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1 2 Agradecimentos Aos amigos por entenderem minha ausência, ou por não entenderem e brigarem comigo exigindo minha presença. Saibam que nos momentos que fico distante sempre sofro de saudades. À minha flor pelo incentivo, companhia e por me dar paz. À minha mãe que se preocupa, mas finge que não, só para me dar tranqüilidade para continuar no caminho que escolhi. Ao Marco, meu guia, meu amigo, meu exemplo de pessoa e de profissional. Aprendo com você nos dias bons e nos dias ruins. Obrigada por estar ao meu lado todos esses anos. E por sempre me lembrar que tudo dá certo no final. Se não deu certo ainda é porque não chegamos nos final. Ao Antônio, meu anjo da guarda, meu santo! Obrigada por me ouvir, me ajudar em tudo, e por sempre chegar sorrindo acabando com qualquer possibilidade de um dia ruim. Aos amigos do Laboratório de Microbiologia de Alimentos, por me aguentarem reclamando, por serem pessoas incríveis com quem aprendi muito e por terem cada um, uma história que os fazem únicos nas suas particularidades. Às Professoras Vêronica Calado e Lourdes Cabral pela orientação e compreensão ao longo desses 2 anos. À Analy Leite (maluca!) e ao LEMM por me ajudarem na última etapa do trabalho de forma tão atenciosa. À Capes pela bolsa de mestrado. Ao Programa de Ciência de Alimentos pela oportunidade. Muito obrigada! 3 BERES, Carolina. ISOLAMENTO DE MICRORGANISMOS COM POTENCIAL TECNOLÓGICO DE UVAS VITIS VINIFERA E DESENVOLVIMENTO DE UM MEIO DE CULTURA BASEADO NA UVA E SEUS DERIVADOS. Rio de Janeiro, 2013. Dissertação (Mestrado em Ciências de Alimentos) – Instituto de Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. Resumo A vitivinicultura representa um importante segmento econômico e social no mercado. O papel biotecnológico dos microrganismos neste processo permite novos estudos, uma vez que os processos são intimamente dependentes de características da região produtora, assim como das variedades de uvas utilizadas. Na produção do vinho são utilizadas culturas comerciais, que aumentam os custos e não valorizam as particularidades encontradas em culturas nativas. Além da participação nos processos fermentativos, há produção de enzimas como pectinases e a seleção de estirpes probióticas, cujos produtos com estas características têm apresentado uma crescente demanda no mercado. Desta forma este estudo teve como objetivo isolar microrganismos da superfície de uvas que apresentem potencial de uso biotecnológico e características probióticas. E desenvolver um meio de cultivo que tem como componente principal a uva e seus derivados, para isolamento de bactérias láticas. Foram isolados em Agar MRS 485 microrganismos. Estes foram caracterizados presuntivamente como: BAL (189), fungos e leveduras (202) e bastonetes Gram negativos (69). Todos os microrganismos foram avaliados quanto à produção da enzima pectinase, resistência a sais biliares, pH ácido e produção de atividade antimicrobiana. Destes, 94 estirpes produziram pectinase e 9 estirpes foram presuntivamente caracterizadas como potenciais probióticas por apresentarem resistência aos sais biliares, resistência ao pH 3,5 e produzir antimicrobiano ao mesmo tempo. As estirpes que apresentaram alguma atividade biotecnológica de interesse foram identificadas através de técnicas moleculares. Foi realizada amplificação do material genético por PCR, ARDRA para análise de restrição do RNAr 16S e sequenciamento dos perfis representativos de cada espécie. Foram identificadas 12 estirpes de Paenibacillus sp., 2 de Bacillus sp., 2 Bacillus subtilis, 1 Klebsiela pneumoniae, 16 Klebsiela sp., 12 Leuconostoc e 1 Cellulosimicrobium funkei. Foi desenvolvido um meio de cultivo utilizando-se a uva Vitis vinifera, bagaço de uva, extrato do bagaço de uva e suco de uva comercial para isolamento de BAL. Na formulação com 50% de suco e 50% de uva foi observado o crescimento das culturas de referência igual ou superior ao encontrado no meio comercial (MRS). O desenvolvimento de um meio de cultura a base de uva, com desempenho comparável a um meio comercial permitirá o isolamento de culturas a partir das uvas de uma forma mais econômica e utilizando as particularidades das variedades de uvas de cada região. Palavras – chave: uva, bagaço, meio de cultura, microrganismo, bactéria lática, pectinases. 4 BERES, Carolina. MICRORGANIMS WITH TECNOLOGICAL POTENTIAL ISOLATED FROM THE VITIS VINIFERA GRAPE SURFACE AND CULTURE MEDIUM DEVELOPMENT USING GRAPE AND ITS DERIVATIVES. Rio de Janeiro, 2013. Dissertation (Master in Food Science) – Chemistry Institute, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. Abstract The wine industry is an important economic and social sector. The role of microorganisms in biotechnological process allow further studies, as the processes are critically dependent on the characteristics of the grape varieties used. In the production of wine commercial cultures are used, which increase costs and do not value the particularities found in native cultures. In addition to cultures participating in fermentation processes, there are cultures that secrets enzymes such as pectinases, and the selection of probiotic strains, whose products with these characteristics have shown a growing demand in the market. Therefore, this study aimed to isolate microorganisms from the surface of grapes with biotechnological and probiotic potential, and develop a culture medium that has as main component the grape and derivatives, to isolate lactic acid bacteria. Were isolated in MRS Agar 485 microrganisms. These were characterized as presumptively: BAL (189), fungi and yeasts (202) and Gram negatives rod (69). These were evaluated for the production of the enzyme pectinase, resistance to bile salts, acid pH and production of antimicrobial activity. Among these, 94 strains produced pectinase and 9 strains were BAL characterized as presumptively due to its resistance to bile salts, pH 3.5 and to produce antimicrobial simultaneously. Strains that produced some biotechnological activity of interest were identified by molecular techniques. The DNA fragment amplified by PCR technique of the strains were used ARDRA. It was identified 12 strains of Paenibacillus sp., 2 Bacillus sp., 2 Bacillus subtilis, 1 Klebsiela pneumoniae, 16 Klebsiela sp., 12 Leuconostoc and 1 Cellulosimicrobium funkei. We developed a culture medium using the Vitis vinifera grape, grape pomace, grape pomace extract and commercial grape juice for the isolation of BAL. In the formulation with 50% fruit juice and 50% grape the growth in the Type cultures obtained was equal or superior to that found in commercial medium (MRS). The development of a culture medium based on grape, with performance comparable to a commercial medium allows the isolation of cultures from grapes with a cheaper methodology and using the particularities of grape varieties of each region. Keywords: grape, pomace, culture medium, microrganism, lactic acid bacteria, pectinases. 5 LISTA DE FIGURAS Figura 1: Uva Vitis vinifera. 18 Figura 2: Produção de vinhos, sucos e derivados a partir de uvas destinadas ao processamento no Rio Grande do Sul no ano de 2011. 19 Figura 3: Partes integrantes do cacho de uva. 21 Figura 4: Estrutura química dos polifenóis resvetrol e catequina. 23 Figura 5: Fluxograma de operação para produção de vinho tinto (Barnabé, 2006). 25 Figura 6: Estrutura primária da pectina. 37 Figura 7: Ação da pectinase na produção do suco de uva (Rizzon e Meneguzzo, 2007). 39 Figura 8: Mecanismos de ação das pectinases: (a) R=H para PG e CH3 para PMG; (b) PE. (c) R=H para PGL e CH3 para PL. A seta indica o local onde a pectinase reage com a substância péctica (Gogus, 2006). PMG: polimetilgalacturonase;PG: poligalacturonase; PE: pectinesterase; PL: pectina liase. 42 Figura 9: Alegação de propriedade funcional aprovada para os alimentos probióticos e os requisitos específicos (Brasil, 2008). 48 Figura 10: Etapas da técnica de PCR. 57 Figura 11: Atividade antimicrobiana de bactérias láticas isoladas da uva contra Listeria innocua. 72 Figura 12 A,B,C: Atividade antimicrobiana contra S. aureus das 9 culturas caracterizadas como bactérias láticas, isoladas da superfície das uvas. A seta indica o controle positivo L. lactis ATCC 11454 produtor de bacteriocina. 72 Figura 13: Triagem para determinação de microrganismos com atividade pectinolítica, a partir de revelação por vermelho de rutênio. A presença do halo foi considerada positiva para presença da enzima. 75 Figura 14: Estirpes isoladas da uva produtoras de atividade pectinolítica. As setas indicam dois controles positivos Candida krusei 50148 e Pichia anomala 50407. 76 Figura 15: Perfil de bandas obtidos por ARDRA após tratamento com a enzima HhaI realizados em 9 culturas com atividade pectinolítica. As setas superiores indicam o padrão de bandas (Kb) e a seta lateral indica a banda com 1.500 pares de base. Kb: padrão de 77 6 bandas; pb: pares de base. Figura 16: Perfil de bandas obtidos por ARDRA após tratamento com a enzima HhaI realizados em 18 culturas com atividade pectinolítica. As setas superiores indicam o padrão de bandas (Genevuler 1Kb Plus DNA ladder) e a seta lateral indica a banda com 1.500 pares de base. pb: pares de base. 77 Figura 17: Perfil de bandas obtidos por ARDRA após tratamento com a enzima HhaI realizados em 9 culturas com atividade pectinolítica. As setas superiores indicam o padrão de bandas (Genevuler 1Kb Plus DNA ladder) e a seta lateral indica a banda com 1.500 pares de base. pb: pares de base. 78 Figura 18: (A e B) Meios elaborados com 100% e 50% de uva, respectivamente. (C) Meio constituído de 100% de suco. (D) MRS – meio controle. Nas figuras A, B e C, observam-se colônias com pigmentação, diferente do encontrado no MRS. 84 Figura 19: Diagrama de caixa para o Lactobacillus delbrueckii ATCC 7830, usando Agar Uva com pH 5,5 e autoclavado por 5 minutos. L: Lactobacillus; Log UFC/mL: logaritmo de unidades formadoras de colônias por mililitro; oC: grau Celsius; Mean: média; SD: desvio-padrão. 