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Geografia_e_giro_descolonial_experiencia (1)

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EXPERIÊNCIAS, IDEIAS E HORIZONTES 
DE RENOVAÇÃO DO PENSAMENTO CRÍTICO
GEOGRAFIA E 
GIRO DESCOLONIAL
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Valter do Carmo Cruz 
Denílson Araújo de Oliveira (org.)
Valter do C
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enílson Araújo de O
liveira (org.)
Coleção espaço, território e paisagem
Valter do Carmo Cruz • Carlos Walter Porto-Gonçalves • 
Renato Emerson dos Santos • Denílson Araújo de Oliveira • 
Gabriel Siqueira Corrêa • Carolina de Freitas Pereira • 
Jorge Montenegro e Otávio Gomes Rocha • 
Simone Raquel Batista Ferreira • Marilda Teles Marcai • 
Marcelo Argenta Câmara • Eduardo Barcelos • 
Marcos Vinícius da Costa Lima • Edir Augusto Dias Pereira • 
Mateus de Moraes Servilha • Claudio Barría Mancilla • 
Lina María Hurtado Gómez
O presente livro é um desdobramento 
do I Seminário Geografa e giro 
descolonial: experiências, pensamentos 
e horizontes de renovação do 
pensamento crítico realizado em 
novembro de 2014 na Universidade 
Federal Fluminense-UFF. Tal 
seminário foi organizado pelos grupos 
de pesquisa NETAJ/UFF (Núcleo 
de Estudos Sobre Territórios, Ações 
Coletivas e Justiça) e NEGRA/FFP-
UERJ (Núcleo de Estudo e Pesquisa 
em Geografa Regional da África e da 
Diáspora) com apoio do Programa 
de Pós-Graduação em Geografia da 
Universidade Federal Fluminense – 
POSGEO-UFF.
O seminário teve como objetivo reunir 
um conjunto de pesquisadores(as) 
que, em sua maioria, foram ou 
são alunos(as) ou professores(as) 
do Programa de Pós-Graduação 
em Geografia da Universidade 
Federal Fluminense – UFF e que 
vêm desenvolvendo pesquisas que 
se orientam por uma perspectiva 
epistêmica, ética e política, alinhados 
com ou inspirados no chamado 
pensamento descolonial latino-
americano.
O livro que o leitor tem em mãos 
é o resultado desse rico, profundo 
e desafiante esforço coletivo para 
se estabelecer um diálogo mais 
efetivo entre a geografia brasileira 
e o pensamento descolonial latino-
americano. Os textos fazem uma 
crítica a colonialidade do saber e 
ao eurocentrismo como narrativa 
colonial do mundo que subalterniza 
saberes, culturas, grupos, povos e 
territórios. Afirmam a necessidade 
de uma descolonização que 
valorize outras racionalidades, 
outras epistemes, outras formas de 
saber, viver e existir oriundas das 
experiências de re-existências dos 
grupos subalternizados.
Trata-se de um pequeno passo 
em uma longa caminhada ainda a 
ser percorrida para a construção 
de uma “biblioteca descolonial” 
a partir da geografia produzida 
em nosso país. Esperamos que tal 
obra cumpra o papel de fomentar e 
ampliar o interesse e os debates entre 
os geógrafos(as) sobre os temas e 
questões aqui tratados.
 
 Valter do Carmo Cruz 
e Denílson Araújo de Oliveira
capa_geografia_UFF.indd 1 27/1/17 14:59
GEOGRAFIA E GIRO DESCOLONIAL: 
EXPERIÊNCIAS, IDEIAS E HORIZONTES 
DE RENOVAÇÃO DO PENSAMENTO CRÍTICO
miolo_geografia_UFF.indd 1 30/01/17 17:16
Conselho Editorial
Arlete Moyses Rodrigues (UNICAMP)
Carlos Walter Porto Gonçalves (UFF)
Doralice Satyro Maia (UFPB)
Heloisa Soares De Moura Costa (UFMG)
Marcio Piñon De Oliveira (UFF)
Olga Lucia C. De Freitas Firkowski (UFPR)
Orlando Alves Dos Santos Jr (UFRJ)
Rogério Haesbaert (UFF)
Ruy Moreira (UFF)
Sandra Lencioni (USP)
miolo_geografia_UFF.indd 2 30/01/17 17:16
Valter do Carmo Cruz 
e Denílson Araújo de Oliveira
(Organizadores)
GEOGRAFIA E GIRO DESCOLONIAL: 
EXPERIÊNCIAS, IDEIAS E HORIZONTES 
DE RENOVAÇÃO DO PENSAMENTO CRÍTICO
Valter do Carmo Cruz • Carlos Walter Porto-Gonçalves • 
Renato Emerson dos Santos • Denílson Araújo de Oliveira
• Gabriel Siqueira Corrêa • Carolina de Freitas Pereira
• Jorge Montenegro • Otávio Gomes Rocha • 
Simone Raquel Batista Ferreira • Marilda Teles Maracci • 
Marcelo • Argenta Câmara • Eduardo Barcelos • 
Marcos Vinícius da Costa Lima • Edir Augusto Dias Pereira • 
Mateus de Moraes Servilha • Claudio Barría Mancilla • 
Lina María Hurtado Gómez
miolo_geografia_UFF.indd 3 30/01/17 17:16
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
G31
Geografia e giro descolonial: experiências, ideias e horizontes de renovação do pensamento 
crítico / organização Valter do Carmo Cruz, Denílson Araújo de Oliveira. -- 1. ed. -- Rio de 
Janeiro : Letra Capital, 2017. 
 388 p. : il. ; 16x23 cm. 
 Inclui bibliografia
 ISBN: 978-85-7785-512-4
 1. Movimentos sociais. 2. Geografia humana. I. Cruz, Valter do Carmo. II. Oliveira, Denílson 
Araújo de.
17-39173 CDD: 325
 CDU: 327
© 2017 by Valter do Carmo Cruz e Denílson Araújo de Oliveira
Direitos desta edição reservados a Letra Capital Editora - Av. Treze de Maio, 13, sala 1301 - Centro CEP 20031-901 
Tels. (21) 3553-2236 2215-3781 - www.letracapital.com.br E-mail: vendas@letracapital.com.br
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Editora.
Coleção: Espaço, Território e Paisagem
Coordenação: Jorge Luiz Barbosa e Ester Limonad
Estagiários: Renata Scansetti e Jhonatan N. Perlingeiro
Projeto gráfico, produção editorial e diagramação: REC design
Copidesque e revisão gráfica: REC design
Capa: REC design (Montagem com base no mural El hombre en el cruce de caminos de Diego Riviera -1933)
Proibida a reprodução, total ou parcial, por qualquer meio ou processo, seja reprográfico, fotográfico, gráfico, microfil-
magem etc. Essas proibições aplicam-se também às características gráficas e/ou editoriais. A violação dos direitos auto-
rais é punível como crime (Código Penal, art. 184 e §§; Lei 6.895/80), com busca, apreensão e indenizações diversas 
(Lei 9.610/98 – Lei dos Direitos Autorais – arts. 122, 123, 124 e 126).
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
Reitor 
Sidney Luiz de Matos Mello
Vice-Reitor 
Antônio Claudio Lucas da Nóbrega
Pró-Reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação 
Roberto Kant de Lima
Programa de Pós-Graduação em Geografia
Coordenador 
Marcio Piñon de Oliveira
Subcoordenador 
Rogério Haesbaert
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APRESENTAÇÃO 9
I – GEOGRAFIA E GIRO DESCOLONIAL: EXPERIÊNCIAS, IDEIAS E 
HORIZONTES DE RENOVAÇÃO DO PENSAMENTO CRÍTICO 
Geografia e pensamento descolonial: notas sobre um diálogo necessário para 
a renovação do pensamento crítico 15 
Valter do Carmo Cruz 
De saberes e de territórios: diversidade e emancipação a partir da 
experiência latino-americana 37 
Carlos Walter Porto-Gonçalves
II – RAÇA, ESPAÇO E COLONIALIDADE DO PODER, DO SABER E DO SER
O movimento negro brasileiro e sua luta antirracismo: por uma perspectiva 
descolonial 57 
Renato Emerson dos Santos
Colonialidade, biopolítica e racismo: uma análise das políticas urbanas na 
cidade do Rio de Janeiro 77 
Denílson Araújo de Oliveira
O branqueamento do território como dispositivo colonialidade do poder: 
notas sobre o contexto brasileiro 117 
Gabriel Siqueira Corrêa
Racismo, espaço e colonialidade do poder, do saber e do ser: diálogos, 
trajetórias e horizontes de transformação 131 
Carolina de Freitas Pereira
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III – POVOS INDÍGENAS E COMUNIDADES TRADICIONAIS E AS LUTAS 
PELA DESCOLONIZAÇÃO DO SABER, DO PODER E DO TERRITÓRIO
A ordem moderno-colonial do desenvolvimento: desafios críticos desde uma 
leitura das práticas e das vozes das comunidades tradicionais 
Jorge Montenegro e Otávio Gomes Rocha 145
Conflitos territoriais e a explicitação de matrizes de racionalidade divergen-
tes: projetos desenvolvimentistas e a emergência de r-existências dos povos e 
comunidades tradicionais no Espírito Santo 179 
Simone Raquel Batista Ferreira
Percursos descoloniais nas lutas territoriais dos Tupiniquim e dos Guarani 
Mbyá no Espírito Santo 209 
Marilda Teles Maracci
Pensar a colonialidade, praticar a descolonização: apontamentos para uma 
prática contra-hegemônica 247 
Marcelo Argenta Câmara
Povos e comunidades tradicionais, conflitos territoriaise lutas pela 
descolonização do saber, do poder e do território 261 
Eduardo Barcelos
As múltiplas faces da colonialidade hegemônica na genealogia das práticas 
territoriais do movimento indígena, a partir da segunda metade do século 
XX no Brasil 271 
Marcos Vinícius da Costa Lima
IV – REPRESENTAÇÕES E IMAGINÁRIOS GEOGRÁFICOS (DES)COLONIAIS
Horizonte geográfico do imaginário moderno-colonial e as representações 
espaciais da Amazônia 301 
Edir Augusto Dias Pereira
Região, colonialidade e subdesenvolvimento 321 
Mateus de Moraes Servilha
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Memória, imaginário descolonial e aura da arte e da cultura popular na 
nossa América 345 
Claudio Barría Mancilla
Conflictos por la representación y las prácticas, por los saberes y haceres en 
las fronteras internas colombianas: el caso de La Macarena 369 
Lina María Hurtado Gómez
SOBRE OS AUTORES 383
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Apresentação
O presente livro é resultado de um seminário realizado no mês de novembro 
de 2014 na Universidade Federal Fluminense denominado I Seminário Geografia 
e giro descolonial: experiências, pensamentos e horizontes de renovação do pensamen-
to crítico. Tal seminário foi organizado pelos grupos de pesquisa NETAJ/UFF 
(Núcleo de Estudos Sobre Territórios, Ações Coletivas e Justiça) e NEGRA/FFP-
-UERJ (Núcleo de Estudo e Pesquisa em Geografia Regional da África e da Diás-
pora) com apoio do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade 
Federal Fluminense – POSGEO-UFF.
