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2022/2 Isabella Rocha Baihense @isabellabaihense.psi Estudo dirigido – 1 bimestre (Textos de 1 ao 6) Disciplina: Psicologia e Políticas em Saúde Mental – 2022/ 2 Profª: Camila Mariani 1 – Qual a importância da insituição hospitalar até meados do século XVIII? A quem servia? Qual era seu público? A importância da instituição hospitalar até meados do século XVIII é de “assistência aos pobres”, ou melhor, de segregação, exclusão; para onde se levavam aqueles que estavam morrendo nas ruas, para evitar o “contagio” e a “periculosidade”. Os hospitais eram tidos como locais de salvação, e tinham como função, garantir que o perigo dos corpos doentes estivessem longe da população, a salvação da alma do pobre no momento da morte e do pessoal hospitalar que cuidava dos pobres. 2 – Foucault nos apresenta mudança importante no saber-poder da medicina a partir de meados do século XVIII, inclusive mudança de espaço de atuação. Discuta esta afirmação. Até meados do século XVIII, eram as figuras religiosas que administravam os grandes hospitais. A partir de então, o médico passou a assumir a responsabilidade de organização e poder dos hospitais, ganhando status e poder. Dessa forma, os hospitais passaram a não ser apenas um local de cura, mas também de registro, acúmulo e formação do saber, sendo um local essencial para a formação médica. Antes do século XVIII, o médico que as comunidades religiosas chamavam para fazer visitas aos hospitais era, geralmente, o pior dos médicos. Depois que houve a mudança no saber-poder da medicina, o grande médico do hospital, isto é, o médico tido como mais sábio, era aquele que tinha mais experiência hospitalar, o que foi uma grande mudança no espaço de atuação médica daquela época. 3 – Qual a importância do hospital para o surgimento da psiquiatria? Primeiramente, no período da grande internação, criaram-se pseudo-hospitais, que ficavam afastados dos centros urbanos e abrigavam a todos que, em ordem da razão e da moral, não deveriam fazer parte da sociedade (loucos, pobres, deficientes, etc). No século XVIII, a sociedade começa a se estruturar e denunciar essas internações arbitrárias, por conta da forma de assistência. Dessa forma, esses locais de internação ficaram reservados apenas aos loucos. A psiquiatria só surgiu a partir desses manicômios, que eram aonde os dito “loucos” da época eram exilados; segregados da sociedade. Os manicômios eram instituições disciplinares para reeducação do paciente e onde começa-se a pensar na internação com um outro significado, a partir do momento em que os médicos veem uma oportunidade para entenderem o fenômeno da loucura. Dessa forma, entende-se que, somente a partir dos hospitais, é que foi possível que a psiquiatria surgisse. 4 – Explique o processo em que a loucura passou a ser considerada doença mental. A Revolução Francesa trouxe várias transformações, entre elas, na instituição que conhecemos como hospital, Isto, pois, na Idade Média, o hospital era uma instituição de caridade, administrada pela igreja. Após a Revolução Francesa, passou a ser administrada pelas autoridades reais e judiciárias. Nela, eram acolhidos, alojados e alimentados, todos aqueles que se apresentavam ou eram encaminhados pela autoridade real ou judiciária. Nessa transição entre o hospital de caridade e o hospital com funções mais sociais e políticas, muitos médicos foram atuar no sentido de humaniza-las e adequá-las, 2022/2 Isabella Rocha Baihense @isabellabaihense.psi transformando-as em instituições médicas. Desta forma, o hospital passou a ser um espaço de exame (o que permitiu um contato empírico com as doenças e os doentes) espaço de tratamento (enquadramento das doenças e doentes, disciplina do corpo terapêutico e das tecnologias terapêuticas) e espaço de reprodução do saber médico (hospital-escola, residência médica, local privilegiado de ensino e aprendizagem). O saber sobre o