86 Figura 20: Diagrama de caixa para o Lactobacillus GG rhamnosus ATCC 53103, usando Agar Uva com pH 5,5 e autoclavado por 5 minutos. L: Lactobacillus; Log UFC/mL: logaritmo de unidades formadoras de colônias por mililitro; oC: grau Celsius; Mean: média; SD: desvio-padrão. 86 Figura 21: Diagrama de caixa para o Lactobacillus casei ATCC 393, usando Agar Uva com pH 5,5 e autoclavado por 5 minutos. L: Lactobacillus; Log UFC/mL: logaritmo de unidades formadoras de colônias por mililitro; oC: grau Celsius; Mean: média; SD: desvio-padrão. 87 Figura 22: Diagrama de caixa para o Lactobacillus sake CECT 906, usando Agar Uva com pH 5,5 e autoclavado por 5 minutos. L: Lactobacillus; Log UFC/mL: logaritmo de unidades formadoras de colônias por mililitro; oC: grau Celsius; Mean: média; SD: desvio-padrão 87 Figura 23: Diagrama de caixa para o Lactobacillus GG rhamnosus ATCC 53103, usando Agar Uva com pH 5,5 e autoclavado por 15 minutos. L: Lactobacillus; Log UFC/mL: logaritmo de unidades formadoras de colônias por mililitro; oC: grau Celsius; Mean: média; SD: desvio-padrão. 88 Figura 24: Diagrama de caixa para o Lactobacillus delbrueckii ATCC 7830, usando Agar Uva com pH 5,5 e autoclavado por 15 minutos. L: Lactobacillus; Log UFC/mL: logaritmo de unidades formadoras de colônias por mililitro; oC: grau Celsius; Mean: média; SD: desvio-padrão. 88 7 Figura 25: Diagrama de caixa para o Lactobacillus casei ATCC 393 usando Agar Uva com pH 5,5 e autoclavado por 15 minutos. L: Lactobacillus; Log UFC/mL: logaritmo de unidades formadoras de colônias por mililitro; oC: grau Celsius; Mean: média; SD: desvio-padrão. 89 Figura 26: Diagrama de caixa para o Lactobacillus sake CECT 906, usando Agar Uva com pH 5,5 e autoclavado por 15 minutos. L: Lactobacillus; Log UFC/mL: logaritmo de unidades formadoras de colônias por mililitro; oC: grau Celsius; Mean: média; SD: desvio-padrão. 89 Figura 27: Gráfico das Médias para L. GG rhamnosus ATCC 53103 Log UFC/mL: logaritmo de unidade formadora de colônia por mililitro; oC: grau Celsius; pH: potencial de hidrogênio. 90 Figura 28: Gráfico das Médias para L.delbrueckii ATCC 7830. Log UFC/mL: logaritmo de unidade formadora de colônia por mililitro; oC: grau Celsius; pH: potencial de hidrogênio. 91 Figura 29: Gráfico das Médias para L.casei ATCC 393. Log UFC/mL: logaritmo de unidade formadora de colônia por mililitro; oC: grau Celsius; pH: potencial de hidrogênio. 92 Figura 30: Gráfico das Médias para L. sakei CECT 906. Log UFC/mL: logaritmo de unidade formadora de colônia por mililitro; oC: grau Celsius; pH: potencial de hidrogênio. 93 Figura 31: Comparação entre meios de cultivo com 100% ou 50% de suco em relação ao crescimento de colônias das estirpes analisadas. Log UFC/mL: logaritmo de unidade formadora de colônia por mililitro. 94 Figura 32: Comparação entre meios de cultivo com 100% ou 50% de uva quanto ao crescimento de colônias das estirpes analisadas. Log UFC/mL: logaritmo de unidade formadora de colônia por mililitro. L: Lactobacillus. 95 Figura 33: Comparação entre meios de cultivo com 100% de uva e meio MRS. Log UFC/mL: logaritmo de unidade formadora de colônia por mililitro; L: Lactobacillus, MRS: de Man, Rogosa and Sharpe. 96 Figura 34: Comparação entre meios de cultivo formulados com uva e suco de uva e meio MRS. Log UFC/mL: logaritmo de unidade formadora de colônia por mililitro; MRS: de Man, Rogosa and Sharpe, pH: potencial de hidrogênio; min: minutos. 97 8 LISTA DE QUADROS Quadro 1: Produção (em toneladas) de uvas para processamento e para consumo in natura, no Brasil. 19 Quadro 2: Composição da uva (Vitis vinifera L.) por 100 gramas de parte comestível. 22 Quadro 3: Conteúdo fenólico de sucos e vinhos. 24 Quadro 4: Principais aplicações do bagaço de uva na indústria. 26 Quadro 5: Microrganismos encontrados como fitopatógenos em uvas 32 Quadro 6: Efeitos benéficos à saúde, atribuídos pelos probióticos e seus respectivos mecanismos de ação. 46 Quadro 7: Substratos de origem vegetal utilizados como veículo de microrganismos probióticos. 49 Quadro 8: Aplicação de microrganismos probióticos em produtos no Brasil. 50 Quadro 9: Meios de cultura comumente empregados para isolamento e identificação de bactérias láticas de interesse. 52 Quadro 10: Meios de cultura comumente empregados para isolamento e identificação de leveduras de interesse. 54 Quadro 11: Composição do meio de cultura para pesquisa de microrganismos pectinolíticos. 54 Quadro 12: Composição do Agar MRS. 63 Quadro 13: Resultado da contagem de colônias para as corridas do planejamento. 81 9 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Culturas-padrão usadas nos experimentos. 59 Tabela 2: Planejamento de Misturas Simplex-Lattice com Pontos Interiores. 67 Tabela 3: Planejamento fatorial fracionário 22 e 3 pontos centrais. 69 Tabela 4: Caracterização morfotintorial das estirpes isoladas das uvas em diferentes condições. 71 Tabela 5: Resistência de bactérias láticas isoladas de uva ao pH 3,5. 73 Tabela 6: Viabilidade celular das culturas isoladas da superfície da uva em Caldo MRS suplementado com 0,3% de bile. 74 Tabela 7: Relação entre as estirpes isoladas e o perfil de bandas obtidos no ARDRA. 78 Tabela 8: Identificação molecular por sequenciamento das cepas com perfil de bandas distintos. 79 Tabela 9: Melhores condições de pH, temperaturade incubação, tempo de autoclavação e formulação do meio para o crescimento de bactérias láticas. 85 10 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS µL: microlitros 16S rRNA: subunidade 16S do RNA ribossomal a.C.: antes de Cristo ANOVA: Analysis of Variance, Análise de variância ARDRA: Amplified Ribosomal DNA Restriction Analysis, Análise de Restrição do DNA Ribosomal Amplificado ATCC: American Type Culture Colection BAA: bactéria ácido acética BAL: bactéria ácido lática BHI: Brain Heart Infusion, infusão de cérebro e coração DNA: Deoxyribonucleic, Ácido desoxirribonucléico dNTP: Deoxynucleotide Triphosphate, Desoxiribonucleotídeo Tri-fosfato FAO: Food and Agriculture Organization GC: conteúdo Guanina e Citosina GRAS: Generally Recognaze as Safe g/L: grama por litro h: horas Kb: padrão de bases KDa: quilo Dalton L: litros LDH: desidrogenase lática log: unidade logarítmica MgCl2: cloreto de magnésio mL: mililitros 11 MRS: Man, Rogosa and Sharpe NAD: nicotinamida adenina dinucleotídeo NADH: nicotinamida adenina dinucleotídeo oC: graus Celsius PCR: Polimerase Chain Reaction, Reação em Cadeia da Polimerase pH: potencial de hidrogênio SO2: ácido sulfúrico TAE: tris acetato EDTA TBE: tris borato EDTA UFC: unidade formadora de colônias UFRJ: Universidade Federal do Rio de Janeiro UV: ultravioleta WHO: World Health Organization 12 SUMÁRIO 1. Introdução 14 2. Justificativa 16 3. Objetivos 17 3.1. Objetivo geral 17 3.2. Objetivos específicos 17 4. Revisão Bibliográfica 18 4.1. Uva e resíduos da vitivinicultura 18 4.2. Variedade de uva para produção de vinho 20 4.3. Produção de vinho e suco de uva 24 4.4. Resíduos agroindustriais 27 4.5. Microbiota da uva 29 4.5.1. Fatores que afetam a microbiota da uva 29 4.5.2. Principais microrganismos da microbiota da uva 29 4.5.3. Microrganismos fitopatogênicos 30 4.6. Presença de microrganismos de interesse industrial na uva 33 4.6.1. Levedura 33 4.6.2. Bactérias ácido láticas 34 4.7. Microrganismos pectinolíticos 36 4.7.1. Pectina 37 4.7.2. Definição e nomenclatura da enzima pectinase 37 4.7.3. Importância prática, econômica e aplicação industrial 38 4.7.4. Mecanismos de ação das pectinases 40 4.8. Microrganismos com potencial probiótico 42 4.8.1. Microrganismos probióticos 42 4.8.2. Mecanismos de ação de microrganismos probióticos 44 4.8.3. Legislação para probióticos 46 4.8.4. Aplicação de microrganismos probióticos 49 4.9. Seleção e isolamento de microrganismos de interesse 51 4.9.1. Métodos tradicionais 51 4.9.2. Métodos recentes 55 4.9.2.1. Técnicas moleculares 55 5. Material e métodos 59 5.1. Seleção de microrganismos com interesse tecnológico para a indústria de uvas e vinhos 59 5.1.1. Origem das uvas 59 5.1.2. Culturas padrão 59 5.1.3. Isolamento e estocagem dos microrganismos da superfície da uva 60 5.1.4. Seleção de bactérias láticas produtoras de substâncias antimicrobianas 60 5.1.5. Seleção de bactérias láticas com potecial probiótico 61 5.1.5.1. Resistência ao pH ácido 61 5.1.5.2. Resistência a sais biliares 62 13 5.1.5.3. Análise estatística 62 5.1.6. Seleção de microrganismos pectinolíticos 62 5.1.7. Identificação molecular dos microrganismos isolados que apresentaram propriedades tecnológicas de interesse 64 5.1.7.1. Extração do DNA das culturas analisadas 64 5.1.7.2. Amplificação do gene codificador do RNAr 16s por PCR 64 5.1.7.3. Análise de restrição do DNA ribossomal amplificado (ARDRA) 65 5.1.7.4. Purificação do material genético 65 5.1.7.5. Identificação molecular por seqüenciamento 66 5.2. Desenvolvimento do meio de cultivo para isolamento de bactérias láticas de interesse para vitivinicultura 66 5.2.1. Planejamento de misturas 67 5.2.1.1. Obtenção dos componentes analisados no planejamento de misturas 68 5.2.2. Planejamento fatorial fracionário (23-1) 69 6. Resultados 71 6.1. Isolamento de microrganismos com interesse