O seminário teve como um dos objetivos reunir um conjunto de pesquisa-
dores que, em sua maioria, foram ou são alunos ou professores do Programa de 
Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense – UFF e que 
vêm desenvolvendo pesquisas que se orientam por uma perspectiva epistêmica, 
ética e política, alinhados com ou inspirados no chamado pensamento descolo-
nial latino-americano. Esses pesquisadores, na sua maioria geógrafos, exercem 
suas atividades de pesquisa, ensino e extensão em diferentes universidades, locali-
zadas em diversas regiões do Brasil, a exemplo de pesquisadores do Sudeste (Rio 
de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo), do Sul (Paraná e Rio Grande do Sul) 
e da Amazônia (Pará). O seminário contou ainda com a participação de colegas 
de países latino-americanos como Colômbia e Chile. Além dos pesquisadores, o 
evento teve a importante participação de diferentes movimentos sociais, como é 
caso do movimento negro, do movimento indígena, do movimento camponeses, 
atingidos por grandes projetos, e outros.
Os pesquisadores reunidos no seminário também realizaram uma homenagem 
a Carlos Walter Porto-Gonçalves, professor do Departamento e do Programa de 
Pós-Graduação em Geografia na Universidade Federal Fluminense – UFF e co-
ordenador do Laboratório de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades 
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GEOGRAFIA E GIRO DESCOLONIAL10
– LEMTO, abrigado nessa mesma instituição. A homenagem foi o reconheci-
mento do pioneirismo que o professor Carlos Walter Porto-Gonçalves exerceu e 
exerce no debate do chamado pensamento descolonial na geografia brasileira. Há 
mais de uma década e meia o professor vem contribuindo através de seus escritos, 
palestras, aulas, organizações de eventos e orientações de graduação, mestrado e 
doutorado para construção e divulgação de uma geografia crítica em chave desco-
lonial. Essa influência está expressa pela relação e a colaboração dos autores deste 
livro com a obra do professor homenageado. Reafirmando essa homenagem, con-
tamos com um texto de sua autoria na presente publicação.
O livro está estruturado em 16 capítulos distribuídos em quatro partes. Essa 
configuração reproduz, em grande parte, a estrutura do seminário e reproduz a 
intervenção de cada participante nas mesas do evento.
A primeira parte, denominada “Geografia e giro descolonial: experiências, 
ideias e horizontes de renovação do pensamento crítico”, corresponde ao diálogo 
de abertura do seminário, tem um caráter introdutório ao debate e é composta 
por dois textos de caráter mais teórico de autoria de Valter do Carmo Cruz e Car-
los Walter Porto-Gonçalves. Nessa sessão inaugural é apresentada aos leitores uma 
reflexão sobre as principais linhas de força que constituem o chamado pensamen-
to descolonial, um pouco da sua história, suas bases conceituais e os desafios que 
implicam o diálogo entre esse campo de pensamento e a geografia como campo 
disciplinar. Os textos apontam uma crítica ao eurocentrismo como narrativa co-
lonial do mundo e afirmam para a necessidade de valorização de outras epistemes, 
outras formas de saberes como fundamento para um projeto de emancipação que 
passa pela descolonização do poder, do saber, do ser e da natureza. 
A segunda parte, denominada de “Raça, espaço e colonialidade do poder, do 
saber e do ser”, é composta por quatro textos de autoria de Renato Emerson 
dos Santos, Denílson Araújo de Oliveira, Gabriel Siqueira Corrêa e Carolina de 
Freitas Pereira respectivamente. Os textos têm como centralidade o debate da 
raça e do racismo como ponto estruturante da colonialidade do poder como pa-
drão histórico, relações de poder que historicamente configuraram desigualdades, 
opressões, formas de classificação social e subalternizações em nossa sociedade. 
Esse processo tem uma geograficidade, pois ela é constitutiva da produção social 
do espaço, de uma racialização do espaço expressa nas velhas e novas políticas de 
branqueamento do território. Mas esse processo foi e é historicamente marcado 
por múltiplas formas de resistências cotidianas ou organizadas, como, por exem-
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Org. Valter do Carmo Cruz e Denílson Araújo de Oliveira 11
plo, o movimento negro, que vem construindo discursos e práticas antirracistas 
e descoloniais. Os textos nos oferecem reflexões teóricas, históricas e geográficas 
que nos mostram o antagonismo entre, por um lado, o racismo como um padrão 
de poder que produz, organiza e regula as relações e práticas socioespaciais e, por 
outro lado, as lutas e práticas de resistências que buscam criar contraespaços an-
tirracistas e descoloniais.
A terceira parte, intitulada “Povos indígenas e comunidades tradicionais e as 
lutas pela descolonização do saber, do poder e do território”, é composta por seis 
textos de autoria de Jorge Montenegro e Otávio Gomes Rocha, Simone Raquel 
Batista Ferreira, Marilda Teles Maracci, Marcelo Argenta Câmara, Marcos Viní-
cius da Costa Lima e Eduardo Barcelos respectivamente. Os textos nos mostram 
como os povos indígenas, as comunidades quilombolas, faxinalenses e outros po-
vos e comunidades tradicionais vêm se defrontando com as políticas moderno-co-
loniais de desenvolvimento do Estado e do grande capital que vem colonizando 
seus territórios. Os autores nos mostram como esses grupos subalternizados vêm 
construindo práticas de re-existência fundadas em outras racionalidades, saberes 
e formas de viver e existir. A luta pelas condições materiais de vida, por dignidade 
e por autonomia ganha forma e materialidade na luta pelo direito ao território. 
A luta pela descolonização de poder, de saber e do ser para esses povos só tem 
sentido se for luta pela descolonização dos seus territórios de vida. Os autores nos 
trazem as experiências concretas de luta e resistência de povos e comunidades que 
em suas práticas cotidianas constroem outras possibilidades de vida.
A quarta e última parte, “Representações e imaginários geográficos (des)colo-
niais”, é composta por quatro textos de autoria de Edir Augusto Dias Pereira, Ma-
teus de Moraes Servilha, Claudio Barría Mancilla e Lina María Hurtado Gómez 
respectivamente. Os textos têm como centralidade a crítica de como a coloniali-
dade está presente no conjunto de narrativas, discursos e representações espaciais 
produzidas pelo Estado, pela academia, pelaarte que produz e reproduz uma 
imaginário eurocêntrico moderno-colonial sobre certos grupos, povos e regiões. 
Os autores nos mostram como os dispositivos discursivos produzem estereótipos, 
estigmas e invisibilidades, negando a diversidade e a alteridade. 
O presente livro é o início de um esforço coletivo para se estabelecer um diá-
logo mais efetivo entre o pensamento descolonial latino-americano e a produção 
intelectual no campo da geografia brasileira. Trata-se de um pequeno passo em 
longo caminho ainda a ser percorrido para a construção de uma “biblioteca des-
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12
colonial” a partir da geografia produzida em nosso país. Esperamos que tal obra 
cumpra o papel de fomentar e ampliar o interesse e os debates entre os geógrafos 
sobre os temas e questões aqui tratados.
