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A Vingança de Sombra de Bordo -MS Traduções-

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- POR MISTYSONG TRADUÇÕES
1
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TRADUZIDO POR MISTYSONG TRADUÇÕES
Essa tradução pode e irá sofrer correções de revisões com o passar do tempo.
2
AS ALIANÇAS
CLÃ DO TROVÃO
LÍDER ESTRELA DE CARVALHO - gato marrom robusto com olhos âmbares.
REPRESENTANTE CAUDA DE ABELHA - gato marrom escuro malhado.
CURANDEIRO ASA DE CORVO - pequeno gato preto com olhos azuis.
GUERREIROS (gatos e gatas sem filhotes)
SOMBRA DE BORDO - gata de pelagem grossa laranja e branca com olhos âmbares.
MANCHAS DE CERVO - gata malhada prateada e preta.
APRENDIZ, PATA DE URTIGA
DESEJO SARAPINTADO - gata mosqueada de pelagem laranja e olhos de um âmbar profundo.
CORAÇÃO FLORIDO - gato cinza malhado.
MANTO DE SEMENTE - gato marrom-claro e branco.
GARRA DE TORDO - gato marrom-claro malhado.
APRENDIZ PATA DE URTIGA - gato alaranjado.
ANCIÃO (antigos guerreiros e rainhas, agora aposentados)
PELO DE COELHO - gato cinza malhado.
CLÃ DO RIO
LÍDER ESTRELA NEGRA - gata negra.
REPRESENTANTE CAUDA PONTIAGUDA - gato cinza escuro.
GUERREIROS QUEDA D’ÁGUA - gato preto magrelo.
CREPÚSCULO DE MAÇÃ - gato marrom-pálido com olhos verdes.
APRENDIZ, PATA ELEVADA
BRILHO DE JUNCO - gata laranja escuro.
PELO DE LEITE - gata branca.
PÉ CHAPINHADO - gato cinza pálido.
3
CAUDA DE ENGUIA - gata cinza e preto malhada.
APRENDIZ PATA ELEVADA - gato cinza de pelagem grossa.
CLÃ DAS SOMBRAS
CURANDEIRO PELAGEM DE ABRUNHO - gato preto.
CLÃ DO VENTO
CURANDEIRO ASA DE COTOVIA - gato cinza malhado.
GUERREIROS VÔO LIGEIRO - gato cinza pálido malhado.
PELO DE MOSQUITO - gato marrom peludo.
GATOS QUE NÃO PERTENCEM A CLÃS
MYLER - gato preto e branco.
4
MAPA
5
CAPÍTULO 1
— Olha por onde anda, Sombra de Bordo! Você pisou na minha cauda! — O guerreiro do Clã do Vento se afastou com um
silvo.
— Desculpe, Vôo Ligeiro. — A gata pediu desculpas por cima de seu ombro, enquanto mergulhava mais fundo na multidão
de pelos. A luz da lua cheia conferia uma tonalidade de prata às pelagens dos guerreiros presentes, aquelas fazendo o focinho de
Sombra de Bordo pinicar. Acima dela, a voz de Estrela de Carvalho ecoava pelas quatro grandes árvores.
— Meus guerreiros rastrearam as víboras até seus ninhos, na Rochas das Serpentes, e bloquearam as passagens com pedras
— informou o líder do Clã do Trovão. — Graças à sua coragem, nenhuma outra cobra foi avistada em nosso território desde então.
— Eles tiveram sorte de não serem picados — resmungou um sênior do Clã das Sombras, próximo de Sombra de Bordo.
— Exatamente — concordou o colega de clã. — Lembra quando Pata de Brejo topou com uma víbora em sua primeira
patrulha? Aquela foi uma maneira terrível de morrer.
O primeiro gato deu de ombros.
— Eu já vi piores.
Sombra de Bordo revirou os olhos. Só mesmo os gatos do Clã das Sombras para se tornarem competitivos pela pior morte
que já viram. Ela desviou de algumas pedras e se juntou a um grupo do Clã do Rio. Instantaneamente os pelos ao seu redor se
eriçaram e ela sentiu olhares hostis em sua direção.
— Podemos estar em trégua — rosnou o guerreiro negro, Queda d'Água. —, mas não abuse da sorte, escória do Clã do
Trovão.
A gata abaixou a cabeça.
— Não vim fazer nenhum mal — ela miou. — Estou só de passagem.
— Ótimo — murmurou um gato que ela não pôde ver.
Sombra de Bordo forçou sua pelagem a abaixar enquanto passava pelos guerreiros hostis. Ela não podia culpar o Clã do Rio
por estar com raiva. O Clã do Trovão havia triunfado na última batalha pelas as Rochas Ensolaradas; a derrota foi a ferida mais
amarga de todas.
— Lembre-se do que aconteceu com Rosto de Bétula e Pata de Flor — Queda d'Água sussurrou em sua orelha, tão perto que
ela podia sentir o calor do seu hálito de peixe. — Aquelas pedras pertencem a nós, e mataremos quantos forem necessários até que
vocês as entreguem.
A guerreira tropeçou conforme uma lembrança inundou o seu cérebro: Crepúsculo de Maçã, um guerreiro do Clã do Rio de
pelagem marrom-clara e penetrantes olhos verdes, golpeando Rosto de Bétula com tanta força que o gato do Clã do Trovão perdeu o
equilíbrio e escorregou do topo das Rochas Ensolaradas. Ele caiu no rio, espalhando água para todos os lados. Seu aprendiz, Pata de
Flor, saltou atrás dele e lutou para manter a cabeça do mentor para fora da água, mas a corrente era muito forte, e eles foram
arrastados leito abaixo para as pedras submersas. Por um terrível momento, duas cabeças, uma listrada e outra manchada, surgiram na
superfície, gritando de medo, desaparecendo logo depois na água espumante. Seus corpos foram encontrados logo depois das pedras,
debruçados na costa do Clã do Trovão, como se estivessem fazendo um último e desesperado esforço para ir para casa.
Sombra de Bordo engoliu uma súbita raiva dos guerreiros à sua volta. Por que o Clã do Rio insistia em lutar por um monte de
rochas que eram claramente território do Clã do Trovão? Ela abaixou a cabeça e abriu o caminho por entre a multidão de felinos
irritados, chegando a um canto vazio, onde as sombras se aglomeravam mais densamente; suficientemente escuro para se esconder.
De repente, uma pálida figura marrom apareceu na frente dela, e as narinas da gata se dilataram com o cheiro de peixe. Ela olhou para
cima, seu coração batendo.
— O que você está fazendo aqui? — sibilou Crepúsculo de Maçã, com suas longas garras dianteiras refletindo a luz da lua
enquanto afundavam na grama.
As palavras da guerreira pareciam estar presas em sua garganta. Ela olhou para os olhos cor-de-azevinho do guerreiro do Clã
do Rio e tentou respirar normalmente. Se perguntava se algum dos seus companheiros de clã estavam observando.
6
Crepúsculo de Maçã deu um passo mais perto e baixou a cabeça até que o seu focinho escovou a ponta da orelha de Sombra
de Bordo.
— Você sabe o quão perigoso é para você estar aqui. O que aconteceria se seus companheiros a vissem falando comigo?
A gata inclinou-se para a frente até que sua bochecha fosse pressionada contra o pelo macio do peito do guerreiro.
— Eu precisava falar com você — ela murmurou. — Já faz muito tempo. Esperei por você no sicômoro todas as noites, mas
você nunca veio.
A respiração do gato aqueceu a parte de trás do pescoço dela. — Eu sei — ele ronronou. —, mas desde a batalha, dobramos
nossas patrulhas nas fronteiras, mesmo depois do anoitecer. Eu não posso atravessar o rio sem ser avistado.— Ele deu um passo para
trás, e Sombra de Bordo sentiu uma onda de ar frio em sua pele. — Vou tentar atravessar na lua nova. As coisas podem ter se
acalmado até lá.
— Se você não tivesse matado Rosto de Bétula… — sussurrou ela. — De todos os gatos para morrer na batalha, tinha que
ser o filho de Estrela de Carvalho?
Ela sentiu Crepúsculo de Maçã enrijecer sob sua pele.
— Foi um acidente, — ele resmungou. — Eu nunca quis que ele caísse no rio.
A guerreira fechou os olhos.
— Essa não é a forma como os meus companheiros vêem; eles culpam você por ambas as perdas.
— Então eles são tolos. — O guerreiro estremeceu, depois relaxou. — Mas as Rochas Ensolaradas sempre fizeram nossos
clãs agirem como dois cérebros de camundongo. — Ele lambeu o topo da cabeça de Sombra de Bordo. — Agradeço ao Clã das
Estrelas por você não ter se machucado na batalha.
A gata olhou para ele. Oh meu precioso guerreiro. Eu te amo com todo o meu coração.
— Há algo que você precisa saber — disse ela.
Crepúsculo de Maçã estava olhando por cima da cabeça, em direção ao lume de lua, onde seus companheiros estavam de pé.
— Não pode esperar?
— Acho que não — Sombra de Bordo respirou fundo. — Estou esperando por seus filhotes.
Houve um flash verde quando o felino arregalou seus olhos.
—Você tem certeza? — Ela assentiu com a cabeça. O guerreiro do Clã do Rio enrolou a cauda sobre suas costas. — Eu vou
ser pai… — ronronou. — Incrível. — Ele inclinou a cabeça para um lado. — Mas esses filhotes serão meio clãs; meio Clã do Rio. O
que osseus companheiros pensarão sobre isso?
— Eles não saberão. — Respondeu Sombra de Bordo. Ela notou que o companheiro hesitava. — Pelo menos, não no início
— continuou. — Eu vou criá-los como gatos do Clã do Trovão até que eles tenham sido totalmente aceitos. Então, cada gato poderá
lidar com a verdade. Por que é tão importante que seu pai viva em um clã diferente?
Os pelos sobre os ombros de Crepúsculo de Maçã se contraíram.
— Você tem grande fé em seus colegas — murmurou.
— Não; eu tenho fé no Clã das Estrelas e no código dos guerreiros.
— Você acha que o Clã das Estrelas aprova o que estamos fazendo? — Ele estreitou os olhos.
— Eu acho que nossos ancestrais sabem que nossos clãs precisam de filhotes, e nós os estamos fornecendo. Como nossos
filhos inocentes não podem ter sua benção? Eles crescerão para serem bons guerreiros; leais ao Clã do Trovão e ao Clã do Rio
igualmente. — A gata se afastou antes que ele pudesse dizer qualquer outra coisa. — Eu devo retornar aos meus companheiros antes
que eles venham me procurar. Talvez seja melhor que não nos vejamos novamente até que os filhotes tenham nascido. — Ela olhou
por cima de seu ombro. — Mas vou pensar em você todos os dias, meu amor.
Quando adentrou as sombras que rodeavam o vazio, a gata pôde ouvir passos rápidos.
— Crepúsculo de Maçã! Aí está você! Eu estava te procurando! — Sombra de Bordo parou, esperando que suas manchas
brancas não estivessem refletindo a luz da lua. Uma gata laranja-escuro se pressionou contra o ombro do guerreiro. — Um dos
anciãos do Clã das Sombras está contando uma história sobre um gato que engoliu um sapo vivo — disse ela. — Venha e escute, é
muito engraçado!
