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Manual de C o n d u t a s O b s t é t r i ca s d o H o s p i t a l M a t e r n o I n fa n t i l d e B ra s í l i a Larissa Maciel Ribeiro Leonardo Ayres Coelho Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa 1ª Edição ISBN: 978-65-995783-0-4 Ano 2021 Apoio: Manual de Condutas Obstétricas do Hospital Materno Infantil de Brasília 1ª Edição Ano 2021 Larissa Maciel Ribeiro Leonardo Ayres Coelho Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Editores colaboradores Adriano Bueno Tavares Alexandre Pavan Garieri Lucila Nagata Zilma Eliane Ferreira Alves Manual de Condutas Obstétricas do Hospital Materno Infantil de Brasília Manual de Condutas Obstétricas do Hospital Materno Infantil de Brasília é uma publicação do Corpo Clínico e do Programa de Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil de Brasília. Os conceitos emitidos nos artigos são de inteira responsabilidade de seus autores. Não é permitida a reprodução parcial ou total de textos sem permissão expressa dos autores. Tiragem: 120 exemplares Editores / Editores Revisores Larissa Maciel Ribeiro Leonardo Ayres Coelho Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Fotos: Juliano Azevedo Endereço Editoria Programa de Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia Hospital Materno Infantil de Brasília Av. L2 Sul SGAS Quadra 608 Módulo A - Asa Sul, Brasília - DF, CEP: 70203-900 E-mail: acoelholeonardo@gmail.com Produção Editorial Luan Comunicação www.luancomunicacao.com.br Nossa vida é tão curta que não podemos deixar as oportunidades serem descartadas ou esquecidas. Assim, ao perceber a oportunidade de concretização deste ideal, pensei: “Agora é a hora... não deixarei passar”, e assim foi feito. Confesso que a energia e a empolgação dos residentes, especialmente do Leonardo Coelho e da Ellen Tieko, não me deixaram desanimar. Agradeço a Deus e a Nossa Senhora, sempre meu refúgio e fortaleza. Ao meu amado filho João Victor, que sempre me inspira e faz meus dias mais alegres e animados. À minha família, que sempre me auxilia e apoia. O desenvolvimento deste manual foi fruto de um trabalho em equipe. O nosso sucesso é o reflexo da determinação de cada um de nós!!! Agradeço a cada um do fundo do coração! Larissa Maciel Ribeiro Verba volant, scripta manent. Agradecemos aos autores colaboradores que sonharam junto conosco na produção desta obra, seria inviável se todos não tivéssemos a mesma dedicação e conexão. Agradecemos aos nossos pais, razão e eternos fomentadores do nosso projeto de ser e viver a medicina. Agradeço por fim à minha avó, Ivone, a melhor enfermeira do mundo e minha inspiração de vida. Leonardo Ayres Coelho Agradecemos aos nossos pais por terem nos presenteado com a vida e com a capacidade de sonhar. Incentivadores do estudo e da perseverança, estiveram ao nosso lado nesta bela jornada sinuosa. Alguns partiram precocemente, porém vivem em cada sorriso e em cada pensamento, eternamente iluminando nossos caminhos. Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa AGRADECIMENTOS O Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB), fundado em 1966, é conhecido pela excelência na formação de profissionais especialistas nas áreas de Ginecologia e Obstetrícia, Pediatria, Neonatologia e Cirurgia Pediátrica. O Programa de Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia do HMIB foi iniciado em 1967 com a formação de dois residentes por período e, ao longo desses 54 anos, foi se aprimorando e evoluindo nas questões de ensino e pesquisa, até que, em 2007, o HMIB foi oficialmente credenciado como Hospital de Ensino onde, atualmente, tem capacidade de formação de 24 residentes na área da Ginecologia e Obstetrícia e mais oito residentes de suas subespecialidades. O processo de ensino e aprendizagem perpassa a relação residente, preceptor e paciente, tornando-se cada vez mais humanizado, sem deixar de lado as questões técnicas baseadas nas evidências científicas atuais. Este manual representa o quão é perceptível o desejo de evolução pessoal e profissional por todos que fazem parte do corpo clínico que compõe este grande time. Marina da Silveira Araujo Diretora Geral do Hospital Materno Infantil de Brasília O Hospital Materno Infantil de Brasília é o hospital terciário da rede SES/DF em assistência obstétrica e caracteristicamente é especializado em atender os casos clínicos mais complexos da área, por isso surgiu uma necessidade natural de elaborar um compilado das principais condutas obstétricas. O Manual de Condutas Obstétricas do Hospital Materno Infantil de Brasília apresenta procedimentos operacionais padrão (POPs) dos principais temas de emergência obstétrica, que foram elaborados em um trabalho conjunto da equipe de médicos ginecologistas e obstetras e residentes do Programa de Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia do HMIB. O objetivo do Manual é padronizar as condutas médicas no atendimento do serviço de emergência obstétrica, expondo o conteúdo de forma objetiva e prática, baseado nas mais recentes evidências científicas. Esperamos que o Manual a seguir, que representa o trabalho sério, dedicado e entusiasmado da equipe do HMIB, possa proporcionar aos profissionais que o utilizarem a tomada de decisões clínicas de forma segura e embasada no que há de melhor em termos científicos, determinando assim o melhor atendimento para as mulheres usuárias do SUS. Andréia Regina da Silva Araujo Referência Técnica Assistencial da Unidade de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil de Brasília PREFÁCIO 9 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB AUTORES Adriano Bueno Tavares Graduado em Medicina pela Universidade de São Paulo (USP). Mestrado e Doutorado em Ginecologia e Obstetrícia pela USP. Pós-Doutorado em Ciências Reprodutivas - University of Utah (EUA). Coordenador de Ginecologia e Obstetrícia - SES/GDF (2011-2015). Consultor Nacional em Saúde da Mulher - Organização Pan-Americana de Saúde OPAS/ Organização Mundial da Saúde OMS (2015- 2016). Consultor em Saúde Sexual e Reprodutiva para Brasil, Honduras e Panamá pelo Departamento de Saúde Reprodutiva e Pesquisa da Organização Mundial da Saúde - OMS (2017-2018). Médico Ginecologista e Obstetra - HMIB - SES/ GDF. Preceptor PRM em Ginecologia e Obstetrícia - HMIB - SES/GDF. Professor e Pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências para Saúde - ESCS- FEPECS - SES/GDF. Alexandre Pavan Garieri Médico Ginecologista e Obstetra no Centro Obstétrico do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Graduado em Medicina e mestre em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, com especialização em Mastologia e Oncologia Ginecológica e Título de Especialista em GO - TEGO. Perito Médico Legista da Polícia Federal e bacharel em Direito pelo UNICEUB. Ana Luiza de Macêdo Sampaio Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília. Graduada em medicina pelo Centro Universitário de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí (UNINOVAFAPI). Ana Luíza Martins Meyer Barros Graduada em Medicina pela Universidade Federal de Uberlândia. Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia pelo Hospital Materno Infantil de Brasília (2018/2020). 1º Tenente Médica da Força Aérea Brasileira. Médica adjunta do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de Força Aérea de Brasília. 10 Ana Medeiros Farias da Mata Mestre pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciências para Saúde, da Escola Superior de Ciências da Saúde (FEPECS), da Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Pós- graduação Latu Sensu em Especialização em Gestão da Clínica do SUS pelo Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa (HSL/IEP). Membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) e da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD). Médica endocrinologista do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB), Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES/DF). Andréia Regina da Silva Araújo Médica Ginecologista eObstetra, RTA da Unidade de Ginecologia e Obstetrícia e da Unidade do Centro Obstétrico do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Graduada em Medicina pela Universidade de Brasília. Especialização em Mastologia e Oncologia Ginecológica na Universidade de Brasília. Andressa Luiza Costa Rodrigues de Paiva Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2018-2021); Graduada em Medicina pelo Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos em Araguaína-TO em 2015. Bruna Morena Messias de Lima Dias Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2020-2023). Graduada em Medicina em 2019 pela Universidade Católica de Brasília (UCB). Caio de Oliveira Reges Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2020-2023). Graduado em Medicina em 2019 pela Universidade Católica de Brasília (UCB). 11 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Carlos Alberto Castro Rubiano Graduado em Medicina pela Universidade de Brasília. Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília. Residência Médica em Gestação de Alto Risco e Medicina Fetal no Hospital Materno Infantil de Brasília. Título de especialista em ultrassonografia gineco-obstétrica pelo Colégio Brasileiro de Radiologia. Médico Gineco-Obstetra do Setor de Gestação de Alto Risco e Medicina Fetal do Hospital Materno Infantil de Brasília, DF. Médico ultrassonografista em Ginecologia e Obstetrícia, Medicina Fetal da Clínica de Imagens MEDCEU, Brasília - DF. Carolina Genaro Pultrin Médica Ginecologista e Obstetra no Centro Obstétrico do Hospital Materno Infantil de Brasília. Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro (UFTM) com especialização em ginecologia e obstetrícia pelo HMIB-DF, Título de Especialista em GO - TEGO. Desde 2010 fazendo parte do Setor de Alto Risco do HMIB. Daniela Vinhaes dos Reis Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia pelo Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Médica formada pela Universidade Católica de Brasília (UCB). Denise Gomes da Silva Graduação pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital de Clínicas de Porto Alegre e na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. Título de especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela FEBRASGO e em Mastologia pela SBM. Mestre em Ginecologia, Obstetrícia e Mastologia pela UNESP. Atuou como médica e plantonista do serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB) e como docente da Escola Superior de Ciências da Saúde, área de Saúde da Mulher. Ex-coordenadora da Comissão de Residência Médica e Supervisora do Programa de Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia do HMIB. 12 Edelaide Raquel Pilau Frazão Formada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Passo Fundo - Rio Grande do Sul. Residência médica em Ginecologia e Obstetrícia pela Santa Casa de Curitiba - PUC/ Paraná. Mestranda em Avaliação em Saúde na ENSP/FIOCRUZ. Médica ginecologista e obstetra do Hospital Materno Infantil de Brasília - Secretaria de Saúde- DF. Membro da Sociedade Brasileira de Menopausa e Climatério. Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Graduação em Medicina pelo Centro Universitário de Brasília, Brasília-DF. Bacharel em Enfermagem, Magna Cum Laude, pela Universidade de Connecticut, Storrs - CT, Estados Unidos. Felipe Teixeira de Mello Freitas Graduado em Medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais (1999 – 2005). Residência Médica em Infectologia pelo Instituto de Infectologia Emílio Ribas (2006 – 2009). Egresso do Programa de Treinamento em Epidemiologia Aplicada aos Serviços do SUS da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (2009 – 2011). Doutor em Medicina Tropical pela Universidade de Brasília (2013 – 2017). Médico Infectologista dos Serviços de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Materno Infantil de Brasília (2011 – atualmente) e da Maternidade Brasília (2015 – atualmente). Docente da Escola Superior de Ciências da Saúde, Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde (2018 – atualmente). Fernanda Helena Pereira dos Anjos Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Médica na Unidade de Terapia Intensiva Hospital Regional da Asa Norte, DF. Isabella Moreira Dias Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2020-2022). Graduação em Medicina pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). 13 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Jaqueline Santos Ribeiro Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno-Infantil de Brasília (HMIB) (2020 - 2022). Graduação em Medicina pela Universidade de Brasília. Jessica Lucena Wolff Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2019-2021). Graduada em Medicina pela Universidade de Brasília (UnB) com Graduação-Sanduíche em Medical Physiology na University of East London em Londres, Reino Unido. Pós-Graduanda em Ultrassonografia em Ginecologia e Obstetrícia no Nexus - Núcleo de Excelência em Ultrassonografia e Ensino Médico, Brasília. João Rocha Vilela Mestre em Ginecologia, Obstetrícia e Mastologia pela Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia. Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia (TEGO) Febrasgo. Título de Especialista em Ultrassonografia Geral e Membro Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia (CBR). Título de Especialista em Ultrassonografia Geral pela Sociedade Brasileira de Ultrassonografia (SBUS). Título de Especialista em Cirurgia Endoscópica - Febrasgo. Médico do Serviço de Reprodução Humana Assistida (SRH) Centro de Ensino e Pesquisa em Reprodução Assistida (CEPRA) do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Jordana Joab Alencar Barros Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno-Infantil de Brasília (2020 - 2022). Graduação em Medicina pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS). 14 Kelma Luana Abreu de Siqueira Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2019-2022). Graduada em Medicina pela Universidade Católica de Brasília (UCB). Lara Wanderley Paes Barbosa Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2018-2020). Graduação em Medicina pelo Instituto Master de Ensino Presidente Antônio Carlos (IMEPAC), Araguari, MG. Larissa Maciel Ribeiro Mestre em Ciências da Saúde pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS) da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SES/DF). Pós-Graduada em Ultrassonografia na área de Ginecologia e Obstetrícia pela Escola de Ultrassonografia Médica de Ribeirão Preto, SP. Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia, Endoscopia Ginecológica e Reprodução Assistida pela FEBRASGO. Fellow em Reprodução Assistida pela Genesis (Centro de Reprodução Assistida) em Brasília. Capacitação em Reprodução Assistida pela Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA). Supervisora do Programa de Residência Médica de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Médica do serviço de Reprodução Humana do HMIB. Leonardo Ayres Coelho Médico Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2019-2021). Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) com Graduação-Sanduíche em Biomedical Sciences na Cardiff Metropolitan University no País de Gales, Reino Unido. Médico da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SES/DF) na área de Medicina de Emergência e Médico Plantonista do Pronto-Socorroe da Sala Vermelha do Grupo Santa em Brasília, DF. 15 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Lígia Helena Ferreira Melo e Silva Mestre em Cirurgia pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Pós-Graduação em Biotecnologia pelo Instituto HZI, Alemanha. Título de Especialista em Ultrassonografia em Ginecologia e Obstetrícia pelo Colégio Brasileiro de Radiologia (CBR). Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia e Endoscopia Ginecológica pela FEBRASGO. Residência em Ginecologia e Obstetrícia pelo Hospital Regional da Asa Norte (HRAN). Graduada em Medicina pela Faculdade de Catanduva, SP. Lorena da Silva Rosa Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2020-2022). Graduação em Medicina pela Universidade de Brasília (UnB). Luciana Pinto Moraes Graduação em Medicina pela Universidade de Goiás. Especialização em Ginecologia e Obstetrícia pelo Hospital Regional da Asa Norte. Título de especialista em gineco obstetrícia (TEGO) e título de especialista em ultrassonografia gineco obstétrica e geral pela Sociedade Brasileira de Ultrassom e pelo Colégio Brasileiro de Radiologia. Lucila Nagata Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia pelo Hospital Regional da Asa Norte, Brasília/DF. Graduação em Medicina pela Universidade de Brasília (UnB). Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO. Membro da Comissão de Mortalidade Materna da FEBRASGO. Médica aposentada do Serviço de Gestação de Alto Risco do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Paula Faria de Campos Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (2020-2023). Graduada em Medicina em 1/2020 pela Universidade Católica de Brasília (UCB). 16 Maria Jocilda De Albuquerque Guimarães D’Oliveira Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia (TEGO) pela FEBRASGO. Preceptora do Programa de Residência Médica em Medicina Fetal e Alto Risco do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Preceptora do Curso de Graduação em Medicina da ESCS/FEPECS. Médica do Setor de Alto Risco do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Médica da Unidade de Ginecologia e Obstetrícia (UCOB) do HMIB. Maria Marta Neves de Oliveira Freire Mestre (Mestrado Acadêmico) pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciências da Saúde pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS/FEPECS), da Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES/DF). Residência Médica em Psiquiatria no Hospital São Vicente de Paulo pela FEPECS, SES/DF (2004-2006). Título de Especialista em Psiquiatria pela Associação Brasileira de Psiquiatria e Associação Médica Brasileira. Pós-graduação Lato Sensu em MBA Executivo em Saúde pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Graduação em Medicina pela Universidade de Brasília (2003). Preceptora do Internato em Saúde Mental do Curso de Medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS). Preceptora Colaboradora do Programa de Residência Médica de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Preceptora Colaboradora do Programa de Residência Médica de Psiquiatria do Instituto Hospital de Base (IHB). Vice-coordenadora do Grupo de Cuidados Paliativos Pediátricos do HMIB. Membro da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). Membro da Associação Brasileira de Estudos e Prevenção ao Suicídio (ABEPS). Membro da Associação Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Médica Psiquiatra do Serviço de Saúde Mental da Mulher do HMIB. Márcia Nóbrega de Queiroz Médica Gineco-Obstetra graduada pela Universidade de Brasília (UnB). Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia pela UnB. Médica da SES/DF. Título em Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO. MBA FGV em Gestão de Clínica e Hospitais. 17 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Paola Zilah Fleury Teixeira Zamora Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia pelo Hospital Regional de Taguatinga, DF. Médica Residente em Medicina Fetal e Gestação de Alto Risco pelo Hospital Materno Infantil de Brasília (2020). Graduada em Medicina pelo Centro Universitário de Anápolis, Goiás. Rachel Costa Vinhaes dos Reis Graduação em Medicina pela Universidade de Brasília (UnB). Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia pelo Hospital Regional da Asa Norte, DF. Estágio na Reprodução Humana do HMIB em 1998. Médica Gineco-obstetra da SES/DF desde 1991. Ricardo Barbosa Alves Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Especialista em Uroginecologia pelo Hospital Pérola Byington, SP. Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO. Médico Ginecologista/Obstetra e responsável pelo Setor de Uroginecologia e Cirurgia Vaginal do HMIB. Roberta Gava Tedesco Horta Residência Médica em Clínica Médica no Hospital Regional do Gama, SES/DF. Residência Médica em Hematologia no Hospital de Base do Distrito Federal, SES/DF. Graduação em Medicina pela Escola de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de Vitoria (EMESCAM). Hematologista/Hemoterapeuta do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Médica de hospitais DASA, Brasília/DF. Sâmia Luiza Sousa Paiva Médica Residente em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB), DF. Graduada em Medicina pela Universidade Atenas em Paracatu, MG. 18 Tatiane de Lima Takami Graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde do Distrito Federal (ESCS). Aperfeiçoamento em Uroginecologia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Aperfeiçoamento em Ginecologia Endócrina e Climatério pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Aperfeiçoamento em Patologia do Trato Genital Inferior e Colposcopia pelo Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Irmandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO. Médica Ginecologista e Obstetra do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Zilma Eliane Ferreira Alves Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia na Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG), Belo Horizonte. Título em Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO. Certificado de atuação na área de Ultrassonografia em Ginecologia e Obstetrícia: Colégio Brasileiro de Radiologia, FEBRASGO e Associação Médica Brasileira (AMIB). Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. Certificado de atuação na área de Medicina Fetal pela FEBRASGO e AMIB (2009). Médica Gineco-Obstetra do Setor de Gestação de Alto Risco e Medicina Fetal do Hospital Materno Infantil de Brasília, DF. Médica ultrassonografista em Ginecologia e Obstetrícia, Ecocardiografista Fetal e Medicina Fetal da Clínica de Imagens MEDCEU, Brasília - DF. 19 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Os editores e autores deste livro acreditam fortemente que a complexa prática da medicina, o desenvolvimento constante da ciência e a imprevisibilidade das condições patológicas bem como as respostas do corpo humano não podem ser rigidamente categorizados por qualquer documento escrito. Portanto, não é objetivo nem intenção de nosso livro servir como uma fonte impositiva, ou definir rigorosamente um padrão de cuidado sobre qualquer condição médica, plano de tratamento ou intervenção clínica. A medicina é uma área do conhecimento em constante evolução. Esta obra deve servir de apoio complementar à prática médica, não sendo ferramenta substitutiva da avaliação do julgamento clínico. Toda consulta e conduta médica deve ser individualizada. Construímos um livro baseado no que há de mais recente e considerado confiável na literatura científica mundial, bem como no conhecimento e na experiência adquirida e compartilhada por todos os editores e autores na criação da obra. O objetivo é fornecer de maneira didática e referenciada um guia clínico razoável, combinado comsugestões práticas de profissionais experientes e dedicados, em acordo com os padrões aceitos à época da publicação. Reiteramos que muitas das complicações e resultados adversos descritos associados à implementação ou à retenção de intervenções clínicas e cirúrgicas complexas podem ocorrer, mesmo quando todos os aspectos da prática estavam de acordo com o padrão esperado ou tenham sido realizados corretamente. Os protocolos de segurança devem ser seguidos, porém novas pesquisas e testes clínicos podem merecer análises e revisões, inclusive de regulação, normas técnicas e regras dos respectivos órgãos de classe, como código de ética. Os leitores, profissionais da saúde que se sirvam desta obra como apoio ao conhecimento, são aconselhados a conferir as informações fornecidas pelo fabricante de cada medicamento a ser administrado, verificando as condições de saúde do paciente, dose recomendada, o modo e a duração da administração, bem como as contraindicações e os efeitos adversos. Essa recomendação é particularmente importante em relação PALAVRA DO EDITOR 20 a medicamentos introduzidos recentemente no mercado farmacêutico ou raramente utilizados. As linhas de pesquisa ou de argumentação do autor, assim como suas opiniões, não são as da Editora. Do mesmo modo, foram empregados todos os esforços para garantir a proteção dos direitos dos autores envolvidos na obra, inclusive quanto às obras de terceiros e imagens e ilustrações aqui reproduzidas. Caso algum autor se sinta prejudicado, favor entrar em contato com a Editora. Finalmente, cabe orientar o leitor que a citação de passagens deste Manual com o objetivo de debate ou exemplificação para uso privado, sem intuito comercial e desde que não prejudique a normal exploração desta obra são, por um lado, permitidos pela Lei de Direitos Autorais, art. 46, inciso II e III. Por outro, a mesma Lei de Direitos Autorais, no art. 29, incisos I, VI e VII, proíbe a reprodução parcial ou integral desta obra, sem prévia autorização, para uso coletivo, bem como o compartilhamento indiscriminado de cópias não autorizadas, inclusive em grupos de grande audiência em redes sociais e aplicativos de mensagens instantâneas. Essa prática prejudica a normal exploração da obra pelo seu autor, ameaçando e desvalorizando a edição técnica e acadêmica de livros científicos e didáticos e a produção de novas obras. Leonardo A. Coelho Ana Luiza Martins Meyer Barros Jordana Joab Alencar Barros Lucila Nagata TRABALHO DE PARTO PREMATURO ASSISTÊNCIA AO TRABALHO DE PARTO AUTORES PALAVRA DO EDITOR 27 09 19 49 59 77 87 Denise Gomes da Silva Jéssica Lucena Wolff Rachel Costa Vinhaes dos Reis AVALIAÇÃO DA VITALIDADE FETAL Carlos Alberto Castro Rubiano Luciana Pinto Moraes Jaqueline Santos Ribeiro PARTOGRAMA E DISTOCIAS Lígia Helena Ferreira Melo e Silva Lorena da Silva Rosa João Rocha Vilela ANALGESIA NO TRABALHO DE PARTO Adriano Bueno Tavares Caio de Oliveira Reges Ana Luiza de Macedo 97MANEJO DA GESTAÇÃO PROLONGADA Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Paula Faria Campos Zilma Eliane Ferreira Alves SUMÁRIO 120 130 141 CRESCIMENTO INTRAUTERINO RESTRITO Daniela Vinhaes dos Reis Zilma Eliane Ferreira Alves Carolina Genaro Pultrin DIABETES NA GESTAÇÃO Ana Medeiros Farias da Mata Caio de Oliveira Reges Zilma Eliane Ferreira Alves SÍNDROMES HIPERTENSIVAS DA GRAVIDEZ Leonardo Ayres Coelho Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Lucila Nagata Maria Jocilda de Albuquerque Guimarães D’Oliveira DISTÚRBIOS TROMBOEMBÓLICOS DURANTE A GESTAÇÃO Carolina Genaro Pultrin Andressa Luiza Costa Rodrigues de Paiva Alexandre Pavan Garieri Isabella Moreira Dias Carolina Genaro Pultrin Lucila Nagata HEMORRAGIA PÓS-PARTO Paula Faria Campos Isabella Moreira Dias Adriano Bueno Tavares Leonardo Ayres Coelho Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Larissa Maciel Ribeiro 162HEMORRAGIAS DA SEGUNDA METADE DA GRAVIDEZ 173 193 108ROTURA PREMATURA DE MEMBRANAS OVULARES Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Ana Luíza Martins Meyer Barros Maria Jocilda de Albuquerque Guimarães D’Oliveira USO DE HEMOCOMPONENTES NA EMERGÊNCIA OBSTÉTRICA Bruna Morena Messias de Lima Dias Adriano Bueno Tavares Roberta Gava Tedesco Horta 202 212HIPERÊMESE GRAVÍDICA Edelaide Raquel Pilau Frazão Kelma Luana Abreu de Siqueira Tatiane de Lima Takami 223 246 232 262 254 ÓBITO FETAL Jaqueline Santos Ribeiro Alexandre Pavan Garieri Andréia Regina da Silva Araújo COLESTASE INTRA-HEPÁTICA DA GESTAÇÃO Zilma Eliane Ferreira Alves Maria Jocilda de Albuquerque Guimarães D’Oliveira Ana Luiza de Macêdo Sampaio CORIOAMNIONITE Larissa Maciel Ribeiro Lucila Nagata Lara Barbosa Márcia Nóbrega de Queiroz ENDOMETRITE PÓS-PARTO Larissa Maciel Ribeiro Lucila Nagata Lara Barbosa Márcia Nóbrega de Queiroz GESTAÇÃO INVIÁVEL Alexandre Pavan Garieri Luciana Pinto Moraes Paula Faria Campos DIAGNÓSTICO E MANEJO DAS INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO NA GESTAÇÃO E SUAS COMPLICAÇÕES Ricardo Barbosa Alves Alexandre Pavan Garieri Fernanda Helena Pereira dos Anjos Fernanda Helena Pereira dos Anjos Lígia Helena Ferreira Melo e Silva Paola Zilah Fleury Teixeira Zamora Leonardo Ayres Coelho Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa INFECÇÕES DO SÍTIO CIRÚRGICO Ricardo Barbosa Alves Felipe Teixeira de Mello Freitas Sâmia Luiza Sousa Paiva 319 297 308 SEPSE MATERNA GESTAÇÃO ECTÓPICA E GESTAÇÃO DE LOCALIZAÇÃO DESCONHECIDA João Rocha Vilela Marcelo de Oliveira Lima Filippo Bruna Morena Messias de Lima Dias Jordana Joab Alencar Barros Jean Pierre Barguil Brasileiro 284 MANEJO DA PARTURIENTE INFECTADA COM HIV Andréia Regina da Silva Araújo Jéssica Lucena Wolff Sâmia Luiza Sousa Paiva 335 Larissa Maciel Ribeiro Leonardo Ayres Coelho Lígia Helena Ferreira Melo e Silva Tatiane de Lima Takami 270ABDOME AGUDO NA MULHER SÍNDROME GRIPAL NA GESTAÇÃO Leonardo Ayres Coelho Adriano Bueno Tavares Larissa Maciel Ribeiro 342 360 373 386 VIOLÊNCIA SEXUAL Larissa Maciel Ribeiro Alexandre Pavan Garieri Natália Jardim de Carvalho Schettini Lorena da Silva Rosa EMERGÊNCIAS PSIQUIÁTRICAS NO CENTRO OBSTÉTRICO AGITAÇÃO PSICOMOTORA EM GESTANTES Maria Marta Neves de Oliveira Freire Leonardo Ayres Coelho Maria Marta Neves de Oliveira Freire Leonardo Ayres Coelho EMERGÊNCIAS PSIQUIÁTRICAS NO CENTRO OBSTÉTRICO MANEJO DO RISCO DE SUICÍDIO NO PERÍODO GESTACIONAL E PERINATAL 27 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB INTRODUÇÃO O trabalho de parto (TP) é um processo fisiológico que, juntamente com a gestação, compõe um dos períodos críticos do ciclo de vida da mulher.1 Mais do que apenas um fenômeno orgânico, constitui-se em um evento biopsicossocial, com implicações na saúde e bem-estar da mulher e do concepto, e com influência na sociedade como um todo.2 A assistência ao trabalho de parto, além de proteger a mãe e o concepto de complicações, mortalidade e morbidade por meio de cuidados e intervenções oportunas, tem como objetivo uma experiência positiva para as mulheres e suas famílias, preservando os direitos e a autonomia da parturiente, assistindo-a em ambiente acolhedor e respeitoso, em modelo assistencial centrado na parturiente e no concepto, e baseado em evidências científicas.2-4 A rotina de assistência aqui descrita se organiza em função da evolução temporal do processo fisiológico, ou seja, tendo como base as quatro fases clínicas do TP: primeiro período ou dilatação, dividido em fase latente e fase ativa; segundo período ou expulsão; terceiro período ou dequitação; e quarto período, correspondendo à primeira hora pós-parto. Essa rotina se destina à assistência da mulher em trabalho de parto de início espontâneo, com gestação de risco habitual (Anexo 1), a termo, com feto em situação longitudinal e apresentação cefálica fletida. Poderá ser utilizada com adaptações em outras circunstâncias em que a assistência ao TP ocorra. ASSISTÊNCIA AO TRABALHO DE PARTO Denise Gomes da Silva Jéssica Lucena Wolff Rachel Costa Vinhaes dos Reis 28 Tabela 1- Princípios da Assistência ao Trabalho de Parto PRINCÍPIOS DA ASSISTÊNCIA AO TRABALHO DE PARTO Entendimento do TP como processo fisiológico e período crítico do ciclo de vida da mulher, com componentes biopsicossociais. Modelo assistencial centrado na parturiente e no concepto. Respeito à autonomia e aos direitos da mulher e assistência em ambiente acolhedor e respeitoso. Proteção da parturiente e do concepto de complicações, morbidade e mortalidade e suas consequências. Assistência baseada em evidências científicas. Fonte: elaborado pelas autoras. 1. ASSISTÊNCIA AO PRIMEIRO PERÍODO DO TRABALHO DE PARTO Para utilização nesta rotina usaremos as seguintes definições: 5 • Fase latente do TP: Presença de contrações dolorosas, não necessariamente contínuas, acompanhadas de modificações cervicais, incluindo apagamento e dilatação < 4 cm. • Fase ativa do TP: Presença de contrações dolorosas e regulares, durante pelo menos 40 segundos, pelo menos 3 em 10 minutos, acompanhadas de dilatação cervical ≥ 4 cm. 1.1 INTERNAÇÃO As gestantes de risco habitual em fase ativa do TP deverão ser internadas, assim como todas as gestantes com bolsa rota, independentemente de estarem ou não em TP. 6 As parturientes que não preencherem critérios de fase ativa deverão receber apoio e ser aconselhadas a aguardar o início da fase ativa.6 Em geral, reavaliamos essas pacientes a cada 2 horas, não sendo obrigatória a realização de exame de toque em cada reavaliação.41 Essa conduta associou-se à menor utilização de ocitocina e analgesia e melhor avaliação pelas parturientes da experiência e do controle durante o TP, menor duração do período entre a internação e o nascimento, e 29 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB menor número de diagnósticos de retardo na evolução do TP,7 sem evidência de piora de apgar e/ou necessidade de ressuscitação neonatal.8 Situações de pacientes que apresentem retardo no início da fase ativa, ou seja, fase latente prolongada, não serão tratadas aqui. Desde as avaliações iniciais e durante toda a assistência, a parturiente e o acompanhante de sua escolha devem receber informações baseadas em evidências e devem ser incluídos na tomada de decisões de cada procedimento indicado pela equipe médica. A equipe de assistência deve verificar se a parturiente entende as orientações e repeti-las quantas vezes for preciso, usando os recursos que se fizerem necessários para a correta compreensão.6 Se a parturiente tiver um plano de parto, ele deverá ser lido e discutido o mais cedo possível após a internação, levando-se em consideração as condições para a implementação e possíveis limitações, buscando-se preservar a amplitude da autonomia da mulher.6 Na consulta inicial e na internação devem ser realizados anamnese e exame físico, com atenção à verificação da idade gestacional, avaliação do pré-natal, paridade e história dos partos anteriores, existência de fatores de risco, presença de movimentação fetal, perdas vaginais, contratilidade uterina e suas características. Se, por qualquer motivo, houver necessidade de transferência da parturiente, esta deve ser realizada de forma segura, orientando a mulher e seu acompanhante, e seguindo as recomendações e portarias vigentes.6 30 Fluxograma 1: Avaliação inicial no Pronto Atendimento Fonte: Elaborado pelos autores. 1.2 LOCAL DA ASSISTÊNCIA No HMIB, adotamos o uso da sala de PPP, em que a parturiente é assistida no Pré- parto, Parto e Pós-parto no mesmo ambiente e no mesmo leito. Essa medida, além de evitar deslocamento inapropriado e incômodo, contribui para a humanização do parto e simplificação da assistência.9,10 Separamos as gestantes de risco habitual e de alto risco nos setores de PPP de baixo e alto risco, respectivamente. Uma vez que a parturiente esteja em um PPP, este deve ser respeitado como seu espaço pessoal.6 31 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 1.3 EXAMES COMPLEMENTARES DE ROTINA Todos os exames do cartão de PN devem ser verificados. As parturientes de risco habitual que fizeram os exames rotineiros no terceiro trimestre com resultados normais não necessitam de outros exames de rotina, com exceção dos explicitados abaixo. As parturientes com complicações ou doenças intercorrentes devem ter solicitações de exames individualizados. Os testes rápidos de sífilis e HIV deverão ser solicitados para todas as parturientes, independentemente de testagem prévia no terceiro trimestre.11,12,13 Também serão solicitados tipagem sanguínea e fator RH, caso não constem no cartão de PN. O resultado da cultura de Streptococcus do grupo B deverá ser verificado para decisão quanto à profilaxia antibiótica durante o trabalho de parto.14 1.4 AVALIAÇÃO DO BEM-ESTAR MATERNO E DA EVOLUÇÃO DO TP É importante a observação do estado emocional da parturiente e a oferta de orientação, apoio e encorajamento, bem como avaliação quanto à necessidade de intervenção específica neste sentido. A frequência cardíaca materna deverá ser verificada a cada hora, e a pressão arterial e temperatura, a cada 4 horas.6 A periodicidade de avaliação da dinâmica uterina varia entre recomendações, tendo sido proposta sua realização a intervalos de 30 minutos a 1 hora.5,6 Observamos que não há evidência de efetividade do exame vaginal e que ele está associado ao desconforto das parturientes e a potenciais efeitos adversos, como a infecção puerperal.15 Metanálise realizada em 2013 concluiu que não havia evidências para apoiar ou rejeitar o uso de exame vaginal de rotina no TP e os autores expressaram surpresa que uma intervenção sem evidência de efetividade fosse tão amplamente utilizada.16 Assim, embora a frequência ideal de exames pélvicos não tenha sido adequadamente investigada em estudos randomizados de qualidade, o Ministério da Saúde (MS) do Brasil e a Organização Mundial da Saúde (OMS), em seus guias práticos, sugerem que a realização do exame a cada 4 horas é suficiente.4,6 Esse intervalo poderá ser menor caso haja efetiva preocupação quanto à evolução do TP, baseada em achados objetivos ou solicitação da parturiente.6 A avaliação da bacia obstétrica e do canal de parto através da pelvimetria clínica não deve ser realizada rotineiramente nos trabalhos de parto com evolução fisiológica, uma vez que se trata de exame doloroso e não há evidências de que sua realização contribua para a redução da morbidade materna e neonatal.4 32 Antes de realizar o exame de toque, é necessário explicar para a parturiente a necessidade de sua realização e estar seguro de sua autorização explícita. Deverá ser realizado com atenção ao conforto e à privacidade da parturiente. Também é necessário explicar os achados e o seu significado na evolução do TP.6 1.5 AVALIAÇÃO DO BEM-ESTAR FETAL A avaliação do bem-estar fetal poderá ser realizada através da ausculta intermitente nas pacientes classificadas como de risco habitual5,17 e nas quais os BCFs (Batimentos Cardíacos Fetais) se mantiverem dentro da normalidade. Em conformidade com a Febrasgo, a frequência cardíaca fetal (FCF) deve ser avaliada, pelo menos, a cada 30 minutos – antes, durante e 30 segundos após uma contração.41 A FCF será considerada normal de 110 bpm a 160 bpm.6 Se houver um aumento da frequência cardíaca fetal basal ou suspeita de desaceleração na ausculta intermitente, devemos estender o período de ausculta e realizá-la, por exemplo, após três contrações consecutivas, inicialmente.5 Também é importante considerar o quadro clínico, incluindo a posição e hidratação da mulher, a força e a frequência das contrações, e os fatores de risco maternos.5 Se uma linha de base crescente ou desacelerações forem confirmadas, recomenda-se realização de cardiotocografia (CTG).5 Se a cardiotocografia for tranquilizadora por um período contínuo de 20 minutos, poderemos retomar a ausculta intermitente.5 Se a CTG não tiver padrão tranquilizador, observações adicionais serão necessárias5(vide capítulo sobre Avaliação do Bem-Estar Fetal). 1.6 EVOLUÇÃO DO TP NO PRIMEIRO PERÍODO E PARTOGRAMA O partograma é realizado na fase ativa do TP, considerando uma linha de ação de 4 horas.6 Para considerações a respeito da normalidade da evolução da fase ativa, utilizaremos os seguintes parâmetros de duração:5, 6 • Primíparas: dura em média 8 horas e é pouco provável que dure mais que 18 horas; • Multíparas: dura em média 5 horas e é pouco provável que dure mais que 12 horas 33 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Na avaliação individual de cada gestante durante o TP, consideramos:5, 6 • Suspeita de atraso na evolução da fase ativa, quando a dilatação for inferior a 2 cm em 4 horas; • Confirmação de atraso na evolução da fase ativa, quando a dilatação for inferior a 1 cm em exame subsequente, após 2 horas, tendo sido ou não realizada a amniotomia. Em caso de suspeita ou confirmação de atraso na evolução da fase ativa, considerar:5 • Paridade. • Dilatação e mudanças cervicais. • Mudanças na intensidade, duração e frequência das contrações uterinas. • Altura e variedade de posição da apresentação. • Descida e rotação do polo cefálico.6 Observar, buscando otimizar a assistência:6 • A atitude da parturiente, se postura mais ativa ou não. • Estado emocional, o tipo de apoio e suporte físico e emocional. Conduta na suspeita de atraso na evolução:6 • Considerar a realização de amniotomia se as membranas estiverem íntegras. Explicar o procedimento e informar que o mesmo irá diminuir o trabalho de parto por cerca de 1 hora e pode aumentar a intensidade e dor das contrações. • Realizar um exame vaginal após 2 horas, tendo ou não sido realizada amniotomia. Se a dilatação for > 1 cm, retomar a rotina das avaliações a cada 4 horas. Se a dilatação for < 1 cm em 2h, considera-se que há atraso na evolução. Conduta na confirmação de atraso na evolução:6 • Se as membranas estiverem íntegras, aconselhar a mulher a ser submetida a uma amniotomia e repetir o exame vaginal 2 horas após. • Para todas as mulheres com confirmação do atraso, deve ser ofertado o uso de ocitocina. Demais indicações, dosagem e peculiaridades a respeito do uso de ocitocina devem ser confirmadas no capítulo específico deste manual (Gestação Prolongada). A parturiente deve ser informada que, após o uso de ocitocina e a ruptura das membranas, haverá aumento da frequência 34 e intensidade das contrações e diminuição do tempo para o parto, mas não influenciará no tipo de parto ou outros desfechos, sendo necessária a monitorização fetal contínua ou realizada com mais frequência.5 • Um novo exame vaginal deverá ser realizado 4 horas após o início da ocitocina.6 Se a dilatação cervical tiver progredido menos que 2 cm após 4 horas, deve-se proceder a uma nova avaliação cuidadosa e considerar o diagnóstico de falha de indução do parto.6 (Vide capítulo de Gestação Prolongada). Fluxograma 2: Evolução do primeiro período do TP Fonte: Elaborado pelos autores. 35 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 1.7 POSIÇÃO DA PARTURIENTE A deambulação e as posições verticalizadas no primeiro período reduzem a duração do TP, o risco de cesariana e a necessidade de anestesia peridural.18 Maior perda de sangue estimada (acima de 500 ml) foi também observada em posições verticalizadas, porém sem repercussões clínicas.28 Sugere-se orientação a respeito dos benefícios anteriormente descritos e decisão livre à parturiente sobre adotar a postura de sua preferência.5,6 1.8 DIETA E HIDRATAÇÃO Revisão sistemática concluiu que não há justificativa para restrição de líquidos ou alimentos sólidos em mulheres em trabalho de parto sem complicações.19 Com base nessas conclusões,5,6 prescrevemos para as parturientes de risco habitual uma dieta para trabalho de parto mínima em resíduos. Essa dieta é composta por refeições leves, sólidas, líquidas e pastosas, doces e salgadas, oferecidas em intervalos de 2h e 3h, enquanto a água é oferecida em livre demanda. Parturientes que por motivo definido inspirem preocupações quanto ao sucesso do parto vaginal poderão receber dieta líquida. 1.9 PRESENÇA DE ACOMPANHANTE E APOIO FÍSICO E EMOCIONAL CONTÍNUOS INTRAPARTO Todas as parturientes têm direito à presença de acompanhante de sua escolha durante o trabalho de parto, sem que isso exclua a presença de acompanhante de fora de sua rede social (doula), se for de seu desejo, estiver disponível e atender às normas institucionais. Uma mulher em TP não deve ser deixada sozinha, exceto por curtos períodos ou por sua solicitação.6 1.10 MEDIDAS DE CONTROLE DA DOR De extrema importância na assistência ao TP, as medidas para controle da dor, farmacológicas e não farmacológicas serão tratadas em capítulo separado neste manual (Métodos Analgésicos no Trabalho de Parto). 36 2. ASSISTÊNCIA AO SEGUNDO PERÍODO DO TRABALHO DE PARTO O segundo período do trabalho de parto ou período expulsivo tem início com a dilatação completa e pode ser dividido em duas fases:6, 20 • Fase inicial ou passiva: desde a dilatação completa do colo até o início dos esforços expulsivos maternos. • Fase ativa: dilatação completa do colo uterino com presença de esforços expulsivos maternos e até o nascimento do concepto. O diagnóstico da fase passiva do 2º período depende, portanto, da constatação da dilatação completa. O diagnóstico da fase ativa do 2º período pode ser feito ao se observar em uma parturiente com a dilatação completa, o início dos esforços expulsivos, desejo de defecar, aumento da secreção na vulva, surgimento de náuseas e vômitos,21, 22 aumento da frequência e da intensidade da contratilidade uterina e agitação da parturiente. O aparecimento desses sinais é um indicativo para a realização de toque vaginal. Além do diagnóstico da dilatação cervical, no exame de toque deverão ser observadas a apresentação, variedade de posição, altura da apresentação e presença de bossa e moldagem da cabeça fetal. O horário do início do 2º período deve ser anotado para o correto controle de sua duração. 