Valter do Carmo Cruz 
e Denílson Araújo de Oliveira
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I – GEOGRAFIA E GIRO DESCOLONIAL: 
EXPERIÊNCIAS, IDEIAS E HORIZONTES DE 
RENOVAÇÃO DO PENSAMENTO CRÍTICO
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Geografia e pensamento descolonial: 
notas sobre um diálogo necessário para a 
renovação do pensamento crítico
Valter do Carmo Cruz
I
Normalmente, em nossas reflexões, tratamos a nossa experiência colonial e sua 
herança como coisa do passado, colocando tal herança como algo superado com 
o fim do colonialismo. No entanto, o fim do colonialismo na América Latina, 
como relação econômica e política de dominação na segunda metade do século 
XIX, não significou o fim da colonialidade como relação social, cultural e inte-
lectual (QUIJANO, 2005). Longe de ser algo irrelevante, a colonialidade é um 
resíduo irredutível de nossa formação social e está arraigada em nossa sociedade. 
Manifestando-se das mais variadas maneiras em nossas instituições políticas e 
acadêmicas, nas relações de dominação/opressão, em nossas práticas de sociabi-
lidades autoritárias, em nossa memória, linguagem, imaginário social, em nossas 
subjetividades e, consequentemente, na forma com produzimos conhecimento. 
Esse processo de constituição da colonialidade do poder, do saber, do ser e da natu-
reza tem na conquista ibérica do continente americano seu momento inaugural. A 
partir do domínio ibérico, dois processos articuladamente conformam a nossa his-
tória posterior: a modernidade e a organização colonial do mundo. Com o início do 
colonialismo na América origina-se não apenas a organização colonial do mundo, 
mas, simultaneamente, a constituição colonial dos saberes, das linguagens, da memória 
e do imaginário (LANDER, 2005). Desse modo, inaugura-se, por um lado, o proje-
to civilizatório da modernidade, que busca afirmar e celebrar a experiência histórica 
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GEOGRAFIA E GIRO DESCOLONIAL16
particular da Europa como sendo algo universal e superior, através de elementos 
como o racionalismo, o humanismo, a ciência, a ideia de progresso, o Estado etc. 
Mas, por outro lado, nesse processo, negaram-se e subalternizaram-se outras matri-
zes de racionalidades, outras formas de razão, outros projetos civilizatórios, outras 
cosmovisões, com outros saberes, linguagens, memórias e imaginários.
Nessa perspectiva de compreensão de nossa história, é impossível pensar a mo-
dernidade sem a colonialidade; não dá para pensar nos esplendores e nos triunfos 
da modernidade ocidental sem pensar na colonialidade do poder, do saber, do ser 
e da natureza. Essa ideia implica ver a modernidade de forma indissociável da 
colonialidade. A colonialidade é parte constitutiva da modernidade e não de-
rivativa desta; a colonialidade é seu lado sombrio, oculto e silenciado. Assim, a 
modernidade/colonialidade são duas faces de uma mesma moeda (MIGNOLO, 
2003; DUSSEL, 2005). Na gênese do projeto civilizatório da modernidade está 
presente uma violência matricial do colonialismo e da colonialidade do poder, do 
saber, do ser e da natureza que, segundo Quijano (2005), é uma forma de domi-
nação fundada na crença de que existe uma “natural” superioridade étnico-racial 
e epistêmica do europeu sobre outros povos.
Santiago Castro-Gómez (2005b), analisando as formulações de Anibal Quija-
no, afirma que a colonialidade é uma forma de dominação que não visava apenas 
submeter militarmente outros povos e destruí-los pela força, mas sim visa trans-
formar sua alma com o objetivo de transformar radicalmente suas tradicionais for-
mas de conhecer o mundo e a si mesmo, e, assim, levando o colonizado a adotar o 
próprio universo cognitivo do colonizador (CASTRO-GÓMEZ, 2005, p. 58b).
Dessa forma, a colonialidade do poder, do poder, do ser e da natureza não é 
uma forma de dominação que usa exclusivamente os meio coercitivos para o 
exercício do poder; não se trata apenas de reprimir os dominados, mas também da 
instituição e naturalização do imaginário cultural europeu como única forma de 
relacionamento com a natureza, com o mundo social e com a própria subjetividade. 
Esse projeto de dominação moderno-colonial visou à mudança radical das estru-
turas cognitivas, afetivas e valorativas do colonizado (CASTRO-GÓMEZ, 2005, p. 
59-60). Isso implica vermos, segundo Aníbal Quijano, que processo de coloni-
zação significou a colonização do imaginário do colonizado materializada numa 
repressão sobre os modos de conhecer e produzir conhecimentos; em suma, uma 
colonização nos padrões de produzir conhecimentos e significação do mundo. Esse 
processo se realizou a partir de três dispositivos:
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Org. Valter do Carmo Cruz e Denílson Araújo de Oliveira 17
Em primeiro lugar, expropriaram as populações colonizadas – entre seus des-
cobrimentos culturais – aqueles que resultavam mais aptos para o desenvolvi-
mento do capitalismo e em benefício do centro europeu. Em segundo lugar, 
reprimiram tanto como puderam, ou seja, em variáveis medidas de acordo 
com os casos, as formas de produção de conhecimento dos colonizados, seus 
padrões de produção de sentidos, seu universo simbólico, seus padrões de ex-
pressão e de objetivação da subjetividade. A repressão neste campo foi reco-
nhecidamente mais violenta, profunda e duradoura entre os índios da América 
ibérica, a que condenaram a ser uma subcultura camponesa, iletrada, despo-
jando-os de sua herança intelectual objetivada. Algo equivalente ocorreu na 
África. Sem dúvida muito menor foi a repressão no caso da Ásia, onde portan-
to uma parte importante da história e da herança intelectual, escrita, pôde ser 
preservada. E foi isso, precisamente, o que deu origem à categoria de Oriente. 
Terceiro lugar, forçaram – também em medidas variáveis em cada caso – os 
colonizados a aprender parcialmente a cultura dos dominadores em tudo que 
fosse útil para a reprodução da dominação, seja no campo da atividade mate-
rial, tecnológica, como da subjetiva, especialmente religiosa. É este o caso da 
religiosidade judaico-cristã. Todo esse acidentado processo implicou no longo 
prazo uma colonização das perspectivas cognitivas, dos modos de produzir ou 
outorgar sentido aos resultados da experiência material ou intersubjetiva, do 
imaginário, do universo de relações intersubjetivas do mundo; em suma, da 
cultura. (QUIJANO, 2005, p. 237)
Nesse sentido, podemos afirmar, segundo Castro-Gómez (2005b), que a colo-
nialidade do poder, do saber, do ser e da natureza é, sobretudo, a intenção do coloni-
zador de eliminar “as muitas formas de conhecer” (e viver) dos povos subjugados e 
colonizados e substituir por outras novas formas de conhecer (e viver) que serviam 
diretamente aos propósitos dos processos civilizatórios do regime colonial. 
Trata-se de uma verdadeira violência epistêmica1, ou seja, uma forma de exer-
cício do poder que produz a invisibilidade do outro, expropriando-o de sua pos-
sibilidade de representação e de sua autorrepresentação; isto é, trata-se do apaga-
mento, do anulamentoe da supressão dos sistemas simbólicos, de subjetivação e 
representação que o outro tem de si mesmo, bem como de suas formas concretas 
de representações e registro de suas memórias e experiências. Esse processo im-
1 O conceito de violência epistêmica é usado por Santiago Castro-Gómez (2005) em um diálogo com for-
mulação da pensadora indiana Gayatri Spivak.
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GEOGRAFIA E GIRO DESCOLONIAL18
plicou aquilo que Boaventura de Sousa Santos denominou de “epistemicídio”, 
ou seja, aniquilação da diversidade e da riqueza epistêmica do mundo, resultado 
do caráter totalitário da racionalidade moderna expressa no exclusivismo epis-
temológico, pautados na ciência moderna que desqualificou e exterminou uma 
infinidade de outras epistemes, ou seja, “outras formas de conhecer”. Isso mostra 
de maneira muito clara o vínculo entre a ciência moderna e o exercício do po-
der colonial. Desse processo permaneceu uma profunda colonização epistêmica, 
inclusive no pensamento crítico, que resultou em uma cosmovisão claramente 
arraigada no eurocentrismo, expresso nas formulações teóricas, na forma como 
construímos nossos conceitos, na maneira como estabelecemos nossas interpre-
tações, comparações de fenômenos históricos e sociais e, enfim, na maneira de 
produzimos conhecimentos, modos de significação e de produção de sentido ao mundo. 
 II
A colonialidade como herança cultural, cognitiva e epistêmica está materiali-
zada no eurocentrismo que atravessa e orienta até os dias atuais uma grande parte 
da produção intelectual produzida em ciências sociais, incluída aí a produção 
dos geógrafos. O eurocentrismo, como perspectiva hegemônica de conhecimento 
da versão eurocêntrica da modernidade segundo Anibal Quijano (2005), está 
assentada em dois principais mitos fundacionais: (1) Em primeiro lugar, a ideia-
-imagem da história da civilização humana como uma trajetória que parte de um 
estado de natureza e culmina na Europa. (2) Em segundo lugar, a forma de outor-
gar sentido às diferenças entre Europa e não Europa como diferenças de natureza 
(racial) e não de história do poder (QUIJANO, 2005, p. 238).
