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Centro Dia e Centro de Convivência para Idosos

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 
 
 
 
 
Beatrice Cavalcante Limoeiro 
 
 
 
 
 "Uma sociedade para todas as idades" 
Centro Dia e Centro de Convivência para idosos em Campo Grande (Rio de 
Janeiro) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro, 2014. 
 
 
 
 
 
 
Beatrice Cavalcante Limoeiro 
 
"Uma sociedade para todas as idades" 
Centro Dia e Centro de Convivência para idosos em Campo Grande (Rio de Janeiro) 
 
 
 
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Sociologia e Antropologia do Instituto de 
Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do 
Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à 
obtenção do título de mestra em Sociologia (com 
concentração em Antropologia). 
 
 
 
Orientadora: Profª. Dra. Mirian Goldenberg. 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
Maio de 2014. 
AGRADECIMENTOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Limoeiro, Beatrice Cavalcante. 
 “Uma sociedade para todas as idades”: Centro Dia e Centro 
de Convivência para idosos em Campo Grande (Rio de Janeiro). / 
Beatrice Cavalcante Limoeiro. Rio de Janeiro: UFRJ / IFCS, 2014. 
 xii, 160f.: il; 30 cm. 
 Orientadora: Profª. Dra. Mirian Goldenberg 
 Dissertação (Mestrado) – UFRJ: Instituto de Filosofia e 
Ciências Sociais / Programa de Pós-Graduação em Sociologia e 
Antropologia, 2014. 
Referências bibliográficas: f. 173-179 
1. Envelhecimento 2. Saúde 3. Prevenção 4. Lazer 5. Sociabilidade 6. 
Políticas públicas I. Goldenberg, Mirian. II. Universidade Federal do 
Rio de Janeiro, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Programa de 
Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia III. “Uma sociedade 
para todas as idades”: Centro Dia e Centro de Convivência para 
idosos em Campo Grande (Rio de Janeiro). 
AGRADECIMENTOS 
Todo conhecimento se desenvolve socialmente. Portanto, não poderia ter realizado 
esta dissertação sozinha. Existem muitas pessoas a quem devo agradecer pela colaboração, 
ajuda e apoio na realização desse trabalho. 
 Agradeço ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia - seu corpo 
docente, coordenação e secretaria - por ter me dado a oportunidade de ingressar no curso de 
mestrado, tornando possível a realização da pesquisa, minha participação em eventos 
acadêmicos e essa dissertação. 
 Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico pelo 
financiamento através da bolsa de pesquisa que teve vigência de dois anos. 
 Agradeço especialmente à minha orientadora, Professora Mirian Goldenberg, por 
quem tenho muito carinho e admiração. Mirian é uma inspiração como professora e 
pesquisadora, com quem tenho o privilégio de trabalhar desde o segundo período de minha 
graduação em Ciências Sociais. Sou profundamente grata pela sua orientação que vai além 
dos aspectos acadêmicos e burocráticos. Obrigada pelas conversas, conselhos, paciência, 
respeito e pelos incontáveis e-mails trocados nestes dois anos de mestrado. 
 Gostaria de agradecer aos professores Octavio Bonet e Andréa Moraes Alves pelas 
valiosas críticas e sugestões oferecidas por ocasião do exame de qualificação do projeto de 
mestrado. A contribuição de vocês foi fundamental para o recorte e direcionamento deste 
trabalho. 
 Aos professores Beatriz Heredia, Celi Scalon, Cesar Gordon, Jean François Véran, 
Marco Aurélio Santana, Maria Ligia de Oliveira Barbosa, docentes do PPGSA/UFRJ, e 
Antonio Carlos de Souza Lima, docente do Museu Nacional/UFRJ, pelas proveitosas 
discussões em sala de aula. 
 Aos meus professores de graduação em Ciências Sociais da UFRJ. Seus ensinamentos 
despertaram em mim a curiosidade e o gosto pela investigação social. Sou igualmente grata 
aos meus professores do ensino médio e fundamental, que me prepararam para a inserção na 
vida acadêmica. 
 Agradeço carinhosamente à minha família, pelo amor e apoio que tornaram possível 
alçar esta conquista do mestrado. Em especial, agradeço à minha mãe Denise Cavalcante, a 
quem sou eternamente e profundamente grata pelo amor incondicional que me ofereceu. 
Obrigada pelos seus ensinamentos e pelo seu constante e expressivo incentivo. Depois de 
todas as lutas que enfrentamos juntas, essa conquista é nossa. 
A meu pai Denilson Limoeiro e minha madrasta Mary Assumpção por terem 
acreditado em mim, mesmo sem nunca terem entendido exatamente o meu interesse pelas 
Ciências Sociais. Vocês me mostraram que o amor não questiona, ele aceita e apoia. Muito 
obrigada. 
 Aos meus irmãos queridos Denilson Limoeiro Junior e Denis Gabriel Limoeiro, pelo 
companheirismo, pelo carinho e até pelas brigas. Vocês são parte importante de mim. 
À minha avó Joaquina Limoeiro e aos meus tios, tias, primos e primas, pelo suporte, 
amor, carinho, compreensão e torcida. Em especial, sou grata aos meus padrinhos tia Alcinede 
Fassbender e tio Waldir Fassbender. 
Quero agradecer aos membros da equipe de pesquisa “Corpo, Envelhecimento e 
Felicidade” do Núcleo de Estudos de Sexualidade e Gênero. Agradeço especialmente à Olivia 
von der Weid pela coorientação no meu período de iniciação científica e pelo carinho, 
dedicação e comprometimento despendidos neste período. Agradeço também aos amigos e 
colegas de pesquisa: Fernanda Rougemont, que me atura com carinho desde o segundo 
período de graduação até os dias de hoje. Obrigada pela amizade, pelas trocas, discussões e 
viagens; Vinícius Paes de Azevedo e José Mauricio Octaviano, companheiros desde a 
graduação. Obrigada pelos momentos de alegria, amizade e risos que compartilhamos juntos. 
Agradeço ainda à Veronica Tomsic, Antonio Pilão e Thiago Soliva, pelas proveitosas 
e divertidas reuniões de pesquisa; à Ayra Garrido, Natalia Alves e Thaiza dos Santos, pela 
oportunidade de coorientá-las em suas pesquisas de iniciação científica. Eu aprendi muito 
com vocês. 
Agradeço aos valiosos amigos que tive a oportunidade de conhecer e conviver durante 
minha graduação no IFCS: Ianê Silveira, Marta Calvet, Denis Suzarte, Leonardo Menezes e 
Vinícius Azevedo. Amo a cada um de vocês de um jeito especial. Vocês tornaram o período 
da graduação mais leve, agradável e alegre. 
 Aos colegas da turma de mestrado, pelas discussões, apoio, dúvidas e incentivos 
trocados. Especialmente a David Maciel, Renata Lacerda, Renan Reis, Elisa Menezes, 
Cláudia Machado, Cláudia Pessi, João Junior, Luisa Pitanga, Barbara Goulart e Gabriela 
Kronemberger. 
 Às minhas amigas de ontem, hoje e sempre: Camila Dominice, Ravelly Machado e 
Samyra Costa. Obrigada pela compreensão e torcida. 
 Por fim, agradeço aos meus pesquisados, funcionários e usuários do Centro Dia e 
Centro de Convivência. Obrigada pelo acolhimento e pela recepção sempre calorosa e 
carinhosa. A colaboração de vocês foi fundamental para a realização desta pesquisa. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“30, pimba 
40, aguenta 
50, arrebenta 
60, senta 
70, tenta 
80, inventa! 
Aí, você pergunta ‘e 90?’, 
 Nas ventas!” 
- Usuária do Centro Dia e Centro de Convivência, 69 anos 
 
 
 
“Pois o tempo não perdoa. 
O tempo é que nos faz 
Todos iguais.” 
- Cara a cara, Nelson Gonçalves 
 
RESUMO 
LIMOEIRO, Beatrice Cavalcante. "Uma sociedade para todas as idades": Centro Dia e 
Centro de Convivência para idosos em Campo Grande (Rio de Janeiro). Rio de Janeiro, 
2014. Dissertação (Mestrado em Sociologia e Antropologia) – Instituto de Filosofia e 
Ciênciais Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro. 
A dissertação discute o tema da velhice e das políticas públicas voltadas para idosos, 
mais especificamente na área de saúde. O objeto investigado é um programa público 
denominado Centro Dia e Centro de Convivência, anexo ao Hospital Estadual Eduardo 
Rabello, localizado em Campo Grande, Rio de Janeiro. Neste programa, pessoas com 60 anos 
ou mais participam de atividades que tem por objetivo prevenir e promover a saúde dos 
mesmos,assim como estimular o lazer e a sociabilidade. O local reúne duas modalidades de 
centros para idosos: Centro Dia, para prevenção, promoção e cuidado da saúde de idosos 
fragilizados e dependentes funcionalmente; e Centro de Convivência, para sociabilidade e 
lazer de idosos independentes funcionalmente. 
O objetivo da pesquisa é compreender como a experiência de envelhecimento está 
sendo representada, gerida e vivenciada em um programa social do governo estadual do Rio 
de Janeiro. Para atingir este objetivo foi realizada pesquisa de campo no local no período 
entre fevereiro e agosto de 2013, quando foram feitas 31 entrevistas em profundidade com 
funcionários e usuários do programa. 
 Através desta pesquisa, foi possível perceber que coexistem variadas e contraditórias 
representações sobre o que é a velhice e o que ela deve ser no contexto do programa. O 
público alvo é, a princípio, entendido como necessitado, carente, frágil, decadente, solitário e 
depressivo. Acredita-se que os idosos, a partir da adoção de um conjunto de práticas 
transmitidas pelos profissionais da área da saúde, devem se tornar ativos, independentes e 
saudáveis. O programa se apresenta como uma alternativa de cuidado, prevenção e 
sociabilidade, uma maneira particular de se conceber a saúde, para além da biomedicina 
curativa. No entanto, é possível perceber que, embora o programa apresente inovações a 
respeito da saúde, bem estar e qualidade de vida para a pessoa idosa, a perspectiva biológica 
sobre a saúde acaba predominando. Além disto, existem divergências entre o que o idoso 
espera do programa e deseja fazer e aquilo que os profissionais consideram adequado para o 
mesmo, gerando conflitos e diferentes concepções sobre o que seria um bom envelhecimento. 
Palavras-chave: Envelhecimento; saúde; prevenção; lazer; sociabilidade; políticas públicas. 
ABSTRACT 
LIMOEIRO, Beatrice Cavalcante. “A society for all ages”: Day Centre and Community 
Centre for elderly people in Campo Grande (Rio de Janeiro). Rio de Janeiro, 2014. 
Dissertation (Master’s degree in Sociology and Anthropology) – Philosophy and Social 
Sciences Institute, Federal University of Rio de Janeiro. 
 
