Aconselhamento genetico

BIOLOGIA CELULAR E GENÉTICA GRASIELA DIAS DE CAMPOS SEVERI - AGUIAR 1 UNIDADE 1 3 ACONSELHAMENT O GENÉTICO COMPETÊNCIAS 1 . CONCEIT OS GERAIS Em algu mas famílias podem acontecer situações que levam a busca do aconselhamen - to genético, tema a ser abordado nessa unidade. Acontece, por exemplo, de nascer uma criança portando uma doença de origem genética e a família deseja saber qual é a probabilidade de nascer uma outra criança com a mesma doença, em uma nova gesta - ção. Ou, também, pode acontecer de existir uma doença genética que já é comum em uma determina da família, e de um membro dessa família que deseja ter um \ue6bflho, querer conhecer a probabilidade de ele nascer com essa doença. Nesse caso trata-se de uma recorrência familial , ou seja, o risco de acontecer novamente o mesmo evento. Ocorre também, caso em que se deseja saber a probabilidade de um evento acontecer , ou seja, uma ocorrência . Por exemplo, uma mulher que engravida naturalmente, com mais de 40 anos, e deseja saber a probabilidade de o feto ter síndrome de Down. T anto em uma como em outra situação, esses indivíduo s, que são chamados con- sulentes , são encaminhados para serviços de aconselhamento genético (AG) , que pode ser entendido como um processo de comunicação a respeito dos riscos de ocor - rência ou recorrência de uma anomalia genética em uma família. Ele exige pro\ue6bfssionais especializados em genética, médicos ou geneticistas, chamados de conselheiros ou aconselhadores genéticos , que farão uma análise detalh ada do caso, solicitarão exa - mes como o do cariótipo, realizarão entrevistas com os familiares, estudarão o histórico familial da doença buscando de\ue6bfnir o padrão de herança da mesma, para deduzir , com maior segurança, as probabilidades de nascimentos de indivíduos afetados. O conselheiro genético deve, portanto, conhecer bastante sobre genética, probabilidade e estatística para avaliação de risco de ocorrência e recorrência na família, mas também deve ter habilidade para explicar todas essas informações aos envolvidos, esclarecendo seus questiona mentos. Esse pro\ue6bfssional deve integrar uma equipe multidisciplinar de Aplicar o conhecimento cientí\ue6bfco na prática pro\ue6bfssional em saúde Conteúdo programático 01. Conceitos gerais 02. Procedimento do aconselhamento genético 03. Importância do aconselhamento genético 2 Biologia Celular e Genética U13 Aconselhamento Genético saúde com função de educar e esclarecer as pessoas sobre formas de prevenção e/ou de adaptação às doenças genéticas, além de respeitar as condições e necessidades religiosas, psicológicas, culturais, éticas e sociais dos pacientes. O conselheiro genético deve ter profundo conhecimento genético sobre a doença, deve conhecer os recursos médico s para o tratamento da doença e, também, para reduzir os riscos de ocorrência e recorrência da mesma, além de, encaminhar os envolvidos para o apoio psicoterapêutico para o enfretamento do problema. O AG deve fornecer aos en - volvidos todas as informações necessárias para garantir a autonomia dos mesmos na tomada de decisões. Inclusive os riscos, benefícios e limitações dos testes que podem ser utilizados, como no caso da amniocentese, emprega da no diagnóstico pré-natal, devem ser apresentados e discutidos pelos indivíduos para decidirem a favor ou não pela sua realização. Nessa unidade, conheceremos como ocorre o processo do aconselhamento genético, suas etapas, em que situações ele é indicado e, também, a importância e aplicações do AG. SAIBA MAIS SOBRE ACONSELHAMENT O GENÉTICO.... Acesse o link: https://www .youtube.com/watch?v=65kkggIUwXQ . Acesso 1 1 de junho 2022. 