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Sociologia e Antropologia - Ebook

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Prévia do material em texto

Responsável Técnico: Lorena de Fátima Vidal (CRB: 410/11-AM) 
Biblioteca CEUNI-FAMETRO
FAMETRO
Av. Djalma Batista, Nossa Sra. das Gracas. Manaus, AM
 L372s Lima, Nata Souza. 
 Sociologia e antropologia. / Nata Souza Lima. -- Manaus: CEUNI-
FAMETRO, 2021.
 178 p. 
 ISBN: 978-85-64293-06-9 
 1. Sociedade 2. Cultura 3. Diversidade cultural 4. Fato social I. 
Título.
 CDU.:572 
 
Ficha catalogada na Biblioteca CEUNI-Fametro
Todos os direitos reservados © FAMETRO
IME Instituto Metropolitano de Ensino Ltda
Wellington Lins de Albuquerque | Presidente - IME
Maria do Carmo Seffair Lins de Albuquerque | Reitora
Cinara da Silva Cardoso | Pro-Reitora
Iyad Amado Hajoj | Diretor de EaD e Expansão
Leonardo Florêncio da Silva | Diretor Editorial e Gestor de EaD
Luciana Braga | Projeto Gráfico e Direção de Arte
Amenayde Cristine Corrêa | Assistente Editorial
Ana Augusta de Oliveira Simas | Supervisora de Produção e Revisora
Liene Costa | Revisora
Flávia Bahia Lacerda | Revisora Técnica
Imagens | depositphotos.com
"Nos termos da Lei n.º 9.610/98, o autor desta obra é titular de todo o complexo de 
direitos autorais sobre a presente criação. Assim, é vedada a cópia, reprodução, 
edição ou distribuição desta obra sem autorização expressa do Autor ou da Editora 
e, ainda é vedado utilizar, citar, publicar esta obra integral ou parcialmente sem 
deixar de indicar ou anunciar o nome, pseudônimo ou sinal convencional do autor 
sob pena da aplicação das medidas previstas nos Art. 101 a 110 da Lei n.º 9.610/98."
“Sejam todos e todas bem-vindos ao EaD 
do Centro Universitário Fametro”
O Centro Universitário Fametro acredita que o 
papel de uma instituição de ensino é formar não apenas 
profissionais, mas também formar profissionais no 
Ensino Superior, com valores éticos, humanísticos e 
com respeito ao meio ambiente capazes de contribuir 
para o desenvolvimento da nossa Amazônia. 
A Fametro, portanto, tem premissas claras a 
cumprir como instituição de ensino de qualidade. 
Praticar o ensino, pesquisa e extensão é a sua principal 
bandeira. 
A Fametro, ao longo das últimas duas décadas, 
vem se consolidando como a melhor instituição de 
ensino do Norte, um espaço democrático e docentes 
com variadas visões de mundo. Somos uma instituição 
de ensino plural que avança a cada ano em busca 
sempre de desenvolver a economia da Amazônia. Nossa 
estrutura é moderna, estamos em diversos municípios 
levando uma educação inclusiva e de qualidade.
Conheça o Centro Universitário Fametro e viva a 
experiência em estudar numa instituição com o corpo 
docente com mestres e doutores e de qualidade de 
ensino comprovada pelo MEC. 
Maria do Carmo Seffair
Reitora
Pa
la
vr
a 
da
 R
ei
to
ra
“É a educação que 
faz o futuro 
parecer um lugar 
de esperança e 
transformação”.
(Marianna Moreno)
UNIDADE I
 
Debates fundamentais em Sociologia
A noção de "ciência social"
Sociologia e método sociológico
Industrialização e mudança social
Individualismo e estigma
Modernidade e globalização
Su
m
ár
io
13
13
16
22
31
38
UNIDADE II 
Debates fundamentais em Antropologia
Evolucionismo social
Natureza e cultura
Etnocentrismo e Alteridade
Trabalho de campo e Etnografia 
Populações tradicionais e vozes ameríndias
UNIDADE III 
Problemas sociais do Brasil
Formação nacional
 
Questões étnico-raciais no Brasil
 
Conflitos agrários e as lutas pela terra
 
Cidades e violência urbana
 
A Amazônia no debate social
53
53
59
65
68
74
85
85
91
99
105
110
UNIDADE IV 
Desigualdades sociais e direitos humanos
 
 Direitos humanos e justiça
Gênero: desigualdades e violências
 
Migração e fronteiras
Poder e subalternidades
Estado e intervenção social
Referências 
Caderno de exercícios
121
121
125
136
142
146
152
159
U
ni
da
de
 1
Videoaula 1
Videoaula 2
13
DEBATES 
FUNDAMENTAIS 
EM SOCIOLOGIA
A NOÇÃO DE “CIÊNCIA 
SOCIAL”
As ciências sociais são um 
campo do conhecimento moderno 
que compreende três disciplinas 
principais: Sociologia, Antropolo-
gia e Ciência Política. Esses três sa-
beres propõem olhares diferentes 
sobre a vida social humana. Embora 
estas áreas do conhecimento sejam 
muito próximas entre si, não são to-
talmente iguais. A Sociologia busca 
estudar as relações do indivíduo na 
sociedade, a estrutura e dinamici-
dade das sociedades modernas, fa-
14
Anotações: zendo uma análise no percurso histórico e as suas 
transformações ao longo do tempo. A antropologia 
analisa a distinção das culturas humanas, a diversi-
dade dos grupos sociais ou étnicos e as mudanças 
que ocorrem, devido à interação entre os grupos. 
Ao passo que a Ciência Política estuda a siste-
matização do poder do estado, as instituições e o 
processo político partidário de um país, as políticas 
públicas em todas as suas etapas, ou seja, na elabo-
ração, implantação e avaliação do resultado de sua 
aplicação. Neste livro, nosso enfoque será sobre 
Sociologia e Antropologia, duas áreas das Ciências 
Sociais, que têm origens aproximadas, mas formas 
distintas de observar e refletir sobre as relações 
sociais. 
Numa percepção clássica, a Sociologia se 
constrói a partir de três principais teóricos, que 
produzem visões diferentes sobre a sociedade 
e as transformações modernas. Primeiramente, 
veremos a consolidação da Sociologia como uma 
Ciência moderna, a partir de Émile Durkheim, na 
França. Em seguida, estudaremos outros dois 
teóricos fundadores de problemas sociológicos 
modernos, mas que não estiveram intrinsecamente 
ligados à formação da Sociologia como um campo 
disciplinar, mas cada um adotando compromissos 
diferentes em relação à ciência e à compreensão 
das transformações da modernidade. São eles: Karl 
Marx e Max Weber, ambos alemães. 
15
Anotações:
A formação da Sociologia como Ciência
O Iluminismo foi um movimento filosófico 
do século XVIII, que propôs a separação radical 
entre igreja e ciência. Esse foi o marco da ciência 
moderna, onde autores como Renè Descartes, 
Jonh Locke, Rousseau, Voltaire, entre outros, 
elaboraram ensaios sobre as leis, as formas de 
desigualdade, as relações de poder e, sobretudo, 
a necessidade do método como meio pelo qual se 
conhece a realidade. A partir desse movimento 
intelectual, consolida-se a modernidade, baseada 
na técnica, no método e na comprovação científica.
Desse processo, as ciências exatas e da 
natureza consolidam métodos e regras para a 
investigação científica, apreensão e acúmulo do 
conhecimento. O método científico proporciona 
maior veracidade e controle de uma determinada 
experiência. Além disso, assegura o acúmulo de 
conhecimento, uma nova descoberta, devidamente 
testada e aprovada pelos cientistas que compõem 
um campo disciplinar, não precisa ser testada do 
zero. Outras teorias e experimentações podem ser 
realizadas a partir dos conhecimentos já adquiridos 
cientificamente.
No final do século XIX, havia uma lacuna 
em torno da produção de conhecimentos sobre a 
humanidade e as sociedades, que até ali era feita 
pela Filosofia ou pela Teologia, a primeira com mais 
ênfase nas questões do espírito humano, a segunda, 
com ênfase na crença e na fé. Nas duas, a produção do 
conhecimento não passava por métodos científicos, 
nem por processos de testagem e comprovação.
16
Anotações: Movidos por essas questões, dois autores do 
final do século XIX buscaram consolidar abordagens 
científicas sobre a vida social. O primeiro foi 
Gabriel Tarde, que propôs a literatura (por meio da 
interpretação literária) como meio para a análise 
social. Essa ideia não repercutiu com a mesma 
proporção que a proposta de Auguste Comte, que 
inaugurou a noção de “física social”, uma ciência 
que seria capaz de analisar a sociedade, a partir 
do método científico já consolidado nas ciências 
“duras” (exatas e da natureza, principalmente).
Comte teve grande influência na educação 
francesa, sendo primeiramente um crítico do 
elitismo em torno do acesso ao conhecimento,o 
que o levou a ser apoiado por diversos intelectuais 
da época. Foi mentor de Émile Durkheim, quem o 
ajudou a formular as primeiras ideias em torno da 
“física social’’. Ocorre que Comte, antes de finalizar 
suas formulações em torno da nova ciência, fora 
acometido de “colapsos nervosos”, o que abalou 
seu trabalho e, sobretudo, sua criatividade. Assim, 
foi Émile Durkheim, aluno de Auguste Comte, quem 
seguiu com a tarefa de construir a primeira ciência 
social, a qual chamou de “Sociologia”.
SOCIOLOGIA E MÉTODO SOCIOLÓGICO
Émile Durkheim foi fundamental para a 
criação formal da Sociologia no espaço acadêmico 
francês, tendo sido o primeiro a ocupar uma cadeira 
universitária com esse nome (em Bordéus, 1887) e 
fundou, em 1896, o L’Année sociologique (anuário 
sociológico), que se tornou a principal revista de 
Sociologia da França, divulgando o pensamento da 
17
Anotações:“escola” durkheimiana, que teve muitos discípulos, 
entre eles, seu sobrinho Marcel Mauss (fundamental 
para os estudos em Etnologia, como veremos 
posteriormente).
Figura 1 - Émile Durkheim
 Fonte: Domínio público.
Esse processo envolveu a defesa da existên-
cia de um objeto propriamente sociológico, o “fato 
social”, distinto do objeto de outras áreas do conhe-
cimento, como a Biologia, a Filosofia, a Psicologia, 
o Direito, a Economia, etc. Esse objeto demandaria 
a codificação de um método específico para tratá-
lo e de uma ciência distinta e autônoma — a Sociolo-
gia — para descobrir as leis de seu funcionamento.
