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História da Arquitetura Jana Cândida Castro dos Santos Arquiteturas modernista e pós-modernista Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever os movimentos da arquitetura contemporânea pós-ecletismo. Identificar as características da arquitetura contemporânea. Reconhecer as principais obras e os artistas da arquitetura modernista e pós-modernista. Introdução Os acontecimentos do século XX, combinados aos avanços tecnológicos na construção civil (marcados pelo uso do aço e do concreto armado) deram uma nova visão às cidades como um local para abrigar indústrias e sistemas modernos de transporte. Pensando-se ainda na questão da saúde física e mental, caracterizaram nesse contexto o surgimento das arquiteturas modernista e, mais tarde, pós-modernista. Neste capítulo, você verá a descrição dos movimentos da arquitetura contemporânea pós-ecletismo, a partir da identificação de suas características e principais obras e artistas. Arquitetura modernista Durante o período de transição da Revolução Industrial até nossa contempo- raneidade, surgem novos problemas e, com isso, repostas diferentes e únicas, a partir de um leque de novas experimentações. Para Pereira (2010, p. 227), esses novos problemas levaram “[...] a uma desagregação dos nexos morfoló- gicos tradicionais em todos os campos”. O século XX traz consigo mudanças culturais e científi cas importantes. Tais mudanças e as novas descobertas levaram a teorias que abalaram a sensação “típica do século XIX de progresso infi nito”, abrindo caminho para uma nova etapa cultural e arquitetônica. A nova etapa cultural é marcada pelo modernismo, do qual fazem parte outros tantos movimentos, como será visto a seguir. O percurso será iniciado pela explicação sobre o abandono do ornamento na arquitetura modernista. Adolf Loos (1870–1933) deu início à sua carreira associada à Sezession de Viena, mas logo se afastou. Após entrar em contato com os textos de Louis Sullivan, começou a opor-se ao uso de ornamentos na arquitetura. E, assim, dedicou-se a explorar, criando um novo método de composição espacial, cha- mado de Raumplan. Um de seus textos mais famosos foi publicado em 1908, o Ornamento e crime, seguindo a sugestão de abandonar a ornamentação na arquitetura, como já sugerido por Sullivan, e adotando como resultado “formas vernaculares simples”, construções funcionais e desadornadas, adequadas, a seu ver, para a era das máquinas (Figura 1). Figura 1. Casa Moller, Viena, 1927–1928. Fonte: Ching, Jarzombek e Prakash (2019. p. 703). A Casa Moller se mostra como um projeto paradigmático de Loos, visto que sua fachada é simples e “[...] um tanto opressora” (CHING; JARZOMBEK; PRAKASH, 2019, p. 703). E se, por um lado, o exterior da casa é simples, os Arquiteturas modernista e pós-modernista2 ambientes internos, por outro, “[...] são ricamente revestidos de lâminas de madeira clara nas paredes e de tapetes orientais no piso, criando uma sensação de suntuosa elegância”, como colocam Ching, Jarzombek e Prakash (2019, p. 703). Embora Loos seja considerado como um dos precursores do modernismo, nesse caso, ele apresenta uma aproximação com o ideal do movimento das artes e ofícios, em razão do tratamento do interior e seu intimismo. O futurismo e o construtivismo O futurismo italiano e o construtivismo russo foram dois movimentos que infl uenciaram o desenvolvimento do modernismo europeu, apesar de terem sido relativamente breves. Filippo Marinetti (1876–1944) foi o principal responsável por apresentar os ideais futuristas, publicando um manifesto, em 1909, para sua fundação, mesmo ano em que Frank Lloyd Wright seguia para a Europa após abandonar os Estados Unidos. Marinetti acreditava piamente que a paisagem italiana, assim como sua arquitetura, deveria sofrer uma mudança radical. Segundo Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 483), ele “[...] louvava a velocidade, o perigo, a audácia e até mesmo a guerra como meio de limpar a sociedade; também anunciou o fim das noções tradicionais de tempo e espaço”. Para Marinetti (apud CHING; JARZOMBEK; PRAKASH, 2019, p. 708), “[...] a arte não pode ser nada além de violência, crueldade e injustiça”. Ao redor dessa retórica agressiva, estavam artistas e escultores, ainda sem