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Adrenalina - Nathalia Santos

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Copyright © 2022 por Nathalia Santos
Todos os direitos reservados.
 
Título: Adrenalina
Revisão: Ana Ferreira e Raquel Moreno
Leitura Crítica: Ana Ferreira
Capa: Larissa Chagas
Diagramação: Nathalia Santos
 
 
Proibida a reprodução, no todo ou em parte, através de quaisquer
meios, sem o consentimento do(a) autor(a) desta obra.
Esta é uma obra de ficção. Todos os nomes, lugares,
acontecimentos e descrições são fruto da mente da autora.
Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.
Texto revisado conforme o Novo Acordo Ortográfico da Língua
Portuguesa.
 
Até que ponto as dores do passado podem afetar um amor no
presente?
Ele é conhecido como o bad boy pelos corredores da
universidade.
Ela é a nova aluna de Campbell.
Ele a quis no momento que a viu.
Ela chegou na cidade com apenas um propósito: destruir o
império do seu irmão.
Ele vive uma vida presa ao passado.
Ela precisa de um futuro.
Ele encontrou uma nova família.
Ela nunca teve essa chance.
Ele ama sentir a adrenalina em suas veias.
Ela odeia tudo o que as corridas representam.
Ele fará de tudo para tê-la em sua cama.
Ela fará de tudo para não se apaixonar.
Eles têm o medo como um aliado.
Eles irão dar início a uma guerra juntos.
Eles correm o risco de se apaixonarem dentro de um jogo que
só há um vencedor.
É possível que dois corações bombeados pela adrenalina e
atormentados pelo passado possam encontrar a paz que sempre
desejaram?
 
 
 
 
 
Para todos aqueles que tem medo de mostrar suas fraquezas.
 
 
Não pulem, por favor!
Adrenalina é o quarto livro da série dos irmãos Blossom.
Todos os livros são independentes, mas para uma melhor
experiência (evitando spoilers), é recomendado a leitura dos
primeiros livros, Peculiar, Intenso e Fatal.
Para as leitoras dos irmãos Blossom, quero que saibam já
com muita antecedência que esse livro é diferente de todos os
outros. Tyler exigia algo assim e eu como uma boa cadelinha deles,
apenas escrevi. Então se preparem para encontrar muita ação,
drama e hot.
Primeiro de tudo, o livro passou por leitura sensível de uma
psicóloga e uma leitura crítica para uma melhor construção do
enredo.
Segundo, o livro retrata muito sobre impulsividade e raiva,
duas coisinhas que quando estão juntas podem explodir. Leiam
esse livro com atenção, porque além de uma história de romance,
ele também traz alguns significados ocultos. 
Terceiro, mas não menos importante, Adrenalina traz alguns
assuntos que podem causar gatilho, são eles: violência física e
psicológica. Crises de pânico. Sintomas relacionados ao
transtorno TEI. Abuso de drogas líricas e ilícitas.
Aproveitem a leitura desse livro.
Ele não foi fácil de escrever, admito, mas quando entendi o
que Angeline e Tyler queriam me passar consegui encontrar o ritmo
e no final me sentir orgulhosa de mais um trabalho que doei tudo de
mim. Eles passaram cinco meses comigo, me atazanando e fazendo
com que eu me apaixonasse por cada linha da história, agora é a
vez de vocês sentirem um pouco do que eu senti.
A história de Tyler e Angel é sobre amor, o mais puro e lindo
amor, e como duas pessoas quebradas podem dividir dores e se
apaixonarem em meio à ruína.
Eles quebraram o medo de mostrarem as suas fraquezas e eu
espero que você, que tem medo, perceba que isso não o torna
fraco, pelo contrário, o torna mais forte.
 
Adrenalina tem uma playlist no Spotify, sinta-se à vontade
para ouvir, cada música está organizada conforme a ordem dos
capítulos.
Para ouvir, abra a guia “Busca” no Spotify e toque na câmera,
depois aponte para o código abaixo e vai ser direcionado para a
playlist.
 
Adrenalina tem uma música exclusiva no Spotify, composta e
cantada por Lari Kochla. Você pode encontrar ela pelo QR Code
abaixo ou pelo nome “Adrenalina Lari Kochla” na busca do
aplicativo.
 
PARTE UM
Ser machucado, sentir-se perdido
Ser deixado no escuro
Ser chutado quando você está mal
Sentir como se você estivesse sendo empurrado
WELCOME TO MY LIFE - SIMPLE PLAN
QUASE DEZ ANOS ATRÁS...
Meus pais não são boas pessoas.
Eu não preciso ser um adulto para entender que nunca fui
desejado por eles, está muito claro em todas as palavras feias que
minha mãe diz quando está tomando aquele líquido transparente e
todas às vezes que meu pai me empurra, me bate ou me xinga por
ter feito algo errado.
Eu tento ser um bom garoto, mas tudo o que eu faço é errado
de alguma forma para eles, então como ser um exemplo? Como dar
orgulho para eles?
Acho que tem algum problema comigo.
Parei em frente ao espelho quebrado do meu quarto e
observei o meu reflexo. Se eles não são boas pessoas, não há
chance de eu ser alguém decente.
Eu estou sem camisa devido ao calor que faz no Tennessee
nessa época do ano.
Não sou um garoto bonito, será que é por isso que eles me
odeiam?
Meus ossos se tornam muito visíveis conforme eu respiro,
deixando evidente o quão magro eu estou. Minha barriga faz um
barulho insuportável, mas não posso fazer muita coisa para acalmar
o meu estômago.
Minha última refeição foi há dois dias.
Especificamente, sexta-feira, no almoço da escola.
As férias estão se aproximando e pode parecer meio egoísta,
mas estou com medo. Sem escola significa sem comida, e eu não
sei se consigo sobreviver só com água e farelos que encontro pela
cozinha de casa.
Meus pais não são boas pessoas.
Talvez se eu repetir isso tantas vezes dentro da minha cabeça,
entenda que o problema não está em mim e sim neles.
Será?
“Nossa vida era um espetáculo antes de você nascer, inseto.”
A voz alta de minha mãe vem com muita força em minha
mente.
“Ele não parece um inseto, Randy? Tão pequeno e
insignificante.”
Sua voz.
Ela estava levando para a boca mais daquela bebida que a
deixava maluca. Ambos me fizeram sentar na cama.
Meus olhos se encheram de lágrimas.
“Pare de chorar como uma menina! — Um tapa foi acertado
no meu rosto. — Homens não choram, porra. Bichinha! Estúpido!”
Engoli o meu choro.
Voltei a olhar para o reflexo do espelho.
Inseto.
Bichinha.
Estúpido.
Idiota.
Garoto insignificante.
Talvez os meus pais fossem boas pessoas e o problema
estava unicamente em mim, afinal, ambos diziam e faziam coisas
que me resumiam apenas em alguém sem importância, deixando
muito claro quem era o insignificante nessa família.
Tentei não chorar, mas estava muito difícil, um caroço maldito
se encontrava na minha garganta e não era fácil de engolir.
O som de muitas coisas se quebrando no andar de baixo é o
que me chamou atenção. Antes que eu me perguntasse o que
estava acontecendo, os gritos dos meus pais se ofendendo e
brigando foram o suficiente para entender que era mais uma briga.
Nos últimos meses vinha acontecendo muito isso.
Mais uma vez um pensamento egoísta se infiltrou na minha
mente: pelo menos essas brigas os impediam de brigarem comigo.
— Você estava com ela! Seu puto! — Minha mãe gritou,
parecia furiosa. — Por que não admite de uma vez por todas que
está transando com a nossa vizinha?
— Quer saber de uma coisa? — Meu pai devolveu, no mesmo
tom. — Eu estou mesmo, ela é uma puta de uma gostosa e talvez
me dê um filho mais decente do que você me deu.
— Vai se foder, putão! Eu não tenho culpa daquele inseto ter
saído de mim. Ele puxou ao pai, um tremendo fracote!
— Olha o jeito que você fala comigo, vadia! — Parecia estar
mais irritado. — Eu sou o seu marido.
— Quero o divórcio.
O que é divórcio? Não lembro de ter aprendido isso na
escola...
— Você não quer nada! Quem vai bancar as suas bebidas?
Quem vai te foder como eu te fodo? Cala a porra da boca e me
deixa ver o jogo em paz.
— Você é um idiota! Eu quero a porra do divórcio.
— Você não vai ter nada. Por que não vai beber? É só o que
você faz mesmo.
Um silêncio estranho tomou o andar de baixo e não entendi o
motivo do meu coração acelerar com aquilo. Meu pai estava com a
vizinha? Eu era o culpado? Não conseguia entender o motivo de
estarem brigando.
Abri a porta do meu quarto com cuidado para não fazer
barulho e caminhei em direção às escadas. Como eu estava
descalço, foi fácil não fazer barulhoconforme eu descia pé por pé.
— O que está fazendo? — Minha mãe sussurrou.
— Acha que não sei que dá para outro? Você quer exigir
coisas de mim que nem é capaz de fazer. Uma tremenda vadia!
Garanto que o imprestável do Tyler nem é meu filho.
— Ele é a sua cara, para de ser idiota e abaixa isso.
Fiquei no último degrau e observei o que acontecia no meio da
sala. Entendi no mesmo momento que eles não estavam em silêncio
por todo esse tempo, só estavam falando mais baixo.
Mas o que fez eu engolir em seco foi a arma apontada em
direção a minha mãe.
— Você não seria capaz — ela disse, balançando a cabeça
sem desviar do negócio apontado pra ela.
— Sabe que não vai viver sem mim e eu muito menos sem
você. Nos amamos.
Então por que estavam com outros? Era esse o motivo da
briga, né? Não fazia sentido na minha cabeça...
— Abaixe essa arma.
Ele riu e mexeu naquele objeto preto, o fazendo soltar um
barulhinho, mais parecido com um click.
— Ainda quer o divórcio?
— Randy...
— Responde, porra!
— Eu quero — gritou. — Não aguento mais essa vida de...
Ela não conseguiu terminar o que tinha pra dizer porque algo
a impediu.
Meu pai a impediu.
Com um tiro bem no meio da testa, dei um grito e observei o
corpo da minha mãe cair no chão sem vida.
Meus olhos estavam arregalados em direção à mulher que há
alguns minutos brigava com o meu pai e agora estava morta sem
chances de lutar pela sua vida.
Meu pai deve ter ouvido o meu grito e quando se virou em
minha direção, tive um medo diferente de todos os outros. Ele
também iria me matar?
— Se cuide, inseto.
Antes que eu pudesse processar o que aquelas palavras
significavam, ele enfiou a arma na sua cabeça e atirou.
Dessa vez eu não consegui gritar.
Meus olhos permaneciam arregalados observando os corpos
ali na minha frente, o sangue se espalhando por toda a sala e meu
coração se despedaçando com aquela cena que sempre ficaria
gravada em minha mente.
Eu fiquei paralisado por horas.
Não vi quando a casa foi arrombada por homens vestidos de
preto que seguravam armas, só notei a presença deles quando me
pegaram no colo e me tiraram daquela casa com a promessa de
que arrumariam um lugar melhor para mim.