Em “As regras do método sociológico”, 
Durkheim defende que os fatos sociais existem 
“acima” das consciências individuais, sendo-lhes 
exteriores e as antecedendo. Essa definição sobre 
18
Anotações: os fatos sociais, implica na construção do conceito 
de “sociedade”, na sociologia durkheimiana, para a 
qual a “sociedade” existe acima (sobrepondo) dos 
indivíduos. Para Durkheim, “sociedade” não significa 
meramente uma coletividade de sujeitos, mas uma 
“consciência pública ou coletiva que exerce um 
poder de coerção ou se impõe, de maneira mais ou 
menos perceptível, aos indivíduos” (CASTRO, 2014).
O método sociológico seguirá, portanto, 
algumas premissas importantes, distinguindo-
se de outras ciências, da Filosofia e da Religião. 
Durkheim afirma que o fato de ter nascido a partir 
das doutrinas filosóficas consideradas relevantes, 
a Sociologia não alterou o hábito de se apoiar 
em qualquer sistema no qual se sinta solidário, 
a exemplo de ser positivista, evolucionista, 
espiritualista, ao invés de cultivar simplesmente a 
Sociologia (idem).
Quanto às ideologias, a Sociologia de 
Durkheim não deve “tomar partido” entre as grandes 
hipóteses que dividem os metafísicos. Tampouco 
lhe cabe defender a liberdade ou o determinismo. 
Nesse aspecto, distingue-se muito das teorias 
socialistas que ganharam força na Europa no final 
do século XIX, principalmente com a publicação 
das obras de Karl Marx. A Sociologia, segundo o 
princípio da tradução francesa, deve limitar-se 
a que o “princípio de causalidade seja aplicado 
aos fenômenos sociais’’. Isso significa tratar os 
fenômenos sociais como dotados de “causas” que 
também produzem “efeitos” próprios. Além disso, 
esse princípio é estabelecido por ela não como uma 
necessidade racional, mas tão somente como um 
postulado empírico, produto de legítima indução. 
19
Anotações:Durkheim (apud CASTRO, 2014, p. 38) reafirma: 
A sociologia assim entendida não será 
individualista, nem comunista, nem 
socialista, no sentido vulgarmente 
atribuído a essas palavras. Por 
princípio, irá ignorar essas teorias, 
nas quais não poderia reconhecer 
valor científico, uma vez que elas 
tendem claramente não a exprimir os 
fatos, e sim a reformá-los. Se ela se 
interessa por eles, é tão somente na 
medida em que vê neles fatos sociais 
capazes de ajudar a compreender a 
realidade social por manifestarem 
as necessidades que operam a 
sociedade.
A ênfase na ausência de um viés ideológico à 
Sociologia, proposta por Durkheim, estava atrelada 
principalmente ao seu esforço de objetividade, cru-
cial para sua consolidação como Ciência. Para tanto, 
o autor defendia que os fatos sociais (como objetos 
sociológicos) deveriam ser tratados como coisas. 
Nesse processo de construção da objetividade, o 
sociólogo deveria abrir mão das “pré-noções” e ob-
servar os fatos como eles são, buscando examinar 
suas características mais objetivas.
20
O suicídio (1897)
O livro de Émile Durkheim, publicado pela 
primeira vez em 1897, marcou a Sociologia por 
ter sido a primeira obra a se debruçar sobre um 
problema social (fato social), a crescente onda de 
suicídios na França, a partir de dados estatísticos 
e empíricos. As explicações sobre o Suicídio, na 
época, tratavam esse fenômeno como um problema 
de ordem individual. 
Analisando taxas de mortes autoprovo-
cadas, a partir de regiões, concentração 
em períodos, Durkheim pôde argumen-
tar que o suicídio não era um fenômeno 
isolado a cada caso, mas tinha influên-
cias coletivas e sociais. Essas unidades 
de motivação agrupariam os casos de 
suicídio, demonstrando que havia 
uma dimensão coletiva a ser con-
siderada. 
Comparando diferentes ex-
pressões de suicídio (ou morte au-
toprovocada), Durkheim estabele-
ceu três principais motivações 
geradoras dessas mortes. 
A primeira, chamou de egoísta, 
a qual as altas taxas estavam associa-
das à diminuição da integração social. 
Pessoas com maior isolamento de gru-
pos onde houvesse sensação de per-
tencimento, eram as que estavam en-
quadradas nesssa categoria. Durkheim 
salienta, por exemplo, que o individu-
21
Anotações:alismo se expressava também na desagregação das 
comunidades religiosas, nas quais os protestan-
tes prezavam mais pela individualidade, enquanto 
católicos costuravam suas relações de forma mais 
comunitária.
A segunda, a altruísta era caracterizada pelas 
mortes auto cometidas em nome de um grupo ou 
causa. Nesta, ao contrário da primeira motivação, 
o sujeito estaria tão imerso pelo pertencimento e 
pelas crenças de um grupo (religiosas, políticas, 
ideológicas, culturais), que sua morte ocorre como 
um serviço final, ou uma defesa, do conjunto de 
crenças que o grupo representa.
A terceira, chamada de anômica, categoriza 
situações em que um indivíduo está se sentindo 
sem direção social. Diferente da primeira, em 
que o suicídio se baseia na ausência e diminuição 
da integração social, na anômica, a morte está 
relacionada aos eventos de ruptura da crença no 
grupo social. Está relacionado aos momentos 
de crise social profunda, como grandes crises 
econômicas, guerras e situações pós-traumáticas.
22
A noção de “fato social”
A noção de “fato social” é fundamental para a 
construção da perspectiva francesa da Sociologia. 
Durkheim afirma que, “embora consideremos os 
fatos sociais como coisas, é como coisas sociais.” 
Assim, o valor dos fatos sociais é seu aspecto 
sociológico. O suicídio, a devoção religiosa, por 
exemplo, são fatos sociais com explicações 
sociológicas, dotados de complexidade que 
vinham sendo reduzidas por explicações psíquicas, 
orgânicas, de fé, ou seja, descaracterizados de 
dados objetivos sobre eles mesmos. O esforço 
da Sociologia durkheimiana foi o de tratar 
desses fatos sociais, sem descaracterizá-los. 
INDUSTRIALIZAÇÃO E MUDANÇA SOCIAL
O surgimento da Sociologia, além do 
contexto acadêmico de sua criação na França, 
está relacionado à preocupação em torno da vida 
moderna. E o marco inicial da Modernidade como 
conhecemos, é a industrialização. A primeira 
revolução industrial ocorreu na Inglaterra, com o 
surgimento da máquina a vapor. Esse processo 
deu início às transformações nas relações com 
a propriedade e o trabalho. A demanda por mão 
de obra, o avanço das grandes propriedades 
— principalmente para plantação de algodão, 
motivada pelo crescimento da indústria têxtil — 
geraram um grande êxodo rural e vários problemas 
urbanos. Rapidamente, a indústria dominou a 
economia europeia,provocando muitos problemas 
sociais, como a superlotação das cidades, o 
trabalho precário, a fome, entre outros. 
Para maior 
aprofundamento 
de como o método 
de investigação 
sociológica de 
Durkheim se aplicava 
aos fatos sociais, 
ler “O Suicídio”, a 
primeira investigação 
sociológica publicada 
sobre um fenômeno 
social. Sugiro 
também a leitura 
de “As estruturas 
elementares da vida 
religiosa”.
23
Anotações:Figura 2 - Karl Marx
Fonte: Domínio público.
A obra de Karl Marx, apoiada por seu amigo 
Friedrich Engels, dialoga com esse contexto social. 
Ambos não são definidos como sociólogos, mas as 
ideias de Marx, que passam pela Filosofia, História, 
Direito e Economia, são de grande interesse 
sociológico e exercem muita influência nas Ciências 
Sociais. 
Suas obras de maior destaque são (1) “O 
Manifesto do Partido Comunista”, livro de caráter 
mais panfletário, mas extremamente mobiliza-
dor e inquietante, que apresenta um resumo das 
suas teorias em torno da exploração do proletaria-
do pela burguesia, da luta de classes sociais, da 
necessidade de união dos trabalhadores do mun-
do contra as apropriações e acúmulos do Capi-
tal industrial; e (2) “O Capital”, obra que contém 
3 volumes principais, além de outras publicações 
24
Anotações: após a morte de Marx, onde o autor apresenta sua 
teoria econômica sobre a lógica do Capital, seu 
processo de produção, circulação e o sistema de 
Mais-Valia. 
Aqui falaremos sobre “A ideologia Alemã”, 
publicado originalmente em 1932, quando Marx 
desenvolveu, em parceria com Engels, as princi-
pais noções sobre o “materialismo histórico”. O ar-
gumento de “A Ideologia Alemã” segue como uma 
resposta aos filósofos alemães seguidores de He-
gel, cujas teorias partiam do pressuposto de que 
o mundo das ideias antecede à realidade material 
(nunca alcançada). Marx e Engels argumentam que 
a história é material, existe no mundo real e são as 
condições histórico-materiais que dão suporte às 
relações de poder. 
Essa concepção materialista da história hu-
mana permitiria compreender como as relações 
dos indivíduos entre si e suas formas de proprie-
dade se alterariam, à medida que fossem se desen-
volvendo forças produtivas novas e mais podero-
sas. Para Marx, o cerne das relações sociais são as 
formas de como os homens produzem seus meios 
de existência, transformando inclusive a natureza.
Não se deve considerar esse modo 
de produção sob esse único ponto de 
vista, ou seja, enquanto reprodução 
da existência física dos indivíduos. Ao 
contrário, ele representa, já, um modo 
determinado da atividade desses 
indivíduos, uma maneira determinada 
de manifestar sua vida, um modo de 
vida determinado. A maneira como 
os indivíduos manifestam sua vida 
25
Anotações:reflete exatamente o que eles são. O 
que eles são coincide, pois, com sua 
produção, isto é, tanto com o que 
eles produzem quanto com a maneira 
como produzem. O que os indivíduos 
são depende, portanto, das condições 
materiais da sua produção (MARX 
apud CASTRO, 2014, p. 12).
Esse debate é fundamental para as propostas 
de Marx em torno da construção de sua própria 
obra. Ao contrário dos filósofos até ali, Marx não 
tinha interesse em produzir reflexões distantes 
da realidade (material). Seu esforço era de 
compreender como a sociedade moderna produziu 
as condições da desigualdade, e como as massas, 
o proletariado (trabalhadores), em condições de 
subalternidade, poderiam produzir condições 
materiais para o Comunismo. 
