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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Aula 02: OS PRINCIPAIS PRESSUPOSTOS DE MUDANÇA NO MODELO DE ATENÇÃO PSIQUIÁTRICA, BEM COMO O CONTEXTO DE CRIAÇÃO DOS ATUAIS DISPOSITIVOS DE ATENÇÃO À SAÚDE MENTAL NO BRASIL
Professora Ma. Karla Souza
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
A loucura como questão social
Diversas sociedades, em diferentes momentos históricos, trataram de formas distintas a questão da loucura, associando-a a atributos ora positivos, ora negativos, a depender das questões culturais, econômicas e políticas que estruturavam tais sociedades. 
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
A consideração da loucura como experiência patológica, tal como a conhecemos hoje, diz respeito a um processo econômico, político e cultural relativamente novo, no que concerne ao que denominamos tempo histórico, distinto do tempo de nossa própria existência enquanto indivíduo.
O conceito de dispositivos de Foucault
Segundo Foucault (1972), esse processo só foi possível devido às mudanças que ocorreram na sociedade ocidental e à constituição de uma série de dispositivos de captura e de apropriação do fenômeno da loucura que datam do final do século XVII e início do XVIII.
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Mas o que seria um dispositivo?
Um dispositivo, para Foucault (2014), traduz-se como um conjunto dominante e estratégico que comporta discursos, instituições, arranjos arquitetônicos, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais e filantrópicas que, em um dado momento histórico, tem por função responder a determinadas questões sociais de seu tempo. No que se refere ao momento em que a loucura passa a ser vista como um problema social a ser tratado, um dos principais elementos deste dispositivo será a constituição e o desenvolvimento da medicina mental como campo de saber teórico e prático. Esse campo responsável pela construção de toda uma maneira de ver e falar sobre a loucura transforma-a, nesse caso, em doença mental, isto é, em uma patologia.
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Arranjo arquitetônico seria aquilo que Foucault chamou de instituições disciplinares, neste caso representado pelo manicômio, baseadas num sistema jurídico calcado na segurança social e na reclusão. 
São esses elementos, imbricados uns nos outros, fortalecendo-se mutuamente, que vão produzir a grande teia que constitui aquilo que Foucault chama de dispositivo de captura da loucura, transformada em doença mental. E isso de tal modo que, como veremos adiante, nem mesmo as manifestações dos sintomas poderão ser atribuídas ao que seria a experiência da loucura propriamente dita, em estado puro, mas, sim, àquilo que dela foi feito por esses dispositivos, processo esse que, nos anos 1960, ficou conhecido/nomeado como institucionalização da loucura.
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Breve histórico da questão social da loucura
A visão de Foucault
O estudo desses modelos de compreensão da loucura é abordado em diversas obras. Dentre essas, grande destaque é dado à História da Loucura na Idade Clássica (1961), do pensador francês Michael Foucault (1926-1984), que se constitui no grande marco desses estudos, influenciando definitivamente a historiografia contemporânea sobre o tema. Foucault quer saber quando a loucura passou a ser pensada como doença, entendendo que isso nem sempre foi assim. Segundo Foucault, por volta do final do século XVII, a loucura circulava livremente pelos espaços públicos e era tema recorrente de diversas expressões artísticas, como peças de teatro, romances, entre outros.
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Breve histórico da questão social da loucura
Os loucos “conhecidos” eram tolerados, e os loucos “estranhos”, com comportamentos desviantes e bizarros, incluindo os bêbados e os devassos, eram confinados em navios numa espécie de exílio ritualístico. Essa representação nômade da loucura na Idade Clássica é apresentada por Foucault na Nau dos Loucos ou dos Insanos, simbolizando a busca da razão por meio da purificação pela água, ou também a entrega do louco a seu próprio destino, ou a sua própria sorte.
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Influências da organização social do trabalho
Mudanças de ordem social, como o declínio do feudalismo, o início da industrialização, o crescimento populacional nas cidades, o aumento da expectativa de vida e, sobretudo, as mudanças na organização social do trabalho, tornaram menores os limites de tolerância à loucura. 
O trabalho no campo, por sua vez, respeita o tempo e as leis da natureza, cujas regularidade e alternância podem se adequar com certa facilidade às diferentes formas de ser e estar no mundo. Porém, com o declínio do campesinato e o fim dos ofícios artesanais, o modo de produção deixa de respeitar o tempo de cada um e passa a ser submetido aos batimentos do relógio e ao compasso das máquinas, tornando-se mais discriminatório em ternos de diferenças individuais.