tecnológico para indústria de uvas e vinhos 71 6.1.1. Isolamento e caracterização morfotintorial de microrganismos isolados 71 6.1.2. Seleção de estirpes produtoras de substância antimicrobiana semelhante à bacteriocina 71 6.1.3. Determinação de características probióticas das culturas isoladas 72 6.1.4. Pesquisa de presença da enzima pectinase 75 6.1.5.Identificação molecular dos microrganismos isolados com interesse tecnológico 76 6.2. Desenvolvimento de meio de cultura para isolamento de bactérias láticas de interesse na vitivinicultura 79 6.2.1. Meios de cultura 79 7. Discussão 98 8. Conclusão 105 9. Referências bibliográficas 106 14 1. INTRODUÇÃO A agricultura gera quantidades significativas de resíduos que, podem em alguns casos ser considerados não perigosos, mas possuem um alto conteúdo de matéria orgânica, que causam impactos no ambiente. O fato de sua produção ser concentrada em épocas específicas do ano representa um potencial poluidor. O uso eficiente de resíduos industriais é importante não só para diminuir o impacto ambiental, mas também para aumentar a rentabilidade. A matéria orgânica apresenta potencial como fonte renovável de energia ou como substrato para a formulação de outros produtos. Uma indústria que produz uma quantidade significativa de resíduos é a vitivinicultura, que constitui uma parte importante da economia de diversas regiões no mundo, de acordo com a FAO a cultura de uva produz mais de 60 milhões de toneladas anualmente (Ping et al., 2011). Durante o processamento e elaboração do vinho e do suco de uva alguns microrganismos participam de forma efetiva. As bactérias ácido láticas (BAL) apresentam papel importante na produção de vinho, onde seu crescimento e metabolismo podem ter efeitos positivos e negativos no vinho. A transformação do ácido málico em ácido lático na fermentação malolática é positivo para o vinho já que diminui a acidez e permite a formação de uma série de produtos, além da remoção de ocratoxina A. Entretanto podem levar a formação de compostos com propriedades sensoriais negativas como β – D- glucanas, ácido acético e formação de aminas biogênicas. Além dessa característica, as bactérias ácido láticas podem ser aplicadas em melhorias no produto devido seu potencial probiótico trazendo, portanto benefícios à saúde do consumidor e ação contra patógenos devido a presença de substâncias antimicrobianas (Holzapfel, 2006; Terrade et al., 2009). Os microrganismos pectinolíticos, principalmente fungos e bactérias, são importantes na indústria pela sua ação hidrolítica na molécula de pectina. Sendo assim, tais microrganismos podem ser relevantes por permitirem a clarificação do suco de uva e facilitarem a extração, aumentando o rendimento da produção (Benoit et al., 2012). O isolamento e identificação de microrganismos da microbiota da superfície de cascas de uvas podem revelar microrganismos com potencial tecnológico para o beneficiamento da 15 vitivinicultura, além de reduzir o uso de microrganismos comerciais, prática que frequentemente aumenta os custos do processamento. 16 2. JUSTIFICATIVA O aumento do consumo de sucos de frutas naturais, impulsionado pela busca por hábitos mais saudáveis e o reconhecimento da qualidade do vinho brasileiro, elevam o seu consumo pela população. Desse modo, a cultura de uva e vinho no Brasil é crescente, representando um importante segmento da economia nas regiões sul e nordeste do país. No processamento da uva, normalmente são utilizados microrganismos de uso comercial, aumentando assim o custo da produção. A aplicação de microrganismos isolados da superfície da uva no processamento dos seus derivados, permite uma ação mais específica, visto que as variedades de uvas influenciamsuas características nutricionais e tecnológicas, assim como sua microbiota. Poucos estudos avaliam a utilização de microrganismos da uva no processamento e beneficiamento do suco e do vinho. A microbiota da uva é complexa e formada principalmente por leveduras e bactérias. As bactérias desempenham funções importantes na vitivinicultura, entretanto são menos estudadas que as leveduras. Além de atuar nos processos fermentativos, as bactérias produzem enzimas importantes em etapas do processamento, além de uma possível utilização nos resíduos agroindustriais. O processamento industrial da uva resulta em uma produção alta de resíduos. Apesar de estudos que buscam alternativas de uso para estes resíduos, ainda há uma quantidade significativa de matéria orgânica com destino inadequado. Desse modo, a utilização de microrganismos para a sua degradação é relevante. As bactérias pectinolíticas e celulolíticas adaptadas à superfície da uva são importantes nessa utilização por aumentarem o rendimento dessa reação. Além da possível degradação do bagaço, os microrganismos pectinolíticos isolados da uva podem atuar de forma mais específica na etapa de clarificação da produção do suco. Na literatura atual poucos estudos abordam o papel das bactérias láticas como produtoras de pectinase. A sua aplicação na produção de suco de uva é vantajosa por unir as ações probiótica e pectinolítica, em um microrganismo. Além disso, a presença de bactérias láticas com potencial probiótico no suco permite a valorização do produto e o crescente mercado de produtos probióticos indica a importância de avanços nessa área. 17 3. OBJETIVOS 3.1. OBJETIVO GERAL Isolar microrganismos produtores de substâncias de interesse tecnológico, a partir da superfície de uvas Vitis vinifera, usadas na vitivinicultura no sul do Brasil e desenvolver um meio de cultivo baseado na uva Vitis vinifera e seus derivados. 3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Isolar microrganismos produtores de substâncias antimicrobianas semelhantes às bacteriocinas; - Isolar microrganismos com potencial probiótico; - Isolar microrganismos produtores de enzima pectinase; - Identificar os microrganismos isolados por métodos moleculares; - Desenvolver um meio de cultura sólido não seletivo composto de uva e seus derivados para isolamento de microrganismos selvagens de interesse para indústria da uva. 18 4. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 4.1 Uva e resíduo da vitivinicultura A cultura da uva (Vitis sp.) é a segunda maior cultura no mundo depois apenas da laranja. Dentre as espécies mais cultivadas encontra-se a Vitis vinifera (Figura 1), usada para produção de vinho. A uva é uma fruta não climatérica que pode ser consumida in natura ou desidratada. Também pode ser usada na elaboração de geléias, suco, vinagre e vinho. Aproximadamente 71% das uvas no mundo são usadas para produção de vinho, 27% como fruta fresca e 2% como fruta desidratada (Arvanitoyannis e Varzakas, 2008; Demiral e Ayan, 2011). Figura 1: Uva Vitis vinifera No Brasil, a vitivinicultura é uma atividade importante para sustentabilidade de pequenas propriedades, tendo apresentado no ano de 2011 um aumento de 12,97% na produção de uvas. Na vitivinicultura brasileira, parte da uva é destinada ao consumo in natura e parte é processada (Quadro 1), destas 60,9% são destinadas à produção de vinho, enquanto 37,3% para produção de suco de uva, como se pode observar na figura 2 (Embrapa Uva e Vinho, 2010; Mello, 2012). 19 Quadro 1: Produção (em toneladas) de uvas para processamento e para consumo in natura, no Brasil. Discriminação/ano 2007 2008 2009 2010 Processamento 637.125 708.042 678.169 557.888 Consumo in natura 717.835 691.220 667.550 737.554 Total 1.354.960 1.399.262 1.345.719 1.295.442 Fonte: Embrapa Uva e Vinho, 2010. Figura 2: Produção de vinhos, sucos e derivados a partir de uvas destinadas ao processamento no Rio Grande do Sul no ano de 2011. A uva é um dos alimentos mais antigos da humanidade, originário da Ásia, da região árida do Cáucaso, existindo há cerca de 6.000 anos a.C. No Brasil o desenvolvimento da vitivinicultura só ocorreu no século XIX, após a chegada dos imigrantes portugueses e italianos. A uva é produzida pela videira e atualmente são conhecidas mais de 10.000 variedades encontradas em todos os continentes, predominantemente em climas temperados. As uvas podem ser cultivadas em várias regiões onde cada variedade se adapta a diferentes tipos de solo e clima (Pereira et al., 2008; Vedana et al., 2008; Ferrari et al., 2010). Vinho mesa Vinho fino Suco de uva integral Suco concentrado Outros derivados 20 4.2. Variedade de uva para produção de vinho Em torno de 60% das uvas destinadas ao processamento, são utilizadas na elaboração do vinho. As uvas da categoria Vitis vinifera são usadas para produção de vinhos finos e Vitis labrusca, Vitis bourquina e híbridos para produção de vinhos comuns. A variedade Vitis vinifera produz vinho de melhor qualidade; no entanto, seu cultivo está limitado a algumas regiões brasileiras, como Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Região do Vale do São Francisco, pois as condições de clima e solo são mais favoráveis. As uvas destinadas à produção de vinhos de mesa, sucos e derivados para consumo in natura são, na sua maioria, da variedade Vitis labrusca (Aquarone et al., 2001; Camargo et al., 2007). No Brasil, as variedades de uvas cultivadas para o vinho são (Aquarone et al., 2001): a) Vitis vinifera • Tintas: Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc, Pinot Noir, Bonarda, Sangiovese, Canaiolo, Syrah e Tannat; • Brancas: Riesling Renano, Riesling Itálico, Chardonnay, Gewürztraminer, Malvasia, Pinot Blanc, Trebbiano, Peverella, Moscatel Flora, Sauvignon Blanc e Semillon; b) Vitis labrusca • Tintas: Isabel, Concord, Tercy, Bordô, Folha de Figo e York Madeira; • Brancas: Niagara; c) Vitis bourquina • Tintas: Hebermont e Jaques; d) Híbridas • Tintas: Seibel 2, Seibel 10.096, IAC 138-22, Pignoletta e Couderc; • Brancas: Seyve Villard 5.276, IAC 116-31, IAC 21-14. 