2.1 AVALIAÇÃO DO BEM-ESTAR MATERNO E FETAL E DA EVOLUÇÃO DO SEGUNDO PERÍODO DO TP O bem-estar materno será assistido como no primeiro período, com exceção da PA, que deverá ser verificada a cada hora.1 Na avaliação da progressão do TP, a verificação da dinâmica uterina deverá ser realizada a cada 30 minutos e o toque vaginal oferecido a cada hora.5,6 A ausculta do BCF continuará sendo intermitente naquelas pacientes em que os BCFs estiverem dentro da normalidade,5 conforme já explicitado anteriormente, a cada 10 a 15min na fase passiva e a cada 5 a 10min na fase ativa do segundo período.23,24 Desacelerações temporárias da FCF até 100 bpm não estão necessariamente associadas a risco fetal, desde que ocorram durante os puxos e não persistam nos intervalos das contrações.25 37 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 2.2 EVOLUÇÃO DO TP NO SEGUNDO PERÍODO Duração do segundo período: A duração e o tempo máximo permitidos para o segundo período do trabalho de parto não estão claramente entendidos e são controversos.20 Não há uma definição de limite de duração a partir da qual ocorra piora dos desfechos maternos e fetais. Contudo, acredita-se que períodos expulsivos com duração superior a 3 horas em nulíparas (4 horas com anestesia neuroaxial) e 2 horas em multíparas (3 horas com anestesia neuroaxial) possam estar associados a um aumento na frequência de complicações maternas e neonatais.6,31,41,42 Na suspeição de prolongamento do segundo período, propor amniotomia se as membranas estiverem intactas.5,6 Tabela 2 - Duração Média do Segundo Período Duração Paridade Sem analgesia Com analgesia Mediana Percentil 95 Mediana Percentil 95 Nulíparas 36min 2h48min 1h6min 3h48min Multíparas 12min 1h18min 24min 2h Fonte: Zhang J, Landy HJ, Branch DW, et al. Contemporary patterns of spontaneous labor with normal neonatal outcomes. Obstet Gynecol., 2010. Descida da apresentação: No início do segundo período a apresentação encontra-se geralmente em plano zero ou acima. Comumente está mais alta nas multíparas, sendo a descida mais rápida neste grupo do que nas nulíparas.20 Se houver prolongamento do segundo período do trabalho de parto, ou se a parturiente estiver excessivamente estressada, promover medidas de apoio e encorajamento e avaliar a necessidade de analgesia/anestesia,6 além de outras medidas que se fizerem necessárias (Vide capítulo específico). 2.3 PUXOS MATERNOS Puxos espontâneos ou tardios são os preferidos.6 Os puxos precoces reduzem a 38 duração do período expulsivo, porém aumentam os riscos de parto instrumental e podem acarretar lesão do assoalho pélvico, esgotamento materno e queda na FCF.29 A parturiente deve ser orientada a se deixar guiar pelo próprio desejo e necessidade de fazer força e empurrar. O comando aos puxos e o estímulo à manobra de Valsalva são de resultado incerto, não devendo ser feitos rotineiramente, especialmente nas situações dentro dos limites fisiológicos. Sua utilização deve ser individualizada e decidida em acordo com a parturiente. No caso de puxos ineficazes ou por solicitação da mãe, deve-se oferecer estratégias na assistência ao parto como suporte, mudança de posição, esvaziamento da bexiga e encorajamento.5,29 2.4 EPISIOTOMIA O uso da episiotomia deve ser restrito, não havendo no momento evidências que justifiquem sua indicação nem definição de uma frequência aceitável para sua realização.4 As possíveis indicações são a necessidade de abreviar o segundo período do parto por suspeita de comprometimento fetal, distocia de ombro e parto operatório.30 Caso seja realizada, deverá ser precedida por explícita autorização materna e a indicação deve ser registrada. A preferência é pela incisão médio- lateral, direita ou esquerda, sempre sob anestesia perineal adequada.5,6 2.5 MEDIDAS DE PROTEÇÃO DO PERÍNEO A principal medida de proteção do períneo é a não realização de episiotomia de rotina. Tanto a técnica de “mãos sobre” (proteger o períneo e flexionar a cabeça fetal) quanto a técnica de “mãos prontas” (com as mãos sem tocar o períneo e a cabeça fetal, mas preparadas para tal) podem ser utilizadas para facilitar o parto espontâneo. Se a técnica de “mãos sobre” for utilizada, controlar a deflexão da cabeça e orientar a mulher para não empurrar nesse momento.6 Considerar a oferta de uso de compressas mornas no períneo,6 que podem melhorar o conforto e reduzir a frequência de lacerações.31 Massagem perineal não deve ser utilizada.6 2.6 MANOBRA DE KRISTELLER A manobra de Kristeller não deve ser realizada no segundo período do trabalho de parto.6,9 39 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Fluxograma 3: Assistência ao segundo período do TP. Fonte: Elaborado pelos autores. 3. ASSISTÊNCIA AO TERCEIRO E QUARTO PERÍODOS DO TRABALHO DE PARTO Neste período ocorre, além da dequitação da placenta, o primeiro contato entre a parturiente, agora mãe, com seu filho fora do ambiente uterino. É nesse momento que mãe e filho se conhecem, ou se reconhecem, e tem início uma das mais importantes relações humanas. Nesse momento também ocorre o início do aleitamento materno. É importante que a assistência e quaisquer procedimentos, portanto, sejam realizados com o cuidado de minimizar a separação entre mãe e filho,6 e a interferência nessa relação. A dequitação placentária ocorre em aproximadamente 90% dos partos nos primeiros 5 a 15 minutos,31 considerando-se normal uma duração de até 30 minutos.6 Uma das principais complicações deste período, e importante causa de mortalidade materna,32 é a hemorragia pós-parto (HPP). A HPP constitui tópico 40 de alta relevância e, portanto, possui capítulo próprio neste manual. Os principais objetivos da assistência obstétrica neste período são a redução do risco de HPP, a obtenção da dequitação completa da placenta,10 a reparação adequada de lesões de trajeto ou episiotomia, o favorecimento e proteção ao contato mãe-bebê e o estabelecimento do aleitamento materno imediato. 3.1 RECEPÇÃO DO RN, CONTATO PELE A PELE E ALEITAMENTO IMEDIATO O RN que estiver ativo e não necessitar de intervenção médica imediata deverá ser colocado sobre o abdômen ou tórax maternos, preferencialmente desnudos, com a face voltada para a mãe. Será secado e protegido da perda de calor no colo materno, sendo coberto por campo seco e, idealmente, aquecido. Esse contato deve ser mantido pelo menos durante a primeira hora de vida, se não houver necessidade de intervenções.33 O contato pele a pele precoce parece favorecer o início do aleitamento materno e seu prolongamento e a interação da mãe e do RN, além de reduzir o choro do RN, sem nenhum efeito negativo.34,35 Contraindicações ao aleitamento materno são pouco frequentes – as contraindicações absolutas no pós-parto imediato são mulheres que vivem com HIV12,36 ou com HTLV 1 e HTLV 2.36 3.2 LIGADURA DO CORDÃO UMBILICAL O clampeamento do cordão deve ser realizado entre 1min e 5min após o nascimento ou quando cessar a pulsação, a menos que haja necessidade de realização de manobras para reanimação do RN ou assistência à mãe que não possam ser conduzidas sem a ligadura do cordão.6 Esse período de preservação da circulação feto-placentária permite o aumento da passagem de sangue da placenta para o concepto, reduzindo o risco de anemia no RN.38 A ligadura do cordão deve ser realizada 2 a 4 cm além da parede abdominal do RN.33 3.3 ASSISTÊNCIA AO DESPRENDIMENTO DA PLACENTA: MANEJO ATIVO X MANEJO FISIOLÓGICO O manejo ativo é recomendado na assistência ao terceiro período do parto por estar associado ao menor risco de hemorragias acima de 500 ml e 1000 ml, menor risco de transfusão sanguínea e maior nível de hemoglobina pós-parto.39 41 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB O manejo ativo compõe-se de:6 • Administração de 10 UI de ocitocina, intramuscular, após o desprendimento da criança. • Ligadura do cordão. • Tração controlada do cordão após clampeamento. Na assistência à saída da placenta, sugerimos a realização de manobra de Jacob- Dublin, que consiste em leve tração da placenta e rotação das membranas.40 A placenta deve ser examinada clinicamente,33 procurando-se sinais de retenção placentária e anormalidades que devam ser investigadas, com solicitação de exame anatomopatológico, se necessário. 3.4 SUTURA DE LACERAÇÕES E EPISIOTOMIA O períneo deve ser avaliado cuidadosamente quanto à ocorrência de lacerações e sangramento das mesmas e da episiotomia, caso tenha sido realizada. Na avaliação das lacerações deve ser verificada sua extensão, classificação e existência de sangramento.6 Havendo necessidade de suturas, deve ser realizada a anestesia local (lidocaína 1% ou equivalente).6 Aconselhamos realizar as suturas necessárias após a saída da placenta. Com isso se evitaria uma eventual necessidade de remoção de pontos em caso de indicação de curagem. Entretanto, se for necessário abreviar a assistência, a sutura poderá ser realizada antes da dequitação, com critério. A sutura deve ser realizada preferencialmente em pontos contínuos (tanto para a camada de parede vaginal quanto para o músculo),6 por planos, por estar associada com menos dor no pós-parto imediato do que a sutura em pontos separados.46 Se as bordas da pele estiverem justapostas adequadamente, não é necessária a sutura deste plano.6 Entretanto, se houver necessidade de sutura da pele, utilizar uma técnica subcutânea contínua.6 O uso de material de sutura sintético absorvível (Vicryl ®) é preferível por provocar menos dor.6 Ao final da rafia de lesões, nos traumas de difícil abordagem ou lacerações de 3º e 4º graus deve-se realizar exame digital retal para identificar suturas inadvertidamente postas atravessando a mucosa retal que, nesse caso, deverão ser retiradas.6 42 3.5 AVALIAÇÃO FINAL DA GESTANTE:A hora seguinte à saída da placenta e das membranas é designada por alguns autores como “quarto período do trabalho de parto”. Neste período é mais comum a ocorrência de sangramento pós-parto, geralmente associado à atonia uterina. Em função desse risco, a paciente deve ser avaliada frequentemente.6 No HMIB esse período de observação mais intenso no pós-parto é de duas horas, durante as quais a paciente é mantida no centro obstétrico. Puérperas podem apresentar tremores de início 1 a 30min após o parto e podem durar de 2 a 60min.47 Realizar apenas aquecimento com cobertores como medida de conforto.47 A prescrição pós-parto no risco habitual compõe-se de dieta oral livre, analgésicos, sulfato ferroso e cuidados gerais. ANEXO 1 A assistência obstétrica é realizada por equipe multiprofissional, composta por profissionais da área médica (médicos obstetras, residentes de obstetrícia43 e internos sob supervisão) e da enfermagem (enfermeiros obstetras e residentes de enfermagem obstétrica).43 A definição do risco da paciente deve ser realizada na admissão para o trabalho de parto e sua reclassificação a cada quatro horas de trabalho de parto ativo ou na presença de intercorrências.43 No caso de pacientes classificadas como de risco não habitual, a assistência direta ao parto será realizada pela equipe médica.43 Variações serão aceitas em casos de exceção, de acordo com as condições do plantão e em concordância entre a equipe médica e de enfermagem. Tabela 1: Fatores relacionados à gestação de risco habitual PACIENTES COM RISCO HABITUAL FATORES DE AVALIAÇÃO MARCADORES Gestação atual43 Gestação Única Idade gestacional: entre 37 semanas completas e 41 semanas e 6 dias Número de partos: até 4 partos normais 43 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB FATORES DE AVALIAÇÃO MARCADORES Gestação atual43 Exames laboratoriais: realização dos exames nos 1º, 2º e 3º trimestres, com sorologias sem alterações Altura de fundo de útero entre os percentis 10 e 90 do gráfico de crescimento uterino de acordo com a idade gestacional Ausência de intercorrências obstétricas Trabalho de parto43 Início espontâneo do trabalho de parto Movimentação fetal ativa ou padrão tranquilizador da vitalidade fetal Apresentação cefálica BCF: entre 110 e 160 batimentos por minuto, com boa variabilidade (5 bpm-25 bpm), sem desacelerações à ausculta intermitente Contrações uterinas dentro dos padrões de normalidade e tônus uterino preservado Trabalho de parto espontâneo após rotura prematura de membranas ≤18h, com líquido amniótico claro e boa vitalidade fetal, em gestação a termo Trabalho de parto espontâneo de parturiente com uma cesárea anterior há dois anos ou mais Líquido amniótico claro e com grumos, quando presente Pressão arterial sistólica menor que 140 mmHg, pressão arterial diastólica menor que 90 mmHg Sangramento vaginal de leve intensidade correspondente à fase de dilatação cervical Período expulsivo com falha da dinâmica uterina e uso de ocitócito, desde que vigência de condições de normalidade para mãe e feto 44 Adaptado de: Secretaria de Saúde do Distrito Federal, 2019; EBSERH, 2019; Secretaria de Saúde do Piauí, 2019. 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Nunes, Vanessa & Gholitabar, Maryam & Sims, Jessica & Bewley, Susan. (2014). Intrapartum care of healthy women and their babies: Summary of updated NICE guidance. BMJ (Clinical research ed.). 349. g6886. 10.1136/bmj.g6886. 6. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde. Diretrizes nacionais de assistência ao parto normal: versão resumida [recurso Condições maternas44, 45 Ausência de: - Obesidade; - Qualquer patologia clínica que necessite de acompanhamento especializado; - Morte intrauterina ou perinatal em gestação anterior, principalmente se for de causa desconhecida; - História prévia de doença hipertensiva da gestação, com mau resultado obstétrico e/ou perinatal (interrupção prematura da gestação, morte fetal intrauterina, síndrome Hellp, eclâmpsia, internação da mãe em UTI). 45 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde. – Brasília : Ministério da Saúde, 2017. 7. Mcniven, Patricia & Williams, Jack & Hodnett, Ellen & Kaufman, Karyn & Hannah, Mary. (1998). An Early Labor Assessment Program: A Randomized, Controlled Trial. Birth (Berkeley, Calif.). 25. 5-10. 10.1046/j.1523-536x.1998.00005.x. 8. 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A prematuridade, apesar de todos os esforços na sua prevenção, persiste como a principal causa de mortalidade neonatal e a segunda causa em menores de 5 anos de idade, perdendo apenas para pneumonia, no mundo inteiro.33 A prevalência de partos prematuros é de 11,7% em relação a todos os partos realizados no país, percentual que coloca o Brasil no mesmo patamar de países de baixa renda, onde a prevalência é de 11,8%.4 Nos países de renda média, o percentual é de 9,4%.5 ETIOLOGIA A etiologia do parto prematuro espontâneo é desconhecida em cerca de 50% dos casos, mas pode estar associada a diversos fatores maternos e fetais que muitas vezes se sobrepõem:7 TRABALHO DE PARTO PREMATURO Ana Luiza Martins Meyer Barros Jordana Joab Alencar Barros Lucila Nagata 50 • Epidemiológicos: baixo nível socioeconômico, falta de higiene, gravidez nos extremos etários, desnutrição, dieta desequilibrada, tabagismo, baixo peso pré-gestacional, consumo de drogas ilícitas e estresse psicossocial. • Obstétricos: prematuridade em gestação anterior, rotura prematura de membranas, infecção amniótica, alterações hormonais, incompetência cervical, sangramentos genitais de segundo e terceiro trimestres, malformações fetais e placentárias, gemelaridade e polidrâmnio. • Ginecológicos: amputação do colo uterino, malformações uterinas e miomas, infecções geniturinárias e procedimentos cirúrgicos na gravidez. Pode-se dividir a prematuridade espontânea em duas categorias: o trabalho de parto prematuro com membranas intactas e o que se dá em consequência de rotura prematura das membranas, este representando cerca de 25% a 40% dos casos de prematuridade.8 As infecções que estão associadas com mais frequência à prematuridade são infecções periodontais; do trato urinário; cervicovaginais silenciosas, como a vaginose bacteriana e a presença de infecção por Trichomonas, Chlamydia, Candida.8 DIAGNÓSTICO Fala-se que existe Trabalho de Parto Pré-Termo (TPP) ao se identificarem contrações uterinas regulares (intervalo de 5 minutos ou menos) após 22 semanas e antes de 37 semanas, e pelo menos um dos seguintes critérios: dilatação cervical ≥ 2 cm; esvaecimento cervical ≥ 80%; ou progressão das alterações cervicais.9,10,11,19 Em serviços com disponibilidade de ultrassonografia (USG), outros critérios podem ser adotados, como contrações uterinas regulares associadas à medida de colo uterino < 20 mm na USG transvaginal.18 Observamos que os pródromos de trabalho de parto podem aparecer algumas horas antes do trabalho de parto prematuro e frequentemente são relatados os seguintes sinais e sintomas: dor semelhante às cólicas menstruais; contrações irregulares; dor lombar; pressão pélvica ou na vagina; mucorreia; e sangramento leve.18 Portanto, é importante realizar a anamnese e o exame físico cuidadosos (avaliar atividade uterina por meio da palpação abdominal; frequência, intensidade e duração das contrações; fazer ausculta e contagem de batimentos cardíacos fetais; exame especular e toque vaginal) para confirmar a presença das alterações 51 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB definidas acima.1 O diagnóstico é clínico, porém a propedêutica auxiliar pode ajudar na definição da causa ou mostrar informações capazes de prever complicações, deixando a equipe mais preparada para eventuais intercorrências.1 Os exames a serem solicitados são: hemograma, urina tipo I (EAS) e urocultura (para descartar a infecção do trato urinário assintomática como causa do TPP); pesquisa para estreptococo do grupo B (EGB), caso não tenha sido realizada nas últimas 5 semanas; ultrassonografia obstétrica, se disponível.1 Em situações de dúvida diagnóstica, pode-se utilizar o teste da fibronectina fetal que, por apresentar valor preditivo negativo elevado (acima de 90%), exclui os falsos trabalhos de parto, evitando as internações desnecessárias.10,11 Na presença de contrações uterinas regulares, porém sem ao menos um dos critérios diagnósticos anteriormente descritos, podemos estar diante de uma Ameaça de Parto Pré-Termo, ou o que alguns autores chamam de Útero Irritável.32 FATORES PREDITIVOS DE TRABALHO DE PARTO PREMATURO A medida do colo uterino pode ser realizada com 24 semanas de gestação, ou na ultrassonografia morfológica de segundo trimestre, para rastrear o risco de parto prematuro.12 Gestantes assintomáticas e com o colo uterino ≤ 25 mm possuem maior risco de parto prematuro.21,22 Essas pacientes se beneficiam da progesterona micronizada na dose de 200 mg via vaginal, à noite.12, 23 Pacientes sintomáticas, com dilatação cervical < 3 cm e a medida do colo uterino de 20 mm a < 30 mm podem ser submetidas ao teste de fibronectina, quando disponível, para estimar o risco de parto prematuro.18,20 Quando a fibronectina é negativa, há baixo risco de parto nos próximos 7 dias (apenas 5% evoluem para o parto).18, 20 Já as pacientes sintomáticas com a medida do colo uterino < 20 mm possuem alto risco para parto prematuro (> 25% dos casos em 7 dias) e não necessitam de testes adicionais.18,20 Similarmente, gestantes sintomáticas com o colo uterino ≥ 30 mm possuem baixo risco para parto (< 5 % dos casos em 7 dias) e também não necessitam de testes adicionais para estimar o risco.18,20 52 CONDUTA Indicamos a internação das pacientes diagnosticadas com trabalho de parto prematuro em fase ativa. A viabilidade fetal da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SES/DF) é de 24 semanas de idade gestacional.31 Assim, pacientes com idade gestacional entre 24 e 34 semanas deverão ser submetidas a tocólise, corticoterapia antenatal e profilaxia para estreptococo do grupo B.13 Se entre 34 e 37 semanas em fase ativa de trabalho de parto, as gestantes receberão assistência ao parto e, se indicado, profilaxia para estreptococo do grupo B.16 Gestantes de até 32 semanas deverão receber sulfato de magnésio para neuroproteção.13 As pacientes diagnosticadas em Ameaça de Parto Pré-Termo deverão ser mantidas, por 2h a 3h, em repouso e em observação no Centro Obstétrico – quando necessário, pode-se lançar mão de sedação com benzodiazepínico (ex.: Diazepam 5 mg/dia) por via oral.32 TOCOLÍTICOS O uso de tocolíticos está indicado para pacientes diagnosticadas com TPP entre 24 e 33 semanas e 6 dias. As medicações existentes são: inibidores da síntese de prostaglandinas, como a indometacina, e os antagonistas de receptores de ocitocina, como atosiban, porém, as únicas medicações disponíveis no nosso serviço são nifedipino, salbutamol e sulfato de magnésio.15 Observamos que a tocólise está contraindicada nos casos de morte fetal; sofrimento fetal agudo; pré-eclâmpsia com sinais de gravidade; eclâmpsia; hemorragia materna; corioamnionite; e ruptura prematura de membranas ovulares.26 Duração da tocólise: suspendemos os tocolíticos 48 horas após a administração da primeira dose de corticosteroide.27 A) Bloqueadores de canais de cálcio – nifedipino O nifedipino é a medicação de primeira escolha para tocólise e a duração do seu efeito é de até 6 horas.27 • Dose de ataque: 10 mg VO a cada 20 minutos, até 4 doses. Se após 2 doses mantiver contrações, considerar utilizar outro agente.1 53 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB • Dose de manutenção: 20 mg VO de 6 em 6 horaspor no máximo 72 horas.1 Efeitos adversos: rubor facial, cefaleia, tonturas, palpitações, hipotensão arterial.16 Contraindicações: hipotensão materna; uso concomitante com sulfato de magnésio (agem sinergicamente na supressão de contração muscular, podendo causar depressão respiratória; aumentam também o risco de hipocalcemia sintomática, hipotensão e supressão cardíaca).27,30 B) Agonista beta-adrenérgico – salbutamol: 6 • Solução de 5 mg (10 ampolas) em 500 ml de SG 5%. • Iniciar a 60 ml/h ou 20 gotas/min em bomba de infusão contínua. • Aumentar 20 gotas/min a cada 20 minutos até interrupção das contrações ou efeitos colaterais maternos indesejados (taquicardia > 120 batimentos por minuto, dor torácica, hipotensão). • Diminuir 20 gotas/min de 30min em 30min até menor dosagem efetiva para inibição das contrações e manter por 12 horas. Efeitos adversos: dor torácica, taquicardia materna/fetal, dispneia, mal estar, cefaleia, tontura, tremores, palpitações, hipocalemia, hiperglicemia, náusea/vômitos, obstrução nasal, edema agudo de pulmão.6,8 Contraindicações: diabetes mellitus descontrolada, doença cardíaca materna sensível à taquicardia.13 Cuidados: manter a frequência cardíaca materna inferior a 120 batimentos por minuto; vigiar edema agudo de pulmão (complicação mais frequente quando há hipervolemia materna como polidrâmnio, gestação gemelar ou infusão de grande quantidade de líquido – não ultrapassar dois litros em 24 horas).26 PÓS-TOCÓLISE O uso de progesterona após um episódio de ameaça de parto prematuro ou de trabalho de parto prematuro inibido é controverso. A maioria dos trabalhos não recomenda rotineiramente a suplementação de progesterona para tocólise de manutenção.21 Por outro lado, gestantes assintomáticas e com o colo uterino ≤ 25 mm ou com história de parto prematuro possuem maior risco de parto prematuro.21,22 Essas pacientes se beneficiam da progesterona micronizada na dose de 200 mg via vaginal, à noite.12, 21, 23 54 CORTICOIDES O uso de corticoide está indicado para pacientes entre 24 e 34 semanas com alta probabilidade de parto prematuro dentro de 7 dias: contrações regulares e alterações cervicais descritas acima; rotura prematura de membranas ovulares; doença materna grave que indique o parto.6,14,16,28 • 1ª escolha: betametasona 12 mg IM de 24h em 24h por 48h (2 doses). • Alternativa: dexametasona 6 mg IM de 12h em 12h por 48h (4 doses). Efeitos colaterais maternos: hiperglicemia temporária; leucocitose temporária nas primeiras 24h, com melhora em 3 dias, podendo ter desvio à esquerda.16,28 Efeitos colaterais fetais: melhora temporária no doppler da artéria umbilical; diminuição da variabilidade no batimento cardíaco fetal 2 a 3 dias após a administração.28 A máxima eficácia da terapia ocorre entre 2 e 7 dias da administração da primeira dose, apresentando queda após esses 7 dias, e a eficácia é parcial nas primeiras 24h após a administração da primeira dose.28, 29 Uma dose única de reforço pode ser considerada em mulheres com menos de 34 semanas de gestação, em risco de parto em menos de 7 dias, caso o primeiro ciclo de corticooide tenha ocorrido há mais de 14 dias. No entanto, o resgate pode ser fornecido até 7 dias após a dose anterior, se indicado pelo cenário clínico.13,28 Não há evidência consistente de que haja benefício em aumentar a dose do corticoide; basear a dose do corticoide no peso materno; diminuir o intervalo entre as doses ou utilizar outra via de administração no lugar da intramuscular.28 Pacientes que fazem uso crônico de hidrocortisona podem receber a dose habitual da betametasona ou da dexametasona como descrito acima, pois grande parte da hidrocortisona é metabolizada pelas enzimas placentárias.28 ANTIBIÓTICOS Os antibióticos devem ser utilizados como profilaxia da sepse neonatal pelo estreptococo do grupo B (GBS) em gestantes em trabalho de parto prematuro com risco iminente de parto: 6,14 • 1ª escolha: penicilina G cristalina 5 milhões de UI IV de ataque + manutenção com 2,5 milhões de UI IV de 4h em 4h até o parto. 55 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB • Esquema alternativo: ampicilina 2g EV de ataque + 1g EV de 4h em 4h. O antibiótico deve ser mantido até a inibição efetiva do trabalho de parto ou até o parto.6 A profilaxia antibiótica intraparto é mais eficaz se administrada pelo menos quatro horas antes do parto.34 SULFATO DE MAGNÉSIO O sulfato de magnésio deve ser utilizado como medida de neuroproteção fetal para mulheres em trabalho de parto prematuro com idade gestacional entre 24 e 31 semanas e 6 dias, pois reduz o risco e a severidade de paralisia cerebral em fetos nessa faixa etária gestacional.13,14 Não há evidências que suportem o uso dessa medicação como tocolítico.30 A dose administrada é a mesma utilizada para prevenção de eclâmpsia:30 • Ataque: 4 g de sulfato de magnésio em 20 minutos. • Manutenção: 1 g/h (deverá ser mantida por pelo menos 6h a 12h, pois ainda não se sabe o tempo necessário para conferir neuroproteção fetal).24 Se o parto não for mais iminente e não ocorrer em 24h, deve-se suspender a infusão, que é o tempo máximo de tratamento.24 • Retratamento: não recomendamos, pois há pouca evidência sobre seus efeitos na neuroproteção fetal.30 Contraindicações: miastenia gravis materna; defeitos de condução cardíaca materna, uso concomitante com nifedipina. Reações adversas são mais frequentes quando o sulfato de magnésio é administrado em conjunto com bloqueadores de canais de cálcio ou beta agonistas.30 Nesse caso, deve-se preferir o uso de indometacina como tocolítico em pacientes com < 32 semanas de gestação, porém esse medicamento não está disponível no nosso serviço no momento.30 CONSIDERAÇÕES FINAIS As gestantes submetidas a tocólise, após suspensão do fármaco tocolítico, deverão ter avaliação diária da dinâmica uterina, da movimentação e frequência cardíaca fetal, dos sinais vitais (temperatura, frequência cardíaca, pressão arterial) e avaliação dos exames solicitados.17 Ressaltamos que não há evidências de que a 56 manutenção da tocólise (mesmo que por via oral) até 34 semanas de gestação melhore os desfechos gestacionais.10 A conduta pós-inibição do TP é individualizada. Muitas vezes, após 24 horas sem contrações e com corticoterapia completa, as pacientes podem receber alta com orientação de mobilograma 2 vezes ao dia e retorno imediato ao hospital no caso de contrações rítmicas, perda de líquido ou sangue, ou diminuição na movimentação fetal.17 Orientamos que o seguimento pode ser realizado no pré- natal de risco habitual, a não ser que haja outras comorbidades que justifiquem o encaminhamento ao pré-natal de alto risco. Não há evidências convincentes de que o repouso, a hidratação ou sedação sejam eficazes para a prevenção ou tratamento do trabalho de parto prematuro. Além disso, o repouso prolongado aumenta o risco de eventos tromboembólicos.27 Se houver contraindicação à tocólise ou falha terapêutica, proceder o acompanhamento do trabalho de parto.17 Por ocasião do parto, manter a integridade das membranas (evitar amniotomia) e realizar vigilância rigorosa da vitalidade fetal (amnioscopia e cardiotocografia, quando indicadas).17 Nos casos de situação transversa, apresentação pélvica ou cefálica defletida, fetos com peso abaixo de 1.500 g ou pacientes com síndromes hemorrágicas, recomendamos o parto cesariana.10,11 REFERÊNCIAS 1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Trabalho de parto prematuro. In: Gestação de alto risco: manual técnico / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – 6. ed. – Brasília : Editora do Ministério da Saúde, 2012. 2. Rades E, Bittar RE, Zugaib M. 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Up To Date, 2021. 59 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB INTRODUÇÃO A avaliação da vitalidade fetal permite identificar fetos de risco para eventos adversos ou para o óbito e, assim, atuar preventivamente para evitar o insucesso da gestação.1 Os testes de vitalidade fetal são baseados na premissa de que o feto responde à hipoxemia com alterações biofísicas sequenciais de adaptação e, posteriormente, de descompensação,1,2 permitindo estimar o momento ideal para o parto.3 Todos os métodos apresentam vantagens, desvantagens e previsões diferentes.1 Desse modo, a literatura tem demonstrado que a utilização de uma única técnica não avalia suficientemente as condições da vitalidade fetal, sendo necessária a associação de várias metodologias de investigação.1 As situações de maior risco para o comprometimento da oxigenação fetal e que, por conseguinte, indicam uma monitorização fetal anteparto com maior frequência,4 estão dispostas na Tabela 1. Tabela 1 – Indicações para a Monitorização Fetal Anteparto INDICAÇÕES PARA MONITORIZAÇÃO FETAL ANTEPARTO Intercorrências Clínicas Intercorrências Obstétricas Intercorrências Fetais Síndromes hipertensivas Endocrinopatias Cardiopatias Pneumopatias Colagenoses Hemopatias Trombofilias Mau passado obstétrico Rotura prematura de membranas Gemelaridade Aloimunização Rh Placenta prévia Pós-termo Crescimento intrauterino restrito Oligo ou Polidrâmnio Infecções fetais Malformações fetais AVALIAÇÃO DA VITALIDADE FETAL Carlos Alberto Castro Rubiano Luciana Pinto Moraes Jaqueline Santos Ribeiro Fonte: Adaptado de ACOG, 2014; Signore, 2019. 60 TÉCNICAS DE MONITORAMENTO ANTEPARTO Observamos que apesar dos testes de vitalidade fetal possuírem baixos índices de falsos negativos, isto é, mortes fetais que ocorrem uma semana após um teste normal, o índice de falso positivo é elevado, portanto, um teste alterado deve ser avaliado com cautela.4 Tabela 2 - Técnicas de Monitoramento Fetal Anteparto TÉCNICA COMPONENTE RESULTADO Mobilograma - > 34 sem. - 5 - 6 movimentos em 1h - Inatividade fetal: < 6 movimentos fetais por hora em 2 horas consecutivas Cardiotocografia na ausência de contrações Aceleração: - ≥ 32 sem.: 15 bpm acima da linha de base por ≥ 15s - < 32 sem: 10 bpm acima da linha de base por ≥ 10s - Reativo: ≥ 2 acelerações em 20min (ou por 40min) - Não reativo: < 2 acelerações em 40 minutos Cardiotocografia na presença de contrações - Pelo menos 3 contrações de ≥ 40s em 10 minutos - Negativo: ausência de desacelerações tardias - Positivo: desacelerações tardias em ≥ 50% das contrações, mesmo se houver < 3 contrações em 10 minutos - Suspeito: desaceleração tardia intermitente ou desaceleraçõesvariáveis significativas - Equivocado devido à taquissistolia: desaceleração associada a contrações a cada 2 minutos ou que duram > 90s. - Insatisfatório: < 3 contrações em 10 minutos ou erro técnico no registro da CTG 61 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Perfil Biofísico Fetal Avaliação por 30 minutos (5 parâmetros): - Padrão reativo na CTG na ausência de contrações - ≥ 1 movimento respiratório fetal que dura ≥ 30s - ≥ 3 movimentos fetais discretos - ≥ 1 movimento fetal com extensão acentuada com retorno à flexão OU abertura e fechamento de uma mão - Medida vertical do Maior Bolsão > 2 cm Cada parâmetro recebe de 0 ou 2 pontos - Normal: ≥ 8 - Suspeito: 6 - Anormal: ≤ 4 Perfil Biofísico Fetal Modificado - CTG na ausência de contrações - Medida vertical do Maior Bolsão > 2 cm - Normal: CTG reativa e Maior Bolsão > 2 cm - Anormal: CTG não reativa e/ou Maior Bolsão ≤ 2 cm Dopplerfluxometria da artéria umbilical - Protocolo de Barcelona - IP > p95: ANORMAL – prejuízo da transferência de nutrientes e gases entre a placenta e o feto - Diástole zero ou reversa: maior morbimortalidade fetal Abreviaturas: sem (semanas); bpm (batimentos por minuto); CTG (cardiotocografia). Fonte: Adaptado de Signore, 2019; Ministério da Saúde, 2006; ACOG, 2014. A. MOBILOGRAMA É uma forma subjetiva de avaliar a movimentação fetal a partir da percepção materna.1 Apesar de o Ministério da Saúde recomendar, para as gestações de baixo risco, o registro diário de seis movimentos fetais em uma hora de observação a partir da 34ª semana,5 não existem evidências claras do limite abaixo do qual 62 ocorra maior risco de comprometimento fetal.1,6 Ademais, não há comprovação de que a avaliação quantitativa da movimentação fetal seja mais efetiva do que a avaliação qualitativa materna para identificar fetos com maior risco de eventos adversos.6 Observamos que a diminuição da movimentação fetal pode ser devido a sono fetal (ciclos de sono fetal duram até 40 minutos); medicamentos que atravessam a placenta; tabagismo materno.7 Além disso, a diminuição da percepção materna de movimento fetal pode ocorrer devido à alteração na quantidade de líquido amniótico; posição materna; posição fetal (coluna fetal posicionada anteriormente); placenta anterior.7 B. CARDIOTOCOGRAFIA ANTEPARTO A cardiotocografia é utilizada para avaliar a atividade cardíaca fetal e suas variações em função das contrações uterinas ou da movimentação fetal.4 Suas indicações são amplas, porém não são isentas de adversidades. Estudos indicam que o uso rotineiro em pacientes de baixo risco aumentam as taxas de intervenções médicas, como a cesariana.8 Os PARÂMETROS avaliados são:1,9,10,11,12 • LINHA DE BASE: é a frequência cardíaca fetal (FCF) média aproximada durante o exame. Pode-se ter uma variação de até 5 bpm. Para determiná- la, é necessário obter uma FCF basal por pelo menos 2 minutos em um registro de 10 minutos. • Normal: 110 bpm - 160 bpm. • Bradicardia fetal: linha de base < 110 bpm. • Bradicardia grave < 100 bpm. • Taquicardia fetal: linha de base > 160 bpm. 63 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 3 - Causas de Alterações no Batimento Cardíaco Fetal TAQUICARDIA FETAL BRADICARDIA FETAL Febre materna Analgesia peridural Infecção intra ou extrauterina Beta-agonistas (fenoterol, salbutamol) Bloqueadores parassimpáticos (atropina, escopolamina) Arritmias fetais (taquicardia supraventricular, fibrilação atrial) Hipertireoidismo Estímulo fetal Atividade motora intensa sem associação com patologias Hipotermia materna Hipotireoidismo Hipoglicemia Uso de betabloqueadores Gestações com > 42 semanas Arritmias fetais: bloqueio atrioventricular Fonte: Adaptado de Intrapartum fetal heart rate monitoring: Nomenclature, interpretation, and general management principles. ACOG, 2009. • VARIABILIDADE: é a amplitude de variação da FCF durante o exame. Normal: entre 6 bpm - 25 bpm. • Ausência de variabilidade: não é possível detectar variação na FCF. • Variabilidade mínima: ≤ 5 bpm. • Variabilidade moderada: entre 6 e 25 bpm. • Variabilidade aumentada: > 25 bpm. • ACELERAÇÕES TRANSITÓRIAS: trata-se da elevação transitória da FCF além da variabilidade normal esperada. Considera-se aceleração transitória da FCF um aumento de pelo menos 15 bpm por um período maior que 15 segundos e menor que 2 minutos. Se a idade gestacional for < 32 semanas, considera-se aceleração transitória quando há aumento súbito na FCF maior que 10 bpm por pelo menos 10s. • Reativo: ≥ 2 acelerações em 20min (ou por 40min). • Não reativo: < 2 acelerações em 40 minutos. 64 • DESACELERAÇÕES: trata-se da diminuição progressiva da FCF com duração de pelo menos 15s com queda de pelo menos 15 bpm. • Precoce: é quando o nadir da desaceleração coincide com o pico da contração; apresentam usualmente intervalo de pelo menos 30s entre a frequência da linha basal e o nadir da desaceleração; costumam ser superfi ciais e mantêm a variabilidade. Não indicam hipóxia/acidose fetal. Estão relacionadas à compressão do polo cefálico. Figura 1. Desaceleração precoce Fonte: Imagem elaborada pelo autor. • Espiculares / Em “V”: desaceleração mais comum do trabalho de parto com queda abrupta da FCF e intervalo entre o início e o nadir menor que 30s. Não são relacionadas às contrações, mantêm boa variabilidade, recuperação rápida da linha de base. Raramente estão associadas à hipóxia/ acidose fetal importante. Figura 2. Desacelerações espiculares. Fonte: Imagem elaborada pelo autor. 65 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB • Tardias / Em “U” ou com redução da variabilidade: apresentam intervalo de pelo menos 30s entre FCF basal e o seu nadir; ocorrem cerca de 20s após o início da contração, têm um nadir depois do pico da contração e retornam à FCF basal após a contração ter acabado. Indicam resposta de quimiorreceptores à hipoxemia fetal. Importante: em um traçado com baixa variabilidade e ausência de desacelerações, uma queda de 10 bpm - 15 bpm também pode ser considerada uma desaceleração tardia. Figura 3. Desaceleração tardia Fonte: Imagem elaborada pelo autor. • Prolongadas: desacelerações com duração maior que 3 minutos. Quando o traçado tem pouca variabilidade, FCF ≤ 80 bpm e a desaceleração dura mais que 5min, deve-se intervir imediatamente, pois indica hipóxia grave. Figura 4. Desaceleração prolongada Fonte: Imagem elaborada pelo autor. 66 • Padrão Sinusoidal: oscilações regulares em formato de sino, suaves, com variabilidade entre 5 bpm-15 bpm, em frequência de 2-5 por minuto e duração de 30 minutos. Está relacionada à anemia fetal, síndrome de transfusão feto-fetal, hemorragia materno-fetal, ruptura de vasa prévia, infecções, hipóxia fetal aguda, malformações cardíacas. Figura 5. Desaceleração padrão sinusoidal Fonte: Imagem elaborada pelo autor. • CONTRAÇÕES: deve-se registrar o tônus uterino por meio da parede abdominal a partir de um tocodinamômetro. Pode ter interferência quando está mal posicionado, com tensão inadequada, ou se a paciente for obesa. O registro do tônus uterino por meio de um tocodinamômetro externo não disponibiliza informações confi áveis acerca da intensidade e duração das contrações, apenas o ritmo.11 • MOVIMENTOS FETAIS: é um parâmetro subjetivo que se baseia na percepção materna de movimentos fetais durante o exame. A mãe registra cada movimento a partir do acionamento do botão. A cardiotocografi a anteparto não está indicada antes de 26 semanas de gestaçãopela imaturidade fi siológica do Sistema Nervoso Autônomo (SNA) e por inexistirem parâmetros de normalidade disponíveis para essa idade gestacional.13 67 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 4 - Interpretação e Conduta na Cardiotocografia CARDIOTOCOGRAFIA Parâmetros Normal (Categoria 1) Atípica ou indeterminada(Categoria 2) Anormal (Categoria 3) Linha de base 110 bpm-160 bpm 100 bpm - 110 bpm > 160 bpm por < 30 min Elevação da linha de base Bradicardia < 100 bpm Taquicardia > 160 bpm por 30 min Linha de base irregular Variabilidade 6 bpm a 25 bpm ≤5 bpm por < 40 min > 5 bpm por 40min a 80min ≤5 bpm por ≥ 80 min >= 25 bpm por > 10 min Padrão sinusoidal Desacelerações Nenhuma ou ocasional / variável, < 30s Desacelerações variáveis por 30s a 60s Desacelerações variáveis, > 60s Desacelerações tardias Acelerações (IG > 32 semanas) ≥ 2 acelerações ≥15 bpm por 15s em < 40 min ≤ 2 acelerações > 15s por 15 s em 40min-80 min ≤ 2 acelerações >15 bpm por 15s em > 80min Acelerações (IG < 32 semanas) > 2 acelerações ≥ 10 bpm por 10s em < 40 min ≤ 2 acelerações ≥10 cpm por 10s em 40min-80 min ≤ 2 acelerações ≥10 bpm por 10s em > 80min Conduta Nova avaliação segundo quadro clínico Nova avaliação necessária após correção de causas reversíveis URGÊNCIA: Avaliação completa com US e PBF. Alguns casos evoluirão para interrupção da gestação Abreviaturas: US (ultrassonografia); PBF (perfil biofísico fetal); bpm (batimentos por minuto); IG (Idade Gestacional). Fonte: Adaptada de Macones et al., 2008; Tratado de Obstetrícia da Febrasgo, 2019. 68 C. PERFIL BIOFÍSICO FETAL É um método de avaliação ultrassonográfico do bem-estar fetal em tempo real, no qual são observados cinco parâmetros:4 cardiotocografia na ausência de contrações; movimentos respiratórios fetais; movimentos fetais; tônus fetal; maior bolsão de líquido amniótico (MB) > 2 cm.4 A medida do maior bolsão vertical é a estimativa do volume de líquido amniótico por meio de medida vertical, livre de partes fetais ou cordão umbilical.4 Fundamenta-se na hipótese de que as variações biofísicas fetais refletem a integridade funcional do sistema nervoso central e, como tal, espelham o estado de oxigenação.4 Tabela 5. Parâmetros do Perfil Biofísico Fetal PERFIL BIOFÍSICO FETAL CARDIOTOCOGRAFIA Presença de acelerações transitórias 2 MOVIMENTOS RESPIRATÓ- RIOS 1 ou mais movimentos com 30s de duração 2 MOVIMENTOS CORPÓREOS 3 ou mais movimentos corpóreos discretos OU 1 amplo 2 TÔNUS FETAL Extensão de extremidades ou da coluna 2 LÍQUIDO AMNIÓTICO Maior bolsão com diâmetro vertical >= 2cm 2 TOTAL 10 Fonte: Tratado de Obstetrícia Febrasgo, 2019. Tabela 6. Interpretação do Perfil Biofísico Fetal INTERPRETAÇÃO DO PBF 10 ou 8 com MB normal ( ≥ 2 cm ) NORMAL - Baixo risco de asfixia aguda (1/1000 em uma semana). Conduta: conservadora. 8 com MB ANORMAL ( < 2 cm ) NORMAL - Baixo risco de asfixia aguda (89/1000 em uma semana). Conduta: resolução de acordo com a IG e a maturidade. 69 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 6 com MB NORMAL ( ≥ 2 cm ) SUSPEITO - Possível asfixia fetal aguda. Repetir teste com 6h. Interrupção da gestação se <6. 6 com MB ANORMAL ( < 2 cm ) SUSPEITO - Risco de asfixia fetal aguda (89/1000 dentro de uma semana). Conduta: interrupção da gestação quando o feto for maduro. Se não, avaliar doppler (conduta individualizada). 