The dissertation discusses the theme of old age and public policies for elderly people, 
more specifically about health. The investigated object is a public program called Day Centre 
and Community Centre, annex to the Public Hospital Eduardo Rabello, situated in Campo 
Grande, Rio de Janeiro. In this program, people with 60 years old or more participate in 
activities that aim to prevent and promote their health and stimulate the leisure and sociability. 
The place brings together two types of Centre for elderly people: Day Centre, for prevention, 
promotion and care of the health of old-aged fragile and functionally dependent; and 
Community Centre, for sociability and leisure for functionally independent seniors. 
The objective of the research is to understand how the experience of aging is being 
represented, managed and lived in a social program of the Rio de Janeiro state government. In 
order to achieve this goal a field work was done in the local during the period between 
February 2013 and August 2013, when were made 31 interviews in depth with employees and 
program’s users. 
Through this research was possible to perceive that coexists diverse and contradictory 
representations about what is the old age and what it should be in the context of the program. 
The target audience is, at first, understood as needy, fragile, decadent, lonely and depressed. 
But it should be active, independent and healthy, thanks to the adoption of a set of practices 
transmitted by health professionals. The program presents itself as an alternative for care, 
prevention and sociability, a distinct way to conceive health, beyond the curative biomedicine. 
However, it is possible to perceive that, although the program presents innovations regarding 
health, wellness and quality of life for the elderly, the biological perspective about health 
predominates. Besides there are significant differences between what the senior expect of the 
program and want to do and what the professionals consider appropriate, engendering 
conflicts and different conceptions about what would be good aging. 
 
Keywords: Aging; health; prevention; leisure; sociability; public policies. 
 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 12 
1.1 O Campo ........................................................................................................................... 12 
1.2 As velhices e seus contextos ............................................................................................. 14 
1.3 Os objetivos ....................................................................................................................... 21 
1.4 Metodologia ...................................................................................................................... 23 
1.5 Justificativa ....................................................................................................................... 25 
1.6 Inserção no campo ............................................................................................................ 27 
1.7 Apresentação dos capítulos ............................................................................................... 32 
 
2 CAPÍTULO I - História e descrição: Centro Dia e Centro de Convivência ................ 35 
2.1 A região administrativa de Campo Grande ....................................................................... 35 
2.2 Descrição ........................................................................................................................... 36 
2.2.1 Público Alvo .................................................................................................................. 36 
2.2.2 Profissionais ................................................................................................................... 43 
2.2.3 O espaço ......................................................................................................................... 47 
2.2.4 As atividades .................................................................................................................. 52 
2.3 História - Centro Dia e Centro de Convivência ................................................................ 54 
2.3.1 O projeto: contexto, objetivos e justificativas ................................................................ 59 
2.3.1.1 A família como problema ........................................................................................... 63 
2.3.1.2 Cuidado, prevenção e sociabilidade como necessidades ............................................ 69 
 
3 CAPÍTULO II - Consensos e controvérsias: cotidiano, eventos, diferenças e 
semelhanças entre Centro Dia e Centro de Convivência ................................................... 74 
3.1 Heterogeneidades de velhices no Centro Dia e Centro de Convivência ........................... 74 
3.2 O ingresso no programa: inserção e moralidades ............................................................. 78 
3.3 Cotidiano Centro Dia e Centro de Convivência ................................................................ 83 
3.3.1 Atividades Centro Dia .................................................................................................... 86 
3.3.2 Atividades Centro de Convivência ................................................................................ 94 
3.3.3 Atividades comuns: refeições ...................................................................................... 102 
3.4 Eventos: Centro Dia e Centro de Convivência como “vitrine” ...................................... 105 
3.5 Conflitos, tensões e divergências entre funcionários: CentroDia ou Centro de 
Convivência? ......................................................................................................................... 111 
4 CAPÍTULO III - Saúde, cuidado, autonomia, bom envelhecimento e os usuários do 
Centro Dia e Centro de Convivência ................................................................................. 116 
4.1 Saúde e cuidado: direito ou favor? .................................................................................. 116 
4.1.1 O usuário sobre o cuidado: gratidão e reivindicação de direitos ................................. 119 
4.2 O uso do espaço e o conflito de saberes entre funcionários e usuários .......................... 126 
4.3 O que é envelhecer bem? ................................................................................................ 133 
4.3.1 Independente X Dependente ........................................................................................ 136 
4.3.2 Idoso X Velho .............................................................................................................. 139 
4.3.3 Usuário X Paciente ....................................................................................................... 143 
4.4 A agência do usuário e o que ele busca no serviço ......................................................... 145 
 
5 CAPÍTULO IV – Diferenças de gênero e a sexualidade dos usuários do Centro Dia e 
Centro de Convivência ........................................................................................................ 152 
5.1 Público e atividades: por que os homens são minoria? ................................................... 152 
5.2 Três perfis de homens usuários: o acompanhante, o que precisa e o músico ................. 156 
5.3 Moralidades e religiosidade: a sexualidade negada aos usuários ................................... 161 
 
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 166 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................. 173 
 
APÊNDICES ........................................................................................................................ 180 
 
ANEXOS .............................................................................................................................. 185 
 
 
 
 
 
 
 
12 
 
1 INTRODUÇÃO 
1.1 O Campo 
“Construir uma sociedade para todas as idades” foi o lema da II Assembleia Mundial 
sobre o Envelhecimento, promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), na cidade 
de Madrid, Espanha, em 2002. Tal reunião teve por objetivo discutir determinações, políticas 
e ações para a saúde, inclusão e bem estar da população idosa. O acontecimento deste evento 
se insere em um contexto mais amplo, em que o fenômeno do envelhecimento e a velhice 
passam a ser um problema social, uma preocupação, digna de ser discutida, pensada e de ter 
planos e metas elaborados visando soluções para tal questão. 
Mais distante, porém inserido no mesmo contexto amplo de uma atual preocupação 
científica e política com o envelhecimento, está o objeto de investigação desta pesquisa e foco 
desta dissertação: o Centro Dia e Centro de Convivência (CD/CC) para idosos do Hospital 
Estadual Eduardo Rabello (HEER), um hospital geriátrico, localizado em Campo Grande, 
Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Na parede da recepção do Centro Dia e 
Centro de Convivência, até novembro de 2012, antes de uma reforma pela qual passou o 
espaço, era possível visualizar a frase: “Construindo uma sociedade para todas as idades”, ao 
lado de uma placa que declarava a missão do hospital: “Promover a saúde do idoso de forma 
humanizada e com compromisso social”. A primeira frase, uma adaptação do título do plano 
de metas elaborado pela ONU, indica uma possível confluência de valores e ideais deste 
programa público para idosos com os problemas e riscos identificados a respeito do 
envelhecimento populacional e os objetivos e ações de saúde e condições de vida para esta 
população, destacando-se a tentativa de promoção da ideia de um “envelhecimento ativo”, 
elaborada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) também no ano de 2002. 
A fixação da frase neste lugar indica que o programa é uma tentativa de colocar em 
prática o que está previsto nas diversas políticas públicas que vêm sendo elaboradas sobre a 
velhice nas últimas décadas: a promoção e prevenção da saúde daqueles classificados como 
velhos, bem como daqueles que um dia irão envelhecer; ou até mesmo “envelhecer sem ficar 
velho” (ONU, 2002), isto é, sem vivenciar totalmente as mudanças físicas associadas a este 
período da vida, bem como seus estigmas. Através desta frase podemos ainda compreender a 
identificação do idoso como um indivíduo excluído socialmente, que perdeu seu prestígio 
e/ou funções sociais e que precisa ser reintegrado à sociedade. Por isso, a necessidade de um 
plano de ações que promova “uma sociedade para todas as idades”. 
 
