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MEU FILHO É HOMOSSEXUAL: 
COMO A DESCOBERTA DA HOMOSSEXUALIDADE PODE AFETAR 
A DINÂMICA DAS FAMÍLIAS E SEUS PADRÕES PREVIAMENTE 
INSTITUÍDOS 
 
Ariel Augusto Brandão Gonzales 
Ana Conceição Rangel de Andrade 
Ester Moraes de Souza Silva 
Elton Marzochi Delacorte 
 
RESUMO 
Ao abordar a homossexualidade, pensamos em atravessar várias barreiras socialmente 
impostas. Encontramos vários temas que poderiam ser o fio condutor deste trabalho: a 
descoberta da homossexualidade, a homossexualidade através da história, os movimentos pela 
luta dos direitos dos homossexuais, porém, consideramos que estes temas já contemplam 
alguns estudos. Procuramos nos focar em um objeto de pouca investigação social, sobretudo 
no Serviço Social, as relações familiares dos homossexuais. Não nos atentamos sobre os 
aspectos jurídicos e/ou religiosos acerca da homossexualidade ou das "Uniões Homoafetivas", 
pois tais abordagens, apesar de estritamente necessárias em um contexto amplo, seriam 
dispensáveis no tema proposto. O estudo se pauta, então, nas relações estabelecidas pelos 
filhos homossexuais e seus pais, pretendendo mostrar como o trato e recebimento da 
homossexualidade no seio familiar interfere no cotidiano da mesma. Para tanto, se mostrou 
necessário, decorrermos, brevemente, acerca da homofobia presente na sociedade brasileira, 
como ela se dá e que consequências traz. Para elaboração do texto foram utilizados como 
fonte de pesquisa websites e autores que corroboram para a defesa dos direitos dos 
homossexuais. O uso de websites se apresentou necessário, pela dinamicidade corrente acerca 
das discussões que envolvem a homossexualidade como também, todas as manifestações 
geradas pelo tema. Isto posto, apresentamos depoimentos recolhidos do website Grupo de 
Pais de Homossexuais, buscando nos atentar às varias informações contidas em cada uma das 
falas e situações narradas. 
 
 
 
 
 
 
1. Introdução 
 
 Novas conjunturas sociais se tornaram um desafio a sociedade. A família brasileira 
vem se modificando ao longo das ultimas décadas e com ela tende-se a alterar o pensamento 
societário como um todo. 
Os movimentos pela liberdade de credo, cor, raça e diversidade sexual eclodiram com 
maior força e repercussão trazendo grandes avanços. A partir deste contexto, comportamentos 
e crenças foram, literalmente, sendo obrigadas a ceder espaço para os novos rumos que se 
exigiam as parcelas, ditas como minoritárias, da sociedade. 
 
1.1 Família: A Instituição 
De acordo com Bruschini (1990), a família se define também como unidades de 
relações sociais, no interior das quais hábitos, valores e padrões de comportamento são 
transmitidos a seus novos membros, configurando assim, unidades de reprodução ideológica. 
São espaços de convivência, nos quais se dá a troca de informações entre os membros e onde 
decisões coletivas a respeito de consumo, do lazer e de outros itens são tomadas. Os 
indivíduos maduros se ressocializam a cada momento, revendo e discutindo seus valores e seu 
comportamento na dinâmica do cotidiano de acordo com as possibilidades oferecidas pela 
sociedade na qual o grupo se insere. 
Deste modo, para ser considerada uma família não é preciso, ser composta de pai, mãe 
e filhos. Ela poderá ser só de homens, só de mulheres, só de adultos, enfim, considera-se 
família qualquer aglomeração de pessoas que dividem tarefas, responsabilidades e emoções. 
Assim, as famílias, como célula máxima da sociedade também iniciaram mudanças em seu 
modo de participar, atuar, enxergar e, sobretudo, alterar o status quo societário. 
 