Com um olhar preocupado para a escuridão onde a companheira se escondia, Crepúsculo de Maçã seguiu a gata de volta para
grupo de felinos. A guerreira laranja ajeitou a cauda até que ela estava nas costas do gato marrom-claro.
Sombra de Bordo afastou os lábios. Fique longe dele, Brilho de Junco. Ele é meu! Esses filhotes serão a prova disso!
— Sombra de Bordo, acorde! — Um pequeno rosto cor-de-gengibre atravessou os ramos que protegiam a toca dos
guerreiros. — Cauda de Abelha quer que você vá na patrulha do amanhecer. Você está atrasada!
— Tudo bem, Pata de Urtiga, eu estou indo. — Sombra de Bordo se levantou com dificuldade. Na noite passada, ela sentiu
os filhotes mexendo dentro dela pela primeira vez. É porque o seu pai sabe sobre vocês agora? pensou. Ela virou a cabeça para
lamber o pelo desgrenhado em seu flanco, e andou para fora da toca. Sentia-se estranhamente pesada e desequilibrada pela barriga
inchada.
7
O ar na clareira estava parado e frio, com o gosto de folhas antigas e de terra úmida. O pequeno aprendiz de laranja saltitava
em torno da guerreira.
— Se apresse! Quando foi que você ficou tão lenta?
Sombra de Bordo o golpeou levemente com a cauda.
— O que Manchas de Cervo faria se você falasse assim com ela, ein?
Pata de Urtiga abaixou o olhar com a menção de sua mentora.
— Ela provavelmente me faria arrancar os carrapatos de Pelo de Coelho por uma lua — admitiu.
A guerreira ronronou, alegre demais com a sua gravidez para ficar brava.
— Você tem sorte de eu não castigá-lo, então. Agora vá e deixe-me falar com Cauda de Abelha.
O aprendiz correu com um gritinho. Sombra de Bordo dirigiu-se ao representante do Clã do Trovão, que estava parado ao
lado da entrada da toca de Estrela de Carvalho. O gato marrom-escuro malhado assentiu quando Sombra de Bordo se aproximou.
— Eu gostaria que você se juntasse à patrulha do amanhecer, por favor — ele miou. — Desejo Sarapintado irá liderar.
— Na verdade, há algo que eu preciso dizer. — Começou a gata. Suas patas pinicaram. — Não poderei cumprir os meus
deveres habituais por um tempo; estou esperando filhotes.
Cauda de Abelha piscou.
— Oh; certo. Eu... Uh... Não estava esperando por isso. Bem, você poderá fazer o que você se sentir disposta a realizar.
Estrela de Carvalho já sabe?
— Ainda não. Por que não ajudo no acampamento por hoje? — Sugeriu Sombra de Bordo. Ela não conseguiu resistir a olhar
a curva da barriga dela. — Eu poderia ir buscar musgo com água para os anciãos, se você quiser.
— Isso seria ótimo — disse, alternando o peso entre as patas. — E, uh, parabéns.
— Obrigada — miou Sombra de Bordo. — É uma notícia maravilhosa, não é?
— De fato — o felino miou. — Esses filhotes... quem é o pai deles?
— Eu vou criá-los sozinha — respondeu ela com firmeza.
O representante pareceu surpreso por um momento, depois acenou com a cabeça:
— Que o Clã das Estrelas guie seu caminho, e o caminho dos seus filhos.
Ainda ronronando de alegria, Sombra de Bordo virou-se e voltou para a clareira. Como não era mais necessária na patrulha
do amanhecer, ela poderia voltar para o seu ninho até o resto do clã se levantar. Sabia que tinha que guardar suas forças para quando
os seus filhotes nascessem.
Ela estava dormindo na luz do sol, quando foi despertada por patas tropeçando fora da toca. Desejo Sarapintado entrou com
pressa; tanto seu pelo, dourado, quanto seus olhos cintilavam.
— Cauda de Abelha me contou as novidades! — ela ronronou. — Eu estou tão feliz por você!
Sombra de Bordo se sentou e enrolou sua grossa cauda branca sobre as patas.
— Obrigada. — disse. Vê, Crepúsculo de Maçã? Meus companheiros de clã estão encantados de ter novos filhotes no
acampamento!
A guerreira dourada se colocou ao lado do ninho de Sombra de Bordo, olhando para ela com uma timidez incomum.
— Cauda de Abelha também disse que você estaria criando esses filhotes sozinha... — Sombra de Bordo ficou tensa; ela não
havia antecipado perguntas sobre o pai dos filhotes tão cedo. Desejo Sarapintado olhou para o chão da toca. — Isso... Isso é porque o
pai deles está morto? — Ela ergueu o olhar, e a rainha quase estremeceu com a chama de esperança em seus olhos. — Esses filhotes
são de Rosto de Bétula? — sussurrou. — O meu irmão vai viver através de você?
O ar na toca dos guerreiros subitamente ficou tão espesso que Sombra de Bordo mal conseguiu recuperar o fôlego. O Clã das
Estrelas está me mostrando o caminho para que meus filhotes sejam aceitos pelos seus companheiros? Eu não posso mentir, não se eu
quiser que eles saibam a verdade mais tarde. pensou. Ela olhou para a outra gata, incapaz de falar.
A felina dourada não parecia precisar de uma resposta. Ela assentiu devagar, e a luz em seus olhos queimou, ainda mais
brilhante.
— Estou certa, não estou? Obrigada, Clã das Estrelas! E muito obrigada, Sombra de Bordo. Você nunca saberá o quanto isso
significa para mim. Eu... Eu pensei que nunca mais ficaria feliz novamente depois que Rosto de Bétula foi morto naquela batalha
terrível. Mas agora posso ajudar você a criar os filhos dele, ensinar-lhes que seu pai era um verdadeiro herói do Clã do Trovão, vê-los
tomar os seus lugares no clã... — Ela parou e pisou gentilmente no ninho até que estivesse agachada ao lado da futura mãe. A gata
esticou a pata da frente, descansando-a no flanco laranja e branco de Sombra de Bordo. — Espero que Rosto de Bétula possa nos ver
agora — murmurou.
A rainha respirou fundo. — Eu não menti em voz alta. Isso tudo foi feito pela própria Desejo Sarapintado, mas não posso
recusar a chance de ter meus filhotes acolhidos com o amor que eles merecem. Crepúsculo de Maçã entenderá que tenho que colocar
o Clã do Trovão em primeiro lugar; por agora.— Ela ajeitou a cauda até que esta ficasse em cima do ombro da guerreira dourada.
— Você respondeu minhas orações, Desejo Sarapintado — ela miou suavemente. — Meus filhotes e eu não estamos mais
sozinhos.
O olhar âmbar-escuro de Desejo Sarapintado se voltou para ela.
8
— Nunca. — ela prometeu. — Esses filhotes serão a melhor coisa que acontecerá em nosso Clã.
9
CAPÍTULO 2
Oh Clã das Estrelas, faça com que pare! Sombra de Bordo se contorceu em agonia e afundou suas garras no musgo seco.
— Relaxe — insistiu Asa de Corvo, colocando uma pata em seu flanco ondulante.
Tente você relaxar com isso acontecendo com você. Sombra de Bordo queria guinchar para o curandeiro,mas ela quase não
tinha ar suficiente para sobreviver aos espasmos que invadiam o seu corpo. Ela apertou a mandíbula e resistiu o desejo de afundar os
dentes na perna negra de Asa de Corvo.
— É um gatinho! — anunciou Desejo Sarapintado. — Oh, ele é magnífico!
Asa de Corvo virou-se para olhar. A rainha desabou sobre o ninho com os olhos fechados, tentando não pensar na dor que
ainda estava por vir, quando sentiu algo molhado e macio sendo empurrado contra o seu focinho. Ela abriu a boca para protestar, e
sentiu o aroma mais doce que já conheceu. Ela levantou a cabeça e piscou para a bola de pelos marrom-escuro ao lado dela. Oh,
Crepúsculo de Maçã, você tem um filho. E ele é lindo!
— Lamba-o, Sombra de Bordo — o curandeiro miou. — Isso o ajudará a respirar.
Por um momento, Sombra de Bordo queria pedir para que os outros gatos saíssem e deixássem-na sozinha com esta preciosa
criaturinha. Nada seria tão especial quanto este momento; quando ela conheceu seu primeiro filhote. E então seu corpo se curvou sob
outra onda de dor, e ela gritou. Asa de Corvo puxou rapidamente o filhote para longe.
— Fique com ele, Desejo Sarapintado — ele ordenou.
— Com prazer — miou a gata. — Venha aqui, pequeno. Deixe-me limpá-lo.
Sombra de Bordo tentou dizer que ela poderia cuidar de seus próprios filhotes, mas o espasmo tornou-se mais forte e de
repente havia outro filhote ao seu lado; sua boca aberta em um miado inaudível. Seu pelo era uma mistura de laranja e branco, como o
de sua mãe.
— Outro gatinho — relatou Asa de Corvo. — Você está indo bem, Sombra de Bordo. — Ele percorreu as patas ao longo seu
corpo. — Mais um, e é isso. Vamos lá; foco.
O desejo irresistível de estar a sós com seus filhotes deu uma nova onda de força à rainha, e último gatinho escorregou quase
que de uma só vez.
— Uma gatinha! — Asa de Corvo ronronou. — Menor que seus irmãos, mas em excelente forma. Sua vez de assumir,
Sombra de Bordo. — Ele colocou todos os três filhotes na curva da barriga de Sombra de Bordo. Ela se levantou e se virou para
contemplá-los com espanto. Consegui, Crepúsculo de Maçã! Dois filhos e um filha!
— Eles são lindos — Desejo Sarapintado sussurrou, com a voz rouca de emoção.
Asa de Corvo assentiu.
— Você fez um excelente trabalho, Sombra de Bordo. Nós vamos deixá-la sozinha para descansar, mas eu vou voltar com
algumas ervas para você depois do sol alto. Está se sentindo bem? — Havia preocupação em seu olhar azul-escuro; provocando, na
gata, uma onda de simpatia em relação ao jovem curandeiro. Ele era o único responsável pelo Clã do Trovão por apenas duas luas
desde a morte de Pinta de Aveia, e essa foi uma das primeiras entregas que ele teve que supervisionar.
— Eu não poderia estar melhor. — Sua garganta parecia seca e dolorida. — Posso beber um pouco de água, por favor?
— Eu vou buscar — Desejo Sarapintado se ofereceu, saindo do ninho e desaparecendo pelos raminhos.
Asa de Corvo a viu partir.
— Você a fez sentir como se viver valesse a pena de novo — comentou. — Ela sofreu muito com a perda de seu irmão.
Sombra de Bordo enterrou o focinho na pele macia e úmida de seus filhotes.
— Esses filhotes são um presente meu para todo o Clã do Trovão — ela murmurou. — Agradecerei ao Clã das Estrelas por
eles todos os dias durante o resto da minha vida.
O curandeiro a tocou levemente com a ponta da cauda.
— E o Clã do Trovão a agradece — ele miou.
10
Assim como o Clã do Rio, Sombra de Bordo adicionou silenciosamente. A disputa pelas Rochas Ensolaradas será esquecida
quando os clãs perceberem que eles compartilham esses guerreiros perfeitos!
— Você está recebendo visitas? — perguntou uma voz na entrada do berçário.
— Claro! Entre. — Sombra de Bordo miou, um pouco sem fôlego, enquanto tentava tirar a gatinha do topo de sua cabeça.
