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Reticulados, Álgebra Booleana e Formas Quadráticas Abstratas ∗ Clotilzio Moreira dos Santos † Resumo O objetivo deste trabalho é introduzir formas quadráticas sobre reticulados. Demonstramos que a definição forte de isometria de formas quadráticas sobre álge- bras booleanas é equivalente a definição de isometria de formas quadráticas abstratas dada por Kaplansky em [1]. Palavras Chave: Reticulados, álgebras booleanas, formas quadráticas abstratas Introdução Adaptamos a definição de formas quadráticas sobre corpos para reticulados e definimos isometria de formas quadráticas sobre reticulados. O principal resultado é que duas formas quadráticas de dimensão dois são isométricas se, e somente se, as estruturas aditiva e multiplicativa do reticulado admitem elementos neutros e a isometria é dada por um elemento do reticulado que possui complemento. Como consequência se a é um elemento do reticulado que possui complemento, então as formas quadráticas ⟨a, b⟩ e ⟨a + b, ab⟩ são isométricas. Isto leva a considerar reticulados que são álgebras booleanas, e nesta estrutura demonstramos que esta definição de isometria é equivalente a definição de isometria de formas quadráticas abstratas dada por Kaplansky em [1]. No item 1, foi desenvolvido parte da teoria já conhecida de reticulados e álgebra booleana, para os nossos objetivos. No item 2, usando as estruturas aditiva e mul- tiplicativa usual de um reticulado derivada da ordem, introduziremos os conceitos de forma quadrática e de isometria (forte), adaptadas das definições de formas quadráticas sobre corpos, a partir das quais demonstramos nossa proposição. No item 3, caracterizamos a isometria forte de duas formas quadráticas bidimensionais sobre álgebras booleanas, o que mostra que esta definição equivale a definição dada por Kaplansky em [1] para formas quadráticas abstratas. 1 Reticulados Um conjunto não vazio R parcialmente ordenado pela relação de ordem ≼; (R ≼) é dito reticulado se para quaisquer x, y ∈ R existem o supremo e o ı́nfimo de {x, y}. É usual denotá-los por x ∨ y e x ∧ y, respectivamente. ∗Trabalho realizado como parte de pesquisa sobre formas quadráticas †Email: moreira@ibilce.unesp.br. Departamento de Matemática do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas. DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 2 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 5, p. 2-9, dez. 2015. Por recorrência, definimos x1 ∨ x2 ∨ · · · ∨ xn := (x1 ∨ x2 ∨ · · · ∨ xn−1) ∨ xn, n ≥ 3 e x1 ∧ x2 ∧ · · · ∧ xn := (x1 ∧ x2 ∧ · · · ∧ xn−1) ∧ xn, n ≥ 3. Se existem elementos e1 e e2 ∈ R tais que e1 ≼ x, ∀x ∈ R e x ≼ e2, ∀x ∈ R, denotaremos e1 por 0R e denotaremos e2 por 1R. É claro que 0R ∧ x = 0R, 0R ∨ x = x = 1R ∧ x e 1R ∨ x = 1R. Notemos também que os elementos 0R e 1R podem existir independentemente. Exemplos: (1) Se a ordem ≼ (precede) atribui estrutura de reticulado em R, então a ordem dual ≽ (sucede) também atribui uma estrutura de reticulado em R dito reticulado dual (R,≼). Além disso, sup{x, y} em (R,≼) é igual a inf{x, y} em (R,≽). O mesmo vale para inf{x, y}. Portanto, existe 1R no reticulado (R,≼) se, e somente se, existem 0R no reticulado (R,≽) e eles são iguais. O mesmo vale para 0R no reticulado (R,≼) e 1R em (R,≽). Por exemplo 0N = 0 ∈ N no reticulado (N,≤) e 1N = 0 ∈ N no reticulado