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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE PSICOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DO COMPORTAMENTO INVESTIGAÇÃO EXPERIMENTAL DA PERCEPÇÃO DE DOR EM MULHERES COM DEPRESSÃO ANA MARIA CREPALDI BRASÍLIA 2009 UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE PSICOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DO COMPORTAMENTO INVESTIGAÇÃO EXPERIMENTAL DA PERCEPÇÃO DE DOR EM MULHERES COM DEPRESSÃO Ana Maria Crepaldi Orientador: Prof. Dr. Antonio Pedro de Mello Cruz Co-orientadora: Profa. Dra. Wânia Cristina de Souza Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências do Comportamento do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília, como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre em Ciências do Comportamento. Brasília 2009 - 3 - UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE PSICOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DO COMPORTAMENTO Comissão Examinadora: Prof. Dr. Antonio Pedro de Mello Cruz – Presidente Departamento de Processos Psicológicos Básicos Universidade de Brasília Assinatura _____________________________ Profa. Dra. Cibele Andrucioli de Mattos Pimenta – Membro Externo Departamento de Enfermagem Médico-cirúrgica Universidade de São Paulo Assinatura _____________________________ Prof. Dr. Áderson Luiz Costa Júnior – Membro Externo Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Universidade de Brasília Assinatura _____________________________ Prof. Dr. Gerson Américo Janczura – Suplente Departamento de Processos Psicológicos Básicos Universidade de Brasília Assinatura _____________________________ Data: __________________________________ Parecer: ________________________________ - 4 - Dedicatória Aos meus avós maternos, Hermínio Santarcangelo e Maria Cândida; e paternos, Gino Crepaldi e Mercedes, por terem feito as escolhas certas para que meus pais e eu pudéssemos gozar da vida boa que levamos. - 5 - AGRADECIMENTOS Ao Professor Doutor Antônio Pedro de Mello Cruz, por me receber em seu laboratório, me dar a chance de recomeçar, e confiar a mim um estudo envolvendo humanos. À Professora Doutora Wânia Cristina de Souza, por ter me aceitado como co-orientanda e providenciado local, equipamento e muitas outras coisas úteis para meu trabalho e minha estadia. A meus pais, Vanda e Umberto, por terem feito sacrifícios pessoais para custear meus estudos e promover a infra-estrutura necessária para que eu pudesse ter escolhas. Ao meu irmão Matheus, pelo apoio incondicional. Aos três, por existirem. Às minhas tias Carminha e Venerina, por me ouvirem e torcerem por mim. Ao Odival Serrano, à Natália Rodrigues e à Cláudia Morini, por me ensinarem coisas positivas e enriquecerem minha vida com pontos de vista diferentes. À Marina, Renata Tavares, Catita, Mariana, Zito, Flavia, Luciana Bastos, Luciana Carelli, Carla, Valzinha e Jaqueline, meus remedinhos para o equilíbrio. À CAPES, pela bolsa de Mestrado;e à Diretoria de Desenvolvimento Social da UnB, pela bolsa alimentação e moradia. Ao Fernando Pereira Miranda, por sua infinita paciência, bom humor e por dividir comigo o que aprendeu no Laboratório de Psicobiologia da UnB. Ao Flávio Campestrin Bettarello e família; Ministro Jorge Henrique Ferraz de Souza Jr e família; Marília Greidinger Carvalho e família e Associação Cultural Israelita de Brasília, por todo o apoio que me deram durante o curso. - 6 - À Paula Valliccheli Yamaoka e ao Fabrício Fernandes Almeida, por estarem sempre no lugar certo, na hora certa. Ao CAEP, especialmente ao Prof. Ileno Izídio da Costa, e às queridas Suemes, Aline e Regina, por nunca colocarem muros, apenas portas. Aos docentes, discentes e demais funcionários do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Comportamento, por toda a ajuda recebida e laços de amizade formados. Ao Dr. Régis Eric Maia Barros, Psiquiatra, Mestre em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP, por me introduzir à Mini International Psychiatric Interview, e ao Prof. Nelson Rocha de Oliveira, Doutor em Ciências do Comportamento, por indicá-lo. Aos moradores e funcionários da Moradia de Pós Graduação da UnB na Colina: vocês tornaram esta experiência inesquecível. Ao Prof. Vitor Augusto Motta Moreira e aos alunos da turma de Psicofisiologia 1 do segundo semestre de 2009, pela oportunidade de estágio em docência. Ao mestre Gerson Américo Janczura, sempre bem humorado e colaborador. Aos amigos queridos, docentes e discentes, da Casa Thomas Jefferson: altíssimo padrão de qualidade. Aos Professores Sérgio Koiti Kamei,Victoria Secaf, Miguel Nicolelis e Sidarta Ribeiro, pela inspiração antes mesmo que eu iniciasse o mestrado. Ao Rafael Sordili, o Charlie Brown, sem o qual esta aventura sequer teria começado. - 7 - RESUMO No Brasil, onde existe grande ocorrência de casos de Transtorno Depressivo Maior (TDM) em comorbidade com sintomas dolorosos, há uma carência de pesquisa básica sobre a interação entre depressão e percepção de dor. O presente trabalho teve como objetivo contribuir para esclarecer como os estados depressivos podem influenciar a percepção de dor em ambientes experimentais, por meio do uso do Teste Pressor ao Frio (TPF) como método de indução de dor e do Questionário de Dor de McGill (QDM) como métrica de avaliação da dor. Foram realizados dois estudos: um piloto, com 16 participantes saudáveis (12 mulheres e quatro homens), para ajuste da metodologia, e um experimento envolvendo 16 mulheres com Depressão e 16 mulheres saudáveis, utilizando-se da mesma metodologia do estudo piloto para averiguar possíveis diferenças entre os resultados do TPF e do QDM entre os grupos com e sem depressão. O diagnóstico de depressão e a ausência de sintomas depressivos foram verificados através dos questionários Mini International Neuropsychiatric Interview (M.I.N.I.) e Inventário de Beck Para Depressão. A sensibilidade à dor foi comparada entre homens e mulheres no estudo piloto (01) e entre mulheres com e sem depressão no estudo 02. As medidas utilizadas para averiguar a sensibilidade à dor foram: a tolerância à dor, verificada através da latência de retirada da mão da água no TPF; e os índices de estimativa sensorial, afetiva e global de dor do QDM. No estudo piloto, as mulheres permaneceram mais tempo com a mão na água do que os homens, embora tenham alcançado escores mais altos nos índices de estimativa da dor. As diferenças entre as médias foram estatísticamente significantes para os índices IED Sensorial e IED Total e houve correlação negativa estatisticamente significante entre idade e IED Sensorial e também entre a latência e a Avaliação Global da Intensidade da Experiência Dolorosa (AGIED). No experimento com mulheres com e sem depressão, o grupo controle tendeu a permanecer mais tempo com a mão na água e a atribuir mais valor sensorial à experiência, enquanto as mulheres com depressão atribuíram maior valor afetivo à dor experienciada. Estas diferenças foram estatisticamente significantes quando utilizamos os diagnósticos dos instrumentos M.I.N.I. e Beck separadamente. Entretanto, quando comparamos as mulheres saudáveis com mulheres classificadas como tendo Depressão Maior Atual e Recorrente de acordo com o M.I.N.I., o resultado foi oposto: o grupo controle apresentou escores de índice afetivo significantemente maiores do que o grupo com Depressão Maior Atual e Recorrente, talvez indicando uma possível dessensibilização afetiva na depressão recorrente. Palavras-chave: percepção de dor, depressão, tolerância à dor, teste pressor ao frio, questionário de dor de Mcgill, mini international neuropsychiatric interview, inventário de depressão de Beck. - 8 - ABSTRACTIn Brazil, where there is a strong prevalence of Major Depression in comorbidity with painful symptoms, as well as some clinical research on this interaction, there is little basic research on depression and pain perception. The present study has had the purpose of contributing to the understanding of how depressive states can influence pain sensitivity, through the use of the Cold Pressor Test (CPT) as an experimental pain method and the McGill Pain Questionnaire (MPQ) for subjective pain measurement. Two studies were carried out: a pilot study with 16 healthy subjects (including 12 women and 4 men), for methodological adjustments; a second study involving 16 depressed women that were compared to 14 healthy women of approximate age. The goal of the second study was to compare pain tolerance and pain estimates between depressed and healthy women. The categorization of participants in depressed and healthy was made through the application of the Mini International Neuropsychiatric Interview (M.I.N.I.) and the Beck Depression Inventory. Pain tolerance, accessed through the withdrawal latency in the CPT, and pain estimates, accessed through MPQ scores, were compared between men and women in the pilot study (01) and between women with and without depression in study 02. In the pilot study, women were able to stand the CPT longer than men, though they have attributed higher values to the pain estimate indexes. The differences between the means were significant for the sensory and the total pain estimate indexes and a negative correlation was found between age and the sensory pain estimate index, as well as between the latency in the CPT and the global evaluation index in the MPQ. In the experiment with depressed women and healthy controls, the control group could endure the CPT longer, and has made higher sensory estimates comparing to the depressed women, who had attributed higher affective values to the pain experienced. However, these differences were only statistically significant when we analyzed the data comparing depressive women with health controls who had been classified as such through the both the M.I.N.I. and the Beck diagnostic criteria separately. Women with major depression have had significantly higher affective index scores than healthy controls both for the BDI and the M.I.N.I. classification criteria. However, when comparing healthy subjects with women classified as having Recurrent and Current Major Depression according to the M.I.N.I., the result was the opposite: controls had significant higher affective index scores than women with recurrent and current major depression. Studies using greater samples, different diagnostic criteria and more accurate physiological pain measurement methods could provide data that may be generalized. Keywords: pain perception, depression, pain tolerance, cold pressor test, McGill pain questionnaire, mini international neuropsychiatric interview, Beck depression inventory. - 9 - ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 – Escala Visual Analógica utilizada com o Questionário de McGill. 