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Saberes de costureiras - tecnologia e precariedade no ambiente de oficinas em Cuiabá - Mato Grosso -2018-2019

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO 
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO E ARTES 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM 
ESTUDOS DE CULTURA CONTEMPORÂNEA 
 
 
CAMILA BARBOSA PASINATO 
 
 
 
 
 
 
SABERES DE COSTUREIRAS: TECNOLOGIA E PRECARIEDADE 
NO AMBIENTE DE OFICINAS EM CUIABÁ, MATO GROSSO (2018-2019) 
 
 
 
 
 
 
 
CUIABÁ-MT 
2021 
 
 
 
CAMILA BARBOSA PASINATO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SABERES DE COSTUREIRAS: TECNOLOGIA E PRECARIEDADE 
NO AMBIENTE DE OFICINAS EM CUIABÁ, MATO GROSSO (2018-2019) 
 
 
 
 
 
Tese de doutorado apresentada como requisito 
parcial para obtenção do título de Doutora junto 
ao Programa de Pós-Graduação em Estudos de 
Cultura Contemporânea da Faculdade de 
Comunicação e Artes da Universidade Federal de 
Mato Grosso (PPGECCO-UFMT), Linha de 
Pesquisa em Epistemes Contemporâneas, sob 
orientação do Prof. Dr. Yuji Gushiken. 
 
 
CUIABÁ-MT 
2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico a todas as mulheres, mães, que 
lutam para sustentar suas famílias por 
meio de suas próprias mãos e saberes. 
 
 
 
 
 
 
Agradecimentos 
 
Ao meu orientador Yuji Gushiken, por acreditar em mim desde 2013, quando ainda era 
aluna especial de mestrado do programa. Por entender nossas diferenças de construção 
de pensamento, leitura e escrita, minhas limitações e mesmo assim apoiar e acreditar. 
Agradeço pela paciência e sensibilidade que teve em cada etapa da minha vida. 
A todos os professores da banca, pelas valiosas colaborações que foram além do 
esperado. Agradeço pela dedicação do tempo, pela gentileza, sutileza e educação 
contida em cada comentário. 
Ao meu pai, minha mãe e meu marido que sempre me apoiaram em todas as minhas 
decisões e insistiram para que eu continuasse no doutorado, mesmo quando eu pensei 
em desistir. Durante todos esses anos, foram eles o meu suporte e a minha rede de 
apoio: quando casei, quando mudei de profissão, quando engravidei e nos cuidados com 
o meu filho. 
Ao meu filho, que antes mesmo de completar seu primeiro ano de vida me deu forças 
para continuar a pesquisa e escolher o caminho do estudo sempre que as dúvidas me 
cercavam. Obrigada por entender que muitas vezes era necessário estar à frente do 
notebook escrevendo, mesmo que ao seu lado, do que brincando ou dormindo com 
você. 
A todos que colaboraram com dados preciosos para a costura dessa tese: faccionistas, 
funcionários, professores, empresários, fornecedores e representantes: obrigada por 
gentilmente cederem seu tempo, sua paciência e sua experiência. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
Oficina (ou “facção”) é o nome popularmente atribuído a confecções caseiras, em geral 
de estrutura familiar, instaladas em residências, que operam de forma terceirizada diante 
da flexibilização do mundo do trabalho, seguindo condições de produção impostas pelo 
comércio ou indústria de confecções. A precariedade do mundo do trabalho, imposto 
pela modernização capitalista, constitui uma interface que problematiza saberes 
domésticos como condição de produção de renda e espaço privado do lar em sua 
transformação em espaço de trabalho. O consumo tecnológico implica na aquisição de 
máquinas de costura e de outros instrumentos, o que demanda a produção de novos 
saberes e desenvolvimento de habilidades. Operar uma facção doméstica, hoje, na 
condição imposta pela modernidade, significa enfrentar problemas relacionados à 
condição de gênero e dominar, além de saberes tecnológicos, os saberes da área 
administrativa, contábil, jurídica, logística e de marketing. No sistema econômico, 
saberes das costureiras de oficinas constituem condição de pensamento e produção do 
campo da moda, mesmo que em meio à informalidade e à precarização do sistema 
produtivo, como a falta de leis trabalhistas específicas que se referem ao fenômeno da 
terceirização das facções. Neste aspecto, considera-se a dimensão comunicacional das 
práticas culturais, em que informações são produzidas, processadas e ressignificadas 
como saberes. A tese tem como objetivo analisar os saberes das costureiras em facções 
de Cuiabá-MT, o que inclui suas subjetividades, a precariedade e a tecnologia do 
trabalho que as envolve. Como recurso metodológico para se extrair as informações 
necessárias para a construção da tese, foram utilizadas pesquisa de campo e entrevista 
qualitativa em profundidade com três costureiras. Partindo dos conceitos de história 
oral, a tese é construída de modo que explicitassem o cotidiano e as condições 
subjetivas que envolvem as faccionistas. A tese propõe uma análise e discussão sobre a 
interface entre produção de saberes e processos de tecnificação na experiência de 
modernização no setor de confecções na cidade de Cuiabá-MT. Trata-se de uma 
pesquisa interdisciplinar, que une campos da sociologia, direito, psicologia, história e 
moda, todos centralizados nos estudos de cultura. 
 
 
Palavras-chave: Costureira, Cuiabá, facção, saberes, precarização. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
Workshop (or "faction") is the name popularly attributed to homemade confection, 
generally with a family structure, installed in homes, which operate on an outsourced 
basis in view of the flexibilization of the world of work, following production 
conditions imposed by the garment trade or industry. The precariousness of the world of 
work, imposed by capitalist modernization, constitutes an interface that problematizes 
domestic knowledge as a condition for income production and the private space of the 
home in its transformation into a work space. Technological consumption implies the 
acquisition of sewing machines and other instruments, which demands the production of 
new knowledge and skills development. To operate a domestic faction, today, in the 
condition imposed by modernity, means facing problems related to the condition of 
gender and dominaing, in addition to technological knowledge, knowledge in the 
administrative, accounting, juridical, logistical and marketing areas. In the economic 
system, knowledge of workshop seamstresses is a condition of thought and production 
in the field of fashion, even in the informality and the precariousness of the production 
system, such as the lack of specific labor laws that refer to the phenomenon of 
outsourcing of factions. In this aspect, the communicational dimension of cultural 
practices is considered, in which information is produced, processed and re-signified as 
knowledge. The thesis aims to analyze the knowledge of seamstresses in factions in 
Cuiabá-MT, which includes their subjectivities, precariousness and the technology of 
the work that involves them. As a methodological resource to extract the necessary 
information for the construction of the thesis, field research and in-depth qualitative 
interviews with three seamstresses were used. Starting from the concepts of oral history, 
the thesis is constructed in a way that make explicit the daily life and the subjective 
conditions that involve factionists. The thesis proposes an analysis and discussion on the 
interface between knowledge production and technification processes in the experience 
of modernization in the clothing sector in the city of Cuiabá-MT. It is an 
interdisciplinary research, which unites fields of sociology, law, psychology, history 
and fashion, all centered on cultural studies. 
 