 Segundo Quijano (2005), ambos os mitos podem ser reconhecidos, inequivo-
camente, no fundamento do evolucionismo e do dualismo, pois esses são dois dos 
dispositivos epistêmicos nucleares do eurocentrismo que pode ser verificado no 
uso da operação de comparação e confronto entre a experiência histórica europeia 
e de outras sociedades feitas a partir da perspectiva eurocêntrica de conhecimen-
to, que se utiliza de diferentes mecanismos como:
1 – Uma articulação peculiar entre um dualismo (pré-capital-capital, não eu-
ropeu-europeu, primitivo-civilizado, tradicional-moderno etc.) e um evolucio-
nismo linear, unidirecional, de algum estado de natureza à sociedade moderna 
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europeia; 2 – A naturalização das diferenças culturais entre grupos humanos 
por meio de sua codificação com a ideia de raça; 3 – A distorcida relocalização 
temporal de todas essas diferenças, de modo que tudo aquilo que é não euro-
peu é percebido como passado. (QUIJANO, 2005, p. 238)
Todas estas operações intelectuais são claramente interdependentes e não te-
riam podido ser cultivadas e desenvolvidas sem a colonialidade do poder. Ainda 
segundo Quijano (2005, p. 239), o fato de que os europeus ocidentais imagina-
ram ser a culminação de uma trajetória civilizatória desde um estado de natureza, 
levou-os também a pensar-se como os únicos modernos da humanidade e de sua 
história, isto é, como o novo e ao mesmo tempo o mais avançado da espécie. Mas já 
que, ao mesmo tempo, atribuíam ao restante da espécie o pertencimento a uma 
categoria, por natureza, inferior e por isso anterior, isto é, ao passado no processo da 
espécie, os europeus imaginaram também serem não apenas os portadores exclusi-
vos de tal modernidade, mas igualmente seus exclusivos criadores e protagonistas. 
Essa narrativa eurocêntrica está pautada em uma monocultura do tempo linear 
(SOUSA SANTOS, 2006) que compreende a história como tendo direção e sen-
tido únicos, organizando a totalidade do espaço e do tempo (todas as culturas, povos 
e territórios presentes e passados) em uma grande narrativa universal. 
Esta é uma construção eurocêntrica, que pensa e organiza a totalidade do tem-
po e do espaço para toda a humanidade do ponto de vista de sua própria 
experiência, colocando sua especificidade histórico-cultural como padrão de 
referência superior e universal. Mas é ainda mais que isso. Este metarrelato da 
modernidade é um dispositivo de conhecimento colonial e imperial em que se 
articula essa totalidade de povos, tempo e espaço como parte da organização 
colonial/imperial do mundo. Uma forma de organização e de ser da socieda-
de transforma-se mediante este dispositivo colonizador do conhecimento na 
forma “normal” do ser humano e da sociedade. As outras formas de ser, as 
outras formas de organização da sociedade, as outras formas de conhecimento, 
são transformadas não só em diferentes, mas em carentes, arcaicas, primitivas, 
tradicionais, pré-modernas. São colocadas num momento anterior do desen-
volvimento histórico da humanidade (FABIAN, 1983), o que, no imaginário 
do progresso, enfatiza sua inferioridade. (LANDER, 2005, p. 34)
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Nessa perspectiva, o tempo é pensado somente em uma visão diacrônica, na 
qual a história é compreendida a partir de estágios e etapas sucessivas (da tradição 
à modernidade). Essa maneira de pensar o tempo-espaço tem como referências 
um imaginário e uma ideologia do progresso que se expressa pelas ideias de desen-
volvimento, crescimento, modernização e globalização, entre outras, e que com-
põe a cosmovisão da modernidade ocidental. Essa visão, segundo Lander (2005), 
foi historicamente produzida, legitimada em grande parte pela produção das ci-
ências sociais (incluindo a geografia) e teve como consequência duas implicações:
Em primeiro lugar está a suposição da existência de um metarrelato univer-
sal que leva a todas as culturas e a todos os povos do primitivo e tradicional 
até o moderno. A sociedade industrial liberal é a expressão mais avança-
da desse processo histórico, e por essa razão define o modelo que define a 
sociedade moderna. A sociedade liberal, como norma universal, assinala o 
único futuro possível de todas as outras culturas e povos. Em segundo lugar, 
e precisamente pelo caráter universal da experiência histórica europeia, as 
formas do conhecimento desenvolvidas para a compreensão dessa sociedade 
se converteram nas únicas formas válidas, objetivas e universais de conheci-
mento. As categorias, conceitos e perspectivas (economia, Estado, sociedade 
civil, mercado, classes etc.) se convertem, assim, não apenas em categorias 
universais para a análise de qualquer realidade, mas também em proposições 
normativas que definem o dever ser para todos os povos do planeta. Estes 
conhecimentos convertem-se, assim, nos padrões a partir dos quais se podem 
analisar e detectar as carências, os atrasos, os freios e impactos perversos que 
se dão como produto do primitivo ou o tradicional em todas as outras socie-
dades. (LANDER, 2005, p. 34)
Essa cosmovisão cria uma forma muito particular de pensar a relação espaço-
tempo. Segundo Doreen Massey (2004), todas essas narrativas compartilham de 
uma imaginação geográfica que rearranja as diferenças espaciais em termos de 
sequência temporal, suprimindo, desse modo, a espacialidade e a possibilidade da 
multiplicidade e da diferença. “A implicação disso é que lugares não são conside-
rados genuinamente diferentes; na realidade, eles estão simplesmente à frente ou 
atrás numa mesma história: suas ‘diferenças’ consistem apenas no lugar que eles 
ocupam na fila da história” (p. 15).
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Isso significa que os lugares, as populações, as comunidades são tratados como 
se estivessem numa fila histórica que vai do estágio dos mais “selvagens” até os 
mais “civilizados”, dos mais “atrasados” aos mais “avançados”, dos mais “subde-
senvolvidos” aos mais “desenvolvidos”. Nessa forma de conceber e classificar as 
experiências sociais e os lugares e, consequentemente, as identidades, as popu-
lações denominadas “tradicionais” são classificadas como “atrasadas” e “impro-
dutivas” em detrimento dos tempos e espaços que são “modernos”, “avançados” 
e “produtivos”. Assim, essa visão colonialista caracteriza as expressões culturais 
de tais populações como “tradicionais” ou “não modernas”, como estando em 
processo de transição em direção à modernidade, e lhes nega toda possibilidade 
de lógicas culturais ou de cosmovisões próprias. Ao colocá-las como expressão do 
passado, nega-se sua contemporaneidade (LANDER, 2005). 
Trata-se de uma representação/narrativa que celebra cosmovisão da moder-
nidade/colonialidade, instituindo um imaginário em que se atribui, a priori, 
uma positividade ao novo, ao moderno, e uma negatividade ao velho, ao passa-
do, ao tradicional. Essa perspectiva de compreensão da história e da realidade 
está pautada em uma ideologia do progresso e em uma espécie de “fundamen-
talismo do novo”. O geógrafo Carlos Walter Porto-Gonçalves (2005) usa essa 
expressão para chamar a atenção para a obsessão do imaginário da modernidade 
pelo novo, pela velocidade, pela mudança, pelo progresso, criando uma justi-
ficativa ideológica para todas as formas de violência cometidas em nome do 
“desenvolvimento” e da “modernização”. Nessa perspectiva, aqueles que não 
conseguirem incorporar-se a esta marcha inexorável da história estão destina-
dos a desaparecer. As outras formas de ser, as outras formas de organização 
da sociedade, as outras formas de conhecimento são transformadas não só em 
diferentes, mas em carentes, arcaicas, primitivas, tradicionais, pré-modernas e, 
como afirma Lander (2005), são situadas, num momento anterior do desenvol-
vimento histórico da humanidade, o que, no imaginário do progresso, enfatiza 
sua inferioridade.
Para superarmos essas narrativas coloniais, precisamos repensar a forma como 
concebemos o tempo, o espaço e as diferenças, pois na estrutura dessas narrativas 
está sempre implícita certa forma de conceber o tempo-espaço. Como já vimos, 
essa cosmovisão/narrativa fundada no mito da modernidade acima descrito está 
estreitamente vinculada com o colonialismo e a colonialidade, e tem uma forma 
muito particular de conceber o tempo-espaço, que tem dois efeitos perversos: o 
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primeiro é supressão da multiplicidade contemporânea do espaço, e o segundo é 
a redução da temporalidade a um único tempo (MASSEY, 2005). 
Segundo Massey (2005), essa cosmovisão tem algumas consequências na for-
ma como pensamos o espaço, o tempo e a política, pois se trata de uma imagina-
ção (uma conceituação implícita) a qual esconde a possibilidade de analisarmos 
a produção da desigualdade do mundo que se realiza na atualidade. Além disso, 
essa imaginação geográfica reduz a diferença entre países, regiões ou lugares a 
uma posição “na fila histórica”; isso, por sua vez, produz um efeito decisivo: nega 
a igualdade de voz, sendo uma maneira de depreciar, negar que somos verda-
deiramente coetâneos – a existência de coetâneos de uma multiplicidade é uma 
propriedade essencial do espaço, afirma Doreen Massey.
