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Prévia do material em texto

Responsável Técnico: Lorena de Fátima Vidal (CRB: 410/11-AM) 
Biblioteca CEUNI-FAMETRO
FAMETRO
Av. Djalma Batista, Nossa Sra. das Gracas. Manaus, AM
 L372s Lima, Nata Souza. 
 Sociologia e antropologia. / Nata Souza Lima. -- Manaus: CEUNI-
FAMETRO, 2021.
 178 p. 
 ISBN: 978-85-64293-06-9 
 1. Sociedade 2. Cultura 3. Diversidade cultural 4. Fato social I. 
Título.
 CDU.:572 
 
Ficha catalogada na Biblioteca CEUNI-Fametro
Todos os direitos reservados © FAMETRO
IME Instituto Metropolitano de Ensino Ltda
Wellington Lins de Albuquerque | Presidente - IME
Maria do Carmo Seffair Lins de Albuquerque | Reitora
Cinara da Silva Cardoso | Pro-Reitora
Iyad Amado Hajoj | Diretor de EaD e Expansão
Leonardo Florêncio da Silva | Diretor Editorial e Gestor de EaD
Luciana Braga | Projeto Gráfico e Direção de Arte
Amenayde Cristine Corrêa | Assistente Editorial
Ana Augusta de Oliveira Simas | Supervisora de Produção e Revisora
Liene Costa | Revisora
Flávia Bahia Lacerda | Revisora Técnica
Imagens | depositphotos.com
"Nos termos da Lei n.º 9.610/98, o autor desta obra é titular de todo o complexo de 
direitos autorais sobre a presente criação. Assim, é vedada a cópia, reprodução, 
edição ou distribuição desta obra sem autorização expressa do Autor ou da Editora 
e, ainda é vedado utilizar, citar, publicar esta obra integral ou parcialmente sem 
deixar de indicar ou anunciar o nome, pseudônimo ou sinal convencional do autor 
sob pena da aplicação das medidas previstas nos Art. 101 a 110 da Lei n.º 9.610/98."
“Sejam todos e todas bem-vindos ao EaD 
do Centro Universitário Fametro”
O Centro Universitário Fametro acredita que o 
papel de uma instituição de ensino é formar não apenas 
profissionais, mas também formar profissionais no 
Ensino Superior, com valores éticos, humanísticos e 
com respeito ao meio ambiente capazes de contribuir 
para o desenvolvimento da nossa Amazônia. 
A Fametro, portanto, tem premissas claras a 
cumprir como instituição de ensino de qualidade. 
Praticar o ensino, pesquisa e extensão é a sua principal 
bandeira. 
A Fametro, ao longo das últimas duas décadas, 
vem se consolidando como a melhor instituição de 
ensino do Norte, um espaço democrático e docentes 
com variadas visões de mundo. Somos uma instituição 
de ensino plural que avança a cada ano em busca 
sempre de desenvolver a economia da Amazônia. Nossa 
estrutura é moderna, estamos em diversos municípios 
levando uma educação inclusiva e de qualidade.
Conheça o Centro Universitário Fametro e viva a 
experiência em estudar numa instituição com o corpo 
docente com mestres e doutores e de qualidade de 
ensino comprovada pelo MEC. 
Maria do Carmo Seffair
Reitora
Pa
la
vr
a 
da
 R
ei
to
ra
“É a educação que 
faz o futuro 
parecer um lugar 
de esperança e 
transformação”.
(Marianna Moreno)
UNIDADE I
 
Debates fundamentais em Sociologia
A noção de "ciência social"
Sociologia e método sociológico
Industrialização e mudança social
Individualismo e estigma
Modernidade e globalização
Su
m
ár
io
13
13
16
22
31
38
UNIDADE II 
Debates fundamentais em Antropologia
Evolucionismo social
Natureza e cultura
Etnocentrismo e Alteridade
Trabalho de campo e Etnografia 
Populações tradicionais e vozes ameríndias
UNIDADE III 
Problemas sociais do Brasil
Formação nacional
 
Questões étnico-raciais no Brasil
 
Conflitos agrários e as lutas pela terra
 
Cidades e violência urbana
 
A Amazônia no debate social
53
53
59
65
68
74
85
85
91
99
105
110
UNIDADE IV 
Desigualdades sociais e direitos humanos
 
 Direitos humanos e justiça
Gênero: desigualdades e violências
 
Migração e fronteiras
Poder e subalternidades
Estado e intervenção social
Referências 
Caderno de exercícios
121
121
125
136
142
146
152
159
U
ni
da
de
 1
Videoaula 1
Videoaula 2
13
DEBATES 
FUNDAMENTAIS 
EM SOCIOLOGIA
A NOÇÃO DE “CIÊNCIA 
SOCIAL”
As ciências sociais são um 
campo do conhecimento moderno 
que compreende três disciplinas 
principais: Sociologia, Antropolo-
gia e Ciência Política. Esses três sa-
beres propõem olhares diferentes 
sobre a vida social humana. Embora 
estas áreas do conhecimento sejam 
muito próximas entre si, não são to-
talmente iguais. A Sociologia busca 
estudar as relações do indivíduo na 
sociedade, a estrutura e dinamici-
dade das sociedades modernas, fa-
14
Anotações: zendo uma análise no percurso histórico e as suas 
transformações ao longo do tempo. A antropologia 
analisa a distinção das culturas humanas, a diversi-
dade dos grupos sociais ou étnicos e as mudanças 
que ocorrem, devido à interação entre os grupos. 
Ao passo que a Ciência Política estuda a siste-
matização do poder do estado, as instituições e o 
processo político partidário de um país, as políticas 
públicas em todas as suas etapas, ou seja, na elabo-
ração, implantação e avaliação do resultado de sua 
aplicação. Neste livro, nosso enfoque será sobre 
Sociologia e Antropologia, duas áreas das Ciências 
Sociais, que têm origens aproximadas, mas formas 
distintas de observar e refletir sobre as relações 
sociais. 
Numa percepção clássica, a Sociologia se 
constrói a partir de três principais teóricos, que 
produzem visões diferentes sobre a sociedade 
e as transformações modernas. Primeiramente, 
veremos a consolidação da Sociologia como uma 
Ciência moderna, a partir de Émile Durkheim, na 
França. Em seguida, estudaremos outros dois 
teóricos fundadores de problemas sociológicos 
modernos, mas que não estiveram intrinsecamente 
ligados à formação da Sociologia como um campo 
disciplinar, mas cada um adotando compromissos 
diferentes em relação à ciência e à compreensão 
das transformações da modernidade. São eles: Karl 
Marx e Max Weber, ambos alemães. 
15
Anotações:
A formação da Sociologia como Ciência
O Iluminismo foi um movimento filosófico 
do século XVIII, que propôs a separação radical 
entre igreja e ciência. Esse foi o marco da ciência 
moderna, onde autores como Renè Descartes, 
Jonh Locke, Rousseau, Voltaire, entre outros, 
elaboraram ensaios sobre as leis, as formas de 
desigualdade, as relações de poder e, sobretudo, 
a necessidade do método como meio pelo qual se 
conhece a realidade. A partir desse movimento 
intelectual, consolida-se a modernidade, baseada 
na técnica, no método e na comprovação científica.
Desse processo, as ciências exatas e da 
natureza consolidam métodos e regras para a 
investigação científica, apreensão e acúmulo do 
conhecimento. O método científico proporciona 
maior veracidade e controle de uma determinada 
experiência. Além disso, assegura o acúmulo de 
conhecimento, uma nova descoberta, devidamente 
testada e aprovada pelos cientistas que compõem 
um campo disciplinar, não precisa ser testada do 
zero. Outras teorias e experimentações podem ser 
realizadas a partir dos conhecimentos já adquiridos 
cientificamente.
No final do século XIX, havia uma lacuna 
em torno da produção de conhecimentos sobre a 
humanidade e as sociedades, que até ali era feita 
pela Filosofia ou pela Teologia, a primeira com mais 
ênfase nas questões do espírito humano, a segunda, 
com ênfase na crença e na fé. Nas duas, a produção do 
conhecimento não passava por métodos científicos, 
nem por processos de testagem e comprovação.
16
Anotações: Movidos por essas questões, dois autores do 
final do século XIX buscaram consolidar abordagens 
científicas sobre a vida social. O primeiro foi 
Gabriel Tarde, que propôs a literatura (por meio da 
interpretação literária) como meio para a análise 
social. Essa ideia não repercutiu com a mesma 
proporção que a proposta de Auguste Comte, que 
inaugurou a noção de “física social”, uma ciência 
que seria capaz de analisar a sociedade, a partir 
do método científico já consolidado nas ciências 
“duras” (exatas e da natureza, principalmente).
Comte teve grande influência na educação 
francesa, sendo primeiramente um crítico do 
elitismo em torno do acesso ao conhecimento,o 
que o levou a ser apoiado por diversos intelectuais 
da época. Foi mentor de Émile Durkheim, quem o 
ajudou a formular as primeiras ideias em torno da 
“física social’’. Ocorre que Comte, antes de finalizar 
suas formulações em torno da nova ciência, fora 
acometido de “colapsos nervosos”, o que abalou 
seu trabalho e, sobretudo, sua criatividade. Assim, 
foi Émile Durkheim, aluno de Auguste Comte, quem 
seguiu com a tarefa de construir a primeira ciência 
social, a qual chamou de “Sociologia”.
SOCIOLOGIA E MÉTODO SOCIOLÓGICO
Émile Durkheim foi fundamental para a 
criação formal da Sociologia no espaço acadêmico 
francês, tendo sido o primeiro a ocupar uma cadeira 
universitária com esse nome (em Bordéus, 1887) e 
fundou, em 1896, o L’Année sociologique (anuário 
sociológico), que se tornou a principal revista de 
Sociologia da França, divulgando o pensamento da 
17
Anotações:“escola” durkheimiana, que teve muitos discípulos, 
entre eles, seu sobrinho Marcel Mauss (fundamental 
para os estudos em Etnologia, como veremos 
posteriormente).
Figura 1 - Émile Durkheim
 Fonte: Domínio público.
Esse processo envolveu a defesa da existên-
cia de um objeto propriamente sociológico, o “fato 
social”, distinto do objeto de outras áreas do conhe-
cimento, como a Biologia, a Filosofia, a Psicologia, 
o Direito, a Economia, etc. Esse objeto demandaria 
a codificação de um método específico para tratá-
lo e de uma ciência distinta e autônoma — a Sociolo-
gia — para descobrir as leis de seu funcionamento.
Em “As regras do método sociológico”, 
Durkheim defende que os fatos sociais existem 
“acima” das consciências individuais, sendo-lhes 
exteriores e as antecedendo. Essa definição sobre 
18
Anotações: os fatos sociais, implica na construção do conceito 
de “sociedade”, na sociologia durkheimiana, para a 
qual a “sociedade” existe acima (sobrepondo) dos 
indivíduos. Para Durkheim, “sociedade” não significa 
meramente uma coletividade de sujeitos, mas uma 
“consciência pública ou coletiva que exerce um 
poder de coerção ou se impõe, de maneira mais ou 
menos perceptível, aos indivíduos” (CASTRO, 2014).
O método sociológico seguirá, portanto, 
algumas premissas importantes, distinguindo-
se de outras ciências, da Filosofia e da Religião. 
Durkheim afirma que o fato de ter nascido a partir 
das doutrinas filosóficas consideradas relevantes, 
a Sociologia não alterou o hábito de se apoiar 
em qualquer sistema no qual se sinta solidário, 
a exemplo de ser positivista, evolucionista, 
espiritualista, ao invés de cultivar simplesmente a 
Sociologia (idem).
Quanto às ideologias, a Sociologia de 
Durkheim não deve “tomar partido” entre as grandes 
hipóteses que dividem os metafísicos. Tampouco 
lhe cabe defender a liberdade ou o determinismo. 
Nesse aspecto, distingue-se muito das teorias 
socialistas que ganharam força na Europa no final 
do século XIX, principalmente com a publicação 
das obras de Karl Marx. A Sociologia, segundo o 
princípio da tradução francesa, deve limitar-se 
a que o “princípio de causalidade seja aplicado 
aos fenômenos sociais’’. Isso significa tratar os 
fenômenos sociais como dotados de “causas” que 
também produzem “efeitos” próprios. Além disso, 
esse princípio é estabelecido por ela não como uma 
necessidade racional, mas tão somente como um 
postulado empírico, produto de legítima indução. 
19
Anotações:Durkheim (apud CASTRO, 2014, p. 38) reafirma: 
A sociologia assim entendida não será 
individualista, nem comunista, nem 
socialista, no sentido vulgarmente 
atribuído a essas palavras. Por 
princípio, irá ignorar essas teorias, 
nas quais não poderia reconhecer 
valor científico, uma vez que elas 
tendem claramente não a exprimir os 
fatos, e sim a reformá-los. Se ela se 
interessa por eles, é tão somente na 
medida em que vê neles fatos sociais 
capazes de ajudar a compreender a 
realidade social por manifestarem 
as necessidades que operam a 
sociedade.
A ênfase na ausência de um viés ideológico à 
Sociologia, proposta por Durkheim, estava atrelada 
principalmente ao seu esforço de objetividade, cru-
cial para sua consolidação como Ciência. Para tanto, 
o autor defendia que os fatos sociais (como objetos 
sociológicos) deveriam ser tratados como coisas. 
Nesse processo de construção da objetividade, o 
sociólogo deveria abrir mão das “pré-noções” e ob-
servar os fatos como eles são, buscando examinar 
suas características mais objetivas.
20
O suicídio (1897)
O livro de Émile Durkheim, publicado pela 
primeira vez em 1897, marcou a Sociologia por 
ter sido a primeira obra a se debruçar sobre um 
problema social (fato social), a crescente onda de 
suicídios na França, a partir de dados estatísticos 
e empíricos. As explicações sobre o Suicídio, na 
época, tratavam esse fenômeno como um problema 
de ordem individual. 
Analisando taxas de mortes autoprovo-
cadas, a partir de regiões, concentração 
em períodos, Durkheim pôde argumen-
tar que o suicídio não era um fenômeno 
isolado a cada caso, mas tinha influên-
cias coletivas e sociais. Essas unidades 
de motivação agrupariam os casos de 
suicídio, demonstrando que havia 
uma dimensão coletiva a ser con-
siderada. 
Comparando diferentes ex-
pressões de suicídio (ou morte au-
toprovocada), Durkheim estabele-
ceu três principais motivações 
geradoras dessas mortes. 
A primeira, chamou de egoísta, 
a qual as altas taxas estavam associa-
das à diminuição da integração social. 
Pessoas com maior isolamento de gru-
pos onde houvesse sensação de per-
tencimento, eram as que estavam en-
quadradas nesssa categoria. Durkheim 
salienta, por exemplo, que o individu-
21
Anotações:alismo se expressava também na desagregação das 
comunidades religiosas, nas quais os protestan-
tes prezavam mais pela individualidade, enquanto 
católicos costuravam suas relações de forma mais 
comunitária.
A segunda, a altruísta era caracterizada pelas 
mortes auto cometidas em nome de um grupo ou 
causa. Nesta, ao contrário da primeira motivação, 
o sujeito estaria tão imerso pelo pertencimento e 
pelas crenças de um grupo (religiosas, políticas, 
ideológicas, culturais), que sua morte ocorre como 
um serviço final, ou uma defesa, do conjunto de 
crenças que o grupo representa.
A terceira, chamada de anômica, categoriza 
situações em que um indivíduo está se sentindo 
sem direção social. Diferente da primeira, em 
que o suicídio se baseia na ausência e diminuição 
da integração social, na anômica, a morte está 
relacionada aos eventos de ruptura da crença no 
grupo social. Está relacionado aos momentos 
de crise social profunda, como grandes crises 
econômicas, guerras e situações pós-traumáticas.
22
A noção de “fato social”
A noção de “fato social” é fundamental para a 
construção da perspectiva francesa da Sociologia. 
Durkheim afirma que, “embora consideremos os 
fatos sociais como coisas, é como coisas sociais.” 
Assim, o valor dos fatos sociais é seu aspecto 
sociológico. O suicídio, a devoção religiosa, por 
exemplo, são fatos sociais com explicações 
sociológicas, dotados de complexidade que 
vinham sendo reduzidas por explicações psíquicas, 
orgânicas, de fé, ou seja, descaracterizados de 
dados objetivos sobre eles mesmos. O esforço 
da Sociologia durkheimiana foi o de tratar 
desses fatos sociais, sem descaracterizá-los. 
INDUSTRIALIZAÇÃO E MUDANÇA SOCIAL
O surgimento da Sociologia, além do 
contexto acadêmico de sua criação na França, 
está relacionado à preocupação em torno da vida 
moderna. E o marco inicial da Modernidade como 
conhecemos, é a industrialização. A primeira 
revolução industrial ocorreu na Inglaterra, com o 
surgimento da máquina a vapor. Esse processo 
deu início às transformações nas relações com 
a propriedade e o trabalho. A demanda por mão 
de obra, o avanço das grandes propriedades 
— principalmente para plantação de algodão, 
motivada pelo crescimento da indústria têxtil — 
geraram um grande êxodo rural e vários problemas 
urbanos. Rapidamente, a indústria dominou a 
economia europeia,provocando muitos problemas 
sociais, como a superlotação das cidades, o 
trabalho precário, a fome, entre outros. 
Para maior 
aprofundamento 
de como o método 
de investigação 
sociológica de 
Durkheim se aplicava 
aos fatos sociais, 
ler “O Suicídio”, a 
primeira investigação 
sociológica publicada 
sobre um fenômeno 
social. Sugiro 
também a leitura 
de “As estruturas 
elementares da vida 
religiosa”.
23
Anotações:Figura 2 - Karl Marx
Fonte: Domínio público.
A obra de Karl Marx, apoiada por seu amigo 
Friedrich Engels, dialoga com esse contexto social. 
Ambos não são definidos como sociólogos, mas as 
ideias de Marx, que passam pela Filosofia, História, 
Direito e Economia, são de grande interesse 
sociológico e exercem muita influência nas Ciências 
Sociais. 
Suas obras de maior destaque são (1) “O 
Manifesto do Partido Comunista”, livro de caráter 
mais panfletário, mas extremamente mobiliza-
dor e inquietante, que apresenta um resumo das 
suas teorias em torno da exploração do proletaria-
do pela burguesia, da luta de classes sociais, da 
necessidade de união dos trabalhadores do mun-
do contra as apropriações e acúmulos do Capi-
tal industrial; e (2) “O Capital”, obra que contém 
3 volumes principais, além de outras publicações 
24
Anotações: após a morte de Marx, onde o autor apresenta sua 
teoria econômica sobre a lógica do Capital, seu 
processo de produção, circulação e o sistema de 
Mais-Valia. 
Aqui falaremos sobre “A ideologia Alemã”, 
publicado originalmente em 1932, quando Marx 
desenvolveu, em parceria com Engels, as princi-
pais noções sobre o “materialismo histórico”. O ar-
gumento de “A Ideologia Alemã” segue como uma 
resposta aos filósofos alemães seguidores de He-
gel, cujas teorias partiam do pressuposto de que 
o mundo das ideias antecede à realidade material 
(nunca alcançada). Marx e Engels argumentam que 
a história é material, existe no mundo real e são as 
condições histórico-materiais que dão suporte às 
relações de poder. 
Essa concepção materialista da história hu-
mana permitiria compreender como as relações 
dos indivíduos entre si e suas formas de proprie-
dade se alterariam, à medida que fossem se desen-
volvendo forças produtivas novas e mais podero-
sas. Para Marx, o cerne das relações sociais são as 
formas de como os homens produzem seus meios 
de existência, transformando inclusive a natureza.
Não se deve considerar esse modo 
de produção sob esse único ponto de 
vista, ou seja, enquanto reprodução 
da existência física dos indivíduos. Ao 
contrário, ele representa, já, um modo 
determinado da atividade desses 
indivíduos, uma maneira determinada 
de manifestar sua vida, um modo de 
vida determinado. A maneira como 
os indivíduos manifestam sua vida 
25
Anotações:reflete exatamente o que eles são. O 
que eles são coincide, pois, com sua 
produção, isto é, tanto com o que 
eles produzem quanto com a maneira 
como produzem. O que os indivíduos 
são depende, portanto, das condições 
materiais da sua produção (MARX 
apud CASTRO, 2014, p. 12).
Esse debate é fundamental para as propostas 
de Marx em torno da construção de sua própria 
obra. Ao contrário dos filósofos até ali, Marx não 
tinha interesse em produzir reflexões distantes 
da realidade (material). Seu esforço era de 
compreender como a sociedade moderna produziu 
as condições da desigualdade, e como as massas, 
o proletariado (trabalhadores), em condições de 
subalternidade, poderiam produzir condições 
materiais para o Comunismo. 
Ao contrário de outros autores do panteão 
sociológico que se limitaram à compreensão da 
realidade social, a obra de Marx e Engels, tem um 
comprometimento com a mudança social, tendo o 
trabalho e a economia como as principais chaves 
conceituais de análise. De certa forma, pode-se 
dizer que todos os grandes paradigmas da Socio-
logia foram inquietados por questões da sua época, 
alguns com limites institucionais, outros nem tan-
to. Marx talvez tenha sido o mais inadequado para 
as instituições acadêmicas. Já seu conterrâneo, 
Max Weber, foi um exímio acadêmico, apesar de não 
gostar da docência. 
26
Anotações: Figura 3 - Max Weber
 
Fonte: Domínio público.
Weber teve seus primeiros trabalhos publi-
cados, cerca de vinte anos após a morte de Marx, 
interessava-se a respeito de como a modernidade 
transformou-se em grandes instituições sociais, 
como a Igreja e o Estado. Suas análises também 
têm grande influência nos campos de Economia, 
Política e Direito, sobretudo por conta das estru-
turas de organização burocráticas e do poder. 
Porém, Weber construiu um trabalho dito “soci-
ológico” e, semelhante a Durkheim, preocupou-se 
com a consolidação da disciplina, com o método 
sociológico, com os interesses de investigação da 
Sociologia. Sua proposta para a constituição dos 
problemas sociológicos e apreensão das reali-
dades sociais se constituirá tomando como base 
as conexões conceituais entre os problemas. 
Para isso, Weber se debruçou sobre a 
abrangência do que chamamos “social”, argu-
27
Anotações:mentando que o termo nos levaria a um sentido 
muito generalizado da realidade, tornando por 
vezes, indeterminado: “se é encarado no seu sig-
nificado geral, não oferece qualquer ponto de vis-
ta específico a partir do qual se possa iluminar 
a importância de determinados elementos cul-
turais” (WEBER apud CASTRO, 2014, p. 62). Contu-
do, a proposta de Weber para a construção de uma 
análise sociológica, que apreenda as complexi-
dades da realidade social de forma abrangente 
(sem desconexão com o social e o real), é a elabo-
ração de “tipos ideais”. 
O “tipo ideal” é uma consolidação de padrões 
sociais em um conceito emblemático. Lançando 
mão da construção de “tipos ideais” sobre as 
instituições, Weber consegue apontar elementos 
constituintes da sociedade, dos fenômenos 
históricos e das organizações.
A sua relação com os fatos empirica-
mente dados consiste apenas em que, 
onde quer que se comprove, ou sus-
peite de que determinadas relações 
— do tipo das representadas de modo 
abstrato naquela construção, a saber, 
as dos acontecimentos dependentes 
do “mercado” — chegaram a atuar em 
algum grau sobre a realidade, podemos 
representar e tornar compreensível 
pragmaticamente a natureza par-
ticular dessas relações mediante um 
tipo ideal. Esta possibilidade pode ser 
valiosa, e mesmo indispensável, tanto 
para a investigação como para a ex-
posição (WEBER apud CASTRO, 2014, 
p. 63).
28
Anotações: Nessa elaboração sobre o método e a 
construção dos objetos da Sociologia, Weber não 
deixa de criticar Durkheim por conta do debate 
sobre “distanciamento” e “neutralidade” em torno 
dos fatos sociais. Para Weber, nossa interpretação 
da realidade social não poderia ser feita sem 
“pressuposições”, mas seria de antemão elaborada 
a partir de alguns significados atribuídos sobre 
as coisas sociais. Além disso, em sua teoria, os 
tipos ideais são o caminho para a análise social, 
e não o seu fim. Constituí-los é, portanto, criar as 
ferramentas da análise sociológica.
A construção de tipologias mais importante 
dentre as obras de Weber se dá em torno do conceito 
de poder e dominação, que são os meios pelos quais 
um sujeito ou organização conseguem a submissão 
ou obediência a partir de certos comandos.
Pode depender diretamente de uma 
situação de interesses, ou seja, de 
considerações utilitárias de van-
tagens e inconvenientes por parte 
daquele que obedece. Pode também 
depender de mero “costume”, do 
hábito obtuso de um comportamen-
to inveterado. Ou pode fundar-se, 
finalmente, no puro afeto, na mera 
inclinação pessoal do dominado. Não 
obstante, a dominação que repou-
sasse apenas nesses fundamentos 
seria relativamente instável. Nas 
relações entre dominantes e domi-
nados, por outro lado, a dominação 
costuma apoiar-se internamente em 
bases jurídicas, nas quais se funda a 
29
Anotações:“legitimidade”, e o abalo dessa cren-
ça na legitimidade costuma acarretar 
consequências de grande alcance. 