dual (N,≥). Também não existe 1N no reticulado (N,≤), nem 0N no reticulado dual (N,≥). O reticulado (Z,≤) não possui 0Z nem 1Z e, o mesmo vale para o reticulado dual (Z,≥). (2) Denotemos por | a relação de divisibilidade em N. Então (N, |) é um reti- culado e 0N = 1, 1N = 0, pois 1|x, ∀x ∈ N e x|0, ∀x ∈ N. (3) Se (R,≼) é um reticulado finito, então existem 0R e 1R. De fato, se R = {a1, · · · , an}, n ≥ 1, então 0R = a1 ∧ · · · ∧ an e 1R = a1 ∨ · · · ∨ an. Em particular, denotando por D(n) o conjunto dos divisores positivos em Z de n ∈ N, n > 0, segue que, no reticulado (D(30), |), 0D(30) = 1 ∈ N e 1D(30) = 30. 2 Algumas propriedades imediatas que serão úteis para o que vem a seguir são: Propriedades P1. Comutativa x ∧ y = y ∧ x, x ∨ y = y ∨ x. P2. Associativa { x ∨ (y ∨ z) = (x ∨ y) ∨ z, x ∧ (y ∧ z) = (x ∧ y) ∧ z. P3. Absorção { x ∨ (x ∧ y) = x, x ∧ (x ∨ y) = x. P4. Idempotência { x ∨ x = x, x ∧ x = x. Demonstração: P1 e P4 são evidentes. Para demonstrar P2, inicialmente notamos que, se x ≼ y então x ∨ z ≼ y ∨ z. De fato, como x ≼ y e (por definição) y ≼ y∨z, então pela propriedade transitiva x ≼ y∨z. Como também z ≼ y∨z, vem que y∨z é um limite superior para {x, z}. Por definição de sup, temos o resultado. Agora usemos este fato para demonstrar que (x∨ y)∨ z ≼ x∨ (y ∨ z). De fato, SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas. DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 3 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 5, p. 2-9, dez. 2015. Como y ≼ y∨z vem que x∨y ≼ x∨(y∨z). Além disso, de z ≼ y∨z ≼ x∨(y∨z) vem que x∨(y∨z) é um limite superior de {x∨y, z}. Por definição (x∨y)∨z ≼ x∨(y∨z). Digamos que esta é a primeira parte da demonstração de P2. Para demonstrar que x ∨ (y ∨ z) ≼ (x ∨ y) ∨ z, usemos a primeira parte e a propriedade P1, como segue: x∨ (y ∨ z) com.= (y ∨ z)∨ x 1a Parte ≼ y ∨ (z ∨ x) com.= (z ∨ x)∨ y 1a Parte ≼ z ∨ (x∨ y) com.= com. = (x ∨ y) ∨ z. Consequentemente x ∨ (y ∨ z) = (x ∨ y) ∨ z. Analogamente, se demonstra que (x ∧ y) ∧ z = x ∧ (y ∧ z). Isto conclui a demonstração de P2. A demonstração de P3, segue do fato que x∧y ≼ x ≼ x∨y, ∀x, y ∈ R. Portanto x ∨ (x ∧ y) = x e x ∧ (x ∨ y) = x. 2 Podemos notar que se (R,≼) é um reticulado, então dados x, y ∈ R, x ≼ y se, e somente se, x ∨ y = y, ou então x ≼ y se, e somente se, x ∧ y = x. A proposição que segue mostra que as propriedades acima caracterizam o reticulado, ou seja, Proposição 1 Seja R um conjunto em que se tem duas operações + e · que satisfazem as propriedades comutativa, associativa, idempotência e absorção. Então a operação binária definida sobre R por: x ≼ y se x + y = y é uma relação de ordem parcial em R que torna R um reticulado com x ∨ y = x+ y e x ∧ y = x.y. Demonstração: Veja Proposição 3.2.3, pg. 76 de [2] 2 A propriedade distributiva de uma operação em relação a outra, em geral, não é verdadeira. No entanto, temos x∨ (y ∧ z) ≼ (x∨ y)∧ (x∨ z), e (x∧ y)∨ (x∧ z) ≼ x ∧ (y ∨ z), ∀x, y, z ∈ R. Vejamos x ≼ x ∨ y x ≼ x ∨ z } =⇒ x ≼ (x ∨ y) ∧ (x ∨ z) y ∧ z ≼ y ≼ x ∨ y y ∧ z ≼ z ≼ x ∨ z } =⇒ y ∧ z ≼ (x ∨ y) ∧ (x ∨ z) =⇒ x∨(y∧z) ≼ (x∨y)∧(x∨z). Analogamente, demonstra-se que (x ∧ y) ∨ (x ∧ z) ≼ x ∧ (y ∨ z). Portanto, as operações “∨” e “∧” são distributivas, uma em relação a outra, se forem verdadeira as relações (x∨y)∧(x∨z) ≼ x∨(y∧z) e x∧(y∨z) ≼ (x∧y)∨(x∧z). Definição 2 Um reticulado (R,≼) é dito distributivo, se