1.2 Família, Homofobia e Heterossexismo 
Ser homossexual no Brasil é muito mais complexo do que pode parecer aos olhos do 
senso comum, evidenciada pela discriminação, machismo e, principalmente, homofobia, que 
se caracteriza pela 
 
 aversão e medo mórbido irracional, e repugnante da homossexualidade ou de 
se tornar homossexual. Mais especificamente a Homofobia caracteriza o 
medo e o resultante desprezo pelos homossexuais que alguns indivíduos 
sentem. Para muitas pessoas é fruto do medo de elas próprias serem 
homossexuais ou de que os outros pensem que o são. O termo é usado para 
descrever uma repulsa face às relações afetivas e sexuais entre pessoas do 
 
mesmo sexo, um ódio generalizado aos homossexuais e todos os aspectos do 
preconceito heterossexista e da discriminação anti-homossexual. (MORAES, 
2007. on-line) 
 
 
O autor, professor e militante Luiz Mott põe em evidência atitudes homofóbicas e 
heterossexistas em seu artigo – A Construção da Cidadania Homossexual no Brasil (2006) - 
utilizando para tal, exemplos decorrentes na mídia nacional que, infelizmente, devido ao 
pouco ou nenhum acesso do brasileiro à educação e ao lazer, toma para si o papel de 
educadora, adentrando os lares das famílias brasileiras com ideias preconceituosas e 
deturpadas a respeito de tal realidade 
Na Universidade de Santa Cruz, RS, foram distribuídos panfletos e adesivos 
com a seguinte palavra de ordem: "Mate um homossexual!". Em um dos 
programas de maior audiência popular, quando ainda na TV Record (da 
Igreja Universal), a apresentadora Ana Maria Braga divulgou a seguinte 
piadinha: "Você sabe qual é a maior tristeza de um pai caçador? Ter um 
filho veado e não poder matar! [..] Carecas de Santo André, SP, distribuíram 
panfletos com a seguinte palavra de ordem: "Destrua os homossexuais!". E 
alguns meses depois, em janeiro de 2000, dezoito skeen-heads trucidaram 
um jovem gay, Edson Néris, na Praça da República. Espumando de ódio, 
num programa de TV, o deputado paulista Afanazio Jazadi declarou: "Todo 
homossexual deveria ser morto!". Policiais do 16º Batalhão da PM de 
Salvador proclamaram: "A ordem é metralhar os travestis!”(MOTT, 2005 
p.101) 
 
Vivemos numa sociedade capitalista e desigual, onde o machismo e o heterossexismo 
são reforçados nas diversas esferas de poder. Nossa sociedade cria os parâmetros e 
mecanismos para que assim seja: criando estereótipos para parcela da população 
“diferenciada” e atribuindo funções específicas aos ideários masculino e feminino. 
Ao homem cabem os papéis de ser o provedor familiar, de demonstrações de 
coragem e virilidade, independência, resistência à dor, espírito competitivo e dominação sobre 
os mais “fracos”, papel este que fica a cargo da figura feminina, a mulher. A ela, é permitido 
chorar, demonstrar fraqueza física e sentimental. Desde pequena é ensinada a lidar com 
trabalhos domésticos; seu “instinto maternal” é estimulado e, em muitos casos, ainda é vista 
como ser inferior e submisso ao homem 
 
Em suas brincadeiras, as meninas têm liberdade para ser cozinheiras, 
cabeleireiras, fadas madrinhas, mães que limpam seus filhos, enfermeiras, 
etc. brincadeiras que denotam a elas o caráter pacífico atribuído. 
 
[...] As manifestações espontâneas nas brincadeiras dos meninos costumam 
ser de caráter agressivo, como no caso de uma disputa de bola, no jogo de 
futebol. (MORENO,1999. p. 27,31) 
 