4 / 2 / 0 PROVÁVEL ASFIXIA FETAL (risco de asfixia fetal de 91 a 600/1000 dentro de uma semana). Conduta: interrupção da gestação na viabilidade fetal. Fonte: Tratado de Obstetrícia Febrasgo, 2019. D. DOPPLERFLUXOMETRIA É um método que efetua a mensuração das velocidades de fluxo em vasos da circulação materna e fetal (artérias uterinas, artéria umbilical, artéria cerebral média, ducto venoso e veia umbilical) promovendo informações a respeito do fluxo uteroplacentário e da resposta circulatória fetal a eventos fisiológicos e patológicos, propiciando, assim, uma análise das alterações hemodinâmicas que caracterizam a condição fetal.15 Observamos que a administração de corticoide pode causar uma melhora transitória nos parâmetros do Doppler da artéria umbilical. Essa melhora inicia com aproximadamente 8h da primeira dose e pode durar até 10 dias.16,17 Tabela 7. Fatores que alteram a análise do Doppler FATORES QUE ALTERAM A ANÁLISE DO DOPPLER Idade Gestacional Há mudanças dos índices fluxométricos com o avanço da gestação Frequência cardíaca fetal As alterações nos índices não são significativas com a FCF entre 110 bpm e 160 bpm 70 Local onde se obtém a amostra Índices da artéria umbilical são menores nas proximidades da inserção do cordão na placenta, quando comparados ao cordão próximo à inserção abdominal Movimentos respiratórios fetais Movimentos corpóreos fetais Corticoterapia Fonte: Nomura, Miyadahira, Zugaib, 2009. O índice utilizado para avaliação da vitalidade fetal é o Índice de Pulsatilidade (IP)15. Considerações importantes sobre a avaliação e conduta dos resultados dopplerfluxométricos: • A interpretação, conduta e acompanhamento materno fetal estão diretamente associados à idade gestacional e comorbidades maternas.15 • Uma relação cérebro-placentária (RCP) alterada tem sido associada a alterações de crescimento fetal, um risco aumentado de admissão em UTI Neonatal e Cesárea de urgência.21 Uma baixa RCP indica redistribuição de fluxo sanguíneo fetal (brain sparring), portanto evidências recentes sugerem que baixas RCPs foram relacionadas com moderada a alta acurácia preditiva de morte perinatal e aumento da probabilidade pré-teste de desfechos perinatais adversos, além de ser um bom preditor de parto cirúrgico devido a estado fetal não tranquilizador.22 A RCP parece ter um valor mais acurado em predição de desfechos adversos em fetos com alterações de crescimento quando utilizada em conjunto com o Doppler da Artéria Umbilical, contudo o valor numérico definido como alvo para predição de eventos adversos e o papel real do uso da RCP no manejo de gestações complicadas com alterações de crescimento fetal ainda requerem estudos para embasamento científico robusto e consistente que culmine em utilização na prática clínica e na definição de condutas.23 • Pela gravidade do comprometimento fetal, a interrupção imediata da gestação é recomendada nos casos de diástole zero acima de 34 semanas ou diástole reversa acima de 32 semanas. Abaixo disso, devemos avaliar cada caso, juntamente com a neonatologia, ponderando a conduta conservadora com vigilância diária do bem-estar fetal e a propedêutica disponível (corticoide, sulfato de magnésio para neuroproteção etc.).15 71 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB • Em gestações abaixo de 30/32 semanas, com grave insuficiência placentária e presença de alterações importantes na oxigenação fetal, é indicada a interrupção imediata da gestação, após corticoterapia, se valores de IP do Ducto Venoso estiverem acima do percentil 95.15 • Toda interrupção realizada no HMIB segue o protocolo de “Alterações do Crescimento Fetal” do Centre de Medicina Fetal i Neonatal de Barcelona - Hospital Sant Joan de Déu/Universitat de Barcelona,18 levando sempre em consideração as individualidades dos casos clínicos. Tabela 8. Índice de Pulsatilidade ÍNDICE DE PULSATILIDADE (IP) Vaso Análise Interpretação ARTÉRIAS UTERINAS Invasão trofoblástica (11/13 semanas e 22/24 semanas): predição do risco de pré- eclâmpsia, restrição de crescimento fetal e óbito perinatal Não é considerado método de avaliação fetal (6) ARTÉRIA UMBILICAL Desenvolvimento e crescimento fetal: a diminuição progressiva do fluxo diastólico nessas artérias representa avarias na vascularização dos vilos placentários. IP > p95: ANORMAL - prejuízo da transferência de nutrientes e gases entre a placenta e o feto Diástole zero ou reversa: maior morbimortalidade fetal ARTÉRIA CEREBRAL MÉDIA Centralização fetal: priorização da circulação de órgãos nobres IP < p5: ANORMAL - padrão ouro do doppler na predição de resultados não favoráveis navitalidade fetal 72 DUCTO VENOSO Aumento da pressão das câmaras cardíacas, alterações no território venoso do feto → fluxo retrógrado na veia cava inferior durante a contração atrial + redução no fluxo sanguíneo no ducto venoso, aumento dos valores do IP e alterações na onda A (que se refere a sístole atrial), se mostrando ausente ou reversa Quanto maior o IP, mais eventos neonatais adversos, maior disfunção miocárdica (aumento de troponina T cardíaca fetal). Onda A ausente ou reversa: risco de óbito iminente Índice principalmente usado em fetos com prematuridade extrema e já com comprometimento dos outros índices VEIA UMBILICAL Pulsações na veia umbilical com IG > 15 semanas em CIUR ou hipóxia fetal Disfunção cardíaca Fonte: Nomura, Miyadahira, Zugaib, 2009. MONITORAMENTO FETAL INTRAPARTO Ausculta cardíaca fetal intermitente: em conformidade com a Febrasgo, a frequência cardíaca fetal deve ser avaliada, pelo menos, a cada 30 minutos, antes, durante e 30 segundos após uma contração no primeiro período, e a cada 5min/15 min no segundo período do trabalho de parto.11,19 É importante avaliar a frequência cardíaca basal, a presença de acelerações ou desacelerações, além dos movimentos fetais. Em presença de desacelerações <100 bpm, a posição materna no leito deve ser avaliada, devido à possibilidade da compressão aortocava.11 IMPORTANTE: a monitorização dos batimentos cardíacos fetais deve fazer parte da rotina de toda a equipe envolvida nos cuidados da gestante. 73 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 9. Achados anormais durante a cardiotocografia ACHADOS ANORMAIS Linha de base Abaixo de 110 bpm ou acima de 160 bpm Desacelerações Presença de desacelerações repetitivas ou prolongadas (> 3 minutos) Contrações > 5 contrações em 10 minutos, em dois períodos sucessivos de 10 minutos, ou em média durante um período de 30 minutos. Fonte: Adaptado e traduzido de FIGO, 2015. Tabela 10. Medidas para melhorar a oxigenação fetal MANOBRAS DE REANIMAÇÃO INTRAPARTO Manejo Efeito Benefício Potencial Reposicionar a gestante em decúbito lateral esquerdo Evita compressão aorto-cava e melhora a perfusão uteroplacentária Alivia a compressão do cordão umbilical Reversão de desacelerações tardias, variáveis e prolongadas Suspensão de puxos maternos Diminui a compressão do polo cefálico Reversão de desacelerações precoces Suspensão da ocitocina e administração de uterolítico Reduz taquissistolia, melhorando a oxigenação fetal Reversão de desacelerações tardias, variáveis e prolongadas Tratamento da taquissistolia Administração de oxigênio para a mãe Aumento do aporte de oxigênio para o feto Melhora da oxigenação fetal (eficácia questionável) 74 Hidratação intravenosa Correção da hipovolemia materna Melhora da perfusão uteroplacentária Amnioinfusão Alivia a compressão do cordão Reversão de desacelerações variáveis e prolongadas Fonte: Tratado de Obstetrícia da FEBRASGO, 2018. • CARDIOTOCOGRAFIA INTRAPARTO • Indicações:11 todas e quaisquer situações que podem condicionar ou sugerir acidose e/ou hipóxia fetal, tais como comorbidades maternas, crescimento intrauterino restrito, ocasiões em que pode haver atividade uterina aumentada (indução do trabalho de parto, infecções), líquido amniótico meconial ou quando há alterações na ausculta fetal intermitente. CONSIDERAÇÕES FINAIS De maneira geral, na insuficiência placentária com hipóxia fetal progressiva há alterações biofísicas sequenciais de adaptação. Uma das primeiras alterações que podem ser observadas é a alteração no Doppler da artéria umbilical, seguida pelas anormalidades da frequência cardíaca fetal (FCF), detectadas pela cardiotocografia e, por último, pelos outros parâmetros do Perfil Biofísico Fetal (PBF)20. Além disso, outras alterações do Doppler surgem de forma progressiva: aorta, artéria cerebral média, ducto venoso e pulsação da veia umbilical.1,20 REFERÊNCIAS 1. Signore, C. Overview of antepartum fetal surveillance. Up To Date, 2019. 2. Martin CB Jr. Normal fetal physiology and behavior, and adaptive responses with hypoxemia. Semin Perinatol. Aug;32(4):239-42, 2008. 3. Melo ASO, Souza ASR, Amorim MMR. Avaliação biofísica fetal FEMINA, 2011. Acesso em 4 de nov de 2020. Disponível em: http://files.bvs.br/ upload/S/0100-7254/2011/v39n6/a2693.pdf. 75 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 4. American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG). Practice bulletin no. 145: antepartum fetal surveillance. Obstet Gynecol. 124(1):182, 2014. 5. Ministério da Saúde. Pré-Natal e puerpério, atenção qualificada e humanizada. 3ª ed. Brasil, 2006. 6. Flenady V, et al. Detection and management of decreased fetal movements in Australia and New Zealand: a survey of obstetric practice. Aust N Z J Obstet Gynaecol;49(4):358, 2009. 7. Fretts, RC. Decreased fetal movement: Diagnosis, evaluation, and management. Up To Date, 2020. 8. Nomura, RMY; Miyadahira, S; Zugaib, M. Avaliação da vitalidade fetal anteparto - Rev.Bras.Ginecol.Obstet - vol 31 - no 10 Rio de Janeiro - oct, 2009. 9. American College of Obstetricians and Gynecologists. Practice Bulletin Number 106. Intrapartum fetal heart rate monitoring: Nomenclature, interpretation, and general management principles. Obstet Gynecol. 2009;114:192-202. 10. Macones GA, Hankins GDV, Spong CY, Hauth J, Moore T. The 2008 National Institute of Child Health and Human Development Workshop Report on Electronic Fetal Monitoring. Update on Definitions, Interpretation, and Research Guidelines. Obstet Gynecol. 2008;112:661-6. 11. Ayres‐de‐Campos D, Spong CY, Chandraharan E. FIGO consensus guidelines on intrapartum fetal monitoring: Cardiotocography. International Journal of Gynecology & Obstetrics - Wiley Online Library, 2015. 12. Miller, D.A.Nonstress test and contraction stress test. Up to Date, 2019. 13. Fatorelli J, Carvalho PR. Cardiotocografia anteparto. In: Sá RAM, Oliveira CA. Hermó genes - Obstetrícia básica. Rio de Janeiro: Atheneu; 2015. 14. Febrasgo. Tratado de Obstetrícia Febrasgo. Rio de Janeiro ELSEVIER, 2019. 15. Nomura, RMY; Miyadahira, S; Zugaib, M. Avaliação da vitalidade fetal anteparto - Rev.Bras.Ginecol.Obstet - vol 31 - no 10 Rio de Janeiro. 2009. 16. Wallace EM, Baker LS. Effect of antenatal betamethasone administration on placental vascular resistance. Lancet. 353(9162):1404, 1999. 17. Robertson MC, et al. Predicting perinatal outcome through changes in umbilical artery Doppler studies after antenatal corticosteroids in the growth-restricted fetus. Obstet Gynecol.113(3):636, 2009. 18. Figueras F, et al. Defectos del crecimiento fetal. Centre de Medicina Fetal i Neonatal de Barcelona - Hospital Sant Joan de Déu/Universitat de Barcelona, 2019. 19. Silveira, SK. Trapani Júnior, A. Monitorização fetal intraparto. Febrasgo, 2018. 76 20. Comissão Nacional Especializada em ginecologia e obstetrícia: Perinatologia. Manual de Orientação em Perinatologia Febrasgo, 2010. 21. Khalil AA, Morales-Rosello J, Morlando M, Hannan H, Bhide A, Papageorghiou A, Thilaganathan B. Is fetal cerebroplacental ratio an independent predictor of intrapartum fetal compromise and neonatal unit admission? Am J Obstet Gynecol. 2015 Jul;213(1):54.e1-54.e10. doi: 10.1016/j.ajog.2014.10.024. Epub 2014 Oct 18. PMID: 25446667. 22. Conde-Agudelo A, Villar J, Kennedy SH, Papageorghiou AT. Predictive accuracy of cerebroplacental ratio for adverse perinatal and neurodevelopmental outcomes in suspected fetal growth restriction: systematic review and meta-analysis. Ultrasound Obstet Gynecol. 2018 Oct;52(4):430-441. doi: 10.1002/uog.19117 Epub 2018 Sep 5. PMID: 29920817. 77 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB INTRODUÇÃO Distocia é, por definição, a anormalidade no desenrolar do trabalhode parto. O nome origina-se da palavra grega dustokia, que significa “parto anormal, difícil”. Decorre de qualquer alteração em um ou mais fatores determinantes do processo: força, trajeto e objeto.1 De maneira didática, podemos definir esses fatores na chamada “Regra dos 3 Ps” sendo: P: passenger (objeto – feto) P: pressure (motor - útero) P: passage (trajeto) Tabela 1: Fatores Determinantes do Parto FATORES DETERMINANTES DO PARTO MOTOR (útero) Força motriz ou contratilidade uterina Distocia funcional Bradi ou Oligossistolia - percepção materna de que as contrações não são fortes à palpação e/ou pouco frequentes (< 2 contrações em 10 minutos) e/ou de curta duração (< 50 segundos)12,13 Taqui ou Polissistolia (> 5 contrações em 10 minutos)10 Segmento inferior hipertônico Esforço muscular expulsivo deficiente (prensa abdominal insuficiente) PARTOGRAMA E DISTOCIAS Lígia Helena Ferreira Melo e Silva Lorena da Silva Rosa João Rocha Vilela 78 OBJETO (feto) Distocia fetal Distocia de apresentação: occipito-posteriores persistentes, ântero-posteriores altas, cabeça alta e móvel, occipito transversa baixa, apresentação pélvica, apresentação córmica e deflexões de primeiro, segundo e terceiro graus. Distocia de volume: macrossomia fetal. Distocias de cordão: brevidade, nó verdadeiro, circular, procúbito, prolapso e inserção velamentosa. TRAJETO (bacia e partes moles) Distocia do trajeto Distocias ósseas: vícios de estreito superior, médio e inferior. Distocias de partes moles: edema de colo, estenoses cervicais por cirurgias prévias, câncer de colo uterino, miomas cervicais ou vaginais, septos vaginais, cistos vaginais e condilomas volumosos. Fonte: Distocias, Febrasgo – 2017. Cerca de 20% dos trabalhos de parto, com concepto vivo ao nascer, apresentam algum grau de dificuldade ou distocia no seu intercurso, sendo maior o risco em nulíparas com gestações a termo.9 Assim, sua importância é evidente por ser a causa de indicação da primeira cesárea em mais de 50% dos casos.10 A cesárea, por distocia, não deve ser realizada na fase latente do trabalho de parto.2 FATORES FAVORECEDORES DE DISTOCIA Tabela 2: Fatores que favorecem distocia Diagnóstico Incorreto do Trabalho de Parto Deve-se prestar especial atenção à internação da paciente primípara. 79 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Diagnóstico Incorreto do Trabalho de Parto Só devem ser internadas em fase ativa do trabalho de parto, ou seja: dilatação cervical mínima de 4 cm; apagamento cervical avançado e franca atividade uterina. Admissão Hospitalar Precoce Evitar a internação de pacientes com dilatação cervical menor que 3,0 cm. Este grupo de mulheres irá receber mais ocitócitos, analgésicos e peridurais, com consequente aumento de distocia e iatrogenia. Restrição no Leito A limitação da mobilidade da parturiente torna o trabalho de parto mais lento. A deambulação e posição vertical encurtam o trabalho de parto, sendo medidas tão efetivas quanto o uso de ocitócitos. Monitorização Eletrônica Fetal Contínua Por limitar a parturiente ao leito, aumenta a incidência de distocia e as taxas de cesárea. Analgesia Peridural Há evidências de associação com prolongamento do segundo estágio do parto, maior uso de ocitocina, fórceps e vácuo- extrator. Fonte: Adaptado de Protocolo Partograma PRO.MED-OBS, 2015. PARTOGRAMA E DISTOCIA O Partograma é uma representação gráfica do trabalho de parto que permite acompanhar sua evolução, documentar e diagnosticar alterações e indicar a necessidade de condutas apropriadas para a correção de desvios da normalidade, ajudando ainda a evitar intervenções desnecessárias, sendo uma ferramenta de excelência no diagnóstico das distocias.1 Apesar de ser uma excelente representação visual do trabalho de parto, o uso rotineiro do Partograma não demonstrou melhorar os desfechos obstétricos de forma significativa.14,15, 16 Salientamos que o Partograma pode ser utilizado, tão somente, quando a parturiente estiver na fase ativa do trabalho de parto (TP). Existem várias 80 definições para fase ativa do TP, entre elas: • American College of Obstetricians and Gynecologists – ACOG (2014): dilatação cervical de 6 cm deve ser considerada a dilatação inicial na fase ativa da maioria das mulheres em trabalho de parto.2 • Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS – Conitec (2016): trabalho de parto estabelecido quando dilatação cervical ≥ 4 cm de dilatação cervical.3 • Ministério da Saúde – MS (2017): trabalho de parto estabelecido quando dilatação cervical ≥ 4 cm e contrações regulares.4 • Organização Mundial da Saúde – OMS (2018): trabalho de parto estabelecido quando dilatação cervical ≥ 5 cm .5 No nosso serviço, tendemos a adotar como fase ativa do trabalho de parto as orientações do Ministério da Saúde. O parto é considerado disfuncional quando a curva da dilatação ultrapassa a Linha de Ação.8 Seguem alguns exemplos (Tabela 3): FASE LATENTE PROLONGADA Dilatação menor que 4 cm, apesar do tempo excessivo de contrações dolorosas e regulares, com o tempo maior que 20 horas em primíparas e 14 horas em multíparas. A fase latente prolongada não deve ser indicação de cesárea.2 FASE ATIVA PROLONGADA (FIGURA 1) Caracteriza-se por evolução da dilatação inferior a 1,0 cm/h no primeiro período do parto.9 A curva de dilatação ultrapassa a Linha de Alerta ou até mesmo a Linha de Ação. A principal causa é a hipocontratilidade ou a incoordenação das contrações:9 • Secundárias a distocias funcionais ou discinesias uterinas; • Corrigir com verticalização, deambulação, alteração de decúbito, e se necessário, ocitocina. 81 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB PARADA SECUNDÁRIA DA DILATAÇÃO (FIGURA 2) É diagnosticada pela dilatação mantida após dois toques sucessivos no intervalo de 2h na fase ativa da dilatação.9 Nesse tipo de distocia, a dilatação cervical permanece a mesma durante 2h ou mais, ultrapassa a linha de alerta e, por vezes, a linha de ação.8 Pode ser causada por desproporção céfalo- pélvica (DCP),9 distocia mecânica ou funcional com alteração da posição da apresentação ou macrossomia fetal. PARTO PRECIPITADO OU TAQUITÓCICO (FIGURA 3) O parto acontece em até 4h após o início do trabalho de parto.9, 13 Caracteriza-se pela curva de dilatação muito rápida e excessivo padrão de contrações, que é definido por mais de 5 contrações em 10 minutos ou uma contração durando mais de 120 segundos.11 Pode ser causado por distocia funcional como taquissistolia, hipersistolia ou hipertonia. Além disso, há maior risco para sofrimento fetal agudo e laceração de trajeto e tocotraumatismo. Como conduta, sugerimos a suspensão imediata da infusão de ocitocina, ou mudança de decúbito. PERÍODO PÉLVICO PROLONGADO (FIGURA 4) Descida da apresentação excessivamente lenta, apesar da dilatação completa.12 Normalmente relacionada com contratilidade uterina deficiente, por isso, sugerimos a amniotomia, mudança de decúbito, ou o uso de ocitocina.12 Outras causas descritas na literatura: macrossomia fetal, circular de cordão, ou cordão umbilical curto.12 PARADA SECUNDÁRIA DA DESCIDA (FIGURA 5) Diagnosticada por dois toques sucessivos com intervalo de 1h, desde que a dilatação do colo esteja completa.9, 13 Tem como principais causas: a distocia bacia, macrossomia fetal, DCP, distócia 82 mecânica, alteração da apresentação fetal:9, 13 • A DCP absoluta: não pode ser corrigida e está indicada a cesárea • DCP relativa: corrige com verticalização, deambulação e mudança de decúbito. Tabela 3: Definições de falhas de indução e distúrbios de parada Falha de indução do trabalho de parto Contrações inadequadas e ausência de mudança cervical após 24h de administração de ocitocina, com membranas rotas, se possívelParada de progressão do primeiro período ≥ 6 cm, com membranas rotas, sem mudança cervical por ≥ 4 h, com contrações adequadas, ou ≥ 6h, se contrações inadequadas Parada de progressão do segundo período Não progressão (descida ou rotação) por: ≥ 4h em nulíparas com epidural ≥3h em nulíparas sem epidural ≥ 3h em multíparas com epidural ≥ 2h em multíparas sem epidural Fonte: ALSO, 2016. 83 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB PARTOGRAMA - FIGURAS Figura 1 - Fase Ativa Prolongada Fonte: Elaborado pelos autores. Figura 2 - Parada Secundária de Dilatação Fonte: Elaborado pelos autores. 84 Figura 3 - Parto Precipitado ou Taquitócico Fonte: Elaborado pelos autores. Figura 4 - Período Pélvico Prolongado Fonte: Elaborado pelos autores. 85 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Figura 5 - Parada Secundária da Descida Fonte: Elaborado pelos autores. CONSIDERAÇÕES FINAIS Salientamos que todo o processo de assistência ao parto deve ser anotado claramente em cada campo do Partograma, inclusive as condições de parto, do recém-nascido, as condições de dequitação placentária e quaisquer intercorrências. O Partograma nos ajuda no reconhecimento precoce de possíveis complicações na evolução do trabalho de parto e também na condução segura. Sendo assim, é extremamente importante e necessário seu preenchimento correto. REFERÊNCIAS 1. MEAC / EBSERH. Protocolo Partograma PRO.MED-OBS.022, abril,2020. Disponível em: http://www2.ebserh.gov.br/documents/214336/5166523/PRO.MED-OBS.022+- +V3+PARTOGRAMA.pdf/9fa6fbb4-7106-4400-b1f2-96af181b6efd. 2. ACOG. Obstetric Care Consensus, Safe Prevention of the Primary Cesarian Delivery, march, 2014. 86 3. CONITEC. Diretriz Nacional de Assistência ao Parto Normal. Brasília, DF, 2016. 4. CURY, Alexandre Faisal; GARCIA, Sidney A. L. Estimativa do Peso Fetal: Comparação Entre um Método Clínico e a Ultra-Sonografia. Rev. Bras. Ginecol. Obstet., Rio de Janeiro, v. 20, n. 10, p. 551-555, Dec. 1998. Disponível em: . Acesso em: 21 nov. 2017. http://dx.doi.org/10.1590/S010072031998001000002. 4. Brasil. Ministério da Saúde. Diretrizes nacionais de assistência ao parto normal Ministério da Saúde, 2017. 51. 5. WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience. Geneva: World Health Organization; 2018. 6. Diretriz Nacional de Assistência ao Parto Normal: relatório. Brasília. Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, CONITEC; 2016. 7. Intrapartum care for healthy women and babies: Clinical guideline. London. National Institute for Health and Care Excellence (NICE); 2014. 8. Ministério da Saúde, FEBRASGO, ABENFO. Parto, Aborto e Puerpério - Assistência Humanizada à Mulher. Ministério da Saúde. 2001. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ publicacoes/cd04_13. pdf. 9. MEAC / EBSERH . Protocolo Partograma PRO.MED-OBS.008, março, 2015. Disponível em: http://www2.ebserh.gov.br/documents/214336/1109086/ Cap%C3%ADtulo-8-Dist%C3%B3cias.pdf/a60f55eb-6595-4ef5-9598- 7c5de6432113. 10. ZUGAIB, Marcelo; BITTAR, Roberto Eduardo. Protocolos Assistenciais: clínica obstétrica. [S.l: s.n.], 2003. 11. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Gestação de Alto Risco Manual Técnico, 5ª edição, p. 70-88, 2012. 12. Rezende, J. Montenegro, CAB. Obstetrícia fundamental. 13a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014. 13. The influence of uterine motility upon cervical dilatation in labor.Lindgren L Am J Obstet Gynecol. 1973;117(4):530. 14. Lavender T, Cuthbert A, Smyth RM . Effect of partograph use on outcomes for women in spontaneous labour at term and their babies. Cochrane Database Syst Rev. 2018;8:CD005461. Epub 2018 Aug 6. 15. Bonet M, Oladapo OT, Souza JP, Gülmezoglu AM . Diagnostic accuracy of the partograph alert and action lines to predict adverse birth outcomes: a systematic review. BJOG. 2019;126(13):1524. Epub 2019 Aug 18. 16. Ehsanipoor, RM; Satin, AJ. Normal and abnormal labor progression. Up To Date, 2021. 87 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB INTRODUÇÃO Sabe-se que a percepção da dor é individual, logo, o mesmo estímulo doloroso pode ser interpretado de diferentes formas, seja entre pessoas distintas ou até mesmo em ocasiões diferentes, pela mesma pessoa.¹ O receio pela dor do trabalho de parto é uma das justificativas que impedem muitas mulheres de optar pelo parto vaginal, o que contribui para o aumento de cesarianas em serviços privados.² Em um estudo coorte, de 2014, com 23.940 puérperas, foi avaliado qual a preferência inicial das gestantes pela via de parto.² Observou-se que 27,6% preferiram a cesariana inicialmente, e destas, 46,6% justificaram sua escolha pelo medo da dor do parto.² Dito isso, buscaremos apresentar medidas alternativas, não farmacológicas e farmacológicas, que possam ser utilizadas ao longo do trabalho de parto para trazer maior conforto e amenizar o sofrimento das parturientes. FISIOLOGIA DA DOR A dor no parto aumenta a ansiedade e o estresse maternos, o que acarreta aumento das catecolaminas circulantes.3 Esse aumento está associado à diminuição do fluxo sanguíneo uterino, incoordenação contrátil e a alterações cardiotocográficas. Além disso, há aumento do volume corrente e da frequência respiratória, causando hipocapnia e alcalose respiratória.3 Durante o parto, a dor origina-se em diferentes vias, dependendo da fase do trabalho de parto.3 No primeiro período, ou período de dilatação, a dor é gerada por estímulos nociceptivos a receptores existentes no colo uterino e no miométrio. Essa é uma dor visceral, do tipo cólica, que é difusamente percebida e sua via aferente alcança o SNC nos níveis de L1a T10.3 A partir de 3 cm a 4 cm, a dor torna-se mais intensa e atinge as fibras sacrais de S2 a S4.3 ANALGESIA NO TRABALHO DE PARTO Adriano Bueno Tavares Caio de Oliveira Reges Ana Luiza de Macedo 88 Já no período expulso a dor é, predominantemente, de origem somática e ocorre através da tração e da distensão do assoalho pélvico e do períneo. Esses estímulos aferentes são transportados especialmente pelo nervo pudendo até níveis de S2 a S4.12 Essa dor caracteriza-se por ser aguda e localizada.3 É importante mencionar que vários fatores interferem na percepção da dor, entre eles, ruptura de membranas amnióticas, número de partos anteriores, dilatação cervical, influências culturais e ambientais.4 MEDIDAS NÃO FARMACOLÓGICAS As medidas não farmacológicas não fazem a dor desaparecer, favorecem o controle pessoal sobre o trabalho de parto, reduzindo o sofrimento da parturiente e melhorando a sua capacidade de lidar com a dor. 5 ACOMPANHANTE Medidas simples, como o apoio contínuo no trabalho de parto e o controle ambiental, já trazem maior conforto e amenizam o receio deste processo.6 O apoio contínuo se refere à permanência de acompanhante junto à gestante no trabalho de parto e no parto, o que no Brasil é um direito garantido por lei.7 Durante o trabalho de parto, o acompanhante pode ajudar a mulher a lidar melhor com a dor e a ansiedade, além de melhorar a satisfação e os desfechos obstétricos, reduzindo a necessidade de analgesia intraparto e aumentando a probabilidade de um parto vaginal espontâneo. BOLA SUÍÇA Quando utilizada na posição sentada, ajuda a relaxar o assoalho pélvico, além de aplicar uma pressão no períneo que bloqueia parte dos sinais de nocicepção, reduzindo, dessa forma, a percepção de dor. 5, 8 HIDROTERAPIA Refere-se ao banho de imersão ou de aspersão. O contato com a água aquecida e o calor ajudam a liberar a tensão muscular e podem conferir uma sensação de 89 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB bem-estar. A água quente promove vasodilatação e redução das catecolaminas. O ideal é que esse estímulo seja adotado na fase ativa do trabalho de parto, sendo encorajada a permanecer enquanto estiver confortável.9 MASSAGEM É uma técnica simples, de baixo custo, que ajuda a aumentar a sensaçãode relaxamento e reduzir a dor.3 Apesar de os estudos ainda serem inconclusivos a respeito da melhor técnica de massagem, quando praticada pelo acompanhante aumenta o vínculo com a parturiente e contribui para sensação de participação no processo de nascimento.3, 5 ACUPUNTURA E ACUPRESSÃO Acupuntura envolve a colocação de agulhas em pontos específicos do corpo, já a acupressão envolve a pressão feita com os dedos nesses mesmos pontos.11 Os estudos relatam que, ao agulhar a pele, há liberação de várias substâncias, entre elas, os opioides endógenos, que têm efeito analgésico.11 São mais de 360 pontos de acupuntura existentes no corpo humano: para a analgesia no parto, os pontos mais utilizados são aqueles localizados na região sacral; o IG4 (intestino grosso 4); e o BP6 (baço-pâncreas 6).11 Quanto à acupressão, alguns estudos sugerem benefício na pressão do ponto BP6 (porção medial da região inferior da tíbia) e no ponto IG 4 (região entre o primeiro e o segundo metacarpos).5, 12, 13 ELETROESTIMULAÇÃO NERVOSA TRANSCUTÂNEA (TENS) A técnica consiste em administrar estímulos elétricos de baixa voltagem através de eletrodos colocados sobre a pele, que emitem uma corrente elétrica com forma de onda tipicamente bifásica, simétrica ou assimétrica, com o objetivo de excitar as fibras nervosas para diminuir a sensação dolorosa do trabalho de parto, retardando ou evitando a necessidade da utilização de métodos farmacológicos.10 Apesar de poucas evidências, os estudos apontam que a utilização da TENS como estratégia não farmacológica de alívio da dor no trabalho de parto tem resultados positivos, quando comparada aos grupos sem intervenções.10 90 BANHO O banho em chuveiro com água morna, por tempo indeterminado, tem demonstrado melhora nas escalas visuais de dor e melhora na satisfação da parturiente em alguns estudos.5, 14 MUSICOTERAPIA E AROMATERAPIA A musicoterapia utiliza o estímulo auditivo para diminuir a percepção da dor.3 Acredita-se que a utilização da música é um meio eficaz como forma de distração, ou seja, não reduz diretamente a dor, mas atua como um estímulo agradável ao cérebro desviando a atenção e o foco da mãe na hora do parto.3 Já a aromaterapia utiliza-se de óleos essenciais altamente concentrados e postula-se que sua utilização se baseia na capacidade de estimular a produção de substâncias relaxantes, estimulantes e sedativas endógenas.3 MEDIDAS FARMACOLÓGICAS ANALGESIA REGIONAL As técnicas regionais de analgesia são consideradas o padrão-ouro para alívio da dor atualmente. São conhecidas duas técnicas que podem ser usadas: a peridural, a raquianestesia e o bloqueio combinado raqui-peridural.15 A analgesia de condução deve ser indicada à parturiente em qualquer momento do trabalho de parto, independentemente da dilatação cervical.4 A analgesia peridural envolve a injeção de um anestésico local com ou sem opioide no espaço peridural da região inferior da coluna vertebral.16 Existem três maneiras que as soluções podem ser administradas: infusão por bolus, contínua ou em bomba controlada pela paciente.16 As técnicas intermitentes envolvem injeções de anestésico local através de um cateter posicionado no espaço epidural.16 Bolus de concentrações mais altas era o meio mais utilizado anteriormente e está associado a um bloqueio mais denso e consequentemente à diminuição da mobilidade da paciente, do tônus pélvico, perda da sensação de sustentação presente no período expulsivo e aumentadas taxas de cesariana.16,3 Atualmente, prefere-se a infusão contínua ou em bomba controlada pela paciente, pois permite uma dose menor das medicações e com isso há a preservação de alguma função motora, possibilitando movimentação durante o trabalho de parto. Além disso, 91 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB estudos recentes mostram que as técnicas com doses menores de anestésicos não aumentam o número de cesarianas.16 O bloqueio combinado envolve uma única injeção de anestésico local ou de opioide, ou a combinação desses no líquido espinhal juntamente com a instalação de um cateter peridural.16 Essa técnica combina as vantagens da analgesia espinhal, que é o início mais rápido de alívio da dor e a analgesia mais confiável, com os benefícios da analgesia peridural como alívio contínuo da dor, mantido durante toda a extensão do trabalho de parto.16 Esses dois tipos de analgesia são igualmente eficazes para alívio da dor, e a escolha do método empregado será influenciada pela experiência do anestesista, pelo período do parto no qual a analgesia será iniciada. A técnica combinada pode fornecer alguns benefícios em relação às peridurais tradicionais, incluindo início mais rápido da analgesia (três a cinco minutos devido à analgesia espinhal) e menor necessidade de analgesia de resgate. 4, 3 A analgesia peridural, por sua vez, deve ser preferida em situações nas quais exista alta probabilidade de evolução para cesariana, além de situações de instabilidade hemodinâmica como aquelas em pacientes com pré-eclâmpsia ou nas cardiopatas. 4, 3 • RAQUIANESTESIA EM SELA O bloqueio em sela é um tipo de raquianestesia baixa que proporciona anestesia sobre o períneo, região medial das coxas e pernas.17 Essa técnica pode ser usada em alguns procedimentos obstétricos, como na episiorrafia, no parto instrumentalizado e durante o trabalho de parto em si.17 Ao longo dos anos, esse bloqueio ganhou espaço na analgesia de parto, pois permite o uso de baixa dosagem de medicamentos, fornece alívio completo da dor sem narcotizar o recém-nascido e não compromete a deambulação da gestante.17 Uma diversidade de medicações pode ser usada nesse procedimento, sendo os mais difundidos a procaína e a bupivacaína.17 A raquianestesia em sela promove anestesia a nível das segunda e terceira vértebras sacrais (S2 e S3). Uma peculiaridade dessa técnica é que após a injeção do medicamento, a paciente é instruída a permanecer sentada por 3min a 10min, o que proporciona a anestesia baixa.17 92 ANESTESIA LOCAL Técnicas de anestesia local são utilizadas para diminuir a dor no estágio final da dilatação, no período expulsivo e para permitir a incisão e o reparo de episiotomia, quando indicada, ou para realização de sutura das lacerações existentes.3 • BLOQUEIO PARACERVICAL O bloqueio paracervical (plexo uterovaginal ou de Frankenhäuser) pode fornecer alívio parcial na dor da contração uterina e da dilatação cervical durante a fase ativa, sem afetar as fibras motoras ou a duração do trabalho de parto.18 Por outro lado, tem pouco efeito na dor após a dilatação total, pois não bloqueia os nervos sensoriais do períneo.18 Esse procedimento é pouco utilizado atualmente por estar relacionado à bradicardia fetal, especialmente quando realizado com dilatações acima de 8 cm.18 Esse bloqueio pode ser executado nas dilatações entre 4 cm e 8 cm e repetido a cada 1 hora, se necessário.18 Injeta-se, entre as contrações, 5 mL de anestésico em um fórnice vaginal lateral, penetrando até 3 mm da agulha.18 Após esse bloqueio, orientamos manter a paciente em decúbito lateral esquerdo e monitorar o feto por 3 minutos antes de realizar o bloqueio do outro fórnice vaginal lateral.18 Preferir injetar o anestésico na localização de 4h e de 8h, pois são áreas menos vascularizadas do que 3h e 9h.18 • BLOQUEIO DO NERVO PUDENDO O bloqueio do nervo pudendo é um dos bloqueios anestésicos locais mais frequentemente utilizados e pode ser realizado por duas técnicas, transperineal e transvaginal.3 O bloqueio pudendo bilateral é realizado por meio de injeção de anestésico local em torno do tronco do nervo pudendo, que está localizado atrás do ligamento sacro-espinhal.3 Deve-se conferir se a agulha não se encontra dentro de estrutura vascular, então, são injetados 3 ml de anestésico local, lidocaína a 2%, no ligamento.3 A agulha é então avançada ligeiramente até transpassar o referido ligamento, quando então a resistência à agulhaé perdida.3 A aspiração é novamente realizada para confirmar que agulha não está posicionada dentro de vaso (os vasos glúteos pudendo e inferior ficam adjacentes ao nervo pudendo), e então os 7 ml restantes de anestésico são injetados.3 O procedimento é repetido no 93 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB lado contralateral.3 Os dados de uma revisão sistêmica mostram maior satisfação das mulheres com alívio da dor após bloqueio pudendo bilateral (em particular, com 2% de lidocaína) do que após o placebo.19 Salientamos que o bloqueio do nervo pudendo não diminui a dor da contração uterina ou da dilatação cervical no primeiro estágio do trabalho de parto, sendo mais efetivo após a dilatação total.18 ANALGESIA SISTÊMICA • INALATÓRIA O óxido nitroso a 50% pode ser utilizado na analgesia inalatória.4 Possui como efeitos colaterais: náusea, tontura, vômitos e alterações de memória.4 O efeito do óxido nitroso ocorre em 50 segundos, devendo ser inalado 30 segundos antes do início de uma contração e mantido até o seu alívio, repetindo-se o processo a cada contração uterina.15 Ele é rapidamente eliminado pela via aérea, não causando depressão respiratória no recém-nascido.15 Além disso, não afeta a duração do trabalho de parto.15 • INTRAMUSCULAR E ENDOVENOSA As drogas mais utilizadas por essas vias de administração são os opioides, especialmente a petidina, morfina, fentanil, alfentanila e remifentanil.3,20 A maioria das evidências sobre o uso dessas medicações são de baixa qualidade, então devem ser reservadas a situações em que não se dispõe da instalação de analgesia de condução ou quando há contraindicação a esse método, como sepse e hemorragia materna ativa.3,20 Se optar pela petidina, administrar 1 hora antes do parto ou mais de 4 horas antes do nascimento, pois a concentração máxima no feto é atingida entre 2h e 3h depois da administração materna.15 A morfina tem pouco efeito analgésico em doses não sedativas, por isso, está em desuso.15 O fentanil, por possuir ação de curta duração, é mais utilizado em bombas de infusão controladas pela paciente.15 Quando possível, a via preferencial deve ser a administração endovenosa por bomba de infusão controlada pela paciente.3,20 Contudo, essas drogas estão associadas a efeitos adversos maternos, como náusea, vômitos, sonolência e tontura e, no recém-nascido, podem acarretar depressão respiratória e sonolência 94 que pode durar vários dias.4,20 Além disso, estudos mostram que essas drogas podem causar interferência negativa no aleitamento materno.4,20 CONCLUSÃO Há diversos métodos, farmacológicos e não farmacológicos, que podem ser usados para promover a analgesia durante o trabalho de parto. Atualmente, o padrão-ouro são os bloqueios regionais, entretanto, essas técnicas dependem da disponibilidade de anestesista no serviço.3 Dessa forma, o bloqueio peridural ou o raquiperidural devem ser as primeiras opções de analgesia durante o trabalho de parto, contudo, na ausência do anestesista, pode-se optar por técnicas não farmacológicas, além do bloqueio do nervo pudendo e dos opioides (petidina e morfina). Tabela 1 - Medicações para Analgesia no Trabalho de Parto MEDICAÇÕES MODO DE USAR MORFINA - 5 mg a 10 mg, IM, sendo o máximo 15 mg - Não ultrapassar 10 mg em 4h PETIDINA - 50 mg a 100 mg, IM ou SC por 1h a 3h - Não ultrapassar 400 mg em 24h LIDOCAÍNA 2% (BLOQUEIO DO NERVO PUDENDO BILATERAL) 1ª ETAPA: Aplicar 3 ml de lidocaína 2% no ligamento sacro-espinhal 2ª ETAPA: Passar pelo ligamento com a agulha e aplicar 7 ml de lidocaína 2% na topografia do nervo pudendo 3ª ETAPA: Repetir a técnica contralateral Fonte: Guideline NHS, 2019 21. REFERÊNCIAS 1. VARDEH, Daniel; MANNION, Richard J.; WOOLF, Clifford J. Toward a mechanism- based approach to pain diagnosis. The Journal of Pain, v. 17, n. 9, p. T50-T69, 2016. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27586831/. Acesso em 07 de ago. de 2020. 95 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 2. CUNHA AA, GRIBEL GP, PALMIRO A. Analgesia e anestesia farmacológica. Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO); São Paulo (Protocolo FEBRASGO - Obstetrícia, no. 98/ Comissão Nacional Especializada em Assistência ao Abortamento, Parto e Puerpério). 2018. 3. ZUGAIB, Marcelo; VIEIRA, Rossana P. Zugaib Obstetrícia. Barueri: Editora Manole, 2020. 4. Ministério da Saúde, Diretrizes nacionais de assistência ao parto normal. Brasília: Editora MS, 2017. 5. Caughey, AB. Nonpharmacologic approaches to management of labor pain. Up to Date, 2020. 6. HODNETT, Ellen D. et al. Continuous support for women during childbirth. Cochrane database of systematic reviews, n. 7, 2013. Disponível em: https://www. cochranelibrary.com/cdsr/doi/10.1002/14651858.CD003766.pub5/abstract. Acesso em 07 de ago. de 2020. 7. Brasil, Presidência da República. LEI Nº 11.108, DE 7 DE ABRIL DE 2005. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2005. 8. Makvandi S, Latifnejad Roudsari R, Sadeghi R, Karimi L. Effect of birth ball on labor pain relief: A systematic review and meta-analysis. J Obstet Gynaecol Res. 2015;41(11):1679. Epub 2015 Sep 30. 9. SILVA, Dannielly Azevedo de Oliveira et al. Uso de métodos não farmacológicos para o alívio da dor durante o trabalho de parto normal: revisão integrativa. Rev. enferm. UFPE on line, p. 1539-1548, 2013. Disponível em: https://periodicos.ufpe. br/revistas/revistaenfermagem/article/view/11645/34512. Acesso em 07 de ago. de 2020. 10. MELLO, Larissa FD; NÓBREGA, Luciana F.; LEMOS, Andrea. Estimulação elétrica transcutânea no alívio da dor do trabalho de parto: revisão sistemática e meta- análise. Brazilian Journal of Physical Therapy, v. 15, n. 3, p. 175-184, 2011. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rbfis/v15n3/02.pdf. Acesso em 25 de ago. de 2020. 11. KAWAKITA, Kenji; OKADA, Kaoru. Acupuncture therapy: mechanism of action, efficacy, and safety: a potential intervention for psychogenic disorders. BioPsychoSocial medicine, v. 8, n. 1, p. 4, 2014. Disponível em: https://www.ncbi. nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3996195/. Acesso em 08 de ago. de 2020. 12. Effects of acupressure at the Sanyinjiao point (SP6) on the process of active phase of labor in nulliparas women. Kashanian M, Shahali S. J Matern Fetal Neonatal Med. 2009. 13. Hjelmstedt A, Shenoy ST, Stener-Victorin E, Lekander M, Bhat M, Balakumaran L, Waldenström U. Acupressure to reduce labor pain: a randomized controlled trial. 96 Acta Obstet Gynecol Scand. 2010;89(11):1453. Epub 2010 Sep 8. 14. Lee SL, Liu CY, Lu YY, Gau ML. Efficacy of warm showers on labor pain and birth experiences during the first labor stage. 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Parenteral opioids for maternal pain management in labour. Cochrane database of systematic reviews, 5 Junho 2018, Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6513033/. Acesso em 24 de ago. de 2020. 21. COMMITTEE. Guideline. Maternity Guidelines: pain relief inlabour. NHS. University Hospitals Plymouth. Disponível em: https://www.plymouthhospitals. nhs.uk/maternity-guidelines. Acesso em 04 de março de 2021. 97 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB INTRODUÇÃO A gestação prolongada ou pós-termo é aquela com idade gestacional (IG) maior ou igual a 42 semanas.1,2 Ela está relacionada ao aumento do risco de morbimortalidade fetal, macrossomia, síndrome de dismaturidade/pós-maturidade, convulsões neonatais, síndrome da aspiração meconial, admissões na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN)1,2 e com mortalidade perinatal duas vezes maior do que na gestação a termo.3 Similarmente, há risco materno aumentado para lacerações perineais, infecções, hemorragia pós-parto e cesáreas.1 Esse risco cresce gradativamente após as 40 semanas de gestação, piorando expressivamente ao alcançar 42 semanas.4 A indução do parto é uma estratégia que diminui os riscos perinatais associados à gestação prolongada.1 DEFINIÇÃO A gestação pode ser definida como: • Prolongada ou pós-termo: alcança ou ultrapassa 42 semanas.2 • Termo tardio: 41 semanas a 41 semanas e 6 dias.2 • A termo: 39 semanas a 40 semanas e 6 dias.2 • Pós-datismo (recomendamos não utilizar essa definição): termo genérico para definir gestações entre 40 e 42 semanas, isto é, após a data provável do parto.17 • Termo precoce: 37 semanas a 38 semanas e 6 dias.2 A indução do parto é a conduta de estímulo das contrações uterinas antes do início do trabalho de parto.10 Alguns métodos descritos na literatura para a indução são: sorocondução com ocitocina; amniotomia; administração de prostaglandina E1 (misoprostol); e descolamento de membranas.10 MANEJO DA GESTAÇÃO PROLONGADA Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Paula Faria Campos Zilma Eliane Ferreira Alves 98 DIAGNÓSTICO O diagnóstico é obtido pela determinação correta da idade gestacional, etapa primordial para a definição da conduta médica.1 Para o estabelecimento da data provável do parto (DPP), calcula-se 280 dias após o primeiro dia da última menstruação (DUM), o que corresponde a 40 semanas de idade gestacional.7 Porém, deve-se alterar a DPP se a idade gestacional ultrassonográfica diferir da estimada pela DUM conforme os critérios expostos na Tabela 1.7 Tabela 1 – Critérios para Redatação da Idade Gestacional pela Ultrassonografia Idade Gestacional pela ultrassonografia Método da Medida Diferença entre a idade gestacional pela ultrassonografia e pela DUM ≤ 8 semanas + 6 dias CCN > 5 dias 9 semanas a 13 semanas + 6 dias CCN > 7 dias 14 semanas a 15 semanas + 6 dias DBP / CC / CA / CF > 7 dias 16 semanas a 21 semanas + 6 dias DBP / CC / CA / CF > 10 dias 22 semanas a 27 semanas + 6 dias DBP / CC / CA / CF > 14 dias ≥ 28 semanas DBP / CC / CA / CF > 21 dias Abreviações: CCN (comprimento cabeça-nádega); DBP (diâmetro biparietal); CC (circunferência cefálica); CA (circunferência abdominal); CF (comprimento femoral). Fonte: ACOG, 2019. FATORES DE RISCO Os principais fatores de risco para uma gestação pós-termo são: gestação pós- termo prévia (principal); nuliparidade; fetos masculinos; obesidade; idade materna avançada; erro de datação.2 PREVENÇÃO A melhor forma de prevenção de uma gestação pós-termo é a correta definição da idade gestacional.1 Portanto, recomendamos a realização de uma ecografia obstétrica na primeira metade da gestação, de preferência no primeiro trimestre.1 99 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB O descolamento digital de membrana na gestação com ≥ 39 semanas é útil na prevenção de gestação pós-termo quando há dilatação cervical, placenta normoinserida e ausência de vasa prévia.1,19 CONDUTA A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) recomendam a indução do parto a partir das 41 semanas de gestação.3,5 Essa recomendação é referente a gestações únicas, em apresentação cefálica, sem complicações associadas.2 Já em gestantes com ≥ 40 anos, recomendamos a resolução da gestação com 39 semanas, uma vez que, nessas condições, o risco de natimorto é similar ao das gestantes de 20 a 29 anos com 41 semanas.15, 16 Similarmente, no caso de iteratividade com pelo menos duas histerotomias segmentares transversas prévias, sugerimos realizar cesárea eletiva entre 39 semanas e 39 semanas e 6 dias, desde que a datação da gestação seja satisfatória (ecografia antes das 22 semanas de gestação que confirme a idade gestacional).28,29,30 Se a datação da gestação for insatisfatória, optamos por realizar a cesariana no início do trabalho de parto.29 Por outro lado, no caso de histerotomia corporal, placenta prévia ou ruptura uterina em gestação anterior, a cesárea eletiva pode ser programada entre 36 semanas e 37 semanas.31 Nos demais casos de acretismo placentário (acreta, increta ou percreta) e vasa prévia, a cesariana eletiva pode ser entre 34 e 35 semanas e 6 dias.31 A situação do colo do útero afeta o tempo para início da fase ativa do trabalho de parto8. Assim, se o colo não for favorável, Bishop < 6 (Tabela 2), o procedimento inicial deve ser a preparação do colo.8,10 Tabela 2: Escore de Bishop PONTOS 0 1 2 3 Dilatação (cm) Fechado 1 a 2 3 a 4 ≥ 5 Apagamento (%) 0 a 30 40 a 50 60 a 70 ≥ 80 Altura -3 -2 -1 a 0 +1 a +2 Consistência cervical Firme Intermediária Amolecido Posição cervical Posterior Intermediário Anterior Fonte: Grobman, 2020; FEBRASGO, 2009; Bishop, 1964. 