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Ambientalização do Urbano no Complexo do Alemão

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MATHEUS ALVES DE BARROS 
 
 
 
AMBIENTALIZAÇÃO DO URBANO: 
O caso do Complexo do Alemão na Zona Norte da cidade do 
Rio de Janeiro. 
 
 
Dissertação apresentada ao Curso de 
Mestrado do Programa em 
Planejamento Urbano e Regional da 
Universidade Federal do Rio de 
Janeiro, como parte dos requisitos 
necessários à obtenção do grau de 
Mestre em Planejamento Urbano e 
Regional. 
 
Orientador: Prof. Dr. Carlos Bernardo 
Vainer (Doutor em Desenvolvimento 
Econômico e Social/Université de 
Paris I Panthéon, Sorbonne). 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2012 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
B277a Barros, Matheus Alves de. 
 Ambientalização do urbano : o caso do Complexo do 
 Alemão na Zona Norte da cidade do Rio de Janeiro / 
 Matheus Alves de Barros. – 2012. 
 94 f. : il. ; 30 cm. 
 
 Orientador: Carlos Bernardo Vainer. 
 Tese (mestrado) – Universidade Federal do Rio de 
 Janeiro, Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e 
 Regional, 2012. 
 Bibliografia: f. 93-94. 
 
 1. Ambientalismo – Rio de Janeiro (RJ). 2. Conflito 
 social. 3. Favela do Alemão (Rio de Janeiro, RJ) – Aspectos 
 ambientais. I. Vainer, Carlos Bernardo. II. Universidade 
 Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Pesquisa e 
 Planejamento Urbano e Regional. III. Título. 
 
 CDD: 303.6 
 
MATHEUS ALVES DE BARROS 
 
AMBIENTALIZAÇÃ DO URBANO: 
O caso do Complexo do Alemão na Zona Norte da cidade do 
Rio de Janeiro 
 
Dissertação apresentada 
ao Curso de Mestrado do 
Programa de Pós-
Graduação em 
Planejamento Urbano e 
Regional da Universidade 
Federal do Rio de Janeiro 
– UFRJ, como parte dos 
requisitos necessários à 
obtenção do grau de 
Mestre em Planejamento 
Urbano e Regional. 
 
Aprovado em: 
BANCA EXAMINADORA 
___________________________________ 
Prof. Dr. Carlos Bernardo Vainer – Orientador 
Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional - UFRJ 
____________________________________ 
Prof. Dr. Eder Jurandir Carneiro 
Universidade Federal de São João del-Rei – UFSJ 
_____________________________________ 
Prof. Dr. Pedro Novais Lima Junior 
Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional – UFRJ. 
Dedicatória 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico esse trabalho aos meus pais: 
Maria Antônia de Barros e Mauro Ronan Alves (in memoriam). 
 
 
 
 
 
Agradecimentos: 
 
A realização e conclusão deste trabalho contaram com o apoio e ajuda de muitas 
pessoas que seria difícil falar de todas elas, cito apenas algumas, mas sem perder de vista 
os demais. Gostaria de agradecer, em primeiro lugar, aos meus pais e aos meus irmãos 
que amo incondicionalmente. De outra parte, gostaria de agradecer aos professores e 
funcionários do IPPUR/UFRJ, em especial, ao professor Carlos BernardoVainer pela 
orientação e leitura atenta. Aos professores Henri Acselrad e Pedro Novais que 
contribuíramcom suas críticas e comentários. Ao professor Eder Jurandir Carneiro 
(UFSJ) pela amizade e pelas orientações. Aos amigos, companheiros de lutas e pesquisas, 
Breno Pimentel Câmara e João Batista Araújo (BABA), pelas orientações, leituras e 
comentários. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
A pesquisa busca identificar e qualificar o uso da retórica ambiental aplicada ao 
espaço urbano da cidade do Rio de Janeiro, por um lado, pelos governos e 
organismos multilaterais e, por outro, pelas ONGs e atores sociais locais. A 
partir das análises do material empírico coletado, explanou-se o que diferentes 
atores sociais entendem pelas mesmas categorias e conceitos (meio ambiente, 
sustentabilidade, desenvolvimento e justiça ambiental) dentro de um mesmo 
contexto histórico. A hipótese inicial de que haveria uma dicotomia entre o que 
se denominava “ambientalistas dos pobres” (Martinez-Alier, 2009), personificado 
pelo “ambientalismo da Serra da Misericórdia” (SIMAS, 2007), e o ambientalismo 
oficial (ambientalismo do governo) não se sustentou. Com efeito, constatou-se 
que o ambientalismomisericordiano– que a primeira vista apresentava-se como 
sendo dos pobres – se configurava, em determinadas práticas, como sendo o 
mesmo que aquele preconizado pelo governo. Por outro lado, porém, em outros 
momentos ele apresenta elementos que o aproxima da concepção preconizada 
pela justiça ambiental e toda a luta por igualdade e garantia de direitos. Diante 
disso, perguntar-se-ia: como caracterizá-lo? E porque assim fazê-lo? Eis 
algumas questões que emergem para a reflexão. 
Palavras chaves :Ambientalismo.Conflitos. Alemão. 
 
 
 
 
 
 
 
Résumé 
La recherche vise à identifier et qualifier l’utilisation de la rhétorique de 
l’environnement appliquée à l’espace de la ville de Rio de Janeiro, d’une part, 
par les gouvernements et par les organisations multilatérales et, d’autre part, par 
les ONGs et les acteurs locaux. L’analyse des données empiriques recueillies a 
possibilité d`expliquer comment les différents acteurs sociaux comprendre et 
signifie les concepts (environnement, la durabilité, le développement et la justice 
environnementale) dans un contexte historique. L’hypothèse initiale qu’il y avait 
une dichotomie entre le « environnementalisme des pauvres » (MARTINEZ, 
ALIER, 2009), personnifiés par le « environnementalisme de Serra da 
Misericórdia (SIMAS, 2007), et environnementalisme official (du gouvernement) 
ne sont pas est mis à jour. En effet, il a été constaté que l’environnementalisme 
Misericórdiano – qui, à première vue, s’est présentée comme étant des pauvres 
– a été configuré à de telles pratiques comme étant écologiste. D’un autre côté, 
cependant, d’autres fois il présente des preuves que la démarche de conceptions 
préconisée par la justice environnementale et la lutte ensemble pour l’égalité des 
droits et la sécurité. Ainsi, on pourrait demander: comment on peut fais pour le 
caractérisé? Et pourquoi on le faire? Voici les questions qui émergent pour la 
réflexion. 
Mots-Clés : L’environnementalisme. Conflits.Alemão. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sumário: 
 
INTRODUÇÃO...................................................................................................09 
CAPITULO 1 – O COMPLEXO DO ALEMÃO: OCUPAÇÃO E CONTROLE...18 
1.1 – ELEMENTOS DA HISTÓRIA DE OCUPAÇÃO.........................................18 
1.2 – AS ATUAIS CONDIÇÕES SOCIOECONÔMICAS DO ALEMÃO..............22 
1.3 –VIGIAR E PUNIR: AS OPERAÇÕES MILITARES DE 2007 E 2010.........25 
1.3.1 - Operação de 2007: Pan-Americano e PAC..........................................25 
1.3.2 - Operação de 2010: a tomada do “controle” bélico do Alemão.................27 
1.3.3 - Vigiar e punir: a lógica das ações militares no Alemão?..........................31 
CAPÍTULO 2– O PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO 
(PAC)..................................................................................................................34 
2.1 - O PAC NACIONAL......................................................................................34 
2.2 –O PAC NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO..............................................36 
2.3 - O PAC NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO...........................................39 
2.4 - O PAC NO COMPLEXO DO ALEMÃO E O PLANO DE 
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO ALEMÃO (PDSA)..........................40 
2.4.1 - Orçamento e as obras físicas...............................................................43 
2.4.2 - O Trabalho Social e o PDSA....................................................................48 
2.4.3 - PDSA: uma conclusão.............................................................................52 
CAPÍTULO 3– AMBIENTALIZAÇÃO DO COMPLEXO DO ALEMÃO: ATORES 
E REPRESENTAÇÕES.......................................................................................583. 1 – OS ATORES: VERDERJAR, RAIZES EM MOVIEMENTO E EFETA.......58 
3.1.1 - O Verdejar: um fator ambientalizante do Alemão...............................58 
3.1.2 - O Raízes em Movimento.........................................................................62 
3.1.3 - O Efeta: Movimento de Integração Social................................................63 
3.1.4 Verdejar, Raizes, Efeta e o Comitê de Desenvolvimento Local da Serra da 
Misericórdia: articulações e parcerias.................................................................65 
CAPÍTULO4REPRESENTAÇÕES E AMBIENTALISMOS: JUSTIÇA 
AMBIENTAL, MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO................................69 
4.1. TRAJETÓRIAS QUE SE CRUZAM NA AMBIENTALIZAÇÃO DO 
ALEMÃO..............................................................................................................69 
4.1.1 Entrevistado 1 e o Raízes........................................................................69 
4.1.2 Entrevistado 2 e o Verdejar........................................................................70 
4.1.3 Entrevistado 3 e o Efeta.............................................................................73 
4.1.4 CDLMS: uma conclusão.............................................................................74 
5CONSIDERAÇÕES FINAIS:AMBIENTALIZAÇÃO DO URBANO E O CASO 
DO ALEMÃO.......................................................................................................81 
5.1 AMBIENTALIZAÇÃO DOS CONFLITOS SOCIAIS.......................................82 
5.2 AMBIENTALIZAÇÃO DAS CIDADES............................................................87 
5.3 AMBIENTALIZAÇÃO DO ALEMÃO OU UM VIGIAR E UNIR?.....................92 
6 REFERÊNCIAS................................................................................................93 
9 
 
 
 