Essa forma de conceber o tempo, o espaço e as diferenças está claramente an-
corada na grande “narrativa” universal da modernidade/colonial; é uma forma de 
imaginação geográfica, uma leitura do mundo que opera através de uma transfor-
mação, uma reorganização da geografia (uma simultaneidade espacial de diferen-
ças) em uma única fila histórica (uma sucessão de etapas e períodos). Assim, cada 
vez que caracterizamos um país, uma região, uma cultura como “atrasada”, como 
“primitiva”, negamos sua diferença atual. Além disso, esse tipo de raciocínio natu-
raliza essas desigualdades em forma de diferença, impedindo uma reflexão política 
sobre os processos e as relações que produzem as desigualdades, as diferenças e as 
hierarquias. Esta cosmologia de “uma única narrativa” oblitera as multiplicidades, 
as heterogeneidades contemporâneas do espaço. Reduz as coexistências simultâ-
neas a um lugar na “fila da história” (MASSEY, 2005). 
A crítica a essa forma de compreendermos espaço-tempo implica novos com-
promissos epistemológicos, políticos e éticos. Doreen Massey (2005) sugere uma 
nova forma de imaginação geográfica, a construção de uma nova “cosmovisão” 
que reconstrua a relação entre tempo e espaço, construindo uma nova narrativa 
que não seja uma narrativa colonial do mundo, mas uma narrativa descolonial. 
Desse modo, questiona se não devemos imaginar os diferentes lugares, territórios 
e culturas como tendo suas próprias trajetórias, suas próprias histórias específicas 
e o potencial para seus próprios, talvez diferentes, futuros.
Para construirmos uma narrativa descolonial, é preciso pensar o espaço como 
esfera da possibilidade da existência da multiplicidade; isso implica, segundo 
Massey (2005, colocar a questão da diferença no centro do debate político, per-
mitindo pensarmos na existência de múltiplas vozes, múltiplas temporalidades, 
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múltiplas histórias na contemporaneidade, descentrando uma perspectiva etno-
cêntrica que afirmam histórias locais como universais, mas que são particulares; 
entretanto, pelo exercício do poder e do saber, subalternizam outras histórias, 
temporalidades, sujeitos e saberes. 
Portanto, para Massey (2005), a verdadeira possibilidade de qualquer reco-
nhecimento sério da multiplicidade e da diferença depende, ele próprio, de um 
reconhecimento da espacialidade. 
(...) um verdadeiro reconhecimento “político” da diferença deve entendê-la 
como algo mais do que um lugar numa sequência; de que um reconhecimento 
mais completo da diferença deveria reconhecer que os “outros” realmente 
existentes podem não estar apenas nos seguindo, mas ter suas próprias histórias 
para nos contar. Neste sentido, seria concedido ao outro, ao diferente, pelo 
menos um determinado grau de autonomia. Seria concedida pelo menos a 
possibilidade de trajetórias relativamente autônomas. Em outras as palavras, 
isso levaria em consideração a possibilidade da coexistência de uma multiplici-
dade de histórias. (MASSEY, 2005 p. 15)
Desse modo, a autora conclui que, para que haja histórias múltiplas, coexis-
tentes, deve existir espaço. Em outras palavras: “o pleno entendimento da espacia-
lidade envolve o reconhecimento de que há mais de uma estória se passando no 
mundo e que essas estórias têm, pelo menos, uma relativa autonomia” (MASSEY, 
2005 p. 15). Nesse sentido, o espaço deve ser entendido como: “uma simulta-
neidade de histórias inacabadas, o espaço como um momento dentro de uma 
multiplicidade de trajetórias. Se o tempo é a dimensão da mudança, o espaço é a 
dimensão da multiplicidade contemporânea” (MASSEY, 2005).
III
A expressão “giro descolonial” é uma forma sintética de nomear uma inflexão 
epistêmica, ética e política nas ciências sociais latino-americanas que coloca o nosso 
passado colonial como ponto de partida para pensarmos a especificidade de nossas 
sociedades. Os autores do chamado pensamento descolonial insistem na diferença 
entre o colonialismo como uma experiência de dominação política e econômica 
expressa na relação entre metrópoles e colônias e a colonialidade como uma he-
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rança desse processo. Inúmeras vezes nos lembram de que o fim do colonialismo 
não significou o fimda colonialidade. Os processos formais de independência não 
significaram uma ruptura com as práticas, experiências e ideias coloniais. Essa co-
lonialidade, na interpretação desses autores, permanece ativa e atual, e, portanto, 
o esforço por descolonização da sociedade, do Estado, do pensamento continua 
como um horizonte e um desafio cotidiano. Essa interpretação nos obriga a ter 
uma outra leitura do passado e uma compreensão mais complexa dos processos 
de mudança/ruptura e continuidade na história e na geografia das sociedades la-
tino-americanas. Esses autores afirmam que a colonialidade não foi uma etapa ou 
um estágio anterior à inserção das nossas sociedades na modernidade, mas uma 
dimensão constitutiva da nossa própria forma de viver a modernidade. 
Essa nova perspectiva epistemológica, ética e política de compreender a nossa 
história e geografia que ganha destaque no momento atual não nasceu agora, 
mas sim é resultado de um longo processo, fruto de muitas formas de pensar e de 
agir contra o legado do colonialismo nos últimos cinco séculos. A nossa história 
é a história do colonialismo e sua herança, mas também é a história das resistên-
cias e lutas dos grupos subalternizados contra essa realidade. Sempre houve lutas 
concretas e formulações de pensamento que tinham como horizonte a superação 
do colonialismo e da colonialidade. Portanto, o pensamento descolonial não se 
restringe ao debate contemporâneo do “giro decolonial”, ele tem uma longa tra-
jetória histórica.
Nessa direção podemos identificar uma longa linhagem de pensamento crítico 
que atravessou o século XIX e XX com pensadores que buscaram compreender a 
especificidade das nossas sociedades periféricas através de uma interpretação de 
nosso passado colonial e a necessidade de superarmos essa herança. Podemos iden-
tificar, por exemplo, uma leitura descolonial nas obras dos pensadores da teoria 
da dependência, que se propuseram a rediscutir a relação entre centro e periferia 
e a desvendar os mecanismos do tipo de capitalismo dependente a que os paí-
ses da América Latina estavam submetidos. Esse “espírito descolonial” orientou 
movimentos filosóficos e teológicos como a teologia da libertação e a filosofia da 
liberação, que se propunham outros horizontes de espiritualidade e de liberdade, 
pensando a partir das vítimas e dos grupos mais vulneráveis da histórica latino-a-
mericana. É possível também identificar um esforço de descolonização no campo 
da formulação de uma teoria educacional que está presente na obra de Paulo Frei-
re, marcada pela busca de uma Pedagogia da liberdade e da autonomia. O esfor-
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ço de uma crítica radical ao eurocentrismo também está fortemente presente na 
crítica ao modo de fazer pesquisa e ciência formulado pelo sociólogo colombiano 
Orlando Fals Borda na sua proposta de pesquisa participante e pesquisa-ação. 
As contribuições latino-americanas afetaram até campos do pensamento bas-
tante consolidados, como é o caso do marxismo, por exemplo, com as contri-
buições de Mariátegui, José Marti que incluíram as questões étnico-raciais numa 
interpretação materialista-histórica da realidade latino-americana. Esses apenas 
são alguns exemplos, mas se fizermos uma genealogia histórica mais detalhada2 
veremos que a produção do pensamento descolonial sempre esteve presente no 
pensamento critico Latino-americano.
Essa longa tradição ganhou um novo fôlego pelo esforço de um conjunto de 
intelectuais que no final dos anos 1990 começam a construção de uma crítica 
ainda mais radical e contundente à herança eurocêntrica que está presente de 
maneira extremamente atual nas sociedades latino-americanas, seja na forma das 
relações de poder, na maneira de produção do conhecimento ou na produção das 
sociabilidades e subjetividades cotidianas. 
Esses pensadores oriundos de distintos campos disciplinares e de tradições 
intelectuais distintas iniciam um processo de construção de uma rede de diá-
logo e colaboração que se desdobra na construção de encontros internacionais 
e publicações coletivas em torno da crítica à colonialidade do poder, do saber, 
do ser e da natureza. Diferentemente das gerações anteriores, esse grupo deno-
minado de “modernidade/colonialidade” não restringe sua crítica às heranças 
econômicas-políticas de nossa experiência colonial. Suas estratégias se voltam 
para a dimensão cognitiva questionando as matrizes epistêmicas de produção do 
conhecimento que naturalizam um conjunto de teorias, categorias e conceitos 
que nos impedem de compreender as especificidades de nossas sociedades. Além 
da crítica epistemológica, esse conjunto de pensadores inicia uma crítica ontoló-
gica, trazendo para a cena a necessidade de uma reflexão sobre nossa memória, 
nosso imaginário, nossa subjetividade, nossas formas de existir cotidianas.
 Esse grupo tem nas formulações iniciais de Aníbal Quijano (Peru), Enrique 
Dussel (Argentina/México) e Walter Mignolo (Argentina/EUA) os aportes teó-
ricos para uma crítica à ideia de modernidade, uma leitura do sistema-mundo 
capitalista, moderno-colonial, e uma interpretação da constituição das socieda-
2 Para ver a genealogia do pensamento descolonial detalhada, Castro-Gómez e Grosfoguel (2007), para ver 
um sumário dos conceitos e linhas de força, Escobar (2003).
