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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO CHELSEA CRISTINA BRAGA DE AVELLAR O TRIBUNAL DO JÚRI E A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NAS DECISÕES DO CONSELHO DE SENTENÇA FORTALEZA 2017 CHELSEA CRISTINA BRAGA DE AVELLAR O TRIBUNAL DO JÚRI E A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NAS DECISÕES DO CONSELHO DE SENTENÇA Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial a obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Processual Penal. Orientador: Prof. Dr. Gustavo César Machado Cabral. FORTALEZA 2017 CHELSEA CRISTINA BRAGA DE AVELLAR O TRIBUNAL DO JÚRI E A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NAS DECISÕES DO CONSELHO DE SENTENÇA Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial a obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Processual Penal. Aprovada em: __/__/____. BANCA EXAMINADORA ______________________________________ Prof. Dr. Gustavo César Machado Cabral (Orientador) Universidade Federal do Ceará (UFC) _______________________________________ Mestranda Beatriz Lima Nogueira Universidade Federal do Ceará (UFC) ______________________________________ Mestrando Lucas Silva Machado Universidade Federal do Ceará (UFC) A Deus. AGRADECIMENTOS A Deus, por todas as bênçãos concedidas em minha vida, especialmente por toda saúde, fé e força dadas para que eu superasse as dificuldades e chegasse onde estou. Agradeço imensamente por Teu amor e por Tua presença em minha vida. A minha mãe Thelma Regina Braga, a minha avó Cleonice Braga, ao meu irmão Thiago Braga, ao meu pai Érico de Avellar e a minha avó Neide de Avellar, por todo amor, esforço, dedicação, incentivo e ensinamento que recebi de vocês em minha vida. Sem vocês, minha família, eu não teria chegado até aqui. Espero poder retribuir tudo que fizeram por mim. Ao meu namorado, Pedro Portela, pelo amor, pelo encorajamento e pelo apoio incondicional. Ao professor e orientador, Gustavo César Cabral, pela excelente orientação e pela confiança depositada em mim. Aos mestrandos, Beatriz Lima e Lucas Machado, pela solicitude ao convite para compor a banca examinadora do presente trabalho e pelas valiosas colaborações. Aos amigos feitos ao longo do Curso de Direito, especialmente às Organilindas, que me acompanharam ao longo dos cinco anos da Faculdade de Direito, tornando este percurso mais fácil, leve e alegre. Aos demais amigos e familiares, dentre os quais cito Karoline Bastos, Camila Beatriz, Carolina Timbó, Beatriz Emília, Letícia Lima, Amanda Moreira, Larissa Braga, Amanda Palácio, Rachel Portela, Lucas Portela, Lúcia Portela, Antônio Portela, que, direta ou indiretamente, me ajudaram ao longo desta caminhada que se encerra com o presente trabalho. Muito obrigada! RESUMO O presente trabalho tem como objetivo principal analisar a influência midiática sobre os julgamentos do Conselho de Sentença do Tribunal do Júri. Para tanto, aborda o Tribunal Júri como garantia e direito fundamental previsto no artigo 5°, inciso XVIII, da Constituição Federal de 1988, sob égide dos princípios norteadores da plenitude de defesa, do sigilo das votações, da soberania dos veredictos e da competência mínima para julgamentos de crimes dolosos contra a vida. Aborda também a composição e o procedimento do instituto constitucional em tela. Além disso, trata sobre a mídia na atualidade e a sua influência sobre as decisões do Tribunal do Júri, especialmente sobre as decisões dos jurados que compõe o Conselho de Sentença. Observa ainda a ameaça à imparcialidade dos jurados e a colisão entre direitos fundamentais geradas pela atuação da mídia. Por fim, analisa o emblemático caso Isabella Nardoni que comprova que a mídia pode exercer concreta influência sobre as decisões do Tribunal do Júri. Portanto, a metodologia adotada no presente trabalho utiliza o método de abordagem dedutivo e as técnicas de pesquisa bibliográfica e de estudo de um caso relevante ao tema, tendo uma forma de abordagem predominantemente qualitativa. PALAVRAS CHAVE: Tribunal do Júri. Conselho de Sentença. Mídia. Influência. Caso Isabella Nardoni. ABSTRACT The presente study aims to analyze mainly the influence of the media on trials of the jury’s sentencing council. Therefore, It approaches the Jury Trial as guarantee and fundamental right provided in the 5th article, clause XVIII, of the 1988 Brazilian Federal Constitution under the auspices of the guiding principles of secret ballots, the sovereignty of the verdicts of defenses and minimum competence to judge intentional crimes against life. It also approaches the composition and procedure of the constitutional institute concerned. Moreover, It refers to media currently and its influence on the Jury Trial’s decisions, specially on decisions made by jurors members of the sentencing council. It mentions, yet, the threat against impartiality by jurors and the collision among fundamental rights promoted by media. Lastly, It goes through the iconic Isabella Nardoni case which proves that the Media may influence on Jury Trial’s decisions. Thus, the adopted methodology for the present paper uses the deductive method and bibliographic research techniques and a case study which is revelant to the work theme. This study was mostly based on qualitative investigation. KEY WORDS: Jury Trial. Sentencing Council. Media. Influence. Isabella Nardoni Case. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 8 2 O TRIBUNAL DO JÚRI ........................................................................................ 10 2.1 O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 ............................................ 10 2.2 Os princípios norteadores do Tribunal do Júri ..................................................... 12 2.2.1 Plenitude de Defesa ................................................................................................. 12 2.2.2 Sigilo das Votações .................................................................................................. 13 2.2.3 Soberania dos Veredictos ......................................................................................... 15 2.2.4 Competência para julgamento de crimes dolosos contra a vida ............................... 16 2.3 Composição do Tribunal do Júri: Juiz Presidente e Conselho de Sentença ......... 18 2.4 Procedimento do Tribunal do Júri ........................................................................ 22 3 A MÍDIA E A SUA INFLUÊNCIA NOS JULGAMENTOS DO TRIBUNAL DO JÚRI ........................................................................................................................ 26 3.1 A mídia .................................................................................................................... 26 3.2 A mídia e as decisões do Tribunal do Júri ............................................................. 28 3.3 A colisão entre direitos fundamentais gerada pela atuação da mídia................... 32 4 UM ESTUDO SOBRE O CASO ISABELLA NARDONI .................................... 41 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 51 REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 54 8 1 INTRODUÇÃO O Tribunal do Júrifoi confirmado pelo ordenamento jurídico do Brasil como um instrumento da democracia, pois assegura a participação popular direta nas decisões que envolvem crimes dolosos contra a vida, razão pela qual merece ser respeitado, especialmente no que concerne aos seus princípios norteadores da plenitude de defesa, do sigilo das votações, da soberania dos veredictos e da competência mínima para julgamentos de crimes dolosos contra a vida. O instituto do Júri é composto pelo juiz presidente e pelo Conselho de Sentença. No entanto, os jurados que compõem o Conselho de Sentença julgam com base na sua íntima convicção e nos ditames da justiça, sem a necessidade de fundamentar suas decisões, as quais podem ser influenciadas pela atuação da mídia. Tem-se que mídia vem se expandido notadamente nas últimas décadas, em virtude do avanço tecnológico, e passado a influenciar as pessoas em diversos âmbitos (social, cultural, político, econômico e educacional, por exemplo). Independente do sexo, da idade, da classe social e da religião, todas as pessoas que convivem na sociedade contemporânea sofrem alguma influência da mídia. Entretanto, ela vem sendo dominada por grandes conglomerados empresariais que visam obter lucros a qualquer custo e, por isso, vem ultrapassando a sua função social, passando a transmitir as informações de forma sensacionalista e influenciar negativamente a opinião pública. É nesse contexto que surge o problema da influência da mídia nos julgamentos do Conselho de Sentença, pois nota-se a preferência da mídia sensacionalista por noticiar matérias criminais, principalmente no que se refere aos crimes de competência do Tribunal do Júri, uma vez que os mencionados crimes geram enorme curiosidade e comoção pública, sendo responsáveis pela maior audiência dos meios de comunicação de massa e pela maior lucratividade. Diante disso, o presente trabalho monográfico tem como tema o Tribunal do Júri e a influência da mídia nas decisões proferidas pelo Conselho de Sentença. Trata-se de um assunto atual e extremamente relevante na sociedade contemporânea, razão pela qual se justifica a escolha do tema, uma vez que é necessário buscar alternativas para tentar solucionar os efeitos negativos da atuação da mídia nos casos sob enfoque. O trabalho pretende responder as perguntas problemáticas acerca do tema: Como a mídia pode influenciar nos julgamentos do Conselho de Sentença? Quais os efeitos negativos 9 da atuação da mídia sobre os julgamentos do Tribunal do Júri? Quais as alternativas e as soluções possíveis para tentar evitar os efeitos negativos da atuação da mídia nos casos sob enfoque? O estudo em tela tem como objetivo geral analisar a influência midiática sobre os julgamentos do Conselho de Sentença, com a finalidade de buscar alternativas para evitar os possíveis efeitos negativos gerados pela atuação midiática nos casos de competência do Tribunal do Júri. Tem ainda como objetivos específicos estudar a instituição do Tribunal Júri, abordando seus princípios norteadores, sua composição e seu procedimento; analisar a atuação da mídia na atualidade e a sua influência sobre as decisões do Tribunal do Júri, especialmente sobre as decisões dos jurados que compõe o Conselho de Sentença e realizar um estudo de caso sobre a atuação da mídia em um caso emblemático de competência do Tribunal do Júri que repercutiu na sociedade brasileira, qual seja o caso Isabella Nardoni. Para tanto, a metodologia adotada no presente trabalho utiliza o método de abordagem dedutivo e as técnicas de pesquisa bibliográfica e de estudo de um caso relevante ao tema, tendo uma forma de abordagem predominantemente qualitativa. Por todo o exposto, o desenvolvimento do presente trabalho será estruturado em três capítulos. O segundo capítulo abordará um estudo acerca do Tribunal do Júri como garantia e direito fundamental previsto no artigo 5°, inciso XVIII, da Constituição Federal de 1988, sob égide dos princípios norteadores da plenitude de defesa, do sigilo das votações, da soberania dos veredictos e da competência mínima para julgamentos de crimes dolosos contra a vida, os quais serão abordados detalhadamente. Ademais, o capítulo abordará também a composição do Tribunal do Júri, especialmente no que concerne a composição do Conselho de Sentença, e o procedimento bifásico do instituto constitucional em tela, com base principalmente no Código de Processo Penal Brasileiro. O terceiro capítulo adentrará ao estudo da mídia e a sua influência nos julgamentos do Tribunal do Júri, abordando ainda a ameaça à imparcialidade dos jurados e a colisão entre direitos fundamentais causadas pela atuação da mídia nos casos sob enfoque. Por fim, o quarto capítulo trará um breve estudo do caso Isabella Nardoni, a fim de enriquecer o trabalho e de observar na prática a influência que a mídia sensacionalista pode exercer sobre as decisões do Conselho de Sentença. O caso Isabella Nardoni foi um dos casos brasileiros mais emblemáticos de competência do Tribunal do Júri e teve intensa repercussão nacional nos meios de comunicação. 10 2 O TRIBUNAL DO JÚRI No segundo capítulo do presente trabalho, abordam-se os aspectos e os princípios constitucionais do Tribunal do Júri, bem como o funcionamento e a organização do instituto. Tudo isso com a finalidade de abordar no próximo capítulo a temática principal do trabalho, ou seja, a influência da mídia sobre as decisões proferidas pelo Conselho de Sentença. 2.1 O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 A atual Constituição Federal, promulgada em 1988, foi marcada pela redemocratização do Brasil e elaborada com ampla participação popular, razão pela qual recepcionou a instituição do Tribunal do Júri, inserindo-a entre os direitos e garantias individuais, e retornou os princípios norteadores. O Tribunal do Júri está expressamente previsto no artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal de 1988, o qual reconhece a sua instituição dentre os direitos e garantias individuais, bem como assegura a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência mínima para julgamento, como os seus princípios ensejadores. Ademais, a Constituição prevê também que a organização do Tribunal do Júri é dada por lei ordinária.1 O Capítulo II (Do procedimento relativo aos processos de competência do Tribunal do Júri), do Título I (Do processo comum), do Livro II (Dos processos em espécie), do Código de Processo Penal, dispõe sobre o procedimento relativo aos processos da competência do Tribunal do Júri em seus 91 artigos (artigos 406 a 497). Conforme mencionado acima, o Júri foi inserido na Constituição Federal como uma garantia fundamental, mas também como um direito fundamental. Nesse sentido, corroboram Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar: Com a Constituição do Brasil de 1988, o tribunal do júri foi confirmado como direito e garantia fundamental. Garantia de sujeição ao tribunal popular, nos crimes de sua competência, para atendimento ao devido processo legal. E direito, conferido de 1 Art. 5º, CF/88: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. 11 forma ampla, de participar da atividade do Judiciário, na condição de jurado (juízes leigos).2 Por se tratar de um direito e uma garantia individual, o Tribunal do Júri não pode ser suprimido do ordenamentojurídico brasileiro, nem mesmo por emenda à Constituição Federal, constituindo uma verdadeira cláusula pétrea, ou seja, um núcleo constitucional revestido de intangibilidade e imutabilidade, em razão do artigo 60, §4º, IV, da Constituição Federal3, que traz uma limitação material expressa. 