hospital, permitiria ao médico, agrupar as doenças e, assim, observá-las de uma forma diferente, em seu curso e evolução. Quando o médico Philippe Pinel iniciou sua grande obra de medicalização do Hospital Geral de Paris, quatro anos após o início da Revolução, ele propõe a construção pineliana de liberdade subtraída pela alienação. Ele defendeu que era necessário observar para conhecer (descrever, acompanhar, analisar, classificar) e, sendo assim, que os loucos deveriam ser libertados das correntes e mantidos em um espaço para que suas doenças fossem conhecidas e tratadas sem interferência externa (basicamente isolar para conhecer; conhecer para tratar). Ele elaborou uma primeira classificação das enfermidades mentais e consolidou o conceito de alienação mental, e a profissão do alienista, não elegendo o termo “doença mental”, mas “alienação mental”. Entende-se, desta forma, que “alienação mental” (mais tarde substituída por “doença mental”) seria um distúrbio no equilíbrio das paixões e que o hospital de alienados de Pinel seria uma instituição terapêutica. O Alienismo foi o estudo sobre os alienados (criado por Pinel) – alienados foram mais tarde chamados de doentes mentais. 5 – O que foi chamado de “trabalho terapêutico”? Esta proposta foi usada no Brasil? Explique. O “trabalho terapêutico” foi o trabalho o qual foram submetidos os internos, dentro das próprias colônias de alienados, construídas em grandes áreas agrícolas. Essa proposta foi usada no Brasil a partir do século XX, pois considerava-se que o trabalho seria “o meio terapêutico mais precioso”, que estimulava a vontade e a energia, e consolidava a resistência cerebral tendendo fazer desaparecer “os vestígios do delírio”. 6 – Explique as principais características do que Paulo Amarante chamou de psiquiatrias reformadas (Comunidades Terapêuticas, Psicoterapia Instituicional, Psiquiatria Preentiva/ Comunitária, Psiquiatria de Setor). E o motivo deste autor diferenciá-las da Antipsiquiatria e da Psiquiatria Democrática. o Comunidades Terapêuticas: Luta contra a hierarquização ou verticalidade dos papeis sociais (horizontalidade e “democratização” das relações) Ênfase na comunicação livre entre equipes e grupos de pacientes e nas atitudes permissivas que encorajam a expressão de sentimentos, o que implica numa organização social democrática igualitária e não numa organização social do tipo hierárquico tradicional. Proposta iniciada na Inglaterra em 1946 com Main e Reichman e depois Maxwell Jones. Acreditava-se que a solução era melhorar a organização e funcionamento do hospital; não questionavam a internação e buscavam qualificar, melhorar o tratamento psiquiátrico hospitalar. Percebiam o potencial de internos e elaboraram estratégias para que todos (pacientes e funcionários) pudessem propor, planejar, trabalhar juntos – iniciando o debate sobre a relação social-psiquismo. 2022/2 Isabella Rocha Baihense @isabellabaihense.psi o Psicoterapia Institucional Propõe a “transversalidade”, ou seja, o encontro e ao mesmo tempo o confronto dos papéis profissionais e institucionais com o intuito de problematizar as hierarquias hegemoniais. Na França, François Tosquelles deu início ao Coletivo Terapêutico, só depois chamado de Psicoterapia Institucional. Acreditava-se que o hospital tinha perdido sua função terapêutica e que seria necessário “tratar” a instituição hospitalar. Buscaram instituir mudanças no funcionamento do hospital sem questionar a internação. Através da escuta polifônica (sem priorizar uma abordagem ou referencial teórico) acreditam que a instituição e a equipe devem ser importantes referências para os pacientes. Clube terapêutico – profissionais e internos organizavam festas, passeios, ateliês, feiras de arte, etc. o Psiquiatria Preventiva/Saúde Mental Comunitária Redirecionamento da política de assistência psiquiátrica dos EUA, que passou a ter como objetivo, reduzir as doenças mentais na comunidadee promover o estado de