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Reticulados, Álgebra Booleana e Formas
Quadráticas Abstratas ∗
Clotilzio Moreira dos Santos †
Resumo
O objetivo deste trabalho é introduzir formas quadráticas sobre reticulados.
Demonstramos que a definição forte de isometria de formas quadráticas sobre álge-
bras booleanas é equivalente a definição de isometria de formas quadráticas abstratas
dada por Kaplansky em [1].
Palavras Chave: Reticulados, álgebras booleanas, formas quadráticas abstratas
Introdução
Adaptamos a definição de formas quadráticas sobre corpos para reticulados e
definimos isometria de formas quadráticas sobre reticulados. O principal resultado
é que duas formas quadráticas de dimensão dois são isométricas se, e somente se,
as estruturas aditiva e multiplicativa do reticulado admitem elementos neutros e a
isometria é dada por um elemento do reticulado que possui complemento. Como
consequência se a é um elemento do reticulado que possui complemento, então
as formas quadráticas ⟨a, b⟩ e ⟨a + b, ab⟩ são isométricas. Isto leva a considerar
reticulados que são álgebras booleanas, e nesta estrutura demonstramos que esta
definição de isometria é equivalente a definição de isometria de formas quadráticas
abstratas dada por Kaplansky em [1].
No item 1, foi desenvolvido parte da teoria já conhecida de reticulados e álgebra
booleana, para os nossos objetivos. No item 2, usando as estruturas aditiva e mul-
tiplicativa usual de um reticulado derivada da ordem, introduziremos os conceitos
de forma quadrática e de isometria (forte), adaptadas das definições de formas
quadráticas sobre corpos, a partir das quais demonstramos nossa proposição. No
item 3, caracterizamos a isometria forte de duas formas quadráticas bidimensionais
sobre álgebras booleanas, o que mostra que esta definição equivale a definição dada
por Kaplansky em [1] para formas quadráticas abstratas.
1 Reticulados
Um conjunto não vazio R parcialmente ordenado pela relação de ordem ≼; (R ≼)
é dito reticulado se para quaisquer x, y ∈ R existem o supremo e o ı́nfimo de {x, y}.
É usual denotá-los por x ∨ y e x ∧ y, respectivamente.
∗Trabalho realizado como parte de pesquisa sobre formas quadráticas
†Email: moreira@ibilce.unesp.br. Departamento de Matemática do Instituto de Biociências, Letras e
Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas.
DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp
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Por recorrência, definimos
x1 ∨ x2 ∨ · · · ∨ xn := (x1 ∨ x2 ∨ · · · ∨ xn−1) ∨ xn, n ≥ 3
e
x1 ∧ x2 ∧ · · · ∧ xn := (x1 ∧ x2 ∧ · · · ∧ xn−1) ∧ xn, n ≥ 3.
Se existem elementos e1 e e2 ∈ R tais que e1 ≼ x, ∀x ∈ R e x ≼ e2, ∀x ∈ R,
denotaremos e1 por 0R e denotaremos e2 por 1R.
É claro que 0R ∧ x = 0R, 0R ∨ x = x = 1R ∧ x e 1R ∨ x = 1R.
Notemos também que os elementos 0R e 1R podem existir independentemente.
Exemplos:
(1) Se a ordem ≼ (precede) atribui estrutura de reticulado em R, então a ordem
dual ≽ (sucede) também atribui uma estrutura de reticulado em R dito reticulado
dual (R,≼). Além disso, sup{x, y} em (R,≼) é igual a inf{x, y} em (R,≽). O
mesmo vale para inf{x, y}. Portanto, existe 1R no reticulado (R,≼) se, e somente
se, existem 0R no reticulado (R,≽) e eles são iguais. O mesmo vale para 0R no
reticulado (R,≼) e 1R em (R,≽).
