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Diretrizes Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017 Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76 7. Tratamento Não Medicamentoso das Dislipidemias 7.1. Medidas no controle da hipercolesterolemia 7.1.1. Terapia nutricional Nos últimos anos, o padr�o alimentar e o estilo de vida saud�vel ganharam evid�ncia em estudos epidemiol�gicos observacionais e de intervenç�o, como o DASH (Dietary Approachs to Stop Hypertension),121 o INTERHEART109 e o PREDIMED (PREvención con DIeta MEDiterránea),122 e reforçaram as diretrizes nutricionais que preconizam dieta isenta de �cidos graxos trans, o consumo de < 10% do valor cal�rico total de �cidos graxos saturados para indiv�duos saud�veis e < 7% do valor cal�rico total para aqueles que apresentarem risco cardiovascular aumentado.25,106,123 O padr�o alimentar deve ser resgatado por meio do incentivo à alimentaç�o saud�vel, juntamente da orientaç�o sobre a seleç�o dos alimentos, o modo de preparo, a quantidade e as poss�veis substituições alimentares, sempre em sintonia com a mudança do estilo de vida. Na tabela 6, est�o expostas as recomendações diet�ticas para tratamento da hipercolesterolemia. 7.1.2. Substituição parcial de ácidos graxos saturados por mono e poli-insaturados Apesar de os �cidos graxos saturados apresentarem importantes funções biol�gicas, seu elevado consumo est� associado a comprovados efeitos delet�rios, tanto sob o Quadro 5 – Recomendações para o manejo dos lípides sanguíneos Recomendação Grau de Recomendação Nível de Evidência Indivíduos de muito alto risco cardiovascular, o LDL-c deve ser reduzido para < 50 mg/dL e o não HDL-c < 80 mg/dL I B Indivíduos de alto risco cardiovascular, o LDL-c deve ser reduzido para < 70 mg/dL e o não HDL-c < 100 mg/dL I A Para indivíduos de alto e muito alto risco cardiovascular, sempre que possível e tolerado, deve-se dar preferência para o uso de estatina de alta intensidade ou ezetimiba associada à estatina (sinvastatina 40 mg ou outra estatina com potência pelo menos equivalente) I A Indivíduos de risco cardiovascular intermediário, o LDL-c deve ser reduzido para < 100 mg/dL e o não HDL-c < 130 mg/dL I A Indivíduos de risco cardiovascular intermediário, sempre que possível e tolerado, deve-se dar preferência para o uso de estatina de intensidade pelo menos moderada I A Indivíduos de baixo risco cardiovascular, a meta de LDL-c deve ser < 130 mg/dL e o não HDL-c < 160 mg/dL I A Não se recomenda tratamento medicamentoso visando à elevação dos níveis de HDL-c III A Indivíduos com níveis de triglicérides > 500 mg/dL devem receber terapia apropriada para redução do risco de pancreatite I A Indivíduos com níveis de triglicérides entre 150 e 499 mg/dL devem receber terapia, com base no risco cardiovascular e nas condições associadas IIa B LDL-c: colesterol da lipoproteína de baixa densidade; HDL-c: colesterol da lipoproteína de alta densidade. ponto de vista metab�lico124 quanto o cardiovascular,125,126 em raz�o de elevar o colesterol plasm�tico127 e por sua aç�o pr�-inflamat�ria.128 Recente metan�lise, com aproximadamente 59 mil indiv�duos, realizada pela Biblioteca Cochrane, reafirmou que a substituiç�o parcial de �cidos graxos saturados por poli-insaturados, por mais de 2 anos, reduziu em 17% o risco de eventos cardiovasculares. Nesta metan�lise foram inclu�dos apenas estudos randomizados e controlados e com alto Grau de Evid�ncia.129 A substituiç�o na dieta de �cidos graxos saturados por carboidratos pode elevar o risco de eventos cardiovasculares.130 Neste sentido, a substituiç�o de �cidos graxos saturados e carboidratos na alimentaç�o por �cidos graxos poli-insaturados est� associada ao baixo risco cardiovascular.131 Importante estudo epidemiol�gico, que avaliou a dieta da populaç�o de 20 pa�ses, mostrou que naqueles com alto consumo de �leos tropicais, a mortalidade por doença coronariana foi associada ao alto consumo de �cidos graxos saturados presentes nestas gorduras e tamb�m ao baixo consumo de �cidos graxos poli-insaturados da s�rie �mega 6.132 No Brasil, mostrou-se associaç�o com alto consumo de trans e com o baixo consumo de poli-insaturados, quando substitu�dos por saturados. Estabeleceram-se os pontos de corte de > 10% para �cidos graxos saturados, de < 12% para poli-insaturados e de > 0,5% para trans.132,133 Importante salientar que para o tratamento da hipercolesterolemia recomendam-se no m�ximo 7% das calorias na forma de �cidos graxos saturados e, segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE), o consumo m�dio atual deste �cido � de 9%. 18 Diretrizes Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017 Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76 Estudo conduzido apenas no Brasil mostrou que a inadequaç�o alimentar � a principal causa de mortalidade cardiovascular e reiterou que o baixo consumo de poli-insaturados, em substituiç�o à gordura saturada, aumenta a mortalidade por cardiopatia isqu�mica.134 O consumo de gorduras saturadas deve ser limitado, por�m o mais importante é sua substituição parcial por insaturadas − principalmente por poli-insaturadas, que est�o associadas a diminuiç�o de CT e LDL-c, como tamb�m est�o relacionadas à diminuiç�o de eventos e morte cardiovasculares.135-137 (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A). Faltam dados conclusivos para a indicaç�o de suplementaç�o de �cidos graxos insaturados.138,139 (Grau de Recomendaç�o: IIa; N�vel de Evid�ncia: B). É importante realçar que o modo de preparo de alguns alimentos tem papel fundamental no teor de gorduras nos alimentos. No caso dos peixes, o teor de poli-insaturados pode variar at� 220 vezes para uma mesma esp�cie.139,140 A substituiç�o por gorduras monoinsaturadas, como azeite de oliva e frutas oleaginosas, pode estar associada à reduç�o do risco cardiovascular, por�m as evid�ncias s�o menos robustas do que em relaç�o às poli-insaturadas136 (Grau de Recomendaç�o: IIa; ; N�vel de Evid�ncia: B). 7.1.3. Ácidos graxos trans Os �cidos graxos trans devem ser exclu�dos da dieta por aumentarem a concentraç�o plasm�tica de LDL-c e induzirem intensa les�o ateroscler�tica,141 condições que culminam em maior risco cardiovascular, conforme demonstrado em estudos experimentais, cl�nicos e epidemiol�gicos.131,133 (Grau de Recomendaç�o: III; N�vel de Evid�ncia: A). Tabela 6 – Recomendações dietéticas para o tratamento das dislipidemias Recomendações LDL-c dentro da meta e sem comorbidades* (%) LDL-c acima da meta ou presença de comorbidades* (%) Triglicerídeos Limítrofe 150-199 mg/dL (%) Elevado 200-499 mg/dL (%) Muito elevado† > 500 mg/dL (%) Perda de peso Manter peso saudável 5-10 Até 5 5-10 5-10 Carboidrato (%VCT) 50-60 45-60 50-60 50-55 45-50 Açúcares de adição (%VCT) < 10 < 10 < 10 5-10 < 5 Proteína (%VCT) 15 15 15 15-20 20 Gordura (%VCT) 25-35 25-35 25-35 30-35 30-35 Ácidos graxos trans (%VCT) Excluir da dieta Ácidos graxos saturados (%VCT) < 10 < 7 < 7 < 5 < 5 Ácidos graxos monoinsaturados (%VCT) 15 15 10-20 10-20 10-20 Ácidos graxos poli-insaturados (%VCT) 5-10 5-10 10-20 10-20 10-20 Ácido linolenico, g/dia 1,1-1,6 EPA e DHA, g - - 0,5-1 1-2 > 2 Fibras 25 g, sendo 6 g de �bra solúvel * Comorbidades: hipertensão arterial sistêmica, diabetes, sobrepeso ou obesidade, circunferência da cintura aumentada, hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia, síndrome metabólica, intolerância a glicose ou aterosclerose signi�cativa; † recomendação dietética na hipertrigliceridemia primária homozigótica: ver texto.145 LDL-c: colesterol da lipoproteína de baixa densidade; VCT: valor calórico total; EPA: ácido eicosapentanoico; DHA: ácido docosahexaenoico. Fonte: Adaptado de American Heart Association.143 e I Diretriz sobre o consumo de Gorduras e Saúde Cardiovascular.144 7.1.4. Colesterol alimentar Recente metan�lise mostrou que o colesterol alimentar exerce poucainflu�ncia na mortalidade cardiovascular,135 embora neste estudo tenha sido demonstrada linearidade entre o consumo de colesterol alimentar e a concentraç�o plasm�tica de LDL-c. J� o aumento do consumo de ovos, em um contexto de dieta com baixo teor de gordura, manteve a relaç�o LDL-c/HDL-c, tanto entre indiv�duos que absorvem mais colesterol da dieta quanto nos hiporresponsivos.142 Em raz�o destes estudos mais recentes da literatura, as atuais diretrizes internacionais sobre prevenç�o cardiovascular mostram que n�o h� evid�ncias suficientes para estabelecimento de um valor de corte para o consumo de colesterol. 7.2. Medidas no controle da hipertrigliceridemia 7.2.1. Terapia nutricional A concentraç�o plasm�tica de TG � muito sens�vel a variações do peso corporal e a alterações na composiç�o da dieta, particularmente quanto à qualidade e à quantidade de carboidratos e gorduras. A quantidade recomendada destes nutrientes na dieta depende do tipo de hipertrigliceridemia, que pode se apresentar na forma prim�ria ou secund�ria, cujas bases fisiopatol�gicas s�o distintas. A terapia nutricional indicada para a hipertrigliceridemia prim�ria grave, caracterizada pelo aumento da concentraç�o plasm�tica de quilom�crons, por diminuiç�o da enzima lipoprote�na lipase, baseia-se na reduç�o importante da gordura na dieta, que deve atingir, no m�ximo, 10% do valor cal�rico total.145 Na hipertrigliceridemia 19 Diretrizes Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017 Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76 prim�ria moderada, recomendam-se aproximadamente 25 a 35% das calorias na forma de gorduras e controle da ingest�o de açúcares. J� na hipertrigliceridemia de causa secund�ria, observada na obesidade e no diabetes, mant�m-se o controle de gorduras (30 a 35% das calorias) e a adequaç�o no consumo de carboidratos, com �nfase na restriç�o de açúcares.144 Atualmente, as recentes diretrizes e guias internacionais apontam para os benef�cios de padrões alimentares saud�veis, como demonstrado nos estudos INTERHEART109 e em diversos estudos que testaram a efici�ncia da Dieta do Mediterrâneo,122,146 nos quais a matriz alimentar assume papel de destaque. Em comum, todos estes estudos reafirmam a relevância de se manterem quantidades moderadas de gordura na dieta, eliminar �cidos graxos trans, controlar o consumo de saturados, priorizar poli-insaturados e monoinsaturados, reduzir açúcares e incluir carnes magras, frutas, gr�os e hortaliças na dieta146 (Quadro 6). 