saúde mental das mesmas. Deram visibilidade às precárias condições de assistência, violência e aos maus-tratos a que eram submetidos os pacientes internados em todo o país. Prevenção primária: prevenção do que pode causar a doença mental; Prevenção secundária – diagnóstico precoce e tratamento rápido; Prevenção terciária – reabilitação e readaptação à vida social. Conceito de CRISE como desadaptação social. Crise pode ser: Evolutiva – relacionadas ao processo de desenvolvimento, que se não for bem elaborada pela pessoa pode levar a transtornos mentais. Acidental – a partir de alguma perda ou risco – se tratada logo poderia ser crescimento para o indivíduo, não adoecimento o Psiquiatria de Setor Iniciado na França, nos anos 50 com Lucien Bonnafé, buscando medidas terapêuticas após alta hospitalar. Consideravam hospitais obsoletos e haveria necessidade de se criar outros espaços de cuidado e assistência. Foram criados Centos de Saúde Mental (CSM) nos diferente “setores administrativos”, para que recebessem os egressos do manicômio, com equipe de cuidado, não ambulatorial e fragmentado Adoção de medidas de continuidade terapêutica após alta hospitalar (centros de saúde mental), para evitar a reinternação ou internação de novos casos. – Pela primeira vez na história da assistência psiquiátrica, se falou em regionalização. Subdivisão do espaço interno do hospital, destinando para cada setor, uma enfermaria correspondente. Quando recebessem alta médica, seriam encaminhados para o CSM existente no mesmo setor. O acompanhamento nos CSM se daria pela equipe multiprofissional que tratara o sujeito quando internado (sem prioridade médica). O hospital era visto como uma fase do tratamento. Para a antipsiquiatria e a psiquiatria democrática, o termo “reforma” se mostra inadequado. Ambas entendem a necessidade de se colocar em cheque todo o saber psiquiátrico. Para a antipsiquiatria, a doença mental seria patológica, devido a relação do indivíduo com o ambiente, pois seria o social, o responsável pela patologização da doença mental. Para essa corrente, o indivíduo deveria se ver livre para expressar seus sintomas e somente assim 2022/2 Isabella Rocha Baihense @isabellabaihense.psi haveria algum tipo de terapêutica. Ao terapeuta, caberia apenas auxiliar a pessoa a auxiliar os processos, protegendo-a inclusive da própria psiquiatria. A psiquiatria democrática, teorizada por Basaglia, haveria a ideia de uma superação do aparato manicomial no sentido de conjunto de saberes e práticas que fundamentavam a existência do isolamento e patologização. 7 – Explique o que é chamado de horizontalidade dos saberes e como algumas propostas de mudança no cuidado à loucura trabalharam esta questão. A horizontalidade dos saberes era constituída pela noção de que a função terapêutica era uma tarefa que deveria ser assumida por todos (técnicos, familiares e pacientes); e não mais apenas o psiquiatra (ideia de hierarquização e verticalidade dos papeis sociais). O processo de horizontalidade constituía em uma democracia das relações sociais que imprimia em todos os atores sociais uma verve terapêutica, onde as diferentes categorias profissionais, os usuários e os familiares tem saberes que são usados no tratamento do indivíduo. 8 – Quais alguns fatores importantes no processo de reforma psiquátrica brasileira? No Brasil, o processo da Reforma Psiquiátrica teve como base principal da Reforma Democrática Italiana, que propõe colocar a doença mental entre parênteses e cuidar da pessoa considerada louca, em sofrimento. Mudar a forma de tratamento manicomial é fundamental, mas isso deve ser consequência ao transformar a modo de lidar com a loucura. A proposta da Antipsiqiuatria, da Psiquiatria Democrática e da Reforma Psiquiátrica no Brasil é cuidar do sujeito, “abandonar o conceito de doença mental” (p.68), construir uma outra forma de lidar com a loucura e com o sujeito dito louco, que não isolando e prendendo. Utilização