para quaisquer x, y, z ∈ R se verificam as igualdades: x∨(y∧z) = (x∨y)∧(x∨z) e x∧(y∨z) = (x∧y)∨(x∧z). Exemplos: (4) Se ≼ é uma ordem total sobre R, então (R,≼) é um reticulado distribu- tivo. De fato x ∨ y = max{x, y} e x ∧ y = min{x, y} e, portanto, para todos x, y, z ∈ R devemos verificar que max{x,min{y, z}} = min{max{x, y},max{x, z}} e min{x,max{y, z}} = max{min{x, y},min{x, z}}. Como a ordem é total, isto deve ser verificado em cada caso que segue: x ≼ y ≼ z, x ≼ z ≼ y, y ≼ x ≼ z, y ≼ z ≼ x z ≼ x ≼ y z ≼ y ≼ x. Mas como y e z desempenham o mesmo papel, estes casos se reduz à x ≼ y ≼ z, y ≼ x ≼ z e y ≼ z ≼ x. SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas. DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209- Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 4 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 5, p. 2-9, dez. 2015. A verificação disto é simples. (5) O reticulado (N, |) é distributivo e, consequentemente, (D(n), |) também é distributivo. De fato, para todos x, y ∈ D(n), x ∨ y = mmc(x, y) e x ∧ y = mdc(xy). Assim, o cálculo de x∨ y e de x∧ y se reduz ao cálculo do máximo e do mı́nimo dos expoentes dos fatores primos que ocorrem na decomposição de x e y e isto se reduz ao caso anterior. (6) Reticulados dos tipos 1 a @@�������� b OO c ^^======== 0 @@������� OO^^>>>>>>>> 1 y ??�������� z ^^>>>>>>>> x OO 0 __??????? GG�������������� são denominados diamante e pentágono, respectivamente. Esses reticulados não são distributivos. De fato, no diamante temos: a ∨ (b ∧ c) = a ∨ 0 = a enquanto (a ∨ b) ∧ (a ∨ c) = 1 ∧ 1 = 1. E no pentágono x ∨ (y ∧ z) = x ∨ 0 = x, enquanto (x ∨ y) ∧ (x ∨ z) = y ∧ 1 = y. Demonstra-se que qualquer reticulado que não é distributivo contém um desses reticulados como sub-reticulados. É o caso de reticulados de sub-espaços vetoriais de um espaço vetorial sobre um corpo F de dimensão maior ou igual a 2. Vejamos: se u e v são vetores linearmente independentes, considere U = F.u, V = F.v e W = F (u+ v). Então U +(V ∩W ) = U, enquanto (U +V )∩ (U +W ) = F.u+Fv. Logo este reticulado contém um sub-reticulado diamante. E o reticulado (D(12), |) 12 4 ??~~~~~~~~ 6 OO 2 OO ??~~~~~~~~ 3 OO 1 OO ??~~~~~~~~ contém o sub-reticulado pentágono ({1, 2, 3, 4, 12}, |), ou ({1, 3, 4, 6, 12}, |). No reticulado diamante temos: a∨c = a∨b = 1 e a∧c = a∧b = 0, mas b ̸= c. No reticulado pentágono, também temos: x ∨ z = y ∨ z = 1 e x ∧ z = y ∧ z = 0 e também x ̸= y. No entanto, temos, Proposição 3 Sejam (R,≼) um reticulado distributivo e x, y, z ∈ R tais que x ∨ y = x ∨ z e x ∧ y = x ∧ z. Então y = z. Demonstração: Temos: y = y∧ (x∨ y) hip.= y∧ (x∨ z) distr.= (y∧x)∨ (y∧ z) hip.= (x ∧ z) ∨ (y ∧ z) distr.= (x ∨ y) ∧ z hip.= (x ∨ z) ∧ z = z. 2 Definição 4 (i) Seja (R,≼) um reticulado que admite 0R e 1R. Dizemos que y ∈ R é um complementar de x ∈ R, se x ∨ y = 1R e x ∧ y = 0R. (ii) Dizemos que um reticulado é complementado se todos os seus elementos possuem um complementar. SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas. DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 5 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 5, p. 2-9, dez. 2015. Nota 5 Obviamente, se y é o complementar de x, então x é o complementar de y. Além disso, se o reticulado é distributivo e x é um elemento do reticulado que possui complementar, então pela Proposição 3 seu complementar é único. Neste caso, denotaremos o complementar de x por x. É claro que 0 = 1 e 1 = 0. Exemplo (6) O reticulado do exemplo 5 é distributivo, mas só 0N = 1 ∈ N e 1N = 0 ∈ N possuem complemento e 0N = 1N e 1N = 0N. Logo, este reticulado não é complementado. Mas o sub-reticulado (D(30), |) de (N, |) é complementado, e os pares {x, x} são: {1, 30}, {2, 15}, {3, 10}, {5, 6}. Definição 6 Álgebra de Boole Uma álgebra de Boole (ou álgebra booleana) é um reticulado distributivo e com- plementado. 