7.2.2. Controle de peso corporal O alcance das metas nutricionais no tratamento � vari�vel e depende da ades�o à dieta e às correções no estilo de vida, como perda de peso, e pode resultar na reduç�o de 20% da concentraç�o plasm�tica de TG.147 Al�m do controle de calorias na dieta (d�fice de 500 a 1.000 Kcal),148 enfatiza-se a relevância da qualidade dos nutrientes em aspectos relacionados ao desenvolvimento da obesidade, como saciedade, resposta insul�nica, lipog�nese hep�tica, adipog�nese, gasto energ�tico e microbiota.148 7.2.3. Redução de bebida alcoólica O consumo de bebida alco�lica n�o � recomendado para indiv�duos com hipertrigliceridemia.149 Por�m, h� alguma diverg�ncia no impacto da ingest�o de etanol nos triacilglicer�is (TAG) em situações de consumo moderado (at� 30 g/dia). A combinaç�o de um consumo excessivo de etanol e �cidos graxos saturados potencializa a elevaç�o da trigliceridemia. A inibiç�o da lipase das lipoprote�nas pelo excesso de etanol e a consequente reduç�o na hidr�lise de quilom�crons parecem justificar a lipemia induzida pelo etanol. Al�m disso, o produto da metabolizaç�o do �lcool � a Acetilcoenzima A (acetil-CoA), principal precursora da s�ntese de �cidos graxos. 7.2.4. Redução de açúcares e de carboidratos A Organizaç�o Mundial da Saúde passou a recomendar, a partir de 2015, o consumo m�ximo de 5% em Kcal do valor energ�tico da dieta na forma de açucares de adiç�o,143 nos quais se incluem a sacarose e o xarope de milho (American Heart Association − AHA). O guia alimentar americano publicado naquele ano incluiu ainda como açúcares de adiç�o os sucos de frutas concentrados, mesmo que n�o adoçados.136 Tanto a sacarose quanto os xaropes s�o constitu�dos por aproximadamente partes iguais de frutose e glicose, os quais s�o metabolizados de forma diferente. Enquanto existe um mecanismo celular de feedback de regulaç�o da glicose mediado pela fosfofrutoquinase, para a produç�o de piruvato e consequentemente de acetil-CoA e �cidos graxos, o mesmo mecanismo n�o ocorre para metabolizaç�o da frutose, que � metabolizada pela frutoquinase. Desta forma, a frutose gera �cidos graxos mais rapidamente do que a glicose, aumentando tanto o dep�sito de gordura hep�tica, como o aumento da produç�o de VLDL.150 Estudos mostram que o consumo superior a 50 g de frutose ao dia eleva o TG p�s-prandial.151 A elevada ingest�o de carboidratos aumenta a glicemia, o que promove o aumento da insulinemia; esta, por sua vez, ativa os fatores de transcriç�o que promovem a s�ntese de �cidos graxos e TG, favorecendo outros fatores de risco.152 7.2.5. Substituição parcial de ácidos graxos saturados por mono e poli-insaturados Os �cidos graxos saturados da dieta relacionam-se com a elevaç�o da trigliceridemia, por aumentarem a lipog�nese hep�tica e a secreç�o de VLDL. Desta forma, recomenda-se a inclus�o de poli e monoinsturados.153 Para indiv�duos com n�veis de TG muito altos, a AHA recomenda uma reduç�o significativa em gordura saturada, o que diminui o risco de pancreatite.143 Dentre os �cidos graxos poli-insaturados, os da s�rie �mega 3 s�o reconhecidos pela atividade cardioprotetora.154 O consumo de �mega 3 proveniente de fontes animais fornece os �cidos graxos EPA e DHA, mais associados à proteç�o cardiovascular. O �cido Alfalinolenico (ALA) produz pequenas quantidades end�genas de EPA e DHA, e tamb�m exerce aç�o cardioprotetora.155 As diferentes fontes de �mega 3, por meio da diminuiç�o da lipog�nese hep�tica e da LPL, contribuem de forma significativa com a reduç�o de triglicer�deos.156 Quadro 6 – Impacto da modi�cação de hábitos alimentares e estilo de vida na trigliceridemia Intervenção não medicamentosa Magnitude Nível de Evidência Redução de peso +++ A Redução da ingestão de bebidas alcoólicas +++ A Redução de ingestão de açúcares simples +++ A Redução da ingestão de carboidratos ++ A Substituição (parcial) ácidos graxos saturados por mono e poli-insaturados ++ B Aumento da atividade física ++ A Fonte: Adaptado de V Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose.25 20 Diretrizes Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017 Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76 7.3. Ácidos graxos ômega 3 Os principais �cidos graxos da s�rie �mega 3 s�o o �cido ALA (C18:3), de origem vegetal (soja, canola e linhaça), e os �cidos EPA (C20:5) e DHA (C22:6), provenientes de peixes e crust�ceos de �guas muito frias dos oceanos Pac�fico e Ártico. EPA e DHA tamb�m podem ser obtidos por aç�o enzim�tica de dessaturases e elongases sobre o ALA, que � um �cido graxo essencial e apresenta recomendaç�o de consumo pelas Dietary Reference Intakes (DRIs), que pode ser alcançada pela ingest�o moderada de �leo de soja ou canola, n�o sendo necess�ria sua suplementaç�o na dieta.157 A convers�o de ALA em EPA e DHA � limitada e sofre interfer�ncia de fatores fisiol�gicos e externos. Especialmente, EPA e DHA t�m sido investigados quanto ao seu potencial na reduç�o do risco cardiovascular. Os mecanismos propostos para os benef�cios cardiovasculares incluem reduç�o de marcadores inflamat�rios e da agregaç�o plaquet�ria, melhora da funç�o endotelial, reduç�o da press�o arterial e reduç�o da trigliceridemia.158-160 Em regiões onde est�o dispon�veis peixes que s�o fonte de �mega 3, � recomendada a utilizaç�o de padrões alimentares saud�veis, queincluam, no m�nimo, duas porções deles por semana, pelos efeitos ben�ficos em fatores de risco e pela reduç�o de risco de desfechos em prevenç�o prim�ria e secund�ria.161-163 Em prevenç�o prim�ria de indiv�duos com alto risco, o consumo de peixes que resultem na ingest�o di�ria de 500 mg de EPA + DHA est� relacionado à reduç�o de 39% do risco de DCV fatal e de 46% do risco de DAC fatal.164 Efeitos controversos s�o observados entre o consumo de peixes ricos em �mega 3 e a prevenç�o secund�ria de eventos cerebrovasculares.165 Em prevenç�o prim�ria, independente do grau de risco cardiovascular, o consumo di�rio de 250 mg de EPA e DHA pela alimentaç�o est� relacionado à reduç�o de 35% da morte súbita.166 Apesar de haver correlaç�o positiva entre os n�veis s�ricos de EPA e DHA e reduç�o do risco cardiovascular,167 estudos cl�nicos randomizados recentes n�o comprovam benef�cio da suplementaç�o de EPA e DHA na reduç�o de eventos cardiovasculares maiores, como infarto agudo do mioc�rdio, AVC e morte por DCV (Quadro 7).168-173 Como adjuvante no tratamento da hipertrigliceridemia, a suplementaç�o de �mega 3 (EPA e DHA) entre 2 a 4 g ao dia, pode reduzir a concentraç�o plasm�tica de TG em at� 25 a 30%.163,172 Em estudo recente, indiv�duos normolipid�micos e levemente hiperlipid�micos (TG > 150 e < 200 mg/dL) tamb�m se beneficiam com o consumo > 4 g ao dia de EPA e DHA provenientes de alimentos enriquecidos ou de animais marinhos, com reduç�o entre 9 a 26% da trigliceridemia, enquanto que a suplementaç�o entre 1 a 5 g de EPA e/ou DHA pode reduzir entre 4 a 51% em indiv�duos com n�veis lim�trofes.173 Alguns estudos mostram que a suplementaç�o com �mega 3 pode aumentar discretamente a concentraç�o plasm�tica de HDL-c (1 a 3%) e aumentar o LDL-c (at� 5 a 10%),172 em raz�o de reduzir os receptores de LDL, tamb�m chamados de receptores B/E. 7.4. Fitosteróis Fitoster�is, fitostan�is e seus �steres s�o um grupo de esteroides alco�licos e �steres, que ocorrem exclusivamente em plantas e vegetais. Possuem estrutura semelhante à do colesterol, diferindo apenas pela presença de um ou dois grupamentos metil ou etil em sua cadeia lateral, ligada ao C-24, sendo os ester�is as formas insaturadas (sitosterol e campesterol) e os estan�is, seus derivados saturados (sitostanol e campestanol).174 Óleos vegetais, cereais, gr�os e demais vegetais s�o fontes de fitoster�is, sendo o consumo habitual vari�vel em populações ocidentais (de 100 a 300 mg ao dia),175-177 alcançando 600 mg ao dia em vegetarianos.178 S�o pouco absorvidos (0,5 a 2% para os ester�is, e 0,04% a 0,2% para os estan�is)179 e possuem eficiente excreç�o biliar ap�s captaç�o hep�tica, com concentrações s�ricas 500 a 10 mil vezes menores do que as concentrações de colesterol.180 A aç�o dos fitoster�is no intestino delgado ocorre em tr�s etapas: (1) incorporaç�o às micelas que permitem o transporte destes at� a borda em escova do enter�cito; (2) transporte dos ester�is das micelas para o interior do enter�cito via transportador NPC1-L1; (3) transporte de volta à luz intestinal pelos cotransportadores ABC G5/G8.181-184 Quadro 7 – Recomendações e evidências para o consumo de ácidos graxos ômega 3 Ômega 3 Grau de Recomendação Nível de Evidência O consumo ≥ 2 porções de peixes ricos em EPA e DHA por semana está associado à redução do risco cardiovascular entre indivíduos em prevenção primária e secundária I A O uso de suplementos de EPA e DHA pode ser considerado na prevenção cardiovascular IIb B Suplementação com EPA e DHA (2 a 4 g) deve ser recomendada para hipertrigliceridemia grave (≥ 500 mg/dL) na vigência do risco de pancreatite, refratária a medidas não farmacológicas e tratamento medicamentoso I A Suplementação com EPA e DHA (1 a 5 g) pode ser recomendada para hipertrigliceridemia leve e moderada IIb B Suplementação com EPA e DHA (1 g/dia) pode ser recomendada na insu�ciência cardíaca IIa B EPA: eicosapentaenoico; DHA: docosahexaenoico. Fonte: Adaptado de Santos et al.144 21 