da expressão “em sofrimento mental/psíquico”, ao invés de “portador de transtorno ou doença”, já que transmite a ideia de carregar um fardo eterno; ao invés de pessoa com transtorno, que traz a ideia de pessoas transtornada continuamente; ao invés de desordem mental, que remete a uma ordem, a um jeito bom ou normal de ser. Lei 10.216 de 2001 – lei da Reforma Psiquiatra Brasileira que “dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental”. O projeto de lei foi apresentado em 1989, tendo ficado 12 anos em tramitação no Congresso Nacional, e não foi aprovado na íntegra (ex: não abordou a extinção progressiva dos manicômios). A Reforma Psiquiátrica está intimamente ligada à luta por direitos humanos, pela “inclusão de novos sujeitos de direito e de novos direitos para os sujeitos em sofrimento mental” (p69- 70): direito ao trabalho, ao lazer, à cultura, à cidade. 9 – O que significa dizer que Reforma Psiquátrica é um processo social complexo? A Reforma Psiquiátrica é um processo social complexo, à partir do momento em que é pensada no campo da saúde mental, não como um modelo ou sistema fechado, mas sim como um processo; um processo social complexo; é permanente. Quando pensamos em um processo, pensamos em movimento, em algo que caminha e se transforma permanentemente. Neste caminhar, vão surgindo novos elementos, novas situações a serem enfrentadas. Novos elementos, novas situações, pressupõem que existam novos atores sociais, com novos (e certamente conflitantes) interesses, ideologias, visões de mundo, concepções teóricas, religiosas, éticas, étnicas, de pertencimento de classe social... Enfim, um processo social complexo se constitui enquanto entrelaçamento de dimensões 2022/2 Isabella Rocha Baihense @isabellabaihense.psi simultâneas, que ora se alimentam, ora são conflitantes; que produzem pulsações, paradoxos, contradições, consensos, tensões. 10 – Podemos afirmar que o processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil está completo e consolidado? Justifique sua resposta Não! É um processo e é sobre um outro modo de lidar com a loucura que a Reforma Psiquiátrica vem instaurar, uma maneira em que a pessoa em sofrimento possa ser acolhida, que o diferente não precise ser afastado e isolado; que a diversidade habite todos os espaços. Os princípios da Reforma Psiquiátrica (também no Brasil) são: democratização, participação social, envolvimento, acolhimento, corresponsabilização, escuta polifônica, transversalidade (cuidado em saúde mental não é especifico de um espaço, de uma instituição). Ainda não está completo e consolidado pois ainda precisam existir movimentos (como por exemplo a luta antimanicomial) para a desinstitucionalização da loucura. 11 – O que significa dizer “colocar a doença mental entre parênteses”? Colocar a doença mental entre parênteses foi uma proposta feita por Basaglia para que o sujeito e sua experiência de vida fossem pensadas e cuidadas em primeiro lugar, não sua doença. Colocar a doença entre parênteses não é negar a experiência de mal estar, dor e sofrimento, mas é não lidar com isso antes de lidar com o sujeito que sofre e que estava sendo reduzido à esses sintomas. Cuidar do sujeito (e a doença mental entre parênteses) é contribuir nas questões de vida da pessoa, seus problemas relacionados ao trabalho, renda, família, vizinhos, projetos de vida, estudo, anseios, etc. 12 – Explique o lema “Por uma sociedade sem manicômios”, que vem sendo utilizado no Brasil desde final dos anos 80 (atenção para a diferenciação de desospitalização e desinstitucionalização da loucura e ao conceito de manicômios mentais). O lema “Por uma sociedade sem manicômios” se refere justamente à luta antimanicomial, que defende a desospitalização e desinstitucionalização, onde acredita- se que o cuidado em saúde mentalpor meio da retirada da comunidade e inserção em hospitais psiquiátricos, não é uma particularidade deste momento histórico e nem a única