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O surgimento da psicologia como ciência Ana Alice Reis Pieretti Introdução Nesta aula, trabalharemos o conceito de psicologia, compreendendo quais são as principais questões desta disciplina. Para isso, veremos a sua evolução desde a época da grécia antiga até os séculos XIX e XX, quando passou a ser estudada como ciência. Objetivos de aprendizagem Ao final desta aula, você será capaz de: • Identificar a evolução da psicologia como ciência; • Diferenciar psicologia do senso comum e ciência. Bons estudos! 1 Conceito de psicologia Inicialmente, é importante definir que a psicologia consiste no estudo, de forma científica, do comportamento e dos processos mentais (pensamentos, emoções, percepções etc.) (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008) (FELDMAN, 2015). Assim, os psicólogos procuram utilizar de métodos científicos para encontrar respostas válidas para as questões humanas, descrevendo e explicando o comportamento e buscando tentar melhorar a vida das pessoas. Figura 1 – Psicologia: estudo das ações e estados mentais humanos. Fonte: Lightspring/Shutterstock.com EXEMPLO Para melhorar a relação funcionário e empresa, pode-se utilizar os princípios da psi- cologia, observando o comportamento do funcionário, procurando entender seus sentimentos, percepções etc. Assim, intervenções podem ser realizadas, caso se- jam necessárias. Morris e Maisto (2013) afirmam que as principais questões relacionadas à psicologia são: • Pessoa-situação - até que ponto os nossos comportamentos são resultados de pro- cessos internos ou de relações externas? • Natureza-criação - somos quem somos por conta de questões inatas ou por conta das nossas experiências? • Estabilidade-mudança - as características que adquirimos na infância são mais perma- nentes? As pessoas podem mudar de maneira previsível ou imprevisível? • Diversidade-universalidade - uma pessoa é igual a várias outras, é igual somente a algumas poucas pessoas, ou ninguém é igual a ninguém? • Mente-corpo - de qual forma a mente e o corpo estão relacionados? FIQUE ATENTO! Os questionamentos sobre o ser humano estão presentes desde o princípio da his- tória da Psicologia, sendo o norteador das grandes teorias da disciplina. Ao longo do desenvolvimento da Psicologia, conforme veremos a seguir, foram surgindo diver- sas áreas de atuação da disciplina, sendo as principais: a psicologia clínica e de aconselhamento psicológico; psicologia social; e a psicologia industrial e organizacional (MORRIS; MAISTO, 2013). SAIBA MAIS! Para conhecer as áreas de atuação da Psicologia, regulamentadas pelo conselho profissional, acesse: <http://www.crp09.org.br/portal/orientacao-e-fiscalizacao/ orientacao-por-temas/areas-de-atuacao-do-a-psicologo-a>. Vimos que a Psicologia é uma disciplina que pode ser aplicada nas mais diferentes áreas, com a intenção de entender sobre o ser humano, ajudando-o na vida profissional e pessoal. A seguir, conheceremos a evolução histórica do conceito de Psicologia. 2 Evolução histórica do conceito de Psicologia A história da Psicologia iniciou há mais de dois mil anos, para tratar de uma das principais questões do ser humano: entender a si mesmo e aos outros. No entanto, o seu conceito foi sendo modificado ao longo de toda sua história. Acompanhe! FIQUE ATENTO! A Psicologia como estudo sistemático surgiu na Grécia antiga, porém o questio- namento do ser humano sobre suas ações, existe desde que a espécie aparece enquanto seres pensantes. A origem da palavra psicologia (psyché = alma + logos = razão) vem da Grécia antiga, e sig- nifica etimologicamente “estudo da alma”. Nesse período, os filósofos gregos tentaram fazer uma sistematização da disciplina, de modo que haviam duas teorias relacionadas à Psicologia: a platô- nica, que considerava a imortalidade da alma, ou seja, que acreditava que a alma estava separada do corpo; e a aristotélica, que considerava a alma como mortal e pertencente ao corpo (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). Figura 2 – Os filósofos da antiguidade sistematizaram a Psicologia. Fonte: Renata Sedmakova/Shutterstock.com No Império Romano e Idade Média, a Psicologia atuava com grande influência religiosa. Nesse período, os principais pensadores da Psicologia eram: Santo Agostinho, que considerava que a alma e o corpo eram divididos, porém a alma era uma manifestação divina; e São Tomás de Aquino, que julgava que o homem, na sua essência, buscava a perfeição na sua existência, mas que esta só poderia ser alcançada em deus (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). No Renascimento, houve um grande avanço na produção de conhecimento científico de forma geral. Nesse período, um dos principais autores foi René Descartes, que postulou a separa- ção entre mente e corpo, de forma que o corpo era apenas uma máquina, uma substância material, e a mente a substância pensante (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). A partir do século XIX, então, observou-se o início do desenvolvimento científico da Psicologia, surgindo, assim, descobertas relevantes, como: a doença mental relacionar-se direta ou indireta- mente com a ação de fatores em células cerebrais; o reflexo, que consiste em um estímulo que chega à medula espinhal, antes de chegar ao cérebro, fazendo com que a atividade motora aconteça mesmo sem relação com a consciência; e a Lei de Fechner-Weber que estabelece a relação entre um estímulo e uma sensação, o que permite mensuração (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). Figura 3 – Quando encostamos a mão em algo quente e retiramos prontamente sem analisar a situação, é reflexo. Fonte: Jurga Jot/Shutterstock.com A seguir, aprofundaremos nosso conhecimento em relação à Psicologia como ciência. 3 Identificação da Psicologia como ciência Como vimos, no final do século XIX, com as pesquisas de Wundt, Weber e Fechner, na Ale- manha, a Psicologia passou a ser entendida como ciência. Nesse momento, a Psicologia se dis- tanciou da Filosofia, com um esforço dos estudiosos da área para definir o objeto de estudo da disciplina, ou seja, delimitar o campo de estudo, formular a metodologia de pesquisa e as teorias que obedecessem aos critérios científicos, como: a busca da neutralidade do conhecimento cien- tífico, de dados que possam ser comprovados e de conhecimento cumulativo (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA 2008). FIQUE ATENTO! Se você perguntar para as pessoas quem foi o pai da Psicologia, a maioria dirá que foi Sigmund Freud (1886-1939). Porém, apesar deste autor ser um importante teórico da disciplina e criador da Psicanálise, quem é considerado o criador da Psi- cologia como ciência é Wilhem Wundt (1832-1920). Nos Estados Unidos, no final do século XIX, surgiram as primeiras abordagens psicológicas que serviram de base para as teorias atuais da Psicologia. De acordo com Bock, Furtado e Teixeira (2008), as primeiras abordagens psicológicas foram: • Funcionalismo: considera que a consciência (capacidade da mente de perceber as rela- ções com o ambiente) seja central na busca da compreensão do ser humano, pois é a partir do uso dela que ele se adaptará ao meio; • Estruturalismo: preocupa-se, também, em compreender a consciência, porém, a partir de aspectos estruturais, ou seja, existem estruturas que explicam o comportamento, quando explica-se, por exemplo, a inteligência a partir de uma parte do cérebro; • Associacionismo: tem como principal característica entender que a aprendizagem se dá a partir da associação de ideias. SAIBA MAIS! Para conhecer a história da Psicologia no Brasil, leia o artigo “História da Psicologia no Brasil: uma narrativa por meio de seu ensino”, de Ana Maria Jacó Vilela (UERJ). Acesse: <http://www.scielo.br/pdf/pcp/v32nspe/v32speca04.pdf>. Essas teorias, influenciaram na criação das principais abordagens da Psicologia do século XX. Segundo Bock, Furtado e Teixeira (2008), as abordagens são: • Behaviorismo: entende que o objeto de estudo da psicologia é o comportamento, e que esse é explicado pela sua relação com o ambiente; • Gestalt: entendeo homem em sua totalidade, sendo contrária à fragmentação; • Psicanálise: compreende o inconsciente como objeto de estudo da psicologia, pois ele é um determinante nas ações humanas. Figura 4 – A Psicanálise é uma das abordagens da Psicologia. Fonte: Pressmaster/Shutterstock.com EXEMPLO O psicólogo, ao se embasar no behaviorismo para compreender a dificuldade de relacionamento entre um colaborador e o seu gerente, observará o comportamento de ambos, bem como suas relações com o ambiente de trabalho, ou seja, com o contexto que estão inseridos. Veja que compreender o desenvolvimento da psicologia é essencial para entendermos como ela atua hoje. Fechamento A Psicologia é uma disciplina científica que busca compreender os seres humanos, com a atuação em várias áreas e com diversas abordagens. Nesta aula, você teve a oportunidade de: • Entender a psicologia como o estudo do comportamento e processos mentais humanos; • Conhecer a evolução da psicologia ao longo da história; • Compreender a inserção da disciplina na ciência, partindo de três teorias prin- cipais (associacionismo, funcionalismo e estruturalismo), que culminaram nas abordagens atuais. Referências BOCK, Ana Maria Barbosa; FURTADO, Odair. TEIXEIRA; Maria de Lourdes Trassi. Psicologias: uma introdução ao estudo da Psicologia. São Paulo: Editora Saraiva, 2008. CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA 9ª REGIÃO. Áreas de atuação do(a) psicólogo (a). Goiânia, 2015. Disponível em: <http://www.crp09.org.br/portal/orientacao-e-fiscalizacao/orientacao-por- temas/areas-de-atuacao-do-a-psicologo-a>. Acesso em: 20 out. 2016. FELDMAN, Robert S. Introdução à Psicologia. 10. ed. Porto Alegre: AMGH, 2015. MORRIS, Charles G; MAISTO, Albert A. Understanding Psychology. Londres: Pearson, 2013. VILELA, Ana Maria Jacó. História da Psicologia no Brasil: uma narrativa por meio de seu ensino. Psicologia ciência e profissão, v. 32, n. esp, p. 28-43, 2012. Disponível em: <http://www.scielo.br/ pdf/pcp/v32nspe/v32speca04.pdf>. Acesso em: 20 out. 2016. O surgimento da psicologia como ciência Ana Alice Reis Pieretti Introdução Nesta aula, trabalharemos o conceito de psicologia, compreendendo quais são as principais questões desta disciplina. Para isso, veremos a sua evolução desde a época da grécia antiga até os séculos XIX e XX, quando passou a ser estudada como ciência. Objetivos de aprendizagem Ao final desta aula, você será capaz de: • Identificar a evolução da psicologia como ciência; • Diferenciar psicologia do senso comum e ciência. Bons estudos! 1 Conceito de psicologia Inicialmente, é importante definir que a psicologia consiste no estudo, de forma científica, do comportamento e dos processos mentais (pensamentos, emoções, percepções etc.) (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008) (FELDMAN, 2015). Assim, os psicólogos procuram utilizar de métodos científicos para encontrar respostas válidas para as questões humanas, descrevendo e explicando o comportamento e buscando tentar melhorar a vida das pessoas. Figura 1 – Psicologia: estudo das ações e estados mentais humanos. Fonte: Lightspring/Shutterstock.com EXEMPLO Para melhorar a relação funcionário e empresa, pode-se utilizar os princípios da psi- cologia, observando o comportamento do funcionário, procurando entender seus sentimentos, percepções etc. Assim, intervenções podem ser realizadas, caso se- jam necessárias. Morris e Maisto (2013) afirmam que as principais questões relacionadas à psicologia são: • Pessoa-situação - até que ponto os nossos comportamentos são resultados de pro- cessos internos ou de relações externas? • Natureza-criação - somos quem somos por conta de questões inatas ou por conta das nossas experiências? • Estabilidade-mudança - as características que adquirimos na infância são mais perma- nentes? As pessoas podem mudar de maneira previsível ou imprevisível? • Diversidade-universalidade - uma pessoa é igual a várias outras, é igual somente a algumas poucas pessoas, ou ninguém é igual a ninguém? • Mente-corpo - de qual forma a mente e o corpo estão relacionados? FIQUE ATENTO! Os questionamentos sobre o ser humano estão presentes desde o princípio da his- tória da Psicologia, sendo o norteador das grandes teorias da disciplina. Ao longo do desenvolvimento da Psicologia, conforme veremos a seguir, foram surgindo diver- sas áreas de atuação da disciplina, sendo as principais: a psicologia clínica e de aconselhamento psicológico; psicologia social; e a psicologia industrial e organizacional (MORRIS; MAISTO, 2013). SAIBA MAIS! Para conhecer as áreas de atuação da Psicologia, regulamentadas pelo conselho profissional, acesse: <http://www.crp09.org.br/portal/orientacao-e-fiscalizacao/ orientacao-por-temas/areas-de-atuacao-do-a-psicologo-a>. Vimos que a Psicologia é uma disciplina que pode ser aplicada nas mais diferentes áreas, com a intenção de entender sobre o ser humano, ajudando-o na vida profissional e pessoal. A seguir, conheceremos a evolução histórica do conceito de Psicologia. 2 Evolução histórica do conceito de Psicologia A história da Psicologia iniciou há mais de dois mil anos, para tratar de uma das principais questões do ser humano: entender a si mesmo e aos outros. No entanto, o seu conceito foi sendo modificado ao longo de toda sua história. Acompanhe! FIQUE ATENTO! A Psicologia como estudo sistemático surgiu na Grécia antiga, porém o questio- namento do ser humano sobre suas ações, existe desde que a espécie aparece enquanto seres pensantes. A origem da palavra psicologia (psyché = alma + logos = razão) vem da Grécia antiga, e sig- nifica etimologicamente “estudo da alma”. Nesse período, os filósofos gregos tentaram fazer uma sistematização da disciplina, de modo que haviam duas teorias relacionadas à Psicologia: a platô- nica, que considerava a imortalidade da alma, ou seja, que acreditava que a alma estava separada do corpo; e a aristotélica, que considerava a alma como mortal e pertencente ao corpo (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). Figura 2 – Os filósofos da antiguidade sistematizaram a Psicologia. Fonte: Renata Sedmakova/Shutterstock.com No Império Romano e Idade Média, a Psicologia atuava com grande influência religiosa. Nesse período, os principais pensadores da Psicologia eram: Santo Agostinho, que considerava que a alma e o corpo eram divididos, porém a alma era uma manifestação divina; e São Tomás de Aquino, que julgava que o homem, na sua essência, buscava a perfeição na sua existência, mas que esta só poderia ser alcançada em deus (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). No Renascimento, houve um grande avanço na produção de conhecimento científico de forma geral. Nesse período, um dos principais autores foi René Descartes, que postulou a separa- ção entre mente e corpo, de forma que o corpo era apenas uma máquina, uma substância material, e a mente a substância pensante (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). A partir do século XIX, então, observou-se o início do desenvolvimento científico da Psicologia, surgindo, assim, descobertas relevantes, como: a doença mental relacionar-se direta ou indireta- mente com a ação de fatores em células cerebrais; o reflexo, que consiste em um estímulo que chega à medula espinhal, antes de chegar ao cérebro, fazendo com que a atividade motora aconteça mesmo sem relação com a consciência; e a Lei de Fechner-Weber que estabelece a relação entre um estímulo e uma sensação, o que permite mensuração (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). Figura 3 – Quando encostamos a mão em algo quente e retiramos prontamente sem analisar a situação, é reflexo. Fonte: Jurga Jot/Shutterstock.com A seguir, aprofundaremos nosso conhecimento em relação à Psicologia como ciência. 3 Identificação da Psicologia como ciência Como vimos, no final do século XIX, com as pesquisas de Wundt, Weber e Fechner, na Ale- manha, a Psicologia passou a ser entendida como ciência. Nesse momento, a Psicologia se dis- tanciou da Filosofia, com um esforço dos estudiosos da área paradefinir o objeto de estudo da disciplina, ou seja, delimitar o campo de estudo, formular a metodologia de pesquisa e as teorias que obedecessem aos critérios científicos, como: a busca da neutralidade do conhecimento cien- tífico, de dados que possam ser comprovados e de conhecimento cumulativo (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA 2008). FIQUE ATENTO! Se você perguntar para as pessoas quem foi o pai da Psicologia, a maioria dirá que foi Sigmund Freud (1886-1939). Porém, apesar deste autor ser um importante teórico da disciplina e criador da Psicanálise, quem é considerado o criador da Psi- cologia como ciência é Wilhem Wundt (1832-1920). Nos Estados Unidos, no final do século XIX, surgiram as primeiras abordagens psicológicas que serviram de base para as teorias atuais da Psicologia. De acordo com Bock, Furtado e Teixeira (2008), as primeiras abordagens psicológicas foram: • Funcionalismo: considera que a consciência (capacidade da mente de perceber as rela- ções com o ambiente) seja central na busca da compreensão do ser humano, pois é a partir do uso dela que ele se adaptará ao meio; • Estruturalismo: preocupa-se, também, em compreender a consciência, porém, a partir de aspectos estruturais, ou seja, existem estruturas que explicam o comportamento, quando explica-se, por exemplo, a inteligência a partir de uma parte do cérebro; • Associacionismo: tem como principal característica entender que a aprendizagem se dá a partir da associação de ideias. SAIBA MAIS! Para conhecer a história da Psicologia no Brasil, leia o artigo “História da Psicologia no Brasil: uma narrativa por meio de seu ensino”, de Ana Maria Jacó Vilela (UERJ). Acesse: <http://www.scielo.br/pdf/pcp/v32nspe/v32speca04.pdf>. Essas teorias, influenciaram na criação das principais abordagens da Psicologia do século XX. Segundo Bock, Furtado e Teixeira (2008), as abordagens são: • Behaviorismo: entende que o objeto de estudo da psicologia é o comportamento, e que esse é explicado pela sua relação com o ambiente; • Gestalt: entende o homem em sua totalidade, sendo contrária à fragmentação; • Psicanálise: compreende o inconsciente como objeto de estudo da psicologia, pois ele é um determinante nas ações humanas. Figura 4 – A Psicanálise é uma das abordagens da Psicologia. Fonte: Pressmaster/Shutterstock.com EXEMPLO O psicólogo, ao se embasar no behaviorismo para compreender a dificuldade de relacionamento entre um colaborador e o seu gerente, observará o comportamento de ambos, bem como suas relações com o ambiente de trabalho, ou seja, com o contexto que estão inseridos. Veja que compreender o desenvolvimento da psicologia é essencial para entendermos como ela atua hoje. Fechamento A Psicologia é uma disciplina científica que busca compreender os seres humanos, com a atuação em várias áreas e com diversas abordagens. Nesta aula, você teve a oportunidade de: • Entender a psicologia como o estudo do comportamento e processos mentais humanos; • Conhecer a evolução da psicologia ao longo da história; • Compreender a inserção da disciplina na ciência, partindo de três teorias prin- cipais (associacionismo, funcionalismo e estruturalismo), que culminaram nas abordagens atuais. Referências BOCK, Ana Maria Barbosa; FURTADO, Odair. TEIXEIRA; Maria de Lourdes Trassi. Psicologias: uma introdução ao estudo da Psicologia. São Paulo: Editora Saraiva, 2008. CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA 9ª REGIÃO. Áreas de atuação do(a) psicólogo (a). Goiânia, 2015. Disponível em: <http://www.crp09.org.br/portal/orientacao-e-fiscalizacao/orientacao-por- temas/areas-de-atuacao-do-a-psicologo-a>. Acesso em: 20 out. 2016. FELDMAN, Robert S. Introdução à Psicologia. 10. ed. Porto Alegre: AMGH, 2015. MORRIS, Charles G; MAISTO, Albert A. Understanding Psychology. Londres: Pearson, 2013. VILELA, Ana Maria Jacó. História da Psicologia no Brasil: uma narrativa por meio de seu ensino. Psicologia ciência e profissão, v. 32, n. esp, p. 28-43, 2012. Disponível em: <http://www.scielo.br/ pdf/pcp/v32nspe/v32speca04.pdf>. Acesso em: 20 out. 2016. O surgimento da psicologia nas organizações Ana Alice Reis Pieretti Introdução Dentro do contexto organizacional, existe um campo de estudo direcionado especificamente para a compreensão da influência das relações humanas dentro das instituições e das reações que acontecem neste contexto. Nesta aula, compreenderemos como a Psicologia surgiu nas orga- nizações, contribuindo para este campo. Para isso, conheceremos as vantagens e desafios enfren- tados pelas empresas, nos quais o comportamento organizacional possibilita soluções. Objetivos de aprendizagem Ao final desta aula, você será capaz de: • identificar a importância da Psicologia para a organização; • compreender a função da Psicologia para as relações de trabalho. 1 A Psicologia nos estudos do comportamento no ambiente organizacional O comportamento organizacional (CO) é o campo de estudos que busca investigar qual o impacto que o ambiente organizacional exerce sobre o comportamento dos indivíduos inseridos neste contexto. Trata-se da especialidade com um corpo comum de conhecimento, que são os determinantes do comportamento humano: os indivíduos; os grupos; e a estrutura da instituição. Um dos objetivos dos estudos do comportamento no ambiente organizacional é fazer com que o trabalho ocorra de maneira eficiente (ROBBINS; JUDGE; SOBRAL, 2011). EXEMPLO O CO pode investigar, por exemplo, qual o mecanismo da motivação dos funcioná- rios, para, assim, tentar aumentá-la. Nesse contexto, surgiu a Psicologia no ambiente organizacional, trazendo contribuições com as teorias da aprendizagem e personalidade, atuando, especialmente, com a área da Psicologia Organizacional e Industrial (ROBBINS; JUDGE; SOBRAL, 2011). Figura 1 – A Psicologia atua no estudo do CO Fonte: Rawpixel.com/Shutterstock.com FIQUE ATENTO! A Psicologia Organizacional e Industrial busca entender quais são as questões que influenciam no desempenho e na satisfação do indivíduo, na intenção de elaborar métodos que maximizem estas questões. A Psicologia Organizacional e Industrial incialmente preocupou-se em estudar as questões relacionadas ao desempenho dos trabalhadores, como fadiga, falta de entusiasmo etc. Porém, suas análises foram expandidas, incluindo contribuições sobre processos psicológicos básicos, como a aprendizagem, percepção e outros, com o objetivo de melhorar as questões relacionadas aos trei- namentos, liderança, motivação e satisfação com o trabalho (ROBBINS; JUDGE; SOBRAL, 2011). SAIBA MAIS! Para complementar seu conhecimento, leia o livro “Fundamentos de comportamento organizacional”. Nele, por meio de um estudo de caso, os autores fazem uma análise do ambiente de trabalho, antecipando seus desafios. A seguir, veremos qual a associação das relações humanas no ambiente organizacional. Acompanhe! 2 As relações humanas no ambiente organizacional A relação humana, um dos campos de estudo da Psicologia, é considerada uma ciência do comportamento humano, que lida com as relações interpessoais (entre no mínimo duas pessoas) e com as relações intrapessoais (o sujeito com ele mesmo). Assim, as relações humanas estão presentes em vários contextos, a todo momento, inclusive no ambiente de trabalho, podendo trazer benefícios para o crescimento da empresa, como a troca de ideias para a produção de um novo projeto, ou para a resolução de questões da organização. Mas, também, podem trazer problemas, por falhas de comunicação e interpretação mútua, como discussões improdutivas por diferenças pessoais. Figura 2 – As relações humanas Fonte: bikeriderlondon/Shutterstock.com Assim, no ambiente organizacional, um administrador eficaz, além de saber lidar com as questões técnicas da gestão da organização, precisa compreender sobre as relações humanas. Para isso, ele conta com a atuação de ciências sociais, como a Psicologia, Sociologia, Moral, entre outras (MINICUCCI, 2013). FIQUE ATENTO! Atualmente,a capacidade de avaliação das situações por meio do estudo das rela- ções humanas é uma habilidade importante para os gestores, uma vez que é neces- sário lidar com diferentes pessoas de maneira efetiva. A área da Psicologia que contribui para o estudo das relações humanas é a Psicologia Social, que utiliza tanto os conceitos da Psicologia quanto da Sociologia, focando na influência que um indivíduo pode exercer sobre o outro, ou seja, seu objeto de estudo são as interações sociais, a inter- dependência (relação de dependência mútua) entre os indivíduos e o encontro social (BOCK, 2001). A Psicologia Social surgiu no ambiente organizacional para contribuir, entre outras questões, nas mudanças organizacionais, ou seja, atuar no sentindo de analisar as melhores práticas para aplicar essas mudanças (ROBBINS; JUDGE; SOBRAL, 2011). SAIBA MAIS! Para aprofundar seu conhecimento sobre a Psicologia Social, leia “Psicologia Social ou Psicologias Sociais: uma análise dos repertórios interpretativos que dão sentido a este campo profissional”. Acesse: <http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/images/Anais_ XVENABRAPSO/86.%20psicologia%20social%20ou%20psicologias%20sociais.pdf>. No tópico seguinte, iremos abordar sobre quais são os desafios e oportunidades no campo do comportamento organizacional. 3 Desafios e oportunidades no campo do comportamento organizacional O estudo do comportamento organizacional é bastante importante para que os gestores identifiquem quais são os desafios e oportunidades que este tema traz. De acordo com Robbins, Judge e Sobral (2011), as principais questões levantadas com o CO são as expostas a seguir. • Administração das pessoas em época de crise Em momentos de crise, os gestores precisam lidar com muitas situações de estresse, como as demissões, sendo necessária a compreensão de questões relacionadas às emoções, motivação etc. • Globalização Com o aumento da internacionalização das empresas, as relações humanas passaram a acontecer entre indivíduos de diferentes culturas. Assim, o gestor precisa a lidar com a situação e equilibrar os objetivos da empresa com os países nos quais opera. Figura 3 – A globalização possibilita que os gestores lidem com diferentes culturas Fonte: frank_peters/Shutterstock.com • Administração da diversidade O gestor precisa lidar com as diferentes características individuais existentes dentro da instituição. Esta questão pode caracterizar um obstáculo, uma vez que, por conta des- tas diferenças podem surgir conflitos. Em contrapartida, a situação é vantajosa, pois permite que a empresa tenha acesso a diversas habilidades e ideias. • Melhoria do atendimento ao cliente O comportamento organizacional pode auxiliar os gestores a garantirem a qualidade de serviço prestado pelos funcionários, criando uma cultura organizacional que preze esta questão. Figura 4 – Qualidade do atendimento ao cliente Fonte: Antonio Guillem/Shutterstock.com • Estimulação da inovação e mudança Sendo a mudança um dos fatores fundamentais para o desenvolvimento da empresa, e os funcionários essenciais para estimular ou bloquear estas modificações, é essencial que os administradores utilizem técnicas de CO para estimular a criatividade e diminuir a resistência à mudança. EXEMPLO Por meio da análise do CO, ao enfatizar os aspectos positivos do funcionário, os gestores criam um ambiente de trabalho favorável. FIQUE ATENTO! O campo do comportamento organizacional pode contribuir para diversos desafios encontrados nas organizações, fornecendo ferramentas teóricas e técnicas, como a escala de percepção de comportamentos éticos organizacionais. Como vimos, o CO possibilita a compreensão de muitos desafios e oportunidades do ambiente organizacional. Fechamento Concluímos a aula sobre o surgimento da Psicologia nas organizações. Aqui, você pôde com- preender a importância da Psicologia para o estudo do comportamento organizacional. Nesta aula, você teve oportunidade de: • entender o que é o estudo do comportamento organizacional; • compreender que a Psicologia surgiu no ambiente organizacional para contribuir com este estudo; • conhecer que um dos objetos da Psicologia Social é compreender sobre as interações humanas; • avaliar alguns dos obstáculos e oportunidades que envolvem o estudo do CO. Referências BERGAMINI, Cecilia Whitaker. Psicologia aplicada à administração de empresas: psicologia do comportamento organizacional. 