Diretrizes Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017 Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76 O consumo de fitoster�is reduz a absorç�o de colesterol, principalmente por comprometimento da solubilizaç�o intraluminal (micelas),185 embora novos mecanismos tamb�m tenham sido propostos.186-188 Existe relaç�o inversa entre o consumo habitual de fitoester�is na dieta e os n�veis s�ricos de colesterol ou de LDL-c. J� a suplementaç�o de 2 g ao dia de fitoester�is reduziu o CT e o LDL-c em 8,2% e 9,3%, respectivamente,189-190 com reduções maiores em crianças e adolescentes (19%), bem como em pacientes com HF. Pode haver reduç�o de TG de 6 a 20%.191,192 Considera-se que, em m�dia, o consumo de 2 g ao dia reduza em cerca de 10% o LDL-c, com diminuições maiores quando associado a uma dieta pobre em gorduras saturadas e colesterol.189 Em adiç�o às estatinas, os fitoster�is reduzem em 10 a 15% o LDL-c, um efeito superior ao dobro da dose da estatina, geralmente pr�ximo de 6%;193-195 em adiç�o à ezetimiba, foi observada reduç�o adicional de 8% no LDL-c com 2 g ao dia de fitoster�is.196 Efeitos aditivos a outros hipolipemiantes, como fibratos ou sequestrantes de �cidos biliares, s�o menos descritos. O uso de fitoster�is deve ser parte das mudanças de estilo de vida e est�o indicados para: Indiv�duos com colesterol elevado e que estejam sob risco cardiovascular baixo ou intermedi�rio, que n�o se qualifiquem para tratamento farmacol�gico (Grau de Recomendaç�o: IIa; N�vel de Evid�ncia: A);25,197 como medida adjunta ao tratamento farmacol�gico em pacientes que n�o atingem as metas de LDL-c em tratamento com estatinas (Grau de Recomendaç�o: IIa; N�vel de Evid�ncia: A),194 ou sejam intolerantes a estas (Grau de Recomendaç�o: IIa; N�vel de Evid�ncia: C);198 e adultos ou crianças (a partir dos 5 anos) com HF (Grau de Recomendaç�o: IIa; N�vel de Evid�ncia: A).198,199 Os fitoster�is podem ser administrados incorporados a alimentos ou sob a forma de c�psulas, sendo sua efic�cia semelhante. Devem ser ingeridos preferencialmente nas refeições, podendo ou n�o ser fracionados em v�rias tomadas, sendo seus efeitos observados a partir de 3 a 4 semanas. Em nosso pa�s, est�o dispon�veis cremes vegetais acrescidos de fitoster�is e c�psulas contendo entre 650 a 900 mg por c�psula, devendo ser consumidas duas colheres de sopa de creme vegetal com fitoster�is, ou duas a tr�s c�psulas de fitoster�is por dia, para obtenç�o dos efeitos hipolipemiantes, e estar associado a uma alimentaç�o equilibrada e h�bitos de vida saud�veis. Pode haver modesta reduç�o nos n�veis de vitaminas lipossolúveis (carotenoides), uma condiç�o que pode ser revertida aumentando-se o consumo de vegetais.200 7.4.1. Uso terapêutico dos fitosteróis na infância, gestação e lactação Os fitoster�is t�m sido usados de maneira crescente na prevenç�o e no tratamento da hipercolesterolemia tamb�m em crianças, com reduç�o das concentrações de LDL-c na HF,201,202 hiperlipidemia familiar combinada e em dislipidemias n�o familiares. Seu uso � seguro e bem tolerado.203 Na HF, metan�lise de estudos que inclu�ram crianças demonstrou reduç�o do CT (7 a 11%) e do LDL-c (10 a 15%).204 O Expert Panel on Integrated Guidelines for Cardiovascular Health and Risk Reduction in Children and Adolescents205 recomenda o uso de ester�is/estan�is at� 2 g ao dia como uma medida de suporte em crianças com HF. Os fitoster�is s�o aprovados para uso pedi�trico a partir dos 5 anos no Brasil. A I Diretriz de Brasileira de Hipercolesterolemia Familiar199 recomenda a ingest�o de 1,2 a 1,5 g por dia em crianças portadoras de HF Heterozig�tica (HeHF) (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A). A European Society of Cardiology (ESC) e EAS orientam o consumo de suplementos contendo fitoster�is em adultos e crianças com dislipidemias.206 Poucos estudos testaram ouso de fitoster�is na gestaç�o e lactaç�o,207 sendo seu uso recomendado com cautela por este documento. A ingest�o de fitoster�is se acompanha do aumento dos ester�is plasm�ticos, no entanto, metan�lise demonstra que os n�veis circulantes destes ester�is s�o inferiores a 1% de todos os ester�is.206 Na fitosterolemia, seu uso � contraindicado. Os fitoster�is s�o bem tolerados e n�o se acompanham de efeitos adversos significativos; no entanto, n�o existem estudos de desfechos cardiovasculares em longo prazo para demonstrar a exist�ncia de benef�cios na reduç�o de desfechos cardiovasculares. 7.5. Proteína de soja O consumo di�rio de uma a duas porções de alimentos fonte de prote�na de soja, totalizando 15 a 30 g de prote�na, est� associado à reduç�o de 5% de LDL-c, ao aumento de 3% de HDL-c e à reduç�o de 11% na concentraç�o de TG (Grau de Recomendaç�o: IIa; N�vel de Evid�ncia: A).208 7.6. Fibras solúveis A aç�o das fibras na reduç�o do colesterol est� relacionada ao consumo de fibras solúveis, que formam um gel que se liga aos �cidos biliares no lúmen intestinal, aumentando sua excreç�o nas fezes e diminuindo sua reabsorç�o durante o ciclo entero-hep�tico. Essa reduç�o induz a s�ntese de novos �cidos biliares, diminuindo o colesterol dispon�vel para incorporaç�o em lipoprote�nas. Quanto maior o grau de viscosidade da fibra, maior o efeito de reduç�o do colesterol. Al�m disto, as fibras solúveis e o amido resistente s�o fermentados por bact�rias presentes no intestino grosso, produzindo �cidos graxos de cadeia curta, que auxiliam na reduç�o dos n�veis de colesterol. Em contraste, o consumo de fibras insolúveis n�o mostra efeitos na reduç�o do colesterol e do risco cardiovascular.209,210 Psyllium � a fibra solúvel mais estudada na reduç�o do colesterol. Uma revis�o de estudos indica que doses de 7 a 15 g ao dia est�o associadas com uma reduç�o de 5,7% a 20,2% de LDL-c e reduç�o de 2 a 14,8% de CT. O Psyllium parece n�o afetar significativamente os n�veis de HDL-c e TG. Deve-se orientar o consumo fracionado, antes das 22 Diretrizes Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017 Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76 grandes refeições. Estudos com aveia demonstram resultados semelhantes ao Psyllium, com reduç�o de 5,3 a 5,6% do LDL-c, sem efeitos significativos sobre o HDL-c e os TG. Vale ressaltar que � no farelo de aveia que encontramos os maiores teores de fibras solúveis (betaglucanas). Sugere-se o consumo de aproximadamente 3 g ao dia de betaglucanas.210 A ingest�o recomendada m�nima de fibras por dia � de 25 g, a fim de proteger contra DCV e câncer (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).210-212 7.7. Probióticos Apesar do crescente interesse em investigar o uso de probi�ticos na colesterolemia, os estudos mostram aus�ncia de seu efeito ou reduç�o muito modesta de concentraç�o plasm�tica de LDL-c. Uma metan�lise com 485 indiv�duos mostrou que a administraç�o de probi�ticos reduziu em 4,9 mg/dL o LDL-c, em 6,4 mg/dL o CT e em 3,95 mg/dL os TG, sem efeitos sobre o HDL-c.213 Outra metan�lise mostrou que a reduç�o de CT em indiv�duos tratados com probi�ticos foi de 7,8 mg/dL e 7,3 mg/dL para LDL-c, quando comparados com o grupo controle. Entre as cepas utilizadas que mostraram reduções significativas est�o os Lactobacillus acidophilus, uma mistura de L. acidophilus e Bifidobacterium lactis, e Lactobacillus plantarum. N�o houve diferenças significativas para HDL-c e TG.214 É importante ressaltar que cada cepa possui um efeito cl�nico diferente, sendo a dose usual de 109 UFC.215 A duraç�o do tratamento tamb�m pode afetar os resultados. Uma forte associaç�o foi observada quando o estudo teve duraç�o maior que 8 semanas.214 7.8. Mudanças no estilo de vida 7.8.1. Estratégias de adesão Praticar saúde vai al�m de expressões superficiais como: “coma bem”, “use �lcool com moderaç�o” ou “use escadas e n�o elevador”. S�o falas politicamente corretas, mas sem a especificidade necess�ria.216 Os programas de mudanças no estilo de vida t�m se mostrado efetivos no tratamento das DCV.217 Um programa que tem demonstrado uma relaç�o de custo e efetividade adequada com reduções significativas em risco cardiovascular � o Coronary Health Improvement Project (CHIP),218 aplicado por profissionais de saúde em hospitais219 e ambientes de trabalho.220 Apesar do sucesso deste trabalho desde 1987, uma vers�o deste programa, gravada em v�deo, tem sido aplicada por volunt�rios treinados e certificados para uma boa relaç�o com os participantes, em suas comunidades. Em estudo feito para avaliar a efetividade desta pr�tica que aumenta a ades�o da populaç�o,221 mudanças significativas em peso, press�o arterial, CT, LDL, TG e glicemia de jejum foram registradas. 