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Indaial – 2021 do Período realista à literatura ContemPorânea Prof.ª Mara Gonzalez Bezerra 2a Edição literatura Brasileira: Elaboração: Prof.ª Mara Gonzalez Bezerra Copyright © UNIASSELVI 2021 Revisão, Diagramação e Produção: Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI Impresso por: B574l Bezerra, Mara Gonzalez Literatura brasileira: do período realista à literatura contempo- rânea. / Mara Gonzalez Bezerra – Indaial: UNIASSELVI, 2021. 278 p.; il. ISBN 978-65-5663-670-2 ISBN Digital 978-65-5663-666-5 1. Literatura brasileira. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 869 Caro acadêmico! Apresentamos um panorama da literatura brasileira do período relativo ao Realismo à Literatura Contemporânea. Por isso, não pretendemos esgotar os temas apresentados, mas fornecer subsídios para que você possa desenvolver pesquisas a respeito da nossa literatura. Ainda, incluímos nas unidades conceitos de teoria e crítica literária e, ao mesmo tempo em que estuda a nossa literatura, convidamos você a pensar como inserir os temas literários nas aulas de língua portuguesa na educação básica. O livro está dividido em três unidades e em cada uma delas você encontrará uma introdução seguida de tópicos contendo dicas, fragmentos de obras, textos significativos, resumo do tópico, atividades, leituras complementares e, no final da obra, você encontrará um registro de referências importantes. A Unidade 1 apresenta o panorama cultural e literário do final do século XIX e início do século XX, bem como a discussão sobre teoria e prática sobre o ensino de literatura na sala de aula de forma que possa auxiliar em sua prática docente. Também iniciamos o percurso dos movimentos literários do período oitocentista, quando iremos estudar obras, autores e a crítica dos estilos chamados de Realismo, Naturalismo, Parnasianismo e Simbolismo. A Unidade 2 destaca o período depois do Simbolismo, quando as vanguardas europeias tiveram um papel importante no impulso de novas formas de escrever e pensar artes e literatura. Também destacamos as primeiras décadas do século XX, com autores anteriores ao movimento modernista, e a trajetória nos leva até a Semana de Arte moderna, em 1922, quando o Modernismo foi consolidado. A Unidade 3 discorre sobre a literatura brasileira contemporânea, que se desenvolve depois do Modernismo entre os séculos XX e XXI, e as novas perspectivas interculturais literárias. Além disso, também contempla a pluralidade de escritores de literaturas indígenas, africanas e o movimento de escritores em busca de uma literatura brasileira e a independência cultural dos padrões europeus e a literatura contemporânea. Destacamos, por fim, que a cada unidade, o livro discute de forma mais pontual o ensino literário, sob a luz da BNCC, e apresenta propostas de práticas com exemplos de atividades para as aulas de língua portuguesa. Esperamos contribuir com o seu conhecimento intelectual sobre a importância da literatura dos períodos estudados. Bons estudos! Profª. Mara Gonzalez Bezerra APRESENTAÇÃO Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você – e dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, nós disponibilizamos uma diversidade de QR Codes completamente gratuitos e que nunca expiram. O QR Code é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar essa facilidade para aprimorar os seus estudos. GIO QR CODE Olá, eu sou a Gio! No livro didático, você encontrará blocos com informações adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento acadêmico como um todo. Eu ajudarei você a entender melhor o que são essas informações adicionais e por que você poderá se beneficiar ao fazer a leitura dessas informações durante o estudo do livro. Ela trará informações adicionais e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto estudado em questão. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material-base da disciplina. A partir de 2021, além de nossos livros estarem com um novo visual – com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura –, prepare-se para uma jornada também digital, em que você pode acompanhar os recursos adicionais disponibilizados através dos QR Codes ao longo deste livro. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com uma nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página – o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Preocupados com o impacto de ações sobre o meio ambiente, apresentamos também este livro no formato digital. Portanto, acadêmico, agora você tem a possibilidade de estudar com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Preparamos também um novo layout. Diante disso, você verá frequentemente o novo visual adquirido. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar os seus estudos com um material atualizado e de qualidade. ENADE LEMBRETE Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conheci- mento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementa- res, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira, acessando o QR Code a seguir. Boa leitura! SUMÁRIO UNIDADE 1 - A LITERATURA BRASILEIRA OITOCENTISTA ................................................. 1 TÓPICO 1 - O FINAL DO SÉCULO XIX – ITINERÁRIOS ..........................................................3 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................3 2 O PANORAMA EUROPEU OITOCENTISTA ..........................................................................3 3 O REALISMO EUROPEU ......................................................................................................5 4 COMO COMENTAR OU ANALISAR UM TEXTO DE LITERATURA .....................................14 4.1 A BNCC E O ENSINO DE LITERATURA ............................................................................................ 19 RESUMO DO TÓPICO 1 ........................................................................................................ 24 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................. 25 TÓPICO 2 - O REALISMO NO BRASIL ................................................................................. 29 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 29 2 A LITERATURA BRASILEIRA NO FINAL DO SÉCULO XIX ...............................................29 3 MACHADO DE ASSIS – O ESCRITOR DO COSME VELHO................................................ 33 4 RAUL POMPEIA E A POLÊMICA DO ESTILO .................................................................... 45 RESUMO DO TÓPICO 2 ........................................................................................................ 49 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................. 50 TÓPICO 3 - NATURALISMO – PARNASIANISMO – SIMBOLISMO ...................................... 55 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 55 2 O NATURALISMO, OUTRA FACETA DO REALISMO ......................................................... 55 2.1 ALUÍSIO AZEVEDO E O NATURALISMO BRASILEIRO .................................................................. 57 2.2 JÚLIO RIBEIRO, A CARNE EXPOSTA ...............................................................................................61 2.3 INGLÊS DE SOUZA, O HOMEM AMAZÔNICO ................................................................................62 2.4 ADOLFO CAMINHA, E A POLÊMICA DO O BOM CRIOULO ....................................................................64 3 O PARNASO BRASILEIRO ............................................................................................... 66 3.1 OLAVO BILAC, O PRÍNCIPE DOS POETAS PARNASIANOS .........................................................69 3.2 FRANCISCA JÚLIA NO PARNASO BRASILEIRO .......................................................................... 73 3.3 RAIMUNDO CORREIA, O POETA DAS POMBAS ............................................................................ 75 4 O SIMBOLISMO BRASILEIRO ...........................................................................................78 4.1 O SIMBOLISMO DE CRUZ E SOUSA ............................................................................................... 80 LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................................................ 85 RESUMO DO TÓPICO 3 ........................................................................................................ 86 AUTOATIVIDADE ..................................................................................................................87 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 91 UNIDADE 2 — DAS VANGUARDAS AO MODERNISMO BRASILEIRO ..................................95 TÓPICO 1 — AS VANGUARDAS E A LITERATURA BRASILEIRA ..........................................97 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................97 2 AS VANGUARDAS EUROPEIAS ........................................................................................97 3 O VANGUARDISMO NO BRASIL ......................................................................................107 RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................... 114 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................ 115 TÓPICO 2 - O PRÉ-MODERNISMO BRASILEIRO ............................................................... 