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< DESCRIÇÃO As responsabilidades social e ambiental do médico veterinário, no exercício da sua profissão, relacionadas à saúde pública, ao bem-estar animal, ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável. PROPÓSITO Compreender as responsabilidades social e ambiental do médico veterinário, articuladas com as ideias de ética, direitos humanos, desenvolvimento e sustentabilidade. PREPARAÇÃO Para iniciar este estudo, é importante que você tenha em mãos os principais documentos normativos para construir conhecimentos mais abrangentes sobre o tema. Você deverá acessar e consultar: Resolução n. 1.138, de 16 de dezembro de 2016 (aprova o Código de Ética do Médico Veterinário) Resolução CFMV n. 1.236, de 26 de outubro de 2018 (define e caracteriza crueldade, abuso e maus-tratos contra animais vertebrados e dispõe sobre a conduta de médicos veterinários e zootecnistas) OBJETIVOS MÓDULO 1 Descrever os principais aspectos que fundamentam a responsabilidade social do médico veterinário MÓDULO 2 Descrever os principais aspectos que fundamentam a responsabilidade ambiental do médico veterinário INTRODUÇÃO Neste tema, estudaremos os aspectos importantes da responsabilidade social e da responsabilidade ambiental do médico veterinário. A primeira é entendida como um arcabouço ético que aponta para a obrigação que os indivíduos têm de trabalhar e cooperar com outros indivíduos e organizações em prol do bem comum. Já a responsabilidade ambiental está condicionada a ações que propiciem a existência de um meio ambiente saudável, sustentável e equilibrado. MÓDULO 1 Descrever os principais aspectos que fundamentam a responsabilidade social do médico veterinário RESPONSABILIDADE SOCIAL – HISTÓRICO E CONCEITO Foi nos Estados Unidos, por volta dos anos 1950, e na Europa, na década de 1960, que surgiram os estudos sobre responsabilidade social. Porém, apenas a partir dos anos 1970 o tema se tornou um novo campo de estudo, quando as associações profissionais passaram a se interessar pelo tema. Inicialmente vinculada às empresas que decidiram de forma voluntária atuar orientadas por uma sociedade mais justa e o meio ambiente mais limpo, hoje a responsabilidade social atravessa toda a sociedade, nos planos individual, profissional e coletivo. Mas se antes as empresas não pensavam nisso, de onde vem essa ideia? Vários fatores contribuíram para o surgimento da ideia, em especial o fenômeno da globalização, com as alterações nos modos de produção, os avanços da tecnologia, os fenômenos migratórios, entre outros, despertando nas pessoas a consciência de que a atividade econômica em geral não pode estar exclusivamente vinculada à noção de lucro. Há uma dimensão ética voltada para o bem comum que deve ser considerada. Indivíduos e instituições, assim como consumidores e investidores, tornam-se uma voz importante no debate sobre a responsabilidade social, que se traduz na adoção de uma moldura legal apropriada para fomentar medidas que possam gerar e ampliar as condições adequadas de vida para toda a sociedade. Hoje, a responsabilidade social pode ser entendida como um arcabouço ético que sugere aos indivíduos o dever de trabalhar e cooperar com outros indivíduos e organizações – sejam empresas, sociedades civis, entidades governamentais etc. – em prol do bem comum. A responsabilidade social pode também ser compreendida como a obrigação que cada indivíduo tem de atuar em prol do equilíbrio entre a economia e o bem comum a ser usufruído pela sociedade, pelas pessoas, no meio ambiente em que todos vivemos, incluindo não somente os seres humanos, mas também toda a natureza. Isso nada mais é do que a ampliação e a consolidação dos direitos humanos. A responsabilidade social, além de prescrever que as pessoas devem evitar a prática de atos socialmente danosos, é intergeracional, pois as atitudes de uma geração têm consequências nas gerações futuras, construindo uma cadeia de interdependência recíproca. DIREITOS HUMANOS Todos parecem saber o que significa, mas há muita dificuldade em determinar um conceito que dê conta de transmitir o sentido da expressão direitos humanos. Confira o que Vicente Barreto, autor reconhecido nos estudos da Ética, da Filosofia e do Direito, nos ensina: O EMPREGO DA EXPRESSÃO ‘DIREITOS HUMANOS’ REFLETE ESSA ABRANGÊNCIA E A CONSEQUENTE IMPRECISÃO CONCEITUAL COM QUE TEM SIDO UTILIZADA. A EXPRESSÃO PODE REFERIR-SE A SITUAÇÕES SOCIAIS, POLÍTICAS E CULTURAIS QUE SE DIFERENCIAM ENTRE SI, SIGNIFICANDO MUITAS VEZES MANIFESTAÇÕES EMOTIVAS EM FACE DA VIOLÊNCIA E DA INJUSTIÇA; NA VERDADE, A MULTIPLICIDADE DOS USOS DA EXPRESSÃO DEMONSTRA, ANTES DE TUDO, A FALTA DE FUNDAMENTOS COMUNS QUE POSSAM CONTRIBUIR PARA UNIVERSALIZAR O SEU SIGNIFICADO E, EM CONSEQUÊNCIA, A SUA PRÁTICA. (BARRETO, 2002, p. 500) Ainda assim, podemos associar os direitos humanos, de um lado, a uma ideia de vulnerabilidade do indivíduo e, de outro, à ideia de proteção. Carlos Santiago Nino, importante filósofo e jurista argentino, que também estudou essa temática, em seu livro Etica y derechos humanos: un ensayo de fundamentación chama atenção para o fato de que muitas vezes é o próprio homem que ameaça e põe em risco o outro. Ele trata os direitos humanos como uma ferramenta para lidar com ameaças à vida humana, com os infortúnios que a todo o tempo podem recair sobre nossos planos, aspirações e afetos, e destaca que esse aspecto trágico da condição humana é obra de nós mesmos, determinado pela fragilidade de nossa constituição biológica e pela instabilidade de nosso habitat ecológico (NINO, 1989). Essa vulnerabilidade se torna evidente quando pensamos no direito à saúde, à alimentação, ao desenvolvimento, ao bem-estar animal e na proteção do meio ambiente – o que nos remete à contribuição do médico veterinário para essa temática, reforçando o papel essencial desse profissional na proteção desses direitos, conforme a própria Resolução n. 1.138/2016 reconhece. Apesar da ausência de um conceito único, hoje podemos ao menos concordar que os direitos humanos são direitos de TODAS as pessoas humanas – HOMENS, MULHERES e CRIANÇAS – em TODOS OS LUGARES. ATENÇÃO Os direitos humanos podem ser direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos e de desenvolvimento, sendo ainda reconhecidos como direitos universais, indivisíveis, de todos os seres humanos, sem distinção. Sustentam-se na dignidade das pessoas e estabelecem obrigações para os governos, agentes públicos e profissionais em geral, que têm por finalidade proteger indivíduos e grupos. Como vimos, os direitos humanos também guardam uma relação estreita com a