Mas eu não conseguia me desligar do que havia visto.
Meus pais me deixaram.
E um tempo depois, eu saberia que aquele foi o melhor dia da
minha vida.
PARTE DOIS
SETE ANOS ATRÁS...
Meus pais eram os melhores pais do mundo.
Minha família era o motivo de eu querer sair da escola e ir
direto para casa o mais rápido possível, só para poder passar o
máximo de tempo com eles. Eu amava cantar no coral da igreja e
passar um tempo com as minhas colegas, mas era com a minha
família que eu me sentia a Angeline mais feliz do mundo.
Meu irmão era minha âncora.
Meu pai era o meu herói.
E minha mãe... ela era a única mulher capaz de reinar dentro
daquele reino.
Nossa vida era a mais simples e maravilhosa possível, não
passávamos dificuldade. Minha mãe trabalhava como professora de
canto de uma pequena escola particular da nossa cidade e meu pai
tinha a sua própria oficina, o lugar mais divertido do mundo depois
do meu quarto.
Quando eu não estava aprendendo a tocar violão, estava
sujando as minhas mãos de graxa com o meu pai e posso dizer que,
para uma criança de 10 anos, esse era um programa estranho e
muito divertido.
Tudo era incrível.
Até que tudo desmoronou.
Sete de Setembro.
Às dez horas da noite.
Teve uma tempestade naquela noite e minha mãe ficou até
mais tarde no serviço. A escola ficava na esquina da rua e quando
ela decidiu vir para casa foi surpreendida por um carro, que prensou
seu corpo contra as grades do portão.
Minha mãe foi retirada sem vida do local do acidente.
O motorista não estava bêbado e nem nada do tipo, ele
apenas havia perdido o controle no asfalto molhado da rua.
Minha mãe nunca mais voltou para casa e minha família
nunca mais foi a mesma. Sem sua rainha, o reino estava destinado
ao caos e não havia nenhuma substituta à altura.
Eu achei que aquela dor passaria, mas a verdade é que ela
não passa e tende só a aumentar quando seu pai se afunda no que
para ele é a sua única salvação: bebidas.
Eu vi o homem forte e cheio de sorrisos se tornar fraco e
resmungão.
Meu irmão não conseguia fazer muita coisa, ele teve que
assumir cedo demais a responsabilidade de cuidar de uma irmã
mais nova e da oficina, que com o tempo foi falindo, já que meu
irmão não tinha tanta experiência como o meu pai.
Então os dias se tornaram meses, e os meses se tornaram
anos... e nada mudou.
As coisas só saíram do controle e de uma forma muito
negativa nossa vida simples e maravilhosa se tornou difícil e
horrível.
Agora, com 14 anos, e meu irmão com 20, exatos quatro anos
depois do acidente que levou a minha mãe, tudo ainda permanecia
difícil. Meu irmão não conseguia emprego devido a sua
inexperiência e eu não tinha idade suficiente para arrumar um,
mesmo sendo madura o bastante para desempenhar essa função.
Meu pai...
Eu não sabia o que pensar do meu pai.
Não era o certo sentir raiva, mas por que eu sentia? Eu pensei
que apenas os primeiros meses seriam dessa forma: ele chegando
bêbado, resmungando, nos olhando com tristeza e depois com
raiva, pedindo cerveja quando ainda segurava uma nas mãos.
Não foram apenas meses.
Ele ainda continuava assim, ou melhor, estava pior.
E eu me irritava.
Odiava ouvir as brigas que ele tinha com o meu irmão, e
odiava ainda mais a situação que ele nos colocou por conta de suas
atitudes e do seu vício, a oficina fechou e nossa única fonte de
renda não rendia mais nada há meses. Meu irmão não dava conta
sozinho e podia enxergar no seu olhar o quanto se sentia culpado
por isso.
Não tínhamos mais o que comer e não sei se gostaria de
saber da onde meu pai ainda conseguia dinheiro para sustentar o
seu vício.
— Ryder Fraser, volta aqui! — Meu pai gritou no andar de
baixo, ou tentou, já que a sua voz naquela noite estava mais
embolada do que o normal.
Mais uma noite que ele chegava bêbado.
Engoli o choro e fui até o meu violão.
Fazia mais de dois anos que eu não chorava. Com o tempo,
descobri que chorar não adiantava nada, precisava engolir o
sofrimento e agir, porque apenas eu podia mudar a minha situação.
Não podia esperar que um milagre caísse do céu.
Mas quando eu não tinha para onde fugir e não podia resolver
nada no momento, eu me refugiava no meu lugar secreto.
Minha mente.
Minha voz.
Minha música.
Eu sempre amei cantar e tocar, e de vez em quando arriscava
um pouco na composição. Era o melhor refúgio que eu tinha diante
tantos dias difíceis.
Ajeitei o violão no meu colo e comecei a tocar sem nenhuma
música em mente, naquele momento eu só queria me concentrar
nas notas que as minhas mãos criavam com aquele instrumento.
Essa, com certeza, seria uma música triste no futuro.
Isso se eu escrevesse uma letra.
Diante daquele som dramático, as vozes alteradas e raivosas
do andar de baixo se tornaram apenas sussurros porque tudo em
que eu estava concentrada eram nas notas que saíam do violão.
Fechei os meus olhos e apreciei a melodia, ignorando o
barulho do estômago roncando. A última refeição havia sido de
manhã, com as únicas fatias de pão que haviam no armário. Eu e
Ryder dividimos, e mais uma vez seu semblante culpado ocupou a
minha mente.
Ryder...
Meu irmão e que ocupou facilmente o lugar do meu pai dentro
do meu coração.
Ele era meu herói agora.
Era Ryder que me abraçava quando comecei a ter pavor de
tempestades, era meu irmão que ficaria sem comer apenas para me
dar comida e era meu herói que arrumava emprego que só tinha
duração de um dia apenas para não nos deixar passar fome.
Empregos que às vezes só davam para comprar pão e
manteiga.
Não podia reclamar.
Ele estava tentando.
A porta do meu quarto foi aberta abruptamente, interrompendo
o meu momento de refúgio. Olhei para Ryder, que parecia prestes a
bater na primeira pessoa que aparecesse em sua frente. Ele fechou
a porta e se atirou ao meu lado, fazendo uma careta ao deitar na
cama.
— Outra briga? — murmurei, já sabendo a resposta.
Largueio violão no seu lugar e me deitei ao seu lado.
— Ele não quer largar isso de jeito nenhum, ruivinha. — Me
abraçou. — Não sei mais o que fazer.
— Algumas pessoas não querem ser salvas.
Ele assentiu.
— Como você está?
Minha barriga roncou em resposta. Meu irmão engoliu em
seco.
— Prometo que amanhã bem cedo vou receber o pagamento
de hoje e comprar pão, ok?
— Eu estou bem e você? — Fui forte.
— Como estar bem diante dessa situação, ruivinha? — Tirou
uma mecha de cabelo da minha testa. — Nossa vida está uma
merda por culpa dele.
Notei o tom de raiva que ele falou do nosso pai e não podia
culpá-lo. No fundo, ele tinha razão.
— Temos um ao outro, vamos dar um jeito nisso. — O abracei.
— Somos uma dupla e tanto, né?
Meu irmão sorriu e beijou o topo da minha cabeça.
— Preciso falar uma coisa com você.
Estranhei na hora. Ergui o meu rosto e ainda encontrei aquele
semblante inquieto, cheio de raiva e dúvidas passando pelo seu
olhar.
— Existe uma proposta de emprego pra mim.
— Fixo? — Aquilo me encheu de esperanças.
— Sim, ele é fixo e amanhã eu vou fazer a entrevista — disse.
— Isso é ótimo, Ry. — Me sentei na cama, mais animada que
antes. — Vai dar certo. Eu tenho certeza!
— É a nossa esperança, né?
— Vamos poder viver melhor, e assim que eu puder, já vou
procurar um emprego também.
— Por enquanto, foque nos seus estudos, ruivinha. —
Bocejou, parecendo estar com sono. — Eu sempre vou estar aqui
com você.
Naquela noite não entendi por que apontou para o meu
coração.
Sorri, feliz com aquela última notícia.
— Vou ter ótimos sonhos depois dessa conversa.
— Posso dormir aqui? — ele perguntou.
— Não tem tempestade. — Arqueei a sobrancelha.
— Eu sei, mas estou a fim.
Toquei na sua barriga e em seguida comecei a fazer cócegas,
tudo o que ele mais odiava.
— Admita que não vive sem mim, ruivinho.
Ele começou a rir, desviando das minhas mãos.
— Para!
— Admita!
Ele balançou a cabeça, mas se rendeu.
— Não imagino uma vida sem você, pestinha. — Bagunçou os
meus cabelos. — Agora vamos dormir porque eu tenho que acordar
cedo amanhã.
Me aconcheguei ao seu lado, com o coração transbordando
de felicidade por pelo menos uma parte da minha vida ser boa. Meu
irmão havia ocupado um espaço ainda maior dentro do meu
coração.
Rei e herói.
Éramos tudo um para o outro.
— Promete? — sussurrei antes de cair no sono.
— O quê? — Sua voz estava sonolenta.
— Que sempre vai estar comigo.
A resposta demorou mais tempo do que eu esperava.
— Eu prometo.
Meus olhos se fecharam e meu coração se iludiu com aquela
última frase quase como se iludiu com meu pai dizendo que seria a
última cerveja da vida.
Pouco tempo depois, eu saberia que aquele foi o pior dia da
minha vida.
 
O que for preciso
Porque adoro a adrenalina nas minhas veias
Faço o que for preciso
Porque amo a sensação de quando rompo meus limites
WHATEVER IT TAKES— IMAGINE DRAGONS
Uma criação boa resulta em um filho bom.
Era o que eu escutava quando meus colegas aprontavam na
escola e as professoras conversavam entre si sobre aquele
determinado aluno.
Alguém deveria ter dito a elas que nem sempre uma má
criação resulta em um filho ruim. Eu sou um bom exemplo dessa
merda.
Criado por pessoas que nunca deveriam ser chamadas do que
eram para mim, não me tornei alguém ruim, pelo contrário, me tornei
alguém de quem Dylan e Rav se orgulhavam, mesmo com todas as
minhas bagagens, que não eram poucas.
Mas o que aquelas professoras não sabiam era o quanto a
sua mente fica fodida com uma má criação.
Meus pais nunca foram boas pessoas.
E quando vi meu pai matando a minha mãe, para logo em
seguida se matar, tive a certeza disso. Porra! Quem mata a mulher e
se mata logo em seguida? Isso não era normal.
Tudo aconteceu muito rápido naquela noite, fui passado por
tantas mãos e lugares que não conseguiria mencionar sem acabar
errando um deles nesse momento.
Eu era uma criança.
Eu estava em choque.
Até que alguns meses depois, eu estava em um novo lar,
sendo supervisionado por duas mulheres que cuidaram de mim
naquela época, hoje sei que elas eram assistentes sociais e
estavam vendo se Dylan e Rav cuidariam bem de mim.