119 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 119 2 UM INTERSTÍCIO LITERÁRIO – ENTRE 1900 E 1922 .................................................... 119 3 A LITERATURA BRASILEIRA EM TRÂNSITO .................................................................. 121 3.1 AUGUSTO DOS ANJOS – ESCRITOR E PROFESSOR .................................................................121 3.2 CARMEN DOLORES – ESCRITORA DA BELLE ÈPOQUE ........................................................... 123 3.3 JOÃO DO RIO – A VOZ DA RELIGIÃO AFRO ................................................................................ 125 3.4 LIMA BARRETO – JORNALISTA E ESCRITOR ............................................................................ 127 3.5 EUCLIDES DA CUNHA – A VOZ DO SERTÃO ............................................................................. 133 3.6 MONTEIRO LOBATO – A VEZ DA LITERATURA INFANTOJUVENIL ........................................ 136 RESUMO DO TÓPICO 2 ...................................................................................................... 140 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................ 141 TÓPICO 3 - O MODERNISMO – A SEMANA DE ARTE MODERNA ......................................145 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................145 2 O MODERNISMO – ARTES E LITERATURAS DE ROUPA NOVA .....................................145 3 OS RUMOS DA LITERATURA BRASILEIRA .....................................................................149 4 REFLEXÃO SOBRE O USO DE TDICS E O ENSINO DE LITERATURA .............................159 LEITURA COMPLEMENTAR ...............................................................................................162 RESUMO DO TÓPICO 3 .......................................................................................................163 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................164 REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 167 UNIDADE 3 — A LITERATURA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA (SÉCULOS XX E XXI) ........171 TÓPICO 1 — OS CAMINHOS LITERÁRIOS DEPOIS DE 1922.............................................. 173 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 173 2 DEPOIS DA SEMANA DE ARTE MODERNA – O MODERNISMO ..................................... 173 2.1 O MODERNISMO E SEU PERCURSO LITERÁRIO ......................................................................... 174 2.2 LETRAS DO MODERNISMO ............................................................................................................. 179 3 NARRATIVAS DO INTERIOR BRASILEIRO ......................................................................184 3.1 HISTÓRIAS REGIONAIS LITERÁRIAS ............................................................................................185 3.2 A VOZ DO INTERIOR BRASILEIRO .................................................................................................189 RESUMO DO TÓPICO 1 ...................................................................................................... 206 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................... 207 TÓPICO 2 - EXPRESSÕES DA LITERATURA BRASILEIRA ......................................................213 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................213 2 A POESIA CONCRETISTA – LETRAS E IMAGENS ...........................................................213 2.1 O QUE FOI A POESIA CONCRETA? ................................................................................................. 213 2.2 POESIA MARGINAL DE 1970 .......................................................................................................... 223 3 A LITERATURA ESCRITA POR MULHERES ................................................................... 224 3.1 ESCRITORAS BRASILEIRAS CANÔNICAS .................................................................................. 225 RESUMO DO TÓPICO 2 ......................................................................................................239 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................... 240 TÓPICO 3 - NARRATIVAS BRASILEIRAS DO SÉCULO XX E XXI ..................................... 245 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 245 2 A PLURALIDADE DA LITERATURA BRASILEIRA .......................................................... 245 3 LITERATURAS INDÍGENAS E AFRO-BRASILEIRAS ..................................................... 252 3.1 LITERATURA AFRO-BRASILEIRA .................................................................................................. 256 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................. 260 RESUMO DO TÓPICO 3 ...................................................................................................... 262 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................... 263 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................267 1 UNIDADE 1 - A LITERATURA BRASILEIRA OITOCENTISTA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • identificar obras e autores do Realismo e Naturalismo francês; • compreender o contexto cultural oitocentista europeu e brasileiro; • entender o processo de formação da literatura realista no Brasil; • examinar as obras literárias do período final do Século XIX; • diferenciar as características literárias do Realismo e Naturalismo; • reconhecer as características literárias do Parnasianismo; • analisar as características literárias do Simbolismo; • conhecer as obras e autores do Realismo ao Simbolismo brasileiro; • verificar aspectos da teoria, crítica literária e análise literária referentes ao período estudado. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – O FINAL DO SÉCULO XIX – ITINERÁRIOS TÓPICO 2 – O REALISMO NO BRASIL TÓPICO 3 – NATURALISMO – PARNASIANISMO – SIMBOLISMO Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 2 CONFIRA A TRILHA DA UNIDADE 1! Acesse o QR Code abaixo: 3 O FINAL DO SÉCULO XIX – ITINERÁRIOS 1 INTRODUÇÃO Neste tópico, você irá conhecer como o Romantismo entrou em declínio e como o Realismo foi consolidado na Europa. Escritores brasileiros do porte de Machado de Assis e Aluísio de Azevedo escreveram obras-primas da estética realista e naturalista. O Realismo e o Naturalismo foram movimentos que fizeram escola no Brasil ao longo de duas décadas e renderam algumas das obras da nossa literatura que retratam da forma mais real possível, com descrições minuciosas acerca da sociedade local. O panorama literário do final do período oitocentista é apresentado a partir de uma análise teórica, crítica de obras e autores selecionados para representar o período estudado, mas que não se esgota no tópico e irá exigir diversas leituras e pesquisas para ampliar o conhecimento. Este tópico procura discutir os aspectos práticos do ensino de literatura, em um mundo que se transforma e muda a cada dia. Abrimos a discussão para que, ao ler a obra, você tenha em mente como trabalhar cada um dos temas de literatura brasileira na sala de aula, com propostas de ensino e literatura. 2 O PANORAMA EUROPEU OITOCENTISTA Sobre o panorama europeu no final do século XIX, é importante lembrar que a burguesia era uma classe social consolidada, presente em todos os momentos sociais e históricos dos séculos que antecederam o Realismo. Posteriormente, assume um protagonismo na indústria, comércio, financeiro, artes, assim a burguesia é rica e tem grande poder político. O Capitalismo, como sistema financeiro, iria aprofundar ainda mais as diferenças sociais, o que acabou também por influenciar nas artes. A literatura acaba por refletir a burguesia sob diversos prismas e atinge um amadurecimento. Carpeaux (2008) discute o fato de que em todas as épocas a burguesia estava presente: em todas essas “épocas de transição” agiu, histórica e literariamente, a burguesia; mas sempre imitando o estilo de outras, mais altas, classes da sociedade TÓPICO 1 - UNIDADE 1 4 Recomendamos a ampliação das reflexões sobre as teorias cientificistas do século XIX, especialmente a concepção do Socialismo científico, de Karl Marx, a Teoria da evolução das espécies de Charles Darwin, o Determinismo, de Hippolyte Taine, e o Positivismo, defendido por Auguste Comte. As leituras são importantes para entender como o contexto cientificista favoreceu a produção de uma literatura/arte pautada pela objetividade. Leitura 1 – Os impasses e a crise da ciência moderna. Capítulo II – Os impasses e a crise da ciência moderna. GERMANO, M. G. In: Uma nova ciência para um novo senso comum [on-line]. Campina Grande: EDUEPB, 2011. Disponível em: https://bit.ly/3iaFThC. Leitura 2 – O positivismo brasileiro na sombra do darwinismo. GLICK, T. O positivismo brasileiro na sombra do darwinismo: o grupo ideia nova em desterro. In: DOMINGUES, H. M. B.; SÁ, M. R.; GLICK, T. A recepção do Darwinismo no Brasil [on-line]. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2003, p. 181-189. História e saúde collection. Disponível em: https://bit.ly/3zM2k2D. Leitura 3 – A Recepção do Darwinismo no Brasil. DOMINGUES, H. M. B.; SÁ, M. R.; GLICK, T. A recepção do Darwinismo no Brasil [on-line]. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2003, 189 p. História e saúde collection. I. Disponível em: https://bit.ly/3zM2k2D. Acesso em: 25 abr. 2021. DICAS (CARPEAUX, 2008, p. 1717). Portanto, o Realismo procura a busca científica, a observação da natureza humana, teorias de evolução, cientificismo, entre outras questões, mas com a publicação do romance Madame Bovary, a escola ganha o reconhecimento de estilo literário, embora o estilo já fosse latente por séculos. O panorama europeu do século XIX remete aos acontecimentos mundiais e que afetaram a sociedade como um todo, modificando nações inteiras. Para entender melhor o panorama literário, veja algumas delas: • As revoluções industriais, a primeira de 1760 a 1840. • A segunda que se estendeu de 1850 a 1945. • A queda de monarquias, como a de Luis XVI. • A queda do regime antigo. • O pensamento humanista. • O positivismo de Comte. • A valorização da ciência. • A busca de novas descobertas. • A evolução darwinista. • A publicação do Manifesto Comunista de Marx. Esses acontecimentos acabaram por influenciar e favorecer uma série de transformações sociais e culturais significativas. Marcaram definitivamente a ascensão da burguesia que tinha o grande poder econômico e político. 5 Foram tantas mudanças no período do século XIX, principalmente as sociais, entre outras, que seria necessário outro livro para falar apenas delas. Assim, orientamos a consultar a historiografia da época. Toda essa transformação também se refletiu nas artes e em especial nas letras. A seguir, será apresentado como o Realismo também fez escola no Brasil, cresceu como movimento e rendeu algumas das melhores obras e escritores da literatura brasileira. 3 O REALISMO EUROPEU O Realismo foi uma escola literária nascida na Europa, na França, na metade do Século XIX e se consolidou por ser uma contraposição ao Romantismo. Buscou desde os primeiros escritos a rejeição aos elementos românticos, tais como a dor existencial, o saudosismo e os excessos sentimentais entre outras características do estilo. Foi uma inovação literária na época. Depois dos estilos como Barroco, Arcadismo, Romantismo, o Realismo, tinha comoprincipal característica contar uma história a partir de elementos cotidianos reais e não idealizados. Veremos com pormenores mais adiante no tópico. Contudo, o surgimento do Realismo não significou o fim do Romantismo, como explica Carpeaux (2008), porque o Romantismo ainda representa a parte emocional de expressão literária e uma qualidade humana permanente. Assim, no apagar das luzes da década de 1870, com o Romantismo em declínio, mas não extinto, novas escolas renovaram a literatura primeiro na Europa e posteriormente também no Brasil. O autor que fez a transição entre Romantismo e o Realismo, de acordo com Carpeaux, foi o escritor francês Honoré de Balzac. Sobre ele, citamos: “é a figura mais importante da transição entre o romantismo e o Realismo-Naturalismo: representa o advento da burguesia” (CARPEAUX, 2008, p. 1716). Foi descrito como um escritor moderado com relação ao Realismo e que através de suas obras consagra a burguesia na literatura. Os escritores Flaubert e Zola são os representantes das épocas vivenciadas pela literatura e que serão estudadas: o Realismo, no tópico dois e o Naturalismo, Parnasianismo e o Simbolismo, no Tópico 3, mas primeiro iremos nos deter no panorama europeu, especialmente na França, onde nasceram as escolas literárias citadas e se desenvolveram, com a publicação de textos literários como romances, contos e poesia. Os gêneros narrativos romance e conto serão os gêneros usuais do Realismo. Sobre o conto, uma das teses desenvolvidas por Piglia sobre o conto, e como ele encerra sempre uma segunda história, é importante para lembrar na hora de análise e compreensão do texto literário: 6 O conto conta uma encruzilhada, uma passagem, é um experimento com o marco e com a noção de limite. Há um mecanismo mínimo que se esconde na textura da história e é sua margem e centro invisível. Trata-se de um procedimento de articulação, um levíssimo engaste que dá fecho à dupla realidade. A verdade de uma história depende sempre de um argumento simétrico que se conta em segredo. Concluir um relato é descobrir o ponto de interseção que permite entrar na outra trama (PIGLIA, 2004, p. 111). O movimento realista na Europa também se destacou na dramaturgia realista e citamos autores europeus como Alexandre Dumas, (1824-1895), com a “A Dama das Camélias”; a Henrik Ibsen (1828-1906), obra “Casa de Bonecas” e a Gorki (1868-1936), com a “Ralé e Os Pequenos Burgueses”. Obras que a objetividade do Realismo por meio do teatro colocou em cena uma linguagem popular para apresentar temas que focavam na miséria humana, na vida cotidiana, trazendo elementos de realidade. No Brasil, boa parte das peças encenadas será de autores europeus, contudo podemos citar Machado de Assis que irá ter uma produção teatral, mas não tão expressiva quanto à prosa narrativa de romances e contos, conteúdo que estudaremos sobre o autor no Tópico 2. O Realismo com suas características de estilo se encontra em outras épocas, por isso costuma se pensar na intertextualidade de algumas obras anteriores. De acordo com Carpeaux (2008), a escrita realista remete à Picaresca espanhola do século XVI, em especial o Lazarillo de Tormes e se caracteriza como uma narrativa que reflete e representa a sociedade da época. Carpeaux (2008) também menciona que na obra Odisseia há elementos de uma literatura realista, como o cenário familiar, o cotidiano de Penelope, tecendo os pretendentes que buscam o matrimônio com a suposta viúva de Ulisses e as festas regadas a comida e vinho na casa de Penelope e Ulisses. Ao longo das unidades, você irá ver como a intertextualidade é um elemento constante nas obras a ser estudadas. Eagleton já escreveu que: Todos os textos literários são tecidos a partir de outros textos literários, não no sentido convencional de que trazem traços ou "influências'', mas no sentido mais radical de que cada palavra, frase ou segmento é um trabalho feito sobre outros escritos que antecederam ou cercaram a obra individual. Não existe nada como "originalidade" literária, nada como a "primeira” obra literária: toda literatura é "intertextual" (EAGLETON, 2006, p. 207). A posição comum de estudiosos literários sobre o marco zero do Realismo foi a publicação do romance Madame Bovary, por Gustave Flaubert, na França, em 1857. Carpeaux descreve a obra como: Madame Bovary é a “maravilha do mundo” entre todos os romances. É o primeiro romance rigorosamente construído como um poema. A releitura e a re-releitura sempre fazem descobrir concatenações inesperadas. Quanto à arte da estrutura, Madame Bovary situa-se entre a Divina Commedia de Dante e o Ulysses de Joyce. É o precursor do romance poemático moderno (CARPEAUX, 2008, p. 1786). 7 A narrativa seria algo incomum para a época e se tornou o epicentro de debates acalorados. Bovary acabou sendo clamada por uns e condenada por outros. Já pensou quanta discussão acalorada nos salões sociais deve ter gerado o romance nos meios sociais da Paris de 1857? Otto Maria Carpeaux foi crítico e pesquisador literário que procurou aproximar texto e leitor desde uma perspectiva crítica e teórica dos estudos sobre a história literária ocidental e em especial da literatura brasileira. Você tem acesso aos quatro volumes escritos por Otto Maria Carpeaux sobre a história da literatura Ocidental e no Brasil na biblioteca digital do Senado. Disponível em: <https://www2.senado.leg. br/bdsf/handle/id/528992>. Acesso em: 20 fev. 2021. NOTA O crítico literário Jauss relata como a crítica da época acusou a obra de corromper os “bons costumes”, a moral e a ética do leitor: “[...] Madame Bovary como produtos da nova escola do réalisme, à qual acusam de negar tudo quanto é ideal e de atacar as ideias sobre as quais se assenta a ordem social no Segundo império” (JAUSS, 1994, p. 34). Com certeza, os temas abordados na obra são discutidos sem pudores, o que na época foi considerado uma transgressão nos dias de hoje é visto largamente em telenovelas, filmes e as diversas leituras. Na época, porém, causou um enorme desconforto para a sociedade e chocou os leitores a ponto de Flaubert ser preso, acusado de corrupção moral por conta da publicação. FIGURA 1 – GUSTAVE FLAUBERT FONTE: <https://bit.ly/2OrCXS9>. Acesso em: 23 jun. 2021. 