meios gráficos para se expressarem. O arquiteto mais conhecido do movimento foi Antonio Sant’Elia (1888– 1916). A arquitetura futurista perdeu muita força após a sua morte. Sant’Elia ficou conhecido a partir da exposição de 1914, Città Nuova (Cidade Nova) e da publicação que a acompanhou, Messagio (Mensagem), que se tornou o manifesto da arquitetura futurista. Sua técnica envolvia perspectivas exube- rantes, projetos para hangares de aeronaves, blocos de apartamentos, centro de transporte, entre outros. Os projetos se caracterizavam por “[...] fortes volumes sem ornamentação, verticalidade, paredes inclinadas ou escalonadas, múltiplos níveis de circulação horizontal, elevadores externos e equipamentos de geração de energia aparentes”, como como ser visto na Figura 2 (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p. 484). 3Arquiteturas modernista e pós-modernista Figura 2. Antonio Sant’Elia, detalhe de La Città Nuova, 1914. Sant’Elia explorou as pos- sibilidades de uma cidade dinâmica domi- nada por múltiplos meios de transporte. As altas torres de elevadores conectadas às laterais dos prédios por passarelas são especialmente impressionantes. Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011. p. 484). Assim como os futuristas, os construtivistas também eram muito ra- dicais na Rússia revolucionária, ainda que determinados a desaparecer, em vista do classicismo de Stalin. O construtivismo idealizava uma República Soviética cuja arquitetura fosse impulsionada pelas forças da industrialização. No entanto, muitas dessas ideias construtivistas transpunham o cenário rural e o estado de confusão total que caracterizava o país. Propunham o uso de materiais de construção modernos, como aço e o concreto, e grandes áreas de vidro. Entre seus projetos, destaca-se o Pavilhão Soviético para a Exposition des Arts Décoratifs, de 1925, projeto de Konstantin Melnikov (1890–1974), com “volumes romboides e estrutura em balanço” enfatizando o dinamismo, ao passo que “[...] os espaços interconectados expressavam a agenda ainda em aberta do Comunismo Soviético” (Figura 3) (FAZIO; MOFFETT; WO- DEHOUSE, 2011, p. 485). Arquiteturas modernista e pós-modernista4 Figura 3. Konstantin Melnikov, Pavilhão Soviético, Exposition des Arts Décoratifs, Paris, 1925. Para criar esta forma dinâmica, Melnikov usou um grelha de planejamento interseccionada por uma escadaria diagonal. Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 485). O expressionismo holandês e alemão Os pintores dos grupos alemães Brucke (Ponte) e Blauer Reiter (Cavaleiro Azul), entre 1900 e 1914, revoltaram-se contra o naturalismo acadêmico, passando a expressar suas emoções, pensamentos e sentimentos diretamente na pintura. No período pós-guerra, os artistas e arquitetos europeus viam- -se emocionados em relação à barbárie da guerra enquanto a sociedade se recuperava da devastação. Os membros do expressionismo holandês, trabalhando em Amsterdã, deviam muito à obra de H. P. Berlage (1856–1934). Em suas obras, buscavam ressaltar o processo artesanal da construção, revelar a estrutura e um alto nível de detalhes. Um dos prédios pelo qual Berlage ficou conhecido é o da Bolsa de Valores de Amsterdã (1897–1903). O edifício apresenta paredes portantes de tijolo e pedra com inspiração medieval, cobertura de treliças de ferro e claraboias acima do grande salão (Figura 4). 5Arquiteturas modernista e pós-modernista Figura 4. H. P. Berlage, Bolsa de Valores de Amsterdã, Amsterdã, 1907–1903 (exterior e interior do edifício). Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 487). Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 487) revelam que: Berlage se inspirou na longa tradição holandesade construção com tijolos. A alvenaria de tijolo da Bolsa de Valores fica ainda mais rica pelo uso de pedras policromáticas tanto no interior quanto no exterior. No interior não há apenas tijolo e pedra, mas ferro na forma de arcos treliçados. O material que antigamente era considerado apropriado apenas para edificações como estufas e estações ferroviárias passou a ser aceito em edifícios institucionais. Diferentemente do holandês, o expressionismo alemão se mostrou muito mais diversificado, pois se preocupava tanto com a forma como com a utopia. Foram fundamentais para o movimento os escritos