4 Acerca da essência de cláusula pétrea do instituto popular, trata Walfredo Cunha Campos: Não apenas seria injurídico propor emendas que visassem abolir o Tribunal do Júri, como também devem ser acoimadas de inconstitucionais quaisquer leis que, embora nominalmente preservem a instituição no seu conteúdo, retiram-lhe substância e poder, esvaziando-a. É claro que alterações desse jaez, que acabem por aniquilar a essência do Júri, devem ser acoimadas de inconstitucionais.5 Destarte, para manter o instituto, não existe a possibilidade de proposta de quaisquer leis pelo legislador ordinário tendentes a abolir o Tribunal do Júri. Cabe destacar ainda que, apesar de não ter sido inserido expressamente no rol da Constituição Federal como órgão do Poder Judiciário, é quase pacífico na doutrina o entendimento que o Tribunal do Júri constitui verdadeiro órgão do Judiciário, sendo sua especialidade reconhecida.6 Nesse sentido, ensina Guilherme de Sousa Nucci: Enfim, trata-se de um órgão especial do Poder Judiciário, que assegura a participação popular direta nas suas decisões de caráter jurisdicional. Cuida-se de uma instituição de apelo cívico, demonstrativa da importância da cidadania e da democracia na vida em sociedade.7 Desse modo, o Júri possui um papel de grande importância na sociedade, principalmente nos Estados Democráticos de Direito, pois assegura uma participação popular direta nas decisões que envolvem crimes dolosos contra a vida, razão pela qual merece ser respeitado, especialmente no que concerne aos seus princípios norteadores. 2 ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 2229. 3 Art. 60, CF/88: §4º: Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: IV – os direitos e garantias individuais. 4 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 839. 5 CAMPOS, Walfredo Cunha. Tribunal do Júri - Teoria e Prática. 4. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2015, p.7. 6 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 60. 7 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 61. 12 2.2 Os princípios norteadores do Tribunal do Júri Como exposto acima, os princípios norteadores do Tribunal do Júri estão previstos no art. 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal, quais sejam: a plenitude da defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento de crimes dolosos contra a vida. Diante disso, faremos uma análise detalhada acerca dos mesmos. 2.2.1 Plenitude de Defesa Alguns autores defendem que a plenitude da defesa é sinônimo fiel da ampla defesa, prevista no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal. Em contrapartida, outros, como Guilherme de Souza Nucci, Eugênio Pacelli de Oliveira, Fernando Capez, Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar, afirmam que a plenitude da defesa é uma variante da ampla defesa, pois esta refere-se a uma garantia dos acusados nos processos criminais em geral e aquela refere-se a uma garantia aos acusados nos processos em trâmite Tribunal do Júri. Acerca das diferenças entre ampla defesa e defesa plena, ensina Guilherme de Souza Nucci: Amplo é algo vasto, largo, copioso, enquanto pleno equivale a completo, perfeito, absoluto. [...] O que se busca aos acusados em geral é a mais aberta possibilidade de defesa, valendo-se dos instrumentos e recursos previstos em lei e evitando-se qualquer forma de cerceamento. Aos réus, no Tribunal do Júri, quer-se a defesa perfeita, dentro, obviamente, das limitações naturais dos seres humanos.8 Eugênio Pacelli de Oliveira também explica: Defesa ampla é uma defesa cheia de oportunidades, sem restrições, é a possibilidade de o réu defender-se de modo irrestrito, sem sofrer limitações indevidas, quer pela parte contrária, quer pelo Estado-juiz, enquanto que defesa plena é uma defesa absoluta, perfeita, completa, exercício efetivo de uma defesa irretocável, sem qualquer arranhão, perfeição, logicamente dentro da natural limitação humana.9 Portanto, ampla defesa não tem o mesmo significado de defesa plena, uma vez que esta compreende aquela com um plus necessário ao procedimento empregado no Tribunal do Júri, em que os jurados decidem acerca da condenação ou absolvição do acusado sem nenhuma fundamentação. A defesa plena assegura a maior paridade possível aos acusados nos processos em trâmite no Tribunal do Júri perante a acusação e compreende duas facetas importantes. A 8 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 35. 9 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 44. 13 primeira faceta, de natureza obrigatória, refere-se à defesa técnica completa realizada pelo profissional habilitado. A segunda faceta, de natureza facultativa, refere-se à autodefesa realizada pelo próprio acusado por meio do que ele falar em seu interrogatório ou do seu silêncio.10 Sobre o tema, destaca-se os ensinamentos de Fernando Capez: Defesa plena, sem dúvida, é uma expressão mais intensa e mais abrangente do que defesa ampla. Compreende dois aspectos: primeiro, o pleno exercício da defesa técnica, por parte do profissional habilitado, o qual não precisará restringir-se a uma atuação exclusivamente técnica, podendo também servir-se de argumentação extrajurídica, invocando razões de ordem social, emocional, de política criminal etc. Esta defesa deve ser fiscalizada pelo juiz-presidente, o qual poderá até dissolver o conselho de sentença e declarar o réu indefeso (art. 497, V), quando entender ineficiente a atuação do defensor. Segundo, o exercício da autodefesa, por parte do próprio réu, consistente no direito de apresentação de sua tese pessoal no momento do interrogatório, relatando ao juiz a versão que entender ser a mais conveniente e benéfica para sua defesa.11 Destarte, caso ocorra deficiência na performance da defesa do acusado, esta deverá ser remediada pelo Juiz Presidente através da nomeação ou constituição de outro defensor, o qual é responsável por exercer o controle da defesa em plenário, aplicando a regra do artigo 497, inciso V, do Código de Processo Penal.12 2.2.2 Sigilo das Votações O sigilo das votações é resguardado pela Constituição Federal e pelo Código de Processo Penal. Constitui uma tentativa de preservar a livre manifestação dos jurados e de evitar qualquer interferência no ritual de votação do Tribunal do Júri. Em outras palavras, é uma tentativa de preservar os jurados de quaisquer influências e de protegê-los contra eventuais represálias pelos seus votos durante o julgamento ou depois do julgamento. Conforme artigo 485, do Código de Processo Penal, após os debates, não havendo qualquer dúvida a ser esclarecida acerca do julgamento, os jurados e as demais pessoas autorizadas pela lei se dirigirão à sala especial para proferir os seus votos. No caso de não existir 10 ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 2229. 11 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 839-840. 12Art. 497, CPP. São atribuições do juiz presidente do Tribunal do Júri, além de outras expressamente referidas neste Código: V – nomear defensor ao acusado, quandoconsiderá-lo indefeso, podendo, neste caso, dissolver o Conselho e designar novo dia para o julgamento, com a nomeação ou a constituição de novo defensor. 14 uma sala especial, o público presente deverá sair do recinto, permanecendo somente os jurados e as pessoas autorizadas.13 A existência da sala especial para votação é uma exceção à regra da publicidade prevista no artigo 5º, inciso LX14, e no artigo 93, inciso IX15, ambos da Constituição Federal de 1988. Os dois alicerces constitucionais não se chocam pelo fato do próprio texto constitucional limitar a publicidade dos atos processuais quando determinarem a defesa da intimidade ou o interesse social ou público. Neste sentido, confirma Walfredo Cunha Campos: Pacificou-se, hoje em dia, que tal previsão legal que estabelece o sigilo de uma decisão judicial - pelo Júri – ocorrida no recinto não aberto ao público, não viola o preceito constitucional que assegura a publicidade, em geral, dos atos processuais (art. 93, IX, da CF); isto porque, a própria Lei Maior, em seu art. 5º, LX, faz a ressalva de que a lei pode restringir a publicidade de atos processuais quando o interesse social exigir.16 Acerca do sigilo das votações, também assegura Fernando Capez: O sigilo nas votações é princípio informador específico do Júri, a ele não se aplicando o disposto no art. 93, IX, da CF, que trata do princípio da publicidade das decisões do Poder Judiciário. Assim, conforme já decidiu o STF, não existe inconstitucionalidade alguma nos dispositivos que tratam da sala secreta (CPP, arts. 485, 486 e 487).17 Salienta-se que o sigilo das votações era quebrado no caso de decisão unânime dos jurados, pois todos sabem que os sete jurados votaram no mesmo sentido, seja pela absolvição ou pela condenação. Entretanto, após a mudança dada pela Lei nº 11.689/2008, a contagem dos votos para cada quesito se encerra no momento em que é alcançado o quarto voto no mesmo sentido, resguardando o sigilo das votações. Assim, corroboram Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar: Basta a obtenção de quatro votos num determinado sentido, para que se tenha a majoritariedade na votação de cada quesito. Como salientamos acima, somos 13 Art. 483, CPP: Não havendo dúvida a ser esclarecida, o juiz presidente, os jurados, o Ministério Público, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça dirigir-se-ão à sala especial a fim de ser procedida a votação. §1º Na falta de sala especial, o juiz presidente determinará que o público se retire, permanecendo somente as pessoas mencionadas no caput deste artigo. §2º O juiz presidente advertirá as partes de que não será permitida qualquer intervenção que possa perturbar a livre manifestação do Conselho e fará retirar da sala quem se portar inconvenientemente. 14Art. 5º, CF/88: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem. 15Art. 93, CF/88: IX -todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação. 16 CAMPOS, Walfredo Cunha. Tribunal do Júri - Teoria e Prática. 4. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2015, p. 9. 17 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 840-841. 15 partidários de que o magistrado deve zelar para evitar a unanimidade, para que indiretamente não seja quebrado o sigilo das votações, afinal, havendo unanimidade, todos saberão que os jurados, em sua totalidade, se inclinaram a favor desta ou daquela tese, o que pode desaguar eventualmente em retaliação. Foi, aliás, o que fez o legislador recentemente, prevendo bastar a resposta de mais de três jurados em um dado sentido, a fim de resguardar o sigilo das votações (art. 483, §§ 1º e 2º, CPP, com redação dada pela Lei nº 11.689/2008).18 Diante do exposto, conclui-se que o sigilo das votações é fundamental para o correto funcionamento das sessões de julgamento do Tribunal do Júri, tendo em vista que é um mecanismo para tentar manter a isenção dos votos dos jurados, que deve ocorrer livre de qualquer influência externa ao processo, como a atuação midiática. 2.2.3 Soberania dos Veredictos A soberania dos veredictos é a essência do instituto do Tribunal do Júri e alcança o julgamento dos fatos realizado pelos jurados, assegurando que o julgamento não pode ser modificado pelo juiz togado ou pelo tribunal que venha a apreciar um recurso, somente podendo ser modificado o mérito da decisão por uma nova decisão do Tribunal do Júri no caso de ter sido o julgamento manifestamente contrário às provas dos autos.19 A soberania dos julgamentos do Júri Popular busca dar maior poder as decisões proclamadas pelos jurados, assegurando que o que foi decidido pelo povo permaneça. Nesse sentido, confirma Walfredo Cunha Campos que: A decisão coletiva dos jurados, chamada de veredicto, não pode ser mudada em seu mérito por um tribunal formado por juízes técnicos (nem pelo órgão de cúpula do Poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal), mas apenas por outro Conselho de Sentença, quando o primeiro julgamento for manifestamente contrário às provas dos autos. E assim deve ser. Júri de verdade é aquele soberano, com poder de decidir sobre o destino do réu, sem censuras técnicas dos doutos do tribunal.20 Todavia, a soberania dos veredictos tem sido mitigada, pois, em sede de revisão criminal, na qual o acusado pode rever sua condenação criminal transitada em julgado com base em provas novas, tem sido comum que o órgão revisor analise o mérito e absolva o acusado, desprezando a soberania das decisões do Tribunal do Júri. Assim, assevera Fernando Capez: 18 ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de direito processual penal. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 2234. 19 ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de direito processual penal. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 2231. 20 CAMPOS, Walfredo Cunha. Tribunal do Júri - Teoria e Prática. 4. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2015, p.10. 16 Trata-se de princípio relativo, pois no caso da apelação das decisões do Júri pelo mérito (art. 593, III,d) o Tribunal pode anular o julgamento e determinar a realização de um novo, se entender que a decisão dos jurados afrontou manifestamente a prova dos autos. Além disso, na revisão criminal, a mitigação desse princípio é ainda maior, porque o réu condenado definitivamente pode ser até absolvido pelo tribunal revisor, caso a decisão seja arbitrária. Não há anulação nesse caso, mas absolvição, isto é, modificação direta do mérito da decisão dos jurados.21 Cabe mencionar que poderia ser realizado um novo julgamento pelo Tribunal do Júri para evitar a relativização da soberania dos veredictos em sede de revisão criminal, tendo em vista que a determinação de realização de novo julgamento pelo Tribunal do Júri não contraria o princípio constitucional quando a decisão for manifestamente contrária à prova dos autos. 2.2.4 Competência para julgamento de crimes dolosos contra a vida Por fim, a Constituição Federal assegurou ao Tribunal do Júri a competência para julgamento dos crimes dolosos contra a vida, em suas modalidades consumada ou tentada. Contudo, a modalidade culposa dos referidos crimes nãopertence à apreciação do Tribunal Popular. É de suma importância destacar que a doutrina majoritária não entende ser esta uma competência fixa, já que a Constituição Federal não demonstra tal posicionamento. Foi estabelecida apenas uma competência mínima, no intuito de assegurar que o Júri Popular não fosse aniquilado do ordenamento jurídico brasileiro. Destarte, não há nenhuma proibição de ampliar a competência do Júri.22 Nessa linha, Guilherme de Souza Nucci assevera: Note-se que o texto constitucional menciona ser assegurada a competência para os delitos dolosos contra a vida e não somente para eles. O intuito do constituinte foi bastante claro, visto que, sem a fixação da competência mínima e deixando-se à lei ordinária a tarefa de estabelecê-la, seria bem provável que a instituição, na prática, desaparecesse do Brasil. Foi o que houve em outros países ao não cuidarem de fixar, na Constituição, a competência do Tribunal Popular (conferir: Portugal, art. 210; Espanha, art. 125, locais onde a instituição do júri não obtém predominância).23 Logo, observa-se que, independente da intenção do legislador, a fixação de uma competência mínima atribuída pela própria Constituição Federal garantiu a permanência do 21 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 841. 