Por exemplo 0N = 0 ∈ N no reticulado (N,≤) e 1N = 0 ∈ N no reticulado dual
(N,≥). Também não existe 1N no reticulado (N,≤), nem 0N no reticulado dual
(N,≥).
O reticulado (Z,≤) não possui 0Z nem 1Z e, o mesmo vale para o reticulado dual
(Z,≥).
(2) Denotemos por | a relação de divisibilidade em N. Então (N, |) é um reti-
culado e 0N = 1, 1N = 0, pois 1|x, ∀x ∈ N e x|0, ∀x ∈ N.
(3) Se (R,≼) é um reticulado finito, então existem 0R e 1R. De fato, se
R = {a1, · · · , an}, n ≥ 1, então 0R = a1 ∧ · · · ∧ an e 1R = a1 ∨ · · · ∨ an.
Em particular, denotando por D(n) o conjunto dos divisores positivos em Z de
n ∈ N, n > 0, segue que, no reticulado (D(30), |), 0D(30) = 1 ∈ N e 1D(30) = 30. 2
Algumas propriedades imediatas que serão úteis para o que vem a seguir são:
Propriedades
P1. Comutativa x ∧ y = y ∧ x, x ∨ y = y ∨ x.
P2. Associativa
{
x ∨ (y ∨ z) = (x ∨ y) ∨ z,
x ∧ (y ∧ z) = (x ∧ y) ∧ z.
P3. Absorção
{
x ∨ (x ∧ y) = x,
x ∧ (x ∨ y) = x.
P4. Idempotência
{
x ∨ x = x,
x ∧ x = x.
Demonstração: P1 e P4 são evidentes.
Para demonstrar P2, inicialmente notamos que, se x ≼ y então x ∨ z ≼ y ∨ z.
De fato, como x ≼ y e (por definição) y ≼ y∨z, então pela propriedade transitiva
x ≼ y∨z. Como também z ≼ y∨z, vem que y∨z é um limite superior para {x, z}.
Por definição de sup, temos o resultado.
Agora usemos este fato para demonstrar que (x∨ y)∨ z ≼ x∨ (y ∨ z). De fato,
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Como y ≼ y∨z vem que x∨y ≼ x∨(y∨z). Além disso, de z ≼ y∨z ≼ x∨(y∨z) vem
que x∨(y∨z) é um limite superior de {x∨y, z}. Por definição (x∨y)∨z ≼ x∨(y∨z).
Digamos que esta é a primeira parte da demonstração de P2.
Para demonstrar que x ∨ (y ∨ z) ≼ (x ∨ y) ∨ z, usemos a primeira parte e a
propriedade P1, como segue:
x∨ (y ∨ z) com.= (y ∨ z)∨ x
1a Parte
≼ y ∨ (z ∨ x) com.= (z ∨ x)∨ y
1a Parte
≼ z ∨ (x∨ y) com.=
com.
= (x ∨ y) ∨ z. Consequentemente x ∨ (y ∨ z) = (x ∨ y) ∨ z. Analogamente, se
demonstra que (x ∧ y) ∧ z = x ∧ (y ∧ z). Isto conclui a demonstração de P2.
A demonstração de P3, segue do fato que x∧y ≼ x ≼ x∨y, ∀x, y ∈ R. Portanto
x ∨ (x ∧ y) = x e x ∧ (x ∨ y) = x. 2
Podemos notar que se (R,≼) é um reticulado, então dados x, y ∈ R, x ≼ y se,
e somente se, x ∨ y = y, ou então x ≼ y se, e somente se, x ∧ y = x. A proposição
que segue mostra que as propriedades acima caracterizam o reticulado, ou seja,
Proposição 1 Seja R um conjunto em que se tem duas operações + e · que
satisfazem as propriedades comutativa, associativa, idempotência e absorção. Então
a operação binária definida sobre R por: x ≼ y se x + y = y é uma relação de
ordem parcial em R que torna R um reticulado com x ∨ y = x+ y e x ∧ y = x.y.