de Paul Scheerbart, que enxergava na arquitetura de vidro e cristalina um modo de amenizar a opaci- dade “opressora” a seu ver, característica da cultura moderna. Dentre as obras do expressionismo alemão, um monumento bastante di- vulgado é o da Caixa d’Água, de Posen (atual Poznan, na Polônia), projeto de Hans Poelzig, o qual juntou funções aparentemente heterogêneas com uma estética industrial, com um aspecto “quase alucinógeno” (Figura 5). Sobre essa obra, Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 491) afirmam que: [...] vedações externas da edificação são facetadas e extremamente texturiza- das, incluindo alvenaria variada e padrões de vidraça. No interior, inserido em uma estrutura independente [...] e sob o reservatório de água. Poelzig projetou um espaço de exibição que pretendia transformar em mercado público. A edificação é um impressionante amálgama de função e fantasia. Arquiteturas modernista e pós-modernista6 Figura 5. Hans Poelzig, Caixa d’Água de Posen, Posen, 1911. Hans Poelzig era um membro muito respeitado da Werkbund; atualmente seria descrito como um corporativista. Mesmo assim, não encontrou dificuldades para produzir este projeto evocativo baseado em painéis policromados facetados. Alguns panos de tijolo externos se refletem no interior, entre a estrutura independente de pilares treliçados. Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 491). A Art Déco A Art Déco abrange uma linguagem diversifi cada de projeto, incluindo de gráfi cos a móveis, de arquitetura a cerâmicas. Suas artes decorativas — tam- bém conhecidas como l’art moderne — fl oresceram na França em meados de 1910, ao passo que sua arquitetura seguiu popular nos Estados Unidos ao longo da década de 1930, particularmente em arranha-céus e teatros. Como estilo, a Art Déco só foi reconhecida na década de 1960 (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p. 492). 7Arquiteturas modernista e pós-modernista Um exemplo do movimento Art Déco é o Cristo Redentor, do Rio de Janeiro, estátua localizada no alto do morro do Corcovado, cuja construção teve início em 1926. Para Giumbelli (2008, p. 88): [...] o Cristo Redentor participa e testemunha a própria consolidação de um estilo que pretendia encarnar os índices da suprema modernidade. No quadro da arquitetura brasileira e carioca, a estátua figura como uma das obras pioneiras do Art Déco. O movimento Art Déco, assim como a Art Nouveau e as demais experiências modernistas, buscou a inovação em um novo século, mas suas inspirações eram extremamente ecléticas. Além das inspirações que serão citadas a se- guir, o movimento também trouxe inspirações do Egito Antigo, da África, do Oriente e de outros locais, utilizando flores estilizadas, formas vegetais onduladas, formas geométricas facetadas e figuras humanas estilizadas, idealizadas e heroicas. Inspirações do cubismo: formas sobrepostas e facetadas. Inspirações do construtivismo russo: linguagem da mecanização. Inspirações do futurismo: o fascínio pelo movimento. O movimento Déco, ainda que abraçasse a estética da máquina, apresentava um modo de celebrar tanto a arte como a tecnologia. Dentro de sua produção arquitetônica, destaca-se um famoso arranha-céu, o Edifício Chrysler (1928), situado em Nova Iorque e projetado por William Van Alen (1883–1954). Como vemos na Figura 6 e segundo Fazio e colaboradores (2011, pp. 492–493), o edifício, com sua “cúpula em forma de coroa feita de aço inoxidável, com sucessivos arcos preenchidos com raios de sol e coroada com uma flecha”, se tornou um marco na paisagem urbana. Ainda se destacam “suas gárgulas de águias e o famoso acrotério com motivos radiais e friso adjacente com rodas de veículos abstratas”. Arquiteturas modernista e pós-modernista8 Figura 6. William Van Alen, Edifício Chrysler, Nova Iorque, 1928. A silhueta mais característica na linha do horizonte de Nova Iorque ainda é a coroa de aço inoxidável do Edifício Chrysler. Ignorado por muito tempo pelos modernistas, este ornamento para edifícios altos ressurgiu quase como um fetiche nas décadas de 1970 e 1980. Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 492). Além dos edifícios altos Art Déco que se destacam em Nova Iorque, há um conjunto particularmente rico em Miami Beach, Flórida, “[...] onde a linguagem internacional se misturou com uma paleta de cores local e se adaptou ao clima subtropical” (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p. 495). São edifícios 9Arquiteturas modernista e pós-modernista de escala modesta, mas pintados com tons fortes. Em geral, apresentam brises e balcões que enfatizam a horizontalidade do conjunto, sendo pontuados por elementos marcadamente verticais, como entradas e torres de escada. Sua decoração é marcada por motivos da Art Déco, como raios de sol, motivos da fauna e flora locais, incluindo as tradicionais palmeiras e flamingos de Miami (Figura 7), como ressaltam os autores citados. Figura 7. Anton Skislewicz, The Breakwater, Miami Beach, Flórida, 1939. As volumetrias mais populares entre os edifícios da Art Déco em Miami combinam vários pavimentos horizontais com um alto elemento central — neste caso, um letreiro de hotel e uma caixa de escada. Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 496). O De Stijl As origens do movimento holandês De Stijl remontam às obras do pintor Piet Mondrian (1872–1944) e do arquiteto H. P. Berlage (também comentado no ex- pressionismo holandês) e possuem duas fases, ambas coordenadas por Theo Van Doesburg — pintor, projetista, tipógrafo, crítico, escritor e agitador de multidões. Os dois artistas que marcam o início do movimento buscavam em sua obra uma maneira moderna de se expressar. Os projetos de De Stijl são marcados pela ultrarracionalidade e por serem abstratos e mecânicos, diferentemente dos ex- pressionistas holandeses, que tendiam ao fi gurativismo, sintonizados com o meio artesanal de produzir edifi cações (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Arquiteturas modernista e pós-modernista10 Primeira fase do De Stijl: tem início em 1921 e inclui como parti- cipantes Mondrian, vários outros pintores holandeses e os arquitetos Rob van t’Hoff (1887–1979) e J. J. P. Oud (1890–1963), que defendiam a criação de formas universais espacialmente ilimitadas e em sintonia com a tecnologia moderna. Segunda fase do De Stijl: de 1921 a 1922, mudaram os participantes, e o movimento ganhou um perfil mais internacional, sem Mondrian e com a permanência de Van Doesburg. Temos a entrada dos russos construtivistas El Lissitzky (1890–1941), Friedrich Kiesler (1890– 1965), do Grupo Berlim G (que incluía o jovem Mies va der Rohe), o planejador Cor Van Eesteren (1897–1988) e o arquiteto e desenhista de móveis holandês Gerrit Rietveld (1888–1964). Nessa fase, as obra do De Stijl continuaram abstratas e com caráter tecnicista, porém se tornaram mais construtivistas e radicais em relação à exploração do espaço tridimensional. Dessa produção, podemos dar destaque, entre os desenhos de móveis, à Cadeira Vermelha e Azul (1917–18) de Rietveld, até hoje produzida (Figura 8). Figura 8. Gerrit Rietveld, Cadeira Vermelha e Azul, 1917– 1918. Essa cadeira, nas cores primárias características do estilo, ainda é produzida. A construção com elementos aparentemente independentes mostra por que Rietveld descreveu sua obra como “elementarismo”. Fonte: Picturepartners/Shutterstock.com. 11Arquiteturasmodernista e pós-modernista Gerrit Rietveld desenvolveu uma linguagem chamada de elementarismo, na qual reunia os elementos individuais, de modo a manter sua integridade; o conjunto completo evidenciava todo o processo de construção (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Da produção arquitetônica, pode-se destacar a Casa Schröder (1924), projeto de Rietveld em Utrecht, que costuma ser apontada e conhecida como umas das principais obras do De Stijl. A casa possui exterior similar ao de outras composições residenciais de Van Eesteren e Van Doesburg, a partir de planos com diferentes orientações ortogonais que se interseccionam e se conectam através de perfis de aço lineares (Figura 9) (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Figura 9. Gerrit Rietveld, Casa Schröder, Utrecht, 1924. Não é difícil imaginar o susto dos vizinhos, que moravam em casas de tijolos tradicionais, quando esta composição estranha apareceu na rua. Fazia 20 anos que Adolf Loos havia despojado uma casa com a aplicação de ornamentos pela primeira vez. Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 498). Arquiteturas modernista e pós-modernista12 O estilo internacional A Deutscher Werkbund — em português, “Associação Alemã de Artesãos” — foi uma organização cultural alemã formada por Peter Behrens, Walter Gropius e Mies Van der Rohe, entre outros arquitetos e designers, fundada em 1907, com o objetivo de valorizar o design alemão — apresentou uma proposta, em 1925, de uma exposição (1927) para mostrar as últimas tendências em projetos de moradias, acessórios de interiores e técnicas de construção (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Para a exposição, foram disponibilizados pela prefeitura de Stuttgart terrenos e verba para a construção de 33 edifi cações permanentes, localizadas em uma colina no subúrbio da cidade (Figura 10). Figura 10. Ludwig Mies van der Rohe, Edifícios de apartamentos do Weissenhof Siedlung, Stuttgart, 1927. Mies desenvolveu a implanta- ção desta exposição e construiu este edifício de apartamentos na parte mais alta do terreno. Observe as janelas pré-fabricadas e os balcões com guarda-corpos tubulares similares aos que Adolf Loos usara 20 anos antes. Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 511). O empreendimento ficou a cargo de Mies van der Rohe, responsável pelo plano diretor e um dos projetos, um edifício de apartamentos. Além disso, Mies convidou 16 dos principais arquitetos da Europa para projetar as edificações, entre elas casas isoladas, casas geminadas e casas em fita. As edificações ficaram conhecidas como Weissenhof Siedlung (ou Conjunto Habitacional Modelo de Weissenhof). Embora tenham se adotado no conjunto diversas abordagens, os elementos comuns entre os projetos foram determinantes para o desenvolvimento do modernismo. Sobre as características das edificações, ressalta-se a colocação: 13Arquiteturas modernista e pós-modernista Todas as edificações foram pintadas de branco; tinham janelas “funcionais” que enfatizam a horizontalidade; e quase todas tinham coberturas planas, algumas com terraços-jardim. O aspecto industrial foi expresso nos perfis tubulares dos guarda-corpos dos balcões, os quais eram o principal elemento decorativo no exterior. As guarnições de janela eram mínimas e não havia cornijas (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p. 511). No fim, observou-se uma aparência parecida nas edificações, mesmo que projetadas por arquitetos alemães e de outros países. Tanto essa afinidade estética quanto o livro Internacionale Architektur (1925), de Walter Groupius, contribuíram para que a arquitetura moderna do final da década de 1920 fosse intitulada de estilo internacional. Estilo este caracterizado, segundo Barr (apud FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p. 512), por dar: [...] ênfase no volume — espaços vedados por planos e superfícies finas em vez de simetrias ou outros tipos de equilíbrio evidente; e, finalmente, a dependência com relação à elegância intrínseca dos materiais, sua perfeição e belas proporções, em vez da aplicação de ornamentos. Poucas mulheres entraram para o seleto grupo do modernismo europeu, dominado por homens. Lilly Reich trabalhou com Ludwig Mies van der Rohe em seus interiores, mas apenas Eileen Gray (1878–1976) produziu casas no estilo internacional por conta própria. No projeto de sua casa, em Roquebrune, França (1926–1929), é interessante observar como as paredes brancas desadornadas são bastante consistentes com a arquitetura tradicional do litoral e das ilhas do Mediterrâneo (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Conclusões sobre a arquitetura modernista Após a Primeira Guerra Mundial, muitos arquitetos europeus enxergaram na arquitetura um possível instrumento de transformação social. Em meio a um cenário caótico de destruição e emergência de habitações, elegeram-se como principais preocupações a utilidade, a efi ciência e a mecanização ligada à indústria, combinadas às avançadas concepções espaciais em voga nesse momento nas artes visuais. E, como apanhado desse contexto e período de inúmeras experiências e de desenvolvimento do modernismo, temos o trecho, Arquiteturas modernista e pós-modernista14 que muito nos revela, de Fazio, Moff ett e Wodehouse (2011, p. 525) sobre os modernistas, que, por meio da arquitetura, acreditavam na mudança de mentalidade do povo: Não faltaram novas ideias: Adolf Loos e seu ataque contra a ornamentação “decadente” e o desenvolvimento do Raumplan; Frank Lloyd Wright e a decisão de inventar uma tipologia doméstica norte-americana única (o que fez com as casas no Estilo dos Prados), além de inovações técnicas como o condicionamento de ar central no Edifício Larkin e o concreto moldado in loco no Templo Unitário; e a experiência alemã, na qual Peter Behrens e ou- tros com ideias similares fundaram a Deustcher Werkbund, tentando elevar a qualidade geral dos produtos manufaturados, e Walter Groupius desenvolveu um novo sistema de ensino de arquitetura na Bahaus – primeiro em Weimar, depois em Dessau, até a escola ser fechada pelos nazistas. Some a essa fértil mistura as propostas radicais – desenhadas com frequência, mas construídas como frequência menor – de dinamismo feitas pelos futuristas italianos, de modulações de espaço infinito pelos projetistas do De Stijl e de composições radicais de materiais pelos construtivistas russos. No final, o espaço se tornou a especialidade do Modernismo. E, logo, vemos essa espacialidade muito bem trabalhada pelos “mestres do modernismo” — Le Corbusier, Walter Groupius, Mies van der Rohe e Frank Lloyd Wright — em suas obras, desenvolvidas ao longo de diferentes fases de suas carreiras, deixando um legado importante para a arquitetura e sua história. Devem-se ressaltar ainda, para além de todos esses acontecimentos, os avanços tecnológicos na construção civil — marcados pelo uso do aço e do concreto armado —, e as novas visões da cidade, sendo esta vista como um local para abrigar indústrias e sistemas modernos de transporte, assim como a questão da saúde física e mental e os ideais utópicos. Lembre-se, ainda, de que, em número total de edificações construídas, tinham destaque “[...] as formas alternativas do Expressionismo holandês e alemão, as formas híbridas da Art Déco e as formas latentes do ecletismo”, e não as que seguiam as prescrições modernistas (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p.525). Em vista disso tudo, a situação se tornou ainda mais complexa e indefinida no final do século XX, como veremos a seguir. Arquitetura pós-modernista A organização conhecida como CIAM (Congresso Internacional de Arquitetura Moderna), em 1928, deu início à promoção da arquitetura moderna e à aborda- 15Arquiteturas modernista e pós-modernista gem de questões urgentes de projetos de edifi cações e planejamentos urbanos. Le Corbusier foi considerado como sua fi gura de destaque, no entanto, outros modernistas também participaram do CIAM, como Walter Groupius e Alvar Aalto. Após a Segunda Guerra Mundial, a organizaçãobuscou reformular suas metas, mas logo fi cou claro que os novos projetistas se direcionavam para outros horizontes. Em 1953, um grupo recém-formado e que se denominava Team-X fi cou responsável por organizar a próxima edição, ocasionando o término dos CIAMs. O Team-X era formado pelo casal Peter (1923–2003) e Alison (1928–1993), Smitshon e Ralph Erskine (1914–2005), ingleses, e o holandês Aldo Van Eyck (1918–99), que pensavam de maneira diferente dos modernistas convencionais, pois voltavam-se mais para os problemas pós-guerra e para as questões dos contextos regional e local (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Roberti Venturi O modernismo estava ameaçado após a Segunda Guerra Mundial. Como vimos, membros do Team-X percebiam que o campo da arquitetura estava mudando. Assim, arquitetos como Alvar Aalto, Saarinem e Louis Kahn bus- caram novas direções. A partir da década de 1960, deu-se início ao pós-modernismo, marcado pela publicação do tratado Complexidade e Contradição em Arquitetura (1966), de Robert Venturi (1925), que defendia uma arquitetura multivalente e subjetiva. No livro, Venturi (apud FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p. 538) descartava: “[...] o caráter ordenadamente puro e imaculado do Modernismo em favor de obras populistas plurais, frequentemente anônimas e eminentemente práticas”, transformando o “menos é mais” (less is more) de Mies, para “menos é um tédio” (less is a bore). Entre as obras de Venturi, antes da publicação do livro, destaca-se a casa feita para sua mãe, Vanna, em 1962, na Pensilvânia (Figura 11). Arquiteturas modernista e pós-modernista16 Figura 11. Robert Venturi, Casa Vanna Venturi, Chestnut Hill, Pen- silvânia, 1962. Robert Venturi construiu esta casa para sua mãe. A modesta edificação é rica em alusões à arquitetura do passado, desde a moldura semelhante a um arco acima da entrada até a volumetria em forma de frontão partido do bloco inteiro. Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 538). É importante ressaltar que o termo “pós-modernismo” foi criado para identificar as novas direções surgidas dentro do campo da arquitetura após o modernismo. Não descrevia que novas direções seriam estas, somente aquilo que elas não eram. Segundo Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 539), depois da introdução do termo no contexto da arquitetura, “[...] ele assumiu um contrassignificado na cultura de maneira geral, sugerindo uma fragmentação pós estruturalista e uma desconfiança em relação a qualquer tentativa de construir sistemas de pensamento sobre bases firmes”. O Quadro 1, a seguir, aponta alguns dos personagens que se destacam dentro da produção pós-moderna e dentro de suas vertentes. Arquiteto Uma de suas obras Obra Descrição Philip Johnson (1906–2000) Sede da American Telephone and Telegraph, Nova Iorque, 1984 Com este edifício e as referências aos estilos do passado, Philip Johnson rompeu com a tradição miesiana. Quadro 1. Uma vertente pós-modernista (Continua) 17Arquiteturas modernista e pós-modernista Fonte: Adaptado de Fazio, Moffett e Wodehouse (2011). Arquiteto Uma de suas obras Obra Descrição Charles Moore (1925–1993) Piazza d’Itália, Nova Orleans, Louisiana, 1975–1979 A obra de Moore assu- miu um aspecto quase carnavalesco com projetos como este, uma fonte com pano de fundo para um espaço público criado em Nova Orleans. Michael Graves (nascido em 1934) Dolphin Hotel, Disney World, Orlando, Flórida, 1987 Aqui, Graves trouxe Boullée para um ambiente de parque temático. Embora os apartamentos sejam modestos, o contexto, projetado com água, passarelas, cabanas e esplanada ladeada por palmeiras, anima o conjunto. Robert A. M. Stern (nascido em 1939) Casa Lang, Washington, Connecticut, 1973–1974 Esta casa de campo tem uma fachada à maneira de loja do faroeste norte-ame- ricano, na qual foram aplicadas molduras similares a glacê de bolo. São os primei- ros passos de Stern na chamada alusão clássica. Quadro 1. Uma vertente pós-modernista (Continuação) Arquiteturas modernista e pós-modernista18 A desconstrução O pós-modernismo também inclui obras descritas como desconstrutivistas — obras que enfatizam a fragmentação e dissociação em vez da unidade e síntese tradicionais (Quadro 2). Arquiteto Uma de suas obras Obra Descrição Berbard Tschumi (nascido em 1944) Folie, Parc de la Villette, Paris, 1982–1985 O Parc de la Villette foi criado como centro cultural ao ar livre, com espaço para oficinas, academia de ginástica, equipamentos de ba- nho, parques infantis, exposições, concertos e muito mais. Cada fo- lie é um objeto neutro e indiferente na paisa- gem, onde podem ser realizadas as atividades designadas. Peter Eisenman (nascido em 1932) Casa III, Lakeville, Connecticut, 1969–1971 Na década de 1960, Peter Eisenman explo- rou as possibilidades abstratas das grelhas rotadas. Os espaços se tornavam um efeito causado pela manipu- lação de elementos se- lecionados de acordo com um conjunto de regras. Quadro 2. A desconstrução (Continua) 19Arquiteturas modernista e pós-modernista Fonte: Adaptado de Fazio, Moffett e Wodehouse (2011). Arquiteto Uma de suas obras Obra Descrição Zaha Hadid (nascido em 1950) Rampa para Prática de Esqui de Bergi- sel, Innsbruck, Aústria, 2002 Nesta época em que as mulheres ganham cada vez mais des- taque no cenário da arquitetura internacio- nal, ninguém é mais famosa que a iraniana Zaha Hadid. Ao proje- tar a rampa de esqui, ela pôde explorar seu interesse pela veloci- dade, a mudança e os ângulos relacionados dos volumes. Frank Gehry (nascido em 1929) Museu Gug- genheim de Bilbao, Bilbao, 1997 Este foi o edifício recente que mais chamou a atenção da imprensa e atraiu pere- grinos da arquitetura. Os visitantes adoram tocar a pele brilhante de titânio. Rem Koolhaas (nascido em 1944) Biblioteca Central de Se- attle, Washing- ton, 2004 Algumas pessoas questionam se sua preocupação com as montagens de mate- riais e sistemas é com- patível com sua queda pela conceitualização. Quadro 