Com apenas três sóis de idade, eles a surpreendiam com a habilidade de aprontarem por todo o berçário de uma só vez, e, ao mesmo
tempo, constantemente esfregavam os seus pequenos focinhos em sua barriga.
O amplo rosto castanho-escuro de Estrela de Carvalho apareceu por entre os galhos.
— Olá, pequenos — ele ronronou.
A gatinha saltou com som grave de sua voz. Liberando suas pequeninas garras da orelha da mãe, ela deslizou de volta para o
musgo com rapidez.
— Este é Estrela de Carvalho, o líder do Clã do Trovão. — Disse Sombra de Bordo à seus filhotes. Ela tentou organizá-los
em uma linha, mas seus olhos ainda estavam fechados, e o cheiro de um gato diferente era tentador demais para resistir, então os três
cambalearam para o líder com suas caudas esticadas; suas boquinhas abertas em miados altos.
Estrela de Carvalho gentilmente guiou-os de volta para Sombra de Bordo com sua pata.
— Eu não sou apenas o líder deles — ele lembrou. — Rosto de Bétula era meu filho. Estes preciosos gatinhos são meus
netos. — Seus olhos se encheram de emoção quando ele olhou para os filhotes. — Se Rosto de Bétula pudesse vê-los...
A gata sentiu seu pelo esquentar e ouriçar.
— Tenho certeza de que ele está assistindo tudo, lá do Clã das Estrelas. — Ela murmurou. Ao lado dela, os filhotes
começaram a acariciar sua barriga e ficaram em silêncio quando começaram a beber.
— Meu filho era um grande guerreiro — afirmou Estrela de Carvalho. — É uma honra para o clã que seu espírito viva com
os seus filhotes.
Um farfalhar de folhas e galhos anunciou a vinda de Desejo Sarapintado, que apareceu com um pequeno preá em sua
mandíbula e o colocando ao lado do ninho.
— Peguei uma das primeiras presas frescas do dia; é para você — ela disse com orgulho.
— Obrigada. — A rainha miou com uma voz rouca. Ela se perguntou se seria rude pedir para que o líder do clã saísse; sua
simples presença já era o suficiente para deixá-la nervosa.
Desejo Sarapintado virou-se para seu pai.
— Não são os filhotes mais perfeitos? — ela ronronou. — Eu posso ver Rosto de Bétula em cada um deles!
Sombra de Bordo olhou para os minúsculos corpos na curva de sua barriga. Além do gatinho que tinha o mesmo padrão de
pelo da mãe, eles possuíam o mesmo tom de marrom de Crepúsculo de Maçã; Rosto de Bétula era um gato malhado, de pelagem
marrom-escura, quase preta. Com o coração batendo, ela esperou que Estrela de Carvalho notasse, mas, em vez disso, ele perguntou
se ela já havia escolhido nomes para eles.
A rainha usou a cauda para indicar cada filhote sem perturbá-los.
— Eu pensei em Filhote de Lariço para o gatinho marrom, Filhote de Remendo para o seu irmão, e Filhote de Pétala para a
sua irmã. — Ela pausou enquanto a ponta da cauda descansava sobre a minúscula filhote. Ela era a mais peluda dos três, e suas
orelhas eram tão pequeninas que mal se podiam enxergá-las em meio à pelagem da cabeça. Sombra de Bordo sentiu como se seu
coração fosse explodir de tanto amor. Se você pudesse vê-los agora, Crepúsculo de Maçã...
— Excelentes nomes — o líder miou.
— Você não quis nomear um deles em homenagem à Rosto de Bétula? — a guerreira perguntou; parecia desapontada.
A gata tricolor não tirou o olhar de seus filhotes.
— Eu quero que cada um deles seja seu próprio guerreiro — ela explicou calmamente. — Não um reflexo de um gato que já
foi.
Para seu alívio, Estrela de Carvalho ronronou em aprovação.
— O Clã do Trovão é abençoado por ter você como rainha, Sombra de Bordo. Estou ansioso para ver estes filhotes
crescerem.
— Eu mal posso esperar para ver a cara dos gatos do Clã do Rio quando eles ouvirem sobre a ninhada na próxima assembleia
— comentou Desejo Sarapintado.
O coração de Sombra de Bordo começou a bater mais rápido.
— Eu queria poder estar lá para ver isso também. Certifique-se de dizer-lhes que eu tive três filhotes perfeitos e fortes que
serão grandes guerreiros! — ela contou a Desejo Sarapintado. — Especialmente para Crepúsculo de Maçã. Diga-lhe primeiro.
A pálida gata dourada hesitou.
— Por que eu falaria com aquele sarnento? — Ela resmungou. — Ele matou Rosto de Bétula!
— Exatamente! — A rainha miou apressadamente. — Ele precisa saber que o Clã do Trovão está mais forte do que nunca;
tudo graças a estes filhotes.
Desejo Sarapintado assentiu.11
— Claro. — Ela desembainhou suas garras dianteiras e as afundou no musgo do chão do berçário. — Nossos inimigos têm
ainda mais razões para nos temer agora!
Estrela de Carvalho retraiu o lábio, mostrando um brilho dos dentes amarelos.
— Não fará mal o Clã do Rio saber que, apesar de ter nos roubado dois gatos habilidosos, graças a Rosto de Bétula, haverá
mais três guerreiros prontos para defender o que é nosso por direito.
A rainha ficou alarmada.
— O código dos guerreiros diz que devemos mostrar misericórdia aos guerreiros que derrotamos — ressaltou ela.
— Crepúsculo de Maçã não mostrou nenhuma misericórdia para com Rosto de Bétula e Pata de Flor! — a felina alaranjada
sibilou, chicoteando a cauda.
Foi um acidente! Sombra de Bordo queria gritar. Rosto de Bétula escorregou! E Pata de Flor nunca deveria ter seguido ele
no rio! Mas ela se controlou; não podia deixar que Desejo Sarapintado suspeite de qualquer simpatia da rainha por Crepúsculo de
Maçã. Pelo menos, ainda não.
O líder estava começando a sair do berçário.
— No momento, o mais importante é que os filhotes de Sombra de Bordo estão seguros e bem. — Ele miou. Havia uma
entonação sombria em sua voz, o que fazia o pelo da gata tricolor se levantar. — Nós vamos guiá-los para que sejam grandes
guerreiros, como o seu pai — declarou Estrela de Carvalho. —, e deixaremos que eles vinguem sua morte quando estiverem prontos.
— Ele virou-se e desapareceu do berçário, deixando apenas os galhos do espinheiro, por onde tinha passado, balançando.
Desejo Sarapintado inclinou-se sobre os pequenos corpos peludos e tocou ligeiramente o seu focinho nas costas de cada
filhote.
— Eles são o presente do meu irmão para o clã — ela murmurou. —, e as criaturinhas mais preciosas de toda a floresta!
Sombra de Bordo lutou contra o impulso de afastar Desejo Sarapintado. Estes são meus filhotes, não os seus! Ela sabia que a
amizade da gata dourada seria de grande ajuda para que seus filhotes pudessem ser amados por todo o Clã do Trovão. Quando seus
filhotes estivessem prontos para se tornarem aprendizes, a verdade sobre quem era seu pai seria inofensiva para a lealdade de seus
companheiros. Mesmo Estrela de Carvalho entenderia, uma vez que ele valorizava os filhotes por quem eles são, a qualquer legado
que eles pudessem herdar. E, uma vez que o Clã do Rio conhecê-los, esses gatos sentirão o mesmo!
CAPÍTULO 3
— Olha só, Filhote de Lariço! — Enrugando o focinho em concentração, Filhote de Pétala segurou o punhado de musgo seco
em sua mandíbula e o sacudiu violentamente.
Seu irmão agarrou o musgo dela e atirou-o pela clareira. Ambos os filhotes correram atrás dele, com Filhote de Pétala
ganhando por um focinho. Ela se jogou em cima do musgo.
— Meu! — declarou.
— Você não quer participar? — Sombra de Bordo perguntou a Filhote de Remendo, que estava deitado na curva da barriga
dela. Seu pelo combinava com o dela tão perfeitamente que era impossível dizer onde um acabava e o outro começava. — Parece que
eles estão se divertindo...
Seu filho balançou a cabeça.
— Estou bem aqui — ele disse, se aconchegando um pouco mais perto. — Você precisa de mim para continuar aquecida, não
é? — Seus olhinhos verdes olhavam ansiosamente para os da mãe.
A rainha reprimiu uma risada; ela mal podia sentir o corpo minúsculo do filhote contra o dela. Era um dia sem nuvens;
incomum na estação das folhas caídas, e os raios de sol estavam fortes o suficiente para trazer os gatos para fora de suas tocas, para
que pudessem apreciar um pouco do calor do sol. Uma lufada de ar frio os lembrava que a vinda da estação sem folhas estava
próxima.
— Você está fazendo um excelente trabalho — disse ela à Filhote de Remendo. — Eu acho que vou ter que levar você para
ficar um tempo com os anciões, para que eles possam se esquentar também.
12
Os olhos verdes de Filhote de Remendo se arregalaram em alarme.
— Não! Eu quero ficar com você para todo sempre! Mesmo quando eu virar um aprendiz!
Sombra de Bordo acariciou o topo de sua cabeça.
— Isso só será assim por mais quatro luas, pequenino. Até lá você vai ficar tão grande e forte que ficará aliviado quando
deixar o berçário e começar seu treinamento de guerreiro!
— Não, eu não vou — murmurou Filhote de Remendo, enterrando o rosto no peito dela. — Eu não quero deixar você.
Filhote de Pétala e Filhote de Lariço estavam de pé, lado a lado, olhando para o musgo.
— Você o rasgou em pedaços! — protestou Filhote de Lariço. — Ele não rola mais… Olhe. — Ele cutucou a pilha
empoeirada de musgo com a pata.
Filhote de Pétala deu de ombros.
— Ela estava tentando escapar e eu peguei!
Um dos anciões, um gato malhado cinzento chamado Pelo de Coelho, andou, com dificuldade, até os filhotes.
— Parece que ela o matou — ele observou. — Querem jogar um jogo diferente?
— Sim, por favor! — pediu Filhote de Lariço.
O gato mais velho usou sua pata dianteira para rolar uma pedrinha até o meio da clareira, e, então, empurrou um galho com o
focinho até ficar a um pouco menos do que uma cauda de raposa da pedra. Sombra de Bordo sentou-se para assistir.
— Eu quero que você fique do lado deste galho — Pelo de Coelho miou, apontando com sua cauda — e salte até aquela
pedra sem tocar no chão entre os dois.
Filhote de Pétala arregalou os olhos.
— Mas isso é quase do outro lado da clareira!
— Eu precisaria de asas para ir tão longe — protestou Filhote de Lariço.
— Não seja um cérebro de camundongo — disse Pelo de Coelho — Seu pai poderia pular duas vezes essa distância, e
aterrissar na menor das folhas sem perturbar uma mosca sequer.
Sombra de Bordo sentiu seu estômago embrulhar, alarmada. Ao lado dela, Filhote de Remendo sentou-se e inclinou a cabeça
para o lado.
— Pelo de Coelho é bem mandão! — ele guinchou.
Filhote de Pétala estava agachada ao lado do galho, balançando a garoupa enquanto se preparava para o salto. Com um
grunhido, ela pulou para frente, mas sua pata traseira enroscou no graveto; a filhote foi direcionada para o lado, quebrando o galho no
processo, e caindo de barriga no chão, na frente das patas do mais velho.