Demonstração: Veja Proposição 3.2.3, pg. 76 de [2] 2
A propriedade distributiva de uma operação em relação a outra, em geral, não
é verdadeira. No entanto, temos x∨ (y ∧ z) ≼ (x∨ y)∧ (x∨ z), e (x∧ y)∨ (x∧ z) ≼
x ∧ (y ∨ z), ∀x, y, z ∈ R. Vejamos
x ≼ x ∨ y
x ≼ x ∨ z
}
=⇒ x ≼ (x ∨ y) ∧ (x ∨ z)
y ∧ z ≼ y ≼ x ∨ y
y ∧ z ≼ z ≼ x ∨ z
}
=⇒ y ∧ z ≼ (x ∨ y) ∧ (x ∨ z)
=⇒ x∨(y∧z) ≼ (x∨y)∧(x∨z).
Analogamente, demonstra-se que (x ∧ y) ∨ (x ∧ z) ≼ x ∧ (y ∨ z).
Portanto, as operações “∨” e “∧” são distributivas, uma em relação a outra, se
forem verdadeira as relações (x∨y)∧(x∨z) ≼ x∨(y∧z) e x∧(y∨z) ≼ (x∧y)∨(x∧z).
Definição 2 Um reticulado (R,≼) é dito distributivo, se para quaisquer x, y, z ∈ R
se verificam as igualdades: x∨(y∧z) = (x∨y)∧(x∨z) e x∧(y∨z) = (x∧y)∨(x∧z).
Exemplos:
(4) Se ≼ é uma ordem total sobre R, então (R,≼) é um reticulado distribu-
tivo. De fato x ∨ y = max{x, y} e x ∧ y = min{x, y} e, portanto, para todos
x, y, z ∈ R devemos verificar que max{x,min{y, z}} = min{max{x, y},max{x, z}}
e min{x,max{y, z}} = max{min{x, y},min{x, z}}. Como a ordem é total, isto
deve ser verificado em cada caso que segue:
x ≼ y ≼ z, x ≼ z ≼ y, y ≼ x ≼ z, y ≼ z ≼ x z ≼ x ≼ y z ≼ y ≼ x.
Mas como y e z desempenham o mesmo papel, estes casos se reduz à
x ≼ y ≼ z, y ≼ x ≼ z e y ≼ z ≼ x.
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A verificação disto é simples.
(5) O reticulado (N, |) é distributivo e, consequentemente, (D(n), |) também é
distributivo.
De fato, para todos x, y ∈ D(n), x ∨ y = mmc(x, y) e x ∧ y = mdc(xy).
Assim, o cálculo de x∨ y e de x∧ y se reduz ao cálculo do máximo e do mı́nimo dos
expoentes dos fatores primos que ocorrem na decomposição de x e y e isto se reduz
ao caso anterior.
(6) Reticulados dos tipos 1
a
@@��������
b
OO
c
^^========
0
@@�������
OO^^>>>>>>>>
1
y
??��������
z
^^>>>>>>>>
x
OO
0
__???????
GG��������������
são denominados diamante e pentágono, respectivamente. Esses reticulados não são
distributivos. De fato, no diamante temos:
a ∨ (b ∧ c) = a ∨ 0 = a enquanto (a ∨ b) ∧ (a ∨ c) = 1 ∧ 1 = 1. E no pentágono
x ∨ (y ∧ z) = x ∨ 0 = x, enquanto (x ∨ y) ∧ (x ∨ z) = y ∧ 1 = y.
Demonstra-se que qualquer reticulado que não é distributivo contém um desses
reticulados como sub-reticulados. É o caso de reticulados de sub-espaços vetoriais
de um espaço vetorial sobre um corpo F de dimensão maior ou igual a 2. Vejamos:
se u e v são vetores linearmente independentes, considere U = F.u, V = F.v e
W = F (u+ v). Então U +(V ∩W ) = U, enquanto (U +V )∩ (U +W ) = F.u+Fv.