2 . PROCEDIMENT O DO ACONSELHAMENT O GENÉTICO Na grande maioria das vezes, o paciente é encaminhado ao serviço de AG, de instituição pública ou privada, por um pro\ue6bfssional médico, a quem ele procurou em virtude de uma queixa. As principais indicações para encaminhamento ao AG estão listadas na \ue6bfgura 01. Figura 01. Principais indicações para encaminhamento ao AG 01. A valiação de pessoa com de\ue6bfciência intelectual ou atraso de crescimento; 02. A valiação de pessoa com defeitos morfológicos congênitos único s ou múltiplos, questio - namento sobre uma síndrome dismór\ue6bfca; 03. A valiação de pessoa com uma possível doença metabólica herdada; 04. Presença de possível doença monogênica; 05. Presença de doença cromossômica, incluindo rearranjos cromossômicos equilibrados; 06. Pessoas em risco de uma condição genética, incluindo questões de diagnóstico pré-sin - tomático ou risco de câncer; 07. Pessoa ou família com dúvidas sobre aspectos genéticos de qualquer condição médica; U13 3 Biologia Celular e Genética Aconselhamento Genético 08. Casais com histórico de abortos recorrentes; 09. Consanguinidade em um casal; 10. Doenças típicas de grupos étnicos especí\ue6bfcos; 1 1. Uso de teratógenos; 12. Aconselhamento pré-concepção e sobre fatores de risco. Incluin do idade materna avan - çada e outras Fonte: Goloni-Bertollo e col. (2013, p. 31) De maneira resumida, pode-se dizer que o AG apresenta quatro etapas: 2 . 1 . DEFINIÇÃO E / OU CONFIRMAÇÃO DO DIAGNÓSTICO . Para que o diagnóstico seja atingido, é necessário realiz ar uma anamnese bastante detalhada do paciente e de membros da família e levantar um histórico familial o mais completo possível. T odas as informações são importantes e os detalhes devem ser con - siderados. Exames adicionais podem ser solicitados para descartar alguma hipótese ou para acrescentar informação relevante, como o exame de cariótipo. 2 . 2 . ESTIMA TIV A DE RISCO Com base em todas as informações obtidas, o conselheiro genético buscará encontrar o padrão de herança mendel iana da anomalia, calcular as probabilidades e estimar os riscos de ocorrência e/ou recorrência. 2 . 3 . COMUNICAÇÃO DAS INFORMAÇÕES AOS ENVOL VIDOS Estabelecido o diagnóstico e estimados os riscos, o conselheiro genético agenda nova entrevista com os consulente s, que procuraram o AG, para apresentar a conclusão dos estudos realizados. Serão apresentados a eles, de forma clara e objetiva, o diagnóstico, a causa do problema (doença), o prognóstico do caso, as formas de tratamento e os ris - cos da ocorrência ou da recorrência desse problema. Em muitos casos, o aconselhador genético, deve orientar e encaminhar o consulente para um suporte psicoterapêutico. 2 . 4 . T OMADA DE DECISÃO Em muitas situações, os consulentes terão que tomar decisões decorrentes das infor - mações que receberam do conselheiro genético. Por isso é importante que eles enten - dam a situação e analisem todas as informações recebida s para que decidam de forma autônoma. O conselheiro genético não vai decidir por eles, isto é, ele apresentará as possibilidades, os riscos, as alternativas, os caminhos, mas eles decidirão o que fazer . Para entender melhor como o AG ocorre, leia o caso abaix o reportado num artigo publi - cado na Revista Medicine em 2020, que relatou uma mutação rara associada à infertili - dade masculina (Deng et al., 2020). 4 Biologia Celular e Genética U13 Aconselhamento Genético \u201cUm homem chinês de 33 anos foi encaminhado ao Serviço de Aconselhamento Gené - tico com queixa de infertilidade. Casado há 10 anos, somente agora a esposa estava grávida. Sua altura era 182cm e seu peso era 77Kg. Apresentava pênis com desenvol - vimento normal e o volume dos testículos direito e esquerd o também normal. Nenhuma outra anormali dade física foi observada. Uma série de exames de rotina foi realizada e pela análise do espermograma foi diagnosticada oligozoospermia severa (produção muito baixa de espermatozoides).