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Crise Prof.ª Dra. Tatiana Lima de Almeida Crises Evolutivas e Crises Circunstanciais As crises evolutivas dizem respeito à realização não satisfatória das passagens do desenvolvimento do indivíduo. Elas podem ser previsíveis, já que as etapas do crescimento e os momentos decisivos em cada uma delas são conhecidos e ocorrem com a maioria das pessoas. São as situações criadas internamente, por mudanças fisiológicas e psicológicas, que podem desencadear uma resposta de crise ou não, como, por exemplo, a concepção ou a esterilidade, a gravidez e o parto, a infância, a adolescência, a aposentadoria, o envelhecimento e a morte (Slaikeu, 1996; Wainrib & Bloch, 2000). Crises circunstanciais São aquelas decorrentes de situações encontradas principalmente no ambiente. Surgem em consequência de eventos raros e extraordinários, que o indivíduo não pode prever ou controlar, como a perda de uma fonte de satisfação básica, o desemprego, a morte abrupta, a perda da integridade corporal, as enfermidades, os desastres naturais, as violações e os acidentes. Imprevisibilidade Em uma situação de desastre, por conta da imprevisibilidade, da ameaça, do dano ou da perda, são produzidas emoções muito intensas, tanto para a vítima quanto para os seus familiares e pessoas próximas, inclusive para a equipe que lhe presta atendimento (Sánchez & Amor 2005). Diante disso, cabe ressaltar alguns fatores que podem conduzir a pessoa a resolver o impasse de maneira positiva, levando assim ao desenvolvimento e à aquisição de novas habilidades; ou negativa, gerando uma consequência danosa, que irá provocar sofrimento e desenvolvimento de possíveis psicopatologias imediatas ou a longo prazo. Assim, Liria e Veja (2002) consideram que o desenlace de uma crise pode ameaçar a saúde mental ou ser um marco para mudanças que permitam um funcionamento melhor do que o anterior ao desencadeamento do evento. De tal forma, quando a crise é resolvida satisfatoriamente, ela pode auxiliar o desenvolvimento do indivíduo; caso contrário, poderá constituir-se em um risco, aumentando a vulnerabilidade da pessoa para transtornos mentais. A crise é, sem dúvida, uma condição de reação frente a uma situação de perigo, capaz de ameaçar a integridade da pessoa. O indivíduo pode apresentar sinais e sintomas clínicos em resposta ao estado provocado. Crise e Adaptação Quando a resolução da crise se dá de forma adaptativa, surgem três oportunidades: a de dominar a situação atual, a de elaborar conflitos passados e a de apreender estratégias para o futuro (Parada, 2004). Estas novas habilidades para a resolução de problemas são também úteis para o manejo de situações posteriores. Concordando com o entendimento de que a crise possa se manifestar como uma oportunidade positiva, Erikson (1971) já a definia como um ponto crítico necessário ao desenvolvimento, capaz de conduzir o indivíduo a tomar uma direção ou outra, de modo a encaminhar seus recursos para o próprio crescimento, recuperação e maior diferenciação. Teoria da Crise Caplan (1980) e colaboradores desenvolveram estudos sobre a ‘teoria da crise’, que pode ser definida como um período de desorganização de um sistema aberto. A crise é precipitada por uma ou mais circunstâncias que, às vezes, ultrapassam a capacidade do individuo ou do sistema de manter a sua homeostase. Ela pode ser uma desestabilização passageira ou pode permanecer prejudicando o estado de equilíbrio do homem em relação ao seu corpo e ao meio ambiente. A crise pode advir de uma situação imprevisível - doença, desemprego e morte – ou previsível, como a adolescência, gravidez, envelhecimento, etc. Nesta perspectiva o adoecimento é entendido como uma forma de adaptação e de reação do sujeito, frente aos estímulos internos ou externos ao organismo De acordo com Knobloch (1998), o que nos importa aqui é marcar outra posição: a que pode considerar a crise também em seu lado positivo, buscando sua significação temporal e singular para o sujeito que a