Logo este reticulado contém um sub-reticulado diamante.
E o reticulado (D(12), |) 12
4
??~~~~~~~~
6
OO
2
OO ??~~~~~~~~
3
OO
1
OO ??~~~~~~~~
contém o sub-reticulado pentágono ({1, 2, 3, 4, 12}, |), ou ({1, 3, 4, 6, 12}, |).
No reticulado diamante temos: a∨c = a∨b = 1 e a∧c = a∧b = 0, mas b ̸= c.
No reticulado pentágono, também temos: x ∨ z = y ∨ z = 1 e x ∧ z = y ∧ z = 0 e
também x ̸= y. No entanto, temos,
Proposição 3 Sejam (R,≼) um reticulado distributivo e x, y, z ∈ R tais que
x ∨ y = x ∨ z e x ∧ y = x ∧ z. Então y = z.
Demonstração: Temos: y = y∧ (x∨ y) hip.= y∧ (x∨ z) distr.= (y∧x)∨ (y∧ z) hip.=
(x ∧ z) ∨ (y ∧ z) distr.= (x ∨ y) ∧ z hip.= (x ∨ z) ∧ z = z. 2
Definição 4 (i) Seja (R,≼) um reticulado que admite 0R e 1R. Dizemos que y ∈ R
é um complementar de x ∈ R, se x ∨ y = 1R e x ∧ y = 0R.
(ii) Dizemos que um reticulado é complementado se todos os seus elementos
possuem um complementar.
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Nota 5 Obviamente, se y é o complementar de x, então x é o complementar de
y. Além disso, se o reticulado é distributivo e x é um elemento do reticulado que
possui complementar, então pela Proposição 3 seu complementar é único. Neste
caso, denotaremos o complementar de x por x. É claro que 0 = 1 e 1 = 0.
Exemplo (6) O reticulado do exemplo 5 é distributivo, mas só 0N = 1 ∈ N e
1N = 0 ∈ N possuem complemento e 0N = 1N e 1N = 0N. Logo, este reticulado não
é complementado. Mas o sub-reticulado (D(30), |) de (N, |) é complementado, e os
pares {x, x} são: {1, 30}, {2, 15}, {3, 10}, {5, 6}.
Definição 6 Álgebra de Boole
Uma álgebra de Boole (ou álgebra booleana) é um reticulado distributivo e com-
plementado. 1
2 Formas quadráticas sobre reticulados
De agora em diante só consideraremos reticulados distributivos e vamos denotar as
operações ∨ e ∧, respectivamente, por + e · , ou seja, x+ y é o supremo de {x, y}
e x.y o ı́nfimo de {x, y}.
Se (R,≼) um reticulado e tendo como inspiração a definição de isometria de
formas quadráticas sobre corpos, dizemos que uma aplicação F : Rn → Rn é uma
isometria, se F é bijetora do tipo linear, ou seja,
F (x1, . . . , xn) = (a11x1 + · · ·+ a1nxn, . . . , an1x1 + · · ·+ annxn)
onde cada aij são elementos fixados de R.
Definição 7 Uma forma quadrática (n-dimensional) sobre um reticulado (R,≼) é
uma n-upla denotada por ⟨a1, . . . , an⟩. Se q = ⟨a1, . . . , an⟩ é uma forma quadrática
sobre R e X = (x1, x2, . . . , xn) ∈ Rn denotemos q(X) o valor a1x21 + a2x22 + · · · +
anx
2
n ∈ R. Notemos que pela Propriedade P4 (idempotência) q(X) = a1x1 + a2x2 +
· · ·+ anxn.
Neste artigo vamos explorar a seguinte definição forte de isometria.