— Humph! — murmurou. — Tente novamente.
Dessa vez, Filhote de Pétala conseguiu pular sem tropeçar no graveto, mas mal conseguiu alcançar metade da distância até a
pedra. O ancião balançou a cabeça.
— Sua vez, Filhote de Lariço. — ele disse.
O gatinho marrom parecia muito determinado quando se agachou. Ele saltou no ar, quase tão alto quanto as orelhas de Pelo
de Coelho, mas desceu quase na vertical; como uma bolota caindo de uma árvore. Pelo de Coelho teve que se desviar do caminho para
evitar ser esmagado.
— Cuidado! — Ele lambeu seu peito algumas vezes. — Rosto de Bétula conseguia aterrissar sem achatar nenhum gato. —
resmungou.
Sombra de Bordo não queria mais ouvir. Ela saltou, derrubando Filhote de Remendo, que rolou com um gritinho agudo, e
correu para a clareira.
— Talvez eles seja igual a mim, Pelo de Coelho — ela miou. — Eu também não consigo aterrissar direito.
O velho estreitou os olhos.
— Você não é tão ruim — respondeu. — Não acredito que qualquer filhote de Rosto de Bétula seja tão pesado quanto um
texugo. — Ele olhou torto para Filhote de Pétala, que estava lambendo a pata que havia pego no graveto.
O sangue estava fervendo nos ouvidos da rainha.
— Não vou julgar meus filhos antes mesmo de começarem o treinamento para guerreiro! — ela miou. — Filhote de
Remendo, venha aqui! Vamos dar um passeio na floresta!
Filhote de Remendo correu, mas Filhote de Pétala ficou fazendo bico.
— Eu quero ficar aqui e praticar o meu pulo — protestou. — Eu quero ser tão boa quanto Rosto de Bétula!
Pelo de Coelho parecia satisfeito.
— Você deveria ter muito orgulho de quem seu pai era — ele ronronou. — Lembro-me da vez em que estávamos
perseguindo um faisão no lugar dos Duas-Pernas. Eu nunca vi um pássaro tão grande, mas Rosto de Bétula era destemido, e tão quieto
que eu não conseguia ouvir nada além da brisa contra as folhas!
— Eu acho que os filhotes precisam esticar um pouco as pernas. Fora do acampamento — Sombra de Bordo rosnou,
interrompendoas memórias de Pelo de Coelho. — Vamos lá, vocês três! Sem reclamar, Filhote de Pétala.
13
Os olhos verdes de Filhote de Remendo, exatamente como os de Crepúsculo de Maçã, estavam enormes. A lembrança do
companheiro fez o coração da rainha doer.
— Podemos sair? Pensei que tínhamos que ficar no acampamento até que tivéssemos idade suficiente para sermos
aprendizes.
— Estarei com vocês, então é perfeitamente seguro — Sombra de Bordo disse a ele.
Estrela de Carvalho e Cauda de Abelha estavam em patrulha, Desejo Sarapintado foi verificar a barreira de pedras nas
Rochas das Serpentes e Pelo de Coelho já havia retornado ao seu local ensolarado do lado de fora da toca dos anciãos. Além de alguns
gatos cochilando, a clareira estava vazia; ninguém prestaria muita atenção se ela levasse os filhotes.
De repente, a gata não aguentou mais estar alí. Com uma chicoteada de cauda, ela trotou em direção ao túnel de tojo. Os
filhotes foram atrás dela, gorjeando de emoção.
— Eu vou pegar um texugo! — Filhote de Lariço se gabou.
— Vou assistir esse texugo comer você primeiro! — replicou Filhote de Pétala.
Filhote de Remendo estava roçando nos calcanhares da mãe.
— Não deixe um texugo me comer! — ele choramingou.
A rainha parou ao lado da entrada do túnel e virou-se para lamber as orelhas do filho apavorado.
— Nunca deixarei nada de ruim acontecer com você. — Prometeu. Com mais um olhar para verificar se eles não estavam
sendo observados, ela conduziu sua ninhada pelos galhos.
— Ai, é espinhoso! — reclamou Filhote de Pétala.
— Não pare. — Pediu Sombra de Bordo. Alimentados pela curiosidade, os filhotes dispararam para fora, parando para olhar
em volta.
— Uau, fora do acampamento é realmente grande! — Filhote de Lariço arfou.
— É ainda maior do topo da ravina — A rainha miou, empurrando seus filhotes em direção ao caminho que levava às
árvores. Seu pelo se arrepiou quando ela pensou em ser avistada por uma patrulha que voltava.
Os filhotes subiram a ladeira, com Filhote de Pétala na liderança. Eles pareciam ainda mais pequenos entre os troncos das
árvores, os carvalhos e as faias imponentes que pairavam sobre a ravina. Sombra de Bordo apressou-os por um caminho pouco usado
sob densas samambaias; os filhotes queriam parar e cheirar todas as folhas, todas as marcas no chão, mas Sombra de Bordo os
mantinha em movimento, escondendo-se sob as folhas de cheiro doce e esperando que o aroma das samambaias cobrisse seus rastros.
A vegetação rasteira começou a diminuir, e o som da água espirrando ecoou pelas árvores. Filhote de Lariço levantou as
orelhas.
— O que é isso? — Ele miou. Enquanto tentava espiar pelos caules, tropeçou em um galho e caiu de focinho no chão.
Sombra de Bordo o levou de volta às patas antes que ele pudesse soltar um gemido. Fico feliz que Pelo de Coelho não tenha visto
isso, ela pensou. Ela não podia negar que esses filhotes eram mais desajeitados que seus companheiros do Clã do Trovão.
Filhote de Remendo continuou enquanto a rainha pegava seu irmão, quando ouviu seu grito repentino de surpresa.
— Água! Água em todos os lugares, olhe!
Seus companheiros de ninhada se juntaram para ficar ao lado dele na beira da samambaia. Sombra de Bordo se juntou a eles
e olhou para o brilho deslumbrante do rio, que passava rápido e cintilante.
— É a coisa mais linda que eu já vi — sussurrou Filhote de Pétala.
— De onde ela vem? — miou Filhote de Lariço.
Sombra de Bordo pensou por um momento.
— Eu realmente não sei — ela admitiu. — Corrente acima, há um desfiladeiro profundo, ao lado do território do Clã do
Vento...
— Podemos ir lá? — Filhote de Pétala interrompeu.
Sombra de Bordo negou com a cabeça.
— Não, pequena. Ainda é muito longe para você andar. Mas um dia você verá; eu prometo.
Filhote de Remendo, geralmente tão tímido e feliz em deixar seus companheiros de ninhada tentarem tudo primeiro,
cambaleou sobre as pedras até a beira da água.
— Cuidado! — Sombra de Bordo avisou.
O filho virou-se para olhá-la; tanto os olhos como as gotas de água presas em seus bigodes brilhando.
— Está tudo bem — ele miou. — Veja!
Antes que a rainha pudesse detê-lo, ele se lançou para frente e deslizou até a água. Por um momento de parar o coração, ele
desapareceu, e então seu rosto ruivo e branco apareceu na superfície.
— Olhe para mim! — Ele guinchou.
Seus irmãos correram pela praia e mergulharam. Por alguns passos, suas patinhas cavaram as pedras enquanto a água lambia
suas barrigas macias, e logo estavam nadando na água.
Sombra de Bordo sentiu uma explosão de amor, como o calor do sol nascente. Oh Crepúsculo de Maçã! Nossos filhotes são
metade do Clã do Rio, com certeza!
14
Filhote de Remendo alcançou um galho saindo da água e se jogou sobre ele. A água escorria de sua pele, deixando-o tão
brilhante quanto às penas de um corvo. Ele não parecia maior que um rato, com o pelo achatado ao lado do corpo, e seus flancos se
erguiam vigorosamente enquanto ele recuperava o fôlego. Sombra de Bordo sentiu uma pontada de preocupação.
— Você está bem? — Ela chamou.
Filhotes de Remendo assentiu, ainda arfando demais para falar. A mãe andava de um lado para o outro na margem; ela
odiava a ideia de ficar com as patas molhadas, mas não tinha certeza se Filhote de Remendo tinha força suficiente para nadar sozinho.
Os outros gatinhos estavam brincando de esconde-esconde em um grupo de juncos perto da costa.
— Filhote de Lariço, Filhote de Pétala, vão ajudar seu irmão! — mandou.
De repente, os juncos na margem oposta farfalharam e uma cabeça cinza-escura apareceu e a gata congelou. Era Cauda
Pontiaguda, o representante do Clã do Rio. No meio do leito, Filhote de Remendo soltou o ramo, a sua bochecha ainda descansando
sobre a casca lisa.
— O que esse filhote está fazendo? — Rosnou Cauda Pontiaguda. Ele pisou na costa, com o pelo em sua coluna eriçado.
Ela abriu a boca para falar, mas outros dois guerreiros estavam saindo dos juncos ao lado de Cauda Pontiaguda.
— O Clã do Trovão está enviando seus gatos mais jovens para nos invadir? — Perguntou Pelo de Leite, o seu pelo branco
contrastando com o cinza das pedras.
O terceiro gato encontrou o olhar de Sombra de Bordo em frente ao rio. A partir desta distância, seus olhos verdes eram
ilegíveis.
— Eu acho que um filhote dificilmente é uma ameaça ao nosso território, — ele miou. — Eu vou levá-lo de volta para onde
ele veio. — anunciou, entrando na água; seu pelo marrom-pálido ficou quase preto enquanto ele deslizava abaixo da superfície.
— Filhote de Lariço, Filhote de Pétala, venham aqui! — Sombra de Bordo silvou. Os gatinhos correram até ela, assustados.
— Aquele guerreiro do Clã do Rio vai nos levar? — Filhote de Pétala guinchou.
Sombra de Bordo observou a cabeça de Crepúsculo de Maçã aproximar-se do galho.
— Não, — ela miou. — Você está segura, não se preocupe.
Crepúsculo de Maçã miou algo para Filhote de Remendo, baixo demais para que a gata pudesse ouvir, e o mais jovem
deslizou para baixo do ramo e para dentro da água. O guerreiro Clã do Rio firmou-o com uma única pata, e começou a empurrá-lo
para a costa do Clã do Trovão. Ao perceber que os outros gatinhos estavam tremendo de frio, a rainha inclinou a cabeça para
lambê-los.
— Estamos em apuros? — Filhote de Lariço miou.
— Silêncio, está tudo bem. — murmurou Sombra de Bordo entre lambidas.
Crepúsculo de Maçã saiu do rio com Filhote de Remendo pendurado entre seus dentes. Ele colocou o gatinho sobre as pedras
e o cutucou.
— Eu acho que este está desgastado por toda essa natação — comentou. Seus olhos queimavam Sombra de Bordo. — Você
correu um risco, trazendo-os tão perto da nossa fronteira.
— Eu queria mostrar-lhes o rio — a gata miou. Ela posicionou o corpo para que os gatinhos se amontoassem atrás dela, fora
do alcance da voz. Ela podia ouvir o Filhote de Lariço perguntando à Filhote de Remendo como era nadar tão longe.
Crepúsculo de Maçã inclinou-se para a frente, até que o seu focinho quase tocasse a bochecha de Sombra de Bordo.