22 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 48. 23 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 48. 17 Tribunal do Júri no Brasil, diferente do que ocorreu em outros países que não tiveram o mesmo cuidado. Como mencionado, apesar de ser mínima a competência atribuída ao Tribunal do Júri, não significa que o legislador esteja impedido de ampliar o âmbito desta competência. Isto porque, o instituto também atrai a competência para o julgamento dos crimes conexos, conforme previsto no artigo 78, I, Código de Processo Penal.24 Acerca da competência do Júri Popular, Guilherme de Souza Nucci diz: Incluem-se na competência do Tribunal Popular, originariamente, os seguintes delitos: homicídio simples (art. 121, caput); privilegiado (art. 121, § 1.º), qualificado (art. 121, § 2.º), induzimento, instigação e auxílio ao suicídio (art. 122), infanticídio (art. 123) e as várias formas de aborto (arts. 124, 125, 126 e 127). Além deles, naturalmente, vinculam-se os delitos conexos, aqueles que, por força da atração exercida pelo júri (arts. 76, 77 e 78, I, CPP), devem ser julgados, também, pelo Tribunal Popular.25 Entretanto, quando uma pessoa com prerrogativa de função concedida pela Constituição Federal cometer um crime de competência do Tribunal do Júri, será julgada de acordo com a seu foro privilegiado, nos termos do artigo 96, inciso III, do artigo 102, inciso I, alíneas b e c, do artigo 105, inciso I, alínea a, e do artigo 108, inciso I, alínea a, todos da Constituição Federal de 1988.26 Cabe destacar que as pessoas com o foro por prerrogativa de função concedido exclusivamente pela Constituição Estadual não estão excluídas da competência do Tribunal do 24 Art. 77, CPP: Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras: I – no concurso entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum, prevalecerá a competência do júri. 25 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 51. 26 Art. 96, CF/88. Compete privativamente: III - aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral. Art. 102, CF/88. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República; c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente. Art. 105, CF/88. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar, originariamente: a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais. Art. 108, CF/88. Compete aos Tribunais Regionais Federais: I - processar e julgar, originariamente: a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral. 18 Júri, pois ela foi atribuída pela Constituição Federal e deve prevalecer sobre a competência atribuída pelas Constituições Estaduais, nos termos da Súmula Vinculante nº 45.27 2.3 Composição do Tribunal do Júri: Juiz Presidente e Conselho de Sentença Consoante o disposto no artigo 447, do Código de Processo Penal, para fins de julgamento, o Tribunal do Júri é composto pelo juiz presidente e pelo Conselho de Sentença. Em outras palavras, sua composição é feita por um juiz togado e por vinte e cinco jurados que serão sorteados dentre os alistados, dos quais apenas sete jurados formarão o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento.28 Ao juiz presidente, ou seja, juiz de direito ou juiz federal, caberão a direção e a condução de todo o procedimento, bem como a lavratura da sentença final, após as conclusões apresentadas pelo Conselho de Sentença, por meio das respostas aos quesitos formulados previamente sobre as questões de fato e de direito. Diferente do juiz togado, os jurados que formam o Conselho de Sentença são pessoas do povo, que não precisam possuir conhecimentos relacionados ao ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista que respondem aos quesitos com base na sua íntima convicção e nos ditames da justiça, sem a necessidade de fundamentar suas decisões. Nesse sentido, Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar asseveram que: A ideia do tribunal popular é a de que os casos importantes sejam julgados por pessoas que formam a comunidade a qual pertence o acusado, tal como o acusado seja parte desta, vale dizer, a noção que se tem do júri popular é a de que o julgamento se dê pelos pares do réu.29 Em relação ao alistamentos do jurados, estabelece o artigo 425, do Código de Processo Penal, que ele será realizado pelo juiz presidente do Tribunal do Júri, devendo este alistar oitocentos a mil e quinhentos jurados nas comarcas com mais de um milhão de habitantes, de trezentos a setecentos nas comarcas com mais de cem mil e de oitenta a quatrocentos nas comarcas de menor população, podendo aumentar o número de jurados, nas comarcas onde houver demanda. O alistamento dos jurados se dará com base nas informações 27 Súmula Vinculante 45: A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição Estadual. 28 Art. 447, CPP. O Tribunal do Júri é composto por 1 (um) juiz togado, seu presidente e por 25 (vinte e cinco) jurados que serãosorteados dentre os alistados, (sete) dos quais constituirão o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento. 29 ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de direito processual penal. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 2228. 19 prestadas ao juiz presidente de que eles reúnem as condições exigidas para a função, dentre estas, a maioridade e a idoneidade moral.30 Acerca da apuração da idoneidade moral, Guilherme de Souza Nucci explica: A apuração da notória idoneidade (aptidão manifesta ou competência publicamente reconhecida) não deixa de ser, na prática e como regra, uma utopia. Especialmente em grandes centros urbanos, torna-se humanamente impossível que o juiz atuante no Tribunal do Júri, necessitando do alistamento de inúmeros jurados, consiga ter conhecimento pessoal suficiente de cada um dos que forem chamados. Aliás, nem mesmo em Comarcas do interior, salvo em pequenas comunidades, é viável provocar o alistamento de pessoas notoriamente capacitadas para servir o júri. Por isso, tem-se disseminado o método aleatório, com busca em cartórios eleitorais e listas formuladas de maneira fortuita, como já mencionado anteriormente. A única cautela que se exige é a checagem do nome do jurado junto aos órgãos competentes, ao menos para se apurar se não possui antecedentes criminais.31 Dispõe o artigo 426, do Código de Processo Penal, que a lista geral dos alistados é elaborada pelo juiz presidente, devendo conter a indicação de suas profissões e ser anualmente completada. Consta também que será publicada pela imprensa até o dia 10 de outubro de cada ano e divulgada em editais fixados à porta do Tribunal do Júri. A lista poderá ser alterada, de ofício ou mediante reclamação de qualquer do povo, ao juiz presidente, até o dia 10 de novembro de cada ano, data de sua publicação definitiva.32 Ademais, a inclusão de pessoa inapta a ser jurada ou a exclusão de pessoa que preenche todos os requisitos legais na lista geral permite à interposição de recurso em sentido estrito, dirigido ao presidente do Tribunal de Apelação, conforme artigo 581, inciso XIV, e artigo 582, parágrafo único, ambos do Código de Processo Penal.33 30 Art. 425, CPP. Anualmente, serão alistados pelo presidente do Tribunal do Júri de 800 (oitocentos) a 1.500 (um mil e quinhentos) jurados nas comarcas de mais de 1.000.000 (um milhão) de habitantes, de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) nas comarcas de mais de 100.000 (cem mil) habitantes e de 80 (oitenta) a 400 (quatrocentos) nas comarcas de menor população. §1º Nas comarcas onde for necessário, poderá ser aumentado o número de jurados e, ainda, organizada lista de suplentes, depositadas as cédulas em urna especial, com as cautelas mencionadas na parte final do §3º do art. 426 deste Código. §2º O juiz presidente requisitará às autoridades locais, associações de classe e de bairro, entidades associativas e culturais, instituições de ensino em geral, universidades, sindicatos, repartições públicas e outros núcleos comunitários a indicação de pessoas que reúnam as condições para exercer a função de jurado. 31 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 223. 32 Art. 426, CPP. A lista geral dos jurados, com indicação das respectivas profissões, será publicada pela imprensa até o dia 10 de outubro de cada ano e divulgada em editais afixados à porta do Tribunal do Júri. §1º A lista poderá ser alterada, de ofício ou mediante reclamação de qualquer do povo ao juiz presidente até o dia 10 de novembro, data de sua publicação definitiva. §2º Juntamente com a lista, serão transcritos os arts. 436 a 446 deste Código. §3º Os nomes e endereços dos alistados, em cartões iguais, após serem verificados na presença do Ministério Público, de advogado indicado pela Seção local da Ordem dos Advogados do Brasil e de defensor indicado pelas Defensorias Públicas competentes, permanecerão guardados em urna fechada a chave, sob a responsabilidade do juiz presidente. §4º O jurado que tiver integrado o Conselho de Sentença nos 12 (doze) meses que antecederem à publicação da lista geral fica dela excluído. §5º Anualmente, a lista geral de jurados será, obrigatoriamente, completada. 33 Art. 581, CPP. Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença: XIV - que incluir jurado na lista geral ou desta o excluir. 20 Importa salientar que os alistados são todas as pessoas selecionadas pelo juiz presidente, no decorrer de um ano, para servirem no ano seguinte. Contudo, as pessoas alistadas podem ou não servir como jurados, dependendo do sorteio realizado para a composição dos grupos das sessões. Portanto, não se constitui efetivo exercício da função o simples alistamento. Para cada sessão de julgamento, dos vinte e cinco jurados sorteados, sete são escolhidos, igualmente por sorteio, para compor o Conselho de Sentença, sendo os demais dispensados.34 O sorteio dos vinte e cinco jurados dentre todos os alistados será feito a portas abertas, presidido pelo juiz presidente e acompanhado pelo Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil e da Defensoria Pública, nos termos dos artigos 432 e 433, do Código de Processo Penal.35 A convocação dos jurados sorteados será feita por correio ou qualquer outro meio hábil, bem como serão afixados na porta do Tribunal do Júri a relação de jurados convocados, nos termos dos artigos 434 e 435, do Código de Processo Penal. 36 Quanto ao alistamento dos jurados, importante destacar ainda que o cidadão que tenha integrado o conselho de sentença nos últimos 12 meses, ou seja, na lista anterior é proibido de integrar novamente a lista geral, nos termos do art. 426, § 4º, do Código de Processo Penal. Essa proibição visa ventilar o Conselho de Sentença e evitar a figura do “jurado profissional”, que é um jurado cuja participação nos julgamentos do Tribunal do Júri torna-se repetitiva, ano após ano. As participações sistemáticas de um cidadão nos julgamentos podem transformá-lo em um mal jurado, pois ele pode ter a falsa impressão de que conhece o suficiente o direito penal e o direito processual penal ou pode ser contaminado pela proximidade que sua constante participação pode trazer em relação aos membros do Ministério Público e da Defensoria Pública ou aos advogados.37 Art. 582, CPP. Os recursos serão sempre para o Tribunal de Apelação, salvo nos casos dos ns. V, X e XIV. Parágrafo único. O recurso, no caso do no XIV, será para o presidente do Tribunal de Apelação. 34 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 214. 35 Art. 432, CPP. Em seguida à organização da pauta, o juiz presidente determinará a intimação do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil e da Defensoria Pública para acompanharem, em dia e hora designados, o sorteio dos jurados que atuarão na reunião periódica. Art. 433, CPP. O sorteio, presidido pelo juiz, far-se-á a portas abertas, cabendo-lhe retirar as cédulas até completar o número de 25 (vinte e cinco) jurados, para a reunião periódica ou extraordinária. §1º O sorteio será realizado entre o 15º (décimo quinto) e o 10º (décimo) dia útil antecedente à instalação da reunião. §2º A audiência de sorteio não será adiada pelo não comparecimento das partes. §3º O jurado não sorteado poderá ter o seu nome novamente incluído para as reuniões futuras. 36 Art. 434, CPP. Os jurados sorteados serão convocados pelo correio ou por qualquer outro meio hábil para comparecer no dia e hora designados para a reunião, sob as penas da lei. Parágrafo único. No mesmo expediente de convocação serão transcritos os arts. 436 a 446 deste Código. Art. 435, CPP. Serão afixados na porta do edifício do Tribunal do Júri a relação dos jurados convocados, os nomes do acusado e dos procuradores das partes, além dodia, hora e local das sessões de instrução e julgamento. 37 LOPES Jr, Aury. Direito Processual Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 1029-1030. 21 Além disso, não podem participar do Conselho de Sentença os cidadãos estrangeiros, pois integrar o Júri Popular é uma possibilidade apenas para os brasileiros natos e os brasileiros naturalizados.38 Os artigos 436 e 438, do Código de Processo Penal, dispõem que o alistamento deverá compreender cidadãos maiores de dezoito anos e com notória idoneidade. Além disso, dispõem que o serviço do júri é obrigatório e a recusa momentânea, quando injustificada, acarretará a multa fixada pelo juiz, de um a dez salários mínimos, conforme a condição econômica do jurado. Em contrapartida, a recusa definitiva fundada em convicção religiosa, filosófica ou política, acarretará a prestação de serviços alternativos e poderá acarretar a suspensão dos direitos políticos, pelo tempo que permanecer sem prestar o serviço.39 O artigo 437, do Código de Processo Penal, traz o rol das pessoas que estão isentas do serviço do júri.40 Enquanto os artigos 439 e 440, do Código de Processo Penal, trazem os privilégios decorrentes do exercício da função de jurado, quais sejam presunção de idoneidade moral, prisão especial, em caso de crime comum, até o julgamento definitivo, preferência, quando estiver em igualdade de condições, nas licitações públicas e no provimento, mediante concurso, de cargo ou função pública, bem como nos casos de promoção funcional ou remoção voluntária. Isto porque, o efetivo exercício da função de jurado, consistente na composição do Conselho de Sentença, ao menos uma vez, constitui serviço público relevante.41 38 OLIVEIRA, Marcus Vinícius Amorim de. Tribunal do Júri Popular na ordem jurídica constitucional. Curitiba: Juruá, 2003, p. 114. 