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des latino- americanas. Somaram-se a esses percussores autores como Ramón 
Grosfoguel (Porto Rico/EUA), Santiago Castro-Gómez (Colômbia), Nelson 
Maldonado-Torres (Porto Rico/EUA), Edgardo Lander (Venezuela), Arturo 
Escobar (Colômbia), Catherine Walsh (EUA/Equador), entre outros que vêm, 
individualmente ou coletivamente, contribuindo para a construção de um pen-
samento descolonial.
Uma das críticas fundamentais do pensamento descolonial é que não existe 
um conhecimento objetivo, neutro e universal, isso é um mito, uma retórica 
de poder. O discurso epistemológico hegemônico da ciência e da filosofia mo-
dernas aponta para a ideia de que o conhecimento científico é des-localizado, 
des-contextualizado e des-incorporado e, portanto, trata-se de um conhecimento 
abstrato e universal, um conhecimento transcendental que independe de tempo 
e espaço, um conhecimento que paira sobre as contingências históricas, como se 
estivesse flutuando e não tivesse nenhuma ligação com os sujeitos-autores que o 
produzem. Assim, na produção filosófica e científica moderna ocidental, o sujeito 
que fala, o sujeito que teoriza, em suma, o sujeito que produz o conhecimento, as 
teorias e os conceitos está sempre oculto, disfarçado, escondido. Trata-se de um 
sujeito abstrato, um sujeito não localizado, não situado, um sujeito sem corpo, 
sem cultura, sem classe, sem sexo e que, portanto, o seu lócus de enunciação é 
abstrato e não está contaminado de marcas terrenas. Logo, o lócus de enunciação 
tem a pretensão de ser objetivo, neutro e universal.
Contudo, como nos mostram Lander (2005), Sousa Santos (2006), Grosfoguel 
(2010) e Mignolo (2003), a produção do conhecimento não é abstrata, mas sim 
contextualizada, localizada, incorporada; ela está situada em histórias locais e arrai-
gada em culturas e cosmovisões particulares, e traz as marcas dos sujeitos-autores 
que a produzem, sujeitos estes constituídos a partir de suas experiências e subje-
tividades configuradas socialmente. Desse modo, falamos sempre a partir de um 
determinado lugar, de algum lugar de enunciação, ou seja, existe uma profunda 
relação entre o que se fala, quem fala e de onde se fala, ou, como argumenta Mig-
nolo (2003), as localizações epistemológicas têm uma estreita relação com o lócus 
geopolítico e biopolítico de enunciação a partir do qual o pesquisador constrói o 
seu olhar e o seu discurso. E até hoje o perfil epistêmico dominante na produção 
do conhecimento ocidental tem uma configuração muito particular e específica: 
são homens brancos,heterossexuais de classes privilegiadas de origem europeia 
falando em inglês, alemão, francês e italiano. Esse perfil está longe de ser universal!
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Mas, apesar de todo o conhecimento ser localizado, a geopolítica do conhe-
cimento estabeleceu historicamente uma relação de centro e periferia em termos 
cognitivos, atribuindo o caráter de universalidade a determinados conceitos e 
teorias. De maneira direta e concreta, produzir conhecimento em certas línguas, 
e a partir de certos lugares, como, por exemplo, produzir em inglês, francês, ale-
mão ou italiano, do centro da Europa hegemônica, torna os pensadores oriun-
dos desses lugares de enunciação pensadores universais, mesmo que estes tenham 
construído suas reflexões arraigadas em experiências locais e específicas. Do outro 
lado, pensadores que formulam seus discursos, teorias, conceitos em línguas não 
hegemônicas, como, por exemplo, espanhol, português e mandarim, suaíli, yo-
rubá, kicongo, kimbundu, falando de continentes e países periféricos, como a 
Bolívia, a Colômbia, o Brasil, ou de alguns países africanos ou asiáticos, são vistos 
sempre como pensadores locais, e que, portanto, não têm o caráter de universali-
dade vinculado a sua fala, seu lócus de enunciação.
O que define essa geopolítica do conhecimento é o que Walter Mignolo 
(2003)denomina de diferença colonial, ou seja, as marcas e heranças de um longo 
processo de experiência colonial que moldou o sistema-mundo moderno-colo-
nial, resultando numa relação entre centro e periferia não só em termos econô-
micos e políticos, mas em termos culturais e cognitivos. Essa relação está expressa 
na construção dos modelos de universidade e dos sistemas educacionais de uma 
forma geral presentes nos países de origem colonial. Essa geopolítica do conheci-
mento está concreta e metaforicamente representada em nossas bibliotecas, que 
permanecem como “bibliotecas coloniais”.
Lemos, interpretamos e teorizamos o nosso mundo, as nossas sociedades, nos-
sas experiências, nossos problemas, ancorados em categorias, conceitos, teorias, 
línguas do norte global (autores que falam predominantemente em francês, in-
glês, alemão e italiano, que nos falam a partir de Paris, Berlim, Londres, Roma, 
Nova York etc.). Olhamos o mundo pelas lentes de autores que construíram suas 
reflexões, em muitos casos, referenciados em realidades completamente alheias 
à nossa. No entanto ignoramos os intelectuais que falam a partir dos lugares, 
experiências e línguas do sul. Não é raro intelectuais brasileiros ignorarem solene-
mente a produção intelectual dos países vizinhos, sem falar do que é produzido 
nos continentes africano e asiático. A questão não é a limitação ou ignorância 
(uma condição de todos) e sim a naturalidade com que aceitamos o fato de que o 
conhecimento legítimo, sofisticado e de vanguarda é atributo somente de certos 
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centros geopolíticos do norte global (são inegavelmente centros devido a todos o 
recursos e poderes acumulados nesses lugares historicamente). Imaginar que Lima 
no Peru ou La Paz na Bolívia ou ainda a cidade do México podem ser centros de 
produção intelectual de vanguarda e que o conhecimento produzido nessas rea-
lidades tem profundas afinidades com nossas sociedades parece um absurdo para 
um certo imaginário acadêmico eurocêntrico dominante entre nós. 
O que os autores do pensamento descolonial sugerem é a necessidade de des-
locamento dos lugares hegemônicos de enunciação (o norte global) para as peri-
ferias, para as margens, para os lugares subalternos de enunciação (o sul global). 
Descolonizar o saber, o pensamento, a ciência implica a construção de epistemo-
logias outras que estejam vinculadas às experiências, às dores e aos sofrimentos 
dos grupos, lugares que são vítimas do processo colonial. A construção de “episte-
mologias do sul” (SOUSA SANTOS, 2010) “epistemologias fronteiriças” (MIG-
NOLO, 2003) que possam ser referências para a construção de outras bibliote-
cas, “bibliotecas descoloniais”. Isso não significa negar a importância cultural e 
intelectual europeia e sim negar o eurocentrismo. Essa postura não é uma postura 
relativista ou uma visão essencialista ou fundamentalista, mas sim um exercício 
de localização dos diferentes lugares de enunciação em nossa atual geopolítica do 
conhecimento. É importante lembrar que essa geopolítica do conhecimento se 
reproduz em outras escalas e sustenta um imaginário moderno colonial a exemplo 
do que ocorre no Brasil, onde há claramente uma postura de privilégio do Sudeste 
como região central de produção intelectual e artística deixando marginalizadas 
as produções intelectual e artística em regiões como Nordeste e Amazônia. 
IV
Incorporar as contribuições do pensamento descolonial ao pensamento crítico 
no campo da geografia brasileira, fazer uma geografia inspirada nas epistemolo-
gias dos sul ainda está por se fazer, apesar de esforços iniciais, dentre os quais o 
presente livro, pretende ser uma pequena contribuição. Para que essa incorpora-
ção seja fértil e capaz de ajudar na renovação do pensamento crítico, impõem-se 
alguns desafios que se colocam como uma espécie de agenda para os geógra-
fos que desejam construir um projeto de descolonização de nossa disciplina. A 
seguir apresentaremos alguns desafios, conscientes de que deve haver outros de 
que sequer temos clareza. Esperamos que ao esboçarmos essa espécie de agenda 
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possamos estimular outros geógrafos a se engajarem nesse projeto coletivo de 
construção de uma geografia descolonial.
1) O primeiro desafio é construir um pensamento descolonial enraizado nas es-
pecificidades e singularidades da formação socioespacial brasileira. Hoje gran-
de parte das formulações teórico-conceituais do chamado pensamento desco-
lonial está referenciada na realidade de países andinos (Bolívia, Peru, Equador 
etc.) que têm muitas afinidades e proximidades com a realidade brasileira, 
mas também importantes diferenças de grau e de natureza. Tais realidades 
são muito distintas em termos de geobiodiverdades e sociodiversidades, além 
de oriundas de distintos processos de colonização. Esses diferentes projetos 
moderno-coloniais resultaram em formações socioespaciais diversas, com 
construções de Estado-nação particulares, formações de classes, processos de 
hierarquização racial e gênero que constituem padrões de poder, formas de re-
sistências e construção de diferentes sujeitos políticos e lutas descolonais com 
muitas expressões e matizes. Diante desse quadro, é fundamental estabelecer 
um diálogo entre a tradição do pensamento crítico brasileiro com essa impor-
tante matriz do pensamento descolonial, bem como outras linhagens do pen-
samento critico pós-colonial e dos estudos subalternos vindos do Caribe, da 
Índia, da África etc. sem esquecer, contudo, o que temos de específico como 
realidade socioespacial. Temos que estabelecer um amplo diálogo produzindo 
um verdadeiro “pensamento liminar”, uma “epistemologia fronteiriça” (MIG-
NOLO, 2003) a partir dos diferentes lugares de enunciação que constituem 
as “epistemologias do sul” (SOUSA SANTOS, 2010) mantendo as nossas 
especificidades históricas e geográficas. 