 
Introdução: 
O tema desta dissertação surgiu a partir de inquietações e investigações, 
realizadas anteriormente1, sobre os conflitos ambientais que se manifestam na cidade, 
em particular, aqueles que ocorrem nos territórios habitados pelas classes populares. 
Na cidade do Rio de Janeiro essas inquietaçõe levaram o autor deste trabalho a refletir 
sobre os significados e usos das categorias de “meio ambiente”, “favela” e 
“desenvolvimento sustentável”, sobretudo, dentro do contexto de aplicação de políticas 
governamentais. Ao que parece, os significados de tais categorias são construídos em 
determinados contextos culturais, com base em “saberes” específicos. As categorias, 
porém, tendem a circular por entre os grupos e atores sociais que animam a realidade 
social. À medida que vão sendo incorporadas, essas imagens ganham novos 
contornos e outras são construídas. Essa “circulação” está permeada por relações de 
poder, no sentido de que grupos que, numa determinada sociedade, detêm o controle 
dos meios de comunicação e da produção de saberes tidos como superiores, ou 
mesmo “únicos”, têm uma capacidade muito maior de fazer com que suas imagens 
sejam incorporadas ao imaginário social, em sentido amplo. Desse modo, este estudo 
se insere no tema geral sobre as formas como determinados conceitos com origens 
históricas e culturais específicas, e que servem como base tanto para a atuação de 
governos e organismos multilaterais quanto para os movimentos sociais, são 
reinventados e reordenados com os mais diferentes sentidos. No caso, estamos 
analisando as percepções sociais envolvidas nos chamados “conflitos ambientais” 
sobre categorias como “natureza”, “meio ambiente” e “desenvolvimento sustentável”, 
nos processos de implantação do Programa de Aceleração do Crescimento 
                                                            
 
1 Trata-se de projetos de pesquisa de iniciação científica desenvolvidos durante a graduação (2002-
2006), dentre eles destaca-se o “Justiça ambiental e construção de um território de classe popular: o 
caso do bairro São Dimas na cidade de São João del-Rei –MG.” que pode ser encontrado nos anais do 
encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Sociedade e Ambiente (ANPPAS, 
2006). 
10 
 
 
 
 
(PAC/Social e Urbano)2, no Complexo de Favelas do Alemão3, na Zona Norte da 
cidade. 
 
 Figura 1 Áreas do Complexo que terão obras de intervenção do PAC - Aspecto do Complexo de Alemão. 
 Fonte: www.emop.gov.br/pac/alemão. 
                                                            
 
2 Trata-se de um programa proposto pelo governo Federal em parceira com os governos do Estado e 
Município do Rio de Janeiro. O PAC/Social e Urbano, que ficou conhecido como PAC/Favelas, compõe 
uma pequena parte de um programa muito mais amplo, lançado em 22 de janeiro de 2007 pelo Governo 
Federal, com o nome de Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que engloba um conjunto de 
políticas econômicas, elaboradas para serem aplicadas em quatro anos, 2007 a 2010, nas mais variadas 
áreas. 
3 Trata-se de um conjunto de favelas (o número exato de favelas é alvo de polêmicas, já que o governo 
diz serem 14, as ONGs e moradores falam em 13, outros contabilizam 12) da Zona Norte do Rio de 
Janeiro, com uma área de 296,09 hectares (IBGE, 2005) e uma população de aproximadamente 97. 026 
habitantes (IBGE, 2010), distribuídos por 22.245 domicílios (RELATÓRIO, 2010). O Complexo apresenta 
um dos piores indíces de IDH e é considerado uma das áreas mais violentas da cidade. Do ponto de vista 
sociológico, cabe, aqui, salientar que o entendimento do que seja “Complexo do Alemão” é um objeto de 
estudo deste trabalho, na medida em que a denominação genérica de “Complexo do Alemão” tende a 
homoginazar a constelação de relações e identidades sociais presente nessas favelas e ofuscar a 
análise. Com efeito, há que se considerar que as condições e interesses de quem vive no “Morro do 
Adeus”, por exemplo, não são as mesmas que aqueles que moram na “Vila Cruzeiro, na “Grota” ou no 
“Morro da Baiana”. Além disso, é preciso considerar que cada localidade tem sua história, seu mito de 
origem, seus valores que não são necessariamente os mesmos que as demais, pode até haver valores 
compartilhados, processos parecidos ou até contemporâneo, mas ainda sim terão identidades distintas. 
Por outro lado, a midía além de homegenizar ainda constroi visões diferentes para o genérico “Complexo 
do Alemão” ofusando ainda mais a compreensão. Basta uma rápida olhada na mídia e notaremos que 
imagem de Complexo do Alemão construida, por exemplo, pelo jornal “O Globo” não é a mesma que 
aquela sugerida pelo programa “Balanço Geral” do apresentador e deputado estadual do Rio de Janeiro 
Wagner Montes. Para o presente trabalho optamos em denominar o Complexo do Alemão como um 
Conjunto de Favelas, com o objetivo evitar a homegenização. Acreditamos que a palavra “conjunto”, em 
certa medida, fornece uma ideia de heterogeneidade, por isso, ela será utilizada, ao longo do trabalho, 
para se referir ao então denominado Complexo do Alemão. 
11 
 
 
 
 
Ao longo do cronograma da pesquisa foram realizadas observações participantes 
em um grande número de encontros, audiências públicas (8 no total), reuniões, 
debates, Fóruns etc., cujo tema central é a implantação do PAC/Social e Urbano na 
cidade do Rio de Janeiro e os impactos deste na população residente, em particular, no 
território do Alemão. Além disso, realizamos pesquisas nos arquivos das Secretárias 
Estadual e Municipal de Obras, arquivos da Empresa de Obras Públicas (EMOP) da 
prefeitura e, ainda, leituras sistemáticas de textos sobre a história de ocupação do 
território do Alemão, além de textos sobre sustentabilidade, desenvolvimento 
sustentável, conflitos ambientais e ambientalismos. 
Nesse sentido, a luta de moradores e ONGs do Complexo do Alemão pela 
preservação, recuperação e transformação da Serra da Misericórdia4 em Parque 
Ecológico, contra outras formas de uso5 deste recurso “natural”, podem ser lida nos 
termos de Acselrad (2004), como um conflitoambiental. Ao analisarmos a história da 
luta de moradores nucleados em torno do Verdejar e de outras ONGs, percebemos uma 
constelação de relações sociais e atores coletivos que configuram e animam os 
conflitos ambientais urbanos na cidade do Rio de Janeiro. Além disso, percebemos, nos 
territórios considerados como “favelas”, para além das gestões governamentais, uma 
lógica comum de atuação do Estado, que, através de programas, políticas e projetos, 
buscam se apropriar da cidade e de seus territórios. Essa lógica atua de duas 
maneiras. A primeira busca, através de intervenções urbanísticas, “aparelhar” a cidade 
                                                            
 
4 A Serra da Misericórdia abrange cerca de 43,9 km2 no município do Rio de Janeiro, e está localizada 
após uma faixa de baixada de aproximadamente 6 km a norte do Maciço da Tijuca e 3 km da costa oeste 
da Baia de Guanabara no ponto mais próximo de seu relevo: o bairro da Maré. O maciço da Misericórdia 
chega a aproximados 260 metros de altitude em seu pico culminante a Serra do Juramento. Sua 
formação geológica de morros e nascentes, quase toda destruída pela construção do Complexo. Restam 
poucas áreas verdes na região, apesar dos esforços de preservação empreendidos pelo Verdejar e seus 
parceiros. Disponível em: http://verdejar.wordpress.com/2009/05/24/serra-da-misericórdia, acessado em 
10/10/11. 
5 Referimo-nos aos “usos” que as empresas de Pedreira (Lafarge, ), Grileiros e Estado dão ao mesmo 
espaço. 
12 
 
 
 
 
com equipamentos urbanos6 que lhe possibilitem ser “competitiva” e “atraente” ao 
mercado mundial (ACSELRAD, 2009). A segunda busca, através da retórica, a 
legitimidade ampliada dos responsáveis pelas políticas urbanas; assim, tanto as obras 
de intervenção urbanísticas quanto as ações militares ocorridas no Complexo do 
Alemão, entre 2007 e 2011, tendem a ser legitimadas, na medida em que “razões 
universais” são evocadas7 (ACSELRAD, 2009). 
 O estudo dos processos de implantação do PAC no Complexo do Alemão, por 
um lado, e o estudo das retóricas acionadas pelos vários atores envolvidos no 
processo, por outro, iluminam a compreensão desta dinâmica conflitual. Um estudo 
dessa natureza se justifica na medida em que há um grande número de trabalhos 
acadêmicos sobre o PAC no Rio de Janeiro (já realizados e em andamento), mas 
grande parte deles se concentra no Complexo de Manguinhos. Um menor número se 
dedica ao estudo dos processos de implantação do PAC no Complexo do Alemão. 
Além disso, o estudo pretende contribuir para a reflexão sobre a forma de atuação das 
políticas governamentais aplicadas às favelas cariocas num momento em que a cidade 
passa por grandes transformações fisícas e sociais para se adequar, minimamente, 
para sediar dois grandes eventos esportivos internacionais: a Copa do Mundo de 
Futebol (2014) e as Olímpiadas Mundiais (2016). Esse estudo busca jogar luz sobre a 
problemática do que são os conflitos ambientais urbanos, na medida em que revela a 
dinâmica conflitual resultante das ações de ONGs e Associações de Moradores em 
resposta (ou demanda) às políticas sociais omitidas e/ou implantadas nas favelas. 
                                                            
 
6 Refere-se, aqui, aos projetos de intervenção na parte física da cidade, como, por exemplo: melhorias no 
sistema de rodo e ferroviário (melhorias circulação de mercadoria e pessoas), melhorias nos portos e 
aeroportos (infra-estrutura produtiva), etc. 
7 Entende-se por razões universais aquelas que de algum modo seria justificada ou legitimada por todos, 
sem exceções. No caso, cita-se como exemplo as retóricas, ambiental e de segurança pública, já que, 
supostamente, as consequências da precariedade ou falta de controle desses dois campos afetaria à 
todos independente de classes, gênero, raça ou crença; ou seja, a insegurança pública - proveniente da 
delinquência e da criminalidade - e degradação ambiental de um território afetaria toda a população da 
cidade e, ainda, no caso da degradação ambiental, todo o planeta. 
13 
 
 
 