1 2 Formas quadráticas sobre reticulados De agora em diante só consideraremos reticulados distributivos e vamos denotar as operações ∨ e ∧, respectivamente, por + e · , ou seja, x+ y é o supremo de {x, y} e x.y o ı́nfimo de {x, y}. Se (R,≼) um reticulado e tendo como inspiração a definição de isometria de formas quadráticas sobre corpos, dizemos que uma aplicação F : Rn → Rn é uma isometria, se F é bijetora do tipo linear, ou seja, F (x1, . . . , xn) = (a11x1 + · · ·+ a1nxn, . . . , an1x1 + · · ·+ annxn) onde cada aij são elementos fixados de R. Definição 7 Uma forma quadrática (n-dimensional) sobre um reticulado (R,≼) é uma n-upla denotada por ⟨a1, . . . , an⟩. Se q = ⟨a1, . . . , an⟩ é uma forma quadrática sobre R e X = (x1, x2, . . . , xn) ∈ Rn denotemos q(X) o valor a1x21 + a2x22 + · · · + anx 2 n ∈ R. Notemos que pela Propriedade P4 (idempotência) q(X) = a1x1 + a2x2 + · · ·+ anxn. Neste artigo vamos explorar a seguinte definição forte de isometria. Definição 8 Duas formas quadráticas n-dimensionais q1 e q2 são isométricas e denotamos por q1 ≃ q2, se existe uma aplicação bijetora F : Rn → Rn tal que q1 = q2 ◦ F Rn q1 !!D DD DD DD D F // Rn q2 �� R É fácil ver que esta relação é simétrica e transitiva. No entanto, a propriedade refle- xiva é explorada nos lemas que seguem, em casos particulares de formas quadráticas. Lema 9 As formas quadráticas unidimensionais ⟨a⟩ e ⟨b⟩ definidas sobre o reti- culado (R,≼) são isométricas se, e somente se, existe 1R e a = b. Em particular ⟨a⟩ ≃ ⟨a⟩ se, e somente se, existe 1R. 1Existe uma definição alternativa de álgebra booleana: Um conjunto B junto com duas operações “+” e “·” que satisfazem: (1) x+y = y+x, x.y = y.x (2) x+(y.z) = (x+y).(x+z), x.(y+z) = x.y+x.z (3) Existem 0, 1 ∈ B tais que x+ 0 = x, x.0 = 0, x+ 1 = 1, x.1 = x (4) ∀x ∈ B existe x′ ∈ B tal que x+ x′ = 1 e x.x′ = 0. Alguns autores exigem ainda as propriedades associativa e absorção, mas estas são consequência das quatro propriedades dadas. É fácil demonstrar que as duas definições são equivalentes. SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas. DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 6 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 5, p. 2-9, dez. 2015. Demonstração: Se existe 1R então F : R → R definida por F (x) = x é uma isometria. Portanto ⟨a⟩ = ⟨a⟩ ◦ F, ou seja ⟨a⟩ ≃ ⟨a⟩. Reciprocamente, se ⟨a⟩ ≃ ⟨b⟩ então existe uma aplicação bijetora G : R → R, G(x) = cx, tal que ⟨a⟩ = ⟨b⟩ ◦ G. Seja F : R → R, F (x) = dx a inversa de G. De F ◦G = IdR vem que dcx = x, para todo x ∈ R. Isto é equivalente a x ≼ dc, ∀x ∈ R, ou seja, existe 1R e 1R = dc. Além disso, como dc ≼ d, c ≼ 1, vem que d = c = 1R. Consequentemente, de ⟨a⟩(x) = ⟨b⟩(G(x)),∀x ∈ R segue que ax = bx,∀x ∈ R e para x = 1, obtemos a = b. 2 Nota 10 Este lema é verdadeiro para um reticulado qualquer, não necessariamente distributivo. Mas