 
Keywords: Seamstress, Cuiabá, faction, knowledge, precariousness. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
Figura 1 - Capa do livro Método Vogue, exemplar original da década de 1967 ................................................................................. 57 
Figura 2 - Exemplo de desenho explicando como cortar o vestido ....................................................................................................61 
Figura 3- Máquina de costura reta. ..................................................................................................................................................... 71 
Figura 4 - Ponto da costura reta visto de cima ................................................................................................................................... 72 
Figura 5 - Máquina Galoneira com aparelho próprio para fazer golas e punhos em uma facção de Cuiabá-MT. ............................... 72 
Figura 6 - Ponto da costura da galoneira ............................................................................................................................................ 73 
Figura 7 - Máquina Overloque em uma facção de Cuiabá-MT .......................................................................................................... 73 
Figura 8 - Ponto da costura da Overloque visto de cima .................................................................................................................... 74 
Figura 9 - Fluxograma da cadeia têxtil e de confecção .....................................................................................................................116 
Figura 10 - Valor Bruto da Produção Industrial por UF – Têxtil 2016 ..............................................................................................116 
Figura 11 - Número de estabelecimentos por porte das empresas na cadeia produtiva Algodão/Confecção e Vestuário em Mato 
Grosso (2017) ...................................................................................................................................................................................118 
Figura 12 - Sexo dos trabalhadores por atividade na cadeia produtiva ..............................................................................................118 
Figura 13 - Camisetas sendo cortadas. ..............................................................................................................................................124 
Figura 14 - Camisetas sendo costuradas em facção de Cuiabá - MT. ................................................................................................125 
Figura 15 - Instalações da Facção de Julia. .......................................................................................................................................137 
Figura 16 - Instalações da parte de serigrafia da facção de Julia. ......................................................................................................138 
Figura 17- Fachada da facção de Maria. Acima se encontra a sua casa e à esquerda a casa de sua irmã. ..........................................139 
Figura 18 - Instalações da Facção de Maria. .....................................................................................................................................139 
Figura 19 - Instalações da Facção de Neide. .....................................................................................................................................140 
Figura 20 - Engradado plástico usado como suporte para as peças já costuradas ..............................................................................143 
Figura 21 - Tubos de fios e linhas separados por cor em facção. ......................................................................................................143 
Figura 22- Facção de Neide com detalhe para o chão e as mesas ......................................................................................................144 
Figura 23 - Sacolas com peças cortadas, tapetes, tubos e outros materiais ........................................................................................145 
Figura 24 - Cadeira usada na facção de Julia ....................................................................................................................................155 
Figura 25 - Cadeira usada na facção de Maria ..................................................................................................................................156 
Figura 26 - Cadeira usada na facção de Neide ..................................................................................................................................156 
Figura 27 - Faccionista realizando a etapa 4 da descrição acima.......................................................................................................159 
Figura 28 - Maria respondendo os clientes ao fim de uma das etapas da costura. .............................................................................160 
Figura 29 - Detalhe dos cadernos de Maria para cada cliente............................................................................................................161 
Figura 30 – Salmo 23 pregado na parede da facção de Maria ...........................................................................................................163 
Figura 31 – Detalhe da bíblia disposta ao lado da máquina de costura, apontando para um ritual de leitura e oração antes de iniciar a 
jornada de trabalho............................................................................................................................................................................164 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 13 
A COSTURA DO MÉTODO: CULTURA E HISTÓRIA ORAL ........................... 27 
CAPÍTULO 1 – SABERES COSTURADOS POR UMA FACCIONISTA ............ 42 
1.1 Saberes do mundo da moda .................................................................................................................................................... 42 
1.2 Saberes das costureiras a partir da década de 1950 ................................................................................................................. 56 
1.3 Saberes tecnológicos: a lida com a máquina ........................................................................................................................... 64 
CAPÍTULO 2 – COSTURAS FRÁGEIS: PRECARIZAÇÃO NAS FACÇÕES ... 76 
2.1 Questões de gênero ................................................................................................................................................................. 76 
2.2 Trabalho e emprego ................................................................................................................................................................ 89 
2.3 Leis e terceirização: saberes trabalhistas e judiciais ................................................................................................................ 97 
CAPÍTULO 3 – CENÁRIO TÊXTIL E DE CONFECÇÃO: COMO SE 
COSTURA EM CUIABÁ .......................................................................................... 112 
3.1 O cenário produtivo têxtil e de confecção de Cuiabá .............................................................................................................112 
3.2 O cenário de uma facção........................................................................................................................................................120 
3.3 O cenário da casa ...................................................................................................................................................................132 
CAPÍTULO 4 – SUBJETIVIDADE COMO COSTURA: VIDA DE 
FACCIONISTA .......................................................................................................... 147 
4.1 O cotidiano de trabalho na facção ..........................................................................................................................................147 
4.2 A vida das faccionistas ..........................................................................................................................................................1624.3 De costureiras a faccionistas ..................................................................................................................................................178 
CONCLUSÃO ............................................................................................................. 186 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 194 
APÊNDICE ................................................................................................................. 201 
 
 
 
 
 
 
13 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
“A gente aprendeu praticamente na garra.” (JULIA, fevereiro, 2019). A citação 
extraída da fala de uma das costureiras de facção ou oficina entrevistadas para a pesquisa 
resume a forma como as profissionais do ramo aprendem não só a costurar, mas também a 
desempenhar as distintas funções necessárias para conduzir uma facção ou oficina. 
Em Mato Grosso e em alguns estados do Brasil é comum o uso do termo “facção” para 
categorizar um grupo de pessoas que se reúnem para prestar serviços terceirizados de costura 
ou outras etapas produtivas de confecção a uma marca. Em geral, os indivíduos desse grupo 
são do sexo feminino e possuem algum vínculo familiar entre si. 
Porém, o termo “facção” é comum apenas entre as pessoas que se relacionam com a 
área têxtil e de confecção. Pude perceber isto com a tentativa de usar o título da pesquisa de 
“Saberes de costureiras: tecnologia e precariedade no ambiente de facções em Cuiabá, Mato 
Grosso (2018-2019)”, ao invés de usar o termo “oficinas”. 
Ao escolher o termo “facção” no título e apresentar o trabalho em algumas palestras e 
seminários no próprio programa, o vocabulário causou muito estranhamento por parte das 
pessoas que tinham contato com a tese, sempre associando o termo “facção” a “facção 
criminosa” - uma vez que é assim que o termo é mais popularmente conhecido na mídia de 
modo geral. Sendo assim, optei por usar o termo “oficinas” no título e durante a tese usar o 
termo que comumente é usado: “facção”. 
O local de trabalho das pequenas facções situadas na cidade de Cuiabá é, em sua 
grande maioria, na própria casa das costureiras. Uma das facções está localizada no município 
de Várzea Grande, vizinha ao município de Cuiabá, no aglomerado urbano principal da 
chamada Região Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá. Dadas as características entre Cuiabá 
e Várzea Grande, o que inclui o cotidiano comum que as cidades partilham, decidimos indicar 
no título apenas a cidade de Cuiabá, pela capacidade que tem de centralizar a rede urbana 
local. 
A cidade de Cuiabá não está no imaginário da população brasileira como uma cidade 
que produz moda ou como um polo de confecções, assim como Goiânia está por exemplo. No 
entanto, o estado de Mato Grosso é reconhecido por ser um forte produtor de algodão, uma 
das matérias primas utilizadas para as confecções. 
14 
 
 
 
Porém, se for analisada toda a cadeia têxtil, desde a produção da matéria-prima até a 
comercialização de artigos de vestuário em lojas, a cidade de Cuiabá, ao contrário do que 
pode permear o imaginário das pessoas por ser a capital de um estado forte produtor de 
algodão, possui uma representatividade muito maior no setor de comércio do que de indústria 
ou agro. 
Pesquisar as questões de uma cidade com tais singularidades é um dos diferenciais da 
pesquisa, uma vez que não há muitos registros sobre facções em Cuiabá, dando mais margem 
para problemas como a precarização e a informalidade, além de evidenciar a forma como as 
faccionistas sobrevivem em um cenário pouco favorável, produzindo renda e sustentando suas 
famílias. 
O termo precariedade é usado na tese para caracterizar as condições de trabalho em 
que se encontram as faccionistas diante do contexto das transformações que ocorreram no 
mundo do trabalho. Por condição precária se entende a ausência dos direitos trabalhistas, a 
desproteção social, as condições ergonômicas impróprias e insalubres que se encontram 
(acarretando problemas de saúde e acidentes de trabalho) e a exploração do trabalho de forma 
geral. 
A pesquisa possui um recorte temporal entre os anos de 2018 e 2019. Isso significa 
que o cenário estudado retrata o contexto antes da pandemia do vírus Covid-19. Todos os 
dados coletados dizem respeito a um cenário que, provavelmente, hoje não é mais o mesmo, 
porém, por ser um período em que ainda estamos vivendo, optei por não o retratar. 
A pandemia modificou a vida de todos, principalmente das pessoas mais pobres. 
Acredito que o novo cenário que as faccionistas estão hoje vivendo deve ser revisado e 
estudado em um outro momento, quando os efeitos dessa doença que se alastrou por todo o 
mundo sejam melhor compreendidos. Penso dessa forma por respeito a dor de muitos que 
adoeceram e perderam seus familiares. 
Tendo feito esse esclarecimento ao leitor, outro ponto importante é sobre a diferença 
da função da costureira e da faccionista. Nem toda costureira é faccionista, assim como nem 
toda faccionista é costureira. Ou seja, uma costureira pode exercer a sua função, trabalhando 
com carteira assinada por uma fábrica, cumprindo uma carga horária específica e sendo uma 
funcionária contratada. Pode também exercer sua profissão em oficinas de conserto, em 
ateliês de roupas de festas e outros lugares. 
15 
 
 
 
A faccionista, por sua vez, possui uma facção onde exerce a função de costurar. 
Porém, como foi mencionado, nem toda faccionista é costureira. Existem facções dentro do 
cenário de Cuiabá-MT especializadas na etapa de bordado ou estamparia. Por serem raras, 
durante a presente tese abordarei o termo faccionista, que, dentro do determinado contexto, 
servirá para se tratar das profissionais que possuem uma facção e são costureiras. 
A diferença entre uma costureira e uma faccionista, portanto, é o saber, o que para nós 
equivale a uma produção epistêmica. Uma faccionista, além de costurar, precisa cuidar da sua 
facção e exercer outros saberes. 
São vários os saberes necessários para se administrar um negócio, mesmo na 
informalidade, e tal fato se aplica ao caso das faccionistas. Entre os saberes estão os que 
tradicionalmente se aprendem em faculdades ou outras instituições de ensino superior, como 
os saberes administrativos, contábeis, jurídicos e logísticos. Porém, o que as faccionistas 
sabem não foi aprendido no cenário acadêmico. Trata-se de saberes empíricos, adquiridos ao 
longo da vida e de acordo com as mais variadas experiências vividas. 
As faccionistas, na lida com o trabalho diário, tropeçam, se erguem, atuam na 
informalidade, cometem equívocos pela escassez de saberes ou até pelo excesso, mas, em 
geral, representam vidas que atuam em meio à precariedade social do sistema capitalista em 
vigor no mundo de muitas confecções de moda. 
Entre os saberes necessários, aprender a lidar com a tecnologia através da máquina de 
costura, é o primeiro deles, não o mais importante, porém é o saber que comumente se pensa 
ser o único. São máquinas importadas, de difícil manuseio e que exercem diversas funções, 
uma para cada tipo de costura. 
Além disso, precisam lidar e aprender sobre as propriedades dos materiais necessários 
para a costura e toda a dimensão tecnológica concernente, como tipos de linha, fios e tecidos, 
que se disponibilizam como matéria-prima das facções. Para cada tipo de tecido, um novo 
ajuste na máquina deve ser feito e, possivelmente, uma determinada agulha e uma 
determinada linha, e ainda um modo específico de proceder à costura. 
Para se gerir uma facção é necessário entender da parte administrativa, logística, 
contábil, financeira e jurídica que a envolve. De todos os saberes necessários, esses são os 
mais complexos para as faccionistas devido ao difícil acesso aos conteúdos e por serem áreas 
do conhecimento ligadas ao ensino acadêmico ou à gestão administrativa.16 
 