2. A desconstrução (Continuação) Arquiteturas modernista e pós-modernista20 O regionalismo moderno O Quadro 3 apresenta arquitetos que seguiram o caminho aberto pelo Team-X, baseando-se em valores locais, tradições de construção e linguagens formais, sensíveis ao terreno em conjuntos com as novas tecnologias. Fonte: Adaptado de Fazio, Moffett e Wodehouse (2011). Arquiteto Uma de suas obras Obra Descrição Luís Barragán (1902–1988) El Bebedero (bebedouro e fonte), Las Arboledas, Cidade do México, 1959–1962 A água é um bem precioso em lugares áridos, como em grande parte do México, e está associada à vida, ao renascimento e à renovação; isso significa que, embora tenha sido concebido como um “bebedouro”, este espelho de água e o jardim que o cerca tornaram-se uma paisagem introspectiva. Mario Brotta (nascido em 1943) Casa 1973, Monte San Giorgio, Suíça, 1973 Brotta respondeu ao contexto espetacular inserindo no terreno íngreme a geometria elementar de um cubo, acessado por uma delicada passarela em esqueleto. Álvaro Siza (nascido em 1933) Centro Galego de Arte Contemporânea, Santiago de Compostela, Espanha, 1985–1992 Primeiramente, Siza relacionou o edifício com a estrada; em seguida, uniu o convento, o claustro e a igreja antigos com o novo museu por meio de paisagens compartilhadas. Quadro 3. O regionalismo moderno 21Arquiteturas modernista e pós-modernista Destacam-se, ainda, as vertentes: o modernismo no Japão, com os arqui- tetos Kenzo Tange (1913–2005), Fumihiko Maki (nascido em 1928), Arata Isozaki (nascido em 1931), Tadao Ando (nascido em 1941); o formalismo nos Estados Unidos, com os edifícios a Prefeitura de Boston (1968), o Memorial aos Veteranos do Vietnã (1982), o United States Holocaust Memorial Museum (1993) e alguns edifícios altos da cidade de Nova Iorque; e o trabalho dos arquitetosRichard Meier (nascido em 1934), Antoine Predock (nascido em 1936), Steven Holl (nascido em 1947), da firma Morphosis; além do formalismo em outros locais, como Jorn Utzon, vencedor do projeto Casa de Ópera de Sydney, na Austrália (1957); o trabalho de alguns arquitetos europeus — como o de Renzo Piano (nascido em 1937), Santiago Calatrava (nascido em 1951), Jean Nouvel (nascido em 1949), Norman Foster (nascido em 1935) e Nicholas Grimshaw (nascido em 1939). Conclusões sobre a arquitetura pós-modernista Pode-se concluir que, defi nitivamente, não há uma única vertente no projeto de edifi cações no início deste século. O movimento pós-moderno chegou e já se foi, e o desconstrutivismo revelou-se mais como um “rótulo”. Não há como negar que a cultura arquitetônica, de modo geral, apresenta-se plural, em que há novas forças, sendo o computador, provavelmente, uma das mais evidentes. Como coloca Pereira (2010, p. 311) sobre a arquitetura contemporânea: A arquitetura atual é cruzada por diversas linhas transversais, é uma arquite- tura mestiça: de formação cosmopolita e atuação planetária. Distanciada dos experimentos radicais, não é uma arquitetura de ideias, e sim um arquitetura de experiências: é pouco programática e peculiar a cada situação. Arquiteturas modernista e pós-modernista22 CHING, F. D. K.; JARZOMBEK, M. M.; PRAKASH, V. História global da arquitetura. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2019. FAZIO, M.; MOFFETT, M.; WODEHOUSE, L. A história da arquitetura mundial. 3. ed. Porto Alegre: AMGH, 2011. GIUMBELLI, E. A modernidade do Cristo Redentor. DADOS Revista de Ciências Sociais, v. 51, n. 1, 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/dados/v51n1/a03v51n1.pdf. Acesso em: 16 jul. 2019. PEREIRA, J. R. A. Introdução à história da arquitetura: das origens ao Século XXI. Porto Alegre: Bookman, 2010. Leituras recomendadas CURTIS, W. J. R. Arquitetura moderna desde 1900. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2008. HADID, Z. Zaha Hadid: 1983-1995. Madrid: El Escorial, 2000. HARVEY, D. Condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 1992. MAHFUZ, E. C. Quem tem medo do pós-modernismo. Revista Projeto, n. 111, 1989. ROSSI, A. A arquitetura da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1995. RUUSUVUORI, A.; PALLASMAA, J. Alvar Aalto: 1898-1976. 3. ed. Lisboa: Helsinki, 1981. SIZA, Á. Alvaro Siza: 1986-1995. Lisboa: Blau, 1995. 23Arquiteturas modernista e pós-modernista