39 Art. 436, CPP. O serviço do júri é obrigatório. O alistamento compreenderá os cidadãos maiores de 18 (dezoito) anos de notória idoneidade. §1º Nenhum cidadão poderá ser excluído dos trabalhos do júri ou deixar de ser alistado em razão de cor ou etnia, raça, credo, sexo, profissão, classe social ou econômica, origem ou grau de instrução. §2º A recusa injustificada ao serviço do júri acarretará multa no valor de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a condição econômica do jurado. Art. 438, CPP. A recusa ao serviço do júri fundada em convicção religiosa, filosófica ou política importará no dever de prestar serviço alternativo, sob pena de suspensão dos direitos políticos, enquanto não prestar o serviço imposto. §1º Entende-se por serviço alternativo o exercício de atividades de caráter administrativo, assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, no Poder Judiciário, na Defensoria Pública, no Ministério Público ou em entidade conveniada para esses fins. §2º O juiz fixará o serviço alternativo atendendo aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 40 Art. 437, CPP. Estão isentos do serviço do júri: I – o Presidente da República e os Ministros de Estado; II – os Governadores e seus respectivos Secretários; III – os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras Distrital e Municipais; IV – os Prefeitos Municipais; V – os Magistrados e membros do Ministério Público e da Defensoria Pública; VI – os servidores do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública; VII – as autoridades e os servidores da polícia e da segurança pública; VIII – os militares em serviço ativo; IX – os cidadãos maiores de 70 (setenta) anos que requeiram sua dispensa; X – aqueles que o requererem, demonstrando justo impedimento. 41 Art. 439, CPP. O exercício efetivo da função de jurado constituirá serviço público relevante e estabelecerá presunção de idoneidade moral. Art. 440, CPP. Constitui também direito do jurado, na condição do art. 439 deste Código, preferência, em igualdade de condições, nas licitações públicas e no provimento, mediante concurso, de cargo ou função pública, bem como nos casos de promoção funcional ou remoção voluntária. 22 Cabe mencionar ainda que, os jurados são equiparados aos magistrados togados, em relação ao exercício funcional, podendo responder por concussão, corrupção, prevaricação, além de outros delitos pertinentes aos funcionários públicos, conforme disposição do artigo 445, do Código de Processo Penal.42 Por exercem função jurisdicional, também vigoram contra os jurados as regras aplicadas aos juízes togados, quais sejam as regras de impedimento, suspeição e incompatibilidade, nos termos do artigo 448, do Código de Processo Penal. Além dessas regras mencionadas, no mesmo artigo, são previstos expressamente os impedimentos de marido e mulher, ascendente e descendente, sogro e genro ou nora, irmãos e cunhados (durante o cunhado), tio e sobrinho, padrasto ou madrasta e enteado, bem pessoas que mantenham união estável reconhecida como entidade familiar.43 Por fim, o artigo 449, do Código de Processo Penal, traz outras hipóteses em que o jurado não poderá servir ao Júri.44 2.4 Procedimento do Tribunal do Júri Alguns autores, como Guilherme de Souza Nucci, defendem que o procedimento do Tribunal do Júri é trifásico. Entretanto, outros, como Aury Lopes Júnior, Eugênio Pacelli de Oliveira, Fernando Capez, Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar, defendem que o procedimento é bifásico. No presente trabalho, abordaremos resumidamente o procedimento do Tribunal do Júri e seguiremos a corrente doutrinaria que defende que ele é dividido em duas fases bem delineadas: instrução preliminar, formação de culpa ou judicium accusationis e julgamento propriamente dito, acusação em plenário ou judicium causae. Nesse sentido, assevera Fernando Capez: O rito procedimental para os processos de competência do Júri é escalonado. A primeira fase se inicia com o oferecimento da denúncia e se encerra com a decisão de 42 Art. 445, CPP. O jurado, no exercício da função ou a pretexto de exercê-la, será responsável criminalmente nos mesmos termos em que o são os juízes togados. 43 Art. 448, CPP. São impedidos de servir no mesmo Conselho: I – marido e mulher; II – ascendente e descendente; III – sogro e genro ou nora; IV – irmãos e cunhados, durante o cunhado; V – tio e sobrinho; VI – padrasto, madrasta ou enteado. §1º O mesmo impedimento ocorrerá em relação às pessoas que mantenham união estável reconhecida como entidade familiar. §2º Aplicar-se-á aos jurados o disposto sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades dos juízes togados. 44 Art. 449, CPP. Não poderá servir o jurado que: I – tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo processo, independentemente da causa determinante do julgamento posterior; II – no caso do concurso de pessoas, houver integrado o Conselho de Sentença que julgou o outro acusado; III – tiver manifestado prévia disposição para condenar ou absolver o acusado. 23 pronúncia (judicium accusationis ou sumário de culpa). A segunda fase se inicia com o recebimento dos autos pelo juiz-presidente do Tribunal do Júri e se encerra com o julgamento pelo Tribunal do Júri (judicium causae).45 A duas fases ocorrem pela divisão que se estabelece na decisão de pronúncia, impronúncia, absolvição sumária ou desclassificação. Através de uma destas decisões, o juiz presidente do Júri, ou seja, o juiz de direito ou o juiz federal titular da vara, decide com base nas provas colhidas na instrução preliminar entre enviar o réu para julgamento pelo Tribunal do Júri (pronúncia) ou não (impronúncia, absolvição sumária ou desclassificação). Portanto, o processo pode acabar na primeira fase, dependendo da decisão tomada pelo juiz presidente, pois a segunda fase somente inicia com a decisão de pronúncia.46 Cabe destacar que, conforme previsto noartigo 421, do Código de Processo Penal, é necessário que esteja preclusa a decisão de pronúncia, para que os autos serão encaminhados ao juiz presidente do Tribunal do Júri e para que se inicie a segunda fase do procedimento.47 Em uma visão geral, a primeira fase assemelha-se com o procedimento comum ordinário, porém, com algumas modificações conferidas pela Lei n° 11.689/2008, que trouxe as alegações escritas preliminares e a inversão do rito, com a realização do interrogatório e debates orais ao final. Tal fase chama-se ainda de juízo de admissibilidade, sumário de culpa, juízo de acusação ou judicium accusationis, sendo uma verdadeira fase de filtro, que pode remeter o réu à segunda fase, quando o feito estiver suficientemente maduro.48 A primeira fase do procedimento do Tribunal do Júri tem a finalidade de definir a provável existência de um crime doloso contra a vida, de forma que, o juiz deve emitir apenas um juízo de admissibilidade da peça acusatória, cabendo ao Conselho de Sentença, na segunda fase, dar a certeza sobre a existência ou não do crime. Como mencionado, ao final dessa fase, o magistrado pode adotar as seguintes decisões: pronúncia, impronúncia, absolvição sumária ou desclassificação. A pronúncia é uma decisão interlocutória mista não terminativa de conteúdo declaratório, onde o juiz remete o caso à apreciação do Tribunal do Júri. Conforme artigo 413, 45 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 844-845. 46 LOPES Jr, Aury. Direito Processual Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 1003-1004. 47 Art. 421, CPP. Preclusa a decisão de pronúncia, os autos serão encaminhados ao juiz presidente do Tribunal do Júri. §1º Ainda que preclusa a decisão de pronúncia, havendo circunstância superveniente que altere a classificação do crime, o juiz ordenará a remessa dos autos ao Ministério Público. §2º Em seguida, os autos serão conclusos ao juiz para decisão. 48 ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de direito processual penal. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 2235. 24 do Código de Processo Penal, ocorre quando existir prova da materialidade e indícios de autoria ou participação.49 Acerca da pronúncia, apesar da divergência doutrinária, Marcos Vinícius Amorim de Oliveira defende que: Nessa cena processual, não se destaca o princípio do in dúbio pro réu – que só se aplica na análise de mérito da causa, a ser feita não pelo juiz do feito, mas pelos juízes naturais, isto é, os sete jurados pertencentes ao conselho de sentença. Tem prevalência aí o ineditismo do princípio do in dúbio pro sociedate. Tal ocorre simplesmente por se tratar de mero juízo de admissibilidade da acusação, pois a decisão da causa, verdadeiramente, caberá aos jurados.50 A impronúncia é uma decisão interlocutória mista de conteúdo terminativo, tendo em vista que encerra a primeira fase do processo e não adentra no mérito, fazendo coisa julgada meramente formal. Conforme artigo 414, do Código de Processo Penal, ocorre quando inexistir prova da materialidade e indícios de autoria ou de participação.51 A absolvição sumária encerra o processo e adentra no mérito, fazendo coisa julgada material. Conforme artigo 415, do Código de Processo Penal, ocorre quando provada a inexistência do fato, provado não ser o acusado autor ou partícipe do fato, o fato não constituir infração penal ou demonstrada a causa de isenção de pena ou a causa de exclusão de crime, excetuando-se os casos de inimputabilidade para os quais seja cabível a aplicação de medida de segurança.52 Acerca da absolvição sumária, assegura Marcus Vinícius Amorim de Oliveira: Isto posto, o juiz deverá agir com extrema cautela e prudência se deseja proferir uma sentença de absolvição sumária, pois daí resulta a exclusão do Júri popular para 49 Art. 413, CPP. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. §1º A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena. §2º Se o crime for afiançável, o juiz arbitrará o valor da fiança para a concessão ou manutenção da liberdade provisória. §3º O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código. 50 OLIVEIRA, Marcus Vinícius Amorim de. Tribunal do Júri Popular na ordem jurídica constitucional. Curitiba: Juruá, 2003, p. 107. 51 Art. 414, CPP. Não se convencendo da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado. Parágrafo único. Enquanto não ocorrer a extinção da punibilidade, poderá ser formulada nova denúncia ou queixa se houver prova nova. 52 Art. 415, CPP. O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: I – provada a inexistência do fato; II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; III – o fato não constituir infração penal; IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do art. 26 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva. 25 apreciar a matéria, uma vez que a sentença de absolvição extingue o processo, isentando o réu de responsabilidade sobre o fato criminoso.53 A desclassificação é uma decisão interlocutória simples, que modifica a competência do juízo sem adentrar no mérito e sem encerrar o processo. Conforme artigo 419, do Código de Processo Penal, ocorre quando o crime praticado não configurar crime doloso contra a vida, devendo os autos serem remetidos ao juízo competente.54 A segunda fase, que só ocorrerá se o acusado for pronunciado, isto é, se a acusação for admitida, com a prolação de um juízo de admissibilidade positivo pelo juiz presidente, chama-se ainda judicium causae ou juízo de mérito, onde há participação dos jurados, os quais apreciam os fatos sob a presidência do juiz presidente do Tribunal do Júri.55 O veredicto proferido no julgamento realizado no plenário do Tribunal do Júri encerra a segunda fase do procedimento. Por fim, tem-se que todo o procedimento legal próprio do Tribunal Júri está detalhadamente delimitado pelos artigos 406 a 497 do Código de Processo Penal, o qual foi notadamente alterado pela Lei nº. 11.689/2008. 53 OLIVEIRA, Marcus Vinícius Amorim de. Tribunal do Júri Popular na ordem jurídica constitucional. Curitiba: Juruá, 2003, p. 101. 54 Art. 419, CPP. Quando o juiz se convencer, em discordância com a acusação, da existência de crime diverso dos referidos no §1º do art. 74 deste Código e não for competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja. Parágrafo único. Remetidos os autos do processo a outro juiz, à disposição deste ficará o acusado preso. 55 ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de direito processual penal. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 2235. 26 3 A MÍDIA E A SUA INFLUÊNCIA NOS JULGAMENTOS DO TRIBUNAL DO JÚRI No terceiro capítulo do presente trabalho, estuda-se a mídia e a sua influência nos julgamentos do Tribunal do Júri, abordando ainda a ameaça à imparcialidade dos jurados ea colisão entre direitos fundamentais causadas pela atuação da mídia nos casos sob enfoque. 3.1 A mídia Segundo o dicionário Houaiss, a palavra “mídia” pode ser definida como “todo suporte de difusão da informação que constitui um meio intermediário de expressão capaz de transmitir mensagens; meios de comunicação social de massas não diretamente interpostas” 56. O termo “mídia” é comumente usado para fazer referência ao jornalismo, à imprensa e aos meios, veículos ou canais de comunicação. Os meios de comunicação podem ser classificados como de massa ou de uso restrito ou pessoal de acordo com a quantidade de receptores que podem ser alcançados simultaneamente por uma mesma mensagem. A televisão, o rádio, os jornais, as revistas e a internet são exemplos de meios de comunicação de massa, pois alcançam simultaneamente uma quantidade enorme de pessoas. No presente trabalho, será usado o termo “mídia” como sinônimo de “meios de comunicação de massa”. Em virtude do desenvolvimento tecnológico, os veículos de comunicação de massa têm se expandido notadamente nas últimas décadas e passado a influenciar as pessoas em diversos âmbitos (social, cultural, político, econômico e educacional, por exemplo). Independente do sexo, da idade, da classe social e da religião, todas as pessoas que convivem na sociedade moderna sofrem alguma influência da mídia. Nesse contexto, a mídia vem sendo apontada como o quarto poder, em alusão aos três poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) nomeados no Estado Democrático e em razão do poder e da influência que exerce na sociedade moderna em diversos aspectos. Na verdade, o que se tem na sociedade moderna é uma “poderosa máquina” capaz de influenciar diretamente ou indiretamente na opinião pública e nos outros poderes, principalmente no Poder Judiciário. 56 HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Sales. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. 