100 CONDIÇÕES PARA INICIAR A INDUÇÃO Avaliação pré-indução:8,9 • Revisar a idade gestacional. • Determinar a apresentação fetal. • Estimar o peso fetal. • Estabelecer o escore de Bishop. • Cardiotocografia. Descartar as contraindicações para o parto vaginal, para o uso de misoprostol, e para a indução com ocitocina (Tabela 3).8,9 Tabela 3 - Contraindicações Parto Vaginal Misoprostol Indução com Ocitocina - Infecção herpética ativa - Placenta prévia ou vasa prévia - Prolapso de cordão - Situação transversa - Carcinoma invasivo do colo uterino - Monitorização anteparto (cardiotocografia categoria 3) - Cesárea prévia - Ruptura uterina prévia - Incisão uterina transmural prévia (miomectomia) - ≥ 2 cesarianas prévias com incisão transversa baixa - 1 cesariana prévia com incisão corporal - Ruptura uterina prévia - Incisão uterina transmural prévia (miomectomia) Fonte: Grobman 1, 2020. Grobman 2, 2020. Mulheres com uma cesariana prévia com incisão transversa baixa não têm contraindicação ao parto vaginal.6 Nesse caso, se o colo for desfavorável, os métodos mecânicos para a preparação do colo como o descolamento das membranas e o método de Krause têm menos risco de complicações e são considerados seguros no amadurecimento do colo uterino.6,8 As prostaglandinas, como o misoprostol, são desaconselhadas nessa situação devido ao maior risco de ruptura uterina.6,8 A decisão da via de parto em mulheres com cesariana prévia deve ser compartilhada com a paciente.22 Devem-se levar em consideração os seguintes fatores de risco para a ruptura uterina: intervalo intraparto < 18 meses;23 mais de uma cesárea 101 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB prévia;23 idade gestacional ≥ 40 semanas; Bishop desfavorável; peso fetal estimado > 4.000g; e idade materna > 40 anos.22 PREPARAÇÃO DO COLO E INDUÇÃO (TABELA 4) Métodos mecânicos: A grande vantagem é o baixo custo, menor risco de taquissistolia, menor risco de efeitos colaterais sistêmicos, além da possibilidade de uso ambulatorial.6,8 Como desvantagem, podem ser citados o risco de infecção materna e neonatal, o desconforto materno e a necessidade frequente de suplementar a indução com ocitocina.6,8 1- O descolamento digital de membranas: promove a liberação intracervical de fosfolipase A2 e da prostaglandina (PGF2) alfa decidualou da PGE2 do colo uterino, estimulantes da atividade uterina.6 Insere-se o dedo do examinador pelo canal cervical, ultrapassando o orifício interno, o mais alto possível, com rotação circunferencial para descolar as membranas do segmento uterino inferior.6 Observe que no caso do canal cervical fechado, o colo uterino pode ser massageado com movimentos circulares.6,8 Esse procedimento pode ser realizado a partir de 39 semanas, aumentando a chance de trabalho de parto espontâneo.1,19 2- Método de Krause (sonda de Foley). A sonda nº 16 ou 18 é introduzida no canal endocervical até o espaço extra-amniótico.22 Após inserido, injeta-se 30 ml a 80 ml de soro fisiológico no balão e espera-se até 12h para que seja expelido.8 A contraindicação relativa para esse método é a inserção baixa da placenta e a ruptura das membranas ovulares.8 Método farmacológico: 1- Postaglandina E1 (misoprostol 25 mcg): poderá ser utilizada a cada 6h para a preparação do colo até que haja um colo favorável.6 As contrações uterinas geralmente são evidentes na primeira hora, com seu pico em 4 horas.10 Quando houver dinâmica uterina de ≥ 2 contrações dolorosas em 10 minutos, não iniciar ou não realizar a dose seguinte de misoprostol.8 Além disso, podemos citar como efeitos colaterais: taquissistolia, febre, náuseas, vômitos, diarreia.8 102 Tabela 4 - Preparação do Colo e Indução Método Dose Tempo Observações Misoprostol 25 mcg (vagina ou oral)25 6h - 6h (vaginal) 2h-2h (oral)25 Iniciar pela manhã Evitar dose da madrugada24 Repetir mais um ciclo, no dia seguinte, se necessário Sugestão de horários: 7h - 13h - 19h Orientar decúbito por ≥30 min após a administração26 Via vaginal possui maior eficácia Krause 12h Sonda de Foley Número 16 ou 18 com duas vias22 Administrar 30 ml - 80 ml no balão22 Aplicar tração Boa opção quando há contraindicação para o misoprostol Descolamento digital das membranas Rotação circunferencial para descolar as membranas do segmento uterino inferior após o orifício cervical interno (OCI) Se o orifício interno (OI) estiver fechado, o canal cervical ou a parte externa do colo uterino podem ser massageados com movimentos circulares. Fonte: Martins-Costa, 2017. Grobman, 2020. ACOG, 2009; EBSERH, 2017. WHO, 2018. INDUÇÃO COM OCITOCINA Quando o colo estiver favorável (Bishop ≥ 6), pode-se iniciar a indução com ocitocina 4h após a última dose de misoprostol ou a qualquer momento no método de Krause (mesmo com o cateter de Foley ainda no colo) e no descolamento das membranas.9 103 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Durante a indução com ocitocina, observar BCF e dinâmica uterina a cada 30 minutos.8 Possíveis complicações são: taquissistolia ( > 5 contrações em 10 minutos); ruptura uterina; embolismo de líquido amniótico.9 Diluir 5 UI de ocitocina (1 ampola) em 500 ml de solução cristaloide (10 mU/ml) e administrar em bomba de infusão.9,10 Assim, pode-se iniciar 12 ml/h (4 gotas/min) na bomba de infusão e aumentar 12 ml/h a cada 30 minutos, se necessário, ou a infusão pode seguir um dos regimes do protocolo na Tabela 5.9,10 Observe que a dose deve ser aumentada até haver 4 a 5 contrações em 10 minutos.11 Após 4h de indução, se a dilatação cervical aumentar menos que 2 cm, avaliar a necessidade de cesariana. Por outro lado, se houver pelo menos 2 cm de aumento na dilatação em 4h, continuar a indução.11 Tabela 5 - Protocolo de Infusão de Ocitocina 9,10 Tempo após o início da infusão (min) Dose de Ocitocina (mU/min) Taxa de Infusão (Diluição: 5U em 500 ml) 0 2 12 ml/h ou 4 gt/min 30 4 24 ml/h ou 8 gt/min 60 6 36 ml/h ou 12 gt/min 90 8 48 ml/h ou 16 gt/min 120 10 60 ml/h ou 20 gt/min 150 12 72 ml/h ou 24 gt/min 180 14 84 ml/h ou 28 gt/min 210 16 96 ml/h ou 32 gt/min 240 18 108 ml/h ou 36 gt/min 270 20 120 ml/h ou 40 gt/min Diminuir 1mU/min (6 ml/h) se hiperestimulação recorrente Dose máxima cumulativa: 10 UI Dose máxima: 32 mU/min27 Cesárea prévia: máximo 20 mU/min27 Tempo máximo: 12h9 Meta: ≥ 2 cm de aumento na dilatação a cada 4h Fonte: Adaptado de Manual Técnico Gestação de Alto Risco. Ministério da Saúde, 2010. Grobman, 2020. ACOG,2009. Brasil, 2017. 104 AMNIOTOMIA A ruptura intencional das membranas isoladamente não é um procedimento efetivo para a indução do parto.9 Por outro lado, a amniotomia realizada precocemente, assim que o colo ficar favorável, associada ao uso de ocitocina, não aumenta o risco de cesariana e diminui o tempo de trabalho de parto em aproximadamente 5h.9.21 Pode ser realizada se a cabeça fetal estiver encaixada, a fim de reduzir o risco de prolapso de cordão.9 FALHA DA INDUÇÃO Não existe consenso na definição da falha da indução.9 Ela ocorre quando a fase latente do trabalho de parto é mantida por longos períodos mesmo com medidas ativas de indução.9 Nesse caso, a cesárea está indicada.9 Antes de aventar o diagnóstico de falha de indução, recomendamos que a ocitocina seja administrada por pelo menos 12h após a ruptura das membranas, pois esta afeta consideravelmente o tempo de trabalho de parto.9 O tempo de amadurecimento cervical não é incluído na contagem do tempo9. Além disso, a parada da fase ativa, o segundo estágio prolongado e as indicações maternas ou fetais para a cesariana não devem entrar nessa definição.9,12,13,14 105 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB FLUXOGRAMA: CONDUTA NA GESTAÇÃO PROLONGADA Fonte: Adaptado de EBSERH, 2017. 106 REFERÊNCIAS 1. ACOG. Management of Late-Term and Postterm Pregnancies. Practice Bulletin: Clinical Management Guidelines for Obstetrician-Gynecologists. Number 146, Aug 2014. 2. Norwitz, E.R. Postterm pregnancy. UpToDate, 2019. 3. FEBRASGO. Manual de Perinatologia, 2013. 4. Lawn JE, Blencowe H, Waiswa P, et al, Ending Preventable Stillbirths 2. Stillbirths: rates, risk factors, and acceleration towards 2030. Lancet 2016;387:587-603. doi:10.1016/S0140- 6736(15)00837-5. 5. WHO recommendations: induction of labour at or beyond term, 2018 https://apps. who.int/iris/bitstream/handle/10665/277233/9789241550413-eng.pdf. 6. Martins-Costa, SH, et al. Rotinas em Obstetrícia, Artmed, 7ª ed, 2017. 7. ACOG.Committee on Obstetric Practice American Institute of Ultrasound in Medicine Society for Maternal–Fetal Medicine. Number 700, May 2018, Reaffirmed 2019. 8. Grobman, William. Techniques for ripening the unfavorable cervix prior to induction. UpToDate Inc, 2020. 9. Grobman, William 2. Induction of labor with oxytocin UpToDate Inc, 2020. 10. ACOG. Induction of Labor. Practice Bulletin: Clinical Management Guidelines for Obstetrician-Gynecologists. Number 107, Aug 2009. 11. BRASIL. Ministério da Saúde. Diretrizes Nacionais de Assistência ao Parto Normal. Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde, 2017. 12. Rouse, Dwight J., John Owen, and John C. Hauth. “Criteria for failed labor induction: prospective evaluation of a standardized protocol.” Obstetrics & Gynecology 96.5 (2000): 671-677. 13. Grobman, William A., et al. Defining failed induction of labor. American journal of obstetrics and gynecology 218.1 (2018): 122-e1. 14. Leduc, Dean, et al. Induction of labour. Journal of Obstetrics and Gynaecology Canada 35.9 (2013): 840-857. 15. Dhanjal MK, Kenyon A. Induction of Labour at Term in Older Mothers. Scientific Impact Paper No. 34, Royal College of Obstetricians and Gynaecologists; London, UK, 2013. 16. Fretts, RC. Management of pregnancy in women of advanced age. Up To Date, 2019. 107 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 17. Zugaib M. Obstetrícia. 3ª edição.Barueri, SP. Manole, 2016. 18. Finucane EM, et al. Membrane sweeping for induction of labour. Cochrane Database Syst Rev. 2020. 19. Boulvain M, Stan CM, Irion O. Membrane sweeping for induction of labour. Cochrane Database of Systematic Reviews, Issue 1. Art. No.: CD000451, 2005. 20. BishopEH. Pelvic scoring for elective induction. Obstet Gynecol. 24:266–8, 1964. 21. De Vivo V et al. Early amniotomy after cervical ripening for induction of labor: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. Am J Obstet Gynecol.;222(4):320, 2020. 22. FEBRASGO. Tratado de Obstetrícia. Elsevier, 2019. 23. Landon, MB. Uterine rupture: After previous cesarean delivery, Up To Date, 2020. 24. EBSERH. Gestação Prolongada. Universidade Federal do Ceará, 2017. 25. Morris, JL. et al. FIGO’s updated recommendations for misoprostol used alone in gynecology and obstetrics Int J Gynecol Obstet 138: 363–366, 2017. 26. World Health Organization. Medical management of abortion, 2018. 27. Zugaib, M; Bittar, RE; Francisco, RPV. Protocolos Assistenciais, 5ª ed, FMUSP, 2015. 28. Berghella, V. Repeat cesarean delivery. Up to Date, 2021. 29. HMIB - Despacho SES/SAIS/CATES/DUAEC de 8 de fev de 2021. 30. Breslin N, Vander Haar E, Friedman AM, Duffy C, Gyamfi-Bannerman C. Impact of timing of delivery on maternal and neonatal outcomes for women after three previous caesarean deliveries; a secondary analysis of the caesarean section registry. BJOG. 2019;126(8):1008. Epub 2019 Mar 25. 31. Medically Indicated Late-Preterm and Early-Term Deliveries: ACOG Committee Opinion, Number 818. Obstet Gynecol. 2021;137(2):e29. 108 INTRODUÇÃO Rotura prematura das membranas ovulares (RPMO) é aquela que ocorre antes do início do trabalho de parto e pode ser classificada como RPMO pré-termo, se ocorrer antes das 37 semanas de gestação, ou RPMO a termo, se ocorrer com ≥ 37 semanas.1,2 Em aproximadamente metade dos casos, o parto ocorre em até 33 horas da RPMO em gestações a termo e em até uma semana nas pré-termo.3 A complicação materna mais expressiva é a infecção intrauterina e o risco mais significativo para o feto são as complicações relacionadas à prematuridade, como a sepse, a hemorragia intraventricular, a enterocolite necrotizante e as complicações respiratórias.3 Alguns motivos para a resolução da gestação com RPMO seriam o sofrimento fetal, a corioamnionite, o descolamento prematuro de placenta e o prolapso de cordão.1 Dentre os fatores de risco já relatados, podemos citar:4,6 Tabela 1. Fatores de risco para rotura prematura das membranas ovulares Fatores de Risco para RPMO Maternos Uteroplacentários Outros - RPMO prévia - Sangramento vaginal anteparto - Uso crônico de corticoide - Trauma abdominal - Conização prévia - Descolamento de placenta - Procedimentos invasivos: amniocentese**, cordocentese, cerclagem do colo uterino. ROTURA PREMATURA DE MEMBRANAS OVULARES Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Ana Luíza Martins Meyer Barros Maria Jocilda de Albuquerque Guimarães D’Oliveira 109 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB - História pregressa de parto prematuro - Infecções: genitais*, urinária - Drogas ilícitas - Doenças crônicas: anemia, doenças do colágeno, desnutrição - Tabagismo (afeta a composição da membrana) - Baixo nível socioeconômico - Distensão uterina: macrossomia fetal, gestação múltipla, polidrâmnio - Colo curto (< 2,5 cm) - Anormalidades uterinas - Corioamnionite - Infecções agudas na gestação: apendicite, pielonefrite * Causa tratável mais comum. A infecção gera uma resposta inflamatória que ocasiona a RPMO. Agentes: GBS, C. trachomatis, vaginose bacteriana, N. gonorrhoeae, Trichomonas vaginales, Ureaplasma ssp, H. influenzae, sífilis ** RPMO por amniocentese tem melhor prognóstico do que a RPMO espontânea, pois aquela ocorre em membrana saudável e longe do colo uterino. Fonte: EBSERH. Ruptura Prematura de Membranas, 2017. DIAGNÓSTICO Os pilares do diagnóstico são a história clínica e o exame especular confirmatório.2 A ecografia auxilia no raciocínio diagnóstico ao evidenciar diminuição de 50% - 70% do líquido amniótico normal, sem anomalias do sistema urinário fetal ou restrição de crescimento intrauterino (CIUR).4 Observamos que quando o maior bolsão é < 2,0 cm, há associação com o período de latência mais curto e com a maior incidência de corioamnionite.5 Porém, esse fator isoladamente não é indicação de interrupção da gestação quando todos os outros parâmetros estiverem normais.5 Destaca-se que o Doppler não é útil na monitoração de fetos na RPMO pré-termo.5 Passos para o diagnóstico:1,2,3 • História de perda abrupta de líquido pela vagina, que escorre pelas pernas, em quantidade moderada e com cheiro peculiar. • Exame especular evidenciando escoamento (espontâneo ou induzido pela manobra de Valsalva) de líquido pelo orifício externo do colo uterino ou coletado no fundo de saco. 110 • Testes adicionais, se houver dúvida diagnóstica: Teste do Fenol; Fitas reagentes de pH (falso positivo se sêmen ou sangue); Fern Test ou Teste da Cristalização em Lâmina aquecida; ultrassonografia evidenciando oligoâmnio. Em nosso serviço, temos disponível apenas o teste da fita e a ultrassonografia. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Na investigação diagnóstica, devemos observar alguns diagnósticos diferenciais: 6 • Perda de urina. • Muco cervical. • Descarga vaginal. PREVENÇÃO Recomendamos o uso de progesterona a partir de 16 semanas, podendo ser mantida até 36 semanas,19 além do rastreio e tratamento de infecção do trato genital em paciente com história prévia de RPMO ou de gestação pré-termo.4,7 O uso de progesterona não é indicado em caso de RPMO na gestação atual.4 MANEJO PELA IDADE GESTACIONAL Quando se trata de RPMO, é importante que a mulher e sua família recebam aconselhamentos quanto à morbidade e mortalidade relacionados a cada faixa de idade gestacional acometida, e também sobre as taxas de sucesso dos tratamentos propostos.8 Nossa proposta de conduta será estabelecida de acordo com a idade gestacional: > 36 SEMANAS Para os fetos acima de 36 semanas, a nossa conduta é a interrupção da gestação pela via obstétrica. Não utilizamos corticoide, tocólise ou sulfato de magnésio (neuroproteção fetal).4 Nos fetos pré-termo, se a cultura para GBS for positiva ou desconhecida, iniciar a profilaxia no momento da internação e manter até o parto.20 A partir de 37 semanas, a profilaxia para GBS pode ser iniciada após 18 horas de bolsa rota.20 111 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB ENTRE 34 SEM. E 36 SEM. Na faixa de idade gestacional entre 34 e 36 semanas, é importante tratar cada caso de forma individualizada, para melhor decisão do momento de interrupção.3 Tanto a conduta expectante quanto a resolução da gravidez são aceitáveis, levando em consideração o bem-estar materno e fetal.9 O resultado do estudo PPROMT, publicado na The Lancet em 2015, em consonância com o estudo PPROMEXIL, publicado na PLOS Medicine em 2012, demonstra que a conduta expectante proporciona benefícios sem causar riscos significativos ao recém-nascido.10 Além disso, o grupo da Universidade de Sydney e o Royal College of Obstetricians and Gynaecologists já empregam a conduta expectante até 37 semanas7, 11, 12 e o American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG) aceita tanto a conduta expectante quanto a conduta ativa em gestações entre 34 semanas e 36 semanas + 6 dias.9 De forma geral, a paciente deve ficar internada na enfermaria de alto risco, ou Setor de Alto Risco (SAR), até o momento do parto. Os critérios por nós utilizados para essa conduta são: pacientes sem suspeita de infecção, pacientes com idade gestacional inconclusiva, pacientes com líquido amniótico normal e apresentação cefálica. Não está indicado o uso de antibiótico para aumentar o período de latência.3 Também não há necessidade de tocólise em caso de trabalho de parto espontâneo.3 No entanto, há indicação de profilaxia para GBS no momento da internação nos casos selecionados como cultura positiva ou desconhecida, devendo ser suspensa após 48h se a paciente não entrar em trabalho de parto.20 Neste período,também não usamos corticoide para maturação pulmonar. 24 SEM. A 33 SEM. + 6 D Para situações de RPMO em fetos pré-termo extremos, porém acima do limite inferior de viabilidade do nosso serviço (24 semanas), está preconizada a conduta expectante, desde que não haja evidência de corioamnionite ou outra indicação materna ou fetal.3 Indicamos o uso de corticoide entre 24 semanas e 33 semanas e 6 dias de idade gestacional,3 sendo a 1ª escolha a Betametasona 12 mg IM de 24h em 24h por 48h (2 doses). Uma alternativa é a Dexametasona 6 mg IM de 12h em 12h por 48h (4 doses).8 Lembrando que nos primeiros dias após a administração de corticoide existe a possibilidade de ocorrer leucocitose, até mesmo com desvio à esquerda.13 112 Não indicamos a tocólise em mulheres com ruptura prematura de membranas, pois há risco aumentado de corioamnionite,1 a não ser em situações específicas, como necessidade de adiar o parto por até 48h para a realização de corticoterapia ou de transferência para centros com maternidade e UTI neonatal.4,6 O sulfato de magnésio para neuroproteção deve ser oferecido nas gestações < 32 semanas que estiverem em risco iminente de parto.3 A dose deverá ser a do esquema Zuspan, também utilizado na prevenção da eclâmpsia (4 g de sulfato de magnésio em 20 minutos e manutenção de 1 g/h) e deverá ser mantida por pelo menos 6h - 12h, pois ainda não se sabe o tempo necessário para conferir a neuroproteção.15 Se o parto não for mais iminente e não ocorrer em 24h, deve- se suspender a infusão.¹5 Não recomendamos o retratamento, pois há pouca evidência sobre seus efeitos na neuroproteção fetal. Por outro lado, advertimos que procedimentos de emergência não devem ser retardados para a administração do sulfato de magnésio. Está preconizado realizar o esquema de antibióticos para aumento da latência e redução do risco de infecção materna e neonatal em mulheres fora do trabalho de parto.3,8 O esquema de escolha é Azitromicina 1 g VO dose única, Ampicilina 2 g IV de 6h em 6h por 48h, seguido de Amoxicilina 500 mg de 8h em 8h, por 5 dias.13 Em pacientes com alergia a penicilina com baixo risco de anafilaxia pode-se usar 1 g de Azitromicina VO dose única, 1 g de Cefazolina de 6h em 6h por 48h, seguido de Cefalexina 500 mg de 6h em 6h, por 5 dias.13 E nas pacientes com alto risco para anafilaxia sugere-se Azitromicina 1 g VO em dose única, Clindamicina 900 mg EV de 8h/8h por 48h, Gentamicina 5 mg/kg de 24h/24h no total de duas doses, seguidos de Clindamicina 300 mg VO de 8h/8h por 5 dias.13 Para mulheres em trabalho de parto ativo e com critérios para profilaxia para estreptococos do grupo B, recomenda-se o uso de Penicilina G Cristalina 5 milhões de UI IV de ataque + manutenção com 2,5 milhões de UI IV de 4h em 4h até o parto. Um esquema alternativo, que é o mais utilizado no nosso serviço, é a Ampicilina 2 g EV de ataque + 1 g EV de 4h em 4h até o parto.3,8 Manejo: 1. Evitar o toque vaginal para minimizar infecções. 2. Rastrear complicações: corioamnionite e o sofrimento fetal • Sinais vitais 4 vezes ao dia. • Hemograma 2 a 3 vezes por semana. 113 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB • Cardiotocografia diária com perfil biofísico fetal semanal (se possível) a depender da indicação clínica. • Culturas de Estreptococco do Grupo B (GBS) na internação e a cada 5 semanas, se disponível. < 24 SEMANAS No nosso serviço, consideramos gestações inferiores a 24 semanas como inviáveis. Nessa faixa de idade gestacional, os riscos maternos são altos e a mortalidade neonatal é elevada. Portanto, é necessário acolher a mulher e sua família, de forma a orientar sobre o mau prognóstico da gestação, os riscos e tirar as dúvidas que surgirem.13 A paciente deverá ser internada no momento do diagnóstico. Está indicada interrupção da gestação com indução do trabalho de abortamento com Misoprostol para idades gestacionais < 22 semanas, mediante aceitação da paciente e assinatura de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 1). Em casos de objeção da paciente, deverá ser assinado termo de ciência dos riscos e registrado em prontuário.13 Para gestações com idade gestacional entre 22 e 24 semanas, preconizamos a conduta expectante, com monitorização materno fetal, desde que não haja sinais infecciosos que indiquem a interrupção, uma vez que se encontram além da faixa considerada como abortamento pela legislação brasileira, e não há clareza nos protocolos dos órgãos oficiais em relação à indicação de interrupção imediata.13 Não está indicado uso de corticoide, tocólise e sulfato de magnésio para neuroproteção ou antibiótico para aumentar latência nessa faixa etária gestacional.3,6 SITUAÇÕES ESPECIAIS • Corticoterapia: evidências recentes demonstram a ausência de segurança e eficácia em uma prática proposta de antecipar a segunda dose do corticoide, reduzindo o intervalo, com objetivo de completar o curso de esteroides antes do parto. Essa conduta tem respaldo em evidências de baixa qualidade e, inclusive em um dos estudos, houve um possível aumento de risco para enterocolite necrotizante nos recém- nascidos expostos a essa prática, o que é preocupante. Até o lançamento desta edição não há evidência de alta qualidade que recomende a redução no intervalo entre as doses de corticoide, portanto, NÃO recomendamos 114 essa prática.16,17,18 • Primoinfecção por herpes simples: conduta expectante. Realizar tratamento específico.4 • Cerclagem: conduta individualizada.4,5 Geralmente optamos pela remoção da cerclagem. Se optar pela não remoção, o uso de antibiótico profilático por mais de sete dias não é recomendado.5 • Pessário: recomenda-se a retirada, porém pode ser mantido em situações especiais, como a dúvida no diagnóstico.4 • RPMO Presumida: em nosso serviço, definimos como RPMO Presumida os casos de pacientes internadas com história clínica de perda líquida, porém com exame físico normal (especular e teste da fita) e ecografia com líquido amniótico normal (LAN). Nesses casos, a conduta será individualizada pela equipe do Setor de Alto Risco do HMIB. COMPLICAÇÕES • Corioamnionite: em caso de corioamnionite, está recomendada interrupção da gestação, independentemente da idade gestacional, por via vaginal, se possível, e uso de antibiótico: Clindamicina 900 mg IV de 8h/8h e Gentamicina 5mg/Kg IV 1 x/dia ou Ceftriaxona 1 g IV de 12h/12h e Metronidazol 500 mg IV de 8h/8h, se nefropata.6,13 Manter terapia IV até 48h sem febre após o parto.13 Para detalhes sobre diagnóstico, vide Capítulo de Corioamnionite. • Prolapso de cordão: o baixo volume de líquido amniótico está associado a um aumento do risco de compressão do cordão umbilical.5 O risco de ocorrer prolapso na RPMO pré-termo é de 11% se a apresentação não for cefálica.7 • Descolamento Prematuro de Placenta: ocorre em 2% - 5% dos casos de RPMO.5,7 O risco para DPP aumenta ainda mais quando há oligoâmnio ou corioamnionite associada.7 INTERRUPÇÃO DA GESTAÇÃO Em nosso serviço, a interrupção da gestação está indicada a partir de 34 semanas, podendo, em alguns casos, chegarmos até a 36 semanas. Na presença de suspeita de corioamnionite, descolamento de placenta, prolapso 115 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB de cordão umbilical ou condição fetal não tranquilizadora, a indicação da via de parto deve ser obstétrica.14 Tabela 2. Medicamentos na RPMO Medicamentos e Doses na RPMO Corticoide Betametasona 12 mg, IM, 24h - 24h, por 48h (2 doses) Dexametasona 6 mg, IM, 6h - 6h, por 48h (4 doses) Esquema Zuspan Sulfato de Mg a 50% Ampola 10 ml (5 g/ampola) Ataque: 4 g, IV, em 15min - 20min (8 ml Sulfato de Mg 50% + 12 ml de SF 0,9%: 60 ml/h) Manutenção: 1 g/h, IV em BI (10 ml Sulfato de Mg 50% + 490 ml SF 0,9%: 100 ml/h) Até o parto ou até 48h Corioamnionite (realizar os 2) Clindamicina 900 mg, IV, 8h - 8h, até 48h sem febre após o parto Gentamicina 5 mg/Kg, IV, 1 x/dia, até 48h semfebre após o parto Esquema antibiótico para aumento de latência (realizar os 3) Azitromicina 1 g, VO, dose única Ampicilina 2 g, IV, 6h-6h, por 48h Amoxicilina Após a última dose de Ampicilina 500 mg, VO, 8h - 8h, por 5 dias Esquema antibiótico para aumento de latência em alérgicos a penicilina (realizar os 4) Azitromicina 1 g, VO, dose única Clindamicina 900 mg, IV, 8h - 8h, por 48h Gentamicina 5 mg/kg, 24h - 24h, no total de duas doses Clindamicina Após a última dose de Gentamicina 300 mg, VO, 8h - 8h, por 5 dias 116 Profilaxia para GBS (realizar um dos antibióticos) Penicilina G Cristalina Ataque: 5 milhões de UI, IV Manutenção: 2,5 milhões de UI, IV, 4h - 4h até o parto Ampicilina Ataque: 2 g, IV Manutenção: 1 g, IV, 4h - 4h até o parto Clindamicina 900mg, IV, 8h - 8h até o parto Para alérgicos a penicilina Fonte: SES-DF, 2017. ACOG, 2018. FLUXOGRAMA DA RPMO * Se parto nas próximas 24h ** Exceto se previsão de transferência *** Nos casos de cultura para GBS desconhecida ou positiva 117 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB ANEXO 1 Termo de Consentimento Livre e Esclarecido13 Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para Conduta em Casos de Rotura Prematura de Membranas antes de 22 Semanas de Gestação Eu, _______________________________________________________________, portadora de documento de identidade _________________________________, de maneira livre e consciente, confirmo que fui orientada pela equipe de saúde de que tive o diagnóstico de ROTURA PREMATURA DE MEMBRANAS, que significa que minha bolsa rompeu antes que se completasse o tempo necessário para que o feto amadurecesse. Confirmo também que fui orientada de que nessa idade gestacional, se houver o nascimento do feto, este não teria condições de sobrevivência nesse momento, pois ainda é considerado um produto de abortamento. Também fui orientada de que se optar por manter a gestação, corro riscos importantes, de infecção grave, com possibilidade de perda do meu útero e ovários e até infecção local e generalizada que pode levar à minha morte. Fui orientada também de que, se mantida a gestação, pode acontecer morte do feto a qualquer momento e que, no caso da remota possibilidade de a gestação chegar até a uma idade mais avançada, a criança gerada pode ter vários problemas graves em decorrência disso, como o não desenvolvimento dos pulmões, malformações das pernas e braços, cegueira, retardo mental, necrose do intestino, paralisia cerebral e outras complicações que podem levar à morte ou a outras sequelas. Assim, ciente dessas orientações, ( ) CONSINTO que se façam procedimentos para adiantar o abortamento ou o parto. Data: ___/___/______ _______________________ _______________________ Assinatura da paciente Assinatura do médico 1 _______________________ _______________________ Assinatura de familiar Assinatura do médico 2 ( ) NÃO CONSINTO que se façam procedimentos para adiantar o abortamento ou parto. Data: ___/___/______ _______________________ _______________________ Assinatura da paciente Assinatura do médico 1 _______________________ _______________________ Assinatura de familiar Assinatura do médico 2 118 REFERÊNCIAS 1. FEBRASGO. Rotura prematura de membranas ovulares: protocolo clínico. Obstetrícia, n30, 2018. 2. Scorza, W. E. Management of prelabor rupture of the fetal membranes at term. UpToDate, 2020. 3. ACOG. Practice Bulletin No. 188: Prelabor Rupture of Membranes. Obstet Gynecol;131(1): e1-14, 2018. 4. Martins-Costa, S.H. et a. Rotinas em Obstetrícia. Artmed Editora Ltda, 2017. 5. FHEMIG. Rotura prematura das membranas. Diretrizes Clínicas. Protocolos Clínicos, 2019. 6. EBSERH. Protocolo Clínico: Ruptura Prematura de Membranas. Universidade Federal do Ceará, 2017. 7. Duff, P. Preterm prelabor rupture of membranes: Management and outcome. UpToDate, 2020. 8. Ministério da Saúde. Gestação de Alto Risco: Manual técnico. 5ªth ed. Brasília: Editora MS; 79-84 p. único vol, 2012. ISBN: 978-85-334-1767-0. 9. ACOG. Practice Bulletin No. 217: Prelabor Rupture of Membranes. Obstet Gynecol;135(3), 2020. 10. Morris J.M et al., on behalf of the PPROMT Collaboration. Immediate delivery compared with expectant management after preterm pre-labour rupture of the membranes close to term (PPROMT trial): a randomised controlled trial. The Lancet. Published Online November 9, 2015 http://dx.doi.org/10.1016/ S0140- 6736(15)00724-2. 11. Bond DM, Middleton P, Levett KM, et al. Planned early birth versus expectant management for women with preterm prelabour rupture of membranes prior to 37 weeks’ gestation for improving pregnancy outcome. Cochrane Database Syst Rev 2017; 3:CD004735. 12. Thomson AJ, Royal College of Obstetricians and Gynaecologists. Care of Women Presenting with Suspected Preterm Prelabour Rupture of Membranes from 24+0 Weeks of Gestation: Green-top Guideline No. 73. BJOG 2019; 126:e152. 13. Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Rotura prematura de membranas. Protocolo de Atenção à Saúde, 2017. 14. Zugaib, M.; Bittar, R.E.; Francisco, R.P.V. Protocolos Assistenciais. 5ª ed. Clínica Obstétrica FMUSP, 2015. 15. Simhan, H.N; Hilmes, M.P. Neuroprotective effects of in utero exposure to magnesium sulfate. UpToDate, 2020. 16. Lee, MJ. Antenatal corticosteroid therapy for reduction of neonatal respiratory morbidity and mortality from preterm delivery. UpToDate, 2020. 119 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 17. Haas DM, McCullough W, McNamara MF, Olsen C. The first 48 hours: Comparing 12-hour and 24-hour betamethasone dosing when preterm deliveries occur rapidly. J Matern Fetal Neonatal Med. 2006 Jun;19(6):365-9. doi: 10.1080/14767050600715873. PMID: 16801314. 18. Khandelwal M, Chang E, Hansen C, Hunter K, Milcarek B. Betamethasone dosing interval: 12 or 24 hours apart? A randomized, noninferiority open trial. Am J Obstet Gynecol. 2012 Mar;206(3):201.e1-11. doi: 10.1016/j.ajog.2012.01.025. PMID: 22381601. 19. Norwitz, E.R. Progesterone supplementation to reduce the risk of spontaneous preterm birth. Up To Date, 2020. 20. Baker, Carol J. Neonatal group B streptococcal disease: Prevention. Up To Date, 2021. 120 CRESCIMENTO INTRAUTERINO RESTRITO Daniela Vinhaes dos Reis Zilma Eliane Ferreira Alves Carolina Genaro Pultrin INTRODUÇÃO A Restrição de Crescimento Fetal (RCF) não é uma doença específica, mas a manifestação de muitos distúrbios fetais, placentários e maternos que afetam 5% - 10% das gestações.1 A RCF precoce (< 32 semanas) apresenta alta taxa de mortalidade perinatal e está fortemente relacionada à alteração da implantação placentária e, consequentemente, à pré-eclâmpsia.2,3 Por outro lado, a RCF tardia (≥ 32 semanas) tem pouca relação com a pré-eclâmpsia e pode apresentar doppler da artéria umbilical normal mesmo com a centralização hemodinâmica, tendo, assim, um diagnóstico precoce mais difícil, podendo o óbito fetal ocorrer de forma rápida e inesperada.2,3 Além disso, a RCF pode ser classificada em simétrica e assimétrica. A restrição de crescimento simétrica corresponde a 20% - 30% dos casos e indica um comprometimento precoce de hiperplasia global – com isso todos os órgãos são proporcionalmente reduzidos.4 Em contraste, a assimétrica ocorre em 70% - 80% dos casos e é caracterizada pela maior redução da circunferência abdominal do que da cefálica. Isso acontece devido àcapacidade de adaptação fetal em fases mais tardias da gestação, por meio da redistribuição do fluxo sanguíneo para órgãos nobres quando há um ambiente intrauterino desfavorável.4 Após confirmada a alteração de crescimento, ela é subdividida em duas categorias: crescimento intrauterino restrito (CIUR) e feto constitucionalmente pequeno para idade gestacional (PIG).5,6,7 Existem várias definições na literatura sobre CIUR. Assim, com base na ausência de uniformidade dos critérios diagnósticos, foi publicado em 2016 o Consensus definition of fetal growth restriction: a Delphi procedure, que define as duas formas de CIUR (precoce e tardio).8 121 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 1 - Definição de Crescimento Intrauterino Restrito (CIUR) na Ausência de Malformações Congênitas CIUR precoce CIUR tardio Idade Gestacional < 32 semanas ≥ 32 semanas Parâmetros CA/PFE < p3 ou AU com fluxo diastólico final ausente ou 1. CA/PFE < p10 e 2. IP da AUt > p95 e/ou 3. IP da AU > p95 CA/PFE < p3 ou Pelo menos 2 dos 3 parâmetros: 1. CA/PFE < p10 2. Redução do CA ou PFE em > 2 quartis de curvas de crescimento 3. Razão cerebroplacentária < p5 ou IP da AU > p95 Abreviaturas: CIUR (crescimento intrauterino restrito); CA (circunferência abdominal); PFE (peso fetal estimado); p (percentil); AUt (artéria uterina); AU (artéria umbilical); IP (índice de pulsatilidade) Adaptado de: Consensus definition of fetal growth restriction: a Delphi procedure. Ultrasound Obstet Gynecol. 48: 333–33, 2016. Destacamos que a identificação pré-natal dos fetos com alterações de crescimento por meio da altura uterina é insatisfatória, com taxa de detecção por volta de 25% em gestações de alto risco e de 15% em gestações de baixo risco. A maior parte dos casos de natimortos evitáveis está relacionada à falha na detecção pré-natal desses fetos.6,7 A morbidade é de 19,8/1.000 nascimentos nos casos não diagnosticados intraútero, comparado a 9,7/1.000 quando o CIUR foi identificado durante o pré-natal.5 Portanto, é extremamente relevante detectar esses fetos, com o objetivo de permitir intervenções que podem melhorar os resultados perinatais.6,7,9 A morbidade perinatal é cerca de cinco vezes maior para os recém-nascidos (RN) afetados pela restrição de crescimento, com maiores taxas de hipoglicemia, hipocalemia, policitemia, hemorragia pulmonar, hipotermia, aspiração meconial e prejuízo no desenvolvimento psicomotor.5 122 Além disso, fetos com CIUR e PIG apresentam prevalência aumentada de resultados adversos a longo prazo, acarretando implicações importantes na saúde na vida adulta.6,7 Ou seja, estão associados a maior risco de morbidades, como coronariopatia, dislipidemia, hipertensão arterial e diabetes.5,9 ETIOLOGIA E FATORES DE RISCO Os fatores supostamente associados à restrição de crescimento fetal podem ser divididos em maternos, fetais, genéticos e uteroplacentários, conforme a Tabela 2. Porém, 40% dos casos têm etiologia desconhecida.1 Tabela 2 - Fatores associados à Restrição de Crescimento Fetal1 Fatores Maternos Fatores Fetais Fatores Uteroplacentários Idade: < 20 anos ou > 35 anos Peso: início da gestação com peso < 54 kg ou ganho < 6 kg na gestação História prévia de RCF Primiparidade e multiparidade Intervalo entre as gestações: < 2 anos Baixas condições socioeconômicas e baixa escolaridade Tabagismo Uso de álcool e drogas ilícitas Teratógenos: anticonvulsivantes, antineoplásicos e outros Técnicas de reprodução assistida Doenças maternas: doença renal crônica, pré-eclâmpsia e hipertensão crônica, diabetes mellitus pré-gestacional, doença cardiopulmonar crônica, lúpus eritematoso sistêmico, trombofilias, infecção do trato urinário e anemia crônica grave Anormalidades genéticas, cromossômicas e patologias fetais Infecção intrauterina Gestações múltiplas Anormalidades uterinas Anormalidades placentárias: placenta prévia, placenta bilobada, inserção velamentosa de cordão, corioangioma, artéria umbilical única, síndrome de transfusão feto- fetal e mosaico placentário Abreviatura: RCF (restrição de crescimento fetal). Fonte: Martins-Costa S H, et al. Rotinas em Obstetrícia. 7ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2017. 123 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Os casos secundários a infecções virais precoces e causados por alterações genéticas têm prognóstico associado à natureza e gravidade da patologia de base. Por sua vez, casos associados à insuficiência placentária em fetos normais têm prognóstico totalmente dependente do diagnóstico precoce e do manejo obstétrico e neonatal adequados para que sejam reduzidos os riscos neonatais.1 Assim, o CIUR associado à insuficiência placentária tem maior risco de resultados adversos perinatais, sendo causa importante do aumento da morbidade e mortalidade perinatais.5,7Já os fetos PIG normalmente não têm comprometimento placentário e têm resultados perinatais habituais.6,7 PREVENÇÃO O uso de aspirina para prevenção de pré-eclâmpsia está bem estabelecido na literatura. Entretanto, há controvérsia sobre o seu uso na prevenção de CIUR.11 Devido à forte relação da pré-eclâmpsia e da CIUR precoce e em consonância com as sociedades do Reino Unido, Nova Zelândia, Canadá, Irlanda e França, recomendamos o uso de aspirina para a prevenção de CIUR nas gestantes de risco.11 Logo, orientamos iniciar aspirina 100 mg/dia, na hora de dormir, com 12 a 16 semanas e suspender com 34 a 36 semanas.12,13 DIAGNÓSTICO Quando existe suspeita de CIUR por meio de fatores de risco ou exame clínico, a ultrassonografia deve ser o método escolhido para ratificar ou excluir esse diagnóstico.4 A circunferência abdominal (CA) é a medida ultrassonográfica que apresenta maior sensibilidade para diagnóstico de CIUR e geralmente é a primeira a se alterar, porém é menos específica.2,14,15 Em contraste, utilizar o peso fetal estimado (PFE) abaixo do p10 aumenta a especificidade do diagnóstico de CIUR.2 As recomendações de duas grandes entidades de Obstetrícia para o diagnóstico de CIUR são:4 1. O Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas (ACOG) considera um PFE < p10 sugestivo de CIUR.16 124 2. O Royal College of Obstetricians and Gynecologists (RCOG) considera o PFE < p10 ou CA < p10 para o diagnóstico de CIUR.17 Essa classificação é discretamente mais sensível quando comparada à classificação da ACOG. A dopplerfluxometria da artéria umbilical, artéria cerebral média e artérias uterinas consiste no primeiro exame a ser solicitado após a suspeita ultrassonográfica de CIUR.1 A avaliação do fluxo do ducto venoso não é utilizada para diagnóstico, está indicada nos casos de CIUR em fetos já bem comprometidos com fluxo da artéria umbilical alterado, sendo muito usado para avaliar o momento da interrupção nos fetos muito prematuros.1 O feto classificado como PIG é aquele com PFE inferior ao percentil 10 e maior que o percentil 3 para IG, com dopplerfluxometria das artérias uterinas, artéria umbilical e artéria cerebral média dentro da normalidade.6,7,10 Características que corroboram o diagnóstico de feto PIG são: PFE de p5 a p10; velocidade de crescimento normal durante a gestação; fisiologia normal; velocidade de crescimento da CA > p10; tamanho apropriado para a genética materna (tamanho, peso, etnia).18 O feto classificado como CIUR é aquele com PFE inferior ao percentil 3 ou PFE inferior ao percentil 10 com dopplerfluxometria das artérias uterinas, artéria umbilical e artéria cerebral média alterados,6,7,10 conforme o Fluxograma 1. Apesar de não termos disponíveis na Secretaria de Saúde, existem marcadores bioquímicos (PAPP-A, P1GF, fração livre do B-HCG, PP-13 e ADAM-12) que, aliados aos parâmetros do doppler, podem ser realizados no primeiro trimestre para definir a população que deve ser precocemente tratada, a fim de diminuir as complicações dessaentidade.20 Salientamos que o centro de Medicina Fetal de Barcelona propõe um protocolo para as restrições de crescimento fetal, que está disponível no link a seguir: https://medicinafetalbarcelona.org/calc/. 125 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Fluxograma 1: Diagnóstico Ultrassonográfico5,9,10 CONDUTA ASSISTENCIAL O acompanhamento da gestante com CIUR deve ser realizado em centro terciário, em razão das complicações perinatais e da necessidade de avaliações mais complexas.4,5 Não existe tratamento comprovadamente benéfico e efetivo para a restrição de crescimento fetal.5,6,9 Sendo assim, os principais objetivos quando se 126 suspeita de CIUR são: esclarecer a etiologia e definir o melhor momento para a resolução da gestação.1,5,6 O diagnóstico de CIUR no segundo trimestre implica a realização da ultrassonografia morfológica e ecodopplercardiografia. Se houver alterações sugestivas de aneuploidias, deve-se propor o estudo do cariótipo fetal e a revisão e repetição das sorologias de infecção congênita.1 A monitorização da vitalidade fetal será realizada com ultrassonografia obstétrica com dopplerfluxometria, de acordo com a classificação da restrição de crescimento fetal, conforme o Fluxograma 2.6,9,10 Porém, se o CIUR for associado à pré-eclâmpsia, deve-se aumentar um estágio na classificação em termos de seguimento da gestação.10 Os casos classificados com PIG devem ser acompanhados a cada duas semanas por ultrassonografia e dopplerfluxometria e, se persistem normais, é recomendada a indução do parto (vide capítulo de Gestação Prolongada).1,3,9 Segundo a ACOG em 2021, o parto é recomendado entre 38 e 39 semanas.20 A monitorização da vitalidade fetal durante o trabalho de parto deve ser realizada com maior frequência.4, 6 A indicação do momento de interrupção da gestação também será de acordo com a classificação da RCF, porém associada a IG, conforme o Fluxograma 2.6,9,10 Entretanto, a interrupção da gestação pode ter uma indicação materna, que consiste em uma doença com agravamento clínico, que independe da RCF.5 O modo de parto é decidido conforme a etiologia do CIUR, grau de comprometimento fetal, classificação da RCF e presença de alteração de ducto venoso (sinal indireto de acidemia), IG e quantidade de líquido amniótico (LA).1,6,9,10 Cada caso deve ser individualizado na escolha da via de parto mais adequada,1 sendo que o CIUR estágio I não possui contraindicação ao parto via vaginal e a indução do parto pode ser realizada.6,9,10 Entretanto, fetos com CIUR estágio I devem ter monitorização fetal contínua por meio da cardiotocografia (CTB).9,10 A cesariana sem tentativa de parto vaginal é uma opção apropriada para os casos de prematuridade extrema e alterações graves na ultrassonografia com doppler.1 Sendo assim, fetos com CIUR estágios II, III e IV são indicações de cesárea eletiva.6,9,10,18 Nos casos de CIUR, o clampeamento do cordão umbilical deve ser precoce, logo após o primeiro movimento respiratório do RN, evitando-se maior transferência de glóbulos vermelhos e piora na policitemia encontrada nesses RN.1 O fluxograma 2 trata da conduta obstétrica de acordo com o diagnóstico e com a classificação da RCF. 127 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Fluxograma 2: Classificação da RCF e Conduta Obstétrica5,6,9,10 Le ge nd a: A UF = A ltu ra d o fu nd o ut er in o / I G = Id ad e g es ta ci on al / US G = Ul tra ss on og ra fia / PF E = Pe so fe ta l e st im ad o / P IG = Pe qu en o pa ra id ad e g es ta ci on al CI UR = C re sc im en to in tra ut er in o re st rit o / I P = Ín di ce d e pu lsa til id ad e / A UT = A rté ria u te rin a / A U = Ar té ria u m bi lic al / AC M = A rté ria c er eb ra l m éd ia DV = D uc to v en os o / I CP = Ín di ce c ér eb ro pl ac en tá rio . 