Ao contrário de outros autores do panteão 
sociológico que se limitaram à compreensão da 
realidade social, a obra de Marx e Engels, tem um 
comprometimento com a mudança social, tendo o 
trabalho e a economia como as principais chaves 
conceituais de análise. De certa forma, pode-se 
dizer que todos os grandes paradigmas da Socio-
logia foram inquietados por questões da sua época, 
alguns com limites institucionais, outros nem tan-
to. Marx talvez tenha sido o mais inadequado para 
as instituições acadêmicas. Já seu conterrâneo, 
Max Weber, foi um exímio acadêmico, apesar de não 
gostar da docência. 
26
Anotações: Figura 3 - Max Weber
 
Fonte: Domínio público.
Weber teve seus primeiros trabalhos publi-
cados, cerca de vinte anos após a morte de Marx, 
interessava-se a respeito de como a modernidade 
transformou-se em grandes instituições sociais, 
como a Igreja e o Estado. Suas análises também 
têm grande influência nos campos de Economia, 
Política e Direito, sobretudo por conta das estru-
turas de organização burocráticas e do poder. 
Porém, Weber construiu um trabalho dito “soci-
ológico” e, semelhante a Durkheim, preocupou-se 
com a consolidação da disciplina, com o método 
sociológico, com os interesses de investigação da 
Sociologia. Sua proposta para a constituição dos 
problemas sociológicos e apreensão das reali-
dades sociais se constituirá tomando como base 
as conexões conceituais entre os problemas. 
Para isso, Weber se debruçou sobre a 
abrangência do que chamamos “social”, argu-
27
Anotações:mentando que o termo nos levaria a um sentido 
muito generalizado da realidade, tornando por 
vezes, indeterminado: “se é encarado no seu sig-
nificado geral, não oferece qualquer ponto de vis-
ta específico a partir do qual se possa iluminar 
a importância de determinados elementos cul-
turais” (WEBER apud CASTRO, 2014, p. 62). Contu-
do, a proposta de Weber para a construção de uma 
análise sociológica, que apreenda as complexi-
dades da realidade social de forma abrangente 
(sem desconexão com o social e o real), é a elabo-
ração de “tipos ideais”. 
O “tipo ideal” é uma consolidação de padrões 
sociais em um conceito emblemático. Lançando 
mão da construção de “tipos ideais” sobre as 
instituições, Weber consegue apontar elementos 
constituintes da sociedade, dos fenômenos 
históricos e das organizações.
A sua relação com os fatos empirica-
mente dados consiste apenas em que, 
onde quer que se comprove, ou sus-
peite de que determinadas relações 
— do tipo das representadas de modo 
abstrato naquela construção, a saber, 
as dos acontecimentos dependentes 
do “mercado” — chegaram a atuar em 
algum grau sobre a realidade, podemos 
representar e tornar compreensível 
pragmaticamente a natureza par-
ticular dessas relações mediante um 
tipo ideal. Esta possibilidade pode ser 
valiosa, e mesmo indispensável, tanto 
para a investigação como para a ex-
posição (WEBER apud CASTRO, 2014, 
p. 63).
28
Anotações: Nessa elaboração sobre o método e a 
construção dos objetos da Sociologia, Weber não 
deixa de criticar Durkheim por conta do debate 
sobre “distanciamento” e “neutralidade” em torno 
dos fatos sociais. Para Weber, nossa interpretação 
da realidade social não poderia ser feita sem 
“pressuposições”, mas seria de antemão elaborada 
a partir de alguns significados atribuídos sobre 
as coisas sociais. Além disso, em sua teoria, os 
tipos ideais são o caminho para a análise social, 
e não o seu fim. Constituí-los é, portanto, criar as 
ferramentas da análise sociológica.
A construção de tipologias mais importante 
dentre as obras de Weber se dá em torno do conceito 
de poder e dominação, que são os meios pelos quais 
um sujeito ou organização conseguem a submissão 
ou obediência a partir de certos comandos.
Pode depender diretamente de uma 
situação de interesses, ou seja, de 
considerações utilitárias de van-
tagens e inconvenientes por parte 
daquele que obedece. Pode também 
depender de mero “costume”, do 
hábito obtuso de um comportamen-
to inveterado. Ou pode fundar-se, 
finalmente, no puro afeto, na mera 
inclinação pessoal do dominado. Não 
obstante, a dominação que repou-
sasse apenas nesses fundamentos 
seria relativamente instável. Nas 
relações entre dominantes e domi-
nados, por outro lado, a dominação 
costuma apoiar-se internamente em 
bases jurídicas, nas quais se funda a 
29
Anotações:“legitimidade”, e o abalo dessa cren-
ça na legitimidade costuma acarretar 
consequências de grande alcance. 
Em forma totalmentepura, as “bases 
de legitimidade” da dominação são 
somente três, cada uma das quais se 
acha entrelaçada – no tipo puro – com 
uma estrutura sociológica fundamen-
talmente diversa do quadro e dos 
meios administrativos (WEBER apud 
CASTRO, 2014, p. 65).
Os tipos de Dominação elencados por Max 
Weber:
1. Dominação legal em virtude do estatuto. 
Seu tipo mais puro é a dominação burocrática. Sua 
ideia básica é: qualquer direito pode ser criado 
e modificado mediante um estatuto sancionado 
corretamente quanto à forma. A associação 
dominante é eleita ou nomeada, e ela própria e 
todas as suas partes são empresas. O quadro 
administrativo consiste em funcionários nomeados 
pelo senhor, e os subordinados são membros da 
associação (“cidadãos”, “camaradas”). Obedece-se 
não à pessoa, em virtude de seu próprio direito, 
mas à regra estatuída, que estabelece ao mesmo 
tempo a quem e em que medida se deve obedecer. 
Também quem ordena obedece, ao emitir 
uma ordem, a uma regra: à “lei” ou “regulamento” 
de uma norma formalmente abstrata. O tipo 
daquele que ordena é o “superior”, cujo direito de 
mando está legitimado por uma regra estatuída, 
no âmbito de uma competência concreta, em que 
a delimitação e especialização têm como base a 
utilidade objetiva e nas exigências profissionais 
30
Anotações: estipuladas para a atividade do funcionário. O tipo 
do funcionário é aquele de formação profissional, 
pois as condições de serviço baseiam-se num 
contrato, com pagamento fixo, graduado segundo a 
hierarquia do cargo e não do volume de trabalho, e 
direito de ascensão conforme regras fixas. 
Sua administração é trabalho profissional em 
virtude do dever objetivo do cargo. Corresponde 
naturalmente ao tipo de dominação “legal” não 
apenas à estrutura moderna do estado e do 
município, mas também a relação do domínio numa 
empresa capitalista privada, numa associação com 
fins utilitários ou numa união de qualquer outra 
natureza que disponha de um quadro administrativo 
numeroso e hierarquicamente articulado. 
2. Dominação tradicional em virtude da 
crença na santidade das ordenações e dos poderes 
senhoriais existentes. Seu tipo mais puro é o da 
dominação patriarcal. A associação dominante é 
de caráter comunitário. O tipo daquele que ordena 
é o “senhor”, e os que obedecem são “súditos”, 
enquanto o quadro administrativo é formado por 
“servidores”. Obedece-se à pessoa em virtude de 
sua dignidade própria, santificada pela tradição: por 
fidelidade. O conteúdo das ordens está fixado pela 
tradição, cuja violação desconsiderada por parte 
do senhor colocaria em perigo a legitimidade do 
seu próprio domínio, que repousa, exclusivamente, 
na santidade delas.
 No quadro administrativo, as coisas ocorrem 
exatamente da mesma forma. Ele consta de 
dependentes pessoais do senhor (familiares ou 
funcionários domésticos) ou de parentes, ou de 
amigos pessoais (favoritos), ou de pessoas que 
31
Anotações:lhe estejam ligadas por um vínculo de fidelidade 
(vassalos, príncipes tributários). Falta aqui o 
conceito burocrático de “competência” como esfera 
de jurisdição objetivamente delimitada. 
3. Dominação carismática em virtude de 
devoção afetiva à pessoa do senhor e a seus dotes 
por graça (carisma) e, particularmente faculdades 
mágicas, revelações ou heroísmo, poder intelectual 
ou de oratória. O sempre novo, o extracotidiano, o 
inaudito e o arrebatamento emotivo que provocam 
e constituem aqui a força de devoção pessoal. 
Seus tipos mais puros são a dominação do profeta, 
do herói guerreiro e do grande demagogo. A 
associação dominante é de caráter comunitário, 
na comunidade ou no séquito. O tipo que manda é o 
líder. O tipo que obedece é o “apóstolo”. 
INDIVIDUALISMO E ESTIGMA
Se para os três grandes paradigmas da Socio-
logia, o foco de análise se deu sobre temas de grande 
abrangência, outros autores importantes para esta 
Ciência optaram por objetos de análise mais “mar-
ginais”. Provavelmente, um dos primeiros desses 
sociólogos foi Georg Simmel, contemporâneo de 
Max Weber, que se interessou por desdobramentos 
da modernidade no comportamento individual e na 
psique. Podemos dizer que o conjunto de autores a 
seguir, estabelecem relações entre dilemas sociais 
coletivos e aspectos individuais ou o que conhece-
mos atualmente como “subjetividade”. 
Um dos trabalhos mais célebres de Simmel 
é “A Metrópole e a Vida Mental”, onde desenvolve 
uma análise sobre como o novo ritmo urbano afetou 
32
Anotações: a relação das pessoas com o tempo e com as 
implicações em torno dos laços de solidariedade. 
Simmel viveu no tempo dos primeiros relógios 
de bolso, do controle mais aguçado do tempo, 
do surgimento dos automóveis e do ritmo das 
máquinas de fábrica na vida social. 
Os problemas mais graves da vida 
moderna derivam da reivindicação 
que faz o indivíduo de preservar a 
autonomia e individualidade de sua 
existência em face das esmagado-
ras forças sociais, da herança, da 
história, da cultura externa e da técni-
ca de vida. (...) O século XVIII concla-
mou o homem a que se libertasse de 
todas as dependências históricas 
quanto ao Estado e a religião, a moral 
e a economia. Juntamente com maior 
liberdade, o século XVIII exigiu a espe-
cialização funcional do homem e seu 
trabalho; essa especialização torna 
um indivíduo incomparável a outro 
e cada um deles é indispensável na 
medida mais alta possível. Entretan-
to, esta mesma especialização tor-
na cada homem proporcionalmente 
mais dependente de forma direta 
das atividades suplementares de to-
dos os outros. Nietzsche vê o pleno 
desenvolvimento do indivíduo condi-
cionado pela mais impiedosa luta de 
indivíduos; o socialismo acredita na 
supressão de toda competição pela 
mesma razão. Seja como for, em to-
das estas posições, a mesma mo-
33
Anotações:tivação está agindo: a pessoa resiste 
a ser nivelada e uniformizada por um 
mecanismo sociotecnológico 
(SIMMEL apud CASTRO, 2014, p.11).