 
 
As faccionistas são pressionadas pelo sistema fabril a aprender a negociar com os 
clientes que terceirizam suas produções. No cenário de Cuiabá-MT, a prática comum é a das 
fábricas ou marcas que as procuram e pré-estabelecem um valor a ser pago para cada peça 
produzida. As faccionistas não possuem poder de negociação. Elas relatam que, se não 
aceitarem o trabalho, as fábricas ou marcas escolhem outras facções concorrentes, que, por 
sua vez, aceitam o trabalho de fornecimento das peças mesmo que o valor a ser pago seja 
baixo. 
Além de todos os saberes mencionados, existe um que tradicionalmente a sociedade 
impõe à mulher. Elas precisam ainda administrar a casa, local onde suas facções se situam. 
Uma casa que precisa ser limpa, cuidada e vivida, com todas as subjetividades que incidem no 
cotidiano de uma família: cuidado dos filhos pequenos, demandas da vida conjugal no 
casamento, preparação de refeições e outras atividades. 
O título da presente tese possui o sujeito “costureiras” usando o artigo feminino no 
plural. O uso do gênero feminino é proposital, pois trata-se de uma profissão 
predominantemente feminina e que, durante a história e principalmente no presente, carrega 
consigo muitos problemas relacionados à condição de gênero que serão mencionados durante 
a tese. 
A presente pesquisa coloca em primeiro plano os saberes das costureiras de facções, 
considerando-as como epistemes contemporâneas ligadas aos diversos campos da prática 
social. Optei por evidenciá-los, pois há certa carência em pesquisas acadêmicas no campo da 
moda que estudam sobre o meio produtivo da cadeia econômica. Ou seja, quem efetivamente 
costura as peças, suas subjetividades e condições de trabalho. 
Mais escassas ainda são as pesquisas que envolvem as facções, fato observado após 
revisão bibliográfica com base em palavras-chave, como “moda”, “facções”, “oficinas”, 
“costureiras” e “faccionistas” realizadas em sites como o Periódicos da CAPES, Plataforma 
Lattes CNPQ, Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações e Google Acadêmico. A 
escassez de dados referente a essa classe de trabalhadoras foi uma grande motivação para a 
produção e a escrita da tese. 
Entre as pesquisas encontradas, a grande maioria se situa na área das Ciências Sociais, 
História e Psicologia. Além disso, quase todas as pesquisas relevantes possuem uma marcação 
geográfica, ou seja, um recorte no cenário pesquisado. Os cenários mais pesquisados são de 
cidades do Nordeste e do Sul do país. Lugares tradicionalmente conhecidos pela forte 
17 
 
 
 
produção têxtil e de confecção. Os assuntos mais abordados nas pesquisas encontradas sobre 
as faccionistas são as condições precárias de trabalho, terceirização e questões de gênero. 
Entre as pesquisas encontradas que contribuíram para a construção da presente tese, 
destaco a de Angela Maria de Sousa Lima (2009), intitulada “As faces da subcontratação do 
trabalho: um estudo com trabalhadoras e trabalhadores da confecção de roupas de Cianorte e 
região” do Programa de Pós Graduação “Doutorado em Ciências Sociais” do Instituto de 
Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas. 
A tese de Lima retrata o cenário dos trabalhadores de confecções de roupas de 
Cianorte e região, relacionando a informalidade com questões de gênero. A autora faz uma 
análise que relaciona o processo de modernização e reestruturação do setor de confecções na 
região com a intensificação da precarização de trabalho, principalmente para as mulheres. 
Destaco igualmente a dissertação de Juliane Oliveira Matos (2008), intitulada “Os 
sentidos do trabalho: a experiência de trabalhadoras de facções de costura da indústria de 
confecções do Ceará”, do Programa de Pós Graduação em Psicologia da Universidade Federal 
do Ceará. 
A dissertação de Matos relata as experiências de faccionistas e costureiras de 
confecções do Distrito Industrial de Maracanaú com uma abordagem mais subjetiva através 
de citações diretas ao decorrer da pesquisa. A autora afirma que foi possível identificar as 
tendências globais de transformação da organização do trabalho no pequeno distrito que foi o 
cenário da pesquisa e que essas tendências, sob a prática da subcontratação e trabalho 
informal, trouxeram junto a ampliação do trabalho precarizado. 
Com a mesma relevância das pesquisas já citadas, destaco a de Louisianne Barros de 
Siqueira (2012), dissertação intitulada “Informalidade e precarização: o trabalho das 
costureiras de facção de Fortaleza/Ceará”, do Programa de Pós Graduação em Psicologia da 
Universidade Federal do Ceará. 
 Apesar da pesquisa anterior pertencer ao mesmo programa, esta última possui o 
recorte temporal de anos seguintes e traz o recorte espacial da cidade de Fortaleza, 
especificamente de um único bairro, com a pesquisa qualitativa com oito costureiras. Da 
mesma forma que as anteriores, esta pesquisa considerou que as novas relações de trabalho, 
marcadas pela globalização, capitalismo e as ideias neoliberais, trouxeram consequências para 
a vida das costureiras de facção da cidade, marcadas pela exploração do trabalho. 
18 
 
 
 
Destaco à lista de pesquisas relevantes, a de Verena Fazolo (2014), intitulada 
“Industria del vestuário: la cuestión de la subcontratación em las micro y pequenas empresas 
de la gran Cuiabá, estado de Mato Grosso – Brasil”. Trata-se de uma dissertação do programa 
em Administração Estratégica de Negócios, da Universidad Nacional de Misiones, da 
Argentina. 
A dissertação de Fazolo aborda o contexto das facções na cidade de Cuiabá nos anos 
que antecedem o de 2014, ou seja, período em que a lei que legalizava a terceirização ainda 
não havia sido aprovada. Através de uma pesquisa quantitativa com empresas ligadas ao ramo 
da confecção na cidade, a autora comprovou que existia a prática da terceirização do trabalho 
há alguns anos, mesmo sendo, na época, ilegal. A pesquisa de Fazolo contribuiu, além disso, 
com o contexto histórico das leis que envolvem a terceirização. Foi um ponto de partida para 
o subcapítulo que aborda de forma mais ampla a parte burocrática e jurídica do trabalho das 
faccionistas. 
Considero que as quatro pesquisas destacadas contribuem efetivamente para a 
construção da presente tese oferecendo suporte, seja através da pesquisa de Fazolo (2014), 
que aborda todo o histórico referente às leis que envolvem a terceirização, ou através das 
contribuições características das áreas de psicologia e ciências sociais com abordagens mais 
subjetivas através do método de citações diretas. 
As pesquisas de Lima (2009), Matos (2008) e Siqueira (2012) comprovam a existência 
de um cenário de terceirização através da exploração do trabalho, informalidade e 
precarização em cidades da Região Sul e Nordeste do país. A presente tese contribui como um 
registro de que a situação de precarização na relação “mulheres-costura-trabalho” se constata 
da mesma forma na cidade de Cuiabá, localizada no Centro-Oeste do Brasil. 
Considero que a presente tese vai além das pesquisas estudadas e contribui para o 
conjunto de pesquisas já realizadas sobre costureiras e facções no Brasil. A tese relata de 
forma subjetiva a vida das faccionistas, levando em conta os seus saberes empíricos ao 
mesmo tempo que aborda o estudo de conceitos como os saberes da parte jurídica, contábil e 
econômica, trazendo também conceitos sobre trabalho, precarização, flexibilização e 
informalidade, além de uma discussão importante sobre gênero. 
 Todos os conceitos acima são raramente estudados no campo da moda. Como a 
presente tese se situa dentro dos estudos interdisciplinares da cultura contemporânea, 
19 
 
 
 
considerei importante expor um panorama dos saberes relacionados ao mundo da moda, 
agregando à interdisciplinaridade. 
Ou seja, trata-se de uma pesquisa que une campos como sociologia, direito, psicologia, 
história e moda, todos sendo analisadossob a ótica da cultura contemporânea. A pesquisa 
ainda vai além ao analisar todas essas questões em um cenário onde não há grande 
representatividade da produção têxtil, de confecção e de criação de moda. Dessa forma, a 
potência da pesquisa está em relatar o modo de sobrevivência e resistência das faccionistas de 
Cuiabá, Mato Grosso. 
A tese se situa no Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea 
da Universidade Federal de Mato Grosso, um programa que, como já foi mencionado, é de 
natureza interdisciplinar. Sendo assim, trago aqui alguns conceitos relevantes para o leitor 
compreender o que é o contemporâneo e o que compreendo por cultura, um conceito 
extremamente amplo e com muitos significados possíveis. 
A definição de Giorgio Agambem, filósofo italiano, sobre o indivíduo contemporâneo 
é muito atual. Ao meu ver, o autor traz a noção de que o contemporâneo é improprio, 
anacrônico e até, ouso dizer, desajustado com o tempo em que vive. Segundo o autor (2009, p. 
58), em uma leitura possível, “pertence verdadeiramente ao seu tempo, é verdadeiramente 
contemporâneo, aquele que não coincide perfeitamente com este nem está adequado às suas 
pretensões [...]”. O autor complementa afirmando que é exatamente através desse 
deslocamento e desse anacronismo que o indivíduo é capaz, mais do que os outros, de 
perceber e apreender o seu tempo. 
Agamben (2009) compara a contemporaneidade com a moda, ou melhor, com o 
"estar" ou "não-estar-mais-na-moda”. 
 Essa cesura, ainda que sutil, é perspícua no sentido em que aqueles que devem 
percebê-la a percebem impreterivelmente, e, exatamente desse modo, atestam o seu 
estar na moda; mas, se procuramos objetivá-la e fixá-la no tempo cronológico, ela se 
revela inapreensível. (AGAMBEN, 2009, p. 66). 
 