21 O cacho de uva é composto por engaço que possui os pedúnculos e as almofadas. Estes sustentam o cacho formado pelas bagas, também chamadas de grãos. A baga é composta principalmente por casca (6-12%), semente (2-5%) e polpa (85-92%) (Figura 3). A uva é composta basicamente por açúcares, ácidos, pectinas, gomas, compostos aromáticos e compostos fenólicos (Peixoto, 2000; Souza, Lima e Vieites, 2010). A composição nutricional da polpa está discriminada no Quadro 2. Figura 3: Partes integrantes do cacho de uva. 22 Quadro 2: Composição da uva (Vitis vinifera L.) por 100 gramas de parte comestível. Componentes Quantidade/100g parte comestível Umidade 81,6g Proteínas 0,6 g Lipídios 0,7 g Glicídios 16,7 g Fibra 1,1 g Cinzas 0,4 g Cálcio 12 mg Fósforo 15 g Ferro 0,9 mg Potássio 185 mg Magnésio 6 mg Manganês 0,06 mg Vitamina A (retinol) 7,3 mg Vitamina B1 (tiamina) 0,09 mg Vitamina B3 Niacina 0,3 mg Vitamina B5 (ácido pantotênico) 0,02 mg Vitamina B6 (piridoxina) 0,11 mg Vitamina C (ácido ascórbico) 10,8 mg Vitamina B2 (riboflavina) 0,06 mg Fonte: Tabela de alimentos em composição química e medidas caseiras – 2003. Estudo Nacional da Despesa Familiar – 1999. g – grama; mg – miligrama. Um dos componentes mais estudados da uva são os polifenóis, metabólitos secundários da via pentose-fosfato em plantas, sendo considerado o grupo de fitoquímicos mais encontrados, com importância fisiológica e morfológica para plantas, como funções antialérgicas, antiarterogênica, antiinflamatória, antimicrobiana, antioxidante, antitrombótica, cardioprotetora e vasodilatadora. O potencial antioxidante é consideradoo mais importante em determinar as suas características benéficas, vinculadas ao consumo de frutas e hortaliças. Estruturalmente consistem de um anel aromático com moléculas de hidroxilas, normalmente conjugados com mono ou polissacarídeos. O possível benefício à saúde depende da absorção dos polifenóis pelo organismo. São polifenóis: quercitina, taninos, antocianinas, flavonóides, resveratrol, catequinas, proatocianinas, ácido hidroxibenzóico e resviratrol (Figura 4) (Baydar, Özkan e Sagdiç, 2004; Balasundram, Sundram e Samman, 2006; Baydar, Özkan e Yasar, 2007). 23 Figura 4: Estrutura química dos polifenóis resvetrol e catequina. Os antioxidantes são compostos químicos que diminuem os efeitos maléficos ao organismo, pois possuem capacidade de reagir com os radicas livres, sendo inibidores dos processos oxirredutores. Os polifenóis são exemplos de antioxidantes não enzimáticos, assim como vitaminas e ácido úrico (Pimentel et al., 2005; Dani, 2006; Vedana, 2008). Os radicais livres são moléculas altamente reativas produzidas naturalmente no metabolismo. Entretanto quando em excesso podem ser prejudiciais à saúde, causando oxidação das células, facilitando o desenvolvimento de diversas patologias (Perin e Schott, 2011). Os antioxidantes possuem mecanismo de ação variado, inativação dos radicais livres, redução de hidroperóxidos e complexação de íons metálicos, podendo agir sobre radicais livres tornando-os menos reativo. Os antioxidantes endógenos, ou seja, produzidos pelo organismo, apresentam eficiência parcial, sendo necessária a ingestão de antioxidantes exógenos, por meio da dieta, que podem ser encontrados nas plantas, principalmente nas frutas. Além disso, os antioxidantes naturais têm a possibilidade de melhorar a estabilidade e qualidade dos alimentos, trazendo consigo beneficio a saúde humana (Pimentel et al., 2005; Vedana, 2008). Dentre as frutas, as uvas são consideradas uma das maiores fontes de compostos fenólicos. Desse modo, os produtos derivados do seu processamento, como suco e vinho, apresentam alto conteúdo fenólico (Quadro 3) (Balasundram, Sundram e Samman, 2006; Abe et al., 2007). 24 Quadro 3: Conteúdo fenólico de sucos e vinhos. Bebidas Conteúdo fenólico total (mg ácido gálico /L) Sucos comerciais Maçã 339 ± 43 Uva 535 ± 11 Laranja 755 ± 18 Suco fresco Uva 1.728 Laranja 382-1.147 Vinho tinto Argentino 1.593-1.637 Brasileiro 1.947-1.984 Chileno 2.133 Californiano 1.800-4.059 Vinho branco Argentino 216 Brasileiro 256-353 Californiano 220-306 Adaptado de Balasundram, Sundram e Samman, 2006. mg- miligrama; L – litro. 4.3. Produção de vinho e suco de uva O vinho é uma bebida proveniente exclusivamente da fermentação alcoólica de uva madura e fresca ou suco de uva fresca (Brasil, 1973). A definição bioquímica do vinho seria: bebida proveniente da fermentação alcoólica dos açúcares de suco de uva pelas leveduras ou pelas bactérias láticas (Aquarone et al., 2001). O processo de elaboração do vinho está exemplificado no fluxograma da figura 5. 25 Figura 5: Fluxograma de operação para produção de vinho tinto (Barnabé, 2006). 26 O processamento da uva para elaboração do suco e do vinho gera o bagaço de uva como resíduo agroindustrial. O bagaço é definido como o produto resultante da prensagem de uvas frescas, fermentado ou não, constituído pelas partes sólidas das uvas e pelo mosto (Regulamento CE, 1999). Normalmente, o bagaço é usado como ração animal ou fertilizante orgânico. Assim como a uva, o bagaço é rico em polifenóis. Desse modo, o resíduo agroindustrial da vitivinicultura pode ser usado como fonte de polifenóis (Quadro 4). Há uma necessidade por antioxidantes naturais derivados de frutas e plantas, já que antioxidantes sintéticos são considerados tóxicos e carcinogênicos aos humanos (Ferrer et al., 2001; Arvanitoyannis e Varzakas, 2008; Demiral e Ayan, 2011). Quadro 4: Principais aplicações do bagaço de uva na indústria. Uso do resíduo agroindustrial da vitivinicultura Adequação do resíduo Referência Antioxidantes para conservação de alimentos Extração por Soxhlet Bayden, Ozkan e Sagdiç, 2004 Antioxidantes para conservação de alimentos Ausente Balasunndam, Sundann e Sammam, 2006 Produção de ácido glucônico Processo fermentativo Sing e Sing, 2006 Antioxidante para conservação de alimentos Extração por filtração Baydan, Ozkan e Yasar, 2007 Absorção de metais Secagem Farinella, Matos e Arruda, 2007 Produção de ácido lático e biossurfactantes Hidrólise química Rivera et al., 2007 Produção de biodisel e compostagem Ausente Arvanitoyamis e Varzakas, 2008 Atividade antimicrobiana em alimentos Concentração por rotavapor Serra et al., 2008 27 Produção de celulose e hemicelulose Hidrólise química Spino, Pizzoro e Farrei, 2008 Absorção de cobre e níquel Ausente Bhatnagan e Sillarpcia, 2010 Produção de celulose bacteriana Extração aquosa Carreira et al., 2011 Produção de biocombustível para aquecimento e gerador de eletricidade Pirólise Demiral e Ayan, 2011 Imobilização de células para fermentação em estado sólido Ausente Genisheva et al., 2011 Elaboração de farinha para produção de biscoito Maceração Perin e Schott, 2011. Fonte de lignina, celulose e hemicelulose Lavagem e diluição em ácido sulfúrico ou oxidação Ping et al., 2011 4.4. Resíduos agroindustriais Estudos demonstram possíveis finalidades para o bagaço de uva, principalmente como substrato fermentativo para produção de substâncias com elevado nível comercial. O substrato normalmente usado é a glicose comercial, entretanto o uso do bagaço além de representar uma diminuição do resíduo agroindustrial é uma opção mais barata para indústria (Singh e Singh, 2006; Demiral e Ayan, 2011). O bagaço da uva representa aproximadamente 20% do peso de uva colhida. Atualmente, pouca quantidade desse subproduto é reaproveitada. Todos os dias toneladas de frutas e derivados sofrem decomposição inapropriada e são descartadas em ambientes abertos causando sérios danos ao meio ambiente. A bioconversão desse material pode ser parte do controle de poluição do meio ambiente pelo produtor, além de proporcionar a produção com menor custo comercial de outros produtos. O bagaço de uva contém alta concentração de açúcar e é facilmente disponível, podendo ser considerado um bom substrato (Singh e Singh, 2006; Arvanitoyannis e Varzakas, 2008). 28 De acordo com o Decreto-Lei n.o 239/97, de 9 de Setembro, resíduo é qualquer “substância ou objeto de que o detentor se desfaz ou tem intenção ou obrigação de se desfazer, nomeadamente os previstos em portaria dos Ministérios da Economia, da Saúde, da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Ambiente, em conformidade com o Catálogo Europeu de Resíduos, aprovado por decisão da Comissão Européia”. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (Brasil, 2011), dentre os resíduos sólidos, os resíduos agrícolas foram os que apresentaram maior potencial de geração de energia elétrica, principalmente o bagaço de cana de açúcar. Entretanto sabe-se que a maior parte do resíduo agrícola é utilizada para alimentação animal, alimentação humana e fertilizante orgânico, praticas estas consideradas como nobres. Não é possível estimar as quantidades utilizadas de resíduo agrícola, entretanto esta é considerada relevante. O crescimento dos setores agrícolas indica que a geração de resíduos continuará aumentando, porém a legislação vigente não apresenta exigências quanto ao destino dos resíduos. Sendo assim a Lei 9.795 de 27 de abril de 1999 (Brasil, 1999) é utilizada como referência, na qual define educação ambiental como “os processos por meio dos quais o indivíduoe a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competência voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade” (Brasil, 2011). De acordo com a diversidade das possíveis aplicações, confirma-se que o aproveitamento de resíduos materiais das indústrias agrícolas gera um impacto positivo para a indústria correspondente e a economia local e nacional. O uso do resíduo pode diminuir o valor do produto final, além de agregar valor ao resíduo, através da sua utilização e processamento para obtenção de outros produtos, como meios de cultivo. As características nutricionais dos resíduos gerados na vitivinicultura são determinantes na elaboração de meio de cultura específico para cultura de microrganismo de interesse deste setor. 