Para caracterizar esse tempo das 
transformações radicais que a modernidade impôs 
sobre os sujeitos, Simmel elaborou a noção de 
“sentimento blasé”, uma forma de “não reação” 
a novidades, problemas graves, violações, por 
exemplo, que seriam “resultado dos estímulos 
contrastantes que a vida moderna impõe aos 
nervos”: 
Uma vida em perseguição desregrada 
ao prazer torna uma pessoa blasé 
porque agita os nervos até seu ponto 
de mais forte reatividade por um 
tempo tão longo que eles finalmente 
cessam completamente de reagir. Da 
mesma forma, através da rapidez e 
contraditoriedade de suas mudanças, 
impressões menos ofensivas forçam 
reações tão violentas, estirando 
os nervos tão brutalmente em uma 
e outra direção, que suas últimas 
reservas são gastas; e, se a pessoa 
permanece no mesmo meio, eles não 
dispõem de tempo para recuperar a 
força. Surge assim a incapacidade 
de reagir a novas sensações com a 
energia apropriada. Isto constitui 
aquela atitude blasé que, na 
verdade, toda criança metropolitana 
demonstra quando comparada com 
crianças de meios mais tranquilos e 
34
Anotações: menos sujeitos a mudanças (SIMMEL, 
1973 apud CASTRO, 2014, p. 16).
Outra influência geradora da “atitude blasé” 
para Simmel, seriam as relações com o dinheiro, 
que acirra a distinção social, estabelecendo valores 
em torno de quem tem mais.
A essência da atitude blasé con-
siste no embotamento do poder de 
discriminar. Isto não significa que 
os objetos não sejam percebidos, 
como é o caso dos débeis mentais, 
mas antes que o significado e va-
lores diferenciais das coisas, e daí as 
próprias coisas, são experimentados 
como destituídos de substância. Elas 
aparecem à pessoa blasé num tom 
uniformemente plano e fosco; obje-
to algum merece preferência sobre 
outro. Esse estado de ânimo é um 
fiel reflexo subjetivo da economia do 
dinheiro completamente interiorizada. 
Sendo o equivalente a todas as múl-
tiplas coisas de uma mesma forma, o 
dinheiro torna-se o mais assustador 
dos niveladores (ibid, p.16).
Se para Simmel, as transformaçõesda vida 
moderna impactaram, significativamente, na po-
tencialização do individualismo, da distinção e do 
desprezo, para Erving Goffman um processo con-
tínuo da vida social, aprofundado em outros es-
paços do cotidiano — inclusive das interações face 
a face, da individualidade — foi a segregação de 
certos grupos e sujeitos a partir de estigmas soci-
35
Anotações:ais. Goffman é um dos primeiros autores modernos 
a refletir sobre a noção de “Estigma” como resul-
tado de certas regras de convívio, que corroboram 
em atitudes preconceituosas e discriminatórias 
contra grupos e pessoas. Apesar de ser usado 
como um termo sobre a depreciação, o conceito 
de Estigma vai além disso. 
É uma linguagem de relações e 
não de atributos. Um atributo que 
estigmatiza alguém pode confirmar a 
normalidade de outrem, portanto ele 
não é, em si mesmo, nem horroroso 
nem desonroso. Por exemplo, alguns 
cargos nos Estados Unidos obrigam 
seus ocupantes que não tenham a 
educação universitária esperada a 
esconder isso; outros cargos, entre-
tanto, podem levar os que os ocupam 
e que possuem uma educação superi-
or a manter isso em segredo para não 
serem considerados fracassados ou 
estranhos (GOFFMAN apud CASTRO, 
2012, p.13).
Goffman argumenta ainda, que se pode 
elencar o Estigma em pelo menos três tipos:
1. As deformidades físicas, tidas como 
abominações do corpo (considerando que 
Goffman escreveu sobre essas formas de 
estigma na metade do século XX, devemos 
ponderar que há uma série de políticas 
sociais em torno da diferença de corpos, 
contudo, alguns estigmas ainda persistem, 
porém, passíveis de punição por lei). 
36
Anotações: 2. As culpas de caráter individual percebidas 
socialmente como vontade fraca, paixões 
tirânicas ou não naturais, crenças falsas 
e rígidas, desonestidade, sendo essas in-
feridas a partir de relatos conhecidos de, 
por exemplo, distúrbio mental, prisão, 
vício, alcoolismo, homossexualidade, de-
semprego, tentativas de suicídio e com-
portamento político radical. 
3. Estigmas raciais, de nação e religião, que 
geralmente são repassados para uma 
família inteira.
As atitudes de pessoas tidas como normais 
para com uma pessoa com um estigma, e os 
atos que empreendido em relação a ela são bem 
conhecidas na medida em que são as respostas 
que a ação social benevolente tenta suavizar e 
melhorar. Contudo, as pessoas debaixo de algum 
estigma social são percebidas numa posição de 
inferioridade (menos humanos). Dessa forma de 
tratamento consolidada socialmente, surgem 
diversos preconceitos que funcionam como uma 
ideologia para explicar a suposta inferioridade, 
indicando que ela representa algum perigo.
Numa análise sociológica que se aproxima 
dos interesses de Goffman, sobre os estigmas 
sociais, Howard Becker coloca sua ênfase 
no estudo de grupos considerados outsiders 
[marginais], refletindo sobre os impactos das 
regras sociais e suas quebras (violações). Becker 
argumenta que todos os grupos sociais têm regras 
de funcionamento interno, sejam as leis, conjuntos 
de normas jurídicas que norteiam uma sociedade, 
37
Anotações:sejam as regras da tradição, que não são escritas 
e normatizadas como leis, mas tem força de 
imposição social e são transmitidas entre gerações.
Muitas regras não são impostas, 
e, exceto no sentido mais formal, 
não constituem o tipo de regra em 
que estou interessado. Exemplos 
disso são as leis que proíbem certas 
atividades aos domingos, que 
permanecem nos códigos legais, 
embora não sejam impostas há cem 
anos. (É importante lembrar, contudo, 
que é possível reativar uma lei não 
imposta por várias razões e recuperar 
toda a sua força original...). Regras 
informais podem morrer de maneira 
semelhante por falta de imposição. 
Estou interessado sobretudo no que 
podemos chamar de regras operantes 
efetivas de grupos, aquelas mantidas 
vivas por meio de tentativas de 
imposição (BECKER apud CATRO, 
2014, p. 103).
As violações a essas regras sociais, geram 
grupos e sujeitos marginalizados. Porém, o grau em 
que uma pessoa é considerada marginalizada varia. 
Essa diferença é atravessada tanto pela forma do 
crime, quanto pelas proteções sociais em torno 
de quem os comete. Um exemplo, são os crimes 
de atropelamento cometidos contra ciclistas, por 
jovens filhos de grandes empresários com carros 
de luxo, que sequer sofrem alguma punição. Já 
crimes tidos como mais graves (ainda dependendo 
de quem o cometa), como assassinato ou estupro, 
38
Anotações: nos levam a ver o transgressor como um verdadeiro 
marginal. 
Com essa análise sobre como reagimos 
às violações das regras sociais, e a partir disso, 
como estabelecemos quem é ou não um outsider 
(marginal), Becker pretende desenvolver uma 
sociologia do desvio, deixando de absorver 
unicamente as noções patologizantes do desvio 
como verdades absolutas, mas problematizando 
quais os pesos sociais, os valores morais, envolvidos 
na classificação do desvio e dos desviantes. Em sua 
concepção sociológica, afirma que “desvio é a falha 
em obedecer às regras do grupo’’. O desvio como a 
infração de alguma regra, geralmente, aceita.
Se um ato é ou não desviante, depende de 
como outras pessoas reagem a ele. As violências 
domésticas podem ser um exemplo disso. No caso 
do Brasil, são absolutamente criminalizadas, mas 
ainda pouco denunciadas. Essas violências que 
ocorrem no ambiente doméstico podem se tornar 
queixas policiais, ou se manter como segredo de 
família e vizinhança, sem gerar sanções legais aos 
agressores. Portanto, o grau em que outras pessoas 
reagirão a um ato dado como desviante varia 
enormemente. “O grau em que um ato será tratado 
como desviante depende de quem o comete e de 
quem se sente prejudicado por ele” (idem, p. 108). 
MODERNIDADE E GLOBALIZAÇÃO
Se a industrialização marcou uma nova fase de 
transformações sociais globais, a internacionalização 
da indústria, assim como o fim da Guerra Fria em 
1989, marcara uma fase explicada por muitos au-
39
Anotações:tores como “globalização”, “mundialização” ou até 
mesmo “pós-modernidade”. Essa era das transfor-
mações globais tem classificações ainda não total-
mente consolidadas, pois diz respeito ao passado 
recente e ao presente. Contudo, alguns sociólogos 
trataram de debater essas mudanças. Para Giddens 
(1991), sociólogo britânico, o fim do século XX é de 
fato uma era de transição, marcada pelo consumo 
desenfreado e pela informação. 
Alguns dos debates sobre estas 
questões se concentram principal-
mente sobre transformações insti-
tucionais, particularmente as que 
sugerem que estamos nos deslocan-
do de um sistema baseado na manu-
fatura de bens materiais para outro 
relacionado mais centralmente com 
informação (GIDDENS, 1991, p.8).
O autor, ao invés de classificar taxativamente 
essa era “pós-moderna”, prefere refletir sobre 
quais as transformações e consequências da 
modernidade (a do século XX). Um dos seus 
elementos de análise é a nossa relação com o 
tempo e o espaço. 
Todas as culturas pré-modernas pos-
suíam maneiras de calcular o tempo. 
O calendário, por exemplo, foi uma 
característica tão distinta dos esta-
dos agrários quanto à invenção da 
escrita. Mas o cálculo do tempo que 
constituía a base da vida cotidiana, 
certamente para a maioria da popu-
lação, sempre vinculou tempo e lu-
40
Anotações: gar — e era geralmente impreciso e 
variável. Ninguém poderia dizer a hora 
do dia sem referência a outros marca-
dores socioespaciais: “quando” era 
quase, universalmente, ou conectado 
a “onde” ou identificado por ocorrên-
cias naturais regulares (idem, p.21).
Essa vinculação entre tempo e lugar seria 
fundamental, na visão de Giddens, para pensar num 
dos pontos da transformação impulsionada pela 
invenção do relógio mecânico, que estabeleceu 
mais precisão em torno do tempo, possibilitando 
maior controle em torno das horas — pagas, gastas, 
etc. — desvinculando efetivamente o tempo do 
espaço. Não seria mais necessário usar algum ponto 
espacial como parâmetro de medidado tempo. As 
horas estavam sendo controladas universalmente, 
à disposição de todos, mesmo aqueles sem a 
autonomia de “olhar as horas” por si mesmos. 