sustenta. Segundo Dell’Aqua (1988), poderíamos caracterizar como “situações de crise” aquelas que respondem a pelo menos três dos cinco parâmetros arbitrariamente especificados: - Grave sintomatologia psiquiátrica; - Grave ruptura no plano familiar e/ou social; - Recusa do tratamento; - Recusa obstinada de contato; - Situações de alarme em seu contexto de vida e incapacidade pessoal de afrontá-las. Tais parâmetros “. . .identificam aquelas situações que por alarme ou gravidade eram enviadas ao hospital psiquiátrico com internação forçada, além de definidas como perigosas para o sujeito ou para os outros” (DELL’AQCUA, 1988, p.59) O que é crise? A palavra “Crise” deriva do grego Krisis que em português significa: decisão, distinção, separação. Psicologia e crise Em psicologia, a palavra crise é utilizada principalmente na área da psicologia do desenvolvimento. O ser humano é um ser em equilíbrio e desequilíbrio constante, em todas as suas dimensões, ao nível biológico, psicológico, social, etc. A mudança, alteração ou mesmo perturbação a esse equilíbrio constante, é a chamada “crise psicológica”. Assim sendo, a Crise Psicológica corresponde à rutura da homeostase psíquica devido à perda ou mudança dos elementos ou fatores estabilizadores habituais, que exige necessariamente um esforço suplementar para manter o equilíbrio ou atingir novamente a homeostase. Sendo que a estabilidade psicológica depende de alguns fatores e/ou elementos, a crise é então considerada uma perda desses fatores, temporária ou permanente, ou então uma substituição rápida desses fatores por outros. Esta mudança requer a dependência de novos ou outros fatores para atingir a estabilidade, já que os antigos elementos/fatores já não estão presentes. Ao nível da crise psicológica as atitudes e comportamentos da pessoa é que vai definir a evolução da crise. Como vimos a crise é uma quebra do equilíbrio por ausência ou substituição de fatores e/ou elementos que “sustentavam” esse equilíbrio. Perante este desequilíbrio, a pessoa em crise psicológica têm “uma bifurcação no seu caminho”, tendo que tomar necessariamente uma decisão. Se continua esperando os fatores e/ou elementos que se perderam ou se ausentaram, responsáveis por proporcionaram o equilíbrio psíquico no passado (procurando o antigo equilíbrio) ou procura novos fatores e/ou elementos, novos e mais sólidos, proporcionando um novo equilíbrio. Esta escolha vai refletir-se na evolução da crise. Desta forma a crise pode ser vista como negativa, com sentido regressivo quando a pessoa não consegue o equilíbrio por depender de elementos que se perderam permanentemente, mas a pessoa ainda assim os espera. Ou pode ser vista como positiva ou momento de crescimento, constituindo um novo e mais forte equilíbrio, dependendo de fatores e elementos mais sólidos. Para a psicoterapia breve quando se fala em saudável ou não saudável está se perguntando se o paciente está ou não em crise ou a beira dela. Será entendido por crise: ruptura de equilíbrio, um corte na subjetividade, uma ruptura no sentido da vida . Conceito de crise A crise não ocorre, necessariamente, em função da angústia, ou por causa das circunstâncias da vida como casamento, desemprego, promoção no trabalho ou em virtude do falecimento de alguém ou alguma doença grave, ou de momentos de passagem como a adolescência ou a menopausa entre outros. Cada pessoa segue seu caminho baseando-se num sentido para sua vida por meio das experiências em suas primeiras relações significativas É importante conhecer o estilo pessoal de cada sujeito, o que ele faz, como se veste seus hábitos, preferências, sua visão de mundo. Pois, durante a crise as características da personalidade estão mais exaltadas ou inibidas A crise A crise se instala quando o sentido da vida sofre uma quebra assim o sujeito está impossibilitado de se auto perceber, a nova situaçãoo colocou fora da sua vida está alienado etimologicamente estranho a si mesmo. A crise geralmente leva aos sintomas por exemplo a síndrome do ninho