7.9. Atividade Física Evid�ncias acumuladas ao longo das últimas d�cadas mostram que o exerc�cio f�sico tem papel muito importante na prevenç�o e no tratamento de DCV. Ele melhora a estrutura e a funç�o vascular. No endot�lio, o exerc�cio f�sico aumenta a biodisponibilidade de �xido n�trico e diminui a concentraç�o de endotelina (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).222 O efeito do exerc�cio f�sico na funç�o endot�lio-independente n�o � comprovado. A resposta vasodilatadora à administraç�o de nitroprussiato de s�dio � semelhante em indiv�duos treinados e em sedent�rios.223 Estes resultados corroboram a ideia de que os efeitos do treinamento f�sico na funç�o vascular est�o relacionados ao endot�lio. Na presença de DCV, h� evid�ncias de que o exerc�cio f�sico praticado regularmente diminui a formaç�o de neo�ntima, aumenta a circunfer�ncia luminal e provoca angiog�nese (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).224 O exerc�cio aumenta a mobilizaç�o de c�lulas progenitoras do endot�lio e a express�o da Óxido N�trico-Sintase Endotelial (eNOS) (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).224 Esta melhora na vasculatura est� associada ao fator de crescimento derivado do endot�lio e de fibroblastos. Finalmente, esta conduta n�o farmacol�gica reverte a resposta vasoconstritora da art�ria coron�ria à administraç�o de acetilcolina e aumenta o fluxo de reserva coron�ria à infus�o intracoron�ria de adenosina (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).224,225 Em relaç�o aos l�pides plasm�tico, o exerc�cio f�sico aumenta os n�veis de HDL-c (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: B).226 Seus efeitos nos n�veis absolutos de LDL-c s�o menos evidenciados. Entretanto, o exerc�cio f�sico aumenta a cin�tica de LDL-c na circulaç�o (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: B)227 e prolonga o per�odo que o LDL-c permanece na forma reduzida (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: B).228 Os efeitos do exerc�cio f�sico nos n�veis plasm�ticos de TG s�o muito significativos. A reduç�o da concentraç�o plasm�tica de TG tem sido consistentemente demonstrada (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).229 O programa de exerc�cio deve começar com uma avaliaç�o cl�nica e um teste ergoespirom�trico progressivo m�ximo230 para avaliar as respostas cardiovasculares e metab�licas em esforço, e a capacidade f�sica. Na impossibilidade de um teste ergoespirom�trico, deve ser realizado um teste ergom�trico. A sess�o deve ter duraç�o de 60 minutos e intensidade entre o limiar aer�bio e o ponto de compensaç�o respirat�ria, ou 60 a 80% da frequ�ncia card�aca de pico. A frequ�ncia deve ser de tr�s a cinco sessões por semana. A sess�o de exerc�cio deve incluir aquecimento e alongamento (5 minutos), exerc�cio aer�bio (30 a 40 minutos), exerc�cio de resist�ncia muscular localizada com intensidade menor ou igual a 50% da força de contraç�o volunt�ria m�xima (15 a 20 minutos) e exerc�cios de alongamento e relaxamento (5 minutos). 7.10. Cessação do tabagismo A doença ateroscler�tica encontra-se relacionada com a disfunç�o endotelial. A exposiç�o à fumaça do cigarro causapreju�zos à vasodilataç�o dependente do endot�lio em art�rias coron�rias, assim como em leitos microvasculares.231,232 A cessaç�o do tabagismo � ben�fica em qualquer fase da vida do fumante. A pr�tica cl�nica233 recomenda o uso de farmacoterapia para a cessaç�o do tabagismo em fumantes 23 Diretrizes Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017 Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76 motivados a parar de fumar. Os medicamentos de primeira linha para a cessaç�o tab�gica s�o a Terapia de Reposiç�o de Nicotina (TRN) com goma ou patch, bupropiona e vareniclina. Estes medicamentos demonstraram efic�cia na cessaç�o do tabagismo,233 embora algumas vezes surjam questionamentos quanto a segurança do uso em pacientes com DCV. As dúvidas em relaç�o ao uso de TRN, bupropiona e vareniclina foram revistas em metan�lise recente e a conclus�o � que estes medicamentos n�o determinam eventos cardiovasculares maiores, como infarto e AVC,234 e que o benef�cio da cessaç�o � indiscutivelmente impactante na morbimortalidade dos pacientes. Recente estudo avaliou influ�ncia destas drogas na frequ�ncia card�aca e na press�o arterial de fumantes portadores de DCV e demostrou que, em monoterapia ou uso combinado, elas n�o influenciam na frequ�ncia card�aca e na press�o arterial desta populaç�o com DCV235 (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A). 7.11. Exercício físico e aterosclerose O sedentarismo destaca-se entre os maiores fatores de risco na mortalidade global.236 A pr�tica regular de exerc�cios f�sicos aer�bios � associada a decr�scimo da morbidade e mortalidade cardiovascular, comprovadamente reduzindo o risco de evento coronariano fatal e n�o fatal em indiv�duos aparentemente saud�veis, com escore de risco coronariano elevado e tamb�m em cardiopatas (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).237 No contexto da reabilitaç�o card�aca, o exerc�cio cont�nuo de moderada intensidade, consensualmente uma forma segura e eficaz de treinamento f�sico, tem sido considerado priorit�rio (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).238 Em pacientes com doença coron�ria ateroscler�tica, o exerc�cio f�sico promove estabilizaç�o ou mesmo regress�o da aterosclerose (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A),239 al�m de acentuada queda da mortalidade, tanto por causa card�aca quanto por outras causas (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A),240 existindo uma inversa e independente associaç�o entre HDL-c e DAC, com destaque para a aç�o protetora de um de seus componentes, a ApoA-I (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).241 Entretanto, apesar do exerc�cio proporcionar desfechos cl�nicos altamente favor�veis, a elevaç�o de HDL-c e as quedas de CT, LDL-c e TG decorrentes de sua aç�o s�o modestas, conforme demonstrado em metan�lises,242 pouco contribuindo para a obtenç�o das rigorosas metas terap�uticas atualmente propostas. A explicaç�o para os desfechos cl�nicos favor�veis proporcionados pelo exerc�cio se d� principalmente pelas modificações funcionais, ocorrendo aprimoramento do funcionamento da HDL e da LDL, com aumento da resist�ncia à oxidaç�o da LDL, induç�o da produç�o de paraoxonase, modificações da HDL2 e HDL3, e aumento do efluxo de colesterol.243 Em estudo realizado com triatletas, foram constatados decr�scimos do CT, VLDL-c, ApoB100 e Lp(a), e elevaç�o do HDL-c imediatamente ap�s uma competiç�o, ocorrendo reduç�o das part�culas de LDL-c pequenas e densas (-62%) e aumento de subclasse de HDL-c (+11% HDL2), relacionados inversamente com o risco de DAC. Tamb�m foi observado reduç�o das subclasses de HDL-c (-16% HDL3), as quais s�o positivamente relacionadas com a DAC.244 A atividade f�sica de moderada intensidade promove reduç�o sustentada de VLDL-c e TG e atividade de grande volume em significativo aumento do HDL-c, que adquire caracter�sticas que favorecem suas múltiplas ações antiateroscler�ticas, com maiores quantidades de exerc�cio proporcionando benef�cios mais amplos, sendo, portanto, mais relevante o aumento do volume do que a intensidade (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).245,246 Confirmando a importância do tratamento cl�nico pleno, em estudo de seguimento de 10.043 indiv�duos em m�dia durante 10 anos, constatou-se que, embora a aptid�o cardiorrespirat�ria tenha sido preditora independente de risco de morte, com menores taxas de mortalidade conforme se elevava o desempenho em teste ergom�trico, o tratamento com estatina proporcionou um acr�scimo de benef�cio em todos os n�veis de aptid�o, inclusive para os mais aptos, evidenciando a importância do tratamento cl�nico pleno (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: B).247 Um programa de exerc�cios f�sicos, que devem ser realizados na maioria dos dias da semana, al�m dos exerc�cios aer�bios, deve contemplar exerc�cios resistidos e de flexibilidade (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: B).248 Os exerc�cios de resist�ncia devem ser executados por grandes grupos musculares, em s�ries de oito a 15 repetições, com cargas progressivas, suficientes para causar fadiga nas últimas tr�s repetições, por�m, sem falha do movimento. Idealmente, devem ser realizados tr�s vezes por semana, enquanto os exerc�cios para melhorar a flexibilidade devem ser realizados no começo e no final de cada sess�o (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: B).248,249 Os exerc�cios aer�bios devem ser realizados pelo menos tr�s vezes por semana, em sessões de 30 a 60 minutos de duraç�o. Na aus�ncia de teste ergom�trico, a intensidade do exerc�cio pode ser controlada subjetivamente pela percepç�o de esforço e, objetivamente, pela ventilaç�o pulmonar, sendo a atividade considerada predominantemente aer�bia quando o indiv�duo que caminha ou corre, por exemplo, permanece apenas discretamente ofegante, conseguindo falar frases completas sem interrupções, inspirando no decorrer de duas ou tr�s passadas e expirando no decorrer de uma ou duas passadas. O mesmo vale para as outras modalidades: ciclismo, nataç�o, dança etc. Assim, se houver uma atividade prolongada, realizada com a participaç�o de grandes grupos musculares, em que o individuo permanece confort�vel, podendo sincronizar o movimento do corpo com a ventilaç�o pulmonar, pode-se dizer que existe uma participaç�o predominante do metabolismo aer�bio (Grau de Recomendaç�o: I; N�vel de Evid�ncia: A).250 Caso esteja dispon�vel um teste ergom�trico realizado na vig�ncia da medicaç�o cardiovascular de uso cont�nuo, pode ser determinada a intensidade a partir da frequ�ncia card�aca pico do teste ergom�trico, conforme propõe o American College of Sports Medicine:248 para atividades leves e/ou leves a moderadas, 50 a 70% da frequ�ncia card�aca pico do teste ergom�trico considerado m�ximo; para atividades moderadas, 70 a 85% da frequ�ncia card�aca pico, sendo recomendada para treinamento dos que j� est�o bem adaptados à pr�tica de exerc�cios f�sicos; para atividades moderadas a intensas e/ou intensas, acima de 24 OBesiDADe e sOBrepesO: trAtAmentO DietétiCO OBJETIVO Fornecer recomendações para orientações sobre o tratamento dietético da obesidade. 