Os Blossom salvaram a minha vida.
Eu provavelmente estaria no pior lugar da minha mente se não
fosse por eles.
Com treze anos, fui adotado legalmente e deixei de carregar o
sobrenome Green e passei a usar o sobrenome Blossom. Achei que
aquela leve mudança poderia também levar os meus pesadelos,
mas eu era apenas uma criança se iludindo com um sonho
impossível.
Eu poderia ser Tyler Blossom, mas o Tyler Green nunca sairia
de mim.
No final de todos os sorrisos e momentos felizes que eu tinha
na minha vida por conta da minha nova família, eu nunca deixaria
de ser um...
Inseto.
As vozes dos meus pais explodiram dentro da minha mente,
como se os dois ainda estivessem aqui, me falando como ser, como
reagir, me xingando, me batendo ou simplesmente me ignorando,
como se realmente fosse alguém insignificante na vida deles.
Eu nunca fui uma criança importante para eles.
Não.
Inseto não.
Um homem infeliz, talvez.
Nunca permitiria que aqueles dois me convencessem de que
eu era o que eles me chamavam. Nos poucos anos de terapia que
fiz, consegui enxergar que eu não era um inseto, ainda que em
meus pesadelos eles fizessem questão de gritar isso.
Eu era um homem quebrado que usava da adrenalina para
não permitir que pensamentos dolorosos se infiltrem na minha
mente.
Mas hoje nem a velocidade dos carros está me salvando.
Toda a história com Clarke Hale, a minha cunhada, despertou um
gatilho gigantesco em mim e os pesadelos, que já aconteciam com
frequência, começaram a me atormentar durante o dia.
A história de Nathaniel Blossom e seu cometa era triste, muito
mais do que qualquer teoria que a nossa família já havia pensado
durante os anos que permaneceram separados. Quando toda a
família descobriu que tudo não passava de uma grande
manipulação da mãe de Clarke, me senti angustiado. Sabia
exatamente o que minha cunhada ainda estava sentindo, mesmo
depois de meses da descoberta.
Uma parte dela ainda estava triste, ainda que tivesse se
livrado de um grande peso da sua vida, Jade era sua mãe e por um
bom tempo, era tudo o que ela tinha.
Se era difícil para mim que nunca recebi amor dos meus pais,
imagina para uma mulher que achava que sua mãe a amava?
Aquilo era fodido demais.
— Ei, maninho! — Skyller abriu a porta do meu quarto e
entrou. Sempre abusada. — Posso saber o que está fazendo
deitado em uma cama às duas horas da tarde da nossa primeira
segunda-feira de férias?
— O que todo aluno cansado faz? Descansando? — Sorri de
lado.
— Você pode até enganar os outros, mas a mim não. — Ela
veio até a minha cama e se deitou ao meu lado.
— O que os outros estão fazendo? — Mudei de assunto antes
que ela insistisse em saber sobre o motivo de eu estar aqui sozinho
com os meus pensamentos.
— Adivinha?
Eu ri baixinho.
— Casamento?
Assentiu.
— Clarke está selecionando junto com Alexandra os lugares
para procurar os vestidos, e Nathan está com Caleb. Ele
literalmente sequestrou o meu namorado.
— Sequestrou?
— Para o quarto dele, os dois estão pesquisando ternos na
internet e sabe como é seu irmão. Acredita que se Clarke ver o
terno que Nathan vai provar ou ele ver os vestidos das revistas,
pode dar azar no casamento.
— Eu acho que eles não precisam se preocupar com azar.
Depois de tudo o que passaram, impossível alguma coisa quebrar o
amor que eles sentem.
— Eu concordo, mas tenta explicar isso para Nathan.
— Difícil, né?
Ela riu.
— Muito.
— Me diz uma coisa... — Me ajeitei melhor na cama e a olhei.
— Dylan e Rav já sabem dessa ideia doida de casamento?
Meu quarto foi invadido pelo assunto da nossa conversa e
meu cunhado, que parecia ser o único sem jeito por invadir.
— Não é uma ideia doida e você entenderia se estivesse
apaixonado — Nathan se defendeu, enquanto se atirava na minha
cama. — Por que está nesse quarto trancado? O dia está lindo.
Olhei para a neve que caía lá fora e arqueei as sobrancelhas.
— Você entendeu.
— Ele está apaixonadoe todo aquele lance de só ver o mundo
cor de rosa — Sky justificou, provocando o meu irmão.
Olhei para Caleb e Sky.
— Ainda bem que vocês são um pouco menos emocionados.
— Respondendo a sua pergunta, maninho, não, nossos pais
não sabem de nada e vão saber no próximo final de semana, que é
quando eles vêm passar o Natal conosco — Nathan explicou.
— Vai ser divertido ver eles surtarem — comentei.
— Essa eu não perco por nada. — Sky segurou a mão de
Caleb. — Já pesquisaram os ternos?
— Seu irmão vai nos arrastar para oito lojas diferentes. —
Caleb me olhou. — Está preparado?
Observei o loiro na minha frente, que fez questão de desviar
os olhos castanho-claros só para não encarar meu olhar
repreendedor.
— Oito lojas? Para que visitar oito lojas quando podemos
comprar o primeiro terno que gostarmos na primeira? Nathan, os
ternos são todos iguais, pelo amor de Deus!
Meu irmão revirou os olhos.
— As lojas trabalham com tecidos diferentes, alguns melhores
e outros piores, precisamos sentir a textura nas nossas peles...
— Nem pensar! Pode parar com isso — falei. — Vamos na
melhor loja e compramos os melhores ternos, pronto.
— Você é tão prático que me irrita. — Nathan revirou os olhos.
— Praticidade é tudo nessa vida quando o tempo vale ouro —
Sky me defendeu. — Mas mudando de assunto, vamos receber uma
visita nos próximos dias.
— Visita? — perguntei. — Dylan e Rav não são mais visitas...
— Não são nossos pais — Nathan que disse.
— Angeline Fraser, a melhor amiga de Clarke — Sky contou.
— Parece que foi essa Angel que me substituiu em Los Angeles.
Não havia um tom de mágoa na última parte, afinal, não era
culpa de Clarke que a mãe tivesse escondido Nathan e Skyller dela
depois de um acidente que levou parte da sua memória.
Aquela história era cruel, triste e, ao mesmo tempo,
inspiradora demais para ser resumida.
Mas espera aí...
— Angeline? Fraser? Tipo...
— Tipo irmã de Ryder Fraser — Nathan interrompeu, soltando
a bomba. — É, eu sei, também fiquei chocado com a fofoca.
— Não sabia que Ryder tinha família — falei.
— E você acha que ele nasceu de quê? Da cegonha? — Meu
irmão debochou.
Dei um tapa na sua nuca.
— Idiota! Achei que pela vida que ele leva, não teria família,
afinal, ele nunca comentou nada.
— Então são amigos? Pensei que eram, no máximo, colegas
de negócios — Sky indagou, bem curiosa.
— Sou o melhor corredor de Ryder, nossa relação é a mais
amigável possível — expliquei. — Ryder não tem amigos, essa é a
verdade.
— Se não fosse por Rebeca, eu diria que ele é muito solitário
— Caleb quebrou o seu silêncio, dizendo aquela frase que fazia
muito sentido nos últimos meses.
— Eles já vão completar o quê? Um ano juntos? — Nathan
começou a fazer as contas com a mão direita.
— Acho que está bem perto disso.
Rebeca era a melhor amiga da minha outra irmã, Alexandra, e
havia se apaixonado pelo traficante mais temido de Campbell, Ryder
Fraser. Por sorte ou azar, ele também estava muito interessado nela
e com um relacionamento que pelos nossos olhos só se fortalecia,
as coisas estavam indo muito bem.
Mas na vida de Ryder apenas o seu império importava, e eu e
mais todas as pessoas que se importavam com a baixinha de
cabelos cor de rosa, nos preocupávamos com isso.
Ryder que merecia ser chamado de bad boy pelo que era,
diferente de mim, que apenas corria pelas ruas desertas do deserto.
— Mas o que você quis dizer com Angeline vir nos visitar? —
perguntei, gostando de como o nome soava. Era um nome muito
bonito.
— Ela está vindo estudar em Campbell, mas a faculdade está
de recesso, ou seja, vai precisar ficar alguns dias aqui e como ela
vai ajudar a Clarke na escolha do vestido e vai ser madrinha do
casamento, precisa fazer as provas dos vestidos — Sky explicou.
Tive que fazer a pergunta, porque aquilo ainda parecia loucura
na minha cabeça.
— Está mesmo planejando um casamento sem contar nada
para Dylan e Rav? — perguntei para Nathan.
— Eles vão descobrir no fim de semana.
— Mesmo assim... por que tanta pressa? Vocês dois têm vinte
e um anos.
Meu irmão riu, segurando a minha mão.
— Quando amar da mesma forma que eu estou amando, vai
entender perfeitamente o motivo da pressa.
— Tão romântico! — Sky apertou a bochecha dele.
Nathan desviou, rindo.
— Vamos, preciso da sua ajuda pra selecionar as melhores
lojas, já que não quer visitar as oito comigo e com seus cunhados.
— Precisa mesmo de mim?
— Não, mas odeio ver você nessa cama olhando para o teto e
pensando merda. — Bateu nas minhas pernas. — Vamos!
— Ele também consegue ser bem delicado — murmurei para
Sky, que riu do meu sarcasmo.
Me levantei e Caleb fez o mesmo.
— Para quando vocês estão planejando esse casamento
mesmo? — perguntei.
— Para daqui duas semanas.
Ele não estava brincando.
— O quê?! — gritei.
Mas ele não me respondeu.
Deu as costas e foi para o quarto.
Aquilo era a maior loucura que essa família já presenciou, e
olha que minha irmã namorava com o sócio de Dylan, dezesseis
anos mais velho que ela.
Não, eu ainda não havia superado essa porra.
Deserto.
O segundo lugar que eu mais frequentava, perdendo apenas
para a universidade. Era um lugar que rolava de tudo e eu sabia que
meus irmãos não apoiavam as corridas que eu disputava nesse
lugar, mas eram nessas horas, quando estava dentro de um carro
correndo a mais de 160km/h, que me sentia vivo.
Eu amava sentir a adrenalina nas minhas veias.
Era ela que me salvava do fundo da minha mente.
Quando se é diagnosticado com Transtorno Explosivo
Intermitente ainda na adolescência, as coisas podem complicar um
pouco. Eu tomava os meus remédios da forma correta, afinal o meu
transtorno estava relacionado à raiva e se eu parasse de tomar
esses comprimidos, poderia explodir por qualquer coisa, mas eles
não me salvavam de todas as explosões internas que eu tinha.
Os medicamentos estavam ali para serem um auxílio, e o meu
refúgio deveria ser a terapia, que estava fugindo há anos, mas
infelizmente eu não conseguia.
Tinha consciência do que era certo.