Definição 8 Duas formas quadráticas n-dimensionais q1 e q2 são isométricas e
denotamos por q1 ≃ q2, se existe uma aplicação bijetora F : Rn → Rn tal que
q1 = q2 ◦ F Rn
q1 !!D
DD
DD
DD
D
F // Rn
q2
��
R
É fácil ver que esta relação é simétrica e transitiva. No entanto, a propriedade refle-
xiva é explorada nos lemas que seguem, em casos particulares de formas quadráticas.
Lema 9 As formas quadráticas unidimensionais ⟨a⟩ e ⟨b⟩ definidas sobre o reti-
culado (R,≼) são isométricas se, e somente se, existe 1R e a = b. Em particular
⟨a⟩ ≃ ⟨a⟩ se, e somente se, existe 1R.
1Existe uma definição alternativa de álgebra booleana: Um conjunto B junto com duas operações “+”
e “·” que satisfazem: (1) x+y = y+x, x.y = y.x (2) x+(y.z) = (x+y).(x+z), x.(y+z) = x.y+x.z
(3) Existem 0, 1 ∈ B tais que x+ 0 = x, x.0 = 0, x+ 1 = 1, x.1 = x (4) ∀x ∈ B existe x′ ∈ B
tal que x+ x′ = 1 e x.x′ = 0. Alguns autores exigem ainda as propriedades associativa e absorção, mas
estas são consequência das quatro propriedades dadas.
É fácil demonstrar que as duas definições são equivalentes.
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Demonstração: Se existe 1R então F : R → R definida por F (x) = x é uma
isometria. Portanto ⟨a⟩ = ⟨a⟩ ◦ F, ou seja ⟨a⟩ ≃ ⟨a⟩.
Reciprocamente, se ⟨a⟩ ≃ ⟨b⟩ então existe uma aplicação bijetora G : R → R,
G(x) = cx, tal que ⟨a⟩ = ⟨b⟩ ◦ G. Seja F : R → R, F (x) = dx a inversa de G. De
F ◦G = IdR vem que dcx = x, para todo x ∈ R. Isto é equivalente a x ≼ dc, ∀x ∈ R,
ou seja, existe 1R e 1R = dc. Além disso, como dc ≼ d, c ≼ 1, vem que d = c = 1R.
Consequentemente, de ⟨a⟩(x) = ⟨b⟩(G(x)),∀x ∈ R segue que ax = bx,∀x ∈ R e
para x = 1, obtemos a = b. 2
Nota 10 Este lema é verdadeiro para um reticulado qualquer, não necessariamente
distributivo. Mas no próximo lema já faremos uso da distributividade.
Lema 11 Sejam q1 = ⟨r, s⟩, q2 = ⟨r1, s1⟩ formas quadráticas sobre o reticulado
(R,≼). Então q1 ≃ q2 se, e somente se, existem 0R, 1R e a ∈ R, tal que q1 = q2 ◦F,
onde F : R2 → R2 é definida por F (x, y) = (ax + ay, ax + ay). Em particular,
⟨r, s⟩ ≃ ⟨r, s⟩ e ⟨r, s⟩ ≃ ⟨s, r⟩. Temos ainda rs = r1s1, r + s = r1 + s1.
Demonstração: A rećıproca segue da própria definição de isometria. Agora
suponhamos que q1 ≃ q2 e seja F : R2 → R2, F (x, y) = (ax+ by, cx+ dy), tal que
q1 = q2 ◦F. Como F é bijetora, seja G : R2 → R2, G(x, y) = (a1x+ b1y, c1x+d1y)
a inversa de F. Sejam I = aa1bb1cc1dd1 e S = a + a1 + b + b1 + c + c1 + d + d1, e
vamos demonstrar que I = 0R e S = 1R.