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Influências da organização social do trabalho
São os “tempos modernos”, como satirizado e imortalizado por Charlie Chaplin em seu filme homônimo, de 1936. É nesse período que o trabalho se torna um valor quase que sagrado.
Não se trata mais do trabalho como realização ou expressão de um indivíduo, ou de um “trabalhar para viver”, mas, sim, de um “viver para trabalhar”, da busca por uma máxima exploração das energias dos sujeitos, pensados agora como força de trabalho ou mão de obra, correias de transmissão de uma grande máquina da qual não possui o menor controle.
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Influências da organização social do trabalho
Além dos discursos que visavam glorificar o trabalho duro, exploratório, bem como a exortação moral e religiosa que buscava definir o trabalho como a essência do homem, esse processo exigirá também o uso da força a fim de reprimir a chamada vagabundagem, a mendicância e a ociosidade.
Chibatadas no tronco, marcação a ferro em brasa, multas, prisão e até mesmo pena de morte são algumas das penalidades aplicadas àqueles que se recusavam a se submeter ao novo mundo do trabalho, à nova ordem social.
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Os hospitais gerais como estruturas de exclusão
O louco, que durante longo tempo pôde usufruir de relativa tolerância e liberdade, será incluído no grupo que, por não conseguir se adaptar à nova ordem social, constitui-se como ameaça a esta mesma ordem.
Para Foucault (1972), a origem da medicina mental ou da Psiquiatria encontra seu ápice nesse momento, com a criação, em 1656, do Hospital Geral de Paris, por decreto do rei da França. É também a partir daí que surge um novo lugar social para a loucura, o da segregação e isolamento.
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Encontramo-nos agora numa nova fase da história da loucura, inaugurada por aquilo que ficou conhecido como “o gesto de Pinel”, que seria o de ter libertado os loucos das correntes, humanizando o hospital. Mas Pinel não é famoso apenas por ter liberado a loucura das correntes, mas também porque ele, em um mesmo gesto, teria aprisionado a loucura a outras amarras, em uma prisão mais sutil, como se costuma dizer.
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Inserido em uma certa corrente de pensamento de seu tempo, Pinel e seus contemporâneos passam a conceber a loucura como “alienação mental”, alienação essa cujas causas estariam presentes no meio social. Ora, se as causas da loucura, agora compreendida como “alienação mental”, estavam presentes no meio social,seu tratamento deveria se basear no afastamento do louco do mundo exterior. Ou seja, o tratamento deveria começar com o isolamento.
Ao publicar sua obra, denominada Tratamento Médico-Filosófico sobre a Alienação Mental, Pinel consolidou o conceito de alienação mental e estabeleceu uma nova profissão, a de alienista. Em suma, Pinel fundou os primeiros hospitais propriamente psiquiátricos e instaurou o primeiro modelo de tratamento ao estabelecer o chamado “tratamento moral”, baseado no isolamento, na ordem e na disciplina dos internos. No filme Ilha do Medo (2010), de Martin Scorsese, encontramos bons fragmentos desse tipo de tratamento.
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Isolar passa então a ser considerado um método para proteger o louco da alienação externa, para estabelecer os princípios da ordem e da disciplina, pressupostos do tratamento moral, e para se conhecer a doença em “estado puro”, como em um laboratório.
É assim que, enquanto instituição disciplinar, o hospital de alienados passa a ser pensado como instituição terapêutica, destinado a educar a mente, afastar os delírios e chamar a consciência à realidade. Como advertiu Foucault (1979, p. 107), “é a introdução dos mecanismos disciplinares no espaço confuso do hospital que vai possibilitar sua medicalização”.
Os loucos não são mais enclausurados por caridade ou repressão, mas por um imperativo terapêutico, que nesse contexto significava garantir a segurança do louco e de sua família, liberá-lo das influências externas, vencer suas resistências pessoais, submetê-lo a um regime médico, impor-lhe novos hábitos, entre outros (AMARANTE, 2007).
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Mudança no modelo de atenção psiquiátrica
Vimos anteriormente que, no final do século XVIII, na esteira dos ideais cientificistas da Idade das Luzes, estabeleceu-se aquilo que viria a ser a ciência psiquiátrica. Isso significa dizer que esse campo de saber definiu a loucura como seu objeto de práticas e estudos sistemáticos, buscando descrever suas causas, formas de apresentação, seu desenvolvimento, seu tratamento e sua cura. A essa forma de apropriação da loucura, ou de captura da loucura, como alguns chamavam, convencionou-se denominar de institucionalização da loucura.