27 Para poder exercer sua função social de bem informar a sociedade, sem censuras, proibições e interdições, a atuação da mídia no Brasil é resguardada pela Constituição Federal de 1988, no artigo 5°, incisos IV, V, IX e XIV, no artigo 220 e no artigo 221, garantindo os direitos fundamentais à liberdade de expressão, à liberdade de imprensa, à liberdade de informação e de comunicação.57 Entretanto, nos tempos atuais, a mídia vem sendo dominada por grandes conglomerados empresariais que almejam obter lucros a qualquer custo e, por isso, ela vem ultrapassando o papel social de transmitir informações, passando a formar, influenciar e manipular negativamente a opinião pública através das informações transmitidas. Em razão da dominação exercida por estas grandes empresas que visam apenas o lucro, a informação se tornou uma mercadoria. Sem qualquer atenção com a sua função social, os meios de comunicação têm demonstrado menor preocupação com a responsabilidade e a ética, bem como têm transmitido informações de forma desenfreada, superficial, parcial, sensacionalista e, muitas vezes, inverídica. Nesse sentido, são as lições de Ana Lúcia Vieira: A liberdade de expressão pelos meios de comunicação em massa vem se transformando em arbítrio de expressão, que nada mais é do que a negação dessa liberdade. A informação na atualidade não mais transmite a realidade autêntica, seus aspectos essenciais. As notícias são fragmentadas, superficiais, parciais, sensacionalistas, capazes de ridicularizar e destruir os mais nobres e altos sentimentos, valores éticos e a dignidade dos indivíduos.58 57Art. 5º, CF/88: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. IV: é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. V: é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem. IX: é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. XIV: é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional. Art. 220, CF/88. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. § 3º - Compete à lei federal: I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada; II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente. § 4º - A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso. § 5º - Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio. § 6º - A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade. Art. 221, CF/88. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei; IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família. 58 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 43-44. 28 Desse modo, a busca incessante das grandes empresas pela obtenção de lucros é um enorme empecilho a função social da mídia de bem informar, formar, favorecer a cultura, proporcionar o diálogo e a participação entre as pessoas da sociedade.59 Em resumo, apesar de ter importante função social e continuar sendo fundamental para a existência do Estado Democrático, a atuação dos meios de comunicação atualmente tem se desviado de sua finalidade principal, o que pode prejudicar a própria democracia, especialmente no que se refere à instituição do Tribunal do Júri. 3.2 A mídia e as decisões do Tribunal do Júri É nesse contexto que surge o problema da influência da mídia nos julgamentos do Tribunal do Júri, pois nota-se a preferência da mídia por noticiar matérias criminais, principalmente no que se refere aos crimes de competência do Tribunal do Júri, uma vez que os mencionados crimes geram enorme curiosidade e comoção pública, sendo responsáveis pela maior audiência dos meios de comunicação de massa e pela maior lucratividade. Os crimes de competência do Tribunal do Júri, ou seja, os crimes dolosos contra a vida vêm sendo objeto de uma mídia sensacionalista que transmite as informações de forma exagerada, emotiva, dramática e espetaculosa, com a finalidade de prender a atenção do público. Sobre o sensacionalismo da mídia, Ana Lúcia Vieira diz: O sensacionalismo é umaforma diferente de passar uma informação; uma opção por assuntos que podem surpreender, capazes de chocar o público; uma estratégica dos meios de comunicação que trabalham com a linguagem-clichê, vulgar, compacta, conhecida como lugar-comum, de fácil compreensão por aquele que a recebe.60 Além disso, o sensacionalismo utilizado pela mídia na transmissão de notícias relacionadas aos crimes de competência do Tribunal do Júri introduz no imaginário e na consciência popular violência, medo, terror, pânico e insegurança. Tais sentimentos introduzidos na sociedade vêm acompanhados da forte pressão social que busca punir os culpados. Sobre os sentimentos e a forte pressão da sociedade em busca da punição aos culpados, afirma Ana Elisa Bechara: 59 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 43-62. 60 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 52. 29 E justamente em face dos sentimentos primitivos que ligam os indivíduos ao Direito Penal, parece haver uma atração social irresistível a legitimar a atuação da imprensa. Afinal, há uma curiosidade pública, agora já convertida em “comoção pública”, e essa “opinião pública” (ou opinião da imprensa, transmutada em opinião pública) reclama a pronta resolução do caso, com a severa punição dos seus agentes já julgados. A audiência dos programas televisivos dispara, os jornais e revistas não ousam trazer outras matérias em sua capa, que não a violência em discussão. Ganha-se dinheiro e a sociedade resta aparentemente satisfeita.61 Sem qualquer responsabilidade e sem qualquer compromisso com a verdade, a mídia veicula repetitivamente e exaustivamente os crimes mencionados. Além de informar, ela investiga, opina, debate, expõe os envolvidos, acusa e julga os culpados, antes mesmo de uma decisão judicial. Embora a informação seja um direito fundamental resguardado pela Constituição Federal de 1988, os veículos de comunicação estão ultrapassando a função informativa e assumindo as funções investigativa, acusadora e julgadora, na medida em que emitem pré- julgamentos. Assim, assegura Ana Elisa Bechara: Nesse contexto, ao observarmos o conteúdo das notícias relacionadas à matéria criminal, veiculada nos diversos meios de comunicação, constatamos, com ingrata surpresa, o papel desempenhado pela mídia no Direito Penal atual. Se antes tínhamos uma imprensa que buscava, de forma ativa, influenciar os operadores do sistema jurídico-penal, hoje estamos diante de meios de comunicação que pretendem se substituir aos próprios tribunais, esforçando-se para realizar, por seus próprios recursos, um julgamento virtual do caso concreto, de repercussão infinitamente superior à da própria persecução penal.62 Essa atuação dos meios de comunicação compromete direitos fundamentais resguardados pela Constituição Federal de 1988 e pelos demais ordenamentos jurídicos infraconstitucionais, como o direito à presunção de inocência e os direitos da personalidade. Além de desrespeitar os direitos fundamentais mencionados acima, essa veiculação irresponsável de notícias pelos meios de comunicação de massa coloca em risco o princípio da imparcialidade do julgamento, na medida em que pode influenciar as decisões dos jurados que, através do Tribunal Popular, decidem o futuro de seus pares. Nesse aspecto, observa Artur César de Souza: Da mesma forma, a narração dos fatos pelas redes de informação sem caráter objetivo, segundo a opinião, ideologia ou sentimento pessoal daqueles que são responsáveis pelos meios de comunicação, sem dúvida, além de apresentar uma versão parcial da questão, pode por em risco a lisura e legitimidade do julgamento, uma vez que essas 61 BECHARA Ana Elisa Liberatore S. Caso Isabella: violência, mídia e direito penal de emergência. Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, São Paulo, v. 16, n.186, p. 16-17, maio 2008. 62 BECHARA Ana Elisa Liberatore S. Caso Isabella: violência, mídia e direito penal de emergência. Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, São Paulo, v. 16, n.186, p. 16-17, maio 2008. 30 informações ingressarão, sem qualquer filtragem, no inconsciente do juiz e dos jurados, de tal modo que, antes mesmo do início do julgamento, o resultado final já se encontra sacramentado.63 De fato, a legitimidade e a imparcialidade da decisão judicial encontram-se ameaçadas, uma vez que o julgador sofre pressão para proferir uma decisão influenciada pela repercussão midiática, especialmente nos casos de competência do Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, que é composto por juízes leigos, ou seja, pessoas do povo que não passaram pelo mesmo escrutínio de um juiz togado e são mais vulneráveis a influências externas ao processo.64 Ana Lúcia Vieira confirma: O jurado, “cidadão incumbido pela sociedade de declarar se os acusados submetidos a julgamento são culpados ou inocentes”, é mais permeável à opinião pública, à comoção que se criou em torno do caso em julgamento, do que os juízes togados e, por sentirem-se pressionados pela campanha criada na imprensa, correm o risco de se afastarem do dever de imparcialidade e acabam julgando de acordo com o que foi difundido na mídia. 65 Diferente de um juiz togado, os jurados são desprovidos de conhecimentos jurídicos e não precisam fundamentar suas decisões, uma vez que julgam com base na sua íntima convicção e nos ditames da justiça. Aos jurados, cabe apenas responder sim ou não aos quesitos formulados pelo juiz-presidente. Acerca da ausência de motivação das decisões proferidas pelo Conselho de Sentença, Aury Lopes Júnior assegura: O golpe fatal no júri está na absoluta falta de motivação do ato decisório. A motivação serve para o controle da racionalidade da decisão judicial. Não se trata de gastar folhas e folhas para demonstrar erudição jurídica (e jurisprudencial) ou discutir obviedades. O mais importante é explicar o porquê da decisão, o que o levou a tal conclusão sobre a autoria e materialidade. [...] A decisão dos jurados é absolutamente ilegítima porque carecedora de motivação. Não há a menor justificação (fundamentação) para seus atos. Trata-se de puro arbítrio, no mais absoluto predomínio do poder sobre a razão. E poder sem razão é prepotência. A situação é ainda mais grave se consideramos que a liberdade de convencimento (imotivado) é tão ampla que permite o julgamento a partir de elementos que não estão no processo.66 Tal fato ocasiona uma temerosa insegurança jurídica nos julgamentos do Tribunal do Júri, pois resta impossível saber por que motivos os jurados votaram pela condenação ou 63 SOUZA, Artur César de. Caso Suzane Louise Von Richthofen e os irmãos Cravinho – a influência da mídia na (im)parcialidade do Tribunal do Júri. Revista Ajuris, Porto Alegre, v. 34, n. 105, p. 73-90, mar. 2007, p. 88. 64 NOGUEIRA, Beatriz Lima. O Conselho de Sentença do Tribunal do Júri e a influência dos meios de comunicação de massa à luz da Constituição Federal de 1988: análise dos limites da liberdade de expressa. 2016. 96 f. Monografia (Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Constitucional Aplicado) - Faculdade de Direito Damásio de Jesus, Fortaleza, 2016, p. 7. 65 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 246. 66 LOPES JUNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 10.ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 1063. 31 pela absolvição do réu, uma vez que eles podem ter considerado influências externas ao processo para proferir a decisão.67 Apesar da desnecessidade de fundamentação das decisões do Conselho de Sentença não afastar o dever dos jurados de decidirem com isenção e imparcialidade, favorece ainda mais queeles, ao condenarem ou absolverem o acusado, façam um julgamento influenciado pelo pré-julgamento realizado e amplamente divulgado pela mídia. Tem-se que as impressões trazidas pela mídia podem influenciar demasiadamente as decisões dos jurados, fazendo com que eles decidam mais baseados na emoção e nos pré- julgamentos divulgados pelos meios de comunicação do que na razão e na imparcialidade da avaliação das impressões trazidas no desenrolar do processo pela acusação e pela defesa. Nesse sentido, Ana Lúcia Vieira assegura: A publicidade prévia do ato criminoso ou dos atos do desenvolvimento processual pelos meios de comunicação, perante os casos da competência do Tribunal do Júri, é particularmente preocupante, pois, uma vez que o julgamento é feito por juízes leigos, a impressão que a mídia transmite do crime e do criminoso produz maior efeito neles do que as provas trazidas pelas partes na instrução e julgamento no plenário.68 Ao se afastarem das provas apresentadas no processo pela defesa e pela acusação, os jurados podem estar baseando seu convencimento em fatos dissonantes da verdade processual. Isto porque, em busca do esclarecimento da verdade processual, todas as provas produzidas e utilizadas pelo Tribunal do Júri são lícitas, tendo em vista a vedação constitucional de utilização de provas ilícitas ou de provas obtidas por meios ilícitos. Em contrapartida, as provas produzidas e utilizadas pela mídia podem ser ilícitas. No afã da busca por mais audiência e mais lucro, os meios de comunicação mostram documentos, imagens, vídeos, sons e depoimentos sem averiguar adequadamente a veracidade das provas e a licitude dos meios pelos quais elas foram obtidas. Assim, as provas produzidas e utilizadas pela mídia podem ser ilícitas, falsas ou editadas, o que afasta os jurados do esclarecimento da verdade processual. Destaca-se ainda que, apesar de terem sido garantidos aos jurados a incomunicabilidade e o sigilo das votações para que pudessem formar e expressar livremente suas decisões, sem qualquer influência ou pressão, essas garantias não asseguram 67 NOGUEIRA, Beatriz Lima. O Conselho de Sentença do Tribunal do Júri e a influência dos meios de comunicação de massa à luz da Constituição Federal de 1988: análise dos limites da liberdade de expressa. 2016. 96 f. Monografia (Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Constitucional Aplicado) - Faculdade de Direito Damásio de Jesus, Fortaleza, 2016, p. 80. 68 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 246. 32 materialmente a formação do livre convencimento do Júri, resguardando apenas formalmente a imparcialidade do mesmo, uma vez que não são suficientes para impedir a influência da mídia no convencimento dos jurados. Isto porque, os jurados sofrem influência da mídia antes mesmo de formarem o Conselho de Sentença, no momento em que foram divulgadas as primeiras notícias sobre o caso pelos meios de comunicação. Para tentar garantir a ordem pública, a imparcialidade do julgamento e a segurança pessoal do acusado, o Código de Processo Penal, nos artigos 427 e 428, permite também a aplicação do instituto do desaforamento. Por meio desse instituto, é possível transferir o julgamento para outra comarca da mesma região, onde não mais persistam os motivos que geraram dúvidas sobre a garantia de uma decisão justa pelos jurados.69 No entanto, nos casos de crimes que ganham grande repercussão nacional pela mídia, tal instituto tornou-se obsoleto, pois a transferência de comarca não impedirá a influência da mídia sobre os jurados. Portanto, assim como a incomunicabilidade e o sigilo das votações, o desaforamento resguarda apenas formalmente a imparcialidade do Conselho de Sentença. Por todo o exposto, é forçoso reconhecer que a imparcialidade da instituição do Tribunal do Júri, um dos corolários da democracia e da participação popular no âmbito das decisões propostas pelo Poder Judiciário, é colocada em risco pela ausência de fundamentação das decisões dos jurados e pela atuação sensacionalista da mídia em matéria criminal. 