Mas não conseguia, me sentia sufocar só de me imaginar
dentro de uma sala conversando com uma pessoa estranha. Foi
assim durante todos os anos que fiz terapia, toda a semana
sufocando e me sentindo irritado por ter que ir até lá conversar com
a terapeuta sobre coisas que não conseguia admitir nem para mim
mesmo.
Foi então que agarrei a primeira oportunidade para fugir, vim
para Campbell e encontrei nas corridas o meu maior remédio.
Mesmo sabendo que não era certo.
— Ashton está aqui hoje. — Ryder se aproximou do meu carro
e gritou sobre a música alta do lugar. — Ele não desiste.
— Espero que o meu carro tenha ficado bem longe das mãos
do idiota dessa vez — sondei o ruivo.
Ashton Sanchez era o meu maior inimigo dentro das corridas
organizadas por Ryder, e da única vez que perdi para o idiota foi por
conta da sabotagem que ele fez no meu carro, horas antes da
corrida.
— Você tirou o carro hoje da garagem, Blossom — Ryder
lembrou. — Pegou a única chave da minha mão, relaxa.
— Não gosto dele e você sabe disso.
— Acontece que ele me traz muito dinheiro nas apostas, então
você vai ter que aturar — apertou o meu ombro. — Precisa de
alguma coisa?
Neguei.
No final de todo esse jogo, Ryder era quem mandava e eu era
inferior até mesmo aos seus empregados, já que não trabalhava
para ele.
— Faça o seu melhor. — Deu as costas e foi em direção à
Rebeca.
A garota de cabelos cor de rosa acenou para mim com um
sorriso sincero nos lábios, acenei de volta. Eu gostava dela e da
amizade que havia criado com Alexandra.
Ryder a abraçou pela cintura e deixou um beijo singelo nos
seus lábios, sussurrando algo no seu ouvido que foi respondido com
uma risada que se não fosse pela música, ouviria daqui. Os dois
combinavam de uma forma quase bizarra e eu podia notar como
Ryder se comportava diferente ao lado dela. A sua cara amarrada
não permanecia por muito tempo e mesmo que não sorrisse, ainda
conseguia ver um brilho que nunca esteve naqueles olhos castanho-
claros.
— Pronto para mais uma partida, Blossom? — A voz irritantede Ashton me despertou dos pensamentos.
Abri a porta do meu carro preto e, antes de entrar, o olhei.
— E você? Está pronto para perder mais uma vez?
Não deixei que respondesse.
Entrei no carro, ouvindo os gritos das pessoas ao nosso redor,
alguns torcendo para Sanchez e a grande maioria para mim. Não
era de me gabar como o meu irmão, mas dificilmente eu perdia uma
corrida, e dessa vez não seria diferente.
Eu não temia Ashton Sanchez.
A não ser que ele tivesse visitado a garagem do meu carro
nos últimos dias.
Meus irmãos preferiram ir na última festa dos universitários do
que vir assistir mais uma corrida que sempre terminava da mesma
forma: eu ganhando. Não que eu estivesse reclamando. Odiava
perder, não por ego ferido, mas por saber que era bom demais para
isso.
O lugar estava cheio para uma festa no deserto em plena
segunda-feira de férias. Naquela noite, apenas eu e Ashton
disputaríamos e de longe podia ver o braço direito de Ryder
cuidando das apostas e das drogas.
Eu fechava os olhos para muitas coisas que aconteciam no
deserto, principalmente para o tráfico de drogas que acontecia e que
praticamente mantinha o império de Ryder.
Liguei o meu carro e conferi mais uma vez se estava tudo em
ordem dentro do veículo, não sabia quando Ashton poderia me
surpreender e não queria que isso acontecesse novamente.
O nitro estava ok.
Aceleração também.
Combustível cheio.
Era só começar o jogo.
Parecendo ouvir os meus pensamentos, Ryder largou Rebeca
e veio até o meio da pista, ficando entre os nossos carros.
— Boa noite — cumprimentou a todos. — Preparados para
mais uma corrida? — gritos em resposta. — Hoje apenas o primeiro
e o segundo lugar da semana passada irão correr, provando a todos
nós que só há um vencedor.
Mais gritos.
Ryder pegou a bandeira vermelha e ergueu para cima.
Me preparei, atento ao sinal, que a qualquer momento
abaixaria e iniciaria a corrida.
— Que vença... o melhor. — Abaixou a bandeira, dando a
largada.
Meus pneus cantaram no asfalto ao dar a partida no veículo,
mas não me importava com isso, era até mais emocionante.
Acelerei o carro o máximo que pude, observando sempre pelo
retrovisor o meu concorrente.
Ashton estava quase me alcançando e por conta disso, pisei
mais fundo no acelerador. Não queria usar o nitro agora, era cedo
demais para desperdiçar o ouro da corrida. O percurso não era
grande, afinal, o acesso era limitado apenas a estrada velha de
Campbell, que fazia uma volta em quase toda a floresta da cidade e
durava em torno de cinco minutos com a velocidade em que
corríamos.
Ashton acelerou mais o carro branco que usava e eu pisei
mais fundo no acelerador, sentindo o vento bater no meu rosto e
vendo o velocímetro indicando mais de 180km/h.
Eu não sentia medo.
Não havia nada melhor do que sentir essa adrenalina.
Fiz a única curva da estrada e meu carro quase empinou
devido à força da velocidade. Ashton vinha logo atrás e quando ia
usar o nitro, fui surpreendido por algo que se chocou contra mim.
Outro carro.
Amarelo vibrante e que tentava a todo custo me passar.
De onde esse maluco havia surgido?
Olhei para frente e notei que em mais alguns quilômetros
chegaríamos ao fim de mais uma corrida, mas com aquele cara ao
meu lado, ora ganhando e ora perdendo por diferença de
centímetros, poderia me atrapalhar em tudo e foi exatamente por
isso que decidi usar o nitro naquela hora.
Meu carro correu mais com o uso do gás que entrou no motor.
Sorri, me sentindo vitorioso ao ver o carro amarelo
desconhecido atrás de mim e o de Ashton ainda mais longe.
Eu sempre vencia e sempre seria...
Foram questão de segundos, basicamente em um piscar de
olhos, e o cara do carro amarelo passou por mim em uma
velocidade muito superior à minha, parando o carro depois da linha
de chegada e dando a corrida como encerrada.
Eu havia... perdido? Como...?
Quem era esse homem?
Parei o meu carro ao lado do vencedor, engolindo a raiva de
estar no segundo lugar e de ter perdido para alguém que nem fazia
parte dessa droga. É óbvio que Ryder não deixaria as coisas assim.
Esse cara nem estava competindo.
Saí do carro furioso e bati a porta, esperando que o idiota
mostrasse a cara. De canto de olho vi Ashton fazer o mesmo, se
encostando no seu carro branco.
Algumas pessoas ao nosso redor cochichavam sobre e outras
apenas gritavam, já bêbadas e chapadas demais para entenderem o
próprio idioma.
Olhei fixamente para o para-brisa do carro amarelo. Ele não
iria descer?
Eu sentia que o olhar da pessoa dali de dentro estava
fixamente em mim e aquilo me trouxe uma sensação estranha no
estômago. Desviei o olhar, procurando por Ryder, e o achei a alguns
metros de distância de nós, olhando para o carro amarelo com
estranheza.
Antes que eu me intrometesse naquela situação estranha para
cacete, o motorista abriu a porta do carro amarelo e saiu quase que
em câmera lenta sob o meu olhar.
Não era ele.
Cabelos ruivos como o fogo, pele branca como a neve e com
um corpo digno de deixar qualquer homem vidrado, uma mulher
saiu do carro. Ela bateu à porta do veículo e quando se virou em
minha direção, fiquei ainda mais hipnotizado.
Ela era definitivamente a mulher mais gostosa que já havia
colocado os pés em Campbell.
Com um andar confiante e ao mesmo tempo raivoso, ela
andou em minha direção. Meu olhar ainda permanecia vidrado nela
e foi por isso que tive a certeza de que eu não era o seu foco, havia
um ponto atrás de mim que a chamava mais atenção.
Mas, ainda assim, não consegui impedir de me sentir vibrar.
Ela era incrivelmente linda.
Seu olhar cruzou com o meu por alguns segundos e um
sorriso de lado se abriu nos seus lábios, só para me provar que ela
também conseguia ser a mulher mais sexy que já cruzou o meu
caminho.
Quando passou por mim, deixou o seu cheiro impregnado ao
meu redor e a certeza de que eu precisava conhecê-la.
Pela primeira vez, Tyler Blossom havia perdido e não se sentia
puto, pelo contrário... eu me sentia curioso.
Eu sinto você me segurando
Apertado, eu não posso ver
Quando nós finalmente vamos
Respirar
BREATHE — FLEURIE
Quando se é jovem e perde a única coisa que importa, tudo
tende a mudar para pior, até mesmo a personalidade, mudando para
uma completamente fora da sua essência.
Maturidade ou medo?
Qual lado da balança pesava mais quando eu vejo a jovem
Angeline, sem o seu herói e completamente sozinha com um
bêbado que ainda era obrigada a chamar de pai? Talvez o peso não
esteja apenas em um lado, e sim completamente equilibrado.
Ryder nunca voltou para casa depois da noite que me iludiu
com palavras bonitas e ensaiadas que qualquer herói de televisão
falaria.
Ele me deixou.
E quando se é abandonada pela segunda vez pela própria
família, você tende a amadurecer rapidamente com armaduras
fortes o bastante para se proteger de todos os seus medos.
Passei sete anos da minha vida cuidando do meu pai, ouvindo
desaforos de um homem quebrado e alcoolizado, tendo que
aguentar toda a responsabilidade de uma vida adulta quando estava
entrando na adolescência. Se não fosse por Maria McQuiston, a
dona da lanchonete que ficava perto da minha casa, eu teria morrido
de fome e meu pai logo em seguida. Então a vida que tive até agora
não era apenas mérito meu, também era por conta da ajuda que
recebi de uma pessoa boa e que finalmente me mostrou o que
realmente é ser uma heroína.
Maria fez de tudo para ajudar meu pai também, mas existia
um fato muito importante para todos que estavam no fim do poço:
não conseguimos ajudar quem não quer ser salvo.
A verdade é que eu estava furiosa.
Guardava a raiva, a dor e o rancor há muitos anos dentro de
mim, e quando soube onde o meu irmão se escondia, não perdi a
oportunidade de me vingar.
A melhor parte de tudo é que eu estaria aqui, planejando o
casamento da minha melhor amiga, e vendo o império do meu irmão
ruir tão rápido quanto surgiu.
O rei do deserto.
Era isso que ele era? Bom... ele estava prestes a descobrir
que não se deixa a princesa de fora do reinado.
— O que está fazendo aqui, Angeline? — Ryder pegou nomeu braço e me afastou de uma garota de cabelos cor de rosa, que
observava tudo sem entender nada.
A música tocava baixa e as pessoas nos olhavam confusas
também.
Sorri.
Eu havia arrasado na minha entrada.