 A comparação com a o “estar ou não na moda” me fez compreender com mais 
facilidade a questão da contemporaneidade, por isso trago ao leitor como uma forma de 
complementar o entendimento acerca da moda: "O tempo da moda está constitutivamente 
adiantado a si mesmo e, exatamente por isso, também sempre atrasado, tem sempre a forma 
de um limiar inapreensível entre um 'ainda não' e um 'não mais'". (AGAMBEN, 2009, p. 67). 
20 
 
 
 
 A tese foi escrita levando em consideração que existem culturas no plural, não cultura 
como algo singular, além de compreender os indivíduos como produtos culturais. Considero 
que as culturas populares são plurais. São urbanas e rurais, masculina e feminina, velha e 
jovem, ou seja, são múltiplas. Assim como são essenciais para a produção de alteridades, 
marcam as diferenças, criando classes, raças, identidades de gênero, refletindo em múltiplas 
subjetividades. 
A escrita de uma tese é como a costura de uma peça. Os mínimos detalhes que 
envolvem a sua produção são construídos por etapas. O início da “costura” da presente tese 
foi marcado a quatro anos atrás, pela escolha do objeto e indagações que o cercavam. 
Entre as indagações que motivaram a escrita, estavam: 
- Costurar de forma terceirizada em facções em Cuiabá-MT é um trabalho precário? 
- Se realmente é um trabalho precário, quais são os motivos que levam as faccionistas 
a trabalharem dessa forma? 
- O trabalho como faccionista está atrelado a uma condição de gênero? 
- Trata-se de uma fonte de renda que sustenta a família? 
- Como as faccionistas enxergam seus trabalhos e suas condições de vida? 
Foram perguntas muito simples e diretas, que nortearam a tese, que tem como objetivo 
geral: analisar os saberes das costureiras em facções de Cuiabá-MT, o que inclui suas 
subjetividades, a precariedade e a tecnologia do trabalho que as envolve. 
Para alcançar o objetivo geral, o dividi em objetivos específicos: 
- Identificar as questões de gênero na abordagem histórica do trabalho relacionado à 
costura através de processo de revisão bibliográfica. 
- Investigar quais são os saberes necessários para a operação de uma facção domiciliar. 
- Descrever a relação entre faccionistas e tecnologia, ou seja, como essa relação, 
muitas vezes familiar, se constrói no cotidiano como modo de subjetivar a vida, dentro do 
recorte das facções. 
- Apresentar as questões emergentes no âmbito das relações de trabalho, como as leis 
de terceirização, do microempreendedor individual e contrato de facção. 
21 
 
 
 
Em seguida, a forma como a tese deveria ser “costurada” foi escolhida, ou seja, o 
método. Depois disso fui ao encontro com o meu objeto de pesquisa, as costureiras de facções 
domésticas, para ouvi-las. Somente depois dessa etapa é que a tese começou a ser escrita. 
O saber empírico é considerado, na presente pesquisa, um saber de igual relevância a 
qualquer outro saber. Trata-se do saber aprendido ao longo dos anos através de suas 
experiências, ou seja, a forma como montaram suas facções, como aprenderam a costurar e 
como inseriram esse saber em suas facções, lidando com a organização de pedidos, 
atendimento ao cliente e a logística de produção. 
O saber empírico envolve a relação humano-máquina no processo de modernização e 
da obsolescência planificada das máquinas e dos saberes, através da lida com a tecnologia em 
constante transformação de seus equipamentos, como as máquinas de costura. A máquina 
arrasta os saberes das faccionistas conforme a própria tecnologia se transforma em 
modernização. Além disso, o saber dessas faccionistas envolve os processos de consumo, ou 
seja, a escolha do material, como tecidos, linhas, agulhas. 
São saberes determinados pelo jogo do mercado e pela burocracia de estado, como por 
exemplo, abrirem um cadastro como MEI (Microempreendedor individual), para terem acesso 
a um CNPJ e alguns benefícios, como a previdência social. 
Sendo assim, a fim de entender com mais detalhes o saber empírico, a análise de todo 
o conteúdo proposto na tese partiu das falas das entrevistadas. Elas foram processadas em 
conjunto com os conceitos estudados de teóricos de diversas áreas que serão mencionadas. Ao 
ir a campo, e estar de frente com o objeto de estudo, foi possível perceber que tanto o saber 
empírico quanto o saber acadêmico, representado pelos conceitos dos autores estudados, 
dialogam, apesar de a linguagem e a vivência serem diferentes. 
O Capítulo 1 da tese, nomeado “Saberes costurados por uma faccionista”, aborda os 
saberes que as costureiras necessitam conhecer e exercer para se ter uma facção. Como 
confeccionam artigos têxteis e representam parte da cadeia produtiva da moda, foi necessário 
trazer ao leitor uma perspectiva do mundo da moda, trata-se do subcapítulo 1.1, intitulado 
“Saberes do mundo da moda”. 
Durante toda a tese tive o cuidado de pensar que o meu leitor poderia ser de diferentes 
áreas do conhecimento, principalmente por se tratar de uma tese interdisciplinar, que envolve 
conceitos de diversas áreas que podem ou não serem familiares. 
22 
 
 
 
 O subcapítulo dialoga sobre o cenário da moda de forma direta e simplificada, apesar 
de trazer as contribuições de teóricos como o filósofo francês Gilles Lipovetsky, o sociólogo 
francês Frédéric Godart, o sociólogo britânico Anthony Giddens e a historiadora de moda 
brasileira Mara Rúbia Sant’Anna. 
Traz uma discussão em torno do que é moda, um resumo ao longo dos anos sobre a 
história e seu percurso no mundo, além dos quatro sistemas que sustentam o mercado da 
moda: a alta-costura, o prêt-a-porter, o fast-fashion e o slow-fashion. 
Para finalizar o subcapítulo, há uma explanação de como o sistema da moda rebate no 
cenário da presente pesquisa: Cuiabá-MT, uma cidade com desenvolvimento de moda autoral 
tímido, que segue tendências de comportamento e consumo de cidades maiores como São 
Paulo e Rio de Janeiro. 
Adianto ao leitor que a presente tese aborda os conceitos relacionados à Moda e se 
ancora nos estudos desse campo do saber, porém defendo que a pesquisa abrange com mais 
ênfase o lado avesso da moda do que o lado mais conhecidono imaginário das pessoas. 
O subcapítulo 1.2, intitulado “Saberes das costureiras a partir da década de 1950”, tem 
como objetivo relatar como as costureiras aprendiam a costurar desde a década de 1950. Foi 
necessário o recorte temporal para que o subcapítulo não se tornasse extenso demais ao ponto 
de se desviar do foco principal. 
Na década de 1950 e 1960 o método Vogue foi muito disseminado no Brasil. Tratava-
se de um livro com o método de ensino presencial ou por correspondência voltado 
principalmente para mulheres encontrarem no ofício da costura uma forma de ganhar dinheiro 
ou serem uma boa “dona do lar”. 
O presente subcapítulo possui uma curiosidade que gostaria de compartilhar com o 
leitor: tenho um exemplar original da década de 1967, da décima nona edição, que guardei por 
muitos anos, desde quando estudava design de moda na graduação. Fui presenteada por uma 
costureira que aprendeu a costurar com ele. Por muitos anos guardei e me esqueci, até que, ao 
me deparar com a necessidade de pesquisar como as costureiras aprendiam a costurar, surgiu 
o nome “Vogue”, que me despertou a lembrança. Encontrei o livro bem empoeirado e com as 
páginas amarelas, mas que foi muito útil, pois pude fazer uma análise na íntegra, sem o filtro 
de outro pesquisador. 
23 
 
 
 