13 
 
O objetivo central desta pesquisa consiste em compreender como a experiência de 
envelhecer está sendo representada, gerida e vivenciada em um programa social do governo 
estadual do Rio de Janeiro: o Centro Dia e Centro de Convivência do Hospital Estadual 
Eduardo Rabello. 
Neste programa, que funciona em um espaço anexo ao hospital, pessoas consideradas 
idosas, segundo as determinações da Política Nacional do Idoso
1
, frequentam e participam de 
diversas atividades (realizadas em grupo ou individualmente), de segunda à sexta, das 8 às 16 
horas. As atividades podem ser terapêuticas, de caráter de prevenção e esclarecimento sobre 
questões de saúde, e também com objetivo de lazer. As atividades são desenvolvidas por uma 
equipe multiprofissional, que conta com fisioterapeutas, massoterapeutas, terapeutas 
ocupacionais, psicólogos, gerontólogos, assistentes sociais, nutricionistas, educadores físicos 
e enfermeiros. Algumas atividades podem ainda ser propostas e coordenadas pelos próprios 
frequentadores e usuários deste espaço, como os grupos de artesanato e o grupo musical. 
O programa foi criado em 1998 e reúne duas modalidades de centros para idosos no 
mesmo lugar. O Centro Dia pressupõe um programa de atenção e cuidados diários aos seus 
usuários, uma alternativa de acompanhamento para idosos que possuem alguma fragilidade 
física ou mental, e que não podem mais permanecer sozinhos em suas casas
2
. Já o Centro de 
Convivência possui um caráter opcional, uma alternativa de lazer, aprendizado e 
sociabilidade. O Centro de Convivência seria destinado ao idoso que desejasse participar de 
alguma atividade, já o Centro Dia para aquele que precisasse de atenção e cuidados constantes 
com relação à sua saúde. 
Embora sejam formalmente duas propostas: Centro Dia e Centro de Convivência, não 
existe separação real de atividades ou usuários no local. As duas modalidades funcionam 
como um único programa, em um único lugar e até mesmo a classificação do usuário como 
Centro Dia ou Centro de Convivência se perde e/ou é desconhecida pela equipe de 
profissionais. No dia a dia o espaço é comumente referido como “Centro Dia”, uma forma 
mais prática e curta, mas que engloba as duas modalidades inseridas no mesmo local e 
programa. 
Uma terapeuta ocupacional de 58 anos que esteve presente desde o início do programa 
explica: 
 
1 Instituída pela Lei 8.842/94, regulamentada em 3/6/96 através do Decreto 1.948/96, classifica, para todos os 
efeitos, como idoso pessoas acima de 60 anos. 
2
 Na mídia este tipo de instituição ganhou, inclusive, a alcunha de “Creche do Vovô”, por ser um local em que 
idosos permanecem durante todo o dia, realizam refeições e outras atividades, enquanto seus familiares, a 
princípio responsáveis por seu cuidado, trabalham. Para saber mais,acesse: 
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/1146999-creche-agora-tambem-e-lugar-de-vovo-passar-o-dia.shtml 
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/1146999-creche-agora-tambem-e-lugar-de-vovo-passar-o-dia.shtml
14 
 
“A gente recebia na inclusão qualquer idoso com mais de 60 anos, chegava, fazia 
sua inscrição e era inserido no Centro Dia. Porque Centro Dia e Convivência, aqui a 
gente não inscreve você só para, assim, para convivência. No Centro Dia é que vem 
a convivência. Porque muitos de Centro Dia passam a ser Convivência. E muitos da 
Convivência, né? Estes que entraram só para Convivência, passam a ser Centro Dia. 
É, porque Centro Dia é para idoso mais debilitado, precisa de mais atenção da 
equipe, né? Por isso que a gente tem a nossa equipe multidisciplinar aqui.” 
 
Além das atividades terapêuticas, preventivas ou de lazer, os usuários recebem 
cuidados médicos da equipe de enfermagem, como medida de pressão, teste de glicose e três 
refeições diárias: café da manhã, almoço e lanche. 
 
 
1.2 As velhices e seus contextos 
Cada sociedade, em determinado momento, elabora seu próprio corpo de problemas 
sociais legítimos, dignos de serem discutidos, públicos, oficializados e, por vezes, garantidos 
pelo Estado. A velhice é um destes “problemas” legítimos atualmente na sociedade brasileira, 
vide as tentativas governamentais em delimitar e atender o que seriam demandas daqueles que 
vivem esta realidade socialmente construída. Remi Lenoir (1998) explica o processo pelo qual 
a velhice passa de um problema individual ou do âmbito familiar para se tornar uma questão 
pública, um problema social das sociedades ocidentais, a partir do final do Século XIX. Um 
dos argumentos do autor é que o que é constituído como problema social varia segundo as 
épocas e as regiões e pode até mesmo chegar a desaparecer como tal. 
Simone de Beauvoir em A Velhice (1970) faz uma denúncia sobre como a velhice e o 
velho não eram problemas sociais e não faziam parte das agendas políticas. Muito pelo 
contrário, a autora narra um período das sociedades ocidentais em que falar sobre o 
envelhecimento era um tabu e o velho ou idoso era alvo de estigmas associados a imagens 
negativas, como: decadência, inutilidade, improdutividade, feiura, pobreza e doença. 
Tal mudança de imagens associadas à velhice nas sociedades ocidentais: em um 
primeiro momento estigmatizada, evitada, silenciada, privada, em um outro, alvo de atenção 
da sociedade, mídia e governos, evidencia a dimensão social e cultural do fenômeno do 
envelhecimento. As diferentes formas como o envelhecimento e os velhos serão 
compreendidos, tratados e representados em diferentes sociedades, épocas e contextos deixa 
claro como a questão vai além da dimensão biológica, cronológica, demográfica e econômica. 
A velhice também não é um processo homogêneo e não constitui um grupo identitário, pois 
15 
 
existem múltiplos significados para o envelhecimento (ALVES; LINS DE BARROS, 2012, p. 
32), e este depende também da posição de classe social, renda, localidade e gênero. 
Dirceu Nogueira Magalhães (1987) afirma que, considerando uma perspectiva 
histórica, o velho ou o idoso, como uma etapa da vida, é uma invenção social, semelhante à 
criação da infância, fruto da revolução burguesa e industrial (ARIÈS, 1980 apud 
MAGALHÃES, 1987). 
Myriam Moraes Lins de Barros (2011), ao analisar a trajetória da pesquisa 
antropológica sobre envelhecimento, identifica que o envelhecimento tem significados 
distintos em diferentes culturas e contextos históricos e sociais. Na sociedade ocidental 
contemporânea a autora identifica nas idades etapas que definem estilos de vida, delimitando 
fronteiras entre indivíduos e segmentos sociais, classificações etárias e garantindo ou não o 
direto a determinado benefício. Como no caso específico deste estudo, em que é preciso ter 60 
anos ou mais para usufruir dos serviços oferecidos no espaço, e, portanto, estar legalmente 
enquadrado na categoria “idoso”. 
Pierre Bourdieu (1983a) analisa a arbitrariedade das categorias juventude e velhice, 
que não estariam atreladas somente à idade cronológica, e sim obedeceriam a uma 
representação construída socialmente. Guita Grin Debert (2006) mostra que o recorte de 
idades e a definição de práticas legítimas associadas a cada etapa da vida são construções 
culturais e mudam historicamente. Estas categorias são constitutivas de realidades sociais 
específicas, estabelecem direitos e deveres diferenciados e definem relações entre gerações, 
transformando as idades em mecanismos privilegiados para a criação de atores políticos. 
Dirceu Nogueira Magalhães (1987) diz ainda que para compreender o idoso no Brasil 
é preciso entender como determinantes macro e microssociais agem de forma combinada, e, 
por vezes, contraditórias e conflitivas que delineiam as realidades vividas por esta população 
em diferentes contextos e lugares. Por isso, é também importante nesta investigação entender 
que contexto histórico é este em que faz sentido pensar em direitos, benefícios e/ou 
privilégios específicos, além de políticas sociais e programas para pessoas consideradas 
velhas ou idosas. 
Dirceu Nogueira Magalhães (1987) e Remi Lenoir (1998) escrevem como a questão 
social e pública da velhice surge através das classes trabalhadoras, dos operários, em meados 
do século XIX, associada à invalidez e incapacidade de produção em um contexto de 
expansão e desenvolvimento do modo de produção capitalista. 
Remi Lenoir mostra ainda como a velhice será reconhecida e legitimada como 
problema social, através de uma formulação pública de atores e/ou especialistas que 
16 
 
encontram no tema uma causa a ser defendida e criam uma nova definição da velhice, uma 
nova imagem para esta, agora não mais negativada e invalidada, mas uma nova maneira, 
repleta de possibilidades de ser velho (ou, no caso, de nunca chegar a sê-lo no sentido 
pejorativo e estigmatizado da palavra). 
Neste contexto surgem as ciências especializadas para delimitar e lidar com a velhice e 
o envelhecimento, sendo a mais significativa neste caso a gerontologia, filha da geriatria, que, 
no entanto, vai considerar outros aspectos (sociais, culturais, psicológicos, dentre outros) além 
dos biológicos, para compreender o fenômeno, evidenciá-lo publicamente como um 
problema, criar soluções para evitá-lo e minimizar o estigma. 
Guita Grin Debert (1996) mostra que a gerontologia, campo de estudo sobre o 
envelhecimento, contribuiu para a constituição do idoso como um problema social e se 
empenhou na sensibilização da sociedade para os dramas do envelhecimento. A autora afirma 
que é difícil saber ao certo em que medida o discurso de especialistas pode influenciar um 
conjunto de práticas sociais e em que medida o discurso gerontológico influenciou as políticas 
voltadas para essa população. No entanto, pode-se perceber que, desde os anos 1980, as 
questões relacionadas à velhice ocupam cada vez mais espaço entre os temas que preocupam 
as sociedades ocidentais, inclusive a brasileira. 
A legitimidade do problema só será efetivada ou consagrada a partir do momento em 
que este for identificado e formulado pelas especialidades científicas e assumido pelo Estado, 
assim como argumenta Remi Lenoir. É o Estado a instituição de poder que, através de seus 
agentes e das suas diversas formas de atuar, irá buscar atender soluções, promover 
regulamentações, direitos, políticas e tecnologias para lidar com o novo problema. 
Políticas públicas, bem como novos focos de ação, são exemplos de como o Estado (e 
seus agentes) muda, ao longo do tempo, suas formas de se fazer, de moldar subjetividades, e 
de se colocar em prática. É preciso pensar no Estado como um processo, e não apenas como 
uma entidade que determina objetivos, leis e legítima a ordem de forma autônoma e neutra. O 
Estado é uma instituição que se consolida e se forma de maneira processual,através de 
práticas, dinâmicas, conflitos e demandas sociais, e, por isso, não está isento da dimensão 
cultural e contextual da vida humana (ABRAMS, 1988). 
Norberto Bobbio (1992) analisa a tendência à especificação dos direitos nos últimos 
tempos, com relação às peculiaridades de gênero e de fases de vida nas sociedades ocidentais 
e de criação de políticas públicas específicas para estas mesmas fases, isto é, um plano de 
ações para guiar decisões e ações. É possível interpretar esta tendência dos Estados ocidentais 
17 
 