Para Foucault (1985), a sociedade criou dispositivos que regem a conduta sexual dos 
indivíduos. Deste modo, organiza se o que é dito e sabido sobre a sexualidade humana. O 
“poder saber” é um dispositivo que carrega em si toda uma verdade moral, criando os padrões 
de atos puros e impuros, naturais e não naturais. Assim, a sociedade vem regendo normas e 
engendrando padrões; criam-se as várias “classificações” da sexualidade humana: 
heterossexuais, bissexuais, homossexuais, transexuais, entre outros, gerando então, 
identidades limitadoras, que engendram a sexualidade humana e padronizam o desejo e 
atuação. Nota-se que até as expressões da sexualidade ditas como marginais sofrem tal 
padronização. 
Para Agnes Heller (1985), o preconceito tem a sua origem na fé e na 
ultrageneralização. Afinal, aquele que tem preconceito não o direciona a um ou outro 
indivíduo em específico, ele o faz a toda uma “classe”de pessoas, que supostamente, mantém 
o mesmo tipo de comportamento e mesmo que se comprove que de alguma forma o seu juízo 
não condiz com o real, o indivíduo provido de preconceitos o ignora. 
Não obstante é necessário acrescentar que o preconceito se faz presente a partir da 
normatização imposta por toda uma ideologia. Ao definirmos o que é normal, naturalmente 
também surgem definições da anormalidade. 
 Os preceitos, tanto da normalidade quanto da anormalidade sofrem alterações 
temporais. Afinal, as mudanças pelas quais passam a sociedade exigem que esses parâmetros 
se modifiquem. As motivações para tais modificações podem ser cientificas ou socioculturais. 
 Consideramos como cientificas aquelas em que há relação direta com novas 
descobertas da ciência; deste modo, a exclusão da homossexualidade do rol das doenças pela 
Organização Mundial de Saúde (OMS) veio a auxiliar a “normalizar” a homossexualidade, 
alterando assim o termo “homossexualismo” (o sufixo “ismo” denota doença, desvio) para 
“homossexualidade”, embora, ainda posto em xeque, já que encontramos milhares de estudos 
que procuram conhecer as origens da homossexualidade. De outro lado consideramos como 
fatores sócio-culturais a ampliação das discussões em torno da sexualidade humana e deste 
modo também a homossexualidade. 
Também o fato de uma camada mais visível da sociedade se declarar homossexual ou 
simpatizante à causa como artistas, políticos, escritores vem desmistificar a crença popular de 
que homossexuais não fazem parte produtiva da sociedade. 
 
Ainda em Heller: 
 
Os juízos provisórios refutados pela ciência e por uma experiência 
cuidadosamente analisada, mas que se conservam inabalados contra todos os 
argumentos da razão, são preconceitos [..] Crer em preconceitos é cômodo 
porque afirma nossas ações anteriores. (HELLER, 1985 p.47) 
 
 
Deste modo, a crença em preconceitos não nos faz alterar o cotidiano e questionar o 
antes posto como verídico. Ela se faz necessária a toda uma compreensão de realidade e saber. 
Dependendo de quão elevado é nosso preconceito, mais difícil e doloroso é questioná-lo, pois, 
tal questionamento pode nos levar a descrer no que anteriormente nos era indiscutível. 
Assim é gerada uma cultura heterossexista que, de acordo com o site “ABALO”, 
consiste em: 
 
Nomear uma opressão paralela, que suprime os direitos das lésbicas, gays e 
bissexuais. Heterossexismo descreve uma atitude mental que primeiro 
categoriza para depois injustamente etiquetar como inferior todo um 
conjunto de cidadãos. Numa sociedade heterossexista, a heterossexualidade 
é tida como normal e todas as pessoas são consideradas heterossexuais, salvo 
prova em contrário. O heterossexismo está institucionalizado nas nossas leis, 
órgãos de comunicação social, religiões e línguas. Tentativas de impor a 
heterossexualidade como superior ou como única forma de sexualidade são 
uma violação dos direitos humanos, tal como o racismo e o sexismo, e 
devem ser desafiadas com igual determinação. (MORAES, 2007. on-line) 
 
Em reportagem da revista Época de abril de 2009 é explicitado como o preconceito 
permeia a sociedade como um todo e por meio de fatos ocorridos em ambiente escolar, a 
publicação comprova que a homofobia pode ser encontrada em todas as classes sociais, 
independente do grau de formação 
 
