Buscar

CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO HUMANO E APRENDIZAGEM MOTORA

Prévia do material em texto

45 
 
adultos úteis ao mundo do trabalho. As mudanças socioeconômicas interferiram 
diretamente no modo de ver e atender as crianças, o que implicou na criação e, até 
hoje na reconfiguração dos espaços de atendimento à criança pequena e no modo de 
conceber a infância. 
6. CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO HUMANO E APRENDIZAGEM 
MOTORA 
 
Fonte: shre.ink/mwUI 
 
O processo do aprender sempre causou grandes dúvidas e inquietações no ser 
humano. Há algum tempo tanto os profissionais da educação como da psicologia se 
desdobram na tentativa de explicá-lo. Atualmente, diversas teorias falam como 
acontece a aprendizagem e suas variadas formas. O que se sabe esse processo 
envolve inúmeros aspectos como o biológico, o social, o psíquico e o cognitivo. No 
entanto, antes de abordar o desenvolvimento cognitivo, considere que o processo de 
aprendizagem acontece desde o período uterino até o estágio final da vida, sendo 
contínuo, permanente e cumulativo. 
6.1. Conceitos e características e desenvolvimento cognitivo 
Para o professor atingir seu objetivo ao ensinar, se faz necessário compreender 
tanto as características do seu aluno como do funcionamento desse processo de 
ensino-aprendizagem. Del Prette (2012) aponta que ela pode ser não reflexiva (que 
46 
 
exige pouca atividade intelectual de parte de quem aprende) e reflexiva (quando 
requer uma capacidade cognitiva maior). 
Segundo Linhares (2017), o desenvolvimento cognitivo ocorre por meio de 
processos relativos à aquisição de conhecimento, os quais são a percepção 
(reconhecer determinada situação), a atenção (estar centrado nela), a memória 
(lembrar-se dela) e o raciocínio (resolver ou pensar nela). A autora explica cada um 
desses processos da seguinte forma: 
➢ Percepção: conjunto de processos psicológicos pelos quais as pessoas 
reconhecem, organizam, sintetizam e atribuem significado (no cérebro) às sensações 
recebidas dos estímulos ambientais (nos órgãos dos sentidos). 
➢ Atenção: relação cognitiva entre a quantidade limitada de informação, que é 
realmente manipulada mentalmente, e a enorme quantidade de informação disponível 
por meio dos sentidos e das memórias armazenadas. 
➢ Memória: meios pelos quais as pessoas recorrem ao conhecimento 
passado, a fim de utilizá-lo no presente. Servem para codificar, armazenar e recuperar 
uma informação. 
➢ Raciocínio: processo cognitivo pelo qual uma pessoa pode inferir uma 
conclusão a partir de um grupo de evidências ou de declarações de princípios. 
Os autores que seguem esta corrente enfatizam uma linha chamada de teorias 
cognitivas. Cavalcanti e Ostermann (2011, p. 31) apontam que ela “preocupa-se com 
o processo de compreensão, transformação, armazenamento e uso da informação 
envolvido na cognição e procura regularidades nesse processo mental”. Entre seus 
autores, se destacam Jerome Bruner, David Ausubel e, sobretudo, Jean Piaget. 
Piaget é o principal autor da linha construtivista, a qual não aceita uma visão 
imutável e tradicional de educação, em que o conhecimento está pronto e acabado. 
O construtivismo se baseia em mudanças de ordem qualitativa que ocorrem no 
decorrer do desenvolvimento (LINHARES, 2017), no qual o conhecimento parte da 
interação dos seres humanos com os outros, com o meio ambiente e os objetos, e a 
aprendizagem somente acontece com a desordem e ordem daquilo que já existe 
dentro de cada sujeito (PIAGET, 1973). 
Esse processo de conhecimento baseado na interação se chama de 
assimilação e acomodação. 
Segundo o Piaget (1973, p. 13), assimilação é: 
47 
 