2) Um segundo grande desafio é a construção de um pensamento descolonial que 
efetivamente realize um giro espacial/territorial. Hoje há um diálogo marcado 
por encontros e desencontros entre o pensamento descolonial e a produção da 
geografia crítica. Nessa direção muitos pesquisadores3 vêm incorporando os 
debates do pensamento decolonial em suas pesquisas buscando superar o le-
gado eurocêntrico que está pressente de maneira constitutiva em nosso campo 
3 No Brasil a contribuição do geógrafo Carlos Walter Porto-Gonçalves é fundamental, tendo um papel depioneirismo e vanguarda nesses debates no cenário nacional. Hoje é crescente o número de geógrafos e 
geógrafas de gerações mais jovens que vêm dialogando diretamente ou indiretamente com o pensamento 
descolonial latino-americano na geografia brasileira.
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disciplinar. Mas precisamos ultrapassar a ideia de que esse debate tem a ver com 
certas temáticas, situações e sujeitos específicos. O giro decolonial inaugura no-
vas perspectivas epistemológicas, teóricas, metodológicas com grandes impli-
cações éticas e políticas no pensar e fazer geográfico como um todo. Por outro 
lado, as categorias, os conceitos e as noções geográficas têm sido incorporados 
pelos(as) autores(as)4 do pensamento descolonial de forma parcial e precária 
reduzindo a geograficidade a metáforas espaciais. Categorias e conceitos como 
espaço, território, lugar, escala etc. são de grande potencial cognitivo e político 
para renovação do pensamento crítico e para ampliação e enriquecimento dos 
estudos descoloniais. Contudo seu uso precisa ultrapassar o sentido metafórico 
e ganhar consistência teórico-metodológica capaz de considerar a geografici-
dade como um elemento essencial em termos ontológicos e epistemológicos 
para compressão de nossas sociedades. É necessário realizarmos um verdadeiro 
giro espacial/territorial para que se realize plenamente um giro decolonial. Para 
efetivar tal projeto, faz-se necessária a incorporação do patrimônio intelectual 
acumulado pela geografia às reflexões do pensamento decolonial. Do mesmo 
modo, precisamos extrair todas as consequências epistêmicas, teóricas e meto-
dológicas da incorporação do pensamento decolonial no campo da geografia. 
Essa é uma árdua tarefa coletiva que está por se fazer.
3) O terceiro desafio é ultrapassar o debate epistêmico e teórico abstrato e fecun-
dar essas ferramentas teóricas e epistemológicas que o pensamento descolonial 
vem produzindo (como, por exemplo, os conceitos de colonialidade do poder, 
colonialidade do saber, colonialidade do ser, colonialidade da natureza) com 
experiências, casos, situações concretas que permitam superar os excessos de 
uma leitura teórica abstrata que essa perspectiva tanto critica. Precisamos de 
estudos capazes de oferecer um diagnóstico de nossa realidade, uma ontologia 
política descolonial do presente. Estudos que possam ajudar a compreender 
quem somos nós e o que estamos fazendo de nós mesmos como sociedade, 
construir genealogias de nossa experiência moderna-colonial concretamente. 
As teorias, os conceitos e as interpretações do pensamento descolonial pre-
cisam dialogar com a diversidade de experiências de lutas sociais concretas. 
Bem como os conhecimentos e as epistemologias construídas nas lutas sociais 
4 Os principais autores do pensamento descolonial têm formação disciplinar fora da geografia. São filósofos, 
sociólogos, antropólogos, críticos literários etc. Essa diferença de formação disciplinar se expressa na cons-
trução discursiva desses autores, na qual o espaço está presente apenas no sentido metafórico. 
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concretas podem oferecer novos horizontes de sentidos para a construção de 
um pensamento descolonial. Esse vínculo entre teoria e prática é algo impres-
cindível para a construção de uma geografia descolonial.
4) A grande maioria das teorias e dos conceitos construídos pelos pensadores 
descoloniais operam com uma leitura macrossociológica e uma perspecti-
va histórica de longa duração tomando como referência a ideia de sistema-
-mundo moderno-colonial como centro de referência interpretativa (países 
metropolitanos x colônias, centro x periferia, norte x sul global). Essa leitura 
macroescalar e estrutural é importante, contudo, essa escolha metodológica 
dificulta a compreensão multiescalar em termos espaçotemporais de práticas 
e experiências concretas, nas quais se pode identificar dispositivos da colonia-
lidade do poder, do saber, do ser e da natureza. É fundamental construirmos 
uma leitura multiescalar que ao mesmo tempo seja capaz de compreender a 
colonialidade do poder, do saber, do ser e da natureza em termos macro e 
micropolíticos, tanto em termos de elementos estruturais como através das 
práticas e experiências cotidianas. É preciso construir uma leitura histórica e 
geográfica que envolva uma multiplicidade de temporalidades e ritmos, capaz 
de abarcar a complexidade dos processos concretos. 
5) O quinto desafio é pensar a tensão existente entre como construir um pen-
samento descolonial com velhas formas de fazer pesquisa e produzir conheci-
mento. Descolonizar impõe o desafio da invenção, da criação de novas meto-
dologias de investigação, bem como o desafio de trabalhar com novas formas 
de linguagens. Não bastam conceitos e teorias descoloniais, precisamos a cons-
trução de metodologias outras que permitam o diálogo entre distintos saberes 
e diferentes matrizes de racionalidades. Necessitamos de outras epistemes e 
práticas de produção do conhecimento capazes de efetivar um processo de 
descolonização da ciência e do pensamento. Não é possível produzir conhe-
cimento descolonial com métodos coloniais. As linguagens acadêmicas e as 
tradicionais formas de comunicar as pesquisas não são suficientes para traduzir 
as diferentes experiências. Precisamos encontrar metodologias, linguagens e 
formas de expressão que possam traduzir as experiências e os saberes de grupos 
subalternizados em um registro descolonial.
6) O sexto desafio é a construção de uma estética descolonial. O pensamento 
descolonial tensiona o nosso legado epistêmico e o conjunto de teorias e con-
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ceitos com que operamos cotidianamente para interpretar o mundo, contudo, 
um giro descolonial não pode se reduzir ao pensamento conceitual, a dimen-
são racional e cognitiva. O giro descolonial com implicações ontológicas ne-
cessita não só de uma nova epistemologia, de uma política e uma nova ética, 
necessita também de novas referências estéticas/poéticas. É preciso vermos o 
potencial descolonizador que nos chega através da dimensão do sensível, da 
arte, e não simplesmente pela via da racionalidade. Os potenciais imagético, 
metafórico, narrativo e sonoro são essenciais para construirmos o exercício 
cotidiano de descolonização do poder, do saber, do ser e da natureza. 
 7) A colonialidade do poder, do saber e do ser e da natureza está presente em nos-
so habitus – um conjunto de aprendizados que na maioria das vezes é incorpo-
rado em nossas formas de perceber, representar e agir de forma inconsciente 
através das experiências e práticas cotidianas que vivemos em nossos diversos 
espaços de socialização como família, igreja, a rua etc. (BOURDIEU, 1989). 
Mas, sem dúvida, é na escola e na universidade que somos sistematicamente 
submetidos a um processo de colonização dos nossos sentidos de vida. Nes-
sas instituições somos sistematicamente submetidos à produção de um habi-
tus colonial que produz uma subjetivação eurocêntrica (CASTRO-GÓMEZ, 
2007). Não é possível pensar um esforço de descolonização que não passe 
pela construção de novas práticas de descolonização epistêmica, mas também 
pedagógica, que esteja expressa nos currículos, nas metodologias de ensino, 
nas avaliações etc. A universidade e a escola precisam se descolonizar, nós pro-
fessores precisamos pensar em pedagogias outras, em pedagogias descolonais.
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De saberes e de territórios – diversidade e eman-
cipação a partir da experiência latino-americana
Carlos Walter Porto-Gonçalves
“Nossa luta é epistêmica e política.”
Catherine Walsh/Luis Macas
“A importância da linguagem para o desenvolvimento da cultura está em que 
nela o homem estabeleceu um mundo próprio ao lado do outro, um lugar que ele 
considerou firme o bastante para, a partir dele, tirar dos eixos o mundo restante e 
se tornar seu senhor. Na medida em que por muito tempo acreditou nos concei-
tos e nomes de coisas como um aeternea veritates (verdades eternas), o homem 
adquiriu esse orgulho com que se ergueu acima do animal: pensou ter realmente 
na linguagem o conhecimento do mundo.” 