O advento da modernidade arranca 
crescentemente o espaço do tempo 
fomentando relações entre outros 
“ausentes”, localmente distantes de 
qualquer situação dada ou interação 
face a face. A separação entre o 
tempo e o espaço não deve ser 
vista como um desenvolvimento 
unilinear, no qual não há reversões 
ou que é todo abrangente. Pelo 
contrário, como todas as tendências 
de desenvolvimento, ela tem traços 
dialéticos provocando características 
opostas (GIDDENS, 1991, p.22).
41
Anotações:Por que a separação entre tempo e espaço 
é tão crucial para o extremo dinamismo da 
modernidade? Giddens (1991, p. 23) explica:
1. “Em primeiro lugar, ela é a condição princi-
pal do processo de desencaixe que passo 
a analisar de maneira breve. A separação 
entre tempo e espaço e sua formação em 
dimensões padronizadas, “vazias”, pene-
tram as conexões entre a atividade social 
e seus “encaixes” nas particularidades dos 
contextos de presença.”
2. “Em segundo lugar, ela proporciona os 
mecanismos de engrenagem para aquele 
traço distintivo da vida social moderna, 
a organização racionalizada. As organi-
zações modernas são capazes de conec-
tar o local e o global de formas que seriam 
impensáveis em sociedades mais tradi-
cionais e, assim fazendo, afetam rotinei-
ramente a vida de milhões de pessoas.” 
3. “Em terceiro lugar, a historicidade radi-
cal associada à modernidade depende de 
modos de “inserção” no tempo e no es-
paço que não estavam disponíveis para 
as civilizações precedentes. Um sistema 
de datação padronizado, agora univer-
salmente reconhecido, possibilita uma 
apropriação de um passado unitário, 
mas muito de tal “história” pode estar su-
jeito a interpretações contrastantes. Em 
acréscimo, dado o mapeamento geral do 
globo que é hoje tomado como certo, o 
passado unitário é um passado mundial; 
42
Anotações: tempo e espaço são recombinados para 
formar uma estrutura histórico-mundial 
genuína de ação e experiência.”
Se Giddens estava interessado nas mudanças 
geradas pelo processo de globalização (a uni-
formização de padrões globais, como da relação 
com o tempo), Zygmunt Bauman, sociólogo po-
lonês, por sua vez, tem um olhar muito mais trági-
co e pessimista sobre os tempos pós-modernos. 
Para Bauman, vivemos o tempo da “liquidez”, ter-
mo que baseará grande parte de sua obra. A liqui-
dez faz referência à fluidez/pressa/fragilidade das 
relações sociais, mediadas pela vida moderna e 
pelo consumo. A necessidade de consumir, nos le-
varia a um nível de relações sociais efêmeras, se-
melhante a obsolescência das coisas (capitalistas). 
Nosso mundo seria, portanto, marcado pelas incer-
tezas em múltiplas dimensões.
Nesse novo mundo “líquido”, a incerte-
za passa a dominar a cena social, em 
várias dimensões: as organizações 
sociais (estruturas que limitam as es-
colhas individuais, instituições que 
asseguram a repetição de rotinas, pa-
drões de comportamento aceitável) 
não podem mais manter sua forma 
por muito tempo (nem se espera que o 
façam), pois se decompõem e se dis-
solvem mais rápido que o tempo que 
leva para moldá-las e, uma vez reor-
ganizadas, para que se estabeleçam 
(CASTRO, 2014, p. 128). 
43
Anotações:A crise do Estado-Nação é a provável ruptura 
histórica e epistemológica nas ciências sociais. A 
partir do fim da dualidade, URSS e EUA (Comunismo 
e Capitalismo), que abriu as possibilidades para um 
processo de globalização, visto que as instituições 
internacionais, principalmente, as que lidam com 
dinheiro ou com o comércio, trataram de promover 
ou até exigir uma reformulação nas economias do 
globo, passando a controlá-las e dando início a um 
processo de mundialização do capital. São diver-
sas, diferentes e insistentes as pressões externas 
e internas destinadas a provocar a reestruturação 
do Estado.
A sujeição das economias (e políticas) nacio-
nais, a uma ordem global, é justificada como forma 
de ideais capitalista ou socialista para que sejam 
incogitados diante de uma dinâmica capitalista 
que depende e se relaciona numa rede transna-
cional, que pode ser administrada dos diversos 
lugares do globo, mas nunca internamente. Desta 
forma, a nação transforma-se em mera província 
do capitalismo mundial, sem soberania assegu-
rada para construir suas políticas independente-
mente dos órgãos financeiros internacionais ou 
das grandes multi e transnacionais.
Para as multinacionais (isto é, empre-
sas globais com interesses e compro-
missos locais dispersos e cambiantes), 
“‘o mundo ideal’ é um mundo sem Es-
tados. “A menos que tenha petróleo, 
quanto menor o Estado, mais fraco 
ele é, e menos dinheiro é necessário 
para se comprar um governo.” O que 
temos hoje é, com efeito, um sistema 
44
Anotações: dual, o sistema oficial das “economias 
nacionais” dos Estados, e o real, mas 
não oficial, das unidades e instituições 
transnacionais. Ao contrário do Esta-
do com seu território e poder, outros 
elementos da “nação” podem ser e são 
facilmente ultrapassados pela glo-
balização da economia. Etnicidade e 
língua são dois exemplos óbvios. Sem 
o poder e a força coercitiva do Esta-
do, sua relativa insignificância é clara. 
Como a globalização da economia 
procede aos saltos, “comprar gover-
nos” é, certamente, cada vez menos 
necessário. A clara incapacidade dos 
governos de equilibrar as contas com 
os recursos que controlam (isto é, os 
recursos que eles podem estar certos 
de que continuarão no domínio de sua 
jurisdição independente do modo que 
escolham para equilibrar as contas) 
seria suficiente para fazê-los não só 
se renderem ao inevitável, mas tam-
bém colaborarem ativamente e de 
bom grado com os “globais” (BAUMAN 
apud CASTRO, 2011, p. 200).
Uma questão atual ocupou o etnólogo francês 
Bruno Latour: o debate sobre clima e negacionismo. 
As ideias defendidas pelo intelectual francês em 
“Onde Aterrar? — Como se orientar politicamente 
no Antropoceno,” é de que os acontecimentos 
políticos dos últimos 50 anos estão mobilizados 
em torno da discussão sobre o fenômeno das 
mudanças climáticas da Terra — e de sua negação. 
Segundo Latour (2020), a desregulamentação dos 
45
Anotações:Estados após a queda do muro de Berlim, o aumento 
das desigualdades sociais em todo o planeta e a 
negação da existência de mudanças climáticas, 
são processos de uma mesma situação histórica 
em que as elites perceberam que não existe mais 
espaço para sua existência (e de seus hábitos, 
relações com o capital e o consumo) no mesmo 
tempo e nas mesmas condições que o restante dos 
habitantes do planeta. 
Se nos anos 90 havia um notório esforço das 
lideranças globais e redes de ativistas e organi-
zações sociais em torno do debate ambientalista, 
vide a realização de grandes eventos sobre o Clima, 
como a ECO 92 no Rio de Janeiro, como respos-
ta ao escasseamento de recursos naturais diante 
do avanço predatório das demandas capitalistas, 
houve também a compreensão de que o modo de 
vida industrial moderno, não era sustentável para 
a manutenção da vida, principalmente humana, no 
planeta. As elites optaram, então, por incentivar a 
negação do fim dos recursos naturais, do desgaste 
das condições climáticas, assim como construir 
comunidades muradas para si, entre outras es-
tratégias de proteção como a exploração de novos 
planetas e viagens espaciais. Dessa forma, tam-
bém incentivaram a negação da globalização, para 
assim apregoar a ideia de que não somos codepen-
dentes e interligados por relações e decisões políti-
co-econômicas. 
Para Latour, é possível identificar dois mar-
cos temporais que evidenciam essa estratégia 
de negação à globalização. O primeiro é a saída 
dos EUA, por meio da decisão de Donald Trump, 
do acordo de Paris em 2017; o segundo é o Brexit, 
46
Anotações: movimento de desvinculação da Inglaterra à União 
Europeia. O autor defende que o movimento ini-
cial dasondas negacionistas globais, começa com 
a negação das mudanças climáticas. Seu ápice é 
o engajamento produzido pelo movimento políti-
co de Trump, pautado pela questão ecológica, e 
pela negação da globalização. Fazer a “América 
grandiosa de novo [Make America Great Again]” no 
trumpismo, pressupõe o acirramento das relações 
de fronteira, a negação da escassez de recursos, o 
retorno ao modelo de crescimento americano dos 
anos 60/70.
Se antes, as disputas ideológicas eram 
marcadas pelas diferenças entre os projetos de 
futuro, entre progressistas e reacionários, esquerda 
e direita, atualmente vivemos numa retração 
dessa disputa, que produz, de ambos os “lados”, 
um efeito de recolhimento desses movimentos 
ideológicos às suas próprias bolhas. As posições 
políticas, agora, baseiam-se principalmente na 
defesa de territórios ideológicos (e delimitação 
destes). Assim, para Latour (2020), o Antropoceno 
– era da intervenção humana na biosfera – impõe 
desafios em torno de habitar a Terra. Nesse novo 
processo político, capitaneado pelas alterações 
climáticas e sua negação, a Terra se torna um 
sujeito político, mobilizando os seres humanos a 
refletirem sobre suas ações no planeta, indicando 
através das catástrofes globais, do surgimento de 
novos vírus, que as consequências da ação humana 
serão vivenciadas comunitariamente, seja pelos 
que ficarão sem casa e terão de migrar de seus 
territórios de origem, seja pelos que serão afetados 
pelas alterações num território que “não é seu”. 
47
Anotações:Por fim, o autor sustenta que a negação da 
mudança climática global é, em si mesma, a negação 
da racionalidade científica. As elites produziram e 
optaram por negar a evidente finitude de recursos 
naturais, criando e patrocinando uma atmosfera de 
negacionismo, principalmente em torno da ciência 
e de suas evidências, de modo que confundiu as 
classes populares em relação aos fatos, engajando 
milhares de fake news, que além de distorcerem as 
verdades, distraem as massas sobre os problemas 
que virão. Nas palavras do autor, “não se trata de 
uma política da ‘pós-verdade’, mas sim de uma 
política da pós-política, ou seja, literalmente sem 
objeto, na medida em que ela rejeita o mundo que 
reivindica habitar” (LATOUR, 2020, p. 35).