8 O estilo realista mostrou a sociedade pela literatura, o estilo sem nenhum idealismo romântico ou religioso, mostrou o que os escritores consideravam como a hipocrisia social, ocultar a vida privada, enquanto se vivia negando os conflitos cotidianos envolvidos em relacionamentos, em famílias, cidades, sociedade etc. Os costumes da época mostravam uma sociedade sem virtudes e sem moral no privado, prezando pelas aparências. Bosi afirma (2017, p. 187) que: O Realismo ficcional aprofunda a narração de costumes contemporâneos da primeira metade do século XIX (Stendhal, Balzac, Dickens, Hugo) e de todo o século XVIII (Lesage, Diderot, Defoe, Fielding, Jane Austen...). Nas obras desses grandes criadores do romance moderno já se exibiam poderosos dons de observação e de análise, razão pela qual não se deve cavar um fosso entre elas e as de Flaubert, Maupassant, Verga, Thackeray e Machado. Entretanto, é sempre válido dizer que as vicissitudes que pontuaram a ascensão da burguesia durante o século XIX foram rasgando os véus idealizantes que ainda envolviam a ficção romântica. A obra de Flaubert foi transgressora porque fez oposição aos valores religiosos, governamentais e militares, e em meio a tantas controvérsias, se firmou como escola literária. Note que o Realismo atravessou fronteiras e mares. Fez escola em Portugal, Espanha e posteriormente migrou para as Américas. FIGURA 2 – CAPA DA EDIÇÃO BRASILEIRA FONTE: <https://bit.ly/3i68KUw>. Acesso em: 8 jul. 2021. O romancede Flaubert é considerado realista porque destaca o perfil psicológico da personagem, a Madame Bovary, e nisso reside uma das diferenças entre os dois estilos, Realismo e Naturalismo, o primeiro inclui um perfil psicológico enquanto o segundo faz um esboço do perfil social do personagem na obra. 9 Antes de falar da obra de Flaubert, ressaltamos, de grosso modo, algo a ser lembrado sempre: a literatura é ficção! Portanto, não se faz uma leitura pensando sobre quem a gente conhece que está servindo de modelo para aquela história. Lembre-se de que a narrativa de ficção geralmente adverte o leitor com o aviso de que a obra não representa ninguém ou fatos, e “qualquer semelhança com a vida real é apenas coincidência”. Em Madame Bovary, não há propriamente um idealismo de virtudes ou causas heroicas. É visível o peso da rotina cotidiana, e no que implica ser uma mulher fadada a desempenhar um papel submisso para o marido, obrigada por convenções sociais. Os elementos que constituem a obra são realistas, tais como os personagens, a trama, o espaço e a tensão ou conflito na trama. A presença do conflito corrobora a explicação de Gancho a respeito: “Conflito é qualquer componente da história (personagens, fatos, ambiente, ideias, emoções) que se opõe a outro, criando uma tensão que organiza os fatos da história e prende a atenção do leitor” (GANCHO, 2002, p. 11). Por causa do conflito a obra se torna o mais verossímil possível para o leitor. Observe no fragmento o vislumbre do tédio entranhado no relacionamento conjugal de Emma e Charles. Mas era principalmente às horas das refeições que já não podia mais, naquela pequena sala do rés-do-chão, com o fogão a deitar fumo, a porta a ranger, as paredes a ressumar, as lajes húmidas; parecia-lhe que no seu prato era servida toda a amargura da sua existência e, com o fumegar do cozido, subiam-lhe do fundo da alma outros vapores de tédio. Charles era demorado a comer; ela mordiscava algumas avelãs, ou então, apoiada no cotovelo, entretinha-se, com a ponta da faca, a fazer riscos no oleado da mesa. Agora deixava andar tudo em casa de qualquer maneira, de modo que a velha Bovary, quando veio passar parte da quaresma a Tostes, ficou muito surpreendida com a mudança. Efetivamente, Emma, antes tão cuidadosa e delicada, passava agora os dias inteiros sem se vestir, usava meias cinzentas de algodão e alumiava-se à luz de candeias (FLAUBERT, 2000, p. 63). Madame Bovary conta a história de uma mulher casada, mãe e leitora. A relação conjugal era um fardo e a obra não poupa os pensamentos de uma sociedade nem sempre verdadeira na exposição de seus sentimentos e atitudes. A seguir, você encontra um estudo sobre a obra e sua importância nos estudos literários assim como realiza uma análise da psicologia de Bovary. FONTE: NOBRE, T. L. Madame Bovary e histeria: algumas considerações psicanalí- ticas. Contextos Clínic, São Leopoldo, v. 6, n. 1, p. 62-72, jun. 2013. Disponível em: <https://bit.ly/3kHZqHD>. Acesso em: 11 fev. 2021. DICA 10 O Realismo devido ao momento histórico, filosófico e social em que se desenvolveu terá como característica importante a preocupação com o presente, por isso não se interessa por um passado histórico, mas sim pelo momento em que se vive e como se reflete na sociedade como um todo. A obra de Flaubert reflete em diversos momentos o cotidiano do casal Charles e Emma em cenas descritivas para o leitor. FIGURA 3 – CENA DE JANTAR DO FILME MADAME BOVARY (2014) FONTE: <https://bit.ly/3bzgACr>. Acesso em: 20 abr. 2021. A inovação da obra de Flaubert, considerada como a precursora do Realismo, foi a de romper com o Romantismo ao trazer para a literatura uma história que conta cenas do cotidiano sem nenhuma indicação de sublimação e plausível de acontecer em qualquer lugar. A obra de Flaubert, pela sua importância, tem sido revisitada em diversos gêneros. Para saber mais, assista ao filme Madame Bovary, de 2014, dirigido por Sophie Barthes e roteiro baseado no livro homônimo. Disponível em: https://bit.ly/3bzgACr. Acesso em: 20 abril 2021. NOTA 11 Junto ao Realismo surgiu o Naturalismo na Europa. A obra Germinal (1885), publicada na França por Émile Zola (1840 – 1902), foi considerado um marco do movimento literário. Zola, com a publicação de Thérese Ráquin, foi considerado o fundador do romance naturalista em 1867 e sofreu uma crítica negativa da mesma forma, como Flaubert já tinha sido injuriado por conta de Madame Bovary. FIGURA 4 – ÉMILE ZOLA FONTE: <https://bit.ly/3tOt7bD>. Acesso em: 23 jun. 2021. FONTE: <https://bit.ly/3bzgACr>. Acesso em: 20 abr. 2021. O Naturalismo europeu também se relaciona estreitamente com o Realismo, e busca a representação da realidade através de detalhes específicos nas descrições. O estilo difundia através da literatura ideias próprias do século XIX, tais como as do Positivismo. CARTAZ DO FILME MADAME BOVARY (2014) 12 Que tal assistir a este filme Germinal, de 1993, dirigido por Claude Berri como forma de ampliar o conhecimento do período literário e das obras discutidas ao longo da unidade? A história é uma narrativa das relações trabalhistas no século XIX, o proletariado e a burguesia e como se davam. Mais uma releitura do texto literário de Zola. CARTAZ DO FILME FONTE: <https://bit.ly/3hvGb2Y>. Acesso em: 17 maio 2021. O Realismo em Portugal também teve um expressivo movimento que surgiu a partir da Questão de Coimbra: uma controvérsia no meio literário português por conta das discussões a respeito da nova escola literária, o Realismo. Bosi, reconhecido crítico de literatura brasileira, aponta: Há um esforço, por parte do escritor antirromântico de acercar- se impessoalmente dos objetos, das pessoas. E uma sede de objetividade que responde aos métodos científicos cada vez mais exatos nas últimas décadas do século. Os mestres dessa objetividade seriam, ainda uma vez, os franceses: Flaubert, Maupassant, Zola e Anatole, na ficção; os parnasianos, na poesia; Comte, Taine e Renan, no pensamento e na História. Em segunda plana, os portugueses, Eça de Queiroz, Ramalho Ortigão e Antero de Quental, que travavam em Coimbra uma luta paralela no sentido de abalar velhas estruturas mentais (BOSI, 2017, p. 185). NOTA 13 Além dos autores citados por Bosi, Eça de Queirós (1845-1900) e Antero de Quental (1842-1891), incluímos Teófilo Braga (1843-1924), por serem esses três considerados como os iniciadores do realismo português. Eles estiveram envolvidos na questão de Coimbra, uma polêmica literária, tema próprio de estudos da literatura portuguesa e por isso não será detalhado aqui. Coube a Eça de Queirós ser considerado como o precursor do Realismo-naturalista e o responsável por introduzir o estilo em Portugal. Autor de romances, contos e crônicas, destacamos dele as obras: O crime do padre Amaro (1875), O primo Basílio (1878) e Os Maias (1888). FIGURA 5 – EÇA DE QIERÓS, ANTERO DE QUENTAL E TEÓFILO BRAGA FONTE: Antero de Quental escreveu uma obra representativa do Realismo Português Bom Senso e Bom Gosto (1865), e citamos também A Dignidade das Letras e as Literaturas Oficiais (1865). Teófilo Braga escreveu Teocracias Literárias – Relance sobre o Estado Actual da Literatura Portuguesa (1865) e Parnaso Português Moderno (1877), entre outros títulos. As obras de Eça, O Primo Basílio e O Crime do Padre Amaro, também causaram espanto e indignação em muitos de seus leitores pelo estilo desenvolvido. Eça, ao escrever de forma minuciosa e o mais próximo da realidade, do cotidiano, tornou-se muito criticado pela sociedade portuguesa. Ressaltamos que ele foi decisivo para que Aluísio de Azevedo se tornasse um escritor Naturalista. <https://bit.ly/3beNCXt>; <https://bit.ly/2Nw2b0J>; <https://bit.ly/2ZnUbl6>.Acesso em: 23 jun. 2021. Assista ao filme brasileiro Primo Basílio, lançado em 2007 e dirigido por Daniel Filho, inspirado na obra do autor português Eça de Queiroz. Você encontra o filme na íntegra disponível no Youtube. Disponível em: https://bit.ly/3yjmKk0. DICA 14 FIGURA 6 – CARTAZ DO FILME – PRIMO BASÍLIO (2007) FONTE: <https://bit.ly/3eVnPH8>. Acesso em: 20 abr. 2021. A adesão aos movimentos artísticos e literários também aconteceu nos países vizinhos do Brasil. Muitos já eram independentes em torno de 1810, mas ainda enfrentavam guerras civis e lutas internas para firmar os governos conquistados. A seguir serão apresentados elementos teóricos para a construção de uma análise e crítica literária. Ressaltamos que as reflexões sobre os estudos literários são resultado de análises fundamentadas pela teoria, expressa de forma crítica em diferentes níveis de compreensão textual. Por isso, vamos falar sobre a teoria da literatura e a análise para comentar um texto literário. Nos acompanhe! 4 COMO COMENTAR OU ANALISAR UM TEXTO DE LITERATURA Ensinar a literatura é um tema complexo, e que deve ser motivo de reflexão, por isso esta seção pretende oferecer meios para que o leitor amplie os conhecimentos literários, um objetivo geral que se espera do futuro licenciado que saiba analisar e comentar um texto para elaborar aulas de literatura. 