ideia de dignidade. E é necessário, para que possamos mais adiante discutir a responsabilidade social do médico veterinário e suas vinculações com a dignidade humana, fazer ainda algumas considerações de natureza mais teórica sobre esse valor estruturante. DIGNIDADE HUMANA De acordo com Duarte e Iorio (2008) e Silva, Iorio e Silva (2016), a dignidade humana, tal qual os direitos humanos, é considerada um conceito polissêmico. Isso quer dizer que essa expressão comporta muitos sentidos diferentes, constituindo um desafio para aqueles que buscam estabelecer um sentido único para ela. A dignidade humana diz respeito a coisas diversas, determinadas em razão do sentido que lhe é atribuído ou dos interesses que buscamos preservar ou defender quando dela fazemos uso. O jurista brasileiro Ingo Wolfgang Sarlet conceitua a dignidade humana como a qualidade intrínseca e distintiva que torna o indivíduo merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade. Segundo o jurista, isso gera um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, garantem condições existenciais mínimas para uma vida saudável, e propiciam e promovem sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demaisseres humanos (SARLET, 2007). COMENTÁRIO Percebemos que falar de direitos humanos é falar de respeito. Respeito que é exigido do Estado e da sociedade como um todo, materializando-se num feixe de direitos e deveres fundamentais que asseguram uma existência minimamente decente (por exemplo, acesso ao saneamento básico, à água potável, à alimentação adequada etc.), permitindo ao ser humano decidir os rumos de sua vida, assegurando sua felicidade e participação na sociedade. Os direitos humanos hoje são fundamentais para o discurso global sobre paz, segurança, desenvolvimento e sustentabilidade. Entre os valores assegurados pelos direitos humanos, podemos perceber com facilidade que alguns dialogam diretamente com desempenho profissional do médico veterinário. E é exatamente nessa interseção que apresentamos a questão da responsabilidade social desse profissional. Vamos lá? RESPONSABILIDADE SOCIAL DO MÉDICO VETERINÁRIO Os parâmetros de conduta do médico veterinário em sua atividade profissional se encontram apontados no Código de Ética do Médico Veterinário (em vigor desde 9 de setembro de 2017), aprovado na Resolução n. 1.138, de 16 de dezembro de 2016, expedida pelo Conselho de Medicina Veterinária, conforme as atribuições a ele conferidas pelo art. 16 da Lei n. 5.517, de 23 de outubro de 1968. Nas considerações iniciais do Código de Ética do Médico Veterinário, a medicina veterinária é conceituada como atividade imprescindível ao progresso socioeconômico, à proteção da saúde humana e animal, ao meio ambiente e ao bem-estar da sociedade e dos animais, requerendo, daqueles que exercem a atividade, a formação, o conhecimento e o aprimoramento profissional. No juramento do médico veterinário, fica claro que ele se compromete a aplicar seus “conhecimentos para o desenvolvimento científico e tecnológico em benefício da saúde única e bem-estar dos animais, promovendo o desenvolvimento sustentável” (CFMV, 2016). Assim, a medicina veterinária é qualificada como uma ciência em prol da sociedade, devendo seu exercício acontecer sem discriminação de qualquer tipo ou natureza. Esse compromisso implica direitos e deveres do profissional em relação à comunidade, ao paciente, aos produtores, contratantes e a outros profissionais, bem como ao meio ambiente. A atuação do médico veterinário comprometido com o bem comum pode ser entendida como um compromisso com uma agenda, nos planos nacional e internacional, de promoção e proteção dos direitos humanos, especialmente na perspectiva do direito à saúde, da proteção aos animais e ao meio ambiente. Em 2013, Felipe Pohl de Souza, à época tesoureiro do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Paraná, em palestra aos alunos do primeiro ano de medicina veterinária da Unicentro de Guarapuava, explicou: O MAIS IMPORTANTE PARA UM ACADÊMICO É SABER O ESPAÇO QUE ELE TERÁ NA SOCIEDADE E QUAIS AS COBRANÇAS QUE PODERÃO RECAIR SOBRE ELE NO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. A RESPONSABILIDADE DO MÉDICO VETERINÁRIO NAS ÁREAS ESPECÍFICAS DE ATUAÇÃO DELEGADAS PELA SOCIEDADE EXIGE QUE A REPRESENTAÇÃO SEJA BEM FEITA, NA INSPEÇÃO, CLÍNICA, DIREÇÃO DE HOSPITAIS VETERINÁRIOS, SANIDADE ANIMAL E SAÚDE PÚBLICA, POR EXEMPLO.” (FERRARINI, 2013) Pela fala de Felipe Pohl, percebemos que a responsabilidade do médico veterinário se ancora nas mais diversas áreas de sua atuação profissional. Ele deve agir buscando aprimorar continuamente seus conhecimentos, usando o melhor do progresso científico em benefício dos animais, do homem e do meio ambiente, conforme estabelece o art. 6º do Código de Ética (CFMV, 2016). ATIVIDADES DO MÉDICO VETERINÁRIO NO CONTEXTO DA ÉTICA Veremos, agora, algumas atribuições do médico veterinário e as respectivas resoluções que as relacionam a aspectos éticos. INSPEÇÃO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL A inspeção de produtos de origem animal (POA) é um serviço de responsabilidade de instituições públicas nas esferas municipal, estadual e federal. ÂMBITO FEDERAL A fiscalização está a cargo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e é realizada por médicos veterinários, por intermédio do Serviço de Inspeção Federal (SIF). A inspeção tem por finalidade verificar se as normas sanitárias vigentes estão sendo cumpridas, preservando assim a saúde pública, assegurando alimentos inócuos e a integridade dos produtos produzidos. ÂMBITO MUNICIPAL A fiscalização fica a cargo do Serviço de Inspeção Municipal (SIM), ligado às secretarias municipais de agricultura. ÂMBITO ESTADUAL A inspeção é da responsabilidade do Serviço de Inspeção Estadual (SIE), vinculado às secretarias estaduais da agricultura. O Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (RIISPOA), do MAPA, dá suporte legal a todos os serviços de fiscalização de POA. Há um novo regulamento desde 2017 – o Decreto n. 9.013/2017, que substituiu o anterior, de 1952 – com penas mais severas para as indústrias de processamento de POA que cometerem irregularidades na elaboração de seus produtos. Nos termos do art. 6º do RIISPOA (BRASIL, 2017), a inspeção e a fiscalização serão realizadas: I Nas propriedades rurais fornecedoras de matérias-primas destinadas à manipulação ou ao processamento de produtos de origem animal. II javascript:void(0) javascript:void(0) javascript:void(0) Nos estabelecimentos que recebam as diferentes espécies de animais previstas neste Decreto para abate ou industrialização. III Nos estabelecimentos