Quando era aluno de colégio federal do Rio de Janeiro, Pedro Gabriel Gama 
fez um protesto na escola contra a falta de água. No dia seguinte à 
manifestação, Pedro ouviu do diretor do colégio que sua atitude não era 
"coisa de homem, e sim de veado". O estudante não reagiu. "Nem sabia que 
aquilo se chamava homofobia", afirmou. [..] 
No começo do ano, Daniel foi recusado em sete escolas particulares de São 
Paulo. Ele é transexual, um menino que se sente e age como uma menina. Só 
conseguiu vaga em uma escola especial, para alunos com alguma 
deficiência. [...] 
Em Piracicaba, interior de São Paulo, um aluno move ação contra a 
Secretaria de Educação. No meio de uma aula sobre fotossíntese, no ano 
passado, o professor se recusou a lhe entregar uma apostilha. “As bichinhas 
não precisam desse material”, disse. (ARANHA, 2009 p. 87) 
 
 
Ao invés de encontrarmos uma educação libertária, nos deparamos com educadores 
que são engendrados no preconceito. A educação para a diversidade é simplesmente 
inexistente, afinal, nas escolas só se é ensinado que a heterossexualidade é o modo correto de 
se viver, deste modo se explicita apenas a heteronormatividade como algo natural. 
 
[...] em uma educação de base e de construção positiva no sentido da 
igualdade, respeitando sempre a diversidade. No caso da discriminação, a 
penalização deve ser o mais imediata possível e devem ser considerados 
estes atos discriminatórios como crimes, sejam eles comissivos ou 
omissivos. [...] Todos temos preconceitos. Em diferentes escalas e graus. 
Não temos como fugir deles. Eles vêm arraigados como nossa cultura. 
Entretanto, reconhecer o preconceito é a principal arma que temos para lutar 
contra ele”. (SCHNEIDER, 1999, p.1 apud NETO, 2001 p.37) 
 
 
Ao afirmarmos que todos possuem algum tipo de preconceito em nossa sociedade, não 
podemos excluir os próprios homossexuais. Assim, ao refletir também o que a sociedade 
pensa, a sua autoaceitação se apresenta como sendo um período extremamente confuso, 
conflitante e delicado. 
Segundo Pinheiro 
 
O primeiro desafio dos gays e lésbicas é aceitar seu desejo sexual. Nessa 
fase, eles são tomados por uma onda de questionamentos. Isso vai passar? 
Será que não é doença da qual posso me livrar? [...] Ao perceber que a opção 
sexual não é passageira, o garoto e a garota entram num momento tenso, o 
da iniciação propriamente dita, em que se misturam as angustias da primeira 
vez dos heterossexuais com a sensação de que algo muito estranho e 
indesejável (mas ao mesmo tempo irresistível) está por acontecer. 
(PINHEIRO, 2000, p. 108 apud NETO, 2001 p.39) 
 
A ideologia dominante que dita os parâmetros sociais trata o homossexual como 
promíscuo, efeminado, indivíduo com a sexualidade e pensamentos deturpados. E é assim que 
grande parcela da sociedade acredita ser o homossexual. 
 
2. Desenvolvimento 
 
Parâmetros estereotipados e difundidos pela sociedade atingem também os pais de 
homossexuais, como podemos demonstrar a seguir, a partir de alguns relatos retirados do 
site da primeira ONG (Organização Não Governamental) brasileira fundada para acolher pais 
de homossexuais que ainda não aceitam a orientação de seu filho(a). O Grupo de Pais de 
Homossexuais (GPH) é presidido por Edith Modesto, escritora, professora universitária e 
pesquisadora, mestra e doutora em Semiótica francesa pela Universidade de São Paulo (USP) 
 
e escritora de ficção juvenil e de livros para adultos sobre homossexualidade. É autora do 
livro “Vidas em arco-íris – Depoimentos sobre a homossexualidade”, escrito a partir de 89 
entrevistas com homens e mulheres homossexuais, de 15 a 62 anos. 
Em seu trabalho de orientação para pais de homossexuais, Edith obteve as seguintes 
falas: 
 
