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ANAIS DO V SEMINÁRIO DE DIREITO DO ESTADO - “ALTERNATIVAS POLÍTICAS E RESPOSTAS JURÍDICAS DIANTE DA CRISE DAS INSTITUIÇÕES” Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Reitor Prof. Dr. Pasqual Barretti Vice-Reitora Profa. Dra. Maysa Furlan Pró-Reitor de Pesquisa Prof. Dr. Edson Cocchieri Botelho Pró-Reitor de Extensão Universitária e Cultura Prof. Dr. Raul Borges Guimarães FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS Diretor Prof. Dr. Murilo Gaspardo Vice-Diretora Profa. Dra. Nanci Soares Comissão Editorial UNESP - Câmpus de Franca Presidente Prof. Dr. Murilo Gaspardo Membros Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa Prof. Dr. Alexandre Marques Mendes Profa. Dra. Analúcia Bueno Reis Giometti Profa. Dra. Cirlene Aparecida Hilário da Silva Oliveira Profa. Dra. Elisabete Maniglia Prof. Dr. Genaro Alvarenga Fonseca Profa. Dra. Helen Barbosa Raiz Profa. Dra. Hilda Maria Gonçalves da Silva Prof. Dr. Jean Marcel Carvalho França Prof. Dr. José Duarte Neto Profa. Dra. Josiani Julião Alves de Oliveira Prof. Dr. Luis Alexandre Fuccille Profa. Dra. Paula Regina de Jesus Pinsetta Pavarina Prof. Dr. Paulo César Corrêa Borges Prof. Dr. Ricardo Alexandre Ferreira Profa. Dra. Rita de Cássia Aparecida Biason Profa. Dra. Valéria dos Santos Guimarães Profa. Dra. Vânia de Fátima Martino Murilo Gaspardo José Duarte Neto (Orgs) ANAIS DO V SEMINÁRIO DE DIREITO DO ESTADO - “ALTERNATIVAS POLÍTICAS E RESPOSTAS JURÍDICAS DIANTE DA CRISE DAS INSTITUIÇÕES” Câmpus de Franca 2022 © 2022 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP Faculdade de Ciências Humanas e Sociais – Franca - Contato Av. Eufrásia Monteiro Petráglia, 900, CEP 14409-160, Jd. Petráglia / Franca – SP publica.franca@unesp.br Diagramação e Revisão Sandra Aparecida Cintra Ferreira (STAEPE) Carlos Alberto Bernardes (STAEPE) Adolfo Raphael Silva Mariano de Oliveira Márcio Augusto Garcia - ASS. ADM Comissão Organizadora Adolfo Raphael Silva Mariano de Oliveira Alfredo Minuci Lugato Jackeline Ferreira da Costa Joao Raul Penariol Fernandes Gomes Letícia Rezende Santos Liz Marina Tamião Santana Mayara Paschoal Michéias Murilo Gaspardo Nathalia Neves Escher Rafael dos Anjos Souza Renan Lucas Dutra Urban Yasmin Commar Curia V Seminário de Direito do Estado : “Alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” / Murilo Gaspardo, José Duarte Neto (orgs). –Franca : UNESP – FCHS, 2022. 900 p. ISSN: 2526-0391 1. Direito Público. 2. Segurança jurídica. 3. Políticas públicas. 4. Estado. I. Título. II. Gaspardo, Murilo. III. Duarte Neto, José. CDD – 340 Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Andreia Beatriz Pereira – CRB8/8773 ORGANIZAÇÃO: Departamento de Direito Público da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais (FCHS) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp)/ Campus de Franca - SP Grupo de Pesquisa “Governança Global, Direitos Humanos e Democracia” Núcleo de Cidadania Ativa da Unesp/Franca – SP Núcleo de Estudos de Justiça Constitucional e Democracia Grupo de Pesquisa em “Direito Regulatório” COORDENAÇÃO: Professor Doutor Murilo Gaspardo (Departamento de Direito Público/ FCHS/UNESP) Professor Doutor José Duarte Neto (Departamento de Direito Público/ FCHS/UNESP) Professor Doutor José Carlos de Oliveira (Departamento de Direito Público da FCHS/UNESP) Professor Doutor Daniel Damásio Borges (Departamento de Direito Público da FCHS/UNESP) APOIO: Faculdade de Ciências Humanas e Sociais (FCHS) da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP)- Câmpus de Franca- SP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) SUMÁRIO O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E A SUPOSTA ABERRAÇÃO JURÍDICA PREVISTA NA REJEIÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS Letícia Filgueira Bauab Daniel Fernandes Nato .............................................................................19 A OPERAÇÃO LAVA JATO, O ABUSO E A ESPETACULARIZAÇÃO DAS PRISÕES PREVENTIVAS Leonardo Sousa dos Santos Moura Victor Rodrigues Nascimento Vieira .......................................................33 EVOLUÇÃO JURÍDICO-PENAL DO COMBATE AO TRABALHO ANÁLOGO À ESCRAVIDÃO NA ARGENTINA: ANÁLISE À LUZ DA INFLUÊNCIA DA LEGISLAÇÃO INTERNACIONAL Luiz Henrique Garbellini Filho Paulo César Corrêa Borges ......................................................................51 APLICABILIDADE DA TEORIA DA CONTINUIDADE DELITIVA NAS INFRAÇÕES AMBIENTAIS Marilia Rodrigues Mazzola Priscylla Gomes de Lima Roberto Alves de Oliveira Filho ..............................................................65 A VINCULAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DOS ESTADOS DEMOCRÁTICOS SOCIAIS DE DIREITO AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS Dailson Soares de Rezende Maria Eugênia Ugucione Biffi .................................................................79 PRIMEIROS DELINEAMENTOS SOBRE A INCONSISTÊNCIA DO MODELO CONSTITUCIONAL DE REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS PELO PRISMA DA PROTEÇÃO AMBIENTAL NOS MUNICÍPIOS - O PAPEL MARGINAL DOS ENTES LOCAIS Marcel Britto ............................................................................................93 A APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE E OS RESULTADOS BENÉFICOS E PREJUDICIAIS DE SUA APLICABILIDADE EM TEMPOS DE CRISE INSTITUCIONAL DOS PODERES EXECUTIVOS MUNICIPAIS Juliana Balbino dos Reis Ricardo Nunes de Oliveira Willian Albano Rocha ............................................................................105 A ANTIGA PEC LEI DA MORDAÇA: UMA RESTRIÇÃO A LIBERDADE DE INFORMAÇÃO OU UMA COIBIÇÃO AO ESTRELISMO EXAGERADO E SUA POSSÍVEL SEMELHANÇA COM AS EMENDAS À LEI ANTICORRUPÇÃO Letícia Filgueira Bauab Daniel Fernandes Nato ...........................................................................115 PARLAMENTO JOVEM COMO INSTRUMENTO DE EDUCAÇÃO CIDADà DAS CASAS LEGISLATIVAS: UMA ANÁLISE DA ATIVIDADE NA CÂMARA MUNICIPAL DE JABOTICABAL-SP Denise Cardozo Silvia Cristina Mazaro Fermino Marcela Francine Garavello ...................................................................131 AS REFORMAS DO ESTADO E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NO BRASIL REPUBLICANO (1937-1998) Caio César Vioto de Andrade .................................................................143 FINANCIAMENTO ILÍCITO PARTIDÁRIO Cauê Varjão de Lima ..............................................................................157 DIREITO E PODER POLÍTICO: A ATUAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA OPERAÇÃO LAVA JATO Luiz Antonio Martins Cambuhy Júnior .................................................173 DEMANDAS COMPLEXAS E DESEMPENHO LEGISLATIVO NO CONGRESSO NACIONAL: O CASO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EDUCAÇÃO INFANTIL BRASILEIRA (2001-2010) Sara Tironi ..............................................................................................187 PSICOLOGIA DE GÊNERO, CRIME E JUSTIÇA Patricia Massuno ....................................................................................203 PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: DELINEAMENTO A PARTIR DA COMPREENSÃO DOS FINS DA REFORMA ESTATAL BRASILEIRA DA DÉCADA DE 90 Carolina Guerra e Souza ........................................................................217 POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA: A DISSONÂNCIA NO MUNDO DO TRABALHO Graziela Donizetti dos Reis ...................................................................235 PLANO NACIONAL DA PRIMEIRA INFÂNCIA (2011-2022) E MARCO LEGAL DA PRIMEIRA INFÂNCIA (2016): POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A CONSTRUÇÃO DA CRIANÇA CIDADà Ana Carolina Esposito Vieito Vera Gers Dimitrov ................................................................................247 PODER VS DIREITO: O DESMANTELAMENTO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO A PARTIR DO EMBATE ENTRE FERDINAND LASSALE E KONRAD HESSE Felipe Rodrigues Xavier ........................................................................259OS INSTRUMENTOS DO CONTROLE SOCIAL DE 1967 Amanda Terumi Souza Takata Anne Martins Sobrinho Gabriela Teixeira de Souza ....................................................................271 PLEBISCITO E REFERENDO: UMA ANÁLISE CRÍTICA ACERCA DO REFERENDO DE 2005 Louislene Rocha Marques de Oliveira Maksuel Andrade Costa Washington Vinicius Almeida Dias .......................................................283 OS DIREITOS, DEVERES E CONDUTAS DOS ADOLESCENTES INFRATORES SOB UMA ANÁLISE PENAL E CONSTITUCIONAL DO ECA Bruna Nascimento Machado Fábio Ruz Borges ..................................................................................297 O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA COMO POLÍTICA PÚBLICA E GARANTIDOR DE DIREITOS Lúcio Rangel Alves Ortiz .......................................................................307 O MÉTODO APAC COMO ALTERNATIVA PENAL À CRISE DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO Bruna Nascimento Machado Fábio Ruz Borges ...................................................................................323 O MODELO DA CONSTITUIÇÃO DE 1824 E A CONTRADIÇÃO PONTUAL DO LIBERALISMO BRASILEIRO Geovana Soares de Oliveira Gessyca Romilda Marques da Rocha Natália Siqueira Alves ............................................................................339 O ESTATUTO DA FAMÍLIA E A INTOLERÂNCIA PARA COM AS FAMÍLIAS HOMOAFETIVAS COMO RESULTADO DE AÇÕES POLÍTICAS EXCLUDENTES Bruno Tozo Figueiredo Marina Bonissato Frattari Rozaine Ap. Fontes