\u201d O paciente do artigo acima foi conduzido para o setor de citogenética e realizada a análise do cariótipo dos linfócitos do sangue periférico. Foi empregado o bandamento G e descrito o cariótipo 46, XY , ad(3)(p26) para o paciente (Figura 2). Além disso, foi também realizada FISH ( Fluorescent in situ Hybridization ) utilizando as sondas para SR Y e Y q12. Os resul - tados da hibridação revelaram um sinal SR Y e dois sinais Y q12: um normal localizado no cromossomo Y e outro na região terminal do cromossomo 3 (Figura 3). Com base nessas análises, o cariótipo do paciente foi de\ue6bfnido como 46, XY , der(3)t(Y ;3)(q1 1.22;p26). Figura 02. Cariótipo do paciente após o bandamento G: 46, XY , ad(3)(p26) Fonte: Deng et al. (2020, p.2) U13 5 Biologia Celular e Genética Aconselhamento Genético A família do paciente foi chamada para investigação citogenética e foi descoberto que a translocação rara não balanceada Y ;3 era transmitida na família há três gerações. O paciente herdo u a mutação do seu pai. Com autorização do paciente e de sua esposa, o feto de 17 semanas foi submetido à amniocentese e detectada a presença do mesmo cromossomo der(3) do pai. Posteriormente, a gestação foi naturalmente interrompida na 23ª semana devido à ruptura prematura de membrana s. O paciente e sua esposa optaram pelo emprego do método de reprodução assistida - Intracytoplasmatic Sperm Injection (ICSI) - nas outras gestações, a \ue6bfm de evitar a transmissão da mutação. Os autores do artigo salienta ram que esse estudo não apenas auxiliou a entender a correlação cariótipo-fenótipo da translocação Y -autossomo, mas também, fortaleceu o papel do emprego das técnicas de citogenética em identi\ue6bfcar pontos de quebra e as regiões envolv idas em proble mas de fertilidade, por exemplo, sendo muito útil para os seus portadore s e sua descendência. Serão apresentados aqui, duas situações \ue6bfctícias de procedimentos em AG. Figura 03. Metáfase de linfócito de sangue periférico submetida à técnica de FISH Legenda: A hibrida ção in situ \ue6c0uorescente mostrou uma marcação com a sonda SR Y em vermelho e duas marcações com a sonda Y q12 em verde, uma no cromossomo Y e outra no cromossomo 3. Fonte: Deng et al. (2020, p.4) 6 Biologia Celular e Genética U13 Aconselhamento Genético Situação 1. O portador da doença de T ay-Sachs apresenta uma mutação no gene HEXA, localizado no cromossomo 15. Esse gene codi\ue6bfca a produção de uma enzima chamada Hexosa - minidase-A (Hex-A), que \ue6bfca dentro do lisossomo, organe la responsável pela digestão intracelular , nesse caso, de uma substância lipídica chamada GM2- gangliosídio. Essa molécula existe normalmente em pequenas quantidades nos neurônios, porém, quando ela não é digerida pela falta de Hex-A, essa substância lipídica acumula nas células nervosas, provocando danos nessas células e culminand o na sua morte. A doença é caracterizada por deterioraçã o progressiva cognitiva e motora, o que leva a convulsões, retardo mental, paralisia e morte do indivíduo. Um casal normal pretende ter \ue6bflhos, mas aconselha-se com um consultor genético, pois o homem tem uma irmã com T ay-Sachs e a mulher tem um irmão com T ay-Sachs. Não se conhece outros casos em suas famílias. Eles solicitam ao consultor genético que determine a probabilidade de que seu primeiro \ue6bflho apresente T ay-Sachs. Qual será essa probabilidade? 01. V amos denomin ar o alelo que causa o fenótipo da T ay-Sachs de t e o respectivo alelo normal de T e buscar determinar o genótipo dos membros da família. A irmã e o irmão do homem e da mulher certamente são t/t. isso demonstra que a doença obedece a um padrão de herança autossômica recessiva. 