que recebam o pescado e seus derivados para manipulação, distribuição ou industrialização. IV Nos estabelecimentos que produzam e recebam ovos e seus derivados para distribuição ou industrialização. V Nos estabelecimentos que recebam o leite e seus derivados para beneficiamento ou industrialização. VI Nos estabelecimentos que extraiam ou recebam produtos de abelhas e seus derivados para beneficiamento ou industrialização. VII Nos estabelecimentos que recebam, manipulem, armazenem, conservem, acondicionem ou expeçam matérias-primas e produtos de origem animal comestíveis e não comestíveis, procedentes de estabelecimentos registrados ou relacionados. VIII Nos portos, aeroportos, postos de fronteira, aduanas especiais e recintos especiais de despacho aduaneiro de exportação. Lembramos que, embora a inspeção seja feita pelo médico veterinário vinculado aos serviços de inspeção nos três níveis (federal, estadual e municipal), não podemos desconsiderar o trabalho realizado pelo médico veterinário como responsável técnico (ver Resolução CFMV n. 1.178/2017), já que os parâmetros de higiene e cuidados com os animais devem ser uma referência para todos esses profissionais, não importando onde atuem. RESPONSABILIDADE TÉCNICA DO MÉDICO VETERINÁRIO A responsabilidade técnica é a atividade que diz respeito ao exercício profissional voltado a assegurar ao consumidor a qualidade de produtos e serviços prestados pelos médicos veterinários. Está prevista na Lei n. 5.517/1968, que lista, em seu art. 5º, alínea “e”, a seguinte atividade: [...] DIREÇÃO TÉCNICA SANITÁRIA DOS ESTABELECIMENTOS INDUSTRIAIS E, SEMPRE QUE POSSÍVEL, DOS COMERCIAIS OU DE FINALIDADES RECREATIVAS, DESPORTIVAS OU DE PROTEÇÃO ONDE ESTEJAM, PERMANENTEMENTE, EM EXPOSIÇÃO, EM SERVIÇO OU PARA QUALQUER OUTRO FIM ANIMAIS OU PRODUTOS DE SUA ORIGEM. Lei n. 5.517/1968 E quanto à responsabilidade social? Sob a ótica da responsabilidade social, espera-se do médico veterinário que ele não apenas cumpra a lei, mas que tenha consciência de que sua atividade profissional é imprescindível para assegurar fundamentalmente: Que as pessoas tenham acesso a uma alimentação produzida dentro dos padrões internacionais de higiene, reforçando a ideia de inocuidade e segurança alimentar, pressupostos do direito à saúde. Que o bem-estar animal seja sempre preservado. Que a saúde pública seja preservada. EXERCÍCIO DA CLÍNICA MÉDICO-VETERINÁRIA A responsabilidade social do profissional que exerce a clínica médico-veterinária inspiracondutas que otimizam o bem-estar animal e que também se desdobram em questões de saúde coletiva. Cabe ao médico veterinário orientar os tutores sobre o manejo e a alimentação dos animais; sobre a higiene e melhores formas de convivência, vacinação, prevenção de zoonoses etc. Observe-se também que esses mesmos pressupostos devem ser considerados quando se trata da atividade de direção de hospitais médico-veterinários. EXEMPLO No exercício da atividade clínica, o atendimento a animais de estimação de pequeno porte deve ser realizado em estabelecimentos adequados, cujas condições para funcionamento estão previstas na Resolução CFMV n. 1.275/2019. Essa resolução se aplica aos ambulatórios, consultórios, clínicas e hospitais médico-veterinários. Observamos ainda que, caso a atividade clínica se organize em uma pessoa jurídica, a responsabilidade social se traduz em responsabilidade social/empresarial, orientando as empresas, ao exercerem seu objeto social, a levarem em conta não apenas o lucro, mas também uma gestão e práticas negociais, éticas e transparentes, assim como o respeito ao consumidor e à comunidade na qual está inserido. OBJETO SOCIAL Atividades para as quais a empresa foi criada para realizar, isto é: a sua finalidade. EXEMPLO Se pensarmos em um hospital veterinário, uma forma de exercício de reponsabilidade social/empresarial seria a promoção de uma campanha de sensibilização da comunidade para adoção de animais abandonados. javascript:void(0) PRÁTICA DA EUTANÁSIA A eutanásia é descrita como a indução da cessação da vida, por meio de método tecnicamente aceitável e cientificamente comprovado, realizado, assistido e/ou supervisionado por médico veterinário, para garantir ao animal uma morte sem dor e sem sofrimento, nos termos da Resolução CFMV n. 1.236, de 26 de outubro de 2018. Ela deve ser indicada, nos termos da Resolução CFMV n. 1.000, de 11 de maio de 2012, quando: O bem-estar do animal estiver comprometido de forma irreversível, sendo um meio de eliminar sua dor e/ou sofrimento, impossível de controlar por meio de analgésicos, sedativos ou de outros tratamentos. O animal constituir ameaça à saúde pública. O animal constituir risco à fauna nativa ou ao meio ambiente. O animal for objeto de ensino ou pesquisa. O tratamento representar custos incompatíveis com a atividade produtiva a que o animal se destina ou com os recursos financeiros do tutor. Dessa forma, considerando que os animais submetidos à eutanásia são seres sencientes e que os métodos aplicados precisam atender aos princípios de bem-estar animal, a eutanásia deve ser compreendida como um procedimento necessário, a ser empregado de forma científica e tecnicamente regulamentada, seguindo preceitos éticos específicos, nos termos da Resolução CFMV n. 1.000/2012, já mencionada. Para dar suporte consultivo aos interessados no tema, visto que várias são as espécies submetidas a esse procedimento, o CFMV, por meio da sua Comissão de Ética, Bioética e Bem-Estar Animal (CEBEA/CFMV) e consultores de reconhecido saber na área, elaborou, em 2012, o seguinte documento: GUIA BRASILEIRO DE BOAS PRÁTICAS EM EUTANÁSIA EM ANIMAIS Os princípios abordados nesse guia que visam garantir: elevado grau de respeito aos animais; ausência ou redução máxima de desconforto e dor; inconsciência imediata seguida de morte; ausência ou redução máxima do medo e da ansiedade; segurança e irreversibilidade; adequação para a espécie, idade e estado fisiológico do animal ou animais em questão; ausência ou mínimo impacto ambiental; ausência ou redução máxima de riscos aos presentes durante o ato; treinamento e habilitação dos responsáveis por executar o procedimento de eutanásia para agir de forma humanitária, sabendo reconhecer o sofrimento, grau de consciência e morte do animal; ausência ou redução máxima de impactos emocional e psicológico negativos, em operadores e observadores. O guia visa colaborar com detalhamentos que possam orientar, de forma consistente, os médicos veterinários e todas as pessoas envolvidas no processo da eutanásia em animais. Para tanto, foi realizada uma ampla consulta na legislação nacional e