3. ed. São Paulo: Editora Atlas, 1992. BOCK, Ana Maria Barbosa; FURTADO, Odair. TEIXEIRA; Maria de Lourdes Tassi. Psicologias: uma introdução ao estudo da Psicologia. São Paulo: Editora Saraiva, 2001. CORDEIRO, Mariana Prioli; LOPES, Felipe Tavares Paes. Psicologia social ou psicologias sociais: uma análise dos repertórios interpretativos que dão sentido a este campo profissional. XV Enc Nac da ABRAPSO – Associação Brasileira de Psicologia Social. Maceió, 2009. Disponível em: <http:// www.abrapso.org.br/siteprincipal/images/Anais_XVENABRAPSO/86.%20psicologia 20social%20 ou%20psicologias%20sociais.pdf>. Acesso em: 25 out. 2016. MINICUCCI, Agostinho. Relações humanas: psicologia das relações interpessoais. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2013. OSBORN, Richard N; HUNT, James G; SCHERMERHORN JR, John R. Fundamentos de comporta- mento organizacional. Porto Alegre: Bookman Editora, 2009. RAIMUNDO, Aletheia et al. Relações humanas no trabalho. IX Enc Latino Americano de Iniciação Científica e V Enc Latino Americano de Pós-Graduação. São José dos Campos, Universidade do Vale do Paraíba, 2005. Disponível em: <http://www.inicepg.univap.br/cd/INIC_2005/inic/IC6%20 anais/IC6-95.pdf>. Acesso em: 25 out. 2016. ROBBINS, Stephen Paul; JUDGE, Timothy A.; SOBRAL, Felipe. Comportamento organizacional: teo- ria e prática no contexto brasileiro. 14. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2011. Diversidade nas organizações Ana Alice Reis Pieretti Introdução Atualmente, a diversidade, que é a pluralidade, multiplicidade de características físicas, pes- soais, visões de mundo etc., é uma questão relevante em vários âmbitos da nossa vida, inclusive no contexto organizacional. Nesta aula, entenderemos como a diversidade é entendida dentro do ambiente organizacio- nal. Além disso, conheceremos formas de aumentar a diversidade, implementando estratégias e programas para a gestão desta questão. Objetivos de aprendizagem Ao final desta aula, você será capaz de: • identificar as principais formas de diversidade no ambiente de trabalho; • compreender como as organizações podem administrar com eficácia a diversidade. 1 Características demográficas da força de trabalho No contexto organizacional, a diversidade da força de trabalho consiste nas características pessoais que diferenciam uma pessoa das outras. Ela pode ser dividida em dois níveis: superficial, que são os aspectos facilmente identificáveis, como idade, sexo, etnia etc.; e profundo, que são as diferenças que não podem ser inicialmente observadas, como crenças e valores (ROBBINS, JUDGE & SOBRAL, 2010). Nesse sentido, os gestores precisam compreender que não é possível tratar todos os funcio- nários como indivíduos iguais, sendo necessário aprender a conviver com as diferenças da melhor forma possível, para garantir a produtividade (ROBBINS, JUDGE & SOBRAL, 2010). Figura 1 – A diversidade é essencial para as organizações Fonte: Daxiao Productions/ Shutterstock.com Assim, o grande desafio dos gestores, atualmente, é lidar com mudanças das características demográficas da força de trabalho (demografia é o estudo da dinâmica populacional humana), como envelhecimento da população, maior número de mulheres no ambiente de trabalho etc. Segundo Robbins, Judge e Sobral (2010), as características demográficas e as principais questões relacionadas a elas são as elencadas a seguir. • Idade A questão da relação entre a produtividade e a idade, é uma preocupação bastante comum entre os gestores, uma vez que se observa um aumento da faixa etáriada força de trabalho, visto que a expectativa de vida da população é maior. Apesar desta preocupa- ção, as pesquisas dos autores indicam que: as pessoas mais velhas apresentam menor rotatividade no emprego; os trabalhadores mais velhos apresentam menor número de faltas consideradas evitáveis; e não foi encontrada relação entre a idade e a produtivi- dade, e em relação à satisfação no trabalho (ROBBINS, JUDGE & SOBRAL, 2010). • Sexo Apesar de existirem diferenças da forma de trabalho e das preferências pessoais entre homens e mulheres, os autores indicam que não há diferença em termos de desem- penho. Além disso, as mulheres apresentam mais ausências no trabalho e também maior rotatividade no emprego, por serem socialmente mais responsabilizadas por suas famílias (ROBBINS, JUDGE & SOBRAL, 2010). EXEMPLO As mulheres, por exemplo, preferem horários de trabalho mais flexíveis. Entre os mo- tivos, está o fato de, em muitos casos, elas serem responsáveis pela rotina dos filhos. FIQUE ATENTO! O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) traça um estudo dos movi- mentos demográficos das empresas. Os resultados destas pesquisas contribuem para projetos governamentais e no desenvolvimento da sociedade civil (IBGE, 2013). • Etnia De acordo com o IBGE (2010), o Brasil apresenta cinco classes de etnia: branco, negro, índio, amarelo (asiático) e pardo. Porém, o maior número de estudos é relacionado às diferenças étnicas entre brancos e negros. Nesse sentido, observa-se disparidades em relação a inserção dos negros no mercado de trabalho, quando comparado aos bran- cos. Além disso, há uma discrepância em relação aos salários recebidos pelos negros (que são normalmente menores) (ROBBINS, JUDGE & SOBRAL, 2010). • Portadores de deficiências Segundo a lei n. 8213/1991, as empresas precisam reservar parte das vagas de trabalho para pessoas portadoras de deficiência. Este fato, permitiu a empregabilidade destas pes- soas. Porém, observa-se que muitos ainda encontram-se fora do mercado de trabalho. FIQUE ATENTO! Características como a religião e a orientação sexual também são alvos de discus- sões importantes dentro das instituições, uma vez que podem causar conflitos. Configura-se bastante importante que o gestor compreenda as características da diversidade para, assim, implementar formas de lidar com esta questão, conforme veremos no próximo tópico. 2 Implementando estratégias de gestão da diversidade Quando falamos em gestão da diversidade, estamos nos referindo às estratégias que permi- tem os gestores tornarem-se mais sensíveis às necessidades e diferenças pessoais dos colabo- radores da empresa, e, com isso, ter acesso a uma variedade de ideias e habilidades (ROBBINS, JUDGE & SOBRAL, 2010). SAIBA MAIS! Para aprofundar seu conhecimento no assunto, leia o artigo “Gerenciamento de diversidade nas organizações”. Acesse: <http://era.org.br/2012/05/gerenciamento- da-diversidade-nas-organizacoes/>. A primeira forma de implementar questões relacionadas à diversidade no trabalho é a partir do recrutamento de pessoas com características diferentes. Durante a seleção de novos funcio- nários, os representantes da empresa devem utilizar critérios objetivos e imparciais, considerando apenas as capacidades e habilidades dos funcionários. Os funcionários advindos desse tipo de seleção mais inclusiva, podem ter dificuldade em permanecer no emprego por não se identifica- rem com a política de atuação da empresa e com seus colegas. Para que isso não aconteça e esse funcionário se mantenha no cargo, a empresa deve realizar uma mudança em suas políticas de aceitação e inclusão da diversidade em todos os seus setores (ROBBINS, JUDGE & SOBRAL, 2010). Figura 2 – Recrutamento e seleção de pessoas Fonte: A1Stock/Shutterstock.com Além disso, o trabalho em grupo se caracteriza como uma estratégia eficaz para a gestão da diversidade, pois, nele, observa-se que é possível fazer com que pessoas com características dife- rentes consigam um desempenho superior de trabalho em comparação aos grupos mais homogê- neos, principalmente se os líderes conseguirem enfatizar um objetivo comum para o grupo (ROB- BINS, JUDGE & SOBRAL, 2010). Figura 3 – O trabalho em grupo é importante para a diversidade Fonte: Rawpixel.com/Shutterstock.com Além disso, existem alguns programas eficazes que promovem a diversidade no ambiente corporativo, conforme veremos a seguir. 2.1 Programas de diversidades eficazes Para o incentivo da diversidade dentro do contexto de trabalho, há programas eficazes. De acordo com Robbins, Judge e Sobral (2010), os programas eficazes de diversidade, no trabalho, devem realizar treinamentos com os gestores, informando o que a legislação atual oferece de opções para a questão das ofertas iguais de empregos. Além disso, eles devem aprender a res- peitar a todos, independentemente de suas características demográficas. Para isso, os programas devem ressaltar como a diversidade na força de trabalho pode ser vantajosa na atração de um mercado que também é diverso. Outra questão essencial para que o programa de diversidade consiga ser efetivo é a criação de práticas de desenvolvimento pessoal, focando nos talentos e habilidades dos trabalhadores. Assim, os funcionários podem ser conscientizados a valorizar as diferentes perspectivas. Além disso, os programas eficazes de gestão da diversidade apoiam ações afirmativas (que consistem num conjunto de medidas voltadas para grupos específicos), pois permitem que os fun- cionários de grupos minoritários (ou seja, grupos que sofreram ou sofrem discriminação) tenham oportunidade de mostrar suas habilidades. Figura 4 – Ações afirmativas Fonte: Phovoir/Shutterstock.com EXEMPLO As vagas reservadas para portadores de deficiência são exemplos de ações afirmativas. Porém, apenas implementar programas de incentivo a diversidade, sem realizar uma mudança efetiva na política de diversidade da empresa, não é, de fato, efetivo. Além de realizar esses treina- mentos, é necessário operar uma mudança concreta, ou seja, a diversidade deve ser observada em seu quadro de funcionários. FIQUE ATENTO! O fato de uma empresa adotar um programa que atenda estes componentes, não significa, necessariamente, que a empresa observa uma mudança em seu quadro de funcionários em direção a diversidade, ou seja, para ser eficaz é necessário uma modificação em toda a política da organização em relação a esta questão. SAIBA MAIS! Para conhecer exemplos de experiências brasileiras em gestão da diversidade, leia o ar- tigo “Gerenciando a diversidade cultural: experiências de empresas brasileiras”. Dispo- nível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034=75902000000300003-sscript- sci_arttextstlng=pt>. Fechamento Aqui, vimos que a diversidade deve ser considerada como uma questão fundamental para as organizações, de modo que sua gestão deve ser um dos pilares da organização. Nesta aula, você teve a oportunidade de: • entender a diversidade da força de trabalho; • conhecer as características demográficas da força de trabalho e suas principais ques- tões no campo organizacional; • reconhecer maneiras de implementação de estratégias para gestão da diversidade; • entender as características de um programa de gestão da diversidade eficaz. Referências BRASIL. Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/L8213cons.htm>. Acesso em: 14 nov. 2016. _______. IBGE. Censo 2010. Disponível em: <http://mapasinterativos.ibge.gov.br/atlas_ge/brasil- 1por1.html>. Acesso em: 14 nov. 2016. ERA. Ética e realidade atual. Gerenciamento de diversidade nas organizações. s.d. Disponível em: <http://era.org.br/2012/05/gerenciamento-da-diversidade-nas-organizacoes/>. Acesso em: 08 nov. 2016. FLEURY, Maria Tereza Leme. Gerenciando a diversidade cultural: experiências de empresas brasi- leiras. Rev adm empres, v. 40, n. 3, p. 18-25, São Paulo, Jul/Set, 2000. Disponível em: <http://www. scielo.br/scielo.php?pid=S0034-75902000000300003sscript=sci_arttextstlng=pt>.Acesso em: 08 nov. 2016. ROBBINS, Stephen, P.; JUDGE, Timothy, A.; SOBRAL, Filipe. Comportamento organizacional: teoria e prática no contexto brasileiro. 14. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2010. Variáveis determinantes do comportamento humano Ana Alice Reis Pieretti Introdução Nesta aula, compreenderemos quais são as variáveis determinantes do comportamento humano, fazendo a devida associação com o contexto organizacional. Objetivos de aprendizagem Ao final desta aula, você será capaz de: • identificar as variáveis dependentes e independentes do comportamento; • compreender a interferência das variáveis no comportamento humano. 1 O que são variáveis dependentes e independentes? Inicialmente, é importante entender que o comportamento é multideterminado, ou seja, exis- tem inúmeras variáveis que o controlam. Além disso, “diferentes variáveis podem controlar de for- mas diferentes, comportamentos diferentes de diferentes pessoas” (MOREIRA; HANNA, 2012, p. 17). Assim, para compreender um comportamento, é necessário conhecer as variáveis que o con- trola, assim como a história de vida do sujeito. Uma variável é qualquer evento, situação ou comportamento que possui pelo menos dois valores (COZBY, 2006). Estes valores são divididos em variável dependente e independente. A vari- ável dependente é o elemento que se pretende explicar ou fazer uma previsão, ou seja, é o objeto que será estudado e que sofre influência de outros elementos. O número de variáveis dependentes que podem ser estudadas no comportamento humano é quase infinita. No contexto organizacional, segundo Robbins, Judge e Sobral (2010), as variá- veis dependentes mais relevantes para o estudo do comportamento humano são: produtividade; absenteísmo; rotatividade; desvios de comportamento no ambiente de trabalho; cidadania organi- zacional (comportamentos que não estão presentes nas normas da empresa, mas que auxiliam no funcionamento da organização de maneira eficiente); e a satisfação no trabalho. Figura 1 – Desvios de comportamento Fonte: Monkey Business Images/Shutterstock.com As variáveis independentes são as supostas causas ou determinantes das variáveis depen- dentes, ou seja, é aquilo que está relacionado com o seu objeto de estudos. Por exemplo, se o pesquisador quer estudar o efeito de incentivos no comportamento criativo, os incentivos serão variáveis independentes e o comportamento criativo, as dependentes. FIQUE ATENTO! No estudo de uma variável dependente do comportamento humano, haverá a análi- se em relação a uma (ou mais) variável independente. Isto é, o pesquisador sempre observará a relação entre a variável dependente e a independente. A seguir, abordaremos os conceitos de conhecimento e habilidade humana, que consistem em variáveis dependentes. 2 Conhecimento e habilidades humanas No contexto organizacional, de acordo com Robbins, Judge e Sobral (2010), as variáveis inde- pendentes podem ser classificadas em três níveis: variáveis do indivíduo (questões individuais que influenciam no ambiente de trabalho); variáveis do grupo (a influência da dinâmica dos grupos no comportamento dos indivíduos); e variáveis do sistema organizacional (como a organização influencia em diversas questões do comportamento humano). As variáveis grupais consideram o quanto as pessoas de um grupo são influenciadas pelo que se espera delas. Além disso, é importante compreender que os grupos são importantes na organização para formação de equipes eficazes. Estão entre as principais variáveis do sistema organizacional o desenho da organização formal, a cultura, assim como as práticas e políticas internas (ROBBINS; JUDGE; SOBRAL, 2010). As variáveis do indivíduo que apresentam mais rele- vância para o contexto organizacional são “conhecimento” e “habilidades humanas”, uma vez que estas questões são essenciais para o desempenho dos funcionários dentro da organização. O conhecimento consiste no saber, naquilo que se aprende nos livros e na faculdade. Ele é considerado não definitivo, pois pode ser esquecido caso a pessoa não coloque-o em prática ou não prossiga estudando sobre o tema (ROBBINS; JUDGE; SOBRAL, 2010). EXEMPLO Para um administrador, por exemplo, é essencial que haja o conhecimento da área de atuação, do mercado e também para lidar com pessoas (BORBA et al, 2011). A habilidade consiste em colocar o conhecimento adquirido em prática (BORBA et al, 2011). As habilidades humanas são fundamentais em diversos contextos. Segundo De Oliveira (2010), no ambiente organizacional, as habilidades humanas mais importantes são: • atitudes perante as situações da empresa, como crises, conflitos, etc.; • saber relacionar-se adequadamente com as pessoas; • ser capaz de trabalhar com erros; • conseguir fazer uma autoavaliação adequada; • ser agente de mudanças; • apresentar intuição; • ser capaz de trabalhar em equipe; • saber resolver conflitos. Assim, as variáveis “conhecimento”, que é adquirido, e a “habilidade humana”, que é a aplica- ção do conhecimento, são muito importantes para o contexto organizacional. No próximo tópico, continuaremos tratando de variáveis individuais: as necessidades e valores. 3 Necessidade e valores humanos As necessidades humanas são processos internos e subjetivos que surgem em algumas situações específicas e que levam a satisfação no ambiente externo e formam o ciclo da motiva- ção. Em outras palavras, elas surgem a partir de questões internas do sujeito, que, assim, busca a satisfação destas questões no ambiente que o cerca. As necessidades variam de acordo com a experiência, isto é, são diferentes para cada indivíduo (MISONO, 2006). Existem várias teorias que tratam sobre as necessidades humanas, estabelecendo quais seriam mais básicas. Uma das teorias mais conhecidas é a Teoria da Pirâmide das Necessidades de Maslow, que afirma que as necessidades humanas dividem-se em cinco níveis (MISONO, 2006). Acompanhe! • Básicas: alimentação, descanso e de reprodução da espécie. • Segurança: proteção física e mental e inexistência de ameaça à integridade. • Associação: conjunto de relações nos vários grupos que pertencemos. • Reconhecimento: busca de prestígio e valorização diante de outros. • Autorrealização: ações que fazem o sujeito se realizar de maneira pessoal, atingindo o conjunto de valores e crenças. FIQUE ATENTO! Existem diversas teorias que tratam sobre as necessidades humanas. Entre elas está a do psicólogo norte-americano David McClelland (1917 - 1998), que desenvol- veu uma teoria que explica a motivação dos indivíduos por meio da satisfação das suas necessidades. Os níveis das necessidades humanas podem ser ilustrados na forma de uma pirâmide, sendo a base representada pelas necessidades mais fundamentais, conforme fi gura a seguir. Figura 2 – Pirâmide de Maslow FISIOLOGIA SEGURANÇA PERTENCIMENTO EGOCENTRISMO AUTORREALIZAÇÃO Fonte: adaptada de MISONO, 2006. Os valores humanos consistem em preferências em relação a determinadas ações e resul- tados, podendo refl etir em noções como “certo” e “errado”. Meglino, Ravlin e Adkins (1990 apud SCHERMERHORN; HUNT; OSBORN, 2007) abordaram que os principais valores humanos são das seguintes categorias: • realização: conseguir que as coisas sejam realizadas, por meio de trabalho árduo; • ajuda e preocupação com os outros: interesse em outras pessoas e disposição para ajudá-las; • honestidade: preocupação em dizer a verdade e fazer o que considera o certo; • justiça: fazer aquilo que é justo para todas as pessoas envolvidas. Assim, as questões relacionadas aos principais valores humanos estão presentes em vários momentos da vida do ser humano e o infl uencia em diversas tomadas de decisões. Figura 3 – A preocupação com os outros Fonte: Michael D Brown/Shutterstock.com SAIBA MAIS! Para conhecer os valores organizacionais, leia o artigo “Valores organizacionais e comprometimento afetivo”. Disponível em: <http://editorarevistas.mackenzie.br/ index.php/RAM/article/view/79/79>.A seguir, entenderemos como as variáveis podem interferir no comportamento humano. 4 Interferência das variáveis no comportamento humano Entender o comportamento humano é objeto da Psicologia. Para isso, uma das teorias abor- dadas é a Análise do Comportamento, que entende que o comportamento pode ser compreendido e modificado a partir de sua relação com as variáveis ambientais. Figura 4 – Interferência das variáveis ambientais Fonte: Fred Ho/Shutterstock.com Existem diversas variáveis (como processos do organismo biológico e do ambiente) que podem intervir no mesmo comportamento, e um conjunto de variáveis podem exercer uma influ- ência diferente para cada pessoa (MOREIRA; HANNA. 2012). FIQUE ATENTO! A análise do comportamento é uma das teorias da Psicologia que analisa a inter- ferência das variáveis nas ações do ser humano, porém não é a única; há, também, outras teorias, como a Psicanálise, Sócio-histórica e Cognitiva. EXEMPLO Uma política de incentivo ao comportamento criativo, por exemplo, pode ser efetiva para modificar o comportamento de um grupo de funcionários, mas não para outros. Para a análise do comportamento, a variável ambiental pode influenciar o comportamento humano alterando a probabilidade de ocorrência, ou seja, mudando a chance de que um compor- tamento possa acontecer. Assim, uma modificação na variável pode aumentar a probabilidade de que ela aconteça novamente no futuro. Este fato é chamado de reforço. Por outro lado, a mudança na variável pode diminuir a chance do comportamento ocorrer novamente, sendo chamada, assim, de punição (MOREIRA; MEDEIROS, 2008). Logo, é possível observar que as variáveis ambientais podem influenciar o comportamento a ocorrer mais ou menos vezes. Por exemplo, para aumentar a pontualidade do funcionário, o gestor pode reforçar o compor- tamento por meio de registro de ponto e elogios. Além disso, ele também pode punir com adver- tências aqueles funcionários que não são pontuais. SAIBA MAIS! Para entender mais sobre como as variáveis influenciam o comportamento, leia o livro “Análise do Comportamento: pesquisa, teoria e aplicação”, de Josele Abreu- Rodrigues e Michela Rodrigues Ribeiro. Fechamento Neste aula, conhecemos as diferenças entre as variáveis dependentes e independentes, e como elas podem influenciar no comportamento humano. Nesta aula, você teve a oportunidade de: • conhecer a diferença entre as variáveis dependentes e independentes; • compreender o conceito de conhecimento; • aprender sobre a habilidade humana; • conhecer o conceito de necessidade; • entender o conceito de valores; • compreender como as variáveis podem influenciar no comportamento humano. Referências ABREU-RODRIGUES, Josele; RIBEIRO, Michela Rodrigues. Análise do comportamento: Pesquisa, teoria e aplicação. Artmed Editora, 2009. BORBA, Jacqueline Sansom et al. A definição dos conhecimentos, habilidades e atitudes na for- mação de administradores na percepção de gestores, acadêmicos e legal. VIII Convibra Adm – Cong virt bras Admin, 2011. Disponível em: <http://www.convibra.com.br/upload/paper/adm/ adm_2917.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2016. COZBY, Paul C. Métodos de pesquisa em ciências do comportamento. Atlas, 2006. MISONO, Naomi. Necessidades. In: LIMONGI-FRANÇA, Ana Cristina. Comportamento Organiza- cional: conceitos e práticas. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 23 – 28. MOREIRA, Márcio Borges; MEDEIROS, Carlos Augusto. Princípios básicos em análise do compor- tamento. Porto Alegre: Artmed, 2008. MOREIRA, Márcio Borges; HANNA, Elenice. Bases filosóficas e noções de ciência em análise de comportamento. In: HÜBNER, Maria Marta Costa; MOREIRA, Márcio Borges (orgs). Fundamentos de Psicologia: temas clássicos em psicologia sob a ótica da análise do comportamento. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. ROBBINS, Stephen, P.; JUDGE, Timothy, A.; SOBRAL, Filipe. Comportamento organizacional: teoria e prática no contexto brasileiro. 14ª ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2010. SCHERMERHORN, John; HUNT, James; OSBORN, Richard. Fundamentos do Comportamento Organizacional. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2007. TAMAYO, Alvaro. Valores organizacionais e comprometimento afetivo. Rev de Admin Macken- zie, v. 6, n. 3, 2008. Disponível em: <http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/RAM/article/ view/79>. Acesso em: 17 nov. 2016. Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094 M175c McShane, Steven L. Comportamento organizacional : conhecimento emergente, realidade global [recurso eletrônico] / Steven L. McShane, Mary Ann Von Glinow ; tradução : Francisco Araújo da Costa. – 6. ed. – Porto Alegre : AMGH, 2014. Editado também como livro impresso em 2014. ISBN 978-85-8055-404-5 1. Comportamento organizacional. I. Von Glinow, Mary Ann. II. Título. CDU 005.32 McShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd iiMcShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd ii 28/07/14 13:4328/07/14 13:43 4 Emoções, Atitudes e Estresse no Local de Trabalho O comissário de bordo da JetBlue, Steven Slater, já teve seus dias ruins, mas um certo voo de Pittsburgh para Nova Iorque foi demais para ele. Antes mesmo da deco- lagem, Slater sofreu um corte feio na testa ao escorregar sobre um bagageiro aéreo enquanto resolvia uma briga por espaço para malas entre dois passageiros. Uma das passageiras xingou Slater quando ele mandou sua mala gigante para ser despachada. Enquanto o avião taxiava após a aterrissagem em Nova Iorque, a mesma passagei- ra se ergueu e exigiu que Slater trouxesse sua mala des- pachada. Quando Slater mandou que ela se mantivesse sentada até o avião parar, a passageira o xingou. Foi nesse momento que Slater perdeu a paciência. Ele agarrou o microfone, disse algumas palavras nada polidas para a passageira malcomportada e anunciou para o resto da cabine: “Para aqueles que demonstraram dignidade e respeito pelos últimos 20 anos, obrigado por tudo. Acabou. Para mim chega”. Com isso, Slater agarrou uma cerveja do carrinho, ativou a rampa de emergência, escorregou até a pista e foi caminhando calmamente até seu carro. Nas semanas seguintes, as atitudes de Slater foram celebradas, repudiadas e dissecadas pela mídia e pelo público. Comissários de bordo e outros funcionários de companhias aéreas revelaram seus desafios diários com passageiros grosseiros, jornadas de trabalho longas, serviço apressado e condições de trabalho conturbadas. Outros comentaristas, incluindo dois passageiros que estavam no voo de Slater, sugeriram que o comissário de bordo não sabia lidar bem com pessoas. Um dos vi- zinhos de Slater, no entanto, afirma que ele é “um cara bastante escrupuloso, envolvente e compreensivo. Ele sabe se expressar e é muito simpático”. Um passageiro observou que Slater parecera bastante amigável em voos anteriores, mas estava agitado naquele dia. O próprio Slater afirmou que seu comportamento brusco se deveu aos eventos daquele voo e ao estresse causado por uma doença que a mãe enfrentava. Independente da causa desse comportamento, Slater foi acusado de crime de dano, violação de propriedade e conduta imprudente (acionar a rampa de emergên- cia poderia ter ferido a equipe no solo). Ele foi demitido do emprego e concordou em pagar 10.000 dólares para substituir a rampa. O caso também produziu uma nova expressão em inglês: “to hit the slide” (“pular na rampa”), que significa pedir demissão de uma maneira chocante ou espetacular. 