15 O leitor atento adquire uma experiência real com a leitura de ficção, porque passa a ver algo que não tinha percebido. Já a crítica contribui para adquirir uma nova experiência da realidade e nisso reside uma das contribuições da literatura na formação crítica do sujeito. Você já parou para pensar por que o ensino de literatura é tão importante? Porque teorizar é refletir sobre um tema e analisar com cuidado o texto: O objetivo da teoria é, na verdade, desconsertar o senso comum. Ela o contesta, o critica, o denuncia como uma série de ilusões — o autor, o mundo, o leitor, o estilo, a história, o valor — das quais lhe parece indispensável se liberar para poder falar de literatura. Mas a resistência do senso comum à teoria é inimaginável (COMPAGNON, 1999, p. 257). Em outras palavras, a leitura deve ser uma experiência prazerosa, de entretenimento, no entanto, há obras que se tornam universais e sempre são estudadas, por serem atemporais, ou seja, a cada tempo elas têm algo a comunicar para o leitor atual, e acabam por despertar o desejo de entendimento e o de comentários sobre ela. Por isso a pergunta sobre o que é literatura. Muitas outras derivadas dessa primeira têm ocupado por séculos aos pesquisadores literários e críticos. Acompanhe as indagações de Compagnon e perceba que muitas dessas perguntas estamos sempre procurando responder: Todo discurso sobre a literatura assume posição – implicitamente o mais das vezes, mas algumas vezes explicitamente – em relação a estas perguntas, cujo conjunto define uma certa ideia de literatura: O que é literatura? Qual é a relação entre literatura e autor? Qual é a relação entre literatura e realidade? Qual é a relação entre literatura e leitor? Qual é a relação entre literatura e linguagem? (COMPAGNON, 1999, p. 25). Algumas questões são para ser pensadas ao realizar uma leitura analítica de um texto, até para escrever um comentário, ou produzir uma resenha literária, entre outras atividades, que requerem tal análise do texto literário, quando então após há condições de se falar algo sobre o texto. Conforme Perrone-Moisés (1998, p. 10), cada vez que uma obra é eleita por alguém como objeto de discurso, essa escolha já é a expressão de um julgamento, pois a análise será como olhar cada parte e depois emitir um parecer, qualquer que seja o “método de análise”. Logo, ao analisar são aplicados conhecimentos teóricos adquiridos ao longo do curso, pois como leitores também nos tornamos críticos de uma obra literária. A importância de estudar a teoria e realizar análises de um texto nos obriga a pensar, a questionar e a refletir a respeito do que lemos. 16 Então, já tinha pensado em ler um texto e realizar uma análise? E se já analisou e tem algumas ideias próprias despertadas pela leitura, que tal escrever uma pequena resenha sobre o texto? Como você iria começar? A seguir, apontamos alguns elementos para iniciar uma análise de um texto literário. À medida que a sua leitura e o conhecimento da obra avançam, você mesmo irá notar que fará seus próprios questionamentos a respeito da obra: • O estilo e o ano em que foi escrito, é um texto barroco? Ou modernista? Ou realista? • O tema da obra: às vezes, o título dá uma pista, mas entender a trama e ver se está claro. • O perfil dos personagens, quais são as características de cada personagem e como são descritos. • O narrador, quem é o narrador? É importante perceber se o narrador é onisciente, ou se é o leitor que sabe mais do que o próprio protagonista. • O protagonista; quem é o personagem principal sobre quem recai a ação? • O enredo ou argumento, verifique se é uma narrativa linear ou não linear. Uma breve explicação sobre o linear é quando há um início, meio e fim enquanto o não linear são os enredos sem uma sequência cronológica, analepses e flashbacks. • O tempo e o espaço: estas duas questões de análise remetem a Aristóteles, e as três unidades, perceba que no teatro e em um romance ocorrem variações e nem sempre são iguais. O tempo e quanto é a duração de uma obra. • O contexto histórico e social da obra nos permite entender o momento em que a obra foi escrita. Nem sempre estão relacionados, e não é a regra, mas, por exemplo, quando se trata de um romance histórico temos elementos ficcionais que remetem a fatos reais e que acabam por dar verossimilhança ao texto. O ensino da literatura precisa estar ancorado na prática de leitura de textos literários de diversos gêneros e na reflexão sobre suas especificidades. Em sala de aula, é importante que o professor esmiúce o gênero estudado, estimule a leitura integral das obras e a procura de obras na biblioteca, internet etc. Ademais, cabe destacar que o ato de leitura é, ao mesmo tempo, individual e social, e que a produção de sentido envolve as dimensões do leitor, autor, do texto e do contexto. Também é importante lembrar que a compreensão e interpretação do texto literário não se fecha em uma única possibilidade. Além da atividade de leitura do gênero e de análise dos aspectos textuais e discursivos, o professor pode solicitar a produção de um gênero, coletivamente ou individualmente, trabalhando etapas de produção textual, entre outras atividades envolvendo a oralidade. NOTA 17 Sobre a presença do narrador no relato realista, procure encontrar na narrativa a voz dos personagens e identifique os tipos de narradores, observe quem está falando. Lembre-se que o narrador pode estar em primeira pessoa porque ele interage na história (Exemplo: Eu, Brás, vou contar uma história), e em terceira pessoa temos dois tipos: o que conta o que vê e o onisciente que sabe tudo sobre o enredo e os acontecimentos. Em outras palavras, é importante lembrar de alguns conceitos ao estudar literatura, como a intertextualidade, conceito que nos remete ao dito por Barthes: “o escritor só pode imitar um gesto sempre anterior, jamais original; seu único poder está em mesclar as escrituras, em fazê-las contrariarem-se umas pelas outras, de modo a nunca se apoiar em apenas uma delas" (BARTHES, 1988, p. 69). Assim, se conta uma nova história a partir de outras histórias arquivadas no imaginário coletivo ou de leituras adquiridas com o tempo. Vamos lembrar o que Aristóteles menciona na Arte Poética: a arte é uma representação, a mimesis, a imitação da natureza, e a contemplação do conjunto de ações de uma trama no momento da peripécia,o acontecimento que dá uma reviravolta na ação irá conduzir à catarse, ou à emoção sentida diante de uma ação em que o espectador ou leitor, se envolve e sente a emoção da obra (ARISTÓTELES, 2003). Ele também dividiu a literatura em três gêneros: o épico, o lírico e o dramático, sendo que o épico é considerado o gênero por excelência, o dramático é a imitação das ações humanas, tanto na tragédia como na epopeia o herói é o personagem principal porque são mostradas as angústias desenvolvidas em uma trama que nem sempre será com um final feliz, o que importa são as ações desenvolvidas. Sobre a imitação é importante lembrar que: Como a imitação se aplica aos atos das personagens e estas não podem ser senão boas ou ruins (pois os caracteres dispõem-se quase nestas duas categorias apenas, diferindo só pela prática do vício ou da virtude), daí resulta que as personagens são representadas melhores, piores ou iguais a todos nós (ARISTÓTELES, 2003, p. 6). Com o passar dos séculos e dos diversos movimentos literários, os textos foram agrupados e passaram a serem definidos como gêneros literários, por conta da semelhança na forma de cada um. Os gêneros são classificados em três tipos e cada um apresenta características e formas que os diferenciam: 18 FIGURA 7 – ESQUEMA DOS GÊNEROS LITERÁRIOS FONTE: A autora (2021) Por isso, ao analisar uma obra é importante conhecer pensadores e teorias que amparam e fundamentam os argumentos que construímos sobre o texto, e essa é uma atividade que se inicia ao estudar teorias da literatura, pois, se não houver a teoria, a crítica fica sem um fundamento que a ampare. Gêneros literáriosGêneros literários Gênero lírico poemas, canções, soneto, escrito em verso ou prosa poética. Gênero narrativo romances, contos, escritos em prosa. Gênero dramático comédias escritas para representação ou leitura, peças teatrais. Verbete: Texto “Se o texto, mormente o texto literário, deve sempre reinventar o seu próprio cânone, cumpre buscar possíveis definições do que seja “texto”, signo que perambula, solene e interdisciplinarmente, por campos vários do saber, como a filologia, a filosofia, a filosofia da linguagem, a didática, a linguística, a semiologia, a semiótica, a psicologia, a teologia, as ciências jurídicas e históricas, a teoria literária, a crítica textual, onde se imbricam sentidos, engendrando outros sentidos”. Continue a leitura sobre a definição de texto no dicionário literário disponível em: https://edtl.fcsh.unl.pt/encyclopedia/texto/. Acesso em: 20 abril 2021. Convidamos você a revisitar o conteúdo das disciplinas e os livros de Teoria da literatura I e Teoria da Literatura II. Ambos estão disponíveis na biblioteca on-line e você pode revisitar os conceitos discutidos brevemente nesta obra. Referências: HOFFMANN, E. Teoria da literatura I / Elaine Hoffmann; Tiago Hermano Breunig. Indaial: UNIASSELVI, 2017. SANTOS, A. J. C. Teoria da literatura II / Abraão Júnior Cabral e Santos. Indaial: UNIASSELVI, 2019. NOTA DICA 19 Outro elemento importante a ser notado em uma obra na linguagem literária é o sentido denotativo e conotativo. Observe que quando se fala em sentido denotativo, nos referimos à linguagem direta e uso da palavra em seu sentido dicionarizado, enquanto sentido conotativo remete à linguagem indireta com o acréscimo de opiniões pessoais, uso figurativo. Acompanhe a colocação de Compagnon: “os três fios da teoria, da história e da crítica tornam-se essenciais para amarrar o estudo literário, ou para reatar com ele na plenitude de seu sentido. Para mim, depois dos tempos da teoria e da história, veio o momento da crítica” (COMPAGNON, 1999, p. 19). A teoria oferece uma base, suporte, para depois discutir de forma crítica um texto. Se você gosta de saber sobre a história de uma obra, entenda que “a história literária é a disciplina acadêmica que surgiu ao longo do século XIX, mais conhecida, aliás, com o nome de filologia, ou pesquisa (COMPAGNON, 1999, p. 22). Por isso, procure textos que possam auxiliá-lo ainda mais para ampliar o conhecimento literário, fazer pontes com outros gêneros, como a Picaresca e o Realismo, leituras sobre a biografia do autor, a cultura que se encontra na obra. Abrimos o tópico falando das diretrizes contidas na BNCC sobre o ensino de língua portuguesa com um recorte a partir das competências sobre literatura. O foco das orientações da Base Nacional Comum Curricular do Ensino Fundamental – BNCC reside em dar subsídios para que as competências e habilidades sejam desenvolvidas pelo aluno ao longo dos anos escolares, entre o ensino fundamental e o médio. Por isso, a proposta é despertar a atenção docente para o planejamento de aulas, ou seja, saber associar teoria e ensino, ou seja: saber-fazer com o conhecimento adquirido para as futuras aulas de literatura. 4.1 A BNCC E O ENSINO DE LITERATURA Na sua maior parte de forma explícita, as diretrizes indicam a inclusão de textos literários como forma de desenvolver o senso crítico do aluno. De forma geral a literatura sempre foi presente nos livros didáticos e nas aulas de língua portuguesa, porém, muitas vezes como motivo para ensinar algum elemento gramatical ou de sintaxe, de forma repetitiva. Já na BNCC o aluno é percebido como protagonista no processo de aprendizagem e o professor se torna um facilitador, o orientador desse processo. Veja uma das competências que se aplica à inclusão de literatura na sala de aula: Envolver-se em práticas de leitura literária que possibilitem o desenvolvimento do senso estético para fruição, valorizando a literatura e outras manifestações artístico-culturais como formas de acesso às dimensões lúdicas, de imaginário e encantamento, reconhecendo o potencial transformador e humanizador da experiência com a literatura (BRASIL, 2018, p. 86). 20 A competência citada é direcionada ao ensino Fundamental, mas o aluno ao progredir para o ensino Médio terá uma base e continuará a desenvolver com mais habilidade o senso crítico, um processo começado nos anos iniciais. O que aprendemos de forma teórica nem sempre se traduz em aulas que incentivam o aluno a gostar de ler livros considerados clássicos, contudo com as ferramentas digitais, materiais didáticos adequados disponíveis e inovadores, é possível aprimorar cada etapa do processo de aprendizagem do aluno. Em outras palavras, o ideal é escapar de aulas literárias que apenas evocam a memorização ou a resposta de alguma pergunta, ou ainda usar o texto como “pretexto” para responder algum questionário gramatical sem envolver a capacidade reflexiva discente. FIGURA 8 – LOGOMARCA DA BNCC FONTE: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>. Acesso em: 23 jun. 2021. Excerto: Um dos grandes estudiosos na Educação, Jean Piaget, já alertava para o fato de que, na educação no futuro, as fronteiras disciplinares tenderiam a desaparecer e que os educadores precisariam adotar cada vez mais atitudes que levassem os estudantes a observar as conexões entre as áreas de conhecimento sem, no entanto, negligenciar o campo de sua especialidade. Eis um dos maiores desafios posto aos educadores: conferir às abordagens pedagógicas, nas dimensões do Currículo, dos Projetos Pedagógicos e aos Planos de Aula, o alcance da integralidade do seu objetivo somado aos temas da contemporaneidade na perspectiva da educação integral e transformadora (BRASIL, 2019, p. 23). FONTE: BRASIL. Temas Contemporâneos Transversais na BNCC. Propos- ta de Práticas de Implementação. Brasília: MEC/Secretaria de Educação Básica, 2019. Disponível em: https://bit.ly/3xUlx30. Acesso em: 23 jun. 2021. NOTA 21 Os documentos oficiais do MEC, em especial a Base Nacional Comum Curricular – BNCC –destaca nas competências de Língua portuguesa o ensino de literatura. Compilamos aseguir as competências específicas de língua portuguesa para o ensino fundamental: 1. Compreender a língua como fenômeno cultural, histórico, social, variável, heterogêneo e sensível aos contextos de uso, reconhecendo-a como meio de construção de identidades de seus usuários e da comunidade a que pertencem. 2. Apropriar-se da linguagem escrita, reconhecendo-a como forma de interação nos diferentes campos de atuação da vida social e utilizando-a para ampliar suas possibilidades de participar da cultura letrada, de construir conhecimentos (inclusive escolares) e de se envolver com maior autonomia e protagonismo na vida social. 3. Ler, escutar e produzir textos orais, escritos e multissemióticos que circulam em diferentes campos de atuação e mídias, com compreensão, autonomia, fluência e criticidade, de modo a se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos, e continuar aprendendo. 4. Compreender o fenômeno da variação linguística, demonstrando atitude respeitosa diante de variedades linguísticas e rejeitando preconceitos linguísticos. 5. Empregar, nas interações sociais, a variedade e o estilo de linguagem adequados à situação comunicativa, ao(s) interlocutor(es) e ao gênero do discurso/gênero textual. 6. Analisar informações, argumentos e opiniões manifestados em interações sociais e nos meios de comunicação, posicionando-se ética e criticamente em relação a conteúdos discriminatórios que ferem direitos humanos e ambientais. 7. Reconhecer o texto como lugar de manifestação e negociação de sentidos, valores e ideologias. 8. Selecionar textos e livros para leitura integral, de acordo com objetivos, interesses e projetos pessoais (estudo, formação pessoal, entretenimento, pesquisa, trabalho etc.). 9. Envolver-se em práticas de leitura literária que possibilitem o desenvolvimento do senso estético para fruição, valorizando a literatura e outras manifestações artístico-culturais como formas de acesso às dimensões lúdicas, de imaginário e encantamento, reconhecendo o potencial transformador e humanizador da experiência com a literatura. 10. Mobilizar práticas da cultura digital, diferentes linguagens, mídias e ferramentas digitais para expandir as formas de produzir sentidos (nos processos de compreensão e produção), aprender e refletir sobre o mundo e realizar diferentes projetos autorais (BRASIL, p. 87). FONTE: BRASIL. Base Nacional Comum Curricular: Educação é a base. Brasília: MEC/Secretaria de Educação Básica, 2018. Disponível em: https://bit.ly/3i7IqJV Acesso em: 24 jun. 2021. 22 Observe que das dez competências gerais, em todas, a língua e a literatura são interligadas, mas pelo menos em cinco são direcionadas de forma objetiva à literatura. Assim, a BNCC destaca o ensino da literatura nas aulas de língua portuguesa e orienta que ensinar a língua e gêneros textuais ampliam o conhecimento de mundo do aluno. Observe o que Silva (2019, p. 243) fala a respeito: Em 2018, os educadores discutiram Ensino Fundamental com uma preocupação especial sobre a literatura, a BNCC passou a destacar o contato com o campo artístico-literário, destacando as manifestações artísticas e produções culturais. Assim, o estudo da literatura na nova BNCC se expressa que a leitura literária oferece condições para os estudantes compreenderem e fruírem os textos de maneira gradativa, significativa e crítica. Desse modo, no Ensino Básico, a literatura é fundamental na elaboração dos currículos, principalmente das práticas da linguagem relativas à leitura, à compreensão, à fruição e, consequentemente, o desenvolvimento da escrita. Portanto, o componente curricular de Língua Portuguesa deve levar em conta o diálogo entre as linguagens, o diálogo com a literatura, além de possibilitar o contato e a reflexão acerca da leitura e produção de textos. No ensino fundamental e médio encontramos as competências e habilidades que norteiam os estudos literários de língua portuguesa. Vale pesquisar e ver quais são! As aulas de literatura procuram promover reflexões, portanto, saber alguns detalhes sobre vida é obra de um autor é importante porque nos situa em um contexto histórico e nos dá uma ideia do contexto literário, contudo, não se resume a apenas isso, e ao questionar uma narrativa a partir do contexto cultural e histórico em que está inserida é uma forma de desenvolver a pesquisa e a reflexão além da competência leitora. Outra informação importante a respeito da BNCC é a seguinte: Cumpre destacar que os critérios de