internacional, bem como na literatura científica, incluindo os guias já existentes, conhecidos como guidelines for euthanasia, utilizados mundialmente como embasamento científico para normatização do tema. OUTROS ASPECTOS CONSIDERADOS NA CONDUTA ÉTICA Além das atividades de inspeção de produtos animais, exercício da clínica veterinária e prática da eutanásia, devemos ainda mencionar que a responsabilidade social do médico veterinário também reverbera na produção animal, no que se refere à questão da extensão rural e ao respeito ao modo de vida das comunidades locais. Embora a produção animal e a extensão rural estejam bastante relacionadas com a zootecnia, conforme a Resolução n. 619, de 14 de dezembro de 1994, o médico veterinário tem uma contribuição significativa nessa área, também quando se fala da questão ambiental e da sustentabilidade no campo, como veremos adiante. É importante, ainda, mencionarmos o aspecto da sanidade animal em suas articulações com a responsabilidade social do médico veterinário. A sanidade animal deve ser compreendida como um valor que articule medidas de cuidado, proteção e prevenção e planejamento, voltados para a saúde animal. Há vários exemplos, no dia a dia do médico veterinário, que têm por finalidade a promoção da sanidade animal, vejamos: O art. 8º do Código de Ética do Médico Veterinário (CFMV, 2016) proíbe que o atendimento (clínico ou cirúrgico), a realização de procedimento ambulatorial e a prescrição sejam realizados em estabelecimento comercial ou em locais que estejam em desacordo com a legislação vigente. Também é vedado, pelo mesmo artigo, em seu inciso XXIII, prescrever ou administrar aos animais drogas que sejam proibidas por lei, drogas que possam causar danos à saúde animal ou humana e drogas que tenham o objetivo de aumentar ou de diminuir a capacidade física dos animais. A proteção do bem estar-animal, em linhas gerais, nos termos do Código de Ética do Médico Veterinário, proíbe a prática ou a permissão para que se pratiquem atos de crueldade para com os animais nas atividades de produção, de pesquisa, esportivas, culturais, artísticas ou de qualquer outra natureza. Além do Código de Ética, outras normas também tratam do bem-estar animal, tais como: RESOLUÇÃO CFMV N. 1.236/2018 Define e caracteriza crueldade, abuso e maus-tratos contra animais vertebrados. RESOLUÇÃO CFMV N. 879/2008 Dispõe sobre o uso de animais no ensino e na pesquisa e regulamenta as Comissões de Ética no Uso de Animais (CEUA) no âmbito da medicina veterinária e da zootecnia brasileiras. O bem-estar animal pode ser entendido como um valor ético em si mesmo, como uma obrigação voltada para o aperfeiçoamento ético e moral do ser humano e também numa dimensão ambiental, como abordaremos mais adiante. Sobre a saúde pública, em primeiro lugar, devemos registrar que a 8ª Conferência Nacional de Saúde concebeu a saúde como “direito de todos e dever do Estado” e ampliou a compreensão dos seguintes pontos: A relação saúde/doença como decorrência das condições de vida e trabalho. javascript:void(0) javascript:void(0) O acesso igualitário de todos aos serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde, colocando como uma das questões fundamentais a integralidade da atenção à saúde e a participação social. A amplitude dessa compreensão implica a adoção de ações interdisciplinares no âmbito da saúde. Por outro lado, o reconhecimento da imprescindibilidade das ações realizadas pelos diferentes profissionais de nível superior tem sido visto como um avanço no que tange à concepção de saúde e à integralidade da atenção. Nesse sentido, veja a resolução que inclui o médico veterinário na categoria de “profissional de saúde”, vinculando-o à saúde pública: RESOLUÇÃO MS N. 287/1998 Nessa resolução, o médico veterináriorecebe diversas atribuições: diagnóstico, controle e vigilância em zoonoses (a de maior destaque); estudos comparativos da epidemiologia de enfermidades não infecciosas dos animais em relação aos seres humanos; intercâmbio de informações entre a pesquisa médica veterinária e a pesquisa médica humana; estudo sobre substâncias tóxicas e venenos provenientes dos animais considerados peçonhentos; inspeção de alimentos e vigilância sanitária em algumas áreas que são exclusivas da profissão; estudo de problemas de saúde relacionados às indústrias de produção de alimentos de origem animal, incluindo o destino adequado de dejetos; supervisão da criação de animais de experimentação; estabelecimento de interligação e cooperação entre as organizações de saúde pública e veterinária com outras unidades relacionadas a animais; consulta técnica sobre assuntos de saúde humana relativos aos animais. PERSPECTIVA DA OMS QUANTO À SAÚDE PÚBLICA VETERINÁRIA Alguns conceitos precisam ser definidos em relação a esse tema e que têm por base a atuação da Organização Mundial da Saúde. Trata-se especificamente de saúde, saúde pública veterinária e saúde única. Observemos: SAÚDE Para a OMS o conceito de saúde ultrapassa a ausência da doença, precisando haver um estado de completo bem-estar físico, mental e social. SAÚDE PÚBLICA VETERINÁRIA O uso desse termo ocorreu pela primeira vez no ano de 1946, também no âmbito da OMS, e é aplicado para designar o marco conceitual e a estrutura de implementação das atividades de saúde pública que utilizam os recursos e conhecimentos da medicina veterinária na proteção e melhoria da saúde das pessoas, vinculando a agricultura, a saúde animal, a educação, o ambiente e a saúde humana. SAÚDE ÚNICA O conceito de “saúde única” (one health, em inglês) remete à interdependência entre a saúde humana, a dos demais seres vivos e a do meio ambiente. Tem por objetivo melhorar a qualidade de vida da comunidade, gerando benefícios para todos, aqui englobados os seres humanos, os animais e o meio ambiente, como já dito. javascript:void(0) javascript:void(0) javascript:void(0) Por fim, podemos concluir que a atuação do médico veterinário é central para que a sociedade possa se desenvolver em um ambiente adequado, formado pelo indissociável tripé: AMBIENTE SAUDÁVEL SAÚDE ANIMAL SAÚDE HUMANA A propósito, João Vieira de Almeida Neto, presidente do Conselho Regional de Medicina Veterinária de Mato Grosso do Sul (CRMV-MS), aponta que a importância da medicina veterinária nas questões de saúde pública consolidou-se por esse conceito de saúde única, que ambiente saudável, saúde animal e saúde humana têm de estar ligados e cuidados (ALMEIDA NETO, 2017). Como vimos, qualquer ação que possa impactar o bem comum deve estar orientada pelo vetor responsabilidade social. Desse modo, a saúde com seus aspectos sanitários, o controle