Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
XXX Congresso de Iniciação Científica da UNICAMP – 2022 1 Impactos da pandemia de COVID-19: Alimentação e saúde mental Palavras-Chave: pandemia, alimentação, saúde mental Autores/as: Guilherme Furhmann Barbiero - UNICAMP Prof./ª Dr./ª Lilian Regina Barros Mariutti (orientadora) - UNICAMP INTRODUÇÃO: No dia 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde declarou pandemia de COVID-19, doença transmitida pelo SARS-CoV-2. O estado de pandemia fez com que diversos países adotassem medidas de restrição de circulação, na tentativa de diminuir a taxa de transmissão do coronavírus. De acordo com CUNHA et al (2022), a adoção dessas intervenções prejudicou o bem-estar emocional da população, com o aumento da incidência de transtornos mentais, como depressão e ansiedade, e a manifestação de sintomas como estresse, medo, pânico e alterações de humor, que podem influenciar os hábitos de vida e as escolhas alimentares. Os autores afirmaram também que alimentos in natura e minimamente processados têm impacto positivo no combate à depressão. Em contrapartida, uma dieta rica em açúcares e ácidos graxos saturados tem sido associada à queda na qualidade da saúde mental (COLETRO et al, 2022 apud MOUFIDATH et al, 2019). Nesse sentido, os dados reforçam a existência de uma relação entre alimentação e saúde mental, uma vez que uma dieta de baixo valor nutricional, caracterizada por baixas concentrações de ácidos graxos, vitaminas e minerais, tem sido associada a uma maior probabilidade de desenvolvimento de transtornos mentais, devido ao papel por eles exercido na regulação de neurotransmissores, como a serotonina, dopamina e noradrenalina (FRAGA et al, 2021 apud IBARRA et al, 2014). As informações supracitadas revelam que a pandemia trouxe consequências que vão além das restrições de circulação e da necessidade de adaptação e que seus desdobramentos envolvem tanto a saúde física quanto a saúde mental da população. Desse modo, o estudo buscou entender de que forma e em qual intensidade as condições impostas pela pandemia influenciaram a rotina dos indivíduos, permitindo-nos estabelecer um panorama geral das condições de saúde pública no Brasil durante o período. METODOLOGIA: O objetivo do trabalho foi realizar um estudo da literatura científica buscando dados que associem a ocorrência de transtornos depressivos e de ansiedade com o consumo de grupos alimentares específicos e suas implicações na saúde da população. Além disso, foi investigado como estes hábitos evoluíram durante a pandemia de COVID-19. XXX Congresso de Iniciação Científica da UNICAMP – 2022 2 Foi realizada uma busca de artigos em bases de dados como Scopus, Web of Science, Scielo e Google Acadêmico utilizando inicialmente como palavras-chave: “mental health”, “food” e “COVID-19”. RESULTADOS E DISCUSSÃO: Até o momento, cinco estudos foram analisados para que fosse possível estabelecer uma relação entre o período de pandemia e os aspectos emocionais associados ao desenvolvimento de transtornos mentais e a mudanças nos hábitos alimentares. Os resultados obtidos estão sintetizados na tabela 1: Tabela 1 – Síntese dos artigos selecionados e suas conclusões Artigo Autores Conclusões Food Insufficiency and Mental Health in the U.S. During the COVID-19 Pandemic NAGATA et al (2021) Aumento da prevalência de insegurança alimentar, associada ao desenvolvimento de transtornos mentais. Association between lifestyle and emotional aspects of food consumption during the COVID- 19 pandemic CUNHA et al (2022) Alterações de peso, aumento do consumo de alimentos não saudáveis e alterações na saúde mental. Alimentação e saúde mental durante a pandemia de Covid-19 MENEGOTTE et al (2021) Aumento do consumo de alimentos de alto valor nutricional. Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Brasil GALINDO et al (2022) Redução do consumo de alimentos saudáveis em domicílios em situação de insegurança alimentar. Ultra-processed and fresh food consumption and symptoms of anxiety and depression during the COVID e 19 pandemic: COVID Inconfidentes COLETRO et al (2022) Sintomas depressivos e de ansiedade e irregularidade de consumo de alimentos frescos ou minimamente processados. É possível perceber que, em geral, os quadros depressivos e de ansiedade estão associados a situações de insegurança alimentar ou ao consumo inadequado de determinados alimentos. Segundo SANTOS et al (2021), quadros de insegurança alimentar são caracterizados pela falta de acesso a alimentos de alto valor nutritivo em quantidades suficientes para garantir um estilo de vida saudável. Dados de GALINDO et al (2022), cujo estudo foi realizado em 2004 domicílios brasileiros, sintetizados na figura 1, mostram que a redução do consumo de alimentos foi significativamente maior em domicílios em situação de insegurança alimentar, quando comparada àquela observada em domicílios em situação oposta. XXX Congresso de Iniciação Científica da UNICAMP – 2022 3 Figura 1 – Redução do consumo, em porcentagem, de determinadas classes de alimentos em domicílios em situação de segurança e insegurança alimentar Fonte: GALINDO et al (2022) Em estudo conduzido por NAGATA et al (2021), realizado com dados de corte transversal de 63.374 pessoas, entre os participantes que reportaram quadros de insegurança alimentar, grande parte relacionou-os com determinados fatores, que estão apresentados na figura 2. Figura 2 – Porcentagem de participantes que relacionaram a insegurança alimentar com os fatores apresentados Fonte: NAGATA et al (2021) Nesse contexto, a pandemia teve a capacidade de influenciar questões associadas aos hábitos alimentares, tanto pela falta de acesso a determinados nutrientes, quanto pelo desenvolvimento de condições socioeconômicas desfavoráveis (RANTERÍA et al, 2022), já que trouxe perturbações na cadeia de suprimentos e no sistema alimentar, causando escassez e redução da qualidade dos alimentos, redução do poder de compra dos indivíduos e inflação dos preços dos produtos (NAGATA et al, 2021). 0 20 40 60 80 100 Queijos Ovos Leite Hortaliças/LegumesFrutas Cereais/Leguminosas Carnes Segurança Alimentar Insegurança Alimentar Perda de emprego Baixa renda Sintomas de saúde mental 0 20 40 60 80 100 76,5 54,4 93,8 XXX Congresso de Iniciação Científica da UNICAMP – 2022 4 Em relação ao papel exercido pelos alimentos na fisiopatologia dos transtornos mentais, CUNHA et al (2022) afirmam que alimentos naturais e minimamente processados têm impacto positivo no combate à depressão, uma vez que são fontes de compostos antioxidantes, fenólicos, fibras, vitaminas, minerais e ácidos graxos poli-insaturados, que evitam a modulação de genes expressores de citocinas pró- inflamatórias. FRAGA et al (2021), por sua vez, afirmam que uma dieta rica em produtos processados e de baixo valor nutricional tem sido associada ao aumento do estresse oxidativo, por meio do incremento da concentração de marcadores inflamatórios. Conclusões semelhantes foram relatadas por ÁLVAREZ et al (2022), que relacionaram o desenvolvimento de doenças ao estresse oxidativo, resultante do desbalanço entre a produção e o acúmulo de espécies reativas de oxigênio, que podem causar danos a ácidos nucleicos, proteínas e lipídeos, promovendo alterações das funções celulares. De acordo com FRAGA et al (2021), a exposição a longos períodos de estresse, como os impostos pela pandemia de COVID-19, pode levar à ativação do eixo hipotalâmico-pituitário-adrenal (HPA), que, segundo HAO et al (2019), provoca liberação de hormônio adrenocorticotrófico, responsável por estimular a produção de cortisol. A ação prolongada desse hormônio, associada a ativação de vias orexigênicas, contribui para o aumento do apetite, estimulando o consumo excessivo de alimentos, o que podelevar ao sobrepeso e à obesidade (GLUCK, 2006 apud DALLMAN et al, 2003). Ademais, estudo conduzido por FERRIANI et al (2022) estabeleceu uma relação entre transtornos depressivos e a ingestão de micronutrientes, cujos