Tomaz ....................................................................355 O CALENDÁRIO CIVIL BRASILEIRO COMO RESULTADO DA NÃO EFETIVAÇÃO DO ESTADO LAICO DEVIDO A UMA HERANÇA CRISTà Marina Bonissato Frattari Rozaine Ap. Fontes Tomaz ....................................................................367 O FRACASSO DA PENA DE PRISÃO E AS MEDIDAS DE COMPENSAÇÃO NA EXECUÇÃO PENAL PARA MINIMIZAR A SUPERLOTAÇÃO E A CRISE NO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO Juliana Aparecida de Lima .....................................................................377 NATUREZA JURÍDICA E HERMENÊUTICA (COMPREENSÃO) DAS QUALIFICAÇÕES DO HOMICÍDIO QUALIFICADO E FEMINICÍDIO Luciana Sparsa Menegasso Ellen Cássia Giacomini Casali ...............................................................387 MECANISMOS DE PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NAS CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS - ONU HABITAT II E ONU HABITAT III Cesar Andre Machado de Morais ...........................................................401 GLOBALIZAÇÃO E DIREITO INTERNACIONAL: A BUSCA DA EFICÁCIA DA ORDEM JURÍDICA INTERNACIONAL E SUA INTERNALIZAÇÃO Renata Aparecida Follone Otávio Rezende ......................................................................................413 CRISE NO JUDICIÁRIO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE MEDIAÇÃO E EDUCAÇÃO Amaranta Vasconcelos Silva Isadora Beatriz Magalhães Santos .........................................................425 DIREITOS ADQUIRIDOS PELAS MULHERES APÓS A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 – PARTICIPAÇÃO ATIVA E PASSIVA NA POLÍTICA BRASILEIRA William Albano Rocha Juliana Balbino dos Reis Ricardo Nunes de Oliveira .....................................................................437 DO CAFÉ À SOJA: A REPRODUÇÃO BRASILEIRA DA ESTRUTURA AGRÁRIA ARTICULADA A PARTIR DE FLORESTAN FERNANDES Vanessa de Castro Rosa .........................................................................445 DEMOCRACIA, URBANISMO E A CRISE DE IDENTIDADE DO ESTADO André Simionato Castro Claudia Elias Valente .............................................................................459 CRISE INSTITUCIONAL E VIOLÊNCIA CONTRA O ÍNDIO: A PERMANÊNCIA HISTÓRICA DA INJUSTIÇA Luiz Adriano Moretti dos Santos Stéfanie dos Santos Spezamiglio ...........................................................473 ESTADO E SECULARISMO: ABORDAGEM COMPARATIVA EM HABERMAS, RATZINGER E TAYLOR Felipe Henrique Canaval Gomes Kaleo Dornaika Guaraty Marcio Henrique Pereira Ponzilacqua ...................................................493 CRIMES INFORMÁTICOS: COMENTÁRIOS AO PROJETO DE LEI Nº 5.555/13 André Luiz Pereira Spinieli ...................................................................507 CRISE DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO Loyana Christian de Lima Tomaz Nayara de Paula Moraes ........................................................................519 CRISE CONSTITUCIONAL E O NOVO DESENVOLVIMENTO: CONSIDERAÇÕES QUANTO À ORDEM ECONÔMICA CONSTITUCIONAL Luiz Adriano Moretti dos Santos Stéfanie dos Santos Spezamiglio ...........................................................529 CENÁRIO DA BOMBA-RELÓGIO E A RELATIVIZAÇÃO DA PROIBIÇÃO DA TORTURA André Luiz Pereira Spinieli ...................................................................545 CARACTERIZAÇÃO E SUPERAÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL EM MATÉRIA DE SAÚDE Luciana Campanelli Romeu ...................................................................561 O DESAFIO NORTEADOR DA INSERÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL A POLÍTICA OPUBLICA DE EDUCAÇÃO Bárbara Sousa Piraí Elisângela de Jesus Silva .......................................................................575 A JUDICIALIZAÇÃO EXCEPCIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS COMO FORMA DE DESENVOLVIMENTO DO ESTADO Taisa Cintra Dosso .................................................................................589 APLICAÇÃO DAS TEORIAS DE THOMAS PIKETTY E ZYGMUND BAUMAN COMO ALTERNATIVAS PARA UMA MAIOR DISTRIBUIÇÃO DA RIQUEZA Isis De Angellis Sanches Alexandrino ...................................................561 A INTEGRAÇÃO INTERNO-INTERNACIONAL DO POSICIONAMENTO BRASILEIRO SOBRE A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS FRENTE AO STF E O JULGAMENTO DO CASO GOMES LUND E OUTROS VS BRASIL Jamerson Soares Santos de Oliveira ......................................................615 DIREITO E COAÇÃO: ANÁLISE DO RE 693456 S PARTIR DA ÓTICA KELSENIANA Elias Andraus Neto Ian Xavier Rodrigues William Victor Silva Alves de Medeiros ...............................................629 A RELAÇÃO ENTRE OS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS E O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO Gabriel Leví Borges de Souza ...............................................................641 A UTILIZAÇÃO DAS MEDIDAS DE EXCEÇÃO DE FORMA CORRIQUEIRA NO BRASIL Camila Morita Lujan Vinícius Fernandes Ormelesi .................................................................657 LIMITES BRASIL-GUIANA: A QUESTÃO DO RIO PIRARA Andressa de Oliveira Resende Ana Clara Marques Barbosa Fernanda Luísa de Assis Resende ..........................................................667 PERSPECTIVAS SOBRE O TRÁFICO DE ORGÃOS DE PESSOAS COM ALBINISMO E A RESPOSTA POLITICO-CRIMINAL NA REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE Esteves Pedro Dina António Camacho ..................................................677 A FALÊNCIA DA ATUAL POLÍTICA DE DROGAS E SEUS EFEITOS COLATERAIS NA SOCIEDADE BRASILEIRA Pedro Tadeu Stocco Giaretta ..................................................................693 ALTERNATIVAS PARA A SUPERAÇÃO DA CRISE DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO: DA MULTIPLICAÇÃO DE PRESÍDIOS (E DE PRESOS) AO DESENCARCERAMENTO Fernanda Cristina Barros Marcondes José Arthur Fernandes Gentile Luciana de Freitas ..................................................................................711 O TRABALHO PROFISSIONAL DO ASSISTENTE SOCIAL NA SAÚDE NA PERSPECTIVA DA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS Gabriela Cristina Braga Bisco Fernanda de Oliveira Sarreta .................................................................723 O EXERCÍCIO DA ADVOCACIA CRIMINAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO: UM ESTUDO ACERCA DA CRIMINALIZAÇÃO DE PROFISSIONAIS QUE ATUAM NA DEFESA DE INTEGRANTES DO PCC Ana Carolina de Sá Juzo Mariana Pinto Zoccal .............................................................................735 A DEMOCRACIA COSMOPOLITA E A QUESTÃO URBANA: A CIDADE COMO SUJEITO E OBJETO DA FORMAÇÃO DE UMA NOVA GOVERNANÇA GLOBAL Frederico Haddad ...................................................................................747PATRIMONIALISMO E ESTAMENTO BUROCRÁTICO: OS OBSTÁCULOS À EFETIVAÇÃO DO TEXTO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO Luiz Augusto Mendonça Honório Maria Laura Bolonha Moscardini ..........................................................765 A EVOLUÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO BRASIL: LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA E CRENÇA X INTOLERÂNCIA RELIGIOSA Clara de Souza Oliveira Maria Beatriz Appoloni Zambom Vitor Júnior Araújo Silva .......................................................................779 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA COMO MODALIDADE DE REMIÇÃO DE PENA Ana Lucia Cândida Alves ......................................................................791 A CONFORMAÇÃO JURÍDICA DOS CRIMES DE RESPONSABILIDADE NO BRASIL: ANÁLISE DOS ANTECEDENTES ANGLO-AMERICANOS Murilo de Robbio ...................................................................................807 OS LIMITES DA INTERVENÇÃO ESTATAL E DA PRESERVAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS NA APLICAÇÃO DA LEI ANTITERRORISMO NO BRASIL Luís Gustavo Arantes .............................................................................817 CRIMINALIZAÇÃO DA IMAGEM DO ADOLESCENTE DA PERIFERIA: UMA ANÁLISE À PARTIR DOS RESULTADOS DO PROJETO ÉTICA PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES DA FACULDADE DE DIREITO DE RIBEIRÃO PRETO Gabrielli Silva Duarte ............................................................................829 O MODELO DA CONSTITUIÇÃO DE 1937 EM SENTIDO ANALÍTICO Felipe Eduardo de Oliveira Silva ...........................................................841 REFORMA AGRÁRIA E SEGURANÇA ALIMENTAR: UMA INTERSECÇÃO FAVORÁVEL AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Gil Ramos de Carvalho Neto Mateus Anderson Botelho ......................................................................849 A REESTRUTURAÇÃO DOS SISTEMAS TRIBUTÁRIOS MUNICIPAIS COMO ALTERNATIVA AO ENFRENTAMENTO DA CRISE DOS REPASSES DE VERBAS Maurício Queiroz de Melo Neto Marcos Simão Figueiras Samir Vaz Vieira Rocha .........................................................................863 A OPERAÇÃO LAVA JATO, O ABUSO E A ESPECULAÇÃO DAS PRISÕES PREVENTIVAS Leonardo Sousa dos Santos Moura Victor Rodrigues Nascimento Vieira .....................................................877 POLÍTICAS PÚBLICAS E O DIREITO À SAÚDE LIMITADO PELA APLICAÇÃO DE UMA PORTARIA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE: UM ESTUDO DE CASO Ana Lélis de Oliveira Garbim Flávia Haddad França ............................................................................893 V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 19 