29 4.5. Microbiota da uva A microbiota encontrada na casca da uva é variada e numerosa, a presença de cera na superfície da casca permite a retenção da mesma. Entre os microrganismos presentes na uva, existem os úteis e os indesejáveis (Aquarone, 2001). O conhecimento da microbiota da uva é importante para produção de um vinho com melhor qualidade e atributos desejáveis. As uvas apresentam uma complexa ecologia microbiana que inclui fungos filamentosos, leveduras e bactérias, com diferentes características fisiológicas e efeitos na produção do vinho. A microbiota residente apresenta interações dinâmicas, e estas vão determinar a ecologia microbiana da superfície da uva no tempo de colheita e a comunidade microbiana transferida para o vinho e o suco de uva (Bae, Fleet e Heard, 2004; Li et al., 2010; Barata, Malfeito-Ferreira e Loureiro, 2012). 4.5.1. Fatores que afetam a microbiota da uva Alguns microrganismos são encontrados apenas nas uvas, outros têm capacidade de sobreviver no vinho. A proporção desses microrganismos depende do estágio de maturação da uva e da viabilidade de nutrientes. Condições climáticas como temperatura, exposição aos raios ultravioleta (UV), chuvas e ventos, e os vetores encontrados influenciam na microbiota da uva (Bae, Fleet e Heard, 2004; Chiotta et al. 2009; Barata, Malfeito-Ferreira e Loureiro, 2012). 4.5.2 Principais microrganismos da microbiota da uva Nos estudos envolvendo a microbiota da uva, as leveduras são mais estudadas do que as bactérias sendo encontradas frequentemente, pois exercem papel fundamental na fermentação alcoólica. Leveduras dos gêneros Kloeckera, Metschnikowia, Torulaspora, Issatchenkia, Candida, Dekkera, Brettanomyces, Kluyveromyces e Pichia são encontrados na superfície das uvas, sendo a Hanseniaspora uvarum e Candida zemplinina as mais comuns. As leveduras não pertencentes ao gênero Saccharommyces, normalmente encontrada em menor concentração 30 durante a fermentação alcoólica, complementam a ação da Saccharomyces cerevisiae já que são responsáveis por causar impacto positivo no aroma do vinho, reduzindo a acidez volátil e o conteúdo de ácido málico (Bae, Fleet e Heard, 2004; Zott et al., 2010; Barata, Malfeito-Ferreira e Loureiro, 2012). Dentre as bactérias são encontradas frequentemente na uva as acéticas, destacando-se os gêneros Gluconobacter spp., Acetobacter spp. e Gluconoacetobacter spp. Além destes, as bactérias láticas podem aumentar a produção de compostos sensoriais responsáveis pelas características sensoriais, a formação de aminas biogênicas e fenóis voláteis. As bactérias ácido láticas, principalmente Oenococcus oeni são responsáveis pela fermentação malolática, que melhora o equilíbrio ácido, o flavour e a estabilidade microbiana do vinho. Dentre as bactérias láticas, o gênero lactobacilos e suas aplicações no alimento são mais estudados, tendo importante papel na conservação, produção e alteração de alimentos. O Lactobacillus spp. e o Pediococcus spp. são responsáveis por processos de fermentação espontânea na uva, com produção de vinho. Algumas espécies de lactobacilos são comumente encontradas em uvas, e podem crescer em suco e vinho. Algumas espécies novas foram isoladas recentemente de uvas, como por exemplo Lactobacillus kunkeei, L. nagelii, L. bobalius e L. vini. (Bae, Fleet e Heard, 2004; Manes-Lazaro, 2008; Orduna, 2010; Barata, Malfeito-Ferreira e Loureiro, 2012). 4.5.3. Microrganismos fitopatogênicos Os fitopatógenos são microrganismos que causam danos às plantas, principalmente frutas e vegetais que são mais susceptíveis por apresentarem uma maior concentração de água (Duarte e Ramirez, 2006). No Brasil, as doenças pós colheita causadas por microrganismos fitopatogênicos constituem um grave problema e apresentam prejuízos em torno de 80% do valor total da produção de frutas (Camargo et al., 2011). Desse modo é necessário o uso de fungicidas, o que aumenta o nível de contaminantes no produto final (Coelho, Hoffmann e Hirooka, 2003). 31 Os mecanismos de ataque dos fitopatógenos podem ser por meio de: Enzimas – desintegram componentes estruturais das células do hospedeiro. Por exemplo, as exoenzimas do tipo cutinases, que são esterases que degradam a cutícula, camada lipídica contínua que recobre a epiderme de folhas, frutos e talos jovens. A cutícula tem como principal função evitar a difusão de água e nutrientes para o ambiente externo, protegendo a planta contra efeitos adversos. Outra exoenzima prejudicial às plantas é a celulase que causa colapso das células resultando na formação de lesões, ou alteração do fluxo normal de água devido o bloqueio de elementos vasculares; Fitotoxinas – alteram a permeabilidade das membranas. As fitotoxinas são substância de baixo peso molecular (<1.000 daltons) ativas em concentrações fisiológicas e podem ser peptídeos, glicopeptídeos ou derivados de aminoácidos. Estas substâncias alteram a permeabilidade e o potencial de membranas, causando mudanças no equilíbrio iônico, perda de eletrólitos, inibição ou estímulo de enzimas, aumento na respiração e na biossíntese de etileno; Alteração hormonal – alteram a divisão e crescimento celular. Desequilíbrio hormonal de auxinas que levam a um aumento da plasticidade da célula e alongamento celular, de ciocininas alterando a divisão celular e do etileno, que gera uma desfolha e inibição do crescimento; Ação mecânica – capacidade de atravessar a parede celular causando degradação (Coelho, Hoffmann e Hirooka, 2003). Micotoxinas - metabólitos secundários tóxicos provenientes de vias biossintéticas comuns em fungos que proliferam em produtos agrícolas destinados a alimentação humana e animal. Estas substâncias são consideradas toxinas naturais de difícil controle aliada a termorresistência perante o processamento industrial. Portanto, as micotoxinas são consideradas um dos pontos críticos de controle decisivos no comércio internacional de produtos agrícolas (Coelho, Hoffmann e Hirooka, 2003). O consórcio microbiológico do vinho (leveduras, bactérias acéticas e bactérias lácticas) não é responsável por doenças na uva. Entretanto há microrganismos patogênicos que causam doenças à uva (Quadro 5), prejudicando a produção de suco e vinho, como os fungos 32 filamentosos Botrytis cinerea, Penicillium sp. e Aspergillus sp., conhecidos por sua capacidade de deteriorar as uvas antes da colheita. A presença da micotoxina ocratoxina A, encontrada em vinhos indica contaminação principalmente por Aspergillus carbonarius e Aspergillus nigri durante o cultivo. A presença dessa substância é um risco para o homem já que possui potencial carcinogênico (Bae, Fleet e Heard, 2004; Chiotta et al., 2009; Barata, Malfeito-Ferreira e Loureiro, 2012). Quadro 5: Microrganismos encontrados como fitopatógenos em uvas Microrganismos Espécies fitopatogênicas isoladas Referência Fungos Alternaria alternata, Aspergillus niger, Cladosporium herbarum, Penicillium expansum, Lasiodiplodia theobromae, Rhizopusstolonifer Camargo et al., 2011 Botrystis spp; Penicillium spp.; Rhizopus spp. Coelho, Hoffmann e Hirooka, 2003 Botrytis cinera, Uncinula necator, Plasmopara viticola Rajo, Coello e Rodríguez, 2002 Plasmopara viticola Leite et al., 2011 Botrytis cinera, Aspergilluis niger, Cladosporium cladosporoides, Alternaria alternata, Mucor racemosus, Penicillium expansum Estay, 2006 Bactérias ácido acéticas Acetobacter aceti Estay, 2006 As leveduras que causam danos aos vinhos são encontradas no material de vinificação e dentro de recipientes vinários, como adegas de conservação. As leveduras deterioradoras possuem ação oxidativa, que consiste na oxidação do álcool etílico a acetaldeído, gerando um odor muito forte no vinho. Dentre as principais leveduras deterioradoras encontram-se Candida mycoderma, Hansenula, Pichia ou Bretanomyces. Para evitar esse tipo de levedura, deve-se manter o recipiente de armazenamento do vinho cheio, diminuindo a quantidade de oxigênio (Aquarone, 2001). 33 Outro dano ao vinho provocado por microrganismos é denominado azedia, que consiste no aumento da acidez volátil, é provocada por bactérias acéticas que pertencem ao gênero Acetobacter, sendo mais frequentes as espécies A. rancens e A. ascendens (Aquarone, 2001). 