 
Para tanto, realizamos um conjunto de entrevistas semi-estruturadas com um 
conjunto de atores, tais como: lideranças comunitárias, moradores, militantes, 
coordenadores e membros da ONG e, também, com o coordenador do projeto Pacto 
pela Cidadania8. Essas entrevistas permitiram problematizar a maneira como alguns 
atores locais e de fora do território têm-se utilizado das noções de “desenvolvimento 
sustentável”, “meio ambiente”, “sustentabilidade” e “justiça ambiental”, no embate com 
as instituições governamentais e suas políticas. Em contraste, objetivou-se a realização 
de um conjunto de entrevistas com alguns dirigentes de instituições governamentais, 
como a Secretária-Executiva do PAC/Rio Mirian Belchior, a coordenadora do 
PAC/Social estadual, a arquiteta e urbanista Ruth Juberg, e o Coordenador do PAC/Rio 
pela prefeitura Municipal, o Sr. Icaro Moreno (presidente da Empresa de Obras Públicas 
– EMOP). Apesar de procurá-los várias vezes não obtivemos sucesso, com exceção da 
Sra. Ruth, que nos recebeu no dia 19 de outubro de 2011. Diante do insucesso, 
traçamos outro caminho metodológico para atender a essa demanda da pesquisa. 
Optamos por utilizar entrevistas e outras matérias divulgadas na impressa - e em outras 
fontes, entrevistas proferidas por eles nos meios de comunicação de massa - cujo 
contéudos tratassem da implantação do PAC/Social e Urbano nas favelas cariocas. 
Assim, assistimos e transcrevemos seis entrevistas, das quais uma com Secretária-
Executiva do PAC/Rio Mirian Belchior, duas com a coordenadora do PAC/Rio, Ruth 
Juberg9, e duas com Icaro Moreno. Além disso, foram pesquisados textos, boletins 
informativos, filmes e outros materiais de divulgação e propaganda dos governos. A 
                                                            
 
8 Refere-se ao projeto do Instituto Brasileiro de Análises Social e Econômica (IBASE), cujo objetivo 
principal é criar “um espaço de negociação das diferenças e de construção de convergências e para a 
elaboração de propostas e alternativas que potencializem as ações do PAC” (IBASE, 2010). O 
projeto realizou três encontros denominados de “Fórum pela Cidadania”, no qual estavam presentes 
os governos Estadual e Municipal, lideranças e moradores de Manguinhos, Rocinha e Alemão. 
Disponível em: http//www.pactopelacidadania.org.br/index.php/o-projeto, acessado em 05/09/2010). 
9 Mesmo realizando a entrevista com a coordenadora do PAC/Social no dia 19/10/11 foi realizado esse 
procedimento metodológico para ampliar a percepção dos discursos proferidos pelos representantes dos 
governos. 
14 
 
 
 
 
partir desse material e das entrevistas, analisou-se a maneira que os governos têm-se 
incorporado da questão ambiental e como a utilizam – por exemplo, menções as 
noções de “meio ambiente”, “desenvolvimento sustentável”, “sustentabilidade” etc., - no 
contexto da aplicação de suas politícas, em particular, a política do PAC/Social e 
Urbano. A partir dessas análises (atores locais e externos de um lado e instituições 
governamentais de outro), objetivou-se explanar o que esses dois conjuntos de atores 
entendem pelas mesmas categorias e conceitos. Nesse momento, algumas questões 
são levantadas tais como: quais são os objetivos dos “usos” dessas categorias? Há um 
confronto (de significado e representação) entre esses dois grupos de atores? Se 
positivo, poder-se-ia caracterizá-lo como sendo “ambientalistas dos pobres” (grupo de 
atores locais) e “ambientalistas oficiais” (governos e suas instituições)? O que poder-se-
ía afirmar ou negar desses usos ou deste suposto confronto? Além disso, a partir da 
constatação de que houve a criação de novos espaços de debates e diálogo - entre as 
instituições governamentais e as organizações locais (Alemão, Manguinhos e Rocinha) 
– poder-se-ia perguntar quais são as “vozes” do Alemão nos processosde implantação 
do PAC? O que essas “vozes” dizem ou têm a dizer? De que maneira poder-se-ia falar 
de autonomia do movimento popular do Alemão? Até que ponto os “dizeres” se 
confundem e se distanciam? O que pensam algumas lideranças comunitárias sobre a 
atuação dos governos estadual e municipal na condução de suas políticas e, ainda, o 
que pensam sobre atores internos: Verdejar, Raízes em Movimento, Efeta? Quais são 
esses tais espaços de debates? Essas e outras questões foram levantadas no início e, 
na medida do possível, respondidas no desenrolar do cronograma da pesquisa. 
Algumas delas ficaram sem respostas, em grande parte, pela ausência ou precariedade 
dos dados coletatos10 que, dentre outros motivos, apresentou uma incompatibilidade 
entre o tempo de maturação do objeto (por se tratar de uma análise diacrônica) e o 
                                                            
 
10 Gravações de seminários, debates, encontros, Fóruns relativos ao tema; coleta de vídeos e gravações 
disponíveis na Rede Internacional de Computadores (Internet) e em sites oficiais, tais como: Secretárias 
Estadual e Municipal de Obras; Empresa de Obras Públicas (EMOP), Secretária de Assistência e Direitos 
Humanos, etc.; anotações feitas a partir das observações participantes, leitura de atas, entrevistas, 
realização de fotografias e entrevistas semi-estruturadas. 
15 
 
 
 
 
tempo de execução do projeto dissertativo. Tinha-se, nos momentos inciais da 
pesquisa, a hipótese de que haveria uma dicotomia entre o que se denominava 
“ambientalistas dos pobres” (Martinez-Alier, 2009), personificado pelo “ambientalismo 
da Serra da Misericórdia” (SIMAS, 2007), e o ambientalismo oficial ou preservacionista 
(ambientalismo do governo). No decorrer da pesquisa, porém, essa hipótese foi se 
enfraquecendo, na medida em que os dados apontavam para outra direção: constatou-
se que o ambientalismo – que a primeira vista se apresentava como sendo dos pobres, 
nos termos de Martinez-Alier (2009) – se configurava, em determinadas práticas, como 
sendo preservacionista11. Essa constação abalou teoricamente, por assim dizer, o 
modelo analítico proposto pela pesquisa que, em última instância, teve que se adequar 
(ou aceitar) ao fato de que o material coletado demonstrava algo novo, não previsto 
pelo projeto inicial. Essa “adequação” gerou uma reflexão: a análise sociológica - de um 
determinado fenômeno social que é, por natureza, dinâmico, mutável e permeado por 
conflitos e relações de poder – deve-se ater primeiramente à teoria que, de maneira 
científica, explicaria o que ele seja ou a descrição tal como ele aparece para o campo 
epistemológico escolhido12? Ou devem ser feitos os dois movimentos 
simultaneamente? Sem entrar no mérito da questão, constata-se que a tentativa de 
análise do assim chamado ambientalismo da Serra da Misericórdia (Alemão) apresenta-
se, em parte, um ambientalismo conservacionista que legitima as ações dos governos, 
que vem desde muito tempo, buscando alternativas à contenção da favelização da 
Serra da Misericórdia13. Por outro lado, porém, ele apresenta elementos que o aproxima 
                                                            
 
11 Refe-se ao fato de que o mito que dá origem ao que Simas (2007) denominou como ambientalismo da 
Serra da Misericórdia, é a preservação ambiental e a preocupação que o espaço da Serra – que também 
é usado e significado pelas Mineradoras – se transformassem num “grande favelão”. Nesse sentido, se 
aproximam daquele dissiminado e praticado pelos governos e agências multilaterais. 
12 Alusão ao fato de que a Ciência (Gaia) pode ser diferenciada pelo seu objeto e por suas características 
e pecularidades analíticas; logo, a análise sociológica parte de campo espistemológico distinto daquele 
elaborado para as ciências naturais ou da terra. Do mesmo modo que a análise sociológica de um 
fenômeno social é distinta daquela elaborada pela antropologia, ciência política, psicologia ou filosofia 
para descrever e analisar o mesmo fenômeno que, por sua natureza, tende a ser objeto para todas elas. 
13 Este significado e uso atribuídos a Serra da Misericórdia contrapõem aqueles dados pelos invasores 
(grileiros) e ocupantes (trabalhadores precarizados sem teto) que atribuem a ela o significado e uso de 
16 
 
 
 
 
da concepção preconizada pela justiça ambiental e toda a luta por igualdade e garantia 
dos direitos. Diante disso, perguntar-se-ia: como caracaterizá-lo? E porque assim fazê-
lo? Eis questões que emergem para a reflexão. 
 A estrutura do texto está organizada da seguinte maneira. Discute-se, no 
primeiro capítulo, a história de ocupação, fornecendo elementos que compõem a 
construção social do território. No item I, do referido capítulo, apresentamos os 
processos pelos quais se deram a transformação de um ambiente rural para um 
ambiente urbano. No item II, realizamos um esforço analítico para construir uma leitura 
dos processos de ocupação do território pelas forças criminosas e sua militarização 
pelas forças policiais como sendo um “vigiar e punir” (FOUCAULT, 2009). 
Simultaneamente, busca-se relacionar esse processo de vigiar e punir ao processo 
ambientalizador, iniciado na última década, para descrevê-los, nos termos que Acselrad 
(2009) propõe, como um “vigiar e unir”: vigiar pelas forças policiais (as operações 
militares para garantir a realização das obras do PAC aparelhando a cidade de 
equipamentos que a possiblite ser competitiva no mercado dos mega-eventos) e unir 
pela questão ambiental (vista como um problema de todos ou, em termos mais 
específicos, de toda a cidade). Neste capítulo, apresenta-se o movimento de 
preservação da Serra da Misericórida como sendo o elemento que unifica a luta de 
diversas ONGs e atores sociais locais. No item sobre o PAC/Alemão, no capítulo II, 
retoma-se a questão do vigiar e unir, oferecendo mais elementos, tais como: a 
participação da população; os interesses obscuros dos governos, empreiteiras e 
lideranças; plano de desenvolvimento sustentável do Alemão (PDSA) e todo seu 
processo de elaboração. Em seguinda, no capítulo III, realiza-se uma descrição das 
ONGs a partir das falas de seus coordenadores e de pesquisas em seus sites, arquivos 
                                                                                                                                                                                                 
 
construção de habitações e demais edificações urbanas. Além disso, observa-se outro uso e significado 
para o mesmo espaço: exploração mineral, com a produção de britas, cascalhos e derivados pelas 
empresas Lafarj. O Estado aparece como regulador de tais conflitos e, por vez, interventor – agente 
responsável pelas políticas de “controle, organização e construção do espaço” – paternalista e 
corenealista. 
17 
 