[...] uma integração a estruturas prévias, que podem permanecer invariáveis 
ou são mais ou menos modificadas por esta própria integração, mas sem 
descontinuidade com o estado precedente, isto é, sem serem destruídas, mas 
simplesmente acomodando-se à nova situação. 
Linhares (2017) sublinha que ela é a incorporação de dados sobre os objetos, 
acontecimentos ou conceitos aos esquemas existentes. Por exemplo, ao ter um 
esquema de cachorro na mente, a criança pode chamar qualquer animal de quatro 
patas de cachorro. Já a acomodação é toda mudança de comportamento e alteração 
do sujeito, que acontece apenas quando este se transforma, amplia ou muda os seus 
esquemas (NEVES, 2018). 
Linhares (2017) afirma que ela se trata de qualquer modificação de um 
esquema ou uma estrutura pelos elementos assimilados e leva à construção de novos 
esquemas de assimilação, promovendo, dessa forma, o desenvolvimento cognitivo 
(CAVALCANTI; OSTERMANN, 2011). Para Piaget (1973), somente há aprendizagem 
quando o esquema de assimilação sofre acomodação. Por exemplo, ao acomodar o 
esquema do cachorro, a criança sabe que não se aplica a um gato, apesar de ambos 
terem quatro patas. 
Outro elemento importante na aprendizagem para Piaget é o processo de 
equilibração: 
A mente, sendo uma estrutura para Piaget, tende a funcionar em equilíbrio. 
No entanto, quando esse equilíbrio é rompido por experiências não 
assimiláveis, a mente sofre acomodação a fim de construir novos esquemas 
de assimilação e atingir novo equilíbrio. Esse processo de reequilíbrio é 
chamado de equilibração majorante e é o responsável pelo desenvolvimento 
mental do indivíduo. Portanto, na abordagem piagetiana, ensinar significa 
provocar o desequilíbrio na mente da criança para que ela, procurando o 
reequilíbrio, se reestruture cognitivamente e aprenda (CAVALCANTI; 
OSTERMANN, 2011, p. 33). 
Há também outro elemento essencial na aprendizagem, o erro. La Taille, 
Oliveira e Dantas (1997, p. 25) citam que a teoria piagetiana da inteligência humana 
reorganizou o enfoque sobre esse aspecto, porque, para Piaget, se uma pessoa 
segue errando, três situações podem ocorrer. Na primeira, a pessoa não tem estrutura 
suficiente para compreender o conhecimento desejado e, para isso, deve-se criar um 
ambiente melhor de clima, diálogo ou trabalho para atingir tais estruturas. Já na 
segunda situação, ela pode estar com estruturas em formação e, portanto, trabalha-
se com a ideia de que o erro é constitutivo e o professor deve fazer a mediação 
colaborando, assim, para que o aluno supere suas dificuldades. 
48 
 
Na última, ela possui as estruturas formadas e não aprende, com isso, os 
procedimentos estão errados. Piaget aponta, ainda, que as respostas erradas são 
geralmente associadas à imprecisão ou à falta de conhecimento do aluno, porém, 
afirma que elas sublinham o estágio do pensamento da criança. Assim, o autor sugere 
que o professor, antes de tudo, observe a criança frente à tarefa dada para saber de 
qual ajuda ela necessita. 
Fases do desenvolvimento cognitivo 
Entre as análises dos modos de aprendizagem e conhecimento do ser humano, 
Jean Piaget caracterizou, em quatro períodos, o estágio de desenvolvimento 
cognitivo: sensório-motor, pré-operacional, operacional-concreto e operacional-
formal. 
Sensório-motor 
Abrange, aproximadamente, dos 0 aos 2 anos e está dividida em seis 
subestágios. Piaget (1973) aponta as seis características principais dessa fase. 
1. Reflexo: no qual ela não se diferencia do mundo exterior, servindo como um 
conector entre o bebê e seu ambiente. Os bebês têm a capacidade de diferenciar 
objetos (como quando aprendem que alguns podem ser sugados, e outros não); 
quanto à integração, característica que permite uma coordenação com as duas mãos, 
por exemplo, quando seguram um brinquedo com uma mão, e o braço da mãe com a 
outra (COLE; COLE, 2003). 
2. Primeiras diferenciações: nelas, existe uma coordenação entre mão e boca, 
bem como uma diferenciação entre pegar e sugar, surgem os primeiros sentimentos 
como a alegria, a tristeza, o prazer e desprazer, que estão ligados à ação. Meneses 
(2012) aponta que, nessa etapa, os bebês também começam a se atentar aos sons, 
demonstrando capacidade de coordenar diferentes tipos de informações sensoriais, 
como visão e audição, e seu universo visual com o tátil. 
3. Reproduçãode eventos interessantes: nela, surge os primeiros sons da fala, 
e os bebês começam a entender que os objetos são mais que extensões de suas 
próprias ações, no entanto, não possuem noção de espaço a sua volta (COLE; COLE, 
2003). 
49 
 