 Mãe 1 
 “Eu e meu marido já fomos dirigentes por dois mandatos do Encontro 
de Casais com Cristo em paróquias de São Paulo e já dirigimos o ECC 
– Encontro de Casais com Cristo, desde 1981, em diversas paróquias. 
Também fomos dirigentes de Grupo de Jovens, de 1995 a 2000. Foi 
quando soube da homossexualidade do (nome do filho) e me afastei 
de todas as pastorais. Quando nos afastamos da igreja, eu e o (nome 
do marido), estávamos fazendo o curso de preparação para Ministros 
da Eucaristia, na Catedral da Sé, em São Paulo. Eu, meu marido e 
meus filhos, fomos atuantes em quase todas as pastorais de importante 
paróquia de São Paulo, por 20 anos. Depois de entrar para o GPH – 
Grupo de Pais de Homossexuais, estamos voltando, fomos convidados 
a fazer parte do Conselho das Pastorais, mas não aceitamos, 
preferimosatuar um pouco mais, ser mais um servidor, sem cargos. 
Ainda não tenho coragem de virar a vidraça, por mais que todos 
tenham compreendido e terem sido solidários com „o nosso 
problema‟, a homossexualidade do (nome do filho), sei que muitos 
irão falar que não somos uma família “modelo de exemplo” para a 
comunidade.” (MODESTO, Coluna Depoimentos. on-line) 
 
 
 
No depoimento acima encontramos o conflito presente em uma família atuante na 
Igreja Católica. A mãe apresenta já ter atuado no Encontro de Casais com Cristo (ECC) e 
também no Grupo de Jovens. È interessante notar que quando descoberta a homossexualidade 
do filho o casal obrigou-se a se afastar das pastorais católicas, o que provavelmente se dá pelo 
cunho pecaminoso que a homossexualidade carrega dentro da religião. 
A família sofre um processo de isolamento temendo o julgamento da comunidade 
católica. O depoimento dá-nos a impressão de que mesmo após a turbulência da descoberta e 
idas e voltas à vida católica, o preconceito está intimamente embutido na família e esta já não 
se vê merecedora das bênçãos da comunidade. Embora citado o medo de que outros não os 
acharão mais modelo de família, a recusa em retomar as antigas funções nas pastorais nos 
indicam que a própria família não se enxerga mais deste modo. 
 
 Mãe 3 
 “Acho que foi o momento mais sofrido de toda a minha existência! O meu 
mundo foi destruído na totalidade. Meus sonhos, dilacerados. Meu filho não 
parecia mais meu filho. Era o fim de tudo! Pensei que enlouqueceria que não 
resistiria a tanto sofrimento. Chorei dias e dias seguidos. Não comia, não 
 
dormia, não conseguia trabalhar. Fiquei doente. Menstruei fora da época, 
vomitava, tinha diarréia. Meu único pensamento era esse: Como aceitar que 
o meu filho, querido e amado, inteligente, íntegro, honesto, não passava de 
uma “bicha”? O que eu conhecia sobre o mundo dele era negro. Era muito 
nojento. Era promíscuo. Por tempos, sofri sozinha... Estava de luto.... Li 
livros, textos e tudo que surgia na minha frente... Descobri então o Grupo de 
Pais de Homossexuais. Parece que uma porta se abria para mim. Edith me 
recebeu de braços abertos e me mostrou que eu não estava sozinha. Como 
eu, muitos pais e mães passavam pelo mesmo processo, inclusive ela. Uns 
passavam por processos mais dolorosos; outras, menos. Existiam mães 
desesperadas, mães, como eu, em processo de aceitação e outras que já 
tinham aceitado. Era o cantinho que eu precisava... No grupo, ninguém 
estava ali pra me apontar, me criticar. Pelo contrário, as pessoas estavam ali 
para uma ajuda mútua, para se aconchegar, para que pudessem chorar todas 
as suas lágrimas, ter um colo. Penso que todos os pais como eu, que se 
encontrassem nessas condições e tivessem a chance de encontrar um grupo 
de apoio, as coisas seriam menos sofridas. Apenas 1 ano se passou desde a 
minha descoberta, mas a relação com o meu filho é excelente. Somos 
parceiros, somos mãe e filho, integrados...” (MODESTO, Coluna 
Depoimentos. on-line) 
 