73 inTRODUÇÃO Apesar de não haver controvérsia sobre o fato de que balanço energético negativo causado por redução na ingestão calórica resulte em diminuição da massa corporal, há muita diver- gência sobre a melhor maneira de promover essa redução de consumo de calorias. Antes de discutir essas maneiras, devem-se enfatizar alguns pontos importantes. Em primeiro lugar, o tratamento dietético é mais bem sucedido quando aliado a um pro- grama de modi�cação comportamental que envolva aumento no gasto energético, promo- vendo um balanço energético negativo. Para o sucesso do tratamento dietético, devem-se manter mudanças na alimentação por toda a vida. Dietas muito restritivas, arti�ciais e rí- gidas não são sustentáveis, embora possam ser usadas por um períodolimitado de tempo. Um planejamento alimentar mais �exível, que objetive reeducação, geralmente obtém mais sucesso, devendo considerar, além da quantidade de calorias, as preferências alimentares do paciente, o aspecto �nanceiro, o estilo de vida e o requerimento energético para a manuten- ção da saúde. O contato frequente entre o médico, ou o nutricionista e o paciente e o tempo dispendido com o paciente auxiliam muito na perda e na manutenção do peso perdido. Em longo prazo, o método, a velocidade de perda de peso, o ajuste �siológico e a habilida- de de manter as mudanças comportamentais de dieta e atividade física é que determinarão o sucesso de qualquer programa de emagrecimento. Uma avaliação adequada inclui, mas não está limitada à ingestão alimentar; história social, incluindo situação socioeconômica e motivação para controle de peso. A taxa meta- bólica de repouso deve ser calculada (por equações de predição, como Harris-Benedict ou Mi�in-St. Jeor) ou determinada (por calorimetria indireta), e combinada com o nível de atividade física (sedentário, pouco ativo, ativo, muito ativo) e a ingestão habitual em ter- mos de conteúdo de energia e nutrientes, pode ajudar no desenvolvimento de parâmetros nutricionais durante a intervenção. O nível de atividade física é necessário para estimar as necessidades energéticas (fatores de correção da taxa metabólica de repouso para sedentá- rio: 1,0-1,4; pouco ativo: 1,4-1,6; ativo: 1,6-1,9; muito ativo: 1,9-2,5). Considerar sedentário o indivíduo que não pratica atividade física regular programada ou não programada na maioria das semanas; pouco ativo quem pratica atividades como passeios a pé (que per- mitem conversar com facilidade); pouco ativo quem faz caminhadas rápidas que elevam a FC e os movimentos respiratórios (que permitem conversar, mas não cantar); ativo aquele OBesiDADe e sOBrepesO: trAtAmentO DietétiCO 75 que faz corridas ou trotes (que permitem conversar/cantar com di�culdade); muito ativo, quem faz corridas mais rápidas (e de longa duração). Deve-se manter uma adequada ingestão de micronutrientes e a dieta deve harmonizar-se com a ingestão dietética diária recomendada (IDR). Micronutrientes devem ser suplementa- dos se necessário. efeTiViDaDe Da DieTOTeRaPia Uma dieta planejada individualmente para criar um dé�cit de 500 a 1.000 kcal deve ser parte integrante de programas de perda de peso objetivando uma diminuição de 0,5 a 1 kg por semana, com metas realistas. Dietas com baixas calorias, com 1.000 a 1.200 kcal por dia, reduzem em média 8% do peso corporal, em três a seis meses, com diminuição de gordura abdominal, com perda média de 4% em três a cinco anos. Dietas de muito baixas calorias (very-low calorie diets, VLCD), com 400 a 800 kcal por dia, produzem perda de peso maior em curto prazo, em comparação às dietas de baixas calorias, mas em longo prazo, no período de um ano, a perda de peso é similar. Estas, devem ser feitas apenas em ambiente médico adequado e sob rígida supervisão. Reduzir a quantidade de gordura da dieta, em uma dieta hipocalórica, é uma maneira prá- tica de diminuir a ingestão calórica e induzir a perda de peso. Dietas que contenham 1.200 a 1.500 kcal por dia para mulheres e 1.500 a 1.800 kcal por dia para homens, independente- mente da composição de macronutrientes frequentemente levam à perda de peso. Uma revisão sistemática de estudos randomizados e não randomizados, sobre a efetivi- dade em longo prazo de vários tratamentos dietéticos para a obesidade, publicados entre 1931 e 1999, mostrou que 17 de 881 publicações revisadas preencheram os critérios para inclusão. A perda de peso inicial média foi de 11 kg (variando de 4 a 28 kg), mas apenas 15% de 2.132 pacientes que foram seguidos por 3 a 14 anos (média de cinco anos), preenche- ram pelo menos um dos critérios de sucesso (de�nidos como a manutenção de todo o peso perdido ou, pelo menos de 9 a 11 kg a menos que o peso inicial, perda de peso associada a melhora signi�cativa das comorbidades da obesidade). A manutenção da perda de peso foi maior nos pacientes nos quais se combinou dieta com terapia de grupo e/ou com acompa- nhamento em longo prazo. Os resultados foram semelhantes ao de outra revisão sistemáti- ca com mais de 700 estudos randomizados e não randomizados, realizados de 1972 a 1997, sobre os efeitos de diferentes dietas na perda de peso, que mostrou que um programa de dieta de 15 semanas ocasionou perda de 11 kg e manutenção de aproximadamente -6,5 kg do peso perdido após um ano. Estes e vários outros estudos subsequentes indicam que os pacientes obesos perdem peso quando mantidos com dieta restrita, mas que sua perda de peso tende a não se manter em longo prazo. Uma metanálise recente comparou estudos randomizados controlados avaliando a e�cá- cia na redução do peso corporal de dietas, exercícios físicos e programas combinados com pelo menos 12 meses de seguimento realizados em adultos com sobrepeso e obesidade. No total, 8 estudos foram incluídos, com 1.022 participantes, a maioria mulheres. Com 3 a 6 meses, não houve diferença entre programa combinado e só dieta (-0.62 kg; 95% CI -1,67 a 0,44), mas com 12 meses, o programa combinado foi melhor (-1.72 kg; 95% CI -2,80 a -0,64). 76 Obesidade e sObrepesO: tratamentO dietéticO Programa combinado comparado a exercício foi superior com 3 a 6 meses (-5.33 kg; IC 95% -7,61 a -3,04) e 12 a 18 meses (-6.29 kg; 95% CI -7,33 a -5,25). Durante intervenções dietéticas, as comorbidades da obesidade como hipertensão, disli- pidemia e outras condições devem ser acompanhadas cuidadosamente, monitorando as ne- cessidades de medicamentos e fazendo ajustes se necessário, especialmente nos remédios anti-hipertensivos e para diabetes, para evitar hipotensão e hipoglicemia. Alguns estudos iniciais em animais e relatos de casos em humanos mostraram ainda que dietas hipocalóricas poderiam potencialmente levar a benefícios em doenças neurológicas como demência, em redução da velocidade evolução tumoral, melhora da imunidade e cardioproteção. Grande porcentagem de pacientes recupera o peso perdido: 50% dos pacientes recuperam o peso pré-tratamento em 12 meses e a maioria, em cinco anos. Apenas 11% mantêm perda de 5 kg ou mais. Algumas dietas de emagrecimento são nutricionalmente corretas e consistentes com bons hábitos alimentares. Outras se apresentam como dietas milagrosas, que encorajam práticas irracionais, algumas vezes perigosas, e passam a ser feitas pela população, devido à promoção da mídia, ou porque são praticadas por celebridades. Não há nenhuma evidência cientí�ca de longo prazo sobre a efetividade dessas dietas, sem que se estabeleça um balanço energético negativo. Na percepção popular, a velocidade e a quantidade de perda de peso geralmente se confundem com o sucesso da dieta. Deve-se medir esse sucesso pela condição de se atingir e manter perda de peso clinicamente signi�cativa. DieTas Da MODa D��t�� r���� �m gordur� � pobr�� �m ��rbo�dr�to Caracterizadas por serem compostas de 55% a 65% de gordura, menos de 20% de carboi- dratos (até 100 g por dia), e 25% a 30% de proteínas. Apesar de toda a controvérsia, ainda são populares. A mais famosa delas é a Dieta Revolucionária do Dr. Atkins, publicada em 1972 e reeditada em 1992. Outros exemplos dela são Protein power, The carbohydrate additct’s diet, Dr. Bernstein’s diabetes so-lution, Life without bread, South Beach, e mais recentemente, Duncan e a dieta paleolítica ou Paleo. Os proponentes dessas dietas ignoram o conceito de que a ingestão calórica é importante tanto para a perda quanto para o ganho de peso. Defendem que uma dieta rica em carboidratos deixa o indivíduo menos satisfeito, resultando em mais fome, maior ingestão de carboidratos e maior produção de insulina, o que inibiria a liberação de serotonina cerebral, que, por sua vez, aumenta o apetite. Apesar desses autores alegaremque dieta rica em gordura leva à cetose, o que diminuiria o apetite, evidências mostram que não há diferença nem quanto ao apetite, nem quanto à sensação de bem estar. A diminuição da pressão arterial e a redução dos níveis séricos de glicose, insulina e LDL colesterol, provavelmente, são consequências da perda de peso, e não da composição dietética, especialmente caso se considere que a quantidade de gordura con- sumida em uma dieta rica em gordura pode ser semelhante à consumida antes do início da dieta. Todas as dietas hipocalóricas, se sustentadas em longo prazo, levam à perda de peso. Entretanto, em curto prazo, as dietas cetogênicas, ricas em gorduras e escassas em 77 Obesidade e sObrepesO: tratamentO dietéticO carboidratos, causam maior perda de água do que de gordura corporal. As dietas escassas em carboidratos e ricas em gorduras, especialmente saturadas em colesterol, são também ricas em proteínas animais e de�cientes em vitaminas A, B6 e E, folato, cálcio, magnésio, ferro, potássio e �bras. Portanto, requerem suplementação. Podem levar a halitose, dor de cabeça e litíase renal por oxalato, questionando-se a segurança cardiovascular do seu emprego a longo prazo. D��t�� pobr�� �m gordur� � mu�to pobr�� �m gordur� (m��o� d� 19%) Estas dietas ricas em carboidratos e com quantidades moderadas de proteínas foram histo- ricamente desenvolvidas para prevenir ou reverter doença cardiovascular e não para per- der peso. Entretanto, à medida que os norte-americanos tornavam-se mais obesos e seu anseio por livros sobre dietas aumentava, os autores dessas dietas mudaram o foco e o título de seus livros de doença cardíaca para perda de peso. Pode-se com-provar essa teoria ao se observar os títulos dos livros, nos últimos 20 anos, como os de Dean Ornish: Stress diet and your heart (1982), Dr. Dean Ornish’s program for reversing heart disease (1990) e Eat more, weight less (1993), e os de Nathan Pritikin: The Pritikin program for diet and ex- ercise (1979), The Pritikin promise (1983), The new Pritikin