4.6. Presença de microrganismos de interesse industrial na uva 4.6.1. Leveduras No processo de fermentação alcoólica de açúcares os principais produtos como, álcool etílico e gás carbônico, são produzidos em quantidades equimolares (Equação 1). Também são produzidos acetaldeído, glicerol, 2,3 butilenoglicol, ácido lático, ácido succínico, ácido cítrico, que contribuem para o aroma e sabor do vinho (Lerma e Peinado, 2011). C6H12O6 → 2 CH3CH2OH + 2 CO2 Equação 1: Reação química exotérmica de fermentação alcoólica. As leveduras são agentes de fermentação alcoólica. Existe um grande número de espécies de leveduras que se diferenciam pelo seu aspecto, suas propriedades, sua forma de reprodução e também pela maneira de transformar o açúcar em álcool, através de processo fermentativo. As leveduras encontradas na vinificação podem apresentar as formas: elíptica ou oval, alongada, esférica e apiculada; e dois modos de reprodução: vegetativa por brotamento e por formação de esporos. As leveduras se encontram na superfície da uva madura no momento da colheita e são transportadas para a cuba ou recipiente de vinificação. Normalmente, as leveduras são encontradas no solo em camadas superficiais, no verão são transportadas para superfície das uvas pela poeira e sobretudo pelos insetos (Aquarone, 2001). As leveduras apiculadas, como Kloeckera apiculata ou Hanseniaspora uvarum são geralmente responsáveis pelo início da primeira fase da fermentação alcoólica, já que se encontra na uva em estado ativo. Nas uvas danificadas, a fermentação pode ser iniciada com a Torulopsis bacillares capaz de produzir álcool pelo processo de fermentação, entretanto pouco resistente ao 34 anidro sulfuroso, fase na qual as Saccharomyces entram em ação e as leveduras iniciais são inibidas. Na fase final de uma fermentação alcoólica, as espécies dominantes são S. ellipsoideus e S. bayanus, sendo esta última mais alcoogênica (Zott et al., 2010). A sulfitação (adição de ácido sulfúrico) é importante na produção de vinho como agente antioxidante e protetor. Um objetivo essencial é paralisar o desenvolvimento de microrganismos existentes naturalmente no mosto, em particular os indesejáveis. Esses microrganismos não são destruídos, permanecem somente em seu estado latente. Desse modo as leveduras naturalmente presentes e melhor adaptadas podem tornar-se as predominantes (Li et al., 2010). A adição do inóculo contendo leveduras selecionadas ou desejadas em plena atividade, tem como objetivo eliminar as selvagens. Entretanto algumas vezes ocorre falha na seleção da levedura e dificuldade na operação. A seleção da levedura deve levar em consideração características fisiológicas como rendimento da produção de álcool, poder alcoogênico, resistência à temperatura elevada, grande produtora de glicerol, pequena produção de ácido acético, produção de aroma particular e degradação de ácido málico (Aquarone, 2001). As vantagens do emprego de leveduras, quando bem realizado são: • Início da fermentação rapidamente; • Fermentação regular, com conclusão mais rápida, gerando um aumento no rendimento da produção de álcool; • Boa conservação do vinho, sendo mais seco e isento de açúcares fermentáveis (Aquarone, 2001, Li et al., 2010). 4.6.2. Bactérias ácido láticas Durante séculos observou-se que após o término da fermentação alcoólica, determinados vinhos tintos de mesa turvavam e liberavam pequenas bolhas de gás. Esse fenômeno não ocasionava prejuízo à qualidade, ao contrário parecia contribuir para a melhoria do vinho. Posteriormente verificou-se que se tratava de transformação biológica ocasionada por bactérias, e denominou-se fermentação malolática (Aquarone, 2001). 35 A fermentação malolática consiste essencialmente na descarboxilação bacteriana do ácido málico em ácido lático, com liberação de gás carbônico. Esse fenômeno ocorre naturalmente em muitos vinhos tinto de mesa. Essa reação é importante na maioria das regiões vinícolas do mundo, particularmente naquelas como as brasileiras, onde os vinhos apresentam acidez elevada. A fermentação malolática pode ocorrer durante, logo em seguida, após meses ou um ano após a fermentação alcoólica, sendo então considerada tardia. Para que ocorra a fermentação malolática é necessário que o vinho esteja armazenado em ambiente de temperatura amena, com adição moderada de ácido sulfúrico, pH elevado devido uso de carbonato de cálcio, ou adição de borra de vinho que tenha concluído a fermentação malolática. A inoculação de bactérias láticas apropriadas pode influir favoravelmente na fermentação malolática. Existem bactérias láticas comerciais para o emprego na produção de vinho tinto ou branco (Rodas, Ferrer e Pardo, 2003; Cañas et al., 2008). A bactéria lática Oeneococcus oeni é a espécie predominantemente responsável pela fermentação malolática, entretanto outras espécies têm sido descritas com o mesmo potencial. As bactérias determinadas como responsáveis pela fermentação malolática além de O. oeni são do gênero Lactobacillus, Leuconostoc e Pediococcus (Ruiz et al., 2010). A fermentação malolática apresenta três efeitos no vinho: • Reduz a acidez fixa; • Estabiliza o vinho assegurando que a fermentação malolática não ocorra quando engarrafado; • Aumenta o aroma do vinho (Hernández-Orte et al., 2009). O metabolismo do ácido málico pelas bactérias láticas pode ser realizado de duas maneiras: 1) Bactérias que possuem a enzima málica, transformam o ácido málico inicialmente em ácido pirúvico e gás carbônico na presença da co-enzima nicotinamida adenina dinucleotídeo (NAD). Em seguida o ácido pirúvico é imediatamente reduzido a ácido 36 lático pela desidrogenase lática (LDH) com associação de nicotinamida difosfato reduzida (NADH); 2) Enzima trans-hidrogenase málica transforma os ácidos málicos e pirúvico em ácidos oxalacético e lático (Aquarone, 2001). Outra aplicação das bactérias láticas na indústria do vinho é sua capacidade de alterar frações voláteis do vinho liberando compostos aromáticos como fenóis voláteis, terpenos e lactonas a partir de precursores encontrados na uva (Cañas et al., 2008; Hernandez-Orte et al., 2009). 4.7. Microrganismos pectinolíticos Aproximadamente 10% dos microrganismos do solo são pectinolíticos. Os fungos Kluyveromyces, Aspergillus, Rhizopus, Trichoderma, Penicillium e Fusarium são conhecidos como bons produtores de pectinases, podendo ser utilizados em escala industrial, pois cerca de 90% das enzimas produzidas podem ser secretadas no meio de cultura. Dentre as bactérias a produçãode pectinase é mais encontrada nos gêneros: Achromobacter, Aeromonas, Arthrobacter, Agrobacterium, Enterobacter, Bacillus, Clostridium, Erwinia, Flavobacterium, Pseudomonas e Xanthomonas. A atividade pectinolítica não é comum em bactérias láticas, mas há estudos que mostram a ocorrência em Leuconostoc mesenteroides, Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus casei, Lactobacillus plantarum e Lactococcus lactis (APHA, 2001; Uenojo e Pastore, 2006; Benoit et al., 2012). O método básico de detecção de organismos pectinolíticos é o crescimento dos organismos em meio de cultura sólido com adição de pectina. A produção da enzima pelo organismo pode ser observada por depressões no meio ou pela revelação com substância que faça deposição do substrato pectina. Desse modo ao redor da colônia produtora de pectinase será formada uma zona clara onde o substrato foi degradado, enquanto as colônias não produtoras permanecerão opacas (APHA,2001). 37 4.7.1. Pectina A pectina é um dos maiores e mais complexos componentes da lamela média das paredes primárias de células de vegetais superiores, com função estrutural. Pertence a uma família de polissacarídeo composto por 17 monômeros com mais de 20 ligações glicosídicas do tipo α-1,4 parcialmente esterificados por grupos metil-éster (Figura 6). A pectina é composta por 6 estruturas covalentemente ligadas formando um esqueleto com cadeias laterais. A pectina é classificada em protopectina, a forma nativa unida com outros constituintes das células vegetais, insolúvel em água e totalmente metoxilada; ácido péctico, composto de resíduos de ácido poligalacturônico coloidal completamente desmetoxilada; e pectina e ácido pectínico que possuem um grau variável de metoxilação e, em condições adequadas, são capazes de formar géis com ácidos e açúcares (Uenojo e Pastore, 2006; Benoit et al., 2012). Figura 6: Estrutura primária da pectina. 4.7.2. Definição e nomenclatura da enzima pectinase Enzimas são compostos bioativos que regulam mudanças em tecidos vivos. As pectinases pesam em torno de 30-80 KDa (quiloDaltons) e são um grupo heterogêneo de enzimas que hidrolisam as substâncias pécticas presentes principalmente em plantas. De acordo com seu sítio de ação, são classificadas e recebem sua nomenclatura (Sharma, Rhatore e Sharma, 2012): - Poligalacturonase PG (EC 3.2.1.15); - Pectinaliase PNL (EC 4.2.2.10); - Pectatoliase PL (EC 4.2.2.2); - Pectina esterase PE (EC3.1.1.11). 38 4.7.3. Importância prática, econômica e aplicação industrial As enzimas pectinolíticas ou pectinases são usadas principalmente na extração de suco de frutas e sua clarificação, tratamento de fibra têxtil e extração de óleo vegetal. Elas hidrolisam as substâncias pécticas, sob diferentes mecanismos de ação. Essas enzimas são classificadas em pectinoesterase que promovem a desesterificação da cadeia de pectina e despolimerase que são responsáveis pela quebra desta cadeia. Dentre as despolimerases, a poligalacturonase é a enzima com função hidrolítica principal. Para maioria das finalidades industriais, as poligalacturonases produzidas por fungos são úteis por sua atividade ótima em pH baixo, servindo para grande parte das aplicações em processos com frutas e vegetais. Países como Estados Unidos e Japão produzem pectinases e preparação comerciais de pectinases. Atualmente essas enzimas correspondem a cerca de 25% do mercado mundial de enzimas, com valor de vendas estimado em 1 bilhão de dólares (Dinu et al., 2007; Santos et al., 2008; Benoit et al., 2012). A hidrólise enzimática da pectina apresenta vantagens sobre a hidrólise química, já que atua em sítios específicos da molécula, enquanto a química é pouco especifica. Esse fator é importante quando a hidrólise parcial é necessária para produção de oligossacarídeos específicos. Para atender esse requerimento, misturas de enzimas pectinolíticas são produzidas. Diferentes microrganismos produzem diferentes enzimas que hidrolisam a molécula de pectina em pontos específicos, formando oligossacarídeos