no próximo lema já faremos uso da distributividade. Lema 11 Sejam q1 = ⟨r, s⟩, q2 = ⟨r1, s1⟩ formas quadráticas sobre o reticulado (R,≼). Então q1 ≃ q2 se, e somente se, existem 0R, 1R e a ∈ R, tal que q1 = q2 ◦F, onde F : R2 → R2 é definida por F (x, y) = (ax + ay, ax + ay). Em particular, ⟨r, s⟩ ≃ ⟨r, s⟩ e ⟨r, s⟩ ≃ ⟨s, r⟩. Temos ainda rs = r1s1, r + s = r1 + s1. Demonstração: A rećıproca segue da própria definição de isometria. Agora suponhamos que q1 ≃ q2 e seja F : R2 → R2, F (x, y) = (ax+ by, cx+ dy), tal que q1 = q2 ◦F. Como F é bijetora, seja G : R2 → R2, G(x, y) = (a1x+ b1y, c1x+d1y) a inversa de F. Sejam I = aa1bb1cc1dd1 e S = a + a1 + b + b1 + c + c1 + d + d1, e vamos demonstrar que I = 0R e S = 1R. (A) De G ( F (x, y) ) = (x, y), ∀(x, y) ∈ R2, obtemos( (aa1 + b1c)x+ (a1b+ b1d)y, (ac1 + cd1)x+ (bc1 + dd1)y ) = ( x, y ) (2.0.1) (a) Fazendo x = S e y = I na equação 2.0.1, obtemos (aa1 + b1c, ac1 + cd1) = (S, I). Logo aa1 + b1c = S (2.0.2) e ac1 + cd1 = I. Como I ≼ ac1, cd1 ≼ ac1 + cd1 = I, obtemos ac1 = I (2.0.3) cd1 = I. (2.0.4) (b) Fazendo x = I e y = S na equação 2.0.1, obtemos (a1b + b1d, bc1 + dd1) = (I, S). Logo bc1 + dd1 = S (2.0.5) e a1b+ b1d = I. Como I ≼ a1b, b1d ≼ a1b+ b1d = I, obtemos a1b = I (2.0.6) b1d = I. (2.0.7) (B) De F ( G(x, y) ) = (x, y), ∀(x, y) ∈ R2, obtemos( (aa1 + bc1)x+ (ab1 + bd1)y, (a1c+ c1d)x+ (b1c+ dd1)y ) = ( x, y ) , ∀(x, y) ∈ R2. Repetindo o racioćınioanterior. fazendo x = S, y = I e depois x = I e y = S, obtemos a1c = I (2.0.8) SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas. DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 7 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 5, p. 2-9, dez. 2015. c1d = I (2.0.9) ab1 = I (2.0.10) bd1 = I (2.0.11) b1c+ dd1 = S. (2.0.12) (C) Agora comecemos a segunda etapa da demonstração, onde obteremos a1, b1, c1 e d1 em função de a, b, c e d. (i) (Multiplicando a equação 2.0.2 por a), obtemos aa1 + ab1c = aS. Como ab1 = I (veja a equação 2.0.10), obtemos aa1 = a. (Multiplicando a equação 2.0.2 por a1), obtemos aa1 + a1b1c = a1S. Usando a equação 2.0.8, obtemos aa1 = a1. Logo a1 = a. (ii) Analogamente, (multiplicando a equação 2.0.2 por b1), obtemos aa1b1+b1c = b1S ou b1c = b1 (usando a equação 2.0.10), e (multiplicando a equação 2.0.2 por c), obtemos aa1c+ b1c = cS ou b1c = c (pela equação 2.0.8). Logo b1 = c. (iii) Analogamente, (usando a equação 2.0.5 e multiplicando por b e depois por c1 e usando a equação 2.0.11, respectivamente, equação 2.0.9), obtemos: bc1 = b e bc1 = c1. Logo c1 = b. (iv) Finalmente, (multiplicando a equação 2.0.5 por d e por d1 e usando equações anteriores), obtemos d1 = d. Substituindo esses valores obtidos: a1 = a, b1 = c, c1 = b e d1 = d nas onze equações anteriores, ficamos com as seguintes equações: a+ c = S (2.0.13) ac = I (2.0.14) a+ b = S (2.0.15) ab = I (2.0.16) c+ d = S (2.0.17) cd = I (2.0.18) b+ d = S (2.0.19) bd = I (2.0.20) Agora, (multiplicando a equação 2.0.13 por d), obtemos ad + dc = d e, usando a equação 2.0.18 ficamos com ad = d. Por outro lado, (multiplicando a equação 2.0.19 por a), obtemos ab + ad = a e, usando a equação 2.0.16, ficamos com ad = a. Portanto d = a. Analogamente, (multiplicando a equação 2.0.13 por b e usando a equação 2.0.16), ficamos com bc = b, enquanto que (multiplicando a equação 2.0.15 por c e usando a equação 2.0.14), ficamos com bc = c. Logo