3.3 A colisão entre direitos fundamentais gerada pela atuação da mídia 69 Art. 427, CPP. Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas. §1º O pedido de desaforamento será distribuído imediatamente e terá preferência de julgamento na Câmara ou Turma competente. §2º Sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá determinar, fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri. §3º Será ouvido o juiz presidente, quando a medida não tiver sido por ele solicitada. §4º Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo, nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de julgamento anulado. Art. 428, CPP. O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. §1º Para a contagem do prazo referido neste artigo, não se computará o tempo de adiamentos, diligências ou incidentes de interesse da defesa. §2º Não havendo excesso de serviço ou existência de processos aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo Tribunal do Júri, nas reuniões periódicas previstas para o exercício, o acusado poderá requerer ao Tribunal que determine a imediata realização do julgamento. 33 Além de colocar em risco o princípio da imparcialidade do julgamento, como tratado no tópico anterior, a atuação da mídia nos casos de competência do Tribunal do Júri compromete direitos fundamentais resguardados pela Constituição Federal de 1988 e pelos demais atos normativos infraconstitucionais, como o direito à presunção de inocência e os direitos da personalidade (honra, imagem, intimidade e vida privada). No presente tópico, realiza-se um breve estudo sobre os direitos fundamentais que entram em colisão face à atuação dos meios de comunicação de massa, abordando ainda seus fundamentos na Constituição Federal de 1988 e discorrendo sobre o tema de colisões entre direitos fundamentais. O direito fundamental à liberdade de expressão é consagrado pela Constituição Federal de 1988, a qual positiva no artigo 5º, incisos IV, IX e XIV, que é livre a manifestação do pensamento e que é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença, assim como é livre o acesso à informação e resguardada a fonte, quando necessário à atividade profissional.70 É certo que a liberdade de expressão exerce papel fundamental no atual cenário político da sociedade, em virtude da grande censura e da repressão sofrida nos tempos da Ditadura Militar, cujas pessoas eram proibidas de exprimir seus sentimentos e convicções, sendo repreendidos constantemente pelo governo. Após a Ditadura Militar, a liberdade de expressão foi amplamente exercida, tendo em vista que os meios de comunicação ganharam maior força e proteção no ordenamento jurídico brasileiro, incidindo vigorosamente no cotidiano das pessoas, veiculando notícias e possibilitando a comunicação jornalística. A Constituição de 1988 foi promulgada num período de redemocratização da sociedade, e, por isso, protege de formaespecial a liberdade em suas diversas manifestações, dentre elas, a liberdade de expressão. Acerca da liberdade de expressão, destaca Fernanda Carolina Tôrres: Assim, na ordem jurídica contemporânea, a liberdade de expressão consiste, em sentido amplo, num conjunto de direitos relacionados às liberdades de comunicação, que compreende: a liberdade de expressão em sentido estrito (ou seja, de manifestação 70 Art. 5º, CF/88: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. IV: é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. IX: é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. XIV: é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional. 34 do pensamento ou de opinião), a liberdade de criação e de imprensa, bem como o direito de informação.71 Assim, tem-se que a liberdade de expressão, em sentido amplo, engloba outras liberdades, como a liberdade de imprensa e a liberdade de informação. A liberdade de expressão e o direito de informação garantem ao cidadão o livre exercício de suas convicções íntimas e opiniões próprias, bem como o direito de informar, o direito de ser informar e o direito de ser informado. Sobre o direito de informação, ensina Ana Lúcia Vieira: O direito de informar consiste na possibilidade de veicular informações; o direito de se informar, por sua vez, é a faculdade de ter livre acesso às fontes de informação, é o direito de buscar informações, sem impedimentos ou obstáculos; o direito de ser informado é a prerrogativa que possui qualquer pessoa à receptação de informações.72 Destaca-se que a Lei de Imprensa nº 5.520/67, que regulamentava a atuação da mídia, foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, nos termos da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 130/2009, razão pela qual há um espaço no ordenamento jurídico brasileiro no que se refere à regulamentação da liberdade de expressão.73 Contudo, o exercício dessa liberdade implica responsabilidades, bem como precisa de regulamentação e limitações constitucionais, tendo em vista que nenhum direito fundamental é tido como absoluto pela Constituição Federal de 1988. Apesar de serem fundamentais para manutenção do Estado Democrático de Direito, as liberdades mencionadas encontram limites previstos na Constituição Federal de 1988. De fato, nos artigos 220 e 221, existem limites para a liberdade de expressão, quais sejam os próprios direitos fundamentais expostos no texto constitucional e os textos infraconstitucionais espalhados pelo ordenamento jurídico.74 71 TÔRRES, Fernanda Carolina. O direito fundamental à liberdade de expressão e sua extensão. Revista de Informação Legislativa, Belo Horizonte, ano 50, n. 200, p. 61-80, out/dez. 2013, p. 62. 72 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 32. 73 NOGUEIRA, Beatriz Lima. O Conselho de Sentença do Tribunal do Júri e a influência dos meios de comunicação de massa à luz da Constituição Federal de 1988: análise dos limites da liberdade de expressa. 2016. 96 f. Monografia (Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Constitucional Aplicado) - Faculdade de Direito Damásio de Jesus, Fortaleza, 2016, p. 44-49. 74 Art. 220, CF/88. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. § 3º - Compete à lei federal: I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada; II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser 35 Acerca dos limites a liberdade de expressão, Alceu Corrêa Junior e Sérgio Salomão Shecaira ensinam: Entre nós, embora a manifestação do pensamento tenha sido acolhida com a mais ampla abrangência (fato esse que deve ser motivo de júbilo), independentemente de censura ou licença, o próprio dispositivo constitucional estabelece que tais liberdades não poderão ser exercidas com desrespeito a outras normas previstas constitucionalmente como, por exemplo, a inviolabilidade à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, previstas no art. 5.º, X. Como visto, trata-se de uma limitação àquela liberdade, o que, contudo, não representa um cerceamento, mas apenas uma garantia de que não serão praticadas abusivamente, ofendendo direitos de outrem. 75 Ives Gandra e Francisco Resek elaboram uma nomenclatura para os limites da liberdade de expressão, como se verifica abaixo: Em garantia à própria liberdade de expressão, há restrições à intervenção estatal. Também em proteção da mesma liberdade de expressão, podem-se descrever alguns limites, que definem o curso de seu livre exercício. Há limites constitucionalmente expressos e limites constitucionalmente autorizados a liberdade de expressão. Os primeiros estão inseridos diretamente no texto constitucional, no âmbito da proteção dos direitos fundamentais. Os segundos estão na margem de complementação do legislados infraconstitucional por meio de delegação da Carta Maior, ou como decorrência de sua aplicação.76 Cabe mencionar que tais limites impostos à liberdade de expressão não podem ser considerados censura, até porque a censura diverge totalmente das determinações constitucionais. Contudo, se por um lado encontra-se o direito à liberdade de expressão e o direito de informação, por outro, encontra-se o direito à presunção de inocência e os direitos da personalidade. Assim como a liberdade de expressão, a presunção de inocência é um direito fundamental consagrado pela Constituição Federal de 1988, a qual assegura no artigo 5º, inciso LVII, que o indivíduo acusado num processo criminal não seja considerado culpado até que se nocivos à saúde e ao meio ambiente. § 4º - A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso. § 5º - Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio. § 6º - A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade. Art. 221, CF/88. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei; IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família. 75 CORRÊA JUNIOR, Alceu. SHECAIRA, Sérgio Salomão. Teoria da pena:finalidades, direito positivo, jurisprudência e outros estudos de ciência criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 286. 76 MARTINS, Ives Gandra; REZEK, Francisco. Constituição Federal: avanços, contribuições e modificações no processo democrático brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais e Centro de Extensão Universitária, 2008, p. 842-846. 36 tenha transitado em julgado uma sentença penal condenatória. Em outras palavras, garante a indubitável inocência daquele indivíduo que está sendo acusado em um processo criminal, mas ainda não foi condenado por sentença transitada em julgado.77 Nas palavras de Aury Lopes Júnior: No Brasil, a presunção de inocência está expressamente consagrada no art. 5º, LVII, da Constituição, sendo o princípio reitor do processo penal e, em última análise, podemos verificar a qualidade de um sistema processual através do nível de observância (eficácia).78 De fato, o princípio da presunção de inocência é reitor do processo penal e está diretamente ligado a outros princípios, como do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e da imparcialidade do juiz. Nesse sentido, afirma Alexandre de Moraes: Dessa forma, a presunção de inocência condiciona toda condenação a uma atividade probatória produzida pela acusação e veda, taxativamente, a condenação, inexistindo as necessárias provas. O princípio da presunção de inocência consubstancia-se, portanto, no direito de não ser declarado culpado, senão mediante sentença judicial com trânsito em julgado, ao término do devido processo legal (due processo of law), em que o acusado pôde utilizar-se de todos os meios de prova pertinentes para a sua defesa (ampla defesa) e para a destruição da credibilidade das provas apresentadas pela acusação (contraditório).79 A garantia constitucional da presunção de inocência é provisória, no sentido em que pode ser modificada com a sentença penal condenatória transitada em julgado, e antecipada, no sentido em que garante que o acusado seja considerado inocente desde o início do processo criminal. Ou seja, é necessária uma sentença penal condenatória transitada em julgado para alterar o estado jurídico de inocente para o de culpado. No que diz respeito à dimensão do julgador, Aury Lopes Júnior defende: Sob a perspectiva do julgador, a presunção de inocência deve(ria) ser um princípio da maior relevância, principalmente no tratamento processual que o juiz deve dar ao acusado. Isso obriga o juiz não só a manter uma posição “negativa” (não o considerando culpado), mas sim a ter uma postura positiva (tratando-o efetivamente como inocente).80 77 Art. 5º, CF/88: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. LVII: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. 78 LOPES Jr, Aury. Direito Processual Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 226. 79 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos art. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 268. 80 LOPES Jr, Aury. Direito Processual Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 228. 37 Logo, tal direito fundamental deve ser entendido como um dever de tratamento garantido pelo texto constitucional, segundo o qual o acusado deve ser tratado efetivamente como inocente, independente do crime pelo qual esteja sendo acusado. Destaca-se ainda que tal dever de tratamento não está apenas vinculado à atuação jurisdicional, mas também à atuação da mídia, devendo ser limitada qualquer exploração midiática capaz de prejudicar os direitos e as garantias do acusado antes de uma sentença penal condenatória com trânsito em julgado. Apesar da presunção de inocência estar resguardada no mesmo rol de direitos fundamentais da liberdade de expressão, nota-se que ela é um dos princípios mais violados pela mídia, o que ocorre quando os meios de comunicação exploram o crime, expondo a figura do acusado de forma precipitada como se fosse culpado mesmo antes da sentença penal condenatória transitada em julgado, provocando prejuízos irreparáveis ao acusado. Assim como a liberdade de expressão e a presunção de inocência, os direitos da personalidade são direitos fundamentais resguardados pela Constituição Federal de 1988, a qual protege no artigo 5°, inciso X, a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem de cada indivíduo, garantindo ainda o direito a eventuais indenizações em virtude de danos morais e danos materiais causados pelos prejuízos as referidas garantias. 81 Ademais, os direitos da personalidade são referidos pelo Código Civil de 2002, nos artigos 20 e 21, os quais tratam dos direitos a imagem, a honra e a vida privada das pessoas.82 A atual interferência da mídia em matérias criminais vem invadindo a privacidade e a intimidade e degradando a imagem e a honra das pessoas envolvidas no processo criminal, sendo necessário proteger os direitos da personalidade mencionados, para que eles não sejam sacrificados em prol da liberdade de expressão. Nesse sentido, confirma Ana Lúcia Vieira: Se esses bens já se encontram, até certo ponto, limitados pela existência da investigação criminal ou do processo, maior é a necessidade de preservá-los dos abusos que a imprensa comete quando divulga os atos judiciais. A proteção dos 81 Art. 5º, CF/88: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. X: são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. 82 Art. 20, CC. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. Art. 21, CC. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma. 38 direitos da personalidade, sob o ponto de vista da crônica judiciária, tem relevante interesse na medida em que, geralmente, há invasões desmedidas na intimidade das pessoas, pela mídia. 