organização das habilidades na BNCC (com a explicitação dos objetos de conhecimento aos quais se relacionam e do agrupamento desses objetos em práticas de linguagem e campos de atuação) expressam um arranjo possível (dentre outros). Portanto, os agrupamentos propostos não devem ser tomados como modelo obrigatório para o desenho dos currículos. Considerando esses pressupostos, e em articulação com as competências gerais da Educação Básica e com as competências específicas da área de Linguagens, o componente curricular de Língua Portuguesa deve garantir aos estudantes o desenvolvimento de competências específicas. Vale ainda destacar que tais competências perpassam todos os componentes curriculares do Ensino Fundamental e são essenciais para a ampliação das possibilidades de participação dos estudantes em práticas de diferentes campos de atividades humanas e de pleno exercício da cidadania (BRASIL, 2019, p. 86). NOTA 23 A seguir, retornaremos aos estudos teóricos sobre o Realismo literário, que reflete um olhar crítico sobre as relações sociais e privadas do final do século XIX como se trasladou da Europa para o Brasil nos concedendo páginas que marcaram para sempre a literatura. Neste tópico foram comentados os aspectos teórico-metodológicos da teoria literária e crítica sobre a literatura brasileira. No tópico seguinte você acompanha o Realismo no Brasil e o seu lugar nas letras da literatura brasileira do Século XIX. 24 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: ● O Realismo apareceu primeiro na Europa, em meados do século XIX, com uma forte reação à estética romântica. ● O escritor Gustave Flaubert foi um autor inovador em sua época, um dos principais escritores realistas, para quem a função do artista era apresentar uma arte pautada pela objetividade. ● O romance Madame Bovary é uma obra considerada realista porque retrata o cotidiano das pessoas sem idealismos de heroísmo ou românticos. ● O escritor Emile Zola representa a escola naturalista francesa e influencia os escritores brasileiros. ● A recepção da crítica e do público à prosa naturalista foi com rejeição, porque eram acusadas de ultrapassar os limites da moral e dos bons costumes da época. ● A influência do Cientificismo, Darwinismo e Positivismo foi extensa na literatura europeia e brasileira. ● Os diversos movimentos literários nascidos na Europa influenciaram a escrita literária brasileira. ● O Brasil na virada do século XX ainda tinha uma dependência cultural em relação à Europa e seus movimentos literários. ● O ensino de literatura na escola é a parte prática da aprendizagem de teoria e crítica literária. ● Os alunos aprendem a realizar comentários críticos de literatura à medida que o professor busca sensibilizá-los, apresentando as especificidades da linguagem literária e conceitos-chave para a construção de sentido da leitura. RESUMO DO TÓPICO 1 25 1 Excerto: O Realismo aparece em português, vindo da França e Inglaterra, em registro literário, com Eça de Queirós, na conferência “O Realismo como nova expressão da arte”, de 1871, quinze anos depois de Jules-Champfleury ter utilizado o qualificativo “realista” para a pintura de Gustave Courbet, noartigo “Le Réalisme”, de 1857, na França. O escritor português defende o intuito moral, de justiça e de verdade da nova escola, que, para ele, não se restringe a um simples modo de expor, minudente, trivial, fotográfico. Ou seja, não é apenas uma técnica, mas também uma posição. No Brasil, um esboço de Realismo enquanto método já surge com o primeiro romance publicado, O filho do pescador (1843), de Teixeira e Souza: perscruta-se que a primeira grande modificação por que passa o Realismo no Brasil esteja na maneira como ele se integra às necessidades ideológicas do país, vindo do exterior (MENDES, 2015, p. 62). FONTE: MENDES, F. M. Linguagem da violência e realismo literário à brasileira. In: Realismo e violência na literatura contemporânea: os contos de Famílias terrivelmente felizes, de Marçal Aquino [on-line]. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2015, p. 37-93. Disponível em: <https://bit.ly/2Y0y1bm>. Acesso em: 20 fev. 2021. Considerando que o Realismo europeu exerceu uma influência no Brasil, avalie as afirmações a seguir: I- O posicionamento de Eça de Queirós contribuiu para afirmar o Realismo em Portugal. II- Considerando o texto, o Realismo no Brasil se adapta à realidade social brasileira da época. III- O Realismo envolveu a integração de conteúdos artísticos e culturais em outras áreas. IV- O Realismo estava comprometido com uma crítica consciente sobre a sociedade. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I, II, III e IV estão corretas. b) ( ) Somente a sentença II está correta. c) ( ) Somente a sentença I está correta. d) ( ) Somente a sentença III está correta. 2 Ao ensinar literatura na escola é importante incluir a literatura de todos os estilos e escolas porque é possível estabelecer diálogos com outras áreas de cultura, tais como a pintura, o cinema, a música e a fotografia. O objetivo é contribuir com a formação crítica do aluno e ampliar a visão de mundo que ele adquire nos anos escolares. AUTOATIVIDADE 26 De acordo com o dito, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) O texto literário para ser discutido em sala de aula deve estar escrito de acordo com as regras gramaticais para que o aluno aprenda a falar bem. b) ( ) O texto literário selecionado deve ter sempre notas de rodapé para facilitar a leitura do aluno e assim ele irá claramente o que o autor desejou falar. c) ( ) O texto literário permite uma leitura de mundo e por isso é importante que o aluno tenha oportunidade de pensar a respeito da leitura realizada. d) ( ) O estudo prévio da arte poética é a única forma para que o aluno consiga entender uma obra literária. 3 Texto 1: Nos textos comuns, não literários, o autor seleciona e combina as palavras geralmente pela sua significação. Na elaboração do texto literário, ocorre outra operação, tão importante quanto a primeira: a seleção e a combinação de palavras se fazem muitas vezes por parentesco sonoro. Por isso se diz que o discurso literário é um discurso específico, em que a seleção e a combinação das palavras se fazem não apenas pela significação, mas também por outros critérios, um dos quais, o sonoro. Como resultado, o texto literário adquire certo grau de tensão ou ambiguidade, produzindo mais de um sentido. Daí a plurissignificação do texto literário. FONTE: GOLDSTEIN, N. Versos, sons, ritmos. 5. ed. São Paulo: Ática, 1988, p. 5. Texto 2: Os símbolos, as metáforas e outras figuras estilísticas, as inversões, os paralelismos e as repetições constituem outros tantos meios de o escritor transformar a linguagem usual em linguagem literária. FONTE: AGUIAR E SILVA, V. M. Teoria da literatura. 3. ed. Coimbra: Almedina, 1979, p.58 (com adaptações). Tomando como referência os textos, analise as sentenças a seguir: I- A plurissignificação de um texto literário é construída pela combinação de elementos que vão além da significação das palavras que o compõem. II- A construção do texto literário envolve um processo de seleção e combinação de palavras baseados, necessariamente, no uso de metáforas. III- A ambiguidade do texto literário resulta de um processo de seleção e combinação de palavras. IV- O texto literário se diferencia do não literário por não depender de significação, mas, sim, de outros recursos no processo de seleção e combinação das palavras. FONTE: ENADE 2011 – Questão 17, p. 13. Disponível em: <https://bit.ly/2VctPni>. Acesso em: 23 jun. 2021. 27 Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e II estão corretas. b) ( ) As sentenças I e III estão corretas. c) ( ) As sentenças II e IV estão corretas. d) ( ) As sentenças I, III e IV estão corretas. 4 O romance de Flaubert marcou o início do Realismo europeu. O novo estilo se destacou pela objetividade literária e por isso se contrapôs ao Romantismo. Em Madame Bovary, o enredo mostra uma crítica ácida à hipocrisia das relações sociais e privadas dirigidas principalmente à burguesia e tornou seu autor, persona non grata, nos meios sociais franceses. Leia o excerto e entenda como Flaubert conduziu temas polêmicos na obra: “Emma mordia os lábios descorados e, rolando entre os dedos um dos raminhos do polipeiro que ela quebrara, fixou sobre Charles o ponto ardente das pupilas, como duas flechas de fogo prestes a disparar. Tudo nele agora a irritava, o rosto, o vestuário, o que ele não dizia, toda a sua pessoa, a sua própria existência. [...] A recordação do amante vinha-lhe ao espírito com atracções vertiginosas: entregava-lhe a alma, impelida para a sua imagem por um novo entusiasmo, e Charles parecia-lhe tão separado da sua vida, tão definitivamente ausente, tão impossível e aniquilado, como se fosse morrer e estivesse agonizando na sua frente. [...] Charles voltou-se para a mulher, dizendo: – dá-me um beijo, minha querida! - Deixa-me – disse ela, rubra de cólera. - Que tens tu? Mas o que é que tens? – repetia ele, estupefato. - Acalma-te! Sossega!… Sabes bem que te amo!