1 O comportamento de Steven Slater e sua saída final do voo da JetBlue ilustra diversos temas trabalhados neste capítulo. Essa situação representa um exemplo dra- mático dos efeitos das emoções fortes e da insatisfação no trabalho sobre o comportamento de funcionários e o atendimento ao cliente. Ela mostra como espera-se que os funcionários controlem suas emoções e demonstrem tipos específicos de emoções, mesmo em situações di- fíceis. A cena também destaca os efeitos do estresse de trabalho,que Steven Slater estava sofrendo devido a de- safios profissionais e pessoais. O capítulo começa com a definição e a descrição das emoções e a explicação de por que os pesquisadores são tão ávidos para descobrir como as emoções influenciam as atitudes e o comportamento. A seguir, consideramos a dinâmica do trabalho emocio- nal e o popular tópico da inteligência emocional. Depois serão discutidas as atitudes específicas do trabalho de sa- tisfação profissional e compromisso com a organização, incluindo sua associação aos vários comportamentos do funcionário e o seu desempenho profissional. A seção fi- nal analisa o estresse relacionado ao trabalho, incluindo a experiência do estresse, três estressores proeminentes, diferenças individuais no estresse e maneiras de comba- ter o estresse excessivo. Slater: demissão dramáica. McSchane_04.indd 88McSchane_04.indd 88 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 4 Emoções, Atitudes e Estresse no Local de Trabalho 89 EMOÇÕES NO LOCAL DE TRABALHO As emoções influenciam quase tudo que fazemos no local de trabalho. Essa é uma afirmação forte e que você raramente encontraria uma década atrás em uma pesquisa de comporta- mento organizacional. A maioria das teorias de CO ainda supõe que os pensamentos e ações das pessoas são governados principalmente pelo raciocínio consciente (chamado cognição).2 Contudo, descobertas revolucionárias da neurociência revelam que nossas percepções, atitu- des, decisões e comportamentos são influenciados tanto pela cognição quanto pela emoção.3 Na verdade, as emoções podem ter maior influência, pois os processos emocionais ocorrem muitas vezes antes dos processos cognitivos e, por consequência, influenciam estes últimos. Ao ignorarem a emotividade, muitas teorias negligenciaram uma peça importante do quebra- -cabeça sobre o comportamento humano no local de trabalho. As emoções são episódios fisiológicos, comportamentais e psicológicos experimentados em relação a um objeto, pessoa ou evento, que criam um estado de prontidão.4 Esses “episó- dios” são eventos breves que retrocedem ou ocorrem em ondas, que duram de milissegundos a alguns minutos. As emoções são direcionadas a algo ou a alguém. Por exemplo, sentimos alegria, medo, raiva ou outras emoções em relação a tarefas, clientes ou a um programa de software que utilizamos. Isso difere dos estados de espírito, que são estados emocionais mais duradouros e que não são direcionados a nada em particular.5 Emoções são experiências. Elas representam mudanças em nosso estado fisiológico (como pressão sanguínea ou frequência cardíaca), estado psicológico (incluindo a capacidade de pensar com clareza) e comportamento (expressões faciais, por exemplo). A maioria dessas reações emocionais é sutil e ocorre sem termos consciência. É um aspecto importante, pois o tema das emoções muitas vezes sugere imagens de pessoas “se emo- cionando”. Na realidade, as emoções quase sempre são eventos breves e de baixa intensidade que influenciam nosso comportamento sem estarmos conscientes delas. Finalmente, as emoções nos colocam em um estado de prontidão. Quando ficamos preocupados, por exem- plo, nossa frequência cardíaca e nossa pressão sanguínea aumentam para deixar o nosso corpo mais bem preparado para optar entre lutar ou fugir. As emoções fortes também desencadeiam nossa consciência de uma ameaça ou de uma oportunidade no ambiente externo.6 Tipos de emoções As pessoas sentem muitas emoções e também diversas combinações delas, mas todas possuem, invariavelmente, duas características. Primeiro, as emoções geram uma avaliação global (chamado estado emocional central) de que algo é bom ou ruim, útil ou nocivo, a ser abordado ou evitado. Em outras palavras, todas as emoções comuni- cam se o objeto ou evento percebido é positivo ou negativo. Segundo, todas produzem algum nível de ativação; ou seja, geram algum ní- vel de energia ou força motivacional em nós. Algumas experiências OA1 Objetivos de aprendizagem Após ler este capítulo, você deve ser capaz de: OA1 Explicar como as emoções e a cognição (raciocínio lógico) influenciam as atitudes e o comportamento. OA2 Discutir a dinâmica do trabalho emocional e o pa- pel da inteligência emocional no local de trabalho. OA3 Resumir as consequências da insatisfação no tra- balho e também as estratégias para aumentar o compromisso com a organização (afetivo). OA4 Descrever a experiência do estresse e examinar três grandes estressores. OA5 Identificar cinco maneiras de gerenciar o estresse no local de trabalho. “Biossensores. A empresa inteira sabe imediatamente quando não estou contente.” Crédito: Copyright © Ted Goff. McSchane_04.indd 89McSchane_04.indd 89 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 90 PARTE II Comportamento Individual e Processos emocionais, como aquelas sentidas pelo comissário de bordo da JetBlue (ver cena de abertu- ra), são fortes o suficiente para motivar conscientemente os funcionários a agirem. A maioria das experiências emocionais são sutis, mas ainda dão energia o suficiente para nos tornar mais conscientes sobre nosso ambiente. Essas duas dimensões emocionais são o alicerce do modelo do circumplexo mostrado na Figura 4.1.7 Por exemplo, o medo é uma emoção negati- va que gera um alto nível de ativação, enquanto o relaxamento é uma emoção agradável com ativação bastante baixa. Emoções, atitudes e comportamento Para compreender como as nossas emoções influenciam nossos pensamentos e comporta- mento no local de trabalho, primeiro precisamos saber sobre as atitudes. Atitudes represen- tam o conjunto de crenças, sentimentos avaliados e intenções comportamentais em relação a uma pessoa, objeto ou evento (chamado objeto da atitude).8 Atitudes são julgamentos, en- quanto emoções são experiências. Em outras palavras, as atitudes envolvem raciocínio lógico consciente, enquanto as emoções funcionam como eventos, geralmente sem a nossa cons- ciência. Também vivenciamos a maior parte das emoções brevemente, enquanto a nossa atitude em relação a alguém ou algo é mais estável ao longo do tempo.9 Até pouco tempo, os especialistas acreditavam que as atitudes podiam ser compreendidas apenas pelos três com- ponentes cognitivos ilustrados no lado esquerdo da Figu- ra 4.2: crenças, sentimentos e intenções comportamentais. Hoje, as evidências sugerem que um processo emocional Excitado Assombrado Estimulado Quieto Tranquilo Parado Negativa Baixa Alta Positiva Emoções negativas de alta ativação Emoções positivas de alta ativação Emoções negativas de baixa ativação Avaliação A ti va çã o Emoções positivas de baixa ativação Infeliz Triste Depressivo Feliz Alegre Maravilhado Entediado Cansado Sonolento Relaxado Contente Calmo Angustiado Temeroso Nervoso Entusiasmado Extático Animado FIGURA 4.1 Modelo circumplexo das emoções. Fonte: Adaptado de J. Larson, E. Diener, and R.E. Lucas, “Emotion: Models, Measures, and Differences,” in Emotions in the Workplace, ed. R.G. Lord, R.J. Klimoski, and R. Kanfer (San Francisco: Jossey-Bass, 2002), pp. 64–113; J.A. Russell, “Core Affect and the Psychological Construction of Emotion,” Psychological Review 110, no. 1 (2003), pp. 145–72. emoções Episódios fisiológicos, compor- tamentais e psicológicos ex- perimentados em relação a um objeto, pessoa ou evento, que criam um estado de prontidão. atitudes Conjunto de crenças, senti- mentos avaliados e intenções comportamentais em relação a uma pessoa, objeto ou evento (chamado de objeto da atitude). McSchane_04.indd 90McSchane_04.indd 90 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 4 Emoções, Atitudes e Estresse no Local de Trabalho 91 paralelo também está em ação, exibido no lado direito da figura.10 Usando a atitude em rela- ção às fusões de empresas como exemplo, examinaremos esse modelo mais de perto, come- çando pela perspectiva cognitiva tradicional das atitudes. • Crenças. São percepções estabelecidas a respeito do objeto da atitude, ou seja,são o que você acredita ser verdade. Por exemplo, você poderia acreditar que as fusões diminuem a segurança no emprego para os funcionários das empresas fundidas, ou poderia acre- ditar que as fusões aumentam a competitividade da empresa nesta era de globalização. Essas crenças são fatos percebidos que você adquire a partir da experiência e de outras formas de aprendizagem. • Sentimentos. Os sentimentos representam suas avaliações positivas ou negativas cons- cientes sobre o objeto da atitude. Algumas pessoas acham que as fusões são boas; ou- tras, que são ruins. O fato de gostar ou não das fusões representa seus sentimentos avaliados. Segundo a perspectiva cognitiva tradicional das atitudes (lado esquerdo do modelo), os sentimentos são calculados a partir das suas crenças sobre as fusões. Se você acha que as fusões costumam ter consequências negativas, por exemplo, demis- sões e mudanças na política da organização, você terá sentimentos negativos em relação às fusões ou a respeito de uma determinada fusão planejada na sua empresa. • Intenções comportamentais. As intenções representam sua motivação planejada de se comportar de uma determinada maneira com relação ao objeto da atitude.11 Ao ouvir que a empresa será fundida com outra organização, você ficaria motivado a procurar um emprego em outro lugar ou possivelmente reclamar com a gestão a respeito da decisão relativa à fusão. Seus sentimentos em relação a ela influenciam suas intenções comportamentais, e as atitudes que você decide tomar dependem da sua experiência pregressa, personalidade e normas sociais de comportamento adequado. A Figura 4.2 ilustra que as intenções comportamentais predizem diretamente o compor- tamento. No entanto, o fato de as suas intenções se traduzirem ou não em comportamentos depende da situação e talvez de elementos do modelo MARS. Por exemplo, você pode querer pedir demissão após ouvir sobre a fusão, mas não fazê-lo devido à falta de oportunidades de emprego melhores (situação). As atitudes também têm maior probabilidade de influenciar o comportamento quando são fortes, ou seja, quando são ancoradas por emoções fortes. Comportamento Atitude Episódios emocionais Ambiente percebido Processo emocional Intenções de comportamento Sentimentos Crenças Processo cognitivo FIGURA 4.2 Modelo de emoções, atitudes e comportamento. McSchane_04.indd 91McSchane_04.indd 91 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 92 PARTE II Comportamento Individual e Processos Como as emoções influenciam as atitudes e o comportamento Conforme men- cionamos, as emoções desempenham um papel fundamental na formação e na mudança das atitudes do funcionário.12 O lado direito da Figura 4.2 ilustra esse processo, o qual (como o processo cognitivo) também começa com as percepções do mundo à nossa volta. Nosso cérebro sinaliza as informações sensoriais com marcadores emocionais com base em uma avaliação rápida e imprecisa do quanto as informações apoiam ou ameaçam nossos impul- sos inatos. Esses marcadores não são sentimentos calculados, mas sim respostas emocionais automáticas e não conscientes baseadas em quantidades ínfimas de informações sensoriais.13 Pense em sua atitude sobre as fusões. Você poderia sentir preocupação, nervosismo ou alívio ao saber que a sua empresa pretende se fundir com um concorrente. Os pontos nebulosos no lado direito da Figura 4.2 ilustram os inúmeros episódios emocionais que você vivencia ao ouvir o anúncio da fusão, pensando posteriormente sobre essa fusão, discutindo- -a com os colegas, e assim por diante. Essas emoções passam para o processo de raciocínio, no qual são analisadas logicamente junto com outras informações sobre o objeto da atitude.14 Desse modo, enquanto você avalia conscientemente se a fusão é boa ou ruim, suas emoções já estão enviado sinais normativos (bom/ruim) que a seguir afetam sua avaliação consciente. Na verdade, muitas vezes “ouvimos” deliberadamente as nossas emoções a fim de consciente- mente decidir se somos a favor ou contra algo.15 A influência do raciocínio cognitivo e das emoções sobre as atitudes é mais clara quando eles são opostos. Às vezes, as pessoas vivenciam esse cabo-de-guerra mental, sentindo que algo não está certo, embora não possam pensar em nenhuma razão lógica para estarem preo- cupadas. Essa experiência conflitante indica que a análise lógica que a pessoa faz da situação (lado esquerdo da Figura 4.2) não consegue identificar razões para apoiar a reação emocional automática (lado direito da Figura 4.2).16 Devíamos prestar atenção à resposta emocional ou à análise lógica? Não é uma pergunta fácil de responder, mas alguns estudos indicam que enquanto os executivos tendem a tomar decisões rápidas com base na intuição (resposta emocional), as melhores decisões tendem a ocorrer quando eles investem tempo avaliando logicamente as situações.17 Desse modo, devíamos prestar atenção aos lados cognitivo e emo- cional do modelo de atitude, e torcer para que concordem entre si na maior parte das vezes! Como gerar emoções positivas no trabalho Algumas empresas parecem estar bastan- te cientes do processo de atitude cognitiva-emocional, pois tentam incorporar experiências mais positivas ao local de trabalho.19 Por exemplo, os funcionários da Dixon Schwabl par- ticipam de torneios de bocha, jogos de softball, concursos de minigolfe, guerras de balões A LeasePlan USA tem um dos maiores índices de satisfação no trabalho de sua categoria na Amé- rica do Norte. Esse desempenho tem várias explicações, incluindo atividades extracurriculares pla- nejadas pelo comitê de “Diversão no Trabalho” da empresa, uma locadora de frotas de veículos com sede em Atlanta. A foto mostra o diretor de recursos humanos da LeasePlan distribuindo ingressos de beisebol do Atlanta Braves para os vencedores do Torneio de Ping- -Pong da Patty realizado no Dia de São Patrício.18 McSchane_04.indd 92McSchane_04.indd 92 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 4 Emoções, Atitudes e Estresse no Local de Trabalho 93 de água, concursos de escultura de abóboras no Halloween, e ainda contam com uma sala acolchoada para gritos primais para alívio da tensão e um escorregador em espiral para quem quer chegar mais rápido ao térreo. “Diversão não é só uma palavra por aqui, é um estilo de vida!”, explicou um dos 75 funcionários da empresa de marketing e relações públicas de Ro- chester, Nova Iorque.22 Da mesma forma, os funcionários da Razer, uma fabricante de peri- féricos de videogame de Singapura, andam de scooter e fazem competições de videogame em consoles de jogos on-line de última geração. “Às vezes, não acredito que já estou aqui há sete meses”, admite um funcionário da Razer. “Acho que o tempo não passa quando a gente está se divertindo tanto”.23 Alguns críticos afirmam que o foco principal da organização deve ser o de criar emoções positivas no trabalho em si e também em ocorrências cotidianas naturais, como a convivência com colegas simpáticos e clientes educados. Ainda assim, a maioria das pessoas tem traba- lhos que produzem emoções negativas, e as pesquisas indicam que o humor e a diversão no ambiente de trabalho, sejam eles naturais ou artificiais, podem compensar algumas dessas experiências negativas.24 Em geral, os líderes corporativos precisam ter em mente que as emo- ções determinam as atitudes dos funcionários e, como veremos posteriormente, as atitudes influenciam diversas formas de comportamentos relacionados ao trabalho. Um último comentário a respeito da Figura 4.2: repare na seta que vai dos episódios emo- cionais até o comportamento. Ela indica que as emoções influenciam diretamente (sem o raciocínio consciente) o comportamento de uma pessoa. Isso ocorre quando saltamos subi- tamente se alguém nos ataca. Isso também ocorre nas situações diárias, porque até mesmo as emoções de baixa intensidade modificam automaticamente as nossas expressões faciais. Essas ações não são cuidadosamente pensadas. Elas são respostas emocionaisautomáticas aprendidas ou fisicamente conectadas pela hereditariedade para determinadas situações.25 Dissonância cognitiva As emoções e atitudes levam geralmente ao comportamento, mas às vezes acontece o oposto por meio do processo de dissonância cognitiva.26 A dissonância cognitiva ocorre quando percebemos uma inconsistência entre nossas crenças, sentimentos e comportamentos. Essa inconsistência gera emoções (como a da hipocrisia) que nos motivam a criar mais consistência com a alteração de um ou mais desses elementos. Imagine que você vê a si mesmo como um defensor do ambientalismo. Você também trabalha em uma empresa petrolífera que parecia agir de forma ambientalmente correta até uma notícia recente acusá-la, assim como outras do setor, de prejudicar o meio ambiente. Uma tensão interna ocorre porque seu autoconceito “verde” (crenças) e sua opinião positiva sobre o ambientalismo (sentimentos) são inconsistentes com seu emprego em uma empresa com um péssimo histórico ambiental (comportamento). As pessoas sentem essa tensão interna porque querem se imaginar criaturas racionais, o que exige algum alinhamento entre seus pensamentos e suas ações.27 Trabalhar para uma empresa com má reputação ambiental parece inconsistente com suas crenças e atitu- des sobre o ambientalismo, então você é motivado a reduzir essa discrepância. DEBATE Divertir-se no trabalho é mesmo uma boa ideia? A “diversão no trabalho” é um modismo de negócios tão forte que empresas sem um “comitê da diversão” são consideradas carrascas insensíveis. Divertir-se no trabalho pode melhorar as atitudes dos funcionários em muitas situações, mas os eventos divertidos especiais são mesmo necessários ou benéficos? Alguns críticos dizem que não” Eles defendem que even- tos artificiais podem sair pela culatra.20 Os funcionários podem ficar ofendidos com a idiotice de algumas atividades. Outros podem se ressentir por serem forçados a participar. Como alertou um especialista recentemente: “Depois que a ideia de diversão é institucionalizada formalmente de cima para baixo, os funcionários podem acabar ressentidos. Eles se sentem tra- tados com condescendência, o que gera raiva e frustração”. O significado e o valor da diversão no trabalho também pode variar entre gerações: o que funciona para os Millennials pode irritar os Baby Boomers e vice-versa. Outra preocupação é que empresas que enfocam a diversão podem perder os re- sultados financeiros de vista. “No fim das contas, você preci- sa ganhar dinheiro para sobreviver”, afirma Mike Pitcher, CEO da LeasePlan USA (que possui um comitê de diversão). “Se o trabalho fosse pura diversão, ninguém chamaria de trabalho, chamaria apenas de diversão”.21 McSchane_04.indd 93McSchane_04.indd 93 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 94 PARTE II Comportamento Individual e Processos Como as pessoas reduzem a dissonância cognitiva? Uma opção é alterar o comporta- mento, mas isso é mais difícil e muitas vezes mais custoso do que alterar as crenças e os sentimentos. Você poderia, por exemplo, hesitar em largar seu emprego na empresa pe- trolífera. Alterar o comportamento é especialmente difícil quando os outros sabem sobre o comportamento, quando você o realiza voluntariamente e quando as consequências do comportamento não podem ser desfeitas. Você poderia pedir demissão, mas não pode esconder que trabalhou em uma empresa petrolífera ou afirmar que alguém o forçou a trabalhar lá. Quando é difícil desfazer ou alterar o comportamento, as pessoas optam por alterar suas crenças e sentimentos para reduzir a dissonância cognitiva. Como funcionário de uma em- presa petrolífera, você poderia se convencer de que os problemas com o histórico ambiental da empresa foram exagerados ou não levaram em conta as iniciativas ambientalistas mais re- centes da organização. As pesquisas sugerem que às vezes reduzimos a dissonância cognitiva com o reequilíbrio indireto do autoconceito. Assim, em vez de negar o histórico ambiental da empresa, você poderia reduzir a inconsistência com a ênfase em seus comportamentos am- bientalistas pessoais (ex.: usar transporte coletivo para trabalhar, transformar o lixo orgânico em adubo em casa). Em geral, essas acrobacias mentais mantêm algum nível de consistência entre seu comportamento (trabalhar para a empresa petrolífera) e suas crenças e atitudes em relação ao ambientalismo. Emoções e personalidade Nosso panorama da dinâmica das emoções no local de traba- lho não seria completo a menos que mencionássemos que as emoções também são parcial- mente determinadas pela personalidade, e não só pelas experiências no local de trabalho.28 Algumas pessoas sentem emoções positivas como um traço natural. As pessoas com mais emoções positivas costumam ter maior estabilidade emocional e são extrovertidas (ver Ca- pítulo 2). As que sentem mais emoções negativas tendem a ter maior neuroticismo (menor estabilidade emocional) e são introvertidas. Os traços emocionais positivos e negativos afe- tam a assiduidade, a rotatividade e as atitudes de trabalho de longo prazo dos indivíduos.29 Enquanto os traços de personalidade positivos e negativos têm algum efeito, outras pesquisas concluem que a situação real na qual as pessoas trabalham tem uma influência nitidamente mais forte sobre suas atitudes e comportamentos.30 Gerenciar as emoções no trabalho O Elbow Room Café está lotado e muito barulhento na manhã de sábado. Um cliente do restaurante no centro de Vancouver, Canadá, quase tem que gritar para ser servido de mais café. Um garçom que está perto dele zomba: “Quer mais café, vai buscar!” O cliente ri. Outro reclama alto que ele e seu grupo estão atrasados e precisam da comida. Desta vez, é Patrick Savoie, o gerente, que responde: “Se estavam com pressa, deviam ter ido no McDonald’s”. O cliente e seus amigos riem baixinho. Para quem não conhece o lugar, o Elbow Room Café é um caos emocional onde a equipe transforma a grosseria em uma forma de arte. Mas é tudo um show, um ambiente onde convidados podem comer bem e extravasar suas emoções sobre o mau atendimento. “É quase como ir no teatro”, diz Savoie, que passa boa parte do tempo inventando novas maneiras de insultar sua clientela.31 Seja com os piores insultos no Elbow Room Café de Vancouver ou com o tratamento excelente em um voo da Singapore Airlines, as pessoas esperam administrar suas emoções no local de trabalho. Elas devem ocultar sua frustração quando atendem a um cliente irri- tante, demonstrar compaixão com um paciente enfermo e esconder seu tédio em uma reu- nião demorada com a alta administração. Todas essas são formas de trabalho emocional, ou seja, esforço, planejamento e controle são necessários para expressar as emoções desejadas organizacionalmente durante as transações interpessoais.32 Espera-se que todos cumpram as regras de demonstração, as normas que nos le- vam a demonstrar emoções específicas e esconder outras. As demandas do trabalho emocional são mais elevadas nas funções que requerem uma diversidade de emoções (como raiva e alegria) e emoções mais intensas (como mostrar OA2 dissonância cognitiva Condição que ocorre quando percebemos uma incoerência entre nossas crenças, senti- mentos e comportamentos. trabalho emocional Esforço, planejamento e contro- le necessários para expressar as emoções desejadas orga- nizacionalmente durante as transações interpessoais. McSchane_04.indd 94McSchane_04.indd 94 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 4 Emoções, Atitudes e Estresse no Local de Trabalho 95 alegria em vez de um sorriso amarelo), bem como nas funções em que a interação com os clientes é frequente e prolongada. O trabalho emocional também aumenta quando os funcionários cumprem pre- cisamente, em vez de casualmente, as regras de demonstração.33 Isso ocorre especialmente nos setores de serviço nos quais os funcioná- rios com frequência interagem diretamente com os clientes. Por exemplo, os comissários de bordo da Malaysia Airlines rece-bem bastante treinamento para manterem a compostura e a simpatia em situações difíceis. “Eles são apresentáveis? Respeitáveis? Deixam vocês confortáveis? Parecem amigáveis?”, pergunta a Madame Cho- ong Lee Fong, gerente de treinamento e normas da tripulação da Malaysia Airlines. Os alunos da Malaysia Airlines Academy em Pe- taling Jaya aprendem as artes do sorriso, do contato visual e também a manter o queixo erguido em um nível que comunique confiança sem arrogância. A academia até tem espelhos gigantes em algumas paredes para que os alunos sempre possam ver como suas expres- sões faciais são vistas pelos outros. Os alunos recebem treinamento em fonologia e aulas sobre como falar em público. Além disso, eles aprendem cuidados pessoais e as formalidades do comportamento nos países atendidos pela companhia aérea.34 Regras de demonstração emocional entre as culturas Al- gum tempo atrás, a revista parisiense L’Express publicou uma série de artigos especiais sobre a vida na América do Norte. Entre outras coisas, a revista comentou que os garçons em res- taurantes canadenses e americanos oferecem um serviço “hipersimpático, sempre sorridente”, que parece desonesto para muitos