O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E A SUPOSTA ABERRAÇÃO JURÍDICA PREVISTA NA REJEIÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS Letícia Filgueira Bauab1* Daniel Fernandes Nato2** INTRODUÇÃO A constituição brasileira contém uma série de princípios, que auxiliam na interpretação não só da própria Carta Magna, como de todas as outras leis. Teoricamente, uma lei que contraria um princípio constitucional não deveria sobreviver, visto tantas possibilidades de controle de constitucionalidade que são previstas no ordenamento jurídico brasileiro. Para o presente estudo, desconsideram-se as hipóteses de controle de constitucionalidade, o enfoque é na importância e eficácia dos princípios em si. De acordo com Spiliotopoulos (2000): “o princípio da segurança jurídica é um elemento substancial do Estado de direito, que é o fundamento jurídico da dignidade humana, que o Estado democrático deve respeitar e proteger”. Para Willy Zimmer (1999) a confiança é considerada como conceito de base da democracia: “Constitui o fundamento moral da democracia representativa (que começa com o mandato dos eleitores aos eleitos) e se propaga como fundamento de todas as relações travadas pelos cidadãos e os poderes públicos”. Vislumbra-se desde início que o princípio constitucional da segurança jurídica possui um alto valor em relação ao cidadão, pois é o que lhe garante de fato uma seguridade; é considerado um princípio que “confortável”, por sua suposta eficácia em tutelar e consequentemente garantir a democracia. No mesmo âmbito constitucional, têm-se a dita Medida Provisória (MP), cujas normas estão previstas no artigo 62 da Constituição Federal; é um instrumento com força de Lei, utilizado pelo presidente da * Discente do curso de graduação em Direito da Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG – Frutal. ** Discente do curso de graduação Direito da Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG – Frutal. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 20 República, apenas em casos de relevância e urgência. Produzindo efeitos imediatos, mas a qual depende de aprovação do Congresso Nacional para transformação definitiva em lei. Seu prazo de vigência é de 60 (sessenta) dias, prorrogáveis uma vez por igual período. Se não for aprovada no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, contados da sua publicação, a MP tranca a pauta de votações da Casa em que se encontrar (Câmara ou Senado) até que seja votada. Ao chegar ao Congresso Nacional, é criada uma comissão mista, formada por deputados e senadores, para aprovar um parecer sobre a Medida Provisória. Depois, o texto segue para o Plenário da Câmara e, em seguida, para o Plenário do Senado. Se a Câmara ou o Senado rejeitar a MP ou se ela perder a eficácia, os parlamentares têm que editar um decreto legislativo para disciplinar os efeitos jurídicos gerados durante sua vigência. O problema inicia-se quando os parlamentares não editam um decreto legislativo que regulamente as situações jurídicas. A delimitação do problema consiste na abordagem através do viés principiológico de apenas uma espécie contida no processo legislativo, a medida provisória, que nesse estudo, como já supracitado, é considerada como Lei; bem como a abordagem do processo legislativo da Medida Provisória, sobretudo na hipótese de rejeição desta, em detrimento do princípio da segurança jurídica, visto que, inicialmente, a sobrevivência das relações jurídicas regidas por uma medida provisória rejeitada, assemelha- se a uma aberração do ordenamento jurídico brasileiro. Vale ressaltar que existem inúmeras discussões doutrinarias acerca da eficácia da MP, se ela teria de fato a eficácia inerente às leis, além do abuso por parte Presidentes ao lançarem inúmeras Medidas Provisórias sem relevância e urgência. Todavia, não é cabível no presente artigo a explanação de tais teorias, visto que a delimitação é outra. A justificativa baseia-se na relevância e na grande utilização de Medidas Provisórias para legislar no ordenamento jurídico brasileiro, causando um certo receio e sensação de insegurança diante da amplitude de matérias que podem constituir objeto de uma medida; bem como a necessidade de um amparo legal nas relações. O objetivo consiste em afirmar que as situações decorridas da rejeição da medida provisória, apesar de temerosas, não constituem uma aberração jurídica, justamente pelo objetivo secundário do artigo, V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 21 de tornar nítida a conexão entre a Medida Provisória e o princípio da segurança jurídica. Para a realização, a metodologia será hipotético-dedutiva e contará, de forma qualitativa, com o amparo da legislação constitucional e infraconstitucional brasileira, compreendendo abordar desde seus textos legais e princípios atrelados até diversas opiniões doutrinárias sobre os respectivos temas, bem como um caso concreto (estudo de caso). Juntamente pretende-se fazer uma explanação sobre princípio da segurança jurídica, para logo após adentrar no complexo processo legislativo da Medida Provisória, bem como pincelar o conceito de aberração jurídica. 1 PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA Partindo de um Estado Democrático de Direito, ou seja, Estado que busca respeitar os cidadãos através dosdireitos humanos e das garantias fundamentais, pelo qual se estabelece uma proteção jurídica, nasce um importante princípio que está presente em diversas áreas do Direito. A segurança jurídica é elemento fundante de um Estado democrático e que respeita as instituições. Tal princípio, mesmo que implícito em diversas Constituições, como é o caso da Constituição Federal de 1988, não é negada sua existência e importância, visto que está intimamente ligado à própria concepção de Estado. De tal forma é que, desde 1789, com o advento da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da França, apareceu como direito fundamental, em seu art. 2º: O fim de toda a associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses Direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão. (Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1789). Sendo assim, Canotilho conceitua o princípio geral da segurança jurídica, em seu sentido mais amplo: Os indivíduos têm o direito de poder contar com o fato de que aos seus atos ou às decisões públicas concernentes a seus direitos, posições ou relações jurídicas fundadas sobre normas jurídicas válidas e em vigor, se vinculem os efeitos previstos e assinados por estas mesmas normas. (CANOTILHO, 1999). V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 22 E complementa ao revelar por onde tal princípio se manifesta de forma mais completa e abrangente: (1) Relativamente a atos normativos – proibição de normas retroativas restritivas de direitos ou interesses juridicamente protegidos; (2) relativamente a atos jurisdicionais - inalterabilidade do caso julgado; (3) em relação a atos da administração - tendencial estabilidade dos casos decididos através de atos administrativos constitutivos de direitos. (CANOTILHO, 1999). Como se percebe e bem como ensinou o ilustre professor português J. J. Gomes Canotilho, a segurança jurídica prevê a proteção de atos e decisões públicas, vinculando seus efeitos ao que foi previsto e assinado pelas próprias normas. Desta forma, o princípio se encontra da forma mais irrestrita possível, protegendo os indivíduos que vivem no Estado Democrático de Direito. Assim sendo, tanto atos normativos, jurisdicionais ou até mesmo atos administrativos devem respeitar a segurança jurídica. Para Humberto Theodoro Júnior, o princípio da segurança jurídica se divide em dois sentidos: Há dois sentidos, segundo certos autores, a serem distinguidos no conceito de segurança jurídica: a) a segurança que deriva da previsibilidade das decisões que serão adotadas pelos órgãos que terão de aplicar as disposições normativas; e b) a segurança que se traduz na estabilidade das relações jurídicas definitivas. (THEODORO JÚNIOR, 2006). Desta maneira, percebe-se primeiramente uma preocupação expressa com o legislador, ou seja, aquele que cria as normas que serão aplicadas na sociedade. Este deve ser o mais claro e simplista possível para que os destinatários, a sociedade, possa compreender o que se pretende e como serão aplicadas tais normas no cotidiano. Essa imposição visa mitigar ou extinguir qualquer insegurança decorrente de leis ou normas que seja dúbia a sua interpretação ou normas em aberto, sendo passível qualquer tipo de interpretação, a depender apenas de quem irá fazê-las. E assim se manifesta o doutrinador: O primeiro cuidado a ser tomado pelo legislador, para garantir segurança jurídica aos indivíduos, é o da publicidade adequada, em que se inclui o período de vacatio legis compatível com a necessidade de conhecer a lei nova a tempo de adaptar-se aos seus preceitos inovadores. Mas, acima da publicidade, há também, na consciência jurídica italiana, a V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 23 convicção de que é fundamental o problema ligado à exigência de que os atos normativos sejam redigidos de modo a serem "compreensíveis pelos destinatários". Com efeito, a “maneira mais eficaz de reduzir consideravelmente a ‘insegurança’ jurídica é, mesmo, a de redigir os textos normativos à base de regras claras e estandardizadas” (segundo padrões técnicos). Além disso, impõe-se outro tipo de cuidado técnico para fugir da insegurança jurídica: tem-se de evitar o caos dentro do sistema geral do ordenamento jurídico. A lei nova, não pode desorganizar o sistema, criando contradições ou dificuldades