(A) De G
(
F (x, y)
)
= (x, y), ∀(x, y) ∈ R2, obtemos(
(aa1 + b1c)x+ (a1b+ b1d)y, (ac1 + cd1)x+ (bc1 + dd1)y
)
=
(
x, y
)
(2.0.1)
(a) Fazendo x = S e y = I na equação 2.0.1, obtemos (aa1 + b1c, ac1 + cd1) =
(S, I). Logo
aa1 + b1c = S (2.0.2)
e ac1 + cd1 = I. Como I ≼ ac1, cd1 ≼ ac1 + cd1 = I, obtemos
ac1 = I (2.0.3)
cd1 = I. (2.0.4)
(b) Fazendo x = I e y = S na equação 2.0.1, obtemos (a1b + b1d, bc1 + dd1) =
(I, S). Logo
bc1 + dd1 = S (2.0.5)
e a1b+ b1d = I. Como I ≼ a1b, b1d ≼ a1b+ b1d = I, obtemos
a1b = I (2.0.6)
b1d = I. (2.0.7)
(B) De F
(
G(x, y)
)
= (x, y), ∀(x, y) ∈ R2, obtemos(
(aa1 + bc1)x+ (ab1 + bd1)y, (a1c+ c1d)x+ (b1c+ dd1)y
)
=
(
x, y
)
, ∀(x, y) ∈ R2.
Repetindo o racioćınioanterior. fazendo x = S, y = I e depois x = I e y = S,
obtemos
a1c = I (2.0.8)
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c1d = I (2.0.9)
ab1 = I (2.0.10)
bd1 = I (2.0.11)
b1c+ dd1 = S. (2.0.12)
(C) Agora comecemos a segunda etapa da demonstração, onde obteremos a1, b1, c1
e d1 em função de a, b, c e d.
(i) (Multiplicando a equação 2.0.2 por a), obtemos aa1 + ab1c = aS. Como
ab1 = I (veja a equação 2.0.10), obtemos aa1 = a. (Multiplicando a equação 2.0.2
por a1), obtemos aa1 + a1b1c = a1S. Usando a equação 2.0.8, obtemos aa1 = a1.
Logo a1 = a.
(ii) Analogamente, (multiplicando a equação 2.0.2 por b1), obtemos aa1b1+b1c =
b1S ou b1c = b1 (usando a equação 2.0.10), e (multiplicando a equação 2.0.2 por c),
obtemos aa1c+ b1c = cS ou b1c = c (pela equação 2.0.8). Logo b1 = c.
(iii) Analogamente, (usando a equação 2.0.5 e multiplicando por b e depois por
c1 e usando a equação 2.0.11, respectivamente, equação 2.0.9), obtemos: bc1 = b e
bc1 = c1. Logo c1 = b.
(iv) Finalmente, (multiplicando a equação 2.0.5 por d e por d1 e usando equações
anteriores), obtemos d1 = d. Substituindo esses valores obtidos: a1 = a, b1 =
c, c1 = b e d1 = d nas onze equações anteriores, ficamos com as seguintes equações:
a+ c = S (2.0.13)
ac = I (2.0.14)
a+ b = S (2.0.15)
ab = I (2.0.16)
c+ d = S (2.0.17)
cd = I (2.0.18)
b+ d = S (2.0.19)
bd = I (2.0.20)
Agora, (multiplicando a equação 2.0.13 por d), obtemos ad + dc = d e, usando
a equação 2.0.18 ficamos com ad = d. Por outro lado, (multiplicando a equação
2.0.19 por a), obtemos ab + ad = a e, usando a equação 2.0.16, ficamos com
ad = a. Portanto d = a. Analogamente, (multiplicando a equação 2.0.13 por
b e usando a equação 2.0.16), ficamos com bc = b, enquanto que (multiplicando
a equação 2.0.15 por c e usando a equação 2.0.14), ficamos com bc = c. Logo
c = b. Consequentemente, a1 = a = d = d1 e b1 = c1 = b = c. Segue-se que
I = ab, S = a+ b e G(x, y) = F (x, y) = (ax+ by, bx+ ay).