europeus. “É demais para mim. É simpatia demais”, explica Laurence Pivot, que editou a seção especial da L’Express.35 Os comentários da revista fran- cesa destacam as diferenças culturais relativas a normas de demonstração emocional.36 Nos Estados Unidos e no Canadá, espera-se que os garçons sejam consistentes em demonstrar simpatia e outras emoções positivas para os clientes. Os clientes franceses também gostam de simpatia no serviço, mas esperam que os garçons sejam mais transparentes do que artificiais em seus deveres. Se o garçom está tendo um dia ruim, ele não precisa esconder completamen- te as emoções correspondentes. Um grande estudo indica a Etiópia, o Japão e a Áustria, entre outros, como culturas que não incentivam a expressão emocional. Em vez disso, espera-se que as pessoas sejam conti- das, com entonação relativamente monotônica e sem movimentos físicos e toques que de- monstrem emoções. Culturas como as do Kuwait, Egito, Espanha e Rússia, por outro lado, permitem ou encorajam uma demonstração mais vívida das emoções e esperam que as pes- soas ajam de acordo com suas emoções reais. Nessas culturas, espera-se que as pessoas reve- lem mais honestamente suas ideias e sentimentos, sejam dramáticas em seus tons de conver- sação e tenham comportamentos não verbais mais animados. Por exemplo, 81% dos etíopes e 74% dos japoneses concordam que não é profissional expressar emoções ostensivamente em suas culturas, enquanto 43% dos americanos, 33% dos italianos e apenas 19% dos espanhóis, cubanos e egípcios concordam com a mesma afirmação.37 Dissonância emocional O comediante George Burns disse que “o segredo de ser um bom ator é a honestidade. Se você consegue fingir honestidade, está feito na vida”. A piada de Burns destaca uma realidade importante no trabalho emocional, a saber, que é muito difícil ocultar nossas emoções reais no local de trabalho. O trabalho emocional pode ser desafiador, pois é complicado ocultar as emoções verdadeiras e demonstrar aquelas exigidas pelo traba- lho. Alegria, tristeza, preocupação e outras emoções ativam automaticamente um conjunto complexo de movimentos musculares (especialmente faciais) que são difíceis de prevenir e igualmente difíceis de falsificar. Fingir alegria ou preocupação exige o ajuste e a coordenação de diversos músculos faciais e posições corporais específicas. Enquanto isso, nossas emoções reais tendem a se revelar com gestos sutis, em geral sem que estejamos cientes de que estão acontecendo. Na maioria das vezes, os observadores percebem que estamos fingindo e que sentimos uma emoção diferente do que tentamos aparentar.38 Gerenciar emoções é uma parte importante do treinamento de comissários de bordo da Malaysia Airlines Academy em Peta- ling Jaya. Os alunos aprendem a sorrir, a fazer contato visual e a manter o queixo erguido em um nível que comunique confian- ça sem arrogância. A academia até tem espelhos gigantes em algumas paredes para que os alunos sempre possam ver como suas expressões faciais são vistas pelos outros. inteligência emocional (IE) Conjunto de dons intelectuais para perceber e expressar emoções, assimilar emoção no pensamento, compreender e raciocinar com emoção e regular a emoção em si mes- mo e nos outros. McSchane_04.indd 95McSchane_04.indd 95 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 96 PARTE II Comportamento Individual e Processos O trabalho emocional também cria conflito entre as emoções exigidas e as verdadeiras. Quanto maior a lacuna, mais os funcionários tendem a sofrer estresse, esgotamento no tra- balho e separação psicológica do eu.39 O problema pode ser minimizado por meio da atuação profunda em vez da superficial.40 Atuação superficial envolve fingir demonstrar as emoções necessárias, mas continuar com sentimentos internos diferentes. Já a atuação profunda envol- ve mudar as emoções verdadeiras para que sejam compatíveis com as emoções necessárias. Em outras palavras, você se treina para sentir de fato a emoção que deveria expressar. A atuação profunda também requer considerável inteligência emocional, a qual discutiremos em seguida. INTELIGÊNCIA EMOCIONAL A Buckman Laboratories International, Inc., presta muita atenção na inteligência emocional de seus candidatos e funcionários. A empresa química de Memphis, Tennessee, identificou as competências de inteligência emocional fundamentais dos bons membros de equipe, que são avaliadas nas entrevistas de emprego. “Ao definir comportamentos concretos que de- monstram inteligência emocional, podemos dar um foco mais preciso para nossas pergun- tas de entrevistas comportamentais”, explica o diretor de recursos humanos da Buckman. A empresa também avalia seus líderes em 19 competências de liderança, “muitas das quais se baseiam na capacidade do líder de perceber, influenciar e administrar as próprias emoções e as alheias”.41 A Buckman Labs é uma entre um número cada vez maior de empresas que reconhecem a inteligência emocional (IE) como um fator fundamental na eficácia da organização. A inteligência emocional inclui um conjunto de habilidades para perceber e expressar emoções, assimilar emoção no pensamento, compreender e raciocinar com emoção e regular a emoção em si mesmo e nos outros.42 Apesar de várias dimensões da IE terem sido propostas durante a última década, as pesquisas parecem estar convergindo para o modelo de quatro quadrantes apresentado na Figura 4.3.43 O modelo organiza a IE em quatro dimensões que representam o reconhecimento e a regulação das emoções em nós mesmos e nas outras pessoas. • Consciência das próprias emoções. A capacidade de perceber e compreender o signi- ficado de suas próprias emoções. Você é mais sensível às respostas emocionais sutis aos eventos e compreende suas mensagens. As pessoas com bom autoconhecimento são mais capazes de perceber as próprias respostas emocionais a situações específicas e utilizá-las como informação consciente.44 • Gestão das próprias emoções. A inteligência emocional inclui a capacidade de gerenciar as próprias emoções, algo que todos fazemos em algum nível. Nós mantemos nossos impulsos destrutivos sob controle, tentamos não ficar zangados ou frustrados quando os eventos não vão a nosso favor e tentamos sentir e expressar alegria e felicidade em relação aos outros quando essas demonstrações emocionais são apropriadas. Também tentamos recuperar o fôlego de nossa motivação no final do dia. Observe que o geren- ciamento de suas emoções vai além da capacidade de representar as emoções desejadas Consciência das próprias emoções Gestão das próprias emoções Consciência das emoções alheias Você Reconhecimento das emoções C ap ac id ad es Regulação das emoções Outros Gestão das emoções alheias FIGURA 4.3 Dimensões da inteligência emocional. Fontes: D. Goleman,“An EI-Based Theory of Performance,” in The Emotionally Intelligent Workplace, ed. C. Cherniss and D. Goleman (San Francisco: Jossey-Bass, 2001), p. 28; Peter J. Jordan and Sandra A. Lawrence, “Emotional Intelligence in Teams: Development and Initial Validation of the Short Version of the Workgroup Emotional Intelligence Profile (WEIP-S),” Journal of Management & Organization 15 (2009), pp. 452–69. McSchane_04.indd 96McSchane_04.indd 96 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 McShane_Iniciais.indd viMcShane_Iniciais.indd vi 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094 M175c McShane, Steven L. Comportamento organizacional : conhecimento emergente, realidade global [recurso eletrônico] / Steven L. McShane, Mary Ann Von Glinow ; tradução : Francisco Araújo da Costa. – 6. ed. – Porto Alegre : AMGH, 2014. Editado também como livro impresso em 2014. ISBN 978-85-8055-404-5 1. Comportamento organizacional. I. Von Glinow, Mary Ann. II. Título. CDU 005.32 McShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd iiMcShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd ii 28/07/14 13:4328/07/14 13:43 3 Percepção Própria e de Terceiros em Organizações Erica Parziale quer ser bombeira, mas a estudante de 15 anos hesita em contar isso para os outros. “Quando era mais nova, tinha medo de contar porque achava que era coisa de menino”, admite Parziale. Felizmente, ela e mais de dez outras meninas adolescentes puderam treinar as habilidades de bombeiros no Camp Fully Involved, um curso intensivo de seis dias em Nashua, New Hampshire. As participantes aprenderam a subir escadas de 30 me- tros, abrir buracos de ventilação em um teto com um ma- chado, combater incêndios em florestas, descer um pré- dio de rapel e conduzir missões de busca e resgate. As mulheres representam apenas 3,4% dos bombei- ros americanos. Camp Fully Involved pretende aumentar esse número, ajudando as jovens a ver a profissão como uma opção entusiasmante e compatível com seus auto- conceitos. O acampamento também ajuda a fortalecer seu autoconceito para qualquer carreira. “As meninas saem do acampamento andando de cabeça mais erguida”, diz a tenente Jess Wyman, do Departamento de Bombeiros de Nashua, que organizou o acampamento. “Elas estão mais dispostas a serem expansivas e a experimentarem coisas que nunca tentaram antes”. O Corpo de Bombeiros de Houston oferece um dos poucos acampamentos desse tipo para meninas adoles- centes. A expectativa é que essa experiência direta faça com que mais mulheres se interessem por carreiras como a de bombeiras, quebrando estereótipos e desenvolvendo uma atitude positiva entre as participantes. “Queríamos mostrar às meninas que elas conseguem”, diz uma das bombeiras de Houston sobre o acampamento. Mas apesar desses programas encorajarem mais mu- lheres a se definirem como bombeiras, o estereótipo ul- tramasculino da profissão continua a ser um problema. “Não temos muitos pais dizendo às filhas ‘querida, você pode ser bombeira quando crescer’”, admite Karen Du- Pont, chefe-assistente do corpo de bombeiros de Hous- ton. Os estereótipos também causam problemas nas es- tações. Por exemplo, a Equal Employment Opportunities Commission (Comissão de Oportunidades de Emprego Igualitárias) concluiu recentemente que duas bombeiras de Houston haviam sido assediadas e discriminadas por- que os colegas do sexo masculino rejeitavam as mulheres nessa função. 1 Os serviços de bombeiros dos Estados Unidos e de todo o mundo enfrentam dois desafios para atrair e reter mulheres na profissão: (1) o autoconceito que as mulhe- res têm de si mesmas versus sua imagem dos bombei- ros e (2) as percepções que outros têm sobre bombeiros e sobre mulheres nessa função. Ambos os tópicos rela- cionados serão discutidos neste capítulo. Primeiro, exa- minaremos como as pessoas veem a si mesmas, ou seja, seus autoconceitos, e como essa autopercepção afeta suas decisões e comportamentos. A seguir, enfocamos as percepções em contextos organizacionais começando por como as pessoas selecionam, organizam e interpretam informações, seguido de diversos processos perceptivos específicos, como estereotipagem, atribuição e profecias autorrealizáveis. Depois, identificamos possíveis manei- ras eficazes de melhorar as percepções, como o volun- tariado empresarial. A última seção do capítulo revisa os principais elementos da mentalidade global, um proces- so majoritariamente perceptivo que a globalização torna cada vez mais valioso. Treinamento incentiva adolescentes. McSchane_03.indd 61McSchane_03.indd 61 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 62 PARTE II Comportamento Individual e Processos AUTOCONCEITO: COMO PERCEBEMOS A NÓS MESMOS Por que as bombeiras são tão raras nos Estados Unidos e na maior parte do mundo? A cena de abertura deste capítulo sugere alguns motivos, um dos quais é que as mulheres não se veem como bombeiras e têm dúvidas sobre como exercer essa profissão. “Não acho que as mulheres pensem automaticamente que podem ser bombeiras”, admite Kate Bailey, que ini- ciou sua carreira na área alguns anos atrás, no sudeste da Inglaterra. Essa incompatibilidade de autoconceito é reforçada pelas percepções de gênero relacionadas a bombeiros, que são disseminadas entre amigos e familiares e na mídia. “Minha família disse que me imaginava como decoradora ou algo assim”, lembra Maria Dominguez, bombeira na cidade de Odessa, Texas. “Eles se perguntavam ‘por que ela está fazendo isso [tornando-se bombeira]? É traba- lho de homem’”.2 Começamos este capítulo analisando como as pessoas percebem a si mesmas, ou seja, seu autoconceito. O autoconceito se refere às crenças e avaliações do indivíduo quanto a si próprio. Trata-se do “quem sou eu?” e “como me sinto com relação a mim mesmo?” que as pessoas se perguntam e que guiam suas decisões e ações. Seja contemplando uma carreira como bombeiro ou analista financeiro, nós comparamos nossas imagens daquela profissão com nossas próprias imagens atuais (eu percebido) e desejadas (eu ideal). Também avaliamos nossas competências atuais e desejadas para determinar se nos adaptaríamos bem ao trabalho. Um número crescente de autores de CO estão descobrindo que o modo como as pessoas veem a si mesmas ajuda a explicar suas atitudes, decisões e comportamentos no local de trabalho. Complexidade, consistência e clareza do autoconceito Os autoconceitos variam em sua complexidade, consistência e clareza (ver Figura 3.1).3 Pri- meiro, os autoconceitos têm níveis variáveis de complexidade, ou seja, as pessoas percebem a si mesmas em diferentes funções ou assumindo identidades distintas e importantes. Todas têm algum nível de complexidade, pois se veem em mais de uma função (aluna, amiga, filha, fã de esportes, etc.). Além do número de “eus”, a complexidade também é determinada pela separação entre os “eus”.4 Um autoconceito tem baixa complexidade quando as identidades mais importantes do indivíduo estão altamente interconectadas; por exemplo, quando todas estão relacionadas com o trabalho (gerente, engenheiro, arrimo de família). OA1 Objetivos de aprendizagem Após ler este capítulo, você deve ser capaz de: OA1 Descrever os elementos do autoconceito e expli- car como afetam o comportamento e o bem-estar de um indivíduo. OA2 Delinear o processo perceptivo e discutir os efei- tos do raciocínio categórico e dos modelos men- tais no processo. OA3 Discutir como os efeitos da estereotipagem, atri- buição, profecia autorrealizável, halo, falso con- senso, primazia e recência influenciam o processo perceptivo. OA4 Discutir três formas de melhorar percepções, com aplicações específicas às situações organiza- cionais. OA5 Descrever as principais características da menta- lidadeglobal e justificar sua utilidade para funcio- nários e organizações. DIMENSÃO DO AUTOCONCEITO DESCRIÇÃO Complexidade Quantas funções ou identidades distintas e importantes uma pessoa leva em consideração para se definir? Consistência Quão compatíveis são identidades de autoconceito de uma pessoa entre si e com sua personalidade, valores e outros atributos? Clareza Em que medida uma pessoa define a si mesma de forma clara, con- fiante e consistente com o passar do tempo? FIGURA 3.1 Dimensões do autoconceito. McSchane_03.indd 62McSchane_03.indd 62 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 CAPÍTULO 3 Percepção Própria e de Terceiros em Organizações 63 Uma segunda característica do autoconceito é sua consistência interna. As pessoas têm alta consistência interna quando suas funções percebidas são semelhantes aos seus traços, valores e outros atributos. A baixa consistência ocorre quando algumas percepções exigem características pessoais que entram em conflito com outros aspectos do “eu”. Por exemplo, você teria um autoconceito de baixa consistência se imaginasse ser um engenheiro bastante preciso, mas também um esquiador desleixado e dado a correr riscos. A clareza, a terceira característica do autoconceito, representa em que medida você possui um autoconceito claro, definido com confiança e estável. A clareza ocorre quando estamos confiantes sobre quem somos, sabemos descrever nossas identidades importantes para terceiros e damos a mesma descrição de nós mesmos em diferentes momentos. A clareza do autoconceito aumenta com a idade e também com a consistência dos múltiplos “eus”.5 A complexidade, a consistência e a clareza do autoconceito são importantes porque in- fluenciam o bem-estar, o comportamento e o desempenho do indivíduo. As pessoas tendem a ter bem-estar psicológico quando têm múltiplos “eus” (complexidade) bem-estabelecidos (clareza) que são semelhantes e compatíveis com seus traços pessoais (consistência). A com- plexidade é importante porque protege nossas autoavaliações quando algumas funções são ameaçadas ou prejudicadas.6 Um autoconceito complexo é como um navio, com diversos compartimentos que podem ser selados e isolados uns dos outros. Se um compartimento é danificado, ele pode ser isolado e a maior parte do navio permanece intacta. Indivíduos com baixa complexidade, por outro lado, sofrem perdas graves quando vivenciam um fracasso, pois tais eventos afetam uma parcela considerável da imagem que têm de si mesmos. O bem-estar de uma pessoa também aumenta quando seus múltiplos “eus” estão em har- monia (consistência).7 Alguma diversidade de autoconceito ajuda as pessoas a se adaptarem, mas a variação em excesso causa tensão interna e conflito. Finalmente, o bem-estar tende a aumentar com a clareza do autoconceito. Quando não temos confiança em nós mesmos, somos influenciados mais facilmente por terceiros, sofremos mais estresse na tomada de deci- sões e nos sentimos mais ameaçados por forças sociais que minam nossa autoconfiança e nossa autoestima.8 A complexidade, consistência e a clareza do autoconceito têm efeitos a variados sobre o comportamento e o desempenho.9 Por um lado, as pessoas que se definem principalmente pelo trabalho (ou seja, têm baixa complexidade) tendem a ter níveis menores de absenteísmo e rotatividade. Elas também podem ter desempenho melhor porque investem pesado em desenvolvimento de habilidades, horas extras, mais concentração no trabalho e assim por diante. Por outro lado, a baixa complexidade costuma produzir mais estresse e depressão quando o aspecto principal do “eu” é ameaçado ou danificado, o que prejudica o desempenho individual. A clareza do autoconceito tende a melhorar o desempenho e é considerada fun- damental para funções de liderança.10 Entretanto, indivíduos com clareza muito alta podem sofrer de inflexibilidade de funções, ou seja, ter mais dificuldade em se adaptar a funções de trabalho emergentes. Complexidade, consistência e clareza contribuem para formar o autoconceito de um in- divíduo. Além deles, quatro processos moldam o autoconceito e influenciam as decisões e os comportamentos das pessoas. A seguir, analisaremos cada um desses quatro elementos: auto- valorização, autoconfirmação, autoavaliação e o “eu social” (identidade social). Autovalorização Os membros da maioria das culturas (provavelmente todas) são inerentemente motivados a se verem (e serem vistos pelos outros) como competentes, atraentes, sortudos, éticos e im- portantes.11 Essa autovalorização é observada de diversas maneiras. Os indivíduos tendem a se considerar acima da média, acreditam que têm probabilidade acima da média de ter sucesso e atribuem seus êxitos à motivação ou capacidade pessoal ao mesmo tempo que culpam a situação por seus erros. Por exemplo, um levantamento recente do governo americano informou que 69% dos funcionários públicos considerava seu desempenho acima da média em relação a outros colegas em sua unidade; apenas 1% considerava seu desempenho abaixo da média. Ainda mais extremo é que autoconceito Crenças e avaliações que uma pessoa tem de si mesma. autovalorização A motivação inerente de ter um autoconceito positivo (e fazer com que os outros tenham uma percepção favorável de si). McSchane_03.indd 63McSchane_03.indd 63 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 64 PARTE II Comportamento Individual e Processos 94% dos professores universitários que participaram de um estudo se consideravam acima da média em comparação com os outros membros de sua universidade; dois terços se colocavam no quartil superior!12 As pessoas não se veem como acima da média em todas as circunstân- cias, mas essa tendenciosidade é óbvia para condições que são comuns, não raras, e que são importantes para elas.13 A autovalorização tem consequências positivas e negativas nos contextos organizacio- nais.14 No lado positivo, os indivíduos têm melhor saúde física e mental e são mais bem- -ajustados quando enxergam seus autoconceitos sob uma óptica positiva. No lado negativo, a autovalorização pode resultar em decisões ruins. Por exemplo, alguns estudos relatam que a autovalorização induz os gestores a superestimarem a probabilidade de sucesso nas deci- sões relativas a investimentos. Outras pesquisas sugerem que a autovalorização é um fator que influencia motoristas novatos. Geralmente, porém, as empresas de sucesso se esforçam para ajudar os funcionários a sentirem que são membros valorizados e essenciais para a organização. Autoconfirmação Além de serem motivadas pela autovalorização, as pessoas tentam confirmar e manter seus autoconceitos existentes.16 Esse processo, chamado de autoconfirmação, estabiliza o auto- conceito de um indivíduo, o qual, por sua vez, oferece uma âncora importante que orienta seus pensamentos e ações. Os funcionários comunicam ativamente seus autoconceitos para que seus colegas possam oferecer feedback que reforce tais autoconceitos. Por exemplo, você poderia dizer para os colegas que é uma pessoa bastante organizada; mais tarde, eles aponta- riam situações nas quais você foi mesmo organizado. Ao contrário da autovalorização, a au- toconfirmação ocorre quando buscamos feedback que apoie nossas ideias sobre nós mesmos, mesmo quando ele não é positivo ou elogioso (ex.: “sou bom com números, não com pes- soas”). Alguns sociólogos continuam a debater se, e sob quais condições, as pessoas preferem informações que apoiem a autovalorização ou a autoconfirmação.17 Em outras palavras, nós preferimos elogios em vez de críticas corretas sobre nossos pontos fracos conhecidos? A autoconfirmação tem várias implicações no comportamento organizacional.18 Primei- ro, ela afeta o processo de percepção, porque os funcionários são mais propensos a se lembrar de informações que sejam coerentes com seus autoconceitos e a filtrar informações que pare- cem inconsistentes com eles. Segundo, quanto mais claro o autoconceito do indivíduo, menos ele aceitará feedback que contradiga tal autoconceito.Terceiro, os funcionários são motivados a interagir com outras pessoas que afirmam seus autoconceitos e isso afeta o quanto se dão bem com seu chefe e com outros membros de equipe. A maioria dos executivos diz que deseja ver seus funcionários se sentirem valorizados, mas poucos colocam esse desejo em prática tão bem quanto Donna Gadient. “A parte mais importante do meu trabalho é garantir que as pessoas se sintam valorizadas”, diz a vice- -presidente de recursos humanos globais da R.W. Armstrong, em- presa de engenharia com sede em Indianópolis, Indiana. Gadient reconhece que os 550 funcioná- rios da empresa querem ter um autoconceito positivo e que as or- ganizações podem aproveitar essa motivação ao reconhecerem sua contribuição. Os funcionários estão “sedentos por reconhecimento [por parte do empregador] de quem são e do que oferecem para o mun- do”, explica Gadient.15 McSchane_03.indd 64McSchane_03.indd 64 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 CAPÍTULO 3 Percepção Própria e de Terceiros em Organizações 65 Autoavaliação Quase todo mundo se esforça para ter um autoconceito positivo, mas algumas pessoas têm uma avaliação mais positiva de si mesmas. A autoavaliação é definida principalmente por três conceitos: autoestima, autoeficácia e locus de controle.19 Autoestima A autoestima, ou seja, a medida em que as pessoas se gostam, se respeitam e estão satisfeitas consigo mesmas, representa uma autoavaliação global. Alguns especialistas também acreditam que a autoestima representa a avaliação individual sobre o desempenho social. Em outras palavras, as pessoas têm mais autoestima quando acreditam que estão li- gadas e são aceitas pelos outros. As pessoas com autoestima elevada são menos influencia- das pelas outras, tendem a persistir apesar do fracasso e pensam de forma mais racional. A autoestima em relação a aspectos específicos da própria pessoa (ex.: ser um bom aluno, um bom motorista ou um bom pai) é preditora de pensamentos e comportamentos específicos, enquanto a autoestima global de uma pessoa prevê apenas grandes pacotes de pensamentos e comportamentos.20 Autoeficácia A autoeficácia se refere à crença de uma pessoa de que pode concluir uma tarefa com êxito.21 As pessoas com autoeficácia elevada têm uma atitude positiva e acreditam que possuem a energia (motivação), os recursos (fatores situacionais), a com- preensão do curso de ação correto (percepções da função) e as competências (capacidade) para realizar determinada tarefa. Em outras palavras, a autoeficácia é a percepção de um indivíduo em relação ao modelo MARS em uma determinada situação. Embora definida originalmente em termos de tarefas específicas, a autoeficácia também é um traço geral relacionado ao autoconceito.22 A autoeficácia geral é uma percepção da competência de uma pessoa para se sair bem em diversas situações. Quanto maior a autoeficácia geral da pessoa, maior é a sua autoavaliação global. Locus de controle O locus de controle é a crença geral de uma pessoa a respeito do nível de controle que ela exerce sobre os eventos de sua vida pessoal.23 Indivíduos com locus de controle interno acreditam que suas características pessoais (ou seja, motivação e compe- tências) são a principal influência de seus resultados. Aqueles com locus de controle mais externo acreditam que os eventos de suas vidas se devem principalmente ao destino, à sorte ou a condições do ambiente externo. O locus de controle é uma crença generalizada, então as pessoas com locus externo podem se sentir no controle nas situações familiares (como a execução de tarefas comuns). No entanto, seu locus de controle subjacente se evidenciaria nas situações novas em que o controle sobre os eventos é incerto. As pessoas com locus de controle mais interno têm uma autoavaliação mais positiva. Elas também tendem a se sair melhor na maioria das situações profissionais, são mais bem-suce- didas em suas carreiras, ganham mais dinheiro e são mais talhadas para posições de lideran- ça. Além disso, estão mais satisfeitas com seus empregos, lidam melhor com as situações de estresse e são mais motivadas pelos sistemas de recompensa calcados no desempenho.24 Uma observação preocupante é que o locus de controle dos jovens se tornou significativamente mais externo durante as quatro décadas desde o início dos anos sessenta.25 O “eu social” Todo mundo possui um autoconceito que inclui pelo menos algumas identidades (gestor, pai, golfista, etc.) e cada identidade é definida por um conjunto de atributos. Tais atributos desta- cam a singularidade (identidade pessoal) da pessoa e sua associação com outros (identidade social).26 A identidade pessoal (também conhecida como autoconceito interno) consiste em atributos que nos tornam es- peciais ou distintos das pes- soas de grupos sociais com os quais estamos conectados. Por exemplo, uma conquista incomum que o diferencia de outras pessoas normalmente se torna uma característica autoconfirmação A motivação inerente de um indivíduo de confirmar e manter seu autoconceito existente. autoeficácia Crença de uma pessoa de que ela tem capacidade, motivação, percepções corretas do seu papel e situação favorável para concluir uma tarefa com êxito. locus de controle Crença geral de uma pessoa a respeito da quantidade de controle que ela tem sobre os eventos da sua vida. McSchane_03.indd 65McSchane_03.indd 65 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 66 PARTE II Comportamento Individual e Processos da identidade pessoal. A identidade pessoal refere-se a algo sobre você enquanto indivíduo, sem referência a um grupo maior. Ao mesmo tempo, os seres humanos são animais sociais, com um impulso inerente de se as- sociarem com os outros seres humanos e serem reconhecidos como parte das comunidades so- ciais. Esse impulso de pertencer é refletido no autoconceito pelo fato de que todos os indivíduos se definem até certo ponto por sua associação com os demais.27 Essa identidade social (também chamada de autoconceito externo) é o tema central da teoria da identidade social, segundo a qual as pessoas se definem pelos grupos aos quais pertencem ou com os quais possuem uma ligação emocional. Por exemplo, uma pessoa poderia ter uma identidade social como americano, graduado da Indiana University e funcionário da Edward Jones (ver Figura 3.2). A identidade social é uma combinação complexa de muitas participações em grupos or- ganizadas em uma hierarquia de importância. Um fator determinante nesse sentido é com que facilidade somos identificados como um membro do grupo de referência, por exemplo, por meio de nosso gênero, idade e etnia. Um segundo fator é nosso status minoritário em um grupo. É difícil ignorar nosso gênero em uma turma na qual a maioria dos alunos é do gênero oposto, por exemplo. Nesse contexto, o gênero tende a se tornar um aspecto definidor mais forte da nossa identidade social do que é nos contextos sociais em que existem muitas pessoas do mesmo gênero. Em conjunto com as características demográficas, o status do grupo é um fator importan- te para determinar se o incluímos em nossa identidade social, pois essa associação faz com que tenhamos uma opinião mais elevada sobre nós mesmos (ou seja, autovalorização). Os médicos costumam definir a si mesmos por sua profissão devido ao seu status elevado. Al- gumas pessoas se descrevem pelo local de trabalho (“trabalho na Mayo Clinic”) porque seus empregadores possuem boas reputações. Outras jamais mencionam onde trabalham porque seu empregador é conhecido pelas más relações com os funcionários e tem uma má reputação na comunidade.28 Todos tentam equilibrar suas identidades pessoais e sociais, mas a prioridade dada à singula- ridade (identidades pessoais) versus às relações (identidades sociais) varia de um indivíduo para o outro. Aqueles cujos autoconceitos são fortemente definidos por suas identidades sociais, e não pelas pessoais, são mais motivadas para seguir as normas da equipe e mais facilmente influencia-das pela pressão dos pares. Quem dá mais ênfase à identidade pessoal, no entanto, se manifesta mais frequentemente contra a opinião da maioria e tem menos motivação para seguir os desejos da equipe. Além disso, expressar dissenso é um sinal de singularidade e pode ajudar os funcionários a formarem um autoconceito mais claro, especialmente quando tal dissen- so se baseia em diferenças de valores pessoais.29 Funcionário da Edward Jones Cidadão/residente dos EUA Grupos contrastantesIdentidade social Funcionários em outras empresas Cidadãos/residentes de outros países Formados em outras universidades Formado pela Indiana University Identidade social de um indivíduo FIGURA 3.2 Exemplo da teoria da identidade social. teoria da identidade social Teoria segundo a qual as pessoas se definem pelos grupos aos quais pertencem ou com os quais têm uma ligação emocional. percepção Processo de receber informa- ções sobre o mundo à nossa volta e de dar sentido a elas. McSchane_03.indd 66McSchane_03.indd 66 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 CAPÍTULO 3 Percepção Própria e de Terceiros em Organizações 67 Autoconceito e comportamento organizacional O autoconceito se tornou uma questão central em diversas disciplinas e está ganhando atenção no comportamento organizacional enquanto conjunto de teorias que explicam atitudes e comportamentos de funcionários. De acordo com estudos recentes, o autocon- ceito ajuda a explicar a liderança, a dinâmica de equipe, a motivação dos funcionários, a tomada de decisão, a influência, o comprometimento organizacional e outros temas trabalhados neste livro.30 Por consequência, o autoconceito e seus elementos específicos serão mencionados em diversos tópicos trabalhados neste livro, inclusive em partes pos- teriores deste capítulo. Muitos líderes organizacionais já estão cientes de que apoiar as visões dos funcionários sobre si mesmos pode elevar significativamente o desempenho e o bem-estar deles. Há mais de 50 anos, os gestores da Johnson & Johnson seguem o lema da empresa de produtos de saúde, que diz que “todos devem ser considerados como indivíduos” e que a empresa “deve respeitar sua dignidade e reconhecer seu mérito”. Os executivos do Intercontinental Hotels Group (IHG) lembram que a qualidade do serviço que os funcionários prestam para seus hóspedes depende da sensação de que são valorizados pela gerência. Como explicou recen- temente um executivo do IHG: “Tudo que realizamos no negócio deve fazer com que [os funcionários] se sintam como heróis e heroínas, e é preciso reconhecer a contribuição enor- me que eles dão. Todo mundo diz que faz isso, mas são poucas as empresas que agem desse modo de verdade. É assim que se estimula uma organização: fazendo com que as pessoas sintam que pertencem a algo de especial”.31 PERCEPÇÃO DO MUNDO AO NOSSO REDOR Passamos mais tempo do que qualquer outra pessoa considerando a nós mesmos (pensando sobre nosso autoconceito) . Ainda assim, na maior parte do tempo, nossa energia perceptiva é direcionada ao mundo exterior. Seja engenheiro estrutural, contador forense ou alto executi- vo, você precisa estar atento para interpretar o mundo ao seu redor, inclusive para questionar a qualidade das suas percepções. A percepção é o processo de receber informações sobre o mundo à nossa volta e de criar sentido para elas. Isso implica determinar quais informações devem ser notadas, categorizá-las e interpretá-las dentro do repertório do nosso conhecimen- to existente. Esse processo perceptivo normalmente segue os passos mostrados na Figura 3.3. A percepção começa quando recebemos estímulos ambientais por meio de nossos sentidos, sendo que a maioria desses estímulos é filtrada, e o que passa pelo filtro é organizado e inter- pretado. OA2 Organização e interpretação perceptivas Estímulos ambientais Sentimento Calor Visão Resposta de atenção seletiva e marcador emocional Atitudes e comportamento Olfato Paladar FIGURA 3.3 Modelo do processo de percepção. McSchane_03.indd 67McSchane_03.indd 67 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 68 PARTE II Comportamento Individual e Processos O processo de dar mais atenção a algumas informações recebidas pelos nossos sentidos e de ignorar outras se chama atenção seletiva. A atenção seletiva é influenciada pelas carac- terísticas da pessoa ou do objeto que está sendo percebido, particularmente o tamanho, a intensidade, o movimento, a repetição e a novidade. Por exemplo, uma pequena luz vermelha piscando no console do centro de enfermagem é notada imediatamente porque é brilhante (intensidade), piscante (movimento) e um evento raro (novidade), além de ter um significado simbólico de que os sinais vitais do paciente são insuficientes. Repare que a atenção seletiva também é influenciada pelo contexto em que o alvo é percebido. O processo é desencadeado por coisas ou pessoas que poderiam estar fora do contexto, por exemplo, ouvir alguém com um sotaque estrangeiro em um ambiente em que a maioria das pessoas tem sotaque local. As características de quem percebe também influenciam a atenção seletiva, em geral não de forma consciente.32 Quando a informação é recebida pelos sentidos, nosso cérebro ava- lia rápida e inconscientemente se é relevante ou não para nós e, depois, anexa marcadores emocionais (preocupação, felicidade, tédio) a ela. Os marcadores emocionais nos ajudam a armazenar a informação na memória; e também reproduzem as mesmas emoções quando pensamos posteriormente sobre a informação.33 Mas o processo de atenção seletiva está lon- ge de ser perfeito. O filósofo grego Platão reconheceu essa imperfeição muitos anos atrás quando escreveu que vemos a realidade apenas como sombras refletidas contra as paredes irregulares de uma caverna.34 Um preconceito perceptivo que afeta a atenção seletiva é o efeito de nossos pressupostos e da antecipação consciente de eventos futuros. Você é mais propenso a notar o e-mail de um colega de trabalho dentre o bombardeio diário de mensagens quando espera recebê-lo (particularmente quando é importante para você). Infelizmente, as expectativas e pressupostos também nos fazem relevar informações potencialmente importantes. Em um estudo, alunos foram solicitados a assistir a um vídeo de 30 segundos de duração no qual várias pessoas fa- ziam passes com duas bolas de basquete. Os alunos que foram instruídos a apenas assistir ao vídeo repararam com facilidade em alguém vestido com roupa de gorila entre os jogadores que apareceu durante nove segundos e parou para esmurrar o peito. Mas apenas metade dos alunos que foram solicitados a contar cuidadosamente o número de passes de bola notou o gorila.35 Outro problema de atenção seletiva, chamado de tendência à confirmação, é a tendên- cia a ignorar informações contrárias a decisões, crenças, valores e pressupostos pessoais, en- quanto as informações confirmatórias são percebidas mais facilmente.36 Essa tendenciosidade ocorre quando, por exemplo, formamos uma opinião ou teoria a respeito de alguma coisa, tal como uma tendência de consumo ou o potencial de um funcionário. O preconceito nos faz escolher as informações coerentes com a nossa teoria e ignorar as informações contrárias ou aparentemente irrelevantes para ela. Estudos mostra- ram que essa atenção seletiva imperfeita ocorre quando os deteti- ves de polícia e outros especialistas forenses formulam teorias ra- pidamente a respeito do que aconteceu em determinada situação.37 A pesquisa científica oferece muitos exemplos de tendência à confirmação nos quais cientistas ignoraram ou removeram evi- dências que contradiziam suas teorias favoritas. Um caso clássico ocorreu na década de setenta, quando pesquisadores de partículas nucleares do laboratório europeu CERN descobriram uma que- da estranha no padrão formado por uma partícula em colisão. Foi uma descoberta muito animadora, mas um número cada vez maior de pesquisadores nucleares em outros laboratórios come- çou a afirmar que não conseguia replicara queda em seus dados. O CERN defendeu vigorosamente a existência da queda até que as evidências do contrário se tornaram fortes demais. O que acon- teceu? Os pesquisadores do CERN analisaram detalhadamente os lotes de dados que não mostravam a queda. Eles ficaram con- vencidos de que a ausência se devia a dados ruins, então sempre encontravam alguma justificativa para descartar os lotes que não apresentavam queda nenhuma. Enquanto isso, os lotes confirma- “É um erro capital teorizar antes de termos todas as evidências” avisa o mítico Sherlock Holmes em Um Estudo em Vermelho. “Dis- torce o julgamento”. As agências policiais de todo o mundo tentam seguir o conselho de Holmes. Para reduzir o risco de condenar um homem inocente, os detetives evitam adotar quaisquer teorias no início da investigação. “Não podemos sucumbir a viseiras ou corremos o risco de ignorar sinais óbvios sobre o que aconteceu”, afirma o tenente Sean Crosier sobre o caso de uma pessoa desa- parecida no estado da Virgínia do Oeste.38 McSchane_03.indd 68McSchane_03.indd 68 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 CAPÍTULO 3 Percepção Própria e de Terceiros em Organizações 69 tórios eram aceitos sem nenhum questionamento. Na prática, o CERN descartava evidências contrárias à sua descoberta super-excitante, ainda que nada duradoura.39 Organização e interpretação perceptivas As pessoas dão sentido às informações mesmo antes de terem consciência delas. Em parte, a criação de sentido inclui o raciocínio categórico, o processo, em sua maior parte incons- ciente, de organizar as pessoas e objetos em categorias preconcebidas que são armazenadas em nossa memória de longo prazo.40 O raciocínio categórico se baseia em vários princípios automáticos de agrupamento perceptivo. Muitas vezes, as coisas são agrupadas com base em sua semelhança ou proximidade. Se você observar que um grupo de pessoas com aspecto similar inclui vários professores, por exemplo, provavelmente suporá que todos membros do grupo são professores. Outra forma de agrupamento perceptivo se baseia na necessidade de encerramento cognitivo, como preencher as informações que faltam a respeito do que acon- teceu em uma reunião à qual você não compareceu (ex.: quem estava lá e onde ocorreu). Uma terceira forma de agrupamento se dá quando achamos que vemos tendências em informações ambíguas. Vários estudos constataram que as pessoas têm uma tendência natural a enxergar padrões que, na realidade, são eventos aleatórios, por exemplo, as supostas sequências de vitória de estrelas do esporte ou em jogos de azar.41 O processo de dar sentido ao mundo à nossa volta também envolve a interpretação das informações que chegam a nós. Esse processo é tão rápido quanto a seleção e a organização, pois os marcadores emocionais mencionados anteriormente são ativados também para os estímulos recebidos, e geram julgamentos rápidos sobre se a informação é boa ou ruim para nós. Quanto tempo é preciso para fazer um desses julgamentos rápidos? Estudos recentes estimam que fazemos avaliações confiáveis sobre a confiabilidade de outros indivíduos com base em uma imagem facial em até 50 milissegundos (1/20 de segundo). Na verdade, in- dependente de vermos um rosto por um minuto ou por apenas 200 milissegundos, nossa opinião sobre confiar ou não naquela pessoa permanece mais ou menos a mesma.42 Coletiva- mente, esses estudos revelam que a atenção seletiva, a organização perceptiva e a interpreta- ção operam com muita rapidez e em grande parte sem estarmos cientes do processo. Modelos mentais Para alcançar nossos objetivos com algum grau de previsibilidade e sanidade, precisamos de roteiros dos ambientes nos quais vivemos. Esses roteiros, chamados modelos mentais, são representações internas do mundo externo.43 Eles consistem em ima- gens visuais ou relacionais em nossas mentes, por exemplo, a aparência de uma sala de aula ou o que acontece quando entregamos um trabalho atrasado. Os modelos mentais dependem parcialmente do processo de agrupamento perceptivo para dar sentido às coisas; eles preen- chem as lacunas, incluindo as conexões causais entre eventos. Por exemplo, você tem um mo- delo mental de uma aula ou seminário, que inclui pressupostos ou expectativas sobre como o professor e os alunos se posicionam na sala, como fazem e respondem a perguntas, e assim por diante. Podemos criar uma imagem mental de uma aula em andamento. Os modelos mentais desempenham um papel importante na criação do sentido, mas tam- bém dificultam que enxerguemos o mundo de maneiras diferentes. Por exemplo, os conta- dores tendem a ver os problemas da empresa a partir de uma perspectiva contábil, enquanto os profissionais de marketing veem os mesmos problemas da perspectiva do marketing. Os modelos mentais também bloqueiam o nosso reconhecimento das novas oportunidades. Como mudamos os modelos mentais? É um desafio difícil. Afinal de contas, desenvolvemos modelos mentais com base em vários anos de experiência e reforço. A melhor maneira de minimizar os problemas de percepção é questionar constantemente nossos modelos men- tais. Precisamos nos perguntar sobre nossos pressupostos. Trabalhar com pessoas que têm atenção seletiva Processo por meio do qual damos mais atenção a algumas informações recebidas pelos nossos sentidos e ignoramos outras. tendência à confirmação Processo de filtrar informações contrárias aos nossos valores e pressupostos e aceitar mais rapidamente informações que os confirmam. raciocínio categórico Organizar pessoas e objetos em categorias preconcebidas que são armazenadas em nossa memória de longo prazo. modelos mentais Imagens visuais ou relacionais na nossa mente que represen- tam o mundo externo. McSchane_03.indd 69McSchane_03.indd 69 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 70 PARTE II Comportamento Individual e Processos experiências diversas é outra maneira de romper os modelos mentais existentes. Colegas de diferentes culturas e áreas de especialização tendem a ter modelos mentais diferentes, então trabalhar com eles torna nossos próprios pressupostos mais óbvios. PROCESSOS E PROBLEMAS PERCEPTIVOS ESPECÍFICOS Subprocessos específicos e erros associados a eles são partes fundamentais do processo perceptivo geral e recebem bastante atenção dos cientistas sociais. Nas próximas páginas, examinaremos diversos desses processos perceptivos e tendências, além de suas consequên- cias para o comportamento organizacional. Começaremos pelo mais conhecido de todos: a estereotipagem. Estereótipos em organizações Um motivo para poucas mulheres se tornarem bombeiras é que elas, assim como suas fa- mílias e amigos, costumam imaginar os bombeiros como austeros, capacitados para correr riscos, fisicamente fortes e masculinos. Apesar da imagem conter um certo grão de verdade (combater incêndios envolve força física e riscos acima da média), diversas características importantes da profissão raramente são mencionadas, como a capacidade de oferecer ajuda, trabalhar em equipe e enfocar a segurança. Em outras palavras, as pessoas têm um estereótipo dos bombeiros que é incorreto e indesejável para a maioria das mulheres. Estereotipagem é o processo perceptivo pelo qual designamos características a um grupo identificável e então transferimos automaticamente tais características a todos que acreditamos pertencer a tal grupo.44 As características designadas tendem a ser difíceis de observar, como traços de personalidade e habilidades, mas também podem incluir uma série de caracterís- ticas físicas e uma série de outras qualidades. Por exemplo, a maioria das pessoas acredita no estereótipo de que professores universitários são inteligentes e distraídos. Os estereótipos são formados em parte pela experiência pessoal, mas são criados principalmente por imagens midiáticas (ex.: personagens de filmes) e outros protótipos culturais. Eles são crenças de toda a sociedade e, às vezes, de diversas culturas diferentes, não crenças que diferem entreindivíduos. A estereotipagem envolve designar os atributos percebidos de um grupo para indivíduos que se sabe ou acredita pertencerem a tal grupo. Por consequências, supõe-se que todos os indivíduos identificados com um grupo estereotipado possuem tais características. Se desco- brimos que alguém é um professor universitário, por exemplo, presumimos implicitamente que ele também é inteligente e distraído. Historicamente, os pesquisadores também definem estereótipos como exageros ou falsidades. A definição muitas vezes é correta, mas diversos estereótipos não são de todo incorretos. Por que as pessoas usam estereótipos Uma razão pela qual as pessoas adotam a este- reotipagem é que, como uma forma de raciocínio categórico, é um processo natural e prin- cipalmente consciente de “poupar energia”, que simplifica nossa compreensão do mundo. É mais fácil lembrar-se das características de um estereótipo do que da constelação de caracte- rísticas exclusivas de todas as pessoas que encontramos.45 Outra razão é a necessidade inata de compreendermos e prevermos como os outros se comportarão. Não temos muitas infor- mações quando encontramos alguém pela primeira vez, então nos baseamos muito nos este- reótipos para preenchermos as lacunas. Quanto maior a necessidade de fechamento cognitivo por quem percebe, maior sua dependência de estereótipos. Um terceiro motivo para a estereotipagem é que ela fortalece nosso autoconceito. Em uma parte anterior deste capítulo, explicamos que as pessoas se definem pelos grupos aos quais pertencem ou com os quais possuem alguma ligação emocional. Elas também estão motivadas a manter um autoconceito positivo. Essa combinação de identidade social e auto- valorização leva aos processos de categorização, homogeneização e diferenciação:46 estereotipagem Processo de atribuir traços às pessoas com base no fato de pertencerem a uma categoria social. McSchane_03.indd 70McSchane_03.indd 70 04/07/14 09:3104/07/14 09:31 Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094 M175c McShane, Steven L. Comportamento organizacional : conhecimento emergente, realidade global [recurso eletrônico] / Steven L. McShane, Mary Ann Von Glinow ; tradução : Francisco Araújo da Costa. – 6. ed. – Porto Alegre : AMGH, 2014. Editado também como livro impresso em 2014. ISBN 978-85-8055-404-5 1. Comportamento organizacional. I. Von Glinow, Mary Ann. II. Título. CDU 005.32 McShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd iiMcShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd ii 28/07/14 13:4328/07/14 13:43 PARTE II 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais Muitas empresas dizem que valorizam seus funcionários, mas a OhioHealth literalmente estende o tapete vermelho para os seus. Após 20 anos de trabalho, e a cada cinco de- pois deles, os funcionários da maior empresa de saúde do estado de Ohio são levados a um shopping center local e aplaudidos pelos colegas enquanto atravessam um tapete vermelho em um centro de conferências. Alguns funcioná- rios adiam sua aposentadoria apenas para participar desse evento especial. Não é à toa que a OhioHealth é um dos me- lhores lugares para se trabalhar nos EUA e têm um índice de rotatividade de pessoal muito abaixo da média do setor. “Queremos trabalhadores engajados, felizes e bem remunerados”, diz David Blom, CEO da OhioHealth. “Essa recompensa e reconhecimento [o passeio de compras por tempo de serviço] mexe com as emoções e paixões das pessoas”. Além da retenção da equipe, a OhioHealth é igualmen- te bem-sucedida na atração de candidatos para ocupar vagas de enfermagem e outras profissões com escassez de mão de obra. Vários hospitais da OhioHealth são cre- denciadas pela Associação Americana de Enfermagem como organizações Magnet (imã). Os hospitais Magnet possuem ambientes de trabalho amigáveis e não hierár- quicos, centrados em serviços de alta qualidade e que dão autonomia, respeito e representação aos enfermeiros nas decisões. “Na enfermagem, temos governança comparti- lhada e muitas de nossas instalações têm a designação Magnet”, explica Paul Patton, vice-presidente sênior de recursos humanos da OhioHealth. “Usamos o processo de comunicação forte desenvolvido nessa atmosfera em nossa tomada de decisões”. A OhioHealth mantém níveis baixos de absenteísmo com um programa de incentivos que estimula os funcio- nários a se manterem saudáveis e comerem bem. Além disso, ela fortalece o desempenho dos funcionários com programas de treinamento de alta qualidade, estabeleci- mento de metas estruturado e bastante feedback. Uma iniciativa, a GOFAR (gotta own functional areas of res- ponsibility, ou “tem que assumir áreas funcionais de res- ponsabilidade”) encoraja os funcionários a “tomar a ini- ciativa, ser proativo nos relatórios, buscar resultados sem descanso, superar obstáculos e cumprir prazos”, afirma Pam Carlisle, diretora corporativa de serviços de acesso do paciente da OhiopHealth. Jane Berkebile, outra exe- cutiva da OhioHealth, acrescenta que “a mensagem mais forte e consistente que recebemos de nossa equipe é que os funcionários sabem exatamente o que devem fazer, quais são seus objetivos e qual o seu nível de desempe- nho em um determinado momento”. 