16 Figura 2 - Participante com a mão mergulhada na cuba do equipamento de banho termostatizado utilizado durante o Teste Pressor ao frio, modelo de indução experimental de dor. 24 Figura 3 – Comparação entre as médias dos escores dos homens e mulheres participantes do Estudo 01. 30 Figura 4 – Comparação entre as médias dos escores de Latência, IED Sensorial, IED Afetivo e IED Total dos grupos controle e experimental com e sem a inclusão dos indivíduos tomando antidepressivos no Estudo 02. 40 Figura 5 – Comparação das médias dos escores da Avaliação Global da Intensidade da Experiência Dolorosa (AGIED) e da Escala Analógica Visual (VAS) entre os grupos experimental e controle, com e sem medicação, do Estudo 2. As diferenças entre as médias não foram estatisticamente significantes. 41 Figura 6 – Comparação da média dos escores de IED Afetivo entre os participantes saudáveis e aqueles com depressão, classificados através do IDB. 43 Figura 7 – Comparação entre as médias dos escores, dos índices que apresentaram diferenças estatisticamente significativas quando somente o critério diagnóstico da Mini International Psychiatric Interview foi utilizado. 45 Tabela 1 - Estudos Utilizando o TPF Como Método de Indução de Dor em participantes depressivos. 15 Tabela 2 – Escores dos Grupos Controle (C) e Experimental (E) por Critério de Agrupamento. 27 - 10 - SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................11 ESTUDO 01 – PADRONIZAÇÃO DE UM MÉTODO EXPERIMENTAL DE ESTIMULAÇÃO TÉRMICA NOCICEPTIVA E COMPARAÇÃO ENTRE NÍVEL DE TOLERÂNCIA À DOR E ESTIMATIVA DE DOR EM 16 INDIVÍDUOS SAUDÁVEIS ............................................................22 MÉTODO.................................................................................................................................................22 Participantes.....................................................................................................................................22 Materiais e Método ...........................................................................................................................23 RESULTADOS ..........................................................................................................................................27 DISCUSSÃO.............................................................................................................................................31 ESTUDO 02 – NÍVEL DE TOLERÂNCIA À DOR E ESTIMATIVA DE DOR NA DEPRESSÃO MAIOR: COMPARAÇÃO ENTRE MULHERES COM DEPRESSÃO MAIOR E GRUPO CONTROLE .............................................................................................................................................34 MÉTODO.................................................................................................................................................34 Participantes.....................................................................................................................................34 Materiais e Métodos .........................................................................................................................35 RESULTADOS ..........................................................................................................................................38 DISCUSSÃO.............................................................................................................................................46 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................................................49 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................51 - 11 - Introdução Segundo a International Association For the Study of Pain (IASP), a dor é “uma experiência sensorial e emocional desagradável que é descrita em termos de lesões teciduais, reais ou potenciais. A dor é sempre subjetiva e cada indivíduo aprende e utiliza este termo a partir de suas experiências anteriores.” (IASP, 1994). Ainda segundo a IASP, utilizamos para este estudo as seguintes definições: (a) nociceptor: um receptor especializado para estímulos dolorosos ou nociceptivos; (b) limiar de dor: a menor experiência de dor que um indivíduo pode reconhecer como tal e (c) nível de tolerância à dor: o maior nível de dor que um indivíduo esta preparado para tolerar. Outras definições adotadas para este estudo foram: (1) dor crônica: a dor que persiste além do tempo fisiológico de cura, associado a um determinado tipo de injúria e/ou processo patológico (Shipton e Tait, 2005 e Angelotti e Sardá, 2005); (2) dor aguda:dor resultante de patologia, inflamação ou injúria nos tecidos, sendo uma reposta fisiológica a estes e podendo ser acompanhada por ansiedade ou desconforto emocional. Sua causa pode ser diagnosticada e tratada; (3) dor clínica: aquela reportada por pacientes em serviços de saúde (Johnson, 1997) e (4) dor experimental: aquela reportada por participantes em experimentos científicos (Da Silva e Ribeiro Filho, 2006). As bases de dados consultadas para este estudo foram: Web of Science, Science Direct, Medline, Scielo, LiLacs e o portal Periódicos CAPES. Os descritores utilizados foram: pain perception, depression, pain tolerance, cold pressor test, cold pressor task, McGill pain questionnaire, mini international neuropsychiatric interview e Beck depression inventory. Cada descritor acima também foi utilizado em combinação com as palavras - 12 - pain e depression separadamente, intercaladas por AND e depois por OR. Utilizou-se como filtro de pesquisa a restrição de data – de 2004 a 2009, mas artigos publicados anteriormente a 2004 foram incluídos quando seus achados não foram superados por artigos mais recentes. Foram selecionadas 78 publicações, entre artigos, livros, dissertações e páginas da internet. Utilizamos neste estudo dois tipos de indicadores da sensação de dor: aqueles obtidos por auto-avaliação, registrados através do Questionário de Dor de McGill e o indicador comportamental de dor, a latência de retirada da mão da água. Não foram utilizados indicadores fisiológicos da dor. Entretanto, tentamos encontrar uma relação entre a percepção de dor e Depressão, como já foi feito em estudos internacionais. Dentre os aspectos psicobiológicos da correlação entre Dor e Depressão, este estudo considerou as vias neuronais comuns entre a fisiopatologia dos estados depressivos e os mecanismos de modulação da dor. Evidências clínicas e experimentais indicam que o neurotransmissor serotonina encontra-se em quantidades reduzidas no organismo daqueles pacientes com depressão. (Graeff e Brandão, 1999). O presente estudo trabalhou com a hipótese de que pacientes deprimidos pudessem apresentar alterações na percepção de dor graças à participação da mesma substância nos mecanismos fisiológicos de modulação da dor (Otto et al., 2008). Apesar da relevância adaptativa da dor (Danziger e Willer, 2005) e das bem estabelecidas implicações mutiladoras nos indivíduos a ela insensíveis (Jewsbury, 1951), existem mecanismos fisiológicos para a inibição dos estímulos dolorosos. A serotonina participa dos mesmos, que quando alterados estão relacionados a quadros clínicos de dor crônica (Van Steenwinckel et al., 2007). Melzack e Wall (1965) propuseram a Teoria da Comporta da Dor, que trabalha com um modelo que se comporta como um portão, controlando a passagem dos impulsos nervosos do Sistema - 13 - Nervoso Periférico até o Sistema Nervoso Central, através da medula. A Teoria propõe, ainda, a existência de duas vias percorrendo a medula: uma ascendente, que leva o estímulo doloroso ao encéfalo, e uma descendente, de inibição da dor. A serotonina, neurotransmissor cuja depleção está relacionada a quadros depressivos, está envolvida na via descendente de inibição da dor (Pimenta, 1999). São muitas as Áreas do Conhecimento que estudam a dor, mas dentro da Psicologia podemos citar uma área tradicionalmente relacionada à percepção da dor: a Psicofísica. Até a metade do século XIX, a Psicologia era considerada um ramo da Filosofia que só ganharia status de ciência independente após a publicação de estudos pioneiros utilizando a abordagem metodológica da Psicologia Experimental. Tais estudos, que elevaram a Psicologia ao patamar que ocupam as outras ciências, surgiram justamente através da aplicação do método científico em tentativas de medir as relações matemáticas entre as magnitudes físicas dos estímulos externos e as intensidades psicológicas das sensações resultantes. Surgia então o termo Psicofísica, utilizado pela primeira vez em 1860, pelo