 
Assim como o filho que um dia se enxerga homossexual e tem que lidar com uma 
nova forma de viver, os pais também sofrem um processo parecido. 
 A escritora Edith cita que para alguns pais se trate até mesmo de uma forma de luto. 
Pois, todos os planos idealizados aos filhos são desfeitos e desta forma, é preciso que novos 
planos sejam gerados. Porém, com um agravante, é necessário reiniciar um processo de 
reconhecimento de seu filho. Fazer analises de quais são os seus reais desejos, e não aqueles 
por ele explicitados anteriormente, que mascaravam a realidade presente no seu desejo. Isto 
se dá em todas as instâncias da vida. Não se diz apenas à orientação sexual, mas também às 
escolhas de profissão, ter ou não filhos, enfrentamento social, etc. 
Também assim como o filho, os pais se imaginam serem únicos. Não sabem com 
quem e nem como partilhar estes novos sentimentos. Ao contrário de seus filhos que um dia 
acabam por encontrar iguais, sejam em guetos, bares, boates dedicados ao grupo GLS, os pais 
dificilmente os encontram e passam por esse processo sozinhos. 
Habitualmente, os pais procuram nas suas religiões o acolhimento necessário. 
Infelizmente, poucos procuram por ajuda, realmente especializada e caem nos estigmas 
pressupostos pelas religiões. 
Um grupo como o GPH é de extrema importância, como verificado no depoimento 
anterior. Pois, ao encontrarem pais na mesma situação, podem, aos poucos, se afastarem da 
sensação de solidão, estranheza e desconformidade que os invadem quando acontece o 
descobrimento. 
 
 
 Depoimento de uma mãe que é terapeuta 
 “Antes de saber que eu era mãe de gay, mesmo sendo terapeuta e estudando 
sobre sexualidade eu acreditava também que era opcional. A pessoa escolhia 
por se sentir mais atraída e tal pelo mesmo gênero. Só depois que conheci o 
GPH passei a me interessar por tudo que falam sobre isso: opiniões, 
fundamentos teóricos e também de me dar conta de que já tinha a 
experiência própria de ter percebido que meu filho, desde bem pequeno, 
quando não podia escolher nada e nem sabia direito o que estava fazendo, já 
se comportava diferente é que me convenci de que eles „foram escolhidos‟, 
como bem diz a Edith, e „não escolheram‟...” (MODESTO, Coluna 
Depoimentos. on-line) 
 
 
Neste caso, notamos que até mesmo uma mãe, que se espera maior conhecimento 
sobre a sexualidade humana e todas as suas nuances, por se tratar de uma terapeuta apresenta 
um desconhecimento sobre o tema. 
 Ainda que não se tenha nenhum estudo cientifico que ateste as causas e motivações 
que levam alguém a apresentar uma orientação sexual diferente da heterossexualidade, 
esperava-se que uma mãe terapeuta, dialogasse com várias teorias sobre o assunto e não que 
apresentasse, simplesmente, uma ideia amplamente manifestada pelo senso comum. 
A relevância deste depoimento esta em apontar que a alienação, mistificação, 
desconhecimento e também desinteresse sobre a homossexualidade esta presente em todos os 
níveis sociais e acadêmicos. 
 
 Pai 2 
 “Quando soubemos da orientação sexual do nosso filho, eu e a minha 
companheira, tivemos a sensação que não teríamos forças suficientes para 
suportar tamanha dor. Foi como se me arrancassem o coração pela boca, o 
cérebro explodisse, e tudo sem nenhuma anestesia, a seco. Para mim, foi um 
período de trevas, desespero, muito, muito, muito choro, sem nenhuma luz 
no fim do túnel. Queria achar alguma justificativa, culpados, aonde eu errei, 
culpei esta vida e até Deus por permitir que esta desgraça atingisse a minha 
família. Por que conosco, que sempre fomos pessoas boas, honestas, que só 
praticamos o bem?... Desprezei a todos, principalmente o meu filho, 
renegando-o, achado que havia criado um mau caráter, por haver optado em 
ser homossexual e ter uma vida marginal.... (Nome) que nos indicou a Edith. 
Foi nossa corda para sairmos do poço e ver uma luz no fim do túnel. Fomos 
acolhidos com muito amor, carinho e generosidade. Podíamos discutir, 
desabafar e aprender com nossos pares. Tenho orgulho de estar me 
empenhando com todas as minhas forças, junto com a minha companheira e 
junto com meus amados filhos, e diariamente estarmos nos aceitando e nos 
amando com mais intensidade e respeito, admitindo os desígnios do 
desconhecido. Também tenho orgulho e o privilégio de pertencer a esta 
ONG e ter a oportunidade de acolher os próximos pais que estão precisando 
de ajuda, como nós fomos acolhidos e ajudados um dia.” (MODESTO, 
Coluna Depoimentos. on-line) 
 