Será como questionamento dessa forma de aprisionamento daqueles que escapam à ordem social dominante que irão surgir as chamadas psiquiatrias reformadas, ou aquilo que recebe o nome de Reforma Psiquiátrica, movimentos que, dentro da própria Psiquiatria ou não, têm como horizonte a crítica a esse estado de coisas.
A Psiquiatria é um saber que já nasceu criticado, principalmente por suas contradições relacionadas àqueles ideais da Revolução Francesa, sobretudo os ideais de liberdade e cidadania, uma vez que a formação do cidadão pressupõe a convivência e o compartilhamento de uma vida comunitária em liberdade, na pólis, e não no confinamento e na exclusão.
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Ora, que tratamento libertador é esse cujo princípio básico permanece sendo o aprisionamento do louco e seu afastamento da pólis?
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ARA0384 – SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Se, por um lado, a Psiquiatria possuía ainda um saber demasiadamente precário sobre a loucura, por outro, a elevação de sua condição ao status de saber científico a concedia grandes poderes sobre a população. Um exemplo é o próprio mandato social de privação de liberdade, porém agora com justificativas médico-científicas, para um suposto bem do louco e do meio social. “Como tão pouco saber pode gerar tanto poder?”, questionava Foucault (2006, p. 70) a esse respeito.
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No Brasil, O Alienista, de Machado de Assis, é uma das críticas mais contundentes a esse paradigma, pois coloca em xeque os principais pontos problemáticos desse modelo, que são a discussão sobre o que é ser normal ou anormal, questionando a pretensa neutralidade dos saberes científicos, produtores de verdade sobre a loucura. Conta-se que Machado de Assis teria se inspirado no Hospício de Pedro II. Construído no ano de 1852, na cidade do Rio de Janeiro, esse hospital foi o primeiro a ser completamente inspirado nos modelos franceses, os pinelianos.
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Publicado em 1882, o livro conta a história do doutor Simão Bacamarte, um alienista que, ao se aprofundar em seus estudos de psiquiatria, constrói um manicômio chamado Casa Verde para abrigar os loucos de sua região. A partir de seus próprios critérios de classificação e seleção da loucura, baseados, todavia, em estudos e hipóteses pretensamente científicas, o doutor Simão Bacamarte acaba internando quase toda a população da cidade fictícia de Itaguaí, uma vez que quase ninguém se enquadrava em seus critérios de normalidade, sendo todos anormais, portanto.
Porém, quando se apercebe que todos são anormais e somente ele mesmo é normal, o Dr. Bacamarte conclui que talvez o único anormal seja ele mesmo, internando a si próprio, por consequência, até a morte.
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Como diz uma expressão que ficou famosa no campo da Reforma Psiquiátrica, não adianta acabar com os manicômios se esses locais permanecerem dentro de nós. Ou seja, mesmo que não seja realizada no espaço de um manicômio como descrevemos acima, ainda assim uma prática pode guardar características manicomiais.
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Reforma Psiquiátrica ao redor do mundo
Dentre essas tentativas de superação do modelo asilar, existem aquelas consideradas reformadoras, que buscam recuperar certa essência terapêutica que o hospital possuiria, mas que teria perdido em algum momento. Há também aquelas que buscam romper com o paradigma psiquiátrico tradicional de modo geral, visando à superação do manicômio.
As primeiras tentativas de resgatar a pretensa essência terapêutica da instituição psiquiátrica foram as colônias de alienados, aldeias localizadas no interior das cidades para onde familiares enviavam seus loucos a fim de serem tratados pelo trabalho no campo e pela própria formação de comunidade de trabalhadores, onde ocorria uma suposta cura pelo trabalho.
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No início do século XX, o Brasil foi um grande signatário dessas colônias, criando dezenas delas. Os exemplos mais famosos são a Colônia Juliano Moreira, no Rio de Janeiro, e a Colônia de Juquery, em São Paulo. Essa última chegou a acumular 16 mil internos, e logo se assemelharam aos mesmos asilos que visavam superar, sobretudo por suas práticas asilares de recuperação pelo trabalho.
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Novas tentativas de Reforma Psiquiátrica nasceram no período pós Segunda Guerra Mundial, quando essa condição histórica revelou aspectos terríveis da natureza humana, demonstrando que o tratamento dispensado aos loucos não diferia muito daqueles destinados aos prisioneiros dos campos de concentração e de trabalho forçado, violando diversas dimensões da dignidade humana.