4. Coordenação de esquemas: nela, começa-se a usar um esquema em outras 
coisas para ver se obtém o mesmo resultado, por exemplo, a criança balança um 
chocalho e vê que aquilo faz barulho, ao pegar outro objeto, ela vai balançar para ver 
se também fará barulho. 
5. Experimentação: nela, há a invenção de novos meios, a criança passa a criar 
novos comportamentos, ações a partir da tentativa e do erro, bem como consegue a 
inteligência ao solucionar problemas. Meneses (2012) cita que ela realiza imagens 
mentais, a capacidade de representar de modo simbólico uma realidade mentalmente. 
6. Representação: nela, começa-se a ter um sentimento de escolha, o que quer 
ou não fazer. A criança passa a escolher objetos, brinquedos de que mais gosta, 
preterindo os demais. 
Piaget aponta que, até os 8 meses, há uma total ausência de noção, em que, 
se um objeto é ocultado da frente da criança, ela age como se ele não existisse mais, 
como a brincadeira em que os pais cobrem o rosto, sendo que, para ela, eles não 
estão mais ali. A partir dessa idade, existe o desenvolvimento, a noção de que algo 
segue a existir mesmo que não esteja em sua frente (LINHARES, 2017). Depois dos 
18 meses, a criança passa a ter um pensamento representativo, a representar o que 
não está ausente, usando, assim, as imagens mentais para realizar ações. 
Pré-operacional 
Abrange, aproximadamente, dos 2 aos 6 anos e chama-se de fase Pré-escolar, 
na qual surge a inteligência simbólica, como uso de imagens e da linguagem. Neves 
(2018) aponta algumas das principais características dessa fase: 
Primeira – a imitação diferida ou imitação de objetos distantes; 
Segunda – jogo simbólico é também imitativo, a criança não se preocupa se o 
outro irá entendê-la, ela se preocupa com o seu entendimento, é uma forma de se 
auto expressar; 
Terceira – desenho, é a sua forma de deixar uma marca, ela desenha o que 
quer, sendo ou não real; 
Quarta – imagem mental, as imagens são estáticas, são imagens que 
representa o interno, algo que já foi passado; 
Quinta – linguagem falada, a criança começa a falar uma palavra como se fosse 
uma frase, aos pouco ela vai aumentando o seu repertório vocábulo. 
50 
 
Nesta fase, o pensamento se caracteriza por ser egocêntrico, intuitivo e mágico. 
O egocentrismo ocorre por volta dos 4 aos 5 anos, no qual a criança imagina que 
todos pensam como ela. Linhares (2017) aponta que o pensamento pré-operacional 
é marcado por irreversibilidade e uma certa confusão entre a aparência e a realidade. 
Operacional-concreto 
Abrange, aproximadamente, dos 7 aos 11 anos e se caracteriza como a fase 
escolar, em que a criança desenvolve os pensamentos lógicos e começa a apresentar 
argumentos mais elaborados para suas questões, como aponta Neves (2018): 
 A criança descentra suas percepções e acompanha as transformações, ela 
também começa a ser mais social saindo da sua fase egocêntrica ao fazer o 
uso da linguagem, a fala é usada com a intenção de se comunicar, ela 
percebe que as pessoas podem pensar e chegar a diferentes conclusões, 
sendo elas diferentes das suas, ela interage mais com as pessoas, quando 
aparece um conflito ela usa o raciocínio para resolver. 
Linhares (2017) diz que o pensamento nesse período é reversível com 
coordenações mentais e esquemas conceituais, em que se passa a compreender 
noções lógico-matemáticas de conservação de massa, volume e classificação. Já o 
egocentrismo diminui, surgindo a ideia de equipe e cooperação. 
Operacional-formal 
Esta fase, adolescente, ocorre após os 12 anos, aproximadamente, em que 
surge o pensamento hipotético-dedutivo e se começa a levantar hipóteses e deduzir 
conclusões. Piaget (1973) aponta que o adolescente usa esquemas aprendidos dos 
estágios anteriores para fortalecer as hipóteses deste estágio, assim ele vai 
aprimorando cada vez mais os estágios anteriores. Deste estágio em diante o que 
ocorre é o aperfeiçoamento dos estágios passados. 
Esse período é marcado por inteligência abstrata (operações formais), 
pensamento igualmente abstrato, reflexão de conceitos não concretos reais ou 
observáveis e experiência. O egocentrismo tende a desaparecer, tendo o aumento 
significativo do processo de socialização e a construção da autonomia. Neste tópico, 
foram apresentadas as fases do desenvolvimento cognitivo segundo a teoria 
piagetiana. 
51 
 