terapêutica ou a mais adequada. A luta antimanicomial existe para justamente substituir os manicômios por terapêuticas mais humanizadas e inclusivas, onde o doente mental possa fazer parte da sociedade. A desospitalização é um processo que consiste na retirada do paciente do ambiente hospitalar para prosseguir com um tratamento domiciliar. Ela melhora a qualidade na recuperação do paciente e reduz os custos do atendimento para o hospital. No âmbito psiquiátrico, consiste na retirada da internação psiquiátrica para uma ressocialização, um tratamento que permita que esse indivíduo não seja excluído da sociedade; pelo contrário, esteja incluído na sociedade. A desisntitucionalização consiste na desconstrução do pensamento de que o “louco” é perigoso, que precisa ser contido ou precisa ficar recluso da sociedade, que não pode viver com os demais pois é apresenta um risco; e todos os outros pensamentos arcaicos sobre a loucura. É um processo de desconstrução de saberes, práticas e perspectivas que levem à segregação, estigma e destituição de direitos da pessoa com transtorno mental. 13 – Paulo Amarante apresenta quatro dimensões no processo de reforma psiquiátrica. Quais são eles? Explique-as. 2022/2 Isabella Rocha Baihense @isabellabaihense.psi o Dimensão Teórico-conceitual: Questiona a ideia positivista de que a ciência traz a verdade sobre um objeto e que apenas a ciência pode determinar uma ação ou intervenção. A partir do questionamento do saber-poder da psiquiatria, percebe-se a importância de considerar que outros saberes interferem na organização social, nos modos de vida, e nas nossas ações e intervenções, e eles precisam ser considerados; a saber: ideologia, política, ética, religião e muitos outros. A proposta da Antipsiqiuatria, da Psiquiatria Democrática e da Reforma Psiquiátrica no Brasil é cuidar do sujeito, “abandonar o conceito de doença mental” (p.68), construir uma outra forma de lidar com a loucura e com o sujeito dito louco, que não isolando e prendendo. o Dimensão Técnico-assistencial: Tendo a necessidade de lidar com o sujeito em sofrimento como um todo, os serviços de cuidado não podem mais ser fechados e estáticos. Os equipamentos/ serviços devem ampliar o modo de cuidado e intervenção para conseguir contribuir naquilo que o sujeito precisa, no território – diferentes modos de atuação dos profissionais, não apenas atendimentos e intervenções individuais e pré- determinadas. Serviços que lidam com as pessoas, com acolhimento dos incômodos, das dúvidas, das dificuldades; espaço de sociabilidade e produção de subjetividades. o Dimensão jurídico-política: Em diferentes leis e documentos oficiais vemos “referências nocivas aos sujeitos em sofrimento psíquico e representam obstáculos significativos ao exercício da cidadania”. A Reforma Psiquiátrica está intimamente ligada à luta por direitos humanos, pela “inclusão de novos sujeitos de direito e de novos direitos para os sujeitos em sofrimento mental” (p69-70): direito ao trabalho, ao lazer, à cultura, à cidade. Ter a legislação, contudo, não basta. Para de fato termos direitos garantidos e cidadania, as discussões e transformações devem abarcar todos os setores da sociedade. A ideia construída, principalmente pela psiquiatria, de que o “louco é perigoso”, ou que “lugar de doido é no hospício” e a fala de internação como tratamento está, ainda, muito arraigada na nossa sociedade. Não basta tolerar o diferente, suportar o considerado louco, mas de fato tê-lo na sociedade, na cidade – respeitar, estar junto, sem medo, sem estigmas, preconceitos e discriminações. o Dimensão sociocultural: Necessidade de construir um outro lugar social para a loucura e para sujeitos em sofrimento psíquico, de solidariedade e reciprocidade, não de rejeição ou apenas tolerância. Necessidade de questionar tudo o que afasta o sujeito em sofrimento mental das relações, da cidade, da sociedade. Importante trazer a sociedade (o máximo possível) para