como uma tentativa de incluir e diminuir estas diferenças e regularizar e disciplinar 
sociedades. 
Neste exercício de amenizar diferenças e especificar direitos, acaba-se - 
paradoxalmente - criando determinadas classificações, divisões e representações coletivas 
sobre classes, gêneros, idades, etnias, dentre outros, que influenciam na formação também de 
identidades individuais e representações coletivas. 
Abraam de Swaan (1988) reconstrói a história do surgimento de um estado de bem 
estar social dos governos ocidentais, em que as tecnologias de governo passam a focar na 
coletivização de bens, como seguridade social, educação, saúde e bem estar. O autor revela 
como este tipo de política, considerada como “cuidado” vai passar da caridade privada ao 
projeto político dos governos. O idioma que antes era da religião passará a ser da consciência 
social. Este projeto vai demandar o que o autor chama de protoprofissionalização, que seria o 
surgimento de carreiras extremamente especializadas, que identificam um problema social e 
propõem soluções que respondam às demandas de grupos também específicos. 
Quando determinados benefícios são colocados em prática e, mais ainda, quando 
impõem algum padrão de comportamento, o que, segundo Abraam de Swaan acontecerá 
frequentemente quando se trabalha com essa lógica de bem estar social, os funcionários, 
agentes estatais estarão envolvidos também no sentido de reformar os assistidos, ajudando-os 
a conseguir algum benefício, como qualidade de vida, por exemplo – categoria muito utilizada 
quando se fala em políticas para idosos – e ainda lutando e advogando por seus direitos. 
Michel Foucault (2008) demonstra que com o surgimento da cidade e também de uma 
multiplicidade de indivíduos foi preciso que este Estado desenvolvesse determinada técnica 
de governo para governar e centralizar populações. Um bom exemplo deste controle de 
populações será o uso da técnica estatística para analisar, disciplinar, conformar, compreender 
populações, apesar de sua multiplicidade. Neste caso, é impossível não pensar no caso 
brasileiro, quando mídia e governo propagam a todo o momento, baseados em dados 
estatísticos – o mais utilizado parece ser o censo realizado pelo Instituto Brasileiro de 
Geografia e Estatística (IBGE) – sobre o aumento da população com 60 anos ou mais
3
. Tal 
 
3
 De acordo com o último censo, realizado em 2010 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o 
crescimento da população brasileira, se comparado ao ano 2000, foi de 12,3%. Eduardo Pereira Nunes, 
presidente do IBGE, mostra que a base da pirâmide etária no Brasil está se estreitando e o topo se alargando: 
“Em 2000, a pirâmide ia até os 80 anos de idade, agora tivemos que esticá-la até os 100 anos”, o que 
representaria a transição demográfica pela qual está passando o país, onde a população envelhece e a taxa de 
natalidade diminui. Tendência que o Brasil acompanha outros países ocidentais. Hoje, no Brasil, há cerca de 19 
milhões de brasileiros com 60 anos ou mais, o que corresponde a mais de 10% da população. 
 
18 
 
dado parece ser acionado e manejado de forma a justificar a criação de direitos, políticas e 
programas, que, ainda que sob forma de discurso, pretende atender e sanar demandas 
específicas desta população. 
 Assim, foi preciso também capilarizar os poderes, criar pequenas instâncias, pequenas 
esferas representativas do poder estatal. Isto é o que o autor chama de governamentalidade, 
um conjunto constituído por instituições, procedimentos, análises e reflexões, que permite um 
exercício específico de poder sobre as populações. Para Michel Foucault estas próprias 
técnicas de governo e condução produzem um efeito de verdade. Sendo assim, é preciso 
analisar e descrever minuciosamente cada técnica, cada esfera de poder para compreender a 
sua lógica, quais valores estão embutidos nestas práticas. 
Para o autor a razão de Estado vai trabalhar sob a forma de pastorado, uma herança 
cristã, analogia feita pelo autor sobre a forma como se deve conduzir o rebanho (ou a 
população). Ideia semelhante a de Abraam de Swaan quando fala da passagem da caridade à 
consciência social. Desta forma, trabalha-se com a ideia de cuidado, caridade, considerando 
as ovelhas (aqueles que não fazem parte do grupo vencedor dos conflitos e batalhas do 
processo de formação do Estado) como desprotegidas, desguarnecidas. E que, portanto, 
precisam do cuidado, controle, convencimento, vigilância e condução daqueles que estão no 
comando do Estado. Michel Foucault vai nomear esta realidade de governo das almas - o 
governo sobre homens, sobre a multiplicidade destes, mais do que sobre territórios. 
É possível pensar em políticas públicas e programas para idosos sob esta chave, do 
cuidado, da condução das condutas (pastorado), tecnologia do trato humano, da 
representação? É possível falar em representação ou participação neste caso? Quais são as 
normatividades - de como deve ou não se comportar o idoso, por exemplo - que acabam sendo 
produzidas quando o Estado, seus agentes e suas pequenas instâncias entram em ação? Como 
os indivíduos idosos vivenciam e interpretam suas experiências ao fazer parte destas ações 
públicas? Será que podemos pensar apenas em condução de condutas ou podemos identificar 
espaços de “fuga”, reinvenção e reapropriação deste controle governamental e científico? 
Como marcos internacionais da consolidação da velhice como um problema social, 
podemos citar: a I Assembleia Mundial sobre o envelhecimento, promovida pela ONU, 
ocorrida em Viena, em 1982; a II Assembleia Mundial sobre o envelhecimento, realizada em 
Madrid, 2002; e o plano de ações da OMS: “Envelhecimento ativo: uma política de saúde”, 
publicado no mesmo ano, na Assembleia de Madrid. A principal diferença entre as duas 
assembleias se expressa nas mudanças de representação sobre a velhice. No primeiro 
momento a velhice é considerada pelo aspecto das necessidades (de saúde, habitação, renda, 
19 
 
segurança, bem-estar, educação). No segundo, o envelhecimento passa a ser entendido e 
planejado sob a chave da importância de ter um “envelhecimento ativo”, o que segundo Guita 
Grin Debert (1999) apontaria para uma reprivatização da velhice, isto é, seria um processo de 
responsabilização do indivíduo com relação aos seus autocuidados (ou a falta destes), sobre o 
sucesso ou fracasso de seu envelhecimento. 
Se no primeiro momento do surgimento da velhice como um problema social ela 
aparece como alvo de caridade, uma fase de vida repleta de necessidades a serem sanadas 
pelo Estado e sociedade, em um segundo momento esta visão vai se transformando e vai se 
retirando do Estado a responsabilidade sobre as “mazelas” da velhice e colocando-a no 
indivíduo. A partir deste momento, o Estado passa a se empenhar não apenas em solucionar 
os problemas associados à velhice, mas em educar e disciplinar o indivíduo para que seja 
independente dos cuidados do Estado, e, desta forma, seja também menos dispendioso para o 
mesmo. 
Neste contexto, o indivíduo é responsável pelo seu envelhecimento, que deverá ser 
ativo, produtivo e saudável. É preciso que se mude a ideia da velhice como um momento de 
limitações, para que este seja visto positivamente pelo indivíduo. Assim, ele poderá viver o 
que se considera um “envelhecimentoativo”, isto é, tornando-se o principal responsável pelo 
“sucesso” desta etapa de sua vida, o que, neste caso, significa permanecer saudável, ocupado 
e não aparentar ter envelhecido. 
No Brasil, país signatário do Plano Internacional para o Envelhecimento, documento 
produzido na Assembleia de Viena, além das outras determinações da ONU, temos como 
marcos: a introdução da seguridade social como direitos na Constituição de 1988 (“A 
constituição cidadã”), consolidando assim o papel do Estado como um dos responsáveis pela 
questão do envelhecimento da população; no ano de 1994 temos a Política Nacional do Idoso 
(Lei 8.842), que estabelece que “o idoso é um sujeito de direitos e deve ser atendido de 
maneira diferenciada em cada uma das suas necessidades: físicas, sociais, econômicas e 
políticas”; em 1999 promulga-se a Política Nacional de Saúde do Idoso (Portaria 1.395/GM), 
com diretrizes no sentido de prevenção, promoção de saúde e atendimento multidisciplinar 
para esta população
4
; e mais recentemente temos o Estatuto do Idoso, criado em 2003
5
. 
 