Agora de F 2(x, y) = (x, y), obtemos
(
(a + b)x + aby, abx + (a + b)y
)
= (x, y),
∀(x, y) ∈ R2. Assim
abx+ (a+ b)y = y. (2.0.21)
Para y = x e usando a distributividade obtemos (a + b + ab)x = x, ∀x ∈ R, ou
(a+ b)x = x, ∀x ∈ R. Isto significa que x ≼ a+ b qualquer que seja x ∈ R. Portanto
existe 1R e 1R = a+b. Voltando na equação 2.0.21, obtemos abx+y = y, ∀x, y ∈ R.
Fazendo x = a obtemos ab+ y = y, ∀y ∈ R, o que equivale a ab ≼ y, ∀y ∈ R. Logo
existe 0R e 0R = ab, e por definição b = a. As funções F e sua inversa G agora
se escrevem assim: F (x, y) = (ax + ay, ax + ay). Em particular, para a = 1R e
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C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática,
Bauru, v. 5, p. 2-9, dez. 2015. 
para a = 0R temos F (x, y) = (x, y) e, respectivamente, F (x, y) = (y, x) resultam
as isometrias ⟨r, s⟩ ≃ ⟨r, s⟩ e ⟨r, s⟩ ≃ ⟨s, r⟩.
Agora, de q1(x, y) = q2
(
F (x, y)
)
com F (x, y) = (ax + ay, ax + ay), obtemos:
rx+ sy = (ar1 + as1)x+ (ar1 + as1)y.
Para x = 1 e y = 0, obtemos:
r = ar1 + as1. (2.0.22)
Para x = 0 e y = 1 obtemos:
s = ar1 + as1. (2.0.23)
Multiplicando membro a membro as igualdades das equações 2.0.22 e 2.0.23, vem que
rs = aar1+ar1s1+ar1s1+aas1 e, como aa = 0, conclúımos que rs = (a+a)r1s1 =
r1s1 (pois a+a = 1). Também r+s = (a+a)r1+(a+a)s1 = r1+s1. Isto conclui
a demonstração. 2
3 Considerações finais
Um resultado fundamental sobre a teoria de formas quadráticas sobre corpos de
caracteŕıstica distinta de dois, que caracteriza isometria de formas quadráticas de
dimensões maiores ou iguais a dois, é que ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a + b, ab(a + b)⟩, se a + b ̸= 0.
Em nosso caso, esta isometria ficaria ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a + b, ab⟩, pois ab ≼ a + b, e este
resultado é dado a seguir.
Proposição 12 Seja ⟨a, b⟩ uma forma quadrática sobre o reticulado R, com ele-
mentos neutros 0R e 1R. Se a ou b admitem complemento, então ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a+ b, ab⟩.
Em particular, se R é uma álgebra booleana, então ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a+ b, ab⟩, ∀a, b ∈ R, e
⟨a, b⟩ ≃ ⟨a1, b1⟩ se, e somente se, a+ b = a1 + b1 e ab = a1b1.
Demonstração: Se existe a ∈ R,
(
respect. b ∈ R
)
, a isometria entre ⟨a, b⟩ e
⟨a+b, ab⟩ é dada por F (x, y) = (ax+ay, ax+ay),
(
respect. F (x, y) = (bx+by, bx+
by)
)
.
Pelo Lema 11, resta demonstrar que, se a + b = a1 + b1 e ab = a1b1, então
⟨a, b⟩ ≃ ⟨a1, b1⟩. Mas, se temos as igualdades acima, então: ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a + b, ab⟩ =
⟨a1 + b1, a1b1⟩ ≃ ⟨a1, b1⟩. 2
Referências
[1] KAPLANSKY, I; SHAKER, R.J. Abstract Quadratic Forms, Canad. J. Math.
21, 1218-1233, 1969.
[2] MIRANDA, J.G. Conjuntos Ordenados. Ret́ıculos y Álgebras de Boole
http://www.ugr.es/ jesusgm/Curso Acesso em julho de 2015.
SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas.
DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp
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