insuperáveis de compatibilização e interpretação, levando o aplicador e o destinatário a perplexidades e conflitos graves e de difícil solução. A exigência de uma redação mais clara dos textos normativos vem, pois, juntar-se à exigência de coordenar os textos a fim de dar à administração, e também aos cidadãos, os meios de melhor conhecer o direito positivo. (THEODORO JÚNIOR, 2006). Quanto ao segundo sentido, a Constituição Federal de 1988 trouxe, mesmo que não de forma expressa, mas implícita, em seus direitos fundamentais, no art. 5º, XXXVI, uma parcela que decorre do princípio da segurança jurídica, que é a proibição de que lei prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Ou seja, o próprio Estado previu uma garantia para a segurança e estabilização de atos que envolvem diretamente os indivíduos nele existentes. Em suma, o princípio da segurança jurídica adquiriu grande importância, não só no ordenamento jurídico brasileiro, mas também no ordenamento jurídico ocidental, como um todo, afinal, está intimamente ligado a um Estado Democrático de Direito, onde não se imagina tal estado, sem uma segurança jurídica, capaz de prever interpretações possíveis e até mesmo estabilizar atos decorrentes da própria lei. Verifica ainda tal importância no qual, mesmo que não previsto de forma expressa na Constituição Federal, a segurança jurídica permeia e norteia as diversas esferas do poder estatal, como os atos normativos, jurisdicionais e administrativos. 2 PROCESSO LEGISLATIVO DA MEDIDA PROVISÓRIA Partindo da premissa de Estado Democrático de Direito, em que deve-se pré-estabelecer regras a serem seguidas, encontramos no processo legislativo um conjunto de normas que estabelecem os parâmetros seguidos V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 24 pelo legislador para criar, modificar ou, até mesmo, extinguir certa norma do ordenamento jurídico brasileiro. Em nível federal, temos o Congresso Nacional, dividido em duas Casas, sendo elas a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, como sede do Legislativo e sua função típica de legislar. Contudo, isso não impede de que, Executivo e Judiciário também possua essa função, de modo excepcional, visto tratar-se de função atípica desses Poderes. Assim, o processo legislativo deve ser visto como: [...] uma sequência de diversos atos jurídicos que, formando uma cadeia procedimental, assumem seu modo específico de interconexão, estruturado em última análise por normas jurídico-constitucionais, e, realizados discursiva ou ao menos em termos negocialmente equânimes ou em contraditório entre agentes legitimados no contexto de uma sociedade aberta de intérpretes da Constituição, visam à formação e emissão de ato público-estatal de tipo pronúncia-declaração, nesse caso, de provimentos normativos legislativos, que, sendo o ato final daquela cadeia procedimental, dá-lhe finalidade jurídica específica. (CATTONI DE OLIVEIRA, 2006). Com o advento da Constituição de 1988, aboliu-se o antigo decreto-lei, sendo substituído, de certo modo, pela Medida Provisória, regulamentada em seu artigo 62. Trata-se de uma espécie normativa excepcional, cuja edição está atrelada a uma função atípica do Chefe do Poder Executivo, que detém sua competência exclusiva. Entretanto, de 1988 até os dias atuais, as Medidas Provisórias tiveram dois regimes jurídicos distintos,sendo a EC n. 32 de 11.09.2001 um marco divisor quanto a este instituto. Esta mudança quase que total do instituto da Medida Provisória foi motivada pela verdadeira distorção na utilização do instituto, que originalmente foi criado, segundo Pedro Lenza (2014), para “[...] corrigir as distorções verificadas pelo regime militar, que abusava de sua função atípica legiferante por intermédio do decreto-lei”. Contudo, conforme desta o próprio doutrinador, no período entre 05.10.1988 até a aprovação da EC n. 32/2001, já haviam sido editados e reeditados um número assustador de 6.130 Medidas Provisórias, algumas chegando quase sete anos sem aprovação. Sendo assim, após mais de sete anos de tramitação, foi votada e aprovada, em segundo turno, a PEC n. 1-B, de 1995, com parecer favorável da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, promulgada em 11.09.2001, a EC n. 32/2001, com o intuito de trazer limites à edição das medidas provisórias. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 25 Deste modo, conforme o art. 62, caput, da CF/88, compete de forma exclusiva, marcada pela indelegabilidade, ao Presidente da República editar Medidas Provisórias, com força de lei, em caso de relevância e urgência, que deverão ser submetidas de imediato ao Congresso Nacional. Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988). Com relação ao conteúdo, está previsto nos §§ 1º e 2º do art. 62 do texto constitucional, vedações a edição de Medidas Provisórias que versem a determinadas matérias, porém, não cabe no presente trabalho explaná-las. O prazo de vigência da Medida Provisória, conforme o § 3º do referido artigo, será de 60 (sessenta) dias, contados a partir da data da publicação. Esse prazo poderá ser prorrogável por igual período, se ainda não foi apreciado pelo Congresso Nacional. Contudo, nos termos do art. 62, § 4º da CF, tal prazo será suspenso durante os períodos de recesso parlamentar. Inovação e, segundo Lenza (2014), grande novidade trazida pela EC n. 32/2001, foi o § 10 do art. 62 da CF que vedou a reedição de medida provisória, na mesma sessão legislativa, que tenha perdido sua eficácia ou que foi expressamente rejeitada pelo Congresso. Com relação a sua tramitação, editada uma Medida Provisória, esta será submetida de imediato ao Congresso Nacional, que de acordo com o § 5º e 9º do art. 62 da CF, caberá a uma comissão mista de Deputados e Senadores examiná-la e emitir parecer sobre seus aspectos constitucionais, mérito e adequação financeira e orçamentária, além do cumprimento, pelo Presidente da República, da exigência de ter enviado o seu texto ao Congresso, juntamente com documento expondo a motivação do ato. Tal parecer é meramente opinativo, mas é fase obrigatória, sendo vedada a substituição do exame da comissão mista por mero parecer do relator. § 5º. A deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos constitucionais. § 9º. Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 26 plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988). Após o parecer, a votação será em sessão separada, tendo início na Câmara dos Deputados (§ 8º do art. 62 da CF), e sendo o Senado Federal a Casa revisora. Em cada Casa, segundo Lenza, decidirá: [...] em apreciação preliminar, o atendimento ou não dos pressupostos constitucionais de relevância e urgência, bem como a sua adequação financeira e orçamentária, antes do exame de mérito, sem a necessidade de interposição de recurso, para, ato contínuo, se for o caso, deliberar sobre o mérito. Isso porque, se o plenário da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal decidir no sentido do não atendimento dos pressupostos constitucionais ou pela inadequação financeira ou orçamentária da medida provisória, esta será arquivada. (LENZA, 2014). Após as votações no Congresso Nacional, teremos quatro possibilidades de resultados: aprovação sem alteração; aprovação com alteração; não apreciação e rejeição expressa. Aprovada a Medida Provisória e convertida em lei, sem alterações de mérito, será seu texto promulgado pelo Presidente da Mesa do Congresso Nacional, que, segundo o art. 57, § 5º, da CF, é presidida pelo Presidente do Senado Federal. Tal possibilidade não necessita de sanção ou veto do Presidente da República, uma vez que a Medida Provisória foi aprovada nos termos que o próprio propôs. Outra possibilidade é a da aprovação com alteração, que será assim tramitado, segundo Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino: Caso sejam introduzidas modificações no texto adotado pelo Presidente da República (conversão parcial), a medida provisória será transformada em “projeto de lei de conversão”, e o texto aprovado no Legislativo será encaminhado ao Presidente da República, para que o sancione ou vete. (PAULO; ALEXANDRINO, 2015). Por fim, as principais consequências decorrerão da não apreciação da medida provisória no prazo de 120 dias ou se for integralmente rejeitada. A problemática aqui se encontra nas relações que nasceram entre o período de vigência da Medida Provisória e da sua extinção. Para tais relações, o Congresso deverá sancionar decreto legislativo a fim de regulamentá-las. Assim explica os doutrinadores Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino: V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 27 Se for integralmente rejeitada (ou perder sua eficácia por decurso de prazo, em decorrência da não apreciação pelo Congresso Nacional no prazo constitucionalmente estabelecido), a medida provisória será arquivada, o Congresso Nacional baixará ato declarando-a insubsistente e deverá disciplinar, por meio de decreto legislativo, no prazo de sessenta dias contados da rejeição ou da perda de eficácia por decurso do prazo, as relações jurídicas dela decorrentes; caso o Congresso Nacional não edite o decreto legislativo no prazo de sessenta dias, as relações jurídicas surgidas no período permanecerão regidas pela medida provisória. (PAULO; ALEXANDRINO, 2015). Entretanto, curioso o caso que surge se uma Medida Provisória não for apreciada no tempo estipulado ou for integralmente rejeitada, e o Congresso Nacional for inerte em relação ao decreto legislativo que regulamentaria tais relações nascidas durante o prazo de vigência da medida provisória. Segundo