4 Em 2006 essa política foi reeditada e atualizada, pela Portaria Nº 2.528 de 19 de outubro de 2006, que revoga a 
Portaria nº 1.395/GM, de 10 de dezembro de 1999. A principal mudança em relação aos dois documentos se dá 
pelas novas diretrizes, que visam promover um “envelhecimento ativo e saudável” e uma “atenção integral em 
relação à saúde”. 
5 Para saber mais sobre os marcos de legitimação estatal do envelhecimento como um problema social, consulte: 
CAMARANO, Ana Amélia; PASINATO Maria Tereza. “O envelhecimento populacional na agenda das 
20 
 
 No estado e cidade do Rio de Janeiro, a capital brasileira que possui maior proporção 
de população de idosos do Brasil atualmente
6
, foram criadas duas secretarias para lidar e 
promover ações a respeito do envelhecimento. Em 2009 foi criada, na prefeitura, a Secretaria 
Especial de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida (SESQV). Dentre os seus 
principais projetos destacam-se as Academias da Terceira Idade (ATI’s) nas praças públicas, 
as seis Casas de Convivência e Lazer e os dezesseis Lares dos Idosos espalhados pela cidade 
do Rio de Janeiro. Em 2013 foi fundada a Secretaria Estadual de Envelhecimento Saudável e 
Qualidade de Vida, que incorporou como um de seus projetos o Centro Dia e Centro de 
Convivência, a princípio ligado à Secretaria Estadual de Saúde. 
 Algumas destas Casas de Convivência e Lar do Idoso já funcionavam anteriormente à 
criação da secretaria municipal hoje responsável por elas, em postos de saúde da prefeitura. 
Estes programas têm uma grande semelhança com o Centro Dia e Centro de Convivência 
tratado aqui nesta dissertação, inclusive no tipo de atividades e eventos promovidos. No 
entanto, a diferença se manifesta pela ausência da modalidade Centro Dia nos programas da 
prefeitura. Não são lugares de atenção diária ou que sirvam refeições para que os idosos 
possam permanecer ao longo do dia. Para alguns funcionários e usuários do Centro Dia e 
Centro de Convivência (que já participaram destes programas da prefeitura) a ausência de 
uma estrutura que possa receber e cuidar de idosos durante o período diário, parece fazer toda 
a diferença: 
 
“Aqui ainda é um dos poucos lugares que existem na cidade, no estado é o único. O 
município consegue montar alguma coisinha a nível de posto de saúde, mas são 
projetos menores, mais simples. Mas, com essa grandiosidade, eu acho que é o único 
lugar... A população idosa está cada vez maior, a qualidade de vida está aumentando 
a idade de sobrevivência. E o envelhecimento é igual para todos, né? E a tendência 
está cada vez mais... No Centro Dia você vê até pessoas jovens, de 50, 60 anos, com 
mal de Alzheimer, com mal de Parkinson, com outras doenças degenerativas. E... a 
gente tem que ter a porta para acolher essa clientela.” (Terapeuta ocupacional, 44 
anos); 
 
“É porque aqui tem o Centro Dia e o Centro de Convivência. Porque Centro de 
Convivência tem aquele de Padre Miguel, tem o Padre Fregni, tem... aí, na 
aeronáutica tem, no Campo dos Afonsos. Entendeu? Só que aqui, a diferença é que 
aqui eles têm uma alimentação: café, almoço e lanche. Têm as atividades, entendeu? 
Para interagir e se integrar. E já nesses que eu citei, são dois turnos. Então, eles 
levam a comida deles de casa.” (Enfermeira, 59 anos); 
 
 
políticas publicas.” In: CAMARANO, Ana Amélia (org). Novos idosos brasileiros. Muito além dos 60? Rio de 
Janeiro. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 2004. p. 253-292. 
6 Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada em 2012 e publicada em 2013 
pelo IBGE, 11,4% da população da região metropolitana do Rio de Janeiro é formada por pessoas com mais de 
60 anos. Essa proporção é a maior do país. 
21 
 
“Olha, eu era do... lá do Comari, um posto de saúde que tem no Comari. Agora não 
está mais dentro do posto de saúde, não, está na praça. E ela [outra usuária] pegou, 
me convidou. Porque ela veio para cá e viu todo mundo trabalhando. Que lá ela 
ensinava a fazer flores de meia, e eu aprendi com ela lá. Mas, só fazia isso. Aí, ela 
virou: ‘Não, não. Tu quer aprender mais? Vai lá pro Centro Dia, que lá tu vai 
aprender o que tu quer e o que tu não quer. Que ir lá? Vai lá visitar’. Aí, eu peguei e 
vim. Com uma outra que é daqui também, que era de lá. Aí vim no primeiro dia para 
visitar e já fiquei. Gostei e fiquei. Aí, nem fui mais lá. Fiquei aqui.” (Usuária, 81 
anos). 
 
Podemos perceber nestes depoimentos que a existência de um lugar em que o idoso 
possa receber atenção e cuidados diários é valorizada, ainda que se fale de um idoso 
dependente (Centro Dia) ou independente funcionalmente (Centro de Convivência). A 
segurança de ter um espaço de convivência e aprendizado integral parece ser o elemento que 
torna o Centro Dia e Centro de Convivência especial. 
 
 
1.3 Os objetivos 
O objetivo desta pesquisa é compreender, através do cotidiano e funcionamento do 
local, como o envelhecimento está sendo interpretado, lidado e experimentado por 
funcionários e usuários do Centro Dia e Centro de Convivência. Como afirmou Erving 
Goffman (2003, p. 16): “toda instituição conquista parte do tempo e do interesse de seus 
participantes e lhes dá algo de um mundo; em resumo, toda instituição tem tendências de 
‘fechamento’”. Ainda que não estejamos tratando de uma instituição total no sentido estrito 
do termo, tratamos de indivíduos institucionalizados em parte, que vivenciam, durante boa 
parte do seu dia, as regras, os valores e as relações (por vezes conflituosas e hierárquicas) 
travadas neste local destinado a cuidar de pessoas com 60 anos ou mais. 
Neste sentido, faz-se necessário compreender a história da criação do Centro Dia e 
Centro de Convivência. Por quem foi pensado e criado? Sob quais justificativas, discursos e 
possíveis interesses? Quais são os atores sociais envolvidos neste processo de delimitação do 
que seria uma demanda dessa população? Quais valores sobre o processo de envelhecimento e 
sobre saúde estariam sendo utilizados no momento de concepção e percepção da necessidade 
da criação de um espaço como este? 
Através da observação das práticas realizadas neste espaço e dos discursos, pretendo 
também compreender como se opera a representação
7
 do idoso. Como estes gestores e 
 
7 Representação social é entendida aqui como um tipo ideal weberiano do imaginário coletivo “que envolve o 
discursivo, mas também elementos não-discursivos, o dito e não-dito que se articulam nos dispositivos ou 
22 
 
funcionários do Estado, no exercício de suas funções e emseus discursos, representam e 
gerem os indivíduos idosos que utilizam o espaço? Quem são estes gestores e funcionários, o 
que pensam a respeito do que é a velhice, saúde para a mesma e sobre funcionamento do 
Centro, das atividades realizadas no local? Como é o cotidiano do local? Como se dão as 
relações entre funcionários e entre funcionários e usuários? Quais as possíveis disputas de 
poder, conhecimento e legitimidade que estão em jogo no local? 
É importante também pensar sobre a escolha do tipo de atividades que são propostas 
no local voltadas para estes indivíduos. Neste caso, é preciso trazer à tona a pergunta sugerida 
por Howard Becker (1997) em “Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais”: por que as coisas 
são feitas de uma certa maneira e não de outra? Por que certas atividades e não outras? Que 
valores sobre como deve se comportar ou sobre o que é melhor para o idoso estão presentes 
nas realizações destas atividades? 
Podemos perceber que existe uma linguagem específica quando se trata do governo 
desta população, na utilização de termos como: atividade, exercícios físicos, saúde, ocupação 
e lazer. Como esta linguagem específica é utilizada no Centro Dia e Centro de Convivência? 
E em que medida esta acaba por regular e delimitar como deve ser e como deve se comportar 
os indivíduos com mais de 60 anos, classificados como idosos, moldando e/ou influenciando 
de alguma forma o seu cotidiano, comportamento e vivência da velhice e sua subjetividade? 
Em que medida estes idosos aceitam e incorporam estas palavras de ordem e disciplinarização 
ou reinventam e subvertem os mesmos? 
Outro objetivo aqui proposto é compreender quem são os indivíduos que utilizam este 
espaço. Quais são suas motivações para frequentar o local, como representam a própria 
experiência, como são suas participações nas atividades e que tipo de sociabilidade existe no 
local? Em que mundo moral local (NATIONS, 2007) estão inseridos? Pretendo compreender 
se a participação em um programa estatal, elaborado e pensado por gestores públicos, 
influencia ou não o cotidiano destes indivíduos enquadrados na categoria de idosos. 
Nesta pesquisa busquei também compreender as diferenças de gênero entre os 
usuários do local. Como homens e mulheres utilizam este espaço? Ambos os gêneros 
vivenciam a experiência no local de forma semelhante? Existe diferença de motivações para 
estar no programa entre homens e mulheres? 
 
aparatos que, para Michel Foucault, por exemplo, constituem um corpo social como conjunto heterogêneo – 
discurso, instituições, formas artísticas, regulamentos repressivos, medidas administrativas, elaborações 
científicas, proposições morais ou filosóficas, etc”. (CARDOSO, 2000 apud JUNQUEIRA, 2005. p. 146). 
23 
 