— Eles são maravilhosos — disse. — Fortes e corajosos, e tão confiantes quantoqualquer gato do Clã do Rio na água. Estou
tão orgulhoso de você. — Ele se endireitou e levantou a voz. — Eu não quero ver você ou esses filhotes em qualquer lugar perto do
rio novamente — ele miou. O brilho em seus olhos contava uma história diferente.
Sombra de Bordo inclinou a cabeça.
— Claro, Crepúsculo de Maçã. Obrigado por trazer Filhote de Remendo de volta.
Crepúsculo de Maçã olhou mais uma vez para os gatinhos e voltou para a água.
— Esses gatinhos não têm idade suficiente para sair do berçário! — Pelo de Leite chamou pelo rio. — O que você estava
pensando, trazendo eles aqui? Eles poderiam ter se afogado!
— Vocês podem ter conquistado as Rochas Ensolaradas, mas o rio ainda nos pertence — gritou Cauda Pontiaguda. —
Crepúsculo de Maçã foi misericordioso desta vez, mas de agora em diante, fique longe de nosso território.
Sombra de Bordo reuniu os gatinhos em uma moita. Eles estavam saltitando por aí; até mesmo Filhote de Remendo, com a
pelagem inflada conforme secava, estava hiperativo.
— Isso foi a melhor coisa de todas! — gritou Filhote de Lariço.
— Quando poderemos vir aqui de novo? — Filhote de Pétala perguntou. — Nadar é muito mais divertido do que pular!
— Eu fui quem nadou mais longe, não é verdade? — miou Filhote de Remendo com orgulho.
De repente, uma forma escura bloqueou o caminho. a rainha olhou para cima e encarou o olhar azul de Asa de Corvo. O
curandeiro olhou para os gatinhos.
— O que eles estavam fazendo no rio? — ele perguntou.
As patas da gata começaram a tremer.
— Você... você os viu? — ela sussurrou.
15
O gato assentiu.
— Eu vi tudo. O que está acontecendo, Sombra de Bordo?
Antes que Sombra de Bordo pudesse responder, os gatinhos caíram sobre si mesmos para contar a ele sobre sua aventura.
— Um guerreiro do Clã do Rio teve que salvar Filhote de Remendo! — relatou Filhote de Lariço.
— Ele não precisava! Eu estava apenas descansando! — Filhote de Remendo interrompeu rapidamente.
— Está tudo bem, ninguém estava em perigo. — Sombra de Bordo miou quando Asa de Corvo estreitou seus olhos.
— O gato do Clã do Rio foi muito legal! — miou Filhote de Remendo. — Ele disse que eu era muito corajoso e um bom
nadador!
— Ele disse? — miou o felino escuro. — O que mais ele disse? — Ele deu um passo mais perto.
Sombra de Bordo enrolou a cauda em torno dos filhotes.
— Vamos, pequenos, é hora de ir para casa.
Asa de Corvo não se afastou do caminho.
— Eu vi um presságio, Sombra de Bordo, — ele murmurou. — Eu me pergunto se você sabe alguma coisa sobre isso?
Havia algo em sua voz que fez o pelo da rainha levantar.
— Por que eu saberia alguma coisa sobre um presságio? Eu não sou uma curandeira.
O gato negro olhou para ela sem piscar.
— Um pequeno riacho apareceu na minha toca, em um lugar onde não havia fluxo antes; levava com ele três pedaços de
junco. — Ele varreu sua pata pelo chão como se estivesse traçando o caminho do riacho. — O junco não cresce no território do Clã do
Trovão — continuou ele. — Não pertence aos nossos limites. Você entende?
Sombra de Bordo encolheu os ombros.
— Houve tanta chuva nesta estação de folhas caídas; um monte de coisa deve ter parado nos lugares errados. — Ela tentou
manter sua voz despreocupada, mas havia uma sensação fria e pesada em sua barriga, como se ela tivesse engolido uma pedra do rio.
O curandeiro observou os filhotes brincarem com uma bolota, jogando-a de um lado para o outro com as patas.
— Eu acho que esse presságio significa que o rio levou três gatos estranhos para o Clã do Trovão — três gatos que não
pertencem lá.
O coração do Sombra de Bordo estava batendo forte, dificilmente podia respirar.
— O que você está tentando dizer?
Asa de Corvo olhou para ela, e de repente ele não parecia mais um gato jovem e inexperiente. O conhecimento brilhava em
seus olhos como estrelas geladas.
— Rosto de Bétula não é o pai desses gatinhos, é? Pelo de Coelho me contou o que aconteceu hoje, como eles não
mostraram sinais de poder tocaiar ou aterrissar como ele. E nem me fale que eles puxaram isso de você — ele acrescentou, cortando a
rainha quando ela abriu a boca. — Você tem um passo tão leve quanto qualquer guerreiro do Clã do Trovão. — Ele olhou para além
dela, no rio, além da sombra das árvores. — Eu assisti seus filhotes nadarem naquele rio como se fossem peixes. Eu acho que esses
filhotes foram gerados por um gato do Clã do Rio. Crepúsculo de Maçã, eu acho, a julgar pela cor do seu pelo e, pelo modo que ele
falou com você quando ele trouxe Filhote de Remendo de volta.
Sombra de Bordo sentiu o chão balançar debaixo de suas patas.
— O Clã do Trovão é abençoado por ter três gatinhos bonitos e fortes — ela sibilou. — A verdade será revelada na hora
certa. Não é minha culpa que todos assumissem que Rosto de Bétula era o pai deles.
— Eu não posso deixar você mentir para nossos companheiros de Clã! — o felino escuro gritou. — E agora que eu sei a
verdade, também não posso mentir.
— Eu não lhe disse nada. — a gata tricolor miou através dos maxilares cerrados.
— Você me disse muito — Asa de Corvo respondeu, e havia tristeza em seus olhos cor-de-céu. — A verdade deve aparecer.
— Por favor, não diga nada! — implorou. — Estes são filhotes do Clã do Trovão!
— Eles são meio Clã do Rio — o curandeiro corrigiu, sua voz tão dura quanto o gelo. — Nossos companheiros de clã
merecem saber. Desculpe, Sombra de Bordo. Sinto muito por você, mas sinto ainda mais pena destes gatinhos. Eles acabarão sofrendo
pelas mentiras que você contou. — Ele se virou, desaparecendo pelas moitas.
Sombra de Bordo olhou para ele. Clã das Estrelas, me ajude! Por um momento, ela considerou pegar seus filhotes e correr
mais fundo na floresta, escondendo-os de qualquer gato que pudesse prejudicá-los. Mas então, ela olhou para Filhote de Pétala,
equilibrando a bolota em sua cabeça enquanto seus irmãos tentavam derrubá-la de suas patas e desalojá-la. O Clã do Trovão adora
esses gatinhos e não faria nada para machucá-los. Sempre planejei contar a eles a verdade. Isso apenas aconteceu mais rápido do
que eu pensei.
16
CAPÍTULO 4
Quando chegaram ao caminho que levava ao barranco, os filhotes arrastavam as patas com cansaço. — Quase lá,
pequeninos! — Sombra de Bordo miou encorajadoramente. Ela esperava poder acomodá-los no berçário e lhes alimentar antes que
Asa de Corvo viesse procurá-la.
Filhote de Remendo tropeçou na encosta de seixos, de modo que Sombra de Bordo o deixou encostar no ombro dela e tomou
quase todo o seu peso enquanto desciam para o túnel do tojo. Filhote de Pétala soltou um enorme bocejo. — Estou com tanto sono! —
Ela murmurou.
— Estou com fome, — Filhote de Lariço guinchou. — Minha barriga está rugindo mais alto que um texugo!
Eles empurraram o túnel do tojo, abaixando a cabeça para manter os galhos afiados longe dos olhos. Sombra de Bordo
seguiu, cutucando Filhote de Remendos na frente dela. Quando ela emergiu, Filhote de Lariço e Filhote de Pétala pararam mortos na
entrada. — Vamos lá, — Sombra de Bordo insistiu, mantendo sua atenção no Filhote de Remendo enquanto ele balançava em pé.
— Eu acho que algo está acontecendo, — Filhote de Pétala sussurrou.
Sombra de Bordo olhou para cima. A clareira estava cheia de gatos, todos olhando para eles. Estrela de Carvalho estava na
Pedra Alta, sua silhueta em contraste contra as árvores. Asa de Corvo estava agachado abaixo dele, seu olhar feroz. O representante
Cauda de Abelha estava ao lado do curandeiro, com o pelo listrado bagunçado como se tivesse sido interrompido no meio do noivo.
Sombra de Bordo começou a tremer.
Filhote de Remendos se pressionou contra ela. — Há algo de errado? — Ele choramingou.
— Nada para você se preocupar, — Sombra de Bordo disse a ele. — Vá para lá. — Ela apontou com o rabo para um grupo
de samambaias na beira da clareira. Os três filhotes trotaram em silêncio e se amontoaram.
— Venha aqui, Sombra de Bordo. — Estrela de Carvalho ordenou.
Suas pernas que pareciam feitas de pedra, Sombra de Bordo avançou até ficar em pé no centro da clareira. — O que foi,
Estrela de Carvalho?
O gatomarrom escuro se contorceu na ponta do rabo. — Quem é o pai dos seus filhotes? — Ele perguntou. — Diga a
verdade!
Antes que Sombra de Bordo pudesse falar, havia uma onda de pelo de gengibre ao lado dela. Desejo Sarapintado passou por
um grupo de guerreiros e se juntou a Sombra de Bordo abaixo da Pedra Alta. — Sabemos que é Rosto de Bétula! — Ela chamou
Estrela de Carvalho. — Por que você está perguntando isso?
— Quero que Sombra de Bordo nos diga ela mesma, — miou Estrela de Carvalho, sua voz suave com ameaça. — Ela me
deixou acreditar que meu filho Rosto de Bétula era o pai deles. Não consigo imaginar que um dos meus guerreiros se atreveria a
contar tal mentira.
Sombra de Bordo mudou seu peso sobre as patas traseiras para que ela pudesse segurar o olhar do líder. — Qualquer clã
ficaria orgulhoso de ter esses filhotes para servi—lo. — declarou ela.
— Mesmo que eles soubessem que os filhotes são meio clã? — Asa de Corvo miou. — Nós merecemos saber a verdade,
Sombra de Bordo. Crepúsculo de Maçã é o pai deles, não é?
Por um momento, toda a floresta pareceu prender a respiração. Então houve um grito de puro horror e Desejo Sarapintado se
lançou em Sombra de Bordo. — Isso é verdade? — Ela uivou, arranhando o rosto de Sombra de Bordo. — O que é que você fez?
Sombra de Bordo tropeçou para trás. — Pare! — Ela ofegou. Ela tentou erguer as patas da frente para se proteger, mas
Desejo Sarapintado a prendeu.
De repente, o peso foi retirado da barriga de Sombra de Bordo e ela abriu os olhos para ver a gata sendo arrastada por
Coração Florido e Manto de Semente. Sombra de Bordo cambaleou até as patas. Sangue acumulou em seus olhos uma pálpebra
rasgada, e sua bochecha ardeu por um golpe certeiro. Ao seu redor, os gatos assobiavam e murmuravam.
Desejo Sarapintado sacudiu os guerreiros e olhou para Sombra de Bordo. — Você traiu o nome do meu irmão! — Ela cuspiu.