distintos. A maior parte das enzimas é produzida por fungos filamentosos (Benoit et al., 2012). Os sucos de uva possuem alto teor de pectinase sendo, portanto difíceis de espremer e prensar. No processamento das frutas para obtenção de suco (Figura 7) as frutas são primeiramente esmagadas e aquecidas a temperaturas de 60-80ºC e as enzimas pectinases são adicionadas para aumentar o rendimento nesse ponto do processo, além de diminuir o tempo de prensa. Por filtração ou centrifugação, a parte líquida é separada da sólida. O líquido é, portanto resfriado a 0oC de modo a evitar a fermentação. E então, ocorre novamente a adição de pectinases na quantidade de 200 ppm durante 2 semanas. As enzimas permitem a floculação das partículas em suspensão que são retiradas posteriormente por filtração. O suco finalmente é concentrado, 39 pasteurizado e engarrafado. Para produção do vinho, a enzima pode ser adicionada na etapa após a fermentação, quando o vinho está pronto para ser engarrafado para aumentar a taxa de filtração e a limpidez (Kashyap et al., 2001). Figura 7: Ação da pectinase na produção do suco de uva (Rizzon e Meneguzzo, 2007). As pectinases usadas na indústria de vinho e sucos de frutas são principalmente provenientes de Aspergillus niger. A pectina pode causar problemas na indústria de alimentos, aumentando a turbidez e a viscosidade durante a extração, filtração e clarificação. No caso de sucos como maçã, pêra e uva as enzimas são adicionadas para aumentar o rendimento do suco durante o esmagamento, melhorando até 100% do rendimento e para realizar o processo de clarificação. O uso de enzimas também permite uma diminuição do tempo de filtração em até 50%. As enzimas pectinolíticas também podem atuar na água residual de processamento em 40 indústrias de alimentos. O pré-tratamento dessa água com pectinase melhora a remoção desse material, facilitando seu descarte (Kashyap et al., 2001; Gogus, 2006). A pectinase disponível no mercado é produzida por fermentação em estado sólido, de modo a diminuir o custo da produção, uma série de derivados de frutas são usados como material para imobilização. A utilização de resíduos agroindustriais como substrato de baixo custo para a produção microbiana de enzimas resulta em um processo econômico e promissor. Entretanto, a etapa de purificação ainda é cara. Bactérias pectinolíticas são mais baratas e mais facilmente disponíveis para gestão ambiental. O uso de bactérias pectinolíticas isoladas da microbiota da uva pode potencializar a ação enzimática além de reduzir os custos e aumentar o rendimento (Heerd, 2012; Sharma, Rathore e Sharma, 2012). 4.7.4. Mecanismos de ação das pectinases As enzimas pectinolíticas podem ser classificadas em três grandes grupos, dependendo se o substrato alvo é a pectina, ácido péctico ou o oligo-D-galacturonato, se a pectinase atua realizando transeliminação ou hidrólise, ou se a quebra da molécula ocorre de forma randômica (Jayani, Saxena e Gupta, 2005). Os 3 principais modos de ação da pectinase são (Figura 8): a) Protopectinases – degrada a protopectina insolúvel originando uma molécula de pectina solúvel e altamente polimerizada. Essa enzima é encontrada principalmente em leveduras e bactérias do gênero Bacillus sp.; b) Esterases – catalisa a desesterificação da pectina removendo metoxi-esters. A pectina- esterases (PE) catalisa a desesterificação de metil-ester ligados ao esqueleto galacturônico liberando moléculas de pectina ácida e metanol. As pectinases de fungos atuam desse modo de forma randômica, removendo grupos metil de diferentes posições; c) Depolimerase – catalisa a hidrólise da ligação α-(1,4)-glicosídica no ácido D- galacturônico das substâncias pécticas. Estas são subdivididas em hidrolases ou liases. As hidrolases podem ser do tipo poligalacturonase(PG) que catalisa a hidrólise do ácido 41 poligalacturônico com a adição de uma molécula de água na ligação de ponte de hidrogênio. Estas são as mais estudas dentro das pectinases, encontradas em fungos, bactérias e leveduras. Outro tipo de hidrolase são as polimetilgalacturonase (PMG) que quebra a molécula de pectina pelo mecanismo de hidrólise. As liases promovem quebras não hidrolíticas na molécula de pectina e são encontradas como: poligalacturonato liase (PGL), que quebra a molécula de pectato por β-eliminação. A polimetilgalacturonase liase, promove a quebra da pectina pela β-eliminação. As liases são produzidas por bactérias e fungos, sendo a sua forma endógena mais abundante que a forma exógena (Gogus, 2006). 42 Figura 8: Mecanismos de ação das pectinases: (a) R=H para PG e CH3 para PMG; (b) PE. (c) R=H para PGL e CH3 para PL. A seta indica o local onde a pectinase reage com a substância péctica (Gogus, 2006). PMG: polimetilgalacturonase; PG: poligalacturonase; PE: pectinesterase; PL: pectina liase. 4.8. Microrganismos com potencial probiótico 4.8.1. Microrganismos probióticos Probióticos são “microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem benefícios à saúde do hospedeiro” (FAO/WHO, 2006). A maioria dos microrganismos considerados como probióticos fazem parte do grupo de bactérias ácido láticas (BAL), que são cocos, cocobacilos ou bacilos Gram-positivos, imóveis, 43 catalase negativos, não esporogênicos, preferem condições anaeróbias, mas são aerotolerantes, fermentadores obrigatórios e produzem ácido láctico como o principal produto final, durante a fermentação de carboidratos. Os principais gêneros representantes probióticos das BAL são: Aerococcus, Carnobacterium, Enterococcus, Lactobacillus, Lactococcus, Leuconostoc, Oenococcus, Pediococcus, Streptococcus, Tetragenococcus, Vagococcus e Weissella. Também utilizada como probiótico, a classificação de Bifidobacterium spp. como BAL é controversa, sendo mais considerada como uma BAL tecnológica. Existem probióticos que não são BAL, como os gêneros Bacillus e Escherichia, assim como leveduras, sendo a Saccharomyces spp. a mais utilizada (Axelsson, 2004; Costa, 2003; Costa, 2006). Entretanto, os principais organismos utilizados como probióticos em alimentos são Lactobacillus spp. e Bifidobacterium spp. (Fernandes, 2009). O gênero Lactobacillus, pertence ao filo Firmicutes, classe bacilos, ordem Lactobacillales e família Lactobacillaceae, encontrado em ambientes ricos em carboidratos, Gram-positivo, não formador de esporos, catalase negativo, microaerofílico. Podem ser homofermentativos, pela via Embden-Meyerhof-Parnas (glicolítica), onde o principal produto final é o ácido lático, ou heterofermentativos, através da via Fosfocetolase em que são produzidas, além do lactato, uma grande variedade de outros produtos de fermentação como etanol, acetato, CO2, ácido fórmico, diacetil, acetoína e 2,3-butanodiol de citrato. Todos estes compostos contribuem para as propriedades sensoriais e nutricionais dos produtos fermentados (Vasiljevic e Shah, 2008; Oliveira et al., 2012). O gênero Lactococcus apresenta-se como cocos Gram-positivos, microaerofílicos e homofermentadores obrigatórios, produzindo ácido láctico. Tem sido comumente isolados de milho, repolho, alface, abóbora, dentre outros. Geralmente, não são encontrados em material fecal ou solo, e podem ocorrer em pequeno número na superfície do corpo da vaca e em sua saliva, sendo comum seu isolamento em leite cru. Além disso, apresentam grande interesse pela indústria de alimentos, visto que são empregados como culturas iniciadoras puras ou mistas para a produção de diferentes produtos lácteos fermentados como queijos, iogurtes e manteiga (Stiles e Holzapfel, 1997). 44 4.8.2. Mecanismos de ação de microrganismos probióticos O uso de probióticos em alimentos tem como principal objetivo trazer benefícios à saúde do consumidor (Holzapfel, 2006; Schmid et al., 2006). Contudo, melhorias na qualidade do produto, como controle de patógenos (Diez-Gonzalez e Schamberger, 2006) pode ser esperado, quando a cepa probiótica possui essa característica. Desta forma, os probióticos, em virtude da produção de bacteriocinas e de seus metabólitos, têm sido empregados como biopreservantes nos alimentos, o que confere maior segurança ao consumidor, que cada vez mais prefere produtos livres de conservantes químicos e microbiologicamente seguros (Dabés, Santos e Pereira, 2001; Holzapfel, Geisen e Schillinger, 1995). A nisina, a única bacteriocina purificada e aprovada para alimentos em diversos países, inclusive no Brasil, é produzida por Lactococcus lactis ssp. lactis. Essa bacteriocina foi identificada pela primeira vez em leite fermentado e, desde então, tem sido isolada de outros leites e produtos lácteos, bem como de vegetais e água de rio. A nisina possui importância tecnológica, sendo empregada na indústria de lacticínios por apresentar atividade antimicrobiana contra um amplo espectro de microrganismos Gram-positivos, além da prevenção da germinação, dos esporos de bactérias esporogênicas, como Bacillus e Clostridium (Beasley e Saris, 2004). As bactérias produtoras de nisina estão presentes no leite humano e, por isso, podem proteger a lactante da mastite e o lactente da intoxicação por Staphylococcus aureus. No entanto, os potenciais efeitos da ingestão de bactérias produtoras de nisina no trato gastrointestinal e na sua microbiota permanecem desconhecidos. É sabido que essas bactérias sobrevivem à passagem através do intestino, mas não, se a nisina é produzida no trato gastrointestinal (Jozala et al., 2005). Adicionalmente, como resultado das suas propriedades antimicrobianas, a nisina tem sido utilizada no tratamento de úlceras de estômago e cólon (Jozala et al., 2011). Diversos países permitem o uso da