 
 
 
e outras fontes. Tem-se por objetivo, neste capítulo, demostrar a formação de atores 
coletivos atuantes no Alemão e seus envolvimentos com as questões políticas do 
território, sobretudo, aquelas que abordem a temática ambiental. Nesse sentido, a 
análise se concentrou os processos de “ambientalização das questões sociais” do 
Alemão. Ao que tudo indica, a formação do Grupo Verdejar aparece como o promotor 
dessa ambientalização (SIMAS, 2006) que vai, paulatinamente, envolvendo os 
moradores e as demais ONGs (Raízes em Movimento, Éfeta e outras). Essa “onda” 
ambientalizante do Alemão que se propaga ao longo da formação e das ações do 
Verdejar tende a ser incorporada nos discursos e práticas do Raízes em Movimento, 
Efeta e governos. Por outro lado, busca-se caracterizar as instituições governamentais 
(seja federal, estadual e municipal) promotoras do PAC como ambientalistas oficiais, 
cujas práticas e discursos “ambientais” podem ser entendidos, como o “evangelho da 
ecoficiência” (MARTINEZ-ALIER, 2009). Por fim, faz-se uma análise do conflito 
ambiental urbanocomo um processo de confronto simbólico, cujas 
representações culturais para os espaços e ambientes tendem a ser antagônicas e, 
portanto, estão em permanente disputa entre grupos sociais distintos (ACSELRAD, 
2004). 
Por fim, faz-se uma apresentação do processo de ambientalização dos conflitos 
sociais (LEITE LOPES, 2004) e das cidades (BRAND & PRATA, 2006) e os conecta ao 
caso do Alemão. Além disso, retoma-se o “vigiar e unir” (ACSELRAD, 2009) 
exemplificando-o com a análise do caso do Complexo do Alemão e da cidade do Rio de 
Janeiro, como parte integrante da lógica global presente em diversas cidades do 
mundo. 
 
 
 
 
 
18 
 
 
 
 
 
CAPITULO 1 O COMPLEXO DO ALEMÃO: OCUPAÇÃO E CONTROLE. 
Neste capítulo abordaremos alguns aspectos e elementos da história de 
ocupação e construção social do território atualmente denominado “Complexo do 
Alemão”, com o objetivo de apresentar e descrever o objeto empírico desta dissertação. 
1.1 ELEMENTOS DA HISTÓRIA DA OCUPAÇÃO. 
O Complexo do Alemão está localizado na Zona Norte da cidade do Rio de 
Janeiro e é, atualmente, formado por 14 favelas14, com uma população de 
aproximadamente 97.542 (IBGE, 2010), que ocupa uma área de 296,09 hectares 
(IBGE, 2010). O nome do bairro está relacionado com a história de um imigrante 
polonês chamado Leonard Kaczmarkiewicz, que, na década de 1920, adquiriu terras na 
Serra da Misericórdia15. À época, essa área era considerada como parte da zona rural 
da Leopoldina16. Ao que consta, o proprietário era conhecido pela população local como 
alemão, por sua aparência e sotaque ao falar o português. Logo, a área ficou conhecida 
como Morro do Alemão. Nesse mesmo período, se instalou na região o Curtume 
                                                            
 
14 São elas: Morro da Baiana, Morro do Alemão, Nova Brasilia, Pedra do Sapo, Palmeiras, Grota, 
Mineiros, Reservatório de Ramos, Casinhas, Morro do Adeus, Canitar, Sérgio Silva. 
15A Serra da Misericórdia é um maciço rochoso situado na Zona Norte do Rio de Janeiro abrangendo 
diversos bairros, tendo o seu entorno intensivamente ocupado por áreas residenciais, indústrias, centros 
comerciais, ruas e avenidas, linhas de trem e de metrô, entre outros equipamentos urbanos. Uma 
descrição pormenorizada do que se entende e quem entende a Serra da Misericórida será trabalhado no 
capítulo 4. 
16Trata-se da área do entorno da estação de trem denominada Leopoldina. Simas (2006) a define da 
seguinte maneira: aquelas áreas que eram mais bem atendidas pelos sistemas de transporte tiveram um 
processo de urbanização mais precoce. Principalmente as áreas atendidas pela Estrada de Ferro D. 
Pedro II (depois Central do Brasil), como Cascadura, principal aglomeração urbana da freguesia na 
virada do século. Em seguida vieram as áreas atendidas pela Leopoldina Railway, como Olaria, Ramos e 
Bonsucesso. Da divisão entre essas linhas principais, veio a divisão entre “subúrbios da Central” e 
“subúrbios da Leopoldina”, que caracterizam a atual “zona da Leopoldina” (SIMAS, 2006, p. 290 
19 
 
 
 
 
Carioca, no bairro da Penha17, considerado nos anos 1950 como a maior indústria de 
curtição e fabricação de produtos de couro das Américas e a segunda do mundo. O 
curtume chegou a empregar 3.000 funcionários (MOURA DOS SANTOS, 1987). 
Paulatinamente, contigentes de operários foram se instalando nas imediações, atraídos 
pelas indústrias, que cada vez mais ampliavam suas atividades. Com a abertura da 
Avenida Brasil, em 1946, a região se tornou mais “atrativa”, catalisando mais indústrias, 
formando, até 1980, o principal pólo de desenvolvimento industrial da cidade (MOURA 
DOS SANTOS, 1987). O comércio e a indústria cresceram e diversificaram-se, mas a 
ocupação do território se deu de forma desordenada. 
Ao que parece, a ocupação da região para fins de habitação começou nos anos 
inciais do século XX, quando trabalhadores das indústrias que começavam a surgir na 
região construíam suas casas nos arredores de forma precária e sem nenhuma infra-
estrutura, tais como: rede de coleta de esgoto, rede de distribuição de água, (MOURA 
SANTOS, 1987). 
No decorrer da administração Pereira Passos foi levado a cabo um verdadeiro 
projeto de urbanização e de novas formas de deslocamento e distribuição das 
camadas sociais no espaço, alterando de maneira muito significativa o modo 
de vida de grandes parcelas da população do município. (MOURA SANTOS, 
1987, p. 220) 
 A ocupação começou pelo Morro do Adeus (denominado, à época, como Morro 
dos Cabritos) e pelo Morro do Alemão. Nas décadas de 1940 e 1950 houve um 
aumento expressivo da população devido à imigração de trabalhadores nordestinos, 
que ocuparam as áreas atualmente conhecidas como Nova Brasília, Itararé, Grota, 
Esperança e Mineiros (MOURA DOS SANTOS, 1987). Como afirma Simas (2006): 
No decorrer do século XX a região da antiga Freguesia de Inhaúma, já 
desmembrada em bairros, fortaleceu a sua função de “morada de trabalhador”, 
com a inovação de que, principalmente nas últimas quatro décadas, algumas 
                                                            
 
17 Bairro localizado na Zona Norte da cidade que faz limites geográficos com o Complexo do Alemão. 
20 
 
 
 
 
atividades industriais se instalaram em bairros como Del Castilho, Ramos, 
Olaria, Inhaúma e outros. As encostas da Serra da Misericórdia viram o 
surgimento e a expansão das favelas, principalmente, na segunda metade do 
século. Como o Morro do Alemão, que dá nome ao complexo e que teria 
surgido em 1951, quando o “Alemão” (que na verdade era polonês), dono das 
terras, dividiu e vendeu os lotes (SIMAS, 2006, p. 31) 
Ainda nos anos 1950, mais precisamente no dia 9 de dezembro de 1951, o Sr. 
Leonard Kaczmarkiewicz (o Alemão) realizou um empreendimento imobiliário, dividindo 
sua propriedade em lotes. O loteamento foi realizado de forma irregular, de modo que 
as obras de infraestrutura básica não foram realizadas, ficando a cargo dos futuros 
moradores ou do Estado o provimento de equipamentos de uso coletivo, tais como 
iluminação pública, rede de esgoto, infraestrutura básica etc. A partir dos anos 1960 a 
ocupação se intensificou. Ao lado das moradias de zinco ou estuque existentes, 
começaram a surgir construções de alvenaria. No final dos anos 1970 e início dos anos 
1980 a apropriação se completou, com obras na Fazendinha, Palmeiras e Baiana 
(MOURA DOS SANTOS, 1987). A velocidade com que se deu a ocupação, reforçada 
pela ausência e omissão de políticas sociais e urbanas, a região se favelizou – se 
observarmos, nesse mesmo período, veremos que se tratava de um fenômeno comum 
a todas as regiões da cidade18, uma reprodução capitalista do espaço (HARVEY, 1987) 
reforçada por uma espoliação urbana (KOWARICK, 1980). 
O bairro foi constuído sobre a Serra da Misericórdia19. Apesar disso, ainda há 
áreas de mata e pontos de nascentes de rios20 que são usados como fonte de água 
                                                            
 
18 Segundo dados do Intituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 1960 a 2000 a população 
residente em favelas no Rio de Janeiro triplicou. 
19 A Serra da Misericórdia abrange cerca de 43,9 km2 no município do Rio de Janeiro, e está localizada 
após uma faixa de baixada de aproximadamente 6 km a norte do Maciço da Tijuca e 3 km da costa oeste 
da Baia de Guanabara no ponto mais próximo de seu relevo: o bairro da Maré. O maciço da Misericórdia 
chega a aproximados 260 metros de altitude em seu pico culminante a Serra do Juramento. Sua 
formação geológica de morros e nascentes, quase toda destruída pela construção do Complexo. Restam 
poucas áreas verdes na região, apesar dos esforços de preservação empreendidos pelo Verdejar e seus 
parceiros. Disponível em : http://verdejar.wordpress.com/2009/05/24/serra-da-misericórdia, acesso: 
06/08/2009) 
21 
 