6.2. Conceitos e características do desenvolvimento social 
 
Fonte: shre.ink/mwUl 
Desde sua concepção, no período embrionário, o ser humano está se 
desenvolvendo. Desde o período pré-natal até o envelhecimento, cada pessoa passa 
por inúmeras fases, relacionadas ao desenvolvimento físico, motor, social ou 
cognitivo. O desenvolvimento social é oriundo da teoria sociointeracionista proposta 
por Lev Vygotsky, que propõe a interação social como meio de aprendizagem, 
incluindo conceitos como mediação, Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), 
linguagem e pensamento como elementos fundamentais desse processo. 
O estudo do desenvolvimento social surge a partir da linha de pensadores que 
vão formar a abordagem sociointeracionista. Esta linha teórica propõe que o 
desenvolvimento humano se dá nas relações, por meio da troca entre parceiros 
sociais via mediação e interação. O principal pensador dessa linha é Lev Semenovitch 
Vygotsky, que criou conceitos importantes como a ZDP e a abordagem das funções 
da linguagem e do pensamento. Vygotsky é, portanto, o pioneiro dessa linha, que 
conta com outros nomes importantes, entre eles o brasileiro Paulo Freire. Antes de 
explorarmos os conceitos e características do desenvolvimento social, vamos saber 
um pouco mais sobre a biografia de Vygotsky. 
Pode-se afirmar que as teorias, tanto de Piaget como de Vygotsky, têm um 
ponto em comum como destaque: a importância do ambiente para o desenvolvimento 
humano. No entanto, enquanto Piaget considera um ambiente um estímulo, a linha 
52 
 
adotada por Vygotsky enfatiza a questão da relação pessoal e da influência cultural. 
Rabelo e Passos (2014) apontam: 
Em Vygotsky, ao contrário de Piaget, o desenvolvimento – principalmente o 
psicológico/mental (que é promovido pela convivência social, pelo processo 
de socialização, além das maturações orgânicas) – depende da 
aprendizagem na medida em que se dá por processos de internalização de 
conceitos, que são promovidos pela aprendizagem social, principalmente 
aquela planejada no meio escolar. 
Além disso, Vygotsky não considera o aparato biológico suficiente, mas sim a 
participação do indivíduo em ambientes para que a aprendizagem ocorra por meio 
das experiências. Essa relação passa a ser melhor entendida quando se remete ao 
conceito de ZPD. Segundo Vygotsky “a zona de desenvolvimento proximal define 
aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de 
maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado 
embrionário” (VYGOTSKY, 1989, p. 97). 
Para o autor a ZDP é a distância entre o nível de desenvolvimento real, ou seja, 
determinado pela capacidade de resolver problemas de forma independente, e o nível 
de desenvolvimento proximal, demarcado pela capacidade de solucionar problemas 
com ajuda de um parceiro mais experiente. São as aprendizagens que ocorrem na 
ZDP que fazem a criança se desenvolver ainda mais, ou seja, desenvolvimento com 
aprendizagem na ZDP leva a mais desenvolvimento, por isso dizemos que, para 
Vygotsky, esses processos são indissociáveis. 
A implicação pedagógica mais relevante desse conceito reside na forma 
como é vista a relação entre o aprendizado e o desenvolvimento. Ao contrário 
de outras teorias pedagógicas, como a piagetiana, que sugerem a 
necessidadede o ensino ajustar-se a estruturas mentais já estabelecidas, 
para Vygotsky, o aprendizado orientado para níveis de desenvolvimento que 
já foram atingidos é ineficaz do ponto de vista do desenvolvimento global da 
criança. Ele não se dirige para um novo estágio do processo de 
desenvolvimento, mas, ao invés disso, vai a reboque desse processo. Assim, 
a noção de zona de desenvolvimento proximal capacita-nos a propor uma 
nova fórmula, a de que o “bom aprendizado” é somente aquele que se adianta 
ao desenvolvimento (OSTERMANN; CAVALCANTI, 2011, p. 42). 
Dentro dessa zona em que ocorre a aprendizagem, o professor agiria 
favorecendo esse processo, servindo de mediador entre a criança e o mundo. Essa 
construção começaria a partir do nível de desenvolvimento da criança na zona real. 
Ela seria o ponto de partida para que o professor traçasse seus objetivos e 
procedimentos para a construção do conhecimento. Dentro dessa perspectiva, então, 
53 
 