program (1990), The Pritikin weight loss breakthrough (1998) e The Pritikin principle (2000). São dietas ovolactovege- tarianas, compostas por vegetais, frutas, grãos integrais, feijão, moderada quantidade de ovos, laticínios escassos em gorduras, produtos de soja e pequenas quantidades de açúcar e farinha. Os indivíduos obesos que consomem dieta escassa em gorduras e ricas em car- boidratos ingerem menos calorias e perdem peso. Novamente, a quantidade de calorias ingeridas é mais importante que a composição dietética. Uma revisão narrativa do Ornish Multicenter Lifestyle Demonstration Project reportou signi�cativa diminuição na gordura corporal de 25,7% para 21,3%, em um ano, e para 22,4%, em dois anos. As dietas muito escassas em gorduras são de�cientes em vitaminas E, B12 e zinco. Dietas escassas em gorduras, que objetivam a manutenção do peso, diminuem o coles- terol total, LDL e HDL colesterol (de 11% a 23%), mas aumentam também os triglicerídeos em quase 50%. Em contraste, dietas escassas em gorduras hipocalóricas, que objetivam a redução de peso, resultam em diminuição de quase 25% do LDL colesterol, e os níveis de triglicerídeos permanecem inalterados. Dietas escassas em gorduras, ricas em carboidratos complexos, em �bras e hipocalóricas resultam em diminuição da pressão arterial, da glicemia e dos níveis de insulina em pacientes obesos e diabéticos. Pode-se atribuir tais benefícios muito mais à restrição de energia e à perda de peso do que à composição da dieta. Dietas com gorduras modi�cadas tipo do mediterrâneo Existem evidências de que a substituição de gordura saturada por gorduras monoinsatura- das, como azeite de oliva, abacate e nozes, pode melhorar o per�l lipídico e o controle glicê- mico, além de auxiliar na perda de peso. Isto acontece porque, segundo as pesquisas para os vários tipos de gorduras, há diferente captação, oxidação e efeito sobre o apetite. Podem-se prescrever essas dietas, com base na dieta do mediterrâneo, de uma maneira menos estrutu- rada, tipicamente com 40% de energia de gorduras, principalmente monoinsaturadas, e 40% de carboidratos. Um estudo de dois anos de acompanhamento concluiu que tais dietas são 78 Obesidade e sObrepesO: tratamentO dietéticO e�cientes na perda de peso, podendo-se utilizá-las como alternativa às dietas hipocalóricas. Devem-se efetuar estudos de longo prazo sobre a e�cácia das dietas ricas em gorduras mo- noinsaturadas, antes que se possa recomendá-las como baseadas em evidência. D��t� do í�d��� gl���m��o O índice glicêmico é usado para medir o relativo aumento da glicemia após uma quantida- de-padrão de dieta de carboidratos. Comidas como vegetais não feculentos, legumes, frutas e derivados do leite têm baixo índice glicêmico, enquanto produtos com grãos re�nados e batatas, um alto índice glicêmico. Alimentos com alto índice glicêmico, calorias por calorias, elevam mais os níveis de insulina do que os com baixo índice glicêmico, sugerindo que os que possuem alto índice glicêmico podem promover ganho de peso por dirigirem preferen- cialmente os nutrientes da oxidação no músculo para estocagem na gordura. Propôs-se que dietas com baixo índice glicêmico pudessem auxiliar na perda de peso. Um pequeno número de estudos de curto prazo com dietas com baixo índice glicêmico em um número limitado de casos de obesidade infantil, diabetes tipos 2 e 1, mas nenhum por períodos superiores a um ano, o que não valida essa dieta para recomendação. Um recente ECR não mostrou benefí- cio de dieta hipocalórica com alimentos com baixo índice glicêmico em relação a dieta com carboidratos com alto índice glicêmico em mudança do IMC, saciedade, fome e marcadores metabólicos por 6 meses, apesar da redução da insulina. J�jum ��t�rm�t��t� Uma revisão sistemática e metanálise avaliou o efeito da restrição de energia intermitente so- bre peso e marcadores biológicos em estudos de intervenção com duração superior a 6 meses. Nove estudos randomizados (num total de 981 indivíduos) identi�cados incluíram um grupo com restrição de energia intermitente comparados com um grupo de restrição de energia contínua. Perda de peso observada em todos os braços de restrição de energia intermitente, independentemente da duração do estudo ou duração do acompanhamento. Oito interven- ções em seis ensaios utilizados para as metanálises indicam que nem restrição energética contínua nem intermitente foi superior na perda de peso ou nas concentrações sanguíneas de lípidos, glicose e insulina. Os efeitos da restrição de energia intermitente a longo prazo permanecem obscuros pelo limitado número de estudos a longo prazo e de participantes. D��t� ��m glút�� Embora a dieta isenta de glúten seja reconhecida como terapêutica para os indivíduos que so- frem de doença celíaca, tem sido promovida recentemente para outras indicações, tais como o autismo, síndroma da fadiga crônica, síndrome do intestino irritável, ou simplesmente como uma escolha alimentar saudável para qualquer um. Alguns trabalhos experimentais exploram efeitos do glúten no metabolismo, com resultados con�itantes. Não há ERC em humanos. D��t� ��m l��to�� Nos últimos anos,muito tem sido dito sobre consumo de lácteos durante a vida adulta, es- pecialmente porque se refere ao leite de outras espécies de animais. Muitos nutricionistas apregoam cortar a lactose da alimentação. 79 Obesidade e sObrepesO: tratamentO dietéticO O consumo de laticínios, leite e iogurte é um elemento importante para uma dieta sau- dável e equilibrada. É o primeiro alimento para os mamíferos e fornece toda a energia e os nutrientes necessários para garantir o bom crescimento e desenvolvimento, sendo crucial no que diz respeito à formação da massa óssea. Os estudos epidemiológicos con�rmam a importância nutricional do leite na dieta humana e reforçam o possível papel do consumo de laticínios na prevençãode várias doenças crônicas, doenças cardiovasculares, alguns tipos de câncer, obesidade e diabetes. Os sintomas de má absorção de lactose e de alergia à proteína do leite de vaca (que podem ocorrer em 2 a 7% da população) são geralmente considerados como as reações adversas ao consumo de leite. Não há nenhuma evidência para apoiar o uso de dieta isenta de leite de vaca como um tratamento para sobrepeso e obesidade. PLanOs De DieTas RecOMenDaDas D��t�� b�l�����d�� Caracterizam-se por serem compostas de 20% a 30% de gorduras, 55% a 60% de carboidra- tos e 15% a 20% de proteínas. As dietas populares dessa categoria incluem as utilizadas por centros comerciais de perda de peso, como os Vigilantes do Peso, Jenny Craig e Nutri-sys- tems, e as dietas da pirâmide alimentar, MyPlate e do National Cholesterol Education Pro- gram. As dietas balanceadas têm uma longa história, baseiam-se tipicamente em princípios cientí�cos e são as que foram mais estudadas. Essas dietas são calculadas para promover um dé�cit de 500 a 1.000 kcal/dia, com um mínimo de 1.000 a 1.200 kcal/d para as mulheres e 1.200 a 1.400 kcal/d para os homens (exemplo, 1.000 a 1.500 kcal por dia para mulheres e 1.200 a 1.800 kcal por dia para homens). O objetivo das dietas balanceadas é permitir ao consumidor a escolha de maior varie- dade de alimentos, adequação nutricional, maior aderência, resultando em perda de peso pequena, mas sustentada. Diferentes percentuais variando entre 10%, 20%, 30% e 40% das calorias da dieta provenientes de gorduras não in�uenciaram a perda de peso nem a redução no percentual de massa gorda corpórea de mulheres adultas e obesas submetidas à restrição calórica e exercícios durante 12 semanas. Dietas escassas em gordura, sem ter como alvo a restrição calórica, auxiliam na perda de peso por reduzir a ingestão de calorias, que é mais acentuada nas pessoas mais pesadas. No entanto, dietas escassas em gorduras associadas à redução calórica produzem maior perda de peso. Dietas com 1.000 a 1.200 kcal/dia resultam em perda de 7 a 13 kg (média de 8%) e redução na gordura abdominal medida pela circunferência abdominal em média de 10 cm, no período de seis semanas a seis meses. Poucos estudos avaliaram o papel da frequência das refeições na redução caló- rica, não havendo uma conclusão. Quando a escolha de alimentos é apropriada, as dietas hipocalóricas balanceadas são nutricionalmente adequadas. Dietas hipocalóricas balanceadas, com quantidades mode- radas de gorduras, reduzem o LDL colesterol, normalizam os triglicerídeos e diminuem a pressão arterial. 