Em forma totalmentepura, as “bases 
de legitimidade” da dominação são 
somente três, cada uma das quais se 
acha entrelaçada – no tipo puro – com 
uma estrutura sociológica fundamen-
talmente diversa do quadro e dos 
meios administrativos (WEBER apud 
CASTRO, 2014, p. 65).
Os tipos de Dominação elencados por Max 
Weber:
1. Dominação legal em virtude do estatuto. 
Seu tipo mais puro é a dominação burocrática. Sua 
ideia básica é: qualquer direito pode ser criado 
e modificado mediante um estatuto sancionado 
corretamente quanto à forma. A associação 
dominante é eleita ou nomeada, e ela própria e 
todas as suas partes são empresas. O quadro 
administrativo consiste em funcionários nomeados 
pelo senhor, e os subordinados são membros da 
associação (“cidadãos”, “camaradas”). Obedece-se 
não à pessoa, em virtude de seu próprio direito, 
mas à regra estatuída, que estabelece ao mesmo 
tempo a quem e em que medida se deve obedecer. 
Também quem ordena obedece, ao emitir 
uma ordem, a uma regra: à “lei” ou “regulamento” 
de uma norma formalmente abstrata. O tipo 
daquele que ordena é o “superior”, cujo direito de 
mando está legitimado por uma regra estatuída, 
no âmbito de uma competência concreta, em que 
a delimitação e especialização têm como base a 
utilidade objetiva e nas exigências profissionais 
30
Anotações: estipuladas para a atividade do funcionário. O tipo 
do funcionário é aquele de formação profissional, 
pois as condições de serviço baseiam-se num 
contrato, com pagamento fixo, graduado segundo a 
hierarquia do cargo e não do volume de trabalho, e 
direito de ascensão conforme regras fixas. 
Sua administração é trabalho profissional em 
virtude do dever objetivo do cargo. Corresponde 
naturalmente ao tipo de dominação “legal” não 
apenas à estrutura moderna do estado e do 
município, mas também a relação do domínio numa 
empresa capitalista privada, numa associação com 
fins utilitários ou numa união de qualquer outra 
natureza que disponha de um quadro administrativo 
numeroso e hierarquicamente articulado. 
2. Dominação tradicional em virtude da 
crença na santidade das ordenações e dos poderes 
senhoriais existentes. Seu tipo mais puro é o da 
dominação patriarcal. A associação dominante é 
de caráter comunitário. O tipo daquele que ordena 
é o “senhor”, e os que obedecem são “súditos”, 
enquanto o quadro administrativo é formado por 
“servidores”. Obedece-se à pessoa em virtude de 
sua dignidade própria, santificada pela tradição: por 
fidelidade. O conteúdo das ordens está fixado pela 
tradição, cuja violação desconsiderada por parte 
do senhor colocaria em perigo a legitimidade do 
seu próprio domínio, que repousa, exclusivamente, 
na santidade delas.
 No quadro administrativo, as coisas ocorrem 
exatamente da mesma forma. Ele consta de 
dependentes pessoais do senhor (familiares ou 
funcionários domésticos) ou de parentes, ou de 
amigos pessoais (favoritos), ou de pessoas que 
31
Anotações:lhe estejam ligadas por um vínculo de fidelidade 
(vassalos, príncipes tributários). Falta aqui o 
conceito burocrático de “competência” como esfera 
de jurisdição objetivamente delimitada. 
3. Dominação carismática em virtude de 
devoção afetiva à pessoa do senhor e a seus dotes 
por graça (carisma) e, particularmente faculdades 
mágicas, revelações ou heroísmo, poder intelectual 
ou de oratória. O sempre novo, o extracotidiano, o 
inaudito e o arrebatamento emotivo que provocam 
e constituem aqui a força de devoção pessoal. 
Seus tipos mais puros são a dominação do profeta, 
do herói guerreiro e do grande demagogo. A 
associação dominante é de caráter comunitário, 
na comunidade ou no séquito. O tipo que manda é o 
líder. O tipo que obedece é o “apóstolo”. 
INDIVIDUALISMO E ESTIGMA
Se para os três grandes paradigmas da Socio-
logia, o foco de análise se deu sobre temas de grande 
abrangência, outros autores importantes para esta 
Ciência optaram por objetos de análise mais “mar-
ginais”. Provavelmente, um dos primeiros desses 
sociólogos foi Georg Simmel, contemporâneo de 
Max Weber, que se interessou por desdobramentos 
da modernidade no comportamento individual e na 
psique. Podemos dizer que o conjunto de autores a 
seguir, estabelecem relações entre dilemas sociais 
coletivos e aspectos individuais ou o que conhece-
mos atualmente como “subjetividade”. 
Um dos trabalhos mais célebres de Simmel 
é “A Metrópole e a Vida Mental”, onde desenvolve 
uma análise sobre como o novo ritmo urbano afetou 
32
Anotações: a relação das pessoas com o tempo e com as 
implicações em torno dos laços de solidariedade. 
Simmel viveu no tempo dos primeiros relógios 
de bolso, do controle mais aguçado do tempo, 
do surgimento dos automóveis e do ritmo das 
máquinas de fábrica na vida social. 
Os problemas mais graves da vida 
moderna derivam da reivindicação 
que faz o indivíduo de preservar a 
autonomia e individualidade de sua 
existência em face das esmagado-
ras forças sociais, da herança, da 
história, da cultura externa e da técni-
ca de vida. (...) O século XVIII concla-
mou o homem a que se libertasse de 
todas as dependências históricas 
quanto ao Estado e a religião, a moral 
e a economia. Juntamente com maior 
liberdade, o século XVIII exigiu a espe-
cialização funcional do homem e seu 
trabalho; essa especialização torna 
um indivíduo incomparável a outro 
e cada um deles é indispensável na 
medida mais alta possível. Entretan-
to, esta mesma especialização tor-
na cada homem proporcionalmente 
mais dependente de forma direta 
das atividades suplementares de to-
dos os outros. Nietzsche vê o pleno 
desenvolvimento do indivíduo condi-
cionado pela mais impiedosa luta de 
indivíduos; o socialismo acredita na 
supressão de toda competição pela 
mesma razão. Seja como for, em to-
das estas posições, a mesma mo-
33
Anotações:tivação está agindo: a pessoa resiste 
a ser nivelada e uniformizada por um 
mecanismo sociotecnológico 
(SIMMEL apud CASTRO, 2014, p.11).
Para caracterizar esse tempo das 
transformações radicais que a modernidade impôs 
sobre os sujeitos, Simmel elaborou a noção de 
“sentimento blasé”, uma forma de “não reação” 
a novidades, problemas graves, violações, por 
exemplo, que seriam “resultado dos estímulos 
contrastantes que a vida moderna impõe aos 
nervos”: 
Uma vida em perseguição desregrada 
ao prazer torna uma pessoa blasé 
porque agita os nervos até seu ponto 
de mais forte reatividade por um 
tempo tão longo que eles finalmente 
cessam completamente de reagir. Da 
mesma forma, através da rapidez e 
contraditoriedade de suas mudanças, 
impressões menos ofensivas forçam 
reações tão violentas, estirando 
os nervos tão brutalmente em uma 
e outra direção, que suas últimas 
reservas são gastas; e, se a pessoa 
permanece no mesmo meio, eles não 
dispõem de tempo para recuperar a 
força. Surge assim a incapacidade 
de reagir a novas sensações com a 
energia apropriada. Isto constitui 
aquela atitude blasé que, na 
verdade, toda criança metropolitana 
demonstra quando comparada com 
crianças de meios mais tranquilos e 
34
Anotações: menos sujeitos a mudanças (SIMMEL, 
1973 apud CASTRO, 2014, p. 16).
Outra influência geradora da “atitude blasé” 
para Simmel, seriam as relações com o dinheiro, 
que acirra a distinção social, estabelecendo valores 
em torno de quem tem mais.
A essência da atitude blasé con-
siste no embotamento do poder de 
discriminar. Isto não significa que 
os objetos não sejam percebidos, 
como é o caso dos débeis mentais, 
mas antes que o significado e va-
lores diferenciais das coisas, e daí as 
próprias coisas, são experimentados 
como destituídos de substância. Elas 
aparecem à pessoa blasé num tom 
uniformemente plano e fosco; obje-
to algum merece preferência sobre 
outro. Esse estado de ânimo é um 
fiel reflexo subjetivo da economia do 
dinheiro completamente interiorizada. 
Sendo o equivalente a todas as múl-
tiplas coisas de uma mesma forma, o 
dinheiro torna-se o mais assustador 
dos niveladores (ibid, p.16).
Se para Simmel, as transformaçõesda vida 
moderna impactaram, significativamente, na po-
tencialização do individualismo, da distinção e do 
desprezo, para Erving Goffman um processo con-
tínuo da vida social, aprofundado em outros es-
paços do cotidiano — inclusive das interações face 
a face, da individualidade — foi a segregação de 
certos grupos e sujeitos a partir de estigmas soci-
35
Anotações:ais. Goffman é um dos primeiros autores modernos 
a refletir sobre a noção de “Estigma” como resul-
tado de certas regras de convívio, que corroboram 
em atitudes preconceituosas e discriminatórias 
contra grupos e pessoas. Apesar de ser usado 
como um termo sobre a depreciação, o conceito 
de Estigma vai além disso. 
É uma linguagem de relações e 
não de atributos. Um atributo que 
estigmatiza alguém pode confirmar a 
normalidade de outrem, portanto ele 
não é, em si mesmo, nem horroroso 
nem desonroso. Por exemplo, alguns 
cargos nos Estados Unidos obrigam 
seus ocupantes que não tenham a 
educação universitária esperada a 
esconder isso; outros cargos, entre-
tanto, podem levar os que os ocupam 
e que possuem uma educação superi-
or a manter isso em segredo para não 
serem considerados fracassados ou 
estranhos (GOFFMAN apud CASTRO, 
2012, p.13).
Goffman argumenta ainda, que se pode 
elencar o Estigma em pelo menos três tipos:
1. As deformidades físicas, tidas como 
abominações do corpo (considerando que 
Goffman escreveu sobre essas formas de 
estigma na metade do século XX, devemos 
ponderar que há uma série de políticas 
sociais em torno da diferença de corpos, 
contudo, alguns estigmas ainda persistem, 
porém, passíveis de punição por lei). 
36
Anotações: 2. As culpas de caráter individual percebidas 
socialmente como vontade fraca, paixões 
tirânicas ou não naturais, crenças falsas 
e rígidas, desonestidade, sendo essas in-
feridas a partir de relatos conhecidos de, 
por exemplo, distúrbio mental, prisão, 
vício, alcoolismo, homossexualidade, de-
semprego, tentativas de suicídio e com-
portamento político radical. 
3. Estigmas raciais, de nação e religião, que 
geralmente são repassados para uma 
família inteira.
As atitudes de pessoas tidas como normais 
para com uma pessoa com um estigma, e os 
atos que empreendido em relação a ela são bem 
conhecidas na medida em que são as respostas 
que a ação social benevolente tenta suavizar e 
melhorar. Contudo, as pessoas debaixo de algum 
estigma social são percebidas numa posição de 
inferioridade (menos humanos). Dessa forma de 
tratamento consolidada socialmente, surgem 
diversos preconceitos que funcionam como uma 
ideologia para explicar a suposta inferioridade, 
indicando que ela representa algum perigo.
Numa análise sociológica que se aproxima 
dos interesses de Goffman, sobre os estigmas 
sociais, Howard Becker coloca sua ênfase 
no estudo de grupos considerados outsiders 
[marginais], refletindo sobre os impactos das 
regras sociais e suas quebras (violações). Becker 
argumenta que todos os grupos sociais têm regras 
de funcionamento interno, sejam as leis, conjuntos 
de normas jurídicas que norteiam uma sociedade, 
37
Anotações:sejam as regras da tradição, que não são escritas 
e normatizadas como leis, mas tem força de 
imposição social e são transmitidas entre gerações.
Muitas regras não são impostas, 
e, exceto no sentido mais formal, 
não constituem o tipo de regra em 
que estou interessado. Exemplos 
disso são as leis que proíbem certas 
atividades aos domingos, que 
permanecem nos códigos legais, 
embora não sejam impostas há cem 
anos. (É importante lembrar, contudo, 
que é possível reativar uma lei não 
imposta por várias razões e recuperar 
toda a sua força original...). Regras 
informais podem morrer de maneira 
semelhante por falta de imposição. 
Estou interessado sobretudo no que 
podemos chamar de regras operantes 
efetivas de grupos, aquelas mantidas 
vivas por meio de tentativas de 
imposição (BECKER apud CATRO, 
2014, p. 103).
As violações a essas regras sociais, geram 
grupos e sujeitos marginalizados. Porém, o grau em 
que uma pessoa é considerada marginalizada varia. 
Essa diferença é atravessada tanto pela forma do 
crime, quanto pelas proteções sociais em torno 
de quem os comete. Um exemplo, são os crimes 
de atropelamento cometidos contra ciclistas, por 
jovens filhos de grandes empresários com carros 
de luxo, que sequer sofrem alguma punição. Já 
crimes tidos como mais graves (ainda dependendo 
de quem o cometa), como assassinato ou estupro, 
38
Anotações: nos levam a ver o transgressor como um verdadeiro 
marginal. 
Com essa análise sobre como reagimos 
às violações das regras sociais, e a partir disso, 
como estabelecemos quem é ou não um outsider 
(marginal), Becker pretende desenvolver uma 
sociologia do desvio, deixando de absorver 
unicamente as noções patologizantes do desvio 
como verdades absolutas, mas problematizando 
quais os pesos sociais, os valores morais, envolvidos 
na classificação do desvio e dos desviantes. Em sua 
concepção sociológica, afirma que “desvio é a falha 
em obedecer às regras do grupo’’. O desvio como a 
infração de alguma regra, geralmente, aceita.
Se um ato é ou não desviante, depende de 
como outras pessoas reagem a ele. As violências 
domésticas podem ser um exemplo disso. No caso 
do Brasil, são absolutamente criminalizadas, mas 
ainda pouco denunciadas. Essas violências que 
ocorrem no ambiente doméstico podem se tornar 
queixas policiais, ou se manter como segredo de 
família e vizinhança, sem gerar sanções legais aos 
agressores. Portanto, o grau em que outras pessoas 
reagirão a um ato dado como desviante varia 
enormemente. “O grau em que um ato será tratado 
como desviante depende de quem o comete e de 
quem se sente prejudicado por ele” (idem, p. 108). 
MODERNIDADE E GLOBALIZAÇÃO
Se a industrialização marcou uma nova fase de 
transformações sociais globais, a internacionalização 
da indústria, assim como o fim da Guerra Fria em 
1989, marcara uma fase explicada por muitos au-
39
Anotações:tores como “globalização”, “mundialização” ou até 
mesmo “pós-modernidade”. Essa era das transfor-
mações globais tem classificações ainda não total-
mente consolidadas, pois diz respeito ao passado 
recente e ao presente. Contudo, alguns sociólogos 
trataram de debater essas mudanças. Para Giddens 
(1991), sociólogo britânico, o fim do século XX é de 
fato uma era de transição, marcada pelo consumo 
desenfreado e pela informação. 
Alguns dos debates sobre estas 
questões se concentram principal-
mente sobre transformações insti-
tucionais, particularmente as que 
sugerem que estamos nos deslocan-
do de um sistema baseado na manu-
fatura de bens materiais para outro 
relacionado mais centralmente com 
informação (GIDDENS, 1991, p.8).
O autor, ao invés de classificar taxativamente 
essa era “pós-moderna”, prefere refletir sobre 
quais as transformações e consequências da 
modernidade (a do século XX). Um dos seus 
elementos de análise é a nossa relação com o 
tempo e o espaço. 
Todas as culturas pré-modernas pos-
suíam maneiras de calcular o tempo. 
O calendário, por exemplo, foi uma 
característica tão distinta dos esta-
dos agrários quanto à invenção da 
escrita. Mas o cálculo do tempo que 
constituía a base da vida cotidiana, 
certamente para a maioria da popu-
lação, sempre vinculou tempo e lu-
40
Anotações: gar — e era geralmente impreciso e 
variável. Ninguém poderia dizer a hora 
do dia sem referência a outros marca-
dores socioespaciais: “quando” era 
quase, universalmente, ou conectado 
a “onde” ou identificado por ocorrên-
cias naturais regulares (idem, p.21).
Essa vinculação entre tempo e lugar seria 
fundamental, na visão de Giddens, para pensar num 
dos pontos da transformação impulsionada pela 
invenção do relógio mecânico, que estabeleceu 
mais precisão em torno do tempo, possibilitando 
maior controle em torno das horas — pagas, gastas, 
etc. — desvinculando efetivamente o tempo do 
espaço. Não seria mais necessário usar algum ponto 
espacial como parâmetro de medidado tempo. As 
horas estavam sendo controladas universalmente, 
à disposição de todos, mesmo aqueles sem a 
autonomia de “olhar as horas” por si mesmos. 
O advento da modernidade arranca 
crescentemente o espaço do tempo 
fomentando relações entre outros 
“ausentes”, localmente distantes de 
qualquer situação dada ou interação 
face a face. A separação entre o 
tempo e o espaço não deve ser 
vista como um desenvolvimento 
unilinear, no qual não há reversões 
ou que é todo abrangente. Pelo 
contrário, como todas as tendências 
de desenvolvimento, ela tem traços 
dialéticos provocando características 
opostas (GIDDENS, 1991, p.22).
41
Anotações:Por que a separação entre tempo e espaço 
é tão crucial para o extremo dinamismo da 
modernidade? Giddens (1991, p. 23) explica:
1. “Em primeiro lugar, ela é a condição princi-
pal do processo de desencaixe que passo 
a analisar de maneira breve. A separação 
entre tempo e espaço e sua formação em 
dimensões padronizadas, “vazias”, pene-
tram as conexões entre a atividade social 
e seus “encaixes” nas particularidades dos 
contextos de presença.”
2. “Em segundo lugar, ela proporciona os 
mecanismos de engrenagem para aquele 
traço distintivo da vida social moderna, 
a organização racionalizada. As organi-
zações modernas são capazes de conec-
tar o local e o global de formas que seriam 
impensáveis em sociedades mais tradi-
cionais e, assim fazendo, afetam rotinei-
ramente a vida de milhões de pessoas.” 
3. “Em terceiro lugar, a historicidade radi-
cal associada à modernidade depende de 
modos de “inserção” no tempo e no es-
paço que não estavam disponíveis para 
as civilizações precedentes. Um sistema 
de datação padronizado, agora univer-
salmente reconhecido, possibilita uma 
apropriação de um passado unitário, 
mas muito de tal “história” pode estar su-
jeito a interpretações contrastantes. Em 
acréscimo, dado o mapeamento geral do 
globo que é hoje tomado como certo, o 
passado unitário é um passado mundial; 
42
Anotações: tempo e espaço são recombinados para 
formar uma estrutura histórico-mundial 
genuína de ação e experiência.”
Se Giddens estava interessado nas mudanças 
geradas pelo processo de globalização (a uni-
formização de padrões globais, como da relação 
com o tempo), Zygmunt Bauman, sociólogo po-
lonês, por sua vez, tem um olhar muito mais trági-
co e pessimista sobre os tempos pós-modernos. 
Para Bauman, vivemos o tempo da “liquidez”, ter-
mo que baseará grande parte de sua obra. A liqui-
dez faz referência à fluidez/pressa/fragilidade das 
relações sociais, mediadas pela vida moderna e 
pelo consumo. A necessidade de consumir, nos le-
varia a um nível de relações sociais efêmeras, se-
melhante a obsolescência das coisas (capitalistas). 
Nosso mundo seria, portanto, marcado pelas incer-
tezas em múltiplas dimensões.
Nesse novo mundo “líquido”, a incerte-
za passa a dominar a cena social, em 
várias dimensões: as organizações 
sociais (estruturas que limitam as es-
colhas individuais, instituições que 
asseguram a repetição de rotinas, pa-
drões de comportamento aceitável) 
não podem mais manter sua forma 
por muito tempo (nem se espera que o 
façam), pois se decompõem e se dis-
solvem mais rápido que o tempo que 
leva para moldá-las e, uma vez reor-
ganizadas, para que se estabeleçam 
(CASTRO, 2014, p. 128). 
43
Anotações:A crise do Estado-Nação é a provável ruptura 
histórica e epistemológica nas ciências sociais. A 
partir do fim da dualidade, URSS e EUA (Comunismo 
e Capitalismo), que abriu as possibilidades para um 
processo de globalização, visto que as instituições 
internacionais, principalmente, as que lidam com 
dinheiro ou com o comércio, trataram de promover 
ou até exigir uma reformulação nas economias do 
globo, passando a controlá-las e dando início a um 
processo de mundialização do capital. São diver-
sas, diferentes e insistentes as pressões externas 
e internas destinadas a provocar a reestruturação 
do Estado.
A sujeição das economias (e políticas) nacio-
nais, a uma ordem global, é justificada como forma 
de ideais capitalista ou socialista para que sejam 
incogitados diante de uma dinâmica capitalista 
que depende e se relaciona numa rede transna-
cional, que pode ser administrada dos diversos 
lugares do globo, mas nunca internamente. Desta 
forma, a nação transforma-se em mera província 
do capitalismo mundial, sem soberania assegu-
rada para construir suas políticas independente-
mente dos órgãos financeiros internacionais ou 
das grandes multi e transnacionais.
Para as multinacionais (isto é, empre-
sas globais com interesses e compro-
missos locais dispersos e cambiantes), 
“‘o mundo ideal’ é um mundo sem Es-
tados. “A menos que tenha petróleo, 
quanto menor o Estado, mais fraco 
ele é, e menos dinheiro é necessário 
para se comprar um governo.” O que 
temos hoje é, com efeito, um sistema 
44
Anotações: dual, o sistema oficial das “economias 
nacionais” dos Estados, e o real, mas 
não oficial, das unidades e instituições 
transnacionais. Ao contrário do Esta-
do com seu território e poder, outros 
elementos da “nação” podem ser e são 
facilmente ultrapassados pela glo-
balização da economia. Etnicidade e 
língua são dois exemplos óbvios. Sem 
o poder e a força coercitiva do Esta-
do, sua relativa insignificância é clara. 
Como a globalização da economia 
procede aos saltos, “comprar gover-
nos” é, certamente, cada vez menos 
necessário. A clara incapacidade dos 
governos de equilibrar as contas com 
os recursos que controlam (isto é, os 
recursos que eles podem estar certos 
de que continuarão no domínio de sua 
jurisdição independente do modo que 
escolham para equilibrar as contas) 
seria suficiente para fazê-los não só 
se renderem ao inevitável, mas tam-
bém colaborarem ativamente e de 
bom grado com os “globais” (BAUMAN 
apud CASTRO, 2011, p. 200).
Uma questão atual ocupou o etnólogo francês 
Bruno Latour: o debate sobre clima e negacionismo. 
As ideias defendidas pelo intelectual francês em 
“Onde Aterrar? — Como se orientar politicamente 
no Antropoceno,” é de que os acontecimentos 
políticos dos últimos 50 anos estão mobilizados 
em torno da discussão sobre o fenômeno das 
mudanças climáticas da Terra — e de sua negação. 
Segundo Latour (2020), a desregulamentação dos 
45
Anotações:Estados após a queda do muro de Berlim, o aumento 
das desigualdades sociais em todo o planeta e a 
negação da existência de mudanças climáticas, 
são processos de uma mesma situação histórica 
em que as elites perceberam que não existe mais 
espaço para sua existência (e de seus hábitos, 
relações com o capital e o consumo) no mesmo 
tempo e nas mesmas condições que o restante dos 
habitantes do planeta. 
Se nos anos 90 havia um notório esforço das 
lideranças globais e redes de ativistas e organi-
zações sociais em torno do debate ambientalista, 
vide a realização de grandes eventos sobre o Clima, 
como a ECO 92 no Rio de Janeiro, como respos-
ta ao escasseamento de recursos naturais diante 
do avanço predatório das demandas capitalistas, 
houve também a compreensão de que o modo de 
vida industrial moderno, não era sustentável para 
a manutenção da vida, principalmente humana, no 
planeta. As elites optaram, então, por incentivar a 
negação do fim dos recursos naturais, do desgaste 
das condições climáticas, assim como construir 
comunidades muradas para si, entre outras es-
tratégias de proteção como a exploração de novos 
planetas e viagens espaciais. Dessa forma, tam-
bém incentivaram a negação da globalização, para 
assim apregoar a ideia de que não somos codepen-
dentes e interligados por relações e decisões políti-
co-econômicas. 