c = b. Consequentemente, a1 = a = d = d1 e b1 = c1 = b = c. Segue-se que I = ab, S = a+ b e G(x, y) = F (x, y) = (ax+ by, bx+ ay). Agora de F 2(x, y) = (x, y), obtemos ( (a + b)x + aby, abx + (a + b)y ) = (x, y), ∀(x, y) ∈ R2. Assim abx+ (a+ b)y = y. (2.0.21) Para y = x e usando a distributividade obtemos (a + b + ab)x = x, ∀x ∈ R, ou (a+ b)x = x, ∀x ∈ R. Isto significa que x ≼ a+ b qualquer que seja x ∈ R. Portanto existe 1R e 1R = a+b. Voltando na equação 2.0.21, obtemos abx+y = y, ∀x, y ∈ R. Fazendo x = a obtemos ab+ y = y, ∀y ∈ R, o que equivale a ab ≼ y, ∀y ∈ R. Logo existe 0R e 0R = ab, e por definição b = a. As funções F e sua inversa G agora se escrevem assim: F (x, y) = (ax + ay, ax + ay). Em particular, para a = 1R e SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas. DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 8 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 5, p. 2-9, dez. 2015. para a = 0R temos F (x, y) = (x, y) e, respectivamente, F (x, y) = (y, x) resultam as isometrias ⟨r, s⟩ ≃ ⟨r, s⟩ e ⟨r, s⟩ ≃ ⟨s, r⟩. Agora, de q1(x, y) = q2 ( F (x, y) ) com F (x, y) = (ax + ay, ax + ay), obtemos: rx+ sy = (ar1 + as1)x+ (ar1 + as1)y. Para x = 1 e y = 0, obtemos: r = ar1 + as1. (2.0.22) Para x = 0 e y = 1 obtemos: s = ar1 + as1. (2.0.23) Multiplicando membro a membro as igualdades das equações 2.0.22 e 2.0.23, vem que rs = aar1+ar1s1+ar1s1+aas1 e, como aa = 0, conclúımos que rs = (a+a)r1s1 = r1s1 (pois a+a = 1). Também r+s = (a+a)r1+(a+a)s1 = r1+s1. Isto conclui a demonstração. 2 3 Considerações finais Um resultado fundamental sobre a teoria de formas quadráticas sobre corpos de caracteŕıstica distinta de dois, que caracteriza isometria de formas quadráticas de dimensões maiores ou iguais a dois, é que ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a + b, ab(a + b)⟩, se a + b ̸= 0. Em nosso caso, esta isometria ficaria ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a + b, ab⟩, pois ab ≼ a + b, e este resultado é dado a seguir. Proposição 12 Seja ⟨a, b⟩ uma forma quadrática sobre o reticulado R, com ele- mentos neutros 0R e 1R. Se a ou b admitem complemento, então ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a+ b, ab⟩. Em particular, se R é uma álgebra booleana, então ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a+ b, ab⟩, ∀a, b ∈ R, e ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a1, b1⟩ se, e somente se, a+ b = a1 + b1 e ab = a1b1. Demonstração: Se existe a ∈ R, ( respect. b ∈ R ) , a isometria entre ⟨a, b⟩ e ⟨a+b, ab⟩ é dada por F (x, y) = (ax+ay, ax+ay), ( respect. F (x, y) = (bx+by, bx+ by) ) . Pelo Lema 11, resta demonstrar que, se a + b = a1 + b1 e ab = a1b1, então ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a1, b1⟩. Mas, se temos as igualdades acima, então: ⟨a, b⟩ ≃ ⟨a + b, ab⟩ = ⟨a1 + b1, a1b1⟩ ≃ ⟨a1, b1⟩. 2 Referências [1] KAPLANSKY, I; SHAKER, R.J. Abstract Quadratic Forms, Canad. J. Math. 21, 1218-1233, 1969. [2] MIRANDA, J.G. Conjuntos Ordenados. Ret́ıculos y Álgebras de Boole http://www.ugr.es/ jesusgm/Curso Acesso em julho de 2015. SANTOS, C. M. Reticulados, álgebra booleana e formas quadráticas abstratas. DOI: 10.21167/cqdvol5201523169664cms0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 9 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 5, p. 2-9, dez. 2015.
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