83 Com base em todo exposto, tem-se que a liberdade de expressão, a presunção de inocência, a honra, a imagem, a intimidade e a vida privada, direitos fundamentais positivados na Lei Maior de 1988, são prerrogativas concedidas a todos os indivíduos sem distinção, sendo fundamentais à sua maneira, uma vez que trazem garantias específicas e melhorias em diversos âmbitos para a sociedade na suas esferas de atuação. Após tecer um breve estudo sobre os mencionados direitos fundamentais, observa- se desde logo a ocorrência de uma colisão entre eles: liberdade de expressão, englobando a liberdade de imprensa e o direito de informação, versus a presunção de inocência e os direitos da personalidade. Ao publicar notícias imparciais e sensacionalistas sobre os casos criminais, especialmente sobre os casos de crimes de competência do Tribunaldo Júri, expondo o acusado e o condenando antecipadamente, a liberdade de expressão, englobando a liberdade de imprensa e o direito de informação, colide com o direito à presunção de inocência e os direitos da personalidade. Em verdade, a mídia ultrapassa a função informativa e assume as funções investigativa, acusadora e julgadora, na medida em que expõe demasiadamente os envolvidos e emite julgamento antecipado a uma sentença penal condenatória transitada em julgado. Nesses casos, ocorre a colisão de direitos fundamentais, pois a mídia invoca o direito à liberdade de expressão em sua proteção, enquanto o acusado encontra-se amparado pelo direito à presunção de inocência e pelos direitos da personalidade (intimidade, vida privada, honra e imagem). Acerca da colisão entre direitos fundamentais, consagra Robert Alexy: Colisões de direitos fundamentais em sentido estrito nascem sempre então, quando o exercício ou a realização do direito fundamental de um titular de direitos fundamentais tem consequências negativas sobre direitos fundamentais de outros titulares de direitos fundamentais. [...] Sob as colisões entre direitos fundamentais diferentes de titulares de direitos fundamentais diferentes, a colisão da liberdade de manifestação de opinião com direitos fundamentais do afetado negativamente pela manifestação de opinião toma uma posição especial.84 83 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 139. 84 ALEXY, Robert. Colisão de direitos fundamentais e realização de direitos fundamentais no Estado de Direito Democrático. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, v. 17, p. 267-279, 1999, p. 269-271. 39 Conforme doutrina e jurisprudência majoritária, diante de uma colisão entre direitos fundamentais resguardados pela Constituição Federal de 1988, os direitos fundamentais colidentes não podem ser interpretados como absolutos. De fato, nenhum direito fundamental impera de forma absoluta no ordenamento jurídico brasileiro, podendo ser observado livremente em detrimento de outras garantias constitucionais de mesmo valor. Sobre o tema Sérgio D’Antino, Raquel Romano e Larissa Carasso asseguram: Neste sentido, é possível compreender que os órgãos de imprensa têm direito fundamental de informar (função social exercida na forma escrita, falada, televisionada ou on-line), o público sobre acontecimentos e atualidades, em contrapartida têm o dever de divulgar tais informações sem distorcer a realidade dos fatos, em busca do sensacionalismo, ou de modo a afrontar o momento de intimidade ou expor situações constrangedoras. [...] Nenhum direito é ilimitado. O que será averiguado e ponderado são os interesses envolvidos no intuito de decidir a prevalência de um ou de outro, dependendo do contexto e das circunstâncias.85 Nesse sentido, quando ocorre o choque entre direitos fundamentais diferentes, deve ser utilizada a máxima da proporcionalidade a fim de solucionar a colisão e mostrar qual direito fundamental deve recuar e qual direito fundamental deve prevalecer no caso concreto. Nesse sentido, Robert Alexy ensina: Se dois princípios colidem - o que ocorre, por exemplo, quando algo é proibido de acordo com um princípio e, de acordo com o outro, permitido -, um dos princípios terá que ceder. Isso não significa, contudo, nem que o princípio cedente deva ser declarado inválido, nem que nele deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Na verdade, o que ocorre é que um dos princípios tem precedência em face do outro sob determinadas condições. Sob outras condições a questão da precedência pode ser resolvida de forma oposta. Isso é o que se quer dizer quando se afirma que, nos casos concretos, os princípios têm pesos diferentes e que os princípios com o maior peso têm precedência.86 Destaca-se que o uso da máxima da proporcionalidade autoriza somente restrições ou limitações que sejam adequadas, necessárias e proporcionais, pois, se por um lado é inaceitável que um direito fundamental seja absoluto, por outro lado, é absurdo que haja uma restrição ilimitada de outro direito fundamental. Jairo Gilberto Schafer e Nairane Decarli definem a proporcionalidade da seguinte forma: O princípio da proporcionalidade permite que o magistrado; diante da colisão de direitos fundamentais, decida de modo que se maximize a proteção constitucional, impedindo o excesso na atividade restritiva aos direitos fundamentais. O objetivo não 85 D’ANTINO, Sérgio Famá; ROMANO, Raquel Alexandra; CARASSO, Larissa Andréa. Liberdade de expressão. Revista Jurídica Consulex, ano XVI, n. 371, jul. 2012, p. 35. 86 ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 93-94. 40 é anular um ou outro princípio constitucional, mas encontrar a solução que mantenha os respectivos núcleos essenciais.87 Segundo Robert Alexy88, as três máximas parciais intrínsecas à máxima da proporcionalidade são: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. A adequação impõe que as medidas sejam aptas a alcançar ou promover o objetivo almejado. Sem comparações com outras hipóteses. A necessidade determina que deve ser escolhido as medidas menos gravosas, mas que ainda sejam capazes de atingir o objetivo pretendido. Entre diversas hipóteses para atingir o objetivo pretendido, deve-se buscar aquela que produza menos restrições na obtenção do resultado. A proporcionalidade em sentido estrito estabelece um exame entre a intensidade da restrição do direito atingido e a importância da realização do direito fundamental colidente. Em outras palavras, indica qual direito deve ser protegido: o direito atingido com a medida ou o direito que a medida quis estimar. Desse modo, conforme a máxima da proporcionalidade, quando acontecer uma colisão entre os direitos fundamentais e não for possível compatibilizá-los, um direito deve ceder proporcionalmente frente ao outro direito, uma vez que não existe direito fundamental absoluto. Nos casos sob enfoque, a liberdade de expressão deve ceder frente à presunção de inocência e aos direitos da personalidade, pois não é razoável que a liberdade de expressão prevaleça sem limites em detrimento de outros direitos e garantias fundamentais do indivíduo. 87 SCHAFER, Jairo Gilberto; DECARLI, Nairane. A colisão dos direitos à honra, à intimidade, à vida privada e à imagem versus a liberdade de expressão. Prisma Jurídico, São Paulo, v.6, 2007, p. 131. 88 ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 116-117. 41 4 UM ESTUDO SOBRE O CASO ISABELLA NARDONI Finalizada a exposição acerca da influência da mídia nas decisões do Tribunal do Júri, mostra-se enriquecedor realizar um breve estudo de caso, a fim de observar na prática a influência que a mídia sensacionalista pode exercer sobre a decisão do Conselho de Sentença. Consoante explorado no capítulo anterior, a mídia sensacionalista elege um crime, especialmente um crime de competência do Tribunal do Júri, e o explora exaustivamente e repetitivamente, transmitindo as informações de forma exagerada, emotiva, dramática, espetaculosa, superficial, parcial e, muitas vezes, destorcida da verdade. Tudo com a finalidade de prender a atenção do público, gerando audiência e lucro. A atuação sensacionalista da mídia causa aos suspeitos, aos indiciados, aos acusados e aos demais envolvidos efeitos desastrosos e, comumente, fere direitos fundamentais previstos constitucionalmente como o direito à presunção de inocência e os direitos da personalidade (honra, imagem, intimidadee vida privada). Diante do exposto, no capítulo final, pretende-se analisar a influência da mídia no caso Isabella Nardoni, pois trata-se de um dos casos brasileiros mais emblemáticos, que teve intensa repercussão nacional nos meios de comunicação. Além disso, o caso provavelmente teve decisões judiciais influenciadas pela intensa cobertura midiática e pela opinião pública formada que clamava por justiça. Embora as estatísticas apontem para o fato de que a cada dia, no Brasil, duas crianças são mortas por familiares, a morte da menina Isabella Nardoni ganhou destaque especial na mídia nacional, que acompanhava passo a passo as investigações e mantinha a população brasileira constantemente atualizada.89 Em 29 de março de 2008, Isabella de Oliveira Nardoni, de 5 anos de idade, foi agredida, esganada e jogada inconsciente da janela do sexto andar, do Edifício London, situado na Rua Santa Leocádia, nº 138, no distrito da Vila Guilherme, na Zona Norte de São Paulo. A menina foi encontrada ainda viva e foi socorrida ao hospital, mas faleceu logo depois. Os pais de Isabella, Ana Carolina Cunha de Oliveira e Alexandre Alves Nardoni, eram separados, tendo o crime acontecido no apartamento do pai da menina, onde também moravam a madrasta Anna Carolina Trotta Peixoto Jatobá e os dois irmãos paternos dela. Há notícias de que o relacionamento entre o casal era caracterizado por discussões frequentes e 89 DAGNEZE, Cinara Sabadin. ARALDI JÚNIOR, João Irineu. Caso Isabella Nardoni: a indústria midiática e os limites do pré-julgamento (uma análise jurídico-linguística). Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, v. 24, n. 1, p. 118-131, 2010, p. 120. 42 acaloradas, em razão principalmente do forte ciúme nutrido pela madrasta em relação à mãe biológica da menina. O pai e a madrasta afirmaram às autoridades e as demais pessoas que acompanharam o incidente que a menina foi jogada pela janela por um invasor, que não foi visto por ninguém. Entretanto, logo, eles foram apontados pela polícia e pelo Ministério Público como os principais suspeitos de terem matado Isabella. Frisa-se que, apesar de serem apontados como suspeitos do crime, somente poderiam ser considerados e tratados como culpados após decisão judicial transitada em julgado, conforme previsto na Constituição Federal de 1988. Ocorre que, desde o momento em que foram considerados como os principais suspeitos, os veículos de comunicação em massa (emissoras de televisão e de rádio, jornais, revistas, internet, entre outros) passaram a dar ampla cobertura ao caso, bem como a considerar e tratar o casal como culpado pela morte da menina, fazendo um julgamento antecipado e ferindo o direito constitucional à presunção de inocência, que está diretamente ligado a outros princípios constitucionais, como do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e da imparcialidade do juiz, assim como os direitos constitucionais da personalidade. Nesse sentido, confirmam Cinara Sabadin Dagneze e João Irineu Araldi Júnior: No entanto, os órgãos midiáticos anteciparam o julgamento e expuseram o casal Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá a uma condenação antecipada, não pela Justiça – o que se efetivaria dois anos após o crime –, mas pela sociedade brasileira, que os condenou imediatamente, não lhes oportunizando nem mesmo o benefício da dúvida.90 A polícia e o Ministério Público “ofereceram” os suspeitos e a mídia “agarrou com unhas e dentes”, sem responsabilidade e sem preocupação com os direitos constitucionais assegurados aos mesmos, tendo em vista que a cobertura do caso ocorreu de forma desenfreada, invasiva, abusiva, sensacionalista e parcial, com a finalidade de obter lucro e não de bem informar a sociedade. Segundo Fábio Martins de Andrade: Em pesquisa simples na qual se digitou o nome “Nardoni” no sítio de pesquisa do Google, obteve-se em 06.12.2008 nada menos que 622.000 resultados, dentre os quais – registre-se – constam vídeos familiares, policiais, postagens em blogs, opiniões de especialistas, de leigos, e, principalmente, notícias. Tratando-se de um crime ocorrido 90 DAGNEZE, Cinara Sabadin. ARALDI JÚNIOR, João Irineu. Caso Isabella Nardoni: a indústria midiática e os limites do pré-julgamento (uma análise jurídico-linguística). Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, v. 24, n. 1, p. 118-131, 2010, p. 119. 43 em 29.03.2008, todos os resultados encontrados depois de oito meses são surpreendentes.91 Em artigo no qual faz uma análise do caso de Isabella Nardoni, Luiz Flávio Gomes assevera: Não existe "produto" midiático mais rentável que a dramatização da dor humana gerada por uma eliminação perversa e devidamente explorada, de forma a catalisar a aflição das pessoas e suas iras. Isso ganha uma rápida solidariedade popular, todos passando a fazer um discurso único: mais leis, mais prisões, mais castigos para os sádicos que destroem a vida de inocentes e indefesos. O "clima midiático", muitas vezes, interfere nos julgamentos. Apesar da existência de várias garantias (vinculadas com a independência interna e externa dos juízes), é certo (como afirmam os sociólogos) que nenhuma decisão judicial é totalmente "objetiva" e "independente".92 Com efeito, o caso foi exaustivamente e abusivamente explorado pela mídia, tendo uma cobertura impactante e cheia de momentos sensacionalistas que sensibilizaram e chocaram a população brasileira. Os veículos de comunicação em massa transmitiram rapidamente as notícias sobre o caso, acompanharam passo a passo o inquérito policial e o processo criminal, expuseram completamente a vida de todos os envolvidos, fizeram interpretações e emitiram opiniões parciais acerca de todos os acontecimentos, bem como criaram uma grande comoção e uma enorme pressão social em busca punir os culpados. Como exemplo de tal atuação da mídia, destaca-se a atuação da revista Veja, revista de grande circulação nacional, que explorou bastante o caso Isabella Nardoni, fazendo uso de evidentes estratégias sensacionalistas e emissão de opiniões parciais, como capas, títulos apelativos, ilustrações, fotos, depoimentos, entre outros. Tem-se que o caso Isabella Nardoni foi destacado como matéria principal na capa da revista mencionada por quatro vezes (Capa 1 - Edição nº 2055 - veiculada em 09 de abril de 2008, Capa 2 - Edição nº 2057 - veiculada em 23 de abril de 2008, Capa 3 - Edição nº 2088 - veiculada em 26 de novembro 2008 e Capa 4 - Edição nº 2158 - veiculada em 31 de março de 2010). Assim, torna-se interessante a análise de ilustrações das edições da revista Veja que destacaram o caso Isabella Nardoni e podem comprovar a forma de atuação da mídia na cobertura do crime sob enfoque. 91 ANDRADE, Fábio Martins de. A influência dos órgãos da mídia no processo penal: o caso Nardoni. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 98, n. 889, p. 480-505, nov. 2009. 92 GOMES, Luiz Flávio. Casal Nardoni: Inocente ou Culpado? Disponível em: <http://www.elciopinheirodecastro.com.br/documentos/artigos/02_05_2010.pdf>. Acesso em: 01.jun.2017. 