1 A OhioHealth enfrentou bem a recessão econômica e prosperou quando o crescimento econômico deixou ou- tras empresas da área da saúde com muitas vagas não preenchidas. Sua estratégia foi ser o empregador preferi- do pelos candidatos, minimizar o absenteísmo e a rotativi- dade, encorajar comportamentos extrafuncionais e apoiar o alto desempenho. Este capítulo analisa essas formas de comportamento individual e também os fatores que in- fluenciam tais comportamentos. O capítulo começa com o modelo MARS, que des- creve os quatro fatores que influenciam diretamente o comportamento e os resultados individuais. A seguir, ele revisa os cinco tipos de comportamento individual que representam as variáveis dependentes do nível dos indi- víduos mais utilizadas nas pesquisas de comportamento organizacional. A segunda metade do capítulo analisa mais de perto duas das características mais estáveis dos indivíduos: personalidade e valores. A seção sobre per- sonalidade examina especificamente o desenvolvimento da personalidade, os traços de personalidade e a relação entre personalidade e comportamento em contextos orga- nizacionais. A última parte do capítulo enfoca os valores, incluindo os diversos tipos de valores pessoais, a relação entre valores e comportamento individual, a dinâmica da congruência de valores, os valores e as práticas éticas e os valores interculturais. A OhioHealth festeja o tempo de serviço dos funcionários. McSchane_02.indd 29McSchane_02.indd 29 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 30 PARTE II Comportamento Individual e Processos MODELO MARS DO COMPORTAMENTO E DO DESEMPENHO INDIVIDUAL Na maior parte do século passado, os especialistas investigaram os preditores diretos do com- portamento e do desempenho individual.2 Uma das primeiras fórmulas foi desempenho = pessoa × situação, onde pessoa inclui as características individuais e situação representa as influências externas sobre o comportamento do indivíduo. Outra fórmula bastante mencio- nada é desempenho = capacidade × motivação3. Conhecida ocasionalmente como modelo “habilidade e vontade”, a fórmula considera duas características específicas da pessoa que influenciam o desempenho individual. Capacidade, motivação e situação são disparadamente os preditores diretos do comportamento e desempenho individual mais mencionados, mas na década de 1960 os pesquisadores identificaram um quarto fator importante: as percepções da função desempenhada (as obrigações previstas para a função do indivíduo).4 A Figura 2.1 ilustra as quatro variáveis (motivação, capacidade, percepções do papel e fatores situacionais) que são representadas pelo acrônimo MARS.5 Os quatro elementostêm influência fundamental sobre o comportamento voluntário do indivíduo e seu desempenho; se qualquer um deles estiver baixo em uma determinada situação, o funcionário executará mal a tarefa. Por exemplo, vendedores motivados com percepções claras da sua função e re- cursos suficientes (fatores situacionais) não executarão bem suas tarefas se não possuírem habilidades de vendas e conhecimento relacionado (capacidade). Motivação, capacidade e percepção do papel estão agrupadas no modelo porque se situam na pessoa. Os fatores situa- OA1 Objetivos de aprendizagem Após estudar o Capítulo 2, você deve ser capaz de: OA1 Descrever os quatro fatores que influenciam dire- tamente o comportamento individual e o desem- penho. OA2 Resumir os cinco tipos de comportamento indivi- dual nas organizações. OA3 Descrever personalidade, os Big Five (cinco gran- des) traços de personalidade e os quatro tipos de MBTI e explicar a relação entre a personalidade e o comportamento individual nas organizações. OA4 Resumir o modelo dos valores individuais de Schwartz e discutir as condições sob as quais os valores influenciam o comportamento. OA5 Discutir três princípios éticos e discutir quatro fa- tores que influenciam o comportamento ético. OA6 Revisar os cinco valores mais estudados nas cul- turas e discutir a diversidade cultural nos Estados Unidos. Personalidade Características individuais Modelo MARS Valores Autoconceito Percepções Emoções e atitudes Estresse Motivação Capacidade Percepções de função Fatores situacionais Comportamento e resultados • Desempenho nas tarefas • Cidadania organizacional • Comportamentos de trabalho contraproducentes • Ingresso/permanência na organização • Manutenção da assiduidade FIGURA 2.1 Modelo MARS do comportamento e dos resultados individuais. McSchane_02.indd 30McSchane_02.indd 30 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 31 cionais são externos ao indivíduo, mas ainda afetam o seu comportamento e desempenho.6 A seguir, analisamos cada um desses quatro fatores em mais detalhes. Motivação do funcionário A motivação representa as forças internas de uma pessoa que afetam a direção, a intensidade e a persistência do seu comportamento voluntário.8 Direção refere-se ao caminho em que as pessoas empreendem seus esforços; elas têm uma noção do que buscam e em que nível de qualidade, quantidade e assim por diante. Em outras palavras, a motivação é voltada para ob- jetivos, não é aleatória. As pessoas são motivadas a chegar ao trabalho no horário estipulado, a terminar um projeto algumas horas antes ou a visar a muitos outros objetivos. O segundo elemento da motivação, chamado intensidade, é a quantidade de esforço empregado no ob- jetivo. A intensidade reflete o quanto as pessoas incentivam a si próprias a completar uma tarefa. Por exemplo, dois funcionários estão motivados a concluir seu projeto algumas horas antes do prazo estipulado (direção), mas apenas um deles empreende um esforço suficiente (intensidade) para alcançar esse objetivo. Finalmente, a motivação envolve níveis variados de persistência, ou seja, a continuação do esforço durante certo tempo. Os funcionários mantêm seus esforços até atingirem o objetivo, ou desistem de antemão. Para lembrar desses três elementos da motivação, pense na metá- fora de dirigir um carro no qual a força do motor é seu esforço. A direção seria o local para onde você está dirigindo, a intensidade é quanto seu pé aperta o acelerador e a persistência é por quanto tempo você dirige até o destino final. Lembre-se que a motivação é uma força que existe dentro dos indivíduos, não seu comportamento real. Assim, direção, intensidade e persistência são condições cognitivas (pensamentos) e emocionais que são causas diretas de nossas ações. Capacidade As capacidades do funcionário fazem diferença no comportamento e no desempenho das tare- fas. Capacidade inclui tanto as aptidões naturais quanto as capacidades aprendidas necessárias para concluir uma tarefa com êxito. Aptidões são talentos naturais que ajudam os funcionários a aprenderem tarefas específicas com mais rapidez e desempenhá-las melhor. Existem muitas aptidões físicas e mentais, e a nossa capacidade para adquirir habilidades é afetada por tais aptidões. Por exemplo, a destreza dos dedos é uma aptidão pela qual os indivíduos aprendem mais rapidamente e têm um potencial de atingir um desempenho mais elevado na separação e manuseio de objetos pequenos com seus dedos. Os funcionários com alta destreza dos dedos a princípio não são necessariamente melhores do que os outros; em vez disso, sua aprendizagem tende a ser mais rápida e seu desempenho potencial tende a ser mais elevado. As capacidades aprendidas são as habilidades e o conhecimento que você possui atualmente, incluindo as ha- bilidades físicas e mentais, além do conhecimento que você adquiriu. As capacidades aprendi- das tendem a diminuir ao longo do tempo, se não são utilizadas. As atitudes e as capacidades aprendidas estão intimamente relacionadas às competên- cias, um termo que hoje é utilizado com frequência nos negócios. Competências são ca- racterísticas de uma pessoa que resultam em um desempenho superior.7 Tais característi- cas incluem conhecimento, habilidades, aptidões e comportamentos. Alguns especialistas estendem o significado do termo para incluir personalidade e valores, enquanto outros sugerem que as competências são resultados orientados para ações que envolvem tais ca- racterísticas, como atender clientes, lidar com cargas de trabalho pesadas e oferecer ideias criativas. Alguns estudos tentaram identificar uma lista das competências centrais para o desempenho em qualquer cargo ou profissão. Por exemplo, uma corrente de pesquisa identificou as competên- cias mais importantes em todas as situações profissio- nais, como liderar/decidir, apoiar/cooperar, criar/con- ceitualizar, adaptar/lidar e quatro outras.9 motivação Forças interiores de uma pes- soa que afetam a direção, a intensidade e a persistência do seu comportamento voluntário. capacidade As aptidões naturais e as ca- pacidades aprendidas neces- sárias para concluir uma tarefa com êxito. competências Habilidades, conhecimento, aptidões e outras característi- cas pessoais que levam a um desempenho superior. McSchane_02.indd 31McSchane_02.indd 31 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 32 PARTE II Comportamento Individual e Processos O desafio é combinar as competências de uma pessoa com os requisitos de competência do trabalho. Uma boa combinação pessoa–trabalho não só gera um desempenho superior, mas tam- bém tende a aumentar o bem-estar do funcionário. Uma maneira de combinar as competências de uma pessoa com as exigências da tarefa de trabalho é selecionar candidatos que demonstrem as competências necessárias. Por exemplo, as empresas pedem a candidatos que realizem parte do trabalho como amostra, que forneçam referências para confirmar o desempenho pregresso e que completem diversos testes de seleção. Uma segunda estratégia é oferecer treinamento, o que tem uma forte influência sobre o desempenho individual e a eficácia organizacional.10 A terceira estratégia de combinação pessoa–trabalho é reorganizar o trabalho de modo que os funcionários recebam apenas tarefas que refletem suas capacidades aprendidas atuais. Por exemplo, uma tare- fa complexa pode ser simplificada, com parte do trabalho transferido para terceiros, para que o novo funcionário realize apenas aquelas que já sabe fazer. À medida que o funcionário se torna mais competente nessas tarefas, outras são readicionadas à sua função. Percepções da função Motivação e capacidade são influências importantes sobre o comportamento e o desempenho do indivíduo, mas os funcionários também necessitam de boas percepções da função para desempenhar bem o seu trabalho. As percepções da função se referem à clareza com a qual as pessoas entendem os deveresde trabalho (funções) designados a elas ou esperados delas. Por exemplo, os funcionários da OhioHealth desempenham bem seus trabalhos em parte porque “eles sabem exatamente o que devem fazer”. Essas percepções são fundamentais, pois orientam a direção do esforço e melhoram a coordenação com colegas, fornecedores e outras partes interessadas. Funcionários com percepções mais claras da função que devem desem- penhar também tendem a ser mais motivados. Infelizmente, muitos funcionários não têm percepções claras da função. Uma pesquisa concluiu que apesar de 76% dos funcionários entenderem os objetivos de negócio da organiza- ção, apenas 39% afirmavam compreender como atingir tais objetivos em seu próprio trabalho. Da mesma forma, quando uma pesquisa global recente perguntou o que mais ajudaria a me- lhorar seu desempenho, os funcionários da maioria dos países identificaram “maior clareza so- bre o que a organização precisa de mim” como o primeiro ou segundo fator mais importante.12 A compreensão da função existe em três formas. Primeiro, os funcionários têm percep- ções claras quanto a suas funções quando compreendem as tarefas específicas designadas a eles, ou seja, quando sabem os deveres ou consequências específicos pelos quais são responsá- A Black Friday, dia seguinte ao Dia de Ação de Graças nos EUA, é o maior dia de compras do ano, en- tão a Best Buy realiza ensaios es- peciais para garantir que todos os funcionários tenham percepções absolutamente claras sobre suas funções. A foto mostra Aaron San- ford, supervisor de atendimento ao cliente, orquestrando um treino de Black Friday em uma loja Best Buy em Denver. Os eventos ajudam os funcionários a compreenderem seus deveres e responsabilidades específicas, a prioridade dessas tarefas e a maneira correta de realizá-las.11 McSchane_02.indd 32McSchane_02.indd 32 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 33 veis. Pode parecer óbvio, mas os funcionários ocasionalmente são avaliados com relação a de- veres que nunca souberam serem suas responsabilidades. Por exemplo, o sistema de metrô de Washington, DC, sofreu um descarrilamento grave alguns anos atrás porque o departamento de trilhos não lubrificou os trilhos. Uma investigação revelou que o departamento lubrifica- va os trilhos alguns anos antes, mas a atividade parou depois que os gerentes anteriores do departamento se aposentaram ou foram transferidos. Os novos gerentes não sabiam sobre os deveres de lubrificação de trilhos do departamento, então não informaram aos funcionários que tal atividade era parte do seu trabalho.13 A segunda forma de compreender a função se refere a quanto os funcionários entendem a prioridade de suas diversas tarefas e expectativas de desempenho. Um bom exemplo é o dile- ma clássico de priorizar quantidade versus qualidade, como quantos clientes são servidos em uma hora (quantidade) versus como o funcionário deve atender cada cliente (qualidade). Isso também se refere a alocar adequadamente o tempo e os recursos às várias tarefas, por exem- plo, quanto tempo um gestor deve despender treinando os funcionários em uma semana típi- ca versus tempo dedicado a fornecedores e clientes. A terceira forma de compreensão envolve entender os comportamentos prediletos ou procedimentos para realizar as tarefas designadas. Isso se refere a situações nas quais os funcionários possuem o conhecimento e as habilidades para realizar uma determinada tarefa de mais de uma maneira. Os funcionários com percep- ções claras da função sabem quais métodos são preferidos ou exigidos pela organização. Fatores situacionais O comportamento e o desempenho dos funcionários também dependem da situação.14 A situação se refere principalmente a condições que estão além do controle imediato do funcio- nário e que limitam ou facilitam seu comportamento e desempenho.15 Por exemplo, funcio- nários motivados e habilidosos que conhecem as obrigações de sua função ainda assim terão mau desempenho se não tiverem tempo, orçamento, instalações físicas e outras condições situacionais. Algumas limitações situacionais, como as preferências dos consumidores e as condições econômicas, se originam do ambiente externo e, por consequência, estão além do controle do funcionário e da organização. Além das restrições situacionais, os fatores situacionais também podem se referir aos si- nais de clareza e consistência fornecidos pelo ambiente para os funcionários quanto às obri- gações e oportunidades de suas funções.16 A importância da clareza e consistência situacio- nais também é ilustrada pelos acidentes de trabalho. Digamos que você é motivado, capaz e tem a obrigação clara de atuar de maneira segura em seu trabalho. Ainda assim, é provável que você sofra um acidente caso o ambiente de trabalho não comunique clara e consistente- mente a presença de um risco elétrico ou outro problema de segurança. Seu comportamento inseguro e sua probabilidade de sofrer um acidente são afetados pela situação, a saber, a falta de sinais e outros indicadores de risco de segurança, ou o posicionamento inconsistente des- ses avisos no local de trabalho. TIPOS DE COMPORTAMENTO INDIVIDUAL Os quatro elementos do modelo MARS (motivação, capacidade, percepções da função e fa- tores situacionais) afetam todos os comportamentos voluntários no local de trabalho e os resultados de desempenho. Os comportamentos individuais são multivariados, mas a maioria pode ser organizada nas cinco categorias descritas nas próximas páginas: o desempenho nas tarefas, a cidadania organizacional, os comportamentos profissionais contraproducentes, o ingresso e a permanência na organização e a assiduidade no trabalho (ver Figura 2.2). Desempenho nas tarefas Desempenho nas tarefas refere-se aos comportamentos do indivíduo que apoiam os objetivos organizacionais.17 Os comportamentos de desempenho nas tarefas transformam matérias- -primas em produtos e serviços ou apoiam e mantêm as atividades técnicas. Por exemplos, corretores de câmbio da BGC Partners, Inc., tomam decisões e realizam diversas tarefas para OA2 percepções da função Quanto uma pessoa com- preende exatamente as responsabilidades do trabalho (funções) que a ela são atribuí- das ou que dela se esperam. McSchane_02.indd 33McSchane_02.indd 33 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 34 PARTE II Comportamento Individual e Processos comprar e vender moeda estrangeira. A maioria dos trabalhos é composta de diversas tarefas. Por exemplo, os corretores de câmbio da BGC precisam ser capazes de identificar oportuni- dades lucrativas rapidamente, analisar dados econômicos, controlar e completar informações de contas, auxiliar no treinamento de novos membros e usar software e equipamentos espe- cializados sem cometer erros. Em termos mais gerais, as tarefas podem envolver o trabalho com dados, pessoas ou objetos, sozinho ou com terceiros, e diversos graus de influência sobre outras pessoas.18 Cidadania organizacional Poucas empresas sobreviveriam se os funcionários cumprissem apenas seus deveres formais. Eles precisam se envolver em comportamentos de cidadania organizacional (CDOs), ou seja, diversas formas de cooperação e prestimosidade com as outras pessoas que apoiam o contexto social e psicológico da organização.19 Em outras palavras, as empresas prosperam quando seus funcionários se esforçam além dos deveres exigidos. Os comportamentos de cidadania organizacional assumem várias formas. Alguns são voltados para os indivíduos, como ajudar os colegas em seus problemas de trabalho, ajustar a sua agenda para acomodá- -los, demonstrar cortesia genuína em relação a eles e compartilhar seus recursos de trabalho (suprimentos, tecnologia, pessoal). Outros CDOs representam cooperação e prestimosidade em relação à organização em geral, como apoiar a imagem pública da empresa, tomar medi- das discricionárias para ajudar a organização a evitar problemas em potencial, oferecer ideias além dasexigidas para a sua própria função, executar funções voluntárias que apoiem a orga- nização e manter-se a par dos novos desenvolvimentos internos.20 Comportamentos de trabalho contraproducentes O comportamento organizacional está interessado em todos os comportamentos no local de tra- balho, incluindo as atividades disfuncionais conhecidas coletivamente como comportamentos de trabalho contraproducentes (CTCs). Esses comportamentos voluntários têm o potencial de prejudicar direta ou indiretamente a organização.22 Alguns dos muitos tipos de CTCs incluem assediar colegas, criar conflitos desnecessários, desviar dos métodos de trabalho preferenciais (ex.: atalhos que colocam a qualidade em risco), ser desonesto, roubar, sabotar o trabalho, evitar obrigações (atrasos) e desperdiçar recursos. Os CTCs não são preocupações menores: as pesqui- sas sugerem que eles podem prejudicar significativamente a eficácia da organização. Tipos deTipos de comportamentocomportamento individualindividual Tipos de comportamento individual Desempenho nas tarefas Ingresso/ permanência na organização C id ad an ia or ga ni za ci on al C om portam ento contraproducente Ma nu ten çã o da as sid uid ad e FIGURA 2.2 Cinco tipos de comportamento individual no local de trabalho. McSchane_02.indd 34McSchane_02.indd 34 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 35 Ingresso e permanência na organização O desempenho nas tarefas, a cidadania organizacional e a ausência de comportamentos de trabalho contraproducentes obviamente são importantes; mas, se pessoas qualificadas não ingressarem e permanecerem na organização, nenhum desses comportamentos associados ao desempenho ocorrerá. Pense na escassez de enfermeiros. Apesar da recessão dos últimos anos ter aliviado temporariamente o problema, a tendência de longo prazo é que o núme- ro de vagas de enfermagem seja muito maior do que o número de enfermeiros disponíveis. Os Estados Unidos e outros países já tiveram diversos casos de leitos eliminados e serviços hospitalares que se deterioraram devido à falta de enfermeiros.23 A OhioHealth reduziu pro- ativamente esse risco. Como descreve a história que abre este capítulo, a empresa de saúde se tornou o empregador preferencial com a conquista da designação Magnet da associação de enfermagem e sua avaliação como um dos melhores lugares para se trabalhar nos EUA. Mesmo quando as empresas conseguem contratar profissionais qualificados em momen- tos de escassez, elas precisam garantir que esses funcionários permanecerão na organização. As empresas com altos índices de rotatividade sofrem devido ao custo significativo de subs- tituir os ex-funcionários. Mais importante ainda, como mencionamos no capítulo anterior, é que boa parte do capital intelectual da organização é composto pelo conhecimento que fica guardado nas mentes dos funcionários. Quando as pessoas vão embora, parte desse co- nhecimento vital é perdida, resultando frequentemente em menor produtividade, piora no atendimento ao cliente, e assim por diante. Alguns empregadores atraem candidatos e mini- mizam a rotatividade com um ambiente de trabalho prazeroso. Por exemplo, a cena de aber- tura descreveu como a OhioHealth homenageia funcionários com bastante tempo de serviço e cria um ambiente de alto envolvimento no qual a equipe é consultada regularmente sobre questões organizacionais. Manutenção da assiduidade no trabalho Além da atração e retenção dos funcionários, as organizações precisam que todos compareçam ao trabalho nos horários agendados. Os funcionários americanos perdem cinco dias de trabalho regular por ano, um número menor do que na maioria dos outros países. Por exemplo, um estudo concluiu que mais de 25% dos professores do ensino médio e funda- mental da Índia, Uganda e Indonésia não comparecem no comportamentos de cidadania organizacional (CDOs) Diversas formas de cooperação e prestimosidade com as outras pessoas que apoiam o contexto social e psicológico da organi- zação. comportamentos de trabalho contraproducentes (CTCs) Comportamentos voluntários que têm o potencial de preju- dicar direta ou indiretamente a organização. Um carregamento importante de materiais chegou na alfândega para a Procter & Gamble (P&G) in- diana, mas o governo fechou todos os seus escritórios (incluindo a al- fândega) devido a chuvas pesadas. Um engenheiro da fábrica da P&G enfrentou a chuva e conseguiu transportar um agente alfandegário até o escritório para que pudesse completar os documentos de liberação. A seguir, o engenheiro fez com que os materiais fossem entregues na fábrica no mesmo dia. O engenheiro da P&G indiana realizou comportamentos de cida- dania organizacional (e encorajou comportamentos semelhantes por parte do agente alfandegário), o que manteve as linhas de produção em funcionamento.21 McSchane_02.indd 35McSchane_02.indd 35 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 36 PARTE II Comportamento Individual e Processos local de trabalho todos os dias. O relatório alerta que esse nível crônico de absenteísmo prejudi- ca a qualidade da educação a ponto de ameaçar o desenvolvimento econômico desses países.24 A maioria dos funcionários culpa algumas situações por seu absenteísmo, como mau tempo, greve de ônibus ou obrigações familiares (ex.: crianças ou pais doentes). Entretanto, algumas pessoas comparecem no trabalho sob essas condições pois sua motivação para trabalhar é forte, enquanto outras se ausentam mesmo quando o problema não é tão grave. Os funcionários insa- tisfeitos com o trabalho ou sofrendo com estresse têm maior probabilidade de se ausentarem ou chegarem atrasados, pois esse tempo de folga é uma maneira de se afastarem temporariamente de condições estressantes ou insatisfatórias. O absenteísmo é maior nas organizações com licen- ças médicas generosas, pois esse benefício limita o impacto financeiro negativo de se afastar do trabalho. Os valores e a personalidade são outro fator que afeta o absenteísmo.25 Finalmente, os estudos afirmam que o absenteísmo também é mais forte em equipes com normas de ausência fortes, ou seja, em que os membros toleram e até esperam que os colegas tirem folgas.26 Presenteísmo Além de comparecerem no trabalho nos momentos esperados, a manuten- ção da assiduidade no trabalho exige que os funcionários se ausentem quando sua presença seria disfuncional para eles e para a organização. Na verdade, especialistas em CO alertam que o presenteísmo, ou seja, a assiduidade quando a capacidade de trabalhar é prejudicada significativamente por doença, fadiga, problemas pessoais ou outros fatores, pode ser mais grave do que a ausência de quem está em condições de trabalhar.27 Os funcionários que com- parecem no local de trabalho quando estão doentes ou incapazes podem piorar sua própria condição e aumentar os riscos de saúde de seus colegas. Esses funcionários também são me- nos produtivos e podem prejudicar a produtividade dos colegas. O presenteísmo é mais comum entre funcionários com baixa estabilidade no emprego (como os temporários e os recém-contratados), que não recebem licenças médicas ou outras margens de segurança financeira, e cuja ausência afetaria imediatamente muitas outras pes- soas (ou seja, alta centralidade). As normas da empresa ou da equipe sobre absenteísmo tam- bém impactam o presenteísmo. A personalidade é outro fator importante: algumas pessoas possuem traços que as motivam a comparecer enquanto outras se contentam em se recuperar em casa. A personalidade é um preditor bastante citado da maioria das formas de comporta- mento individual. Ela também é a característica pessoal mais estável, então é o próximo tema a ser trabalhado. PERSONALIDADE NAS ORGANIZAÇÕES Ao se candidatar para diversas vagas em editoras, Christina ficou surpresa em descobrir que três delas exigiam que completasse um teste de personalidade. “Uma página tem uma lista de características, comosentimental, aventureira, atraente, convincente e prestativa, e você marca aquelas que melhor descrevem o que os outros esperam de você”, Christina conta sobre o teste. “A segunda página mostra a mesma lista, mas você marca as palavras que descrevem você de verdade”. Christina não ouviu de volta da primeira empresa após completar seu teste de per- sonalidade, então para a segunda ela completou o teste “de acordo com uma personalidade de vendas”, pois a vaga era no setor de vendas. Ao fazer o teste de personalidade para a terceira empresa, ela respondeu as perguntas da maneira que imaginou que alguém faria se fosse “uma boa pessoa, mas honesta”. Nenhuma das candidaturas resultou em uma oferta de emprega, dei- xando Christina na dúvida sobre o perfil que as empresas buscavam entre os candidatos e se sua estratégia de adivinhar a melhor resposta nesses testes seria mesmo uma boa ideia.28 A personalidade é uma característica individual importante, o que explica por que diver- sas empresas tentam estimar os traços de personalidade dos candidatos e funcionários. Quase todo mundo pensa sobre personalidade todos os dias quando interage. Usamos esses traços (falante, orientado para riscos, pensativo, etc.) para simplificar nossas percepções sobre os outros e prever seu comportamento futuro. A personalidade é um padrão relativamente du- radouro de pensamentos, emoções e comportamentos que caracteriza uma pessoa, além dos processos psicológicos subjacentes a tais características.29 Basicamente, a personalidade é o conjunto de características que nos torna semelhantes ou diferentes dos outros. Nós estima- mos a personalidade dos indivíduos pelo que dizem ou fazem e fazemos inferências sobre os OA3 McSchane_02.indd 36McSchane_02.indd 36 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 37 estados internos de indivíduos, deduzindo pensamentos e emoções, a partir desses compor- tamentos observáveis. Uma premissa básica da teoria da personalidade é que as pessoas possuem características ou traços inerentes que podem ser identificados pela coerência ou estabilidade do seu com- portamento ao longo do tempo e de acordo com as situações.30 Por exemplo, provavelmente você tem amigos que são mais comunicativos do que outros. Você pode conhecer pessoas que gostam de assumir riscos e outras que são mais avessas a eles. Essa tendência comportamental é uma característica fundamental da teoria da personalidade, pois atribui o comportamento de uma pessoa a algo dentro dela, sua personalidade, e não a influências puramente ambientais. Certamente, as pessoas não agem da mesma maneira em todas as situações; na prática, esse pensamento seria considerado anormal, pois indicaria uma insensibilidade às normas sociais, sistemas de recompensa e outras condições externas.31 As pessoas variam seu com- portamento para se adequarem à situação, mesmo que determinado comportamento esteja em desacordo com a sua personalidade. Por exemplo, as pessoas falantes ficam relativamente quietas em uma biblioteca onde as regras de silêncio são explícitas e estritas. Entretanto, as