128 REFERÊNCIAS 1. Martins-Costa S H, Ramos J G L, Magalhães J A, Passos E P, Freitas F. Rotinas em Obstetrícia. 7ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2017. 2. Baschat AA, Planning management and delivery of the growth restricted fetus, Best Practice & Research Clinical Obstetrics & Gynaecology (2018), doi: 10.1016/ j.bpobgyn.2018.02.009. 3. Ginecologia e Obstetrícia: Febrasgo para o médico residente. Coordenação: Almir Antonio Urbanetz. Manole. 2ª ed, 2021. 4. Divon, MY. Fetal growth restriction: Screening and diagnosis, Up to Date, Jan 2021. 5. Martinelli S, Zugaib M, Francisco RP, Bittar RE. Restrição do crescimento fetal. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO); 2018. (Protocolo FEBRASGO - Obstetrícia, no. 35/ Comissão Nacional Especializada em Medicina Fetal). 6. Figueras F, Gratacós E. An integrated approach to fetal growth restriction. Best Practice & Research Clinical Obstetrics and Gynaecology. 2017;38:48-58. 7. Figueras F, Gratacós E. Update on the Diagnosis and Classification of Fetal Growth Restriction and Proposal of a Stage-Based Management Protocol. Fetal Diagn Ther. 2014;(36):86-98. 8. Ultrasound Obstet Gynecol 2016; 48: 333–339 DOI: 10.1002/uog.15884 Consensus definition of fetal growth restriction: a Delphi procedure. 9. Governo do Distrito Federal / Secretaria de Estado de Saúde / Subsecretaria de Atenção Integral à Saúde / Comissão Permanente de Protocolos de Atenção à Saúde. Fetos Pequenos para a Idade Gestacional e Restrição de Crescimento Fetal. Portaria SES-DF Nº 1356, publicada no DODF Nº 238. 2018. 10. Figueras F, Gómez L, Eixarch E, Paules C, Mazarico E, Pérez M et al. Protocolo: Defectos del crecimiento fetal. Hospital Clínic, Hospital Sant Joan de Déu, Universitat de Barcelona. 2019. 11. McCowan. Evidence-based national guidelines for management of suspected fetal growth restriction. Am J Obstet Gynecol 2018. 12. Roberge S, Nicolaides K, Demers S, Hyett J, Chaillet N, Bujold E. The role of aspirin dose on the prevention of preeclampsia and fetal growth restriction: systematic review and meta-analysis. Am J Obstet Gynecol 2017;216: 110-20.e116. 13. Hermida, R.C., et al. Chronotherapy with low-dose aspirin for prevention of complications in pregnancy. Chronobiol Int, 30(1-2):260-79, 2013. 129 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 14. Brown HL, Miller JM Jr, Gabert HA, Kissling G Ultrasonic recognition of the small- for-gestational-age fetus. Obstet Gynecol. 1987;69(4):631. 15. Chang TC, Robson SC, Boys RJ, Spencer JA. Prediction of the small for gestational age infant: which ultrasonic measurement is best? Obstet Gynecol. 1992;80(6):1030. 16. ACOG Practice Bulletin No. 204: Fetal Growth Restriction.American College of Obstetricians and Gynecologists’ Committee on Practice Bulletins—Obstetrics and the Society forMaternal-FetalMedicin Obstet Gynecol. 2019;133(2):e97. 17. Royal College of Obstetricians and Gynaecologists. The investigation and management of the small for gestational age fetus. Green-top Guideline No. 31. London (United Kingdom): RCOG; 2013. 18. Mari, Giancarlo. Fetal growth restriction: Evaluation and management. Up to Date, 2021. 19. Francisco, RPV; Mattar, R; Quintana, SM. Manual de Obstetrícia da SOGESP. Editora dos Editores, 2020. 20. ACOG Committee Opinion No. 818: Medically, Indicated Late-preterm and Early Term Deliveries. American College of Obstetricians and Gynecologists. Obstet Gynecol. 2021;137(2): e29. 130 INTRODUÇÃO Neste capítulo abordaremos as implicações do Diabetes Mellitus (DM) prévio à gestação e Diabetes Mellitus Gestacional (DMG). O DM é um distúrbio metabólico de etiologia múltipla, caracterizado por hiperglicemia crônica, com alteração do metabolismo dos carboidratos, das gorduras e das proteínas decorrente de defeitos na secreção ou ação da insulina ou de ambos.1 Define-se DMG como a intolerância variável a carboidratos diagnosticada durante a gestação, que nãoatenda aos critérios para o diagnóstico de Diabetes Mellitus (DM) fora do período gestacional. Caso o nível glicêmico atenda aos critérios para DM, deve-se atentar para o diagnóstico de DM prévio à gestação.2 O DMG é a desordem metabólica mais frequente observada em pré-natal, com uma estimativa de prevalência de até 18% no Brasil. Paralelamente, a ocorrência de gestações em mulheres com diabetes pré-gestacional tem aumentado nas últimas décadas.3,4 Estudo na população dos Estados Unidos da América revelou que, no início dos anos 2000, o Diabetes Mellitus tipo 1 (DM1) estava presente em 7% das gestações complicadas pelo diabetes, enquanto o Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2) aparecia em 4,7% delas.3 Logo, é fundamental que o especialista saiba diagnosticar e conduzir os casos confirmados. É muito importante a diferenciação entre os tipos de diabetes, uma vez que causam impactos diversos sobre o curso da gravidez e o desenvolvimento fetal. Mulheres que são diagnosticadas com DMG apresentam maiores riscos para o desenvolvimento de DM posteriormente. A mesma relação é descrita para crianças de mães diabéticas, as quais também apresentam risco aumentado de desenvolverem obesidade, síndrome metabólica e diabetes na vida futura.4 DIABETES NA GESTAÇÃO Ana Medeiros Farias da Mata Caio de Oliveira Reges Zilma Eliane Ferreira Alves 131 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB CLASSIFICAÇÃO E DIAGNÓSTICO A classificação etiológica do DM está apresentada no quadro abaixo: Quadro 1: Classificação etiológica do Diabetes Mellitus Classificação etiológica do Diabetes Mellitus DM-1: Destruição das células B-pancreáticas, geralmente levando à deficiência absoluta de insulina DM-2: Redução progressiva da secreção de insulina subjacente a estado de resistência à insulina DMG: Diagnosticado durante a gestação que não alcança os critérios para DM prévio Tipos específicos de DM secundário e outras causas: Sd. monogênicas (DM neonatal e o MODY), doenças do pâncreas exócrino (fibrose cística) e DM induzido por fármacos ou agentes químicos Adaptado de Rotinas em obstetrícia. 7ªEd. 2017. O diagnóstico é laboratorial e sua confirmação depende do nível glicêmico sérico e do momento da coleta. Cabe ressaltar que não há necessidade de contraprova do exame, exceto quando há dúvida da confiabilidade, portanto, um resultado alterado confiável confirma o diagnóstico de DM ou DMG.4 Para afirmar a presença de DM, basta que a paciente apresente glicemia de jejum (de 8 a 12 horas) ≥ 126 mg/dL12 ou em coleta aleatória valor > 200 mg/dL associado a sintomas inequívocos de hiperglicemia como poliúria, polidipsia e polifagia.3 Ao se tratar de DMG, atualmente, a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam como ponto de corte uma glicemia de jejum (GJ) entre 92 mg/dL - 125 mg/dL, antes de 20 semanas. Caso a glicemia de jejum esteja abaixo de 92 mg/dL na primeira avaliação, todas as gestantes deverão ser encaminhadas, preferencialmente entre 24 e 28 semanas, para realizar o teste oral de tolerância à glicose 75g (TOTG), que tem como ponto de corte para glicemia de jejum, 1 e 2 horas após sobrecarga, os valores de ≥ 92 mg/dL, ≥ 180 mg/dL e ≥ 153 mg/dL, respectivamente.3 Caso o pré-natal tenha sido iniciado tardiamente, a paciente deve ser encaminhada para realização do teste imediatamente. 132 A hemoglobina glicada (HbA1C) não é usada para diagnóstico de diabetes gestacional e não está nos protocolos de rastreamento de nenhuma sociedade. Ela pode ser útil em gestantes com diagnóstico prévio de DM1 ou DM2 para avaliar controle glicêmico no momento da concepção e ser realizada trimestralmente até a meta de controle glicêmico entre 6,0% - 6,5%.3 Fluxograma 1. Rastreio e diagnóstico de Diabetes Gestacional Fonte: Adaptado de Diretrizes Sociedade Brasileira de Diabetes. SBD, 2020. ORIENTAÇÕES Com relação ao DM prévio, o ideal é uma consulta pré concepcional para avaliação dos níveis glicêmicos com intuito de reduzir as chances de malformações fetais, abortamento e mortalidade perinatal, por meio do controle metabólico adequado no período da concepção e da organogênese. Assim, pacientes com controles inadequados devem ser desencorajadas a engravidar até atingir HbA1c em torno de 7% e naquelas com valores acima de 10% a gestação está contraindicada. Métodos contraceptivos seguros devem ser empregados até que o controle glicêmico satisfatório seja obtido.5 As gestantes com diagnóstico de Diabetes Mellitus devem receber orientações nutricionais com o objetivo de atingir as metas glicêmicas, ganho de peso 133 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB materno adequado e para prevenir a ocorrência de desfechos fetais e neonatais desfavoráveis. Tabela 1. Avaliação de ganho de peso durante a gestação IMC pré-gestacional (kg/m²) Ganho de peso (kg) total até a 14ª semana Ganho de peso (kg) semanal a partir da 14ª semana Ganho de peso (kg) total na gestação Baixo peso: < 18,5 1,0 – 3,0 0,51 (0,44 – 0,58) 12,5 – 18,0 Adequado: 18,5 – 24,9 1,0 – 3,0 0,42 (0,35 – 0,50) 11,5 – 16,0 Sobrepeso: 25 – 29,9 1,0 – 3,0 0,28 (0,23 – 0,33) 7,0 – 11,5 Obesidade: ≥ 30,0 0,2 – 2,0 0,22 (0,17 – 0,27) 5,0 – 9,0 Fonte: Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional no Brasil. OPAS, 2019 Devem ser orientadas a fracionar as refeições: pelo menos três refeições principais (café da manhã, almoço e jantar) e dois ou três lanches saudáveis por dia, evitando intervalos maiores de três horas. Gestantes em uso de insulina devem manter os horários fixos das refeições, minimizando-se assim variações glicêmicas.6 As gestantes devem ser encorajadas a continuar ou a iniciar prática de atividade física, optando por modalidades que ofereçam maior segurança e conforto para o período gestacional, além de interromper vícios, como tabagismo e etilismo.6 Nas pacientes com DM prévio, tipo 1 ou tipo 2, é recomendado o uso de ácido acetilsalicílico profilático 100 mg/noite, com início entre 12 e 16 semanas de gestação, com a finalidade de diminuir o risco de pré-eclâmpsia.7,13 A administração de estatinas e fibratos para tratamento de dislipidemia deve ser suspensa nas gestantes que usavam essas medicações previamente. Em casos de hipertrigliceridemia grave e refratária ao tratamento com dieta e uso de ômega-3, pode ser avaliado o uso de fibratos a partir do terceiro trimestre.3 PROPEDÊUTICA COMPLEMENTAR Devem ser realizados, como método de rastreio, exame de fundo de olho e avaliação 134 de função renal (relação proteína/creatinina e microalbuminúria) nas pacientes com DM prévio.5 Ao longo do 3° trimestre, é importante que seja solicitado USG obstétrico para avaliar o desenvolvimento do feto e se há repercussões fetais presentes, como macrossomia fetal, isto é, peso fetal estimado (PFE) ≥4.000g.12 O controle ultrassonográfico do crescimento fetal pode ser realizado, a partir do diagnóstico de DMG, a cada 2 a 4 semanas, até o parto.14 A idade gestacional ideal para o screening de anomalias cardíacas é entre 18 e 22 semanas,15 mas em nosso serviço o ecocardiograma fetal é solicitado para todas as gestantes com diabetes pré-gestacional em torno da 28ª semana, podendo ser antecipado caso apresente alterações em ecografias morfológicas.5,11 No Serviço de Alto Risco (SAR) do HMIB, realizamos cardiotocografia (IG > 32 semanas) e ecografia gestacional em todas as pacientes diabéticas no momento da admissão. A cardiotocografia deve ser repetida, usualmente, 2 x/semana ou mais brevemente, a depender da avaliação clínica.16 CONTROLE GLICÊMICO Nas gestações complicadas pelo Diabetes, a monitorização da glicemia deve ser realizada a partir do diagnóstico e até o pós-parto visando à avaliação da eficácia e da adesão à terapêutica e, consequentemente, obtenção de controle glicêmicoadequado. O mais indicado é a automonitorização da glicemia capilar, utilizando fitas reagentes e glicosímetros.6 A frequência de monitoramento é acertada entre o paciente e o médico assistente, pois a manutenção de um acompanhamento adequado depende da disponibilidade de material, logo, em determinadas situações, devemos nos adequar à realidade da paciente. Inicialmente, o controle glicêmico preconizado é feito com quatro medidas ao longo do dia: em jejum e após as principais refeições (café/almoço/jantar). Ressalta-se que a contagem do tempo para aferir as medidas pós-prandiais (1h ou 2h) deve ser iniciada a partir do início das refeições (first bite), e não ao terminar a alimentação.17 Deve-se utilizar preferencialmente a aferição de 1h pós-prandial, pois ela corresponde à forma mais fidedigna dos valores glicêmicos, especialmente nas pacientes em uso de insulina.17 135 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 2. Metas de controle glicêmico na gestação METAS DE CONTROLE GLICÊMICO NA GESTAÇÃO Horário Jejum 1 horapós-prandial 2 horas pós-prandial Pré-prandial Limites de glicemia < 95 mg/dL < 140 mg/dL < 120 mg/dL <100 mg/dL **CA no p ≥ P75: controle mais restrito em torno de 80mg/dl para GJ e de 100 mg/dl 2h pós-prandial **CA no ≤ p25: controle mais flexível em torno de 100 para GJ e de 140mg/dl 2h pós-pran- dial. Protocolos assistenciais, clínica obstétrica, FMUSP 5ª Edição. 2016 O controle metabólico é considerado adequado quando se observam, no mínimo, 70% dos valores glicêmicos dentro dos alvos terapêuticos. Quando o peso fetal estimado estiver ≥ p75 para a idade gestacional, o controle deve ser mais restrito, com pelo menos 80% das medidas dentro do alvo terapêutico.6 TRATAMENTO Após duas semanas de dieta ou antes, conforme indicação clínica e idade gestacional do diagnóstico, se os níveis glicêmicos permanecerem fora dos alvos terapêuticos deve-se iniciar tratamento farmacológico.3 Existem duas opções de tratamento farmacológico: insulinoterapia e agentes anti- hiperglicemiantes orais (metformina). No SAR do HMIB, optamos pela insulina como terapia farmacológica de primeira escolha e deixamos o uso de anti- hiperglicemiantes orais para as pacientes que se recusam a utilizar ou que não conseguem compreender de forma adequada a insulinoterapia.17 O tipo e a dose de insulina a ser aplicada dependem do perfil glicêmico apresentado pela paciente. Usaremos as insulinas de ação intermediária (NPH) ou lenta (Detemir) para controle das glicemias em jejum e pré-prandiais e as de ação rápida (Regular) ou ultrarrápida (Asparte e Lispro) para controle das pós-prandiais. Quando optado por insulina NPH, a dose deve ser fracionada em três doses diárias com metade da dose total antes do desjejum, um quarto da dose antes do almoço e um quarto da dose às 22h. Caso haja disponibilidade de Detemir, a dose deve ser dividida em duas doses diárias.2 As doses de insulina regular devem ser feitas 30 minutos 136 antes das refeições e as de ultrarrápida, 15 minutos antes. Tabela 3. Dose total inicial de insulina por dia DOSE INICIAL DIÁRIA DE INSULINA DMG 0,2 UI/kg a 0,5 UI/kg DM prévio – Primeiro trimestre 0,4 UI/kg a 0,7 UI/kg DM prévio – Segundo trimestre 0,8 UI / kg DM prévio – Terceiro trimestre 0,9 UI/ kg 35 a 41 semanas 1 UI/kg Rotinas em obstetrícia, 2017. Recomendamos que os ajustes sejam realizados a cada duas semanas, até 30 semanas, e semanalmente, após essa idade gestacional. Em caso de pacientes internadas para ajuste de dose, ou início de insulinoterapia, devemos corrigir as hiperglicemias com doses adicionais de insulina. As hiperglicemias identificadas nas avaliações pré-prandiais deverão ser corrigidas com a soma das doses de correção (insulina regular ou ultrarrápida) e a dose preestabelecida para refeição.9 Tabela 4. Correção de Hiperglicemia CORREÇÃO DE HIPERGLICEMIA COM INSULINA RÁPIDA E ULTRARRÁPIDA 121 – 140: 1 UI 161 – 180: 3 UI 201 – 240: 5 UI 141 – 160: 2 UI 181 – 200: 4 UI ≥ 241: 6 UI UpToDate, 2020. Sempre observar e orientar as pacientes quanto aos sinais e sintomas de hipoglicemia como rebaixamento do nível de consciência, sudorese, palpitações, parestesias, tremor de extremidades, distúrbios visuais e fome intensa. A hipoglicemia é classificada com níveis de glicemia <70 mg/dl.3 O tratamento da hipoglicemia deve ser realizado, preferencialmente, com a ingesta oral de 15 g a 20 g de carboidrato de rápida ação (½ copo de suco ou 4- 5 bolachas de água e sal ou 1 colher de sopa de açúcar ou 30 ml - 40 ml de glicose hipertônica 50%).18 Rever o valor da glicemia capilar após 15 minutos; se 137 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB não houver reversão da hipoglicemia, repetir o processo. Em seguida, a paciente deve ingerir um carboidrato de longa ação para evitar efeito rebote.18 Em casos de hipoglicemia severa (rebaixamento de nível de consciência), devemos realizar tratamento imediato com glicose hipertônica endovenosa (25 g de glicose a 50%, isto é, 5 ampolas) em bolus e sem diluição.18 Na ausência de acesso venoso periférico estabelecido, pode-se utilizar glucagon (1 mg) por via SC ou IM.18 Com relação às pacientes com DM 2 em uso de hipoglicemiante oral, a primeira linha de tratamento é a substituição do hipoglicemiante pela insulina, com exceção da metformina, que pode ser continuada e até iniciada, em casos selecionados conforme já explicitado anteriormente. A associação de metformina nos casos em uso de insulina pode ser uma boa opção terapêutica, para alcançar o controle glicêmico ideal em menor tempo.7 CORTICOTERAPIA EM 34 SEMANAS – 37 SEMANAS O hiperinsulinismo fetal, secundário à hiperglicemia materna, parece também implicar retardo da produção de surfactante pulmonar e na hipoxemia fetal crônica, mesmo na ausência de vasculopatia materna.8 O mau controle glicêmico associa-se ao retardo no aparecimento do fosfatidilglicerol, portanto, o uso de corticoterapia nos casos de interrupção antes de 37 semanas e após 34 semanas pode ser considerado e não está contraindicado nas gestantes diabéticas.8 MOMENTO DO PARTO O melhor indicador de sucesso na condução da gestação associada ao DM é o parto de um RN a termo, com complicações e mortalidade equivalentes aos da população geral. As indicações de interrupção da gestação estão discriminadas na Tabela 5 abaixo. Tabela 5. Interrupção da gestação INTERRUPÇÃO DA GESTAÇÃO Antes de 37 semanas DM prévio com complicações vasculares, dificuldades de controle glicêmico e PFE > 4.000 g ou CIUR ou natimorto prévio, deve ser discutido com a paciente, obstetra e endocrinologista para avaliar riscos e benefícios da manutenção da gestação. 138 37 semanas DM prévio ou DMG com insulinoterapia e PFE > 4.000 g sem complicações vasculares e controle glicêmico irregular. 38 semanas DM prévio ou DMG com insulinoterapia e/ou metformina, com PFE < 4.000g e controle glicêmico irregular sem complicações vasculares são candidatas à indução eletiva do parto na ausência de contraindicações obstétricas. 39 semanas DM prévio ou DMG em insulinoterapia e/ou metformina, bem controlada sem complicações vasculares e PFE < 4.000g, são candidatas à indução eletiva do parto na ausência de contraindicações obstétricas. 40 semanas Mulheres sem complicações com DMG compensado, controlando com dieta e PFE < 4.000 g Adaptado de ACOG, 2020 e Rotinas em obstetrícia, 2017. Abreviaturas: DM: Diabetes Mellitus; DMG: Diabetes Mellitus Gestacional; PFE: Peso fetal estimado; CIUR: Crescimento intrauterino restrito. Cabe ressaltar que a via de parto é uma decisão obstétrica, mas caso seja programada cesárea eletiva para as pacientes em uso de insulina deve-se manter a dose noturna de NPH e insulina regular e, em caso de Glargina, aplicar 50% da dose. Orienta-se que seja feito um terço da dose de insulina NPH pela manhã e, para a redução de riscosrelacionados ao jejum prolongado, faz-se importante a manutenção de hidratação venosa (soro fisiológico 0,9% ou ringer lactato, 30 ml/kg/dia) e aporte calórico mínimo (5 ampolas de glicose 50% diluídas em cada frasco de 500 ml de SF 0,9%, EV, de 6h/6h). Sugerimos não utilizar soro glicosado 5% como solução de hidratação em pacientes com dieta oral zero, haja vista que devido a sua osmolaridade, cerca de 80% do líquido infundido tende a permanecer no espaço extravascular. Se necessário, deve-se administrar infusão contínua de insulina regular ou ultrarrápida intravenosa com baixas doses. Durante o trabalho de parto, sugere-se manter a dieta liberada conforme a fase do parto, direcionada para paciente diabética, além da infusão de soro glicosado 5% a 125 ml/h.19 Tanto nas pacientes com programação de cesárea eletiva quanto em trabalho de parto ativo, deve-se realizar aferição da glicemia capilar de hora em hora, realizando as correções, caso necessário.19 A meta glicêmica, tanto para o parto cesáreo quanto para o parto vaginal, é estipulada entre 70 mg/dL – 120 mg/dL.3 139 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB PÓS-PARTO Entre 24h e 72h após o parto, suspender as medicações para pacientes com DMG, realizar medidas de glicemia de jejum e pós-prandiais e, se apresentar controle normal, suspender essas aferições.1,16 A maioria das mulheres apresentam normalização das glicemias nos primeiros dias após o parto.16 Ainda, deve-se ofertar dieta sem restrições e estimular o aleitamento materno que, além dos benefícios ao bebê, está associado à prevenção do diabetes tipo 2 em mulheres com histórico de DMG.16 Com relação às pacientes com DM 1 e 2, as doses de medicações pré-gravídicas devem ser retomadas no pós-parto e introduzida dieta específica.10 A realização do TOTG com 75 g de glicose, 6 semanas após o parto, é considerada o padrão-ouro para o diagnóstico de diabetes após a gestação.1,12,20 Caso o exame não apresente alteração, a paciente deverá ser avaliada anualmente, por meio de glicemia de jejum ou HbA1c, ou trienalmente pelo TOTG com 75 g de glicose, considerando os parâmetros para o diagnóstico de diabetes da população geral (não gestante).12, 20 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Diabetes mellitus gestacional in Sociedade Brasileira de Diabetes. Diretrizes Sociedade Brasileira de Diabetes. 2019 – 2020. CLANNAD: Editora Científica, 2020. 2. FRANCISCO, Rossana P. V. Diabetes Mellitus e Gravidez in Tratado de obstetrícia Febrasgo. Editores Cesar Eduardo Fernandes, Marcos Felipe Silva de Sá. Coordenação Corintio Mariani Neto. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Elsevier, 2019. 3. KALRA S, KALRA B, GUPTA Y. Glycemic management after antenatal corticosteroid therapy [Internet]. Vol. 6, North American Journal of Medical Sciences. Wolters Kluwer -- Medknow Publications; 2014 [cited 2020 Aug 18]. p. 71–5. Disponível em: /pmc/articles/PMC3968568/?report=abstract). 4. KITZMILLER JL, GAVIN L. Preexisting diabetes and pregnancy in Manual of Endococrinology and Metabolism, 3rd ed, Lippincott Williams e Wikins, 2002. 5. Management of Diabetes in Pregnancy in American Diabetes Association. Diabetes Care, Volume 43, Supplement 1, January 2020. S183-S192. 6. MARTINS-COSTA, Sérgio H. et al. Rotinas em obstetrícia. Artmed Editora, 2017. 7. Organização Pan-Americana da Saúde. Ministério da Saúde. Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. Sociedade Brasileira de Diabetes 140 - Rastreamento e diagnóstico de diabetes mellitus gestacional no Brasil. Brasília: OPAS, 2016. 8. Organização Pan-Americana da Saúde. Ministério da Saúde. Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. Sociedade Brasileira de Diabetes - Tratamento do diabetes mellitus gestacional no Brasil. Brasília: OPAS, 2019. 9. ZUGAIB, Marcelo [et al]. Protocolos assistenciais, clínica obstétrica, FMUSP 5ª Edição. São Paulo: Atheneu, 2016. 10. ZUGAIB, Marcelo Zugaib Obstetrícia. Editora Rosana Pulcineli Viera Francisco - 3ª Edição. São Paulo: Manole, 2016. 11. LOPES, Lilian. Ecocardiografia/Lilian Lopes. 1ª Edição. Rio de Janeiro, Revinter, 2016. 12. ACOG PRACTICE BULLETIN. Gestational Diabetes Mellitus. Clinical Management Guidelines for Obstetrician–Gynecologists. Number 190, 2018. 13. ACOG Gestational Hypertension and Preeclampsia. ACOG Practice Bulletin: Clinical Management Guidelines for Obstetrician-Gynecologists. Number 222, vol 135, n6, 2020. 14. Hod M, Kapur A, Sacks DA, et al. The International Federation of Gynecology and Obstetrics (FIGO) Initiative on gestational diabetes mellitus: A pragmatic guide for diagnosis, management, and care. Int J Gynaecol Obstet 2015; 131 Suppl 3:S173. 15. Donofrio MT, Moon-Grady AJ, Hornberger LK, et al. Diagnosis and treatment of fetal cardiac disease: a scientific statement from the American Heart Association. Circulation 2014; 129:2183. 16. Caughet, A.B. Gestational diabetes mellitus: Obstetric issues and management. Up to Date, 2020. 17. Durnwald, C. Gestational diabetes mellitus: Glycemic control and maternal prognosis. Up to Date, 2020. 18. Cryer, P. Hypoglycemia in adults with diabetes mellitus. UpToDate, 2020. 19. Kjos, S.L. Pregestational (preexisting) and gestational diabetes: Intrapartum and postpartum glycemic control. UpToDate, 2020. 20. American Diabetes Association. Management of Diabetes in Pregnancy: standards of medical care in diabetes, 2020. 141 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB SÍNDROMES HIPERTENSIVAS DA GRAVIDEZ Leonardo Ayres Coelho Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Lucila Nagata Maria Jocilda de Albuquerque Guimarães D’Oliveira INTRODUÇÃO As doenças hipertensivas na gestação são as principais causas de morbimortalidade materna, correspondendo a 4,6% das complicações gestacionais e 16% das mortes maternas mundialmente.1,2 Segundo dados do Center for Disease Control and Prevention, há aproximadamente uma morte materna relacionada à pré-eclâmpsia/eclâmpsia a cada 100.000 nascidos vivos nos Estados Unidos da América3. Mundialmente, estima-se que de 10% a 15% das mortes maternas são relacionadas à pré-eclâmpsia/eclampsia.4 Destaca-se que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, 99% dessas mortes maternas ocorrem em países de baixa e média renda.5 As complicações fetais e neonatais resultam da ocorrência de crescimento intrauterino restrito (CIUR) e oligodramnia, assim como o aumento na frequência de partos pré-termos, que resultam em elevadas taxas de morbimortalidade perinatal.6,7 ETIOLOGIA A patofisiologia e a etiologia da pré-eclâmpsia provavelmente têm componentes tanto maternos quanto fetais. Diversas hipóteses e teorias já foram discutidas a respeito da etiologia da pré-eclâmpsia. A patogênese mais aceita atualmente envolve alterações multifatoriais como: placentação deficiente (remodelamento anormal das artérias espiraladas, diferenciação defeituosa do trofoblasto, alterações de perfusão placentária e alterações de células da decídua); predisposição genética; alterações imunológicas; síndrome de resposta inflamatória sistêmica; desequilíbrio angiogênico; e fatores ambientais (baixo consumo de cálcio e obesidade). 8,9,10,11,12,13,14,15 142 FATORES DE RISCO E PREVENÇÃO A história clínica nos fornece dados importantes e é uma forma eficaz de identificar gestantes com maior risco de desenvolver pré-eclâmpsia, como demonstrado abaixo (Tabela 1). A avaliação dos fatores de risco prediz 30% das gestantes que desenvolvem pré-eclâmpsia.16 Pacientes com risco elevado para pré-eclâmpsia devem receber doses baixas de aspirina (75 mg/dia a 150 mg/dia). Utilizamos a dose de 100 mg/dia, conforme protocolo da Febrasgo,18 iniciada entre 12 semanas e 16 semanas de gestação, podendo ser mantida até o parto para profilaxia da pré-eclâmpsia.1,17 Entretanto, em consonância com o protocolo da Federação Brasileira de Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) , o serviço de altorisco do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB) interrompe a aspirina entre 34 e 36 semanas de gestação devido ao maior risco de sangramento em procedimentos cirúrgicos.18 Tabela 1 - Fatores de risco relacionados à ocorrência de pré-eclâmpsia Grau do risco Característica clínica Conduta Alto Síndrome do anticorpo antifosfolipídeo Se ≥ 1 dos fatores de alto risco Aspirina, 100 mg/dia, na hora de dormir19 Iniciar: IG 12 - 16 semanas Suspender: IG 34 - 36 semanas História anterior de pré-eclâmpsia Diabetes Mellitus preexistente Gestação múltipla Doença renal Hipertensão crônica Moderado Nuliparidade Se ≥ 2 dos fatores de moderado risco Considerar Aspirina, 100 mg/dia, na hora de dormir Iniciar: IG 12 - 16 semanas Suspender: IG 34 - 36 semanas Obesidade (IMC ≥ 30) História familiar de pré-eclâmpsia (mãe ou irmã) Idade ≥ 35 anos História pessoal: baixo peso ao nascer; pequeno para a idade gestacional; mais de 10 anos entre gestações Fonte: ACOG, 2020; FEBRASGO, 2019; Hermida, 2013. Abreviaturas: IMC (índice de massa corporal). IG (idade gestacional). 143 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Pode-se iniciar a suplementação de cálcio (Ca) na primeira consulta em todas as gestantes que apresentam baixa ingestão de Ca, mas em especial nas que também possuem alto risco de pré-eclâmpsia.18 A ingestão diária de cálcio elementar em gestantes deve ser de 1.000 mg/dia, se entre 19 e 50 anos, e 1.300 mg/dia, se entre 14 e 18 anos. Pacientes que atingem essa meta por meio de ingestão na alimentação não necessitam de suplementação de Ca (Anexo 1).18, 20 Assim, a dose recomendada para prevenção de PE em populações em que a ingestão de cálcio é deficiente varia de 1,5 g/dia a 2 g/dia de cálcio elementar. Essa dose pode ser dividida em três tomadas, de preferência com as refeições, para melhor aceitabilidade.2 Observamos que o carbonato de Ca disponível na Secretaria de Saúde é de 1.250 mg, isto é, cada comprimido possui o equivalente a 500 mg de Ca elementar. DIAGNÓSTICO As discussões mais recentes sobre o tema no mundo têm caminhado para a descontinuação no uso da nomenclatura mais generalista de Doença Hipertensiva Específica da Gravidez (DHEG) e o estabelecimento de quatro síndromes hipertensivas na gestação1,21 definidas como: hipertensão gestacional, hipertensão arterial crônica, pré-eclâmpsia e hipertensão arterial crônica sobreposta (ou superposta ou superajuntada) por pré-eclâmpsia. Sendo, ainda, a pré-eclâmpsia subdividida em: pré-eclâmpsia, pré-eclâmpsia com sinais de gravidade e síndrome HELLP (Tabela 2).22 As alterações pressóricas podem ser classificadas em:18 • Leve: PAS 140 mmHg-150 mmHg ou PAD 90 mmHg-100 mmHg • Moderada: PAS 150 mmHg-159 mmHg ou PAD 100 mmHg-109 mmHg • Grave: PAS ≥ 160 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg Tabela 2 - Diagnóstico das Síndromes Hipertensivas na Gestação 3 1.000 mg/dia, se entre 19 e 50 anos, e 1.300 mg/dia, se entre 14 e 18 anos. Pacientes que atingem essa meta não necessitam de suplementação de Ca (Anexo 1).18, 20 Assim, a dose recomendada para prevenção de PE em populações em que a ingestão de cálcio é deficiente varia de 1,5 g/dia a 2 g/dia de cálcio elementar. Essa dose pode ser dividida em três tomadas, de preferência com as refeições, para melhor aceitabilidade.2 Observamos que o carbonato de Ca disponível na Secretaria de Saúde é de 1.250 mg, isto é, cada comprimido possui o equivalente a 500 mg de Ca elementar. 4. Diagnóstico As discussões mais recentes sobre o tema no mundo têm caminhado para a descontinuação no uso da nomenclatura mais generalista de Doença Hipertensiva Específica da Gravidez (DHEG) e o estabelecimento de quatro síndromes hipertensivas na gestação1,21 definidas como: hipertensão gestacional, hipertensão arterial crônica, pré-eclâmpsia e hipertensão arterial crônica sobreposta (ou superposta ou superajuntada) por pré-eclâmpsia. Sendo, ainda, a pré-eclâmpsia subdividida em: pré-eclâmpsia, pré-eclâmpsia com sinais de gravidade e síndrome HELLP (Tabela 2).22 As alterações pressóricas podem ser classificadas em:18 ● Leve: PAS 140 mmHg-150 mmHg ou PAD 90 mmHg-100 mmHg ● Moderada: PAS 150 mmHg-159 mmHg ou PAD 100 mmHg-109 mmHg ● Grave: PAS ≥ 160 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg Tabela 2 - Diagnóstico das Síndromes Hipertensivas na Gestação Síndromes Hipertensivas na Gestação Síndrome Características Hipertensão Arterial Crônica (HAC) - Hipertensão antes da gestação ou com ≤ 20 semanas de IG - Hipertensão que persiste após 12 semanas do parto - PAS ≥ 140 mmHg ou PAD ≥ 90 mmHg - 2 aferições separadas por ≥ 4 horas* Hipertensão Gestacional (HAG) - Paciente previamente normotensa - Início com > 20 semanas de IG - PAS ≥ 140 mmHg ou PAD ≥ 90 mmHg - 2 aferições separadas por ≥ 4 horas* - Ausência de proteinúria - Ausência de sinais de gravidade da pré-eclâmpsia - Início com > 20 semanas de IG - PAS ≥ 140 mmHg ou PAD ≥ 90 mmHg (2 Ou (na ausência de proteinúria), início de pelo menos 1: 144 3 1.000 mg/dia, se entre 19 e 50 anos, e 1.300 mg/dia, se entre 14 e 18 anos. Pacientes que atingem essa meta não necessitam de suplementação de Ca (Anexo 1).18, 20 Assim, a dose recomendada para prevenção de PE em populações em que a ingestão de cálcio é deficiente varia de 1,5 g/dia a 2 g/dia de cálcio elementar. Essa dose pode ser dividida em três tomadas, de preferência com as refeições, para melhor aceitabilidade.2 Observamos que o carbonato de Ca disponível na Secretaria de Saúde é de 1.250 mg, isto é, cada comprimido possui o equivalente a 500 mg de Ca elementar. 4. Diagnóstico As discussões mais recentes sobre o tema no mundo têm caminhado para a descontinuação no uso da nomenclatura mais generalista de Doença Hipertensiva Específica da Gravidez (DHEG) e o estabelecimento de quatro síndromes hipertensivas na gestação1,21 definidas como: hipertensão gestacional, hipertensão arterial crônica, pré-eclâmpsia e hipertensão arterial crônica sobreposta (ou superposta ou superajuntada) por pré-eclâmpsia. Sendo, ainda, a pré-eclâmpsia subdividida em: pré-eclâmpsia, pré-eclâmpsia com sinais de gravidade e síndrome HELLP (Tabela 2).22 As alterações pressóricas podem ser classificadas em:18 ● Leve: PAS 140 mmHg-150 mmHg ou PAD 90 mmHg-100 mmHg ● Moderada: PAS 150 mmHg-159 mmHg ou PAD 100 mmHg-109 mmHg ● Grave: PAS ≥ 160 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg Tabela 2 - Diagnóstico das Síndromes Hipertensivas na Gestação Síndromes Hipertensivas na Gestação Síndrome Características Hipertensão Arterial Crônica (HAC) - Hipertensão antes da gestação ou com ≤ 20 semanas de IG - Hipertensão que persiste após 12 semanas do parto - PAS ≥ 140 mmHg ou PAD ≥ 90 mmHg - 2 aferições separadas por ≥ 4 horas* Hipertensão Gestacional (HAG) - Paciente previamente normotensa - Início com > 20 semanas de IG - PAS ≥ 140 mmHg ou PAD ≥ 90 mmHg - 2 aferições separadas por ≥ 4 horas* - Ausência de proteinúria - Ausência de sinais de gravidade da pré-eclâmpsia - Início com > 20 semanas de IG - PAS ≥ 140 mmHg ou PAD ≥ 90 mmHg (2 Ou (na ausência de proteinúria), início de pelo menos 1: 4 Pré- Eclâmpsia (PE) Pré-Eclâmpsia aferições separadas por ≥ 4 horas). Ou PAS ≥ 160 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg (confirmada em alguns minutos) E (pelo menos 1): - Proteinúria ≥ 300 mg/24h - Razão de Pur:Cur ≥ 0.3 - ≥ 2+ de proteinúria (1+ tem 71% de falso positivo, segundo a ACOG, 2020) - Plaquetas < 100.000/mm3 - Cr sérica > 1.1mg/dL ou 2x o valor basal - TGO ou TGP > 2x o normal - Edema pulmonar - Sintomas visuais ou cefaleia persistentes Pré-Eclâmpsia com Sinais de Gravidade Pelo menos 1 em paciente com pré-eclâmpsia: - PAS ≥ 160 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg (confirmada com intervalo de ≥ 4h com o paciente em repouso no leito) * - Plaquetas< 100.000/mm3 - TGO ou TGP > 2x o normal ou dor severa e persistente em quadrante superior ou epigastralgia que não melhora com medicação - Cr sérica > 1.1 mg/dL ou aumento de 2x na creatinina sérica basal - Edema pulmonar - Alterações visuais ou cerebrais persistentes Síndrome HELLP (os três critérios devem estar presentes obrigatoriamente) - Hemólise: BT ≥ 1,2 mg% ou DHL ≥ 600 e; - Transaminases hepáticas ≥ 70 UI/L (ou ≥ 2x o normal) e; - Plaquetopenia: < 100.000/mm3 - Quando não são encontradas todas as alterações supracitadas, alguns autores chamam de “HELLP parcial”. Contudo, não utilizamos e não recomendamos a utilização desse conceito no nosso serviço. - Hipertensão e/ou proteinúria não são achados obrigatórios (descartar diagnósticos diferenciais) Apresentações atípicas - Início com IG < 20 semanas: pensar em gestação molar - Início tardio: início com >2 dias até 6 semanas pós-parto - Sinais de gravidade sem hipertensão: em 15% da síndrome HELLP e em alguns pacientes com eclâmpsia Hipertensão Arterial Crônica sobreposta por Pré-Eclâmpsia - HAC controlada com aumento pressórico súbito ou necessidade de escalonar os medicamentos para controlar a PA - Nova proteinúria ou aumento súbito em proteinúria prévia Eclâmpsia - Convulsões generalizadas em paciente com pré-eclâmpsia, quando não pode ser atribuída a outras causas - Pode acontecer antes, durante ou após o parto. - Sinais premonitórios de irritação cerebral em 83%: cefaleia occipital ou frontal persistente; visão embaçada ou com escotomas; alteração do estado mental * Em caso de PA muito severa, as aferições podem ser realizadas em menor intervalo Fonte: August & Sibai, 2020 - Sintomas premonitórios de irritação cerebral - Sintomas premonitórios de irritação cerebral 145 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 4 Pré- Eclâmpsia (PE) Pré-Eclâmpsia aferições separadas por ≥ 4 horas). Ou PAS ≥ 160 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg (confirmada em alguns minutos) E (pelo menos 1): - Proteinúria ≥ 300 mg/24h - Razão de Pur:Cur ≥ 0.3 - ≥ 2+ de proteinúria (1+ tem 71% de falso positivo, segundo a ACOG, 2020) - Plaquetas < 100.000/mm3 - Cr sérica > 1.1mg/dL ou 2x o valor basal - TGO ou TGP > 2x o normal - Edema pulmonar - Sintomas visuais ou cefaleia persistentes Pré-Eclâmpsia com Sinais de Gravidade Pelo menos 1 em paciente com pré-eclâmpsia: - PAS ≥ 160 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg (confirmada com intervalo de ≥ 4h com o paciente em repouso no leito) * - Plaquetas < 100.000/mm3 - TGO ou TGP > 2x o normal ou dor severa e persistente em quadrante superior ou epigastralgia que não melhora com medicação - Cr sérica > 1.1 mg/dL ou aumento de 2x na creatinina sérica basal - Edema pulmonar - Alterações visuais ou cerebrais persistentes Síndrome HELLP (os três critérios devem estar presentes obrigatoriamente) - Hemólise: BT ≥ 1,2 mg% ou DHL ≥ 600 e; - Transaminases hepáticas ≥ 70 UI/L (ou ≥ 2x o normal) e; - Plaquetopenia: < 100.000/mm3 - Quando não são encontradas todas as alterações supracitadas, alguns autores chamam de “HELLP parcial”. Contudo, não utilizamos e não recomendamos a utilização desse conceito no nosso serviço. - Hipertensão e/ou proteinúria não são achados obrigatórios (descartar diagnósticos diferenciais) Apresentações atípicas - Início com IG < 20 semanas: pensar em gestação molar - Início tardio: início com >2 dias até 6 semanas pós-parto - Sinais de gravidade sem hipertensão: em 15% da síndrome HELLP e em alguns pacientes com eclâmpsia Hipertensão Arterial Crônica sobreposta por Pré-Eclâmpsia - HAC controlada com aumento pressórico súbito ou necessidade de escalonar os medicamentos para controlar a PA - Nova proteinúria ou aumento súbito em proteinúria prévia Eclâmpsia - Convulsões generalizadas em paciente com pré-eclâmpsia, quando não pode ser atribuída a outras causas - Pode acontecer antes, durante ou após o parto. - Sinais premonitórios de irritação cerebral em 83%: cefaleia occipital ou frontal persistente; visão embaçada ou com escotomas; alteração do estado mental * Em caso de PA muito severa, as aferições podem ser realizadas em menor intervalo Fonte: August & Sibai, 2020 * Em caso de PA muito severa, as aferições podem ser realizadas em menor intervalo Fonte: August & Sibai, 2020 Abreviaturas: IG (idade gestacional). PAS (pressão arterial sistólica). PAD (pressão arterial diastólica). Pur (proteínúria). Cur (creatinúria). HELLP (hemolysis, elevated liver enzymes, low platelets). BT (bilirrubina total) CONDUTA Na suspeita de PE, além da aferição da PA, solicitamos os seguintes exames laboratoriais para elucidar o diagnóstico e definir a gravidade do quadro: Hemograma Bilirrubina total e frações Creatinina sérica Relação proteinúria/ creatinúria TGO / TGP DHL EAS Observamos que o ácido úrico não é um bom preditor de complicações associadas à pré-eclâmpsia2 e não possui valor diagnóstico para nenhum dos distúrbios relacionados à hipertensão na gravidez, portanto não recomendamos a realização desse exame no ambiente da Emergência Obstétrica. Similarmente, o aumento do índice de pulsatilidade (IP) e a incisura bilateral no Doppler da artéria uterina, apesar de estar associado à má adaptação uteroplacentária, não é um marcador sensível ou específico para a pré-eclâmpsia quando avaliado de forma isolada.2 Na PE, recomenda-se uma dieta normal, sem restrição significativa de sal, pois isso pode gerar hipovolemia.18 Além disso, a redução da atividade física na PE pode melhorar o fluxo uteroplacentário, porém não há evidências de que melhore significativamente os principais resultados maternos e perinatais.18 O início do anti-hipertensivo deve levar em consideração os sintomas e as comorbidades clínicas maternas, o risco de progressão para hipertensão arterial 146 grave/severa, além do bem-estar materno e fetal, sendo o valor da PA o fator mais importante nessa decisão.18 Não há um consenso sobre o valor ideal de PA em que deveríamos iniciar a terapia anti-hipertensiva em pacientes que se manifestam com hipertensão < 160 mmHg x 110 mmHg, contudo, iniciar a medicação ambulatorialmente quando a PA estiver ≥ 145 mmHg x 95 mmHg parece uma conduta razoável.24 Reforçamos que a busca por redução agressiva da PA (< 120 mmHg x 80 mmHg) não deve ser realizada, pois está diretamente relacionada com complicações fetais associadas à perfusão placentária (Tabela 3).24 Ao diagnóstico de hipertensão arterial grave/severa, o início imediato de terapia anti-hipertensiva é um consenso e uma recomendação formal.18 Tabela 3 - Anti-Hipertensivos Orais na Gestação Medicamento Classe Dose inicial Dose máxima Observações Metildopa Alfa agonista de ação central 250 mg, 2x-3x/dia Aumentar a cada 2 dias se necessário 3.000 mg Apesar de a dose máxima ser de 3 g/d, evitamos dose diária acima de 2.000 mg pelos efeitos adversos. Efeito colateral: sedação Nifedipino (liberação intermediária ou prolongada) Bloqueador de Canais de Ca 30 mg - 60 mg 1x ao dia Aumentar a cada 7 dias se necessário 120 mg Não administrar por via sublingual e evitar a utilização da formulação em “liberação imediata” ou “liberação rápida” pois pode provocar quedas abruptas de PA. Anlodipino Bloqueador de Canais de Ca 2,5 mg - 10 mg Dose única ou duas vezes ao dia 20 mg Cautela na insuficiência hepática Metoprolol Betabloquea- dor 50 mg - 200 mg/ dia 1 x–2 x/dia 200 mg Contraindicado, se insuficiência cardíaca descompensada 147 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Hidralazina Vasodilata- dor perifé- rico 10 mg, 4 x/ dia Aumentar a cada 2 dias se necessário 200 mg Nãousar como monoterapia Efeito colateral: taquicardia reflexa Dose acima de 100 mg/ dia aumenta o risco para LES Fonte: Adaptado de August, 2020; FEBRASGO, 2019 Abreviaturas: LES (Lúpus Eritematoso Sistêmico) A aferição domiciliar da PA deve ser realizada duas vezes ao dia.23 Se houver aumento sustentado para PAS ≥ 160 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg por mais de 15 minutos, configura urgência hipertensiva e a paciente deve ser hospitalizada (Tabela 4).23 A meta do tratamento ambulatorial é manter a PA entre 120 mmHg- 150 mmHg/80 mmHg-100 mmHg, com alerta para pressões abaixo de 120 mmHg/80 mmHg, pois pode haver hipoperfusão uteroplacentária.24 Tabela 4 - Anti-hipertensivos para Urgência Hipertensiva Medicamento Dose inicial Seguimento Hidralazina 1 Amp: 20 mg/1 ml 5 mg IV em 1min-2min Diluir 1 Amp. em 19 ml de AD (solução de 20 mg/20 ml) Administrar 5 ml da solução, EV, em bolus. Repetir PA em intervalos de 20min PA ainda elevada: 5 mg IV, em 2min Repetir até a dose acumulada de 30 mg (6 doses) Associar outra classe de anti-hipertensivo Nifedipino (comprimido simples) 10 mg 10 mg, VO Reavaliar em 20 min e administrar 10 mg a 20 mg se PA ainda elevada Associar outra classe de anti-hipertensivo se resposta insatisfatória após 3 doses 148 Nitroprussiato de Sódio 1 Amp (2 ml): 50 mg/2 ml 0,25 mcg/Kg/min-2 mcg/ Kg/min Diluir 1 Amp. em 248 ml de SG 5% (concentração de 200 mcg/ mL) Ex. Paciente de 70 Kg deverá receber uma infusão, nessa diluição proposta, na velocidade de 5 ml/h- 41ml/h para atingir a dose terapêutica. Precisa de proteção contra a luz (fotossensível) Bomba de infusão contínua Considerar acompanhamento conjunto de médico intensivista, emergencista ou anestesiologista durante a infusão do Nitroprussiato. Fonte: Adaptado de August, 2020. Abreviaturas: Amp (ampola). AD (água destilada). IV (endovenoso). VO (via oral). DURANTE O TRABALHO DE PARTO Nesse contexto, os dois grandes objetivos no trabalho de parto são: a prevenção de eclâmpsia e o controle da hipertensão.1 Deve-se diminuir a PA de 15%-25%, de forma gradual, com a meta de atingir valores entre 140 mmHg-150 mmHg/90 mmHg-100 mmHg.18 Uma redução brusca aumenta o risco de acidente vascular cerebral (AVC) e de má perfusão placentária.18 Assim, utilizamos o sulfato de magnésio para prevenir a eclâmpsia (Tabela 6). A concentração terapêutica do íon magnésio é de 4,8 mg/dL-8,4 mg/dL (4-7 mEq/L). Em níveis tóxicos, a paciente apresenta perda do reflexo patelar (9 mg/dl ou 7 mEq/L); depressão respiratória (12 mg/dL ou 10 mEq/L); e parada cardíaca (30 mg/dL ou 25 mEq/L).1,18 Portanto, devemos observar o risco para toxicidade se o débito urinário for < 25 ml/h, além dos respectivos sinais de toxicidade: frequência respiratória < 12 irpm; e ausência do reflexo patelar.1 Salientamos que a infusão de sulfato de magnésio deve ser interrompida se a creatinina sérica (Cr) for maior do que 1 mg/dL ou se a diurese for inferior a 20 ml/h. Em seguida, o magnésio sérico deve ser avaliado em 6h. Se a Cr estiver entre 1 mg/dL-1,5 mg/dl e a diurese for > 25mL/h, a infusão de sulfato de magnésio 149 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB pode ser retomada com metade da dose e o magnésio sérico deve ser novamente avaliado em 6h.1 Apesar de constituir prática frequente em alguns locais, não há indicação formal para restrição de dieta via oral durante a infusão de MgSO4, a menos que haja uma programação de parto cesáreo ou rebaixamento do nível de consciência da paciente. Para obtenção de diurese adequada e redução de riscos relacionados ao jejum prolongado, faz-se importante a manutenção de hidratação venosa (soro fisiológico 0,9% ou Ringer Lactato - 30ml/kg/dia) e aporte calórico mínimo de manutenção durante infusão de MgSO4 em pacientes que estão com dieta oral zero (5 ampolas de glicose 50% diluídas em cada frasco de 500ml de SF 0,9%, EV, de 6h/6h). Sugerimos não utilizar soro glicosado 5% como solução de hidratação, haja vista que devido a sua osmolaridade cerca de 80% do líquido infundido tende a permanecer no espaço extravascular. Ademais, o magnésio atravessa a placenta e pode causar diminuição na linha de base do batimento cardíaco fetal (BCF) e diminuição na sua variabilidade.23 Ressaltamos que a via de parto é a obstétrica e a idade gestacional ideal para o parto depende da gravidade da doença (Tabela 5).23 Tabela 5 - Condutas nas Síndromes Hipertensivas na Gestação Condutas nas Síndromes Hipertensivas na Gestação Síndrome IG (semanas) Conduta HAC 38 - 39+6 - Resolução da gestação se não utilizar anti-hipertensivos 37 - 39 - Resolução da gestação se PA bem controlada com anti- hipertensivos 34 - 36+6 - Resolução da gestação se hipertensão grave de difícil controle HAG e/ou Pré- Eclâmpsia sem Sinais de Gravidade ≥ 37 - Resolução da gestação Resolução da gestação em qualquer IG se deterioração materna ou fetal: - PAS ≥ 160 ou PAD ≥ 110 mesmo com anti-hipertensivos < 37 - Expectante - USG a cada 3-4 semanas para avaliar crescimento fetal e semanal para avaliar líquido amniótico. - Exames laboratoriais semanais (hemograma, enzimas hepáticas, Cr e EAS) - Consultas de pré-natal semanais 150 * O uso de betametasona pode provocar uma melhora transitória no Doppler da artéria umbilical entre 8h e 3 dias da primeira dose,25 contudo essa alteração temporária não está relacionada a melhores desfechos fetais ou neonatais e, portanto, não deve modificar ou guiar a conduta instituída. Fonte: ACOG, 2020; Norwitz, 2020; Sibai 2020; Zugaib, 2015. Abreviaturas: IG (idade gestacional). PAS (pressão arterial sistólica). PAD (pressão arterial diastólica). IAM (infarto agudo do miocárdio). AVE (acidente vascular encefálico). Cr (creatinina sérica). HELLP (hemolysis, elevated liver enzymes, low platelets). DPP (descolamento prematuro de placenta). Tabela 6 - Uso do Sulfato de Magnésio para Prevenção de Eclâmpsia/Crise Convulsiva Pré- Eclâmpsia com Sinais de Gravidade ≥ 34 - Resolução da gestação após estabilização materna - Sinais premonitórios persistentes (cefaleia, epigastralgia, alterações visuais, alteração do estado de alerta) - IAM, AVE - Cr ≥ 1,1 ou 2x o valor de base - Edema pulmonar - DPP - Morte fetal - Diástole reversa na artéria umbilical < 34 - Conduta expectante com avaliação seriada se estabilidade materna e fetal, recomendamos: mobilograma diário; ecografia semanal; exames laboratoriais 2 x/semana - Considerar corticoterapia* para maturação pulmonar fetal Síndrome HELLP ≥ 34 - Resolução da gestação após estabilização materna < 34 - Entre 24s e 34s: considerar corticoterapia* para matu- ração pulmonar fetal e, em seguida, realizar a resolução da gestação (não postergar a resolução por mais de 48h, pois pode ocorrer piora do quadro materno) - MgSO4 para neuroproteção fetal e prevenção de con- vulsões - Exames laboratoriais a cada 12h Eclâmpsia qualquer - Resolução da gestação 151 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Indicação / Público-Alvo Profilaxia de Crise Convulsiva/Eclâmpsia Mulheres com pré-eclâmpsia com sinais de gravidade; Mulheres com pré-eclâmpsia sem sinais de gravidade devem ter a sua conduta individualizada. Em mulheres com diagnóstico de pré-eclâmpsia grave não há necessidade de aguardar sinais de iminência de eclâmpsia para iniciar o MgSO4. Idade Gestacional > 20 Semanas Dose / Esquema Terapêutico Esquema “ZUSPAN” Ataque: 4 g (8 ml de MgSO4 50% diluídos em 12 ml de Água Destilada ou SF 0,9% e aplicar EV, em BIC, a 60 ml/h. Considerar 5 g - 6 g de ataque em pacientes com IMC ≥ 30. Manutenção: 1 g/h (10 ml de MgSO4 50% diluídos em 490 ml de SF0,9% ou SG 5% e aplicar, EV, em BIC a 100 ml/h). Considerar 2 g/h em pacientes com IMC ≥ 30. Duração / Timing Iniciar ao diagnóstico de trabalhode parto ou indução de parto, ou antes e durante o parto cesáreo. O tempo de duração do uso do MgSO4 no puerpério é arbitrário, pois não há evidência de alta qualidade para guiar terapia. Usualmente a infusão é continuada por 24h-48h no pós-parto imediato, podendo se estender até 72h, avaliando-se individualmente os casos e a evolução clínica. O MgSO4 tem implicações anestésicas consideráveis, haja vista que pode prolongar o tempo de ação dos bloqueadores neuromusculares. Contudo, mulheres com pré-eclâmpsia que são encaminhadas para o parto cesáreo NÃO devem ter a infusão de MgSO4 interrompida durante o procedimento cirúrgico. Monitorização Avaliação Clínica de 2h/2h: Pressão Arterial; Reflexo Patelar bilateral; Freq. Resp. > 12 irpm-14 irpm; Déb. Urinário > 25 ml/h; Contraindicações Miastenia gravis; Arritmia Cardíaca Grave ou ICC descompensada. Deve-se ajustar apenas a dose de manutenção para Clearance de Creatinina se Insuficiência Renal Aguda/Crônica. 152 Antídoto Em caso de Toxicidade Grave relacionada à hipermagnesemia e/ ou Parada Cardiorrespiratória: administrar Gluconato de Cálcio 10% (10ml-20ml, EV, em 2-5min). A administração concomitante de Furosemida pode acelerar a excreção urinária de Magnésio Monitorização do Magnésio Não há necessidade de dosagem do nível sérico do Magnésio em todas as pacientes, entretanto a dose considerada terapêutica varia entre 4,8 mg/dl-8,4 mg/dl (4 mEq/L-7 mEq/L). A concentração sérica de magnésio deve ser dosada nas seguintes situações: - Convulsão durante infusão de MgSO4; - Insuficiência Renal (Cr >1,1); - Sinais clínicos de Toxicidade A infusão deve ser suspensa caso o nível sérico esteja > 9,6 mg/ dl (8 mEq/L) e pode ser reiniciada com uma dose de manutenção menor quando atingir o nível < 8,4 mg/dl (7 mEq/L) Fonte: ACOG, 2020; Crowther, 2003; Constantine, 2011; Marret, 2007. Abreviaturas: MgSO4: Sulfato de Magnésio; SF: Soro Fisiológico; SG: Soro Glicosado; EV: Endovenoso; BIC: Bomba de Infusão Contínua; IMC: Índice de Massa Corpórea; ICC: Insuficiência Cardíaca Congestiva; PCR: Parada Cardiorrespiratória ECLÂMPSIA A eclâmpsia geralmente se manifesta com convulsão tônico-clônica generalizada e, na maioria das vezes, ocorre horas após os sinais e os sintomas premonitórios:30 • Hipertensão; • Cefaleia frontal ou occipital persistente; • Alteração visual (escotomas, cegueira cortical, visão embaçada, diplopia, fotofobia); e • Epigastralgia no quadrante superior direito, As convulsões por eclâmpsia são habitualmente autolimitadas: a fase tônico- clônica dura aproximadamente 1 a 3 minutos e o estado pós-ictal pode durar entre 10 a 20 minutos.30 Ressaltamos que 90% dos casos de início no pós-parto ocorrem na primeira semana.30 153 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB O sulfato de magnésio é a primeira escolha no tratamento da eclâmpsia, contudo sua função principal não é cessar a convulsão, haja vista que ela é autolimitada, e sim prevenir novos episódios que ocorrem em 10% das pacientes tratadas de forma expectante (Tabela 7).1 Em casos refratários, isto é, com convulsões que durem mais de 20 minutos após a dose de ataque de sulfato de magnésio ou quando ocorrem mais de dois episódios após o início do tratamento, recomenda- se a hidantalização (Tabela 7).30 Durante as convulsões pode haver desacelerações no BCF e aumento na contratilidade e no tônus uterino.1 Se a bradicardia não melhorar em 10-15 minutos após a terapia inicial, considerar a ocorrência de descolamento de placenta.30 Tabela 7 - Cuidados na Eclâmpsia Eclâmpsia Passos iniciais Prevenção de novas convulsões Recorrência de convulsão Refratários (convulsões por mais de 20 min ou mais de dois episó- dios após MgSO4) Parto - Chamar ajuda; - Posicionar a gestante em decúbito lateral, preferencialmente esquerdo; - Prevenir aspiração; - Administrar oxigênio (8 L/ min - 10 L/min por máscara não reinalante); - Monitorar sinais vitais; - Hidralazina se PAS ≥ 160 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg - Sulfato de Mg (Esquema Zuspan) - Sonda vesical de demora - Suspender o sulfato de Mg após 24h do parto se: melhora dos sinais e sintomas; diurese ≥ 100 mL/h por 2 horas consecutivas - 2 g a 4 g de sulfato de Mg, IV em 5 minutos. - Fenitoína (50 mg/ ml – 1 Amp tem 5ml) Hidantalização: 5 Amp de Fenitoína diluídas em 250 mL SF 9%). Correr em 60 min. Manutenção: 100 mg, IV a cada 8h ou 100 mg, VO a cada 8h - SVD e nasogástri- ca se inconsciente - IOT - UTI - TC de crânio - Após a estabilização materna; - ≥ 34 semanas: o parto vaginal pode ser considerado e deve ocorrer em até 24h - < 34 semanas e sem colo favorável: cesárea Fonte: ACOG, 2020; Norwitz 2, 2020; Zugaib, 2015 Abreviaturas: PAS (pressão arterial sistólica); PAD (pressão arterial diastólica); SF (soro fisiológico); SVD (sonda vesical de demora); IOT (intubação orotraqueal); UTI (unidade de terapia intensiva); TC (tomografia computadorizada) 154 SÍNDROME HELLP A causa da Síndrome HELLP (hemolysis, elevated liver enzymes, and low platelets) é a microangiopatia e a ativação da coagulação intravascular.32 Após o diagnóstico, deve-se tratar a hipertensão severa e iniciar sulfato de Mg para prevenir convulsões.32 Se a idade gestacional for ≥ 34 semanas, realizar o parto após a estabilização materna.32 Se for < 34 semanas e não possuir sinais de alerta, pode-se administrar as duas doses de betametasona e realizar o parto após 48h se mãe e feto permanecerem estáveis; se houver sinais de alerta, realizar o parto após estabilização materna.26, 32 Sinais de alerta: morte fetal; descolamento de placenta; edema pulmonar; eclâmpsia; sangramento hepático; AVC; lesão renal aguda; coagulação intravascular disseminada; sofrimento fetal.26, 32 As indicações para Transfusão de Plaquetas no cenário de Síndrome HELLP tem ainda controvérsias na literatura existente, contudo as situações que encontram maior respaldo e, portanto, são as recomendações do nosso serviço são: pacientes com sangramento ativo e trombocitopenia; transfusão profilática se valores abaixo de 20.000/mm³ durante o trabalho de parto ou abaixo de 50.000/mm³ se programação de parto cesáreo.32 A dose padrão de transfusão de plaquetas é de 1U de concentrado de plaquetas a cada 10 Kg de peso da paciente, que devem ser infundidas durante 20-30 minutos, com elevação esperada dos níveis séricos de plaquetas em 10min a 1h da infusão e redução gradual nas 72h subsequentes. Nos procedimentos de urgência, sugere- se nova dosagem de plaquetas 10min após a infusão para checar se o nível sérico desejado foi atingido. Quando da indicação de transfusão profilática de plaquetas, geralmente não há razão para realizar transfusão de plaquetas mais de uma vez no período de 24h.33 Apesar de constituir prática frequente em algumas unidades de terapias intensivas, não há evidência científica atual suficiente que corrobore a utilização de corticoterapia na Síndrome HELLP com objetivo de melhora dos parâmetros laboratoriais das plaquetas e clínicos maternos, portanto não recomendamos a utilização de corticoesteroides nesse cenário com esse objetivo. 34,35 A via de parto preferencial é a vaginal na ausência de indicações obstétricas formais para a realização de cesariana. A indução do parto pode ser considerada em situações onde o colo uterino é favorável (Índice de Bishop > 6). Na indicação de parto cesariano, a laparotomia mediana infra umbilical está indicada nos casos de coagulação intravascular disseminada ou nas anormalidades laboratoriais e clínicas graves que sugerem hematoma subcapsular hepática, nos demais casos 155 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB pode-se proceder a incisão à Pfannenstiel, contudo deve-se evitar a compressão do fundo uterino no momento da extração fetal para diminuir os riscos de ruptura hepática.36 O pós-operatóriodeve ocorrer, preferencialmente, em ambiente de terapia intensiva para monitorização clínica multiparamétrica contínua, assim como a infusão de Sulfato de Mg deve permanecer por 24h - 48h a depender da gravidade do caso.36 HIPERTENSÃO PÓS-PARTO A pressão arterial naturalmente aumenta no pós-parto imediato e entre o terceiro e o sexto dia. A hipertensão pós-parto ocorre em 20% das mulheres em até 6 semanas do parto e deve ser monitorada devido ao risco de AVC.24 Podemos retornar ao esquema de anti-hipertensivos que a paciente fazia uso antes de engravidar, no caso das Hipertensas Crônicas, com a ressalva de que se faz importante destacar que não há muitas evidências de alta qualidade para guiar o manejo ambulatorial medicamentoso ideal da Hipertensão Puerperal e que as drogas escolhidas devem ser familiares ao médico assistente.37 Dentre os medicamentos disponíveis, evitamos a metildopa devido ao risco de contribuir para a depressão pós-parto.24, 38 A pressão-alvo no puerpério persiste sendo < 140 mmHg/90 mmHg e a analgesia possui papel fundamental no manejo anti-hipertensivo, com o Acetaminofeno (Paracetamol), na dose de 750 mg-1000 mg por via oral até de 6h/6h, ou 500 mg por via oral até de 4h/4h, sendo o analgésico de primeira escolha e não devendo ultrapassar a dose máxima de 4 g/dia.44 O uso de anti-inflamatórios não esteroidais (AINE) classicamente é evitado pela sua correlação clínica conhecida de elevação de níveis tensionais, contudo uma meta-análise recente (set, 2020) avaliando a segurança do uso de AINEs concluiu que o uso de anti-inflamatórios em mulheres com hipertensão no puerpério parece ser tão seguro quanto o Acetaminofeno, apesar de os próprios autores do artigo destacarem que a evidência existente é de baixa qualidade.39 A terapia farmacológica de escolha nas mães que estão amamentando possui algumas restrições. A tabela abaixo exemplifica e descreve os principais agentes anti-hipertensivos de escolha ou não recomendados. Dentre as classes mais seguras, podemos citar os bloqueadores do canal de cálcio (Anlodipino, Nifedipino e Verapamil) e alguns betabloqueadores (Propranolol, Metoprolol e Labetalol) que possuem as menores taxas de passagem no leite materno.40 156 Tabela 8 - Anti-hipertensivos no Puerpério Classe Exemplos/Posologia Observações Bloqueadores de Canais de Ca 1ª Escolha: Anlodipino (5 mg-10 mg, VO, 1 x-2 x/d, máx. 20 mg/d); Nifedipino (10 mg-20 mg, VO, 1x-3x/d, máx. 120 mg/d); Verapamil (40 mg-80 mg, VO, 3x/d, máx. 480mg/d) Doses habituais das medicações, sem particularidades. Betabloquea- dores Propranolol (40 mg-80 mg, VO, 2x/d, máx. 640mg/d); Metoprolol (25 mg-100mg, VO, 1-2x/d, máx. 200 mg/d); Devemos evitar o uso do Atenolol no puerpério pois tem maior excreção no leite materno se comparado com os demais betabloqueadores; Não há evidências a respeito do uso de Carvedilol ou Bisoprolol na lactação, portanto outras opções devem ser consideradas. Inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina (IECA) Enalapril (5 mg-20 mg, VO, 1-2x/d, máx. 40 mg/d) Captopril (12,5 mg-50 mg, VO, 1-3x/d, máx. 450mg/d); Podem ser utilizados em doses habituais com relativa segurança, porém os recém-nascidos lactentes parecem ser mais suscetíveis a essas medicações, portanto o acompanhamento com pediatra se faz necessário. No caso de escolha pelo IECA, sugere-se o Enalapril como primeira opção pela melhor posologia e perfil de efeitos adversos. Bloqueador do Receptor de Angiotensina (BRA) Losartana (25 mg-100mg, VO, 1-2x/d, máx. 100mg/d); Valsartana (40 mg-160 mg, VO, 1x/d, máx. 160mg/d) Não há evidências a respeito do uso de BRA na amamentação, portanto outras opções devem ser consideradas. Essa classe de medicamentos não deve ser utilizada como primeira escolha. Diuréticos Hidroclorotiazida (25 mg-50 mg, VO, 1-x/d, máx. 200 mg); Furosemida (40 mg, VO, 1x/d, máx. 80 mg/d) Teoricamente o uso de diuréticos pode reduzir a produção e excreção do leite materno, contudo doses menores podem ser consideradas a depender das comorbidades clínicas maternas. Essa classe de medicamentos não deve ser utilizada como primeira escolha. 157 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Vasodilatador Periférico Hidralazina (25 mg-50 mg, VO, 1-4x/d, máx. 200 mg/d) Doses habituais da medicação, sem particularidades. Fonte: August, 2020; Drugs and Lactation Database (LactMed) http://toxnet.nlm.nih.gov ANEXO 1 COMPOSIÇÃO DE CÁLCIO POR 100 G DOS ALIMENTOS Energia Cálcio Descrição dos alimentos (kcal) (mg) Cereais e derivados Arroz, integral, cozido 124 5 Arroz, tipo 1, cozido 128 4 Aveia, flocos, crua 394 48 Biscoito, doce, maisena 443 54 Biscoito, salgado, cream cracker 432 20 Cereais, milho, flocos, sem sal 363 2 Cereal matinal, milho 365 143 Curau, milho verde 78 53 Farinha, láctea, de cereais 415 196 Mingau tradicional, pó 373 522 Pão, aveia, forma 343 109 Pão, milho, forma 292 78 Pão, trigo, forma, integral 253 132 Pão, trigo, francês 300 16 Pipoca, com óleo de soja, sem sal 448 3 Polenta, pré-cozida 103 1 Torrada, pão francês 377 19 Verduras, hortaliças e derivados Abóbora, moranga, refogada 29 19 Acelga, crua 21 43 Agrião, cru 17 133 Alface, crespa, crua 11 38 Alface, lisa, crua 14 28 Alface, roxa, crua 13 34 Brócolis, cozido 25 51 Cenoura, cozida 30 26 Couve, manteiga, refogada 90 177 158 Espinafre, Nova Zelândia, cru 16 98 Quiabo, cru 30 112 Rúcula, crua 13 117 Leite e derivados Bebida láctea, pêssego 55 89 Creme de Leite 221 83 Iogurte, natural 51 143 Leite, condensado 313 246 Leite, de vaca, desnatado, pó 362 1363 Leite, de vaca, desnatado, UHT * 134 Leite, de vaca, integral * 123 Leite, de vaca, integral, pó 497 890 Queijo, minas, frescal 264 579 Queijo, minas, meia cura 321 696 Queijo, mozarela 330 875 Queijo, parmesão 453 992 Queijo, prato 360 940 Queijo, requeijão, cremoso 257 259 Queijo, ricota 140 253 Ovos e derivados Omelete, de queijo 268 166 Ovo, de codorna, inteiro, cru 177 79 Ovo, de galinha, inteiro, cozido/ 146 49 Ovo, de galinha, inteiro, frito 240 73 Nozes e sementes Amêndoa, torrada, salgada 581 237 Castanha-de-caju 570 33 Castanha-do-Brasil, crua 643 146 Gergelim, semente 584 825 Linhaça, semente 495 211 Pescados e frutos do mar Bacalhau, salgado, refogado 140 59 Lambari, congelado, frito 327 1881 Sardinha, conserva em óleo 285 550 Fonte: Adaptada de TACO, 2011 159 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB REFERÊNCIAS 1. 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Acetaminophen (paracetamol). In: Uptodate and Lexi-drugs online. Hudson (OH): Lexicomp, Inc. 2020. 162 INTRODUÇÃO As hemorragias da segunda metade da gravidez envolvem enfermidades que podem ocorrer a partir da 20ª semana de gestação.1 Apesar dos avanços da medicina e independentemente do desenvolvimento econômico social do país, são uma das principais causas de morbimortalidade materno-fetal da atualidade.1 Dentre as principais causas de hemorragias da segunda metade, temos:1 • Descolamento Prematuro de Placenta (DPP) • Placenta Prévia (PP) • Vasa Prévia • Lesões cervicais (pólipos, câncer de colo) As doenças hemorrágicas apresentam sua importância na prática obstétrica não apenas por envolver a morbimortalidade materna, mas também por elevar a morbimortalidade perinatal, pois em sua maioria levam à prematuridade, baixo peso ao nascer, restrição de crescimento fetal, hipóxia, distúrbios respiratórios, anemia fetal e óbitos perinatais.2,3 O diagnóstico correto e a elaboração de conduta adequada são o objetivo de nosso capítulo para que possamos, na nossa prática clínica, intervir positivamente nas questões que colaboram com a morbimortalidade do binômio materno-fetal. HEMORRAGIAS DA SEGUNDA METADE DA GRAVIDEZ Isabella Moreira Dias Carolina Genaro Pultrin Lucila Nagata 163 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 1. Causas de hemorragia na segunda metade da gestação Causas Conceito Fatores de Risco Sinais e Sintomas Ecografia Descola- mento Prematuro de Placenta - Descolamento de uma placenta normalmente inserida após a 20ª semana e antes do nascimento do concepto - Síndromes hipertensivas - Rotura prematu- ra de membranas - Corioamnionite - Trombofilia - Tabagismo, uso de álcool e drogas - Paridade - Idade materna ≥ 35 anos e < 20 anos - Gestações múltiplas - Oligoâmnio/ polidrâmnio - Trauma - Malformações uterinas - Diabetes pré-gestacional - Placenta prévia - Dor, mais comumente repentina e intensa, associada a hemorragia - Hemorragia referida como de início súbito, de cor vermelho-es- cura, sem episódios anteriores - Hipertonia ou hipersensibilida- de e dor à palpação uterina - A ecografia pode NÃO demonstrar o hematoma em até 40%-75% dos casos - Tem importância fundamental no diagnóstico da vitalidade fetal, que pode influenciar a conduta Placenta Prévia É a presença de tecido placentário total ouparcialmente inserido no segmento inferior do útero, após 28 semanas de gestação - Número de cesáreas prévias - Idade materna avançada - Gestações múltiplas - Multiparidade - Sangramento vaginal indolor de coloração vermelho vivo, de início súbito, reincidente e de gravidade progressiva - Em 10% dos casos de PP, as gestantes não apresentarão sintomas e o diagnóstico será realizado por ecografia 164 Placenta Prévia - Antecedente de placenta prévia - Tabagismo - Número de curetagens uterinas - Contrações uterinas podem ser encontra- das durante ou após o episódio hemorrágico, e o tônus uterino está normal nos seus intervalos - O exame de toque vaginal é proscrito pelo risco de ocasionar hemorragia abundante - 90% das PP diagnosticadas até 20 semanas serão resolvidas espontanea- mente antes do parto - O diagnóstico é baseado na identificação de tecido placentá- rio recobrindo ou muito próximo ao orifício interno do colo uterino Vasa Prévia Em decorrência de uma inser- ção anômala do funículo umbili- cal na placenta, os vasos fetais cruzam o segmento inferior uterino e ficam à frente da apresenta- ção fetal (próximos ao orifício externo do colo uterino) - Anomalias fetais - FIV - Placenta de inserção baixa ou prévia no segundo trimestre - Inserção marginal do cordão - Gestação múltipla - Placenta sucenturiada ou bilobada - O diagnóstico precoce habitualmente é negligenciado, uma vez que se trata de uma patologia rara. - O uso do Doppler colorido transvaginal deverá ser realizado se houver vasos aberrantes sobre o orifício cervical interno - Olhar a implantação placentária do cordão umbilical Referência: FEBRASGO (2019); ZUGAIB (2016). CLASSIFICAÇÃO O descolamento prematuro de placenta (DPP) pode ser classificado de acordo com os achados clínicos da seguinte forma:1,3 - GRAU I – paciente assintomática ou presença de sangramento genital discreto. Sem repercussões hemodinâmicas. O diagnóstico é realizado após o nascimento por presença de coágulo retroplacentário. - GRAU II – Sangramento genital moderado com hipertonia uterina. Repercussões hemodinâmicas na mãe. Feto vivo, porém com vitalidade fetal prejudicada. 165 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB - GRAU III – grave. Feto morto e alterações mais acentuadas de hipotensão arterial materna e hipertonia uterina. Divide- se em: III a: sem coagulopatia III b: com coagulopatia A placenta prévia total também tem sua classificação de acordo com a localização:1,3 I. Placenta prévia centro-total II. Placenta prévia centro-parcial III. Placenta prévia marginal IV. Placenta lateral ou de implantação baixa AVALIAÇÃO Em contraste com o sangramento na primeira metade da gravidez, o exame digital do colo do útero deve ser evitado em mulheres que apresentam sangramento na segunda metade da gravidez até que a placenta prévia tenha sido excluída. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de DPP é eminentemente clínico, porém achados ecográficos, laboratoriais e a associação com estudos anatomopatológicos pós-parto podem ser utilizados para reforçar o diagnóstico clínico.5,6 A história clínica clássica de uma mulher com DPP consiste em sangramento vaginal súbito, de moderada intensidade, associado a dor abdominal e/ou lombar e contrações uterinas.5,6 Ao exame físico notamos aumento da tonicidade uterina e da sensibilidade, especialmente entre as contrações.5,6,7 A avaliação com ultrassom pode ser útil na identificação de hematomas retroplacentários e no auxílio ao diagnóstico diferencial, todavia a sensibilidade do método varia entre 25% - 60% para o diagnóstico de DPP.8,9,10 A presença de um hematoma retroplacentário é o achado ecográfico clássico da DPP, contudo está ausente na maioria das pacientes.5,8,9,10 Na avaliação puerperal anatomopatológico, faz-se importante salientar que a ausência de características histopatológicas não exclui o diagnóstico.11 166 EXAMES LABORATORIAIS Tem como objetivo rastrear as complicações de DPP: anemia grave, choque e discrasia sanguínea. Neste momento, deve- se solicitar reserva de sangue.12,13 • Hemograma com contagem de plaquetas. • Tipagem ABO Rh. • Coagulograma. • Exames de rotina para doença hipertensiva, se suspeita clínica. • Fibrinogênio. Teste do Coágulo: o estado de coagulação da gestante pode ser avaliado rapidamente com a coleta de 10 ml de sangue em tubo de ensaio seco – este deve ser mantido em temperatura ambiente. Após 7 a 10 minutos, deverá haver a formação de um coágulo firme; se isso não ocorrer, a coagulopatia está instalada. Esse exame é inespecífico, porém tem facilidade de realização, baixo custo e resultado rápido.12 CONDUTAS DESCOLAMENTO PREMATURO DE PLACENTA A decisão da interrupção da gestação vai depender da gravidade do sangramento; da condição materna e fetal; e da idade gestacional:14 Gestações a termo ou complicadas por descolamento placentário severo (choque hipovolêmico, insuficiência renal, padrão fetal não tranquilizador, restrição de crescimento ou morte fetal) devem ser interrompidas.14 A cesárea será a melhor via de parto, quando não houver iminência de parto vaginal, nos casos de sangramento severo com instabilidade hemodinâmica materna.14 Idade gestacional (IG) < 34 semanas e estabilidade materna e fetal: pode-se optar por conduta conservadora, se houver estabilidade materna e fetal.14 IG entre 34 semanas e 36 semanas: recomendamos a interrupção da gestação, pois há risco progressivo de comprometimento materno e fetal.14 Em alguns casos selecionados, pode-se optar por conduta expectante se a paciente e o feto estiverem assintomáticos e o sangramento for em pequena quantidade e por um 167 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB período curto.14 IG > 36 semanas: recomendamos a resolução da gestação pela via mais rápida em todos os casos suspeitos e confirmados.14 Observamos que, em caso de descolamento placentário severo, o sangue pode extravasar para o miométrio causando o útero de Couvelaire.14 Nesse caso, recomendamos conduta agressiva e salientamos que pode ser necessário realizar histerectomia.14 PLACENTA PRÉVIA Recomendamos o monitoramento ultrassonográfico com 32 semanas para o acompanhamento da posição placentária, se a posição for < 2 cm do orifício interno no segundo trimestre.15 Com 32 semanas, se a placenta estiver ≥ 2 cm do orifício interno, não há necessidade de monitoramento posterior.15 Por outro lado, se a posição estiver < 2 cm, deve-se monitorar seu posicionamento com 36 semanas.15 Deve-se também excluir placenta acreta, uma vez que há associação com a placenta prévia.15 Deve-se orientar a gestante a procurar atendimento hospitalar, se houver sangramento transvaginal, e a evitar relação sexual após a 20ª semana, pois as contrações uterinas geradas pelo orgasmo podem provocar sangramento.9 Ademais, recomendamos evitar atividade física exagerada, como levantar mais de 9 kg ou ficar em pé por mais de 4 horas.15 A interrupção da gestação deve ser programada para 36 semanas a 37 semanas e 6 dias, se não houver outras complicações, como pré-eclâmpsia ou restrição de crescimento fetal.15 Na presença de sangramento vaginal, realizar hospitalização imediata para investigação e manejo adequado.5 No caso de pacientes com três ou mais episódios de sangramento, orientamos realizar a internação até o parto, uma vez que a frequência e a gravidade dos sangramentos são imprevisíveis.15 A via de parto nas pacientes com placenta de implantação baixa (entre 0 cm e 2 cm do orifício interno) é discutível.15 Se a distância for ≤ 1cm, há maior risco de hemorragia intraparto, por isso, recomendamos a realização de cesárea.15 Já se a distância for > 1 cm, pode-se optar pelo parto vaginal se o hospital tiver recursos 168para realizar uma cesárea de emergência, caso seja necessário.15 Alertamos para o maior risco de hemorragia pós-parto na PP, pois o miométrio no segmento inferior do útero não contrai com a mesma eficiência das outras regiões, dificultando a hemostasia.1 CONDUTA NA HEMORRAGIA MACIÇA Caracterizada por perda sanguínea maior que 1.000 ml e/ou sinais clínicos de choque. Realizar o “ABCD” proposto pelo Advanced Trauma Life Support (ATLS) e adaptado pelo Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG).16,17 Para mais detalhamentos, ler Capítulos: 5 (Hemorragia Pós-parto) e 8 (Transfusão de Sangue e Hemoderivados no Centro Obstétrico). 1- Monitorização multiparamétrica + obtenção de dois acessos venosos periféricos calibrosos (Jelco 14 ou 16) + sondagem vesical de demora + oxigenioterapia suplementar, se necessário (SpO2 < 95%).6,16 2- Administração de cristaloide, preferencialmente Ringer Lactato, em fase rápida (20 ml/kg - 30 ml/kg na primeira hora) e suficiente para manutenção de débito urinário superior a 30 ml/h.6,16 3- Realização de exames laboratoriais essenciais (hemograma, tipagem sanguínea + prova cruzada, coagulograma com avaliação de fibrinogênio).6,16 4- Solicitação de apoio da anestesiologia para monitorização hemodinâmica da paciente.6,16 5- Realização de hemotransfusão se houver persistência de sangramento ativo após perda visual estimada superior a 1.000 ml de sangue. Em caso de necessidade de transfusão de concentrados de hemácias em quantidade ≥ 4U, deve-se iniciar protocolo de transfusão maciça (ex.: 6U de concentrados de hemácias + 6U de plasma fresco congelado + 1U-2U de crioprecipitado + 1 dose de concentrado de plaquetas (7U-10U/kg):6,16,17 • A – Avaliação das vias aéreas (atenção para paciente com rebaixamento de nível de consciência).16,17 • B – Avaliação da respiração e ventilação (atenção para frequência respiratória e SpO2). 169 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB • Considerar oferecer oxigênio em alto fluxo (10 l/min - 15 l/min) se SpO2 <95%.17 • C – Avaliação da hemorragia e perfusão adequada (palpação de pulsos centrais, obtenção de acessos venosos, solicitação de exames laboratoriais e verificação de tempo de enchimento capilar).16,17 • D – Avaliação do feto e decisão sobre o parto.17 Tabela 2 - Classificação da Hemorragia Parâmetro Classe I Classe II Classe III Classe IV Perda sanguínea aproximada < 15% 15% - 30% 31% - 40% >40% Frequência cardíaca Normal (60 bpm - 100 bpm) Normal/ levemente aumentada (100 bpm - 120 bpm) Aumentada (120 bpm - 140 bpm) Muito aumentada (>140 bpm) Pressão de Pulso Normal Diminuída Diminuída Diminuída Pressão Arterial Normal Normal Diminuída Diminuída Frequência Respiratória Normal (15 irpm - 20 irpm) Normal/ aumentada (15 irpm - 30 irpm) Normal/ aumentada (15 irpm - 30 irpm) Aumentada (> 30 irpm) Débito Urinário Normal(> 30 ml/h) Normal (> 30 ml/h) Reduzido (10 ml/h - 30 ml/h) Anúria (< 5 ml/h - 10 ml/h) Escala de Coma de Glasgow ECG:15 (ansioso leve) ECG:15 (ansioso moderado) ECG: <15 (ansioso/ confuso) ECG: <14 (confuso/ letárgico/coma) Necessidade de hemoderivados Monitorizar Considerar Sim Protocolo de Transfusão Maciça Adaptado de ATLS:10ª Edição, 2018. 170 FLUXOGRAMAS: FLUXOGRAMA 1: HEMORRAGIA DA SEGUNDA METADE DA GESTAÇÃO 171 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB FLUXOGRAMA 2: DESCOLAMENTO PREMATURO DE PLACENTA FLUXOGRAMA 3: PLACENTA PRÉVIA 172 REFERÊNCIAS: 1. 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Definição de hemorragia primária pós-parto Organização Definição de HPP World Health Organization 2 - Perda sanguínea ≥ 500 mL/24h pós-parto - HPP grave: perda sanguínea ≥ 1.000 mL/24h pós-parto - HPP maciça: . perda sanguínea > 2.000 mL . ou que necessite de ≥ 1.200 mL (4 unidades) de concentrado de hemácias . ou que resulte na queda de hemoglobina ≥ 4g/dL . ou que resulte em distúrbio de coagulação American College of Obstetricians and Gynecologists 3 - Perda sanguínea ≥ 1.000 mL/24h pós-parto - Ou perda sanguínea acompanhada de sinais e sintomas de hipovolemia dentro de 24h após o parto, independentemente da via de parto Royal College of Obstetricians and Gynecologists 4 - HPP Minor: Perda sanguínea 500 mL - 1.000 mL/24h pós-parto - HPP Major: Perda sanguínea > 1.000 mL/24h pós-parto . Moderada 1.000 mL - 2000 mL/24h pós-parto . Grave > 2.000mL/24h pós-parto Fonte: Adaptado de Belfort MA, 2020. HEMORRAGIA PÓS-PARTO Paula Faria Campos Isabella Moreira Dias Adriano Bueno Tavares Leonardo Ayres Coelho Ellen Tieko Tsugami Dalla Costa Larissa Maciel Ribeiro 174 CLASSIFICAÇÃO DAS HEMORRAGIAS PÓS-PARTO Tabela 2 - Classificação das Hemorragias Pós-Parto CLASSIFICAÇÃO DAS HPP Primária Secundária Definição - ocorre em até 24h pós-parto - ocorre entre 24h e 6 semanas após o parto Causas - atonia uterina - acretismo placentário - restos intracavitários - inversão uterina; - lacerações - hematomas no trajeto do canal do parto - distúrbios de coagulação congênitos ou adquiridos - infecção puerperal - doença trofoblástica gestacional - retenção de tecidos placentários - distúrbios hereditários de coa- gulação Fonte: OPAS, 2018. Tabela 3 - Causas de HPP CAUSAS ESPECÍFICAS DE HPP – MNEMÔNICO DOS “4 Ts” 4 “Ts” Causa Específica Frequência Relativa Tônus Atonia uterina focal ou difusa 70% - 80% Trauma Lacerações, hematomas, incisão cirúrgica, inversãoe rotura uterina 19% Tecido Retenção de tecido placentário, coágulos, acretismo placentário 10% Trombina Coagulopatias congênitas ou adquiridas, uso de medicamentos anticoagulantes, Síndrome HELLP ou pré-eclâmpsia com sinais de gravidade 1% - 7% Fonte: Adaptado de OPAS, 2018 e Overview of postpartum hemorrhage.Up To Date, 2020. 175 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO DURANTE A INTERNAÇÃO E CONDUTAS PREVENTIVAS De acordo com a identificação dos fatores de risco, devem-se seguir cuidados diferenciados.2 Tabela 4. Estratificação do risco e conduta na prevenção da HPP Estratificação do risco BAIXO RISCO MÉDIO RISCO ALTO RISCO - Ausência de cicatriz uterina - Gravidez única - ≤ 3 partos vaginais prévio - Ausência de distúrbio de coagulação - Sem história de HPP - Cesariana ou cirurgia uterina prévia - Pré-eclâmpsia leve - Hipertensão gestacional leve - Superdistensão uterina - ≥ 4 partos vaginais - Corioamnionite - História prévia de atonia uterina ou hemorragia obstétrica - Obesidade materna (IMC > 35 kg/ m²) - Placenta prévia ou de inserção baixa - Pré-eclâmpsia grave - Hematócrito < 30% - Plaquetas < 100.000/mm3 - Sangramento ativo - Coagulopatias - Uso de anticoagulantes - Descolamento prematuro de placenta - Placentação anômala - Presença de ≥ 2 fatores de médio risco Conduta - Manejo ativo do 3º período - Observação rigorosa por 1h - 2h após o parto - Estímulo à presença do acompanhante para ajudar a detectar os sinais de alerta - Tipagem sanguínea - Tipagem sanguínea - Acesso venoso (Jelco 16 g) - Hemograma - Tipagem sanguínea - Acesso venoso (Jelco 16 g) - Hemograma - Prova cruzada - Reserva de sangue (2 bolsas de concentrado de hemácias) Fonte: Adaptado de OPAS; 2018. 176 PREVENÇÃO (MANEJO ATIVO DO 3º PERÍODO DO TRABALHO DE PARTO) O terceiro período do trabalho de parto consiste no intervalo entre o nascimento e a dequitação placentária, apresentando como principais complicações: hemorragia; retenção placentária; e inversão uterina.6 O manejo ativo do terceiro período diminui o risco de hemorragia.2,6 Compreende o uso de ocitocina, a tração do cordão umbilical e a massagem uterina.6 Dentre essas medidas, o uso de medicamentos uterotônicos é a conduta com maior benefício,6 seguida pela tração controlada do cordão.7 Por outro lado, a massagem uterina não possui evidências claras que comprovam seu benefício.8 OCITOCINA Realizar em TODOS os partos, pois constitui a principal ação de prevenção da HPP, podendo reduzir em mais de 50% os casos de HPP por atonia uterina.2 A concentração dos receptores de ocitocina aumenta com a idade gestacional e eles estão em maior quantidade no fundo uterino.6 O início de ação da ocitocina ocorre em minutos, porém possui uma meia-vida plasmática curta (3min a 6min).6 A ocitocina pode ser administrada após a saída do ombro anterior, após o nascimento ou após a dequitação placentária.6 Entretanto, não deve ser administrada antes da saída do ombro anterior, pois pode exacerbar uma distocia de ombro.6 Recomendações: Parto normal • Injetar 10 UI intramuscular de ocitocina, logo após o nascimento2; Cesariana • Injetar 10 UI intramuscular de ocitocina, logo após o nascimento2 ou; • Esquema endovenoso • Ataque: 40 UI de ocitocina em 500 mL de SF 0,9% em 1 hora; 6,18,19 • Manutenção: 10 UI de ocitocina em 500 mL de SF 0,9% em 4 horas (125 mL/h, ou 40 gts/min) por 8 horas (1 L de SF 0,9% e 20 UI de ocitocina infundidas no total).6,18,19 177 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB • Uso racional da ocitocina no trabalho de parto, pois pode ocorrer dessensibilização expressiva dos receptores de ocitocina, o que culminaria com uma hipocontratilidade no pós-parto.2 No caso de persistência do sangramento ou hemorragia excessiva mesmo após o uso de ocitocina profilática, deve-se iniciar o protocolo de HPP.6 TRAÇÃO CONTROLADA DO CORDÃO UMBILICAL A tração controlada facilita a dequitação placentária, reduz a necessidade de curagem, a duração do terceiro período e a incidência de HPP, quando comparada à técnica hands-off. 9 Recomendações: • Deve ser realizada de forma cuidadosa, pois pode causar rompimento do cordão umbilical ou inversão uterina.9 • Associar à manobra de Brandt-Andrews (estabilização uterina).2,9 MASSAGEM UTERINA APÓS A DEQUITAÇÃO Apesar de a massagem uterina ser amplamente utilizada, não há evidência consistente de que previna a HPP.6,8 Entretanto, como não há malefícios em realizar essa manobra e ainda há poucos estudos disponíveis, indicamos o procedimento.6 Recomendações: • Massagem gentil após a dequitação placentária até a manutenção de uma consistência uterina firme (5min - 30min).6 MEDIDAS ADICIONAIS (IMPACTO VARIÁVEL): • Realizar episiotomia seletiva, isto é, não realizar de forma rotineira.2 • Não realizar Manobra de Kristeller.2 • Monitorização dos sinais vitais após o parto.2 • Inclusão do acompanhante no processo de monitoramento e cuidados após o parto.2 • Estimular os mamilos ou amamentar para promover a liberação de ocitocina endógena.6 178 DIAGNÓSTICO O reconhecimento precoce da HPP, determinação da causa e início do tratamento são críticos, considerando que quase 90% dos óbitos maternos relacionados à HPP ocorrem nas primeiras 4 horas do puerpério imediato.10,11 Aguardar sinais de instabilidade hemodinâmica, ou a simples redução dos níveis tensionais, não deve ser uma conduta preconizada, haja vista que são sinais tardios de HPP grave e geralmente não se manifestam antes que uma hemorragia substancial tenha ocorrido, pois até 25% (≥ 1.500ml) da volemia sanguínea da gestante pode ser perdida antes que os níveis tensionais comecem a cair e a frequência cardíaca comece a aumentar.12 Avaliação isolada da hemoglobina (Hb) e do hematócrito (Ht) deve ser feita com cautela, pois são indicadores ruins de perda sanguínea aguda – eles podem não declinar imediatamente após uma hemorragia aguda.16 Portanto, o diagnóstico é eminentemente clínico, porém podemos lançar mão de algumas ferramentas para auxiliar a propedêutica de estimativa de perda sanguínea:1 • Escala visual com compressas (Tabela 5).1,2 • Pesagem das compressas utilizando a conversão.1,2 • Perda sanguínea (ml) = peso das compressas sujas de sangue (g) - peso das compressas secas (g). • * Dica prática: 1 grama de peso equivale a 1 ml de sangue. 179 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 5 - Estimativa de perda sanguínea por visualização das compressas Esti mati va de Perda Sanguínea Compressas 50% 25 mL 75% 50 mL 100% 75 mL Pingando 100 mL Poça (diâmetro) 75 cm 500 mL 100 cm 1.000 mL Cama com poça de sangue Poça sobre o lençol < 1.000 mL Sangue fl uindo para o chão > 1.000 mL Fonte: Adaptado de OPAS; 2018. • Índice de choque [IC] (frequência cardíaca dividida pela pressão arterial sistólica): importante, e precoce, marcador clínico de instabilidade hemodinâmica e prognóstico de morbimortalidade.1 • IC ≥ 0,9 sugere perda sanguínea significativa e deve-se considerar hemotransfusão. • IC ≥ 1,4 aventa necessidade de terapêutica agressiva e imediata, além de abertura de Protocolo de Transfusão Maciça. • IC > 1,7 denota alto risco de evento adverso materno grave e a conduta deve ser similar à do tópico anterior. • Um baixo nível de fibrinogênio (< 200 mg/dL) é preditivo de HPP grave.2 Em um estudo, o nível sérico < 200 mg/dL apresentou um valor preditivo positivo de 100% de evolução para HPP grave, enquanto níveis superiores a 400 mg/dl apresentaram um valor preditivo negativo de 79%.25 180 Tabela 6 - Classificação da Hemorragia Parâmetro Classe I Classe II Classe III Classe IV Perda sanguínea aproximada < 15% 15% - 30% 31% - 40% > 40% Frequência cardíaca Normal (60 bpm - 100 bpm) Normal/ levemente aumentado (100 bpm-120 bpm) Aumentada(120 bpm - 140 bpm) Muito aumentada (> 140 bpm) Tempo de Enchimento Capilar (TEC) Normal (< 3seg-5 seg) Normal (< 3seg - 5seg) Lentificado (> 5seg) Lentificado (> 5seg) Pressão Arterial Normal Normal Diminuída Diminuída Frequência Respiratória Normal (15 irpm - 20 irpm) Normal/ aumentada (15 irpm - 30 irpm) Normal/ aumentada (15 irpm - 30 irpm) Aumentada (> 30 irpm) Débito Urinário Normal(> 30 ml/h) Normal (> 30 ml/h) Reduzido (10 ml/h - 30 ml/h) Anúria (< 5 ml/h - 10 ml/h) Escala de Coma de Glasgow ECG:15 ECG:15 (Ansioso) ECG: < 15 (Ansioso/ confuso) ECG: < 14 (confuso/ letárgico/ coma) Índice de Choque - - ≥ 0,9 ≥ 1,4 Necessidade de hemoderivados Monitorizar Considerar Sim Protocolo de Transfusão Maciça Fonte: Adaptado de ATLS:10ª Edição, 2018. TEC: Realizar uma leve compressão no leito ungueal do dedo indicador por 10seg. Retirar a pressão e contar os segundos até o restabelecimento da cor (perfusão) completa. 