 
Ainda que se apresentem mães e pais de vivências tão díspares, a característica mais 
marcante encontrada nos relatos diz respeito à dor e ao preconceito que seus filhos e filhas 
serão vítimas. Em nenhum depoimento se vislumbra a possibilidade de encontro da felicidade 
para um filho homossexual. Apenas ao indício de uma provável homossexualidade imagina-se 
dor e privações durante todaa vida. 
Há aqueles que se indagam sobre onde foram cometidos erros na criação de seus filhos 
(a tão repetida frase “Onde foi que eu errei?”), que possa ter gerado neles desejos impróprios 
ou desvios comportamentais e há ainda, os que fazem da condição homossexual de seus filhos 
fonte para suas próprias dores e angústias, como se suas vidas fossem interrompidas por uma 
terrível tragédia. 
 
 Pai 1 
“Quando soubemos o que estava acontecendo com nossa adorada filha, 
tivemos uma reação de impacto muito grande, fomos a terapeutas, religiosos, 
pessoas que deram as mais diversas opiniões, na sua maioria nada 
aproveitáveis. Não sabíamos o que fazer, o sofrimento tomando conta da 
família (nada de parentes, pois os mesmos só atrapalharam nas suas 
colocações).(MODESTO, Coluna Depoimentos. on-line) 
 
 
Na grande maioria das vezes, esses pais não se dão conta da dor que tal reação causa 
nos filhos e procuram todos os tipos de “tratamentos” para que alcancem a paz tão desejada 
para si, deixando o filho em segundo plano. 
Ainda é muito forte em nossa sociedade a ideia de que a homossexualidade se 
encontra no rol das opções, demonstrando que tal vivência se apresenta aos olhos do senso 
comum apenas como “escolha”, uma forma de transgressão, de rebeldia contra os parâmetros 
de normalidade impostos pela sociedade, de safadeza, promiscuidade e vadiagem ou ainda 
pior, de que a mesma seria uma doença. 
Mesmo os pais que aceitam “tranquilamente” a condição sexual de seus filhos, os 
imaginam solitários e angustiados. E quando são surpreendidos ao serem apresentados aos 
pares de seus filhos, se assustam, se veem absortos em ideias de certo ou errado, pois o 
relacionamento e sexualidade do filho se materializa como real, e desta forma, imutável, o que 
antes ficava somente no abstrato, tendo de se confrontar com uma situação, no mínimo 
constrangedora, uma vez que imaginam que os atos, práticas e preferências de seu filho 
seriam restritos aos guetos e nunca adentrariam seu lar. 
 
Em palestra
5
 Edith salientou que não raramente recebe e-mails de jovens adolescentes 
que a chamam de “mãe”. Para ela isso se dá, principalmente, quando os pais destes jovens não 
aceitam sua orientação sexual. Edith declarou que o jovem necessita neste momento de 
acolhimento e, principalmente, de uma identificação com o carinho materno que por ora, foi 
perdido. E nem sempre é restaurado. 
A não aceitação do indivíduo homossexual no meio familiar é uma das principais 
problemáticas enfrentadas pelo homossexual. 
 