Antes da minha mãe morrer, eu tinha uma vida familiar normal
e meu pai era viciado em corridas. Ele amava acordar cedo para
assistir Gold Rush, ralis e outros esportes automobilísticos que
passavam na televisão. Os filmes prediletos da família Fraser? Toda
a saga de Velozes e Furiosos. Era incrível pegar a pipoca e ficar
assistindo aqueles filmes em uma tarde de família.
Meu pai era muito apaixonado por carros, e quando viu que a
filha amava sujar as mãos de graxas quase tanto quanto amava
tocar violão, passou todos os ensinamentos que tinha sobre carros,
motor e tudo o que precisava pra ganhar uma corrida.
Então usei do meu conhecimento para arrumar o carro velho
da família só para chegar aqui e vencer uma corrida que já estava
acontecendo.
Isso que eu chamava de entrada.
— Também senti sua falta. — Usei o sarcasmo ao meu favor.
Fazia tempo que Ryder não me magoava, tudo o que eu
sentia por ele era raiva. Como ele pôde me deixar daquela forma?
Como foi tão ruim a ponto de nem me ligar para saber se eu
precisava de algo? Eu precisava de dinheiro, eu precisava dele!
— Angeline...
— Ah, é melhor você nem começar — o interrompi, me
afastando dele assim que saímos do meio das pessoas. — O que
eu estou fazendo aqui? É isso que tem para perguntar depois de
todos esses anos?
Ele engoliu em seco.
Meu irmão era tão parecido comigo. Os cabelos ruivos e a
pele bem clara, a diferença estava nas suas sardas. Ele era cheio
delas pelo rosto, já eu não tinha muitas, tinha menos do que Clarke,
minha melhor amiga.
— Esse não é o lugar para termos essa conversa — falou,
demonstrando toda a frieza que havia adquirido nesses últimos
anos.
Ryder não era mais meu irmão, eu já tinha essa certeza há
muito tempo.
— Certo, vou para Los Angeles esperar por uma ligação sua...
— O olhei com cinismo. — Ou o que acha de uma visita? Devo
esperar você como da última vez?
— Angeline, pare de ser irônica! Isso me irrita. — Ele pegou
na minha mão, e antes que eu pudesse me soltar, Ryder me levou
para longe da festa que já voltava aos poucos.
— Para onde estamos indo?
— Você não quer conversar?
— Na verdade, eu quero brigar com você — fui sincera.
Ele balançou a cabeça e continuou o seu caminho. O segui
quieta porque realmente queria jogar algumas verdades na cara
dele e, se pudesse, dar um tapa naquelas bochechas seria um
bônus.
Eu o odiava.
Havia um trailer bem perto do início da floresta de Campbell e
foi nele que entramos.
— Eu juro que achava que seu estilo de vida fosse melhor do
que esse — falei, olhando para o interior do lugar.
Havia uma cama no canto, uma mesa no centro com duas
cadeiras e uma parte que imitava uma cozinha de trailer, já que
aquilo não era nada parecido com uma.
— Não moro aqui. — Cruzou os braços em frente ao corpo,
me olhando como se eu fosse indesejada aqui. — O que está
fazendo em Campbell? Como soube que estou aqui?
— Eu vou morar aqui. — Sorri, falsamente. — E não foi muito
difícil de saber onde você estava.
Havia pedido para um colega muito inteligente da faculdade,
que transei no verão passado, rastrear a última ligação de Ryder.
Basicamente, me inspirei no ex-namorado maluco da minha melhor
amiga.
— Esse não é o seu lugar, Angeline.
Eu ri, tive que rir daquela piada.
— Não é o meu lugar? — Me aproximei dele, empurrando seu
peito. — Você pode ao menos olhar para mim quando dirige as
palavras? Desde quando se tornou um cuzão? Por que me deixou?
Por que se tornou um idiota? Eu precisava de você! Nosso pai
precisava de você!
Foi a vez dele rir.
— Nosso pai precisava de mim? — Balançou a cabeça. —
Nosso pai só se preocupava se o copo de bebida estava cheio.
Ryder permaneceu de pé, imóvel demais para alguém que
havia sido empurrado há alguns segundos.
— Quer saber? Eu não me importo com a sua versão. A
verdade é que eu me virei muito bem sem você, sabia?
— Então o que está fazendo aqui?
Aquilo doeu como brasa queimando a pele.
Não.
Ele não me machucava mais.
— Eu estou aqui porque quero me divertir. — Dei de ombros.
— Não posso? Ou vai me proibir de pisar aqui?
— Não quero você no deserto.
— Acontece que você não manda em mim, Ryder — deixei
bem claro. — Você perdeu qualquer direito de me dar conselhos
quando me deixou naquela casa sozinha.
Pela primeira vez, vi algo parecido com dor passar nos olhos
claros dele.
— Não quero ter essa conversa agora.
Assenti.
E antes de me afastar totalmente dele, dei um tapa bem dado
na sua cara. Eu não era uma mulher muito violenta, mas ele me
irritava, e coisas que me tiravam do sério me tornavam violenta.
Ryder apenas virou o rosto com o impacto do tapa, mas não reagiu.
Ele sabia que merecia muito mais do que isso.
— Você me dá nojo — falei diretamente na sua cara. — Tive
que esquecer que você existia, tive que me lembrar que heróis só
existiam na televisão, tive que viver sozinha com o medo e a vida
adulta me abraçando antes do tempo, tive que aprender como
cuidar do meu pai sozinha, tive que lidar com tudo porque você foi
um covarde.
— Você não sabe de nada — murmurou.
— Não, e eu não quero saber, da mesma forma que você não
quis saber de mim durante todos esses anos — falei. — O que é
seu está guardado, Ryder Fraser.
Não esperei que ele entendesse a ameaça que aquela frase
final significava. Me virei e saí dali antes que o estapeasse mais.
Babaca.
Antes que pudesse pensar no que faria a seguir, trombei com
um corpo forte e tão alto quanto eu. Olhei para o cara e o reconheci
imediatamente, era um dos corredores que eu havia vencido nessa
noite.
Um tremendo gostoso.
Pele negra com um rostinho de bad boy sexy e ao mesmo
tempo de mocinho fofo, os cabelos eram curtos e a jaqueta de couro
que usava não escondia o corpo delicioso que ele tinha.
— Para você ser feio, só falta me dizer que trabalha para
Ryder — brinquei, estendendo minha mão em sua direção. —
Angeline Fraser.
Ele pareceu surpreso de primeira e um brilho de
reconhecimento passou pelo seu olhar assim que processou o meu
nome. 
— Tyler Blossom. — Apertou a minha mão.
Entendi a sua reação assim que disse o seu nome completo,
não consegui nem focar na voz bonita que ele tinha e muito menos
na maciez da sua mão.
— Blossom? Campbell é tão pequena a ponto de eu cruzar
com o irmão de Nathaniel?
— Estou me perguntando a mesma coisa em relação a você.
Coloquei minhas mãos no bolso da jaqueta jeans que usava.
Ryder saiu do trailer no mesmo momento.
— É melhor você ir embora, Angeline — ele aconselhou.
Sério? Balancei a cabeça, negando para mim mesma o abuso
desse ser que eu já havia chamado de irmão.
— Na verdade, vou me divertir com o ansioso aqui. — Enlacei
o meu braço no de Tyler. — Ele não me parece ser o tipo que
trabalha para você e estou bem curiosa para aproveitar os últimos
dias de paz do deserto.
Deixei que ele ficasse sem entender sobre o que eu estava
falando e caminhei para longe de meu irmão, arrastando Tyler
Blossom comigo.
Ele que se acostumasse com minha impulsividade, seríamos
tudo uma grande família agora que Clarke iria se casar com Nathan.
Por Deus... Acho que minha amiga enlouqueceu, mas isso era
conversa para outro momento.
— Eu sou ansioso? — Tyler indagou assim que nos
aproximamos do barril de cerveja, me desvencilhei do seu braço e
peguei uma garrafa de bebida. — E o que quis dizer com os últimos
dias de paz do deserto?
— Muitas perguntas. — Tomei um gole da minha cerveja. —
Você é ansioso, se tivesse esperado mais alguns segundos para
usar o nitro, teria me vencido.
Ele sorriu de lado, assentindo. Tyler se aproximou do meu
corpo e pegou uma garrafa de cerveja atrás de mim sem desviar os
olhos negros dos meus.
— Está me ensinando a correr?
Sorri, não deixando de perceber que seus olhos caíram
rapidamente para os meus lábios.
— Você corre bem, Blossom — elogiei, não fugindo da sua
aproximação. Eu conhecia bem esse jogo,mas era difícil eu cair
nele. — Mas precisa ser um pouco menos ansioso, só isso.
Ele abriu a sua garrafa de cerveja e tomou um grande gole, se
distanciando um pouco de mim. De longe, observei Ryder ao lado
da garota de cabelos cor de rosa e soube que estava irritado com a
minha presença aqui por não desviar o olhar de mim.
É claro que ele estava pensando no que eu disse. Meu irmão
era inteligente e me conhecia, o tempo que passou distante de mim
não mudava muitas coisas.
— Irmãos — Tyler comentou, olhando de mim para Ryder. —
Não imaginava que ele tivesse uma irmã.
— Deixei de ser lembrada por ele há muitos anos — falei e
notei o olhar de Tyler mudar. — Sem perguntas, Blossom.
— Estou curioso.
— Fique com sua curiosidade.
Assentiu, rindo baixinho.
— Você também corre bem — elogiou. — Posso saber ao
menos sobre isso?
Me virei para ele.
— O que quer saber?
— Como aprendeu a correr?
— Meu pai era apaixonado por corridas e carros, aprendi
muita coisa com ele — resumi. — E você? Corre por diversão?
— Não deixa de ser.
Parecia haver mais coisas nessa resposta.
Tomei o restante da minha cerveja, observando as pessoas se
embebedando e se drogando ao nosso redor. Um cara passava por
algumas delas e recolhia um dinheiro que eu não fazia ideia do que
era.
— Seu irmão se deu bem com a sua presença hoje — Tyler
explicou, seguindo o meu olhar. — Como nenhum dos corredores
ganhou, ele ficou com a grana toda.
Eu sorri.
— É óbvio que ele ficou.
Era estranho saber que a única coisa que me ligava a Ryder
hoje era o sangue. Ele não se parecia mais em nada com o meu
irmão.
— Quem é a garota de cabelos cor de rosa? — perguntei,
bem curiosa ao ver a forma como ele a segurava perto de si.
— Rebeca Wilson, minha amiga e sua cunhada. — Sorriu de
lado.
Ele tinha um sorriso muito sexy.
Na verdade, Clarke precisava me explicar direitinho o motivo
de não ter me dito que tinha um cunhado muito gostoso, do tipo,
para caralho, que parecia ter saído dos catálogos de atores jovens
de Hollywood.
Mas espera aí... cunhada?
— Meu irmão está namorando. — Não perguntei o que já era
óbvio.
Tyler bebeu da sua garrafa e voltou a se aproximar.
— E você? Tem namorado?