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As Comunidades Terapêuticas e a Psicoterapia Institucional
A partir desse acontecimento histórico, surgem variadas experiências de reforma da instituição psiquiátrica, consideradas pós-pinelianas. Algumas dessas reformas foram mais marcantes, influenciando as práticas no campo da Psiquiatria até os dias de hoje.
É o caso das experiências da “Comunidade Terapêutica” na Inglaterra e da “Psicoterapia Institucional” na França, que acreditavam que o problema da instituição psiquiátrica estava em sua forma de organização, na maneira de gerir as instituições. Sendo assim, essas experiências propunham que, modificando as relações no interior do hospital, seria possível resgatar seu caráter terapêutico. Vamos conhecer melhor cada uma delas.
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A Psiquiatria de Setor e a Psiquiatria Preventiva
No fim dos anos 1950 e início dos 1960, surgem outras duas importantes experiências reformadoras: a Psiquiatria de Setor e a Psiquiatria Preventiva.
A Psiquiatria de Setor tem como personagem principal Lucian Bonnafé, e aponta a necessidade de se realizar um trabalho externo ao manicômio, dando continuidade ao tratamento fora do hospital, após a alta, evitando novos casos. Para isso, serão criados os Centros de Saúde Mental (CSM), distribuídos em diferentes regiões administrativas francesas, de acordo com o índice populacional. Essa experiência teve como característica a inauguração da discussão sobre aquilo que ficou conhecido como regionalização da assistência psiquiátrica, em que a própria divisão do espaço interno do hospital deveria corresponder à região de origem dos pacientes.
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A Psiquiatria de Setor e a Psiquiatria Preventiva
A Psiquiatria Preventiva foi desenvolvida nos EUA por Gerald Caplan, considerado precursor dessa corrente. Sua principal ideia era tornar o hospital obsoleto a partir de medidas preventivas, ou seja, prevenir para não ter que remediar, como se costuma dizer. Naquele período, os hospitais norte-americanos ganharam visibilidade pelas péssimas condições em que se encontravam os internos, vítimas de violência e maus-tratos das mais diversas matizes. Por incentivo do próprio presidente dos EUA, a ordem então era a de reduzir as doenças mentais das e nas comunidades, promovendo a saúde mental. Caplan acreditava que todas as doenças mentais poderiam ser prevenidas, desde que detectadas precocemente, o que daria início a uma caça aos suspeitos que possuíssem alguma.
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A Psiquiatria de Setor e a Psiquiatria Preventiva
O que aconteceu foi que, novamente, todos aqueles indivíduos que apresentavam algum tipo de desadaptação social passaram a ser recolhidos pela ordem psiquiátrica, com a justificativa médica de buscar promover a sua saúde mental, uma vez que apresentavam comportamentos considerados pré-patológicos. No fim, ocorreu um aumento da demanda psiquiátrica nos EUA, já que esses serviços de atenção comunitária acabaram servindo como centros de captação de uma nova clientela, promovendo o que posteriormente foi chamado de medicalização do campo social.
Todavia, apesar dos pesares, a Psiquiatria Preventiva deixou como legado conceitos importantes, como a noção de cuidado comunitário e de saúde mental, em detrimento da associação da Psiquiatria apenas com a noção de doença, e o conceito de desinstitucionalização. Esta, naquele momento, estava muito ligada à noção de desospitalização apenas, significando sobretudo a tentativa de reduzir o tempo médio de internação dos pacientes, antes internados indefinidamente.
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As experiências da Comunidade Terapêutica e da Psicoterapia Institucional visavam a uma intervenção no interior do próprio hospital, numa espécie de reorganização ou democratização de suas relações. Já as experiências da Psiquiatria de Setor e da Psiquiatria Preventiva tinham como expectativa uma reforma por fora, em meio externo, comunitário (ou “comendo pelas beiradas”). Porém, existe ainda um outro conjunto de experiências mais radicais que visavam não apenas à reforma ou à melhoria dos hospitais, mas também ao rompimento com o paradigma psiquiátrico como um todo: a Antipsiquiatria e a Psiquiatria Democrática.