44 A edição nº 2055, veiculada no dia 09 de abril de 2008, tem o caso Isabella Nardoni como capa e tem matéria com o título “ O anjo e o monstro ”. Imagem 1 – Capa da edição nº 2055 da revista Veja Fonte: VEJA, São Paulo: Abril, ano 41, n. 14, abr. 2008. Imagem 2 – Matéria da edição nº 2055 da revista Veja Fonte: VEJA, São Paulo: Abril, ano 41, n. 14, abr. 2008. 45 A edição nº 2056, veiculada no dia 16 de abril de 2008, apesar de não trazer o caso como capa, tem matéria de destaque com o título “Isabella continua a morrer”. Imagem 3 – Matéria da edição nº 2056 da revista Veja Fonte: VEJA, São Paulo:Abril, ano 41, n. 15, abr. 2008. A edição nº 2057, veiculada no dia 23 de abril de 2008, tem a capa com a frase: “Para polícia não há mais dúvidas sobre a morte de Isabella: FORAM ELES” e a matéria de recheio sobre o caso com o título: “Frios e dissimulados”. Imagem 4 - Capa da edição nº 2057 da revista Veja Fonte: VEJA, São Paulo: Abril, ano 41, n. 16, abr. 2008. 46 Imagem 5 – Matéria da edição nº 2057 da revista Veja Fonte: VEJA, São Paulo: Abril, ano 41, n. 16, abr. 2008. A edição nº 2088, veicula em 26 de novembro de 2008, tem a capa com o título: “200 dias na cadeia: A (boa) vida dos acusados do caso Isabella”. Imagem 6 – Capa da edição nº 2088 da revista Veja Fonte: VEJA, São Paulo: Abril, ano 41, n. 47, nov. 2008. 47 A edição nº 2157, veiculada no dia 24 de março de 2010, tem matéria de recheio sobre o caso com o título: “Cara a cara com os jurados”, nos dias anteriores ao julgamento. Imagem 7 – Matéria da edição nº 2157 da revista Veja Fonte: VEJA, São Paulo: Abril, ano 43, n. 12, mar. 2010. Por fim, a edição nº 2158, veiculada no dia 31 de março de 2010, após o julgamento, tem a capa com a foto de Isabella sorrindo e a frase: “CONDENADOS! Agora, Isabella pode descansar em paz”. Imagem 8 – Capa da edição nº 2158 da revista Veja Fonte: VEJA, São Paulo: Abril, ano 43, n. 13, mar. 2010. 48 Sobre as capas e matérias da Revista Veja acerca do caso, Cinara Sabadin Dagneze e João Irineu Araldi Júnior concluem: Dessa forma, quando enuncia “o mal”, “foram eles” ou “condenados!”, combinando tais sequências discursivas com uma série de elementos gráficos que reforçam a construção de um efeito de sentido negativo, de culpa, Veja constrói a naturalização dos sentidos, ditando um sentido (único) dominante e silenciando outros, homogeneizando sentidos na direção que interessa para a empresa jornalística. Em outras palavras, Veja condena antecipadamente Alexandre e Anna Carolina, imprimindo em suas páginas, durante todo o tempo, seu juízo de valor, mantendo-se muito afastada da imparcialidade esperada pelo jornalismo, bem como de seu (pretenso) caráter científico.93 De fato, constata-se uma atuação parcial e sensacionalista da mídia, bem como demonstra-se que houve um julgamento antecipado feito pela mídia, que condenou o casal Nardoni pela morte de Isabella Nardoni antes mesmo de um julgamento feito pela Justiça, sem observar os direitos fundamentais constitucionalmente garantidos a eles. Em meio a atuação midiática, após toda investigação policial, Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá foram denunciados pelo promotor de justiça Francisco Taddei Cembranelli, sendo, após toda instrução processual, pronunciados pelo juiz Maurício Fossen pela prática dos crimes de homicídio triplamente qualificado e de fraude processual. Em 22 de março de 2010, após quase dois anos da morte de Isabella, foi dado início ao julgamento do casal no 2º Tribunal do Júri do Fórum de Santana/São Paulo, presidido pelo juiz Maurício Fossen. O promotor de justiça Francisco Taddei Cembranelli conduziu a acuação, enquanto o advogado Roberto Podval conduziu a defesa. Em 27 de março de 2010, após cinco dias de trabalhos no 2º Tribunal do Júri do Fórum de Santana/São Paulo, os jurados que formaram o Conselho de Sentença decidiram que o casal é culpado dos crimes de homicídio triplamente qualificado de Isabella Nardoni e de fraude processual. Em razão disso, pelo juiz presidente, Alexandre Alves Nardoni foi condenado a pena de 31 (trinta e um) anos, 01 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão pela prática do crime de homicídio contra pessoa menor de 14 anos, triplamente qualificado, agravado ainda pelo fato do delito ter sido praticado por ele contra descendente, em regime fechado, bem como a pena de 08 (oito) meses de detenção, em regime semiaberto, e 24 (vinte e quatro) dias-multa, em seu valor unitário mínimo, pela prática do crime de fraude processual qualificada. 93 DAGNEZE, Cinara Sabadin. ARALDI JÚNIOR, João Irineu. Caso Isabella Nardoni: a indústria midiática e os limites do pré-julgamento (uma análise jurídico-linguística). Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, v. 24, n. 1, p. 118-131, 2010, p. 129-130. 49 Ana Carolina Trotta Peixoto Jatobá foi condenada a pena de 26 (vinte e seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão, pela prática do crime de homicídio contra pessoa menor de 14 anos, triplamente qualificado em regime fechado, bem como a pena de 08 (oito) meses de detenção, em regime semiaberto, e 24 (vinte e quatro) dias-multa, em seu valor unitário mínimo, pela prática do crime de fraude processual qualificada. Além disso, o juiz decidiu que o casal não poderia recorrer da sentença em liberdade. O advogado Roberto Podval recorreu imediatamente da sentença. Entretanto, após dez dias do julgamento, o juiz Maurício Fossen negou o pedido de recurso para um novo júri e a anulação da condenação, entendendo que a mudança no Código de Processo Penal Brasileiro que se refere à extinção do chamado “protesto por novo júri” deveria ser aplicada a todos os casos, inclusive aos anteriores. Obviamente, também houve ampla cobertura da mídia acerca do julgamento e da sentença condenatória. Milhares de pessoas se aglomeraram do lado de fora do Tribunal do Júri, clamando por justiça e demonstrando a forte pressão social criada pela atuação midiática. Do mesmo modo, milhares de repórteres da televisão, do rádio, do jornal e da revista disputavam um espaço e a atenção do público, bem como transmitiram cada detalhe do julgamento. Diante de todo o exposto, conclui-se que a mídia influenciou negativamente no julgamento do caso Isabella Nardoni. Conclui-se também pelo claro desrespeito aos direitos e às garantias constitucionais de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, pois eles – ainda que, de fato, sejam culpados – têm os direitos fundamentais à presunção de inocência, à preservação da imagem, da honra, da intimidade e da vida privada, os quais são previstos na Constituição Federal de 1988 e devem ser assegurados. Acerca da atuação da mídia no caso Isabella Nardoni, Cinara Sabadin Dagneze e João Irineu Araldi Júnior também concluem: No caso em tela, resta evidente que a mídia afrontou o princípio da liberdade de informação, uma vez que não se restringiu à finalidade básica de informar de forma correta e imparcial, impondo, dessa forma, uma condenação prévia ao casal Nardoni e Jatobá e ferindo outra previsão constitucional, a da presunção de inocência.94 Ademais, conclui-se que a imparcialidade dos jurados foi claramente colocada em risco, pois os jurados incumbidos do julgamento, antes mesmo de formarem o Conselho de Sentença, desde o momento em que foram divulgadas as primeiras notícias sobre o caso pelos 94 DAGNEZE, Cinara Sabadin. ARALDI JÚNIOR, João Irineu. Caso Isabella Nardoni: a indústria midiática e os limites do pré-julgamento (uma análise jurídico-linguística). Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, v. 24, n. 1, p. 118-131, 2010, p. 127. 50 meios de comunicação, sofreram forte influência da mídia que explorou intensamente o caso e criou uma forte pressão social em busca da condenação dos acusados. Apesar de ser difícil provar a influência da mídia sobre os jurados, pois os jurados não motivam suas decisões, mais difícil ainda é sustentar que os jurados julgaram o caso Isabella Nardoni que teve ampla repercussão midiática e grande comoção social com base exclusivamente nas provas obtidas no processo criminal. O julgamento antecipado feito pela mídia e a forte pressão social criada por ela produzem mais efeito sobre os jurados do que as provas trazidas pela acusação e pela defesa no processo criminal. 51 5 CONSIDERAÇÕES FINAISNo decorrer do presente trabalho, foi demonstrado que a atuação da mídia influencia, diretamente ou indiretamente, nas decisões proferidas pelo Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, principalmente nos casos de ampla repercussão e grande comoção social, conforme comprovado na análise do caso Isabella Nardoni. Tem-se que mídia está sendo dominada por grandes conglomerados empresariais que visam obter lucros a qualquer custo e, por isso, está ultrapassando a função informativa, na medida em que os meios de comunicação em massa atuam de forma sensacionalista e manipuladora, distorcem a verdade a seu favor, expõem abusivamente os envolvidos, emitem opiniões parciais e fazem julgamentos antecipados, especialmente nos casos de crimes de competência do Tribunal do Júri. Tal atuação da mídia interfere, diretamente ou indiretamente, nos julgamentos do Tribunal do Júri, pois os jurados que compõe o Conselho de Sentença não precisam fundamentar suas decisões, uma vez que julgam com base na sua íntima convicção e nos ditames da justiça. A ausência de fundamentação das decisões do Conselho de Sentença ocasiona uma temerosa insegurança jurídica nos julgamentos do Tribunal do Júri, pois resta impossível saber por que motivos os jurados votaram pela condenação ou pela absolvição do réu, uma vez que eles podem ter considerado influências externas ao processo para proferir a decisão. Apesar de terem sido garantidos aos jurados a incomunicabilidade e o sigilo das votações, que são institutos de extrema importância no Tribunal do Júri, bem como o instituto do desaforamento aos acusados, concluiu-se que eles resguardam apenas formalmente a imparcialidade do Conselho de Sentença, uma vez que não são suficientes para impedir a influência da mídia no convencimento dos jurados. Assim, constatou-se que a imparcialidade dos jurados é colocada em risco pela falta de fundamentação das decisões e pela atuação midiática, pois, antes de serem sorteados para compor a sessão do julgamento no Tribunal do Júri, os jurados formam suas opiniões com base na pressão social e no pré-julgamento feito e divulgado pela mídia. Essas opiniões dificilmente serão modificadas pelas teses de acusação e de defesa ou pelas provas constantes nos autos. Além de colocar em risco a imparcialidade do julgamento, demonstrou-se que a conduta da mídia nos casos de competência do Tribunal do Júri fere direitos fundamentais resguardados pela Constituição Federal de 1988 e pelos demais atos normativos 52 infraconstitucionais, como o direito à presunção de inocência e os direitos da personalidade (honra, imagem, intimidade e vida privada). Quando a mídia publica notícias sensacionalistas, imparciais e irresponsáveis sobre os casos criminais, especialmente sobre os casos de crimes de competência do Tribunal do Júri, expondo o acusado e o condenando antecipadamente, ocorre uma colisão de direitos fundamentais, pois a mídia invoca o direito à liberdade de expressão em sua proteção, enquanto o acusado encontra-se amparado pelo direito à presunção de inocência e pelos direitos da personalidade (intimidade, vida privada, honra e imagem), devendo ser aplicada a máxima da proporcionalidade. Conforme a máxima da proporcionalidade, quando acontecer uma colisão entre os direitos fundamentais mencionados e não for possível compatibilizá-los, um direito deve ceder proporcionalmente frente ao outro direito, uma vez que não existe direito fundamental absoluto e não é razoável que um direito prevaleça ilimitadamente em detrimento de outros direitos e garantias fundamentais do indivíduo. Desse modo, com base nas pesquisas bibliográficas e no estudo do caso Isabella Nardoni, propõe-se duas alternativas para tentar evitar os efeitos negativos da atuação midiática nos casos de crimes de competência do Tribunal do Júri. Defende-se que as decisões do Conselho de Sentença do Tribunal do Júri sejam motivadas. Contudo, tal motivação deve diferir da fundamentação de um juiz togado, não precisando ser relacionada aos posicionamentos jurisprudenciais, às diversas correntes doutrinárias ou à legislação penal, processual penal ou constitucional. A primeira alternativa proposta é de que os jurados devem esclarecer as justificativas acerca das suas conclusões sobre a autoria e sobre a materialidade do crime, ou seja, os motivos de proferirem seus votos pela condenação ou pela absolvição do acusado, para que não pairem dúvidas de que os jurados consideraram apenas as provas internas ao processo e desconsideraram as interferências externas ao processo, como a atuação mídia e a pressão popular. Cabe destacar que a alternativa proposta acima não violaria os princípios norteadores do Tribunal do Júri, nem mesmo o princípio do sigilo das votações, pois é plenamente possível os jurados motivarem suas decisões e preservarem suas identidades, ocultando as mesmas no momento da votação. Ademais, combate-se a censura, que é um instrumento abominável, mas defende- se que a atuação da mídia em matérias criminais, especialmente em crimes de competência do Tribunal do Júri, deve ter responsabilidades e limites, para evitar que o direito à liberdade de 53 expressão da mídia viole os direitos fundamentais do acusado como o direito à presunção de inocência e os direitos da personalidade. A atuação dos meios de comunicação em massa deve ser limitada a função de noticiar os fatos e informar à sociedade brasileira, sem exposição demasiada dos envolvidos, sem realização de julgamentos antecipados e sem manifestação de opiniões parciais. A segunda alternativa proposta é de que a mídia deve atuar livre de censuras, mas também livre de sensacionalismos, manipulações, distorções da verdade, exposições abusivas, opiniões parciais e acusações irresponsáveis. Em outras palavras, uma atuação limitada em casos criminais e compromissada com a verdade, a responsabilidade e a ética, a fim de respeitar os direitos fundamentais dos envolvidos nos processos criminais, como o direito à presunção de inocência e os direitos da personalidade, evitando a colisão do direito fundamental da liberdade de expressão com outros direitos fundamentais. Por todo o exposto, conclui-se que as alternativas propostas devem ser aprofundadas e efetivamente concretizadas, bem como outras alternativas devem ser pensadas e estudadas pelos operadores do Direito, a fim de solucionar o problema da influência negativa da mídia nos julgamentos do Tribunal do Júri, garantindo a imparcialidade das decisões do Conselho de Sentença e os direitos fundamentais do acusado, como o direito à presunção de inocência e os direitos da personalidade. 54 REFERÊNCIAS ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. 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