da qualidade dos alimentos, o manejo dos animais que estão vinculados à indústria alimentícia, a promoção da saúde animal e humana, o bem-estar animal etc. são aspectos que motivam a reflexão de como o médico veterinário deve atuar em sua dimensão ética. E sob a perspectiva legal, o Código de Ética do Médico Veterinário se abre igualmente a uma leitura compromissada com a ideia de responsabilidade social, ao determinar que a conduta desse profissional esteja pautada pelos princípios da igualdade, da justiça, da saúde pública, dos animais e pelo bem-estar dos animais e respeito ao meio ambiente. A VISÃO DO MÉDICO VETERINÁRIO SOBRE A SUA RESPONSABILIDADE SOCIAL No vídeo a seguir, comentaremos sobre a visão do médico veterinário a respeito dos temas que abordamos. VERIFICANDO O APRENDIZADO MÓDULO 2 Descrever os principais aspectos que fundamentam a responsabilidade ambiental do médico veterinário A QUESTÃO AMBIENTAL Questões relacionadas ao meio ambiente têm mobilizado instituições governamentais nacionais e internacionais, a sociedade civil organizada, cidadãos, ativistas, cientistas e pesquisadores, que buscam compreender seus desafios e impasses, já que sua degradação impacta diretamente a qualidade de vida, não só dos seres humanos, mas de todos os seres vivos que habitam o planeta, gerando efeitos para as gerações futuras. Segundo a Organização das Nações Unidas, o meio ambiente é um conjunto de elementos físicos, biológicos, químicos e sociais que provocam efeitos diretos ou indiretos sobre os seres vivos. Foi após a Segunda Guerra Mundial, em 1945, que tomou corpo a ideia de “consciência ecológica”, com a edição da Carta das Nações Unidas, que criou a própria ONU. javascript:void(0) CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS Tratado fundamental dessa organização intergovernamental que estabelece o compromisso com a defesa dos direitos humanos dos cidadãos e um amplo conjunto de princípios relacionados à obtenção de "padrões de vida mais altos”. Ao longo das décadas, essa consciência ambiental foi sendo ampliada de tal modo que hoje há uma série de compromissos e agendas internacionais, com implicações diretas para os países, desdobrando-se muitas vezes em políticas públicas, programas de governo e ações da sociedade civil, que se voltam para a promoção da proteção do meio ambiente. Entre eles, podemos citar os seguintes: POLÍTICAS PÚBLICAS Medidas criadas pelos governos para garantir à população o acesso a direitos, assistência ou prestações de serviços previstos em lei. PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O MEIO AMBIENTE (PNUMA) Criado em 15 de dezembro de 1972 durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, sendo regido pela Carta da ONU, para coordenar as ações internacionais de proteção ao meio ambiente e de promoção do desenvolvimento sustentável. AGENDA 2030 E SEUS OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (ODS) A Agenda 2030, criada em setembro de 2015 por líderes mundiais que se reuniram na sede da ONU, corresponde a um plano de ação para erradicar a pobreza, proteger o planeta e garantir que as pessoas alcancem a paz e a prosperidade. Contém o conjunto de 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que são integrados e indivisíveis, e mesclam as dimensões econômica, social e ambiental do desenvolvimento sustentável. São como uma lista de tarefas a serem cumpridas pelos governos, a sociedade civil, o setor privado e todos os cidadãos. javascript:void(0) RESPONSABILIDADE AMBIENTAL NA MEDICINA VETERINÁRIA Situamos a questão do meio ambiente em termos mais gerais, mas como podemos compreender a responsabilidade ambiental na medicina veterinária? Vimos que a responsabilidade social pode ser entendida como um arcabouço ético, sugerindo que os indivíduos têm obrigação de trabalhar e cooperar com outros indivíduos e organizações em prol do bem comum. O bem comum está condicionado à existência de um meio ambiente saudável, sustentável e equilibrado – o que nos remete à ideia de responsabilidade ambiental na medicina veterinária. Tanto é que o próprio Código de Ética do Médico Veterinário (Resolução CFMV n. 1.138/2016) dedica um capítulo inteiro – o capítulo X – às relações do médico veterinário com o meio ambiente. A seguir, confira os incisos do texto do art. 18 do Código de Ética do Médico Veterinário (2016): I Conhecer a legislação de proteção aos animais, de preservação dos recursos naturais e do desenvolvimento sustentável, da biodiversidade e da melhoria da qualidade de vida. II Respeitar as necessidades fisiológicas, etológicas e ecológicas dos animais, não atentando contra suas funções vitais e impedindo que outros o façam. III Evitar agressão ao ambiente por meio de resíduos resultantes da exploração e da indústria animal que possam colocar em risco a saúde do animal e do homem. IV Usar os animais em práticas de ensino e experimentação científica, somente em casos justificáveis, que possam resultar em benefício da qualidade do ensino, da vida do animal e do homem, e apenas quando não houver alternativas cientificamente validadas. Podemos ainda ampliar a noção de responsabilidadeambiental do médico veterinário, a partir de três dimensões principais a serem consideradas no exercício de suas atribuições: javascript:void(0) javascript:void(0) javascript:void(0) javascript:void(0) PRIMEIRA DIMENSÃO A proteção ambiental SEGUNDA DIMENSÃO O bem-estar animal TERCEIRA DIMENSÃO A sustentabilidade A seguir, abordaremos cada uma dessas dimensões. PRIMEIRA DIMENSÃO: A PROTEÇÃO AMBIENTAL A preservação da saúde coletiva está diretamente relacionada à qualidade de vida das populações – o que pressupõe, minimamente, um meio ambiente saudável. ATENÇÃO Pensar em proteção ambiental é estratégico para assegurar a qualidade de vida necessária à manutenção da saúde, e essa proteção demanda algumas ações especificamente direcionadas, entre elas ações voltadas para a educação ambiental e para o estudo sobre a própria proteção ambiental. O médico veterinário pode ser um agente transformador, ao atuar como um elo multiplicador da educação ambiental. Motivar mudanças comportamentais – quer de indivíduos, quer da coletividade – que incorporem a concepção de que tudo o que fazemos ou faremos gerará um impacto no ambiente em que todos vivemos, pode ajudar a fortalecer a consciência ambiental. De maneira reflexiva, essa consciência reconhece a importância do desenvolvimento das pessoas e da sociedade, mas ao mesmo tempo entende que esse desenvolvimento deve estar compromissado com valores, ações e práticas de sustentabilidade ambiental. Sendo a proteção ambiental um tema transversal