48
Filmes para conferir:
O Jovem Karl Marx (Raoul Peck, 2018): retrato 
biográfico de Karl Marx que narra as vivências de 
sua juventude e o início de sua amizade com Engels, 
que o levaria a se tornar uma das personalidades 
mais importantes do século 19.
Trabalho Interno (Charles Ferguson, 2010): 
documentário sobre a recessão econômica global, 
com início nos EUA, em 2008. Demonstra como 
bancos e acordos de falência amarrados com o 
Estado, levaram ao aumento de desemprego e 
pessoas desabrigadas.
Para seguir:
Tese Onze: canal no YouTube organizado por 
Sabrina Fernandes, socióloga, que debate temas 
contemporâneos à luz das teorias sociológicas.
U
ni
da
de
 2
Videoaula 1
Videoaula 2
52
Anotações:
53
DEBATES 
FUNDAMENTAIS EM 
ANTROPOLOGIA
EVOLUCIONISMO SOCIAL
Diferente da Sociologia, cujos 
paradigmas circulam muito mais em 
torno da obra de autores emblemáti-
cos, na Antropologia, os marcadores 
paradigmáticos serão construídos, 
principalmente, a partir de “escolas 
de pensamento”. Há uma miríade de 
perspectivas teóricas em Antropolo-
gia, porém, a subdivisão mais clássica 
se dá pelo marcador da nacionalidade 
onde o conjunto teórico foi desenvolvi-
do. As principais são:
54
Anotações: a. Antropologia Francesa1: originada a par-
tir da Escola de Sociologia francesa, com 
influência de Émile Durkheim e, principal-
mente, Marcel Mauss, com preocupações 
teóricas voltadas para a compreensão de 
sistemas e estruturas universais da hu-
manidade. Nos anos 50, tem grande re-
percussão a partir da obra de Claude Lévi-
Strauss e sua Antropologia Estruturalista.
b. Antropologia Britânica: é uma escola de 
pensamento com grande ênfase na Et-
nografia e no Trabalho de Campo. A an-
tropologia britânica é sobretudo empírica. 
Esteve diretamente ligada aos projetos 
coloniais ingleses, principalmente no con-
tinente africano, provocando intensos de-
bates nos anos 80 sobre a ética da finali-
dade do trabalho antropológico. 
c. Antropologia Americana: marcada por 
diferentes fases, do Evolucionismo Social 
ao Culturalismo e Interpretativismo, a 
Antropologia Americana tem a noção 
de Cultura como ponto de partida, 
destacando sua diversidade. É a partir dela 
que o olhar para os problemas internos — 
da sociedade em que se situa — tiveram 
destaques e confrontamentos. 
Aqui citaremos alguns desses debates de 
forma introdutória, lidando com as transformações 
1 LAPLATINE, Françoise. Aprender Antropologia. São Paulo, 
Ed. Brasiliense, 2010.
55
Anotações:de objeto da Antropologia e, sobretudo, com as 
mudanças em torno do conceito de Cultura. O 
primeiro paradigma teórico em Antropologia foi 
o “Evolucionismo Social”, tendo como principais 
autores: 
Lewis Morgan (EUA)2: os interesses de 
Morgan nos estudos antropológicos se iniciam a 
partir dos temas “família”, “herança” e “parentesco”. 
Dedicou muitos anos ao estudo e comparação de 
sistemas de parentesco humanos, distinguindo 
como os “selvagens” faziam suas classificações 
em comparação às sociedades “civilizadas”. Suas 
pesquisas resultaram na publicação de “Sistemas 
de Consanguinidade e Afinidade da Família Humana” 
e, posteriormente, “a sociedade antiga”, a qual 
demonstra os estágios de progresso da sociedade 
humana através da análise de cinco casos 
exemplares: os aborígines australianos, os índios 
iroqueses, os astecas, os gregos e os romanos.
Edward Tylor (UK/EUA)3: foi o primeiro 
autor a estabelecer uma definição para o conceito 
de “cultura”, em seu livro “Cultura primitiva”. 
Descreveu Cultura como equivalente à Civilização, 
estabelecendo, a partir desse pressuposto, que 
os povos “não civilizados” (todos os povos fora da 
Europa e não-colonizados) não detinham cultura. 
Seu conceito dizia “Cultura ou Civilização, “é aquele 
todo complexo que inclui conhecimento, crença, 
arte, moral, lei, costume e quaisquer outras 
2 CASTRO, Celso. Evolucionismo Cultural: textos de Morgan, 
Tylor e Fazer. Rio de Janeiro, Ed. Zahar, 2009.
3 Ibidem.
56
Anotações: capacidades e hábitos adquiridos pelo homem na 
condição de membro da sociedade.”
James Frazer (UK)4: sua obra principal foi 
“O Ramo de Ouro”, publicado pela primeira vez em 
1890, em dois volumes, com um total de oitocentas 
páginas. A segunda e a terceira versões foram 
publicadas com respostas a várias críticas de 
outros autores da mesma época, chegando a 13 
exemplares no total. Em 1922, Frazer preparou uma 
versão condensada em um volume que se tornou 
a versão mais conhecida, publicada até os dias 
atuais.
É importante destacar que o Evolucionismo 
Social é uma perspectiva teórica considerada 
superada, porém, estudá-la é necessário para 
entender qual o percurso da Antropologia, como 
surgem as compreensões modernas do conceito 
de cultura, e quais as “sombras” do evolucionismo 
social que ainda permanecem. O postulado básico 
do evolucionismo, em sua fase clássica, era o de 
que, em todas as partes do mundo, a sociedade 
humana teria se desenvolvido em estágios 
sucessivos e obrigatórios, numa trajetória unilinear 
e ascendente. Nessa lógica, toda a humanidade 
deveria passar pelos mesmos estágios de evolução 
social, seguindo uma direção que ia do mais simples 
(os selvagens) ao mais complexo (civilização). 
Como decorrência da visão de um único 
caminho evolutivo humano, os povos “não 
ocidentais”, “selvagens” ou “tradicionais” existentes, 
no mundo contemporâneo, eram vistos como uma 
4 Ibidem.
57
Anotações:espécie de “museu vivo” da história humana, tidos 
como representantes de etapas anteriores da 
trajetória universal do homem rumo à “civilização”; 
como exemplos vivos daquilo “que já fomos um dia”. 
Na medida em que a arqueologia era, então, 
pouco desenvolvida e não havia registroshistóricos 
disponíveis para a reconstituição dos estágios 
supostamente mais “primitivos”, o estudo dessas 
sociedades assumia enorme importância, pois 
assim se poderia reconstituir o caminho evolutivo 
da humanidade, através de suas diferentes etapas. 
Passava-se a dispor de uma espécie de 
“máquina do tempo” que permitia, observando o 
mundo dos “selvagens” de hoje, ter uma ideia de 
como se vivia em épocas passadas. Para Frazer 
(apud CASTRO, 2009, p. 107), “a selvageria é a 
condição primitiva da humanidade e, se quisermos 
entender o que era o homem primitivo, temos que 
saber o que é o homem selvagem hoje”. A solução 
para preencher as “lacunas” do longo período 
“primitivo” de evolução cultural humana era utilizar 
o método comparativo, aplicando-o ao grande 
número de sociedades “selvagens” existentes 
contemporaneamente. 
58
Marcel Mauss
Mauss foi aluno notável e sobrinho de Émile 
Durkheim, sendo iniciado na Sociologia pelo seu 
tio, na Universidade de Bordeaux. Diferente de 
Durkheim, que escreveu obras extensas ao longo 
da vida, Mauss era um intelectual de ensaios, 
com olhar mais direcionado para questões de 
etnologia (estudo das sociedades “simples”) e sua 
obra se dedica, principalmente, aos aspectos mais 
elementares da cultura humana, na perspectiva de 
que a partir da compreensão sobre a vida social 
na sua forma mais simplifi cada, pode-se alcançar 
os signifi cados dos fenômenos nas sociedades 
complexas.
Sua obra de maior importância foi o 
“Ensaio sobre a dádiva”, onde 
analisa diversas formas de trocas 
econômicas entre sociedades ditas 
“arcaicas”. É crucial para a teoria 
antropológica, pois estabeleceu uma 
série de comparações entre formas 
elementares de troca entre diferentes 
sociedades, assim como acordos e relações 
que essas trocas asseguram. Em termos gerais, 
defende que a troca se baseia em um sistema de 
Dádiva, onde “dar”, necessariamente cria uma 
expectativa pela retribuição. O esquema da Dádiva 
se prolonga num processo que implica em “dar”, 
“receber” e “retribuir”. 
Em 1902 assumiu a cátedra de “História 
das religiões dos povos não civilizados”, como 
professor e diretor de pesquisas da École 
Pratique des Hautes Études, de Paris.
elementares da cultura humana, na perspectiva de 
que a partir da compreensão sobre a vida social 
na sua forma mais simplifi cada, pode-se alcançar 
os signifi cados dos fenômenos nas sociedades 
complexas.
Sua obra de maior importância foi o 
“Ensaio sobre a dádiva”, onde 
analisa diversas formas de trocas 
econômicas entre sociedades ditas 
“arcaicas”. É crucial para a teoria 
antropológica, pois estabeleceu uma 
série de comparações entre formas 
elementares de troca entre diferentes 
sociedades, assim como acordos e relações 
que essas trocas asseguram. Em termos gerais, 
defende que a troca se baseia em um sistema de 
Dádiva, onde “dar”, necessariamente cria uma 
expectativa pela retribuição. O esquema da Dádiva 
se prolonga num processo que implica em “dar”, 
“receber” e “retribuir”. 
Em 1902 assumiu a cátedra de “História 
das religiões dos povos não civilizados”, como 
professor e diretor de pesquisas da École 
Pratique des Hautes Études, de Paris.
59
Anotações:NATUREZA E CULTURA
O embate a partir do Evolucionismo Social é 
sobre a qualidade dos aspectos que compõem a 
humanidade. Somos humanos pela nossa unidade 
biológica, mas seríamos equivalentes mesmo com 
formas de organização social tão diferentes? Para 
os evolucionistas, havia aprendizados necessários 
e inevitáveis para que os povos ditos “selvagens” 
adquirissem equivalência no status de humanidade 
em relação às sociedades ditas “civilizadas”. 