— Você nos traiu com suas mentiras e sua deslealdade. Você não merece ser chamada de guerreiro e nem.... aquelas criaturas meio
17
clãs. — Ela torceu o lábio em direção aos três filhotes, que se encolheram sob as samambaias. — O pai deles matou Rosto de Bétula e
Pata de Flor! Tirem eles daqui!
Sombra de Bordo jogou gotas escarlate na grama. — Por que importa quem é o pai deles? — Ela exigiu furiosamente. — Eu
dei três filhotes finos ao Clã do Trovão. Eu sou uma rainha e devo ser tratada com respeito. O Clã das Estrelas sabe que precisamos de
mais guerreiros, e aqui estão eles! Meus companheiros de clã enlouqueceram, porque se voltariam contra mim assim?
Estrela de Carvalho saltou da Pedra Alta e ficou na frente dela. Seus olhos amarelos brilhavam com ódio e ele empurrou a
cabeça para frente até que sua respiração soprou calorosamente no focinho de Sombra de Bordo. — Você esqueceu que Crepúsculo de
Maçã assassinou meu filho e a Pata de Flor? De todos os gatos, por que você teve que escolhê—lo? Você não pode esperar meu
perdão. — Ele deu um passo para trás e levantou a cabeça. — Você traiu o código dos guerreiros e mentiu para seus companheiros de
clã. Não criaremos esses filhotes dentro dos muros de nosso acampamento, nem das fronteiras de nosso território. Pegue—os e vá
embora. Você não é mais um guerreira do Clã do Trovão.
Sombra de Bordo tropeçou para trás. — Você não pode fazer isso! Estes filhotes pertencem ao Clã do Trovão! Você tem que
nos deixar ficar!
Estrela de Carvalho balançou a cabeça. — Não, eu não vou. — Ele olhou para o Clã. — Asa de Corvo me contou sobre um
presságio que recebeu, um fluxo misterioso de água que trouxe três pedaços de junco em sua toca. Os juncos não pertencem ao nosso
território, e certamente não ao coração do nosso acampamento. Esses filhotes não trarão nada além de perigo!
— Livre—se deles! — Gritou Desejo Sarapintado. — Expulse—os!
— Estrela de Carvalho está certo, eles não pertencem a este lugar. — rosnou Coração Florido.
Sombra de Bordo olhou horrorizada para o gato cinzento. — Você era meu mentor, Coração Florido! Você sabe que eu nunca
trairia meu clã!
— Você já traiu, — ele respondeu rispidamente. — Tenho vergonha de você. — Ele se virou e Sombra de Bordo sentiu o
coração dela se partir em pedaços.
— Eu nunca vou esquecer isso, — ela sussurrou, lentamente se virando para encarar cada um de seus companheiros de clã.
— Vocês traíram a mim e ao meus filhotes. Você viverá para se arrepender deste dia para sempre, Clã do Trovão, e isso é uma
promessa. — Ela caminhou até seus filhote e passou o rabo ao redor deles. — Este não é mais o nosso lar, — disse ela. — Venha.
Ela os empurrou de volta pelo túnel do tojo e subiu o caminho. Filhote de Pétala caiu e roçou o nariz em uma pedra, mas
estava cansada demais para protestar. Ela simplesmente se levantou e tropeçou como se soubesse que não havia sentido em reclamar.
Sombra de Bordo sentiu seu coração partir um pouco mais.
— Por que eles não gostam mais de nós? — Choramingou Filhote de Remendos enquanto se dirigiam para as árvores.
Começou a chover e gotas de gordura bateram nas samambaias ao redor deles.
— Porque eles têm cérebro de camundongo, morcego—cego e coração de raposa. — Sombra de Bordo assobiou.
— Essas são palavras ruins! — Filhote de Lariço miou. — Você não deveria dizê—las!
— É a verdade, — Sombra de Bordo respondeu sombriamente.
— O que eles estavam dizendo sobre o nosso pai? — Perguntou Filhote de Pétala. — Eles também não gostam de Rosto de
Bétula?
Sombra de Bordo sentiu uma vontade avassaladora de se deitar e deslizar na escuridão do sono. — Vou contar tudo mais tarde, —
prometeu. — Primeiro precisamos atravessar o rio.
— Vamos nadar de novo? — Gritou Filhote de Remendos. — Mas aquele gato do Clã do Rio disse que tínhamos que ficar
longe da água.
— Tudo é diferente agora. — Sombra de Bordo murmurou.
Quando emergiram do abrigo das árvores, a chuva caía tão forte que Sombra de Bordo mal conseguia manter os olhos
abertos.
— Não quero mais nadar, — gemeu Filhote de Lariço. — Eu quero ir para casa.
— Eu gostaria que estivéssemos no berçário. — Filhote de Pétala fungou. — Está muito molhado para estar do lado de fora.
— Não temos casa! — Sombra de Bordo estalou. Ela teve que levantar a voz por causa das pancadas de chuva na praia. —
Esqueça o Clã do Trovão e o berçário. — Ela olhou para o rio. Os topos das pedras eram apenas visíveis entre as ondas agitadas pelo
vento. — Não precisamos nadar até o fim, — disse ela aos filhotes. — Vocês vêem aquelas pedras? Só precisamos nadar de uma para
a outra até chegarmos ao outro lado.
— Mas então estaremos no Clã do Rio! — Filhote de Remendos chiou. — Não devemos ir lá!
— Está tudo bem, — Sombra de Bordo miou, tentando parecer calma. — Seu pai ficará satisfeito em nos ver.
Filhote de Lariço inclinou a cabeça para um lado. — Eu pensei que nosso pai estivesse morto!
Sombra de Bordo respirou fundo. — Lembra daquele gato do Clã do Rio que ajudou Filhote de Remendos hoje? Ele é seu
pai. Não Rosto de Bétula.
Filhote de Lariço torceu o nariz. — Mas isso não faz sentido. Nosso pai não pode ser do Clã do Rio. Nós somos gatos Clã do
Trovão!
18
— Você é metade Clã do Rio, — Sombra de Bordo disse a ele. — É por isso que você gostou tanto da água hoje. — Os olhos
dos três filhotes se arregalaram até parecerem luas. — É por isso que nossos companheiros de clã estão com raiva de nós? —
Perguntou Filhote de Pétala.
— Sim, — miou Sombra de Bordo. Ela sentiu os arrepios subirem pela espinha. — Mas eles estão errados— , ela rosnou. —
Eles mudarão de ideia em breve e até lá viveremos no Clã do Rio. Tudo vai ficar bem. — Ela cutucou Filhote de Pétala mais perto do
rio. — Vamos lá, precisamos atravessar antes que escureça.
A pequena filhote marrom ficou para trás. — Eu não quero! — Ela lamentou. — Tem muita água!
— Você ficará bem, — insistiu Sombra de Bordo. Ela conduziu Filhote de Lariço e Filhote de Remendos ao lado de sua irmã.
— Eu estarei logo atrás de vocês.
Filhote de Remendos olhou por cima do ombro. — Promete que ficaremos bem?
— Eu prometo.
O gato de gengibre e branco pisou bravamente nas ondas.Quase imediatamente a água passou por sua cabeça, mas ele subiu,
resmungando. Seus companheiros de ninhada o seguiram. Sombra de Bordo observou as três cabeças pequenas balançarem até a
primeira pedra. Eles saíram e ficaram de barriga na água, tremendo.
— Espere por mim! — Sombra de Bordo chamou. — Estou indo! — Cerrando os dentes, ela entrou no rio. A água chupou
seu pelo, gelando—a até os ossos. Ela se forçou a sair da costa e agitar as patas, impulsionando—se para as pedras. Eu tenho que fazer
isso pelos meus filhotes, ela disse a si mesma, odiando cada momento.
De repente, houve um rugido de algum lugar a montante. — Nade mais rápido! — Filhote de Pétala gritou. — Algo está
vindo!
Sombra de Bordo olhou de soslaio para ver uma parede de água caindo sobre ela, varrendo galhos e detritos à frente. Ela
remava furiosamente, mas a corrente a estava arrastando para longe das pedras, não em direção a elas. — Espere! — Ela gritou para
os fillhotes quando a onda caiu sobre sua cabeça.
Sombra de Bordo foi empurrada para o fundo do rio pela força do dilúvio. Galhos batiam contra ela e quando ela abriu os
olhos, ela não viu nada além de bolhas e seixos agitados. Com o peito gritando por ar, ela abriu caminho até a superfície e explodiu,
ofegando. Suas patas dianteiras golpeavam algo duro; desembainhando suas garras, ela conseguiu se arrastar para a rocha. De alguma
forma, ela chegará a primeira pedra. Ela olhou em volta.
Os filhotes se foram. Sombra de Bordo olhou para a água horrorizada. Meus filhotes! Onde vocês estão? Qualquer esperança
de que eles tivessem atingido a segunda pedra desapareceu quando ela viu três formas minúsculas sendo varridas rio abaixo.
— Socorro! — Lamentou Filhote de Pétala antes que uma onda a empurrasse.
Sombra de Bordo se jogou da pedra e remando furiosamente em direção a seus filhote. Uma forma pálida balançou na frente
dela. Ela estendeu a mão e conseguiu prender uma garra no pelo encharcado. Era Filhote de Remendos. Os olhos dele estavam
fechados.
— Acorde! — Sombra de Bordo gritou. — Você tem que nadar!
Um leve miado veio de algum lugar ao lado dela. Sombra de Bordo levantou a cabeça e olhou através das ondas. Filhote de
Lariço estava agarrado a um galho que pendia no rio. Segurando Filhote de Remendos em suas mandíbulas, Sombra de Bordo lutou
até a árvore. Ela tentou tirar Filhote de Remendos da água, mas ele estava muito pesado e escapou de seu alcance.
— Não! — Sombra de Bordo uivou quando ele desapareceu no rio preto.
Filhote de Lariço perdeu o controle do galho e mergulhou na água ao lado dela. Sombra de Bordo afundou os dentes em sua
nuca, mas a força da corrente era muito forte. Filhote de Lariço foi arrancada dela e varrida com apenas um pequeno grito.
— Sombra de Bordo! Sombra de Bordo! Agarre o galho! — Houve um grito frenético da costa. Sombra de Bordo viu
Crepúsculo de Maçã atravessando o rio, com o pelo arrepiado de alarme. Ele apontou com o rabo para a árvore pendente. — Espere e
eu vou te arrastar para fora!
Sombra de Bordo estava apenas vagamente consciente de enganchar suas garras no galho ao lado dela. Ela se sentiu sendo
arrastada pela água, e então mandíbulas fortes estavam em sua pele, puxando—a para as pedras. Crepúsculo de Maçã pairava sobre
ela. — O que, em nome do Clã das Estrelas, você está fazendo? Onde estão os filhotes?
Mais duas formas apareceram ao lado dele. — O que um gato do Clã do Trovão está fazendo no rio? — Perguntou um deles.
Sombra de Bordo reconheceu a voz de Pé Chapinhado, um jovem gato.
— É Sombra de Bordo? — Perguntou o companheiro.
— Acho que sim, Cauda de Enguia — miou Pé Chapinhado. Ele olhou mais perto, seu pêlo cinza pálido brilhando na luz
fraca.
— Meus filhotes, — Sombra de Bordo raspou. — Salve... meus filhotes...