o debate sobre a reforma psiquiátrica, sobre internação, loucura, uso do território. Dimensão esta que se aproxima das inventividades, da cultura, das diferentes formas de arte. Anos 90 – início, por exemplo, de blocos carnavalescos com participação de usuários, familiares, profissionais, voluntários; ou mesmo parte em blocos famosos; alas em escolas de samba; temas de samba-enredo. Músicas, artistas, poemas que instigavam a sociedade a pensar sobre os loucos, a loucura, a chamada doença mental. Isso contribuiu muito para os debates acerca do tratamento e cuidado em saúde mental, sobre as internações e preconceitos. Amarante cita vários grupos musicais, de teatro, rádios, programas em TVs comunitárias, exposições de artistas usuários de serviços de saúde mental, dentre outras estratégias que fazem o debate circular. 14– Diferencie o modo de atenção asilar e o modo de atenção psicossocial. No modo de atenção asilar, o objeto de estudo/análise era simples e chamado apenas de doença mental; já no novo modelo de atenção psicossocial, o objeto é muito mais complexo e há o entendimento da existência do sofrimento na doença mental. Quando falamos de estratégias de intervenção, o modelo asilar era baseado no isolamento e predominantemente biológico; já no modelo de atenção psicossocial, há predominância da diversidade e da intervenção. A instituição asilar era o hospital e a instituição de atenção 2022/2 Isabella Rocha Baihense @isabellabaihense.psi psicossocial é de rede ou intersetorialidade. A prática social adotada pelo modo de atenção asilar era de exclusão e violência, já a prática social adotada pelo modo de atenção psicossocial é de inclusão e solidariedade. 15 – Atenção psicossocial e a chamada psiquiatria tradicional cuidam e lidam com as crises em saúde mental de maneiras diferentes. Que diferenças são essas? No modelo clássico da psiquiatria, entende-se a crise como uma situação de grave disfunção que ocorre exclusivamente em decorrência da doença e, como consequência dessa concepção, a resposta pode ser agarrar a pessoa em crise a qualquer custo; amarrá-la, injetar-lhe fortes medicamentos intravenosos de ação no SNC a fim de dopá-la e aplicar-lhe ECT ou (eletrochoque). Já no contexto da saúde mental e atenção psicossocial, a crise é entendida como o resultado de uma série de fatores que envolve terceiros, sejam estes familiares, vizinhos, amigos, ou mesmo desconhecidos. Também entende-se que pode ser resultado de uma diminuição do limiar de solidariedade de uns para com outros ou precariedade de recursos para tratar a pessoa, ou seja, uma situação mais social do que biológica ou psicológica, tratando-se então de um processo social. Por isso, é necessário que existam serviços de atenção psicossocial que possibilitem o acolhimento das pessoas em crise, e que todas as pessoas envolvidas possam ser ouvidas, expressando suas dificuldades, temores e expectativas. É importante que sejam estabelecidos vínculos afetivos e profissionais com essas pessoas e que elas se sintam realmente acolhidas, isto é, ouvidas e cuidadas. A principal diferença, então, é que na psiquiatria, a relação médico-paciente é mais estabelecida como médico-doença, já na atenção psicossocial, o que se pretende é uma rede de relações entre sujeitos que escutam e cuidam (médicos, enfermeiros, psicólogos, TOs, assistentes sociais, dentre muitos outros atores que são evidenciados nesse processo social complexo), com sujeitos que vivenciam as problemáticas (os usuários e familiares, e outros atores sociais – amigos, colegas de trabalho, vizinhos, etc). 16 – O que é medicalização – considerando que é diferente de medicamentalização. Medicalização é quando a medicina se apropria do que não é exclusivamente médico; tratar como de caráter médico o que é social, políticoe/ou econômico, por exemplo, uma violência. Ou seja, “fazer com que as pessoas sintam que os seus problemas são problemas de saúde e não próprios da vida humana” (p.95). *Se diferencia do uso de medicamento em qualquer situação, entendida como patológica – isso é medicamentalização ou farmacologização. 