O subcapítulo se ancora nos conceitos de André Gorz, filósofo francês e Richard 
Sennet, sociólogo e historiador norte-americano. Ambos contribuem para a tese com 
conceitos sobre o conhecimento, saberes e o termo “artífice”, que fui conhecer somente ao me 
deparar com o momento da escrita. 
Além disso traz alguns exemplos práticos dos saberes específicos que as faccionistas 
possuem no dia-a-dia da confecção, como a etnomatemática, conceituada aqui pelo 
matemático brasileiro Ubiratan D’Ambrosio. 
O subcapítulo 1.3, intitulado “Saberes tecnológicos: a lida com a máquina”, traz 
conceitos acerca da tecnologia dos autores Álvaro Vieira Pinto, filósofo brasileiro, e do 
também filósofo, Val Dusek. 
Neste subcapítulo, o objetivo é que o leitor compreenda que as faccionistas precisam 
dominar o saber tecnológico que envolvem seus instrumentos de trabalho, tendo a máquina de 
costura como o principal deles. 
São inúmeras marcas de máquinas de costura industrial, sendo que todas 
comercializadas no Brasil são de tecnologia importada. Durante o subcapítulo cito as 
principais utilizadas no cenário das facções domésticas em Cuiabá e as dificuldades de se 
aprender e lidar com elas. Aproveito para mostrar com fotos e imagens explicativas os 
modelos de máquinas mais usadas e os pontos específicos que cada uma produz. 
Ao pesquisar sobre o processo produtivo das facções domésticas, duas palavras 
aparecem diretamente: informalidade e precariedade. O Capítulo 2, “Costuras frágeis: 
precarização nas facções”, dá ênfase a essa dura realidade que envolvem as faccionistas. 
O subcapítulo 2.1 expõe as questões de gênero, nele as entrevistas realizadas com as 
faccionistas aparecem com mais expressividade e dialogam a todo momento com as autoras 
pesquisadas: a antropóloga brasileira Adriana Piscitelli, a historiadora norte-americana Joan 
Scott, a socióloga francesa Danièle Kergoat, e a cientista política brasileira Flavia Biroli. 
As três faccionistas entrevistadas são mães e, em todos os casos, foi observado que a 
escolha pelo sistema de facção doméstica foi impulsionado ou relacionado justamente ao fato 
de terem se tornado mães. 
Ao observar e analisar o contexto das três entrevistadas foi possível perceber que 
nenhuma delas teve a opção de parar de trabalhar depois que tiveram filhos. Na verdade, 
ocorre o contrário: elas precisaram continuar trabalhando exatamente por esse motivo. 
24 
 
 
 
Trabalhar em casa através do sistema de facção acabou sendo uma opção, pois em alguns 
casos não conseguiram arrumar uma vaga na creche ou gostariam de acompanhar melhor seus 
filhos dentro de casa. 
São mulheres que acumulam funções, pois além do trabalho como faccionistas, 
cuidam dos afazeres domésticos da casa, além do cuidado com os filhos. O que se percebe é 
que aos companheiros fica a função de “contribuir” ou “ajudar” com o cuidado com a casa e 
os filhos. Muito diferente do papel assumido pelas mulheres, já que a rotina dessas tarefas é 
uma condição atrelada ao gênero. 
O subcapítulo 2.2 intitulado “Trabalho e emprego” possui um viés mais teórico. Foi 
necessário trazer para o contexto da tese um estudo relacionado à conceituação do trabalho e o 
que representou ao longo dos anos. Para isso busquei o suporte de autores como o sociólogo e 
filósofo italiano Maurizio Lazzarato, o sociólogo brasileiro Ricardo Antunes, além das bases 
teóricas de Karl Marx e do filósofo francês Gilles Deleuze, que guiaram toda a construção da 
tese. 
Seu subcapítulo traz para o leitor discussões acerca do capitalismo, mais-valia, divisão 
sexual do trabalho, fordismo, Toyotismo, flexibilização e horizontalização. Além disso, traz a 
diferenciação entre trabalho e emprego. Após a apresentação de conceitos, que podem não ser 
familiares ao leitor, o subcapítulo especifica e detalha o trabalho realizado pelas faccionistas. 
Com uma escrita mais densa e carregada de informações jurídicas, o subcapítulo 2.3 
intitulado “Leis e terceirização: saberes trabalhistas e judiciais”, também aborda, assim como 
o anterior, informações mais teóricas e conceitos ancorados na leitura de Ricardo Antunes. 
Através de um percurso ao longo da história do Brasil no que tange às leis trabalhistas 
e direcionadas a questão da terceirização, é possível compreender o porquê de as costureiras 
trabalharem em situação informal e de precariedade. 
Para tanto, foram estudadas a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que 
proibia a terceirização de atividades-fim; a Lei nº 128 de dezembro de 2008, que cria e 
legaliza a situação do microempreendedor individual (MEI); e a lei 13.429 de março de 2017, 
que, por fim, legaliza a terceirização das atividades-fim, abrindo brechas para a precarização 
do trabalho realizado pelas faccionistas. 
Ao longo do subcapítulo são apresentadas algumas formas das faccionistas 
trabalharem de forma legal, assim como apresenta casos de exploração do trabalho, como 
25 
 
 
 
condições análogas à escravidão ocorridos no Brasil, além de expor como as fábricas e 
faccionistas lidam com essas questões em Cuiabá. 
O Capítulo 3, intitulado “Cenário têxtil e de confecção: como se costura em Cuiabá” 
fornece ao leitor um panorama sobre o cenário econômico da cidade de Cuiabá, sobre as 
facções e o ambiente doméstico onde trabalham as faccionistas. 
O subcapítulo 3.1, “O cenário produtivo têxtil e de confecção de Cuiabá”, 
contextualiza melhor a cidade de Cuiabá, as regiões vizinhas e as especificidades que 
envolvem um cenário em que não houve uma industrialização de forma efetiva, e que não é 
caracterizado por um forte desenvolvimento no setor de confecção e têxtil, além disso aborda 
dados econômicos e geográficos. Dessa forma, o leitor pode compreender que entre as 
dificuldades das faccionistas está a falta de reconhecimento da profissão, bem como a não 
representatividade, a falta de união e força da categoria, por não se tratar de uma cidade 
considerada polo têxtil e de confecção. 
O subcapítulo 3.2 chamado “O cenário de uma facção” detalha a forma de operação 
das facções em Cuiabá, bem como as etapas de produção que podem ser realizadas através do 
processo de terceirização nos ambientes domésticos, já que, ao mencionar facções dentro do 
contexto das confecções, é comum imaginar que se tratam de facções de costura, o que não é 
uma regra, já que existem facções especializadas em processos de estamparia e bordado por 
exemplo, além de outros. 
O respectivo subcapítulo se baseia em dados mais empíricos, ou seja, coletados tanto 
através das entrevistas realizadas com as faccionistas e proprietários, assim como através da 
minhaexperiência prévia enquanto estive imersa no contexto das facções e indústrias de 
Cuiabá. 
O subcapítulo 3.3, intitulado “O cenário da casa”, possui um viés mais subjetivo e se 
alicerça sobre os conceitos teóricos da arquiteta brasileira e pós doutora em Crítica da Cultura 
Ludmila Brandão, do filósofo francês Félix Guattari e Gilles Deleuze. 
A casa é um ambiente subjetivo e de intimidade da família que a habita. Porém quando 
o ambiente de trabalho se instala em seu interior, como é o caso das facções, outras relações 
subjetivas se constroem naquele ambiente. O subcapítulo as explora e expõe, através de 
análises dos teóricos e dos relatos das entrevistadas. 
26 
 
 
 
Além disso, conta com o suporte de fotografias tiradas nos momentos das entrevistas, 
para que o leitor observe melhor as instalações das facções, como adaptaram o ambiente de 
trabalho dentro do ambiente doméstico e suas formas de organização. 
O Capítulo 4, intitulado “Subjetividade como costura: vida de faccionista” explora de 
forma mais incisiva as entrevistas realizadas com as faccionistas. Possui esse nome por 
abranger questões como o cotidiano e os papéis sociais desempenhados por essas mulheres e, 
assim, ao mencionar esses temas, as subjetividades que envolvem a vida das faccionistas 
foram expostas e debatidas. 
O subcapítulo 4.1, nomeado “O cotidiano de trabalho na facção”, tem como ponto de 
partida o conceito de cotidiano da filósofa húngara Agnes Heller e como ele se aplica no 
contexto do trabalho dentro de casa. Debate sobre o sentimento de “estar em casa” em meio 
ao ritmo frenético da produção, além dos conflitos das próprias faccionistas em tentar dividir 
momentos de trabalho com os momentos de estar com a família, mesmo que seja através de 
pequenos rituais matinais se preparando para o trabalho, como tomar um café. 
Também é abordada nesta parte a maneira como as três entrevistadas se percebem 
como faccionistas, como enxergam os seus trabalhos, os problemas de saúde que enfrentam 
em decorrência das longas jornadas e da falta de ergonomia, a forma como lidam com o 
tempo. Além disso, descreve com detalhes a etapa produtiva de uma camiseta, a fim de que o 
leitor perceba como cada minuto da produção conta e se reverte em uma renda boa ou não no 
fim do mês. 
O subcapítulo 4.2 tem como título: “A vida das faccionistas”. A palavra “vida” foi 
escolhida intencionalmente pois remete a questões subjetivas e aspectos pessoais. Além disso, 
foi uma forma mais fácil de elucidar às faccionistas sobre o motivo das entrevistas. Ao entrar 
em contato com elas o contexto da presente pesquisa foi esclarecido, e foi mencionado que 
seria interessante que eu soubesse detalhes tanto sobre suas vidas profissionais, quanto 
pessoais. 
Para isso o subcapítulo conta com o suporte dos conceitos dos autores já mencionados 
Agnes Heller, Flavia Biroli, Maurizio Lazzarato e Félix Guattari. O subcapítulo aborda a 
forma como o capitalismo incide e molda as subjetividades das faccionistas e suas trajetórias 
de vida e de profissão. Além de contar com a visão crítica de cada uma das entrevistadas 
sobre seus trabalhos. 
27 
 
 
 