O rosto de Crepúsculo de Maçã apareceu acima dela, seus olhos enormes de horror. — Você está me dizendo que os filhotes
estão no rio?
Sombra de Bordo assentiu, fraca demais para falar.
Cauda de Enguia já estava saltando ao longo da costa. — Se os filhotes estiverem lá, eles estão em grandes problemas! —
Ela chamou por cima do ombro. Pé Chapinhado correu atrás dela.
19
Crepúsculo de Maçã agachou—se ao lado de Sombra de Bordo. — Vou encontrá—los, prometo. — ele sussurrou. Então ele
correu para longe dela.
Sombra de Bordo fechou os olhos. Clã das Estrelas, ajude meus filhotes, ela rezou. Nada disso é culpa deles. Leve—me se
for necessário, mas por favor, poupe—os.
Ela ficou quieta, sentindo a água escorrer pelo seu pêlo, até ouvir passos de patas esmagando as pedras. Ela levantou a
cabeça e viu Crepúsculo de Maçã se aproximando. Na escuridão, ela não podia ver a expressão dele. — Você os encontrou?
— Sim, — ele miou. — Nós os encontramos.
Sombra de Bordo se apoiou nas patas. — Onde eles estão?
Sem palavras, Crepúsculo de Maçã se virou e a levou rio abaixo. Ele abriu caminho em um denso grupo de juncos e chamou
Sombra de Bordo para frente com o rabo. Cauda de Enguia e Pé Chapinhado estavam em pé sobre três pequenas formas escuras.
Cauda de Enguia olhou para cima, os olhos cheios de pena. — Sinto muito, — ela miou. — Não foi possível salvá—los.
Um grito assustador dividiu o ar. Sombra de Bordo se perguntou de onde vinha o barulho até perceber que sua boca estava
aberta. Ela fechou as mandíbulas rapidamente e deu um passo em direção a seus filhotes. Suas pernas dobraram e de repente ela
estava deitada ao lado deles, lambendo desesperadamente cada um por sua vez.
— Acorde, pequeninos, — ela insistiu. — Conseguimos atravessar o rio. Vocês estão seguro agora!
Mas os corpos rolaram frouxamente sob os golpes de sua língua, e três pares de olhos permaneceram fechados.
Sombra de Bordo pressionou o focinho contra a bochecha fria de Filhote de Remendos. — Você prometeu que nunca me
deixaria, — ela sussurrou. Você prometeu que me manteria a salvo. A voz dele ecoou dentro da cabeça dela. — Sinto muito! —
Sombra de Bordo lamentou. — Eu estava tentando encontrar um novo lar para nós. Eu não sabia para onde mais ir.
— Do que você está falando?— Crepúsculo de Maçã parecia atordoado. — Você quer dizer que tentou deliberadamente
atravessar o rio? No meio de uma enchente?
Sombra de Bordo se virou para olhá—lo. — O Clã do Trovão nos expulsou, — explicou ela. — Não tínhamos mais para
onde ir.
— Não sei o que está acontecendo aqui, mas precisamos levar esses filhotes para Estrela Negra, — miou Cauda de Enguia.
— Ela precisa saber sobre isso.
Por um momento, Crepúsculo de Maçã pareceu discordar, depois assentiu. — Você está certa. Vamos, levar um filhote cada
um, Sombra de Bordo, siga—nos.
Os guerreiros do Clã do Rio gentilmente pegaram as pequenas formas encharcadas e as carregaram lentamente de volta ao
longo da costa. Sombra de Bordo tropeçou atrás deles, entorpecido demais para pensar com clareza. Ao lado deles, o rio havia se
acalmado e lambido a costa como a língua de um gato, fazendo barulhos suaves e reconfortantes no ar parado. Sombra de Bordo
esperou Crepúsculo de Maçã enviar os outros guerreiros à frente, para encontrar alguma desculpa para ficar a sós com ela para que
pudessem lamentar seus filhotes juntos antes de enfrentar o resto do seu clã. Mas ele não voltou a olhar para ela. Ele nem perguntou
como eu os nomeei.
Os guerreiros se entrelaçavam entre juncos altos em um caminho estreito de solo marrom denso. Ele se abriu em uma clareira
que foi levantada da água por montes de mais solo em cima de galhos bem tecidos, como um imenso ninho. Sombra de Bordo captou
o brilho de muitos pares de olhos observando entre os juncos e seu pelo molhado se arrepiando.
Uma gata laranja correu até Crepúsculo de Maçã. Sombra de Bordo a reconheceu imediatamente; era Brilho de Junco, a
guerreira que andara com Crepúsculo de Maçã na assembleia.
— Alguém caiu no rio? — Brilho de Junco engasgou. — Você está bem?
O guerreiro do Clã do Rio pousou o corpo de Filhote de Pétala tão suavemente como se estivesse dormindo, e tocou sua
cauda no flanco de Brilho de Junco. — Estou bem. Eu preciso falar com Estrela Negra…Brilho de Junco ficou onde estava, seu olhar passando rapidamente para Sombra de Bordo e voltando novamente. — Porque
ela está aqui? O que está acontecendo, Crepúsculo de Maçã?
Houve uma agitação de movimento no final da clareira, e Estrela Negra saiu dos juncos. Todos os gatos ficaram em silêncio.
Crepúsculo de Maçã deu um passo à frente. — Três filhotes se afogaram no rio, — ele anunciou.
Pergunte—me o nome deles! Sombra de Bordo gritou silenciosamente.
Crepúsculo de Maçã olhou para as patas. — E eu... eu sou o pai deles.
Sombra de Bordo prendeu a respiração. Esta foi a chance de Crepúsculo de Maçã implorar por misericórdia em seu nome,
para explicar que Sombra de Bordo merecia um lugar no Clã do Rio porque ela era mãe dos filhotes dele.
Os olhos de Estrela Negra se estreitaram em pequenas fendas. — Como assim, Crepúsculo de Maçã? Do que você está
falando?
— Sinto muito, Brilho de Junco, — Crepúsculo de Maçã sussurrou. — Por favor me perdoe.
Brilho de Junco torceu a ponta do rabo. — Perdoá—lo por quê?
Sombra de Bordo olhou para a preocupação nos olhos de Brilho de Junco e sentiu algo dentro dela virar gelo. Esta não era
apenas uma companheira de clã para Crepúsculo de Maçã.
20
Crepúsculo de Maçã inclinou a cabeça e continuou. — Muitas luas atrás, eu me encontrava com Sombra de Bordo em
segredo.
Houve um suspiro de seus companheiros de clã, e um deles, um velho gato amassado, sibilou: — Traidor!
Sombra de Bordo manteve o olhar fixo em Estrela Negra. Ela tem que ter pena de mim. Perdi minha casa e meus filhotes.
Não tenho mais nada, exceto Crepúsculo de Maçã.
— Você sabia sobre esses filhotes? — Perguntou Estrela Negra. A ponta da cauda estava tremendo.
Crepúsculo de Maçã assentiu e Brilho de Junco soltou um gemido suave. — Sombra de Bordo me disse que os criaria no Clã
do Trovão. —, Crepúsculo de Maçã miou. — Eu... Eu sabia que havia cometido um erro, então não disse nada aos meus
companheiros de clã.
Um erro? Sombra de Bordo quase estremeceu com a dor nos pálidos olhos verdes de Crepúsculo de Maçã. Quase, mas não
exatamente. O gelo estava se espalhando por ela mais rápido do que uma geada da estação sem folhas. Logo não poderei sentir nada,
ela pensou.
— Eu nunca deveria ter traído meu clã ao me encontrar com Sombra de Bordo, — continuou Crepúsculo de Maçã. — Vou
me arrepender pelo resto da minha vida, e só posso pedir seu perdão.
— O que trouxe esses filhotes aqui hoje à noite? — Estrela Negra perguntou, olhando para as três formas lamentáveis.
Sombra de Bordo abriu a boca para explicar, mas Crepúsculo de Maçã falou primeiro. — Os companheiros de clã de Sombra
de Bordo descobriram a verdade e ela teve que sair. O rio estava inundado e os filhotes eram jovens demais para nadar. Sua voz
vacilou. Sombra de Bordo olhou para ele. Você está fazendo parecer que a culpa foi minha!
Estrela Negra miou: — A perda de qualquer filhote é uma perda para todos nós. Mas você quebrou o código do guerreiro,
Crepúsculo de Maçã. Como posso confiar em você de novo?
Brilho de Junco avançou até estar ao lado de Crepúsculo de Maçã com o pelo roçando no dele. — Não há gato mais leal ao
Clã do Rio do que Crepúsculo de Maçã, — declarou ela. — Se estou disposta a perdoá—lo por seus erros passados, você também
deveria, Estrela Negra.
Houve murmúrios dos gatos na beira da clareira. Eles pareciam impressionados com a confiança de Brilho de Junco.
Estrela Negra esperou até a clareira ficar em silêncio novamente, depois assentiu. — Esta não é a estação para perder
guerreiros. Crepúsculo de Maçã, acredito que você se arrepende do que fez e que foi punido o suficiente pela morte de seus filhotes.
Vou permitir que você permaneça no Clã do Rio — mas saiba que eu e o resto dos companheiros de clã estarão observando você.
Você terá que recuperar nossa confiança.
Crepúsculo de Maçã abaixou a cabeça tão baixo que seu focinho quase tocou os juncos sob as patas. — Jamais esquecerei
sua misericórdia, Estrela Negra — ele murmurou. — Obrigado. Prometo que minha lealdade reside apenas no Clã do Rio e em meus
companheiros de clã. — Ele olhou de soslaio para Brilho de Junco, que piscou para ele.
Estrela Negra gesticulou com o rabo. — Queda d'Água, ajude Pé Chapinhado e Cauda de Enguia a enterrar esses filhotes. O
acidente de seu nascimento não é culpa deles. Eles podem estar em paz em nosso território agora.
Sombra de Bordo lutou para encontrar sua voz. — E… e eu? — ela resmungou. — Posso ficar aqui com meus filhotes?
A líder do Clã do Rio olhou para ela. — Não, você não pode. Você sairá deste território imediatamente e nunca mais pisará
na fronteira. Como a Crepúsculo de Maçã, acredito que a perda de seus filhotes é uma punição suficiente. Caso contrário, tenha
certeza de que meus guerreiros teriam arrancado seu pelo pelo que você fez.
— Mas a noite está caindo! — Sombra de Bordo protestou. — Para onde irei? Crepúsculo de Maçã, me ajude!
O guerreiro marrom claro balançou a cabeça. — Por que eu deveria? É sua culpa que esses filhotes estão mortos. Eu nunca
mais quero te ver.
Brilho de Junco se pressionou ainda mais perto do flanco de Crepúsculo de Maçã. — Vá embora, Sombra de Bordo, — ela
assobiou. — Você já causou problemas suficientes esta noite.
Sombra de Bordo olhou para seus filhotes afogados. — Eu não posso deixá—los, — ela sussurrou. — Eles são tudo para
mim.
— E agora eles estão mortos, — Crepúsculo de Maçã rosnou. — Seja grata por termos demonstrado alguma piedade, Sombra
de Bordo. Saia antes que a façamos sair.
Sombra de Bordo olhou para o gato cujo rosto havia ocupado sua mente por tantas luas. Ela pensou que conhecia cada
turbilhão de pelos dele, o ângulo de cada bigode, mas agora não o reconhecia. A frieza inchou dentro dela até que ela sentiu que saía
de seus olhos, e houve uma sacudida de satisfação quando Crepúsculo de Maçã se afastou de seu olhar. — Você me disse que me
amava! — Sombra de Bordo assobiou. — Passei pela agonia de carregar seus filhotes! E agora você me trata pior do que uma presa.