a aprendizagem acontece pela maturação biológica associada à interação e à 
presença de mediadores, que são os professores. 
O conceito de mediação é fundamental na teoria vygotskyana, pois toda relação 
é mediada pela linguagem ou por instrumentos técnicos, que passam a intervir no 
processo. Os dois principais elementos mediadores são os instrumentos e os signos. 
Por instrumentos é possível compreender, por exemplo, o machado, que permite um 
corte mais afiado e preciso; ou uma vasilha, que facilita o armazenamento de água, 
entre outros. Alguns animais, sobretudo primatas, podem até utilizá-los 
eventualmente, mas é o homem que concebe um uso mais sofisticado, guardando 
instrumentos para o futuro, inventando novos e deixa instruções para que outros os 
fabriquem (MONROE, 2018). 
Já os signos, segundo Vygotsky (1989), são um meio para sua atividade 
interior, dirigida a dominar o próprio ser humano, ou seja, o signo está orientado para 
dentro. Eles agem como representações como a escrita, os desenhos, a linguagem e 
os mapas. Por fim, temos ainda a internalização por meio da experiência com o outro. 
Assim, Vygotsky aponta: 
[...] o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento 
mental e põe em movimento vários processos que, de outra forma, seriam 
impossíveis de acontecer. Assim, o aprendizado é um aspecto necessário e 
universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas 
culturalmente organizadas e especificamente humanas (VYGOTSKY, 2003, 
p. 118 apud OSTERMANN; CAVALCANTI, 2011, p. 43). 
Fases do desenvolvimento social 
Vygotsky aponta as fases do desenvolvimento social sob dois vieses: o do 
pensamento e o da linguagem. Por meio deles vão ocorrer as transformações sociais 
em cada criança e, para Vygotsky, a relação de ambos é estreita. Para o autor, 
linguagem e pensamento são fenômenos de desenvolvimento independentes nos 
primeiros meses de vida, manifestando-se com autonomia. 
Porém, por volta do segundo ano, as curvas de evolução do pensamento e da 
linguagem se encontram, passando a exercer uma relação de dependência mútua — 
interdependência. Assim, linguagem e pensamento “passam a interferir no complexo 
universo cognitivo da criança de modo a determinar, a certa altura, que a linguagem 
pode servir de impulso para o pensamento” (FERNANDES, 2003, PALANGANA, 
2001). 
54 
 
Linguagem e pensamento 
Para Vygotsky, a linguagem é o nosso instrumento de relação com os outros e 
constituidora do sujeito, podendo ser verbal, gestual ou escrita. Além disso, é por meio 
dela que aprendemos a pensar (RIBEIRO, 2005). Sobre a linguagem, Rabelo e 
Passos (2014) afirmam que, antes de tudo, ela é social, “portanto, sua função inicial é 
a comunicação, expressão e compreensão. Essa função comunicativa está 
estreitamente combinada com o pensamento. A comunicação é uma espécie de 
função básica porque permite a interação social e, ao mesmo tempo, organiza o 
pensamento”. 
Segundo o autor, a aquisição da linguagem passa por três fases ou estágios: 
➢ Linguagem social: é a primeira forma de linguagem, pois surge ainda no 
nascimento e permanece até os 3 anos. Tem como principal função denominar, 
comunicar e acompanhar as ações gerais da criança, porém, de maneira dispersa e 
caótica. 
➢ Linguagem egocêntrica: é a transição da fala social para a fala interna, 
ou seja, da função comunicativa para a função intelectual, ficando bem próxima ao 
pensamento. Segundo Rabelo e Passos (2014), trata-se da fala que a criança emite 
para si, em voz baixa, enquanto está concentrada em alguma atividade. Essa fala, 
além de acompanhar a atividade infantil, é um instrumento para pensar em sentido 
estrito, isto é, planejar uma resolução para a tarefa durante a atividade na qual a 
criança está entretida (RIBEIRO, 2005). 
Sendo assim, a linguagem se caracteriza como sendo da pessoa para a própria 
pessoa, o conhecido “falar sozinho”. Rabelo e Passos (2014) apontam que esse “falar 
sozinho” é “essencial porque ajuda a organizar melhor as ideias e planejar melhor as 
ações. É como se a criança precisasse falar para resolver um problema que, nós 
adultos, resolveríamos apenas no plano do pensamento/raciocínio.” Essa fase 
também marca a curiosidade e as inúmeras perguntas das crianças e, geralmente, 
permanece até os 6 anos. 
➢ Linguagem interior: esta fase ocorre quando começa o declínio da 
linguagem egocêntrica e a criança passa a ter a capacidade de “pensar as palavras”, 
sem a necessidade de dizê-las. 
Sobre isso: 
55 
 