Nessa perspectiva, há vários problemas, 
principalmente, pela posição em que as teorias são 
produzidas pelos seus contextos. A dúvida em torno 
da humanidade dos “selvagens” era colocada pelos 
colonizadores, que tinham suas próprias sociedades 
como espelho da “civilização”. Essa inferiorização 
social das sociedades ditas “selvagens”, reverberou 
em projetos racistas contra sociedades africanas, 
asiáticas e ameríndias, como se o aprendizado da 
civilização tivesse, necessariamente que passar 
pela universalidade racial (europeia, branca). Laraia 
(2001, p. 12) afirma que:
São velhas e persistentes as teorias 
que atribuem capacidades específi-
cas inatas a ‘raças’ ou a outros grupos 
humanos. Muita gente ainda acredita 
que os nórdicos são mais inteligen-
tes do que os negros; que os alemães 
têm mais habilidade para a mecânica; 
que os judeus são avarentos e nego-
ciantes; que os norte-americanos 
são empreendedores e interesseiros; 
que os portugueses são muito tra-
60
Anotações: balhadores e pouco inteligentes; 
que os japoneses são trabalhadores, 
traiçoeiros e cruéis; que os ciganos 
são nômades por instinto, e, final-
mente, que os brasileiros herdaram a 
preguiça dos negros, a imprevidência 
dos índios e a luxúria dos portugueses.
Os antropólogos estão totalmente convenci-
dos de que as diferenças genéticas não são deter-
minantes das diferenças culturais. A experiência do 
nazismo a partir da 2ª Guerra Mundial, levou a UNES-
CO a estabelecer junto a antropólogos, geneticistas, 
biólogos e outros especialistas, a declaração uni-
versal dos Direitos Humanos, que assegura a uni-
versalidade da humanidade e o direito à diferença 
étnica, racial e cultural. A partir da Declaração Uni-
versal dos Direitos Humanos, Laraia (2001) destaca, 
principalmente, os seguintes itens: 
10. Os dados científicos de que 
dispomos atualmente não confirmam 
a teoria segundo a qual as diferenças 
genéticas hereditárias constituiriam 
um fator de importância primordial 
entre as causas das diferenças que 
se manifestam entre as culturas e as 
obras das civilizações dos diversos 
povos ou grupos étnicos. Eles nos 
informam, pelo contrário, que essas 
diferenças se explicam, antes de 
tudo, pela história cultural de cada 
grupo. Os fatores que tiveram papel 
preponderante na evolução do homem 
são a sua faculdade de aprender e a 
sua plasticidade. Esta dupla aptidão 
61
Anotações:é o apanágio de todos os seres 
humanos. Ela constitui, de fato, uma 
das características específicas do 
Homo sapiens.
15. b) No estado atual de nossos 
conhecimentos, não foi ainda provada 
a validade da tese segundo a qual os 
grupos humanos diferem uns dos 
outros pelos traços psicologicamente 
inatos, quer se trate de inteligência 
ou temperamento. As pesquisas 
científicas revelam que o nível das 
aptidões mentais é quase o mesmo 
em todos os grupos étnicos (UNESCO 
apud LARAIA, 2001, p. 13).
Mesmo diante da superação científica do 
determinismo biológico, ainda é comum ouvir-
mos sobre qualidades — positivas ou negativas — 
transmitidas pela genética, pelo “sangue”. O bom 
desempenho em práticas esportivas é justificado 
pela herança de um avô que quase foi jogador da 
seleção; o sucesso musical de um cantor, porque 
seus pais eram músicos. São exemplos comuns 
dessa crença na transmissão de qualidades pela 
natureza. Contudo, o determinismo também opera 
para reducionismos negativos sobre as pessoas.
O crime de um adolescente acaba sendo jus-
tificado pelos comportamentos dos pais, pela sua 
diferença racial/biológica, como se as condições 
sociais e históricas não pesassem em desfavor 
do seu destino. O mesmo pode ser descrito so-
bre o sucesso de grandes empresários jovens, 
comumente retratados nas grandes revistas de 
negócios, que vendem uma narrativa de esforço 
62
Anotações: pessoal, quando sua biografia demonstra uma 
série de privilégios sociais e uma herança farta que 
explica o “sucesso incomum”.
O homem é o resultado do meio cul-
tural em que foi socializado. Ele é um 
herdeiro de um longo processo acu-
mulativo, que reflete o conhecimen-
to e a experiência adquiridos pelas 
numerosas gerações que o ante-
cederam. A manipulação adequada 
e criativa desse patrimônio cultural 
permite às inovações e às invenções. 
Estas não são, pois, o produto da ação 
isolada de um gênio, mas o resultadodo esforço de toda uma comunidade 
(idem, p. 42).
Compreender a Cultura como uma influência 
forte no processo de socialização, também passa 
pelo entendimento de que as Culturas humanas 
são diversas. Em seu artigo “Raça e História”, Lévi-
Strauss (2017) escreve uma passagem linda para 
refletir sobre a diversidade cultural humana.
É indubitável que os homens elabora-
ram culturas diferentes em virtude 
do seu afastamento geográfico, das 
propriedades particulares do meio e 
da ignorância em que se encontravam 
em relação ao resto da humanidade, 
mas isso só seria rigorosamente 
verdadeiro se cada cultura ou cada 
sociedade estivesse ligada e se tivesse 
desenvolvido no isolamento de todas as 
outras. Ora, isso nunca aconteceu, salvo 
63
Anotações:talvez em casos excepcionais como 
o dos Tasmanianos (e ainda aí para 
um período limitado). As sociedades 
humanas nunca se encontram isoladas; 
quando parecem mais separadas, é 
ainda sob a forma de grupos ou de 
feixes. Assim, não é exagero supor 
que as culturas norte-americanas e as 
sul-americanas tenham permanecido 
separadas de quase todo o contato com 
o resto do mundo durante um período 
cuja duração se situa entre dez mil e 
vinte e cinco mil anos (LÉVI-STRAUSS, 
2017, p. 341).
Para Lévi-Strauss (2017), não se pode supor 
que essa “separação” entre as sociedades desco-
bertas pelos europeus através do contato colo-
nial, significasse o total isolamento desse grande 
fragmento da humanidade. Essas sociedades 
eram grandes, mantinham contatos e relações es-
treitas entre si. Quando se mantinham isoladas ou 
distantes umas das outras, estavam demarcando 
oposição e distinção buscando fortalecimento de 
seus próprios costumes. Essas culturas não sur-
giram de acidentes, ou do acaso evolutivo, mas de 
disputas acirradas pelo desejo de não se tornarem 
“atrasadas” em relação aos seus vizinhos. Portan-
to, a diversidade humana não pode ser reduzida ao 
isolamento desses grupos, mas das relações (de 
disputa, conflito, comparação, distinção) que es-
tabelecem entre si.
Margareth Mead (1901-1978), antropóloga 
americana, foi fundamental para a compreensão 
de como a cultura molda os comportamentos e 
64
Anotações: papéis sociais. Também foi uma das intelectu-
ais responsáveis pela desnaturalização dos ditos 
“papéis sexuais”. Em seu livro "Sexo e Tempera-
mento", Mead (1969) fez uma comparação sobre 
como homens e mulheres desempenhavam pa-
péis diferentes de acordo com cada cultura, (que 
atualmente compreendemos como relações de 
gênero) a partir de três tribos da Nova Guiné, (Ara-
pesh, Mundugumor e Tchambuli). A cultura Arapesh 
é caracterizada como maternal, tendo seu valor 
atribuído por meio da “doçura” nas expressões e 
comportamentos. Quanto aos Mundugumor, tinham 
o comportamento agressivo e fomentado a homens 
e mulheres. 
A comparação entre sociedades com proxi-
midade geográfica ajuda a esclarecer que, embora 
certas ideias vigentes em determinados lugares 
sociais relacionem certos trabalhos com um dos 
sexos, em outra sociedade a coisa se passa de modo 
muito distinto. Mead nos ajuda a compreender que 
os ditos “instintos”, não são aspectos inatos da hu-
manidade, mas são elaborados a partir de nossa 
educação e se reproduzem por meio de aprendiza-
gem social. A autora afirma, por exemplo, que até 
a amamentação, ato que poderia ser considerado 
exclusivo das mulheres (que possuem mamas, 
seios), pode ser transferida a um marido moderno 
por meio da mamadeira. Se ideias como “instinto 
materno” ou “instinto sexual” fossem padrões ge-
neticamente determinados, todas as sociedades 
agiriam da mesma forma diante das mesmas 
situações.
65
Anotações:ETNOCENTRISMO E ALTERIDADE
Apesar de muitos avanços e debates que 
consolidam a ideia de diversidade cultural, ela, 
ainda, parece sempre escandalosa. Nosso pon-
to de vista sobre “o outro” opera sempre a partir 
da nossa própria cultura e, esse primeiro olhar, 
tendencioso, preconceituoso, tende a considerar 
outros modos de vida como menos apropriados. 
Esse comportamento é chamado de “etnocentris-
mo” e, levado ao extremo, reverbera em conflitos 
sociais e marginalizações entre diferentes grupos 
(ou de um grupo sobre outro): 
O etnocentrismo, de fato, é um 
fenômeno universal. É comum a cren-
ça de que a própria sociedade é o 
centro da humanidade, ou mesmo a 
sua única expressão. As auto denomi-
nações de diferentes grupos refletem 
este ponto de vista. Os Cheyene, ín-
dios das planícies norte-americanas, 
se autodenominavam “os entes hu-
manos”; os Akuáwa, grupo Tupi do Sul 
do Pará, consideram-se “os homens”; 
os esquimós também se denominam 
“os homens”; da mesma forma que os 
Navajo se intitulavam “o povo”. Os 
australianos chamavam as roupas 
de “peles de fantasmas”, pois não 
acreditavam que os ingleses fossem 
parte da humanidade; e os nossos 
Xavantes acreditam que o seu ter-
ritório tribal está situado bem no cen-
tro do mundo. É comum assim a cren-
ça no povo eleito, predestinado por 
66
Anotações: seres sobrenaturais para ser superior 
aos demais. Tais crenças contêm o 
germe do racismo, da intolerância, e, 
frequentemente, são utilizadas para 
justificar a violência praticada con-
tra os outros. A dicotomia “nós e os 
outros” expressa em níveis diferentes 
essa tendência (op.cit., p. 70).
Sendo assim, em uma mesma sociedade, a 
primeira distinção que fazemos é entre pessoas 
da família e pessoas de fora da família. Tendemos 
a estabelecer um tratamento diferenciado entre 
nossos familiares e pessoas que não pertencem 
a esse círculo. De tal modo, ampliamos essa 
diferenciação nas formas de tratar as pessoas, a 
partir do pertencimento delas ao mesmo grupo 
de amigos, à mesma vizinhança, à mesma região 
do país e à mesma nação. Desse processo de 
aglutinação e diferenciação, resultam distinções, 
preconceitos e formas extremas de preservação 
que priorizam as nossas identificações. 