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A Antipsiquiatria foi um movimento que ganhou expressão em meio aos movimentos de contestação social dos anos 1960. Encabeçadas por Ronald Laing e David Cooper, essas experiências partiam do pressuposto de que a mera reforma ou melhoria da instituição psiquiátrica não era suficiente, já que os loucos eram vítimas de violências não apenas desses locais, mas também de suas famílias e da sociedade como um todo. Sua crítica ao modelo psiquiátrico não se restringia aos modelos de tratamento, mas sobretudo aos paradigmas teóricos adotados pela Psiquiatria, que no seu entender adotava referenciais metodológicos equivocados, herdados das ciências naturais. Segundo eles, o conhecimento em ciências humanas seria de uma natureza inteiramente distinta, cujas consequências ético-políticas deveriam ser avaliadas. Como afirmava o próprio Laing: “o que é cientificamente correto pode ser eticamente errado” (LANG, 1988 apud AMARANTE, 2007, p. 53).
Em suma, com a Antipsiquiatria, veremos surgir a primeira crítica ao saber médico-psiquiátrico, no sentido de desautorizá-lo a considerar a esquizofrenia como uma doença, ou como um objeto que poderia ser fixado dentro dos parâmetros científicos então adotados.
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Para a Antipsiquiatria, o que o hospital fazia era reproduzir as mesmas estruturas opressoras da sociedade, produzindo patologias ao invés de tratá-las. Foi nesse sentido que criaram diversos espaços de contracultura, lugares de vida, espaços “anti”, pois a loucura poderia ser vista ainda como um movimento de reação a uma cultura alienante, e, nesse sentido, uma experiência de libertação que guardava dentro de si ainda uma saúde.
A Psiquiatria Democrática tem como principal protagonista o psiquiatra italiano Franco Basaglia, que nos anos 1960 dirigiu o Hospital Psiquiátrico de Gorizia, numa pequena cidade italiana. Ao propor a reforma do hospital psiquiátrico da cidade, promoveu uma série de mudanças práticas e teóricas, relatadas no livro A Instituição Negada, de 1968. Conta-se que, ao adentrar neste hospital pela primeira vez, Basaglia não pôde deixar de compará-lo aos campos de concentração.
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No início de seu trabalho, Basaglia se inspirou na Comunidade Terapêutica e na Psicoterapia Institucional, a fim de recuperar o potencial terapêutico do hospital. Porém, com o passar do tempo, percebeu que esse tipo de mudança não era suficiente, posto que não seria possível combater processos mortificadores com meras medidas administrativas, ou mesmo humanizadoras.
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Basaglia observava que era importante questionar não somente “o manicômio e a psiquiatria como ciência, mas tudo o que, partindo do território, repelia a doença e a confiava à psiquiatria e ao manicômio” (BASAGLIA, 2005 apud AMARANTE, 2007). Esse conceito de “aparato manicomial” se assemelha muito ao conceito de “dispositivo” proposto por Foucault, tal como vimos em nosso primeiro módulo, ao tratar do dispositivo de exclusão da loucura.
Para Basaglia, é esse dispositivo, ou esse “aparato manicomial”, que legitima um lugar de isolamento, segregação, e patologização das experiências humanas, e apenas com sua desconstrução seria possível construir um novo lugar social para a loucura.
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Além da experiência de Gorízia, Basaglia também realizou um trabalho no Hospital Psiquiátrico de Trieste, no Norte da Itália. Foi nesse hospital, na década de 1970, que se deu aquela que é considerada, até hoje, a mais bem-sucedida experiência de transformação da Psiquiatria, constituindo-se como principal referência para o processo de Reforma Psiquiátrica brasileira nas décadas de 1980 e 1990, iniciado na cidade de Santos, no estado de São Paulo.
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A experiência de Trieste demonstrou que era possível substituir o modelo manicomial, e não apenas reformá-lo. Paralelo ao fechamento do hospital, surgem então os serviços substitutivos, representados por um conjunto de estratégias alternativas ao hospital, tendo como finalidade o desmonte daquele enquanto dispositivo de clausura. Diferentemente das demais experiências, esses serviços, como os clubes ou os Centros de Saúde Mental (CSM), por exemplo, não visavamdar continuidade ao tratamento manicomial após a alta, ou servir de estabelecimento intermediário, mas, sim, tomar o lugar da instituição psiquiátrica, substituí-la. Uma das grandes diferenças com relação às experiências anteriores residia na noção de desinstitucionalização, que, como vimos anteriormente, se restringia à desospitalização, e não à desmontagem do aparato asilar como um todo.
Para a Psiquiatria Democrática, é a desmontagem desse aparato, que por sua vez envolve uma gama muito grande de atores sociais, que pode propiciar uma nova relação com os sujeitos em sofrimento mental.
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Obrigada!!!!!
A força está com vocês!!!!
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