O tom de flerte não passou despercebido por mim e isso
quase me fez sorrir. Levei a garrafa de cerveja à boca e bebi um
gole, consciente de que ele prestava atenção em cada detalhe meu.
Ok, não podia julgá-lo. Eu também não parava de encará-lo, e assim
como uma mulher sabe que atraiu um homem, um homem também
sabe quando atraiu uma mulher.
— Não — respondi, simplesmente. — Também não pretendo,
e você?
Minha resposta não pareceu desencorajá-lo, na verdade,
pareceu bem interessante.
— Não, e também não pretendo.
Tomei o restante da minha cerveja.
— É uma pena que vamos morar juntos por alguns dias e que
você é irmão do namorado da mulher que é como uma irmã para
mim, ou então poderíamos nos divertir muito essa noite. — Inclinei o
meu rosto um pouco para direita, não deixando de olhá-lo. — Mas
sou uma mulher que segue alguns princípios.
Acho que ele não esperava que eu fosse tão direta, mas não
resisti.
— De qualquer forma, foi um prazer conhecer você.
Deixei a garrafa na sua mão e segui o caminho até o meu
carro.
Os princípios eram apenas desculpas, a verdade é que eu
tinha um foco e distrações não eram bem-vindas, não importava o
quão deliciosas elas fossem.
Destruir o império do meu irmão era a maior prioridade de
todas, e o primeiro passo já havia sido dado.
Eu tenho algumas más intenções
Eu tenho algumas más intenções
Eu tenho alguns segredos que eu esqueci de mencionar
Não aprendi a lição
BAD INTENTIONS — NIYKEE HEATON
Angeline Fraser.
Seu nome combinava muito com a sua pose e a sua
aparência. Os cabelos ruivos e o rosto angelical me fizeram a
relacionar com um anjo, mas o comportamento atrevido e o ódio que
vi no seu olhar eram completamente contraditórios com esse nome.
25% anjo e 75% demônio.
Definitivamente, o meu tipo de mulher.
A cena de algumas horas atrás e a forma como terminamos a
nossa conversa cheia de segundas intenções rapidamente me veio
na mente. Eu a entendia, os seus princípios eram bem interessantes
e conscientes, mas eu não queria dar a mínima para eles.
Queria Angeline Fraser na minha cama.
E eu sabia que ela também me queria.
Era comum eu me atrair por uma mulher e transar com ela
sem nenhum compromisso, não tão comum quanto era com Nathan
antes de Clarke. Eu não era um homem muito aberto, e isso
afastava muitas garotas como também atraía outras, e eram essas
que, quando existia uma atração dos dois lados, eu costumava me
envolver.
Nada sério.
Não servia para relacionamentos, não no momento.
Era quebrado demais para amar alguém da mesma forma que
Nathan amava Clarke, por exemplo. Então era por isso que me
divertia com pessoas que estavam na mesma vibe que a minha,
deixando o meu pobre irmão chocado, já que ele amava me zoar
com o lance da virgindade.
Babaca!
E eu ainda o amava.
Segui em direção à minha casa, já que a festa de Ryder
perdeu o interesse assim que a ruiva deu as costas e foi embora.
Ainda fiquei mais um tempo, tentando algo que nunca conseguia:
me divertir e ser um jovem normal, mas era difícil, muito difícil
quando sua mente vive um inferno dia e noite.
Deixei Ryder e sua turma para trás, o ruivo parecia muito
tenso com a chegada da irmã e eu gostaria muito de entender o
motivo, estava claro que havia algo maior do que um conflito entre
eles. O ódio e a mágoa eram sentimentos fáceis de serem
reconhecidos por mim, e eu vi ambos no olhar de Angeline.
Que mulher...
Ela ainda teria que passar alguns dias na mesma casa que eu
morava. Como, em sã consciência, eu deixaria de repará-la?
Angeline tinha uma beleza fora do comum.
Estacionei o carro na garagem ao lado do de Nathan e desci.
Apenas Alex estava em casa, sentada no sofá enquanto brincava
com o seu furão e a sua Pitbull.
— Chegou cedo — disse ao notar a minha presença.
— Sabe que eu não curto muito as festas.
Ela assentiu e deu dois tapas ao seu lado, indicando para me
sentar bem ali. Retirei o meu tênis e fui até ela.
— Como você está, Ty? — perguntou.
— Bem e você, pequena?
Alex me conhecia muito bem e tinha uma facilidade de ler as
pessoas que nenhuma outra pessoa que eu já conheci tinha. Por
isso, não fiquei surpreso quando semicerrou os olhos na minha
direção.
Maldita hora que fraquejei e chorei na frente deles.
— Se quiser conversar, eu vou estar aqui. — Deitou a cabeça
no meu ombro. — Vocês me disseram uma vez que eu não
precisava guardar tudo dentro de mim e digo o mesmo para você,
Ty. Nós quatro temos essa mania, e é horrível.
— Os irmãos Blossom não querem mostrar suas dores para
os outros — brinquei, a abraçando de lado. — E você e Vincent?
— O que tem eu e Vincent?
A olhei bem sério.
— Nathan te contou? Eu falei que não era para contar!
— E Nathan cala a boca em algum momento? Você conhece o
seu irmão.
— Eu e Vincent estamos bem, falei que era apenas bobagem
minha — garantiu. — Você sabe como eu sou carente.
Meu cunhado era muito mais velho do que a minha irmã e
como dono de um hospital veterinário, médico e sócio do meu pai de
outro hospital, se atolava de serviço. Alex entendia isso, sabia o
quanto ele amava e havia lutado para chegar aonde estava, mas
depois da abertura do hospital em Charlotte, o tempo que eles
tinham juntos diminuiu e minha irmã estava triste por isso.
— Já falou isso para ele? — perguntei.
— É claro que não! Vincent já dá conta de muito mais do que
deveria, imagina com um drama da namorada adolescente — Alex
brincou com a situação.
— Não é drama e você não é mais uma adolescente. Só
quero que fique bem diante de todas essas situações.
— Não se preocupe, eu não vou surtar mais do que já estou.
— Então está surtando?
— Tenho transtorno bipolar, é claro que surto, mas logo passa.
— Sorriu, parecendo bem sincera.
Eu gostava dessa nova confiança da minha irmã.
Antigamente, ela dizer que tinha transtorno bipolar vinha em
um tom triste e acabado, agora parecia mais confiante e natural.O
transtorno não tinha cura e fazia parte dela, estava muito feliz que
ela havia amadurecido muito nos últimos meses a ponto de aceitar
essa situação que sempre foi difícil para si mesma.
Diferente de mim, Alex era uma pessoa resiliente. Ela não
tinha problemas em ter um acompanhamento médico e psicológico.
Já eu, meu maior problema era com eles e eu sabia que precisava.
A raiva e o estresse com coisas simples eram fortes, e remédios
não eram os únicos tratamentos para uma pessoa com TEI. Por
isso, eu seguia alguns conselhos que o meu primeiro psiquiatra
havia me dado. Praticava atividades físicas quase todos os dias e
com as corridas, achei uma válvula de escape perfeita.
Se a minha ex-psicóloga me ouvisse falando isso...
— Acho que vocês dois precisam ter uma conversa séria,
afinal, relacionamentos não são só alegrias, né? Na dificuldade,
precisam encará-las juntas.
— Eu amo o fato de que você nunca namorou, mas é o mais
sábio entre nós.
Sorri de lado.
— Na teoria eu costumo saber muitas coisas.
Meu celular tocou, indicando uma mensagem.
“É natural ou pintado?”
Sebastian Sinclair.
Revirei os meus olhos. O cara era mesmo insistente e sua
mensagem mostrava o quanto era um pervertido. Não deveria ter
falado sobre a ruiva que eu me senti atraído no meio da festa, ele
iria querer saber mais sobre e, como o verdadeiro puto que se
mostrava ser, detalhes mais perversos do que o nome e sobrenome.
Mas foi impossível não pensar na resposta.
Me peguei curioso para saber se Angeline era mesmo natural.
Tudo parecia indicar que sim. Seus cabelos eram ruivos como fogo,
e suas sobrancelhas também não pareciam ser pintadas. Divagando
um pouco mais longe, foi inevitável não pensar em seu corpo.
Cintura fina, quadris firmes, mas não muito largos, e peitos
médios. Eu não estava brincando quando disse que ela era a garota
mais linda e gostosa que já havia cruzado o meu caminho.
Suspirei, encarando a mensagem do idiota.
Bloqueei o telefone assim que a porta da entrada abriu. Alex
se levantou, seguindo Jack e Morg até a entrada.
Nathan, Sky e Caleb entraram na sala.
— Oi, princesinha — Nathan abraçou Alex. — Está bem?
— Estou ótima, como foi a festa?
— Mesmas pessoas, mesmos fiascos e até as mesmas
músicas, acho que estou velha para isso — Sky me surpreendeu ao
dizer.
Nathan arregalou os olhos.
— O mundo vai acabar — exagerou, como sempre. —
Meteoros vão cair.
Sky sorriu, revirando os olhos.
— Dramático. — Ela segurou na mão do Caleb e ambos foram
para o sofá. — Estou com preguiça de festas, essa é a verdade.
— Agora você me entende — falei para ela.
Nathan e Alex se aproximaram mais do meio da sala e
deixaram a porta aberta, consegui ouvir muito bem as vozes do lado
de fora da casa, ainda que não entendesse nada do que elas
estavam conversando.
Angeline estava aqui.
— Você promete, Angel? — Isso consegui ouvir claramente.
— Não — a ruiva disse. — Não vou prometer algo que não irei
cumprir. Amo você, Clarke, mas os meus problemas com Ryder são
meus e eu vim para essa casa para planejar o casamento da minha
melhor amiga, não para ouvir o que é certo e errado.
Minha cunhada suspirou tão alto que eu ouvi daqui.
— Vem, sinta-se em casa.
Clarke foi a primeira a entrar, os cabelos loiros presos em um
coque frouxo e as roupas um pouco molhadas devido à pouca neve
que caía lá fora. Angeline entrou em seguida, vestindo a mesma
calça jeans que moldava suas pernas e o casaco curto aberto que a
protegia do frio.
Seus olhos cruzaram com os meus rapidamente.
Eu ainda me sentia impactado com os olhos azuis brilhantes
que ela tinha, só a tornavam mais bonita.
— Essa é Alexandra Blossom — Clarke apresentou minha
irmã. — Alex, essa é a minha amiga, Angeline Fraser.
— Oi — Alex chamou a sua atenção ao abraçá-la. — Seja
muito bem-vinda na residência dos irmãos Blossom, e pode me
chamar de Alex.
— Você é muito... fofa — Angeline disse e o maldito sorriso de
lado inundou seus lábios. — Pode me chamar de Angel.
— Alex é a mais fofinha dos irmãos mesmo — Nathan
comentou. — Diferente do meu garotão aqui. — Bagunçou os meus
cabelos. — Esse é Tyler Blossom.
— Já nos conhecemos — Angeline disse.
Clarke franziu a testa.
— Já?
— Ele é um dos corredores do Ryder — ela explicou. — Eu
ganhei a corrida hoje.