vazio. O equilíbrio O equilíbrio se dá na sustentação das experiências emocionais atuais baseadas nas figuras significativas primitivas. Uma pessoa que está em crise ou a beira dela tem por opção a mudança ou restabelecer o equilíbrio anterior, cabe ao terapeuta identificar qual é a demanda. O manejo Paciente fora da crise: O foco será estabelecido nas características da personalidade do paciente ligadas ao motivo da consulta para pacientes que embora em sofrimento não está em crise . Terapeuta após a apreensão do estilo do paciente centrará à terapia no esclarecimento de seu modo de funcionamento, na psicoterapia dinâmica breve por exemplo, a partir dos 3 tipos de personalidade . Esta compreensão de si mesmo a partir da análise de suas características de personalidade proporcionará reflexão sobre si mesmo e o auxiliará a lidar com a angústia. Geralmente são pacientes que não resistiram a um tratamento psicoterápico longo. A PB costuma durar de 2 a 4 meses, justamente pelo fato de que a pessoa pretende apenas deixar seus conflitos e sua angústia de lado . Paciente à beira da crise Faz-se necessária uma avaliação da capacidade do sujeito atravessar (ou não) a crise. Caso não tenha condições, isto é, esteja fragilizado demais para se aventurar e realizar mudanças com desfechos imprevisíveis ou que não tenha demanda para tal, cabe indicar a PB para que o sujeito lide com as suas características de personalidade. São numerosos os pacientes nessa situação. Pacientes em crise Necessita de maior tempo de terapia devido à crise e à demanda. A mudança pode durar de 6 meses a um ano. O foco é centrado na crise levando-se em conta a demanda e as características ligadas ao tipo de personalidade . A caracterização da crise no modelo de Reforma Psiquiátrica Deve levar em conta três dimensões minimamente: a dimensão clínica - o diagnóstico sindrômico e o diagnóstico da estrutura clínica no sentido psicanalítico, a presença de comorbidades; a dimensão do laço social do sujeito - a rede de suporte, família, trabalho, renda, cultura; e, a dimensão da singularidade da pessoa - subjetividade (sujeito do inconsciente) sujeito de direitos e deveres. A posição da pessoa nessas dimensões demarca um processo de crise. Criatividade No atendimento à pessoa em crise o desafio é entrar na relação a partir da disposição, é como conciliar aproximação e negociação com aceitação e administrar os sentimentos e emoções envolvidos, intervenção esta, cuja habilidade requer no entrelaçamento entre as teorias da subjetividade e da complexa condição humana uma ação criativa. É na produção de um espaço criativo que se tem a possibilidade do dar- se conta do insuportável e do impossível. Crise na orientação psicanalítica Relacionam o conceito de crise ao conceito de trauma. Trauma “O trauma consiste em um acontecimento da crise que se define pela sua intensidade, pela incapacidade em que se acha o indivíduo de lhe responder de forma adequada, pelo transtorno e pelos efeitos patogênicos duradouros que provoca na organização psíquica” (LAPLANCHE & PONTALIS, 1986, p.678). No mesmo sentido, Knobloch, estudiosa de Ferenczi, também elabora sua teoria da crise em torno do tempo do traumático, trazendo grandes contribuições para uma nova conceituação do tema proposto. Knobloch (1998) A crise pode ser designada como uma experiência em que há algo insuportável, no sentido literal de não haver suporte, experiência que nos habita como um abismo de perda de sentido, em que se perdem as principais ligações. Este abismo se manifesta como um excesso de força pulsional que rompe a capacidade de simbolização mas, ao mesmo tempo, instaura uma eminente exigência de ligações até então inexistentes. Neste sentido, podemos dizer que para a autora, a situação denominada “crise” é a testemunha da vacilação do sistema de representação, é o irrepresentável, o inominável. Experiência limite, não por ser uma experiência que desafia o limite, mas por extravasar o delimitado. É uma experiência que traz um excesso, excesso do que é insuportável e intolerável...Ruptura em que se redistribuem, de uma maneira brutal as condições da realidade...instalando um estado inédito (Knobloch, 1998, p.133). Etapas da Crise Modelo de etapas da crise postulado por Horowitz (1976) 1 Desordem decorrente das reações iniciais diante do impacto. 