 
 
 
pela população. Atualmente grande parte dessas nascentes se transformouem valões 
de esgoto, devido à falta ou precariedade do sistema de coleta de esgoto e lixo. Por 
outro lado, parte significativa da Serra é explorada por empresas de mineração 
(Lafarge, Annhanguera, SNM), que começaram a se fixar a partir da segunda metade 
do século XX. Atualmente, esses empreendimentos estão em pleno funcionamento e 
são apontados pela ONGs e lideranças locais como um dos principais causadores da 
poluição atmosférica da região que se encontra na bacia aérea III21. 
A partir dos anos 1980, o bairro começa a sofrer com o esvaziamento econômico 
(desindustrialização), já que a maioria das indústrias da área e entorno fecharam ou se 
transferiram para outras localidades. A expansão das fronteiras da área residencial 
coincide com um momento de crise econômica (final dos 1970 e início dos anos 1980) e 
com aumento do desemprego. Cresce o número de trabalhadores desempregados e 
precarizados nas grandes cidades brasileiras. Esse contigente vê nas ocupações e na 
autoconstrução (irregular, precária e insalubre) a saída para o seu problema de 
habitabilidade, mas ao fazê-lo é, segundo Kowarick (1980), duplamente explorado ou, 
nos termos do autor, espoliado. Com efeito, o processo de modernização brasileira, em 
                                                                                                                                                                                                 
 
20 Estando dentro da macro bacia hidrográfica da Baia de Guanabara destacam-se como principais 
corpos hídricos da região: O Canal do Cunha, o Canal da Penha, os rios Jacaré, Faria, Timbó (que tem 
suas águas enriquecidas por inúmeros afluentes na Serra da Misericórdia), Faria-Timbó, Cachorros (com 
suas nascentes na Misericórdia), Irajá e Ramos; onde se situa a Praia de Ramos, considerada pelos 
órgãos públicos como “a mais poluída do Brasil”. Disponível em: 
http://verdejar.wordpress.com/2009/05/24/serra-da-misericórdia, acessado em 06/08/2009. 
21 O conceito de bácia aerea vem sendo utilizado pela Fundação Estadual de Engenharia do Meio 
Ambiente (Feema) na gestão da qualidade do ar da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ) 
levando em consideração a topologia e a meterologia ela dividiu a RMRJ em quatro bácias áreas. A Zona 
Norte e os municípios da Baixada Fluminense estão localizada na bácia aérea III, considerada a mais 
poluída da RMRJ. Não é objetivo, aqui, avaliar o grau de influência da atividade mineradora na poluição 
atmosférica, menos ainda sobre esta na saúde humana (até porque não temos formação técnica para 
isso), porém, chamamos atenção para o fato por ser ele uma das grandes preocupações das ONGs e 
lideranças locais, já que no confronto com as mineradoras esse fato é sempre envocado como forma de 
legitimar o uso da Serra como espaço de preservação, recreação e lazer em detrimento ao uso minerário 
das empresas. Mais detalhes sobre a categoria de bacia aérea podem ser encontrados no site da Feema. 
Disponível em www.feema.rj.gov.br, acessado em 08/08/2009. 
22 
 
 
 
 
particular da cidade do Rio de Janeiro, pode ser lido, dentre outras leitura possíveis, 
como um caso de injustiça ambiental. Primeiro porque o projeto de modernização 
brasileira deixa um passivo sócio-ambiental22 que é sentido, pelas classes populares, 
até a atualidade. Segundo, porque a lógica do modo de produção capitalista produz, por 
sua natureza, desigualdades que forçam as classes populares a ocuparem o território, 
não só porque não tinham onde morar, mas também porque “foram condicionadas a 
isso para garantir mão-de-obra barata, exercíto industrial de reserva para o processo de 
industrialização da região” (MOURA DOS SANTOS, 1987, p. 34). Terceiro porque os 
espaços da chamada região da Leopodina foram sendo, progressivamente, degradado 
pelas próprias condições de exploração impostas pela industrialização e modernização 
da então capital brasileira. 
1.2 AS ATUAIS CONDIÇÕES SÓCIO-ECONÔMICAS E AMBIENTAIS DO ALEMÃO. 
 Um retrato das injustiças sócio-econômicas e ambientais pode ser observado a 
partir da consideração de alguns indicadores sociais, tais como: renda per capita; 
expectativa de vida; mortalidade infantil; nível de escolarização; Índice de 
Desenvolvimento Humano (IDH); dentre outros23. 
A renda per capita (1/2 salário minímo) dessa população é 3,3 vezes menor a 
renda per capita média da cidade (1,7 salários minímos) 29% vivem abaixo da linha de 
                                                            
 
22 Alguns exemplos podem ser citados aqui: as transformações ocorridas na Zona Norte durante o século 
XX, sobretudo na segunda metade, como, por exemplo, os aterramentos de ilhas e manguezais para a 
construção de condições de infra-estrutura capazes de promover o processo de industrialização, como a 
Av. Brasil, a construção da cidade universitária do Fundão diminuíram a vazão dos rios e gerando 
“problemas ambientais” como as enchentes que atormenta a vida de quem mora no Complexo da Maré, 
de Manguinhos e parte baixa do Alemão. 
23 Os dados sobre a caracterização sócio-econômica da população que serão utilizados aqui foram 
extraídos do Relatório do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Alemão (PDSA) publicado pela 
impresa oficial do governo do Estado do Rio de Janeiro em 2011. Apesar de oficiais e por isso podem ser 
tendenciosos, os dados apresentam, minimamente, como se apresenta autalmente a situação sócio-
econômica e ambiental da população. Há controvérsias (levantadas pelas ONGs locais) sobre os 
métodos de realização da pesquisa, mas nenhuma delas desconsidera a validade dos dados. Veremos 
essas controvérsias mais detalhadamente no capítulo 4. 
23 
 
 
 
 
pobreza24, o que significa que têm renda inferior a 1/2 salário mínimo (RELATÓRIO 
PDSA, 2011). Os piores indicadores de renda per capita dentro do Complexo estão nas 
favelas das Palmeiras, Mineiros-Matinha e Itararé, abaixo de 1/2 salário mínimo. A 
expectativa de vida dos moradores é de 64,8 anos, nove anos mais baixa do que a 
média carioca (74, 9 anos). A taxa de mortalidade infantil é de 40,15 por 100.000 
habitantes, cinco vezes mais alta que a da Zona Sul da cidade (7,76 por 100.000 
habitantes). A região apresenta o mais baixo IDH25entre os 126 bairros da cidade, com 
0,711 (igual ao do Gabão), bem distante dos 0,97 pelo bairro da Gávea com 0,97 
(equivalente ao da Noruega) e bem abaixo da média da cidade, 0,811 (RELATÓRIO 
PDSA, 2011). 
Além disso, a taxa de desemprego é 10,3% índice bem acima da média da 
cidade (6,8%) (IBGE, 2010). Em localidades como Casinhas, a situação é ainda mais 
grave, já que de cada 100 habitantes 25 estão desempregados. No universo dos que 
trabalham 51% estão em situação precária – definida como a dos que não têm carteira 
assinada e acesso a benefícios trabalhistas – ou vivem de trabalhos eventuais. Na 
educação, os indicadores não são melhores: 5,9% são analfabetos, bem acima da 
média da cidade, que é de 4,4%. No grupo etário de 15 a 17 anos, 79% dos jovens 
frequentam escolas, mas apenas 34% estão na série adequada para sua idade 
(RELATÓRIO PDSA, 2011). 
Comparada à população da Zona Sul da cidade, os moradores do Alemão 
recebem grande parcela de degradação ambiental da cidade – haja vista se situarem 
                                                            
 
24 Segundo o governo do Estado, o critério adotado no censo domiciliar e empresarial (aplicado entre 
2009 e 2010 nas favelas do Alemão) para definição de “linha da pobreza” é aquele formulado pelo Banco 
Mundial (BM), para o qual “linha da pobreza” são indivíduos que vivem com menos de um dolar por dia 
(RELATÓRIO PDSA, 2011). 
25 IDH é uma medição utilizada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), 
orgão vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU), para avaliar o bem-estar de uma população, 
levando em consideração renda, educação e esperança média de vida. 
24 
 
 
 
 
na baciaaérea III, a mais poluída do Estado. Além disso, boa parte das atividades 
econômicas poluidoras se concentra nas suas proximidades, como por exemplo, as 
mineradoras26. As explosões para a extração da brita lançam partículas sólidas no ar 
que, somadas à poluição química proveniente das indústrias da região, faz dela uma 
das áreas mais poluídas da cidade. Um dos efeitos dessa poluição é observado na 
saúde da população que passaram apresentar o chamado “pulmão de pedra” 
decorrente da inalação da poeira de pedra emitida pelas freqüentes explosões de pedra 
para extração de brita (PSF/Alemão)27. 
 O esgotamento não atende toda a população, a rede existente é precaria e 
insuficiente, o mesmo acontece com o abstecimento de água, por exemplo, na favela 
Mineira-Matinha apenas 9% das residências têm ligações interna a rede oficial 
(REALTÓRIO PDSA, 2011). Nas partes mais altas, quando há falta de água, é preciso 
usar uma bomba, administrada pela Associação de Moradores, que cobra uma taxa 
pelo serviço. Os reservatórios não passam por manutenções regulares gerando, muitas 
vezes, a chegada de água suja nas residências. Não há coleta regular do lixo para todo 
o Complexo, apenas 40% dos domicílios são atendidos pela Comlurb (empresa 
municipal de coleta de lixomado). Segundo dados do Relatório do PDSA (2011) 12% 
dos domicílios o lixo ainda é queimado ou enterrado no próprio local. Nas proximidades 
da favela Fazendinha há um lixão que acumula lixo há 20 anos e está na cifra de 400 
toneladas de resíduos (RELATÓRIO PDSA, 2011). Além dos lixões o Complexo ainda 
possui as chamadas “valas negras” (corpos d´águas que se transformam em depósito 
de lixo) e redes de esgoto, fossas e sumidouros irregulares. 
 