Nathan não perdeu a oportunidade de se sentar ao meu lado e
me zoar.
— Quer dizer que perdeu uma partida? De 0 a 10, o quanto
você está furioso?
— O bastante pra te dar uns tapas.
— Você me ama, não começa.
— Não começa você a encher o saco!
Nathan riu e olhou para Angeline.
— Ele está puto em uma escala de número 11.
Angeline riu fraco.
— Deixa as suas coisas aí, depois vamos levar para o seu
quarto — Clarke pegou a mão dela.
— Então você corre? — Sky parecia estar muito interessada
naquilo.
— Corro. — Angeline se sentou do meu lado e cruzou as
pernas. — Meu pai era mecânico.
Seu perfume era muito bom, não era muito doce, mas havia
um toque de rosas que o tornava muito cheiroso.
Clarke se sentou ao lado dela e nós quatro ficamos no sofá
maior da sala. Ele era grande, mas ainda nos apertava, e era
inevitável que o corpo de Angeline não grudasse no meu.
— E você é irmã de Ryder Fraser, o ruivo traficante — Nathan
afirmou. — Acho que agora faz sentido porque ele colocou os carros
como um grande evento das noites. Se o pai de vocês era um
mecânico, ele gosta das corridas.
Angeline balançou a cabeça.
— Tenho certeza de que Ryder não pensou no meu pai ao
colocar as corridas.
Meu pai.
Não nosso pai.
Havia algo muito estranho nessa história e eu que não era
nem um pouco fofoqueiro, estava curioso, quem dirá Nathan. Olhei
para o meu irmão e ele estava prestes a fazer um monte de
pergunta, mas sua namorada, ou melhor, noiva, o impediu.
— Skyller e Alex marcaram algumas lojas para provar os
vestidos de noiva e os de madrinhas — Clarke anunciou.
— Casamento, meu Deus — Angeline suspirou. — Tem
certeza?
Prendi o riso ao ver o olhar de Nathan em direção à ruiva.
— Porque tipo... você acabou de se apaixonar por ele.
— Para a sua opinião, nos amamos há mais de quatro anos.
Angeline virou o rosto para o meu irmão e,
consequentemente, observei com mais atenção os detalhes do seu
rosto mais próximo do meu.
Caralho...
Respirei fundo. Estava parecendo aqueles adolescentes
virgens que não podem ver um rosto bonito que já estão com tesão.
Para falar a verdade, eu estava parecendo o meu irmão na época
de galinhagem dele.
Odiei.
Foi engraçado observar o olhar que ela fez ao encarar Nathan.
— E você sabe que ela não se lembra, né?
— Angel! — Clarke deu um tapa na perna dela.
— Desculpa. — Ergueu as mãos e a abraçou pela cintura. —
Só não quero que você se machuque.
— Eu nunca a machucaria.
— Tenho as minhas dúvidas sobre você — Angel disse, muito
sincera. — Ainda não esqueci a forma como a trataram quando ela
chegou nessa cidade.
— Angeline — Clarke levantou.
Sky riu.
— Você disse que ela era rancorosa e eu não acreditei.
— Vejo que a minha fama está maravilhosa aqui. — Ela me
olhou e claro que me pegou a encarando. — Você tratou a minha
irmã bem?
— Ah meu Deus — Clarke murmurou. — Angel, acho melhor
você conhecer o seu quarto.
— É uma pergunta simples, só para saber se eu vou gostar
dele ou não. — Deu de ombros.
Sorri.
— Sempre tratei bem a Clarke.
— Ótimo! Gosto de você.
Nathan riu, só que eu não sabia se era por achar engraçado
ou por nervosismo. Angeline parecia falar muito sério.
— Não estou com sono, uma sessão de filmes cairia bem —
ele sugeriu.
— Posso fazer a pipoca salgada — Alex se ofereceu.
— E eu a doce. — Sky se levantou. — Me ajuda, anjo da
guarda?
— Claro.
— Vou trocar de roupa — Clarke disse.
— Eu vou junto. — Nathan deu um pulo no sofá e abraçou
Clarke. — Vamos?
Ela assentiu e os dois subiram para o quarto.
— Trocar de roupa — Angeline murmurou ao meu lado. —
Eles acham que enganam quem?
— Não a nós dois.
Ela se virou totalmente para mim, usando o braço apoiado no
encosto do sofá de apoio para o seu rosto.
— Como foi a festa do meu irmão?
— Não fiquei por muito tempo — admiti—, mas
provavelmente o mesmo de sempre. Drogas, bebidas e apostas.
— Trabalha para ele?
— Eu não trabalho para ninguém, apenas gosto de correr e
você deve saber que Ryder controla boa parte da polícia aqui. É
fácil e não me traz problemas.
— Acho que entendi o seu ponto.
Angeline retirou a jaqueta do corpo, expondo a blusa fina que
usava por baixo. Eu não era um tarado, mas foi impossível não
reparar no seu decote. Desviei o olhar rapidamente, tentando ter o
mínimo de educação pela mulher que havia acabado de chegar na
minha casa. Ela pegou o celular do bolso e começou a mexer,
dando a nossa pequena conversa como encerrada.
Ela ergueu os olhos para mim e me pegou a admirando. É
claro que um sorrisinho de quem sabia do poder que tinha se abriu
nos seus lábios.
Ela sabia que era gostosa e estava achando engraçado que
eu a queria.
Meu celular voltou a vibrar na mão, não uma vez, várias
vezes.
Bufei e peguei o telefone.
Era Sebastian me enviando um monte de ponto de
interrogação.
Olhei para Angeline, que estava concentrada no celular e
desbloqueei o aparelho nas minhas mãos.
Você não cansa de ser babaca?
É uma pergunta simples, Blossom. Ruivo natural ou não?
Um arranhar de garganta me chamou atenção.
É claro que eu seria azarado a ponto de Angeline saber
exatamente do que o meu amigo de outro estado estava falando.
Essa amizade não me trazia nenhum benefício.
— Homens... — Ela se levantou, e antes que eu pudesse me
justificar, porque por mais idiota que parecesse havia uma
justificativa, ela me interrompeu.
Angeline se inclinou em minha direção, se apoiou com uma
das mãos no encosto do sofá e abaixou o rosto em direção ao meu
ouvido. Foi impossível não sentir um tesão do inferno ao ver seus
seios a centímetros de distância da minha boca.
Salivei.
Porra!
— É uma pena que você nunca vai ter a resposta para essa
pergunta, Blossom.
Ela se afastou devagar, deixando o seu rastro de perfume,
mas eu fui mais rápido e sem pensar muito, segurei a sua nuca e a
trouxe para mais perto. Faltou muito pouco para nossos lábios se
encostarem. Nossos olhos seguiram a linha das nossas respirações
alteradas, uma batendo na boca da outra.
— Hoje — fui sincero — eu não vou ter a resposta para essa
pergunta hoje, mas algum dia, nós dois sabemos que eu terei, e vai
ser quando eu tiver com a minha cara entre as suas pernas.
Percebi pelas suas pupilas dilatando o quanto aquelas
palavras a agradaram. Ela mordeu os seus lábios e a vontade de
mordê-los bateu em mim, mas fui contraditório ao largar a sua nuca,
me sentindo endurecer como um adolescente virgem.
Angeline sorriu e se levantou.
— Vai ser divertido ver você tentar.
Ela caminhou até a sua mala e a pegou, sem dizer mais uma
palavra, subiu as escadas, me deixando com o pensamento de que
não importava o que acontecesse, duas coisas estavam muito
claras:
Angeline não se importava com os seus princípios e ela sabia
que cedo ou tarde estaria na minha cama.
Não, não me responsabilizo
Se eu te colocar em problemas agora
Veja, você é muito irresistível
É, com certeza
AIN'T MY FAULT — ZARA LARSSON
Não cair em tentação.
Talvez se eu repetisse isso para mim mesma me convenceria
do quão errado era sentar naquele gostoso chamado Tyler Blossom.
Caramba.
Minha nuca ainda formigava com a pegada forte que ele
demonstrou ter ao me puxar para mais perto de si. Que homem!
Um homem que consegue te deixar molhada apenas com uma
provocação merece créditos extras depois do sexo. Pouquíssimos
conseguiram isso de mim durante a minha vida de jovem festeira e
que curte uma transa sem compromisso, e Tyler foi um desses.
Mas como eu disse, precisava me manter focada, e por mais
gostoso que Blossom fosse, ainda tinha todo o lance dele ser
cunhado da minha melhor amiga. Eu realmente apreciava fazer
sexo com alguém e nunca mais ver a cara da pessoa na minha
frente.
Eu achava essa ideia mais simples e menos complicada,
principalmente para alguém que não buscava compromisso como
eu.
Meus pensamentos estavam fervendo em minha mente
enquanto arrumava a cama que havia dormido muito bem a noite
toda. Clarke já havia se mudado de vez para o quarto de Nathan e
eu usaria esse quarto que foi dela por alguns dias, até a
universidade de Campbell abrir as portas para eu poder resolver
toda a papelada de transferência.
Eu tinha muitas burocracias para resolver e só de pensar
nelas me sentia cansada. Observei o violão do outro lado do quarto
e senti uma vontade absurda de tocar, mas não queria chamar
atenção dos irmãos Blossom a essa hora da manhã. Era férias e
claro que não estavam acordados ainda.
Skyller, a irmã mais velha, foi muito clara ao dizer ontem que
era para eu me sentir em casa e acho que o meu estômago
roncando em busca de comida me implorava para descer e procurar
algo para comer.
Foi o que eu fiz.
Já havia passado no banheiro e feito todo a minha higiene
matinal, inclusive colocado uma calça de moletom e uma blusa fina
que não se tornasse muito quente devido à temperatura da casa
com o aquecedor ligado.
Saí do quarto e desci as escadas, indo em direção à pequena
cozinha. O relógio no celular marcava oito horas da manhã, não era
tão cedo e fiquei surpresa ao encontrar o dono dos meus desejos
vestido apenas de calça moletom.
Foi impossível desviar o olhar da visão daquele homem sem
camisa. Braços fortes e com músculos, tatuagens nos bíceps e no
ombro esquerdo, um tanquinho de dar inveja a qualquer homem e
deixar qualquer mulher com uma vontade de no mínimo passar a
mão.
Ok.
Não cair em tentação.
Eu não era uma louca por sexo, podia superar a beleza
surreal desse cara.
— Eu estava certa. — Sorri em sua direção. — Você não é
nenhum pouco feio.
Tyler sorriu de lado e se encostou na bancada da cozinha,
cruzando os braços em frente ao corpo. Parabéns para ele, não era
só eu que sabia jogar com as armas da beleza, porque era
impossível que ele estivesse naquela posição ao natural.
— Para quem tem princípios, você está reparando demais,
não acha? — provocou.
Seu sorriso não durou muito tempo. Tyler parecia ser mais
fechado do que o irmão, pois de todas às vezes que ele sorriu até
agora foi de lado e sem mostrar os dentes, algo mais falso do que
verdadeiro. Era instigante e familiar ao mesmo tempo.