2. negação, na tentativa de amortecer o impacto (um exemplo disso é a pessoa que procura não pensar no que aconteceu ou tenta continuar suas atividades como se nada tivesse ocorrido). 3. A terceira etapa seria a intrusão, que consiste no surgimento de ideias involuntárias de dor pelo evento verificado. Pesadelos recorrentes, imagens e outras preocupações são características desta etapa. 4. Elaboração, fase em que a pessoa começa a expressar, identificar e comunicar os seus pensamentos, imagens e sentimentos experimentados pela situação de crise. Alguns conseguem elaborar seus sentimentos, enquanto outros somente o farão com uma ajuda externa. 5. Integração do evento dentro da sua vida, pois a experiência foi enfrentada, os sentimentos e pensamentos identificados, possibilitando, assim, que a pessoa se reorganize. Eventos traumáticos Os eventos podem ser fatores decisivos para o desenvolvimento de um quadro de Transtorno de Estresse Agudo, caracterizado principalmente por intensa ansiedade, medo, impotência e horror, acompanhado de sintomas dissociativos como ausência de resposta emocional, sentimentos de desconexão, redução do reconhecimento de ambiente, sentimento de irrealidade e amnésia dissociativa (DSM IV TR, 2002). Resiliência Embora o foco em questão sejam as pessoas que vivenciam as situações de crise como resultantes em sequelas ou instabilidade emocional, é importante destacar que existem pessoas que possuem a capacidade de, frente a eventos traumáticos, resistir emocionalmente. Essa capacidade é chamada de “resiliência” (do inglês resilience). Assim, as pessoas resilientes conseguem manter um equilíbrio estável sem que tenham afetado o seu rendimento e a sua vida em geral quando acometidos por situações traumáticas. Poseck, Baquero e Jiménez (2006) afirmam que a diferença das pessoas que se recuperam de forma natural de um período disfuncional se encontra no fato de que os indivíduos resilientes não passam por este período, pois permanecem em níveis funcionais apesar da experiência traumática. Intervenção em crise É um procedimento para exercer influência no funcionamento psicológico do indivíduo durante o período de desequilíbrio, aliviando o impacto direto do evento traumático. O objetivo é ajudar a acionar aparte saudável preservada da pessoa, assim como seus recursos sociais, enfrentando de maneira adaptativa os efeitos do estresse. Nessa oportunidade, devem-se facilitar as condições necessárias para que se estabeleça na pessoa, por sua própria ação, um novo modo de funcionamento psicológico, interpessoal e social, diante da nova situação. Toda terapia que visa lidar com situações traumáticas passa necessariamente por recordar e rememorar a situação. É muito importante o relato verbal como elemento primeiro, visando clarificar e organizar o processo terapêutico. Dito de outra forma, para enfrentar um trauma, a primeira condição é enfrentá-lo, pois em termos de comportamento humano, salvo algumas exceções, a tendência é tentar reduzir o que é doloroso e desagradável, tentar esquecer o quanto antes. Uma situação de crise, se resolve, habitualmente entre 4 e 6 semanas. Sendo, às vezes, necessário um período de tempo maior para a resolução do evento estressante podendo a desorganização psíquica continuar por mais tempo, durando anos ou se transformar em algo crônico. Referências AZEVEDO, MariaAlice. Psicoterapia Dinâmica Breve: saúde mental comunitária. RIMA Editora, 2004. BRAIER, Eduardo. Psicoterapia Breve de Orientação Psicanalítica. Martins Fontes, 2008. GILLIERON, Edmond. Manual de Psicoterapias Breves. 2ed. Climepsi, 2004. Psicoterapia Breve - Prof.ª Dra. Tatiana Lima de Almeida
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