 O preconceito manifesto pelos familiares, amigos, contamina o adolescente. 
Ele encampa em parte o preconceito contra ele próprio. Ele se vê entre o 
prazer de estar com seu amigo, e uma culpabilidade e uma solidão que ele 
não sabe reconhecer muito bem. Nada disso facilita qualquer forma de 
afirmação, e encaminha para comportamentos depressivos e para uma vida 
dupla: precisa esconder, manter aparentemente, uma vida como os outros 
querem e, às escondidas, satisfazer os seus amores e desejos. (PINSKY, 
2001 p.20) 
 
 
A rejeição do jovem homossexual em sua família faz com que o próprio não se 
reconheça mais como elemento integrante da mesma, produz em si uma sensação de 
estranhamento e anormalidade, provocando desde a ruptura dos vínculos familiares, à 
situações de depressão e, em casos mais graves, o suicídio. Levantamentos apontam que o 
índice de suicidas entre homossexuais é três vezes maior que entre os heterossexuais (Mott, 
2000). 
 
3. Considerações finais 
 
Há ainda um grande conservadorismo oculto em toda a sociedade quando falamos de 
sexo e sexualidades. Mesmo que o sexo esteja por toda a parte, na mídia, na televisão, na 
literatura, entre outras, a sua discussão é esvaziada e pontual, sendo apenas citado o sexo 
heterossexual; deste modo, fala-se muito sobre sexo e pouco sobre sexualidade. 
Aos pais e professores é incumbida a tarefa de educação sexual, porém além do 
desconhecimento e preconceito, eles têm medo de estarem, de alguma forma, incentivando a 
sexualidade nas crianças e assim tal discussão fica atrelada á mídia, aos amigos, às 
experiências pessoais e/ou á modelos estereotipados e pré-concebidos. 
 
5 III Encontro da Diversidade Sexual de Franca e Região, ocorrida no dia 29 de outubro de 2009. 
 
 Em um país onde existe uma grande população de crença cristã a educação é falha 
temos a mídias televisivas e a igrejas, sobretudo a católica com o papel de educador e 
regulador sobre todo e qualquer assunto. 
As expressões da religião permeiam todas as esferas da vivência em sociedade, por 
isso não é difícil entender o quão é sofrido a aceitação de outras orientações sexuais do que 
daquela imposta pelas religiões, haja vista que esta imposição nas escrituras sagradas é 
amplamente discutida por filósofos, teólogos, historiadores e religiosos. 
Assim, a possibilidade de educação para a superação de preconceitos não é 
satisfatória, se esta não for dirigida a uma meta específica. Os conceitos difundidos tanto pela 
educação formal quanto pelas religiões e outros setores da sociedade estão atrelados ao 
consenso social e a moral religiosa, assim sendo perde-se o foco das discussões coletivas e 
concentra-se nas de cunho pessoal. 
Conceitos de liberdade, igualdade, equidade, preconceito, cidadania, democracia, 
sexualidade estão atrelados a outro conceito, o de ditadura. Uma "ditadura" dos costumes, 
impostos por uma maioria, e neste caso, a heterossexista que, não considera a ideia de 
discuti-los por temer a perda de poder e controle. 
O Estado, por outro lado, como mantenedor do controle social, ora abre discussões 
com a sociedade, ora as ignora como forma de manter-se e/ou aparentar-se “democrático”, 
mas sem mudar a ordem estabelecida, desta forma têm se uma falsa impressão de que se 
abriram novos espaços para discussões de temas relevantes, porém, que ainda são tabus em 
nosso país. 
 Não basta incluir o direito da livre orientação sexual em códigos de ética 
profissionais, ou apresentar somente os anos de dívida que a sociedade tem para com os 
negros por conta de séculos de cultura escravista. Se não forem geradas culturas e debates 
laicos focalizados em temas que engendram a sociedade estaremos fadados a uma cultura 
discriminatória, ainda que velada. 
A convivência familiar é complexa e cada família tem comportamento próprio e um 
ideal. Sempre haverá pessoas que acreditam existir alguma "anormalidade" em sua família e 
que, como diz o ditado, a família do vizinho que é perfeita e isso o faz sentir-se 
incompetente. Contudo, nem sempre se pode fazer uma interpretação de comportamento de 
uma família, pois, a própria sociedade impõe mudanças que alteram os comportamentos, da 
família ou de algum de seus membros. Por vezes, isto ocorre de maneira tão natural que 
passa despercebido pelo grupo. 
 
 
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