181 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB PROTOCOLO DE TRATAMENTO DE HPP OBJETIVOS DO TRATAMENTO:5 • Restabelecer a volemia ideal para prevenir hipoperfusão/hipo oxigenação tecidual e disfunção de órgãos vitais. • Restabelecer ou prevenir a coagulopatia. • Eliminar as causas de HPP (4 “Ts”). MEDIDAS INICIAIS • Chamar ajuda + monitorização multiparamétrica (frequência cardíaca; SpO2; pressão arterial; frequência respiratória; débito urinário; nível de consciência). • Verbalizar claramente o diagnóstico e chamar equipe para o adequado atendimento da paciente.2 • Solicitar o Kit de HPP para que as medidas gerais iniciais sejam imediatamente providenciadas.2 • Solicitar reserva de 2 concentrados de hemácias no Banco de Sangue; • A avaliação inicial deve incluir também um rápido exame físico do útero, vagina e períneo.2,16 • Providenciar 2 acessos calibrosos (jelco 14 G ou 16 G).2 • Iniciar infusão rápida de solução cristaloide (NaCl 0,9% ou Ringer Lactato).2 • Deve-se ter em mente que o tratamento de hemorragias agudas com infusão endovenosa de soluções cristaloides, especialmente volumes > 1.000 ml, aumenta os riscos de coagulopatia pela diluição dos fatores de coagulação e de plaquetas, além do risco de hipotermia, caso as soluções não estejam em temperaturas adequadas. Sendo assim, a terapia de ressuscitação volêmica deve ser realizada com o menor volume necessário para obtenção de estabilidade hemodinâmica ou deve-se considerar o uso precoce de hemoderivados. • Metas: PAM > 65 mmHg; PAS > 90 mmHg; débito urinário > 30 mL/h.16 • Avaliar a resposta hemodinâmica a cada 250 ml - 500 ml infundidos.2, 16 182 • Máximo: 1.500 ml – 2.000 ml.16 • Oxigenoterapia em máscara facial a 8 l/min-10 l/min: SpO2 > 95%. • Elevação de membros inferiores (posição de Trendelenburg). • Cateterismo vesical de demora e aferição de diurese.2,16 • Avaliação laboratorial: • Hemograma completo (considerar que inicialmente Hb e Ht não refletem a perda sanguínea aguda); tipagem sanguínea; prova cruzada; TAP, TTPa; fibrinogênio.2 • Casos graves e em Protocolo de Transfusão Maciça: lactato, gasometria e eletrólitos (cálcio, potássio, sódio e magnésio).2,16 • Prevenir hipotermia.2 MEDICAMENTOS Tabela 7 - Tratamento Medicamentoso da HPP2 Tratamento Medicamentoso da HPP Posologia Observações Ocitocina (1ª escolha) - Ataque: 20 UI a 40 UI (4 a 8 ampolas) diluídos em 500 mL de SF 0,9%, correr em BIC a 250 mL/h - Manutenção: 20 UI a 40 UI diluídos em 500 mL de SF 0,9%, correr em BIC a 125 mL/h por 4 horas. Após, pode permanecer a 67,5 ml/h por 24 horas SE atonia importante - Pacientes que estiveram em trabalho de parto soroconduzido são menos responsivas à ocitocina (utilizar uterotônicos de segunda linha mais precocemente)2 - Bolus EV está associado a quadros de hipotensão grave6 Derivados do Ergot (metilergo- metrina/ Methergin) (2ª escolha) - 0,2 mg (1 ampola), IM, pode-se repetir a cada 20 minutos - Sangramento grave: realizar manutenção com 0,2 mg, IM, a cada 4h (total de 3 doses) - Dose máxima: 1 mg / 24h - Contraindicações: . distúrbio hipertensivo (mesmo em vigência de hipotensão) . doença vascular oclusiva (inclusive cardiopatia isquêmica) . sepse . hipersensibilidade . uso de proteases para HIV) 183 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Misoprostol (3ª escolha) - 800 mcg via retal2,16 - ou 400 mcg via sublingual16 - Pico: 1h, se via retal; 30 min, se sublingual16 - Contraindicações: . doença vascular cerebral . doença coronariana - Monitorar temperatura, pode ocorrer febre de 40ºC (tratar prontamente) Ácido Tranexâmico (iniciar concomi- tantemente com a ocitocina) - 1 g (4 ampolas) diluído em 100 mL SF 0,9%, EV, infundir em 10 minutos21 - Iniciar assim que identificar a hemorragia - Repetir em 30 minutos se per- sistência do sangramento ou ressangramento dentro de 24 horas - Infusão > 250 mg/min pode causar hipotensão16 - Ajustar a dose para a função renal - Não associar a outro medica- mento (no mesmo soro ou no mesmo equipo)28 Fonte: Adaptado de OPAS, 2018. FLOW CHART: • As condutas e o manejo clínico abaixo descritos devem ser realizados antes mesmo da disponibilização dos exames laboratoriais. • Propomos a Classificação da California Maternal Quality Care Collaborative Hemorrhage Taskforce – Stanford University School of Medicine24 para definição de condutas: • Stage 0: Manejo ativo do 3º período do parto com medidas preventivas e monitorização clínica habitual do puerpério Caso seja diagnosticada HPP > iniciar protocolo de HPP e prosseguir ao Stage 1. • Stage 1: Acionar protocolo de HPP e tratar possíveis causas. Caso paciente persista sangrando ou com instabilidade hemodinâmica após medidas realizadas > prosseguir ao Stage 2. • Stage 2: 184 Em caso de persistência do sangramento, mesmo após medidas iniciais realizadas > transfundir 2 Unidades de Concentrados de Hemácias (CH) + 2 Unidades de Plasma Fresco Congelado (PFC). Transferir paciente para leito com monitorização contínua. Reavaliar 4 “Ts”. Notificar Banco de Sangue sobre possibilidade de abertura de Protocolo de Transfusão Maciça. Preparar para realização de procedimentos invasivos. Caso a paciente persista sangrando ou instável hemodinamicamente ou tenha perda sanguínea estimada > 1.500ml deve-se prosseguir ao Stage 3; • Stage 3: Acionar Protocolo de Transfusão Maciça na proporção de 1:1:1 (4 CH + 4 PFC + 4 U Plaquetas). Acionar equipe de Anestesiologia para considerar monitorização invasiva e via aérea definitiva. Prevenir hipotermia. Solicitar leito com suporte intensivo (UTI) via regulação de leitos. Repetição de exames laboratoriais a cada 30min - 60 min.2,16 • Protocolo de Transfusão Maciça • Transfusão Maciça historicamente é definida como a transfusão de 10 unidades, ou mais, de concentrado de hemácias em um período de 24 horas, em resposta a uma hemorragia grave e descontrolada. Entretanto, com a evolução das terapêuticas e dos estudos recentes, abordagens mais precoces e definições alternativas de transfusão maciça têm surgido com objetivo de identificar, de forma antecipada, os pacientes que necessitam de hemoderivados, prevenindo assim os efeitos deletérios da hemorragia aguda grave.16 Dessa forma, definiremos como transfusão maciça o uso de 4 Unidades de concentrados de hemácias em uma hora.16 • Não há consenso na literatura científica atual a respeito da proporção ideal de hemoderivados durante a Transfusão Maciça, contudo, a maior parte dos estudos disponíveis, incluindo o ATLS 185 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB (Advanced Trauma Life Support) suportam a proporção de 1:1:1 (concentrado de hemácia; plasma fresco congelado; plaquetas).17,22,23 • A fisiologia que suporta essa abordagem deriva da existência de coagulopatia aguda e da diluição natural de hemoderivadosdurante uma hemorragia. Pacientes que se apresentam com Choque Classe IV, tipicamente perderam 30% - 40% de sua volemia sanguínea e a ressuscitação na proporção de 1:1:1; buscar restabelecer também os fatores de coagulação além dos níveis de Hb e Ht.16,17 • Metas Transfusionais:26 • Hemoglobina > 7 g/dL • Plaquetas > 50.000/mm3, 26 • Fibrinogênio > 300 mg/dL • Tempo de protrombina < 1,5 x o valor do controle • TPPa < 1,5 x o valor do controle Tabela 8 - Hemoderivados Hemoderivados Componente Composição Observações Sangue total 1 unidade = 500 ml Hemácias, plaquetas, plasma - Raramente indicado - Considerar quando forem necessárias > 5 - 7 unida- des de concentrado de hemácias Concentrado de hemácias (CH) 1 unidade = 220 ml - 280 mL Hemácias - 1 unidade aumenta 1g/dL na hemoglobina e 3% no hematócrito Plasma fresco congelado (PFC) 1 unidade = 200 ml a 250 ml Todas as proteínas solúveis e fatores de coagulação presentes no plasma - 10 ml/kg a 20 mL/kg - IMC ≥ 25 kg/m², utilizar peso ideal para cálculo de volume de PFC - Eleva o fibrinogênio em 30% 186 Crioprecipitado 1 unidade = 10 ml a 20 ml Fibrinogênio, fator VIII, fator XIII, fator de von Willebrand - 1 unidade/10 kg (aumenta 5 mg/dL – 10 mg/dL de fibrinogênio) Concentrado de Plaquetas 1 unidade = 200 ml Plaquetas - 1 unidade/10 kg Fonte: Adaptado de Belfort, 2019; Ministério da Educação, 2018. DETERMINAR A CAUSA DA HEMORRAGIA (“4TS”) E REALIZAR O TRATAMENTO ESPECÍFICO DE CADA CAUSA 2,16 Tabela 9 - Causas de HPP Tratamento Específico dos “4 Ts” 4 “Ts” Conduta Tônus (atonia) - Massagem uterina bimanual (Manobra de Hamilton): 1ª manobra, realizar concomitantemente aos uterotônicos - Uterotônicos - Balão de tamponamento intrauterino (BTI): se efetivo, manter por 6h a 24h e retirar gradualmente; manter o uso de ocitocina; iniciar antibioticoprofilaxia (cefazolina 1 g, EV, 8h - 8h)2 - Outros dispositivos: Traje antichoque2; tamponamento uterino induzido por vácuo16 - Suturas uterinas hemostáticas:2 . Corpo uterino (setor 1) por atonia: B-Lynch, Hayman e ligadura das artérias uterinas . Corpo uterino (setor 1) por acretismo: Cho . Segmento inferior do útero, colo ou vagina superior (setor 2): Cho, ligadura vascular seletiva baixa - Embolização das artérias hipogástricas ou uterinas - Histerectomia Trauma - Lacerações: rafiar - Hematomas vaginais: drenar apenas se estiver expandindo (a tentativa de drenar pode aumentar o sangramento) - Inversão uterina: manobra de Taxe 187 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tecido - Retenção de tecido placentário: extração manual, se houver plano de clivagem (sem plano de clivagem não realizar devido ao risco de acretismo) ou curetagem; - Acretismo placentário: . histerectomia com a placenta in situ (a manipulação da placenta aumenta o sangramento) . ressecção em bloco: quando não há sangramento ativo . conduta conservadora: abordar no puerpério Trombina Tratamento específico + Transfusão Fonte: OPAS, 2018. Belfort, 2020. • Balão de tamponamento intrauterino Contraindicações: neoplasias invasivas; infecções vaginais e uterinas; sangramento arterial volumoso.2 Obs.: pode ser usado em concomitância com as suturas compressivas;2 manter a paciente em jejum;20 manter infusão contínua de ocitocina.2 Tempo máximo de permanência: 24h.2 Antibioticoprofilaxia: cefazolina 1g, EV, 8h - 8h.2 Inserir um cateter com balão (opção na falta do balão de tamponamento: sonda de Foley 18) na cavidade uterina.20 Injetar 80 mL - 300 mL de solução salina morna no balão (até que o balão fique visível no colo uterino). Após confirmada a eficácia no controle do sangramento (perceptível em alguns minutos), marcar a altura uterina para utilizar como referência nas próximas avaliações;20 e Retirada gradual em etapas de 50 ml2 após 6h - 8h de controle do sangramento.20 SEQUÊNCIA DO MANEJO CLÍNICO É de fundamental importância lembrar que o diagnóstico e início do tratamento devem ser o mais precocemente possível, visto que a HORA DE OURO é um período crítico e essencial na abordagem terapêutica e na prevenção da tríade letal (coagulopatia/ 188 hipercoagulabilidade, hipotermia, acidose metabólica)2, esquematizada na figura abaixo: Figura 1: Tríade Letal. Fonte:Transfusion in Trauma. The Emergency Medicine Trauma Handbook. Cambridge University, 2019. A abordagem da HPP necessita então de uma sequência rápida de atendimento (Fluxograma 1) Tabela 10 - Algoritmo de ação na HPP Algoritmo de Ação: H.A.E.M.O.S.T.A.S.I.S H HPP identificada A Ajuda E Estabelecer 2 acessos venosos e iniciar a ressuscitação volêmica (até 2 L de cristaloides e hemoderivados 1:1 ou 4:4:4) M Massagem uterina O Ocitocina e outros uterotônicos S Sala de cirurgia T Tônus, trauma, tecido (revisão), trombina e tamponamento uterino (balão) A Artéria uterina - Ligadura (Técnica de O’ Leary ou Posadas) S Suturas compressivas (B-Lynch, Hayman, Cho) I Intervenção radiológica (embolização) S Subtotal ou total – Histerectomia Fonte: FIGO, 2006. 189 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Fluxograma 1 - Condutas na HPP (Resumo) 190 Fl ux og ra m a 2 - F lo w Ch ar t H PP Fo nt e: A da pt ad o de O bs te tr ic E m er ge nc y M an ag em en t P la n: F lo w Ch ar t F or m at . C al ifo rn ia M at er na l Q ua lit y Ca re C ol la bo ra tiv e H em or rh ag e Ta sk fo rc e - S ta nf or d Un iv er sit y Sc ho ol o f M ed ic in e, 2 01 5. 191 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB REFERÊNCIAS 1. World Health Organization. WHO recommendations for the prevention and treatment of postpartum haemorrhage. Geneva: World Health Organization; 2012. 2. Organização Pan-Americana da Saúde. Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica. Brasília: OPAS; 2018. 3. American College of Obstetricians and Gynecologists. ACOG Practice Bulletin Number 183, October 2017: Postpartum hemorrhage. Obstet Gynecol 2017; 130:e168. 4. Prevention and management of postpartum haemorrhage: Green-top guideline No. 52. ROCG. BJOG 2017; 124:e106. 5. Belfort, MA. Overview of postpartum hemorrhage.Up To Date, 2020. 6. Bergehella, V. Management of the third stage of labor after vaginal delivery: Drug therapy to minimize hemorrhage. Up To Date, 2020. 7. 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Ministério da Educação, Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, Agência Transfusional/ Unidade de Hematologia e Oncologia do Hospital Universitário Lauro Wanderley da Universidade Federal da Paraíba. Protocolo de Transfusão Segura de Hemocomponentes: 2018. 28. Ebserh. Guia para preparo de medicamentos injetáveis 2019. 1ª ed. Setor de Farmácia Hospitalar. Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – Ministério da Educação. Florianópolis: Hospital Universitário Prof. Polydoro Ernani de São Thiago, 2019. 193 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB INTRODUÇÃO Tromboembolismo venoso (TEV) refere-se à trombose venosa profunda (TVP) e/ou embolia pulmonar (EP) e representa hoje uma importante doença, com potencial gravidade quanto à mortalidade materna.1,2 Quando controladas as causas clássicas dessa mortalidade – infecções puerperais, doenças hipertensivas e hemorrágicas -, o TEV aparece como uma das principais causas de morte materna - quinta causa em nível global, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), e primeira em alguns países desenvolvidos, como Estados Unidos.1,3 Estima-se que no Brasil os problemas relacionados ao TEV são responsáveis por 4,2% de todas as causas de mortalidade materna.2 Durante a gestação, o risco de eventos tromboembólicos aumenta de 5 a 10 vezes, podendo chegar a 20 vezes no puerpério, sendo que o risco persiste por até 12 semanas no pós-parto.1 A gestação por si só já é um grande fator de risco para TEV, pois há a presença dos três componentes etiopatogênicos da Tríade de Virchow: estase venosa, hipercoagulabilidade, lesão endotelial.1 A presença de trombofilias adquiridas e hereditárias é fator de risco para TEV.1 A adquirida mais importante é a Síndrome Antifosfolipídica (SAF), podendo cursar com manifestações venosas e arteriais.2 Já as hereditárias são responsáveis por 20% a 50% dos casos de TEV associados àa gravidez e têm maior relação com manifestações venosas.1,4 Quanto à incidência, em torno de 80% dos eventos tromboembólicos que ocorrem durante a gravidez são TVP e 20% são casos de EP.3 Nas gestantes, as TVPs predominam no membro inferior esquerdo (90% versus 55%) e no segmento íleofemoral (72% versus 9%). Já os episódios de EP ocorridos nas primeiras seis semanas do puerpério representam 43% a 60% dos casos.1 DISTÚRBIOS TROMBOEMBÓLICOS DURANTE A GESTAÇÃO Carolina Genaro Pultrin Andressa Luiza Costa Rodrigues de Paiva Alexandre Pavan Garieri 194 FATORES DE RISCO O risco para TVP é maior na primeira semana pós-parto e no terceiro trimestre.3 Estima-se que gestantes com doenças tromboembólicas apresentem ao menos um fator de risco identificável.1 O risco de recorrência é 24,8 vezes maior nas gestantes com TEV prévio.1 Tabela 1 - Fatores de Risco para Trombose Venosa Profunda Idade > 35 anos Obesidade IMC > 30 Kg/m2 Ganho de peso > 21 Kg durante a gestação Paridade > 3 TEV prévio Trombofilia hereditária Cardiopatia Pré-eclâmpsia Infecção pós-parto Hemorragia pós-parto Cesariana / Cirurgias Imobilidade Natimorto Gemelaridade Fonte: Oliveira AL, et al. Tromboembolismo venoso na gestação. FEBRASGO; 2018. DIAGNÓSTICO Apesar da suspeita clínica ser importante, os sinais e sintomas observados na TVP e na EP são inespecíficos, se sobrepondo a muitas das características da gravidez normal. Assim, o diagnóstico é auxiliado por exames complementares.4 A. TROMBOSE VENOSA PROFUNDA Diagnóstico Clínico:3,4 extremidade acometida com edema, rubor, dor e empastamento; sinal de Homan (dorsiflexão do pé provocando dor em panturrilha); diferença de 2 cm entre a circunferência do membro afetado e a do normal; palpação de cordão endurecido no membro afetado. Exames complementares:3,4,5 • USG com doppler: primeiro exame a ser solicitado, altamente sensível e específico.6 Se negativo e ainda houver alta suspeita de TVP, considerar repetir o exame em 3 a 7 dias.3 195 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB • Venografia por Ressonância Magnética: alta sensibilidade e especificidade na detecção de trombose pélvica e de membros.6 B. EMBOLIA PULMONAR Diagnóstico Clínico: dispneia de início súbito; dor torácica; hemoptise; síncope; taquidispneia; taquicardia; hipotensão; dor pleurítica; sinais de hipertensão pulmonar (ingurgitamento jugular, desdobramento de B2, dilatação do ventrículo direito).4 Exames complementares: • Gasometria arterial: alcalose respiratória pode ocorrer tanto no EP quanto na gestação.4 • D-Dímero: se negativo, exclui a doença, mas se positivo não se torna útil, pois pode estar aumentado durante uma gestação normal.4 • ECG: cor pulmonale agudo, como S1, Q3 e T3, bloqueio de ramo direito, alterações de onda P ou desvio de eixo direito.4 • Radiografia de tórax: normal na maioria das pacientes com EP. Podem apresentar áreas de infiltrado, atelectasias, derrame pleural e imagem em cunha com diminuição de vascularização.4 • Cintilografia pulmonar: exame de escolha para gestantes e não gestantes.4 O risco fetal é mínimo quando considerado o risco de morte materna de 15% quando o diagnóstico de EP não é realizado.4 • Ressonância Magnética: vantagem de não produzir radiação e possuir sensibilidade e especificidade semelhantes à tomografia computadorizada.4 • Tomografia Computadorizada: exposição fetal à radiação menor do que na cintilografia, com sensibilidade e especificidade semelhantes entre esses dois exames.4 • Angiografia pulmonar: padrão-ouro para EP, porém é invasiva e o índice de mortalidade é de 0,5%.4 TRATAMENTO E PROFILAXIA A estratificação de risco deve ser realizada em todo o período pré-gestacional, com reavaliação ao longo do pré-natale durante a internação.1 Não há dados 196 suficientes para apoiar o uso rotineiro de tromboprofilaxia para todas as mulheres hospitalizadas durante a gravidez ou pós-parto.6 O uso de meias compressivas no período gestacional e puerpério, além de deambulação precoce no caso de pós- parto, são recomendados; já o uso de medicação deve ser avaliado.4 A profilaxia farmacológica deve ser realizada conforme fatores de risco (tabela 4) e mantida por pelo menos 6 semanas após o parto. Embora a heparina não fracionada (HNF) possa ser usada durante a gravidez, tanto na prevenção quanto no tratamento do tromboembolismo, a heparina de baixo peso molecular (HBPM) – enoxaparina – tem um perfil de segurança melhor do que a HNF com incidência de sangramento e outras complicações mais baixas.5 A HNF intravenosa deve ser considerada em pacientes que possam necessitar de trombólise, cirurgia ou parto de urgência.5 Destacamos que a varfarina deve ser evitada, especialmente no primeiro trimestre por seu potencial teratogênico.7 Tabela 2 - Contraindicações para o uso de heparina de baixo peso molecular Discrasia sanguínea Hemofilia; doença de von Willebrand; coagulopatia adquirida Hemorragia ativa Tanto no pré-natal quanto no pós-parto Risco elevado para hemorragia Placenta prévia Trombocitopenia Plaquetas < 75.000 Acidente vascular cerebral Hemorrágico ou isquêmico nas últimas 4 semanas Doença renal grave Taxa de filtração glomerular < 30 ml/min/1,73m2 Doença hepática grave Tempo de protrombina elevada Hipertensão descontrolada PAS ≥ 200 mmHg ou PAD > 120 mmHg Fonte: adaptado de Reducing the Risk of Venous Thromboembolism during Pregnancy and the Puerperium. Green-Top Guideline Number 37. Royal College of Obstetricians & Gynaecologists, 2015 Para mulheres que estão recebendo heparina de baixo peso molecular na dose profilática, a descontinuação é recomendada pelo menos 12 horas antes da indução programada do parto ou parto cesáreo; um intervalo de 24 horas é recomendado para pacientes com dose intermediária ou terapêutica.11 Para doses de heparina não fracionada de 7.500 unidades SC, duas vezes ao dia ou mais, um intervalo de 12 horas, bem como avaliação da coagulação com testes laboratoriais são recomendados.11 Em mulheres recebendo anticoagulação terapêutica, pode ser 197 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB trocado a HBPM por HNF, sendo que o propósito dessa conversão não está no risco de sangramento materno e sim no risco de hematoma espinhal.11 Quando houver alto risco para TEV, pode-se substituir a HBPM por HNF na internação, pois esta pode ser descontinuada 4h a 6h antes do parto.7 Reiniciar dose terapêutica HBPM ou HNF 4h a 6h após os partos vaginais e 6h a 12h após as cesarianas.11 Nos casos de dose profilática, a anticoagulação deverá ser reiniciada 6h a 12h após os partos vaginais e 12h a 24h após as cesarianas.1 Para mulheres que requerem anticoagulação mais de 6 semanas de pós-parto, a varfarina é uma boa opção, porém a paciente deve receber ambos anticoagulantes, varfarina e heparina, por pelo menos 5 dias, até alcançar INR entre 2 e 3 em dois dias consecutivos.5 A duração ideal da anticoagulação em pacientes com TEV durante a gestação é desconhecida e deve ser individualizada caso a caso. No entanto, a duração total da terapia anticoagulante para essas pacientes deve ser de pelo menos três a seis meses se os únicos fatores de risco para TEV forem transitórios (por exemplo, gravidez, cesariana).7 A terapia anticoagulante geralmente continua por pelo menos seis semanas após o parto.7 Pacientes com fatores de risco persistentes para TEV podem requerer maior duração da terapia.7 Tabela 3 - Doses da Heparina na Gestação 1A HBPM pode prolongar o TTPa, mas não deve ser monitorizada para resposta terapêutica. Abreviaturas: SC (subcutâneo); EV (endovenosa) Heparina Dose Heparina de Baixo Peso Molecular Enoxaparina1 Profilática - 40 mg, SC, 1 vez ao dia Intermediária - 40 mg, SC, uma vez ao dia; - Aumentar no decorrer da gestação até 1 mg/kg uma vez ao dia. Terapêutica - 1 mg/kg, SC, 12h-12h Profilática - 5.000 unidades, SC, 12h-12h 198 1A HBPM pode prolongar o TTPa, mas não deve ser monitorizada para resposta terapêutica. Abreviaturas: SC (subcutâneo); EV (endovenosa). Fonte: adaptado de Malhotra, A; Weinberger, SE. Deep vein thrombosis and pulmonary embolism in pregnancy: Treatment. Up To Date, 2019. Heparina Não Fracionada Intermediária 1º trimestre - 5.000 – 7.500 unidades, SC, 12h-12h 2º trimestre - 7.500 – 10.000 unidades, SC, 12h-12h 3º trimestre - 10.000 unidades, SC, 12h-12h Terapêutica SC - 17.500 unidades de 12h em 12h; - Solicitar o TTPa 6h após a 2ª dose e a cada ajuste de dose; - Ao alcançar a dose terapêutica: solicitar o TTPa em 3 - 4 dias e, em seguida, a cada duas semanas; - Após 30 semanas de gestação, o monitoramento do TTPa deve ser mais rigoroso. EV - Bolus de 80 UI/kg; - Infusão contínua de 18 UI/kg/hora; - Ajustar a dose a cada 6h até atingir um TTPa terapêutico; - Solicitar o TTPa 1 x a 2 x ao dia após atingir a dose terapêutica. Heparina Dose 199 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 4 - Conduta de Acordo com os Fatores de Risco para Tromboembolismo Venoso Fator de Risco Prévio Escore TEV anterior não relacionado com grande cirurgia 4 TEV anterior causado por uma grande cirurgia 3 Alto risco para trombofilia 3 Comorbidades: câncer; insuficiência cardíaca; LES ativo; poliartropatia inflamatória; doença intestinal inflamatória, síndrome nefrótica, DM1 com nefropatia, anemia falciforme, usuário de drogas EV. 3 IMC ≥ 40 2 IMC ≥ 30 1 História familiar de parente de primeiro grau com TEV não provocada ou relacionada ao estrogênio 1 Baixo risco para trombofilia 1 Idade > 35 anos 1 Tabagismo 1 Veias varicosas calibrosas 1 Paridade ≥ 3 1 Fator de Risco Obstétrico Escore Parto cesariano durante o trabalho de parto 2 Cesariana eletiva 1 Pré-eclâmpsia atual 1 Terapia de reprodução assistida / fertilização in vitro (somente no pré-natal) 1 Gestações múltiplas 1 Trabalho de parto prolongado (> 24h) 1 Hemorragia pós-parto (perda > 1l ou necessidade de transfusão) 1 Parto normal operatório com rotação 1 Parto prematuro na gestação atual (< 37 semanas) 1 Morte fetal na gestação atual 1 Fatores de Risco Transitórios Escore 200 Síndrome de Hiperestimulação Ovariana 4 Qualquer procedimento cirúrgico durante a gestação ou puerpério, ex- ceto reparo imediato do períneo 3 Hiperêmese 3 Infecção sistêmica atual 1 Imobilidade, desidratação 1 Resultado e Conduta Escore Final Pré-natal: considerar profilaxia para trombose desde o primeiro trimes- tre ≥ 4 Pré-natal: considerar profilaxia para trombose a partir das 28 semanas de IG 3 Pós-parto: considerar profilaxia para trombose por pelo menos 10 dias ≥2 Considerar profilaxia se internação no pré-natal - Considerar profilaxia se houver internação por mais de 3 dias ou read- missão no puerpério - Abreviaturas: TEV (tromboembolismo venoso); LES (Lúpus Eritematoso Sistêmico); DM1 (diabetes mellitus tipo 1); EV (endovenosa); IMC (índice de massa corpórea); IG (idade gestacional) Fonte: adaptado de Reducing the Risk of Venous Thromboembolism during Pregnancy and the Puerperium. Green-Top Guideline Number 37. Royal College of Obstetricians & Gynaecologists, 2015. Hull, RD. et al. Heparin and LMW heparin: Dosing and adverse effects. Up to Date, 2019. COMPLICAÇÕES DOS ANTICOAGULANTES As complicações podem ocorrer mesmo em doses terapêuticas, porém o risco é aumentado nos tratamentos prolongados.7 a. Sangramento: o tratamento deve ser individualizado.7 Geralmente, pode-se suspender a anticoagulação até a resolução do sangramento.7 Nos casos de sangramento por placenta prévia ou descolamento prematuro de placenta,não recomendamos retomar a anticoagulação.7 b. Trombocitopenia: a trombocitopenia induzida por heparina, fracionada ou não, pode ser fatal, ocorrendo em 5% das pacientes, independentemente da dose ou via de administração.7,12 O tratamento deve ser prontamente iniciado na suspeita 201 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB diagnóstica, mesmo antes dos exames laboratoriais estarem disponíveis.12 As medidas iniciais são: suspender heparina e varfarina; iniciar um anticoagulante que não seja heparina ou varfarina.12 c. Necrose de pele: pode ser uma manifestação da trombocitopenia induzida por heparina.7 d. Osteoporose: ocorre mais nos casos de uso por mais de 7 semanas de heparina, sendo mais comum com a HNF.7 REFERÊNCIAS 1. Oliveira AL, Marques MA, von Ristow A, Paschoa AF. Tromboembolismo venoso na gestação. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO); 2018. 2. Ministério da Saúde, Secretaria de atenção especializada em saúde, portaria conjunta n°4, 12 de fevereiro de 2020. 3. ACOG Practice Bulletin No. 196: Thromboembolism in Pregnancy. Obstet Gynecol. Jul;132(1):e1-e17, 2018. 4. Andrade BA, Gagliano GI, Peret FJ. Tromboembolismo venoso no ciclo gravídico puerperal / Venous thromboembolism in pregnant-puerperal cycle. FEMINA, vol 37, nº 11, 2009. 5. Ruano R, Yoshizaki CT, Matinelli S, Pereira. Doenças Tromboembólicas. In: Zugaib M, organizador. Obstetrícia. São Paulo: Manole; 2008. 6. Malhotra, A. Weinberger, S. Deep vein thrombosis in pregnancy: Epidemiology, pathogenesis, and diagnosis. Up to Date, 2020. 7. Malhotra, A; Weinberger, SE. Deep vein thrombosis and pulmonary embolism in pregnancy: Treatment. Up To Date, 2019. 8. Reducing the Risk of Venous Thrimbiembolism during Pregnancy and the Puerperium. Green-Top Guideline Number 37. Royal College of Obstetricians & Gynaecologists. P -40, 2015. 9. Malhotra, A; Weinberger, SE. Deep vein thrombosis and pulmonary embolism in pregnancy: Prevention. Up To Date, 2020. 10. Hull, RD. et al. Heparin and LMW heparin: Dosing and adverse effects. Up to Date, 2019. 11. Bauer, KA. Use of anticoagulants during pregnancy and postpartum. Up to Date, 2020. 12. Coutre, S. Management of heparin-induced thrombocytopenia. Up to Date, 2019. 202 INTRODUÇÃO Os hemocomponentes são frações do sangue obtidas através de processos físicos, como centrifugação e congelamento.¹ São produtos gerados de doação de sangue total ou por aférese, sendo divididos em: concentrado de hemácias, concentrado de hemácias desleucocitadas, concentrado de hemácias lavadas, plasma fresco, concentrado de plaquetas randômicas, concentrado de plaquetas por aférese, Pool de Buffy Coat, concentrado de granulócitos e crioprecipitado.¹ A hemotransfusão deve ser realizada com função de restauração ou de manutenção da capacidade do transporte de oxigênio e de hemostasia.² Este é considerado um procedimento com risco potencial, sendo necessário o uso racional, e a decisão de realizá-lo deve ser compartilhada com o paciente ou seus familiares.³ Sempre que possível, devemos dar preferência a estratégias alternativas para a condução do paciente, como o uso de cristaloides.² Tabela 1 - Metas Transfusionais Metas Transfusionais Hemoglobina > 8 g/dl Hematócrito 21% - 24% Plaquetas > 50.000 (ou > 100.000 se sangramento ativo) Protrombina < 1,5 vezes o controle PTTa < 1,5 a 1,7 vezes o controle Fibrinogênio > 200 mg/dl Fonte: OPAS. Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica, 2018. USO DE HEMOCOMPONENTES NA EMERGÊNCIA OBSTÉTRICA Bruna Morena Messias de Lima Dias Adriano Bueno Tavares Roberta Gava Tedesco Horta 203 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB CONCENTRADO DE HEMÁCIAS (CH) O CH é indicado para tratar ou prevenir iminente e inadequada liberação de oxigênio (O2) aos tecidos.¹ A decisão sobre a transfusão de CH deve ser baseada em fatores clínicos e laboratoriais, como: idade do paciente, velocidade de instalação da anemia, história natural da anemia, volume intravascular, uso de medicações e a presença de cofatores fisiológicos que afetam a função cardiopulmonar.² É mandatório que classifiquemos o grau de choque para melhor propedêutica quando diante de um sangramento.⁴ No ambiente da Obstetrícia, além da identificação precoce da hemorragia pós- parto (HPP), devemos identificar qual a causa, para que o manejo seja mais eficaz. Primeiramente, é necessário que a fonte de sangramento seja controlada e ocorra a restauração do volume sanguíneo.4 Demais informações sobre identificação e manejo da HPP podem ser encontradas no capítulo específico deste manual. Tabela 2 - Indicações para o Uso de Concentrado de Hemácias Indicações para o Uso de Concentrado de Hemácias Hemorragias após perda volêmica superior a 30% da volemia total Choque grau moderado ou grave Hemoglobina < 6 g/dl Hemoglobina > 6 g/dl e ≤ 8 g/dl deve-se transfundir apenas com a presença de fatores de risco cardiovascular e/ou de sinais de hipóxia Hemoglobina entre 6 g/dl e 10 g/dl, se sinais clínicos e laboratoriais de má perfusão, como taquicardia, hipotensão, baixo débito cardíaco, lactato > 2 mmol/l e acidose Fonte: EBSERH. Protocolo de Transfusão Segura de Hemocomponentes, 2018. A unidade de CH tem volume de aproximadamente 220 ml – 280 ml e é esperado que ocorra um aumento, em média, de 1 g/dl no valor da hemoglobina (Hb) e de 3% do hematócrito (Ht) da paciente à administração de cada unidade.² Pode haver um aumento discreto na quantidade de plasma, leucócitos e plaquetas pois há, na unidade, pequena quantidade destes componentes.¹ A quantidade de CH administrada deve ser suficiente para correção de sinais ou sintomas de hipóxia, ou para que a hemoglobina fique entre 6 g/dL-10 g/dl e/ou se atinja estabilidade hemodinâmica.2,3 204 O ideal é que seja realizado um CH por vez, pois frequentemente somente uma unidade é suficiente.³ A velocidade de infusão deve ser lenta nos primeiros 15 minutos – em média, 15 gotas/minuto.¹ Após esse período, fica a critério médico, a depender do quadro clínico da paciente.¹ No entanto, o tempo de administração não deve exceder 2 horas.¹ A avaliação da resposta terapêutica à transfusão de CH deve ser feita por meio de nova dosagem de Hb ou Ht 1h a 2h após a transfusão, considerando também a resposta clínica.² PLASMA FRESCO CONGELADO (PFC) O plasma é uma fração do sangue composta primariamente de água, com cerca de 7% de proteínas e 2% de carboidratos e lipídeos. Logo, é indicado nos casos de distúrbios ou deficiência de fatores de coagulação para efeitos de hemostasia.¹ A resposta metabólica ao trauma, perda maciça de sangue e a hemotransfusão maciça podem acarretar coagulopatia, podendo esta ser dilucional ou por consumo de fatores de coagulação, dificultando a hemostasia da paciente.² Tabela 3 - Indicações para o Uso de Plasma Fresco Congelado Indicações para o Uso de Plasma Fresco Congelado Deficiência de fatores de coagulação, congênita ou adquirida Sangramento intenso com coagulopatia Coagulação Intravascular Disseminada (CIVD) com sangramento grave ativo, evidência laboratorial de deficiência de múltiplos fatores de coagulação, INR > 1,5 e/ou TTPa no mínimo 50% aumentado Hepatopatias com hemorragia e déficit de vários fatores de coagulação e com INR > 1,5 e/ou TTPa no mínimo de 1,5 x o controle Púrpura Trombocitopênica Trombótica (PTT) Trombose por déficit de Antitrombina III, quando não houver concentrado específico Urgências para reversão dos efeitos de dicumarínicos, com sangramento associado ao uso de vitamina K, e somente quando não houver disponibilidade de uso de CCP - Concentrado de Complexo Protrombínico Transfusão maciça Se TTPa/R ou TP/INR for superior a 1,6 - 1,8 antes de procedimento invasivo ou cirúrgico 205 Manual de Condutas Obstétricas do HMIBTempo de Protrombina: TP, Tempo de Tromboplastina Parcialmente Ativada: TTPa, Índice Internacional Normalizado: INR Fonte: EBSERH. Protocolo de Transfusão Segura de Hemocomponentes, 2018. A unidade de plasma fresco congelado (PFC) tem volume em torno de 200 ml – 250 ml¹. A administração deve ser realizada com cálculo de 10 ml - 20 ml de PFC por quilo de peso da paciente, sendo esperado um aumento de 20% - 30% nos níveis dos fatores de coagulação, chegando a níveis hemostáticos.³ Caso esta tenha Índice de Massa Corpórea (IMC) ≥ 25 kg/m², utilizar peso ideal para cálculo de volume de PFC necessário para transfusão.³ A transfusão de PFC não precisa ser precedida de testes de compatibilidade, porém, se possível, sempre utilizar um PFC com compatibilidade do sistema ABO. Este deve estar completamente descongelado – processo realizado em banho maria a 37ºC.³ O tempo máximo de infusão deste hemocomponente é de 1 hora, não devendo ser realizado caso o PFC apresente aspecto lipidêmico, ictérico, com presença de filamentos de fibrina, precipitados ou turbidez – pode ser um indicativo de contaminação bacteriana.1,2 Na transfusão de PFC, além dos riscos associados à contaminação com vírus e outros patógenos transmissíveis pelo sangue, merecem especial atenção as complicações transfusionais relacionadas à anafilaxia e às reações alérgicas, TRALI (lesão pulmonar associada à transfusão) e hemólise a partir de anticorpos presentes no plasma transfundido.³ A avaliação da necessidade do uso de PFC e da resposta terapêutica é realizada pela dosagem do TP e TTPa antes e após a transfusão.³ CONCENTRADO DE PLAQUETAS (CP) As plaquetas são produtos derivados dos megacariócitos, encontrados fisiologicamente na medula óssea, atuando na fase primária da coagulação. Assim, a indicação de transfusão de plaquetas está associada à plaquetopenia devido à falência medular.¹ A indicação de transfusão de plaquetas por destruição periférica ou por alterações da função plaquetária é menos comum.³ Tabela 4 - Indicações para o Uso de Concentrado de Plaquetas 206 Indicações para o Uso de Concentrado de Plaquetas Contagem de plaquetas inferior a 10.000/µL Pacientes com planejamento cirúrgico e contagens de plaquetas < 50.000/µL CIVD, se na presença de sangramentos, mesmo que sem gravidade no momento, associado PFC, para obter contagens superiores a 20.000/µL Sangramento em pacientes com defeito qualitativo plaquetário Pacientes com sangramento e contagem plaquetária < 50.000/µL Disfunções plaquetárias congênitas Contagem de plaquetas inferior a 20.000/µL associada a febre, hemorragias, alterações de hemostasia, queda rápida da contagem de plaquetas, quimioterapia, esplenomegalia, utilização de medicações que encurtam a sobrevida das plaquetas Plaquetopenias imunes, se sangramentos graves, associadas a formas de tratamento específico, como altas doses de corticoides e imunoglobulina Transfusão maciça, quando ocorre a troca de aproximadamente duas volemias da paciente Fonte: EBSERH. Protocolo de Transfusão Segura de Hemocomponentes, 2018. As seguintes condições clínicas não são indicações per si para transfusão de CP a priori. No entanto, caso as situações citadas acima estejam presentes, a administração de CP deverá ser realizada. Tabela 5 - Transfusões Habitualmente não Indicadas de Concentrado de Plaquetas Transfusões Habitualmente não Indicadas de Concentrado de Plaquetas Púrpura Trombocitopênica Trombótica (PTT). Síndrome Hemolítica Urêmica. Síndrome HELLP (ver manejo no Capítulo de Síndromes Hipertensivas). Púrpura pós-transfusional. Trombocitopenia induzida pela heparina (HIT). Fonte: Fundação Hemocentro de Brasília. Protocolo Transfusional - Indicação de Hemocomponentes, 2018. A obtenção de plaquetas pode ser realizada por sangue total ou por aférese.7 Nas plaquetas randômicas – produzidas a partir da doação de uma unidade de sangue total – cada bolsa contém no mínimo 5,5 x 1010 plaquetas, com volume 207 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB aproximado de 40 ml a 70 ml.³,7 Elas podem ser preparadas em pool, que é obtido pela junção de 3 a 5 unidades de buffy coat (plaquetas são extraídas da camada leucoplaquetária de uma bolsa de sangue total).1,7 Já no Concentrado de Plaquetas por aférese, as plaquetas são obtidas de doador único.7 Cada unidade contém no mínimo 3,0 x 1011 plaquetas, em aproximadamente 200 ml de plasma, correspondendo a 6 a 8 unidades de CP randômicas e já é leucorreduzido³,7. Assim, uma dose de plaqueta para adultos significa:4 • 1 “pool” de plaquetas: ± 250 ml. Equivale a ± 5 unidades randômicas;4 • 1 aférese de plaquetas: ± 350 ml. Equivale a ± 6-8 unidades randômicas;4 • 7 unidades plaquetas randômicas: ± 300 ml.4 No HMIB, dispomos apenas de plaquetas randômicas e estima-se que cada unidade elevará o número total de plaquetas em 5.000 - 10.000.4 A necessidade de unidades de plaquetas pode ser estimada pelo peso, devendo ser administrada uma unidade de plaqueta randômica para cada 10 quilos do paciente.7 Vale ressaltar que cada unidade de CP contém grande quantidade de leucócitos (superior a 1 x 108).¹ Nas transfusões terapêuticas, temos como objetivo uma contagem de plaquetas superior a 40.000/μL; já nas profiláticas, é suficiente que esta seja superior a 25.000/μL.³ A transfusão de plaquetas obedece à compatibilidade dos sistemas ABO e RhD entre doador e receptor.7 A transfusão de plaquetas ABO incompatíveis pode ser feita, desde que seja administrado antialérgico previamente à transfusão e, quando em crianças, estas tenham mais de 2 anos.¹ O tempo de infusão da dose de CP deve ser de aproximadamente 30 minutos em pacientes adultos ou pediátricos, não excedendo a velocidade de infusão de 20 ml/ kg/hora - 30 ml/kg/hora.² A transfusão é eficaz quando a recuperação plaquetária é superior a 30% em 1h e a 20% em 24h após a transfusão do concentrado de plaquetas, sendo uma análise útil para a avaliação da refratariedade do tratamento.7 208 CRIOPRECIPITADO O crioprecipitado é um hemocomponente composto por fibrinogênio – 150mg; fator VIII – 80 UI -120 UI; fator XIII – 20% a 30% da quantidade inicial; fator de Von Willebrand – 40% a 70% da quantidade inicial.¹ Este está indicado no tratamento de hipofibrinogenemia congênita ou adquirida (< 100 mg/dl), disfibrinogenemia ou deficiência de fator XIII.² Tabela 6 - Indicações para o Uso de Crioprecipitado Indicações para o Uso de Crioprecipitado Hipofibrinogenemia ou disfibrinogenemia. Doença de Von Willebrand, quando não houver o fator industrializado. Deficiência de fator VIII, quando não houver o fator industrializado. Reposição de fibrinogênio em pacientes com hemorragia e deficiência isolada congênita ou adquirida de fibrinogênio, quando não se dispuser do concentrado de fibrinogênio industrial purificado. Repor fibrinogênio em pacientes com CIVD e graves hipofibrinogenemias. Fonte: EBSERH. Protocolo de Transfusão Segura de Hemocomponentes, 2018 Cada unidade deste hemocomponente aumentará o fibrinogênio em 5 mg/dl - 10 mg/dl em um adulto médio, na ausência de grandes sangramentos ou de consumo excessivo de fibrinogênio.² O cálculo da necessidade de crioprecipitado deve ser 1 a 1,5 unidade por cada 10 kg de peso do paciente com a intenção de atingir nível de fibrinogênio hemostático de 100 mg/dl, reavaliando-se a cada 3 a 4 dias.² A quantidade necessária pode ser diminuída quando houver administração concomitante de concentrado de hemácias e/ou de plaquetas porque esses produtos contêm 2 mg – 4 mg de fibrinogênio/ml.² Sempre que possível deve-se utilizar componente com compatibilidade do sistema ABO. Quando não houdisponibilidade da bolsa ABO compatível, os grupos serão aceitos para transfusão, exceto em crianças.¹ HEMOTRANSFUSÃO MACIÇA O índice de choque (IC) é um marcador de instabilidade hemodinâmica e um método eficaz para estimar perda volêmica. É calculadopela razão entre frequência cardíaca e a pressão arterial sistólica e, quando diante de 209 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB um IC ≥ 1.4, estaremos em frente a um caso em que será necessário abrir o protocolo de hemotransfusão maciça.4 (Vide capítulo Hemorragia pós-parto) TRANSFUSÕES DE EXTREMA URGÊNCIA É um tipo de transfusão em que não é possível aguardar o término dos testes pré-transfusionais pelo risco de o paciente evoluir para óbito. É indicado utilizar concentrados de hemácias de grupo sanguíneo O e fator Rh negativo.¹ Caso esse tipo sanguíneo esteja indisponível, e em caso de emergência, é possível a transfusão de sangue RhD positivo para pacientes RhD negativos.² Estima-se que a probabilidade de uma paciente que nunca recebeu transfusão e nunca engravidou estar sensibilizada é de 0,04%.³ Esse risco aumenta para 3% naquelas previamente transfundidas ou que já engravidaram. As transfusões de extrema urgência, com provas de compatibilidade em andamento, só se justificam nos casos de real risco de morte imediata da paciente.³ O médico que solicitar a transfusão deverá assinar um termo de responsabilidade e acompanhar todo o curso do procedimento.³ REAÇÕES PÓS-TRANSFUSIONAIS A reação transfusional é toda e qualquer intercorrência que ocorra como consequência da administração de hemocomponentes, seja durante ou após a sua administração.² São classificadas em imediatas – as que ocorrem até 24h após transfusão – ou tardias, quando ocorrem após 24h de sua realização. Podem ocorrer devido a reações imunológicas ou não imunológicas.² Neste manual daremos ênfase às reações mais frequentes decorrentes da transfusão de hemocomponentes, para que sejam mais facilmente detectadas e manejadas adequadamente. Tabela 7 - Reações pós-transfusionais Reação Clínica Conduta Prevenção Reação Hemolítica Aguda Febre, tremores, calafrios, hipotensão, taquicardia, hemoglobinúria, insuficiência renal e CIVD. Hidratação (manter diurese 100 ml/h). Cuidados de terapia intensiva. Seguir rigorosamente todas as normas preconizadas desde a coleta até a transfusão. 