Para Latour, é possível identificar dois mar-
cos temporais que evidenciam essa estratégia 
de negação à globalização. O primeiro é a saída 
dos EUA, por meio da decisão de Donald Trump, 
do acordo de Paris em 2017; o segundo é o Brexit, 
46
Anotações: movimento de desvinculação da Inglaterra à União 
Europeia. O autor defende que o movimento ini-
cial dasondas negacionistas globais, começa com 
a negação das mudanças climáticas. Seu ápice é 
o engajamento produzido pelo movimento políti-
co de Trump, pautado pela questão ecológica, e 
pela negação da globalização. Fazer a “América 
grandiosa de novo [Make America Great Again]” no 
trumpismo, pressupõe o acirramento das relações 
de fronteira, a negação da escassez de recursos, o 
retorno ao modelo de crescimento americano dos 
anos 60/70.
Se antes, as disputas ideológicas eram 
marcadas pelas diferenças entre os projetos de 
futuro, entre progressistas e reacionários, esquerda 
e direita, atualmente vivemos numa retração 
dessa disputa, que produz, de ambos os “lados”, 
um efeito de recolhimento desses movimentos 
ideológicos às suas próprias bolhas. As posições 
políticas, agora, baseiam-se principalmente na 
defesa de territórios ideológicos (e delimitação 
destes). Assim, para Latour (2020), o Antropoceno 
– era da intervenção humana na biosfera – impõe 
desafios em torno de habitar a Terra. Nesse novo 
processo político, capitaneado pelas alterações 
climáticas e sua negação, a Terra se torna um 
sujeito político, mobilizando os seres humanos a 
refletirem sobre suas ações no planeta, indicando 
através das catástrofes globais, do surgimento de 
novos vírus, que as consequências da ação humana 
serão vivenciadas comunitariamente, seja pelos 
que ficarão sem casa e terão de migrar de seus 
territórios de origem, seja pelos que serão afetados 
pelas alterações num território que “não é seu”. 
47
Anotações:Por fim, o autor sustenta que a negação da 
mudança climática global é, em si mesma, a negação 
da racionalidade científica. As elites produziram e 
optaram por negar a evidente finitude de recursos 
naturais, criando e patrocinando uma atmosfera de 
negacionismo, principalmente em torno da ciência 
e de suas evidências, de modo que confundiu as 
classes populares em relação aos fatos, engajando 
milhares de fake news, que além de distorcerem as 
verdades, distraem as massas sobre os problemas 
que virão. Nas palavras do autor, “não se trata de 
uma política da ‘pós-verdade’, mas sim de uma 
política da pós-política, ou seja, literalmente sem 
objeto, na medida em que ela rejeita o mundo que 
reivindica habitar” (LATOUR, 2020, p. 35).
48
Filmes para conferir:
O Jovem Karl Marx (Raoul Peck, 2018): retrato 
biográfico de Karl Marx que narra as vivências de 
sua juventude e o início de sua amizade com Engels, 
que o levaria a se tornar uma das personalidades 
mais importantes do século 19.
Trabalho Interno (Charles Ferguson, 2010): 
documentário sobre a recessão econômica global, 
com início nos EUA, em 2008. Demonstra como 
bancos e acordos de falência amarrados com o 
Estado, levaram ao aumento de desemprego e 
pessoas desabrigadas.
Para seguir:
Tese Onze: canal no YouTube organizado por 
Sabrina Fernandes, socióloga, que debate temas 
contemporâneos à luz das teorias sociológicas.
U
ni
da
de
 2
Videoaula 1
Videoaula 2
52
Anotações:
53
DEBATES 
FUNDAMENTAIS EM 
ANTROPOLOGIA
EVOLUCIONISMO SOCIAL
Diferente da Sociologia, cujos 
paradigmas circulam muito mais em 
torno da obra de autores emblemáti-
cos, na Antropologia, os marcadores 
paradigmáticos serão construídos, 
principalmente, a partir de “escolas 
de pensamento”. Há uma miríade de 
perspectivas teóricas em Antropolo-
gia, porém, a subdivisão mais clássica 
se dá pelo marcador da nacionalidade 
onde o conjunto teórico foi desenvolvi-
do. As principais são:
54
Anotações: a. Antropologia Francesa1: originada a par-
tir da Escola de Sociologia francesa, com 
influência de Émile Durkheim e, principal-
mente, Marcel Mauss, com preocupações 
teóricas voltadas para a compreensão de 
sistemas e estruturas universais da hu-
manidade. Nos anos 50, tem grande re-
percussão a partir da obra de Claude Lévi-
Strauss e sua Antropologia Estruturalista.
b. Antropologia Britânica: é uma escola de 
pensamento com grande ênfase na Et-
nografia e no Trabalho de Campo. A an-
tropologia britânica é sobretudo empírica. 
Esteve diretamente ligada aos projetos 
coloniais ingleses, principalmente no con-
tinente africano, provocando intensos de-
bates nos anos 80 sobre a ética da finali-
dade do trabalho antropológico. 
c. Antropologia Americana: marcada por 
diferentes fases, do Evolucionismo Social 
ao Culturalismo e Interpretativismo, a 
Antropologia Americana tem a noção 
de Cultura como ponto de partida, 
destacando sua diversidade. É a partir dela 
que o olhar para os problemas internos — 
da sociedade em que se situa — tiveram 
destaques e confrontamentos. 
Aqui citaremos alguns desses debates de 
forma introdutória, lidando com as transformações 
1 LAPLATINE, Françoise. Aprender Antropologia. São Paulo, 
Ed. Brasiliense, 2010.
55
Anotações:de objeto da Antropologia e, sobretudo, com as 
mudanças em torno do conceito de Cultura. O 
primeiro paradigma teórico em Antropologia foi 
o “Evolucionismo Social”, tendo como principais 
autores: 
Lewis Morgan (EUA)2: os interesses de 
Morgan nos estudos antropológicos se iniciam a 
partir dos temas “família”, “herança” e “parentesco”. 
Dedicou muitos anos ao estudo e comparação de 
sistemas de parentesco humanos, distinguindo 
como os “selvagens” faziam suas classificações 
em comparação às sociedades “civilizadas”. Suas 
pesquisas resultaram na publicação de “Sistemas 
de Consanguinidade e Afinidade da Família Humana” 
e, posteriormente, “a sociedade antiga”, a qual 
demonstra os estágios de progresso da sociedade 
humana através da análise de cinco casos 
exemplares: os aborígines australianos, os índios 
iroqueses, os astecas, os gregos e os romanos.
Edward Tylor (UK/EUA)3: foi o primeiro 
autor a estabelecer uma definição para o conceito 
de “cultura”, em seu livro “Cultura primitiva”. 
Descreveu Cultura como equivalente à Civilização, 
estabelecendo, a partir desse pressuposto, que 
os povos “não civilizados” (todos os povos fora da 
Europa e não-colonizados) não detinham cultura. 
Seu conceito dizia “Cultura ou Civilização, “é aquele 
todo complexo que inclui conhecimento, crença, 
arte, moral, lei, costume e quaisquer outras 
2 CASTRO, Celso. Evolucionismo Cultural: textos de Morgan, 
Tylor e Fazer. Rio de Janeiro, Ed. Zahar, 2009.
3 Ibidem.
56
Anotações: capacidades e hábitos adquiridos pelo homem na 
condição de membro da sociedade.”
James Frazer (UK)4: sua obra principal foi 
“O Ramo de Ouro”, publicado pela primeira vez em 
1890, em dois volumes, com um total de oitocentas 
páginas. A segunda e a terceira versões foram 
publicadas com respostas a várias críticas de 
outros autores da mesma época, chegando a 13 
exemplares no total. Em 1922, Frazer preparou uma 
versão condensada em um volume que se tornou 
a versão mais conhecida, publicada até os dias 
atuais.
É importante destacar que o Evolucionismo 
Social é uma perspectiva teórica considerada 
superada, porém, estudá-la é necessário para 
entender qual o percurso da Antropologia, como 
surgem as compreensões modernas do conceito 
de cultura, e quais as “sombras” do evolucionismo 
social que ainda permanecem. O postulado básico 
do evolucionismo, em sua fase clássica, era o de 
que, em todas as partes do mundo, a sociedade 
humana teria se desenvolvido em estágios 
sucessivos e obrigatórios, numa trajetória unilinear 
e ascendente. Nessa lógica, toda a humanidade 
deveria passar pelos mesmos estágios de evolução 
social, seguindo uma direção que ia do mais simples 
(os selvagens) ao mais complexo (civilização). 
Como decorrência da visão de um único 
caminho evolutivo humano, os povos “não 
ocidentais”, “selvagens” ou “tradicionais” existentes, 
no mundo contemporâneo, eram vistos como uma 
4 Ibidem.
57
Anotações:espécie de “museu vivo” da história humana, tidos 
como representantes de etapas anteriores da 
trajetória universal do homem rumo à “civilização”; 
como exemplos vivos daquilo “que já fomos um dia”. 
Na medida em que a arqueologia era, então, 
pouco desenvolvida e não havia registroshistóricos 
disponíveis para a reconstituição dos estágios 
supostamente mais “primitivos”, o estudo dessas 
sociedades assumia enorme importância, pois 
assim se poderia reconstituir o caminho evolutivo 
da humanidade, através de suas diferentes etapas. 
Passava-se a dispor de uma espécie de 
“máquina do tempo” que permitia, observando o 
mundo dos “selvagens” de hoje, ter uma ideia de 
como se vivia em épocas passadas. Para Frazer 
(apud CASTRO, 2009, p. 107), “a selvageria é a 
condição primitiva da humanidade e, se quisermos 
entender o que era o homem primitivo, temos que 
saber o que é o homem selvagem hoje”. A solução 
para preencher as “lacunas” do longo período 
“primitivo” de evolução cultural humana era utilizar 
o método comparativo, aplicando-o ao grande 
número de sociedades “selvagens” existentes 
contemporaneamente. 
58
Marcel Mauss
Mauss foi aluno notável e sobrinho de Émile 
Durkheim, sendo iniciado na Sociologia pelo seu 
tio, na Universidade de Bordeaux. Diferente de 
Durkheim, que escreveu obras extensas ao longo 
da vida, Mauss era um intelectual de ensaios, 
com olhar mais direcionado para questões de 
etnologia (estudo das sociedades “simples”) e sua 
obra se dedica, principalmente, aos aspectos mais 
elementares da cultura humana, na perspectiva de 
que a partir da compreensão sobre a vida social 
na sua forma mais simplifi cada, pode-se alcançar 
os signifi cados dos fenômenos nas sociedades 
complexas.
Sua obra de maior importância foi o 
“Ensaio sobre a dádiva”, onde 
analisa diversas formas de trocas 
econômicas entre sociedades ditas 
“arcaicas”. É crucial para a teoria 
antropológica, pois estabeleceu uma 
série de comparações entre formas 
elementares de troca entre diferentes 
sociedades, assim como acordos e relações 
que essas trocas asseguram. Em termos gerais, 
defende que a troca se baseia em um sistema de 
Dádiva, onde “dar”, necessariamente cria uma 
expectativa pela retribuição. O esquema da Dádiva 
se prolonga num processo que implica em “dar”, 
“receber” e “retribuir”. 
Em 1902 assumiu a cátedra de “História 
das religiões dos povos não civilizados”, como 
professor e diretor de pesquisas da École 
Pratique des Hautes Études, de Paris.
elementares da cultura humana, na perspectiva de 
que a partir da compreensão sobre a vida social 
na sua forma mais simplifi cada, pode-se alcançar 
os signifi cados dos fenômenos nas sociedades 
complexas.
Sua obra de maior importância foi o 
“Ensaio sobre a dádiva”, onde 
analisa diversas formas de trocas 
econômicas entre sociedades ditas 
“arcaicas”. É crucial para a teoria 
antropológica, pois estabeleceu uma 
série de comparações entre formas 
elementares de troca entre diferentes 
sociedades, assim como acordos e relações 
que essas trocas asseguram. Em termos gerais, 
defende que a troca se baseia em um sistema de 
Dádiva, onde “dar”, necessariamente cria uma 
expectativa pela retribuição. O esquema da Dádiva 
se prolonga num processo que implica em “dar”, 
“receber” e “retribuir”. 
Em 1902 assumiu a cátedra de “História 
das religiões dos povos não civilizados”, como 
professor e diretor de pesquisas da École 
Pratique des Hautes Études, de Paris.
59
Anotações:NATUREZA E CULTURA
O embate a partir do Evolucionismo Social é 
sobre a qualidade dos aspectos que compõem a 
humanidade. Somos humanos pela nossa unidade 
biológica, mas seríamos equivalentes mesmo com 
formas de organização social tão diferentes? Para 
os evolucionistas, havia aprendizados necessários 
e inevitáveis para que os povos ditos “selvagens” 
adquirissem equivalência no status de humanidade 
em relação às sociedades ditas “civilizadas”. 
Nessa perspectiva, há vários problemas, 
principalmente, pela posição em que as teorias são 
produzidas pelos seus contextos. A dúvida em torno 
da humanidade dos “selvagens” era colocada pelos 
colonizadores, que tinham suas próprias sociedades 
como espelho da “civilização”. Essa inferiorização 
social das sociedades ditas “selvagens”, reverberou 
em projetos racistas contra sociedades africanas, 
asiáticas e ameríndias, como se o aprendizado da 
civilização tivesse, necessariamente que passar 
pela universalidade racial (europeia, branca). Laraia 
(2001, p. 12) afirma que:
São velhas e persistentes as teorias 
que atribuem capacidades específi-
cas inatas a ‘raças’ ou a outros grupos 
humanos. Muita gente ainda acredita 
que os nórdicos são mais inteligen-
tes do que os negros; que os alemães 
têm mais habilidade para a mecânica; 
que os judeus são avarentos e nego-
ciantes; que os norte-americanos 
são empreendedores e interesseiros; 
que os portugueses são muito tra-
60
Anotações: balhadores e pouco inteligentes; 
que os japoneses são trabalhadores, 
traiçoeiros e cruéis; que os ciganos 
são nômades por instinto, e, final-
mente, que os brasileiros herdaram a 
preguiça dos negros, a imprevidência 
dos índios e a luxúria dos portugueses.
Os antropólogos estão totalmente convenci-
dos de que as diferenças genéticas não são deter-
minantes das diferenças culturais. A experiência do 
nazismo a partir da 2ª Guerra Mundial, levou a UNES-
CO a estabelecer junto a antropólogos, geneticistas, 
biólogos e outros especialistas, a declaração uni-
versal dos Direitos Humanos, que assegura a uni-
versalidade da humanidade e o direito à diferença 
étnica, racial e cultural. A partir da Declaração Uni-
versal dos Direitos Humanos, Laraia (2001) destaca, 
principalmente, os seguintes itens: 
10. Os dados científicos de que 
dispomos atualmente não confirmam 
a teoria segundo a qual as diferenças 
genéticas hereditárias constituiriam 
um fator de importância primordial 
entre as causas das diferenças que 
se manifestam entre as culturas e as 
obras das civilizações dos diversos 
povos ou grupos étnicos. Eles nos 
informam, pelo contrário, que essas 
diferenças se explicam, antes de 
tudo, pela história cultural de cada 
grupo. Os fatores que tiveram papel 
preponderante na evolução do homem 
são a sua faculdade de aprender e a 
sua plasticidade. Esta dupla aptidão 
61
Anotações:é o apanágio de todos os seres 
humanos. Ela constitui, de fato, uma 
das características específicas do 
Homo sapiens.
15. b) No estado atual de nossos 
conhecimentos, não foi ainda provada 
a validade da tese segundo a qual os 
grupos humanos diferem uns dos 
outros pelos traços psicologicamente 
inatos, quer se trate de inteligência 
ou temperamento. As pesquisas 
científicas revelam que o nível das 
aptidões mentais é quase o mesmo 
em todos os grupos étnicos (UNESCO 
apud LARAIA, 2001, p. 13).
Mesmo diante da superação científica do 
determinismo biológico, ainda é comum ouvir-
mos sobre qualidades — positivas ou negativas — 
transmitidas pela genética, pelo “sangue”. O bom 
desempenho em práticas esportivas é justificado 
pela herança de um avô que quase foi jogador da 
seleção; o sucesso musical de um cantor, porque 
seus pais eram músicos. São exemplos comuns 
dessa crença na transmissão de qualidades pela 
natureza. Contudo, o determinismo também opera 
para reducionismos negativos sobre as pessoas.
O crime de um adolescente acaba sendo jus-
tificado pelos comportamentos dos pais, pela sua 
diferença racial/biológica, como se as condições 
sociais e históricas não pesassem em desfavor 
do seu destino. O mesmo pode ser descrito so-
bre o sucesso de grandes empresários jovens, 
comumente retratados nas grandes revistas de 
negócios, que vendem uma narrativa de esforço 
62
Anotações: pessoal, quando sua biografia demonstra uma 
série de privilégios sociais e uma herança farta que 
explica o “sucesso incomum”.
O homem é o resultado do meio cul-
tural em que foi socializado. Ele é um 
herdeiro de um longo processo acu-
mulativo, que reflete o conhecimen-
to e a experiência adquiridos pelas 
numerosas gerações que o ante-
cederam. A manipulação adequada 
e criativa desse patrimônio cultural 
permite às inovações e às invenções. 
Estas não são, pois, o produto da ação 
isolada de um gênio, mas o resultadodo esforço de toda uma comunidade 
(idem, p. 42).
Compreender a Cultura como uma influência 
forte no processo de socialização, também passa 
pelo entendimento de que as Culturas humanas 
são diversas. Em seu artigo “Raça e História”, Lévi-
Strauss (2017) escreve uma passagem linda para 
refletir sobre a diversidade cultural humana.
É indubitável que os homens elabora-
ram culturas diferentes em virtude 
do seu afastamento geográfico, das 
propriedades particulares do meio e 
da ignorância em que se encontravam 
em relação ao resto da humanidade, 
mas isso só seria rigorosamente 
verdadeiro se cada cultura ou cada 
sociedade estivesse ligada e se tivesse 
desenvolvido no isolamento de todas as 
outras. Ora, isso nunca aconteceu, salvo 
63
Anotações:talvez em casos excepcionais como 
o dos Tasmanianos (e ainda aí para 
um período limitado). As sociedades 
humanas nunca se encontram isoladas; 
quando parecem mais separadas, é 
ainda sob a forma de grupos ou de 
feixes. Assim, não é exagero supor 
que as culturas norte-americanas e as 
sul-americanas tenham permanecido 
separadas de quase todo o contato com 
o resto do mundo durante um período 
cuja duração se situa entre dez mil e 
vinte e cinco mil anos (LÉVI-STRAUSS, 
2017, p. 341).
Para Lévi-Strauss (2017), não se pode supor 
que essa “separação” entre as sociedades desco-
bertas pelos europeus através do contato colo-
nial, significasse o total isolamento desse grande 
fragmento da humanidade. Essas sociedades 
eram grandes, mantinham contatos e relações es-
treitas entre si. Quando se mantinham isoladas ou 
distantes umas das outras, estavam demarcando 
oposição e distinção buscando fortalecimento de 
seus próprios costumes. Essas culturas não sur-
giram de acidentes, ou do acaso evolutivo, mas de 
disputas acirradas pelo desejo de não se tornarem 
“atrasadas” em relação aos seus vizinhos. Portan-
to, a diversidade humana não pode ser reduzida ao 
isolamento desses grupos, mas das relações (de 
disputa, conflito, comparação, distinção) que es-
tabelecem entre si.
Margareth Mead (1901-1978), antropóloga 
americana, foi fundamental para a compreensão 
de como a cultura molda os comportamentos e 
64
Anotações: papéis sociais. Também foi uma das intelectu-
ais responsáveis pela desnaturalização dos ditos 
“papéis sexuais”. Em seu livro "Sexo e Tempera-
mento", Mead (1969) fez uma comparação sobre 
como homens e mulheres desempenhavam pa-
péis diferentes de acordo com cada cultura, (que 
atualmente compreendemos como relações de 
gênero) a partir de três tribos da Nova Guiné, (Ara-
pesh, Mundugumor e Tchambuli). A cultura Arapesh 
é caracterizada como maternal, tendo seu valor 
atribuído por meio da “doçura” nas expressões e 
comportamentos. Quanto aos Mundugumor, tinham 
o comportamento agressivo e fomentado a homens 
e mulheres. 
A comparação entre sociedades com proxi-
midade geográfica ajuda a esclarecer que, embora 
certas ideias vigentes em determinados lugares 
sociais relacionem certos trabalhos com um dos 
sexos, em outra sociedade a coisa se passa de modo 
muito distinto. Mead nos ajuda a compreender que 
os ditos “instintos”, não são aspectos inatos da hu-
manidade, mas são elaborados a partir de nossa 
educação e se reproduzem por meio de aprendiza-
gem social. A autora afirma, por exemplo, que até 
a amamentação, ato que poderia ser considerado 
exclusivo das mulheres (que possuem mamas, 
seios), pode ser transferida a um marido moderno 
por meio da mamadeira. Se ideias como “instinto 
materno” ou “instinto sexual” fossem padrões ge-
neticamente determinados, todas as sociedades 
agiriam da mesma forma diante das mesmas 
situações.
65
Anotações:ETNOCENTRISMO E ALTERIDADE
Apesar de muitos avanços e debates que 
consolidam a ideia de diversidade cultural, ela, 
ainda, parece sempre escandalosa. Nosso pon-
to de vista sobre “o outro” opera sempre a partir 
da nossa própria cultura e, esse primeiro olhar, 
tendencioso, preconceituoso, tende a considerar 
outros modos de vida como menos apropriados. 
Esse comportamento é chamado de “etnocentris-
mo” e, levado ao extremo, reverbera em conflitos 
sociais e marginalizações entre diferentes grupos 
(ou de um grupo sobre outro): 
O etnocentrismo, de fato, é um 
fenômeno universal. É comum a cren-
ça de que a própria sociedade é o 
centro da humanidade, ou mesmo a 
sua única expressão. As auto denomi-
nações de diferentes grupos refletem 
este ponto de vista. Os Cheyene, ín-
dios das planícies norte-americanas, 
se autodenominavam “os entes hu-
manos”; os Akuáwa, grupo Tupi do Sul 
do Pará, consideram-se “os homens”; 
os esquimós também se denominam 
“os homens”; da mesma forma que os 
Navajo se intitulavam “o povo”. Os 
australianos chamavam as roupas 
de “peles de fantasmas”, pois não 
acreditavam que os ingleses fossem 
parte da humanidade; e os nossos 
Xavantes acreditam que o seu ter-
ritório tribal está situado bem no cen-
tro do mundo. É comum assim a cren-
ça no povo eleito, predestinado por 
66
Anotações: seres sobrenaturais para ser superior 
aos demais. Tais crenças contêm o 
germe do racismo, da intolerância, e, 
frequentemente, são utilizadas para 
justificar a violência praticada con-
tra os outros. A dicotomia “nós e os 
outros” expressa em níveis diferentes 
essa tendência (op.cit., p. 70).
Sendo assim, em uma mesma sociedade, a 
primeira distinção que fazemos é entre pessoas 
da família e pessoas de fora da família. Tendemos 
a estabelecer um tratamento diferenciado entre 
nossos familiares e pessoas que não pertencem 
a esse círculo. De tal modo, ampliamos essa 
diferenciação nas formas de tratar as pessoas, a 
partir do pertencimento delas ao mesmo grupo 
de amigos, à mesma vizinhança, à mesma região 
do país e à mesma nação. Desse processo de 
aglutinação e diferenciação, resultam distinções, 
preconceitos e formas extremas de preservação 
que priorizam as nossas identificações. 
Como dissemos, a tendência mais comum 
entre os grupos humanos é de considerar lógico, 
apenas o próprio sistema cultural, atribuindo 
a outras culturas e sociedades certo grau de 
irracionalidade. Porém, os dados sobre uma 
cultura devem ser analisados como um sistema 
com lógicas próprias, e não na perspectiva de um 
estrangeiro (que em nosso caso também pode ser o 
pesquisador/antropólogo).
Em “O Pensamento Selvagem”, Claude Lévi-
Strauss dedicou-se a refutar as teorias evolucion-
istas cujas conclusões indicavam que os sistemas 
de pensamento dos “selvagens”, eram inferiores e 
67
Anotações:“pré-lógicos” em relação à ciência das sociedades 
brancas, ditas civilizadas. Muitas sociedades tidas 
como “primitivas” confirmam valores e constro-
em seus sistemas de crenças em torno da magia, 
de cosmologias próprias que dão sentido ao seu 
mundo. Lévi-Strauss comprovou que o pensamen-
to mágico ou cosmológico tem uma estrutura com-
plexa e bem articulada. 