80 Obesidade e sObrepesO: tratamentO dietéticO D��t�� d� mu�to b��x�� ��lor��� As dietas de muito baixas calorias, usualmente, proveem 400 a 800 kcal por dia e devem conter 0,8 a 1 g por quilo do peso ideal por dia de proteínas de boa qualidade e quantidades diárias recomendadas de minerais, vitaminas e ácidos graxos essenciais. São utilizadas como única fonte de nutrição durante quatro a 16 semanas e, em geral, são efetivas para pacientes que não obtiveram sucesso com outros tratamentos ou que tenham comorbidades, sendo necessária intensa supervisão. Podem ser pré-preparadas na forma de refeições líquidas ven- didas em farmácias ou também elaboradas de comidas normais, que contenham quantidade adequada de proteínas, vitaminas e sais minerais. Essas dietas produzem maior perda de peso na fase inicial, quando comparadas a outras formas de restrição energética, com redução de 9 a 26 kg em quatro a 20 semanas. Mas, ape- sar dessa grande perda de peso na fase inicial, estudos randomizados mostram, em um a dois anos, as mesmas perdas das dietas convencionais, com nenhuma perda ou redução de até 4 kg. O resultado pode ser melhorado em um a dois anos, se à dieta de muito baixas calorias se adicionar terapêutica com drogas ou modi�cação comportamental (perda de peso de 11,8 kg, variando de 9,2 a 14,2 kg, ou 11%). As dietas de muito baixas calorias são úteis para induzir rápida perda de peso e motivar o paciente muito obeso, mas devem ser seguidas por outro tratamento para manter a perda de peso. As dietas de muito baixas calorias são contraindicadas em pacientes com doença cardía- ca instável, insu�ciência cardíaca grave, doença cerebrovascular, insu�ciência renal aguda e crônica, doença hepática grave ou em fase terminal, transtorno psiquiátrico que possa inter- ferir com sua compreensão e execução; os efeitos colaterais podem incluir fadiga ou fraqueza, tonturas, constipação, pele seca, perda de cabelo, alterações menstruais e intolerância ao frio, e os efeitos secundários mais graves são desenvolvimento de gota e cálculos biliares. sub�t�tu�ção d� r����çõ�� Alguns estudos recentes avaliaram o efeito da substituição de refeições com acompanhamen- to médico regular na perda de peso com refeições preparadas ou suplementos alimentares, como shakes, sopas e barras de cereais. Durante o período de tratamento de um a cinco anos, a média de perda de peso foi de seis quilos, com redução variando de 3 a 9,5 kg, equivalente a 6,2%. Essa perda de peso associou-se à melhora na circunferência abdominal, glicemia, hemoglobina glicosilada, insulinemia, trigliceridemia, colesterolemia, nível da pressão arte- rial e qualidade de vida. Em outro estudo com acompanhamento médico regular, com qua- tro anos de duração, seu uso demonstrou resultados positivos no tratamento da obesidade, sugerindo que, associada à dieta hipocalórica, pode auxiliar no controle e manutenção da perda de peso. O Estudo Look Ahead avaliou o de substituição parcial de refeições em 5 mil pessoas com diabetes tipo 2, durante 12 anos uso em 16 centros nos Estados Unidos como intervenção estilo de vida intensivo comparando com recomendações dietéticas usuais. Com 12 meses de intervenção, a intervenção intensiva teve um consumo signi�cativamente me- nor de gordura e colesterol e maior ingestão de �bras do que os participantes de cuidado usual em educação em diabetes, além de consumir mais porções por dia de frutas, vegetais, leite, iogurte e queijo; e menos porções por dia de gorduras, óleos e doces. Essas mudanças relacionas com uma melhor qualidade de dieta foram mais frequentes nos participantes que 81 Obesidade e sObrepesO: tratamentO dietéticO consumiam dois ou mais substitutos de refeição por dia do que nos que substituiam menos de uma refeição por dia. O estudo incluiu atividade física regular e contato frequente com os pro�ssionais de saúde e mostrou efeitos bené�cos signi�cativos na HbA1c, lipídios e pressão arterial. O estudo mostrou que 39,3% dos 825 participantes que receberam uma intervenção de estilo de vida (que consiste numa redução de energia da dieta e prescrição de atividade física, e uma intervenção cognitivo-comportamental) que perderam pelo menos 10% do seu peso corporal no ano 1 mantiveram pelo menos 10% de perda no �m do ano 8, e 25,8% man- tiveram 5% a 10% de perda de peso. A Herbalife vende suplementos nutricionais e �toterápicos em comprimidos, cápsulas, bebidas e barras energéticas para controle de peso, melhora da nutrição, bem estar e esté- tica, através de estratégias de mercado on-line ou agentes de venda independente. Existem relatos publicados sobre lesões hepáticas após ingestão desses produtos em pelo menos 30 casos de cinco países (Suíça, Israel, Espanha, Argentina e Islândia). O padrão de lesão predominante foi hepatocelular, mas também foram observados padrões mistos e de coles- tase, com intensidade desde leve até lesão hepática grave, incluindo cirrose e insu�ciência hepática aguda com necessidade de transplante de fígado em dois casos, bem sucedido em um paciente, com óbito no segundo. A causalidade entre a ingestão de produtos Herbalife e evolução da lesão hepática foi avaliada em cinco de seis relatórios e considerada como cor- reta em pelo menos cinco pacientes por uma reação de reexposição positiva e provável na maioriados casos restantes. Os representantes da Herbalife negam a relação causal entre consumo de seus produtos e lesão hepática. Apesar de tudo, ainda permanece totalmente especulativo o que poderia ter sido a causa de dano hepático nos casos publicados uma vez que os pacientes ingeriram até 17 diferentes componentes presentes nos produtos Her- balife ao mesmo tempo. Obviamente, isso torna extremamente difícil (se não impossível) identi�car qual teria sido o composto ou os compostos responsáveis. Entre as hipóteses foi aventada uma lesão hepática imunomediada (pela in�ltração celular em alguns pacientes) ou a adulteração de produtos (após um relato de dois pacientes, dos quais um desenvol- veu cirrose após contaminação bacteriana de vários produtos da Herbalife com Bacillus subtilis). Como a Herbalife é produzida em inúmeras regiões do mundo, especula-se que os produtos contaminados com certos germes, ou produtos químicos, como amaciantes, conservantes, realçadores de sabor, pesticidas ou metais pesados adicionados durante o processo de fabricação ou contidos na matéria não re�nada, como extratos de ervas pode- riam ter sido responsáveis pela hepatotoxicidade (Refs. 13,20,22,33,67,74). D��t� d��h A dieta DASH (de dietary approach to stop hypertension) é um padrão alimentar que foi desenvolvido para reduzir a hipertensão em indivíduos com pressão moderada a alta, que incentiva o consumo de frutas, legumes, cereais integrais, nozes, legumes, sementes, lácteos com baixo teor de gordura e carnes magras e limita o sal, bebidas com cafeína e alcoólicas. Um limite diário de energia não é um componente da dieta DASH original, mas é comum ocorrer perda de peso. A dieta DASH combinado com a perda de peso sig- nificativamente aumenta reduções na pressão arterial superior à alcançada pela perda de peso por si só. 82 Obesidade e sObrepesO: tratamentO dietéticO Horár�o� � �r�qu����� d�� r����çõ�� Potencialmente consumir mais calorias no início do dia, em vez de no �nal do dia, pode aju- dar a controlar o peso. O mecanismo de ação pelo qual o momento da alimentação pode aju- dar a controlar o peso é por in�uência no ritmo circadiano. Ver capítulo anterior (Etiologia do sobrepeso e obesidade). Há apenas um ECR conduzido que examinou o tempo de ingestão de energia e a perda de peso em mulheres com sobrepeso e obesidade com síndrome metabólica por 12 sema- nas. O grupo que consumiu a maior parte das calorias no início do dia perdeu mais peso (quase 9 kg vs. cerca de 3,5 kg). Apesar disso, os ECR (três, todos de curta duração, de até 16 semanas) que avaliaram a in�uência consumo de café da manhã na perda de peso, não demonstram maior perda de peso com o consumo de café da manhã. O benefício parece ser o de consumir a maior parte das calorias pela manhã, e não simplesmente tomar ou não tomar café da manhã. Omitir alimentos no período da manhã e comer excessivamente à noite foi chamado de autofagia circadiana. Gu�� �l�m��t�r Recentemente, o Ministério da Saúde apresentou o Guia para a elaboração de refeições saudáveis em eventos, orientações e recomendações objetivando tornar coffee breaks, almoços, brunchs, lanches, dentre outros, espaços mais saudáveis e com este material facilitar a transformação de ambientes institucionais em espaços promotores de alimen- tação mais adequada e saudável, em especial nos espaços urbanos, ambientes de tra- balho, ambiente escolar e serviço de saúde, tomadas em conjunto com as demais ações de incentivo à atividade física e práticas corporais e mudanças estruturais nos espaços urbanos e institucionais que promovem mobilidade urbana e acesso a espaços públicos de lazer, ações estratégicas para prevenção e controle das DCNT e seus fatores de risco, e consequentemente, colaborar com a redução do sobrepeso e obesidade. O guia afirma que ter acesso a uma alimentação adequada e saudável não é algo fácil de ser alcançado, pois não se limita à responsabilidade de cada indivíduo fazer escolhas alimentares mais adequadas, e que diversos fatores de natureza física, econômica, política, cultural ou so- cial podem influenciar o padrão de alimentação das pessoas. Prossegue afirmando que os órgãos públicos e demais instituições responsáveis pelo fornecimento da alimentação em eventos podem contribuir para a promoção de ambientes saudáveis, ofertando alimentos que colaborem positivamente para a saúde da população, valorizem a cultura alimentar local e derivem de práticas produtivas ambientalmente sustentáveis. O guia segue suges- tões do Guia Alimentar para a População Brasileira de 2014, sugerindo que alimentos in natura sejam preferidos dando prioridade aos de origem vegetal, os processados sejam usados em quantidade pequena como ingredientes usados na preparação ou acompanha- mento dos alimentos in natura e os ultraprocessados sejam evitados ou minimamente consumidos. Óleo, açúcar e sal devem ser usados moderadamente, para temperar e pre- parar os alimentos. Açúcar em demasia, particularmente na forma de bebidas adoçadas consumidas em exagero deve ser evitado, e a substituição por edulcorantes não calóricos pode ser válida para reduzir o consumo de calorias da dieta. 83 Obesidade e sObrepesO: tratamentO dietéticO cOncLUsÃO O objetivo da intervenção é melhorar a saúde do paciente através da prevenção ou da me- lhora das complicações relacionadas com a perda de peso. Embora a perda de peso seja im- portante, não se deve ter o foco do tratamento na perda de peso corporal, por si só. Dieta, atividade física e modi�cação comportamental devem ser incluídas em todo tratamento da obesidade. Na presença de falência da intervenção mudança de estilo de vida ou em pacientes com uma história prévia de falência com tentativas de dieta com restrição calórica e aumento de atividade física, o tratamento medicamentoso deve ser indicado na presença de sobrepeso associado a fatores de risco ou de obesidade. 