Questões como as poucas horas de sono, a fadiga, o stress, os papéis sociais 
desempenhados pelas faccionistas, seus sonhos, a forma como veem o futuro, a religião e a 
própria dinâmica da família são analisados mais profundamente durante o subcapítulo. 
O subcapítulo 4.3, nomeado “De costureiras a faccionistas”, expõe conceitos ligados à 
história oral, história cultural, cultura popular e folkcomunicação. Essa costura de conceitos 
foi necessária para compreender os saberes das faccionistas como um saber popular e 
empírico. 
 O subcapítulo é chamado “De costureiras a faccionistas” pois retrata a transformação 
ao longo dos anos, devido a modernização do mundo, de uma profissão. Através de 
momentos marcantes da história, como antes e depois da industrialização em alguns países e o 
fenômeno da terceirização, é possível compreender como os saberes das costureiras tiveram 
que ser ajustados e como elas se viram forçadas a dominar muitos outros, além do “saber 
costurar”. 
 Como já foi mencionado anteriormente, a tese se situa dentro do programa de Pós-
graduação em Estudos de Cultura Contemporânea da Faculdade de Comunicação e Artes da 
Universidade Federal de Mato Grosso. Está inserida dentro do Grupo de Pesquisa em 
Comunicação e Cidade (Citicom-UFMT/CNPq), que busca enfatizar a cidade como questão 
no campo comunicacional, e de modo específico a cidade de Cuiabá-MT. 
 A pesquisa se insere na Linha de Epistemes Contemporâneas. Dentro das práticas 
interdisciplinares, considero os saberes de faccionistas como epistemes comunicacionais na 
medida em que eles se processam como informações que passam em âmbito familiar, 
dimensão comunitária e com características de atravessamento de gênero. Os saberes das 
faccionistas são também saberes midiáticos, operados pela presença de equipamentos tão 
domésticos quanto máquinas de costura, como smartphones, notebooks, aplicativos como o 
Whatsapp e ferramentas como o Youtube 
 
A COSTURA DO MÉTODO: CULTURA E HISTÓRIA ORAL 
Durante a pesquisa, optei por utilizar a entrevista e a observação de campo como 
técnicas que compõem a metodologia, que são aqui identificadas como observação direta e 
entrevista qualitativa em profundidade semiestruturada. 
28 
 
 
 
Existem algumas formas de se referir à abordagem da observação, como observação 
participante, observação direta ou observação in situ. (JACCOUD e MAYER, 2008, p. 254). 
Mylène Jaccoud e Robert Mayer (2008, p. 258), citando um trabalho de Burguess, 
elencam algumas técnicas que podem ser utilizadas como complemento à observação direta: 
“fontes documentais, fontes estatísticas, entrevistas e questionários.” 
Levando em conta os dados apresentados e a necessidade de se extrair ao máximo 
fontes que relatam o contexto em que as costureiras vivem, optei pela entrevista qualitativa 
em profundidade, com três faccionistas. 
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas 
ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, 
ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e 
atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos 
e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. 
(MINAYO, 1994, p. 21). 
A pesquisa qualitativa se difere da quantitativa principalmente por se aprofundar nos 
significados das ações e relações humanas (MINAYO, 1994, p. 22). Algo que não é possível 
ser medido através de análises, equações ou estatísticas da pesquisa quantitativa. 
O processo da pesquisa qualitativa se inicia com uma fase que se chama “fase 
exploratória da pesquisa”. Segundo Maria Cecília Minayo (1994, p. 26) trata-se do: 
[...] tempo dedicado a interrogar-nos preliminarmente sobre o objeto, os 
pressupostos, as teorias pertinentes, a metodologia apropriada e as questões 
operacionais para levar a cabo o trabalho de campo. Seu foco fundamental é a 
construção do projeto de investigação. 
Sendo assim, antes de ir a campo, me preparei pensando nas entrevistadas e nos 
cenários que poderia encontrar. Formulei algumas perguntas que considerava importantes de 
serem abordadas. Eram perguntas divididas por temas, pensando na fluidez da entrevista. 
Essas perguntas se transformaram em um roteiro semiestruturado, ou seja, aberto para 
possíveis outros assuntos que poderiam surgir ao longo das entrevistas. 
Em todos os momentos em que fui acolhida nas casas das faccionistas, iniciei as 
entrevistas, que serão mencionadas através de trechos de citação direta durante a tese, 
informando o leitor de que os nomes reais foram substituídos por nomes fictícios, a fim de 
preservar suas identidades. Elas são chamadas aqui de Neide, Julia e Maria. 
São trêscostureiras com histórias de vida diversas, que serão apresentadas ao longo da 
tese. Para a melhor compreensão e diferenciação, apresento um breve perfil de cada uma 
delas: 
29 
 
 
 
Neide possui 54 anos, foi casada duas vezes, é divorciada, possui três filhos, mora em 
uma casa muito simples de cinco cômodos em um bairro afastado do centro da cidade, sem 
asfalto. Trabalha há 34 anos como costureira e há 20 como faccionista. Seu filho mais novo 
de 19 anos mora com ela e a ajuda raramente. Trabalha só meio período e no outro estuda e 
atua como obreira. Não possui o ensino fundamental completo, vem de uma geração de 
costureiras e aprendeu a costurar em um curso, pago pelo ex-marido. 
Maria possui 56 anos, é solteira e mora com o filho de 25 anos. Mora em uma casa em 
um bairro não tão distante do centro de Cuiabá. No mesmo terreno, porém em uma construção 
separada, moram sua irmã, cunhado e sobrinho. Trabalha como faccionista em sociedade com 
sua irmã. Atua há 26 anos como costureira e há 22 como faccionista. Não possui o ensino 
fundamental completo e aprendeu a costurar em uma fábrica. 
Julia possui 38 anos, é casada e mora com o marido e três filhos, uma menina de 14 
anos, um menino de 9 e um bebê de 2 anos. Trabalha junto com o seu marido, que fica mais 
responsável pela parte de estamparia da facção. Mora em uma casa com terreno amplo em um 
bairro afastado e sem asfalto na cidade de Várzea Grande, vizinha de Cuiabá. Possui o ensino 
fundamental completo, nunca trabalhou em fábricas e aprendeu a costurar com a sua 
professora do Senai de Cuiabá, há 12 anos atrás. 
A pesquisa se apoia no método da história oral. José Meihy (2000, p. 44) compreende 
que: “Como método, a história oral se ergue segundo alternativas que privilegiam os 
depoimentos como atenção central dos estudos. Trata-se de focalizar as entrevistas como 
ponto central das análises”. 
O autor argumenta que a história oral não é de uso exclusivo de historiadores. “[...] 
não fica restrito à História – com ‘H’ maiúsculo – o monopólio da história oral. Nem a 
qualquer outra área do conhecimento, diga-se.” (MEIHY, 2006, 196). Com base na defesa do 
autor, entendi que à minha pesquisa caberia o uso de tal método. 
Meihy (2000, p. 49) defende que “se tomados como ‘saber’ ou ‘conhecimento’, os 
trabalhos de história oral se revestem da mesma consideração que os históricos 
convencionais.” O autor também aponta: 
Hoje em dia, os projetos de história oral passam a ter importância por tratarem de 
impressões, aspectos subjetivos, fantasias e visões de mundo que implicam 
interpretações diferentes das possíveis em histórias feitas com critérios considerados 
científicos. (MEIHY, 2000, p. 49). 
30 
 
 
 
 O autor acredita que a história oral é um recurso de transformação, e não apenas um 
acesso ao conhecimento ou informação. Esse ponto é o que difere a história oral das 
entrevistas de cunho testemunhal. 
 Janaína Amado e Marieta de Moraes Ferreira (2006, p. 12) compreendem que há três 
posturas a respeito do status da história oral: a história oral como uma técnica, como uma 
disciplina e como uma metodologia. 
 As autoras defendem a postura da história oral como metodologia, pois é muito mais 
abrangente e complexa do que uma simples técnica. Não reconhecem a história oral como 
uma disciplina, isto é, uma área de estudos com objeto próprio e capacidade de gerar soluções 
teóricas para as questões surgidas na prática. Defendem que a história oral estabelece e ordena 
procedimentos de trabalho, assim como todas as metodologias. Ou seja, qual o tipo de 
entrevista e as suas implicações para a pesquisa, as possibilidades de transcrições, a forma 
como o historiador se relaciona com o entrevistado. (AMADO e FERREIRA, 2006, p. 16). 
Losandro Tedeschi (2014, p. 11) complementa: 
A racionalidade hegemônica, o pensamento único, patriarcal, colonizador, o 
consenso fabricado sobre os campos de significados produzidos acerca da sociedade, 
a ciência, a cultura, a política, entre outros, apagaram a memória desses grupos, 
negando o passado e reificando o presente, levando mulheres, negros e indígenas a 
lutar pela desnaturalização desses discursos. 
 Outro ponto interessante da história oral é a relevância que as entrevistas assumem 
como uma forma alternativa de proposta para uma história diferente do habitual, que é feita 
sobre bases documentais tradicionais. (MEIHY, 2006, p. 196). 
O objetivo da história oral trata-se então de captar as vozes ocultas pelo saber 
oficializado. Trata-se de um ponto que se aproxima muito da presente pesquisa, pois as 
entrevistadas são mulheres, que possuíam e possuem muitas vezes suas vozes silenciadas na 
história. Além de terem uma profissão que as silencia e ocultam ainda mais. 
Sendo assim, optei por inserir trechos das entrevistas na íntegra e de forma 
privilegiada pois os saberes das costureiras das oficinas ou facções são o meu objeto de 
estudo, além de serem muito singulares, pois são empíricos e não acadêmicos, sendo possível 
serem extraídos somente através delas, tendo assim muita relevância para o presente estudo. 
O uso da história oral, portanto deveria ser aplicado onde os documentos 
convencionais não atuam, revelando segredos, detalhes, ângulos pouco ou nada 
prezados pelos documentos formalizados em códigos dignificados por um saber 
acadêmico que se definiu longe das políticas públicas. (MEIHY, 2006, p. 197). 
31 
 