psicólogo experimental alemão Gustav Theodor Fechner, que ao lado de colegas como o médico alemão Ernst Heinrich Weber, o médico, psicólogo, filósofo e fisiologista alemão Wilhelm Wundt, e do médico e físico, também alemão, Hermann Helmholtz (que mais tarde faria importantes contribuições ao estudo da percepção visual) foi responsável por importantes descobertas comuns às subáreas Psicofísica e Psicofisiologia da Psicologia. Ainda na segunda metade do século XIX, tanto na Alemanha, quanto na Inglaterra e na França, o pensamento científico progredia cada vez mais. Porém, a tradição alemã da busca por uma ciência psicológica experimental, o firme estabelecimento da Fisiologia Experimental na região, e a aceitação dos métodos de investigação da Biologia propiciaram a criação da Psicofísica (Schultz e Schultz, 1998). - 14 - Os fundamentos que guiam o estudo da Percepção, subárea da Psicologia, se perpassam aos fundamentos da própria Psicofísica, que por sua vez são determinantes do delineamento experimental das pesquisas em Percepção. Sendo a dor objeto de estudo da percepção, procuramos estruturar este estudo sob as quatro tarefas perceptivas: detecção, discriminação, reconhecimento e formação de escalas, os principais temas da Psicofísica. (Simões e Tiedemann, 2006). A detecção diz respeito às alterações de energia do ambiente ou à presença de estímulos no ambiente, sejam olfativos, gustativos, visuais, auditivos ou, no caso da dor, os chamados estímulos nociceptivos, que são detectados no corpo humano pelos receptores nociceptivos ou nociceptores. (Bear, Connors e Paradiso, 2008). Já a discriminação, diz respeito à capacidade do indivíduo de discriminar entre dois ou mais estímulos, que no caso deste estudo, seria a discriminação entre a sensação térmica da mão no ambiente da sala de experimento a 25°C (estímulo padrão), a sensação que o indivíduo sente ao mergulhar a mão na água e a sensação que o indivíduo sente quando atinge seu limite e retira a mão da água (limiares de detecção). No presente estudo, utilizamos o Teste Pressor ao Frio (TPF) como método de estimulação nociceptiva experimental e a latência em segundos de retirada da mão da água caracterizando o que chamamos de nível de tolerância à dor, ou seja, o estímulo nociceptivo máximo que o indivíduo decide que pode suportar (Kalat, 2007). Quanto ao reconhecimento do estímulo, sabe-se que além de detectar um estímulo, é preciso reconhecer sua modalidade e intensidade antes da etapa de formação de escalas para dimensionar o mesmo. Neste estudo, os participantes foram estimulados apenas na modalidade nociceptiva de estímulos, unicamente na intensidade de três mais ou menos 1°C, o que é sabidamente mais fácil do que reconhecer estímulos de modalidades diferentes e intensidades diferentes (Gescheider, 1997). - 15 - Tabela 1 Estudos Utilizando o TPF Para a Indução de Dor em participantes depressivos Autores Ano Temperatura Circulação Parte do Corpo Imersões Abbott et al 1991 37° e 0-1°C sim antebraço dominante 2 Weisenberg et al 1998 1°C sim mão e braço 1 Gormsen et al 2001 0 + - 1°C não mão 1 Zachariae et al 2001 1 + - 0.2°C não mão não dominante 1 Edwards et al 2004 5°C sim mão direita 1 Frew e Drummond 2008 2º C não pé não dominante 1 Birklein et al 2008 1º C não mão dominante 1 Não houve a necessidade de formar escalas após a estimulação dolorosa, apenas de preencher escalas pré-existentes no Questionário de Dor de Mcgill. O Questionário para Dor McGill (QDM), desenvolvido por Melzack (1975) e reduzido pelo mesmo (1987), é o instrumento mais utilizado para se avaliar outras características da dor, além da intensidade. Fornece medidas quantitativas da dor que podem ser tratadas estatisticamente e acessam características sensoriais, afetivas e avaliativas do fenômeno doloroso. Pesquisadoresde vários países o validaram e o consideram um instrumento preciso (Baillie, 1993) a despeito das adaptações efetuadas no questionário por cada experimentador (Melzack, 1983). O QDM é um instrumento multidimensional que avalia a dor nas dimensões sensorial (Índice Sensorial de Estimativa da Dor); afetiva (Índice Afetivo de Estimativa da Dor) e avaliativa da dor (Avaliação Global da Experiência Dolorosa), cada uma destas dimensões tendo seu índice determinado pela soma dos valores que o participante atribui às palavras descritoras contidas em cada categoria. Além dos índices mencionados, o QDM utilizado incluiu uma Escala Visual Analógica, que consistiu de uma linha reta de 10 centímetros, não numerada, indicando-se em uma extremidade a - 16 - marcação de "Sem dor", e na outra, "A pior dor imaginável". A somas dos índices Sensorial e Afetivo do QDM resultou no Índice Total de Estimativa da Dor. Sem dor ______________________________________ A pior dor imaginável 10 cm Figura 1 – Escala visual analógica utilizada com o Questionário de McGill. Apesar de críticas ao uso do QDM para avaliação de dor clínica, entre elas o fato de Melzack ter utilizado uma amostra que não representava a população total e a natureza dos descritores verbais utilizados no questionário original (Towery e Fernadez, 1996), o QDM foi amplamente utilizado em contextos clínicos e de pesquisa em âmbito internacional, tendo sido traduzido e adaptado em mais de 15 idiomas (Da Silva e Ribeiro Filho, 2006). Embora as reações de dor sejam mecanismos de defesa indispensáveis para a sobrevivência da espécie humana, medi-la objetivamente por meio de critérios científicos permanece um grande desafio. Uma das razões é que a dor, além da dimensão sensorial, envolve um componente perceptual bastante subjetivo. Além disso, as reações à dor podem ser moduladas por outras variáveis motivacionais e afetivas. A administração de estímulos nociceptivos sob condições experimentais é prática comum em manipulações envolvendo indução de dor em seres humanos (Bushnell et al, 1992). A indução de dor experimental possui algumas vantagens em relação à dor clínica, entre as quais a de permitir um maior controle dos estímulos e das condições experimentais, combinado a um registro cuidadoso das respostas dos participantes (Ribeiro-Filho e Silva, 2006). No estudo dos transtornos mentais, o Teste Pressor ao Frio (TPF) tem sido sugerido - 17 - como uma forma de mimetizar os efeitos percebidos da dor, em razão da aversividade que provoca, e é tido como confiável e válido para testar manipulações analgésicas e outras formas de manejo da dor (Brodie et al, 2004). Citado na literatura científica internacional como Cold Pressor Test, Hand Cold Pressor ou Cold Pressor Task, vem sendo utilizado como método experimental de dor ou indução de estresse psicológico e fisiológico em diversas áreas (Cardiologia, Pediatria, Psicologia, Neurociências). A idéia subjacente ao TPF é que, não obstante a subjetividade do fenômeno doloroso, é possível fazer estimativas quantitativas e qualitativas da magnitude das experiências sensoriais dolorosas das pessoas, o que é conhecido como dor experimental, e que tem origens na Psicofísica. No TPF, o participante mergulha a mão ou parte do braço em um recipiente contendo água fria com temperatura entre 2°C a 10°C (Efran et al, 1989), mantida constante por isolamento ou refrigeração termostatizada, e de preferência, com água circulante. O tempo de permanência da mão na água é cronometrado, e pode ser equivalente ao nível de tolerância individual, ou ser pré-determinado pelo experimentador, respeitando-se sempre um teto limite baseado em estudos prévios, que garante que a água fria não causará lesões à pele dos participantes. Este teto limite variou, de acordo com a revisão realizada, entre zero e quatro minutos, e não era informado aos participantes, que podem ter liberdade para retirar a mão da água quando julgarem necessário, ou mais raramente depender do observador para fazê-lo. Há poucos estudos que utilizam o TPF como ferramenta de investigação de dor, em comparação à quantidade de estudos encontrados que utilizam o método para indução de estresse psicológico ou vascular, e talvez por isso não exista uma padronização rigorosa quanto ao equipamento utilizado. - 18 - Gormsen et al (2003), compararam os limiares de dor ao TPF em pacientes deprimidos antes e após tratamento com eletroconvulsoterapia, em relação a um grupo controle saudável. Este caso ilustra o uso deste método de dor experimental como instrumento de avaliação de desempenho de tratamentos psiquiátricos. Embora os limiares de dor tenham sido semelhantes nos pacientes com depressão antes e após a eletroconvulsoterapia, o grupo experimental apresentou limiares de dor mais baixos do que o grupo controle, corroborando achados anteriores de que a depressão aumenta a sensibilidade à dor. Foi atribuída à terapia de eletro choque a redução nos escores de depressão após sua aplicação. Willoughby et al (2002) provocaram humor deprimido em seus participantes e analisaram os limiares de dor após a indução, obtendo menores tempos de latência de dor e escores mais altos em escalas de auto-avaliação de dor para o grupo com humor depressivo induzido, em relação ao grupo com humor neutro. Similarmente, Edwards et al descobriram que o comportamento de catastrofização explicava as diferenças de sexo na dor aguda. Estes são exemplos da contribuição do TPF para a compreensão dos mecanismos por trás da relação entre estados de humor e percepção de dor, que abrem caminho para diversas propostas de estudo da relação dor-depressão. Mais recentemente, Frew e Drummond, da Faculdade de Psicologia da Murdoch University, na Austrália, realizaram um estudo para determinar se a liberação de opióides endógenos provocada por estresse reduz os limiares de dor para o TPF em