… Anda cá! - Basta! – gritou ela com uma expressão terrível. E fugiu da sala, atirando a porta com tanta força que o barômetro saltou da parede e se fez em pedaços no chão. [...] Quando Rodolphe, à noite, chegou ao jardim, encontrou a amante à sua espera ao fundo da escada, sobre o primeiro degrau. Abraçaram-se e todo o seu ressentimento se desfez como a neve ao calor daquele beijo” (FLAUBERT, 2000, p. 191). FONTE: FLAUBERT, G. Madame Bovary. São Paulo: Martins Fontes, 2000. Disponível em: <https://bit.ly/37dV- g2P>. Acesso em: 25 abril 2021. Depois da leitura e com base em seus estudos, explique por que o romance de Flaubert foi considerado realista: 5 Texto: Émile Zola (1840-1902), escritor francês, marcou o século XIX com sua proposta de uma nova forma de realização literária: o naturalismo. Ao produzir romances com temáticas que abordavam a profundidade das relações humanas, tornou-se um cânone literário (GOMES, 2012, p. 165). FONTE: GOMES, M. dos S. Émile Zola: Traduções de L’Assommoir e Germinal no Brasil Belas Infiéis, v. 1, n. 2, p. 165-171, 2012. Disponível em: <https://bit.ly/2Sx6uLU>. Acesso em: 26 maio 2021. 28 Excerto – leia um excerto de Germinal (1885) de Èmile Zola: “O homem partira de Marchiennes lá pelas duas horas. Caminhava a passos largos, tiritando sob o algodão puído de sua jaqueta e da calça de veludo. Um pequeno embrulho, feito com um lenço de quadrados, incomodava-o bastante; ora o mantinha apertado debaixo de um braço, ora de outro, para poder assim enfiar no fundo dos bolsos as mãos entorpecidas que o açoite do vento leste fazia sangrar. Uma única ideia lhe ocupava o cérebro vazio de operário sem trabalho e sem teto, a esperança de que o frio se tornasse menos agudo com o romper do dia. Havia uma hora que ele caminhava assim, quando percebeu à esquerda, a dois quilômetros de Montsou, uns clarões vermelhos, três braseirosqueimando ao ar livre, e como suspensos. A princípio hesitou, tomado de receio; mas logo após não pôde resistir à necessidade dolorosa de aquecer por um instante as mãos. [...] Só então o homem se deu conta de que aquilo era uma mina e a vergonha tomou conta dele. Para que tentar? Não haveria trabalho... Em vez de se dirigir para o edifício, decidiu escalar o terreno onde ardiam os três fogos de hulha em tachos de ferro fundido que serviam para alumiar e aquecer os homens no trabalho. Os operários encarregados do desaterro certamente tinham trabalhado até tarde, ainda estavam retirando o entulho. Agora ouvia os carregadores empurrando os vagonetes sobre os trilhos montados nos cavaletes, divisava sombras que se moviam descarregando os carros ao lado das fogueiras. FONTE: ZOLA, É. Germinal. Tradução de Francisco Bittencourt. São Paulo: Martins Claret, 2006. Disponível em: https://bit.ly/3fTWEf1. Acesso em: 2 jul. 2021. Depois da leitura e com base em seus estudos a respeito do Naturalismo europeu, explique por que o romance de Zola foi considerado naturalista. 29 REALISMO NO BRASIL 1 INTRODUÇÃO Nas últimas décadas do século XIX, o Romantismo no Brasil também entrou em declínio, a exemplo do que estava acontecendo na Europa, e começou a ceder espaço para as novas estéticas que tinham cruzado o Atlântico e fizeram escola no Brasil. Autores do porte de Machado de Assis e Aluísio de Azevedo foram os primeiros a publicar obras e, assim como aconteceu na França, as primeiras obras despertaram discussões acaloradas sobre a nova forma de escrever. As novas estéticas procuravam ressaltar elementos nacionais e contar histórias verosímeis sem nenhum elemento idealista, trágico ou fantástico, como tinha sido no Romantismo. Muitas das obras desse período se tornaram canônicas da literatura brasileira. Depois da extinção da escravatura em 1850, o Brasil continuou a ter movimentos sociais, militares e religiosos que marcaram o contexto histórico do período que antecedeu e durante o Realismo brasileiro. Uma das mais importantes foi a Proclamação da República em 1889 e estes fatos do cotidiano acabaram por influenciar a escrita literária da época. Neste tópico iremos conhecer e entender melhor o cenário brasileiro do Realismo e do Naturalismo, assim como Parnasianismo transplantados da Europa, e uma nova estética irá marcar a literatura brasileira. 2 A LITERATURA BRASILEIRA NO FINAL DO SÉCULO XIX O Brasil também teve seus próprios movimentos sociais complexos, como a abolição da escravatura e o movimento para a Proclamação da República, pratos cheios para dar ideias e conteúdo para obras realistas. A literatura brasileira realista também realizou uma forte crítica à burguesia. O realismo durou em torno de vinte anos de acordo com Moisés (2016, p. 184): “Em 1902, com o surgimento de Canaã, de Graça Aranha, e de Os Sertões, de Euclides da Cunha, pode-se considerar encerrada a época realista” (MOISÉS, 2016, p. 184). Observa-se que o Realismo e o Naturalismo entraram no Brasil antes de 1881, a data considerada como a fundadora das escolas brasileiras. De acordo com Bandeira de Melo (2018, p. 438): UNIDADE 1 TÓPICO 2 - O 30 Podemos, um pouco arbitrariamente, localizar o início da recepção do Naturalismo no Brasil em 1873, dois anos antes da publicação em Portugal de O crime do Padre Amaro, de Eça de Queirós, primeiro romance naturalista em língua portuguesa (após as obras transicionais de Júlio Dinis), e oito antes de O mulato, de Aluísio Azevedo, que inaugura o Naturalismo brasileiro em 1881. O Realismo, ao migrar para terras brasileiras, consolidou a influência cultural dos movimentos literários europeus no país, ao mesmo tempo que o autor brasileiro procurava a busca de uma independência cultural primeiro de Portugal e da Europa. Na poesia surgiu um novo estilo chamado Parnasianismo. A nova escola tinha proposta marcada pela objetividade, pelo rigor e o culto ao belo conforme os padrões gregos e romanos da antiguidade clássica, mas aguarde um pouco porque a estética parnasiana ainda será mais estudada no Tópico 3. Autores do porte de Machado de Assis e Aluísio de Azevedo são os primeiros a publicar obras e, assim como aconteceu na França, as primeiras obras despertaram discussões acaloradas sobre a nova forma de escrever. Para entender o impacto da literatura realista no Brasil, é importante entender o momento histórico do Século XIX. Da Europa para as Américas, o movimento literário atravessou o Atlântico e fez escola no Brasil. Ainda somamos as questões internas brasileiras ao longo do século XIX, acontecidas antes das publicações de Machado de Assis e Aluísio de Azevedo, tais como: • A Independência do Brasil em 1822. • A Guerra do Paraguai entre 1865-1870. • O Lançamento do Manifesto Republicano em 1870. • A Lei do Ventre Livre em 1871. Também, as Américas aderiram à corrente europeia no que dizia ao pensamento positivista, aos novos estilos nas artes em geral, e procuravam pela literatura contar a realidade social do povo e do local em que viviam. A publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas e O Mulato, ambas em 1881, vão engrossar as vozes de movimentos sociais importantes na sociedade brasileira quase no final da década de 1880, tais como: • Assinatura da Lei dos Sexagenários em 1885. • A Lei Áurea foi promulgada em 1888. • A República foi promulgada em 1889. Assim, entendemos que a literatura está sempre em movimento e a ficção pode confundir um leitor desavisado: 31 A segunda força da literatura, é sua força de representação. Desde os tempos antigos até as tentativas de Vanguarda, a literatura se afaina na representação de alguma coisa. O quê? Direi brutalmente: o real. O real não é representável e é porque os homens querem constantemente representá-lo por palavras que é uma história da literatura (BARTHES, 2002, p. 22). Assim, o que Barthes explana sobre escrever ficção e essa busca de comparar com a realidade, são a recepção do realismo no Brasil e as questões envolvidas para que o Realismo tivesse seu espaço na literatura brasileira. Uma das contribuições para o ensino de literatura na escola, ao estudar o período realista, são as indagações e reflexões que traz a partir dos temas que apresenta, tais como clientelismo, o patriarcalismo, a escravidão, os perfis femininos na vida social, entre outros assuntos que refletem sua época. A leitura orientada, mediada pelo professor, contribui para as descobertas literárias do aluno e as reflexões sobre os temas apresentados porque são atemporais. Ainda falando sobre o positivismo como um movimento filosófico com princípios de evolução social, que se estendeu no Brasil e teve muitos adeptos, ressaltamos que influenciou a cultura brasileira e um exemplo são a frase Ordem e Progresso colocada na bandeira nacional. Se você deseja saber mais sobre o Positivismo no Brasil, leia a obra na íntegra: TORRES, J. C. de O., 1915-1973. O positivismo no Brasil [recurso eletrônico] / João Camilo de Oliveira Torres. – Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2018. – (Coleção João Camilo de Oliveira Torres; n. 5 e-book). Disponível em: https:// livraria.camara.leg.br/o-positivismo-no-brasil. Acesso em: 13 fev. 2021. DICA O Realismo, como o próprio nome diz, procura retratar a realidade em que vivemos, junto com o Naturalismo e o parnasianismo irão influenciar e nos oferecer obras-primas da literatura brasileira. Por conta do momento histórico e a busca maior da ciência em detrimento de achismos, os autores brasileiros expressam nas obras situações que expressam abertamente um posicionamento contra a igreja, a monarquia e a burguesia. Bosi (2017, p. 192) afirma que “De um modo geral, contudo, a prosa de ficção
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