 
                                                            
 
26 As mineradoras que nos referimos são aquelas que se concentram na área da Serra da Misericórida, 
tais como: a Lafarj, Inhaguera e Sociedade Nacional de Mineração SNM. 
27 Ver, por gentileza, o segundo parágrafo da nota 16. 
25 
 
 
 
 
1.3 VIGIAR E PUNIR: AS OPERAÇÕES MILITARES de 2007 e 2010. 
o exército está ocupando o território há um ano e força militar é força militar. A 
própria palavra já indica que está aqui é a força para manter a “ordem”. 
Historicamente você militariza um lugar, será que o tempo todo você vai ter que 
ser vigiado, militarizado? O tempo todo? Uma instância que a partir do medo, 
imposto pelo Estado junto com a mídia execer um poder de dominação muito 
forte, então, na medida em que você faz – que enclausura a população e mete 
medo porque ele sabe que depois do medo vem a esperança de dias melhores. 
Isso vai sustentar o regime totalitário (Morador da favela Nova Brasilia, 
entrevista concedida ao autor em 09/10/11). 
1.3.1 Operação de 2007: Pan-Americano e PAC. 
A operação polícial realizada em 2007 nas favelas que compõem o Conjunto do 
Alemão teve por objetivo disseminar na sociedade uma sensação de “segurança” para 
a realização do envento dos Jogos Pan-Americanos. O governo municipal da época 
(César Maia) e o governo estadual (Sérgio Cabral) fizeram uma articulação pontual, já 
que eram de partidos adversários. Naquele momento, a cidade do Rio de Janeiro já 
tinha sido oficialmente definida como uma das sedes da Copa do Mundo de 2014; logo, 
era preciso esquecer as divergências políticas e trabalhar juntos. 
A ocupação militar do Alemão começou no dia 2 de maio de 2007. A partir daí 
foram constantes os tiroteios e confrontos entre policiais e bandidos. Alunos ficaram 
semanas sem aulas e o comércio local paralisado. A ocupação se intensificou com a 
operação policial ocorrida em 27 de junho de 2007, que reuniu 1.350 policiais, entre 
civis, militares e soldados da Força Nacional. Houve método e organização na incursão, 
planejada ao longo de dois meses28. Na manhã do ataque, nove atiradores de elite 
ocuparam pontos estratégicos, no alto do morro. Dezenove pessoas foram mortas e 
várias outras feridas. Treze corpos foram recolhidos pela própria polícia, e outros seis 
foram deixados à noite numa van em frente à delegacia local, no bairro da Penha. Entre 
os feridos, sete pessoas foram vítimas de balas perdidas, além de um policial e cinco 
                                                            
 
28 www.policiamilitar.rj.gov.br, acessado em 08/10/2010 
26 
 
 
 
 
traficantes atingidos. De acordo com nota publicada à época pela Ordem dos 
Advogados do Brasil (OAB), pelo menos onze dos mortos não tinham relação alguma 
com o tráfico. Em outubro de 2007, relatório feito por peritos forenses designados pela 
Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH) 
comprovou que houve execuções sumárias e arbitrárias no Complexo do Alemão. 
Segundo o documento, a polícia gastou 70 balas para matar 19 pessoas, sendo que, 
pelo menos em dois casos, os laudos comprovam que houve execução. Algumas 
organizações atuantes no local denunciam que o número de mortos seria muito maior 
que os 19 anunciados oficialmente. Até hoje não se confirmou a ligação entre esses 
mortos e o tráfico. Segundo o entrevistado 1: 
nove tinham alguma ligação – por serem parentes, amigos ou conhecido ainda 
que inocentes - quatro ou cinco deles tiveram comprovação direta com o tráfico. 
Teve execução sumária. À pequena distância, três deles menores de 15 anos. 
Então, foi a matança que eles fizeram em menos de três horas de operação e aí 
esse processo foi de amedrontar, de opressão (Entrevistado 1, entrevista 
concedida ao autor em 30/11/ 2011). 
 
Já outro entrevistado relata a história de um policial, “chamado” Trovão, que, 
teria sido um dos 
 
grandes caras que a mídia alardeou com fotos dele passando na avenida 
pisoteando os corpos no chão e ele passando como se estivesse flutuando em 
cima dos corpos, com um detalhe muito interessante: ele estava com um 
charuto cubano, um símbolo fortíssimo, para quem lê. Fumar um charuto se 
traduz em vitória e ele deu uma declaração nos jornais que, para ele, estar aqui 
é como estivesse no Iraque. Nessa nova invasão policial no Alemão em 25 de 
novembro de 2010 ele foi pego, e aí abafaram o caso, envolvido em todos os 
problemas que tiveram, a Dracon e os subtenentes de parte da força de 
pacificação do exército, em corrupção. Para a gente isso diz muito: um agente 
do governo militarizado que passa aquela imagem de “ordem”, ele foi pego 
metido em atividades fora da “ordem”, extorquindo os traficantes. (Entrevistado 
3, entrevista concedida ao autor em 23/11/ 2011). 
 
 
27 
 
 
 
 
1.3.2 - Operação de 2010: a tomada do “controle” bélico do Alemão. 
A partir de denúncias e de todo o trabalho das organizações locais, juntamente 
com as instituições de proteção dos direitos humanos da cidade (OAB/RJ, Tortura 
Nunca Mais, dentre outras), do Estado, do país e internacional, a operação de 2010 
teve um resultado, do ponto de vista da violação dos direitos, mais satisfatório, se 
comparada com as demais. 
Ainda no ano de 2007, em novembro, três meses depois da operação militar, 
esteve no Brasil o Alto Comissário chefe de Direitos Humanos da ONU, Filipe Alston29, 
para compor a mesa de uma audiência pública aberta para a população, com intuito de 
internacionalizar as denúncias de violações de direitos cometidas pelo Estado nas 
operações militares. 
Para a operação de 2010, houve um planejamento, um trabalho de inteligência e 
construiu-se uma estratégia de intervenção. Isso foi benéfico, na medida em que não 
houve baixa letal da população civil. Mas isso não quer dizer que não houve violações. 
No dia 25 de novembro de 2010, a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro 
(PMRJ), com apoio da Marinha do Brasil, ocupou a favela Vila Cruzeiro (Vila da Penha, 
bairro próximo ao Alemão). No dia seguinte, 26 de novembro, a PMRJ, juntamente com 
a Polícia Federal, a Polícia Civil e as Forças Armadas, se posicionaram nos arredores 
do Alemão. Realizaram uma nova operaçãopara tomar o controle de toda a região. 
Houve intensa troca de tiros entre traficantes e policiais no início da noite do dia 26. 
Mais cedo, o traficante Anderson Roberto da Silva Oliveira, o Dande, foi preso por 
policiais da Delegacia de Repressão a Armas e Explosivos (DRAE). Na operação, a 
polícia apreendeu mais de trezentas motos na Favela do Cruzeiro, onde também foram 
                                                            
 
29  O Relatório do Alto Comissário da ONU pode ser visualizado no endereço: 
http://labirintosdodireito.blogspot.com/2010/07/relatorio-do-comissario-da-onu-sobre.html, acessado em 
11/10/11. Trata-se de uma versão do texto do relatório não oficial. 
28 
 
 
 
 
encontradas munições e cerca de duas toneladas de maconha, além de cocaína e 
crack. No dia 27 de novembro, ao final da tarde, cerca de 31 traficantes se renderam à 
polícia. No dia 28 de novembro de 2010, o Batalhão de Operações Policiais Especiais 
(BOPE/PMRJ) e as forças armadas fizeram mais uma operação para a retomada do 
Complexo do Alemão. Os traficantes fugiram pela mata da Serra da Misericórida, que 
dá acesso a 27 bairros da região. Nesta operação, o BOPE/PMRJ apreendeu cerca de 
quarenta toneladas de maconha, cocaína, crack e armas de grosso calibre. 
A imagem que o governo tenta construir com a operação de 2010 é a de que o 
Estado fez um trabalho de inteligência, uma comunicação de mídia prévia em que ele 
se colocou em seu papel institucional de acuar, através da intimidação, o poder do 
tráfico, cujo poder e organização (criminosa) não se apresentam como é propagado 
pela mídia e pelas instituições governamentais. Ao que parece, trata-se de pequenas 
organizações (facções) que dominam frações de territórios e que estão em permanente 
disputa do controle dos pontos de vendas de drogas espalhado pelas favelas do 
Conjunto. Eles (os criminosos) sentiram o peso do Estado antes mesmo dele chegar; 
com isso houve todo um recuo e uma fuga em massa pela Serra da Misericórdia que dá 
acesso a outro grande conjunto de favelas da Zona Norte, o da Penha. O Estado 
retoma o “domínio do território” – isso não implica dizer que ele tem o domínio no 
sentido de inibir o tráfico de drogas, pelo contrário, o tráfico continua, porém 
“desarmando” – o Estado “retoma” o papel de regulador da vida social nesses 
territórios. No entanto, o Estado não possui instrumentos capazes de desempenhar 
esse papel, como explica o entrevistado 1: 
área de favela se você xinga minha mãe eu não posso brigar com você, antes 
de revidar com um soco num bar da esquina na favela, eu tinha que ir lá no 
chefe do tráfico e pedir o direito de revidar. Então este tipo de domínio caiu – o 
de regular a vida em sociedade volta para as mãos do Estado -, só que o 
Estado não tem instrumentos para regular e a violência interna cresce, tais 
como: brigas de bares, agressão contra a mulher, dentre outros (Entrevistado 1, 
entrevista concedida ao autor em 30/11/ 2011). 
 