pacientes com depressão maior. Encontraram evidências de que o estresse psicológico inibe a dor por meio da liberação de peptídeos opióides em casos severos de depressão maior, e de que a neurotransmissão opióide tônica endógena pode inibir sintomas de depressão e percepção de dor em pacientes com baixos escores de depressão (2008). Paradoxalmente, Birklein et al (2008) não encontraram relações entre depressão e - 19 - sensibilidade à dor ao frio no TPF, quando essas variáveis foram estudadas em famílias inteiras. Os resultados levaram os autores a observar as variáveis genéticas envolvidas na percepção de dor. O critério diagnóstico para Depressão Maior do DSM-IV-TR envolve a presença de cinco ou mais dos seguintes sintomas, durante o período de, pelo menos, duas semanas: humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias; interesse ou prazer acentuadamente diminuído por todas ou quase todas as atividades na maior parte do dia; perda ou ganho significativo de peso, quando não está realizando dieta, ou aumento no apetite; insônia ou hipersonia; agitação ou retardo psicomotor; fadiga ou perda de energia; sensação de inutilidade ou culpa excessiva ou inapropriada quase todos os dias; capacidade diminuída para pensar ou concentrar-se, dificuldade na resolução de problemas; pensamentos recorrentes sobre morte; ideação suicida recorrente ou tentativa de suicídio. (American Psychiatric Association, 2000). O DSM IV – TR não considera como TDM o humor deprimido causado por drogas lícitas ou ilícitas, pelas doenças sistêmicas, por outros distúrbios psiquiátricos ou por reações a eventos agudos (como a perda de um ente querido). Paralelamente a isso, muitas condições de saúde aumentam o risco da ocorrência de Transtorno Depressivo Maior, dificultando seu diagnóstico e tratamento. Para este estudo foram utilizados dois instrumentos para determinar quais participantesficariam nos grupos com e sem depressão: a entrevista Mini International Neuropsychiatric Interview (M.I.N.I.) e o Inventário de Depressão de Beck (IDB) ou Escala de Depressão de Beck. O MINI foi desenvolvido por pesquisadores do Hospital Pitié-Salpêtrière de Paris e da Universidade da Flórida, e validado para uso no Brasil em 2000 (Amorim, 2000). É uma entrevista diagnóstica padronizada breve (15-30 minutos), compatível com os critérios - 20 - do DSM-III-R/IV e da CID-10, que é destinada à utilização na prática clínica e em pesquisa e pode ser utilizada por clínicos após um treinamento de uma a três horas. Trata-se de um questionário diagnóstico mais simples e breve que aqueles tipicamente destinados à pesquisa, e mais abrangente que os instrumentos de triagem, já que verifica a co-morbidade com os outros transtornos de humor e determina qual o transtorno dominante. É uma alternativa mais econômica para a seleção de pacientes em ensaios clínicos e pode ser utilizado na prática clínica em psiquiatria. Quanto ao módulo para estados depressivos, as possibilidades de categorização são: (1) Sem Depressão; (2) Depressão Maior Atual; (3) Depressão Maior Recorrente; (4) Depressão Maior Atual e Recorrente e (5) Transtorno Distímico. O Inventário de Depressão de Beck (IDB) ou Escala de Depressão de Beck é um dos questionários de auto-relato mais utilizados em contextos clínicos e experimentais para medir a severidade de episódios depressivos. Em sua versão atual (Beck, Steer, Ball e Ranieri, 1996), apresentada em resposta às mudanças nas classificações dos transtornos depressivos pelo DSMIV, o IDB foi elaborado para pacientes acima de 13 anos de idade, apresentando diversos descritores relacionados a sintomas emocionais como desesperança e irritabilidade, além de descritores relacionados a sintomas cognitivos, como culpa ou crenças de punição, além de sintomas físicos como fadiga, perda de peso e diminuição da libido. Existem três versões da escala: o IDB-I publicado em 1961 e revisado em 1978 (Beck, Ward, Mendelson, Mock, e Erbaugh); a BDI-1A; e a BDI-II, publicada em 1996. A escala é largamente utilizada por clínicos e pesquisadores em uma variedade de contextos. O IDB marcou o início de uma visão da depressão baseada nos processos cognitivos do paciente, ao invés de abordagens freudianas e psicodinâmicas (McGraw Hill Publishing Company, 2009), além de abordar a depressão bifatorialmente, se utilizando de descritores afetivos e somáticos. Os escores - 21 - do IDB são agrupados de modo a gerar as seguintes categorias: 0–9, sem depressão; 10– 18, depressão leve a moderada; 19–29 depressão moderada a severa e 30–63, depressão severa. O presente estudo teve por objetivo padronizar método e instrumentos seguros e confiáveis para a avaliação da percepção de dor em mulheres com e sem depressão, bem como verificar se existe diferença na percepção de dor entre estes dois grupos. Para classificar as participantes nestas duas categorias, utilizamos um critério que incluiu escores do IDB e da MINI. Além das limitações causadas pelo auto-relato (Bowling, 2005), o peso dos sintomas somáticos do IDB pode ser inflacionado devido a comorbidades associadas, por isso optamos por utilizar também o M.I.N.I. neste estudo. - 22 - Estudo 01 – Padronização de um método experimental de estimulação térmica nociceptiva e comparação entre nível de tolerância à dor e estimativa de dor em 16 indivíduos saudáveis Método Participantes Participaram voluntariamente do Estudo 12 mulheres e quatro homens com idades entre 22 e 46 anos, com média de idade de 28,06 anos (DP = 6,09). A amostra foi constituída de alunos e funcionários da Universidade de Brasília, de acordo com os seguintes critérios: (1) ter idade superior a 18 anos; (2) não ser tabagista; (3) não ser portador de doenças crônicas previamente diagnosticadas, que pudessem causar modificações no funcionamento da irrigação ou da condução nervosa, necessárias para o funcionamento fisiológico da nocicepção, ou ainda comprometer a capacidade do indivíduo de fazer estimativas da dor experimentada (Kasch, Qerama, Bach e Jensen, 2005); (4) não fazer uso crônico de medicações que pudessem afetar a nocicepção ou a capacidade de fazer uma estimativa da dor, incluindo drogas com propriedades antidepressivas, sedativas, analgésicas e antiinflamatórias (Jochum, Letzsch, Greiner , Wagner, Sauer e Bar, 2005; Pud, Cohen, Lawental e Eisenberg, 2005); (5) no caso de participantes do sexo feminino, não estar no período pré-menstrual ou menstrual (Kowalczyk, Evans, Bisaga, Sullivan, e Comer, 2006); (6) não apresentar lesões de qualquer natureza no braço a ser utilizado na coleta de dados; (7) não ter feito uso de nenhuma das seguintes substâncias nas 48 horas que antecederam a coleta de dados: álcool, analgésicos, anestésicos, - 23 - antiinflamatórios ou drogas psicoativas; e (8) ser capaz de compreender as instruções e o termo de consentimento livre e esclarecido, bem como estar disposto a participar do estudo sem receber qualquer forma de gratificação. Materiais e Método Para a indução de dor aguda utilizou-se o Teste Pressor ao Frio (TPF) (Sant’Anna, 2006), adaptado por nosso laboratório para esta situação experimental e consistindo do mergulho da mão do participante em um banho termostatizado (Banho Ultratermostato Criostato, Nova Ética) com sistema de resfriamento capaz de manter um determinado volume de água a uma temperatura desejada. Conforme ilustrado na Figura 1, o participante sentava-se em uma cadeira, com altura regulável e posicionada lateralmente ao banho termostatizado. Era feita uma marca na delimitação proximal do terço distal do braço do paciente, sendo que as expressões de Anatomia distal e proximal se referem à posição de parte de um membro em seu local de inserção no tronco, no caso, a articulação do ombro. A medida em centímetros, auferida com fita métrica, do ombro direito à ponta do dedo médio direito do participante foi dividida em três terços, e o terço que ia da ponta do dedo médio do participante até a altura aproximada do centro de seu antebraço foi considerada como o terço distal do braço do participante, e delimitada a caneta. O participante, então, era orientado a mergulhar a mão direita até a altura da marca feita à caneta pela pesquisadora na cuba de água mantida em uma temperatura de três mais ou menos 1°C (Murray e Hagan, 1973; Murray and Safferstone, 1970) e retirá-la voluntariamente a qualquer momento que desejasse em função da sensação de desconforto térmico gerada pela baixa temperatura, por um período máximo de 3 - 24 - minutos. Este tempo foi determinado de acordo com temperaturas utilizadas com segurança em vários estudos prévios com o TPF. (Mitchell, MacDonald e Brodie, 2004). A Latência de retirada era registrada por intermédio de um cronômetro digital (Timex TI5G811). Figura 2– Participante com a mão mergulhada na cuba do equipamento de banho termostatizado utilizado durante o Teste Pressor ao frio, modelo de indução experimental de dor. Um termômetro laboratorial de mercúrio, sensível a temperaturas positivas e negativas em °C foi utilizado para certificar que o termômetro do equipamento de banho termostatizado estava devidamente calibrado, além de servir para controlar a temperatura da sala utilizada para o teste, que foi de 25 mais ou menos 1°C durante todo o período de coleta de dados. Para auferir a Latência de retirada da mão dos participantes da água, foi utilizado um cronômetro da marca Timex (modelo TI5G811). Toalhas de papel descartáveis foram - 25 - utilizadas pelos participantes para que pudessem enxugar levemente a mão que foi mergulhada na água durante o TPF, já que imediatamente após o teste os mesmos deveriam preencher o Questionário de Dor de McGill (QDM). Uma cópia da versão resumidado