nisina em produtos lácteos como leite, queijo, além de tomates, vegetais 45 enlatados, sopas enlatadas, maionese e alimentos infantis. No Brasil, a nisina é aprovada para uso em todos os tipos de queijo no limite máximo de 12,5 mg/kg (Oliveia, Siqueira e Silva, 2012). Os principais benefícios atribuídos aos probióticos são aumento da tolerância e digestão da lactose; influência positiva na microbiota intestinal; redução do pH intestinal; melhora do peristaltismo contribuindo para a prevenção da constipação intestinal; efeitos hipocolesterolêmico, anticarcinogênico e anti-hipertensivo; redução de compostos tóxicos; síntese de vitaminas do complexo B como ácido fólico, cianocobalamina, biotina e ácido pantotênico; restauração da microbiota normal após antibioticoterapia; tratamento e prevenção de diarréia aguda por rotavírus e gastroenterite; redução da atividade ulcerativa de Helicobacter pylori; controle da colite induzida por rotavírus e por Clostridium difficile; imunoestimulação; diminuição do risco de doenças cardiovasculares e prevenção da obesidade, do diabetes mellitus não insulino-dependentes e da osteoporose, em função do aumento da biodisponibilidade de minerais como o cálcio (Buriti e Saad, 2007; Burgain et al., 2011; Costa, 2006; Prado et al., 2008; Quigley, 2010). Os efeitos dos probióticos podem ser classificados em três modos de ação: • Capacidade de modular as defesas do hospedeiro, incluindo o inato, bem como o sistema imune adquirido, estando relacionado não só com a prevenção e terapia de doenças infecciosas, mas também com o tratamento de inflamação crônica do trato digestório e à erradicação de células neoplásicas; • Estabelecimento de um balanço microbiano intestinal, modificando o ecossistema de microrganismos que habitam o intestino humano, devido à competição pelos sítios de aderência, impedindo a colonização de patógenos e estimulando osistema imune, de forma a agir na prevenção e terapia de infecções e na restauração do equilíbrio microbiano no intestino; • Inativação de toxinas e de desintoxicação de componentes alimentares no intestino (Paseephol e Sherkat, 2009; Oelschlaeger, 2010). A maioria dos mecanismos de ação destes efeitos protetores das culturas probióticas à saúde humana ainda não foi completamente esclarecida (Quadro 6). No entanto, alguns efeitos já 46 foram comprovados cientificamente, como a prevenção da diarréia e alívio da intolerância à lactose. Quadro 6: Efeitos benéficos à saúde, atribuídos pelos probióticos e seus respectivos mecanismos de ação. Efeitos protetores Mecanismo de ação Alívio da intolerância a lactose Sistema de enzima β-galactosidase Prevenção e redução dos sintomas de diarréia associada a antibiótico e por Rotavírus Exclusão competitiva Melhora do sistema imune Tratamento e prevenção de alergia (eczema atópico e alergia alimentar) Regulação do sistema imunológico Redução do risco associado à mutagenicidade e carcinogenicidade Metabolismo de agentes mutagênicos Alteração da microbiota e da atividade metabólica intestinal Imunidade intestinal aumentada Efeito hipercolesterolêmico Desconjugação de sais biliares Inibição da Helicobacter pylori e outros patógenos intestinais Exclusão competitiva Produção de compostos antimicrobianos Prevenção de doença inflamatória do intestino Exclusão competitiva Modulação da resposta imune Produção de compostos antimicrobianos Decomposição de antígenos patogênicos Estimulação do sistema imune Indução da imunidade inata adquirida Fonte: Vasiljevic e Shah, 2008. 4.8.3. Legislação para probióticos Um microrganismo para ser considerado como probiótico deve atender a diferentes critérios pré-definidos que englobam aspectos de segurança, tecnológicos, funcionais e fisiológicos desejáveis: status GRAS; história do uso seguro em alimentos; benefícios para a 47 saúde documentados; propriedades antimutagênica e anticarcinogênica; histórico de não patogenicidade; tolerância às substâncias antimicrobianas; adesão à mucosa intestinal; colonização, ao menos temporariamente, do trato gastrointestinal humano; capacidade de reduzir à adesão das superfícies de patógenos; atividade antimicrobiana contra bactérias potencialmente patogênicas através da produção de compostos como bacteriocinas, ácidos orgânicos, peróxido de hidrogênio; ausência de genes determinantes da resistência aos antibióticos; imunoestimulação sem efeito pró-inflamatório; tolerância ao ácido, suco gástrico humano e à bile; resistência aos fagos; tolerância ao oxigênio e calor; atividade metabólica desejada; capacidade de crescer em leite; boas propriedades sensoriais; permancer viável e estável durante o processamento e estocagem de alimentos, até o momento de seu consumo (Naidu e Bidlack e Clemens, 1999; Holzapfel, 2006; Saad, 2006). Para se estabelecer potenciais benefícios dos probióticos a saúde, é necessário que sejam realizados estudos in vitro antes dos ensaios in vivo. Além disso, as estirpes devem ser testadas individualmente para cada propriedade, visto que as características atribuídas a uma estirpe probiótica são cepa-específica (Monteagudo-Mera et al., 2012). Independentemente da forma de introdução dos probióticos, a quantidade final de células devem obedecer à legislação vigente do país. Segundo a legislação brasileira, a manutenção da viabilidade e estabilidade do microrganismo probiótico durante o uso e a estocagem do produto, deve variar entre 108 e 109UFC na recomendação diária do produto, além da capacidade de sobrevivência no ecossistema intestinal, condição necessária à promoção das alegações de saúde e propriedades funcionais de um probiótico (Figura 9) (Brasil, 2008). Contudo, culturas não viáveis podem exercer certos efeitos benéficos como a imunomodulação (Ouwehand et al., 1999). No Brasil, a Comissão Tecnocientífica de Assessoramento em Alimentos Funcionais e Novos Alimentos, instituída junto à Câmara Técnica de Alimentos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), têm avaliado os produtos com alegações de propriedades funcionais e/ou de saúde aprovados no país, como por exemplo os alimentos probióticos. Para a comercialização, deve haver um registro prévio mediante a comprovação científica da sua eficácia, a qual deve ser avaliada caso a caso, tendo em vista que podem ocorrer variações na ação do composto bioativo, em função da matriz ou formulação do 48 produto (Brasil, 2008; Komatsu,Buriti e Saad, 2008). Estas alegações podem fazer referências à manutenção geral da saúde, ao papel fisiológico dos nutrientes e não nutrientes, bem como à redução de risco de doenças, não sendo permitidas aquelas que façam menção à cura ou prevenção de doenças (Moraes e Colla, 2006). Figura 9: Alegação de propriedade funcional aprovada para os alimentos probióticos e os requisitos específicos (Brasil, 2008) 49 4.8.4. Aplicação de microrganismos probióticos Os microrganismos probióticos são aplicados em uma variedade de produtos, sendo em sua maioria de origem láctea. Entretanto estudos utilizam alimentos de origem vegetal (Quadro 7) e origem animal para adição do caráter probiótico. Quadro 7: Substratos de origem vegetal utilizados como veículo de microrganismos probióticos Microrganismo Produto Referência Enterococcus faecium CRL 183 Sorvete de “iogurte” de soja Miguel e Rossi (2003) Bifidobacterium lactis Bb- 12 Maçã e mamão in natura Tapia et al. (2007) Lactobacillus rhamnosus GG Maçã in natura Alegre et al. (2011) Lactobacillus paracasei LAFTI® L26 Sucos de frutas Rodrigues et al. (2011) No Brasil a aplicação de probióticos em produtos alimentícios é crescente, como demonstrado no Quadro 8. 50 Quadro 8: Aplicação de microrganismos probióticos em produtos no Brasil Microrganismo Produto Referência Lactobacillus acidophilus LAC4, Bifidobacterium longum BL04 Queijo petit-suisse Maruyama et .al. (2006) My Bio 6 (Streptococcus thermophilus, Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus, Bifidobacterium e Lactobacillus acidophilus) Bebida láctea Thamer e Penna (2006) Bifidobacterium animalis subsp. lactis BB12, Mesophilic Aromatic Culture (MAC CHN-22) (Lactococcus lactis subsp. cremoris, Lactococcus lactis subsp. lactis, Lactococcus lactis subsp. lactis biovar. diacetylactis e Leuconostoc mesenteroides subsp. cremoris) Bebida láctea (buttermilk) Antunes et.al. (2007) Lactobacillus rhamnosus (Rhodia) Queijo prato Cichoski et al. (2008) MyBio 6 e MyBio 2 (Streptococcus thermophilus, Lactobacillus delbrueckii subsp. Bulgaricus, Lactobacillus acidophilus e Bifidobacterium) Bebida láctea com pêssego Kempka et al. (2008) Bio-Rich®(Bifidobacterium Bb-12 e Lactobacillus acidophilus LA-5) Frozen yogurt de leite de cabra Alves et. al. (2009) L. rhamnosus GG ATCC 53103, B. animalis ssp. lactis DN-173 e L. lactis ssp. lactis ATCC 11454 Glóbulos similares à ovas de salmão e doce à base de surimi Guimarães (2012) 51 4.9. Seleção e isolamento de microrganismos de interesse 4.9.1. Métodos tradicionais Métodos tradicionais são conhecidos como método “ouro” ou método padrão de escolha, e estão envolvidos principalmente com técnicas de cultivo. Tais métodos baseiam-se na multiplicação do organismo alvo usando meios nutritivos em ágar ou caldo para obter um crescimento visível, e assim realizar isolamento ou contagem microbiológica (Jasson et al., 2010). A utilização de meios seletivos e diferenciais é aparentemente mais simples, entretanto esses métodos são mais demorados e podem não ser representativos principalmente em análise de microrganismos semelhantes entre si, onde a caracterização baseada em técnicas fenotípicas e bioquímicas
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