29 
 
 
 
 
O entrevistado acrescenta que quanto ao tráfico de drogas, o negócio 
permanece funcionando regularmente: 
todas as bocas [locais onde são comercializado as drogas] estão funcionando 
normalmente, na mesma intensidade e quantitativo – o que mudou neste 
aspecto foi a retirada da ostentação das armas, quando usadas é de pequeno 
porte e ocultada. A força policial não está fixamente e nem num domínio desse 
território fisicamente, os traficantes têm sua circulação e atividade inalterada. 
Agora nem o Estado consegue entrar para fazer a mediação de conflitos da 
vida social e nem desarticular o tráfico de drogas (Entrevistado 1, entrevista 
concedida ao autor em 30/11/2011, acrecimo do autor) 
Outras falas nos levam a refletir sobre as narrativas que são construídas pelos 
diversos atores que às vezes se assemelham e às vezes se diferenciam. Durante as 
idas e vindas ao Alemão para a realização do trabalho de campo, o autor se encontrava 
(nos ônibus, vans e kombis, motos taxis e, mais no final da pesquisa, nas cabines do 
teleférico) com moradores diversos que, em entrevistas informais, emitiam suas 
narrativas sobre os mais variados assuntos, dentre eles, estão: as obras e intervenções 
do PAC, a preservação da Serra da Misericórdia e questão ambiental local e da cidade, 
a violência e a militarização. Essas narrativas, sem o crivo do gravador e compromisso 
ou formalidade de uma entrevista a um pesquisador universitário, nos apresentam 
quadros e imagens destintas para os temas pesquisados. A questão do aumento da 
violência interna, por exemplo, é um tema interessante a ser investigado, já que essas 
narrativas - construídas alí num encontro casual, cotidano, numa conversa informal de 
transporte coletivo – afirmam que a violência permanece como antes e, ainda, que a 
intervenção do tráfico nos conflitos se dá se somente se, quando pelo menos uma das 
partes estiver ligada direta ou indiretamente com eles e, por outro lado, quando há 
casos de extrema covardia30. Logo, a mediação do tráfico nos conflitos intrafavelas 
                                                            
 
30 Nas falas coletadas, o conceito de covardia aparece como injustiças cometidas por uma das partes no 
conflito, por exemplo: força física, agressões “gratuidas”, ou seja, violência cometida sem motivo 
“justificável”, etc. 
 
30 
 
 
 
 
está condicionada, por um lado, a uma relação anterior àquela que se estabelece no 
conflito e, por outro, por uma relação de justiceiro nos casos de covardias. Assim, a 
ideia de que a violência interna aumentou pode não ser verdadeira, assim como a de 
que ela permanece também. Diante deste impasse, somente um trabalho exaustivo 
sobre o tema poderia nos assegurar uma assertiva quanto à mediação dos conflitos 
internos e a variação no índice de violência interna. Seria preciso, então, quantificar e 
classificar todos os conflitos ocorridos em um dado período de tempo - que 
compreenderia o antes, o durante e o pós PAC – o que não será realizado aqui. Por 
hora, apresenta-se esse problema com intuito de demonstrar que numa realidade social 
como a do conjunto de favelas do Alemão afirmar que o Estado, através pela polícia e 
forças armadas, retomou o controle das mãos do tráfico – como o governo e a mídia em 
geral vêm construindo essa imagem – é, no mínimo, uma falácia. Por outro lado, 
assegurar uma assertiva sobre a atual configuração do poder e dos conflitos com base 
nas narrativas, construídas pelos diversos atores pesquisados é prematura e carente de 
informações e dados mais precisos. Por fim, o chamado “controle do território” tem sido 
mantido com a presença do Exército, que permenecerá patrulhando a região até junho 
de 2012, quando está prevista instalação de quatro Unidades de Polícia Pacificadora 
(UPP) 31. 
 
 
                                                            
 
31 “Criadas pela atual gestão da secretaria de Estado de Segurança, as UPPs trabalham com os 
princípios da Polícia Comunitária. A Polícia Comunitária é um conceito e uma estratégia fundamentada 
na parceria entre a população e as instituições da área de segurança pública. O governo do Rio está 
investindo R$ 15 milhões na qualificação da Academia de Polícia para que, até 2016, sejam formados 
cerca de 60 mil policiais no Estado”. Disponível em: http://upprj.com/wp/?page_id=20, acessado 06/01/12. 
. 
31 
 
 
 
 
1.3.3 Vigiar e punir: a lógica das ações militares no Alemão? 
 Em seu livro “Vigiar e Punir: a história das prisões” Michel Foucault (2009) 
examina a formação das sociedades dos séculos XVIII a XIX, através de um estudo 
aprofundado sobre nascimento da prisão. O autor busca descortinar a história dos 
domínios do saber se concentrando na formação do poder como produção de toda uma 
hierarquia que se realiza a partir da troca entre saberes disciplinares nas mais diversas 
instituições, sejam elas propriamente repressivas (tal qual a prisão e asforças armadas); 
econônomica (como as fábricas) ou até pedagógicas (como as escolas). Para Foucault, 
nessa troca, o que caracteriza o conjunto hierárquico como vida é o poder difuso, e não o 
uso privado pelo topo da hierarquia. 
Ao analisar os séculos XVII a XIX, Foucoult percebe que eles não foram apenas 
um marco na regulamentação dos exércitos, escolas, prisões, hospitais e fábricas, mas 
principalmente uma ideia construtiva de uma conversão do homem em máquina, “é algo 
com intenção de tornar o indivíduo útil, dócil e disciplinado” (FOUCAULT, 2009, p. 30). 
Este tipo específico de poder que se expande por toda a sociedade, investindo sobre as 
instituições e tomando forma de técnica de dominação, possui, segundo Foucault, uma 
tecnologia e história específicas, pois, atinge o corpo do indivíduo, realizando um 
controle detalhado e minucioso sobre seus gestos, hábitos, atitudes, comportamentos. 
Nesse sentido, o uso das forças armadas nas favelas do Alemão pode ser visto como 
parte de uma política que buscar disciplinar os corpos, mudar os “hábitos”, “atitudes” e 
“comportamentos” entendidos como inadequados ou “fora do padrão”. Um relato de uma 
liderança exemplifica isso ao falar da ação do exército no território: 
Não tem o mínimo de diálogo com a população, eles dizem que tem, mas é 
mentira. Na verdade, o Alemão se tornou um grande circo, né?! E num certo 
sentido um grande presídio, cartilhas de comportamentos aceitáveis, toque de 
recolher, existe toqude recolher não para moradores que moram nas vias 
principais (Itararé e outras), mas para os moradores que moram no pico do 
Morro. Lá se chega depois das 22 horas vocês será revistado; não são poucos os 
moradores que reclamam do modo de abordagem do exército e você deve ter 
ouvido em suas andanças e conversas com os moradores que há uma 
resistência por parte dos moradores. A última delas foi noticiada pela mídia de 
um jogo mal explicado, sem a menor ética do ponto de vista da apuração técnica: 
32 
 
 
 
 
aconteceu que na favela da Alvorada alguns moradores estavam assistindo a um 
jogo de futebol e alguns soldados do exército que faziam a patrulha os mandaram 
abaixarem o som da televisão e paralelo a isso tem a cultura do funk aqui dentro 
– que é uma cultura fortíssima - eles, em diversas ocasiões, mandaram abaixar o 
som por ser este visto como uma cultura marginal. Ora, se tem lá cultura que 
desconsideram como tal eles a proíbem, como tem proibido os garotos de ouvir o 
funk, nem na sua casa você pode ouvir porque se o som estiver alto eles 
mandam desligar (Entrevistado 3, entrevista concedida ao autor em 23/10/11) 
Esse relato oferece, por assim dizer, elementos de como se dá, no caso da 
militarização do Alemão, a disciplina e controle dos corpos, dos hábitos e 
comportamentos. Esse tipo de ação das forças armadas e militares se dá em todos os 
momentos em que a cidade vai sediar algum evento internacional ou de grande porte, 
ainda com o entrevistado: 
Você observa isso em todas as ações que tiveram aqui no Alemão; seja na Eco 
92 e aí com a morte do jornalista Tim Lopes; nos jogos de 1994, nas ações para 
o PAN em 2007, na operação de 2010 (Entrevistado 3, entrevista concedida ao 
autor em 23/10/11). 
Para Foucault (2009), essa ação do Estado sobre o corpo dos indivíduos não 
opera simplesmente pela consciência, mais também pelo condicionamento biológico e 
corporal. É, portanto, justamente esse aspecto que explica o fato de que o corpo humano 
seja alvo, pela prisão, não para supliciá-lo, mutilá-lo, mas para adestrá-lo e aprimorá-lo. 
Isso converte, segundo Foucault, numa riqueza estratégica e numa eficácia positiva. 
Desse modo, o corpo é o meio para a dominação e controle de um grupo (ou grupos) 
sobre os outros. Para o autor, há um corpo político composto de um conjunto de 
elementos materiais e técnicos que servem de armas, prolongamentos, pontos de apoio 
às relações de poder sobre outros corpos, gerando as prescrições, as reformas, as 
disciplinas. Assim, a anatomia política desenvolve seus efeitos segundo três direções 
privilegiadas: o poder, o corpo e o saber. Essas direções não são isoladas uma das 
outras, pois, correlacionam-se. 
Essas direções podem ser identificadas, no caso do Alemão, na medida em que o 
poder se estabelece através do “adestramento do corpo” (FOUCAULT, 2009) que, por 
sua vez, é adquirido na constante militarização do território que se dá pela invocação de 
33 
 
 
 
 
“razões universais” (a ideia de segurança pública e de poluição atmosférica, por 
exemplo). Esse adestramento busca condicionar os indivíduos para que eles apresentem 
comportamentos e hábitos pré-estabelecidos pelos governos. Assim, os indivíduos que 
habitam as favelas são vigiados e punidos o tempo todo pelas forças polícias (razão de 
estado) e, em momentos de que a cidade é sede de grandes eventos, essa “pedagogia” 
é intensificada de modo a impor comportamentos e hábitos ditos “aceitáveis”. Outra 
forma de fazer isso é o curso, chamado de módulo de integração, que os futuros 
moradores dos apartamentos, construídos pelo PAC, são obrigados a frequentar. Neste 
curso são ministradas aulas de como se deve comportar em condomínio e de como é 
morar em um apartamento. 
Então eles participam de um sorteio dos apartamentos e aí eles precisam passar 
pelo o que a gente chama de modulo de integração por quinze horas presenciais, 
no qual eles aprendem, dentre outas coisas, a usar a descarga, a viver em 
condomínio, participar de encontros, a construir uma convenção de condomínio, 
entender o que é morar em apartamento sem isso não entra (Entrevistada 4, 
entrevista concedida ao autor em 19/10/2012). 
Por outro lado, o saber pode ser identificado nos programas de educação 
ambiental promovidos pelos governos, nos quais se buscam normatizar os 
comportamentos e hábitos dos indivíduos numa espécie de “código de conduta” (LEITE 
LOPES, 2004). A fala da coordenadora do PAC/Social expressa essa necessidade de 
disciplinar os hábitos e comportamentos dos indivíduos que habitam as favelas do 
Alemão. Ao falar sobre os problemas de destinação do lixo, ela conclui: [...] “a população 
também é muito mal educada, ela lança o lixo – ela não quer na porta dela, mas ela joga 
por lado de fora aí atraí roedores, então a população também não ajuda” (Entrevistado 5, 
entrevista concedida ao autor em 19/10/2012). Essa percepção de que a população é 
sem “educação” fundamenta e legitima o adestramento promovido pelas forças policiais 
e pela pedagogia dos programas de educação ambiental, nos quais o “saber” é 
transmitido para os bárbaros como forma “civilizá-los”. 
 