QDM, traduzido para uso no Brasil por Pimenta e Teixeira (1996), foi utilizada logo após o TPF. Cada participante utilizou uma prancheta e de uma caneta hidrosférica, fornecidas pela pesquisadora, para preencher o questionário. Cada participante foi atendido individualmente e todas as coletas foram agendadas com intervalo de tempo suficiente para evitar que trocassem informações sobre o experimento. Cada sessão de coleta durou entre 15 e 30 minutos, durante os quais todos os procedimentos que requereram a presença dos mesmos foram realizados, eliminando a necessidade de retorno dos participantes. Este fator foi decisivo para que os alunos e funcionários abordados pela pesquisadora aceitassem participar voluntariamente do estudo. Após a chegada do participante à sala de coleta do Laboratório de Psicobiologia da UnB, a pesquisadora agradecia a vinda voluntária do mesmo e verificava se havia necessidade do participante de ir ao banheiro ou de tomar um copo de água, antes do início das instruções. Em seguida, a pesquisadora solicitava ao participante que, se possível, o mesmo desligasse seu telefone celular. Nenhum dos 16 participantes se opôs a proceder desta maneira. Feito isso, o participante recebia as instruções sobre a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e, uma vez que este tivesse sido assinado, a pesquisadora prosseguia com a anamnese embutida no documento impresso que continha a versão resumida do Questionário de Dor de McGill (QDM), a ser utilizado após a indução nociceptiva. Em seguida, o participante recebia as instruções sobre o Teste Pressor ao Frio (TPF) e o QDM a serem aplicados. O participante era orientado a - 26 - mergulhar a mão direita na água até que uma marca feita à caneta previamente pela pesquisadora, para demarcar o início do terço distal do braço direito do participante, ficasse submersa. O participante era informado de que a água estaria fria, mas que o teste era seguro e não ameaçaria sua integridade física. Em seguida, era instruído de que poderia retirar a mão da água a qualquer momento desejado, em função do desconforto térmico experimentado, estabelecendo-se, sem o conhecimento do participante, 3 minutos como Latência máxima de retirada. Se o participante não retirasse a mão após 3 minutos de sua colocação, a sessão era interrompida pelo experimentador. Após a retirada da mão do participante da água, o mesmo recebia uma toalha de papel para secar levemente a mão e era instruído a preencher o QDM, no qual foram atribuídos valores de zero a três (0 = nenhum; 1 = branda; 2 = moderada; 3 = severa) a um total de 16 descritores de dor. Destas, 12 foram classificadas como descritores sensoriais e quatro como descritores afetivos da experiência dolorosa, e a soma dos valores a estes atribuídos era registrada na forma dos índices de estimativa sensorial, afetiva, total (sensorial+afetiva) de dor. Ainda durante o procedimento, os participantes foram instruídos a fazer uma marca em uma escala analógica visual de 10 cm, com valor inicial correspondente ao descritor “Sem dor” (zero cm) e valor final correspondente à descrição “A pior dor imaginável” (10 cm), além de uma “Avaliação Global da Experiência de Dor” na qual atribuíram valores crescentes de zero a cinco aos seguintes descritores de dor, respectivamente: “Nenhuma dor”, “Branda”, “Desconfortável”, “Aflitiva”, “Horrível” e “Martirizante” (Melzack, 1975 e 1987). Em seguida, terminados todos os procedimentos da coleta propriamente dita, o participante era informado sobre maiores detalhes do estudo e também sobre as formas de devolutiva, e, então, dispensado. - 27 - Os dados do Estudo 01 foram analisados estatisticamente com a ajuda dos softwares BioStat 2009 Professional (AnalystSoft) e Statistics 17.0 (SPSS Inc.), tendo sido realizado o teste de Correlação de Pearson para verificar a existência de correlações entre a Latência de retirada da mão e os índices sensoriais, afetivos e globais do Questionário de Dor de McGill (QDM). Resultados Tabela 2 Escores dos Grupos Controle (C) e Experimental (E) por Critério de Agrupamento Beck e MINI Beck MINI Atual MINI DM Recorrente C E C E C E C E Latência 55,8 43,3 32,9 36,6 36,5 28,4 36,5 41,3 IED Sensorial 11,1 9,3 11,7 9,5 11,6 11,8 10,9 6,0 IED Afetivo 2,6 3,5 2,4 4,6 2,1 5,8 2,3 1,5 IED Total 12,6 12,9 12,4 7,1 12,8 16,8 12,8 7,5 AGIED 2,8 2,6 2,6 2,8 2,8 2,8 2,8 2,3 Escala VAS 3,6 4,0 3,7 4,2 3,8 4,7 3,8 3,9 O nível de tolerância média dos participantes ao estímulo frio, estimada através da Latência de retirada da mão no Teste Pressor ao Frio (TPF) em segundos, foi de 31,13 segundos (DP=14,63) e negativamente correlacionada (r = -0,516) à Avaliação Global da Intensidade da Experiência Dolorosa feita pelos participantes durante a aplicação do Questionário de Dor de McGill (QDM). O teste de Correlação de Pearson mostrou que não houve correlação estatisticamente significante entre a idade dos participantes e o tempo que os mesmos levaram para retirar a mão da água (p= 0,1054). Já o IED Sensorial médio no Estudo 01 foi de 10,31 (DP=4,71), e negativamente correlacionado - 28 - (r = - 0,4973) à idade dos participantes (Von Baeyer, Piira, Chambers, Trapanotto e Zeltzer, 2005). O fato de termos encontrado uma correlação estatisticamente relevante entre idade e estimativa sensorial da dor ao frio, e não entre a latência de retirada da mão e a idade corrobora o estudo de Spanos, Hodgins, Henderikus e Maxwell (1984), que revelou efeitos de variáveis sociais implícitas em situações experimentais afetando limiares e nível de tolerância à dor. Não houve correlação estatisticamente significante entre este o IED Sensorial do QDM e a Latência de retirada da mão (p=0,0313), o que pode ter ocorrido por conta da modalidade sensorial escolhida para o teste de dor (Bär, Brehm, Boettger, Boettger, Wagner e Sauer, 2005). O IED Afetivo médio dos participantes foi de 2,19 (DP=1,80) e apresentou-se negativamente correlacionado à idade dos participantes (r = - 0,5187). Contudo, não se apresentou significantemente correlacionado à Latência (p=-0,3459). A média dos valores de IED Total (Sensorial+Afetivo) foi de 11,56 (DP=6,28) e embora este índice tenha se apresentado negativamente correlacionado à Latência (p=-0,3244) e à idade dos participantes (p=-0,4416), estas correlações não foram estatisticamente significantes. A única medida do Questionário de Dor de McGill que foi significantemente correlacionada negativamente à Latência (p=-0,516) foi a Avaliação Global da Experiência Dolorosa (M= 2,44 e DP=1,31). Esta medida também se apresentou negativamente correlacionada à idade dos participantes no estudo 01 (p=-0,195), mas esta correlação foi fraca demais para que a Hο fosse rejeitada. A média dos escores em centímetros da Escala Analógica Visual variando de zero (0 = Nenhuma dor) a 10 cm (10 = A pior dor imaginável) foi de 3,96 (DP = 2,31), e nenhuma correlação estatisticamente significante foi encontrada entre esta escala e as outras medidas de dor. - 29 - Após um teste de normalidade, foram comparadas através de um teste t de Student as médias dos escores obtidos para cada variável, pelos participantes do sexo masculino (n=4), com aquelas obtidas pelas participantes do sexo feminino (n=12), como pode ser visto na Figura 2. As diferenças foram significantemente maiores (p=0,028) entre as mulheres para os escores de IED Sensorial (M=11,92 versus M=5,50) e IED Total (p=0,027; M=13,25 versus M=6,50). Contudo, estas diferenças não foram significantes para os escores de Latência (p=0,745), IED Afetivo (p=0,076), AGIED (p=0,342) ou da Escala Visual Analógica (p=0,672), corroborando os achados de Kowalczyk, Evans, Bisaga, Sullivan, e Comer (2006). - 30 - Figura 3 – Comparaçãoentre as médias dos escores dos homens (N = 4) e mulheres (N = 12) participantes do Estudo 01, resultante do teste t de Student. As diferenças foram significantemente maiores (p=0,028) entre as mulheres para os escores de IED Sensorial (M=11,92 versus M=5,50) e IED Total (p=0,027; M=13,25 versus M=6,50). Apesar disso, as mulheres permaneceram mais tempo com a mão na água. 0 5 10 15 20 25 30 35 40 Latencia IED Sensorial IED Afetivo IED Total AGIED VAS M éd ia s d o s es co re s - E st u d o 0 1 Homens Mulheres 0,00 2,00 4,00 6,00 8,00 10,00 12,00 14,00 Homens MulheresÍn d ic e S en so ri al d e E st im at iv a d e D o r 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 Homens Mulheres Ín d ic e A fe ti vo d e E st im at iv a d e D o r - 31 - Discussão A correlação negativa entre a variável Idade e os índices Sensorial e Afetivo de intensidade da experiência dolorosa, obtidos através do Questionário de Dor de McGill, corrobora o bem estabelecido conceito de envelhecimento sensorial. Tal conceito está embasado em diversas investigações em humanos e animais que puderam atribuir o declínio das capacidades de percepção e modulação da dor ao processo de envelhecimento. Tal declínio se deve não somente ao envelhecimento das estruturas receptoras de estímulos sensoriais, como também ao envelhecimento de estruturas centrais de processamento desta modalidade de informação ambiental (Gagliese e Melzack, 2000; Washington, Gibson e Helme, 2000; Edwards, Fillingim e Ness, 2003; Cole, Farrell, Gibson e Egan 2008). Estudos futuros no Brasil, utilizando o Teste Pressor ao Frio como método experimental de estimulação nociceptiva, valendo-se de medidas fisiológicas mais precisas de dor – como, por exemplo, aquelas obtidas através do uso de equipamentos capazes de auferir disparos neuronais nos nociceptores da pele – poderiam gerar dados importantes sobre a percepção aguda de dor que mais tarde poderiam ser correlacionados aos tantos achados sobre dor crônica