resultados estão compilados na tabela abaixo: Tabela 2 – Resultados obtidos por FARRIANI et al (2022) Micronutriente Conclusões Vitamina C Protege os neurônios do estresse oxidativo e regula o processo de neurotransmissão, mecanismos associados à etiologia da depressão. Vitamina B9 / Folato Indivíduos com transtornos depressivos têm menor nível sérico e menor ingestão de folato. Vitaminas B6, B12, E, selênio e zinco Relação inversa entre a ingestão dos micronutrientes com a probabilidade de desenvolvimento de transtornos mentais. CONCLUSÕES: Os resultados obtidos por meio de pesquisa revelam a existência de uma possível relação entre a alimentação e o desenvolvimento de transtornos mentais, como depressão e ansiedade. Nesse sentido, a pandemia de COVID-19 criou uma rede complexa de desdobramentos, que compreendem desde as restrições de circulação, até questões relacionadas à saúde física e mental. XXX Congresso de Iniciação Científica da UNICAMP – 2022 5 As condições impostas pela pandemia contribuíram para ocorrência de desbalanços na cadeia de suprimentos e alterações no poder de compra da população, fatores que influenciaram a prevalência de quadros de insegurança alimentar e, consequentemente, a falta de acesso a alimentos considerados ideais do ponto de vista nutricional. Além disso, foi possível estabelecer uma relação inversa entre a adoção de uma dieta diversa nutricionalmente com a probabilidade de desenvolvimento de transtornos mentais, destacando o papel exercido por determinados micronutrientes na modulação de determinados sistemas e na fisiopatologia desses transtornos. __________________________________________________________________________________ BIBLIOGRAFIA ÁLVAREZ, S.A. et al. Ancestral Food Sources Rich in Polyphenols, Their Metabolism, and the Potential Influence of Gut Microbiota in the Management of Depression and Anxiety. J. Agric. Food Chem. V. 70, p. 944−956, 2022 COLETRO, H.N. et al. Ultra-processed and fresh food consumption and symptoms of anxiety and depression during the COVID-19 pandemic: COVID Inconfidentes. Clinical Nutrition ESPEN. V. 47, p. 206-214, 2022 CUNHA, C.S. et al. Association between lifestyle and emotional aspects of food consumption during the COVID-19 pandemic. Nutrition, Metabolism and Cardiovascular Diseases. V. 32, n. 3, p. 734-742, 2022 FERRIANI, L.O. et al. Associations of depression and intake of antioxidants and vitamin B complex: Results of the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Journal of Affective Disorders. V. 297, p. 259–268, 2022 FRAGA, A.M. et al. COVID-19, Saúde mental e nutrição: uma revisão narrativa. Revista Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental. V. 7, n. 3, p. 94-100, 2021 GALINDO, E. et al. Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Brasil. Food for Justice Working Paper Series. N. 4. Berlin: Food for Justice: Power, Politics, and Food Inequalities in a Bioeconomy, 2022. DOI 10.17169/ refubium-29554 GLUCK, M.E. Stress response and binge eating disorder. Appetite. V. 46, n. 1, p. 26-30, 2006 HAO, Z. et al. Faecalibacterium prausnitzii (ATCC 27766) has preventive and therapeutic effects on chronic unpredictable mild stress-induced depression-like and anxiety-like behavior in rats. Psychoneuroendocrinology. V. 104, p. 132-142, 2019 MENEGOTTE, P.C.S. et al. Alimentação e saúde mental durante a pandemia de Covid-19. Research, Society and Development. V. 10, n. 14, p. e82101421695, 2021 NAGATA, J.M. et al. Food Insufficiency and Mental Health in the U.S. During the COVID-19 Pandemic. Am J Prev Med. V. 60, n. 4, p. 453-461, 2021 RANTERÍA, I. et al. Unhealthy Diet During the COVID-19 Pandemic: An Opinion Regarding the Harmful Effects on Brain Health. Frontiers in Nutrition. V. 9, 2022 SANTOS, L.P. et al. Association between food insecurity and major depressive episodes amid Covid-19 pandemic: results of four consecutive epidemiological surveys from southern Brazil. Public Health Nutrition. V. 25, n .4, p. 944–953, 2021
Compartilhar