e interdisciplinar, o médico veterinário poderá trabalhar em conjunto com profissionais oriundos de outras áreas de formação, realizando pesquisas que articulem a proteção ambiental como seu principal objeto de investigação. Nessa dimensão protetiva, a contribuição do médico veterinário é, inegavelmente, inestimável. TEMA TRANSVERSAL Conjunto de saberes que não pertence especificamente a nenhuma disciplina, mas que atravessa todas as áreas de conhecimento, como se a todas fosse pertinente. SEGUNDA DIMENSÃO: O BEM-ESTAR ANIMAL O conceito de meio ambiente, como vimos, é bastante abrangente e, no que diz respeito aos animais, prioriza sua saúde e necessariamente pressupõe como requisito mínimo seu bem- estar. O bem-estar animal, por sua vez, nos termos da Resolução CFVM n. 1236, de 26 de outubro de 2018 (que é um dos principais instrumentos normativos sobre o tema), é um conceito que envolve aspectos fisiológicos, psicológicos, comportamentais e do ambiente sobre cada indivíduo, tomado também em uma dimensão ética. Assim, a responsabilidade ambiental do médico veterinário seria o princípio ético que inspira os cuidados e proteção ao bem-estar dos animais que não pode ser preservado se estes são sujeitos a atos de crueldade, abuso e maus-tratos, nos termos da legislação vigente. A temática do bem-estar animal, tamanha a sua importância, transcende inclusive os limites da disciplina deontológica da medicina veterinária. Vejamos a seguir leis e resoluções que disciplinam o tema: javascript:void(0) CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, ART. 225 A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu o art. 225, assegura que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. LEI N. 9.605, DE 12 DE FEVEREIRO DE 1998, ART. 32 Essa lei define como crime – sujeito à pena de detenção de três meses a um ano e multa – praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos. Também atribuiu aos Conselhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária o dever de fiscalizar o exercício da medicina veterinária e da zootecnia, bem como orientar, supervisionar e disciplinar as atividades dos profissionais, sempre com a finalidade de promover o bem-estar animal e em respeito aos direitos e interesses da sociedade. PENA DE DETENÇÃO Um dos tipos de pena previstas pela legislação brasileira para os crimes chamados de menor potencial ofensivo, por serem entendidos como de menor relevância. Daí essas condutas não estarem sujeitas, na hipótese de condenação judicial, à reclusão que é cumprida em presídios, em total restrição de liberdade. CFVM N. 1.236/2018, ART. 2º Essa resolução apresenta várias definições importantes para melhor compreendermos o escopo exigido na proteção ao bem-estar animal. Analisemos: a) maus-tratos são qualquer ato, direto ou indireto, comissivo ou omissivo, que intencionalmente ou por negligência, imperícia ou imprudência provoque dor ou sofrimento desnecessário aos animais; b) crueldade é qualquer ato intencional que provoque dor ou sofrimento desnecessário aos animais, bem como provocar-lhes maus-tratos continuamente e de modo intencional; c) abuso é qualquer ato intencional, comissivo ou omissivo, que implique o uso despropositado, indevido, excessivo, demasiado, incorreto de animais, causando prejuízos de ordem física e/ou psicológica, incluindo os atos caracterizados como abuso sexual. javascript:void(0) RESOLUÇÃO CFVM N. 1.236/2018 Essa resolução apresenta uma lista de condutas consideradas maus-tratos que devem ser evitadas, prevenidas e, se for o caso, reportadas pelo médico veterinário. Vejamos: I - executar procedimentos invasivos ou cirúrgicos sem os devidos cuidados anestésicos, analgésicos e higiênico-sanitários tecnicamente recomendados; II – permitir ou autorizar a realização de procedimentos anestésicos, analgésicos, invasivos, cirúrgicos ou injuriantes por pessoa sem qualificação técnica profissional; III – agredir fisicamente ou agir para causar dor, sofrimento ou dano ao animal; IV – abandonar animais; V – deixar de orientar o tutor ou responsável a buscar assistência médico-veterinária ou zootécnica quando necessária; VI – não adotar medidas atenuantes a animais que estão em situação de clausura junto com outros da mesma espécie, ou de espécies diferentes, que o aterrorizem ou o agridam fisicamente; VII – deixar de adotar medidas minimizadoras de desconforto e sofrimento para animais em situação de clausura isolada ou coletiva, inclusive nas situações transitórias de transporte, comercialização e exibição, enquanto responsável técnico ou equivalente; VIII – manter animal sem acesso adequado a água, alimentação e temperatura compatíveis com as suas necessidades e em local desprovido de ventilação e luminosidade adequadas, exceto por recomendação de médico veterinário ou zootecnista, respeitadas as respectivas áreas de atuação, observando-se critérios técnicos, princípios éticos e as normas vigentes para situações transitórias específicas, como transporte e comercialização; IX – manter animais de forma que não lhes seja permitido acesso a abrigo contra intempéries, salvo condição natural a que se sujeitaria; X - manter animais em número acima da capacidade de provimento de cuidados que lhes asseguraria boas condições de saúde e de bem-estar, exceto nas situações transitórias de transporte e comercialização; XI – manter animal em local desprovido das condições mínimas de higiene e asseio; XII – impedir a movimentação ou o descanso de animais; XIII – manter animais em condições ambientais que propiciem a proliferação de microrganismos nocivos; XIV – submeter ou obrigar animal a atividades excessivas que ameacem sua condição física e/ou psicológica, para dele obter esforços ou comportamentos que não se observariam senão sob coerção; XV – submeter animal, observada a espécie, a trabalho ou a esforço físico por mais de quatro horas ininterruptas sem que lhe sejam oferecidos água, alimento e descanso; XVI – utilizar animal enfermo, cego, extenuado, sem proteção apropriada ou em condições fisiológicas inadequadas para realização de serviços; XVII – transportar animal em desrespeito às recomendações técnicas de órgãos competentes de trânsito,ambiental ou de saúde animal ou em condições que causem sofrimento, dor e/ou lesões físicas; XVIII – adotar métodos não aprovados por autoridade competente ou sem embasamento técnico-científico para o abate de animais; XIX – mutilar animais, exceto quando houver indicação clínico-cirúrgica veterinária ou zootécnica; XX – executar medidas de depopulação por métodos não aprovados pelos órgãos ou entidades oficiais, como utilizar afogamento ou