di- ferenças de personalidade ainda se manifestam nessas situações, pois pessoas falantes tendem a conversar mais nas bibliotecas se comparados com outros tipos de pessoas. Tradicionalmente, as pessoas exibem uma ampla gama de comportamentos, ainda que den- tro dessa variedade existam padrões discerníveis que chamamos de traços de personalidade. Os traços são conceitos amplos que nos permitem rotular e compreender as diferenças individuais. Além disso, os traços predizem o comportamento de um indivíduo no futuro distante. Por exemplo, estudos afirmam que a personalidade de um indivíduo na infância prediz vários com- portamentos e resultados na vida adulta, incluindo o nível de escolaridade, o sucesso profissio- nal, o estado civil, as atividades ilegais e os comportamentos que colocam a saúde em risco.32 Determinantes da personalidade: natureza versus educação O que determina a personalidade de um indivíduo? A maioria dos especialistas concorda que a personalidade é moldada tanto pela natureza quanto pela educação, embora a impor- tância relativa de cada uma continue a ser debatida e estudada. A natureza refere-se às nossas origens genéticas ou hereditárias, ou seja, aos genes que herdamos dos nossos pais. Estudos de gêmeos idênticos, particularmente os que foram separados ao nascer, revelam que a he- reditariedade surte um grande efeito sobre a personalidade; até 50% da variação no compor- tamento e 30% das preferências do temperamento podem ser atribuídos às características genéticas.33 Em outras palavras, o código genético não só determina a cor dos nossos olhos, o tom da nossa pele e o nosso formato físico, como afeta de maneira significativa as nossas atitudes, decisões e comportamentos. Algumas semelhanças entre gêmeos criados em famílias diferentes são surreais. Pense no exemplo de Jim Springer e Jim Lewis, separados quando tinham apenas quatro semanas de vida e que não se reencontraram até os 39 anos de idade. Apesar de terem crescido em famílias e comunidades diferentes em Ohio, os “gêmeos Jim” tinham empregos semelhantes, fumavam o mesmo tipo de cigarro, dirigiam um carro com a mesma marca e cor, passavam as férias na mesma praia da Flórida, tinham o mesmo hobby de marcenaria, deram aos seus primeiros filhos nomes quase idênticos e tinham se casado duas vezes. A primeira e a segun- da esposas de ambos tinham o mesmo primeiro nome!34 Embora a personalidade seja fortemente influenciada pela hereditariedade, também é afe- tada pela educação, ou seja, a socialização da pessoa, as experiências de vida e outras formas de interação com o ambiente. O desenvolvimento e a mudança da personalidade ocorrem principalmente até o início da vida adulta; a personalidade se estabiliza quando o indivíduos chega aos 30 anos, ainda que algumas mudanças continuem até os 50.35 A principal explicação para a estabilização da persona- lidade com o tempo é que, à medida que envelhecemos, nós formamos um autoconceito mais claro e rígido.36 Essa maior clareza sobre “quem somos” funciona como âncora para nosso comportamento, pois a função executiva (a parte do cérebro que gerencia os comportamentos direcionados para presenteísmo Comparecer no trabalho em mo- mentos programados ou agen- dados quando a capacidade de desempenho é afetada por doença ou outros fatores. personalidade Padrão relativamente duradou- ro de pensamentos, emoções e comportamentos que carac- terizam uma pessoa, além dos processos psicológicos subja- centes a essas características. McSchane_02.indd 37McSchane_02.indd 37 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 38 PARTE II Comportamento Individual e Processos metas) tenta manter nosso comportamento condizente com nosso autoconceito. Como o auto- conceito se torna mais claro e estável com a idade, nosso comportamento e personalidade por consequência se tornam mais estáveis e consistentes. O autoconceito será analisado em mais detalhes no próximo capítulo. Por ora, nossa tese é que a personalidade não é determinada totalmente pela hereditariedade; as experiências de vida, especialmente nos primeiros anos, também moldam os traços de personalidade de cada indivíduo. Modelo dos cinco fatores da personalidade Uma das ideias mais importantes da teoria da personalidade é que os indivíduos possuem traços de personalidade específicos. Traços como sociável, deprimido, cauteloso e falante re- presentam grupos de ideias, sentimentos e comportamentos que nos permitem identificar, diferenciar e entender os outros.37 Os pesquisadores descreveram centenas de traços de per- sonalidade com o passar dos anos, de modo que os especialistas no tema tentaram organizá- -los em agrupamentos menores. O conjunto mais respeitado de traços de personalidade é o modelo dos cinco fatores (FFM), grupo de dimensões da personalidade também conhecido como Big Five (cinco grandes).Décadas atrás, especialistas em personalidade identificaram mais de 17 mil palavras que descrevem a personalidade de um indivíduo. Essas palavras fo- ram destiladas e resumidas em cinco dimensões de personalidade abstratas. Estudos em idio- mas diferentes produziram resultados semelhantes, sugerindo que o modelo dos cinco fatores é robusto interculturalmente.38 Essas cinco grandes dimensões, representadas em inglês pelo acrônimo CANOE, (Conscientiousness, Agreeableness, Neuroticism, Openness to experience e Extraversion) estão descritas na Figura 2.3 e nos parágrafos a seguir: • Escrupulosidade. A escrupulosidade caracteriza indivíduos organizados, confiáveis, focados em metas, detalhistas, disciplinados, metódicos e esforçados. As pessoas com baixa escrupulosidade tendem a ser negligentes, menos detalhistas, desorganizadas e irresponsáveis. • Sociabilidade. A dimensão inclui os traços de ser confiante, prestativo, simpático, aten- cioso, tolerante, altruísta, generoso e flexível. Alguns estudiosos preferem o rótulo “con- formidade amigável” para esta dimensão, com o seu oposto sendo “não conformidade hostil”. As pessoas com baixa sociabilidade tendem a ser pouco cooperativas e intole- rantes com as necessidades alheias, além de mais desconfiadas e autocentradas. • Neuroticismo. O neuroticismo caracteriza pessoas que tendem a ser ansiosas, insegu- ras, inibidas, deprimidas e temperamentais. As pessoas com baixo neuroticismo (alta estabilidade emocional), por outro lado, são equilibradas, seguras, positivas e calmas. • Abertura para a experiência. A dimensão é a mais complexa e a que tem o menor consenso entre os estudiosos. Geralmente, refere-se a quanto as pessoas são imaginativas, criativas, Dimensão da personalidade Indivíduos com pontuação elevada nesta dimensão tendem a ser mais: Escrupulosidade Organizados, confiáveis, focados em metas, detalhistas, disciplinados, metódicos, esforçados Confiantes, prestativos, simpáticos, atenciosos, tolerantes, altruístas, generosos, flexíveis Ansiosos, inseguros, inibidos, deprimidos, temperamentais Imaginativos, criativos, pouco convencionais, curiosos, não conformistas, autônomos, perceptivos Expansivos, falantes, enérgicos, sociáveis, assertivos Sociabilidade Neuroticismo Abertura para a experiência Extroversão FIGURA 2.3 Dimensões da personalidade no modelo dos cinco fatores. McSchane_02.indd 38McSchane_02.indd 38 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 39 pouco convencionais, curiosas, não conformistas, autônomas e esteticamente sensíveis. As pessoas com baixa pontuação nesta dimensão tendem a ser mais resistentes à mudança, menos abertas a novas ideias e mais convencionais e rígidas em suas preferências. • Extroversão. A extroversão caracteriza indivíduos expansivos, falantes, enérgicos, soci- áveis e assertivos. Seu oposto é a introversão, que caracteriza indivíduos quietos, caute- losos e menos interativos. Os extrovertidos captam energia do mundo externo (pessoas ou coisas à sua volta), enquanto os introvertidos captam energia do mundo interno, como a reflexão pessoal sobre conceitos e ideias. Os introvertidos não carecem necessa- riamente de habilidades sociais. Em vez disso, eles preferem direcionar seus interesses para ideias do que para eventos sociais. Os introvertidos sentem-se bastante confortá- veis ficando sozinhos, ao contrário dos extrovertidos. Dimensões de personalidade Big Five e comportamento no local de trabalho As dimensões de personalidade no modelo dos cinco fatores influenciam de diversas formas a motivação dos funcionários e a clareza com que eles percebem suas funções.39 Alguns espe- cialistas sugerem que as características de sociabilidade, escrupulosidade e estabilidade emo- cional (baixo neuroticismo) se aglutinam em torno da característica geral de “dar-se bem com os outros”. Indivíduos com alta sociabilidade são mais sensíveis aos outros (mais atenciosos e altruístas), os com alta escrupulosidade são mais confiáveis e os mais emocionalmente está- veis são mais animados. Alguns autores sugerem que a extroversão também está relacionada com a ideia de dar-se bem com os outros, pois os extrovertidos são mais sociáveis. Abertura para a experiência, extroversão, escrupulosidade e estabilidade emocional se aglutinam em torno da característica geral de “avançar na vida”. Aqueles com alta abertura para a experiên- cia estão mais dispostos a experimentar novas ideias, os extrovertidos são mais assertivos, os com alta escrupulosidade são mais orientados para objetivos e os emocionalmente estáveis têm mais confiança em sua capacidade de ter um bom desempenho. Os traços de personalidade refletem as tendências de comportamento de um indivíduo, tornando-as bons preditores de diversos comportamentos e resultados no local de trabalho, mesmo após controlarmos a capacidade do funcionário e outros fatores. Os traços de perso- nalidade se manifestam até no conteúdo de nossos perfis no Facebook e em outras informa- ções que fornecemos a sites. A escrupulosidade e a estabilidade emocional (baixo neuroti- cismo) destacam-se como os traços de personalidade que preveem um melhor desempenho individual em quase todos os grupos de trabalho.40 Ambos são componentes motivacionais da personalidade, pois criam uma disposição voltada ao cumprimento das obrigações pro- fissionais dentro das regras estabelecidas (escrupulosidade) e para alocar recursos para rea- lizar essas tarefas (estabilidade emocional). Diversos estudos mostraram que os funcionários escrupulosos estabelecem objetivos pessoais maiores para si mesmos, são mais motivados e têm expectativas de desempenho mais altas do que os funcionários com níveis baixos de escrupulosidade. Eles também tendem a ter níveis mais elevados de cidadania organizacional e trabalham melhor nas organizações que concedem aos funcionários mais liberdade do que a encontrada nos locais de trabalho tradicionais de comando e controle.41 As outras três dimensões da personalidade preveem tipos mais específicos de comporta- mento e desempenho do funcionário.43 A extroversão está associada ao desempenho nos tra- balhos de vendas e gestão, nos quais os funcionários têm de interagir com pessoas e influen- ciá-las. A sociabilidade está associada ao desempenho nos trabalhos nos quais se espera que os funcionários sejam cooperativos e úteis, como trabalhos em equipes, relações com clientes e outras situações de resolução de conflitos. As pessoas com uma dimensão de personalidade de grande abertura para a experiência tendem a ser mais criativas e adaptáveis a mudanças. modelo dos cinco fatores (FFM) Cinco dimensões abstratas que representam a maioria dos tra- ços de personalidade: escrupu- losidade, estabilidade emocio- nal, abertura para a experiência, sociabilidade e extroversão. escrupulosidade Dimensão da personalidade que descreve as pessoas que são prudentes, confiáveis e autodis- ciplinadas. neuroticismo Dimensão da personalidade que descreve as pessoas com altos níveis de ansiedade, hostilidade, depressão e inibição. extroversão Dimensão da personalidade que descreve as pessoas expansi- vas, comunicativas, sociáveis e afirmativas. McSchane_02.indd 39McSchane_02.indd 39 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 40 PARTE II Comportamento Individual e Processos Finalmente, a personalidade influencia o bem-estar do funcionário de várias maneiras.44 Em geral, ela influencia as reações emocionais típicas de um indivíduo ao trabalho, como ele en- frenta o estresse e qual carreira o tornaria mais feliz. Teoria junguiana da personalidade e indicador tipológico de Myers-Briggs O modelo dos cinco fatores da personalidade é o mais respeitado e apoiado na pesquisa, mas não é o mais popular na prática. Essa distinção vai para a teoria junguiana da persona- lidade, que é medida pelo indicador tipológico de Myers-Briggs (MBTI, Myers-Briggs Type Indicator) (ver Figura 2.3). Quase um séculoatrás, o psiquiatra suíço Carl Jung propôs que a personalidade é representada principalmente pelas preferências do indivíduo pertinentes à percepção e ao julgamento das informações.45 Jung explicou que a percepção, que envolve o modo como as pessoas preferem reunir informações ou perceber o mundo ao seu redor, ocorre por meio de duas orientações concorrentes: sensação (S) e intuição (N). A sensação en- volve a percepção da informação diretamente por meio dos cinco sentidos, baseando-se em uma estrutura organizada para adquirir detalhes factuais e preferencialmente quantitativos. A intuição, contudo, está fundamentada mais na perspicácia e na experiência subjetiva. Os tipos sensoriais se concentram no aqui e agora, enquanto os tipos intuitivos, nas possibilida- des futuras. Jung também propôs que o julgamento, ou seja, o modo como as pessoas processam as informações ou tomam decisões com base no que percebem, consiste em dois processos con- correntes: razão (T) e sentimento (F). As pessoas com uma orientação para a razão se baseiam na lógica racional de causa e efeito e na coleta sistemática de dados para tomar decisões. As pessoas com uma forte orientação para o sentimento, por outro lado, baseiam-se em suas respostas emocionais para as opções apresentadas, bem como na forma que essas escolhas afetam as outras pessoas. Jung observou que além de diferir nos quatro processos principais de sensação, intuição, razão e sentimento, os indivíduos também são diferentes quanto a seus graus de extroversão/introversão, introduzido anteriormente como um dos cinco grandes traços de personalidade ou Big Five. Além da medição dos traços de personalidade identificados por Jung, o MBTI mede as categorias junguianas mais amplas da percepção e do julgamento, que representam a atitude de uma pessoa em relação ao mundo exterior. As pessoas com uma orientação para a per- cepção são abertas, curiosas e flexíveis; preferem se adaptar espontaneamente aos eventos à medida que eles se desdobram; e preferem manter suas opções em aberto. Os tipos julgadores preferem ordem e estrutura e querem resolver os problemas rapidamente. As empresas gastam trilhões de dólares com testes de personalida- de, mas estudos recentes mostram que os candidatos já revelam seus traços de personalidade no conteúdo de suas páginas no Face- book, blogs e outros sites pessoais. O simples ato de ter um blog ou participar de redes sociais on-line pode indicar traços de persona- lidade específicos. Extroversão, abertura para a experiência e sociabilidade costumam ser os traços mais fáceis de estimar a partir do conteúdo de fontes on- -line, enquanto o neuroticismo é o mais difícil.42 McSchane_02.indd 40McSchane_02.indd 40 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 41 O MBTI é um dos testes de personalidade mais utilizados nos ambientes de trabalho, no aconselhamento de carreira e no treinamento de executivos.47 Ainda assim, o apoio dado ao MBTI e ao modelo dos tipos psicológicos de Jung tem sido problemático.48 Por um lado, o MBTI parece melhorar a autoconsciência em termos de desenvolvimento de carreira e com- preensão mútua, além de representar razoavelmente os tipos psicológicos junguianos. Por outro, o MBTI não é bom para prever o desempenho profissional, geralmente não sendo recomendado para a seleção de funcionários ou para as decisões pertinentes à promoção. Por exemplo, apesar de um estudo informar que os tipos intuitivos são mais comuns na alta gerência do que na baixa, outras pesquisas não encontraram relação entre tipos MBTI e lide- rança eficaz. Um estudo recente de larga escala também informou que os resultados de MBTI de membros de equipe não preveem o êxito do desenvolvimento da equipe. Finalmente, o MBTI é redundante com quatro das cinco dimensões do modelo de personalidade dos cinco fatores, mas não mensura as quatro tão bem quanto as escalas Big Five existentes.49 Teste de personalidade nas organizações A personalidade se tornou um tema controverso no campo do comportamento organizacional e recebe bastante atenção no ambiente de trabalho. Em geral, os testes são aplicados para fins de desenvolvimento de pessoal, como planos de carreira e dinâmicas de equipe. Por exemplo, muitos funcionários da Southwest Airlines colocam seus resultados do indicador tipológico de Myers-Briggs (MBTI) em seus escritórios. “É só dar uma passada e você encontra as quatro letras [tipo MBTI] da pessoa penduradas no cubículo”, diz o diretor de desenvolvimento de liderança da Southwest. A companhia aérea começou a usar o MBTI na década passada, com a ideia de ajudar a equipe a compreender e respeitar as diferentes personalidades e estilos de raciocínio dos colegas. “Comportamentos que antes poderiam ter causado mal-entendidos e frustração hoje são vistos por um prisma diferente”, sugere o gerente da Southwest Airlines.50 Como Christina descobriu enquanto procurava um emprego no mercado editorial (ver a história que abre esta seção), os testes de personalidade também estão sendo incorporados ao processo de decisão de seleção e promoção. Quando a Amtrak venceu o contrato para operar o serviço de passageiros Metrolink no sul da Califórnia, por exemplo, a empresa pediu que os engenheiros ferroviários e condutores da empresa anterior completassem um teste de perso- • Comunicativo • Foco externo • Assertivo Obtenção de energia Percepção da informação Tomada de decisão Orientação para o mundo exterior Extroversão (E) • Concreto • Realista • Prático Sensorial (S) • Lógico • Objetivo • Impessoal Racionalista (T) • Organizado • Orientado para cronogramas • Focado em fechamento Julgador (J) • Quieto • Foco interno • Abstrato Introversão (I) • Imaginativo • Focado no futuro • Abstrato Intuitivo (N) • Empático • Solidário • Foco na emoção Sentimental (F) • Espontâneo • Adaptável • Focado em oportunidades Perceptivo (P) FIGURA 2.4 Tipos junguianos e indicadores tipológicos de Myers-Briggs.46 Fonte: Modificado e reproduzido com permissão especial de Publisher, CPP, Inc., Mountain View, CA 994043 from Introduction to Type and Careers by Allen L. Hammer. Copyright 1993 by CPP, Inc. Todos os direitos reser- vados. Reprodução subsequente proibida sem consentimento por escrito de Publisher. Indicador Tipológico de Myers–Briggs (MBTI) Instrumento concebido para medir os elementos da teoria junguiana da personalidade, particularmente as prefe- rências que dizem respeito a perceber e julgar as infor- mações. McSchane_02.indd 41McSchane_02.indd 41 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 42 PARTE II Comportamento Individual e Processos nalidade Big Five como condição para emprego futuro. A Amtrak prefere que a equipe dos veí- culos tenha personalidades de “introvertidos focados”, pois funcionários com esses traços não ficam distraídos enquanto operam o trem ou realizam tarefas repetitivas. A Amtrak menciona um acidente horrível da Metrolink antes de seu contrato como justificativa para o teste de personalidade. Mais de vinte pessoas perderam suas vidas quando um engenheiro ignorou um sinal vermelho enquanto mandava um SMS (supostamente, um indicador de extroversão).51 Os testes de personalidade não foram sempre populares nas organizações. Menos de vin- te anos atrás, muitas empresas rejeitavam os instrumentos por se preocuparem com a pos- sibilidade deles não preverem comportamentos de trabalho e discriminarem injustamente minorias visíveis e outros grupos identificáveis. Aos poucos, os testes de personalidade fo- ram ganhando aceitação, pois os estudos foram relatando que traços específicos estavam cor- relacionados com indicadores específicos de desempenho no trabalho (como descrevemos anteriormente). Hoje, os testes de personalidade são tão populares que alguns especialistas alertam contra sua dependência excessiva em ambientes organizacionais. VALORES NO LOCAL DE TRABALHO Os pais de Colleen Abdoulah ajudaram a filhaa desenvolver um conjunto de valores pessoais fortes. Por exemplo, seu pai enfatizava que “não importa quanto ganha, você não é melhor do que os outros e eles não são melhores do que você”, lembra Abdoulah. Ela também aprendeu a importância de ter coragem para fazer a coisa certa de se relacionar com pessoas para que tivessem um sentimento de pertencimento. Além de praticar esses valores pessoais todos os dias, Abdoulah os injeta na Wide Open West, a empresa de Internet, TV a cabo e telefonia OA4 DEBATE As empresas devem utilizar testes de personalidade para selecionar candidatos? A teoria da personalidade fez avanços significativos nas últimas duas décadas, especialmente no que trata de de- monstrar que traços específicos estão associados com com- portamentos e resultados de trabalho específicos. Diversos estudos relatam que certas dimensões Big Five preveem o desempenho geral no trabalho, cidadania organizacional, liderança, comportamentos de trabalho contraproducen- tes, desempenho de treinamento, desempenho de equipe e diversos outros resultados importantes. Essas descobertas são um voto de peso em favor dos testes de personalidade no local de trabalho. Mas alguns especialistas proeminentes no campo da per- sonalidade aconselham cautela.52 Eles lembram que, apesar dos traços estarem relativamente associados a comportamen- tos no local de trabalho, existem outros preditores melhores para o desempenho de trabalho, como amostras de trabalho e desempenho pregresso. Além do mais, os procedimentos de seleção muitas vezes pressupõem que quanto mais de um de- terminado traço, melhor, mas diversos estudos (ainda que não todos) indicam que os melhores candidatos podem estar mais próximos do ponto médio do que dos extremos da amplitude.53 Por exemplo, o desempenho de trabalho parece aumentar com a escrupulosidade, mas funcionários altamente escrupu- losos podem ser tão dedicados que se tornam perfeccionistas, o que pode prejudicar o desempenho em vez de fortalecê-lo.54 Uma terceira preocupação é que, dependendo de como são aplicados os resultados do teste, os instrumentos de perso- nalidade podem prejudicar injustamente determinados grupos de pessoas.55 Uma quarta preocupação é que os testes de personalida- des costumam ser estruturados na forma de escalas autopre- enchidas, de modo que os candidatos podem tentar mentir em suas respostas. Pior ainda, os resultados podem não repre- sentar a personalidade do indivíduo ou qualquer outra carac- terística significativa, pois os respondentes muitas vezes não sabem quais traços de personalidade a empresa está buscan- do. Os estudos mostram que os candidatos tentam falsificar resultados de personalidade “bons” para alterar os resulta- dos da seleção. Os defensores dos testes de personalidade respondem que poucos candidatos tentam falsificar suas res- postas (ou seja, Christina é uma exceção).56 Um grande estudo recente descobriu que observadores estimam a maioria das dimensões de personalidade melhor do que autoavaliações, mas poucas empresas utilizam avaliações de terceiros.57 Finalmente, os testes de personalidade podem não comuni- car uma imagem favorável da empresa. O uso de testes de per- sonalidade por parte da Amtrak na Metrolink resultou em con- flitos com o sindicato dos ferroviários. As operações britânicas da PricewaterhouseCoopers (PwC) descobriram que seus tes- tes de personalidade desincentivavam as candidatas do sexo feminino devido a preocupações com a impessoalidade dos testes e a facilidade de falsificar resultados. “Nosso teste de personalidade era visto como alienador pelas mulheres, então foi preciso reagir”, afirma o diretor de diversidade da PwC.58 McSchane_02.indd 42McSchane_02.indd 42 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 43 de Denver com 1.300 funcionários da qual ela é CEO. “[Nossos funcionários] demonstram a coragem para fazer a coisa certa, atendem uns aos outros e aos clientes com humildade e comemoram nossas aprendizagens e sucessos com elegância”, diz Abdoulah. “Qualquer um pode estabelecer valores, mas nós operacionalizamos os nossos para que afetem tudo que fazemos, todos os dias”.59 Colleen Abdoulah e outros profissionais de sucesso costumam fazer referência a seus va- lores pessoais e aos eventos críticos que formaram esses valores em sua juventude. Os valores, um conceito que introduzimos no Capítulo 1, são crenças estáveis e avaliativas que guiam nossas preferências por resultados ou cursos de ação em uma série de situações.60 São per- cepções conscientes sobre o que é bom ou ruim, certo ou errado. Os valores nos dizem o que “deveríamos” fazer. Eles servem como uma bússola moral que direciona nossa motivação e, potencialmente, nossas decisões e ações. As pessoas organizam os valores em uma hierarquia chamada sistema de valores. Algu- mas valorizam novos desafios mais do que a conformidade. Outras, mais a generosidade do que a frugalidade. O sistema de valores exclusivo de cada pessoa é desenvolvido e reforçado pela socialização por meio dos pais, das instituições religiosas, dos amigos, das experiências pessoais e da sociedade na qual vive. Assim, a hierarquia de valores de uma pessoa é estável e duradoura. Por exemplo, um estudo constatou que os sistemas de valores de uma amostra de adolescentes era notavelmente similar depois de 20 anos, quando adultos.61 Repare que a nossa descrição dos valores se concentrou em indivíduos, enquanto os exe- cutivos muitas vezes descrevem os valores como se pertencessem à organização. Na realidade, os valores existem apenas nos indivíduos; nós os chamamos de valores pessoais. No entanto, grupos de pessoas podem ter valores iguais ou similares, então tendemos a atribuir esses va- lores compartilhados à equipe, departamento, organização, profissão ou sociedade como um todo. Os valores compartilhados pelas pessoas em toda a empresa (valores organizacionais) receberão uma discussão mais completa no Capítulo 14, pois são uma parte fundamental da cultura empresarial. Os valores compartilhados pela sociedade (valores culturais) serão deta- lhados mais adiante, neste capítulo. Os valores e traços de personalidade estão relacionados entre si, mas os dois conceitos possuem algumas diferenças.62 A distinção mais importante é que os valores são avaliativos, ou seja, nos informam o que deveríamos fazer, enquanto os traços de