É importante enfatizar que o uso da categoria idoso neste trabalho se justifica pelo uso 
nativo. Ao longo do período do trabalho de campo, escolhi adotar a categoria nativa: “idoso”, 
por compreender que não faria sentido utilizar o termo “velho”, por exemplo, no contexto 
específico do Centro Dia e Centro de Convivência, mesmo entendendo que o termo “idoso” 
pode ser utilizado como um eufemismo, uma forma de mascarar um lado não valorizado do 
envelhecimento. Neste lugar, onde se pretende estimular características e atitudes de 
independência, autocuidado, atividade, o uso da categoria “velho” é - veladamente - proibido, 
um tabu. No Centro Dia e Centro de Convivência ninguém será chamado de “velho”, a não 
ser como termo de acusação. 
Sabe-se que o uso da categoria “idoso” não se dá por acaso, nem neste local, nem em 
outros espaços que objetivam transmitir uma nova visão sobre o processo de envelhecimento. 
A categoria surge como esforço de movimentos políticos, áreas especializadas de 
conhecimento, e entidades públicas e privadas, comprometidos em mudar a representação 
social negativa sobre a velhice, como afirma Júlio Simões (2006). Afinal, se a velhice já foi 
tabu, assunto proibido e desagradável, como analisou Simone de Beauvoir (1970), hoje passa 
a ter nova visibilidade e interpretações, um momento alvo de novas possibilidades e 
preocupações. No entanto, se o momento da velhice não é mais tabu neste novo contexto, 
certamente a categoria “velho” está cercada de preconceitos: 
 
“Só isso que eu digo pro pessoal: ‘Velho é trapo. Velho é meu passado’. Porque 
uma psicóloga mesmo falou pra mim: ‘a senhora nunca deixa dizer assim: a senhora 
é velha. Velho é trapo. Velho é troço que a gente joga fora. A senhora não está 
sendo jogada fora. A senhora está sendo bem tratada. Ó, a senhora está limpinha, 
está arrumadinha. A senhora é idosa. Não é velha. A senhora é idosa. Nunca deixe 
chamar a senhora de velha’. Aí, quando os outros falam: ‘ah, aquela velha...’; ‘ei, 
menina, não sou velha, não! Eu sou idosa.’” (Usuária, 67 anos; grifos meus). 
 
 Portanto, caso eu utilizasse o termo “velho”, como uma posição política ou até mesmo 
por entender que o termo “idoso” é um eufemismo, não estaria utilizando uma importante 
categoria nativa, do contexto e da realidade do Centro Dia e Centro de Convivência aqui 
estudado. 
 
 
1.4 Metodologia 
Busquei analisar as questões propostas por meio do trabalho de campo que teve início 
em fevereiro de 2013 e término em agosto de 2013, totalizando sete meses frequentando o 
24 
 
local de duas a três vezes por semana, permanecendo desde o início até o encerramento do 
funcionamento. 
Observei a rotina praticada, participei das atividades propostas, conversei com 
usuários e funcionários (tanto técnicos, quanto administrativos) e realizei trinta e uma 
entrevistas
8
 em profundidade (com perguntas abertas e duração aproximada de uma hora) com 
os pesquisados que concordaram em participar da pesquisa
9
. Ao total foram vinte e uma 
entrevistas com usuários (cinco homens e dezesseis mulheres) e dez com funcionários (um 
homem e nove mulheres). De maneira geral, escolhi meus entrevistados primeiramente pela 
posição ocupada no espaço. Alguns pesquisados se mostraram informantes fundamentais, 
como, por exemplo: funcionários que estiveram presentes na fundação do programa, 
funcionários que realizavam atividades semanais com usuários, usuários em posição de 
liderança ou destaque no lugar bem como alguns que demonstraram vontade ou necessidade 
de conversar sobre a vivência no local. 
Registrei também em meu caderno de campo as informações sobre o funcionamento 
cotidiano, práticas e comportamento, que pude ter acesso ou captar durante a pesquisa no 
campo, com o objetivo de evitar o pensamento convencional (BECKER, 2007), isto é, não 
naturalizar ou imaginar já conhecer todas as respostas para as questões levantadas na 
pesquisa. 
O tempo do trabalho de campo deixa evidentes as limitações da pesquisa. É impossível 
analisar “tudo”, não se pode “colher a vida de todo mundo, pois se o fizéssemos nos 
afogaríamos nos detalhes de todas as vidas. Um afogamento conceitual, e não mecânico” 
(BECKER, 2007, p. 105). Não se pode afirmar que este trabalho corresponderá à total 
realidade do programa, pois para a escrita desta dissertação foi feita uma escolha de questões 
que poderiam render uma profícua discursão - ou, de acordo com Howard Becker (2007, p. 
119), “aquele caso que provavelmente perturbará seu pensamento” -, além dos dados e 
questões levantadas serem datadas, limitadas e interpretadas. Não se pode esperar também 
que o objeto, as representações e os comportamentos de nossos pesquisados sejam estáticos. 
Howard Becker (2007, p. 105) ainda acrescenta: “toda definição global de um campo cria 
uma tarefa impraticável”. 
 
8
 Os roteiros das entrevistas estão em anexo. Os roteiros contêm perguntas norteadoras,mas o rumo e temas das 
entrevistas variaram conforme os dados fornecidos (antes ou durante a entrevista) pelos pesquisados. 
9 Como uma exigência da direção do hospital, antes da realização das entrevistas os pesquisados assinaram um 
termo de consentimento livre e esclarecido, concordando com a participação na pesquisa. O modelo do termo se 
encontra em anexo. 
25 
 
As entrevistas tiveram como foco as atividades e rotina do Centro Dia e Centro de 
Convivência, bem como, no caso dos usuários, as motivações e justificativas para frequentar o 
local, percepções e opiniões a respeito dos serviços e relações que têm lugar no mesmo. No 
caso dos funcionários, o foco foi o diagnóstico de necessidades e demandas encontradas 
através do exercício de suas práticas profissionais e formas específicas de lidar com esta 
população, seja através das atividades propostas ou qualquer outro tipo de abordagem. 
Para ambos, funcionários e usuários, as perguntas versaram sobre as representações da 
velhice e suas respectivas categorias, como “velho” e “idoso”, por exemplo, e sobre possíveis 
diferenças de gênero na velhice. 
Em entrevistas com alguns funcionários e gestores procurei também investigar a 
história e contexto de criação do espaço. Entrevistei e conversei com aqueles que conceberam 
o Centro Dia e Centro de Convivência, procurando entender suas motivações e valores. 
Também analisei o documento que oficializa a criação do espaço: o projeto “Centro Dia e 
Centro de Convivência para idosos no Hospital Eduardo Rabello”, elaborado em 2005 por 
duas assistentes sociais que criaram o programa e foram as pioneiras na direção e 
coordenação do lugar. 
 
 
1.5 Justificativa 
Estudar a velhice é uma possibilidade privilegiada de compreender como a sociedade 
classifica, divide, categoriza e normatiza a vida, o cotidiano, e as práticas de seus indivíduos, 
como destaca Guita Grin Debert (1999). Pensar sobre o papel do Estado no que diz respeito às 
ações voltadas para esta população é fundamental, já que este se apresenta historicamente 
como uma importante instituição que governa não apenas territórios, nações, mas as pessoas, 
moldando e influenciando suas identidades, subjetividades e comportamentos (FOUCAULT, 
2008). 
O Estado exerce poder e influência no momento em que delimita e classifica quem é 
velho, o que é ser velho e como este deve ser, quando estabelece direitos, políticas e ações 
diferenciadas para pessoas que têm mais de 60 anos, por exemplo. 
Entender as diferentes “velhices”, isto é, as diferentes representações e estilos de vida 
que se apresentam como possibilidades ou, por vezes, como normatividades para os velhos ou 
idosos é fundamental para compreender que lugar estas pessoas ocupam em nossa sociedade. 
Mais especificamente, este estudo busca levantar questões sobre o lugar do idoso na cidade do 
26 
 
Rio de Janeiro, a partir do caso específico do Centro Dia e Centro de Convivência, localizado 
na Zona Oeste da cidade. 
A escolha deste Centro Dia e Centro de Convivência se justifica pela possibilidade de 
observar a aplicação e o funcionamento cotidiano de um programa para idosos. Assim, 
observando as práticas e relações neste local entre idosos e gestores públicos acredito ser 
possível compreender o que os idosos pensam a respeito deste programa, a forma como 
incorporam e se apropriam deste serviço e como o convívio neste espaço pode influenciar 
suas vidas e comportamentos e possibilitar o acesso à informação e direitos. 
O local também se mostra interessante, pois conjuga variados conceitos e concepções 
sobre saúde, além da dimensão física e biológica – que se pretende suprir através dos 
atendimentos médicos que acontecem no hospital. Mais do que isso, pensar sobre Centro Dia 
e Centro de Convivência é lidar com a dimensão social, psicológica e de bem estar do 
envelhecimento, entendendo que estes elementos também são importantes para se trabalhar e 
governar a saúde e envelhecimento desta população. 
A localização geográfica do centro também não se dá por coincidência. Visto que a 
cidade do Rio de Janeiro é a capital brasileira que possui maior proporção de idosos do Brasil, 
sendo a região administrativa de Campo Grande, a região que possui uma das maiores 
populações idosas da cidade (63.355 habitantes com 60 anos ou mais), segundo dados do 
Censo 2010 realizado pelo IBGE
10
. 
Pode-se imaginar que o grande contingente de população idosa no bairro pode ser um 
forte elemento para justificar a implantação de um hospital voltado para o atendimento desta 
população e seu respectivo Centro Dia e Centro de Convivência, próximos a este local, no 
bairro de Senador Vasconcellos, que faz parte da região administrativa de Campo Grande. 
Assim como também se justifica a escolha do campo, não no sentido de considerar o objeto 
relevante em si, mas de compreender porque e como, através de sua história, contexto e dos 
atores envolvidos nas atividades do local, tanto gestores e funcionários, quanto usuários, este 
pode tornar-se sociologicamente relevante. 
 