Nietzsche
“Limite entre saberes, limite entre disciplinas, limite entre países. Por todo lado se 
fala que os limites já não são rígidos, que os entes já não são tão “claros, distintos 
e definidos” como recomendara René Descartes. Cada vez mais se fala de empresas 
internacionais, ou transnacionais ou multinacionais, assim como se fala de inter-
disciplinaridade, transdisciplinaridade ou multidisciplinaridade. Enfim, por todo 
lado são usados os prefixos inter, trans ou multi indicando que as fronteiras, sejam 
elas epistêmicas, sociológicas ou geográfico-políticas, se é que podemos separá-las, 
são mais porosas do que se acreditava.”
Carlos Walter Porto-Gonçalves
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Desprovincianizando a razão – elementos para a crítica do eurocentrismo5
Problematizar a relação entre saberes e territórios é, antes de tudo, pôr em 
questão a ideia eurocêntrica de conhecimento universal. Com isso não queremos 
recusar a ideia de que o conhecimento seja universal, mas, sim, (1) retirar o caráter 
unidirecional que os europeus impuseram a essa ideia(eurocentrismo) e (2) afir-
mar que as diferentes matrizes de racionalidade constituídas a partir de diferentes 
lugares, os topoi de Boaventura de Sousa Santos, são passíveis de serem universali-
zados, o que nos obriga a considerar os processos por meio dos quais os conheci-
mentos podem dialogar, se relacionar. Enfim, o que se visa é um diálogo de saberes 
que supere a colonialidade do saber e do poder (QUIJANO, 2005 [2000]).
O que se critica aqui não é a ideia de pensamento universal, mas, sim, a ideia 
de que há Um e somente Um pensamento universal, aquele produzido a partir de 
uma província específica do mundo, a Europa e, sobretudo a partir da segunda 
metade do século XVIII, aquele conhecimento produzido a partir de uma subpro-
víncia específica da Europa, a Europa de fala inglesa, francesa e alemã, enfim, a 
segunda moderno-colonialidade, que teima em olvidar o conhecimento produzido 
na primeira moderno-colonialidade, aquela de fala espanhola ou portuguesa.
Com essa desprovincianização da Europa da ideia de pensamento universal 
o que visamos é o deslocamento do lugar de enunciação e, assim, proporcionar 
que outros mundos de vida ganhem o mundo, mundializando o mundo. In-
sistimos que não se trata de negar o pensamento europeu, o que seria repeti-lo 
com sinal invertido, mas sim nos propomos dialogar com ele sabendo que é 
europeu e, portanto, um lugar de enunciação específico, ainda que sabendo (1) 
que essa especificidade não é igual a outros lugares de enunciação pelo lugar que 
ocupa na contraditória estrutura do sistema-mundo moderno-colonial, (2) nem 
tampouco que esse lugar de enunciação europeu seja homogêneo e não abrigue 
perspectivas contraditórias, sejam de afirmação da ordem, sejam de perspectivas 
emancipatórias. O liberalismo e o marxismo, ambos nascidos na Europa, não 
são a mesma coisa, muito embora de diferentes maneiras se vejam a braços com 
a colonialidade, essa dimensão não revelada pelas duas moderno-colonialidades. 
Enfim, o lugar de enunciação não é uma metáfora que possa ignorar a mate-
5 Neste artigo dou continuidade às reflexões que venho propondo e coletivamente elaborando junto ao Gru-
po de Trabalho Hegemonias e Emancipações de CLACSO, desde 2001. Já em 2001 iniciava Da geografia às 
geo-grafias: um mundo em busca de novas territorialidades, uma reflexão sobre epistemes e territórios afirmando 
a epígrafe acima. 
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rialidade dos lugares, enfim, a geograficidade do social e do político (PORTO-
-GONÇALVES, 2003).
O espaço: onde habita a simultaneidade
Para promover essa desprovincianização e o reconhecimento de novos lugares 
de enunciação, é preciso trazer o espaço para dentro da história e deixá-lo fa-
lar. A visão unilinear do tempo silencia outras temporalidades que conformam o 
mundo simultaneamente. Sucessão e simultaneidade, sucessões simultâneas, eis 
o espaço-tempo. O mundo não tem um relógio único. Nesse sentido, também o 
materialismo histórico deve ser geografizado – materialismo histórico-geográfico 
(SOJA, 1993) – o que significa abandonar uma visão linear do tempo, que certas 
correntes marxistas partilham com os liberais e que não é um tempo abstrato, mas 
o tempo europeu, branco, burguês e fálico da segunda moderno-colonialidade 
(DUSSEL, 2005 [2000]), e se abrir para as múltiplas temporalidades que con-
formam os lugares, as regiões, os países, enfim, os territórios que as conformam. 
Se o espaço é apropriado, marcado, grafado (geografado) no processo histórico, 
tendo, assim, uma historicidade, esse fato nos impõe a necessidade de levar a sério 
essa geograficidade da história, inclusive no campo das ideias, do conhecimento. 
Assim, a cartografia da Terra foi grafada pelo papa, em 1493, com um meri-
diano, o de Tordesilhas e, desde o século XIX, a ciência laica se encarregaria de 
remarcar um novo ponto zero de onde passa a recartografar o mundo, agora a 
partir do meridiano de um subúrbio de Londres, Greenwich. Não olvidemos que 
se orientar é se dirigir para o Oriente, e tomar esse rumo era tomar o rumo certo 
na vida, tal como hoje se diz nortear. Essa troca de verbo é, também, uma troca 
de hegemonia geopolítica.
Embora a segunda moderno-colonialidade, aquela do Iluminismo, procure 
ignorar a verdadeira revolução no conhecimento da primeira moderno-colonia-
lidade, é preciso assinalar que a missão ibérica, ao mesmo tempo em que estava 
consagrada pelo Deus cristão, se ancorava na melhor ciência matemática, car-
tográfica, náutica em suas grandes navegações. “Navegar é preciso, viver não é 
preciso6” (Fernando Pessoa), enfim, navegar é coisa do campo da técnica, da pre-
cisão, e os portugueses foram grandes navegadores, sobretudo. Não é incompatí-
vel a missão salvacionista e evangelizadora com um saber rigoroso, técnico como, 
6 Viver não tem precisão técnica. 
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mais tarde, na segunda moderno-colonialidade, se tentará fazer crer. A primeira 
máquina verdadeiramente moderna, o relógio, surgiu nos monastérios da Idade 
Média exatamente para controlar o tempo das orações de modo objetivo (MUM-
FORD, 1942; PORTO-GONÇALVES, 1989). Na verdade, a ciência da segunda 
moderno-colonialidade está impregnada de um sentido religioso de emancipação. 
Não nos cansamos de ouvir, ainda hoje, que a ciência opera milagres.
A América experimentará essa razão moderno-colonizadora de um modo 
muito próprio. Angel Rama, o ensaísta uruguaio, nos chamou a atenção em seu 
A cidade das letras que as primeiras cidades verdadeiramente planejadas racio-
nalmente no mundo moderno-colonial surgiram na América, onde o espaço da 
plaza foi concebido sob o signo do controle, da dominação. Já, ali, havia despla-
zados. As primeiras manufaturas moderno-colonizadoras se montaram em Cuba, 
no Haiti, no Brasil, haja vista o açúcar não ser exportado para a Europa in natura, 
mas, sim, manufaturado. A própria monocultura, enquanto técnica, inicialmente 
para o cultivo da cana, era uma imposição, haja vista a impossibilidade material 
de um povo ou uma comunidade qualquer se reproduzir fazendo monocultura 
para si próprio. Assim, a monocultura não é só a cultura de um só produto, mas 
também a cultura para um só lado. Por isso a energia da chibata para mover o 
sistema. Afinal, ninguém faz monocultura espontaneamente até que tenhamos 
subjetivado as relações sociais e de poder assimétricas e contraditórias (a mão 
invisível é precedida de outra mão bem visível que brandia a chibata).
Eis as vantagens de falarmos a partir desse outro lugar de enunciação que é a 
América, particularmente, desde a América Latina e desde uma perspectiva eman-
cipatória nesse momento histórico em que velhos protagonistas, como os indígenas 
e os afrodescendentes, entram em cena reinventando-se agora com mais visibilida-
de. A América tem, desde 1492, um papel protagônico na constituição do siste-
ma-mundo moderno-colonial (LANDER, 2005 [2000]). É claro que durante um 
bom tempo não passamos de Índias Ocidentais, nome com que os espanhóis indi-
cavam seu império desde a Ilha de São Domingos até as Filipinas, numa geografia 
estranha para o que, hoje, fomos e estamos habituados. A América será um nome 
que se consagrará, como nos ensina Walter Mignolo, com a emergência da descolo-
nização, fenômeno que, para nós, desde a América, se inicia em 1776 (EUA), ainda 
que revelando a colonialidade do saber e do poder, como nos denuncia o incômodo 
1804 (Haiti). Aliás, o Haiti é a melhor revelação de como a liberdade não pode ser 
pensada ignorando-se a geografia em que está inserida. Toussaint de Louverture 
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(1743-1803) bem que tentou ser livre nos marcos de uma confederação francesa 
que, ainda que revolucionária, não via a liberdade se tornar igual para todos e, 
assim, demonstrava os limites da

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