Ao contrário do que as teorias evolucionistas 
faziam crer, o pensamento mágico não antecede 
o pensamento científico, ambos existem simulta-
neamente. A Antropologia constitui-se como uma 
ciência que se opõe ao etnocentrismo. Essa não 
é uma tarefa fácil, pois o antropólogo quase sem-
pre se constitui como um sujeito que não com-
partilha do mesmo ponto de vista daquelas culturas 
ou sociedades que estuda. Para desvencilhar-se do 
etnocentrismo, a Antropologia recorre à noção de 
“alteridade”:
A abordagem antropológica provoca 
uma verdadeira revolução do olhar. 
Ela implica um descentramento radi-
cal, uma ruptura com a ideia de que 
existe um “centro do mundo”, e cor-
relativamente, uma ampliação do sa-
ber e uma mutação de si mesmo. A 
descoberta da alteridade é a de uma 
relação que nos permite deixar de 
identificar nossa pequena província 
de humanidade com a Humanidade 
(em sua totalidade), e correlativa-
mente deixar de rejeitar o presumido 
“selvagem” fora de nós mesmos. Con-
frontados com a multiplicidade das 
68
Anotações: culturas, somos aos poucos levados 
a romper com a abordagem comum 
que operana naturalização da vida 
social (como se nossos comporta-
mentos estivessem inscritos em nós 
desde o nascimento e não fossem 
adquiridos no contato com a cultura 
em que nascemos) (...) (LAPLAN-
TINE, 2010, p. 22).
A partir do pensamento antropológico 
contemporâneo, a alteridade torna-se um elemento 
fundamental para que o exercício antropológico de 
aproximação de culturas diferentes das nossas, 
seja realizado de forma respeitosa, estabelecendo 
possibilidades de aprendizados e trocas culturais. 
Além de necessária na realização do trabalho 
antropológico, a noção de alteridade será muito 
útil para tornar mais saudável o convívio com a 
diferença social.
TRABALHO DE CAMPO E ETNOGRAFIA 
Uma das rupturas em relação à fase do 
Evolucionismo Social na construção da teoria 
antropológica, foi a construção da etnografia, 
como resultado da pesquisa empírica junto 
às sociedades e povos estudados. Bronislaw 
Malinowski (1884-1942) foi canônico ao propor o 
método de “observação participante” como meio 
para obtenção de dados sobre a vida dos nativos. 
Hoje, a pesquisa em antropologia ainda segue a 
tradição inaugurada por Malinowski. É muito comum 
que nossas pesquisas prezem pela proximidade 
com os sujeitos dos grupos sociais investigados, 
69
Anotações:produzindo documentos sobre nossas impressões, 
conversas, sobre festividades e momentos rituais, 
entre outras circunstâncias importantes da vida 
social. 
A pesquisa de campo realizada por Malinowski 
teve as Ilhas Trobriandesas, na região ocidental 
do Pacífico, como lócus de pesquisa. Dessa 
experiência, escreveu “Argonautas do Pacífico 
ocidental”, “A vida sexual dos selvagens” e “Jardins 
de coral”. Dessas três obras, “Argonautas” é a de 
maior destaque, pois além de descrever o circuito 
do kula (sistema de trocas e hierarquias) e a 
construção das wagas (navegações), é nessa obra 
que apresenta seu método e as etapas de sua 
pesquisa. Segundo Malinowski (2018),
Em etnografia, o autor é ao mesmo 
tempo seu próprio cronista e o his-
toriador, enquanto suas fontes sem 
dúvida são facilmente acessíveis, 
mas também supremamente esqui-
vas e complexas; elas não estão cor-
porificadas em documentos mate-
riais, fixos, mas no comportamento 
e na memória de homens vivos. Em 
etnografia, muitas vezes há enorme 
distância entre o material bruto da 
informação — tal como é apresentado 
ao estudioso em suas próprias obser-
vações, nas afirmações dos nativos, 
no caleidoscópio da vida tribal — e a 
apresentação final autorizada dos re-
sultados. O etnógrafo tem de transpor 
essa distância nos laboriosos anos 
que decorrem entre o momento no 
qual pisa numa praia nativa, faz suas 
70
Anotações: primeiras tentativas de entrar em 
contato com os nativos, e o momento 
em que redige a versão final de seus 
resultados (p. 57).
O pensador também explica como devem ser 
estabelecidas as relações em campo, enfatizando 
que o contato primordial deve ser com os “nativos”. 
Durante o processo de aprendizado sobre um grupo 
ou cultura diferente do nosso, a imersão nas lógicas 
e rotinas do lugar são essenciais. Além disso, 
é importante não perder de vista nosso status 
de “outro” diante daqueles de quem queremos 
informações. Esses laços não são desinteressados, 
mas nem por isso chegam a ser superficiais.
Como foi dito, elas consistem prin-
cipalmente em afastar-se da com-
panhia de outros brancos e per-
manecer no contato mais estreito 
possível com os nativos, o que real-
mente só pode ser alcançado acam-
pando em suas aldeias. É muito bom 
ter uma base nas instalações de al-
gum homem branco para os materiais 
e saber que há um refúgio ali quando 
estamos adoentados ou cansados 
dos nativos. Mas ela deve estar su-
ficientemente afastada para não se 
transformar no meio permanente em 
que você vive e do qual emerge em 
horas fixas somente para “trabalhar 
na aldeia”. Não deveria nem ser próxi-
ma o bastante para que recorramos a 
ela a qualquer momento em busca de 
distração (idem p. 58-59).
71
Anotações:Figura 4 - Malinowski, em pesquisa de campo nas 
Ilhas Trobriand
Fonte: Fotografia de Billy Hanckock. In: Malinowski, 2018.
Outro aspecto das relações é a forma de 
como obtemos os dados em campo. Dificilmente, 
as pessoas têm respostas prontas para as nossas 
perguntas e, às vezes, dependendo dos nossos 
questionamentos, elas não se sentem confortáveis 
para responder. Todas as sociedades têm temáticas 
tabu, situações que não são faladas abertamente 
para estranhos. Malinovski (2018) apresenta 
algumas estratégias para lidar com esse dilema: 
Embora não possamos interrogar um 
nativo sobre regras gerais, abstratas, 
podemos sempre indagar como um 
dado caso seria tratado. Assim, por 
exemplo, ao perguntar como eles 
tratariam o crime, ou o puniriam, seria 
inútil fazer a um nativo uma pergunta 
abrangente como “De que maneira 
você trataria e puniria um criminoso?”, 
porque não seria possível sequer 
72
Anotações: encontrar palavras para expressá-la 
em um idioma nativo. Mas um caso 
imaginário ou, melhor ainda, uma 
ocorrência real estimulará o nativo 
a expressar sua opinião e a fornecer 
informações abundantes (p. 68-69).
Há, ainda, muitas situações e fenômenos 
importantes que não conseguimos registrar 
imediatamente. A convivência envolve múltiplas 
formas de participação e atenção, que podem nos 
fazer deixar de anotar ou gravar as cenas e conversas 
no calor dos acontecimentos. Esses fenômenos são 
chamados de “os imponderáveis da vida real”. São 
coisas como a rotina do trabalho, formas de cuidado 
com o corpo, maneiras de preparar e consumir os 
alimentos, as expressões emocionais, os laços 
fortes de amizade e as antipatias entre pessoas. 
Todos esses fatos podem e devem 
ser cientificamente formulados e 
registrados, mas é necessário que 
isso não seja feito com um registro 
superficial de detalhes, como é 
costume entre os observadores não 
treinados, porém com um esforço 
para penetrar a atitude mental que 
neles se expressa (idem, p. 72).
Malinovski (2018) sugere três caminhos para 
abordar o trabalho de campo. São eles:
1. A organização da tribo e a anatomia de sua 
cultura devem ser registradas num esboço 
firme, claro. O método de documentação 
73
Anotações:concreta, estatística, é o meio pelo qual 
esse esboço deve ser feito.
2. Os imponderáveis da vida real e o tipo 
de comportamento devem ser inseridos 
no interior dessa estrutura. Eles têm 
de ser colhidos mediante observações 
minuciosas, detalhadas, na forma de algum 
tipo de diário etnográfico, possibilitando 
estreito contato com a vida nativa.
3. Uma compilação de depoimentos et-
nográficos, narrativas características, pro-
nunciamentos típicos, itens de folclore e 
fórmulas mágicas devem ser considerados 
um corpus inscriptionum, como documen-
tos da mentalidade nativa.
Uma sequência para a construção do trabalho 
antropológico, clássico na antropologia brasileira, 
foi proposto por Roberto Cardoso de Oliveira em 
seu livro “O trabalho do Antropólogo”. Oliveira (2006) 
argumenta que o trabalho do antropólogo consiste 
em três atos cognitivos primordiais: Olhar, Ouvir 
e Escrever. Os dois primeiros são executados, 
quase sempre, simultaneamente. O autor propõe 
algumas experimentações em torno de cada um. 
Imagine chegar em uma sociedade completamente 
desconhecida, da qual não se domina o idioma 
nativo? As primeiras impressões serão construídas 
a partir do Olhar.
Pelo Olhar, podemos notar como as pessoas 
se vestem, com quem se relacionam, como se 
alimentam, como são as casas, por exemplo. Ouvir, 
complementa o Olhar. Por meio das conversas 
podemos desfazer dúvidas, criar relações com as 
pessoas do lugar, entender como as pessoas se 
74
Anotações: chamam, quais os pronomes de tratamento dados, 
os status atribuídos aos membros de um grupo.
Por fim, Oliveira (2006) fala sobre o ato de 
escrever, subdividindo-o em dois momentos: “Estar 
aqui” e “Estar lá”. Se recorrermos ao exemplo de 
Malinovski, veremos que ele tinha registros locais,cadernetas e diários de campo, mas construiu as 
etnografias finais sobre os Trobriandeses em seu 
escritório. No campo, nós também construímos 
registros escritos sobre as experiências imediatas, 
mas o exercício intelectual de construção da 
etnografia e sua relação com a teoria, é feito nos 
momentos de solidão, distantes do espaço de 
pesquisa.
POPULAÇÕES TRADICIONAIS E VOZES 
AMERÍNDIAS
Segundo Cunha (2017), o emprego do ter-
mo populações tradicionais não implica neces-
sariamente adesão à tradição — no sentido da 
permanência das tradições, pois a teoria antro-
pológica já concebe a cultura como dinâmica e 
mutável. 
Defini-las como populações que têm 
baixo impacto sobre o ambiente, 
para depois afirmar que são ecologi-
camente sustentáveis, seria mera 
tautologia. Se as definirmos como 
populações que estão fora da esfera 
do mercado, será difícil encontrá-las 
hoje em dia (p. 268).
75
Anotações:Compreendendo esse conjunto complexo 
que engloba as “populações tradicionais”, po-
demos inferir que as populações tradicionais são 
aquelas que exercem impactos sustentáveis so-
bre a natureza, mantendo ou não relações com o 
mercado global, que têm status étnico — social, 
administrativo ou jurídico — reconhecido. São os 
sujeitos chamados de “índios”, “indígena”, “tribal”, 
“nativo”, “aborígene” e “negro”, a partir do contato 
com o mundo branco. 
E embora [tais termos] tenham sido 
genéricos e artificiais ao serem criados, 
esses termos foram progressivamente 
habitados por gente de carne e osso. 
Não deixa de ser notável o fato de que 
com muita frequência os povos que de 
início foram forçados a habitar essas 
categorias tenham sido capazes de 
se apossar delas, convertendo termos 
carregados de preconceito em bandei-
ras mobilizadoras. Nesse caso, a de-
portação para um território conceitual 
estrangeiro acabou resultando na ocu-
pação e defesa desse território (idem, p. 
268-269).
Após um século de predominância de 
antropólogos brancos, de países imperialistas, 
fazendo pesquisa com os povos tidos como 
“selvagens”, houve um importante esforço de 
ressignificação dos papéis de sujeitos fixados na 
posição de meros interlocutores. O movimento 
indígena do Brasil teve grande importância nessa 
reviravolta, fazendo surgir e repercutindo trabalhos 
76
Anotações: de intelectuais indígenas e de seus grupos étnicos, 
dos quais destacamos dois a seguir.
Davi Kopenawa (2015) escreve “A Queda do 
Céu” em parceria com o antropólogo Bruce Albert. 
Para muitos teóricos, a cosmologia Yanomami 
apresentada por Kopenawa é um vislumbre da 
ideia de “filosofia ameríndia”, no sentido proposto 
por Eduardo Viveiros de Castro, de que os povos 
ameríndios teriam perspectivas epistemológicas 
próprias e não dicotômicas, sobre a relação entre os 
humanos (a cultura) e os seres da natureza. Mas aqui, 
podemos escapar um pouco dessas categorizações 
e pensar no trabalho do Xamã yanomami, como um 
alerta sobre o avanço predatório “dos brancos”. 
Esse alerta, escrito com muita beleza, apresenta 
aspectos da cosmologia Yanomami e a história 
de como Davi se tornou um Xamã politicamente 
engajado que se encarrega do trabalho de impedir a 
Queda do Céu, que significaria o recomeço da Terra, 
pela vontade de Omama. 
Figura 5 - Davi Kopenawa, liderança política e 
xamã yanomami
Fonte: Foto de Daniel Klajmic, Instituto Socioambiental, 2019.
77
Anotações:Uma das partes mais sensíveis do livro 
é aquela em que Kopenawa, ainda criança, é 
chamado pelo Xapiri nos sonhos. Os sonhos de 
uma criança que poderá se tornar Xamã, são 
sonhos febris, geralmente, sentidos por meninos 
delicados, frágeis, que precisam ser ornados de 
artefatos culturais, carregados de poder simbólico 
que fazem a relação entre o mundo físico e o 
mundo dos espíritos. Davi, vai sendo construído 
como um homem Ianomami, feito de cautelas 
e sensibilidades, sobre a caça, a relação com 
a natureza, o sexo, sobre seu o povo e com os 
espíritos. Ele aprende a ver que a vida é bonita (nas 
danças dos Xapiri nos sonhos, nas visões de pó de 
Yãkoana), por isso, importa manter o Céu.
Kopenawa nos ajuda a perceber que as 
cosmologias contra-capitalistas, que também são 
epistemologias “não-brancas”, dependem também 
de um engajamento sensível na relação com a 
natureza. Num tom semelhante ao de Kopenawa, 
Ailton Krenak, intelectual indígena e liderança do 
povo Krenak, às margens do Rio Doce (MG), tece um 
conjunto de propostas sobre como evitar a extinção 
da humanidade, diante da crise do clima, provocada 
pela lógica da mercadoria, do sistema capitalista. 
O autor utiliza a dicotomia ocidental entre 
“natureza” e “cultura” (que também é um problema 
antropológico ocidental), como ponto de partida 
para afirmar que os povos ameríndios não fazem a 
mesma separação entre humanidade e natureza. 
Afirma que essa distinção é meramente conceitual, 
e do mundo dos brancos, propondo que nossa 
existência como humanidade depende do aparato 
completo que só a natureza, na Terra, nos dá. O 
78
Anotações: livro “Ideias para adiar o fim do mundo” (2019) é 
uma mensagem de alerta e esperança, diante da 
predação da indústria, do consumismo e destruição 
do meio ambiente. Seu livro mais recente, intitulado 
“A vida não é útil” (2020), adota um tom mais 
duro, quase uma decepção com a humanidade, 
e principalmente com o Brasil – pois foi em parte, 
escrito durante a pandemia do coronavírus. 
É importante salientar que diversos povos 
do planeta vivenciaram tempos difíceis diante das 
incertezas da pandemia do coronavírus iniciada 
em 2019, com primeiros casos reportados pela 
China. Contudo, alguns grupos sociais foram mais 
vulneráveis do que outros, entre eles, os povos 
indígenas. Krenak (2020) reflete sobre como o 
drama vivenciado pela humanidade diante da 
COVID-19, é resultado da nossa relação predatória 
com a natureza e dos descasos sociais entre nós 
mesmos.
[Disseram] outro dia que brasileiros 
mergulham no esgoto e não acontece 
nada. O que vemos [...] é o exercício da 
necropolítica, uma decisão de morte. 
É uma mentalidade doente que está 
dominando o mundo. E temos agora 
esse vírus, um organismo do planeta, 
respondendo a esse pensamento 
doentio dos humanos com um ataque 
à forma de vida insustentável que 
adotamos por livre escolha, essa 
fantástica liberdade que todos 
adoram reivindicar, mas ninguém se 
pergunta qual o seu preço. Esse vírus 
está discriminando a humanidade. 
79
Anotações:Basta olhar em volta. O melão-de-
são-caetano continua a crescer aqui 
do lado de casa. A natureza segue. 
O vírus não mata pássaros, ursos, 
nenhum outro ser, apenas humanos. 
Quem está em pânico são os povos 
humanos e seu mundo artificial, 
seu modo de funcionamento que 
entrou em crise. É terrível o que 
está acontecendo, mas a sociedade 
precisa entender que não somos o 
sal da terra. Temos que abandonar 
o antropocentrismo; há muita vida 
além da gente, não fazemos falta na 
biodiversidade (KRENAK, 2020, p. 39).
Através desses exemplos, Krenak demonstra 
que a vida na Terra não se restringe à humanidade. 
Independente da nossa existência, as plantas, os 
animais e demais seres da natureza continuarão 
seus processos de desenvolvimento e existência. 
Portanto, o autor reforça a necessidade de uma 
visão contemporânea sobre o planeta, que incor-
pore o cuidado com a Terra. Assim, as reflexões 
dos povos ameríndios apresentam-se como novas 
perspectivas e desafios para a Antropologia.
80
Filmes para conferir:
O Enigma de Kaspar Hauser (Werner Herzog, 
1974): filme que retrata a vida de Kaspar, um rapaz 
criado longe da sociedade até a juventude, quando 
é deixado em uma cidade alemã. Ao longo do filme, 
o rapaz é tratado como um ser humano em estágio 
primitivo da humanidade, e são questionadas suas 
capacidades de socializar, aprender e interagir com 
outros humanos.
A última floresta (Luiz Bolognesi, 2021): 
documentário que narra a cosmologia e a luta do 
povo Yanomami na defesa de seu território e contra 
a destruição da Terra,através do olhar de Davi 
Kopenawa. 
Para seguir:
@campopodcast (ins-
tagram e spotify): pod-
cast com curadoria e 
pequenas aulas sobre 
autores e autoras clás-
sicas e contemporâneas 
da Antropologia. Idealizado 
por Carol Parreiras e Paula 
Maria.
81
U
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da
de
 3
Videoaula 1
Videoaula 2
84
85
FORMAÇÃO NACIONAL
Há uma ideia sobre a formação 
nacional que gira em torno da cor-
dialidade, das relações amistosas e 
pacíficas entre diferentes povos que 
constituiriam o que conhecemos 
como povo brasileiro. Contudo, essa 
ideia tem uma compreensão que foi 
internalizada pelo senso comum e 
por movimentos que apregoam a 
negação das diferenças sociais e do 
racismo, e outra que percebe a cor-
dialidade como um efeito corruptivo 
das relações hierárquicas no Brasil. 
Deixando de ser uma colônia portu-
guesa, a sociedade brasileira con-
PROBLEMAS 
SOCIAIS DO 
BRASIL
86
Anotações: quistou sua independência nacional em 1822, sob 
um regime monárquico. 
Suas bases socioeconômicas e políti-
cas repousavam na grande proprie-
dade rural, monocultora e exportadora 
de produtos primários para o mercado 
externo; na exploração extensiva de 
força de trabalho escrava, alimentada 
pelo tráfico internacional de negros 
desenraizados de suas tribos e comu-
nidades de origem no continente afri-
cano; na organização social estamen-
tal que estabelecia rígidas fronteiras 
hierárquicas entre brancos, herdeiros 
do colonizador português, negros es-
cravizados, homens livres destituídos 
da propriedade da terra e populações 
indígenas. Esses fundamentos soci-
ais conformaram uma vida associati-
va, isto é, padrões de socialidade e de 
sociabilidade constituída em torno do 
parentesco, da mescla de interesses 
materiais e morais, da indiferenciação 
entre as fronteiras dos negócios pú-
blicos e dos interesses privados, no 
adensamento da vida íntima, na in-
tensidade dos vínculos emocionais, 
no elevado grau de intimidade e de 
proximidade pessoais e na perspecti-
va de sua continuidade no tempo e no 
espaço, sem precedentes (ADORNO, 
2002, p. 84).
Por sua vez, o poder político encontrava seus 
fundamentos institucionais no patrimonialismo, 
87
Anotações:isto é, uma estrutura de dominação cuja legitimi-
dade se constrói tendo como bases as relações en-
tre grandes proprietários rurais, representantes do 
estado burocrático e clientelas locais mantidos a 
partir de trocas de favores ou de apoio político. 
Figura 6 - Abaporu, de Tarsila do Amaral (1928), 
símbolo do movimento modernista brasileiro, é 
usado para ilustrar a capa do livro “Raízes do 
Brasil”, de Sérgio Buarque de Hollanda
Fonte: Google.
Assim, um dos pontos de partida da formação 
do Brasil é sua relação com a “cordialidade”, conceito 
caracterizado por Sérgio Buarque de Holanda, 
em seu célebre livro “Raízes do Brasil”. Buarque 
de Hollanda tece diferentes pilares (raízes) do que 
constituiu o Brasil. Um desses pilares é o padrão de 
comportamento cordial, que envolve as relações 
estatais, burocráticas, numa teia de vínculos de 
88
Anotações: apadrinhamento e familiaridade. Em nível ideal, 
o Estado e suas relações não deveriam ser uma 
ampliação do círculo familiar ou da realização de 
vontades privadas. Buarque de Hollanda afirma que:
Não existe, entre o círculo familiar e o 
Estado, uma gradação, mas antes uma 
descontinuidade e até uma oposição. 
A indistinção fundamental entre as 
duas formas é o prejuízo romântico 
que teve os seus adeptos mais entusi-
astas durante o século XIX. De acordo 
com esses doutrinadores, o Estado e 
as suas instituições descendem em 
linha reta e, por simples evolução, da 
família. A verdade, bem outra, é que 
pertencem a ordens diferentes em es-
sência. Só pela transgressão da ordem 
doméstica e familiar é que nasce o Es-
tado e que o simples indivíduo se faz 
cidadão, contribuinte, eleitor, elegível, 
recrutável e responsável, ante as leis 
da Cidade. Há nesse fato um triunfo do 
geral sobre o particular, do intelectual 
sobre o material, do abstrato sobre o 
corpóreo e não uma depuração suces-
siva, uma espiritualização de formas 
mais naturais e rudimentares, uma 
procissão das hipóstases, para falar 
como na filosofia alexandrina. A ordem 
familiar, em sua forma pura, é abolida 
por uma transcendência (HOLLANDA, 
1995, p. 141).
Contudo, o autor vai demonstrar que o Brasil, 
diferente do modelo ideal das relações de Estado 
89
Anotações:e cidadania, terá a “cordialidade” como base 
civilizacional.
 
A contribuição brasileira para a 
civilização será de cordialidade — 
daremos ao mundo o “homem cordial”. 
A lhaneza no trato, a hospitalidade, a 
generosidade, virtudes tão gabadas 
por estrangeiros que nos visitam, 
representam, com efeito, um traço 
definido do caráter brasileiro, na 
medida, ao menos, em que permanece 
ativa e fecunda a influência ancestral 
dos padrões de convívio humano, 
informados no meio rural e patriarcal 
(idem, p. 146).
A cordialidade não é sinônimo de boas ma-
neiras, de relações de bom trato entre as pessoas. 
A noção de cordialidade percebida por Buarque 
de Hollanda, passa pelo esforço de, por meio de 
sutilezas cotidianas, estabelecer vínculos sociais 
que funcionem como meios de troca (de favores, 
cuidados, afetividades, obrigações). 
Na civilidade há qualquer coisa de 
coercitivo — ela pode exprimir-se em 
mandamentos e em sentenças. Entre 
os japoneses, onde, como se sabe, 
a polidez envolve os aspectos mais 
ordinários do convívio social, chega 
a ponto de confundir-se, por vezes, 
com a reverência religiosa. Já houve 
quem notasse este fato significativo, 
de que as formas exteriores de 
veneração à divindade, no cerimonial 
90
Anotações: xintoísta, não diferem essencialmente 
das maneiras sociais de demonstrar 
respeito. Nenhum povo está mais 
distante dessa noção ritualista da 
vida do que o brasileiro. Nossa forma 
ordinária de convívio social é, no 
fundo, justamente o contrário da 
polidez. Ela pode iludir na aparência — 
e isso se explica pelo fato de a atitude 
polida consistir precisamente em 
uma espécie de mímica deliberada de 
manifestações que são espontâneas 
no “homem cordial”: é a forma natural 
e viva que se converteu em fórmula 
(idem, p. 147).
Essa ambiguidade da “polidez” como narrada 
pelo autor, supõe que a gentileza seja um meio de 
proteção exterior, servindo, quando necessário, 
como uma ferramenta de existência. 
Equivale a um disfarce que permitirá 
a cada qual preservar inatas sua 
sensibilidade e suas emoções. Por 
meio de semelhante padronização das 
formas exteriores da cordialidade, que 
não precisam ser legítimas para se 
manifestarem, revela-se um decisivo 
triunfo do espírito sobre a vida. Armado 
dessa máscara, o indivíduo consegue 
manter sua supremacia ante o social. 