Como dissemos, a tendência mais comum 
entre os grupos humanos é de considerar lógico, 
apenas o próprio sistema cultural, atribuindo 
a outras culturas e sociedades certo grau de 
irracionalidade. Porém, os dados sobre uma 
cultura devem ser analisados como um sistema 
com lógicas próprias, e não na perspectiva de um 
estrangeiro (que em nosso caso também pode ser o 
pesquisador/antropólogo).
Em “O Pensamento Selvagem”, Claude Lévi-
Strauss dedicou-se a refutar as teorias evolucion-
istas cujas conclusões indicavam que os sistemas 
de pensamento dos “selvagens”, eram inferiores e 
67
Anotações:“pré-lógicos” em relação à ciência das sociedades 
brancas, ditas civilizadas. Muitas sociedades tidas 
como “primitivas” confirmam valores e constro-
em seus sistemas de crenças em torno da magia, 
de cosmologias próprias que dão sentido ao seu 
mundo. Lévi-Strauss comprovou que o pensamen-
to mágico ou cosmológico tem uma estrutura com-
plexa e bem articulada. 
Ao contrário do que as teorias evolucionistas 
faziam crer, o pensamento mágico não antecede 
o pensamento científico, ambos existem simulta-
neamente. A Antropologia constitui-se como uma 
ciência que se opõe ao etnocentrismo. Essa não 
é uma tarefa fácil, pois o antropólogo quase sem-
pre se constitui como um sujeito que não com-
partilha do mesmo ponto de vista daquelas culturas 
ou sociedades que estuda. Para desvencilhar-se do 
etnocentrismo, a Antropologia recorre à noção de 
“alteridade”:
A abordagem antropológica provoca 
uma verdadeira revolução do olhar. 
Ela implica um descentramento radi-
cal, uma ruptura com a ideia de que 
existe um “centro do mundo”, e cor-
relativamente, uma ampliação do sa-
ber e uma mutação de si mesmo. A 
descoberta da alteridade é a de uma 
relação que nos permite deixar de 
identificar nossa pequena província 
de humanidade com a Humanidade 
(em sua totalidade), e correlativa-
mente deixar de rejeitar o presumido 
“selvagem” fora de nós mesmos. Con-
frontados com a multiplicidade das 
68
Anotações: culturas, somos aos poucos levados 
a romper com a abordagem comum 
que operana naturalização da vida 
social (como se nossos comporta-
mentos estivessem inscritos em nós 
desde o nascimento e não fossem 
adquiridos no contato com a cultura 
em que nascemos) (...) (LAPLAN-
TINE, 2010, p. 22).
A partir do pensamento antropológico 
contemporâneo, a alteridade torna-se um elemento 
fundamental para que o exercício antropológico de 
aproximação de culturas diferentes das nossas, 
seja realizado de forma respeitosa, estabelecendo 
possibilidades de aprendizados e trocas culturais. 
Além de necessária na realização do trabalho 
antropológico, a noção de alteridade será muito 
útil para tornar mais saudável o convívio com a 
diferença social.
TRABALHO DE CAMPO E ETNOGRAFIA 
Uma das rupturas em relação à fase do 
Evolucionismo Social na construção da teoria 
antropológica, foi a construção da etnografia, 
como resultado da pesquisa empírica junto 
às sociedades e povos estudados. Bronislaw 
Malinowski (1884-1942) foi canônico ao propor o 
método de “observação participante” como meio 
para obtenção de dados sobre a vida dos nativos. 
Hoje, a pesquisa em antropologia ainda segue a 
tradição inaugurada por Malinowski. É muito comum 
que nossas pesquisas prezem pela proximidade 
com os sujeitos dos grupos sociais investigados, 
69
Anotações:produzindo documentos sobre nossas impressões, 
conversas, sobre festividades e momentos rituais, 
entre outras circunstâncias importantes da vida 
social. 
A pesquisa de campo realizada por Malinowski 
teve as Ilhas Trobriandesas, na região ocidental 
do Pacífico, como lócus de pesquisa. Dessa 
experiência, escreveu “Argonautas do Pacífico 
ocidental”, “A vida sexual dos selvagens” e “Jardins 
de coral”. Dessas três obras, “Argonautas” é a de 
maior destaque, pois além de descrever o circuito 
do kula (sistema de trocas e hierarquias) e a 
construção das wagas (navegações), é nessa obra 
que apresenta seu método e as etapas de sua 
pesquisa. Segundo Malinowski (2018),
Em etnografia, o autor é ao mesmo 
tempo seu próprio cronista e o his-
toriador, enquanto suas fontes sem 
dúvida são facilmente acessíveis, 
mas também supremamente esqui-
vas e complexas; elas não estão cor-
porificadas em documentos mate-
riais, fixos, mas no comportamento 
e na memória de homens vivos. Em 
etnografia, muitas vezes há enorme 
distância entre o material bruto da 
informação — tal como é apresentado 
ao estudioso em suas próprias obser-
vações, nas afirmações dos nativos, 
no caleidoscópio da vida tribal — e a 
apresentação final autorizada dos re-
sultados. O etnógrafo tem de transpor 
essa distância nos laboriosos anos 
que decorrem entre o momento no 
qual pisa numa praia nativa, faz suas 
70
Anotações: primeiras tentativas de entrar em 
contato com os nativos, e o momento 
em que redige a versão final de seus 
resultados (p. 57).
O pensador também explica como devem ser 
estabelecidas as relações em campo, enfatizando 
que o contato primordial deve ser com os “nativos”. 
Durante o processo de aprendizado sobre um grupo 
ou cultura diferente do nosso, a imersão nas lógicas 
e rotinas do lugar são essenciais. Além disso, 
é importante não perder de vista nosso status 
de “outro” diante daqueles de quem queremos 
informações. Esses laços não são desinteressados, 
mas nem por isso chegam a ser superficiais.
Como foi dito, elas consistem prin-
cipalmente em afastar-se da com-
panhia de outros brancos e per-
manecer no contato mais estreito 
possível com os nativos, o que real-
mente só pode ser alcançado acam-
pando em suas aldeias. É muito bom 
ter uma base nas instalações de al-
gum homem branco para os materiais 
e saber que há um refúgio ali quando 
estamos adoentados ou cansados 
dos nativos. Mas ela deve estar su-
ficientemente afastada para não se 
transformar no meio permanente em 
que você vive e do qual emerge em 
horas fixas somente para “trabalhar 
na aldeia”. Não deveria nem ser próxi-
ma o bastante para que recorramos a 
ela a qualquer momento em busca de 
distração (idem p. 58-59).
71
Anotações:Figura 4 - Malinowski, em pesquisa de campo nas 
Ilhas Trobriand
Fonte: Fotografia de Billy Hanckock. In: Malinowski, 2018.
Outro aspecto das relações é a forma de 
como obtemos os dados em campo. Dificilmente, 
as pessoas têm respostas prontas para as nossas 
perguntas e, às vezes, dependendo dos nossos 
questionamentos, elas não se sentem confortáveis 
para responder. Todas as sociedades têm temáticas 
tabu, situações que não são faladas abertamente 
para estranhos. Malinovski (2018) apresenta 
algumas estratégias para lidar com esse dilema: 
Embora não possamos interrogar um 
nativo sobre regras gerais, abstratas, 
podemos sempre indagar como um 
dado caso seria tratado. Assim, por 
exemplo, ao perguntar como eles 
tratariam o crime, ou o puniriam, seria 
inútil fazer a um nativo uma pergunta 
abrangente como “De que maneira 
você trataria e puniria um criminoso?”, 
porque não seria possível sequer 
72
Anotações: encontrar palavras para expressá-la 
em um idioma nativo. Mas um caso 
imaginário ou, melhor ainda, uma 
ocorrência real estimulará o nativo 
a expressar sua opinião e a fornecer 
informações abundantes (p. 68-69).
Há, ainda, muitas situações e fenômenos 
importantes que não conseguimos registrar 
imediatamente. A convivência envolve múltiplas 
formas de participação e atenção, que podem nos 
fazer deixar de anotar ou gravar as cenas e conversas 
no calor dos acontecimentos. Esses fenômenos são 
chamados de “os imponderáveis da vida real”. São 
coisas como a rotina do trabalho, formas de cuidado 
com o corpo, maneiras de preparar e consumir os 
alimentos, as expressões emocionais, os laços 
fortes de amizade e as antipatias entre pessoas. 
Todos esses fatos podem e devem 
ser cientificamente formulados e 
registrados, mas é necessário que 
isso não seja feito com um registro 
superficial de detalhes, como é 
costume entre os observadores não 
treinados, porém com um esforço 
para penetrar a atitude mental que 
neles se expressa (idem, p. 72).
Malinovski (2018) sugere três caminhos para 
abordar o trabalho de campo. São eles:
1. A organização da tribo e a anatomia de sua 
cultura devem ser registradas num esboço 
firme, claro. O método de documentação 
73
Anotações:concreta, estatística, é o meio pelo qual 
esse esboço deve ser feito.
2. Os imponderáveis da vida real e o tipo 
de comportamento devem ser inseridos 
no interior dessa estrutura. Eles têm 
de ser colhidos mediante observações 
minuciosas, detalhadas, na forma de algum 
tipo de diário etnográfico, possibilitando 
estreito contato com a vida nativa.
3. Uma compilação de depoimentos et-
nográficos, narrativas características, pro-
nunciamentos típicos, itens de folclore e 
fórmulas mágicas devem ser considerados 
um corpus inscriptionum, como documen-
tos da mentalidade nativa.
Uma sequência para a construção do trabalho 
antropológico, clássico na antropologia brasileira, 
foi proposto por Roberto Cardoso de Oliveira em 
seu livro “O trabalho do Antropólogo”. Oliveira (2006) 
argumenta que o trabalho do antropólogo consiste 
em três atos cognitivos primordiais: Olhar, Ouvir 
e Escrever. Os dois primeiros são executados, 
quase sempre, simultaneamente. O autor propõe 
algumas experimentações em torno de cada um. 
Imagine chegar em uma sociedade completamente 
desconhecida, da qual não se domina o idioma 
nativo? As primeiras impressões serão construídas 
a partir do Olhar.
Pelo Olhar, podemos notar como as pessoas 
se vestem, com quem se relacionam, como se 
alimentam, como são as casas, por exemplo. Ouvir, 
complementa o Olhar. Por meio das conversas 
podemos desfazer dúvidas, criar relações com as 
pessoas do lugar, entender como as pessoas se 
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Anotações: chamam, quais os pronomes de tratamento dados, 
os status atribuídos aos membros de um grupo.
Por fim, Oliveira (2006) fala sobre o ato de 
escrever, subdividindo-o em dois momentos: “Estar 
aqui” e “Estar lá”. Se recorrermos ao exemplo de 
Malinovski, veremos que ele tinha registros locais,

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