 
 
A história oral traz realidades que não aparecem em documentos escritos: 
Não se pode esquecer que, mesmo no caso daqueles que dominam perfeitamente a 
escrita e nos deixam memórias ou cartas, o oral nos revela o “indescritível”, toda 
uma série de realidades que raramente aparecem nos documentos escritos, seja 
porque são considerados “muito insignificantes” – é o mundo da cotidianidade – ou 
inconfessáveis, ou porque são impossíveis de transmitir pela escrita. (JOUTARD, 
2000, p. 33). 
O cotidiano faz parte da vida das faccionistas, sendo assim, compreendi que as 
questões que podem ser consideradas “insignificantes” em primeiro momento, não só fazem 
parte, mas são essenciais nas subjetividades que constroem todas as dimensões de uma 
faccionista, e poderiam ser melhor extraídas através da história oral como parte do processo 
metodológico. 
Para usar a história oral como método procurei entender a própria história da história 
oral, fazendo uma revisão bibliográfica, analisando seu campo de estudos, que áreas 
abrangem e seus principais teóricos. Pesquisando com mais densidade, pude observar que se 
trata de um campo de difícil conceituação por parte dos próprios teóricos. 
Tal fato trouxe dúvidas se eu, como pesquisadora da área da moda e atuando no campo 
dos estudos de cultura, estaria preparada para usá-la como método. Venho de uma área muito 
prática, de formação acadêmica hoje, com perfil profissionalizante, que possui uma 
fragilidade quanto ao registro e estudos de metodologias quando comparada a outras. Acredito 
que exatamente por vir de uma área muito prática, torna-se premente compreender temas 
presentes em áreas e/ou subáreas que também estão em busca de uma conceituação mais 
definida e objetiva, como o caso da história oral. 
Jorge Lozano (2006, p. 19), frisa que a história oral se constitui pela confluência 
multidisciplinar, é como uma encruzilhada de caminhos, um intercâmbio entre a história e as 
demais ciências sociais e do comportamento. 
A história oral é inclusive usada e apropriada fora do mundo acadêmico. Amado e 
Ferreira (2006, p. 15) compreendem que o fato de a história oral ser largamente praticada fora 
do mundo acadêmico tem gerado tensões. Porém, essa pluralidade, que é marca da história 
oral, quando aceita pode gerar um rico diálogo que é raro em outras áreas da história. 
Mesmo ciente das dificuldades que abarcam a história oral, optei por usá-la como 
ferramenta teórica no arcabouço metodológico, principalmentepor sua proximidade com o 
campo da história cultural, outro campo que apresenta também esforços na busca por uma 
conceituação objetiva e teoricamente aceitável na comunidade acadêmica, se não na história, 
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em área adjacentes e igualmente emergentes e metodologicamente em busca de caminhos 
possíveis de investigação. 
Importante para a presente pesquisa é o fato de a história oral tender a se situar 
exatamente onde a história geral, a história política ou econômica, não chega: a história da 
cultura. Enfatizando-a e compreendendo que existem “culturas”, e não “a cultura”, opta-se por 
“[...] uma saída para a atual fragmentação da disciplina em especialistas de história de 
população, diplomacia, mulheres, ideias, negócios, guerra e assim por diante.” (BURKE, 
2005, p. 06). 
A não-especialização que a história cultural defende contribuiu para o entendimento 
de que, no caso desta pesquisa em estudos de cultura contemporânea, os saberes das 
costureiras, constituídos através das suas subjetividades, experiências e cotidiano em meio à 
estrutura econômica e política, devem ser analisados em conjunto. Não há como compreender 
seus saberes sem abordar as dimensões que as envolvem, como os relacionamentos, a família, 
o casamento, filhos, religião e trabalho. 
Ao ler “Costumes em Comum” (1998) e “A formação da classe operária inglesa” 
(1988), ambos do historiador inglês Edward Palmer Thompson, compreendi a importância do 
registro da história sob a ótica cultural da classe operária, ou seja, a história cultural “a partir 
de baixo”. 
São obras que aparecem como um marco na história cultural britânica. Ao fazer esse 
registro, Thompson influenciou diversos historiadores a romper com as abordagens anteriores, 
em que pessoas comuns são deixadas de fora da história. O autor passou a se tornar uma 
referência para a história do trabalho, pois em suas análises os trabalhadores eram os próprios 
sujeitos de suas histórias. 
Assim, segundo Peter Burke (2005, p. 68), os historiadores se tornaram cada vez mais 
conscientes de que pessoas diferentes podem ver o mesmo evento ou estrutura a partir de 
perspectivas muito diversas. 
Thompson apresenta, portanto, uma versão diferente da história, uma história que 
nunca foi bem explorada, já que os olhares dos historiadores estavam voltados para outros 
atores, em geral pertencentes a outras camadas sociais. 
Ao analisar suas obras, mesmo que no contexto de trabalho do operário inglês do 
século XVIII e XIV, em uma realidade distante no espaço e no tempo, considera-se, a partir 
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do ponto de vista de Burke, o cenário das facções em Cuiabá, uma cidade, que séculos depois, 
já na segunda década do século XXI, ainda não passou por um processo de industrialização 
efetivo, e assim pude perceber semelhanças, apesar das diferenças. 
Mesmo séculos depois do tempo retratado por Thompson, o cenário produtivo da 
classe das trabalhadoras de facção é desvalorizado e pouco documentado. Através da revisão 
bibliográfica percebi que são raras as pesquisas que abordam o cenário das facções de costura 
no Brasil através de uma abordagem pela perspectiva das próprias faccionistas. Ou seja, que 
privilegiasse as vozes dessas mulheres, ou que com clareza e amplitude registrasse os cenários 
em que vivem, suas subjetividades, enfim, seus saberes. 
Compreendi que, ao escolher e defender uma opção metodológica de observar o 
contexto “a partir de baixo”, fiz também uma opção política. Ao adotar tal postura como 
pesquisadora, enfatizo a existência de “culturas”, e não “cultura” no singular, algo que a 
história cultural defende e que muitos historiadores do passado não tiveram como objetivo 
alcançar ou compreender. 
Além das entrevistas com faccionistas, foi necessário entrevistar três proprietários de 
confecção, pois precisava de dados técnicos e burocráticos que não foi possível obter apenas 
com as entrevistadas. Alguns dos proprietários terceirizam ou já terceirizaram com algumas 
das faccionistas. Para isto também optei pela entrevista qualitativa em profundidade 
semiestruturada. 
Por fim optei, pelo método de observação direta nas facções das três faccionistas 
entrevistadas. O plano inicial era retornar a cada um dos cenários das facções onde tinha 
realizado as entrevistas, para observar enquanto trabalhavam. Porém, o retorno só foi possível 
em uma das casas das faccionistas. 
Quando expliquei que eu retornaria para observá-las trabalhar, todas responderam que 
não teria nenhuma objeção. Porém Maria foi a única faccionista que permitiu o meu retorno. 
Neide não respondeu às minhas ligações e mensagens quando solicitei para retornar, e, no 
caso de Julia, seu marido me informou que não gostaria que eu voltasse à facção. 
Respeitei a condição colocada nos dois casos. Acredito que tal situação aconteceu, 
pois as faccionistas podem ter algum tipo de receio do rumo da pesquisa ou consideraram que 
a minha visita tomaria muito tempo delas, tempo que poderia ser dedicado ao trabalho, 
gerando renda. 
34 
 
 
 