E, efetivamente, a polidez implica 
uma presença contínua e soberana do 
indivíduo (ibidem, p. 147).
Um exemplo citado por Buarque de Hollanda 
(1995) é o uso da terminação “inho”, aposta nas 
91
Anotações:palavras, que servem para criar mais familiaridade 
com as pessoas ou os objetos. “É a maneira de 
fazê-los mais acessíveis aos sentidos e também 
de aproximá-los do coração.” Podemos pensar nos 
desdobramentos dessa “cordialidade” nas relações 
de poder patrimonial e político, por exemplo. Há 
muitos casos em que um patrão que exerce grande 
domínio sobre uma mesma região, estabeleça 
vínculos de familiaridade com famílias ao redor, 
ampliando assim sua autoridade. O mesmo ocorre 
com políticos de perfil coronelista, aqueles que se 
mantêm por muitas décadas em posições de poder, 
por exercitarem essa dicotomia entre autoridade 
estatal e cordialidade familiar. 
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS NO BRASIL
Quando falamos de questões étnico-raciais 
no Brasil, é comum ouvirmos que não há racismo. 
Esta ideia é fruto de uma teoria que sofreu grande 
influência a partir da publicação de “Casa Grande e 
Senzala” (1933), de Gilberto Freyre. Nessa época, em 
virtude da formação da identidade nacional, havia 
inquietações acerca deo que constituiria o ethos 
da sociedade brasileira. Nesse livro, Freyre trazia a 
ideia de que a miscigenação brasileira possibilitou 
um convívio harmonioso entre as diferentes 
raças que compunham o povoamento do Brasil. 
Sendo assim, a interpretação dominante sobre a 
realidade brasileira passou a produzir um discurso 
negacionista em relação às desigualdades raciais, 
reforçando a ideia de que a convivência entre as “três 
raças” (indígenas, negros e brancos) era pacífica e, 
portanto, estávamos sob uma “democracia racial”. 
92
Anotações: A quebra desse paradigma higienizador sobre 
as relações étnico-raciais no Brasil, se dá a partir 
da obra de Florestan Fernandes, “A integração do 
Negro na Sociedade de Classes”. Essa obra buscou 
compreender o que resulta do encontro dos negros, 
mulatos e brancos, a partir da promulgação da Lei 
Áurea, de abolição da escravatura, em 1888. Foi um 
contraponto à tese freyriana de que as relações 
entre brancos e negros, casa grande e senzala, 
eram complementares, tendo contribuído com 
a formação de uma identidade nacional (mito da 
democracia racial).
Florestan (2008) afirma que o processo de 
“integração” de pessoas negras foi desde o princípio 
deformador, e que não era possível se pensar que 
o cruzamento ou o processo de branquização que 
ocorrera no “meio negro” havia sido tão eficiente 
para se pensar numa “democracia racial”.
Sofrimento na adaptação dos recém-
libertos negros e mulatos às novas 
circunstâncias para as quais foram 
irreversivelmente empurrados. 
Não havia mais um lugar para eles; 
sua importância acabara com o 
fim da escravidão. Ora, o negro não 
estava acostumado a muitas coisas, 
inclusive, à liberdade. Depois de 
tanta dor diante da exploração cativa, 
longe das escolhas, do encontro com 
o outro, fosse ele branco ou mesmo 
negro, o despreparo moral e material 
era real e inevitável. Diante do 
infortúnio experimentado pelo “meio 
negro,” irá se registrar (nas décadas 
93
Anotações:seguintes a Abolição) um “déficit 
negro” perceptível na cidade de São 
Paulo (FERNANDES, 2008, p. 27).
Florestan analisa alguns dados censitários 
e faz algumas considerações sobre as causas da 
baixa demográfica do “elemento negro” em centros 
urbanos. Em primeiro lugar, ele esclarece que: 
A baixa no índice vegetativo não foi 
tão alarmante, nem aconteceu pelas 
causas que se imaginou durante 
muito tempo. E, para ser bem 
compreendida, deveria ser pensado 
em conformidade com a alteração 
da estrutura demográfica da cidade 
de São Paulo. Ou seja, a cidade vai 
receber no período do final do século 
XIX e início do século XX uma grande 
quantidade de imigrantes europeus 
(brancos), e isso vai representar um 
salto enorme na população de São 
Paulo (idem, p. 30).
A ideia de cruzamento entre as raças (como 
parte de um processo de branquização), mesmo 
sendo pequeno, também terá sua importância. 
Muitos indivíduos de pele mais clara e de condições 
socioeconômicas melhores irão mudar de catego-
ria racial e algumas vezes, aceitos, inclusive, em 
relações matrimoniais pelos brancos. Florestan 
também salienta a discrepância das informações 
sobre a cor das crianças nos registros de nasci-
mento. Muitas crianças mulatas eram declaradas 
como brancas ao nascer, mas os óbitos continu-
94
Anotações: avam sendo fiéis à cor dos indivíduos (declaradas 
como negras/mulatas quando mortas).
 Dessa forma, começou a ter um número 
muito pequeno de nascimentos discrepantes em 
relação ao número de mortes. No entanto, como 
já fora mencionado, o decréscimo na população de 
cor existiu, mas não atingiu proporções alarmantes 
e também não foi causado por inadaptabilidade 
dos negros e mulatos às precárias condições 
de existência em relação aos brancos. Esse não 
foi o maior problema que os negros e mulatos 
enfrentaram em sua luta por sobrevivência no 
mundo do branco.
Negritude, identidade e racismo
Se o processo de construção da identidade 
nasce a partir da tomada de consciência das 
diferenças entre “nós” e “outros”, para Munanga 
(2012, p. 06), “o grau dessa consciência é idêntico 
entre todos os negros, considerando que todos 
vivem em contextos socioculturais diferenciados.” 
O essencial para cada povo é reen-
contrar o fio condutor que o liga a seu 
passado ancestral o mais longínquo 
possível. A consciência histórica, pelo 
sentimento de coesão que ela cria, 
constitui uma relação de segurança 
a mais certa e a mais sólida para o 
povo. É a razão pela qual cada povo 
faz esforço para conhecer sua verda-
deira história e transmiti-la às futu-
ras gerações. Também é a razão pela 
qual o afastamento e a destruição da 
95
Anotações:consciência histórica eram uma das 
estratégias utilizadas pela escravidão 
e pela colonização para destruir a 
memória coletiva dos escravizados 
e colonizados. Nas bases populares 
negras sem vínculos com as comuni-
dades religiosas de matriz africana, a 
consciência histórica e, consequen-
temente, a identidade se diluíriam nas 
questões de sobrevivência que toma 
o passo sobre o resto e pode desem-
bocar num outro tipo de identidade: a 
da consciência do oprimido economi-
camente e discriminado racialmente. 
Na militância negra há uma tomada 
de consciência aguda da perda da 
história e, consequentemente, a bus-
ca simbólica de uma África idealizada 
(MUNANGA, 2012, p. 7).
Munanga (2012) também questiona o fator psi-
cológico que gera questionamentos sobre o tem-
peramento do negro, que é diferente do tempera-
mento do branco e, se isso, pode ser considerado 
como marca da identidade negra. Muitas relações 
são feitas entre pessoas negras e atitudes tidas 
como grosseiras (“a preta é braba”, “o negro briguen-
to). Ele não nega que possam existir diferenças de 
temperamento relacionadas à negritude, mas es-
clarece que se essa diferença realmente existir, 
suas causas são “o condicionamento histórico do 
negro e de suas estruturas sociais comunitárias, e 
não com base nas diferenças biológicas como pen-
sariam os racialistas” (2012, p. 08).
96
Anotações: Se historicamente a negritude é, 
sem dúvida, uma reação racial negra 
a uma agressão racial branca, não 
poderíamos entendê-la e cercá-la 
sem aproximá-la do racismo do qual 
é consequência e resultado. Para ser 
racista, coloca-se como postulado 
fundamental a crença na existência 
de “raças” hierarquizadas dentro da 
espécie humana. De outro modo, no 
pensamento de uma pessoa racista 
existem raças superiores e raças infe-
riores. Em nome das chamadas raças, 
inúmeras atrocidades foram cometi-
das nesta humanidade: genocídio 
de milhões de índios nas Américas, 
eliminação sistemática de milhões de 
judeus e ciganos durante a Segunda 
Guerra Mundial. Como se não bastasse 
o antissemitismo, a persistência dos 
mecanismos de discriminação racial 
na África do Sul durante a Apartheid, 
nos Estados Unidos, na Europa e em 
todos os países da América do Sul 
encabeçados pelo Brasil e em outros 
cantos do mundo demonstra clara-
mente que o racismo é um fato que 
confere à “raça” sua realidade política 
e social (idem, p. 08-09).
Ou seja, se cientificamente a realidade da 
raça é contestada, política e ideologicamente 
esse conceito é muito significativo, pois funciona 
como uma categoria de dominação e exclusão 
nas sociedades multirraciais contemporâneas 
observáveis. Crítica observada na tirinha. 
97
Anotações:
Fonte: Laerte, 2012.
Um dos dilemas da questão racial brasileira é 
a desigualdade econômica, como salienta o verso 
da canção de Caetano Veloso e Gilberto Gil, “E quase 
brancos, quase pretos de tão pobres são tratados”: 
os oprimidos brancos da sociedade não têm 
consciência de que a exclusão política e econômica 
do negro, por motivos racistas, só beneficia a classe 
dominante, o que torna difícil, senão impossível, 
sua solidariedade com o oprimido negro; além 
disso, eles mesmos são racistas pela educação e 
pela socialização recebidas na família e na escola.
Os que pensam que a situação do ne-
gro no Brasil é apenas uma questãoeconômica, e não racista, não fazem 
esforço para entender como as práti-
cas racistas impedem ao negro o 
98
Anotações: acesso na participação e na as-
censão econômica. Ao separar raça 
e classe numa sociedade capitalis-
ta, comete-se um erro metodológi-
co que dificulta a sua análise e os 
condena ao beco sem saída de uma 
explicação puramente economicista 
(idem, p. 14).
Entre os povos indígenas, as questões étni-
co-raciais passam pelo apagamento identitário e 
pelos problemas de casamentos entre indígenas 
e brancos. Essa questão aparece na literatura 
antropológica como contato interétnico, que no 
início tinha interesse em compreender se os indí-
genas sofriam processos de “aculturação” a partir 
do contato e construção de novas relações com os 
brancos. A identidade das crianças nascidas dos 
relacionamentos entre índias e brancos é obje-
to de controvérsia na etnologia brasileira, por se 
tratar de uma questão sempre em disputa e nego-
ciação.
Esses filhos de indígenas com brancos são 
chamados de “caboclos”, e seu pertencimento 
gera polêmicas entre as famílias indígenas, pois 
geralmente são filhos de mulheres indígenas, em 
contextos onde o pertencimento étnico passa pela 
linhagem paterna. Em alguns grupos, essas regras 
sociais são renegociadas, para que os filhos de 
mulheres indígenas com homens brancos, possam 
ter o reconhecimento étnico assegurado.
99
Anotações:
CONFLITOS AGRÁRIOS E AS LUTAS 
PELA TERRA
Os conflitos pelo direito à terra são muito 
antigos no Brasil e tiveram seu ápice após a 
abolição da escravatura. A população negra, até ali 
escravizada, tinha seu trabalho ligado à produção 
agrícola. Com o fim da escravidão e a substituição 
pela mão de obra migrante (predominantemente 
italiana) nas fazendas e cafezais, essa população 
negra ficou totalmente desamparada, sem uma 
redistribuição das terras nos espaços rurais do 
país, e sobrecarregando as margens das cidades 
que começavam a se reconfigurar diante da lenta 
industrialização nacional.
Um dos primeiros movimentos sociais 
importantes para a configuração das lutas pelo 
direito à terra e reforma agrária no Brasil foram 
as Ligas Camponesas, que eram associações de 
trabalhadores rurais criadas, inicialmente, no 
estado de Pernambuco, posteriormente na Paraíba, 
no estado do Rio de Janeiro, Goiás e em outras 
regiões do Brasil, que exerceram intensa atividade 
no período que se estendeu de 1955 até a queda de 
João Goulart em 1964.
O movimento que se tornou nacionalmente 
conhecido como “ligas camponesas,” iniciou-se 
de fato, com 140 famílias no engenho Galileia, em 
Vitória de Santo Antão, em Pernambuco tendo sido 
criado no dia 1º de janeiro de 1955 com o nome de 
Sociedade Agrícola e Pecuária de Plantadores de 
Pernambuco (SAPPP). 
O processo iniciado em 1955 desencadeou 
novos núcleos até o início dos anos 60. 25 núcleos 
100
Anotações: foram instalados no estado, com predominância 
visível da Zona da Mata e do Agreste sobre o 
Sertão. Dentre esses núcleos, destacavam-se 
os de Pau d’Alho, São Lourenço da Mata, Escada, 
Goiana e Vitória de Santo Antão. A partir de 1959, 
as ligas camponesas se expandiram rapidamente 
em outros estados, como a Paraíba, estado do Rio 
(Campos) e Paraná, aumentando o impacto político 
do movimento. 
Dentre esses núcleos, o mais importante foi 
o de Sapé, na Paraíba, o mais expressivo e o maior 
de todos. A expansão da Liga de Sapé acelerou-se a 
partir de 1962, quando foi assassinado seu principal 
líder, João Pedro Teixeira, a mando do proprietário 
local. Pouco depois esse núcleo congregava cerca 
de dez mil membros, enquanto outros núcleos iriam 
se espalhar pelos municípios limítrofes.
De um modo geral, as associações criadas 
tinham caráter civil, voluntário e por isso mesmo 
dependiam de um estatuto e de seu registro em 
cartório. Para constituir legalmente uma liga, bas-
tava aprovar um estatuto, registrá-lo na cidade 
mais próxima e lá instalar a sua sede. As finalidades 
das ligas eram prioritariamente assistenciais, so-
bretudo jurídicas e médicas, e ainda de autodefesa, 
nos casos graves de ameaças a quaisquer de seus 
membros. As lideranças pretendiam também, a 
médio e longo prazos, fortalecer a consciência dos 
direitos comuns, que compreendiam a recusa em 
aceitar contratos lesivos, dia de trabalho gratuito 
para aqueles que cultivavam a terra alheia e outras 
prestações de tipo “feudal”.
Nesse momento, o uso do termo “camponês” 
constituiu-se, no Brasil, como categorias unitárias 
101
Anotações:para classificar diferentes modos de trabalho sobre 
a terra, com o intuito de unificar trabalhadores 
rurais em oposição aos “latifundiários” (os donos 
da terra — grandes propriedades rurais — que não 
exerciam seu trabalho sobre ela). A desagregação 
do movimento, em 1964, eliminou as organizações, 
mas não desarticulou suas reivindicações básicas, 
que seriam incorporadas pelos sindicatos rurais 
no período seguinte (1965-1983). Convém notar que 
esses sindicatos rurais têm sido, particularmente, 
ativos nas antigas zonas de influência das ligas.
A ditadura militar, com início em 1964, forçou 
e perseguiu as lideranças que compunham as ligas 
camponesas. Um documentário clássico sobre 
o impacto da ditadura sobre os movimentos de 
reforma agrária no Brasil é “Cabra Marcado para 
Morrer”, de Eduardo Coutinho. Além de narrar de 
forma brilhante como se deu a expansão das ligas, 
Coutinho segue os rastros de Elisabete Teixeira, 
esposa de João Pedro Teixeira, assassinado a 
mando dos coronéis. 
Nos últimos 30 anos, próximo ao fim da 
Ditadura Militar, os movimentos pela terra ganharam 
novas configurações no Brasil. O Movimento dos 
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) é, sem 
dúvida, o movimento sindical mais influente na vida 
rural brasileira, que tem como principal bandeira a 
reforma agrária. Sigaud (2004), ao explicar como 
funcionam os acampamentos e a estrutura de 
organização do MST, afirma: 
A partir do final dos anos 70 as ocu-
pações foram retomadas no sul do 
país e estiveram associadas à insta-
lação de acampamentos com deze-
102
Anotações: nas, centenas de famílias. As pri-
meiras foram organizadas por jovens 
filhos de pequenos produtores, com 
apoio da Comissão Pastoral da Ter-
ra (CPT), vinculada à Igreja Católica. 
Foi este núcleo que criou, em 1984, o 
MST. Em meados da década de 80 há 
registros de ocupações em vários es-
tados brasileiros, graças a uma políti-
ca de expansão da organização. Em 
1993, o Congresso Nacional estabele-
ceu que a improdutividade das terras 
caracterizava o não cumprimento da 
função social da propriedade, caso 
previsto pela Constituição de 1988 
para proceder à desapropriação. As 
ocupações generalizaram-se em todo 
o país. Durante o período, o Instituto 
Nacional da Reforma Agrária (INCRA), 
que até então tinha uma atuação 
modesta, começou a desapropriar 
as terras ocupadas e as redistribuiu 
entre os que estavam nos acampa-
mentos, tornando-os titulares de uma 
parcela de terra. As ocupações, os 
acampamentos e as desapropriações 
indicam uma inflexão no modo de pro-
ceder das diversas organizações no 
mundo rural e do Estado. Daí poder-se 
falar de um fato novo (p. 11).
A Reforma Agrária, por sua vez, consiste na 
reivindicação pelo reordenamento e redistribuição 
de terras improdutivas, ou grandes hectares de 
terra que são usados de maneira industrial para 
produção de um só produto que visa o lucro de 
103
Anotações:uma pessoa ou família. A ideia de Reforma Agrária 
também está vinculada ao tipo de trabalho sobre a 
terra, uma disputa entre o mercado agroindustrial 
brasileiro e as famílias agricultoras (agricultura 
familiar, modelos de produção orgânica de 
alimentos, agriculturas de subsistência. O Estado 
brasileiro tem conferido legitimidade à pretensão 
dos movimentos, ao desapropriar as fazendas 
ocupadas e redistribuir as terras entre os que 
se encontram nos acampamentos. Utilizando o 
exemplo da Zona Rural pernambucana, Sigaud 
(2004) explica como ocorreram as disputasem 
torno da terra e dos modelos de produção rural.
No final da década de 80, o Governo 
brasileiro alterou as diretrizes em 
relação à agroindústria açucareira, 
no bojo de uma política mais geral 
de retirada do Estado da economia: 
suprimiu os subsídios que há déca-
das garantiam o preço da cana e do 
açúcar; privatizou as exportações; 
e permitiu a elevação da taxa de ju-
ros. Estas medidas, assim como uma 
grande seca ocorrida no período, 
desencadearam uma crise no setor. 
Muitos patrões não lograram adap-
tar-se à falta de proteção do Esta-
do e faliram. Outros tantos trataram 
de se reestruturar. Milhares de tra-
balhadores perderam o emprego, 
quer pela falência dos patrões, quer 
pela redução dos efetivos promovi-
da pelas empresas. No final dos anos 
90, das quatro usinas que exploram 
a cana na área estudada apenas uma 
104
Anotações: estava em situação tida como sólida 
e equilibrada. A segunda saía de um 
pedido de concordata; a terceira não 
havia moído na safra de 96-97 e desde 
1995 não pagava regularmente seus 
trabalhadores; a quarta entregara ao 
Banco do Brasil treze de seus enge-
nhos para pagar dívidas e habilitar-se 
a novos empréstimos (p. 15).
Um dos argumentos contra os movimentos 
de ocupação de Terras no Brasil, é de que os acam-
pamentos seriam realizados em espaços produti-
vos, portanto, prejudicariam a economia nacional. 
Sigaud (2004) demonstra que as usinas de produção 
de cana-de-açúcar, ocupadas pelos acampamen-
tos do MST, nos anos 90, já tinham baixas taxas de 
produção. Isso demonstra que o Movimento dos 
Trabalhadores Rurais Sem Terra estava organizado 
para ocupar, primordialmente, as terras improduti-
vas. Vale ressaltar, que os acampamentos são orga-
nizados para produzir alimentos orgânicos a partir 
de “agricultura familiar”, modelo econômico em que 
as famílias produzem alimentos para subsistência, 
com excedente de produção limitado para troca e 
venda.
Nesse contexto, o MST trouxe a tecnologia 
apropriada para ocupar terras, montar e administrar 
os acampamentos, tendo as ocupações dos anos 
90 como marcos inaugurais do movimento. O 
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra 
buscou recrutar jovens com objetivo de montar 
uma rede de militantes que passaram a atuar na 
área a serviço do movimento e de suas ocupações.
Esse modelo de organização das lutas pela 
terra, a partir dos anos 80, passou a perceber a 
105
Anotações:continuidade dos acampamentos de ocupação 
como meio de adquirir o reconhecimento do 
Estado sobre a propriedade. Isso ocorre a partir 
de uma série de disputas políticas e jurídicas em 
torno de como a propriedade foi adquirida, como 
os regimes de trabalho são administrados. O INCRA 
passou, então, a consolidar “assentamentos rurais”, 
reconhecendo os direitos de propriedade para 
muitos grupos “sem-terra” e comunidades.
CIDADES E VIOLÊNCIA URBANA
Os processos de urbanização do Brasil são, 
quase todos, iniciados por uma elite agrária — com 
cidades em zonas portuárias, ou industrial — que 
moldou as principais metrópoles modernas. O 
crescimento das cidades é absolutamente desigual, 
gerando problemas de moradia, de distribuição de 
condições básicas de sobrevivência como rede de 
esgoto, problemas de infraestrutura, mobilidade 
urbana e formação de guetos do crime organizado. 
Dessa forma Milton Santos, geógrafo que se 
especializou em compreender como a globalização 
e a modernidade afetaram as cidades brasileiras, 
explica: 
Alcançamos, neste século, a ur-
ba-nização da sociedade e a ur-
banização do território, depois de 
longo período de urbanização so-
cial e territorialmente seletiva. De-
pois de ser litorânea (antes e mesmo 
depois da mecanização do território), 
a urbanização brasileira se tornou 
praticamente generalizada a partir do 
106
Anotações: terceiro terço do século XX, evolução 
quase contemporânea da fase atual 
de macrourbanização e metropoli-
zação. O turbilhão demográfico e a 
terciarização são fatos notáveis. A 
urbanização se avoluma e a residên-
cia dos trabalhadores agrícolas é 
cada vez mais urbana. Mais que a 
separação tradicional entre um Bra-
sil urbano e um Brasil rural, há, hoje, 
no País, uma verdadeira distinção en-
tre um Brasil urbano (incluindo áreas 
agrícolas) e um Brasil agrícola (in-
cluindo áreas urbanas). Registra-se, 
todavia, uma atenuação relativa das 
macrocefalias, pois além das cidades 
milionárias desenvolvem-se cidades 
intermediárias ao lado de cidades 
locais, todas, porém, adotando um 
modelo geográfico de crescimento 
espraiado, com um tamanho desme-
surado que é causa e é efeito da espe-
culação (SANTOS, 1993, p. 9).
Entre esses diversos problemas enumerados, 
talvez o mais contingente seja o aumento da 
violência urbana gerada por fatores estruturais da 
desigualdade brasileira, como o acesso aos direitos 
básicos (educação, alimentação, saúde, esporte e 
lazer). 
A sociedade brasileira, egressa do 
regime autoritário, há duas décadas, 
vem experimentando, pelo menos, 
quatro tendências: a) o crescimento 
da delinquência urbana, em especial 
107
Anotações:dos crimes contra o patrimônio (rou-
bo, extorsão mediante sequestro) e 
de homicídios dolosos (voluntários); 
b) a emergência da criminalidade or-
ganizada, em particular em torno do 
tráfico internacional de drogas, que 
modifica os modelos e perfis con-
vencionais da delinquência urbana 
e propõe problemas novos para o 
direito penal e para o funcionamen-
to da justiça criminal; c) graves vio-
lações de direitos humanos que com-
prometem a consolidação da ordem 
política democrática; d) a explosão 
de conflitos nas relações intersub-
jetivas, mais propriamente conflitos 
de vizinhança que tendem a conver-
gir para desfechos fatais. Trata-se 
de tendências que, conquanto rela-
cionadas entre si, radicam em cau-
sas não necessariamente idênticas 
(ADORNO, 2002, p. 84).
A metrópole torna-se o lugar privilegiado do 
capital, onde se colocam todos os recursos, para 
onde as pessoas migrarão em busca de trabalho, 
e onde, consequentemente, muitas pessoas, sem 
espaço nos meios de trabalho formais, realizarão 
uma série de atividades tidas como marginais, 
seja do ponto de vista das tecnologias, seja na 
perspectiva das leis e fiscalizações.
Ao mesmo tempo, os investimentos e gastos 
na cidade, terão como prioridade os interesses 
econômicos hegemônicos: a população sem acesso 
aos bens, serviços e direitos sociais, permanecerá 
marginalizada, ampliando as crises nas cidades. 