84 Obesidade e sObrepesO: tratamentO dietéticO 89 Princípios gerais da orientação nutricional no diabetes mellitus Aspectos básicos da terapia nutricional O cuidado nutricional em diabetes mellitus (DM) é uma das partes mais desa�adoras do tratamento e das estra-tégias de mudança do estilo de vida.1-4 A relevância da terapia nutricional no tratamento do DM tem sido en�atizada desde a sua descoberta, bem como o seu papel desa�ador na pre- venção, no gerenciamento da doença e na prevenção do desen- volvimento das complicações decorrentes.1,5 O controle metabólico é apontado como a pedra angular do manejo do diabetes, pois alcançar um bom controle reduz o risco de complicações microvasculares e pode, também, mi- nimizar as chances de doenças cardiovasculares.6,7 De modo semelhante, melhorar os níveis pressóricos e de lipídios pode ser e�caz na redução de eventos cardiovasculares.8,9 As esco- lhas alimentares promovem e�eito direto sobre o equilíbrio energético e, por conseguinte, sobre o peso corporal e os ní- veis pressóricos e de lipídios plasmáticos. Por muito tempo, acreditou-se na prescrição alimentar res- tritiva e com exclusão total dos alimentos com sacarose para o tratamento dietético do DM, mas, com o estudo Diabetes Control and Complications �rial (DCC�, 1993), houve uma “re- viravolta”, sobretudo para o DM1, que passou a considerar a in- clusão da sacarose no rol dos carboidratos do plano alimentar. Embora se saiba que a ingestão de carboidrato in�uencia dire- tamente os níveis de glicose pós-prandial, sendo ele o macro- nutriente de maior preocupação no manejo glicêmico,6,10 a tera- pia nutricional se concentra no equilíbrio dos macronutrientes para a manutenção do bom controle metabólico. Evidências cientí�cas demonstram que a intervenção nu- tricional tem impacto signi�cativo na redução da hemoglo- bina glicada (HbA1c) no DM1 e DM2, após 3 a 6 meses de seguimento com pro�ssional especialista, independentemen- te do tempo de diagnóstico da doença.11,12Além disso, quan- do associado a outros componentes do cuidado em DM, o acompanhamento nutricional pode �avorecer ainda mais os parâmetros clínicos e metabólicos decorrentes de melhor ade- são ao plano alimentar prescrito.5,12-15 A abordagem do mane- jo nutricional não deve ser somente prescritiva, mas também apresentar caráter mais subjetivo, de olhar comportamental, colocando o indivíduo no centro do cuidado. Esse en�oque considera a disposição e a prontidão do paciente para mudar, possibilitando, por conseguinte, adaptar as recomendações às pre�erências pessoais, em uma tomada de decisão conjunta.2 Ao contrário do DM1, que não pode ser evitado, o DM2 pode ser retardado ou evitado por meio de modi�cações do estilo de vida, que incluem alimentação saudável e atividade �ísica. A dieta mediterrânea é citada na literatura como re- �erência de padrão saudável para a população ocidental por promover a longevidade e ser capaz de reduzir 9% da morta- lidade geral por doenças cardiovasculares.16 No Brasil, o Guia Alimentar para a População Brasileira17 sugere a mistura “Ar- roz com �eijão” como a base da alimentação por apresentar excelente combinação de aminoácidos, além do incentivo ao consumo de alimentos in natura ou minimamente processa- dos e preparações culinárias em vez de alimentos ultrapro- cessados, com vistas ao consumo saudável e ao combate à obesidade. O alerta mundial para a prevenção do DM2 é re�orçado pelo substancial aumento da sua prevalência nas últimas dé- cadas. Apesar de a suscetibilidade genética parecer desempe- nhar um papel importante na ocorrência de DM2, a atual epi- demia provavelmente re�ete mudanças prejudiciais do estilo de vida, como aumento da ingestão energética e redução da prática de atividades �ísicas, o que, em associação a sobrepeso e obesidade, parece exercer papel preponderante no surgi- mento da doença.1-4 As recomendações para o gerenciamento nutricional do DM têm como base a melhor evidência cientí�ca disponível, a qual se encontra aliada com a experiência clínica, com pu- blicações periódicas por sociedades cientí�cas internacionais e nacionais. Nesse sentido, os guias da American Diabetes Asso- ciation (ADA), da Diabetes UK, da Canadian Diabetes Associa- tion (CDA) e do Royal Australian College o� General Practitioners (RACGP), sobre o tratamento do diabetes, en�atizam que o alcance das metas de tratamento propostas requer es�orço da equipe de saúde, que é composta por educadores em diabetes e nutricionista especializado, e do indivíduo com diabetes ati- vamente envolvido no processo.1-4 Segundo de�nição do Institute o� Medicine (IOM), terapia nutricional é o tratamento de uma doença ou condição por meio da mudança da ingestão de nutrientes ou de todo um alimento.18 A conduta nutricional direcionada a indivíduos com DM1 e DM2, pré-diabetes e DM gestacional (DMG) deve ser de�nida com base em avaliação e diagnóstico nu- tricional, para posterior programação das intervenções nu- tricionais. Acompanhamento e avaliações contínuas apoiam mudanças de estilo de vida em longo prazo, bem como possi- bilitam analisar resultados e modi�car intervenções, quando necessário.19 90 Princípios gerais da orientação nutricional no diabetes mellitus A abordagem nutricional individualizada requer mudan- ças no estilo de vida e objetivos que possam resultar em in- tervenções dietéticas complexas. Para essa individualização, é necessário conhecer alguns aspectos relacionados ao contexto da produção e do consumo dos alimentos, como cultura, re- gionalidade, composição de nutrientes e preparo de re�eições. Esse cenário justi�ca a recomendação do nutricionista como pro�ssional habilitado para implementar intervenções e edu- cação nutricional para indivíduos com diabetes. Paralelamen- te esse pro�ssional deve esclarecer os membros da equipe sobre os princípios da terapia nutricional, a �m de obter seu apoio nas implementações e desmisti�car concepções.1 A orientação nutricional tem como alicerce uma alimenta- ção variada e equilibrada. Além disso, o �oco é atender às neces- sidades nutricionais em todas as �ases da vida. Essa terapia tem como objetivos, ainda, manutenção/obtenção de peso saudá- vel, alcance das metas de controle da glicemia (tanto em jejum como pré e pós-prandial) e adequação dos níveis pressóricos e dos níveis séricos de lipídios, considerando-se o uso de �árma- cos para prevenir complicações de curto e médio prazos.1,3,4,7 Embora diversos estudos tenham tentado identi�car a melhor combinação de nutrientes para indivíduos com DM, uma revisão sistemática mostrou que não há proporção ideal aplicável e que, portanto, macro e micronutrientes devem ser prescritos de �orma individualizada.20 Sendo assim, a ingestão dietética em pacientes com DM (Quadro 1) segue recomen- dações semelhantes àquelas de�nidas para a população geral, considerando-se todas as �aixas etárias.18 Quadro 1. Composição nutricional do plano alimentar indicado para pessoas com diabetes mellitus. Macronutrientes Ingestão recomendada diária Carboidratos (CHO) 45 a 60%; é possível usar padrões alimentares com menor teor de carboidratos para DM2 de �orma individualizada e acompanhada por pro�ssional especializado Sacarose Máximo 5 a 10% do VET Frutose Não se recomenda adição aos alimentos Fibra alimentar Mínimo 14 g/1.000 kcal, 20 g/1.000 kcal para DM2 Gordura total (GT) 20 a 35% do VET; dar pre�erência para ácidos graxos monoinsaturados e poli-insaturados; limitar saturados em até 10% e isenta de trans Proteína 15 a 20% do VET Micronutrientes Ingestão recomendada diária Vitaminas e minerais Seguem as recomendações da população sem diabetes VET: valor energético total (considerar as necessidades individuais, utilizando parâmetros semelhantes aos da população sem diabetes, em todas as �aixas etárias). Educação nutricional em diabetes O ponto-chave da boa condução do diabetes é o envolvi- mento do paciente e dos �amiliares como parte ativa de todo o processo, de modo a desenvolver o autoconhecimento e auxi- liando na tomada de decisão.1 A educação voltada para a autogestão do DM é o processo de �acilitação de conhecimentos, habilidades e capacidades necessá- rias ao autocuidado da doença. Os objetivos globais da educação em DM, com relação ao indivíduo, são apoiar a tomada de de- cisão, orientar o autogerenciamento e a resolução de problemas, bem como promover a colaboração ativa entre paciente e equipe de saúde, a �m de melhorar os resultados clínicos, o estado de saú- de e a qualidade de vida de maneira e�caz em termos de custos.1,21 Serviços multidisciplinares que promovam educação em diabetes devem incentivar o conhecimento e desenvolver ha- bilidades necessárias ao autocuidado, sempre com a colabora- ção ativa da equipe de saúde. Esta deve ser especializada em diabetes e preparada para incentivar mudanças de estilo de vida e que contribua para melhorar os des�echos clínicos, o estado de saúde e a qualidade de vida. Devem considerar a in- dividualização do tratamento com relação ao nível de respos- ta de cada paciente, bem como de apoio social, �amiliar e de �atores psicossociais que a�etem o autogerenciamento do indi- víduo, tudo isso como parte dos cuidados clínicos de rotina.1 A American Association o� Diabetes Educators (AADE) relata que a construção de comportamentos saudáveis é apropriada para um programa de autogerenciamento da saúde, servindo como base para indivíduos com a doença incluírem uma alimentação saudável em seu estilo de vida, como parte do autocuidado. Essa construção apoia mudanças dietéticas e a prática de atividade �ísica, com o objetivo de promover a perda ou a manutenção do peso. Conscientizar o paciente da importância de um planejamento alimentar balanceado deve ser prioridade em todos os programas voltados a indivíduos com DM.22 Indivíduos com DM, tipos 1 e 2, e seus �amiliares devem ser inseridos em programas de educação nutricional desde o diagnóstico, com abordagem sobre
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