Peguei uma maçã no cesto em cima da mesa.
— Deus fez olhos para observar, não é esse o objetivo? —
Mordi a minha maçã. — O pessoal costuma acordar tarde aqui?
Mudei de assunto ou então aquelas provocações não
cessariam.
— Considerando que foram dormir tarde ontem, sim —
respondeu. — Precisa de alguma coisa?
— Não. — Puxei a cadeira e me sentei. — Mas quanto mais
tarde acordarem, mais tarde para procurar os vestidos.
Foi inevitável não fazer uma careta.
Tyler se sentou ao meu lado e pegou uma maça do cesto.
— Você parece estar ansiosa para a experiência. — Notei o
tom divertido na sua voz.
— Eu amo a minha amiga, mas essa história de casamento é
uma loucura — contei o que achava. — Ela tem vinte e um anos.
— Eles estão muito apaixonados — Tyler disse.
— Eu sei disso, e nunca vi Clarke mais feliz do que como está
agora — admiti. — Só é estranho casar tão nova, acho que eles têm
uma vida para aproveitar antes de se casarem.
— Eu também acho isso, inclusive, os chamo de casal
emocionado — Tyler contou, me fazendo sorrir com o apelido, era
bem a cara deles. — Mas não posso julgá-los muito, só eles sabem
o que estão sentindo e as loucuras que esses sentimentos nos
fazem cometer.
— Já sentiu? — Eu era muito curiosa, confesso.
— Amor?
Assenti.
— Nunca, e você?
— Tudo o que eu sentia pelos meus ex-namorados era fogo
no cu. — Fiz uma careta só de lembrar da época que eu achava
tempo para namorar na minha adolescência.
Obviamente não deu certo e nem durou mais do que uma
semana. Nenhum dos três.
Tyler riu e eu tive um vislumbre dos seus dentes brancos
dentro daquela boca que tinha um sorriso lindo demais para
descrever. Esse cara não tinha um defeito mesmo. Era quase triste
de admitir para mim mesma que não poderia sentar nele.
— Olha como são lindos,eu disse que eles seriam um casal
perfeito. — Nathan entrou na cozinha abraçando a cintura de
Clarke. — Se vocês acelerarem tudo, dá tempo de se casarem
comigo.
Dessa vez minha careta deve ter quase saído do meu rosto.
— Seu noivo é maluco? — perguntei para minha amiga.
— Acordei shippando casais — Nathan justificou o
injustificável. — Estou tendo algumas aulas com Alex.
Não entendi nada e nem tentei fazer questão de entender.
Minha amiga arrumou um namorado que viajava muito através dos
pensamentos.
— Você deu alguma coisa para ele, além da boc...
— Angeline! — Clarke deu um grito.
— O que foi? Ah, Clarke, você já deve ter dado até o cu pra
ele.
Nathan e Clarke ficaram vermelhos. Minha amiga já estava
acostumada com a minha falta de filtro na boca, de vez em quando
saía um palavrão ou outra palavra muito inapropriada para menores,
mas era o meu jeitinho.
Até porque mentindo não estava.
Eu havia ouvido alguns sons estranhos no quarto ao lado.
Tyler não aguentou e gargalhou ao meu lado, rindo da cara do
irmão. E bem... se antes eu já estava impactada com a sua beleza,
agora eu estava desconcertada. Nunca havia reparado em caras
sorrindo, mas até com esse ato simples e bobo, ele era atraente.
Que inferno!
— Do que você está rindo, senhor “sou sério o tempo todo”?
— Nathan resmungou para o irmão.
Tyler tocou no meu ombro.
— Obrigado, Angeline. Foi uma gracinha ver Nathan corando
pela primeira vez.
Senti um formigamento bem no local que a mão de Tyler
estava, uma reação que me surpreendeu o bastante para me deixar
paralisada.
Ferrou!
Acho que a minha crença de não cair em tentação poderia ir
por água abaixo a qualquer momento.
— Cala a boca, Tyler. — Nathan revirou os olhos. — Já está
preparado para visitar as lojas?
— As lojas? — Tyler retirou a mão do meu ombro e eu respirei
fundo. — Nathan, nós selecionamos apenas uma loja de toda
aquela lista absurda sua.
— Achei mais três que temos que ir, e antes que reclame foi
indicação de Vincent, meu cunhadinho maravilhoso que eu amo
tanto.
Clarke riu, balançando a cabeça.
— Não deveríamos contar para os seus pais primeiros?
Arregalei os meus olhos.
— Seus pais não sabem dessa loucura?
— Não é loucura — ele resmungou. — Eles vão saber nesse
fim de semana e vão ficar muito felizes com o casamento.
Olhei para Tyler.
— Verdade ou seu irmão está se iludindo?
— Ei!
— Ravenna vai surtar, mas vai amar preparar um casamento e
ver o filho no altar — Tyler respondeu.
— Bom... então é melhor tomarmos o nosso café porque
temos um casamento para planejar — soei empolgada.
Eu sabia o quanto aquilo era importante para Clarke, e
observando o quanto esses dois se amavam, era difícil não se
render a essa loucura.
Desisto.
Eu estava prestes a desistir de ser madrinha da minha melhor
amiga, irmã de alma e parceira para todo o resto da minha vida. O
motivo? Estávamos na quinta loja de vestidos de noiva de Campbell
e ela não se agradava por nenhum.
— Meu Deus! — Me atirei no sofá em frente ao provador. —
Essa é a parte que mais detesto em qualquer festa: escolher
roupas.
— Está sendo divertido. — Alex se sentou do meu lado. —
Amo casamentos.
É claro que ela amava. Alexandra não só parecia uma mulher
de dezenove anos fofinha, ela era e eu tinha muita vontade de
apertar as suas bochechas. Adorava pessoas delicadas, fofas e
amorosas. Tudo o que eu não era, que irônico.
— É o primeiro casamento que eu vou — admiti. — Nem sei
como funciona.
— Sério? — Mackenzie Brown, a prima dos irmãos Blossom,
se sentou no outro sofá. — Você vai amar, tenho certeza.
— Talvez até queira um.
Eu ri de Alex.
— Gostei do seu senso de humor — comentei.
Skyller, Anne Decker, Evelyn Parker e Rebeca Wilson se
aproximaram de nós com algumas opções de vestidos e uma
vendedora. Anne e Eve eram um casal e haviam se tornado amigas
de Clarke muito rápido no semestre passado. Já Rebeca era a
minha cunhada e ainda não sabia muito o que pensar dela, já que a
nossa única conversa foi uma se apresentando para a outra. Será
que Ryder havia falado alguma merda sobre mim para ela? Eu não
duvidava de mais nada.
— Acho que temos o vestido perfeito — Skyller disse e
apontou para o vestido que Rebeca segurava. — Tenho certeza de
que esse ficará lindo na Clarke.
— Esse vestido não é simples demais? — Alex perguntou.
— Eu estou apaixonada pela simplicidade dele — comentei.
O vestido realmente tinha um caimento simples. Ele tinha
alças finas e não era muito decotado, com a parte de cima que ia
até a cintura justa ao corpo e com a saia caindo até o chão, sem
muitos babados, bem a cara de Clarke Hale. É, eu acho que ela iria
gostar dessa peça, principalmente porque tinha uma camada fina de
tecido branca e transparente com brilho.
— E onde está a nossa noiva? — Eve perguntou.
— Cheguei! — Clarke apareceu. — Não achei nada que me
agradasse do outro lado da... Meu Deus!
Sorri.
— Eu sabia.
— Se eu usar um véu que combine com esses brilhos, ele vai
ficar a coisa mais linda do mundo. — Clarke se aproximou da peça.
— Ele é tão simples e lindo ao mesmo tempo, quase como o que eu
sinto por Nathan.
Não disfarcei a minha careta.
— Meu Deus! Você se tornou uma cadelinha.
Mackenzie riu.
— Eles são muito fofos e grudentos juntos, você tem que ver!
— Agora que eu estou em Campbell, vou presenciar isso
todos os dias, alguém me salva — fiz o meu drama de sempre.
As meninas riram. Clarke pegou o vestido na mão.
— Vou provar! — Me olhou. — Me ajuda a vestir?
— O que você não me pede chorando que eu não faço
sorrindo?
— Eu tenho quase certeza de que é o contrário — Sky disse,
rindo.
— Ai que seja, vocês entenderam. — Bocejei. — Não dormi
direito essa noite, deve ser sono.
— Aconteceu alguma coisa? — Sky perguntou.
— Não — suspirei. — Ainda não aconteceu, mas ouvi
bastante sons do quarto ao lado, onde faço reclamações?
Clarke me olhou séria e as meninas riram ao entenderem do
que se tratava os sons que eu estava falando.
— Vem, vamos provar esse vestido lindo. — Peguei a sua
mão e a levei para o provador.
Entramos no local de tamanho médio e eu aproveitei para me
sentar no banquinho, assim não atrapalhava Clarke tirando a roupa
e colocando o vestido.
— Você não vai me falar nada do que está aprontando? —
Clarke perguntou, fechando a cortina.
— Eu não estou aprontando nada. Por que eu estaria
aprontando alguma coisa?
— Porque você é Angeline Fraser e seu maior defeito, assim
como sua maior qualidade, é ser intensa demais.
Cruzei os braços.
— Prova o vestido, vai.
— Angel, eu não quero que você faça nada que se arrependa
depois — minha amiga disse. — Eu amo muito você e sei o quanto
está magoada, não quero que essa mágoa cegue você.
— Eu estou enxergando muito bem, obrigada.
Clarke suspirou.
— Certo. — Retirou a blusa, revelando o sutiã sem alças que
usava. — Como foi a conversa com Tyler hoje de manhã?
Não gostei do arquear de sobrancelhas que minha amiga deu.
— Normal, ele parece ser um cara legal. — Dei de ombros,
pouco me importando. — Um tremendo de um gostoso também, se
me permite dizer.
— Sentiu algo?
— Tesão.
Clarke riu.
— Eu não esperava outra coisa de você.
Clarke retirou a calça e pegou o vestido.
— Vou precisar de ajuda.
— É por isso que estou aqui. — Me levantei. — E essas
marcas de chupões no peito? Vocês dois são selvagens!
Minha amiga deu risada de novo.
— Coloca o vestido em mim logo e para de reparar nas
minhas marcas.
Peguei o vestido e a ajudei a colocá-lo, prendendo atrás com
o fecho simples e delicado que tinha. Como eu imaginava, a peça
havia ficado perfeita nela, moldava muito bem o seu corpo e
realçava a sua pele cheia de manchinhas. Se havia algo que
deixava Clarke ainda mais bonita, eram as sardas espalhadas por
todo o seu rosto e parte do corpo, principalmente braços e ombros.
A olhei através do espelho, deixando que a emoção de ver a
minha irmã noiva e feliz pela primeira vez depois de tantos anos me
tomasse.
— Vai precisar de alguns ajustes aqui, mas acho que ficou
perfeito. — Ela me olhou. — O que achou, Angel?
A abracei pela cintura e beijei

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