108
Anotações: Mesmo que algumas atividades comecem a 
crescer, persistirão a pobreza e a desigualdade, 
uma vez que sem investimentos, sem nivelação 
técnica e educacional, a população pobre terá suas 
condições de existência cada vez mais degradadas. 
A violência letal produzida intencionalmente, 
a circulação de armas e a facilitação de sua 
comercialização são desafios para as instituições 
democráticas do Brasil, atualmente. Mais do 
que meros problemas de segurança pública, a 
concentração de assassinatos letais em territórios 
urbanos demonstra como estão localizadas as 
ações de grupos armados e seus domínios em 
zonas e bairros das cidades. 
Seja pela constante ameaça ou mes-
mo pelo uso concreto da violência, 
tais grupos controlam diversos tipos 
de negócios legais e ilegais nesses 
territórios, garantindo lucros eleva-
dos para a sustentação e expansão 
de suas atividades, corroendo a insti-
tucionalidade democrática em nível 
local e apelando para a flexibilização 
do monopólio legítimo da força pelo 
Estado. Nos territórios onde exercem 
ou disputam o poder com os rivais, 
porém, o resultado é parecido: esses 
grupos acabam impondo o silêncio 
forçado aos moradores, que pre-
cisam se conformar a viver rotinas 
de tiroteios e de corpos amanheci-
dos nas ruas, como se seus bair-
ros estivessem fadados a seguir 
sob uma sombra eterna, inalcança-
dos pelo Estado de direito e pela 
109
Anotações:Justiça. (...) Quando esses grupos 
são mais bem estruturados,como 
ocorre no Rio de Janeiro, tendem 
a funcionar como uma espécie de 
governo territorial ilegal, assumindo 
o monopólio do uso da força em 
seus territórios e desenvolvendo 
com a população uma relação ao 
mesmo tempo tirânica, paternalista 
e clientelista. Na capital fluminense, 
nas centenas de bairros controlados 
pelas facções criminosas — Comando 
Vermelho, Terceiro Comando Puro, 
Amigo dos Amigos e os grupos para-
militares — o poder político tende a 
ser medido pela quantidade de fuzis 
que tais grupos têm para se defender 
(MANSO e ZILLI, 2021, p. 09).
A violência urbana insere-se nas relações 
da cidade de tal modo, que seu funcionamento, 
suas interações e seus modos de agir, tornam-
se parte da rotina da cidade. Tiros a luz do dia, a 
possibilidade de furtos e assaltos nos meios de 
transporte públicos, as grandes ações de grupos 
criminosos organizados em certos períodos de 
tempo ao longo dos anos, dão o tom da presença 
cotidiana da violência nas metrópoles. 
As forças policiais, que deveriam atuar, estra-
tegicamente, para o rastreio e contenção de grupos 
e sujeitos que se posicionam tiranicamente sobre 
certos territórios urbanos, por vezes são mais um 
grupo que utiliza da violência (do poder de polícia e 
do porte de armas de fogo) para aterrorizar a popu-
lação disputando o poder local. Não só adotam uma 
110
Anotações: violência policial deliberada, mais também agem 
como grupos criminosos organizados, ou milícias, 
aproveitando o status de agentes públicos. Com 
isso, fragilizam ainda mais a credibilidade das insti-
tuições de ordem do Estado, que representam.
Para Santos (1993), a cidade em si, como 
relação social e como materialidade, torna-se 
criadora de pobreza, tanto pelo modelo socioeco-
nômico de que é o suporte como por sua estrutura 
física, que faz dos habitantes das periferias (e dos 
cortiços) pessoas ainda mais pobres. A pobreza não 
é apenas o fato do modelo socioeconômico vigen-
te, mas, também, do modelo espacial.
A AMAZÔNIA NO DEBATE SOCIAL
A análise sobre a Amazônia brasileira quase 
sempre privilegia dois temas: a natureza e o que, ge-
nericamente poderíamos chamar de Amazônia Ofi-
cial, ou seja, a Amazônia dos Grandes Projetos. Essas 
abordagens, embora importantes, são limitadas. Na 
primeira, considera-se território apenas do ponto 
de vista da natureza, tornando-o inócuo, pois são 
as relações sociais que o constroem, ou destro-
em, inventam-no e o reconstroem num processo 
que pressupõe conflitos, contradições e lutas dos 
sujeitos. Na segunda, é preciso reconhecer que o 
processo de transformação ocorrido na Região de-
terminou novos significados para as cidades, no 
entanto, parte significativa da Amazônia não foi 
atingida por este processo o que não quer dizer 
que não seja influenciada por ele. 
Becker (2005) afirma que existem dois 
movimentos internacionais em torno da Amazônia. 
111
Anotações:O primeiro se dá em nível do sistema financeiro, 
da informação, do domínio do poder efetivamente 
das potências; o segundo tem relação com a 
internacionalização dos movimentos sociais, por 
meio de ONGs, por exemplo: 
Todos os agentes sociais organizados, 
corporações, organizações religiosas, 
movimentos sociais etc., têm suas 
próprias territorialidades, acima e 
abaixo da escala do Estado, suas 
próprias geopolíticas, e tendem a se 
articular, configurando uma situação 
mundial bastante complexa (p. 72).
O povoamento da Amazônia e seu desenvolvi-
mento foram fundados a partir de um paradigma de 
relação entre sociedade e exploração da natureza. 
Essa lógica encara o desenvolvimento como linear 
(sempre adiante, sempre em “progresso”) assim 
como, encara os recursos naturais como infinitos, 
o que sabemos ser uma lógica equivocada. 
É imperativo o uso não predatório 
das fabulosas riquezas naturais que a 
Amazônia contém e também do saber 
das suas populações tradicionais que 
possuem um secular conhecimento 
acumulado para lidar com o trópico 
úmido. Já há na região resistências à 
apropriação indiscriminada de seus 
recursos e atores que lutam pelos 
seus direitos (idem, p. 72).
Outra posição sobre a Amazônia, diferente 
daquela de caráter mais desenvolvimentista 
112
Anotações: é a percepção de seu território como uma 
imensa unidade de conservação, que deve ser 
preservada integralmente, com vistas a assegurar 
a sobrevivência do planeta, devido aos danos 
provocados pelo desmatamento e exploração de 
recursos minerais sobre o clima e a biodiversidade. 
A natureza foi reavaliada e revalori-
zada a partir de duas lógicas muito 
diferentes, mas que convergem para 
o mesmo projeto de preservação 
da Amazônia. A primeira lógica é a 
civilizatória ou cultural, que possui 
uma preocupação legítima com a 
natureza pela questão da vida, o que 
dá origem aos movimentos ambien-
talistas. A outra lógica é a da acumu-
lação, que vê a natureza como recur-
so escasso e como reserva de valor 
para a realização de capital futuro, 
fundamentalmente no que tange ao 
uso da biodiversidade condicionada 
ao avanço da tecnologia. Outro recur-
so de que pouco se fala, mas que já é 
fundamental, é a água como fonte de 
vida e de energia em razão dos isóto-
pos de hidrogênio, questão teórica 
ainda não solucionada, mas que vem 
sendo pesquisada em muitos países, 
especialmente na Alemanha e nos 
EUA (BECKER, 2005, p. 74).
Uma postura de oposição à preservação 
da Amazônia são os avanços e investimentos 
em maquinários avançados para o agronegócio. 
Com o crescimento da produção e o aumento da 
113
Anotações:produtividade da soja, a terra não é mais ocupada 
como reserva de valor, como foi na época da 
fronteira anterior. Agora o que sucede é o uso 
produtivo da terra. Acrescem mudanças também na 
pecuária, principalmente no Sudeste do Pará e no 
Mato Grosso, onde ocorrem melhorias com respeito 
às pastagens, aos rebanhos e à indústria de couro 
e de leite. Mudanças bastante significativas em 
termos econômicos. As redes e cidades permitem 
a expansão dessa área econômica avançada que é 
chamada de “arco de fogo”, ou do desmatamento ou 
“de terras degradadas”, porque foi onde se expandiu 
a fronteira e o desmatamento. Como proposta 
diante dessas posturas, quase sempre externas, 
sobre a Amazônia, Becker (2005) sugere que:
Se a Amazônia é efetivamente uma 
região, então há que se substituir a 
política de ocupação por uma políti-
ca de consolidação do desenvolvi-
mento. Uma política de ocupação 
não tem mais cabimento, porque a 
região já está ocupada. As florestas 
que restaram devem permanecer 
com seus habitantes. É necessário 
articular os diferentes projetos e os 
diversos interesses e conflitos que 
incidem na região (p. 83).
Oliveira (2004) argumentava que as taxas de 
crescimento da população urbana da Amazônia, 
(Região Norte) na última década foram superiores 
à média nacional, mesmo assim, o grau de 
urbanização é o menor do Brasil, com distribuição 
desigual da população, concentrada principalmente 
114
Anotações: nas capitais. Com exceção do Pará, nenhum dos 
demais Estados da Região apresentava em 1991, 
outras cidades que não as capitais com mais de 100 
mil habitantes. 
No caso apresentado por Oliveira (2004), 
a cidade de Manaus, capital do Amazonas, 
concentrava até os anos 2000 quase a metade da 
população de todo o Estado. Atualmente, esses 
dados mantêm praticamente o mesmo padrão, ou 
seja, Manaus é a capital mais populosa da região 
Norte do Brasil e concentra 52,8% da população 
do Estado do Amazonas (IBGE, 2021). Com mais 
da metade da população amazônica residindo nas 
cidades é, especialmente, nas pequenas cidades, 
que os problemas urbanos são percebidos de 
forma mais intensa, com as ausências de políticas 
públicas e desigualdades amplificadas.
115
Filmes para conferir:
Cidade de Deus (Fernando Meireles, 2002): 
através de diferentes linhas narrativas, o filme 
demonstra a formação das favelas no Rio de Janei-
ro, a violência urbanadecorrente da desigualdade 
social e do racismo.
Auto de Resistência (Natasha Neri e Lula 
Carvalho, 2019): no Rio de Janeiro, mais de 16.000 
inocentes foram mortos em operações policiais nos 
últimos vinte anos, todos sob o argumento policial 
de legítima defesa. Este filme segue as mães das 
vítimas de violência policial enquanto elas lutam 
por justiça contra um sistema corrupto e brutal.
Cabra marcado para morrer (Eduardo 
Coutinho, 1984): em 1964, um filme sobre a vida 
de João Pedro Teixeira, líder da liga campone-
sa de Sapé, Pernambuco, começa a ser roda-
do, com a reconstituição ficcional da ação 
política que levou 
ao assassinato. As 
filmagens são inter-
rompidas pelo golpe 
militar de 1964, com 
captura de alguns rolos 
de filmes e perseguição à 
viúva de João Pedro, Elisa-
beth Teixeira. Dezessete anos 
depois, em 1981, Eduardo Coutinho 
retoma o projeto em busca de Elisa-
beth Teixeira e outros participantes do 
filme interrompido.
116
Para seguir:
Amazônia Real (amazoniareal.com.br): edita-
do por Elaíze Farias e Kátia Brasil, o portal jornalísti-
co tem foco em grandes coberturas sobre a região 
Norte do Brasil, especialmente nos temas “meio 
ambiente”, “povos indígenas” e “cultura”. Vencedo-
ras dos prêmios “Rei da Espanha de Meio de Co-
municação de Maior Destaque da Ibero-América” 
(2019), Jornalismo Multimídia do 41º Prêmio Vladimir 
Herzog de Anistia e Direitos Humanos (2019), e prê-
mio especial da Associação Brasileira de Jornalis-
mo Investigativo – Abraji (2021).
117
Anotações:
118
Anotações:
U
ni
da
de
 4
Videoaula 1
Videoaula 3
Videoaula 2
Videoaula 4
120
Anotações:
121
DIREITOS HUMANOS E JUSTIÇA
As consequências da Segunda Guer-
ra deixaram a Europa devastada. Milhões 
de mortos, muitas pessoas em situação 
de miséria e fome, e milhares de civis que 
tiveram algum direito violado por ataques, 
ações ou crimes de guerra. A Declaração 
Universal dos Direitos Humanos surge 
como uma resposta global a essas vio-
lações, principalmente o extermínio de ju-
deus, negros, homossexuais e outras mi-
norias, durante a Segunda Guerra Mundial. 
DESIGUALDADES 
SOCIAIS E DIREITOS 
HUMANOS
122
Anotações: Representantes de 50 países reuniram-se para 
elaborar um organismo mundial que visava a garantir 
a paz e o respeito entre os povos, que viria a ser a 
Organização das Nações Unidas (ONU). A primeira 
ação elaborada foi a formação de uma Comissão de 
Direitos Humanos da ONU, que ficaria responsável 
pela redação de um documento prescritivo para 
listar todos os direitos fundamentais dos seres 
humanos. Em 1948, a Declaração Universal dos 
Direitos Humanos foi concluída e aprovada durante a 
Assembleia Geral da ONU naquele mesmo ano.
Atualmente, 193 países são signatários da 
ONU. Isso significa que, entre outras coisas, eles 
devem garantir em seus territórios o respeito aos 
direitos básicos dos cidadãos. Não há uma maneira 
expressa e objetiva da organização fiscalizar e 
regular o cumprimento dos Direitos Humanos, mas 
as legislações da maioria dos países ocidentais 
democráticos, bem como seus sistemas judiciários, 
recorrem aos artigos expressos no documento 
para formularem seus textos legais e aplicarem as 
decisões e medidas jurídicas.
Os direitos fundamentais da pessoa humana 
são reconhecidos e protegidos em todos os Es-
tados, embora existam algumas variações quan-
to à enumeração desses direitos e à extensão 
de cada um deles, bem como quanto à forma de 
protegê-los. Esses direitos não dependem da na-
cionalidade ou cidadania, sendo assegurados a 
qualquer pessoa. Entretanto, podem existir cer-
tos meios de proteção que as leis de um Estado 
criam especialmente para os seus cidadãos.
As Constituições, geralmente, referem-se a 
esses direitos como “direitos individuais”, o que 
123
Anotações:não significa que eles possam ser exercidos pelo 
indivíduo sem responsabilidade social. Na Consti-
tuição brasileira existe um capítulo especial sobre 
os direitos individuais, dispondo-se que eles são 
assegurados aos brasileiros e aos estrangeiros 
residentes no Brasil. Como se trata de direitos 
fundamentais da pessoa humana, a interpretação 
dos dispositivos da Constituição, em caso de dúvi-
da, deve ser feita sempre do modo que for mais fa-
vorável à proteção das pessoas. Assim, por exemplo, 
um estrangeiro que esteja apenas de passagem 
pelo território, sem a intenção de aí residir, tam-
bém tem direito à mesma proteção. 
A estreita relação entre paz e direitos hu-
manos, assim como entre paz e desenvolvimento, 
já foi reconhecida pela Carta das Nações Unidas 
que, em seu preâmbulo, declara: “Nós, os povos 
das Nações Unidas, determinados a preservar as 
próximas gerações do flagelo da guerra (...) e a 
reafirmar a fé nos direitos humanos fundamen-
tais...”. O artigo 55 acrescenta, além disso a fim 
de criar condições de estabilidade e bem-estar, 
necessários para as relações pacíficas entre os 
Estados. As Nações Unidas deverão promover as 
condições para o progresso e o desenvolvimento 
econômico e social e, ao mesmo tempo, o respeito 
universal — e a observância — dos direitos humanos 
e das liberdades fundamentais.
Debates:
Direito à Vida: relativamente ao direito à 
vida, existe um artigo da Constituição afirmando 
expressamente que ela é um direito inviolável, que 
124
Anotações: ninguém tem o direito de tirar de outra pessoa. 
Além disso, o reconhecimento e a proteção do 
direito à vida estão expressos no conjunto dos 
direitos e garantias. Basta assinalar que a própria 
Constituição prevê o julgamento pelo júri dos 
crimes dolosos contra a vida, estando aí contida a 
afirmação de que os atentados contra a vida humana 
são considerados crimes. Há também expressa 
proibição da pena de morte, com a ressalva de que 
ela poderá ser estabelecida por lei apenas para 
punir crimes praticados durante guerra externa 
formalmente declarada. Assim, nem mesmo os 
criminosos mais violentos e cruéis perdem o 
direito à vida. Mas, ainda que não houvesse na 
Constituição aqueles dispositivos, o direito à vida 
estaria implícito, pois, sem ele, nem o Estado nem a 
sociedade humana sobreviveriam.
Direito à igualdade: a igualdade mais 
proclamada e aparentemente mais assegurada é 
a igualdade de todos perante a lei. Em princípio, 
as obrigações legais são dirigidas a todos, sem 
qualquer diferenciação, além do que a lei deve 
ser aplicada de maneira igual para todos. Pelo 
princípio da igualdade jurídica, acolhido pela 
Constituição brasileira, será inconstitucional uma 
lei que conceda privilégios em relação a direitos e 
obrigações. Mas por força de vários fatores, como 
a condição social e econômica, os preconceitos, 
as preferências e até os interesses dos aplicadores 
da lei, não existe igualdade na aplicação das leis. 
São também expressões do direito à igualdade a 
garantia de direitos iguais para homens e mulheres 
e a proibição de discriminações que ofendam os 
direitos e a liberdade das pessoas.
125
Anotações:Os Direitos Humanos estão quase sempre 
sendo ampliados. Esse processo de ampliação 
dos direitos gera inúmeros debates sociais. Um 
exemplo de debate em torno de Direitos Humanos 
é a legalização do Aborto. Atualmente, no Brasil, o 
aborto legal só pode ocorrer em casos de risco à 
vida da gestante ou em casos de estupro. Outros 
países da América Latina, como Argentina, Chile e 
Colômbia, já preveem o direito ao aborto nos meses 
iniciais da gestação, conferindo às mulheres o 
direito de optar ou não pela maternidade.
Rita Segato (2006), antropóloga Argentina que 
trabalhou por muitos anos no Brasil, argumenta que 
esses movimentos em torno de novas reivindicações 
e reconhecimentos de direitos da pessoa humana, 
podem ser chamados de “ética da insatisfação”. Tal 
postura pode ser encontrada entre os cidadãos de 
qualquer nação e nos membros da mais simples e 
coesa das comunidades morais, o que constitui o 
fundamento dos direitos humanos. É por meio das 
insatisfações de certos grupos, principalmente 
os tidos comosubalternos em relação a outros, 
que as mudanças legais, em torno da justiça, do 
reconhecimento de novos valores sociais, podem 
ser inscritas, inclusive na lei.
GÊNERO: DESIGUALDADES E 
VIOLÊNCIAS
As violências de gênero começam a ser 
problematizadas a partir dos movimentos de 
mulheres nos anos de 1930. No entanto, a maior 
evidência sobre o problema da violência de gênero 
(na época chamada especificamente de “violência 
126
Anotações: contra a mulher”) tem início nos anos 60. Desde 
então, tanto a militância feminista, quanto as 
intelectuais, vêm discutindo e evidenciando as 
diferentes formas de violência contra a mulher. 
O período dos anos 60 a 80 é marcado pelo uso 
da categoria “mulher”, e teve como fundamento 
teórico, as noções de “estudos das mulheres”, 
“universalização dos problemas da mulher”, e o 
combate à opressão universal das mulheres pelo 
patriarcado.
No Brasil, a abordagem das teorias do 
“patriarcado” e da “opressão universal das mulheres” 
é iniciada por Heleieth Saffioti, no fim dos anos 60, 
com a defesa de sua tese “A mulher na sociedade de 
classes”. Essa abordagem preocupava-se em como 
analisar a opressão da mulher nas sociedades 
patriarcais, e foi marcada pela relação com o 
conceito de “classe” (GROSSI, 2000).
Após esse período, a categoria “patriarcado” 
entra em desuso a partir das críticas feitas à 
universalização das mulheres, o acentuamento 
teórico das diferenças entre mulheres e o destaque 
para os diferentes níveis de “opressão”. A categoria 
“gênero”, formulada a partir das relações entre 
homens e mulheres, além da relação entre pessoas 
do mesmo gênero (mulheres e mulheres, homens 
e homens), passa a ser a mais adequada para falar 
das relações, desigualdades e poder entre homens 
e mulheres. Usamos o conceito de Joan Scott, para 
o qual, gênero refere-se ao: 
Discurso sobre a diferença dos sexos. 
Ele não remete apenas a ideias, mas 
também a instituições, a estruturas, a 
práticas cotidianas e a rituais, ou seja, 
127
Anotações:a tudo aquilo que constitui as relações 
sociais. O discurso é um instrumento 
de organização do mundo, mesmo se 
ele não é anterior à organização social 
da diferença sexual. Ele não reflete 
a realidade biológica primária, mas 
constrói o sentido desta realidade. 
A diferença sexual não é a causa 
originária a partir da qual a organização 
social poderia ter derivado; ela é mais 
uma estrutura social movediça que 
deve ser ela mesma analisada em 
seus diferentes contextos históricos. 
(SCOTT, 1998, p. 88).
Ao mesmo tempo em que nega a universali-
dade da opressão das mulheres pelos homens, pro-
pondo uma análise que leva em conta os diferentes 
contextos históricos e culturais das diferentes 
relações de gênero, esse conceito possibilita uma 
nova perspectiva sobre as violências de gênero, 
ajudando a perceber as subjetividades dos dois 
eixos da relação (masculino e feminino), propondo 
que ambos têm estratégias de subversão da igual-
dade, que também passam por relações de violência. 
Um dos principais problemas relacionados à 
prática masculina é o acesso à violência. Em nos-
sa sociedade, espera-se dos homens que usem 
a violência em momentos de fazer valer sua de-
cisão, em defesa de suas vontades. No Brasil, isso 
é demonstrado pela nossa história legal, a história 
das leis, que até os anos 2000 ainda admitiam a 
“defesa da honra” como justificativa masculina 
para a resolução de conflitos domésticos. Após a 
aprovação da Lei 11.340, Lei Maria da Penha, ocor-
128
Anotações: reram alguns avanços nas políticas públicas para a 
proteção e criminalização da violência doméstica. 
Esses avanços seguem em outras leis, como as 
leis que tipificam crimes sexuais, modificadas em 
2008, 2012 e 2014, passando a reconhecer estu-
pros como sexo sem consentimento, com ou sem 
penetração, estupro de vulnerável, além de dar 
mais crédito ao depoimento das vítimas. 
Figura 7 - Atos de 8 de Março, dia internacional das 
mulheres, na Avenida Paulista (SP), 2022
Fonte: Google.
Contudo, mesmo com os avanços das leis 
(ainda que sejam tardios) os problemas relacionados 
à violência de gênero, cujo eixo vítima e agressor 
é, via de regra, ocupado por mulheres/crianças e 
homens em oposição, ainda são gigantescos. Eles 
passam primeiro pela ineficácia na aplicação das 
leis e na distribuição dos recursos para os órgãos 
de proteção. Passam também pela insensibilização 
dos agentes que lidam com esse problema social. 
129
Anotações:Esbarram na inexistência de uma política de não 
violência voltada para homens.
Tipos de violência de gênero:
1. Violência doméstica; 
2. Violência sexual; 
3. Abuso sexual; 
4. Assédio sexual; 
5. Exploração sexual;
6. Feminicídio;
7. Violência Psicológica.
Corrêa (1983) inicia seu livro com alguns 
relatos e indicações sobre “associações femininas” 
e formas de organização feminista, até os anos 70, 
época em que escreveu e pesquisou sobre crimes 
contra mulheres nas relações íntimas. Seu objeto 
de estudo são casos de homicídio entre casais 
— com relações de intimidade — ocorridos entre 
1952 e 1972. Como método da pesquisa, realizou 
levantamento documental dos processos, assistiu 
alguns julgamentos e realizou entrevistas informais. 
Do levantamento realizado, Corrêa selecionou 30 
processos, e subdividiu a dissertação a partir dos 
grandes temas que surgiram desse levantamento.
Nas defesas dos criminosos e no acolhi-
mento jurídico dessas argumentações, uma forte 
moralização do gênero (papéis de gênero, papéis 
de homens e mulheres, apesar do desuso dos ter-
mos). A descaracterização da vítima, através de 
argumentos estritamente morais, elaborados pela 
defesa, ocorre quase que como uma fábula. Em 
um dos casos apresentados no trabalho de Corrêa, 
uma mulher, casada por 16 anos, foi assassinada 
130
Anotações: pelo marido, sob argumentos de que ela “era vaido-
sa demais para uma mulher de família”, e que cer-
tamente “tinha um amante”. Sob suspeita de que 
estava sendo traído, com base nessas argumen-
tações, ele executou a mulher quase em frente a 
filha. 