17 – O que o processo de reforma psiquiátrica brasileira pretende com a implantação de serviços residenciais terapêuticos? Como dever ser acompanhamento das pessoas nessas moradias? A implantação de serviços residenciais terapêuticos foi feita, destinada aos internos em instituições psiquiátricas por um período de, no mínimo, dois anos. Essa iniciativa vem contribuindo para a superação do modelo psiquiátrico predominantemente asilar ainda hegemônico. Esses serviços configuram-se como ponto de atenção do componente de desinstitucionalização, sendo estratégicos no processo de desospitalização e reinserção social de pessoas longamente internadas nos hospitais psiquiátricos. Caracterizam-se como moradias inseridas na comunidade destinadas a pessoas com transtorno mental, egressas de hospitais psiquiátricos e/ou hospitais de custódia. Cada módulo residencial deverá estar vinculado a um serviço/equipe de saúde mental de referência que dará o suporte técnico profissional necessário ao serviço residencial. O acompanhamento dos moradores das residências deve estar em consonância com os respectivos projetos terapêuticos individuais que focalizam-se no processo de reabilitação 2022/2 Isabella Rocha Baihense @isabellabaihense.psi psicossocial e inserção dos moradores na rede social existente (trabalho, lazer, educação, entre outros). 18 – O que é Projeto Terapêutico Singular (PTS)? Como deve ser construído? Com que propósito? O Projeto Terapêutico Singular é “uma proposta de um conjunto de ações pactuadas entre diferentes atores: o usuário, seus familiares, integrantes da equipe e profissionais de outros serviços, ativados a partir da necessidade do usuário” (p.149). É negociação de nova rotina, de responsabilizações, de compartilhamento de tarefas. - “quanto maior a diversidade e a quantidade de ferramentas, teremos mais possibilidades de construir projetos de cuidado adequados à complexidade de nosso ofício” (p.150). Acredita-se, nesse projeto, que a disponibilidade potencializa a capacidade de produção e invenção. Hoje em dia, entende-se que cabe aos serviços de cuidado em saúde mental cuidar do sujeito em sofrimento, não da doença. Por isso, é proposto um modelo usuário-centrado, que não se repetirá, ou seja, que é único para cada um. Sendo assim, o PTS é projeto singular, único, mas não solitário, já que deve articular diversos saberes e projetos, talvez em diversos espaços, em muitos encontros. Para construção do PTS deve-se começar investindo na aproximação, no acolhimento, no conhecimento do sujeito e seu contexto, seu entorno, para que vínculos sejam construídos – o que não é um processo rápido (exemplo de vínculos referenciados). A construção de PTS não é simples, é sempre desafio, porque pede a participação de diferentes pessoas, e não temos certeza do que acontecerá. “No entanto, só é possível produzir quaisquer efeitos se arriscarmos, se ousarmos, se damos um passo à frente” (p.152). Uma ação simples pode ser complexa para o cuidado com a pessoa. Trata-se de uma clínica de cuidado ao sujeito, não à doença; que compreende o processo saúde-doença como resultante de múltiplos fatores; que busca ética da autonomia através do diálogo constante – clínica ampliada / clínica antimanicomial / clínica do sujeito / clínica transdisciplinar. 