 
 
 
 
 
10 Estas informações podem ser encontradas no endereço eletrônico: 
http://www.portalgeo.rio.rj.gov.br/bairroscariocas/index_ra.htm 
http://www.portalgeo.rio.rj.gov.br/bairroscariocas/index_ra.htm
27 
 
1.6 Inserção no campo 
Em novembro de 2012 realizei minha primeira visita ao local, com o intuito de 
conhecer o ambiente, ver como ocorriam as atividades, verificar se era um local frequentado 
por muitos idosos e até mesmo para negociar com os gestores do espaço a possibilidade da 
realização da minha pesquisa, bem como a minha circulação pelo Centro e a realização das 
entrevistas com idosos e funcionários. Após esta primeira visita foi possível delimitar meu 
objeto de investigação e estruturar o meu projeto de pesquisa. 
Meu primeiro contato aconteceu por telefone, quando falei com um funcionário
11
, 
secretário da diretora do Centro de Estudos
12
 do hospital, perguntando se poderia agendar 
uma primeira visita ao Centro Dia e Centro de Convivência. A resposta que recebi foi que 
poderia aparecer em qualquer dia e qualquer horário para conhecer o espaço. 
Ao chegar ao local pela primeira vez observei o grande complexo que é o Hospital 
Estadual Eduardo Rabello, constituído por ambulatório, laboratório, capela, espaços que 
oferecem serviços de terapia ocupacional, fisioterapia, psicologia, nefrologia, cardiologia, 
gastrenterologia, odontologia, serviço social, entre outros. 
Depois desta primeira impressão, logo me dirigi ao Centro Dia e Centro de 
Convivência, entendendo ser este o local mais interessante para realizar minha pesquisa. Na 
entrada do local me deparei com os dizeres: “Centro Dia e Centro de Convivência, resgatando 
a vida e os vínculos familiares e afetivos”, que estavam na faixada do galpão reservado para 
ser o espaço do Centro. 
Ao entrar no galpão observei na parede da frente em letras grandes a frase: “O idoso 
não é refugo da sociedade. São nossos pais, nossos avós. E no futuro seremos nós” de Heraldo 
Paranhos. Abaixo da frase, a imagem de um casal de idosos abraçados e felizes. 
Na parede da recepção, local em que se encontravam duas atendentes que foram as 
primeiras pessoas a me receber no local, outras frases: “Construindo uma sociedade para 
todas as idades” (que inspirou o título desta dissertação) e a missão do Hospital: “Promover a 
saúde do idoso de forma humanizada e com compromisso social”. 
 
11 Nesta dissertação optei por não revelar os nomes dos funcionários, assim como dos usuários, a fim de 
preservar suas identidades. Desde o início da pesquisa isso foi esclarecido para os pesquisados. Procurei 
caracterizá-los através de suas funções, profissões, gênero e quaisquer outras informações que sejam pertinentes 
à investigação. 
12 O Centro de Estudospromove eventos de cunho educativo dentro do hospital, capacitando, treinando e 
sensibilizando funcionários sobre a especificidade de trabalhar em um hospital geriátrico, lidando com usuários 
classificados socialmente como idosos. Este setor administra também estágios e pesquisas que acontecem no 
hospital. 
 
28 
 
Em seguida, fui recebida pela secretária do coordenador geral do centro. A funcionária 
disse estar acostumada com visitas e que nesses casos era comum que se fizesse um tour para 
conhecer os diferentes espaços do local. Percorri com ela o galpão, enquanto acontecia a aula 
de alongamento, ginástica e recreação, e observei idosas - nesta aula eram apenas mulheres 
participando - cantando a música “Amélia” de Mário Lago, formando um coro regido pela 
profissional responsável pela atividade. 
Visitei as salas da música, patchwork, artesanato, multimídia, fisioterapia, 
auricoloterapia, massoterapia e informática. Percebi também no espaço a presença de muitos 
objetos coloridos, exposições de artesanatos confeccionados pelos idosos, enfeites de estrela, 
flores e cartazes com outras frases como “É bom ter você aqui de novo” e balões pendurados 
no teto com as palavras: “atenção”, “cuidado” e “respeito”. 
O local parecia tentar criar, através da decoração, um ambiente de alegria, felicidade, 
descontração. Algo muito diferente do que verifiquei no Hospital, com uma decoração 
austera, sóbria, sem cores ou enfeites. 
Depois fui ao hospital procurar o funcionário que havia falado comigo por telefone em 
um primeiro momento para saber que procedimentos eu deveria seguir a fim de conseguir 
autorização da direção do hospital e do Centro de Estudos para realizar minha pesquisa. Este 
funcionário fez também um tour comigo pelo hospital, me mostrando as alas e as salas de 
diferentes especialidades médicas. O funcionário respondeu positivamente sobre as minhas 
próximas visitas, assim como todos os outros funcionários com quem tive contato, e afirmou 
que na minha próxima visita eu deveria conversar com a diretora do Centro de Estudos para 
acertar maiores detalhes burocráticos sobre a autorização da pesquisa. 
Em fevereiro de 2013 voltei ao local e tive uma surpresa: o espaço havia sido quase 
todo reformado. Estava agora com menos enfeites, sem as frases e dizeres de efeito (inclusive 
a frase que deu título à dissertação). Agora todas as paredes eram da cor laranja e nestas 
mesmas paredes havia fotografias em preto e branco dos usuários do local. Procurei os 
mesmos funcionários com quem havia tido contato da primeira vez e em seguida me dirigi à 
sala da presidente do Centro de Estudos, que segundo estes funcionários, seria a responsável 
por autorizar a minha pesquisa. Ela, enfermeira de formação, trabalha no hospital há cerca de 
três anos, e mostrou-se receptiva e animada com a ideia de alguém ter interesse em estudar o 
local. Para ela, seria uma oportunidade de divulgar o trabalho que estava sendo realizado. Ela 
fez diversos questionamentos a respeito dos meus objetivos e me orientou a retornar em outro 
momento, com meu projeto de pesquisa, cópia da carteira de identidade, do CPF, e duas fotos 
3X4, além do cartão de vacinação devidamente atualizado com a garantia de que eu havia 
29 
 
tomado as vacinas contra hepatite B e antitetânica. Neste encontro ficou também acordado 
que eu voltaria ao hospital para apresentar os resultados de minha pesquisa e de que cederia 
ao hospital as entrevistas transcritas ao final do mestrado. 
Passados alguns dias e cumpridas as devidas exigências, retornei ao local para entregar 
todos os documentos solicitados. A pesquisa foi autorizada pela presidente do Centro de 
Estudos, assim como pela direção do hospital, faltando apenas a autorização da Secretaria 
Estadual de Saúde do Rio de Janeiro, que aconteceu após dois meses de pesquisa de campo. 
Por ocasião da visita do Secretário Estadual de Envelhecimento Saudável e Qualidade 
de vida tive a oportunidade de conhecer o diretor do hospital, que afirmou ter lido e apreciado 
meu projeto de pesquisa, além de também ter se mostrado favorável à minha presença e 
trabalho de campo no local. 
Em outubro de 2013 fiz uma apresentação em um evento chamado “Café com o 
Diretor” no hospital, em que falei sobre meu projeto de pesquisa, uma pequena discussão 
teórica sobre como a sociologia/antropologia poderia ajudar a compreender o fenômeno do 
envelhecimento e alguns dados que pudessem interessar aos funcionários e direção do 
hospital. Nesta ocasião separei respostas de usuários e funcionários do Centro Dia e Centro de 
Convivência a perguntas como: Por que vem ao Centro Dia e Centro de Convivência?; De 
quais atividades participa ou mais gosta? Por quê?; Como você avalia os serviços prestados 
aos idosos no Centro Dia e Centro de Convivência? Quais os aspectos positivos e o que ainda 
precisa/pode melhorar e como?; Como você avalia sua experiência trabalhando no 
hospital/Centro Dia e Centro de Convivência?; dentre outras perguntas. 
Para minha surpresa a reação do público do hospital foi positiva em relação à 
pesquisa. Muitos vieram me parabenizar e mostraram interesse em conhecer mais sobre o 
trabalho. 
Só depois de um tempo em campo pude compreender o motivo do entusiasmo dos 
membros da diretoria e do Centro de Estudos do hospital com relação à minha pesquisa. O 
fato é que a atual gestão do hospital teria uma preocupação latente com a imagem da 
instituição. No passado o hospital já ficou conhecido por casos trágicos de morte de pacientes 
por falta de estrutura adequada, principalmente quanto à temperatura de suas dependências, e 
por casos de abandonos de idosos por seus familiares. 
No entanto, desde 2009 a gestão atual da direção entrou em uma espécie de 
empreitada para promover uma imagem positiva do hospital. Ou, como consta na cartilha de 
apresentação do hospital: “um modelo de gestão participativa voltada para qualidade da 
assistência, a adesão às políticas de humanização, a qualificação e ao desenvolvimento 
30 
 