Durante a primeira visita em cada facção, foi utilizado um gravador para as 
entrevistas, por meio de um aplicativo no próprio celular. Após a etapa das entrevistas, foi 
realizada a transcrição. O momento da passagem da oralidade para a escrita foi realizado de 
forma cautelosa. Afinal, uma pausa na fala, um silêncio ou uma hesitação podem significar 
muitas coisas dependendo do contexto. 
Daniele Voldman (2006, p. 38) comenta sobre a pausa: 
Para ele [historiador], não se trata de propor interpretações da mensagem que lhe é 
comunicada, mas de saber que o não-dito, a hesitação, o silêncio, a repetição 
desnecessária, o lapso, a divagação e a associação são elementos integrantes e até 
estruturantes do discurso e do relato. 
Joutard (2000, p. 35) esclarece que: “[...] o documento original é a gravação e que a 
transcrição não passa de acessório, não podendo substituir a audição de fitas gravadas [...]”. 
Sendo assim, mesmo tendo ciência de que a transcrição não substitui a oralidade, procurei ser 
o mais abrangente possível nos detalhes e identificá-los nas transcrições a fim de que esse 
processo auxiliasse no decorrer da tese. Além disso tive acesso constante às gravações, 
sempre recorrendo a elas em momento de necessidade. 
As perguntas foram levadas a campo e transformadas em um roteiro, porém, seguidas 
de forma livre, à medida que certos assuntos surgiam. Durante as entrevistas, diversas 
perguntas que não estavam no roteiro vieram à tona de forma muito espontânea. A 
espontaneidade das entrevistas, que se tornaram conversas, foi muito importante para a 
percepção das questões subjetivas, os saberes que as envolvem e o cenário em que vivem. 
Além do celular com o aplicativo de gravador de voz, levei a campo um caderno, que 
a princípio pensei que funcionaria como um diário de campo. Porém, o caderno foi pouco 
utilizado, pois sentia que as faccionistas faziam breves pausas quando eu fazia alguma 
anotação, interrompendo o fluxo natural da conversa. Já no momento de observação direta, 
quando voltei a campo para observar Maria, que permitiu o retorno, o diário de campo foi 
fundamental. 
Expliquei à faccionista e à sua irmã, sócia da facção, que daquela vez o gravador 
estaria desligado, e que o foco do meu retorno era a observação do cotidiano, resumido ali a 
um dia de trabalho. Usei o diário para descrever o cenário através das minhas percepções, 
descrição de gestualidades que poderiam ser classificadas como cotidianas e despercebidas 
pelo gravador, características subjetivas em geral, além de alguns questionamentos. 
Jaccoud e Mayer (2008, p. 274) falam sobre a importância das anotações na pesquisa: 
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As anotações metodológicas consistem na descrição do desenvolvimento das 
atividades da pesquisa e no relatório sobre a integração social do pesquisador no 
meio observado. As anotações teóricas visam a construçãosocial do pesquisador no 
meio observado. Nas anotações descritivas, registra-se o trabalho de percepção do 
vivido e relata-se exaustivamente a situação observada. 
É fato que a utilização do gravador inibiu as faccionistas. Por isto, desde as primeiras 
conversas por telefone, quando comentava como seria a pesquisa, mencionava o uso do 
gravador, mas amenizava ao comentar que as entrevistas se assemelhariam a conversas 
informais. 
No retorno à facção de Maria, foi possível constatar que ela e a irmã estavam mais à 
vontade, devido ao fato de já me conhecerem e porque o gravador estava desligado. 
A abordagem da observação direta é bem detalhada, o pesquisador deve estar atento 
aos detalhes para estar apto a descrevê-los durante a tese. 
No modelo de passividade, o pesquisador colhe os dados de natureza principalmente 
descritiva, observando a vida cotidiana do grupo, da organização, da pessoa que ele 
quer pesquisar. Sua intervenção continua mínima. (DESLAURIERS, 1991 apud 
JACCOUD e MAYER, 2008, p. 262). 
A pesquisa adota o modelo de passividade no momento de imersão, quando retornei à 
facção para observar o cotidiano de um dia de trabalho. Ou seja, durante esse momento, a 
minha intervenção foi reduzida, a fim de não atrapalhar a cena produtiva e colher os dados 
como seriam se eu não estivesse no meio. 
[...] o termo ‘observação’ pode ser empregado tanto para designar um tipo de coleta 
dos dados pelo próprio pesquisador (a observação in situ), quanto um tipo de relação 
com os objetos-sujeitos pesquisados; isto é, o de um contato mais ou menos íntimo. 
(CHAPOULIE, 1993, apud JACCOUD e MAYER, 2008, p. 258). 
Em todas as entrevistas foi permitido que eu tirasse fotos. Para isso, foi utilizado um 
aplicativo de telefone celular. O objetivo das fotografias era o foco nos detalhes, de modo a 
não revelar através das imagens o local de trabalho ou a identidade das faccionistas, devido ao 
teor ético da pesquisa e que então estávamos buscando delimitar com mais precisão: até que 
ponto as informações constituiriam a tese, sem causar maiores desconfortos às entrevistadas e 
sem produzir sensação de ameaça ao trabalho e à vida privada das entrevistadas. 
Angers (1992, p. 131) desenvolve sobre a abordagem da observação direta: 
Trata-se de uma técnica direta, já que há um contato com informantes. Trata-se, 
também, de uma observação não-dirigida, na medida em que a observação da 
realidade continua sendo o objetivo final e, habitualmente, o pesquisador não 
intervém na situação observada. Trata-se, ainda, de uma análise qualitativa, uma vez 
que entram em jogo anotações para descrever e compreender uma situação, mais do 
que números para enumerar as frequências de comportamentos. 
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Chapoulie (1984) e Laperrièrre (1984, apud Jaccod e Mayer, 2008, p. 260) comentam 
sobre as diferenças de abordagem em relação a hipótese: 
[...] a observação é concebida como uma abordagem, cuja visão é essencialmente 
explicativa ou objetiva: trata-se de observar fatos num meio determinado, para 
formular hipóteses que serão, depois, testadas por meio de um retorno a um trabalho 
de observação, e assim por diante (modelo indutivo); ou, ao contrário, trata-se de 
empreender o trabalho de campo a partir de hipóteses que deverão ser testadas e 
validadas pelas observações (modelo dedutivo). 
A hipótese da tese, portanto, que veio se desenvolvendo entre revisão bibliográfica e 
pesquisa de campo, pode ser assim enunciada: As costureiras de facção produzem saberes 
específicos para o funcionamento das facções, saberes em construção e a serem 
possivelmente construídos. Estão trabalhando em suas casas, através de uma atividade 
informal, como uma saída a precariedade, buscando transformar o saber, possivelmente 
saberes populares urbanos, em trabalho, realização pessoal e valor econômico. 
No caso da pesquisa, a hipótese surgiu após as primeiras visitas nas casas das 
faccionistas. Dessa forma, a pesquisa, considerando a busca pelo argumento ou hipótese como 
construção teórica, seguiu o modelo indutivo, apontado pelos autores, ou seja, através de uma 
hipótese inicial em campo com as entrevistas, observando as faccionistas em seus ambientes 
para posteriormente a hipótese ser reformulada, que foi testada ao retornar a campo. 
As questões mais debatidas, mais comentadas, e, enfim, mais documentadas 
concernem, sobretudo, à posição e ao papel do observador, sua relação com o campo 
de pesquisa, o lugar da observação no procedimento de pesquisa, os critérios de 
validade e de confiabilidade, a amostragem ou a seleção do local de observação, a 
construção das categorias de análise, a produção teórica, o problema da 
generalização dos resultados e as questões de ordem ética. (JACCOUD e MAYER, 
2008, p. 255). 
As categorias de análise foram construídas levando em conta as características de 
definição de amostragem da pesquisa qualitativa. 
A pesquisa qualitativa não se baseia no critério numérico para garantir sua 
representatividade. Uma pergunta importante neste item é “quais indivíduos sociais 
têm uma vinculação mais significativa para o problema a ser investigado?” A 
amostragem boa é aquela que possibilita abranger a totalidade do problema 
investigado em suas múltiplas dimensões. (DESLANDES, 1994, p. 43). 
Sendo assim, para a presente pesquisa, o mais importante era que, no desafio da busca 
e da construção metodológica, eu, como pesquisadora, conseguisse extrair o máximo de 
informações e percepções de cada faccionista. Entendi que mais importante do que um grande 
número de informações e de entrevistadas, era a profundidade da pesquisa. Somente dessa 
forma seria possível entender as dimensões subjetivas que envolvem o trabalho das 
faccionistas neste fazer simultaneamente relacionado ao doméstico e à produção econômica. 
37 
 
 
 
Resolvi, levando em conta tais características e condições, começar com três 
entrevistadas, tendo em mente que esse número poderia aumentar ou não no decorrer da 
pesquisa. Solicitei a indicação de três faccionistas a uma fábrica que terceiriza sua produção 
com facções há muitos anos. As características que foram prezadas no momento da escolha 
das três foram a de serem pessoas abertas à comunicação, que se sentissem mais à vontade na 
presença de um gravador e que fossem solícitas. 
Após entrar em contato com todas as faccionistas, uma delas me deu uma resposta 
negativa. Antes disso me perguntou se teria alguma remuneração por me ceder a entrevista. 
Expliquei que minha pesquisa não previa nenhum tipo de verba para as entrevistadas, e que 
todas elas seriam beneficiadas de alguma forma, pois a pesquisa retrataria suas vidas e se 
destinaria também a elas. A resposta, mesmo assim foi negativa, e eu tive que entrar em 
contato com uma quarta costureira, que gentilmente aceitou me receber em sua facção. 
A metodologia da história oral não se detém nos pontos comuns entre os entrevistados. 
“[...] a história oral, diferentemente das abordagens comuns à sociologia, se preocupa com as 
versões individuais sobre cada fenômeno. [...] Afirma-se pois que cada depoimento para a 
história oral tem peso autônomo, ainda que se explique socialmente.” (MEIHY, 2000, p. 70). 
Levando em consideração a individualidade com que se lida em cada entrevista, a 
quantidade de entrevistadas não foi uma questão relevante. Levei em conta os dados que 
obtive ao final das três entrevistas, e constatei que esclareciam as questões, confirmando ou 
derrubando argumentos que tinha antes de ir a campo. 
“Quando os argumentos começam a ficar repetitivos, deve-se parar as entrevistas.” 
(MEIHY, 2000, p. 124). Levando em consideração o que o autor defende e o observado nas 
entrevistas, encerrei totalizando três. Assim seria possível dar ênfase para cada realidade 
encontrada. 
As três faccionistas foram informadas sobre as características e os objetivos da 
pesquisa, e aceitaram participar das entrevistas

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