02. Se nasceram pessoas afetadas a partir dos avós, todos eles provavelmente devem ser heterozigotos normais (Tt). Como os consulentes são normais, eles são T_, porque não con - seguimos determinar se são homozigotos (TT) ou heterozigotos (Tt). 03. O heredograma pode ser assim representado: Figura 04. Heredograma Tt Tt Tt Tt T_ T_ ? tt tt Fonte: Elaborada pelo autor . U13 7 Biologia Celular e Genética Aconselhamento Genético 04. Assim, a partir dos cruzamentos dos avós é esperada uma progênie nas seguintes pro - porções, conforme mostrado no quadro abaixo. T abela 01. Gametas e possíveis zigotos obtidos do cruzamento com as respectivas proporções genotípi - cas. A VÓS P A TERNOS E MA TERNOS ETEROZIGOT OS TT GAMET AS / ZIGOT O / PROBABI - LIDADE T GAMET AS / ZIGOT O / PROBABI - LIDADE T T TT ¼ Tt ¼ t Tt ¼ tt ¼ Fonte: Elaborada pelo autor . Proporção genotípica: ¼ TT ; ½ Tt ; ¼ tt Proporções fenotípicas: normais= ¼ TT + ½ Tt =¾ e afetados= ¼ tt 05. Como o homem e a mulher consulentes são normais a probabilid ade de cada um ser um heterozigoto é de 2/3, pois dentre os T_, 2/3 podem ser T/t e 1/3 pode ser T/T . 06. Com essas informações, o problema pode-se aplicar a regra do produto, ou seja, pela multiplicação. 07. Um homem e a mulher normais só podem ter um \ue6bflho com T ay-Sachs se ambos forem heterozigotos. Assim, a probabilidade do homem e da mulher serem heterozigotos é 2/3 × 2/3 = 4/9. 08. Sendo os dois heterozigotos, apenas um quarto de seus \ue6bflhos poderá apresentar T ay - -Sachs. 09. Dessa forma, a probabilidade de seu primeiro \ue6bflho apresentar a doença, que é de 1/4 e a probabilidade de ambos serem heterozigotos, que é de 4/9, é calculada pelo produto dessas probabilidades: 4/9 × 1/4 = 4/36 = 1/9. 10. Em conclusão, a probabilidade desses consulentes terem um \ue6bflho com a doença de T ay-Sachs é de 1/9, ou seja, um em cada nove nascimentos. T odas essas informações foram transmitidas aos consulentes para resolverem como proceder numa gestação futura. Situação 2. Um casal de consulentes procura o serviço de AG de um hospital público desejando saber qual a probabilidade de seu segundo \ue6bflho apresentar a mesma doença do irmão mais velho e da mãe. A mulher relata que essa doença rara afeta dois de seus irmãos e uma irmã, além de sua mãe, duas tias maternas e seu avô materno. Com base nas informações apresentadas por ela, foi elaborado o heredograma abaixo. 8 Biologia Celular e Genética U13 Aconselhamento Genético Figura 05. Hederograma Fonte: Elaborada pelo autor . ? 01. O primeiro passo é de\ue6bfnir o tipo de herança da doença. Pelas observações do here - dograma é possível veri\ue6bfcar se trata de uma herança ligada ao X dominante. Dois fatos permitiram essa conclusão: o fato de não haver transmissão paterna para os \ue6bflhos homens, indicando ligaçã o ao cromossomo X e, o homem afetado da geração II, permitiu que a doen - ça aparecesse em todas as gerações, caracterizando caso de dominância. 02. Considerando que o fenótipo doente é causado pelo alelo D e o fenótipo normal pelo alelo d, determina os genótipos dos membros da família. Sendo assim, o menino afetado é X D Y e seu pai, o consulente normal, X d Y . Sua mãe, a consulente afetada pela doença tem genótipo X D X d porque ela é \ue6bflha de mãe afetada e pai normal, tendo recebido o X d do seu pai. 03. O próximo passo é identi\ue6bfcar os possíveis genótipos e suas probabilidades, utilizando o quadro abaixo. T abela 02. Gametas e possíveis zigotos obtidos do cruzamento com as respectivas proporções genotípicas. CONSULENTES P AI E MÃE GAMET AS / ZIGOT O / PROBABILIDADE X D GAMET AS / ZIGOT O / PROBABILIDADE X D X d X D X d ¼ X d X d ¼ Y X D Y ¼ X d Y ¼ Fonte: Elabora pelo autor .

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