profissional”. No intuito de mudar a imagem da instituição, a nova gestão concorreu e ganhou 
prêmios dentro da Secretaria Estadual de Saúde, como: Prêmio Qualidade Rio (PQRIO) (o 
hospital ganhou as medalhas bronze, prata e ouro seguidamente entre os anos de 2011-2013); 
e Medalha Tiradentes, concedida ao diretor do hospital em cerimônia na Assembleia 
Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ), dentre outros. Por este motivo, a minha 
pesquisa poderia ser vista como mais uma forma de promover, valorizar, colocar em 
evidência as atividades do hospital, na visão dos gestores do local, o que acabou me 
colocando em uma situação delicada algumas vezes. 
Na primeira semana do meu trabalho de campo procurei o coordenador do Centro Dia 
e Centro de Convivência e pedi para que ele me apresentasse a alguns funcionários do local. 
As apresentações se deram de maneira informal, para alguns funcionários que estavam 
presentes. Após isto, o coordenador do local disse que eu deveria ficar à vontade para me 
apresentar para os demais funcionários e fazer minha pesquisa. Com o tempo, pude notar a 
grande rotatividade de presença de funcionários e usuários, o que requereu uma constante 
apresentação minha e do meu trabalho. Mesmo após alguns meses frequentando, participando 
e observando atividades, realizando entrevistas, era comum encontrar usuários e funcionários 
que não me conheciam e/ou não sabiam muito bem que função eu exercia ali. 
Aos poucos fui me inserindo, conhecendo as pessoas, fazendo contatos, ganhando 
confiança, credibilidade e simpatia de funcionários e usuários e participando e observando as 
atividades do Centro Dia e Centro de Convivência. A partir do segundo mês de trabalho de 
campo consegui elaborar os roteiros das entrevistas, e receber as primeiras aceitações para 
participação na minha pesquisa. Em ocasião de eventos fui também autorizada pela 
coordenaçãoadministrativa a tirar fotografias. 
Uma informante importante para minha inserção no campo foi uma funcionária, 
enquadrada no cargo de massoterapeuta, mas que exerce a função de fisioterapeuta, em 
função da modalidade “desvio de função” no local. Ela trabalha há cerca de vinte anos no 
hospital. Logo de início ela me acolheu como parte integrante do espaço. Convidou-me a 
deixar meus pertences na sala da fisioterapia, a assistir às suas oficinas, a participar do almoço 
com outros funcionários, prontificou-se a auxiliar no que fosse necessário e apresentou-me 
aos demais funcionários e usuários do local. 
Com o tempo, pude compreender a história do Centro Dia e Centro de Convivência, a 
dinâmica de suas atividades diárias, a estrutura espacial, as percepções, representações, bem 
como as relações e conflitos presentes entre usuários e funcionários. 
31 
 
De uma maneira geral, fui bem recebida por todos os funcionários, mas com um certo 
questionamento e, por vezes, desconfiança: “Vai ser um prazer... mas, a pesquisa é mesmo 
sobre o quê? Vai ficar quanto tempo? Só hoje e depois vai embora? Vai lá, fica à vontade.” 
Este estranhamento a respeito da minha presença no local, e a necessidade de explicar 
diversas vezes minha função ali, algumas vezes sem sucesso, geraram uma sensação de não 
pertencimento. No momento dos convites para participar da entrevista pude identificar certa 
desconfiança por parte de alguns funcionários, talvez certo anseio por pensarem que estariam 
sendo avaliados. Os funcionários não estavam habituados a ser objeto de estudo. Estudar os 
idosos era algo natural para eles, que não gerou estranhamento. No entanto, a possibilidade de 
estudá-los, de serem colocados na posição de pesquisados, inverteu a ordem com a qual 
estavam acostumados e gerou também uma necessidade constante de que eu explicasse que 
não pretendia avaliá-los, mas compreender o funcionamento do programa. 
Neste período inicial era comum também perceber olhares curiosos e perguntas a 
respeito “do que tanto você anota neste caderninho”. Esta sensação de estranhamento foi 
mudando ao longo dos meses, na medida em que a minha presença já havia se tornado algo 
costumeiro; e que idosos e funcionários perguntavam por que eu não havia ido em tal dia ou 
em tal festa, ou me faziam convites para eventos semelhantes. 
Para os idosos usuários deste serviço fui muitas vezes identificada como mais uma 
funcionária. Era comum ser questionada por estes sobre “o que você veio fazer aqui? O que 
vai fazer para a gente?”. Mesmo no momento da realização das entrevistas estes podiam 
encontrar um benefício naquele diálogo que estava sendo travado, ainda que eu estivesse me 
sentido beneficiada por ter conseguido pessoas que colaborassem com a minha pesquisa. 
 
“Não! Que isso! Foi um prazer. Gostei muito. Eu é que saí ganhando. Com certeza. 
Hoje tive uma consulta boa e de graça. [risos] O que eu conversei, né? Isso aí é 
muito bom, a gente se abrir, né? Então, eu hoje, eu que sai ganhando. Eu gostei 
muito, tá?” (Usuária, 66 anos; grifo meu); 
 
“Olha, você por educação, você está me agradecendo. Pela educação que você tem. 
É claro e evidente, né? Mas, eu... você me deu um presente hoje. É o que eu tenho 
a dizer a você. Você me deu um presente, porque você está me dizendo, a mim, que 
você não tem preconceito com a idade e você me convidar para me ouvir é um 
presente de Deus. Eu sou grato a Deus porque usou você para me convidar para 
esta entrevista. Eu estou feliz da vida, tá? Eu estou feliz da vida.” (Usuário, 75 anos; 
grifos meus). 
 
 Para alguns usuários do Centro Dia e Centro de Convivência a participação na 
pesquisa foi uma oportunidade de ser ouvido, de se sentir valorizado, de saber que o seu 
conhecimento e a sua experiência de vida tinham valor. 
32 
 
 Destaco aqui que desde o princípio do trabalho de campo me apresentei para os 
pesquisados com o título de “socióloga”, pois acreditei ser esta uma especialidade de mais 
fácil reconhecimento e familiaridade para estes profissionais da área da saúde do que a 
antropologia. Entendendo que temas e espaços da saúde pública e política social teriam sido 
mais pesquisadas – tradicionalmente – pela sociologia
13
. 
A compreensão e percepção de meu próprio trabalho me levam a intitular-me como 
cientista social, já que entendo o diálogo e troca entre as duas áreas, sociologia e antropologia, 
como algo positivo para o trabalho da investigação social. Este fato me levou, inclusive, a 
optar pelo mestrado no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da 
Universidade Federal do Rio de Janeiro. No entanto, no campo fiquei conhecida e 
reconhecida como socióloga. 
 
 
1.7 Apresentação dos capítulos 
Inicio o primeiro capítulo descrevendo alguns dados sobre o bairro de Campo Grande 
(Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro), onde fica localizado o Centro Dia e Centro de 
Convivência. Abordo alguns aspectos que possam caracterizar, ainda que resumidamente, as 
condições de vida, atividades econômicas, contingente populacional e demais características 
que possam auxiliar na compreensão do perfil do idoso - que na maioria dos casos é morador 
do bairro - que frequenta e participa das atividades que acontecem no Centro Dia e 
Convivência. Descrever o bairro que dá lugar a este programa também teve como finalidade 
ambientar o leitor a respeito da localidade e contextos relacionados a esta pesquisa. 
Em seguida faço uma descrição etnográfica
14
 do espaço, das atividades, profissionais e 
do público que frequenta o Centro Dia e Centro de Convivência. Tais descrições estão 
baseadas na minha vivência, observação, participação e contatos que tive no local. 
Ainda neste primeiro capítulo, resgato a história de criação do Centro Dia e Centro de 
Convivência. Explicarei como e por quais agentes estatais foi criado o espaço, e em quais 
 
13 Eduardo Vianna Vargas (2000), ao falar sobre a relação entre a sociologia e antropologia, afirma que não 
acredita em um fronteira absoluta que separe as áreas, no entanto percebe distinções em suas origens, temas e 
abordagens, isto é, tradições na forma como foram encaminhadas suas discussões. Neste sentido, a sociologia 
teria privilegiado a investigação sobre a própria sociedade ocidental, já a antropologia teria se debruçado mais no 
estudo de outras civilizações. Embora seja sabido que atualmente esta divisão de temas não caberia à realidade 
das duas disciplinas. 
14 O uso do método etnográfico tem como referência as proposições de Clifford Geertz (1978) em “A 
Interpretação das Culturas”, quando explica que a etnografia é uma tentativa de apreender significados através da 
descrição de grupo, lugar, prática, dentre outros. 
 
33 
 
circunstâncias e sob quais justificativas e demandas. Descrevo desde os primeiros anos de 
funcionamento do local, quando aconteciam encontros e atividades no setor ambulatorial do 
hospital, sob o comando e direção do serviço social, até a abertura, reforma e inauguração do 
galpão - que antes servia como depósito - para fazer as vezes de Centro Dia e Centro de 
Convivência. 
 Ao final do capítulo me deterei na análise do projeto, a fim de compreender as 
motivações e justificativas sob as quais os profissionais do local se baseiam para perceberem 
a necessidade da criação do programa para pessoas com 60 anos ou mais. Através da análise 
deste projeto será possível compreender qual o público alvo e quais os objetivos propostos 
pelo programa. 
Além disto, a análise do projeto possibilita a compreensão de um contexto mais 
amplo, identificado e utilizado por estes profissionais, no que diz respeito à concepção do que 
é saúde para idosos e de que tipos de serviço devem os profissionais desta área prestar, em 
que conceitos como promoção e prevenção são constantemente utilizados. Este contexto está 
também relacionado

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