já existentes na literatura internacional (Jensen, Turner, Romano e Karoly, 1991; Mendelson, 1986; Hinrichs-Rocker, Schulz, Järvinen, Lefering, Simanski e Neugebauer, 2009; Thomsen, Sørensen, Sjøgren e Eriksen, 2001). A correlação negativa entre a Latência de retirada da mão na água e a Avaliação Global da Intensidade da Experiência Dolorosa, acessada através do Questionário de Dor de MGill indica que, de fato, quanto mais tempo o participante passa com a mão na água (em experimentos aonde o mesmo é livre para retirar a mão no momento em que julgar - 32 - que já suportou o máximo de dor que poderia suportar), menor será a atribuição negativa que ele dará à experiência (Hirsch e Liebert, 1998). Com base em achados provenientes de trabalhos investigando várias modalidades de dor, o Questionário de Dor de McGill tornou-se uma escala de mensuração de dor consagrada no mundo, em uso no Brasil desde os anos 90 do século XX (Pimenta e Teixeira, 1996), tendo sido previamente utilizada tanto para mensurar dor crônica e dor aguda. Estudos futuros no Brasil, investigando a relação intra-sujeito entre percepção de dor aguda e crônica, poderiam se valer deste instrumento. Pacientes de serviços de saúde brasileiros que procuraram ajuda devido a problemas de dor crônica poderiam ser comparados a controles saudáveis em testes de percepção de estímulos experimentais de dor. Durante as instruções sobre a escala VAS, muitas participantes do sexo feminino, ao lerem a expressão ”a pior dor imaginável”, associaram-na com “a dor do parto”. Todas a as participantes que fizeram este comentário haviam tido filhos. Estudos futuros poderiam comparar a percepção de dor entre mulheres com e sem filhos e mulheres que passaram pelo procedimento de parto através de cesariana versus aquelas que pariram seus filhos por parto normal. Por fim, a diferença encontrada entre os índices de estimativa Sensorial e Total (sensorial+afetivo) da dor entre os sexos, que foi significantemente maior para as mulheres, ainda que estas tenham demonstrado uma tendência a permanecer mais tempo com a mão na água gelada, pode ser explicada por diversas variáveis não biológicas encontradas em estudos anteriores (DeWall e Baumeister, 2006; Bachiocco, Morselli e Carli, 1993; Sanford, Kersh, Thorn, Rich e Ward, 2002; Klatzkin, Mechlin, Bunevicius e Girdler, 2007). Entre estas, podemos citar: normas sociais de comportamento perante a dor (Pool, Schwegler, Theodore e Fuchs, 2007; Wolf, 1971 e 1986), sexo do - 33 - experimentador (Levine e De Simone, 1991) e gênero (Robinson, Gagnon, Riley e Price, 2003). - 34 - Estudo 02 – Nível de tolerância à dor e estimativa de dor na depressão maior: comparação entre mulheres com depressão maior e grupo controle Método Participantes No total, 14 mulheres com Depressão participaram do grupo experimental (GE) do estudo. Um grupo controle (GC) de 16 mulheres saudáveis de idades comparáveis às daquelas do GE, constituiu a segunda amostra. A idade média das 30 participantes foi de 33,60 (DP = 11) Todas as 30 participantes do estudo moravam no Distrito Federal. Com exceção da medicação antidepressiva, que foi permitida neste estudo, e dos critérios utilizados para considerar uma participante como estando ou não com Depressão, os critérios de exclusão do Estudo 02 foram os mesmo utilizados no Estudo 01. Foram contatados 29 mulheres e três homens inscritos no Centro de Atendimento e Estudos Psicológicos (CAEP) da Universidade de Brasília através de telefonemas efetuados pela pesquisadora, em sala própria para o procedimento, situada no CAEP (sala 08). Nenhum dos homens aceitou participar do experimento e, das 22 mulheres que aceitaram comparecer ao Laboratório de Psicologia para participar voluntariamente do mesmo, apenas 17 mulheres estavam livres dos critérios de exclusão. Os dados de uma das 17 participantes não foram incluídos no estudo, já que ao final do experimento a paciente revelou estar no período menstrual, ainda que durante a fase de contato telefônico a pesquisadora tenha deixado claro que este seria um fator de exclusão. Os dados de uma das 17 participantes não foram incluídos no estudo, já que ao final do - 35 - experimento a paciente revelou estar no período menstrual, ainda que durante a fase de contato telefônico a pesquisadora tenha deixado claro que este seria um fator de exclusão. As 16 mulheres restantes foram submetidas a um protocolo de aplicação de dois instrumentos psicométricos para avaliar a intensidade de sintomas depressivos: o Inventário de Depressão de Beck (IDB) e a entrevista Mini International Neuropsychiatric Interview (M.I.N.I.). Destas, foram consideradas com Depressão aquelas mulheres que atingiram 13 ou mais pontos no IDB e obtiveram escores que resultassem em Depressão Maior Atual ou Depressão Maior Atual e Recorrente na M.I.N.I. (N=14). Dois psicólogos clínicos participaram desta etapa do estudo. Materiais e Métodos Até a etapa de preenchimento do Questionário de Dor de McGill, os equipamentos e testes do Estudo 02 foram idênticos aos do Estudo 01 para os dois grupos. Após o preenchimento do QDM, porém, ambos os grupos do Estudo 02 responderam a dois instrumentos psicométricos: o já consagrado Inventário de Depressão de Beck (IDB) (Beck, 1982; Gorenstein e Andrade, 1998) e o Mini International Neuropsychiatric Interview (Amorim, 2000), um instrumento baseado no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 4º Ed. texto revisado (APA, 2000) que acessa não apenas dados relacionados à Depressão Maior, da forma como conceituada pelo DSMIV-TR, como verifica se outras co-morbidades psiquiátricas que possam interferir no estudo estão presentes. Tanto o IDB quanto o M.I.N.I. classificam os indivíduos e mais de um nível de depressão, sendo que para este estudo a classificaçãodos escores foi feita da seguinte maneira: - 36 - • Primeiramente, analisamos os dados dividindo os participantes em dois grupos que foram comparados: grupo experimental, ou grupo 01, de pacientes com escore para Depressão Maior Atual ou Depressão Maior Atual e Recorrente no M.I.N.I. e escore maior ou igual a 13 no Beck (N = 14); versus grupo 02 ou controle, de escore menor do que 13 no IDB e escores que não acarretassem em Depressão Maior Atual ou Depressão Maior Atual e Recorrente no M.I.N.I. (N = 16); • Depois, analisamos os dados considerando como parte do grupo experimental os indivíduos com escores maiores ou iguais a 21 no IDB (N = 20) e como grupo controle os indivíduos com escores menores do que 21 no mesmo inventário (N = 10); • Por último, analisamos os dados considerando como grupo experimental ou com depressão, aquele formado pelos indivíduos com escores para Depressão Maior Atual (N = 6) ou Depressão Maior Recorrente ( N = 6) no M.I.N.I. e como grupo controle aqueles com escores para Sem Depressão ( N = 14) na mesma entrevista. Os escores para os demais diagnósticos, como, por exemplo, para Transtorno Distímico, foram excluídos desta classificação. Os participantes de ambos os estudos foram abordados e contatados pessoalmente pela pesquisadora no Campus Universitário Darcy Ribeiro da UnB ou através de ligações telefônicas efetuadas do Instituto de Psicologia da UnB, e sua participação voluntária foi devidamente regulamentada pela leitura e assinatura do Termo de Consentimento Esclarecido (TCE) do modo como consta no processo de aprovação deste projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Saúde da UnB, registro N°052/2008, CAAE 0054.0.012.000-08, em 25 de junho de 2008 e na Folha de Rosto - 37 - Para Pesquisa Envolvendo Seres Humanos de N°19293 da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Todos os participantes receberam devolutiva na seguinte ordem de prioridade de meio de comunicação: (1) por e-mail, quando possível; (2) pelo correio, no endereço fornecido no TCE; (3) pessoalmente, no Campus da UNB; (4) por telefone, no número fornecido no TCE. Além dos procedimentos descritos no Estudo 01, ambas as amostras do Estudo 02 foram submetidas a procedimentos que requereram a presença de um psicólogo associado ao Laboratório de Psicobiologia ou membro dos corpos discente ou docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Comportamento. Primeiro, ao término do QDM, as participantes preenchiam o IDB, que havia sido lido por elas mesmas, ainda que alguma dúvida fosse esclarecida. As próprias participantes liam e marcavam com um X a resposta que lhes parecia correta no Inventário. Feito isso, o psicólogo procedia à entrevista M.I.N.I. A razão de termos optado por aplicar os instrumentos psicométricos no mesmo dia da aplicação do TPF, foi que nas primeiras abordagens para conseguir voluntários para ambos os grupos, muitas pessoas afirmaram que caso tivessem de comparecer mais de uma vez, em dias diferentes, ao Laboratório de Psicobiologia, não participariam do estudo. O TPF foi aplicado antes dos questionários psicométricos IDB e M.I.N.I., já que o preenchimento dos mesmos poderia causar mudanças de humor em alguns indivíduos, o que por sua vez poderia provocar alterações indesejadas na percepção de dor dos mesmos (Weisenberg, Raz e Hener, 1998). Após a aplicação de todos os testes, o participante era dispensado e a pesquisadora registrava os escores nos questionários dos mesmos. - 38 - Após a realização do teste de normalidade e do teste de Levene para igualdade de variâncias, foi realizado um teste t de Student (nível de significância = 0,05 e bicaudal) para comparar as médias dos escores do grupo controle com aquelas do grupo experimental em cada uma das seis medidas de dor analisadas. Foram elas: (a) Latência de retirada da mão, (b) IED Sensorial; (c) IED Afetivo; (d) IED Total (Sensorial+Afetivo), (e) Avaliação Global da Intensidade da Experiência Dolorosa (AGIED) e (f) Escala Visual Analógica. Com exceção da Latência, todas as outras medidas fazem parte do Questionário de Dor de McGill. Para garantir que a medicação antidepressiva de alguns dos indivíduos de ambos os grupos não era o que estava causando esta ausência de diferenças significantes entre suas médias, os dados foram analisados também levando em consideração apenas os indivíduos que não estavam tomando medicação antidepressiva. Além disso, foram feitas as seguintes comparações: (i) Grupo A (escores de 0 a 20 no IDB) versus Grupo B (escores ≥ 21 no IDB); (ii) Grupo Sem Depressão (M.I.N.I.) versus Grupo Depressão Maior Atual (M.I.N.I.) e (iii) Grupo Sem Depressão (M.I.N.I.) versus Grupo Depressão Maior Atual e Recorrente (M.I.N.I.). Resultados Grupo Controle versus Grupo Experimental Como demonstrado na Figura 3, a média das Latências de retirada da mão da água no grupo controle foi de 55,78 (DP = 53,44), enquanto a do grupo com Depressão foi de 43,25 (DP = 41,13). Esta diferença entre as médias dos dois grupos não foi estatisticamente significante (p = 0,474; t = -0,725). - 39 - Houve uma tendência dos indivíduos do grupo controle 11,07 (DP = 4,14) a atribuir valores maiores aos descritores do IED Sensorial do QDM em relação àqueles do grupo com Depressão 9,31 (DP = 4,50). Entretanto, a diferença não foi estatisticamente significante (p = 0,277; t = -1,109). Para o IED Afetivo, houve uma inversão nas tendências das médias, sendo que o grupo experimental atribuiu valores maiores (M=3,56; DP = 2,78) aos descritores afetivos de dor do QDM do que o grupo controle (M=2,64; DP = 2,21). Esta diferença, porém, também não foi estatisticamente significante (p = 0,329; t = 0,993) de acordo com o teste t. A média dos escores do IED Total no grupo controle foi de 12,64 (DP = 6,06), enquanto a do grupo com Depressão foi de 12,88 (DP = 6,45). Esta diferença se confirmou irrelevante estatisticamente após a aplicação do teste t (p = 0,6929). A média dos escores do AGIED no grupo controle foi de 2,79 (DP = 0,39), enquanto a do grupo com Depressão Maior foi de 2,56 (DP = 0,18). Esta diferença entre as médias dos dois grupos não foi estatisticamente significante (p = 0,920; t = 0,101). A média dos escores da Escala Analógica Visual no grupo controle foi de 3,61 (DP = 2,18), enquanto a do grupo experimental foi de 3,97 (DP = 1,88). Esta diferença entre as médias dos dois grupos não foi estatisticamente significante (p = 0,630; t = 0,487) de acordo com o teste paramétrico t de Student. Para a Avaliação Global da Intensidade da Experiência Dolorosa (AGIED), o teste de Levene (F = 6,176; p = 0,019) revelou não ser possível à assunção de uma variância igual para os dois grupos. Assumindo-se uma variância não igual, não foi encontrada uma diferença estatisticamente significante entre a média dos escores de AGIED no grupo controle (M = 2,79; DP = 1,477) e no grupo com Depressão (M = 2,56; DP = 0,727). - 40 - 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 Controle Depressão Controle SEM MED Depressão SEM MED L at ên ci a d e R et ir ad a d a M ão ( s) 0 2 4 6 8 10 12 14 Controle Depressão Controle SEM MED Depressão SEM MED Ín d ic e S en so ri al d a E st im at iv a d e D o r 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5 5 Controle Depressão Controle SEM MED Depressão SEM MED Ín d ic e A fe ti vo d e E st im at iv a d e D o r 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 Controle Depressão Controle SEM MED Depressão SEM MED Ín d ic e T o ta l d e E st im at iv a d e D o r (S + A ) Figura 4 – Comparação entre as médias dos escores de Latência, IED Sensorial, IED Afetivo e IED Total dos grupos controle e experimental com e sem a inclusão dos indivíduos tomando antidepressivos no Estudo 02. As diferençasentre as médias não foram estatisticamente significantes. - 41 - 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 Controle Depressão Controle SEM MED Depressão SEM MED A va lia çã o G lo b al d a E xp er iê n ci a D o lo ro sa 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5 5 Controle Depressão Controle SEM MED Depressão SEM MED E sc al a V is u al A n al ó g ic a (c m ) Figura 5 – comparação das médias dos escores da Avaliação Global da Intensidade da Experiência Dolorosa (AGIED) e da Escala Analógica Visual (VAS) entre os grupos experimental e controle, com e sem medicação, do Estudo 2. As diferenças entre as médias não foram estatisticamente significantes. - 42 - Grupo Controle livre de medicação antidepressiva versus Grupo Experimental livre de medicação antidepressiva Também é possível observar na Figura 3, que a média das Latências de retirada da mão da água no grupo controle sem medicação foi de 57,81 (DP = 57,66), enquanto a do grupo com Depressão Maior sem medicação foi de 47,50 (DP = 50,50). Esta diferença entre as médias dos dois grupos não foi estatisticamente significante (p = 0,669; t = - 0,434) de acordo com o teste t de Student (nível de significância 0,05 e bicaudal). A média dos escores do IEDS no grupo controle nessa condição foi de 10,82 (DP = 4,67), enquanto a do grupo experimental foi de 9,90 (DP = 4,86). Esta diferença entre as médias dos dois grupos não foi estatisticamente significante (p = 0,664 e t = - 0,441). A média dos escores do IED Afetivo no grupo controle sem medicação foi de 2,82 (DP = 2,44), enquanto a do grupo experimental foi de 3,5 (DP = 3,17). Esta diferença entre as médias dos dois grupos não foi estatisticamente significante (p = 0,585; t = 0,555) no teste t. A média dos escores do IED Total no grupo controle sem medicação foi de 12,27 (DP = 6,81), enquanto a do grupo com Depressão Maior foi de 13,40 (DP = 6,83). Esta diferença entre as médias dos dois grupos não foi estatisticamente significante (p = 0,710 e t = 0,378). A média dos escores do AGIED no grupo controle foi de 2,82 (DP = 0,5), enquanto a do grupo com Depressão Maior foi de 2,70 (DP = 0,26). Esta diferença entre as médias dos dois grupos não foi estatisticamente significante (p = 0,837; t = - 0,209). A média dos escores da Escala Analógica Visual no grupo controle foi de 3,53 (DP = 2,44), enquanto a do grupo experimental foi de 4,04 (DP = 2,27). Esta diferença entre as médias dos dois grupos não foi estatisticamente significante (p = 0,623; t = 0,499). - 43 - Grupo Controle versus Grupo Experimental Determinados pelos escores do IDB Quando consideramos como livres de depressão, os participantes com escores entre zero e 20 (n = 20) para o Inventário de Depressão de Beck, e com depressão, aqueles participantes com escores ≥ 21 (n = 10), encontramos diferenças estatisticamente significantes (Figura 5) entre estes dois grupos para a variável IED Afetivo do QDM (p = 0,022 e t = 2,428): o grupo com depressão apresentou uma média quase 100% maior (M=4,60, DP = 2,914) do que a média dos escores de IED Afetivo no grupo sem depressão (M=2,40 e DP = 2,010). 0 1 2 3 4 5 6 Controle (IDB) Depressão (IDB) Ín d ic e A fe ti vo d a E st im at iv a d e D o r Figura 6 – média dos escores de IED Afetivo, significantemente diferentes (p = 0,022 e t = 2,428) entre os participantes saudáveis (n = 20) e aqueles com depressão (n = 10), quando assim classificados apenas através do IDB. Grupo Controle versus Grupo Experimental Determinados pelos escores do M.I.N.I. Quando dividimos as amostras utilizando somente os escores do M.I.N.I. (sem levar em consideração aqueles do IDB), ou seja, quando comparamos as médias dos escores de um grupo controle formado por aqueles indivíduos considerados sem depressão de acordo com o M.I.N.I. (n = 14), com as médias dos escores do grupo formado pelos - 44 - indivíduos com escores do M.I.N.I. para Depressão Maior Atual (n = 6) ou com as médias dos escores do grupo com Depressão Maior Atual e Recorrente (n = 6); também foram encontradas diferenças estatisticamente significantes entre os participantes com e sem depressão. Entre o grupo formado pelos indivíduos sem depressão (N=14) de acordo com este instrumento e o grupo com escores para Depressão Maior Atual (N = 6), a diferença se deu entre os índices IED Afetivo (p = 0,001 e t = -3,820) e IED Total (p = 0,041 e t = -2,197) do Questionário de Dor de McGill. Para o IED Afetivo, enquanto a média dos escores dos indivíduos sem depressão foi de 2,14(DP = 1,610), a do grupo com Depressão Maior Atual foi mais do que 100% maior, 5,83 (DP = 2,714). Para o IED Total, a média dos escores dos indivíduos sem depressão foi de 11,93 (DP = 5,967) contra 18,17 (DP = 5,419) dos indivíduos com Depressão Maior Atual. Já na comparação entre o grupo formado pelos indivíduos sem depressão ( N = 14) e o grupo com escores para Depressão Maior Atual e Recorrente ( coincidentemente à Depressão Maior Atual, N = 6), foi no índice sensorial do QDM que a diferença estatisticamente significante (p = 0,021; t = 2,534) apareceu, porém de maneira inversa. O grupo sem depressão apresentou uma média de escores quase 100% maior (M = 10,86; DP = 4,276) do que aquela apresentada pelo grupo com Depressão Maior Atual e Recorrente (M = 6,00; DP = 2,828). - 45 - 0 1 2 3 4 5 6 7 8 Controle (MINI) Depressão (MINI) Ín d ic e A fe ti vo d e E st im at iv a d e D o r 0 5 10 15 20 25 Controle (M.I.N.I.) Depressão (M.I.N.I.) Ín d ic e T o ta l d a E st im at iv a d e D o r (S + A ) 0 2 4 6 8 10 12 14 Controle (MINI) Depressão Atual e Recorrente (MINI) Ín d ic e S en so ri al d e E st im at iv a d e D o r Figura 7 – Comparação entre as médias dos escores, dos índices que apresentaram diferenças estatisticamente significativas quando somente o critério diagnóstico da Mini International Psychiatric Interview foi utilizado. IED Afetivo (p = 0,001 e t = -3,820) e IED Total (p = 0,041 e t = -2,197), quando comparamos os indivíduos saudáveis (n = 14) àqueles com Depressão Maior Atual (n = 6); e IED Sensorial (p = 0,021; t = 2,534), quando comparamos os indivíduos saudáveis (n = 14) àqueles com Depressão Maior Atual e Recorrente (n = 6). - 46 - Discussão Os resultados do Estudo 02 foram avaliados em quatro etapas: (a) quando todas as mulheres do grupo controle foram comparadas a todas as do grupo experimental, sendo os critérios de inclusão em um ou outro grupo aqueles obtidos através do uso do M.I.N.I. e do IDB conjuntamente; (b) quando apenas as mulheres livres de medicação antidepressiva de ambos os grupos descritos em (a) foram comparadas; (c) quando as participantes foram classificadas como saudáveis ou deprimidas apenas através dos critérios do IDB e (d) quando as participantes foram classificadas como saudáveis ou deprimidas apenas através dos critérios do M.I.N.I. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significantes que indicassem que a medicação antidepressiva estivesse provocando uma modificação nos resultados. Apesar de não ter havido diferenças estatisticamente significantes entre o grupo controle e o grupo experimental, tanto na análise que incluiu todos os participantes quanto na que excluiu os que estavam sendo medicados com antidepressivos, houve uma tendência da Latência de retirada da mão no TPF ser maior no grupo controle. Tal resultado poderia indicar uma sensibilização à dor aguda em pacientes deprimidos, já relatada anteriormente (Kundermann, Hemmeter-Spernal, Strate, Gebhardt, Huber, Krieg e Lautenbacher, 2009; Lautenbacher, Spernal, Schreiber, e Krieg, 1999), e talvez correlacionada com o aumento na dor crônica também relatado (Bair et al, 2003; Turk et al, 2002). Novas investigações com participantesbrasileiros poderiam ser feitas com amostras maiores que comparassem a percepção de dor, ou a intensidade da dor crônica - bem como seu enfrentamento - em pacientes apresentando diferentes intensidades de Depressão, que poderiam ser acessadas através do IDB ou de outro instrumento psicométrico. - 47 - A despeito da latência de retirada da mão ter apresentado uma tendência de ser maior no grupo controle (sem depressão), independentemente da medicação antidepressiva, o índice Sensorial de estimativa de dor do QDM e a Avaliação Global da Intensidade da Experiência Dolorosa (AGIED) também se apresentaram maiores para este grupo, o que indica que o fato das participantes do grupo controle terem agüentado mais tempo com a mão na água não está relacionado a nenhuma insensibilidade. As pacientes deprimidas, por sua vez, permaneceram menos tempo com a mão na água, mas atribuíram maiores dimensões afetivas a dor sentida. Tais resultados poderiam ser esclarecidos com amostras maiores e maior padronização sócioeconômica, étnica ou cultural dos participantes (Miller e Newton, 2006), o que poderia reduzir as diferenças individuais na compreensão das instruções e na expressão da dor percebida (Logan, Claar e Scharff, 2007). O IED Afetivo, o IED Total e a Escala Visual Analógica do QDM tenderam a apresentar escores maiores nos participantes com depressão (a despeito da medicação), concordando com a tendência destes participantes permanecerem menos tempo com a mão na água. Por se tratar de um índice quantificando um componente afetivo da percepção de dor, tal resultado poderia corroborar achados anteriores de que a catastrofização da dor é maior em pacientes deprimidos (Turk e Okifuji, 2002), ainda que alguns destes estudos tenham avaliado dor crônica, e não experimental. Futuramente, o Estudo 02 poderia ser replicado com uma amostra maior (tanto de pacientes deprimidos tomando medicação, versus grupo controle; quanto de pacientes deprimidos que não estivessem fazendo uso de medicação, versus grupo controle). Em estudos futuros, o tipo de medicação antidepressiva, bem como sua dosagem e tempo de prescrição poderiam ser padronizados através do recrutamento de participantes brasileiros provenientes de serviços de saúde psiquiátricos. Futuros estudos poderiam, - 48 - inclusive, ter delineamento inter e intra-sujeito, que comparassem a nocicepção de um mesmo participante em diferentes estágios do uso do medicamento antidepressivo, ou ainda comparando o tempo até o início dos efeitos da droga sobre o humor com o tempo até o início dos efeitos da droga sobre a nocicepção ou sobre a dor crônica (Lynch, 2001; Mattia, Paoletti, Coluzzi e Boanelli, 2002), com o intuito de orientar melhor os pacientes sobre o tempo que a droga levara para agir sobre um ou outro problema. Quando optamos por analisar os dados entre os grupos formados pelos escores de depressão dos instrumentos IDB e M.I.N.I. separadamente, foram observadas diferenças estatisticamente significantes entre os participantes com e sem depressão. Tanto no caso do IDB quanto no caso do M.I.N.I., os indivíduos deprimidos fizeram uma estimativa afetiva da dor mais do que 100% maior do que os indivíduos saudáveis, embora não tenha havido diferença estatisticamente significante entre suas latências de retirada da mão da água gelada, corroborando estudos que sugerem que os indivíduos deprimidos catastrofizam suas experiências dolorosas. No caso da comparação entre os indivíduos saudáveis e com Depressão Maior Atual e Recorrente, do Mini International Neuropsychiatric Interview (M.I.N.I.), os indivíduos saudáveis apresentaram escores significantemente maiores para o IED Sensorial do que aqueles com Depressão Maior Atual e Recorrente, corroborando achados anteriores de que a percepção sensorial de dor nos indivíduos deprimidos pode estar reduzida. (Marazziti et al, 1998) e indicando que os altos escores nos índices afetivos estão mais relacionados com o processamento central da dor do que com os receptores periféricos de dor. Contudo, a análise dos dados de acordo com os critérios destes instrumentos psicométricos casou uma diminuição nos Ns dos grupos, o que nos leva a sugerir replicações futuras com Ns maiores. (Dickens, McGowan e Dale, 2003). - 49 - Considerações finais As mulheres permaneceram mais tempo com a mão na água do que os homens, embora tenham atribuído valores mais altos aos descritores sensoriais do QDM, o que coincide com achados anteriores e pode estar relacionado com os diferentes limiares de dor aos quais as mulheres são expostas durante a vida. Contudo, seriam necessários novos estudos com amostras maiores para que pudéssemos pensar em generalização dos dados. A correlação negativa e estatisticamente significante entre idade e IED Sensorial corrobora achados sobre envelhecimento sensorial, podendo ser atribuída a este fenômeno. Já a correlação negativa e significante entre latência de retirada da mão no TPF e Avaliação Global da Intensidade da Experiência Dolorosa (AGIED), confirma que em testes de tolerância à dor em que os participantes podem interromper o estímulo doloroso quando quiserem, quanto mais tempo suportam a dor, menor valor a ela atribuem. No experimento com mulheres com e sem depressão, o grupo controle permaneceu mais tempo com a mão na água e atribuiu mais valor sensorial à experiência de dor do TPF, enquanto as mulheres com depressão atribuíram maior valor afetivo à mesma experiência e suportaram a dor por menos tempo. Estudos com imagens cerebrais funcionais e medidas mais acuradas de dor poderiam esclarecer se a maior atribuição afetiva e a menor latência de retirada da mão da água estão relacionadas a aumentos na intensidade do processamento central da dor (IED Afetivo) com ou sem diminuição da nocicepção periférica (IED Sensorial). As diferenças entre as médias dos escores dos participantes saudáveis e dos participantes com depressão, só se mostraram estatisticamente significantes quando utilizamos os diagnósticos dos instrumentos M.I.N.I. e Beck separadamente. Entretanto, - 50 - quando comparamos as mulheres saudáveis com mulheres classificadas como tendo Depressão Maior Atual e Recorrente de acordo com o M.I.N.I., o resultado foi significante, porém oposto: o grupo controle apresentou escores afetivos significantemente maiores do que o grupo com Depressão Maior Atual e Recorrente, talvez indicando uma possível dessensibilização afetiva na depressão recorrente. A diferença entre os Ns dos grupos controle e experimental quando utilizamos os instrumentos psicométricos separadamente pode estar relacionada à ocorrência de resultados falso-negativos quando a entrevista M.I.N.I. é utilizada (Amorim, 2000). Os resultados deste estudo podem contribuir, quando somados àqueles provenientes de estudos clínicos e sociais, na compreensão da interação fisiopatológica entre dor e depressão, bem como nas diferentes formas de tratamento e enfrentamento da mesma, aumentando a eficiência de atuação dos profissionais da Saúde. Estudos com amostras maiores, comparando grupos diagnosticados com instrumentos diferentes a um grupo de controles saudáveis, poderiam apurar melhor os resultados acima. - 51 - Referências Abbott et al. Acute tryptophan depletion blocks morphine analgesia in the cold-pressor test in humans. Psychopharmacology (Berl). 1992;108(1-2):60-6. American Psychiatric Association - APA. (2002). DSM IV TR – Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 4ª Edição. Porto Alegre: Artes Médicas. Amorim, P. (2002). Mini International Neuropsychiatric Interview (MINI): validação de entrevista breve para diagnóstico de transtornos mentais. Revista Brasileira de Psiquiatria, 22 (3), 106-115. Angelotti, G. e Sardá, J.J. (2005). Avaliação Psicológica da Dor. In: J. A. B. Figueiró;
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