outras formas cruéis; DEPOPULAÇÃO Corresponde à ação de eliminar, de determinado local ou região, grande quantidade de indivíduos de determinada espécie, incluindo seres humanos. XXI – induzir a morte de animal utilizando método não aprovado ou não recomendado pelos órgãos ou entidades oficiais e sem profissional devidamente habilitado; XXII – utilizar métodos punitivos, baseados em dor ou sofrimento, com a finalidade de treinamento, exibição ou entretenimento; XXIII - utilizar agentes ou equipamentos que inflijam dor ou sofrimento com o intuito de induzir comportamentos desejados durante práticas esportivas, de entretenimento e de atividade laborativa, incluindo apresentações e eventos similares, exceto quando em situações de risco de morte para pessoas e/ou animais ou tolerados enquanto essas práticas forem legalmente permitidas; javascript:void(0) XXIV – submeter animal a eventos, ações publicitárias, filmagens, exposições e/ou produções artísticas e/ou culturais para os quais não tenham sido devidamente preparados física e emocionalmente ou de forma a prevenir ou evitar dor, estresse e/ou sofrimento; XXV – fazer uso e/ou permitir o uso de agentes químicos e/ou físicos para inibir a dor ou que possibilitem modificar o desempenho fisiológico para fins de participação em competição, exposições, entretenimento e/ou atividades laborativas; XXVI – forçar a alimentação do animal, exceto quando para fins de tratamento prescrito por médico veterinário; XXVII – estimular, manter, criar, incentivar, utilizar, em lutas, animais da mesma espécie ou de espécies diferentes; XXVIII – estimular, manter, criar, incentivar, adestrar, utilizar animais para a prática de abuso sexual; XXIX – realizar ou incentivar acasalamentos que tenham elevado risco de problemas congênitos e que afetem a saúde da prole e/ou da progenitora, ou que perpetuem problemas de saúde preexistentes dos progenitores. Ressalta-se que a eutanásia e o abate para fins de controle sanitário, especialmente de animais sinantrópicos, não são considerados maus-tratos, desde que seguidas as normas e recomendações técnicas vigentes para as referidas práticas. No que toca às manifestações culturais que envolvem a utilização de animais (tais como a vaquejada e o rodeio), o tema é bastante polêmico, sendo acusadas, por muitas associações de proteção aos animais, por atos de crueldade contra os animais. Entretanto, em 6 de junho de 2017, foi aprovada uma alteração na Constituição Federal (EC n. 96/2017) que acrescentou o parágrafo 7º ao art. 225 da Constituição para determinar que não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais, registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser regulamentadas por lei específica que assegure o bem-estar dos animais envolvidos. SINANTRÓPICOS Animais que se adaptaram a viver junto ao homem, a despeito da vontade deste, distinguindo- se dos animais domésticos e dos criados para produção de alimentos ou transporte. javascript:void(0) ATENÇÃO Nos termos da legislação em foco, em especial a Resolução CFVM n. 1.236/2018, é exigido que médico veterinário mantenha atenção permanente à possibilidade da ocorrência de crueldade, abuso e maus-tratos aos animais, cabendo-lhe (e ao zootecnista) o dever de prevenir e evitar esses atos, recomendando procedimentos de manejo, sistemas de produção, criação e manutenção alinhados com as necessidades fisiológicas, comportamentais, psicológicas e ambientais das espécies. Essas obrigações, ao serem rigorosamente observadas, colaboram para o fortalecimento da responsabilidade ambiental do médico veterinário, em prol de um meio ambiente adequado, saudável e equilibrado. TERCEIRA DIMENSÃO: A SUSTENTABILIDADE A sustentabilidade é um conceito relacionado à ideia de utilização de recursos de forma técnica, tornando seu uso viável economicamente e aceito socialmente, de maneira a conservá-los, sejam eles animais, vegetais, água ou solo. Assim se destaca a importância de que o desenvolvimento deve se fazer de forma sustentável, ou seja, deve-se tentar reduzir ao máximo os impactos ambientais. O tema da sustentabilidade também abriga estudos sobre práticas sustentáveis na produção animal – campo de interseção entre a veterinária e a zootecnia –, pressupondo uma cooperação entre os profissionais dessas áreas, e que têm o bem-estar animal como um vetor para se pensar as melhores práticas de produção e manejo no campo. Este é, inclusive, um dos temas centrais discutidos pela Organização Mundial de Saúde Animal (OIE), que, em maio de 2017, publicou a chamada “Estratégia mundial do bem-estar animal”, incluindo diversas recomendações de proteção à saúde e ao bem-estar dos animais, que são a base da prosperidade econômica, do bem-estar social, do meio ambiente e das populações. Desse modo, o governo brasileiro, por intermédio do Mapa pela sua “Coordenação de boas práticas de bem-estar animal”, entende que conhecer e aplicar essas recomendações da OIE resguarda a agropecuária nacional, favorece a imagem dos produtores, gera credibilidade ao serviço veterinário e beneficia diretamente os animais. Nas últimas décadas, em virtude dos problemas observados no meio ambiente em função do desenvolvimento social e econômico, ficou clara a necessidade de se encontrar um bom termo para o problema, não abandonando o desenvolvimento econômico, mas também entendendo e pensando em como reduzir ao máximo os impactos causados no ambiente. Um dos importantes pontos associados à atuação do médico veterinário, nesse tema, diz respeito à agropecuária. Como articular a ideia de produção em larga escala com sustentabilidade e como o médico veterinário participa desse processo? O médico veterinário deve estar atento às questões ambientais, já que ele está em contato direto com o meio ambiente, os animais e seus habitats. Problemas como a destruição da fauna e da flora, contaminação dos recursos hídricos, erosão, uso de agrotóxicos e inseticidas, entre outros, são aqueles aos quais o médico veterinário deve estar atento. O professor e pesquisador Márcio Ricardo Costa dos Santos diz que o desempenho sustentável em medicina veterinária compreende um processo participativo que pode (ANIMAL BUSINESS, 2018): Propiciar a conscientização dos médicos veterinários envolvidos, com mudanças de atitudes na busca pela integração entre os diversos setores da sociedade, em sintonia com os preceitos da sustentabilidade, para a consolidação de uma cultura profissional de desenvolvimento e inovação biotecnológica. Assegurar junto aos estudantes, clientes e demais membros da comunidade próxima o exercício pleno da responsabilidade social, de acordo com