Você vai se arrepender disso, Crepúsculo de Maçã. Essa é a minha última promessa para você.
Ela se virou e saiu cambaleando da clareira, seguindo cegamente os caminhos através dos juncos até alcançar os marcadores
de perfume que sugeriam que ela estava na fronteira do Clã do Rio. Ela estava vagamente consciente de atravessar uma pedra cinza
dura, então uma forma maciça apareceu nas sombras, uma toca de Duas—Pernas de arestas afiadas de algum tipo. Ela encontrou um
buraco na parede e entrou em um espaço com mofo e cheiro de feno. Sombra de Bordo caiu sobre um grupo de caules secos e
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empoeirados e fechou os olhos. O sono a arrastou para longe, e seus sonhos foram preenchidos com a visão de seus filhotes
espiralando para longe dela em água negra e agitada, gritando por ajuda que nunca veio.
CAPÍTULO 5
Sombra de Bordo lutou para escapar de seu sono, tossindo e queimando com febre. Onde estou? Ela saiu de seu ninho
espinhoso com dificuldade e olhou em volta. Um rato abatido recentemente estava ao seu lado, e a barriga de Sombra de Bordo
roncou. Ela não conseguia lembrar da última vez que havia comido. Ela se inclinou para dar uma mordida, mas as memórias de onde
ela estava e o que havia acontecido inundaram ela e ela engasgou violentamente. Meus filhotes! Crepúsculo de Maçã!
— Olá? Você está bem? — Um miado ansioso fez Sombra de Bordo olhar para cima. Um pequeno gato preto e branco estava
de pé ao lado de um fardo de feno enorme que ocupava a toca. A luz do dia filtrava através de rachaduras nas paredes de madeira,
destacando pequenos flocos de poeira que flutuavam no ar. — Onde estou? Quem é você? — Ela murmurou.
O pequeno gato pegou uma bola de musgo encharcada que estava em suas patas e levou até ela. — Você precisa beber — ele
instigou. Meu nome é Myler, e esse é o meu celeiro. Você foi dormir tão rápido ontem à noite que não tive tempo de me apresentar.
— Como está se sentindo? — Ele examinou ela e Sombra de Bordo se afastou.
— Você parece exausta — Myler observou. — Coma o rato, aí vou deixarvocê descansar mais.
— Eu não vou ficar, — Sombra de Bordo sibilou — eu não quero sua presa fresca.
— Mas tem bastante para dividir. — Myler insistiu. — Eu posso pegar mais para mim mesmo, não se preocupe. — Sombra
de Bordo cambaleou adiante, quase derrubando o gato de suas patas. — Me deixe em paz.— Ela rosnou. — Eu não preciso da sua
ajuda.
Ela procurou pela abertura na parede de onde ela tinha entrado. Atrás dela, Myler estava miando alguma coisa sobre abrigar
estranhos e ter bastante espaço no celeiro. Sombra de Bordo não escutou. O que um gatinho de gente poderia oferecer para ela? Minha
vida está arruinada! Eu não fiz nada de errado, e mesmo assim perdi tudo! A imagem de seus três filhotes mortos pairava no canto de
sua visão, como se ela fosse capaz de vê-los apenas se pudesse virar sua cabeça rápido o suficiente. Mamãe, nos ajude! eles
pranteavam.
— Eu não consigo.— Sombra de Bordo sussurrou. — Ah meus queridos, eu sinto muito.—
Tremendo de fome, Sombra de Bordo se aprofundou na vegetação rala que envolvia o território do Clã do Rio. Ela se manteve
distante da fronteira enquanto seguia em direção do desfiladeiro. Ela sabia que havia uma ponte de madeira dos Duas-Pernas logo
abaixo das paredes escarpadas de rocha, onde ela poderia retornar ao território do Clã do Trovão. Ela sentiu uma força irresistível
puxar dentro dela, de volta ao lugar onde ela havia vivido sua vida inteira. Não havia consolo nos salgueiros finos do Clã do Rio, e o
campo aberto que se estendia até o desfiladeiro fazia ela estremecer com medo. Ao invés disso, ela ansiou pela densidade das árvores
robustas e a vegetação verde e espessa que a enraizaram no chão, inundando seus sentidos com cheiros e sons familiares.
Sombra de Bordo alcançou a ponte e atravessou-a correndo, orelhas achatadas e pelo arrepiado. O barulho do rio agitado abaixo
arrastou sua mente de volta ao momento em que ela soltou Filhote de Remendos. A correnteza estava muito forte! Não é minha culpa
que meus filhotes morreram, ela lembrou a si mesma. Ela pulou da ponte para o chão seco e arenoso que continuava até os Quatro
Carvalhos na frente dela. Se ela virasse e avançasse rio abaixo, ela estaria no território do Clã do Trovão. Tentando ignorar o barulho
da água, ela deu alguns passos até a fronteira, já sentindo as marcações de cheiro no ar parado.
Então ela congelou. Ela não podia cruzar a fronteira. Ela havia sido expulsa – exilada pelos seus próprios companheiros de clã. Se ela
desse um passo em direção a sua antiga casa, ela seria tratada ainda pior do que apenas uma exilada. Uma imagem nadou na mente de
Sombra de Bordo de um pequeno gato preto, olhos estreitados com suspeita, palavras que ecoavam com indignação justificada. Asa
de Corvo! Foi tudo culpa dele. Ele pulou para conclusões, quebrou a confiança do clã nela, forçou seus companheiros de clã a julgá-la
por algo além do que ela poderia controlar. Por causa de suas ações, Filhote de Remendos, Filhote de Lariço e Filhote de Pétala
morreram. Cada respiração que Asa de Corvo dava era uma respiração que ele havia negado aos filhotes de Sombra de Bordo.
A raiva cresceu dentro da cabeça de Sombra de Bordo até que os sons da floresta desapareceram e sua visão ficou turva. Ela
cambaleou ao longo da fronteira, não se importando quando suas garras arranharam pedras ou arbustos arranhavam em sua pele. Sua
pele latejava de calor e ela estava vagamente ciente de que estava com sede do que nunca, mas mesmo quando suas patas afundaram
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em um pequeno arroio, ela não conseguiu juntar forças para parar e beber. Por fim, ela não conseguiu mais andar e desabou onde
estava, em uma vala estreita ao lado de um arbusto de azevinho que cheirava como seu lar.
Sombra de Bordo fechou os olhos e ouviu as batidas de seu coração. Parecia ficar cada vez mais alto, até que a folhagem em que ela
estava deitada começou a tremer. Com um sobressalto, ela abriu os olhos e viu um rosto alaranjado olhando para ela com espanto.
— Sombra de Bordo! — guinchou Pata de Urtiga. — Você não deveria estar aqui!
— Então finja que estou morta, — Sombra de Bordo rosnou. — Eu posso estar talvez..
O olhar de Pata de Urtiga disparou ao redor da vala. — Onde estão os filhotes? — ele sussurrou. — Eles estão no Clã do
Rio?
Sombra de Bordo sentiu a dormência rastejando sobre ela mais uma vez. — Eles se afogaram no rio.
— Ah não! — Os olhos de Pata de Urtiga ficaram enormes.
Sombra de Bordo deixou sua bochecha descansar na terra fria. — Me deixe em paz.
Com um miado abafado, Pata de Urtiga se virou e saiu. Sombra de Bordo se perguntou se ela algum dia sairia da vala. Houve
outro tamborilar de passos de pata acima dela. Sombra de Bordo abriu um olho. Pata de Urtiga estava trazendo um feixe de ervas em
sua direção.
— Eu estava coletando isso para Asa de Corvo, — ele miou. — Mas eu acho que você precisa mais deles. Você não cheira
bem, Sombra de Bordo. — Ele olhou seriamente para ela. — Por favor, coma-os. Eu… Eu sinto muito pelo seu filhotes. Desejo
Sarapintado viu o que aconteceu no rio, mas eu achei que você tivesse chegado ao outro lado.
Sombra de Bordo se sentou com um assobio. — Desejo Sarapintado estava assistindo?
O aprendiz parecia assustado. — S-sim. Ela a seguiu para ter certeza de que você iria sair. Ela... ela disse que você caiu das
pedras.
— E ainda assim ela não fez nada? — Sombra de Bordo raspou. — Esses filhotes estavam indefesos! Como ela poderia
vê-los se afogar?
Pata de Urtiga começou a recuar. — Eu não sei. Ela deve ter pensado que eles estavam a salvos. Ela disse que havia gatos do
Clã do Rio na outra margem.
— Eles não estavam salvos! — Sombra de Bordo rosnou, arqueando as costas e afundando suas garras na cobertura morta.
— Pata de Urtiga! Onde você está? — Um gato gritou do outro lado do arbusto de azevinho. Pata de Urtiga soltou um
gemido e saiu correndo.
Sombra de Bordo afundou se de volta na vala. Ela mastigou as folhas sem prová-las, sentindo uma pontada de satisfação por
tê-las tirado de Asa de Corvo. Como ele poderia continuar colhendo ervas, tratando seus companheiros de clã, como se nada tivesse
acontecido? Sombra de Bordo queimava com a necessidade de vê-lo, de fazê-lo se arrepender de ter contado o segredo que era dela, e
só dela. Ela olhou para a lua, que havia aparecido no céu crepuscular. Em um amanhecer, estaria na metade, quando os curandeiros
viajariam para a Pedra da Lua. Sombra de Bordo pode ser proibida de entrar no território do Clã do Trovão, mas nenhum gato poderia
mantê-la longe do caminho que levava a Boca Mãe. Asa de Corvo estaria sozinho em sua jornada, desprotegido por guerreiros que
eram estúpidos o suficiente para ouvir suas acusações e condenação.
Ela sentiu as ervas trabalhando dentro dela, restaurando a força para suas patas. Com um grunhido, ela saltou da vala e
começou a trotar para longe da fronteira, para os matagais de arbustos que circundavam a depressão aos Quatro Carvalhos. Não era
seguro ficar tão perto do Clã do Trovão, não quando as patrulhas podiam estar procurando por ela. Ela não sabia se Pata de Urtiga iria
ficar quieto sobre te-la encontrado-a, embora provavelmente ele não admitisse ter dado a ela as ervas.
Sombra de Bordo desceu a encosta íngreme até a depressão, fez uma breve pausa para olhar para os quatro carvalhos
gigantes, então continuou, escalando o outro lado e mergulhando nas árvores que faziam fronteira com o território do Clã do Vento.
Existia um cheiro forte de raposa, que fez seu pelo formigar, mas era rançoso ao invés de fresco, e esconderia seu próprio cheiro de
patrulhas de fronteira curiosas.
Ela sentiu mais do que ouviu o barulho de patas aterrorizadas no chão; espiando para fora da samambaia, ela viu um coelho
disparando pela charneca em sua direção, perseguido por uma patrulha de gatos do Clã do Vento. Sombra de Bordo mal teve tempo de
pensar antes que o coelho corresse direto para ela em uma confusão de patas e pelos. Ela mordeu com força seu pescoço e ele ficou
mole. Os guerreiros ainda estavam correndo em sua direção, então Sombra

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