19 – Qual a noção de território adotada pela atenção psicossocial? Como se difere de espaço geográfico? Território, a partir do modo de atenção psicossocial, não é espaço geográfico, mas é onde há experiências, onde acontece o cuidado e trata-se das relações que constituímos, do contexto-histórico de vida. 20 – Silvio Yasui (e outros autores) apresenta conceitos ferramentas importantes para a atenção e o cuidado em saúde mental. Explique o que ele chama de acessibilidade e acolhimento. A acessibilidade e acolhimento é destacada pelos autores através da proposta “porta aberta”, que é, muito mais do que um sentido simbólico de oposição às formas de contenção e controle das instituições asilares (como muros, grades, etc), mas propondo um significado positivo: o da garantia da universalidade do acesso ao serviço. A acessibilidade é discutida por Alves e Guljor como critério de qualidade dos serviços de saúde mental: O critério de qualidade é a acessibilidade, que é determinada por três quesitos. O primeiro é a localização geográfica, se o serviço está perto ou não das pessoas – o que chamamos de território. O segundo é o tempo que ele permanece aberto. Se o funcionamento se dá 24, 12 ou 8 horas por dia; se funciona todos os dias ou apenas três vezes por semana – isso pode espelhar a qualidade do serviço. O outro quesito de qualidade integrante da formulação de acessibilidade diz respeito a quais programas estão acessíveis às pessoas que procuram o serviço. No caso de nossa clientela, programas propriamente assistenciais, de inserção 2022/2 Isabella Rocha Baihense @isabellabaihense.psi social, lazer, hospitalidade assistida, trabalho assistido, dentre outros. (Alves & Guljor, 2004: 230). Ainda, o acolhimento é abordado pelo seu significado de “Ato ou efeito de acolher, de receber; hospitalidade, local seguro”. Deste modo, é destacado que “Na dor, na fragilidade, no sofrimento psíquico, o que se deseja é ser olhado e escutado por inteiro, como uma pessoa com vida e com história. Ser acolhido integralmente (...)... é necessário encontrar uma porta aberta, adentrar o serviço e ser recebido” (p.139). Nesse sentido, a chegada do sujeito ao serviço, qualquer serviço, deve ser acolhedora e não burocrática; ele deve ser ouvido em toda sua complexidade. É com o acolhimento que tem início a construção de vínculos e de ideias para o projeto singular de acompanhamento e de vida do sujeito. O acolhimento na saúde mental se diferencia, portanto, do acolhimento tradicional em uma triagem médica, por exemplo. É você sentar e escutar, conversar, ouvir, se dedicar ao que esse paciente e sua família tem a dizer. É sobre como você cuida do sujeito... Você cuida sem olhar pra cara dele? Não! você cuida dele olhando pra ele, conversando, entendendo sobre ele, sua história, suas conquistas, dúvidas, condições sociais, econômicas e culturais. Cuidar, segundo os autores, é tecer projetos de vida. É uma relação. Contudo, ainda percebemos a lógica racional e medicalizante em muitos espaços de cuidado. 21 – Explique a importância do trabalho intersetorial no cuidado em saúde mental. A importância do trabalho intersetorial no cuidado em saúde mental é, além dos equipamentos de saúde que devem conversar entre si, conhecer e utilizar os diversos recursos sociais, (Saraceno utiliza o termo “recursos escondidos”), aqueles que não havíamos pensado como importantes para a saúde, mas que muito podem contribuir (intersetorialidade). “... construir um processo que envolve intenso diálogo, o qual pressupõe reconhecer e respeitar as especificidades e as diversidades de cada campo; explicitar conflitos (...); unir potências, produzir encontros (...) [para] a melhoria da qualidade de vida, a inclusão social e a construção da cidadania da população” (p.155). – dimensão política do cuidado. O que é dimensão política? - reconhecimento de construir coletivamente ações de cuidado; - articulação dos saberes/fazeres (intersetorialidade e transversalidade) - ações de produzam efeitos em todos os atores envolvidos, construindo, assim, sujeitos coletivos. O CAPS deve ser pensado como estratégia, não como serviço independente e responsável único pela atenção psicossocial (não ‘encapsular’). Buscar construir uma rede ampla atravésde “um conjunto de ações que provoque, instigue, convide o território, a cultura, a construir coletivamente novas formas de convivência com a diferença (...)”.
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