Os argumentos da suspeita do marido foram 
levados ao tribunal do júri, e a defesa investiu for-
temente em desmoralizar a conduta da vítima, as-
sociando sua família à prostituição, sua vaidade 
“anormal” a uma suposta traição; o fato de ela tra-
balhar fora ajudou a sustentar a ideia de que ela 
era uma péssima mãe. O assassino foi absolvido 
pelo júri, que acatou a motivação do crime como 
“legítima defesa da honra”. Isso ocorreu entre os 
anos 60, mas o padrão de desmoralização da víti-
ma, perdura até hoje, recebendo mais resistência 
em casos que se tornam emblemáticos, dadas al-
gumas transformações sociais provocadas pelo 
movimento feminista no Brasil. Contudo, essas 
transformações não estão cristalizadas na socie-
dade, muito menos no aparato policial e sistema 
judiciário brasileiro.
Os casos de estupro são continuamente 
moralizados, em todas as esferas sociais, da família 
até a mídia. A vida da vítima, já fragilizada pela 
violência e exposição das agressões e intimidades, 
é esmiuçada, para que todos possam dar sua 
legitimidade sobre a violência. E foi, se não foi, “por 
que foi?”.
Outro ponto importante das reflexões de 
Corrêa (1983) sobre os casos analisados em sua 
dissertação, dos anos 70: “os atores jurídicos 
usam os poderes que a lei lhes confere para 
131
Anotações:reforçar uma ordenação existente na sociedade, 
obscurecendo-a, ao agir como se ela não 
existisse”. As performatividades do judiciário e 
as decisões decorrentes delas, não são isentas, 
mas são investidas de verdade, por meio da fábula 
espetacular construída pela defesa e acatada pelo 
júri ou juiz. Corrêa (1983) adverte sobre a diferença 
entre a lei (escrita) no Brasil, que nem sempre 
corresponde à norma social não escrita, indicando 
que a justiça não é isenta, mas machista, branca, 
heterossexual, burguesa, e manipula, através do 
poder da lei, a vida social, moralizando a vida.
Por fim, devemos lembrar as proximidadese 
identificações sociais possíveis entre os homens 
que julgam e o homem acusado. Já sabemos, 
pela ampla discussão que existe sobre estupro 
e estupradores no Brasil, que as punições são 
mais rígidas para homens em posições sociais 
não hegemônicas. Corrêa (1983) aponta que, na 
comparação entre decisões sobre assassinatos e 
tentativas de assassinatos de mulheres, as penas 
mais pesadas recaíam sobre homens em posições 
subalternas (negros, “crioulos”, desempregados, 
tidos como desocupados).
132
 Patriarcado
O termo “Patriarcado” foi designado pela 
primeira vez para tratar de sociedades cuja cen-
tralidade do poder (a transmissão de herança, 
parentesco, moral, costumes) era coloca-
da a partir de um homem. Em algumas 
sociedades, como na região do Medi-
terrâneo (Portugal, Itália, Espanha) 
essa fi gura era representada 
pelo pai ou pelo avô de uma 
grande família. Esse padrão 
se repete em diferentes so-
ciedades, seja pelo seu caráter 
estrutural (e universalista), seja 
pela colonização. Nas Américas, 
por exemplo, é comum verifi carmos 
uma estrutura familiar patriarcal, nos 
mesmos moldes das estruturas famili-
ares de países da região do Mediterrâneo.
Com o avanço dos estudos femi-
nistas, a noção de patriarcado se am-
plia para caracterizar um sistema de 
poder e dominação masculina, que 
subjuga as mulheres, limitando suas 
possibilidades de acesso ao poder, 
estabelecendo a domesticidade como 
espaço feminino, negando às mulheres 
direitos sobre sua sexualidade e repro-
dução. 
No Brasil, o patriarcado é 
caracterizado por Gilberto Frey-
re (2006) a partir da Casa-Grande, 
onde o senhor da casa, teria sob 
primeira vez para tratar de sociedades cuja cen-
tralidade do poder (a transmissão de herança, 
parentesco, moral, costumes) era coloca-
da a partir de um homem. Em algumas 
sociedades, como na região do Medi-
terrâneo (Portugal, Itália, Espanha) 
essa fi gura era representada 
pelo pai ou pelo avô de uma 
grande família. Esse padrão 
se repete em diferentes so-
ciedades, seja pelo seu caráter 
estrutural (e universalista), seja 
pela colonização. Nas Américas, 
por exemplo, é comum verifi carmos 
uma estrutura familiar patriarcal, nos 
mesmos moldes das estruturas famili-
ares de países da região do Mediterrâneo.
Com o avanço dos estudos femi-
nistas, a noção de patriarcado se am-
plia para caracterizar um sistema de 
poder e dominação masculina, que 
subjuga as mulheres, limitando suas 
possibilidades de acesso ao poder, 
estabelecendo a domesticidade como 
espaço feminino, negando às mulheres 
direitos sobre sua sexualidade e repro-
dução. 
No Brasil, o patriarcado é 
caracterizado por Gilberto Frey-
re (2006) a partir da Casa-Grande, 
onde o senhor da casa, teria sob 
133
Anotações:seu poder, tanto a sua própria extensão familiar (es-
posa, filhos, netos, etc), quanto todos os habitantes 
da sua propriedade, inclusive a Senzala. 
Esse esquema familiar foi bastante criticado 
por autoras feministas, sob o argumento de que 
ao reconhecer a família patriarcal como o modelo 
familiar do Brasil, deixavam-se de lado todas as 
diferentes configurações familiares, inclusive dos 
negros escravizados nas senzalas, que tinham suas 
próprias famílias e relações. 
Atualmente, as feministas usam a expressão 
“lutar contra o sistema patriarcal”, que significa 
a luta contra a permanência do poder familiar e 
social na mão dos homens e contra a manutenção 
dos papéis sociais de subserviência atribuídos às 
mulheres.
134
Anotações: Masculinidades 
Em primeiro lugar, devemos deixar claro o que 
estamos dizendo quando falamos em “masculini-
dades”. À primeira vista, o termo “masculinidades” 
faz uma referência direta ao “masculino”. Com isso, 
nós dispomos de um conjunto de valores sobre a 
ideia do “masculino”. A questão, portanto, é: o que 
nós sabemos sobre o masculino? Que ideias vêm 
à nossa mente quando pensamos neste termo? 
Geralmente, a noção de “masculino” está associada 
aos homens. Podemos associá-la ao sexo mascu-
lino, ao gênero masculino (em oposição ao gênero 
feminino), podemos associá-la à força, ao vigor, à 
ideia de “atividade”, autoridade, virilidade, poder.
Os atributos que, geralmente, vêm à mente 
quando pensamos no termo “masculinidade” não 
são acessíveis apenas aos homens. As mulheres 
também podem exercer força, vigor, “atividade”, 
autoridade, virilidade e poder. Então, o conceito de 
masculinidade trabalha com a ilusão daquilo que 
pensamos ser atributos exclusivamente masculinos 
— atributos dos homens. Connell (1995, 2013) define 
masculinidade: 
Uma configuração de prática em torno 
da posição dos homens na estrutura 
das relações de gênero. O autor 
ainda afirma que existe um modelo 
hegemônico de masculinidade, tão 
predominante que muitos creem 
que as características e condutas 
associadas ao mesmo sejam naturais 
(p. 188).
135
Anotações:Deste modo, a autora formula o conceito 
de “masculinidade” a partir de seu estudo dos 
comportamentos de meninos em escolas 
australianas. Ela buscava entender como os 
meninos reproduziam os valores sociais sobre ser 
homem relacionando sua pesquisa, na época, com 
a teoria produzida por Pierre Bourdieu, sociólogo 
francês que, entre outras coisas, dedicou-se 
a compreender a relação entre prática social, 
estrutura e símbolo.
As noções sobre o que é “ser homem” 
começam a se tornar um problema diante das lutas 
históricas das mulheres por igualdade nos direitos 
civis. Elas têm repercussão na França e EUA, com 
eclosão mundial a partir dos anos 1960. A luta 
das mulheres por direitos civis (o voto, a jornada 
de trabalho, a reprodução sexual e doméstica, a 
violência) explicita uma distinção entre os gêneros. 
Mostra que existe uma desigualdade social entre 
direitos de homens e mulheres.
A partir de então, vão sendo desnaturalizadas 
as noções sobre o que são papéis masculinos e 
femininos. Isso embaralha as concepções tidas 
como naturais relativas ao significado do gênero 
e do tipo de relação que se queria. Os homens não 
“precisaram” pensar nisso, pois “ser homem” parecia 
algo natural e confortável. A partir do movimento 
das mulheres, principalmente em meados dos anos 
70, muitos homens começaram a acompanhar 
mulheres em suas reivindicações. E isso faz com 
que eles próprios comecem a refletir sobre sua 
masculinidade, descobrindo novas formas de 
“ser homem” que não sejam associadas à ideia do 
masculino viril, controlador, violento, etc.
136
Anotações: Um dos grandes problemas do mundo, 
em relação à violência contra as mulheres e a 
desigualdade de gênero, é a ausência de uma 
política de gênero. A questão que nos interessa 
é a dificuldade que há em fazer esse esforço de 
construção de uma “masculinidade” não violenta. 
Pois, homens e mulheres, somos informados desde 
muito cedo sobre os significados de “ser homem”, 
e desde então, afastados de todos os riscos ao 
padrão de masculinidade. Connell (1995) criou duas 
categorias para definir tipos de masculinidade:
1. Masculinidade hegemônica: é o padrão 
idealizado de masculinidade em uma so-
ciedade. Como algo idealizado, é também 
inatingível. Na sociedade ocidental, esse 
padrão pode ser representado pelas ideias 
de “homem viril”, heterossexual, “chefe de 
família”, etc;
2. Masculinidades subalternas: são as mas-
culinidades tidas como desviantes. Na 
sociedade ocidental, exemplos dessas 
masculinidades são as homossexuais, as 
paternidades afetivas, entre outros es-
forços de homens contra as práticas he-
gemônicas de masculinidade.
MIGRAÇÃO E FRONTEIRAS
Quando falamos em “fronteiras,” geralmente, 
os significados que vêm à mente são alusivos às 
divisões físicas, geográficas e espaciais em torno 
do pertencimento a um certo lugar. Atravessar uma 
fronteira, nesse sentido elementar, pode significar o 
afastamento de um lugar ao qual se pertence, assim 
137
Anotações:como a chegada a um lugar estranho. Nas Ciências 
Sociais, a noção de fronteira pode ser concebida 
também a partir da ideia de interstícioentre formas 
de ser no mundo, identidades, compreensões sobre 
gênero, família, raça, pertencimento e moralidades. 
A migração pode ser caracterizada a partir da 
mobilidade entre fronteiras, carregando consigo 
não apenas o afastamento espacial/geográfico, 
mas também valores, cultura, estranhamentos e 
estigmas. Se nos debruçarmos para compreender 
“corpos em movimento” como os dos refugiados, 
podemos notar que existem diversas formas de 
criação e estabelecimento de fronteiras. 
Figura 8 - Posto de Migração entre Peru e Equador 
Fonte: Foto de Cris Bouroncle, AFP, 2018.
A fronteira, nos casos de acolhimento, de re-
fugiados é marcada pela presença de forte apara-
to estatal e militar, e sobre os sujeitos que buscam 
refúgio humanitário, geralmente, pairam diver-
sas dúvidas que devem ser sanadas por meio do 
138
Anotações: preenchimento de formulários das agências es-
tatais e organismos internacionais. Fassin (2005) 
nos ajuda a compreender essas práticas estatais 
de acolhimento de refugiados, como controle das 
fronteiras, assim como demarcação de identidades 
e fluxos migratórios. O conceito de “governamen-
talidade”, articula as noções de “fronteiras sociais” 
e “fronteiras físicas”, demonstrando que, se por um 
lado, concede-se ao migrante um visto por “razões 
humanitárias”, permitindo-lhes a inserção no mer-
cado de trabalho, por outro, limitam-se o acesso à 
plena cidadania, requerendo a eles, uma série de 
comprovantes de vínculos de trabalho ou estudo no 
país. Tais aspectos foram notados por Silva (2016), 
ao pesquisar a presença de haitianos em Manaus, 
acolhidos pelos processos de ajuda humanitária. 
No caso estudado por Silva (2016), dos pontos 
de vista dos manauaras sobre os migrantes, há uma 
percepção generalizada de que a presença dos 
haitianos é boa, na medida em que são percebidos 
como “trabalhadores e educados, que não se 
envolvem com a criminalidade” e, ao senso comum, 
acrescenta-se a percepção de que “a cidade 
está mais colorida” (uma vez que haitianos são 
predominantemente, negros/pretos). Apesar dessa 
presença cotidiana nas relações com a cidade, 
o autor percebe a ausência de políticas públicas 
que desenvolvam relações socioculturais entre os 
migrantes e os cidadãos nacionais. Isso cria outro 
estigma em torno dos migrantes, pois a diversidade 
não é encarada como troca cultural, mas como 
mera exotização da diferença física e cultural.
139
Anotações:A migração tem implicações econômi-
cas, sociais e culturais, tanto no local 
de partida quanto no de chegada ou 
de passagem. Se do ponto de vista 
econômico a integração se dá de al-
guma forma via mercado de trabalho 
formal ou informal, o mesmo não se 
pode dizer do ponto de vista social e 
cultural, já que a condição de imigran-
te, considerado como “trabalhador 
temporário”, impõe uma série de 
limites, seja no exercício da ci-
dadania política, seja no âmbito das 
trocas culturais, em razão de pre-
conceitos que poderão enfrentar 
(SILVA, 2016, p. 147).
Aspectos subjetivos da noção de fronteira po-
dem ser compreendidos por meio da obra de Veena 
Das (2020), uma antropóloga indiana que se dedicou 
a estudar violências cometidas contra mulheres du-
rante a guerra da Partição, entre Índia e Paquistão. 
No contexto dessa guerra, mulheres indianas foram 
sequestradas, forçadas ao casamento ou violenta-
das por soldados paquistaneses. Para os indianos, 
principalmente das zonas rurais, a sexualidade das 
mulheres confere honra a suas famílias, principal-
mente aos homens. Assim, os raptos de mulheres 
nesse contexto, provocaram longas repercussões 
subjetivas para a reinserção delas nas suas famílias 
e sociedades. 
A autora examina através dos relatos de 
mulheres sobreviventes dos raptos da guerra da 
Partição e reenquadradas nos sistemas de honra 
e casamento indiano, como cada uma descreve os 
140
Anotações: processos de “divisão” subjetiva, como silenciam 
em torno das violências, do rapto em si mesmo, 
ou dos novos casamentos. O caso de Asha, é uma 
das descrições/conversas emblemáticas da autora 
sobre a temática.
Asha, tendo enviuvado jovem, no seu caso, o 
potencial para desordens do desejo surgiu dentro 
da família, depois das rupturas brutais da Partição. 
Envolveu-se em várias traições, quebrando as 
regras correntes da viuvez, mas recusando-se 
a viver em má-fé, movendo-se através de suas 
intrincadas relações com as mulheres de sua rede 
familiar, quase forçando os outros a reconhecerem 
a singularidade de seu ser. A via de saída do 
“conhecimento venenoso” não foi uma ascensão 
para a santidade ou a renúncia; foi uma queda em 
direção a um cotidiano diferente.5
Todos os dias eu tentava ser útil. Estava dividida 
entre a lealdade a meu marido morto, sua irmã, que 
eu amara muito, e os novos tipos de necessidade 
que pareciam brotar da possibilidade de uma nova 
relação. 
Apesar de repudiada, tanto por sua família 
de origem, como por sua família conjugal, por ter 
quebrado o tabu de casta alta quanto a um segundo 
casamento, ela continuou tentando refazer seus 
laços rompidos.
Uma vez reconhecido o seu ser sexual, nos 
modos novos como passaram a vê-la seus afins 
masculinos, ela teve de fazer uma escolha. Ou 
assumia uma relação clandestina, ou aceitava o 
5 DAS, Veena. Vidas e Palavras - a violência e sua descida ao ordiná-
rio. Ed. UNIFESP, 2020.
141
Anotações:próprio público e até colocava em risco a honra da 
família, por uma nova definição de si mesma que 
prometia uma certa integridade, embora invia-
bilizasse os projetos de vida que tinha formulado 
anteriormente para si mesma. No processo dessa 
decisão, o self pode ter-se fragmentado radical-
mente e se tornado fugitivo, mas que foi descrito 
é uma espécie de operação complexa que se tor-
na evidente, não necessariamente no momento 
da violência, mas nos anos de trabalho paciente 
ao longo dos quais Asha e a irmã de seu primeiro 
marido reataram os laços rompidos.6
Das (2020) argumenta que as violências mar-
cam “limites” (fronteiras), pois esgotam nossa ca-
pacidade de representar os fatos do horror. Fazem 
com que perguntemos “como seres humanos po-
dem ter sido capazes de atos tão hediondos”, como 
os crimes de guerra, as violações indescritíveis das 
invasões coloniais, as cenas cotidianas de violência 
familiar e estupros. 
A imagem do estado de alerta na 
ocorrência da violência, da capaci-
dade de resposta onde quer que 
ocorra na teia da vida, nos leva a per-
guntar se os atos de violência são 
transparentes. Como se pode expres-
sar a relação entre a possibilidade e 
a ocorrência, e mais ainda, entre o 
factual e o eventual, se a violência, 
quando acontece de modo dramáti-
co, encerra uma relação com o que 
6 Idem.
142
Anotações: está acontecendo de forma repetida 
e não-melodramática, como dizê-lo, 
não numa narrativa única, mas na 
forma de um texto que é constante-
mente revisado, revisto e acrescido 
de comentários (DAS, 2020, p. 118).
A partir das diferentes perspectivas apresen-
tadas sobre a noção de fronteira, podemos com-
preender como essa noção se expande por meio 
das experiências sociais que os grupos e sujeitos 
têm sobre os limites espaciais; como as políticas 
migratórias e de acolhimento de refugiados pro-
duzem tensões a partir das diferenças de origem; 
e como corpos e subjetividades são marcadas a 
partir das dores geradas por violências em contex-
tos de tensões geopolíticas, levando à produção de 
fronteiras/rupturas emocionais.
PODER E SUBALTERNIDADES
De um ponto de vista mais amplo, o conceito 
de poder é definido por Bobbio (1995 apud SILVA, 
2001, p. 128) como “a capacidade ou possibilidade 
de agir, de produzir efeitos’’. Tanto pode ser referida 
a indivíduos e a grupos humanos como a objetos ou 
a fenômenos naturais. Assim, para o autor, o Poder 
pode ser entendido, entre outras definições, como 
“poder social”. Este tipo de poder diz respeito à vida 
dos seres humanos em sociedade, ou seja, trata-se 
das relações sociais. Portanto, designa capacidadede ação, como forma de determinação de um 
indivíduo sobre o outro. De tal modo o Poder, nessa 
concepção social, não é algo que se possui, mas 
uma relação que se estabelece socialmente (SILVA, 
143
Anotações:2001). Diversos teóricos nas Ciências Sociais se 
desdobraram sobre o conceito de Poder. Aqui 
restringimos sua discussão ao debate promovido 
por Michel Foucault, filósofo francês que se dedicou 
a investigar diferentes aspectos da dominação, do 
poder, da sexualidade, das instituições de controle 
e do Estado.
Para Foucault, ao contrário de outros analis-
tas, principalmente marxistas, poder não se esta-
belece como uma via de mão única, como se per-
cebe, por exemplo, no poder econômico. Para o 
filósofo, o poder é exercitado de forma relacional 
e em microrrelações. O conceito de poder é usa-
do como instrumento de interpretação social e as 
“práticas sociais” ou “relações de poder” são o cen-
tro nervoso de suas análises (SILVA, 2001).
Como capilaridades de microrrelações, o 
Poder em Foucault deve ser entendido:
1. Como algo produtivo, como saber, e, 
portanto, não somente repressivo, mas 
também pedagógico;
2. Uma relação que se estabelece entre 
indivíduos, ao invés de um objeto estático 
e transferível;
3. Não se estabelece em um só sentido 
(de cima para baixo) nem deve ser 
compreendido unilateralmente.
Algumas críticas foram feitas à concepção 
de poder concebida por Foucault, principalmente 
em torno das microrrelações que estabeleceriam o 
poder. Spivak, filósofa e ensaísta indiana destacada 
dos estudos “pós-coloniais”, discorda de Foucault 
sobre a ideia de poder como resultado de uma teia 
144
Anotações: de relações, argumentando que há sujeitos que são 
completamente alijados do poder: os subalternos. 
Em seu ensaio “Pode o subalterno falar?”, 
Spivak (1996) apresenta argumentos do ponto de 
vista não-ocidental sobre a ausência completa da 
capacidade de dizer algo e ser ouvida, por sujeitos, 
instituições e posições que ocupam o poder. Para 
ilustrar seus argumentos, a autora apresenta três 
exemplos na história indiana, em que tentativas 
de estabelecer um diálogo com o poder ou ocupar 
o poder, foram completamente silenciados ou 
assimilados pelas forças que de fato ocupam e 
detém o poder: 
[1] a maneira como a educação in-
diana foi pensada e instituída pelos 
colonizadores britânicos, voltada a 
formar uma classe de indianos ‘de 
sangue e cor’ mas ingleses ‘no gosto, 
na moral e no intelecto’, com o obje-
tivo de que esses servissem como 
tradutores e intérpretes na mediação 
entre os governantes europeus e os 
governados indianos; [2] a manei-
ra como o ritual hindu de sacrifício 
das viúvas foi compreendido histori-
camente tanto da perspectiva dos 
britânicos (que o aboliram acreditan-
do que protegiam as mulheres de tal 
violência selvagem), quanto da dos 
indianos nativos (que defendiam sua 
manutenção argumentando que esse 
era o desejo de tais mulheres), mas 
nunca da perspectiva das próprias 
viúvas envolvidas; [3] o caso de Bhu-
vaneswari Bhaduri, jovem de 16 ou 17 
145
Anotações:anos envolvida na luta armada pela in-
dependência da Índia, e que se enforcou 
em Calcutá em 1926 por não conseguir 
realizar um assassinato político ao qual 
foi incumbida. Para que sua morte não 
fosse diagnosticada como ligada a 
uma paixão ilegítima da qual teria re-
sultado uma gravidez, Bhuvaneswari 
esperou sua menstruação para com-
eter o suicídio. Mesmo assim, seu ato 
foi traduzido pelos familiares e intelec-
tuais como um caso de amor ilícito, e 
somente tomou seu sentido real a par-
tir do discurso dos líderes e partici-
pantes masculinos do movimento pela 
independência (SPIVAK, 1996 apud 
FREITAS, 2020, p. 34).
O argumento de Spivak (1996) demonstra a 
armadilha que acaba por retirar a capacidade de 
agência dessas mulheres, incidindo sobre elas a 
subalternidade. Elas não são ouvidas pelos sujeitos 
em posições hegemônicas, são subjugadas pelas 
normas do patriarcado, que impõe às mulheres 
indianas a autonegação, ou ainda, são mulheres 
narradas como tendo permitido (cedido) à “salvação” 
do império britânico. Em seu argumento final, a 
autora afirma que, há sujeitos em posições de 
subalternidade, cuja voz é negada apesar de seus 
esforços, e, portanto, “não podem falar”. 
146
Anotações: ESTADO E INTERVENÇÃO SOCIAL
A noção de Estado perpassa grande parte 
dos debates em Sociologia e Antropologia, pois 
a sua esfera e das políticas públicas são os meios 
pelos quais as intervenções sobre as sociedades 
acontecem. Nesse sentido, o Estado atua em 
diferentes frentes: como um espaço a ser ocupado 
pelas minorias sociais, como lugar de reivindicação 
de reconhecimento de direitos sociais, como 
lugar/agente responsável pela implementação das 
leis e da repressão. Essas perspectivas em torno 
do Estado são adotadas de modo diferentes por 
distintos autores e autoras, uns com ênfase nos 
processos legais e repressivos, outros com foco 
nas lutas de movimentos sociais contra repressões 
(de Estado, de outros grupos sociais hegemônicos, 
etc.) e pelo reconhecimento de direitos. 
Nesse sentido, é importante compreender 
como o Estado atua para a produção de pro-
gramas e projetos sociais, sendo, portanto, uma 
esfera de controle e intervenção social. Tor-
na-se importante aqui ressaltar a diferenciação 
entre Estado e governo. Numa perspectiva da 
promoção de direitos e políticas sociais, podemos 
considerar o Estado como conjunto de instituições 
permanentes. São os órgãos legislativos, os tri-
bunais, as instituições de assistência social, 
entre outras que são consolidadas (a partir de 
orientações constitucionais), e que possibilitam 
ações de governo. O Governo, por sua vez, pode 
ser compreendido como um conjunto de pro-
gramas sociais elaborados a partir de sujeitos 
eleitos pela sociedade civil, ou selecionados pe-
los poderes que ocupam o Estado. 
147
Anotações:É dos governos a responsabilidade pela 
implementação de políticas públicas a partir de 
ações do Estado. Governar adquire o sentido 
de implementar um projeto político, validado 
socialmente, dentro dos limites e obrigações 
constitucionais. As ações do Estado, como políticas 
públicas, devem ocorrer por meio de programas 
sociais, não sendo reduzidas à mera burocracia. 