210 Reação Febril não Hemolítica Febre. Antipiréticos. Meperidina. Pré-medicação com antipiréticos. Reação Alérgica Prurido, urticária, eritema, pápulas, tosse, rouquidão, dispneia, sibilos, náuseas e vômitos, hipotensão e choque. Depende da gravidade. Epinefrina. Anti-histamínicos Corticosteroide. Componentes celulares lavados ou deficientes em IgA. TRALI (Injúria pulmonar relacionada a transfusão) Insuficiência respiratória aguda (até 6 horas após) e febre. Suporte respiratório. Não há consenso. Evitar uso de plasma feminino e relacionados. Sobrecarga volêmica Dispneia, cianose, taquicardia, hipertensão, edema pulmonar. Suporte de O2 e diuréticos. Aliquotar o hemocomponente. Diurético prévio. Hemólise não Imune Oligossintomática. Atenção à presença de hemoglobinúria e hemoglobinemia. Terapia de suporte, se necessário. Seguir rigorosamente todas as normas de transfusão. Hipocalcemia Parestesia, tetania, arritmia Infusão lenta de cálcio com monitorização periódica dos níveis séricos. Monitorização dos níveis de cálcio em quem recebe transfusão maciça. Embolia Aérea Dispneia, cianose súbita, dor, tosse, hipotensão, arritmia cardíaca. Deitar paciente em decúbito lateral esquerdo, com as pernas acima do tronco e da cabeça. Não utilizar infusão sob pressão, se sistema aberto. Hipotermia Desconforto, calafrios, queda da temperatura, arritmia cardíaca e sangramento por alteração da hemostasia. Diminuir o tempo de infusão. Aquecimento dos glóbulos vermelhos e/ou plasma. Aquecer o hemocomponente (CH ou PF) se prevista infusão acima de 15 ml/kg/ hora por mais de 30 minutos. Fonte: Adaptado de EBSERH, Protocolo de Transfusão Segura de Hemocomponentes: 2018. 211 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB REFERÊNCIAS 1. Ministério da Educação, Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, Agência Transfusional/ Unidade de Hematologia e Oncologia do Hospital Universitário Lauro Wanderley da Universidade Federal da Paraíba. Protocolo de Transfusão Segura de Hemocomponentes: 2018. 2. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Especializada e Temática. Guia para uso de Hemocomponentes. 2.ed. Brasília: MS, 2015. 3. Júnior PB, Garcia PC. Manual de Transfusão Sanguínea para Médicos. Botucatu, 2017. 4. Organização Pan-Americana da Saúde. Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica. Brasília: OPAS; 2018. 5. Hess, JH. Massive blood transfusion. Up To Date, 2019. 6. Also Brasil – Advanced Life Support in Obstetrics – Manual e Programa de Estudos: São Paulo: Savier Editora de Livros Médicos, 2016. 7. Brasil. Fundação Hemocentro de Brasília. Protocolo Transfusional - Indicação de Hemocomponentes. Secretaria de Estado de Saúde, Subsecretaria de Atenção à Saúde, 2018. 212 INTRODUÇÃO Êmese Gravídica (EG) é uma queixa muito comum durante as primeiras semanas de gestação. É comumente referida como sensação de náusea pela manhã, sendo possível ocorrer em qualquer horário do dia, ou da noite, e afeta em algum grau boa parte das gestantes.1,2 Entretanto, 1% a 2% das gestantes podem desenvolver uma entidade conhecida como Hiperêmese Gravídica (HG).3 Tal condição é caracterizada por sintomas físicos severos que podem evoluir com complicações clínicas graves.4 Usualmente, é uma condição multifatorial e permanece como diagnóstico de exclusão.4 A escolha do antiemético é baseada na fisiopatologia da doença e na efetividade das medicações em pacientes não gestantes.4 Entretanto, o controle terapêutico nas gestantes é mais complicado, uma vez que, durante a gestação, ocorrem diversas alterações fisiológicas, incluindo alterações na mobilidade gastrointestinal, no volume plasmático e na filtração glomerular.4,5 Quando o quadro clínico não é controlado com a terapia antiemética, pode-se instalar a HG, complicação que aumenta o risco de desnutrição, perda ponderal materna e, consequentemente, eventos fetais negativos, incluindo baixo peso ao nascer e prematuridade.4 Usualmente, as gestantes portadoras de HG necessitam de internação hospitalar como parte do tratamento.4 QUADRO CLÍNICO A EG expressa-se pela presença de náuseas, acompanhadas ou não de vômitos, que costumam aparecer com 5 a 6 semanas de gestação, atingem maior frequência entre 9 e 11 semanas e geralmente melhoram com 16 a 20 semanas.9 Em 15% a 30% das gestantes, os sintomas podem persistir além das 20 semanas.6 Incide HIPERÊMESE GRAVÍDICA Edelaide Raquel Pilau Frazão Kelma Luana Abreu de Siqueira Tatiane de Lima Takami 213 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB em 50% a 80% das gestantes, sendo 25% dessas pacientes classificadas com quadro de náusea exclusivamente matinal.7,8 Já a HG apresenta quadro similar ao da EG, porém clinicamente exacerbado.9 Corresponde a 1% - 2% dos casos de náuseas e vômitos, podendo levar a distúrbios hidroeletrolíticos, perda de peso superior a 5% do peso corporal, cetose/cetonúria, distúrbios neurológicos (Encefalopatia de Wernicke), lesão hepática, lesão renal, hemorragia retiniana e risco de vida materno e fetal.8 Ressaltamos que, se o quadro de êmese começar na segunda metade da gravidez e/ou após o parto, outras etiologias devem ser investigadas (Tabela 1). A hiperêmese gravídica apresenta comprometimento materno progressivo:6,10 • FASE DE DESIDRATAÇÃO: náusea e ptialismo intensos, vômitos fortes, desidratação (diminuição do turgor e da elasticidade da pele, olhos encovados, mucosas secas e pegajosas, língua áspera, taquicardia, hipotensão e hipotermia), elevação do hematócrito e pode apresentar distúrbios hidroeletrolíticos. • FASE METABÓLICA: perda depeso acima de 5%, icterícia leve, hipoglicemia, hiponatremia, hipopotassemia, hipoalbuminemia, elevação das enzimas hepáticas e bilirrubinas, cetonúria ++ ou +++. Pode apresentar hipotermia e torpor. • FASE NEUROLÓGICA: além de todos os achados anteriores, apresentam hiporreflexia, dor à palpação de grupos musculares (panturrilha e coxas) e alterações oftalmológicas. ATENÇÃO: esse quadro antecede o acometimento encefálico irreversível em uma semana (Interstício crítico de Briquet) e a gestação deve ser interrompida. • FASE DE PSICOSE DE WERNICKE-KORSAKOFF: encefalopatia, alucinações e, em casos extremos, coma. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de hiperêmese é de exclusão, necessitando de uma anamnese detalhada e de exames laboratoriais.9 Apesar da hiperêmese ser um quadro severo do espectro da náusea e vômito gestacional, não há um limite claro entre esses quadros clínicos.9 Um critério diagnóstico comumente utilizado para a hiperêmese é a persistência de vômitos associados à perda > 5% do peso pré-gestacional e cetonúria sem 214 outra causa provável.9 Ademais, pode-se utilizar, de forma alternativa, o critério de presença de mais de três episódios de vômitos ao dia e perda de peso de 3 kg (ou 5% do peso corporal) associados à cetonúria sem outra causa.9 Tabela 1 - Diagnósticos Diferenciais Diagnósticos Diferenciais de Hiperêmese Gravídica Obstétricos Neoplasia trofoblástica; gestação múltipla; síndrome HELLP Clínico Diabetes; hipertireoidismo; insuficiência adrenal; Helicobacter pylori; hérnia de hiato e úlceras; cálculo biliar; colecistite; nefrolitíase; infecções renais; síndrome de Adisson; alterações pancreáticas Intoxicação exógena Quimioterápicos; anti-inflamatórios; digoxina; anti-hipertensivos; betabloqueadores; diuréticos; anticonvulsivantes; aminofilina; álcool; drogas ilícitas Psiquiátrico Histerias; neurose; distúrbios alimentares Sistema Nervoso Central Enxaqueca; hipertensão intracraniana; afecções desmielinizantes Fonte: Cabral et al. Febrasgo, 2018; ACOG, 2018. A. ANAMNESE O início do quadro após a 20ª semana merece maior atenção, uma vez que apenas 25% das hiperêmeses gravídicas iniciam após esse período.4 Como a etiologia pode ser multifatorial, o questionamento sobre dados epidemiológicos apresenta-se relevante: hábitos de vida e alimentares; planejamento e relacionamento familiares; estilo de vida; antecedentes de alterações gástricas, obstétricas, psicológicas ou psiquiátricas.6 Ademais, deve- se investigar a gestação atual, pensando no diagnóstico diferencial de gestação trofoblástica ou múltipla.6 Sugerimos a aplicação do Escore PUQE (Pregnancy Unique Quantification of Emesis)13 para determinar a gravidade dos sintomas e, assim, estimar os seus efeitos na qualidade de vida da paciente14 (Tabela 2). 215 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 2 - Escore PUQE (Pregnancy Unique Quantification of Emesis) Escore PUQE Pergunta Resposta (pontuação) Por quanto tempo se sentiu nauseada nas últimas 24 horas? Não sinto náuseas (1) 1 hora ou menos (2) 2 – 3 horas (3) 4 – 6 horas (4) 6 horas ou mais (5) Quantos episódios de vômitos apresentou nas últimas 24 horas? Não vomito (1) 1 - 2 vezes (2) 3 - 4 vezes (3) 5 - 6 vezes (4) 7 vezes ou mais (5) Quantos momentos observou intensa salivação e esforço de vômito nas últimas 24 horas? Nenhuma (1) 1 - 2 vezes (2) 3 - 4 vezes (3) 5 - 6 vezes (4) 7 vezes ou mais (5) LEVE ≤ 6, MODERADO 7-12 SEVERO ≥ 13 Fonte: Adaptado de Lacasse. Validity of the modified-PUQE. Am J Obstet Gynecol 2008. Febrasgo, 2018. B. EXAME FÍSICO Nos casos moderados e graves, podem-se identificar perda de peso > 5%; desidratação; e desequilíbrio eletrolítico.6 Devem-se avaliar sinais vitais (temperatura, frequência cardíaca, pressão arterial); peso; sinais de desidratação.8 C. EXAMES LABORATORIAIS Diferentes exames podem ser solicitados para avaliar possíveis diagnósticos diferenciais, estimar o comprometimento sistêmico da gestante e o resultado 216 terapêutico.6 Nesse sentido, sugere-se avaliar inicialmente: hemograma (podendo apresentar hematócrito alto e eventualmente plaquetas baixas); sódio; potássio; sorologias (sífilis, HIV, toxoplasmose, rubéola, hepatites A, B e C); testes de função renal e hepática; amilase; TSH/T4 livre; sumário de urina; e urocultura.6 A pesquisa, por meio da endoscopia digestiva alta, de Helicobacter Pylori, deve ser usada nos casos refratários aos tratamentos convencionais que se estendem ao segundo semestre da gestação.11 Tabela 3 - Avaliação Complementar e Laboratorial na Hiperêmese Gravídica Exame Resultado Hemograma Hematócrito elevado Anemia megaloblástica Transaminases, amilase, lipase, bilirrubina Elevadas Ureia, creatinina Elevadas Glicose Diminuída Proteínas Diminuídas Tiamina Diminuída Hormônios Tireoidianos TSH diminuído T3 e T4 elevados Perfil eletrolítico Cloro, potássio e sódio diminuídos Gasometria Alcalose metabólica Rotina de urina Densidade alta Cetonúria Fonte: adaptado de Febrasgo, 2018. TRATAMENTO O manejo das náuseas e vômitos na gravidez depende da gravidade dos sintomas e sua interferência na qualidade de vida da gestante (Tabela 2). Inicialmente, deve- se explicar que náuseas e vômitos são sintomas comuns à maioria das gestantes e que devem desaparecer no final do primeiro trimestre. Alguns estudos sugerem que o uso de multivitamínicos por um mês antes da gestação reduz a incidência e a severidade dos sintomas.14,15 Outra conduta que parece ajudar é trocar o multivitamínico contendo ferro apenas por ácido fólico.14 217 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB O tratamento consiste em mudanças na dieta e no estilo de vida, seguido por tratamento medicamentoso, se necessário. • ORIENTAÇÕES DIETÉTICAS: Sugerem-se refeições leves, em pequenas porções e com intervalos de 1h-2h. 14 Preferir alimentos secos, pobres em gorduras e açúcares.14,16 Evitar gatilhos ambientais, como deitar logo após alimentar-se, alimentos com odores fortes, ambientes abafados.14 Evitar líquidos 30 minutos antes ou uma hora após as refeições. O hábito de escovar os dentes logo após uma refeição, cuspir a saliva e lavar a boca várias vezes durante o dia pode ser útil.6,7,9 • TRATAMENTO MEDICAMENTOSO: a) Piridoxina (vitamina B6) - CATEGORIA A - Dose: 10 mg-25 mg (VO) a cada 6h/8h. - Dose máxima sugerida, para mulheres grávidas: 200 mg/dia. -Indicada para náusea leve a moderada, mas não reduz significativamente o vômito.7,9 b) Bloqueador seletivo do receptor de serotonina (Ondansetrona) - CATEGORIA B - Dose: 4 mg-8 mg (VO/EV) de 8h/8h. Dose máxima EV: 16 mg.14 - Efeitos colaterais: dor de cabeça, fadiga, flush facial, constipação e sonolência. - É prudente afastar a possibilidade de prolongamento do intervalo QT. Evitar o uso concomitante com:7,9,14 • Anti-histamínicos (hidroxizine) • Diuréticos • Anticolinérgicos • Antiarrítmicos (amiodarona) • Antipsicóticos (haloperidol, clorpromazina) • Antidepressivos tricíclicos 218 • Antibióticos macrolídeos (eritromicina, azitromicina) • Fluoxetina • Antimaláricos (cloroquina, quinina) • Metronidazol Os dados disponíveis sugerem que o uso de ondansetrona no início da gravidez não está associado a um alto risco de malformações congênitas, mas pode haver um pequeno aumento absoluto no risco de malformações cardiovasculares (especialmente defeitos de septo) e fenda palatina.17,18,19 Uma revisão dos dados disponíveis até 2020 estimou que o aumento absoluto no risco é de 0,03% para defeitos orofaciais e de 0,3% para defeitos do septo ventricular.20 De acordo com as diretrizes do ACOG, o risco/benefício deve ser considerado para aquelas mulheres com menos de 10 semanas de gestação.9,14 c) Bloqueador do receptor de dopamina e serotonina (Metoclopramida / Clorpromazina) - CATEGORIA B - Dose: 5 mg-10 mg(VO/IM/EV) a cada 6h/8h. - Idealmente 30 minutos antes das refeições e na hora de dormir. - A sua maior limitação de uso se refere principalmente às manifestações extrapiramidais.7 d) Anti-histamínicos: bloqueio do receptor H1 de histamina - Efeito indireto no sistema vestibular, diminuindo a estimulação no centro de vômito. - Eficiente para as formas moderadas. - Tem como efeito colateral mais comum a sonolência, seguida por boca seca, tontura e constipação.7,9 - Dimenidrinato • CATEGORIA B • Dose: 25 mg - 50 mg (VO) a cada 4h/6h. • Dose: 50 mg (EV) a cada 6h. • Dose máxima: 400 mg/dia (se a paciente estiver usando Doxilamina, não ultrapasse 200 mg/dia). 219 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB - Meclizina • CATEGORIA B • Dose: 25 mg (VO) a cada 4h/6h. - Prometazina • CATEGORIA C • Dose: 12,5 mg/25 mg (VO/IM) a cada 4h/6h. • É também um antagonista fraco da dopamina. Em caso de falha do tratamento ambulatorial, a gestante deve ser internada, permanecer em dieta zero até cessarem os vômitos, iniciar hidratação venosa, geralmente com soro glicofisiológico (2.400 ml a 4.000 ml/24horas), correção dos distúrbios hidroeletrolíticos e equilíbrio ácido básico (quando existentes).7,9 O tratamento medicamentoso deve ser iniciado com antieméticos – fazer associação de dois ou mais destes, antes de prosseguir para o uso de sedativos. Os glicocorticoides devem ficar como última opção, quando todos os recursos já forem esgotados.7,9 e) Sedativos: - Levomepromazina • CATEGORIA C • Dose: 3 mg (3 gotas – solução 4%) (VO) de 8h/8h. - Diazepam • CATEGORIA C • Dose: 5mg (VO) de 8h/8h ou 10 mg (ampola 2 ml) (EV) de 8h/8h. f) Glicocorticoides: - Prednisona • CATEGORIA C • Dose: 40 mg/dia (VO) no primeiro dia, 20 mg/dia (VO) nos próximos. 3 dias, 10 mg/dia (VO) por mais 3 dias e 5 mg/dia (VO) por 7 dias. - Dexametasona • CATEGORIA C • Dose: 6 mg, EV, 24h/24h. 220 Fluxograma 1 - Tratamento de Náuseas e Vômitos na Gestação Fonte: Adaptado de ACOG Nausea and vomiting of pregnancy. Obstet Gynecol. 2018 Abreviaturas: VO (via oral); EV (via endovenosa); IM (via intramuscular). 221 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB REFERÊNCIAS 1. Gadsby R, Barnie-Adshead AM, Jagger C. A prospective study of nausea and vomiting during pregnancy. Br J Gen Prac 1993;43:245-8. 2. Vellacott ID, Cooke EJA, James CE. Nausea and vomiting in early pregnancy. Int J Gynaecol Obstet 1988;27:57-62. 3. Magee LA, Mazzotta P, Koren G, Evidence-based view of safety and effectiveness of pharmacologic therapy for nausea and vomiting of pregnancy (NVP), Am J Obstet Gynecol 2002;186:S256-61. 4. Viljoen et al. A systematic review and meta-analysis of the effect and safety of ginger in the treatment of pregnancy-associated nausea and vomiting, Nutrition Journal 2014, 13:20. 5. Parboosingh J: The effects of medication during pregnancy. Can Fam Physician 1981, 27:1013–1015. 6. Vaz JO. Náuseas e vômitos na gravidez. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo); 2018. (Protocolo Febrasgo – Obstetrícia, nº 3/Comissão Nacional Especializada em Assistência Pré-Natal). 7. Fernandes CE, Sá MFS. Tratado de Obstetricia. Febrasgo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018. 1160 p. 8. Shehmarn M, MacLean MA, Nelson-Piercy C, Gadsby R, O’Hara M, The management of nausea and vomiting of pregnancy and hyperemesis gravidarum. Nice: Royal College Of Obstetricians And Gynaecologists, 2016. 9. Judith A Smith. Nausea and vomiting of pregnancy: Treatment and outcome. Post TW, ed. UpToDate. Waltham, MA: UpToDate Inc. https://www.uptodate.com (Accessed on June 17, 2020). 10. Colás OR. Hiperemese Gravídica. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, Guia de Medicina, Ambulatorial e Hospitalar; 2006. Capítulo 18, p129- 143. 11. Duarte G, Cabral ACV, Vaz JO, Moraes Filho OB. Êmese da gravidez. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia; 2018. Capítulo 2, Etiologia; p. 4-9. [Orientações e Recomendações FEBRASGO, no.2/Comissão Nacional Especializada em Assistência Pré-Natal]. 12. Cabral AC, Duarte G, Moraes Filho OB, Vaz JO. Êmese da gravidez. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia; 2018. Capítulo 3, Prognóstico e diagnóstico; p.10-15. [Orientações e Recomendações FEBRASGO, no.2/Comissão Nacional Especializada em Assistência Pré-Natal]. 13. Lacasse A, Rey E, Ferreira E, Morin C, Berard A. Validity of a modified Pregnancy- Unique Quantification of Emesis and Nausea (PUQE) scoring index to assess 222 severity of nausea and vomiting of pregnancy. Am J Obstet Gynecol 2008;198:71. e1–7. 14. ACOG (American College of Obstetricians and Gynecologists). Practice Bulletin No. 189: Nausea and vomiting of pregnancy. Obstet Gynecol. 2018 ;131(1):e15-e30. 15. Neural tube defects. ACOG Practice Bulletin No. 187. American College of Obstetricians and Gynecologists. Obstet Gynecol 2017;130:e279–90. 16. Power ML, Holzman GB, Schulkin J. A survey on the management of nausea and vomiting in pregnancy by obstetrician/gynecologists. Prim Care Update Ob Gyns 2001;8:69–72. 17. Huybrechts KF, et al. Association of Maternal First-Trimester Ondansetron Use With Cardiac Malformations and Oral Clefts in Offspring JAMA; 320(23):2429, 2018. 18. Parker SE, Van Bennekom C, Anderka M, Mitchell AA. Ondansetron for Treatment of Nausea and Vomiting of Pregnancy and the Risk of Specific Birth Defects., National Birth Defects Prevention Study Obstet Gynecol;132(2):385, 2018. 19. Zambelli-Weiner A, Via C, Yuen M, Weiner DJ, Kirby RS. First trimester ondansetron exposure and risk of structural birth defects. Reprod Toxicol. 2019;83:14. Epub 2018. 20. Andrade C J. Major Congenital Malformation Risk After First Trimester Gestational Exposure to Oral or Intravenous Ondansetron. Clin Psychiatry. 2020;81(3) Epub 2020. 223 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB INTRODUÇÃO Óbito fetal ou morte fetal, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), em consonância com a Classificação Internacional de Doenças, 11ª edição (CID-11), é definido como a morte de um produto da concepção antes ou durante o trabalho de parto, que ocorre antes da sua expulsão ou da sua extração completa, a partir da ausência de sinais de vida, como respiração, pulsação do cordão umbilical, batimentos cardíacos ou movimentos espontâneos.1,2 A OMS considera o termo natimorto quando a idade gestacional for maior ou igual a 28 semanas.2,3 Segundo a nota técnica da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, o óbito fetal será aquele que ocorre com pelo menos 20 semanas,4,5 ou 500 mg ou 25 cm de comprimento, devendo, nesses casos, ser preenchida a Declaração de Óbito.5 CAUSAS As mortes fetais por causas desconhecidas representam 30% a 40% do total. Já as conhecidas podem ser divididas em três grupos: placentárias, maternas e fetais (Tabela 1).3,6 Tabela 1 - Causas de Óbito Fetal Causas de Óbito Fetal Placentárias Maternas Fetais - Descolamento prematuro de placenta - Insuficiência placentária - Prolapso de cordão - Síndrome de transfusão feto-fetal - Corioamnionite - Diabetes mellitus - Diabetes gestacional - Hipertensão - Síndrome antifosfolípide - Traumas - Obesidade - Cromossomopatia - Malformações congênitas - Infecções congênitas - Crescimento intrauterino restrito Fonte: World Health Association, 2020. Sun SY, et al. Óbito fetal. FEBRASGO, 2018. ÓBITO FETAL Jaqueline Santos Ribeiro Alexandre Pavan Garieri Andreia Regina da Silva Araujo 224 PREVENÇÃO Algumas medidas assistenciais podem ser implementadas a fim de reduzir a TMF, principalmente no que tange aos fetos com mais de 28 semanas de idade gestacional. São elas: 6,7 • Rastrear hipertensão. • Rastrear diabetes mellitus e diabetes gestacional: glicemia de jejum no primeiro trimestre e TOTG no segundo. • Controlar o ganho ponderal. • Realizarsorologias para HIV e sífilis no primeiro trimestre. • Recomendar o uso de ácido fólico antenatal para evitar distúrbios do fechamento do tubo neural.8 • Usar AAS 100 mg e de cálcio nas mulheres com história de pré- eclâmpsia.9 • Solicitar tipagem sanguínea, fator Rh e Coombs indireto, mesmo nas pacientes com Rh positivo em virtude da aloimunização por Kell.10 • Realizar acompanhamento e perfil biofísico fetal regular de fetos com crescimento intrauterino restrito.11 • Incentivar paciente a diminuir a carga tabágica ou a parar de fumar.12 • Realizar a monitorização da vitalidade fetal durante o trabalho de parto regularmente e usar o partograma. DIAGNÓSTICO Quando nos referimos às gestações inviáveis, consideramos as perdas gestacionais que ocorrem até a 20ª semana (discutidas no capítulo Gestação Inviável) e, acima dessa idade gestacional, denominaremos de morte fetal:13 • Perda gestacional precoce: ocorre antes das 12 semanas e 6 dias;13 • Perda gestacional do início do segundo trimestre: entre 13 e 20 semanas;13 • Morte fetal: ≥ 20 semanas ou 500 mg ou 25 cm de comprimento.5 O óbito fetal é diagnosticado a partir da ausência de batimento cardíaco fetal (BCF) à ausculta durante o exame físico e por ausência de BCF à ultrassonografia.6 225 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Após o parto, a investigação da etiologia do óbito fetal é auxiliada pela avaliação macroscópica, microscópica e histopatológica da placenta e do feto e por testes laboratoriais, como: sorologias; glicemia; hemograma; dosagem de anticorpos antifosfolípides; bacterioscopia e cultura de colo uterino; e necropsia.14,15 Tabela 2 - Diagnóstico de Óbito Fetal Clínico - Cessação da movimentação fetal - Sangramento transvaginal - Contrações uterinas Exame - Altura uterina discordante da idade gestacional - Ausência de BCF Exames Complementares - Ultrassonografia: ausência de movimentação fetal e batimentos cardíacos - Sinais de óbito antigo: superposição de ossos do crânio (Spalding); hiperflexão da coluna vertebral (Hartley); sinal de Halo Craniano (Devel); gases na circulação fetal (Robert) - Negativação do β-hCG Fonte: Adaptado de Paiva JP e Feitosa FEL. Protocolo Clínico. Óbito fetal. Universidade Federal do Ceará. EBSERH, 2020. CONDUTA Diante de um quadro de óbito fetal, é importante uma abordagem multidisciplinar, na qual médicos, enfermeiros e psicólogos têm papel fundamental. Os métodos para a resolução da gestação de um óbito fetal dependem da idade gestacional, preferência materna e passado obstétrico, particularmente história de histerotomia prévia. A decisão deve ser compartilhada entre a equipe de saúde e a paciente. A. CONDUTA EXPECTANTE Comumente, as gestantes que evoluíram com óbito fetal entram em trabalho de parto espontâneo em até quatro semanas após o óbito, sendo que cerca de 90% destas, nas primeiras duas semanas pós-óbito fetal.15 Desse modo, pode-se 226 aguardar por até 4 semanas, caso a mãe tenha cesariana há menos de 2 anos, esteja estável clinicamente e sem infecções.15 No entanto, é importante avaliar o risco de coagulopatias, tendo em vista o consumo de fatores de coagulação em virtude da liberação tecidual de tromboplastina pela placenta na circulação materna.15 É importante também realizar coagulograma semanal nessas circunstâncias.15 Além disso, deve-se ater ao risco de hemorragias e morte materna.16 B. CONDUTA ATIVA Em termos de conduta ativa, deve-se optar pela indução do trabalho de parto via vaginal.15 O uso de prostaglandinas (Tabela 3), principalmente local, está associado a bons desfechos quando se tem um colo desfavorável (escore de BISHOP < 6)15,17. Deve-se optar pela cesariana apenas em situações específicas (Tabela 4), resguardando o desejo da paciente.15 Até a idade gestacional de 26 semanas, o misoprostol pode ser administrado nos intervalos e nas doses habituais até a expulsão do concepto, sem estabelecimento de dose máxima, mesmo em pacientes com uma cesárea prévia ou cicatriz uterina transmural, pois o risco de ruptura uterina é inferior a 0,3%.18 Entretanto, não há evidência de segurança no uso de misoprostol em gestações acima de 26 semanas com cicatriz uterina prévia.18 Tabela 3 - Uso do Misoprostol no Óbito Fetal Uso do Misoprostol no Óbito Fetal 20 – 26 SEMANAS DE GESTAÇÃO Com ou sem cicatriz uterina > 26 SEMANAS DE GESTAÇÃO Sem cicatriz uterina 200 μg, via vagina ou sublingual, a cada 4h-6h Pode-se realizar uma dose extra, se a placenta não for expulsa em 30 minutos Pode ser utilizado em caso de cesárea prévia 27-28 semanas: 100 μg, via vaginal ou sublingual, a cada 4h > 28 semanas: 25 μg, via vaginal, a cada 6h ou via oral a cada 2h Não utilizar se cesárea prévia (realizar o método Krause) 227 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Contraindicações19 - Alergias ou hipersensibilidade à medicação. - Uso concomitante de ocitocina. - Gestações ectópicas. - Hemoglobina abaixo de 9,0g/dl. - Insuficiência adrenal crônica. - Porfirias. - Dispositivo intrauterino (retirar DIU antes de começar o protocolo). - Cesárea prévia ou cicatriz uterina transmural em gestante com >26 semanas. Cuidados Gerais - Antes da inserção, pode-se imergir o comprimido de misoprostol em soro fisiológico 0,9%.15 - Não usar ocitocina nas primeiras 4 horas após a inserção do misoprostol.21 - Quando houver dinâmica uterina de ≥ 2 contrações dolorosas em 10 minu- tos, não iniciar ou não realizar a dose seguinte de misoprostol.22 Fonte: Adaptado de FIGO, 2017. Paiva JP e Feitosa FEL, Óbito Fetal, EBSERH, 2020. Bartz, DA e Blumenthal, PD, Up To Date, 2021. Grobman, W, Up To Date , 2020. Em caso de falha de dilatação após 5 doses de misoprostol, pode-se optar por: • Continuar utilizando doses adicionais até a expulsão do concepto.20 • Descontinuar a indução e reiniciar com novas doses de misoprostol após 12h a 24h.20 • Utilizar o método Krause para dilatação cervical, seguido de novas doses de misoprostol ou de ocitocina.20 • Administrar uma dose maior de misoprostol, seguida das doses habituais.20 • Realizar a indução com ocitocina (vide capítulo de Gestação Prolongada).20 • Reavaliar o caso em sessão clínica.15 • Converter para procedimento cirúrgico.20 228 Cateter de Foley (Método Krause): é uma opção mecânica para abertura do colo uterino preferível para pacientes que tenham contraindicações ao uso de prostaglandinas, como cesariana prévia em gestação atual > 26 semanas.17 Nesse processo, deve-se inserir, em meio estéril, sonda de Foley nº 16 a 24 no canal cervical até alcançar a cavidade uterina e, posteriormente, insuflar o balão com cerca de 30 ml a 50 ml de água destilada ou soro fisiológico.17 Esse dispositivo deve ser mantido sob tração, fixado na coxa da paciente a fim de que haja a eliminação da sonda.17 Este deve ser removido em até 24 horas.17 É contraindicado para pacientes com baixa placentação, sangramento uterino e cervicite.17 Tabela 4 - Indicação de Cesariana no Óbito Fetal Absolutas Relativas - Placenta prévia centro total - Hemorragia acentuada - Descolamento prematuro de placenta com instabilidade hemodinâmica materna - Desproporção cefalopélvica - Obstrução do trajeto - Duas ou mais cesáreas anteriores - Feto em posição transversa Fonte: Paiva JP, Feitosa FEL. Protocolo Clínico. Óbito fetal. Universidade Federal do Ceará. EBSERH, 2020. PREENCHIMENTO DA DECLARAÇÃO DE ÓBITO Cuidados no preenchimento da Declaração de Óbito (DO): • Assinar apenas após completamente preenchida.15 • Não realizar emendas ou rasuras.15 • Não utilizar abreviaturas.15 • No campo “número de filhos, vivos ou mortos ou abortos” não incluir o recém-nascido falecido da declaração de óbito atual.15 • Mesmo assinalando-se no Campo 1 da DO que se trata de um óbito fetal, devemos escrever o nome do falecido como “natimorto” semabreviaturas.15 • Nos casos de óbitos fetais, a hora e data do óbito serão as mesmas do nascimento, pois é este o momento em que o médico pode confirmar o óbito.15 229 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Fluxograma 1 - Conduta no Óbito Fetal Fonte: Paiva JP e Feitosa FEL, Óbito Fetal, EBSERH, 2020. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Manual Técnico da Gestação de Alto Risco. 5ª Edição. Brasília, 2012. 230 REFERÊNCIAS 1. Barros PS, Aquino EC, Sousa MR. Fetal mortality and the challenges for women’s health care in Brazil. Rev. Saúde Pública, 2019, vol.53, 12. Epub Jan 31, 2019. ISSN 1518-8787. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2019053000714. 2. World Health Association. ICD - 11 for Mortality and Morbity Statistics. 11ª Revisão. Disponível em https://icd.who.int/browse11/l-m/en. 3. World Health Association. Maternal, newborn, child and adolescent health: Stillbirths [online]. Acesso em julho, 2020. Disponível em https://www.who.int/ maternal_child_adolescent/epidemiology/stillbirth/en/. 4. The American College of Obstetricians and Gynecologists. Management of Stillbirth [Internet]. Obstetric Care Consensus, n 10. Março 2020. Disponível em https://www.acog.org/clinical/clinical-guidance/obstetric-care-consensus/ articles/2020/03/management-of-stillbirth. 5. Brasil. Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal. Nota Técnica Conjunta (Anatomia Patológica e Comitê Central de Prevenção e Controle de Óbitos Maternos, Fetais e Infantis do DF) sobre Exames Anatomopatológicos de Placentas e Necropsias Fetais/Neonatais. Nota Técnica n 2/2021 - SES/SAIS/CATES/ DUAEC/GEDIAG. Governo do Distrito Federal, 2021. 6. Sun SY, Mattar R, Carvalho N, Braga Neto AR. Óbito fetal. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO); 2018. (Protocolo FEBRASGO - Obstetrícia, no. 84/ Comissão Nacional Especializada em Gestação de Alto Risco). 7. The American College of Obstetricians and Gynecologists. Management of Stillbirth. Clinical Management Guidelines for Obstetrician-Ginecologists, número 102. Março 2009. Disponível em https://starlegacyfoundation.org/wp-content/ uploads/acog-management-of-stillbirth1.pdf. 8. Goola JD, Hirchea H, Laxa H, Schaepdrijver L. Folic acid and primary prevention of neural tube defects: A review. Reproductive Toxicology, volume 80, Setembro 2018. DOI: 10.1016/j.reprotox.2018.05.004. 9. Hofmeyr GJ, Lawrie TA, Atallah ÁN, Duley L, Torloni MR. Calcium Supplementation During Pregnancy for Preventing Hypertensive Disorders and Related Problems. Cochrane Database of Systematic Reviews 2014, Issue 6. Art. No.: CD001059. 2018;10(10). DOI: 10.1002/14651858.CD001059.pub4. 10. Schonitzer D. Status of Kell Incompatibility in a 15-year Retrospective Study of Mother-Child Serology in Clinical Records. Infusions therapie und klinische Ernahrung. 1987;14 Suppl 2. 231 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB 11. Baschat AA. Planning Management and Delivery of the Growth-Restricted Fetus. Best practice & research Clinical obstetrics & gynaecology. Epub Março 2018. DOI:10.1016/j.bpobgyn.2018.02.009. 12. Diamanti A, Papadakis S, Schoretsaniti S, Rovina N, Vivilaki V, Gratziou C. Smoking Cessation in Pregnancy: An Update for Maternity Care Practitioners. Tobacco induced diseases. 2019. 13. Prager, S. Micks, E; Dalton, V. UP TO DATE . Pregnancy loss (miscarriage): Risk factors, etiology, clinical manifestations, and diagnostic evaluation. Up To Date, 2020. 14. Roberts, D. Stillbirth: Maternal and fetal evaluation. Up To Date, 2020. 15. Paiva JP, Feitosa FEL. Protocolo Clínico. Óbito fetal. Universidade Federal do Ceará. EBSERH. Emissão: Abril, 2020. Disponível em http://www2.ebserh.gov. br/documents/214336/5215516/%C3%93BITO+FETAL+-+PRO.MED-OBS.021. pdf/4d3bf300-6d81-4bf0-b83d-727969b7304b. 16. Abedias Z, Sheikh M, Pooransari P, et al. Vaginal misoprostol versus intravenous oxytocin for the management of second-trimester pregnancies with intrauterine fetal death: A randomized clinical trial. Journal Obstetrics Gynaecology Research, 2016. 17. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Manual Técnico da Gestação de Alto Risco. 5ª Edição. Brasília, 2012. 18. Morris, J.L., Winikoff, B., Dabash, R., Weeks, A., Faundes, A., Gemzell‐Danielsson, K., Kapp, N., Castleman, L., Kim, C., Ho, P.C. and Visser, G.H. (2017), FIGO’s updated recommendations for misoprostol used alone in gynecology and obstetrics. Int J Gynecol Obstet, 138: 363-366. doi:10.1002/ijgo.12181. 19. Bartz, DA Blumenthal, PD. First-trimester pregnancy termination: Medication abortion. UP TO DATE, 2021. 20. Hammond, C. Second-trimester pregnancy termination: Induction (medication) termination. UP TO DATE, 2021. 21. Grobman, W. Induction of labor with oxytocin. UpToDate Inc, 2020. 22. Grobman, W. Techniques for ripening the unfavorable cervix prior to induction. UpToDate Inc, 2020. 232 INTRODUÇÃO A gestação pode ser classificada em: viável, viabilidade incerta e inviável1 (tabela 1). Quando nos referimos às gestações inviáveis, estamos considerando as perdas gestacionais que ocorrem até a 20ª semana4 e, acima dessa idade gestacional, denominaremos de morte fetal: • Perda gestacional precoce: ocorre antes das 12 semanas e 6 dias.2,4 • Perda gestacional do início do segundo trimestre: entre 13 e 20 semanas.4 • Morte fetal: ≥ 20 semanas ou o feto ≥ 500 g ou ≥ 25 cm.5 Observamos que a perda gestacional precoce ocorre em aproximadamente 10% das gestações diagnosticadas, enquanto a de segundo trimestre, em 1%.4 O quadro clínico é variável, podendo ser assintomático ou apresentar sinais inespecíficos, como sangramento transvaginal e dor abdominal.2,4 A definição da gestação como viável ou não, assim como o diagnóstico diferencial com outras complicações do início da gestação, é importante e necessária para correta condução dos casos.1,2 Tabela 1. Terminologia e testes diagnósticos usados na gestação de primeiro trimestre Terminologias Viável Aquela que tem potencial de resultar em um recém-nascido vivo Não viável Aquela que não puder resultar em um recém-nascido vivo Gestação intrauterina de viabilidade incerta Ecografia transvaginal mostra um saco gestacional intrauterino sem batimentos cardiofetais embrionários, porém não há evidência para fechar o diagnóstico de gestação inviável GESTAÇÃO INVIÁVEL Alexandre Pavan Garieri Luciana Pinto Moraes Paula Faria Campos 233 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Gestação de localização desconhecida Teste de gravidez positivo, de urina ou sérico, e nenhum achado ecográfico de gestação intrauterina ou ectópica é encontrado Testes Diagnósticos Gonadotrofina Coriônica Humana (hCG) Positivo quando a concentração sérica for > 5 mIU/ml Ecografia Pélvica Critérios mínimos de qualidade incluem: avaliação transvaginal do útero e anexos; avaliação transabdominal em busca de líquido livre e/ou massas na pelve; supervisão por um ecografista experiente Fonte: Doubilet, 2013. ETIOLOGIA As principais etiologias descritas são relacionadas às anormalidades cromossômicas (cerca de 50%), seguidas das síndromes antifosfolípides, trombofilias, anormalidades uterinas (síndrome de Asherman, 15%; fibroses ou miomas, 14%; septos, 3%; pólipos, 2%), fatores masculinos, psicológicos e traumas (quedas, violência) ou iatrogenias (1% nas biópsias de vilo corial e abaixo de 1% na amniocentese).2,3,4 FATORES DE RISCO Os fatores de risco para perda gestacional incluem:2,3,4 • Idade materna (cerca de 11% entre 20 - 34 anos, 17% entre 35 - 39 anos, 50% a 80% a partir dos 40 anos). • Gestações inviáveis anteriores. • Comorbidades maternas. • Endocrinopatias (diabetes tipo 1 e 2, hipo e hipertireoidismo, obesidade); • Infecções (parvovírus B19, sífilis, citomegalovírus). • Gestações associadas a dispositivos intrauterinos (DIU).• Medicações e uso de substâncias (anti-inflamatórios não esteroidais, drogas teratogênicas, cocaína, metanfetaminas, álcool, tabagismo, cafeína). 234 • Fatores de exposição (poluição, arsênico, mercúrio). • Hematomas subcoriônicos (influenciados pelo volume e localização). • Estresse (aumento do cortisol e diminuição da imunidade). DIAGNÓSTICO Para avaliação de uma possível gravidez inviável, devemos realizar a história clínica, o exame físico (exame especular, toque vaginal e bimanual, e a tentativa de ausculta dos batimentos cardíacos fetais) e a confirmação diagnóstica, que se baseia em dois pilares:1,2,4 • Dosagem sérica da fração beta de gonadotrofina coriônica humana (Beta HCG). • Ultrassonografia (USG), preferencialmente transvaginal. ULTRASSONOGRAFIA A sequência de eventos de uma gestação inicial, avaliada através da ultrassonografia, consegue nos dar uma predição do prognóstico da gestação:12 • Saco gestacional: visualizado a partir de 4 semanas; avaliar anomalias de implantação (posição, regularidade, quantidade, coleções etc.). • Vesícula vitelínica: surge com 5½ semanas; normalmente regular, circular, translúcida, com cerca de 3 mm a 5 mm de diâmetro. • Embrião/polo fetal: surge em torno de 6 semanas. Nota-se o aparecimento do embrião, adjacente à vesícula vitelínica, e a presença dos batimentos cardíacos fetais (BCF). Os critérios mais usados para o diagnóstico de uma gestação inviável são:1,2,12 • Ausência de BCF a depender do tamanho do embrião (comprimento cabeça nádegas – CCN ). • Ausência de embrião a depender do tamanho do saco gestacional. • Ausência de embrião no primeiro trimestre. 235 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB Tabela 2 - Critérios Ultrassonográficos para o Diagnóstico de Gestação Inviável Critérios Diagnósticos de Gestação Inviável no Primeiro Trimestre Achados Diagnósticos Achados Suspeitos CCN ≥ 7 mm sem BCF CCN < 7 mm sem BCF Diâmetro médio do SG ≥ 25 mm sem embrião Diâmetro médio do SG 16 mm-24 mm sem embrião Ausência de embrião com BCF ≥ 2 semanas após USG que mostrou SG sem VV Ausência de embrião com BCF ≥ 7-13 dias após USG que mostrou SG sem VV Ausência de embrião com BCF ≥ 11 dias após USG que mostrou SG com VV Ausência de embrião com BCF ≥ 7-10 dias após USG que mostrou SG com VV Ausência de embrião ≥ 6 semanas após a DUM Âmnio vazio (ausência de embrião em cavidade amniótica com SG) SG alargado, > 7 mm SG pequeno em relação ao tamanho do embrião (diferença entre o diâmetro médio do SG e o CCN <5 mm) Fonte: Doubilet, 2013; ACOG, 2018. Abreviaturas: CCN (comprimento cabeça-nádega); SG (saco gestacional); BCF (batimento cardíaco fetal); VV (vesícula vitelínica); DUM (data da última menstruação). GONADOTROFINA CORIÔNICA HUMANA (BETA HCG) A dosagem sérica da fração beta de gonadotrofina coriônica humana (Beta HCG) segue um protocolo baseado nas alterações descritas pela ultrassonografia.1 A presença de um teste de gravidez positivo e apenas uma dosagem da fração beta do HCG não são suficientes para se estabelecer uma conduta.1,4 Serão necessárias pelo menos 3 dosagens seriadas e a complementação com a ultrassonografia.1,4 Valores entre 1.000 e 2.000 mUI/ml de HCG devem estar associados à visualização de um saco gestacional pela ultrassonografia transvaginal.1 Em gestações normais, os níveis de HCG alcançam um platô por volta de 8 a 11 236 semanas e depois começam a declinar.4 A evolução natural desse HCG segue, geralmente, o aumento de cerca de 50% - 70% em 48 horas.1 Por isso, a não evolução ou a pouca elevação (abaixo de 50%) ou a queda dos níveis séricos (cerca de 25%) em 48 horas, associada a um sangramento transvaginal e/ou cólicas uterinas, sugere uma evolução não satisfatória da gestação.4 DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Dentre um quadro de Beta HCG positivo, sangramento transvaginal e/ou cólicas uterinas devemos sempre nos deparar com os seguintes diagnósticos diferenciais:4 • Gestação tópica, viável ou inviável – pode apresentar sangramento leve no primeiro trimestre. • Hematoma subcoriônico – área de descolamento do córion da parede uterina. • Gestações molares – normalmente apresentam útero aumentado de volume, valores anormais de Beta HCG, podendo apresentar outros sintomas associados como hipertireoidismo, hipertensão. • Gestações de localização desconhecida (ectópicas) – quando não se localiza gestação intraútero na presença de Beta HCG positivo. • Outros: patologias cervicais que cursam com sangramento (cervicite, pólipos, malignidades), lesões vulvares. CONDUTA E TRATAMENTO Neste protocolo, discutiremos apenas sobre a conduta e o tratamento dos casos de abortamento (gestações anembrionadas e morte embrionária). As gestações molares já possuem um protocolo específico do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN). Diante de uma gestação inviável, podemos tomar três tipos de condutas básicas: expectante, medicamentosa e cirúrgica.2,10 Ademais, devemos considerar a idade gestacional, as comorbidades maternas e a estabilidade clínica de cada paciente.1 Os riscos e benefícios de cada conduta devem ser discutidos com a paciente, de preferência assinando um termo de consentimento informado.2 237 Manual de Condutas Obstétricas do HMIB CONDUTA EXPECTANTE Ressaltamos que a maioria dos abortamentos no primeiro trimestre acontece de forma espontânea e completa, mesmo sem intervenções, em 2-3 semanas.11 Estudos mostram que há 91% de eliminação completa e espontânea na conduta expectante em abortamentos incompletos de 1º trimestre; 76% para abortamentos retidos; e 66% para gestações anembrionadas em até 14 dias de diagnóstico.6 Em relação ao abortamento incompleto de primeiro trimestre, pode-se permitir a conduta expectante frente a casos bem selecionados. Evidências demonstram que essa conduta pode atingir 95% de sucesso em duas semanas, e não apresenta maiores taxas de complicações.12 Sugerimos conduta expectante, desde que preenchidos os seguintes critérios: • Abortamento espontâneo (não provocado).12 • Sangramento vaginal leve.12 • Dor controlável com analgésicos orais.12 • Espessura endometrial de até 30 mm à ultrassonografia transvaginal (independentemente de fluxo ao doppler).2 • Motivação da paciente para conduta expectante.12 • Possibilidade de seguimento adequado.12 Se após 15 dias não houver sucesso, isto é, se a espessura endometrial for > 15 mm à USG transvaginal, parte-se para conduta ativa.12 Lembrar de: • Orientar as pacientes sobre os sinais de alerta para que procurem imediatamente uma assistência emergencial: sangramento com odor fétido ou saída de secreção purulenta via vaginal; febre; dor à mobilização do colo uterino; dor abdominal; reação peritoneal de defesa; taquicardia; tontura; queda do estado geral; e sinais de sepse.2 • Prescrever analgésicos para as pacientes que escolham a conduta expectante: anti-inflamatórios não esteroides (ex.: ibuprofeno, naproxeno).2 • Avaliar a necessidade de um protetor gástrico (ex.: omeprazol, pantoprazol, esomeprazol, lansoprazol ou rabeprazol). 238 • Oferecer ajuda psicológica ou até mesmo psiquiátrica; caso seja necessário, iniciar ansiolíticos e/ou sedativos. CONDUTA MEDICAMENTOSA Pacientes estáveis (sem infecção, sem hemorragias, sem anemia severa ou sangramentos), em que o processo de expulsão já se instalou, podem optar pela conduta medicamentosa, assim como nos casos de falha da conduta expectante.2, 7 Observar as contraindicações para a conduta medicamentosa com misoprostol:7 • Alergias ou hipersensibilidade à medicação. • Uso concomitante de ocitocina. • Gestações ectópicas. • Pacientes com hemoglobina abaixo de 9,0 g/dl. • Pacientes com insuficiência adrenal crônica. • Pacientes com porfirias. • Paciente com dispositivo intrauterino (retirar DIU antes de começar o protocolo). Salientamos que o antecedente