a Carta Magna, em seu § 11, do art. 62, tais relações continuarão regidas pela medida provisória, mesmo que extinta. § 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988). O doutrinador Pedro Lenza (2014), crítico severo dessa opção constitucional, expõe que tal medida trata-se de verdadeiro resgate do autoritário decreto-lei, que permitia a sua aprovação por decurso do prazo. Assim expõe: [...] de maneira totalmente contrária aos interesses da sociedade, resgatando as mazelas do extinto decreto- lei, o § 11 do art. 62, na nova redação, estabelece que se não for editado o decreto legislativo para regulamentar as relações jurídicas decorrentes da medida provisória que perdeu a sua eficácia, “as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas”; [...] Datamáxima vênia, trata-se de verdadeiro resgate do autoritário decreto-lei, que permitia a sua aprovação por decurso do prazo. Aqui se diz que a não apreciação implica a perda da eficácia ex tunc. Mas, inexistindo o decreto legislativo, as relações serão regidas pela extinta medida provisória! [...] não deixamos de V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 28 declarar a nossa repulsa por essa nova sistemática, totalmente inconstitucional e arbitrária. (LENZA, 2014). De outro lado, como o próprio doutrinador explana, de acordo com a justificação encontrada no Projeto de Resolução n. 5 – CN (DCN, 03.10.2001, p. 19.989), o objeto dessa regra é “evitar vácuo jurídico [...] evidenciado na prática recente”. 3 SUPOSTA ABERRAÇÃO JURÍDICA E CASO CONCRETO De acordo com algumas teorias, “aberrações jurídicas” seria algo que desvia o direito de sua verdadeira finalidade, tornando-o obsoleto. Estão estritamente ligadas com “absurdo” e “contradição” e totalmente contrárias à razoabilidade das Leis. No âmbito do direito previdenciário têm-se um caso concreto, relacionado à aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, de acordo com texto original do artigo 29, inciso II, da Lei 8213/91, o cálculo do benefício consistia na média aritmética simples de todos os últimos salários-de- contribuição dos meses imediatamente anteriores ao do afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de 36 (trinta e seis), apurados em período não superior a 48 (quarenta e oito) meses. Em 1999, o dispositivo legal sofreu alterações pela Lei no 9.876 estabelecendo que o salário-de-benefício dos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez consiste na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a 80% de todo o período contributivo. Em 2005 a dita Medida Provisória 242 alterou a forma de cálculo do salário de benefício do auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez, determinando a aplicação da média aritmética simples dos 36 (trinta e seis) últimos salários de contribuição: MP 242/05 - Art. . . Os arts. 29, 59 e 103-A da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, passam a vigorar com as seguintes alterações: Art.29[...] III - para os benefícios de que tratam as alíneas "e" e "h" do inciso I do art. 18, e na hipótese prevista no inciso II do art. 26, na média aritmética simples dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição ou, não alcançando esse limite, V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 29 na média aritmética simples dos salários-de-contribuição existentes. (MP 242/2005). Essa Medida Provisória posteriormente foi rejeitada pelo Congresso, entretanto, não foi editado nenhum decreto legislativo regulamentando as situações ocorridas na vigência da medida, devendo a mesma medida rejeitada, ser aplicada para esses casos que se deram na época dos fatos. Isso seria, exemplificadamente, o conceito de “aberração jurídica”, mas no ordenamento jurídico brasileiro tal acontecimento é considerado uma “exceção da exceção”. A “aberração jurídica”, teoricamente, também engloba a enorme importância da Medida Provisória em face da situação “assustadora”. Basicamente, a Medida Provisória é uma espécie normativa com poucas restrições (contidas no artigo 62, §1°, I da Constituição Federal e esquecendo as antigas regras que quase não possuíam restrições), dessa forma, uma MP pode tratar de assuntos muito abrangentes ou muito específicos, extremamente delicados ou não. Como visto, uma MP pode tratar de matéria extremamente usual e corriqueira, como a aposentadoria por invalidez e auxilio doença, fatos de ocorrência constante no Brasil. Outro exemplo: a Medida Provisória que acresceu e alterou dispositivos da Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e dá outras providências (lei que regulamentava o uso da engenharia genética e liberação do meio ambiente de organismos geneticamente modificados), ou seja, um tema extremamente delicado (células tronco), que no caso não houve problemas como a rejeição e a não edição de decreto regulamentador (como no caso de direito previdenciário supracitado), mas que torna possível ver até onde se pode legislar através de uma MP e consequentemente mostra a que nível chegaria a suposta aberração, se acontecesse em um caso como esse, por exemplo. Sobre a MP: “nem se diga que o constituinte reformador, ao assim modificar o texto constitucional, teve em vista garantir a segurança ou estabilidade jurídica, como defendem alguns.” (SZKLAROWSKY, 2002, RESENDE, 2001). CONSIDERAÇÕES FINAIS Conforme visto no decorrer desse estudo, a Medida Provisória é um mecanismo de extrema importância no âmbito legislativo brasileiro, V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 30 sobretudo por seus requisitos de relevância e urgência que lhe conferem eficácia imediata de Lei. Na hipótese de rejeição de tal espécie normativa, apesar da situação, em primeira análise, parecer absurda e assustadora, não necessariamente se encaixa como uma aberração jurídica, justamente pela existência do princípio da segurança jurídica; sem ele as situações simplesmente ficariam totalmente desamparadas enquanto não confeccionam um decreto para regulamentação e perante a impossibilidade de reedição de nova medida na mesma seção legislativa. Diante disso, certeiro foi o legislador ao ilustrar a situação no § 11 do artigo 62 da Constituição Federal, pois é preferível que as situações permaneçam sobre vigência de uma MP rejeitada do que sem amparo nem tutela alguma, gerando insegurança e desconforto jurídico. A insegurança gerada pela falta de amparo é o que pode ser assemelhada a um “absurdo jurídico”, o sistema de Medidas Provisórias não. REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 5 mar. 2017. BRASIL. Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8974.htm. Acesso em: 6 mar. 2017. BRASIL. Lei 9.876, de 26 de novembro de 1999. Dispõe sobre a contribuição previdenciária do contribuinte individual, o cálculo do benefício, altera dispositivos das Leis nº 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, e dá outras providências. Disponível em: http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9876.htm. Acesso em: 6 mar. 2017. BRASIL. Medida Provisória nº 22, de 24 de março de 2005. Altera dispositivos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004- 2006/2005/Mpv/242.htm. Acesso em: 6 mar. 2017. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 1999. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 31 CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Devido processo legislativo. 2. ed. Belo Horizonte: Mandamentos, 2006. FRANÇA. Declaração dos direitos do homem e do cidadão, de 02 de out. 1789. Disponível em: http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e- conteudos-de-apoio/legislacao/direitos-umanos/declar_dir_homem_ cidadao.pdf. Acesso em: 5 mar. 2017. LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 18. ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2014. PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito constitucional descomplicado. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. RESENDE, Idma. Medidas Provisórias e a Emenda Constitucional no 32/01. Revista jus navigandi, Teresina, ano 8, n. 65,1 maio 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4073. Acesso em: 8 mar. 2017. SPILIOTOPOULOS, Epaminondas. Relatório na XVa Mesa Redonda Internacional realizada em Aix-en-Provence, sobre o tema “Constitution et sécurité-juridique”. In: Annuaire internacional de justice constitutionnelle, XV, 1999. Paris: Economica, 2000. SZKLAROWSKY, Leon Frejda. As medidas provisórias e a Emenda Constitucional no 32/2001. Revista jus navigandi, Teresina, ano 6, n. 59, out. 2002. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=3331. Acesso em: 8 mar. 2017. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Onda Reformista do Direito Positivo e suas Implicações com o Princípio da Segurança Jurídica. In. Revista da escola nacional de magistratura, n. 1, p. 92-118, abr. 2006. ZIMMER, Willy. Relatório na XV Mesa Redonda Internacional, realizada em Aixen-Provence, sobre o tema “Constitution et sécurité- juridique”. In: Annuaire, 1999. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 33 A OPERAÇÃO LAVA JATO, O ABUSO E A ESPETACULARIZAÇÃO DAS PRISÕES PREVENTIVAS Leonardo Sousa dos Santos Moura* 2Victor Rodrigues Nascimento Vieira** INTRODUÇÃO A Operação Lava Jato despontou no cenário nacional e internacional por expor uma série de escândalos de corrupção no país envolvendo indivíduos poderosos que até então eram historicamente intocáveis e blindados pelo seu poder político e econômico. Assim, como uma forma de resposta a estes casos de corrupção, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal passaram a requisitar e o magistrado competente pela operação passou a conceder, frequentemente, mandados de condução coercitiva, de busca e apreensão, de quebra de sigilo telefônico, de prisões temporárias e de prisões preventivas. Neste sentido, o que se observou nos três anos de Operação Lava Jato que se seguiram foi que a grande maioria destas medidas cautelares foram amplamente aclamadas pelos veículos de informação e comunicação, em especial pelos canais de televisão aberta. Assim, a problemática que se estabelece neste trabalho, consiste em verificar até que ponto a utilização das prisões preventivas como medida cautelar está dentro de um limite legalmente permitido . A prisão preventiva está prevista no Capítulo III - arts. 311 a 316 do Código de Processo Penal (CPP)1. Da leitura dos artigos supracitados entendemos que tal modalidade de prisão cautelar não deve ser uma punição antecipada, o que inclusive é vedado pela legislação brasileira, pois a sanção só deve existir após a condenação judicial que transitou em julgado. * Graduando do curso de Direito da Universidade Federal de Uberlândia. ** Graduando do curso de Direito da Universidade Federal de Uberlândia. 1 Código de Processo Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/ Del3689.htm. Acesso em: 18 fev. 2017. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 34 Nesta linha de raciocínio, a1 pesquisa justifica-se pelo fato de que os recentes desdobramentos da Lava Jato2, caso mais emblemático do cenário jurídico-político brasileiro na atualidade3, colocaram em evidência, além dos investigados, os juízes, procuradores, delegados e policiais responsáveis pela operação. A hipótese que se levanta é que as autoridades responsáveis pela Lava Jato tenham sido tocadas pela opinião pública, bem como tenham acabado cedendo à pressão midiática que a espetacularização da operação causou. Assim, na primeira instância o órgão competente pela Operação é a 13ª Vara Criminal da Justiça Federal do Paraná (JFPR), sob responsabilidade do juiz Sérgio Fernando Moro. A 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) é o órgão do tribunal de apelação. Quanto aos órgãos superiores, são competentes: a Corte Especial e a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ); a 2ª Turma e o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Portanto, este estudo objetiva compreender o instituto da prisão preventiva e o preenchimento (ou não) dos requisitos legais para sua decretação ou manutenção, investigando o seu uso desenfreado pelos magistrados encarregados de julgar os réus.4 Para isso a metodologia utilizada foi a análise envolvendo os mandados de prisão preventiva da Lava Jato emitidos pela 13ª Vara Federal da JFPR e a pesquisa jurisprudencial por amostragem do TRF-4 e das instâncias superiores (STJ e STF) relacionada a tais medidas cautelares desde a instauração da operação em 17 de março de 2014 até 17 de março de 2017. A pesquisa realizada nos bancos de jurisprudência da 8ª Turma do TRF4; da 5ª Turma e da Corte Especial do STJ e da 2ª Turma e do Plenário do STF teve como parâmetro de busca os seguintes termos: “mandado e prisão preventiva e operação lava jato”. No total foram encontradas 98 jurisprudências, de modo que no TRF-4 foram encontrados 63 resultados, no STJ foram encontrados 24 resultados e no STF foram encontrados onze resultados. 1 2 Veja como foi a procura pelo caso no GOOGLE TRENDS (Org.). Operação Lava Jato. 2017. Disponível em: https://trends.google.com.br/trends/explore?q=Opera%C3%A7%C3%A3o%20 lava-jato. Acesso em: 17 mar. 2017. 3 BRASIL. Ministério Público Federal. Entenda o caso. 2014. Disponível em: http://lavajato.mpf.mp.br/entenda-o-caso. Acesso em: 23 mar. 2017. 4 Veja mais em: Quem são os juízes da operação Lava Jato. Disponível em: http://www.migalhas. com.br/Quentes/17,MI216941,91041Quem+sao+os+juizes+da+operacao+Lava+Jato. Acesso em: 10 fev. 2017. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 35 Após a análise dos julgados encontrados, foram descartadas 26 do TRF-4; duas do STJ e sete do STF pelo fato de que, ou se tratavam de processos de outros casos; ou então eram da Operação Lava Jato, porém não diziam respeito à prisão preventiva. Desse modo, ficamos com um total de 63 jurisprudências para serem utilizadas na pesquisa. Entre as jurisprudências encontradas e utilizadas, trabalhamos com as seguintes classes processuais: Habeas Corpus (HC); Embargos de Declaração em Habeas Corpus (EDHC); Recurso Criminal em Sentido Estrito (RCSE); Exceção de Impedimento Criminal (EXIMCR); Agravo Regimental no Habeas Corpus (AgRg no HC); Embargos de Declaração em Apelação Criminal (EDACR); Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) e Medida Cautelar no Habeas Corpus (MCHC). 1 PRISÃO COMO ÚLTIMA RATIO A prisão enquanto pena condenatória não existia na Antiguidade, nessa época o cárcere era basicamente um local onde o acusado aguardava o seu julgamento – evitando a sua fuga – que culminava muitas vezes na pena capital. Domicio Ulpiano, no Digesto, embasava esse sistema afirmando que: “o cárcere deve existir para custodiar as pessoas, não para puni-las”5 Essa ideia permaneceu praticamente imutável durante a Idade Média, proliferando cárceres particulares nos diversos feudos que existiam à época. A ideia de que a prisão poderia ser uma pena privativa de liberdade e não apenas um local temporário até que ocorresse o julgamento começa a florescer no início do século XIX, visto que "surgiu como uma instituição de fato, quase sem justificação teórica”.6 Não se buscava apenas a defesa da sociedade, mas também um controle do psicológico e da moral dos indivíduos. Atualmente, a pena privativa de liberdade é a sanção mais severa prevista no ordenamento jurídico- penal brasileiro, uma vez que são vedadas as penas de morte, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e qualquer outra de natureza cruel.7 No caso da prisão cautelar (carcer ad custodiam), aquela decretada antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, deve ser aplica 5 Livro 48, título XIX, fragmento 8, parágrafo 9. 6 FOUCAULT, op. cit., p. 84. 7 Constituição Federal de 1988, artigo 5º, inciso XLVII. V Seminário de Direito do Estado: “alternativaspolíticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 36 como ultima ratio pois a liberdade é a regra. Segundo Luiz Flávio Gomes, “a prisão preventiva não é apenas a ultima ratio. Ela é a extrema ratio da ultima ratio. A regra é a liberdade; a exceção são as cautelares restritivas da liberdade (art. 319, CPP); dentre elas, vem por último, a prisão, por expressa previsão legal”.8 1.1 Prisão preventiva As prisões preventivas se encaixam na modalidade das medidas cautelares pessoais que, segundo Dezem (2016), atingem a liberdade do indivíduo e podem ser subdivididas em prisões processuais, medidas diversas da prisão e medidas substitutivas da prisão preventiva. As medidas cautelares pessoais obedecem a dois fundamentos gerais que conhecemos como fumus comissi delicti (fumaça da existência do delito) e periculum libertatis (perigo decorrente da liberdade). Em apertada síntese, temos que fumus comissi delicti “significa a existência de probabilidade de ocorrência do crime (abrangendo aqui tanto os indícios de autoria, quanto a materialidade)”.9 Por outro lado, periculum libertatis “significa o risco que a liberdade do acusado (ou indiciado) representa para o processo. Quanto maior o risco que esta liberdade represente, mais intensa poderá ser a medida cautelar a ser aplicada.”10 Outra questão que é fundamental no que diz respeito às medidas cautelares em geral é o Princípio da Presunção de Inocência. Segundo referido princípio, insculpido no art. 5º, LVII da CF/1988 temos que: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.11 Além da previsão constitucional, a presunção de inocência encontra guarida no art. 8º, 2, do Pacto de São José da Costa Rica (Dec. 678/1992), que dispõe: “Toda pessoa tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente a sua culpa”.12 8 GOMES, apud MARQUES, Ivan Luís. Resumo em 15 Tópicos Sobre as Mudanças da Lei 12.403/2011. Disponível em: http://portalantigo.mpba.mp.br/atuacao/criminal/material/A_ lei_12_403_em_15_topicos.pdf. Acesso em: 20 mar. 2017. 9 DEZEM, Guilherme Madeira. Curso de Processo Penal: livro eletrônico. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, não paginado. 10 Ibidem, não paginado. 11 Constituição da República Federativa Do Brasil De 1988. Disponível em: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 20 fev. 2017. 12 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana Sobre Direitos Humanos. Disponível em: https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana. htm . Acesso em: 30 fev. 2017. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 37 O que se depreende do princípio supramencionado é que o acusado tem que ser “tratado como inocente até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, porque de fato e juridicamente é inocente”13 e frise-se que isto não é um favor que o magistrado faz, mas um direito que o acusado tem. Assim, temos que qualquer prisão automática não pode ser aceita, de forma que, para seja decretada a prisão preventiva do acusado, esta deve se dar de maneira motivada e bem fundamentada pelo juiz, afinal, o que está em jogo é a liberdade de um sujeito de direitos, seja ele quem for. A prisão preventiva, ou prisão preventiva strictu sensu, como é denominada por alguns doutrinadores, é utilizada na maioria dos casos e, segundo Dezem, ainda serve como um termômetro relacionado à presunção de inocência: É a prisão processual utilizada na maioria dos casos, daí porque pode ser considerada um termômetro sobre como determinado sistema se relaciona com a presunção de inocência. Quanto mais larga for a admissão da prisão preventiva, menor será o compromisso com a presunção de inocência. Não entendemos a prisão preventiva como um mal, ontologicamente falando. [...] . A questão toda estará na forma de sua utilização e nos argumentos utilizados pelo Poder Judiciário para justificar a prisão preventiva. Aí está o cerne da questão. A depender da argumentação utilizada teremos uma medida que poderá se mostrar com maior ou menor legitimidade, que poderá ser ou não violadora da presunção de inocência.14 Tal medida cautelar poderá ser requerida “pelo Ministério Público, pelo querelante na ação penal privada ou pelo assistente de acusação. Ainda, quando se tratar de inquérito policial poderá ser decretada mediante representação da autoridade policial”.15 A preventiva só pode ser decretada pelo judiciário, em qualquer de suas instâncias16 e o momento para sua decretação pode ser tanto no inquérito policial quanto no decorrer da ação penal, desde que estejam presentes indícios suficientes de autoria e de prova da existência do crime. O cabimento da prisão preventiva gira em torno de três artigos do CPP, os arts. 312, 313 e 314 e as classificações sobre os elementos destes artigos são divergentes entre os doutrinadores, de forma que, vamos adotar a classificação de Guilherme Madeira Dezem. 13 DEZEM, Guilherme Madeira. Curso de Processo Penal: livro eletrônico. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, não paginado. 14 Ibidem, não paginado. 15 Ibidem, não paginado. 16 Se for um caso de competência originária, competente será o relator do tribunal em questão. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 38 Segundo Dezem, podemos dividir os elementos das prisões preventivas em quatro: pressupostos positivos; pressupostos negativos; fundamentos da prisão preventiva e condições de admissibilidade da prisão preventiva. Assim, para que ela seja decretada, é necessária a combinação dos requisitos supracitados da seguinte forma: a) pressupostos positivos - ambos devem se fazer presentes; b) pressuposto negativo - não pode estar presente sob pena de ficar obstada a possibilidade de decretar a prisão preventiva; c) fundamentos da prisão preventiva - deve haver a presença ao menos de um dos fundamentos da prisão preventiva e d) condições de admissibilidade - deve haver a presença de ao menos uma das condições de admissibilidade da prisão preventiva.17 Os pressupostos positivos encontram-se na parte final do art. 312 do CPP e são os seguintes: indícios suficientes de autoria e prova de existência do crime, de forma que os dois devem se fazer presentes. Os pressupostos negativos estão dispostos no art. 314 do diploma Processual Penal e tratam das causas excludentes de ilicitude previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 23 do Código Penal. Assim, a presença de qualquer hipótese de excludente da ilicitude impede a decretação de prisão preventiva e a torna ilegal. O artigo 312 do Código de Processo Penal, por sua vez, versa sobre os fundamentos da prisão preventiva, que são quatro: garantia da ordem pública; garantia da ordem econômica; conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal. Como se observa de uma primeira leitura, o fundamento “garantia da ordem pública” é muito vago e esta é uma crítica muito recorrente entre os doutrinadores. Assim, para tentar traçar os limites de tal fundamento, seguimos a mesma linha de pensamento de Guilherme Madeira Dezem, que versa o seguinte: [...] a ordem pública tem este conteúdo material ligado à paz pública. No entanto, não basta violação da paz pública, é preciso que haja os seguintes requisitos cumulativos (é a mesma posição de Zanoide): a) pena prevista para o crime imputado deve justificar a prisão preventiva; 17 DEZEM, Guilherme Madeira. Curso de Processo Penal: livro eletrônico. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, não paginado. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 39 b) as circunstâncias e a forma demonstradas de cometimento do suposto crime devem ser de tal gravidade que justifica o cometimentoda restrição da liberdade; e c) relação temporal entre o conhecimento da autoria e o instante de determinação da prisão. Ora, não é possível falar- se em abalo à ordem pública de crime cuja autoria tenha sido descoberta há tempos e que apenas depois venha a se querer prender. Como justificar que a ordem pública foi violada quando um crime foi cometido em 2012, tendo lá sido descoberta sua autoria, e somente em 2014 tenha sido decretada sua prisão? Com a devida vênia, não há como.18 Entretanto, conforme se extrai da análise da maioria dos julgados, a garantia da ordem pública tem a ideia simplista de probabilidade de reiteração de condutas criminosas. Ademais, observa-se nas jurisprudências que o conceito de ordem pública abrange ainda: a probabilidade de reiteração de condutas criminosas; a gravidade em concreto do crime; a periculosidade do agente e a gravidade em concreto do crime baseada no modus operandi da conduta do agente. Por outro lado, acreditamos que fundamentos como a mera gravidade em abstrato do crime, o clamor público e a reincidência por si só, não podem ser admitidos para fundamentar a prisão preventiva com base na garantia da ordem pública. A garantia da ordem econômica também merece a mesma crítica que foi feita acima, por se tratar de um conceito que dá margem para ampla interpretação. Pelo que se observa da leitura das jurisprudências, os crimes que atentam contra esta garantia, são aqueles que tenham qualquer expressão econômica ou até mesmo crimes contra o patrimônio. Aqui ainda é importante ressaltar o art. 30 da Lei 7.492 de 1986, popularmente conhecida como Lei do Colarinho Branco, que dispõe: Sem prejuízo do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941, a prisão preventiva do acusado da prática de crime previsto nesta lei poderá ser decretada em razão da magnitude da lesão causada. (Vetado).19 A conveniência da instrução criminal, por sua vez, não é objeto de muita discrepância na doutrina e conforme assevera Dezem, “possui 18 DEZEM, Guilherme Madeira. Curso de Processo Penal: livro eletrônico. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, não paginado. 19 Lei dos Crimes Contra o Sistema Financeiro. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/L7492.htm. Acesso em: 15mar. 2017. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 40 significado preciso dentro da sistemática do Código de Processo Penal: trata-se de hipótese em que o indiciado ou acusado atuam de maneira indevida sobre a produção probatória (instrução criminal ou investigação criminal)”.20 É preciso entender a expressão “atuação indevida”, visto que não pode ser admitida a prisão preventiva caso o acusado esteja exercendo um direito seu. Assim, por exemplo, se um acusado se recusar a participar de uma delação premiada, ele não pode ser preso preventivamente até que forneça as informações que possam servir como prova para o caso, sob pena de voltarmos ao sistema inquisitório e infligimos uma punição antecipada ao investigado. Entretanto, as críticas que se fazem a Lava Jato vão em direção contrária ao supracitado, visto que se afirma que os investigados são mantidos presos para que sejam forçadas a delatar, afinal, o entendimento do Procurador da República Manoel Pastana é que “o passarinho para cantar, precisa estar preso”.21 A quarta e última hipótese em que cabe a prisão preventiva diz respeito à possibilidade de decretar preventiva como forma de assegurar a aplicação da lei penal. Aqui, o que se analisa na maioria das jurisprudências é que essa hipótese existirá quando houver indícios de fuga por parte do acusado. Entretanto, conforme observa Dezem (2016) a previsão genérica de fuga do acusado não é o bastante. O autor cita ainda o exemplo do acusado possuir dupla nacionalidade ou ser rico (justificativas muito utilizadas nos julgados) como sendo insuficiente para que se decrete a prisão preventiva. É preciso que existam atos concretos que sirvam de evidência de que o acusado está em fuga e não meras hipóteses genéricas. É esse inclusive o entendimento do STF: [...] No caso, em razão da existência de um inquérito policial instaurado em 2011, o Juízo de origem decretou a prisão preventiva por suposto risco de fuga do acusado, em contrariedade à orientação no sentido de que, inexistindo dados concretos a respeito do comportamento processual do acusado, não é possível justificar a prisão preventiva para a aplicação da lei penal apenas na presunção de que o acusado pode vir a fugir.22 20 DEZEM, Guilherme Madeira. Curso de Processo Penal: livro eletrônico. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, não paginado. 21 STRECK, Lenio Luiz; TRINDADE, Andre Karam. "O passarinho pra cantar precisa estar preso". Viva a inquisição! 2014. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2014-nov-29/diario-classe- passarinho-pra-cantar-estar-preso-viva-inquisicao. Acesso em: 29 fev. 2017. 22 STF, HC 122.572/SP, j. 10.06.2014, rel. Min Roberto Barroso. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 41 Já o art. 313 do CPP lista as condições de admissibilidade da prisão preventiva pelo que é necessária a presença de pelo menos uma das condições listadas nos três incisos do referido artigo, sendo prescindível a cumulatividade. Aqui é importante ressaltar que só se admite prisão preventiva para crimes dolosos e ela não será cabível quando se tratar de cometimento de contravenção penal. O inciso I do art. 313 dispõe que será admitida a decretação da prisão preventiva em crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos. Dezem esclarece que “trata-se da pena máxima em abstrato, segundo o parâmetro do CPC e, neste parâmetro de pena, incidem as causas de aumento (pelo valor máximo) e as causas de diminuição de pena (pelo valor mínimo), mas não as agravantes e atenuantes”.23 O inciso II, por sua vez, trata da reincidência e dispõe que cabe preventiva “se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado”. Nesta hipótese há uma ressalva que trata do chamado período depurador, disposto no inciso I do caput do art. 64 do Código Penal.24 Assim, cinco anos após o cumprimento ou extinção da pena, a condenação pretérita não poderá ser utilizada como condição de admissibilidade da prisão preventiva. Já o inciso III trata de cabimento de preventiva “se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência”. Por fim, o parágrafo único do art. 313 dispõe que será admitida a prisão preventiva “quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.” 2 CRIMINOLOGIA MIDIÁTICA Os meios de comunicação de massa, como a televisão e a recente consolidação da Internet, são hoje os principais formadores de opinião da 23 DEZEM, Guilherme Madeira. Curso de Processo Penal: livro eletrônico. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, não paginado. 24 Art. 64 - Para efeito de reincidência: I - não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação; V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 42 coletividade, atuando como o prisma que os sujeitos enxergam o mundo. Engana-se quem acredita que esse fenômeno não reverbera na esfera judiciária, vistoque atualmente cresce entre juristas o debate sobre o impacto da mídia no Poder Judiciário e o quão alarmante pode ser essa influência. Nesse sentido, é importante ressaltar o papel da criminologia midiática que, segundo o entendimento de Zaffaroni (2013, p. 160), sempre existiu e apela para uma criação da realidade através de informação, subinformação e desinformação, calcada em uma etiologia criminal simplista. Sendo assim, as informações passadas pela imprensa, principalmente aquelas ligadas à ordem penal e processual penal, ecoam e fixam-se na consciência coletiva, que, por sua vez, passa a clamar por um maior rigor penal a qualquer custo, inclusive em detrimento de garantias constitucionais. Sobre essa questão, Ana Lúcia Menezes Vieira assevera que: Na justiça midiática não há tempo para nada, nem sequer para a apresentação detalhada dos fatos. Quanto mais velocidade mais verossímil se torna a notícia. O processo é ultrassumário, acelerado. Tudo é sintético e o tom preponderante é o da imagem, que fala por si só; com a difusão da internet a relação entre quem produz e quem consome notícia foi profundamente alterada; as pessoas já não têm tempo nem sequer para ver os detalhes de uma notícia.25 Vale ressaltar aqui que não se questiona o importante papel da imprensa numa democracia, tampouco se anseia a volta da censura, conforme Odone Sanguiné: Quando os órgãos da Administração de Justiça estão investigando um fato delitivo, a circunstância de que os meios de comunicação social proporcionem informação sobre o mesmo é algo correto e necessário numa sociedade democrática. Porém uma questão é proporcionar informação e outra realizar julgamentos sobre ela. É preciso, portanto, partir de uma distinção entre informação sobre o fato e realização de valor com caráter prévio e durante o tempo em que se está celebrando o julgamento. Quando isso se produz, estamos ante um juízo prévio/paralelo que pode afetar a imparcialidade do Juiz ou Tribunal, que, por sua vez, se reflete sobre o direito do acusado à presunção de inocência e o direito ao devido processo.26 25 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo penal e mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 109 26 SANGUINÉ, Odone. A inconstitucionalidade do clamor público como fundamento de prisão preventiva. In: SHECARIA, Sérgio Salomão (Org.). Estudos criminais em homenagem a Evandro Lins e Silva (criminalista do século). São Paulo: Método, PP. 257-295, 2001, p. 268. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 43 Quando se fala em Lava Jato, percebe-se com clareza solar a construção da realidade supracitada. Assim, a narrativa dada pela imprensa transforma o juiz em herói nacional27, com a mesma aura infalível daqueles das revistas em quadrinhos, o policial em galã28 e os acusados em vilões, cuja lei deve ser enrijecida para garantir o quanto antes a punição desses indivíduos.29 É inegável a espetacularização em torno dos eventos ligados à operação, existindo uma forte pressão para que os juristas punam o quanto antes os acusados envolvidos, sob o risco de serem também transformados em inimigos da nação. É nesse momento que o Direito passa a ter uma relação perigosa com a imprensa, buscando acalmar os ânimos da população - já descrente do poder Judiciário - acaba cedendo ao apelo das vozes externas aos fatos do processo e adota uma conduta que desrespeita o direito do sujeito a um processo justo. 3 DIREITO PENAL DO INIMIGO Com o crescente frenesi acerca dos fatos ligados à Operação Lava Jato, a partir do inflamável encontro de uma sociedade em cólera diante desse faraônico esquema de corrupção, e uma imprensa sedenta pela criação de um espetáculo, instaurou-se no cenário nacional um crescente clima de caça às bruxas – onde vale tudo para queimá-las, que trouxe à tona o traiçoeiro fantasma do “Direito Penal do Inimigo”. O “Direito Penal do Inimigo”, termo cunhado por Gunter Jakobs em 1985, afirma que determinados indivíduos perdem o status de cidadãos e passam a ser tratados como inimigos. 27 Ver mais em “Sérgio Moro é exaltado como herói na Paulista”. Disponível em: http://www1. folha.uol.com.br/poder/2016/03/1749519-sergio-moro-e-exaltado-como-heroi-nacional-na- paulista.shtml. Acesso em: 26 mar. 2017. 28 Ver mais em “Saiba quem é o agente federal gato que escoltou Eduardo Cunha” Disponível em: http://extra.globo.com/noticias/brasil/saiba-quem-o-agente-federal-gato-que-escoltou-eduardo- cunha-20316683.html. Acesso em: 26 mar. 2017. 29 Em 2014, ao se manifestar contra um pedido de Habeas Corpus, o procurador da República Manoel Pastana afirmou que “o passarinho para cantar precisa estar preso”. Disponível em: http:// www.conjur.com.br/2014-nov-27/parecer-mpf-defende-prisoes-preventivas-forcar-confissoes. Acesso em: 25 mar. 2017. V Seminário de Direito do Estado: “alternativas políticas e respostas jurídicas diante da crise das instituições” 44 Para elaborar sua teoria, Jakobs debruça-se sobre as obras de grandes filósofos como Rosseau30, Hobbes31 e Kant,32 buscando tornar ainda mais sólidos os seus argumentos. Diante disso, advoga pela existência de dois tipos de direito: o primeiro destinado para o cidadão, que ainda que viole alguma norma, é punido mantendo todas as suas garantias constitucionais preservadas, e o segundo para cuidar “de maneira própria o infiel ao sistema, aplicando-se lhe não o Direito, „vínculo entre pessoas que, por sua vez, são titulares de direitos e deveres‟, mas sim a coação, repressão necessária àqueles que perderam o seu status de cidadão” (CUNHA, 2016, p. 188). Os três pilares que fundamentam o Direito Penal do Inimigo são: Em primeiro lugar, constata-se um amplo adiantamento da punibilidade, isto é, que neste âmbito, a perspectiva do ordenamento jurídico-penal é prospectiva (ponto de referência: o fato futuro), no lugar de – como é o habitual – retrospectiva (ponto de referência: o fato cometido). Em segundo lugar, as penas previstas são desproporcionalmente altas: especialmente, a antecipação da barreira de punição não é considerada para reduzir, correspondentemente a pena cominada. Em terceiro lugar, determinadas garantias processuais são relativizadas ou inclusive suprimidas.33 30 Para Rousseau: “qualquer malfeitor, atacando o direito social, pelos seus crimes torna-se rebelde e traidor da pátria, deixa de ser um seu membro ao violar suas leis e até lhe move guerra. A conservação do Estado é então incompatível com a sua, sendo preciso que um dos dois pereça, e, quando se faz que um culpado morra, é menos como cidadão do que como inimigo. (ROSSEAU, 1973, p. 58). 31 O pensamento de Hobbes é que: “no estado de natureza, os homens, fundamentalmente egoístas e tendo necessidades dos mesmos bens, são fatalmente inimigos entre si (homo homini lupus), em luta perpétua e universal (bellum omnium contra omnes), em que nem sequer a vida está segura.” (PADOVANI, 1974, p. 320). 32 Citado por Jakobs: “ [...] Em seu escrito „Para a Paz Perpétua‟, ele dedica uma longa nota de rodapé ao problema de quando se está autorizado a proceder de modo hostil contra uma pessoa: „o homem, ou o povo, no simples estado natural priva-me [...] dessa segurança (necessária) e lesa- me já por se encontrar ao meu lado nesse estado, ainda que não efetivamente (facto), mas sim pela ausência de lei de seu estado (statu iniusto), que é uma constante ameaça para mim; e eu posso forçá-lo a entrar comigo num estado comunitário-legal ou a afastar-se do meu lado‟. Assim sendo, aquele que não participa de uma vida num „estado comunitário-legal‟ deve se afastar, o que significa que será expulso ou que, em todo caso, não há que ser tratado como pessoa, podendo-se, como observa expressamente Kant, „tratá-lo como um inimigo‟. Como acaba de citar-se, em Kant, não se trata como pessoa quem me ameaça ... constantemente‟, quem não se deixa coagir ao estado de civilidade.” (JAKOBS,
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