O pensamento é um plano mais profundo do discurso interior, que tem por 
função criar conexões e resolver problemas, o que não é, necessariamente, 
feito em palavras. É algo feito de ideias, que muitas vezes nem conseguimos 
verbalizar, ou demoramos ainda um tempo para achar as palavras certas para 
exprimir um pensamento. O pensamento não coincide de forma exata com os 
significados das palavras. O pensamento vai além, porque capta as relações 
entre as palavras de uma forma mais complexa e completa que a gramática 
faz na linguagem escrita e falada. Para a expressão verbal do pensamento, 
às vezes é preciso um esforço grande para concentrar todo o conteúdo de 
uma reflexão em uma frase ou em um discurso. Portanto, podemos concluir 
que o pensamento não se reflete na palavra; realiza-se nela, a medida em 
que é a linguagem que permite a transmissão do seu pensamento para outra 
pessoa (VYGOTSKY, 1998 apud RABELO; PASSOS, 2014). 
Em relação ao desenvolvimento das operações mentais que começam a 
envolver o uso dos signos, Vygotsky (1998) sugere a existência de quatro estágios: 
1º - estágio natural ou primitivo: que corresponde à fala pré-intelectual 
(manifestada na forma de balbucio, choro e riso) e ao pensamento pré-verbal 
(caracterizada por manifestações intelectuais rudimentares, ligadas à 
manipulação de instrumentos); 
2º - estágios das experiências psicológicas ingênuas: a criança vai interagir 
com seu próprio corpo, com objetos e pessoas a sua volta – com isso busca 
aplicar as experiências ao uso de instrumentos; é o início da inteligência 
prática. 
3º - estágio dos signos exteriores: neste estágio “o pensamento atua 
basicamente com operações externas, das quais a criança se apropria para 
resolver problemas internos. ” No desenvolvimento da fala, é o período da 
fala egocêntrica; 
4º - estágio de crescimento interior: caracterizado pela interiorização das 
operações externas. Dispondo de memória lógica, a criança pode operar com 
relações intrínsecas e signos interiores. No desenvolvimento da linguagem, 
este estágio caracteriza-se pela fala interior ou silenciosa. 
Em relação ao pensamento, a teoria vygotskyana propões três fases ou 
estágios de desenvolvimento. La Taille, Oliveira e Pinto (1992) caracterizam esses 
estágios da seguinte maneira: 
➢ Primeiro estágio - é denominado como a formação de conjuntos sincréticos, 
nele, os objetos são agrupados em conjuntos sincréticos pelas crianças, baseados em 
ligaçõesvagas e subjetivas, como a proximidade espacial quando não tem relação 
com os atributos relevantes para formarem categorias de objetos; 
➢ Segundo estágio - denominado estágio de pensamento por complexos, no 
qual as ligações entre os componentes dos objetos não são abstratas e lógicas, mas 
apenas concretas e factuais, de modo que qualquer conexão factualmente presente 
possa incluir um elemento em um “complexo”, sem a lógica devida; 
➢ Terceiro estágio - denominada formação dos conceitos propriamente ditos, 
porque a criança agrupa os objetos conforme um único atributo, sendo capaz de 
56 
 
abstrair características isoladas da totalidade da experiência concreta. É importante 
destacar, que o percurso genético para o desenvolvimento conceitual não é linear, 
pois o terceiro estágio, por exemplo, não aparece necessariamente após o segundo 
estágio. 
7. EDUCAÇÃO INFANTIL AO ENSINO FUNDAMENTAL: CONTINUIDADE DO 
PROCESSO ALFABETIZADOR 
 
Fonte: shre.ink/mwrU 
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI/ MEC), 
no art. 9º, orientam práticas pedagógicas focadas em uma proposta curricular da 
Educação Infantil com eixos norteadores nas interações e na brincadeira (BRASIL, 
2010). A ideia é promover nos alunos o conhecimento de si e do mundo por meio da 
ampliação de experiências sensoriais, expressivas e corporais, que favorecem a 
movimentação ampla, a expressão da individualidade e o respeito pelos ritmos e 
desejos das crianças. Também deve ser priorizada a imersão delas nas diversas 
linguagens e variados gêneros e formas de expressão: verbal, gestual, musical, 
dramática e plástica. 
Não podem ser esquecidas a ampla experimentação de narrativas, de interação 
e apreciação com linguagem oral e escrita e a convivência com os mais distintos

Continue navegando