As políticas públicas são de responsabilidade 
do Estado, tanto em sua implementação, quanto 
na manutenção a partir de processos de tomada 
de decisão democráticos e transparentes, que 
envolvem órgãos públicos, diferentes organismos 
institucionais e agentes sociais relacionados às 
políticas que serão implementadas. 
Neste sentido, políticas públicas não podem 
ser reduzidas a políticas estatais. E políticas sociais 
referem-se às ações que determinam o padrão 
de proteção social implementado pelo Estado, 
voltadas, em princípio, para a redistribuição 
dos benefícios sociais visando a diminuição 
das desigualdades estruturais produzidas pelo 
desenvolvimento socioeconômico. As políticas 
sociais têm suas raízes nos movimentos populares 
do século XIX, voltadas aos conflitos surgidos 
entre capital e trabalho, no desenvolvimento das 
primeiras revoluções industriais.
Para Bourdieu (2020), as esferas do Estado e 
Governo confundem-se, uma vez que os agentes do 
estado, que ocupam posições legislativas ou mesmo 
administrativas também têm o poder de regular 
(criar leis, implementá-las, interpretá-las, efetivar 
denúncias ou não e cumprir regimentos), mesmo 
estando eles próprios submetidos ao conjunto de 
148
Anotações: regras e obrigações em torno das próprias funções 
estatais.
Portanto, o Estado é uma entidade de poder, 
que regula e implementa políticas sociais. Por esse 
mesmo motivo, é um espaço de disputas entre 
ideologias políticas, principalmente partidárias, 
legitimadas socialmente a partir da liberdade de 
manifestação política e expressão, assim como das 
disputas de grupos que compõem a sociedade civil 
organizada (associações, ONGs, coletivos, etc.). 
As lutas em torno do Estado podemocorrer 
entre agentes sociais do mesmo campo políti-
co-ideológico, administrativo e também entre 
diferentes esferas constituidoras do Estado 
(jurídica, política, econômica, intelectual, etc.). 
Essa disputa se dá, principalmente, porque as 
possibilidades de intervenção do Estado sobre 
diferentes espaços da sociedade são muito am-
plas. As decisões tomadas a partir do poder es-
tatal, influenciam no reconhecimento de violações 
contra mulheres, crianças, negros e negras, LGBTs, 
assim como operam em torno de decisões sobre a 
economia, distribuição de renda, que podem culmi-
nar no aprofundamento da desigualdade social, da 
fome e da miséria.
Butler (2016) alerta para como o Estado 
também produz “enquadramentos” que negam 
a existência e, por sua vez, o acesso às políticas 
públicas e sociais a certos sujeitos, corpos e 
grupos. A história do reconhecimento do Estado à 
diversidade e diferença, assim como as mudanças 
nas leis e direitos sociais, são exemplos desses 
enquadramentos. Outros são as leis contra as 
violências domésticas e sobre feminicídios, ganhos 
149
Anotações:sociais que só foram possíveis a partir de 2006 e 
2014, respectivamente. Antes do reconhecimento 
legal dessas violências, houve décadas de lutas das 
mulheres contra as violências machistas e, mesmo 
com o reconhecimento legal desses direitos, 
ainda são muitos os casos de violações, mortes de 
mulheres e dificuldades em realizar as denúncias. 
Portanto, pensar sobre o Estado e suas pos-
sibilidades de intervenção é uma tarefa contínua, 
uma vez que há sempre sujeitos à margem do 
reconhecimento e dos direitos sociais. 
150
Anotações: Filmes para conferir:
Parasita (Bong Joon-ho, 2019): toda a família 
de Ki-taek está desempregada, vivendo em um 
porão sujo e apertado, mas uma obra do acaso faz 
com que ele comece a dar aulas de inglês a uma ga-
rota de família rica. Fascinados com a vida luxuosa 
destas pessoas, pai, mãe e filhos bolam um plano 
para se infiltrarem também na família burguesa, um 
a um. No entanto, os segredos e mentiras necessári-
os à ascensão social custarão caro a todos.
A Lei do Desejo (Pedro Almodóvar, 1987): 
um cineasta espanhol envolvido em um triângulo 
amoroso, vivencia os limites da negação e do desejo, 
enquanto sua irmã, uma mulher trans devota de 
Nossa Senhora, adota uma menina abandonada por 
uma amiga.
O Silêncio dos Homens (Ian Leite e Luiza de 
Castro, 2019): o documentário apresenta diferentes 
iniciativas pelo Brasil, de debates e reelaborações 
das masculinidades. Busca apresentar a importân-
cia de grupos de acolhimento para homens, como 
ferramentas para minimizar os efeitos das violên-
cias de gênero e outros problemas sociais gerados 
pelo machismo.
151
Para seguir:
@think.olga (instagram): laboratório de inovação 
social que educa e cria soluções para a desigualdade 
de gênero.
@debora_d_diniz (instagram): professora de 
bioética da UnB, que debate temas relevantes sobre 
direitos humanos, além de questões de pesquisa e 
metodologia em ciências sociais.
152
Anotações: REFERÊNCIAS
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157
Anotações:
158
159
Ca
de
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de
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160
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 1
QUESTÃO 01
(UFU, 2012 - Adaptado) Observe a tirinha de 
Quino: 
Se tomarmos como ponto de partida que 
a ilustração indica a concepção de fato social, 
segundo Durkheim, qual característica pode ser 
identificada? Marque a única resposta certa:
a. Ser geral e igual em todas as sociedades. 
b. Dar liberdade ao indivíduo, em uma dada 
sociedade, de praticar ações e atitudes 
ligadas ao seu senso crítico. 
c. Ser particular de cada indivíduo, sem 
interferência do grupo social no qual está 
inserido. 
d. Exercer sobre o indivíduo uma coerção 
exterior. 
e. A vontade individual se sobrepõe a do 
grupo.
161
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de
 1
QUESTÃO 02
Quando desempenho meus deveres de irmão, 
de esposo ou de cidadão, quando me desincumbo 
de encargos que contraí, pratico deveres que estão 
definidos fora de mim e de meus atos, no direito e 
nos costumes. Mesmo estando de acordo com sen-
timentos que me são próprios, sentindo-lhes inte-
riormente a realidade, esta não deixa de ser obje-
tiva; pois não fui eu quem os criou, mas recebi-os 
por meio da educação. Assim, também o devoto, ao 
nascer, encontra prontas as crenças e as práticas 
da vida religiosa; o sistema de sinais de que me sir-
vo para exprimir pensamentos; o sistema de moe-
das que emprego para pagar dívidas; os instrumen-
tos de crédito que utilizo nas relações comerciais; 
as práticas seguidas na profissão etc., funcionam 
independentemente do uso que delas faço. 
Émile Durkheim. As regras do método 
sociológico. José Albertino Rodrigues 
(Org.). Trad. Laura Natal Rodrigues. 
Rio de Janeiro: Companhia Edito-
ra Nacional, 1984, p. 1-2 (com adap-
tações). 
No segmento de texto, Durkheim trata, 
sobretudo, 
a. da anomia social. 
b. da solidariedade social. 
c. da consciência coletiva. 
d. do fato social. 
e. das representações coletivas.
162
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 1
QUESTÃO 03
Em “O Suicídio”, Émile Durkheim faz uso de 
ferramentas metodológicas inovadoras na análise 
social da época, demonstrando que o suicídio não 
era um fenômeno individual, mas coletivo.
Aponte a alternativa correta a respeito da 
metodologia da obra.
a. Durkheim aplicou questionários junto às 
famílias de pessoas que haviam cometido 
suicídio para compreender as motivações.
b. Foi a primeira obra de cunho sociológico a 
utilizar dados estatísticos e interpretar as 
taxas de mortes autoprovocadas.
c. O autor realizou a pesquisa em necrotérios, 
a fim de verificar a real causa das mortes.
d. A obra demonstra que o suicídio ocorre 
meramente por questões psicológicas.
e. Durkheim condena o suicídio e demonstra 
que as mortes autoprovocadas ocorriam 
em ambientes pouco religiosos.
QUESTÃO 04
Em seu estudo sobre o suicídio, Émile 
Durkheim classifica três tipos de motivação para 
as mortes autoprovocadas. A respeito da classifi-
cação dos suicídios elaborada pelo autor, assinale 
a alternativa correta.
163
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a. Egoísta, altruísta e distópico.
b. Altruísta, heróico e anômico.
c. Egoísta, altruísta e anômico.
d. Altruísta, anômico e formalista.
e. Formalista, altruísta e civil.
QUESTÃO 05
A sociologia preocupou-se, inicialmente, 
com as mudanças em torno do trabalho, a partir 
da Revolução Industrial e a consequente onda mi-
gratória do campo para as cidades. Um dos prin-
cipais teóricos a se debruçar sobre as relações de 
trabalho na modernidade foi Karl Marx. 
Assinale a opção que corresponde correta-
mente ao pensamento deste autor:
a. As relações de trabalho expressam valores 
e relações de poder dominantes na 
sociedade. 
b. O trabalho é realizado para satisfazer as 
necessidades imediatas dos produtores 
diretos e de suas famílias. 
c. O mundo burguês caracteriza-se pela pas-
sagem do trabalho agrícola para o trabalho 
desregulamentado e flexível. 
d. A divisão do trabalho fortalece a solidarie-
dade entre as pessoas, na medida em que 
fortalece a interdependência entre os in-
divíduos.
e. No capitalismo, é através do trabalho que 
se garante o domínio sobre os meios de 
produção.
164
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 2
QUESTÃO 06
(UEL - 2012) Leia o texto a seguir: 
“Desde o início a criança desenvolve uma 
interação não apenas com o próprio corpo e o 
ambiente físico, mas também com outros seres 
humanos. A biografia do indivíduo, desde o 
nascimento, é a história de suas relações com outras 
pessoas. Além disso, os componentes não sociais 
das experiências da criança estão entremeados e 
são modificados por outros componentes, ou seja, 
pela experiência social.” 
(BERGER, Peter L. e BERGER, Bri-
gitte. “Socialização: como ser um 
membro da sociedade”. In FORAC-
CHI, Marialice M. e MARTINS, José 
de Souza. Sociologia e Sociedade. 
Rio de Janeiro: Livros Técnicos e 
Científicos, 1977, p. 200). 
A partir da análise do texto podemos concluir 
que:
I - Os indivíduos, desde o nascimento, são 
influenciados pelos valores e pelos costumes que 
caracterizam sua sociedade. 
II - A relação que a criança estabelece com o 
seu corpo não deveria ser do interesse das ciências 
sociais, mas apenas da biologia. 
III - O fenômeno tratado pelo autor correspon-
de ao conceito de socialização, que designa o apren-
dizado, pelos indivíduos, das regras e dos valores 
sociais. 
IV - As experiências individuais, até mesmo 
aquelas que parecem mais relacionadas às nossas 
165
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de
 2
necessidades físicas, contêm exclusivamente 
dimensões biológicas. 
V - O desconforto físico que uma criança sente, 
como a fome, o frio e a dor, pode receber dos adultos 
distintas respostas de satisfação, dependendo da 
sociedade na qual eles estão inseridos. 
Indique a única alternativa que contém as 
premissas corretas: 
a. Apenas I, II e III estão corretas. 
b. Apenas I, II e IV estão corretas. 
c. Apenas II e III estão corretas. 
d. Apenas I, III e V estão corretas.
e. Apenas III, IV e V estão corretas.
QUESTÃO 07
Diferente da Sociologia, que tem seu cânone 
clássico subdividido a partir de três autores (para-
digmas) principais, a Antropologia se subdivide em 
três escolas de pensamento:
a. Escola de Sociologia Francesa, Escola 
Britânica, Escola Alemã.
b. Escola Britânica, Escola Francesa e Escola 
Americana.
c. Escola Brasileira, Escola Indiana, Escola 
Americana.
d. Escola Francesa, Escola Americana, 
Escola Espanhola.
e. Escola Britânica, Escola Mexicana e Escola 
Americana.
166
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de
 2
QUESTÃO 08
As origens da Antropologia são fortemente 
marcadas pelo Evolucionismo Social. Suas 
primeiras teorias argumentavam que o processo 
de evolução da humanidade passava por três fases 
principais:
a. Selvageria, monarquia e civilização.
b. Barbárie, tribo e cidade.
c. Tribo, barbárie e democracia.
d. Selvageria, barbárie e civilização.
e. Tribo, feudalismo e civilização.
QUESTÃO 09
Marcel Mauss (2015) foi um autor importante 
para a antropologia, apesar de sua obra ter grande 
influência da Sociologia de seu tio, Émile Durkheim. 
Sua obra mais importante para os estudos 
em etnologia foi “Ensaio sobre a Dádiva”, onde 
apresenta aspectos elementares dos sistemas de 
trocas sociais, baseadas nos princípios:
a. Dar, tomar e emprestar.
b. Dar, receber e negar.c. Receber, doar e devolver.
d. Dar, receber e retribuir.
e. Receber, negar e retribuir.
167
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de
 2
QUESTÃO 10
É comum ouvirmos sobre qualidades — 
positivas ou negativas — transmitidas pela 
genética, pelo “sangue”. O bom desempenho em 
práticas esportivas é justificado pela herança de 
um avô que quase foi jogador da seleção, o sucesso 
musical de um cantor, porque seus pais eram 
músicos. São exemplos comuns dessa crença na 
transmissão de qualidades pela natureza. O trecho 
se refere ao:
a. Relativismo cultural.
b. Determinismo sociológico.
c. Determinismo biológico.
d. Determinismo geográfico.
e. Racismo.
168
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de
 3
QUESTÃO 11
A imaginação sociopolítica brasileira for-
mou-se no contexto da sociedade pós-colonial, 
refletindo os desafios de construção de um pensa-
mento sobre a sociedade nacional, a identidade do 
povo brasileiro e a política. Em decorrência desse 
pensamento, surgiu uma série de noções nas ciên-
cias sociais, tais como miscigenação, eugenismo, 
democracia racial, homem cordial, cultura popular 
e pensamento autoritário. 
Considerando a temática, assinale a opção 
correta. 
a. A miscigenação contribuiu para a melhoria 
da qualidade genética racial do povo bra-
sileiro e, por isso, constituiu uma referên-
cia de valor para as ciências sociais. 
b. Segundo as tendências dominantes das 
ciências sociais contemporâneas no 
Brasil, o discurso da democracia racial 
funda-se em uma ideologia que esconde o 
preconceito racial. 
c. A visão do brasileiro como homem cordial 
é uma proposta interpretativa de Mário de 
Andrade. 
d. A Semana de Arte Moderna, que apresenta 
elementos constitutivos da identidade 
nacional, aconteceu nos fins do século XX. 
e. O pensamento autoritário foi concebido 
para emancipar as classes populares e 
conduzi-las à luta pela democracia racial 
no Brasil.
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QUESTÃO 12
O fim da escravidão e a substituição pela mão 
de obra migrante (predominantemente italiana) nas 
fazendas e cafezais, mostra que essa população 
negra ficou totalmente desamparada, sem uma 
redistribuição das terras nos espaços rurais do 
país, e sobrecarregando as margens das cidades 
que começavam a se reconfigurar diante da lenta 
industrialização nacional, culminou num importante 
movimento pela reforma agrária durante os anos 
50. Esse movimento era chamado de:
a. Levante pela Terra.
b. Ligas Camponesas.
c. Invasões de Terra.
d. Ocupações ao Latifúndio.
e. Empates.
QUESTÃO 13
Atualmente, desde o fim da Ditadura Militar, 
os movimentos pela terra ganharam novas configu-
rações no Brasil. Tendo o _______________________
____________ como movimento sindical mais influ-
ente na vida rural brasileira, que tem como principal 
bandeira a reforma agrária.
Complete o espaço da afirmação anterior com 
a opção correta:
a. Movimento Pastoral da Terra.
b. Movimento dos Trabalhadores dos Serin-
gais.
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c. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem 
Terra.
d. Movimento de Invasores do Agronegócio.
e. Movimento dos Povos Indígenas e Qui-
lombolas.
QUESTÃO 14
A falta de moradias e de serviços urbanos e a 
favelização são questões estruturais da sociedade 
brasileira que se intensificaram com a urbanização 
ocorrida a partir de 1940, levando a uma forte 
concentração populacional nas grandes cidades. 
De acordo com o Censo Demográfico, havia, em 
2000, cerca de 1,7 milhão de domicílios localizados 
em favelas ou assentamentos semelhantes a 
elas, abarcando uma população de 6,6 milhões 
de pessoas, 53% das quais nos estados de São 
Paulo e do Rio de Janeiro, nos quais as regiões 
metropolitanas concentram a maioria das favelas e 
dos favelados (Radar Social, IPEA, 2005, adaptada). 
A respeito dessas informações que carac-
terizam alguns aspectos das metrópoles brasilei-
ras, julgue os itens que se seguem.
I. A favelização, fenômeno sobretudo metro-
politano, revela forte demanda reprimida por aces-
so a terra e à habitação. 
II. A favelização é uma das formas encontradas 
pela população pobre para solucionar suas 
necessidades habitacionais. 
III. A urbanização brasileira vem apresentando 
forte tendência de concentração da população 
pobre nas metrópoles. 
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Assinale a opção correta. 
a. Apenas o item I está certo.
b. Apenas os itens I e II estão certos.
c. Apenas os itens I e III estão certos. 
d. Apenas os itens II e III estão certos.
e. Todos os itens estão certos.
QUESTÃO 15
A urbanização brasileira vem-se caracteri-
zando, nas últimas décadas, por intenso processo 
de metropolização, ou seja, concentração de popu-
lação em grandes cidades conturbadas. O mais alto 
escalão da urbanização brasileira é representado 
por 26 grandes concentrações urbanas, formadas, 
em sua maioria, por arranjos populacionais com 
população acima de 750 000 habitantes. Em con-
junto, esses arranjos populacionais, nos centros ur-
banos brasileiros, totalizam 79,124 milhões de habi-
tantes e reúnem 41,5% da população do país. (IBGE, 
Arranjos populacionais e concentrações urbanas 
do Brasil, 2016).
Sobre esse fenômeno da metropolização 
brasileira, julgue os itens a seguir. 
I. Com o aumento da importância institucional 
e demográfica, as metrópoles brasileiras estão 
concentrando, hoje, um conjunto de questões 
sociais, cujo aspecto mais evidente e dramático é a 
exacerbação da violência. 
II. Com a metropolização, há efetivo processo 
civilizador, que traz vantagens a todos os indivíduos 
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e grupos sociais que se instalam em áreas 
metropolitanas.
III. A aglomeração de população em 
metrópoles é o resultado de fatores de expulsão 
do campo e de fatores da atração que as cidades 
exercem sobre as correntes migratórias. 
Assinale a opção correta. 
a. Apenas o item I está certo. 
b. Apenas os itens I e II estão certos. 
c. Apenas os itens I e III estão certos. 
d. Apenas os itens II e III estão certos. 
e. Todos os itens estão certos.
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QUESTÃO 16
(ENADE 2017 - Adaptado)
A imigração haitiana para o Brasil passou a ter 
grande repercussão na imprensa a partir de 2010. 
Devido ao pior terremoto do país, muitos haitianos 
redescobriram o Brasil como rota alternativa para 
migração. O país já havia sido uma alternativa para 
os haitianos desde 2004, e isso se deve à reorien-
tação da política externa nacional para alcançar 
liderança regional nos assuntos humanitários. 
A descoberta e a preferência pelo Brasil tam-
bém sofreram influência da presença do exército 
brasileiro no Haiti, que intensificou a relação de 
proximidade entre brasileiros e haitianos. Em meio 
a esse clima amistoso, os haitianos presumiram que 
seriam bem acolhidos em uma possível migração, 
já que o país passaria a liderar a missão da ONU. 
No entanto, os imigrantes haitianos têm sofrido 
ataques xenofóbicos por parte da população bra-
sileira. Recentemente, uma das grandes cidades 
brasileiras serviu como palco para uma marcha an-
ti-imigração, com demonstrações de um crescen-
te discurso de ódio em relação a povos imigrantes 
marginalizados. Observa-se, na maneira como es-
ses discursos se conformam, que a reação de uma 
parcela dos brasileiros aos imigrantes se dá em ter-
mos bem específicos: os que sofrem com a violên-
cia dos atos de xenofobia, em geral, são negros e 
têm origem em países mais pobres.
SILVA, C. A. S.; MORAES, M. T. A política 
migratória brasileira para refugiados e a imigração 
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haitiana. Revista do Direito. Santa Cruz do Sul, v. 3, 
n. 50, p. 98-117, set./dez. 2016 (adaptado).
A partir das informações do texto, conclui-se 
que:
a. O processo de acolhimento dos imi-
grantes haitianos tem sido pautado por 
características fortemente associadas 
ao povo brasileiro: a solidariedade e o res-
peito às diferenças.
b. As reações xenófobas estão relaciona-
das ao fato de que os imigrantes são con-
correntes diretos para os postos de tra-
balho de maior prestígio na sociedade, 
aumentando a disputa por boas vagas de 
emprego.
c. O acolhimento promovidopelos brasileiros 
aos imigrantes oriundos de países do leste 
europeu tende a ser semelhante ao ofere-
cido aos imigrantes haitianos, pois no Bra-
sil vigora a ideia de democracia racial e 
respeito às etnias.
d. O nacionalismo exacerbado de classes 
sociais mais favorecidas, no Brasil, motiva 
a rejeição aos imigrantes haitianos e a 
perseguição contra os brasileiros que 
pretendem morar fora do seu país em 
busca de melhores condições de vida.
e. A crescente onda de xenofobia que vem 
se destacando no Brasil evidencia que, 
o preconceito e a rejeição, por parte dos 
brasileiros, em relação aos imigrantes 
haitianos, é pautada pela discriminação 
social e pelo racismo.
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QUESTÃO 17
A origem dos direitos humanos está associada 
ao reconhecimento da cidadania a um número 
cada vez maior de pessoas, como resultado do 
movimento de desconcentração do poder político 
em países da Europa Ocidental. Considerando as 
ideias expressas no texto, é correto afirmar que os 
direitos humanos:
 
a. Abarcam, já no século XVIII, a dimensão 
dos direitos sociais (trabalho, saúde, edu-
cação). 
b. Refletem no Século das Luzes, as aspi-
rações das camadas médias da sociedade 
pela igualdade de direitos. 
c. São relativos aos usos e costumes de cada 
povo ou cultura. 
d. Podem ou não ser exercidos, dependendo 
da escolha de quem os possui.
e. São destinados apenas para pessoas não 
miscigenadas.
QUESTÃO 18
(FUNCAB, 2013 - Adaptado) Nos anos ime-
diatamente posteriores à Segunda Guerra Mun-
dial, os direitos humanos foram declarados uni-
versais pela Organização das Nações Unidas (ONU). 
Desde então, foram promulgadas novas cartas de 
direitos condicionando os países a ajustarem suas 
legislações internas às exigências internacionais. 
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É correto afirmar que os direitos humanos: 
a. Não abarcam atualmente os chamados di-
reitos de terceira geração, que compreen-
dem o direito de viver em ambiente não 
poluído e autossustentável. 
b. São reconhecidos e protegidos apenas 
mediante a concordância dos Estados 
nacionais particulares. 
c. Não dependem apenas da “não ação” do 
Estado (ou do reconhecimento dos direitos 
por um Estado-Nação), mas também da 
ação deste no trato das questões sociais. 
d. Não estão estritamente relacionados a 
práticas democráticas, haja vista que hoje 
não compreendem a dimensão de direitos 
civis e políticos. 
e. Devem ser aplicados apenas para seres 
humanos que respeitam as regras sociais.
QUESTÃO 19
Os movimentos sociais são fundamentais 
como meios de participação da sociedade civil nas 
decisões políticas, em torno de buscar a promoção 
de interesses de grupos sociais. 
É correto afirmar que os movimentos sociais: 
a. Buscam a conquista do poder de Estado 
por meio dos partidos políticos. 
b. Atuam fora da esfera das instituições, 
porém buscam reivindicar direitos dentro 
das leis da sociedade. 
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c. Visam alterar as características estru-
turais de um sistema social e não apenas 
melhorar suas condições. 
d. Não possuem identidades em torno de 
classes sociais, orientações sexuais ou 
grupos étnicos.
e. Só tem legitimidade quando não degradam 
o patrimônio privado.
QUESTÃO 20
Os Direitos Humanos estão quase sempre 
sendo ampliados. Esse processo de ampliação dos 
direitos gera inúmeros debates sociais. Para Segato 
(2006), é por meio de certos grupos, principalmente 
dos tidos como subalternos em relação a outros, 
que as mudanças legais, em torno da justiça, do 
reconhecimento de novos valores sociais, podem ser 
inscritas, inclusive na lei. Os movimentos em torno de 
novas reivindicações e reconhecimentos de direitos 
da pessoa humana, podem ser chamados de: 
a. Ética da insatisfação.
b. Dramas culturais. 
c. Movimento mimimi.
d. Ética da negação.
e. Ética da expressão.
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