a sua competência profissional. Contribuir para melhorar as relações humanas entre si, com os participantes da sociedade e com os animais, ao exercitar a ética, o bem-estar e seus hábitos em saúde, para a higiene pessoal e alimentar. Promover práticas interativas e discutir valores, com colegas, estudantes, clientes e público participante, para ensinar as novas formas e oportunidades de inserção em um mercado de qualidade, com a adoção de tecnologias apropriadas à gestão ambiental, seja no agronegócio como um todo, seja nas demais atividades rurais ou urbanas. Gerar dinheiro novo em posições qualificadas e bem remuneradas, através das consultorias e dos serviços especializados executados por médicos veterinários envolvidos com a gestão de negóciossustentáveis. Ainda é importante registrarmos que a responsabilidade social e a responsabilidade ambiental do médico veterinário não se confundem com sua responsabilidade civil. A responsabilidade civil é o conceito jurídico que trata do dever de reparação, mediante indenização em dinheiro, do dano físico ou moral que uma pessoa causou a outra. Assim, o foco da responsabilidade civil está no centro das relações entre o médico veterinário e o consumidor de seus serviços. Como é disposto no art. 17 do Código de Ética, o médico veterinário deve (CFMV, 2016): I Conhecer as normas que regulamentam a sua atividade. II Cumprir contratos. III Prestar seus serviços sem condicioná-los ao fornecimento de produtos ou serviço, exceto quando estritamente necessário para que a ação se complete. IV Agir sem se beneficiar da fraqueza, ignorância, saúde, idade ou condição social do consumidor para impor-lhe produto ou diferenciar a qualidade de serviços. Isso quer dizer que o médico veterinário é responsável diretamente pelos meios que utiliza, mas não pelo resultado, já que este não pode ser garantido. O PROFISSIONAL MÉDICO VETERINÁRIO E SUA RESPONSABILIDADE AMBIENTAL No vídeo a seguir, o especialista dá um depoimento sobre o profissional médico-veterinário e sua responsabilidade ambiental. VERIFICANDO O APRENDIZADO CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS Como vimos, direitos humanos e dignidade são os vetores finais das práticas profissionais do médico veterinário. Neste tema estudamos a responsabilidade social e a responsabilidade ambiental, que, no contexto, são dimensões éticas do exercício da medicina veterinária direcionadas para o fortalecimento do bem-estar social, do bem-estar dos animais e para a proteção do meio ambiente sustentável e equilibrado. Mostramos que a responsabilidade social – discutida a partir da inspeção de produtos de origem animal, do exercício da clínica médico- veterinária e da eutanásia – é um compromisso ético do médico veterinário. A responsabilidade ambiental foi abordada a partir de três dimensões: proteção ambiental, bem-estar animal e sustentabilidade. Aprendemos, por fim, que o profissional da medicina veterinária tem um papel fundamental na construção de uma sociedade compromissada com a promoção da vida e do desenvolvimento pleno de todos, animais e humanos. PODCAST No podcast a seguir, a especialista Cheryl Almada encerra o tema falando sobre a visão do médico veterinário atuante na clínica sobre a sua importância na responsabilidade social e ambiental. AVALIAÇÃO DO TEMA: REFERÊNCIAS ANIMAL BUSINESS. Entrevista com Márcio Ricardo Costa dos Santos. Sustentabilidade é novo campo para a medicina veterinária. Consultado em meio eletrônico em: 18 nov. 2020. BARRETO, V. Ética e direitos humanos: aporias preliminares. In: TORRES, Ricardo Lobo (Org.). Legitimação dos direitos humanos. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. BRASIL. Casa Civil. Lei n. 5.517 de 23 de outubro de 1968. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. BRASIL. Casa Civil. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Centro Gráfico, 1988. BRASIL. Casa Civil. Lei n. 9.605 de 12 de fevereiro de 1998. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. BRASIL. Conselho Nacional de Saúde. Resolução MS n. 287 de 8 de outubro de 1998. Consultado em meio eletrônico em: 22 nov. 2020. BRASIL. Secretaria-Geral. Decreto n. 9.013 de 29 de março de 2017. Consultado em meio eletrônico em: 22 nov. 2020. BRASIL. Casa Civil. Emenda Constitucional n. 96 de 6 de junho de 2017. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. CFMV. Resolução n. 619 de 14 de dezembro de 1994. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. CFMV. Resolução n. 879, de fevereiro de 2008. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. CFMV. Guia brasileiro de boas práticas em eutanásia em animais: conceitos e procedimentos recomendados. Brasília, 2012. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. CFMV. Resolução n. 1.000 de 11 de maio de 2012. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. CFMV. Resolução n. 1.138 de 16 de dezembro de 2016. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. CFMV. Resolução n. 1.178 de 17 de outubro de 2017. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. CFMV. Resolução n. 1.236 de 26 de outubro de 2018. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. CFMV. Resolução n. 1.275 de 25 de junho de 2019. Consultado em meio eletrônico em: 21 nov. 2020. DUARTE, F.D.L.L.; IORIO, R.M.I.F. Uma fundamentação suficiente para os Direitos Humanos. In: ANAIS DO XVII CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI. Brasília, DF, 2008. FERRARINI, A. M. A responsabilidade social do médico veterinário. In: CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA VETERINÁRIA – PR. Publicado em: 22 mar. 2013. MAGIOLI, C. A. O papel do médico veterinário na saúde pública. Animal Business Brasil. Consultado em meio eletrônico em: 18 nov. 2020. NINO, C. S. Ética y derechos humanos: um ensayo de fundamentación. 2. ed. 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L. da; IORIO FILHO, R. M.; SILVA, R. L. da. Direitos humanos. SESES: Rio de Janeiro, 2016. EXPLORE+ Para reforçar e ampliar seus conhecimentos a respeito do tema tratado aqui, pesquise estas indicações: Responsabilidade ética e civil do médico-veterinário no ambiente hospitalar, artigo publicado em 2016 na Revista de Educação Continuada em Medicina Veterinária e Zootecnia do CRMV-SP. Responsabilidade social, artigo de Clarissa Azevedo. Estratégia mundial de bem-estar animal, documento publicado pela OIE em maio de 2017. Importância e atribuições do médico veterinário na saúde coletiva, texto de Laiza Bonela Gomes, publicado de 2017. CONTEUDISTA Ronaldo Lucas da Silva CURRÍCULO LATTES javascript:void(0);
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