 
34 
 
 
 
 
CAPITULO 2 O PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO (PAC). 
2. 1 O PAC NACIONAL. 
O presente capítulo busca descrever a estrutura do Programa de Aceleração do 
Crescimento (PAC) do governo Federal, com o objetivo de realizar uma análise crítica 
dessa política governamental, que pretende ser um “plano de desenvolvimento 
sustentável” e um modelo de “governança” para todo o território (BRASIL, 2010, p. 10) ··. 
O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi lançado em 22 de janeiro de 2007 
pelo Governo Lula (2006-2010), com o objetivo de “acelerar” o crescimento econômico 
do Brasil - já que a economia brasileira vinha apresentando baixas taxas de incremento 
do PIB por quase três décadas. O programa compreendeu um conjunto de políticas 
econômicas e sociais para serem aplicadas em quatro anos (2007 a 2010), nas mais 
variadas áreas: transporte, energia, saneamento, habitação, recursos hídricos etc. Esse 
programa tem sido coordenado pelo Comitê Gestor do PAC (CGPAC), composto pelos 
Ministérios da Casa Civil, da Fazenda e do Planejamento, Orçamento e Gestão. Para 
consolidar as ações, estabelecer metas e acompanhar os resultados de implantação e 
execução do programa, o governo Federal instituiu o Grupo Executivo do PAC 
(GEPAC). Esse grupo foi composto pela “Subchefiade Articulação e Monitoramento 
(Casa Civil), Secretaria de Orçamento Federal (Planejamento), Secretaria de 
Planejamento e Investimentos Estratégicos (Planejamento), Secretaria Nacional do 
Tesouro (Fazenda) e Secretaria de Política Econômica (Fazenda) (BRASIL, 2010, p. 
20)32. Acredita-se que a expansão de investimentos em infraestruturas social e 
produtiva é a “condição fundamental para a aceleração do desenvolvimento sustentável no 
                                                            
 
32 MEDIDAS, Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). BRASIL, out. 2010. Disponível em : 
http://www.brasil.gov.br/pac/medidas-institucionais-e-economicas/medida-degestao/print acessado em 
12/10/11. 
35 
 
 
 
 
Brasil” (BRASIL, 2010, p. 11) 33. Esperava-se, portanto, que o país pudesse superar as 
“amarras” da economia e estimular o aumento da produtividade, além de diminuir as 
desigualdades regionais, sociais e ambientais. (BRASIL, 2010, p. 11). 
Segundo o relatório do governo federal (BRASIL, 2010), o conjunto de 
investimentos foi dividido em três eixos principais: (1) Infraestrutura Logística, 
envolvendo a construção e ampliação de rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e 
hidrovias; (2) Infraestrutura Energética, contemplando a geração e transmissão de 
energia elétrica, produção, exploração e transporte de petróleo, gás natural e 
combustíveis renováveis; (3) Infraestrutura Social e Urbana, englobando saneamento, 
habitação, urbanização de favelas, melhorias e construção de metrôs, trens urbanos 
etc. 
Para a Infraestrutura Logística, a previsão de investimentos durante o quadriênio 
(2007 a 2010) foi de R$ 58,3 bilhões. Para a Energética, o PAC destinou R$ 274,8 
bilhões e para a Social e Urbana R$ 170,8 bilhões. Busca-se com as obras de 
infraestrutura realizar uma “universalização” dos benefícios econômicos e sociais para 
todas as regiões do país, integrando-as a um “plano de desenvolvimento nacional” 
(BRASIL, 2010, p. 15). Observa-se que o objetivo principal do PAC é estimular a 
eficiência produtiva dos principais setores da economia, impulsionar a “modernização 
tecnológica”, acelerar o crescimento nas “áreas já em expansão e ativar as áreas 
deprimidas, aumentar a competitividade e integrar o Brasil” (BRASIL, 2010, p. 15). Para 
tanto, o programa busca, através de investimentos públicos e de Parcerias Público-
Privadas (PPPs), viabilizar a realização das obras e alcançar as metas pré-
estabelecidas. Para atingir o volume de recursos previstos, inicialmente de 503,9 
bilhões de reais, o governo somou os investimentos públicos diretos (67,8 bilhões de 
                                                            
 
33 RELATÓRIO, Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). BRASIL, out. 2010. Disponível em : 
www.brasil.gov.br/pac/relatorios-balanco-de-4anos, acessado em 12/10/11. 
36 
 
 
 
 
reais em quatro anos), a investimentos dos estados e municípios, financiamento dos 
bancos oficiais e investimentos privados. 
A estratégia principal, para aperfeiçoar as medidas e alcançar os resultados em 
menor tempo, foi a de recuperar a infraestrutura existente, concluir os projetos em 
andamento e buscar “novos projetos” com potencial para gerar o “desenvolvimento 
econômico e social”. Entre outras ações, o plano de investimentos previa: 
45 mil quilômetros de estradas, 2.518 quilômetros de ferrovias, ampliação e 
melhoria de 12 portos e 20 aeroportos, geração de mais de 12.386 MW de 
energia elétrica, construção de 13.826 quilômetros de linhas de transmissão, 
instalação de quatro novas unidades de refinos ou petroquímicas, construção 
de 4.526 quilômetros de gasodutos e instalação de 46 novas usinas de 
produção de biodiesel e de 77 usinas de etanol (BRASIL, 2010, P. 16). 
 
Para a área de habitação, o PAC destinou R$ 106,3 bilhões, entre 2007 e 2010, 
e esperava beneficiar quatro milhões de famílias. Além disso, o programa também 
deveria prover investimentos em abastecimento de água e coleta de esgoto para 22,5 
milhões de domicílios, infraestrutura hídrica para 23,8 milhões de pessoas, bem como 
garantir a ampliação e a conclusão de metrôs em quatro cidades. 
Além de infraestrutura e investimentos urbano-sociais, o Programa inclui 
medidas para estimular o crédito e financiamento, alterações do marco regulatório na 
área ambiental, desoneração tributária e medidas fiscais de longo prazo. 
2. 2 O PAC NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. 
O governo federal estabeleceu com os estados e municípios da federação uma 
parceria, através da qual viabilizaria a implantação do PAC em todo o território nacional, 
de forma a garantir os investimentos públicos nas “áreas estratégicas” elencadas pelo 
programa. 
Para o estado do Rio de Janeiro, a estratégia principal do PAC foi a ampliação foi 
da infraestrutura produtiva existente, com a expectativa de dinamizar o escoamento da 
37 
 
 
 
 
produção regional, tanto para o consumo interno quanto para a exportação. Neste 
sentido, foram projetadas: 
A construção do Arco Rodoviário do Rio de Janeiro, BR - 393/RJ, com um 
orçamento previsto de 1.067 milhões; duplicação da BR – 101/RJ no trecho 
Santa Cruz – Mangaratiba e a construção do acesso ao porto de Itaguaí, com 
investimento previsto de 220 milhões; a manutenção de rodovias em todo 
Estado e a construção de sinalização adequada, para tanto, estão previstos 145 
milhões em investimentos; a construção de uma ferrovia de Trem de Alta 
Velocidade (TAV) que ligará Rio de Janeiro à São Paulo e Campinas, com 
investimentos orçados em 4.510 milhões até 2010 e após mais 18.040 milhões 
(BRASIL, 2010, p. 20). 
Além disso, o PAC/Rio previu a dragagem dos portos de Itaguaí, do Rio de Janeiro 
e de Angra dos Reis e, também, a adequação da Linha Férrea de Barra Mansa e 
melhorias nos aeroportos Galeão e Santos Dumont, na cidade do Rio de Janeiro. 
Segundo o governo do estado, os aeroportos receberão obras de ampliação e 
melhoramento, respectivamente, da pista, dos Terminais de Cargas e Passageiros I e 
obras “complementares”. 
Para infraestrutura social e urbana, o PAC/Rio prevê durante os quatro anos (2007 
a 2010), a realização de 18.765 ligações de energia elétrica para a população pobre, que 
contará também com os recursos oriundos do programa federal Luz para Todos34. Ainda 
na infraestrutura social está previsto a ampliação do sistema de esgotamento sanitário, 
com um investimento de 3,1 bilhões de reais. Esses recursos estão destinados às obras 
de despoluição das baías de Guanabara e Sepetiba; das bacias dos rios Botas e Sarapuí 
e à revitalização do rio Paraíba do Sul; de ampliação do sistema de abastecimento de 
água da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (Novo Guandu). O PAC social objetiva, 
                                                            
 
34O Programa Luz Para Todos é um programa do Governo Federal que visa levar energia elétrica para a 
população do meio rural, seja ela com ou sem recursos financeiros, de forma gratuita. O PLPT foi lançado 
em novembro de 2003 com o desafio de acabar com a exclusão elétrica no país. A meta era levar 
energia elétrica para mais de 10 milhões de pessoas do meio rural até o ano de 2008, tendo sido atingida 
em maio de 2009 e em 2010 já soma-se mais de 12 milhões de beneficiados, ultrapassando as metas 
iniciais. 
38 
 
 
 
 
ainda, a remoção de moradias localizadas em beiras de córregos e áreas de “riscos 
ambientais”. A lista de localidades a serem removidas é bem ampla e engloba 
praticamente quase toda a região metropolitana e algumas cidades do interior do 
estado35. 
No que se refere ao saneamento básico, uma parte será realizada pela FUNASA36, 
com investimentos de 36,7 milhões de reais e contemplará praticamente todos os 
municípios do Estado do Rio de Janeiro. Projetam-se melhorias sanitárias domiciliares, 
abastecimento de água, esgotamento sanitário, coleta de resíduos sólidos e saneamento 
em áreas de quilombolas localizadas no

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