personalidade descre- vem como tendemos naturalmente a agir. A segunda distinção é que os traços de personali- dade têm níveis de conflito relativamente baixos entre si (ex.: é possível ter alta sociabilidade e alta introversão), enquanto alguns valores se opõem a outros. Por exemplo, uma pessoa que valoriza a animação e os desafios teria dificuldade em valorizar a estabilidade e a moderação. Terceiro, apesar da personalidade e os valores serem determinados em parte pela heredita- riedade, os valores são muito mais influenciados pela socialização, enquanto os traços de personalidade são muito mais influenciados pela hereditariedade. Tipos de valores Os valores assumem várias formas e os especialistas no tema dedicaram uma atenção conside- rável a organizá-los em grupos. Várias décadas atrás, o psicólogo social Milton Rokeach desen- volveu duas listas de valores, distinguindo os meios (valores instrumentais) dos objetivos finais (valores terminais). Embora as listas de Rokeach ainda sejam mencionadas em algumas fontes sobre comportamento organizacional, elas foram substituídas por outro modelo quase duas décadas atrás. A distinção entre valores instrumentais e terminais não era precisa nem útil, e o modelo de Rokeach ignorava valores que agora estão incluídos no atual modelo dominante. Atualmente, o modelo de valores pessoais mais aceitado é o Circumplexo de Valores de Schwartz.63 Desenvolvido e testado pelo psicólogo social Shalom Schwartz e seus colegas, o modelo organiza 57 valores em 10 conjuntos no modelo circular (circumplexo) apresentadona Figura 2.5.64 Estudos realizados em todo o mundo demonstram consistentemente que os 57 valores se agrupam nessas 10 categorias. Por exemplo, o conformismo inclui os valores específicos da polidez, respeito aos pais, autodisciplina e obediência. Além disso, os dez agru- pamentos de valores estão associados uns com os outros de maneiras similares ou opostas. Por exemplo, o grupo de valores da benevolência é semelhante (correlacionado positivamente com) ao universalismo, mas oposto (correlacionado negativamente com) ao hedonismo. McSchane_02.indd 43McSchane_02.indd 43 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 44 PARTE II Comportamento Individual e Processos O modelo do circumplexo também organiza as dez categorias de valores em quatro qua- drantes. • Abertura à mudança. O quadrante representa a motivação para buscar procedimentos inovadores. Ela inclui as categorias de valor da autodireção (criatividade, independên- cia de pensamento), estímulo (entusiasmo e desafio) e hedonismo (busca do prazer, fruição, gratificação de desejos). • Conservadorismo. Oposto à abertura à mudança, o quadrante representa a motivação para preservar o status quo. Ele inclui as categorias de valores da conformidade (adesão às normas e expectativas sociais), proteção (segurança e estabilidade) e tradição (mo- deração e preservação das coisas como estão). • Autovalorização. O quadrante se refere a quanto uma pessoa se sente motivada pelo interesse próprio. Ele abrange as categorias de valor da realização (busca do sucesso pessoal), poder (domínio sobre as outras pessoas) e hedonismo (categoria de valor compartilhada com a abertura à mudança). • Autotranscendência. O quadrante, oposto à autovalorização, representa a motivação da pessoa para promover o bem-estar alheio e da natureza. Ela inclui os valores da bene- volência (preocupação com a vida de alguém) e do universalismo (preocupação com o bem-estar de todas as pessoas e da natureza). Valores e comportamento individual Os valores pessoais guiam nossas decisões e ações até certo ponto, mas essa conexão nem sempre é tão forte quanto muita gente acredita. O comportamento habitual tende a ser coe- rente com os nossos valores, mas nossas decisões diárias e ações conscientes aplicam nossos valores de forma bem menos coerente. A principal razão para a distância entre os valores Autotranscendência Autovalorização Universalismo Tradição Benevolência Conformismo Segurança Poder Realização Hedonismo Estimulação Autodireção Conservadorismo Abertura à mudança FIGURA 2.5 Circumplexo dos valores de Schwartz. Fontes: S. H. Schwartz, “Universals in the Content and Structure of Values: Theoretical Advances and Empirical Tests in 20 Countries,” Advances in Experimental Social Psychology 25 (1992), pp. 1–65; S. H. Schwartz and G. Sagie, “Value Consensus and Importance: A Cross-National Study,” Journal of Cross-Cultural Psychology 31 (July 2000), pp. 465–97. McSchane_02.indd 44McSchane_02.indd 44 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 45 pessoais e o comportamento individual é que os valores são conceitos abstratos, de modo que sua relevância em situações específicas quase nunca é óbvia. Três condições reforçam a ligação entre os valores pessoais e o comportamento.65 Primei- ro, tendemos a aplicar nossos valores apenas quando podemos pensar em razões específi- cas para fazê-lo. Em outras palavras, precisamos de motivos lógicos para empregar um valor específico em uma situação específica. Segundo, tendemos a aplicar nossos valores quando a situação permite ou encoraja tal ação. Os ambientes de trabalho influenciam nosso com- portamento, pelo menos no curto prazo, então eles necessariamente encorajam ou desenco- rajam comportamentos consistentes com nossos valores. Terceiro, somos mais propensos a empregar os valores quando pensamos ativamente sobre eles. Isso ocorre naturalmente quan- do somos confrontados com situações que obviamente violam nossos valores. Por exemplo, quando pedem que realize uma tarefa arriscada, você fica ciente de toda a sua segurança. Também ficamos mais cientes de nossos valores (e, por consequência, agimos de modo consistente com eles) quando somos literalmente lembrados deles por terceiros. O efeito fica claro em um estudo recente:66 Os estudantes responderam uma prova de matemática e foram pagos por cada resposta correta. Um grupo entregou os resultados para avaliação por parte do pesquisador, para que não pudessem mentir sobre os resultados. Um segundo grupo podia mentir, pois corrigia a própria prova e informava o experimentador sobre o resultado. Um terceiro grupo era semelhante ao segundo (corrigia sua própria prova), mas precisava assinar seu nome sob a seguinte declaração: “Compreendo que esta pequena pesquisa é abrangida pelo código de honra da Universidade” (a universidade não possuía um código de honra). Os pesquisadores estimam que alguns alunos trapacearam quando corrigiram suas próprias provas sem a afirmação sobre o “código de honra”, mas nenhum dos alunos que recebeu o formulário com o “código de honra” mentiu sobre os resultados. Os resultados foram seme- lhantes quando, em vez da afirmação sobre honra, o terceiro grupo foi solicitado a repetir os Dez Mandamentos. A mensagem é que as pessoas têm maior probabilidade de aplicar seus valores (honestidade, no caso) quando lembradas explicitamente deles. Congruência de valores Os valores nos dizem o que é certo ou errado e o que deveríamos fazer. Essa característica avaliativa afeta nosso conforto com organizações e indivíduos específicos. O conceito funda- mental é a congruência de valores, ou seja, a semelhança entre a hierarquia de valores pessoais de um indivíduo a hierarquia de valores da organização, de um colega ou de outra fonte de comparação. A congruência de valores pessoa-organização ocorre quando os valores de um indivíduo são semelhantes aos valores dominantes de uma organização. Essa forma de congruência de valores aumenta (em certa medida) a probabilidade de que os funcionários tomem decisões e ajam de maneiras consistentes com as expectativas organizacionais, além de gerar maior satisfação, lealdade e cidadania organizacional no trabalho e menos estresse e rotatividade.67 “A realização mais difícil, embora recompensadora, em qualquer carreira é ‘viver com fidelidade’ a seus valores e encontrar empresas onde você possa contribuir no nível mais elevado e ao mesmo tempo ser você mesmo, de maneira autêntica”, afirma Cynthia Schwalm, executiva sênior da Optimer Pharmaceuticals na cidade de Nova Iorque.68 As empresas mais bem-sucedidas empregam pessoas cujos valores pessoais são idênticos aos valores da organização? Nem de perto! Embora um grau confortável de congruência de valores seja necessário pelos motivos mencionados acima, as empresas também se beneficiam de algum nível de incongruência. Os funcionários com valores diversos oferecem perspecti- vas diferentes que podem levar a melhores decisões. Além disso, congruência demais pode criar uma “seita corporativa” que pode minar a criatividade, a flexibilidade organizacional e a ética empresarial. Um segundo tipo de congruência de valores envolve a medida da coerência dos valores aparentes nas nossas ações (valores promulgados) com o que dizemos que acreditamos (va- lores defendidos). A congruência de valores defendidos e promulgados é especialmente impor- tante para as pessoas em posições de liderança, pois qualquer lacuna óbvia entre os valores defendidos e os promulgados mina a sua integridade percebida, que é uma característica im- portante dos líderes eficazes. Uma pesquisa global relatou que 55% dos funcionários acredi- tam que a alta gerência se comporta de modo coerente com os valores centrais da empresa.70 McSchane_02.indd 45McSchane_02.indd 45 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 46 PARTE II Comportamento Individual e Processos Algumas empresas tentam manter níveis elevados decongruência de valores defendidos e promulgados fazendo um levantamento entre subordinados e colegas sobre se as decisões e ações do gestor são coerentes com os valores promulgados pela empresa. Um terceiro tipo, a congruência de valores organização-comunidade, abrange a semelhança entre os valores dominantes de uma organização e os valores predominantes da comunidade ou sociedade na qual realiza negócios.71 Uma empresa sediada em um determinado país que tenta impor seu sistema de valores aos funcionários e a outras partes interessadas localizadas em outra cultura pode sofrer de alta rotatividade de funcionários e ter relações mais difíceis com as comunidades nas quais opera. Assim, a globalização exige um certo malabarismo: as empresas dependem de valores compartilhados para manter padrões e comportamentos coerentes, mas precisam operar dentro dos valores das diferentes culturas em todo o mundo. VALORES ÉTICOS E COMPORTAMENTO Quando precisam identificar o atributo mais importante de um líder, os funcionários cos- tumam mencionar inteligência, decisão e compaixão, mas nenhuma dessas características fica em primeiro lugar. Em inúmeros levantamentos, os funcionários costumam escolher a honestidade ou a ética como a característica mais importante dos líderes corporativos efica- zes.72 Ética refere-se ao estudo dos princípios ou valores morais que determinam se as ações são certas ou erradas e se os resultados são bons ou ruins (ver Capítulo 1). As pessoas se ba- seiam em seus valores éticos para determinar “a coisa certa a se fazer”. A conduta empresarial ética é integrada aos programas de negócios e aparece regularmente no noticiário, ainda que não pareça haver nenhum declínio perceptível nas transgressões. Em uma pesquisa recente, quase metade dos funcionários americanos afirmou ter testemunhado desvios de conduta no trabalho, como uso ilegítimo dos recursos da empresa, comportamento abusivo, mentir para os funcionários, abuso no uso de e-mail ou Internet, conflitos de interesse, discriminação e mentir para as partes interessadas externas à empresa.73 A Figura 2.7 lista os países menos corruptos do mundo. Três princípios éticos Para compreender melhor a ética empresarial, precisamos considerar três tipos distintos de princípios éticos: utilitarismo, direitos individuais e justiça distributiva.75 Embora seus valores pessoais possam empurrar você mais para um princípio do que para os outros, OA5 Logo depois de ir trabalhar na Chick-fil-A, antes mesmo de se formar no Ensino Médio, Scott Reed (direita) descobriu que os fortes valores familiares da rede de restaurantes eram semelhantes a seus próprios valores pessoais. “Os valores fundamentais da Chick-fil-A se alinham bem com os meus”, afirma Reed, que abriu uma franquia da rede em Marietta, no estado da Geórgia, após se formar na universidade duas décadas atrás. Os dois irmãos de Reed também trabalharam na empresa por vários anos. Lauren McGuire, sua irmã, se tornou franqueada da Chick-fil-A recentemente. A con- gruência de valores também foi um fator importante. “É uma empresa que representa meus princípios de corpo e alma”, explica McGuire.69 McSchane_02.indd 46McSchane_02.indd 46 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 47 todos os três devem ser considerados ativamente para colocar em teste as questões éticas importantes. • Utilitarismo. O princípio aconselha a buscar o maior bem para o maior número de pessoas. Em outras palavras, devemos escolher a opção que proporcione o mais alto grau de satisfação para as pessoas afetadas. O conceito também é conhecido como princípio da consequência, pois se concentra nas consequências das nossas ações e não em como as realizamos. Um problema com o utilitarismo é que é quase impossível avaliar os benefícios ou custos de muitas decisões, particularmente quando as partes interessadas têm necessidades e valores divergentes. Outro problema é que a maioria de nós não se sente confortável ao adotar comportamentos que parecem antiéticos para alcançar resultados éticos. • Direitos individuais. O princípio reflete a crença de que todas as pessoas têm direitos que as permitem agir de certa maneira. Alguns dos direitos mais citados são o da liber- dade de ir e vir, segurança física, liberdade de expressão, julgamento justo e proibição da tortura. O princípio dos direitos individuais inclui mais do que direitos legais, mas também os direitos humanos, concedidos a todas as pessoas como uma norma moral da sociedade. Um problema com os direitos individuais é que uns podem conflitar com outros. O direito dos acionistas de serem informados sobre as atividades da empresa pode acabar conflitando com o direito de um executivo à privacidade, por exemplo. • Justiça distributiva. O princípio sugere que as pessoas similares às outras devem re- ceber benefícios e ônus similares; os que são diferentes devem receber benefícios e ônus diferentes na proporção da sua dessemelhança. Por exemplo, esperamos que dois funcionários que contribuem igualmente em seu trabalho recebam recompensas similares, enquanto os que fazem uma contribuição menor devem receber menos. Uma variação do princípio da justiça distributiva diz que as desigualdades são aceitá- veis quando beneficiam os menos favorecidos na sociedade. Assim, os funcionários em empregos arriscados devem ser mais bem pagos se o seu trabalho beneficiar ou- tras pessoas menos favorecidas. Um problema com o princípio da justiça distributiva trata da dificuldade em chegar a um consenso sobre quem é similar e quais fatores são relevantes. FATOR DE INTENSIDADE MORAL QUESTÃO DE INTENSIDADE MORAL A INTENSIDADE MORAL É MAIS ELEVADA QUANDO Magnitude das consequências Quanto dano ou benefício ocorrerá às outras pes- soas em consequência dessa ação? O dano ou benefício é maior. Consenso social Quantas outras pessoas concordam que essa ação é eticamente boa ou má? Muitas pessoas concordam. Probabilidade do efeito (a) Qual é a chance dessa ação vir a ocorrer? (b) Qual é a chance dessa ação vir a causar conse- quências boas ou más? A probabilidade é maior. Imediatismo temporal Quanto tempo depois da ação as consequências ocorrerão? O intervalo de tempo é mais curto. Proximidade O quão próximas de mim em termos sociais, psico- lógicos e/ou físicos estão as pessoas afetadas por esta decisão? As pessoas afetadas estão mais próximas e não distantes. Concentração do efeito (a) Quantas pessoas são afetadas por esta ação? (b) As pessoas afetadas por esta ação podem ser identificadas facilmente como um grupo? Muitas pessoas são afetadas. As pessoas afetadas são identificadas facilmente como um grupo. FIGURA 2.6 Fatores que influenciam a intensidade moral percebida.* *Estes são fatores que as pessoas tendem a questionar consigo mesmas quando determinam a intensidade moral de uma questão. Se algumas des- sas questões devem ser relevantes é em si uma questão ética. Fonte: Baseado em informações de T. J. Jones, “Ethical Decision Making by Individuals in Organizations: An Issue Contingent Model,” Academy of Management Review 16 (1991), pp. 366–95. McSchane_02.indd 47McSchane_02.indd 47 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 48 PARTE II Comportamento Individual e Processos Intensidade moral, sensibilidade ética e influências situacionais Além dos princípios éticos e seus valores subjacentes, outros quatro fatores influenciam a conduta ética no ambiente de trabalho: a intensidade moral de uma questão, a sensibilidade ética de um indivíduo, os fatores situacionais e a atenciosidade.76 Intensidade moral é quanto uma questão exige a aplicação de princípios éticos. As decisões com alta intensidade moral são mais importantes, então o tomador de decisão deve ser mais cauteloso ao aplicar princí- pios para resolvê-las. Diversos fatores influenciam a intensidade moral de uma questão, in- cluindo aqueles listados na Figura 2.6. Lembre-se de que a lista representaos fatores sobre os quais as pessoas tendem a pensar; alguns podem não ser considerados moralmente aceitáveis quando as pessoas tomam formalmente decisões éticas.77 Mesmo que uma questão tenha alta intensidade moral, alguns funcionários podem não reconhecer sua importância ética porque possuem baixa sensibilidade ética. A sensibilidade ética é uma característica pessoal que capacita as pessoas a reconhecerem a presença de uma questão ética e determinarem sua importância relativa.78 As pessoas eticamente sensíveis não são necessariamente mais éticas, mas sim mais propensas a detectar se uma questão requer consideração ética, ou seja, elas conseguem estimar com mais precisão a intensidade moral da questão. As pessoas eticamente sensíveis tendem a ter uma empatia maior, e têm mais informações sobre a situação específica. Por exemplo, os contadores seriam mais eticamente sensíveis em relação à pertinência de procedimentos contábeis específicos do que alguém que não recebeu treinamento nessa profissão. O terceiro fator explica por que as pessoas boas se envolvem em decisões e comportamen- tos antiéticos: é a situação na qual ocorre a conduta. Os funcionários afirmam que a alta gerên- cia os pressiona regularmente para mentir para os clientes, violar as normas ou cometer outros atos antiéticos. Segundo uma pesquisa global com gestores e gerentes de recursos humanos, a pressão proveniente da alta gerência ou do conselho de administração para cumprir prazos e objetivos empresariais irreais é a principal causa de comportamento empresarial antiético.79 Os fatores situacio- nais não justificam a conduta antiética. Em vez disso, pre- cisamos estar a par desses fatores para que as organizações possam reduzir sua influência no futuro. CATEGORIA PAÍS PONTUAÇÃO CATEGORIA PAÍS PONTUAÇÃO 1 Dinamarca 9,3 11 Islândia 8,5 1 Nova Zelândia 9,3 11 Luxemburgo 8,5 1 Singapura 9,3 13 Hong Kong 8,4 4 Finlândia 9,2 14 Irlanda 8,0 4 Suécia 9,2 15 Áustria 7,9 6 Canadá 8,9 15 Alemanha 7,9 7 Holanda 8,8 17 Barbados 7,8 8 Austrália 8,7 17 Japão 7,8 8 Suíça 8,7 19 Qatar 7,7 10 Noruega 8,6 20 Reino Unido 7,6 FIGURA 2.7 Os vinte países menos corruptos do mundo.74 Fonte: Os resultados de 2010 vêm do Corruption Perceptions Index publicado pela Transparency Interna- tional. O índice é calculado com base em até 13 relatórios. Reproduzido de Corruption Perceptions Index. Copyright © 2010 Transparency International: the global coalition against corruption. Usado com permissão. Para mais informações, visite http://www.transparency.org. intensidade moral Quanto uma questão exige a aplicação de princípios éticos. sensibilidade ética Uma característica pessoal que capacita as pessoas a reco- nhecerem a presença de uma questão ética e determinarem sua importância relativa. McSchane_02.indd 48McSchane_02.indd 48 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 49 Um último motivo para as pessoas participarem de condutas antiéticas é que elas se com- portam de maneira irracional. Em outras palavras, elas não pensam conscientemente sobre a ética de suas ações.80 Como explicamos anteriormente neste capítulo, as pessoas seguem seus valores apenas quando pensam sobre eles. As pesquisas sugerem que muitos comportamen- tos ocorrem no piloto automático, então os funcionários raramente avaliam se suas ações violam seus valores pessoais ou princípios éticos. O comportamento irracional é particular- mente comum quando (uma situação frequente) os funcionários estão localizados longe das situações em que suas decisões produzem impacto (ou seja, baixa intensidade moral). O comportamento irracional também é apoiado por pressupostos de que os principais tomadores de decisão possuem altos padrões morais. Os funcionários desprezam as preo- cupações éticas com seu trabalho quando acreditam que o chefe que designou a tarefa é ine- rentemente ético. Por exemplo, um dos maiores casos de fraude contábil ocorreu por que o diretor financeiro da empresa era altamente respeitado no setor, de modo que os funcionários imaginaram que ele estava introduzindo procedimentos con- tábeis inovadores dentro dos limites da lei. Na realidade, suas atividades eram formas extremas de fraude contábil.81 Apoiar o comportamento ético A maioria das empresas de grande e médio porte aplica uma ou mais estratégias para melhorar a conduta ética. Um dos passos mais básicos nesse sentido é elaborar um código de conduta ética, ou seja, uma de- claração sobre as práticas desejadas, regras de conduta e filosofia sobre o relaciona- mento da organização com suas partes in- teressadas e o meio ambiente. Quase todas as empresas da lista Fortune 500 nos Esta- dos Unidos e a maior parte das 500 maiores empresas da Grã-Bretanha possuem códi- gos de ética.82 O objetivo desses códigos é motivar e orientar o comportamento dos funcionários, sinalizar a importância da conduta ética e fortalecer a confiança na empresa por parte das partes interessadas. Mas os críticos sugerem que elas não têm muito sucesso na redução da conduta anti- ética. Um exemplo flagrante é que a Enron tinha um código de ética bem desenvol- vido, mas os altos executivos da empresa ainda se envolveram em transgressões em grande escala, resultando na falência da empresa de energia.83 Muitas empresas complementam os códigos de ética com treinamento em éti- ca. Na Texas Instruments, os funcionários recebem um panfleto do tamanho de um cartão de visitas. Nele, as seguintes per- guntas devem funcionar como sua bússola moral: “A ação é legal? Ela está de acordo com nossos valores? Se você fizer isso, vai A Texas Instruments (TI) é considerada uma das empresas mais éticas e bem conceituadas do mundo. A TI dá a cada funcionário o “Livreto de Ética da TI” (disponível em 10 idiomas), que inclui os códigos de ética da empresa de produtos eletrônicos e sete perguntas usadas para orientar os funcionários em dilemas éticos. O escritório de ética da TI possui uma linha- -direta confidencial. Os funcionários precisam completar uma série de pequenas módulos de treinamento em ética e conformidade por computador para cada unidade de negócios. “Queremos que os funcionários tenham as ferramentas e o treinamento que precisam para trabalhar dentro da lei e das normas da TI, e para preservar nossa reputação de empresa que opera com integridade”, afirma David Reid, vice-presidente da TI e diretor de ética e confor- midade da empresa.85 McSchane_02.indd 49McSchane_02.indd 49 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 50 PARTE II Comportamento Individual e Processos se sentir mal? Como ficaria se saísse no jornal? Se você sabe que é errado, não faça! Se não tem certeza, pergunte. Continue perguntando até ouvir uma resposta”. A Molson Coors de- senvolveu um premiado programa de treinamento on-line em forma de uma expedição: os funcionários devem resolver as violações éticas em cada “acampamento” à medida que esca- lam uma montanha. Os primeiros acampamentos apresentam cenários reais com violações relativamente claras da códigos de ética da empresa, enquanto fases posteriores apresentam dilemas mais ambíguos, exigindo uma reflexão mais cuidadosa sobre os valores fundamen- tais da organização.84 Algumas empresas também têm maneiras de comunicar transgressões confidencialmen- te, como uma “linha direta” anônima ou um link na web que os funcionários podem acessar para discutir questões éticas ou preocupações com a conduta ética. Algumas empresas em- pregam ombudsmans de ética que recebem informações confidenciais dos funcionários e in- vestigam possíveis transgressões proativamente. As auditorias éticas também são conduzidas em algumas organizações, mas são mais comuns em avaliações de práticas de responsabilida- de social da empresa.86 Essas medidas adicionais apoiam a conduta ética até certo ponto, mas a base mais po- derosa é um conjunto de valores compartilhados que reforce a conduta ética. “Se você não tiver umacultura de tomada de decisão ética, todos os controles e normas de conformidade que você se preocupar em implantar não necessariamente impedirão o desvio da conduta ética”, alerta um alto executivo da gigante britânica das comunicações Vodafone. Essa cultura é apoiada pela conduta ética e pela vigilância dos líderes empresariais. Ao agirem com os mais elevados padrões de conduta moral, os líderes não só ganham apoio e confiança dos seguidores, eles também modelam os padrões éticos que os funcionários são mais propensos a seguir.87 VALORES INTERCULTURAIS Sean Billing trabalhava como diretor de hotelaria no Fairmont Hotels, em Chicago, quando casualmente perguntou ao seu chefe se a rede de hotéis poderia usar as habilidades e conheci- mentos dele em outro lugar. Logo depois, a Fairmont transferiu Billing para uma vaga admi- nistrativa no Quênia, com a missão de elevar as novas propriedades da rede no país africano aos padrões internacionais mediante treinamento e tecnologia, sem perder o caráter quenia- no diferenciado. Billing aproveitou a oportunidade, mas logo descobriu o desafio de incutir em outra cultura os valores profundos da Fairmont de atendimento ao cliente, ambientalismo e capacitação. “É um pouco de choque cultural hoteleiro… as coisas são bem diferentes aqui”, admitiu Billing.88 A Fairmont Hotels & Resorts opera hotéis de nível internacional em vários países e está ávida para ajudar Sean Billing e outros funcionários a desenvolverem e reforçarem sua com- petência intercultural. Como descreve a seção Conexões 2.1, as pessoas pensam e agem de maneiras diferentes em culturas diversas e essas diferenças se devem a normas singulares de comportamento e também à ênfase em valores diferentes. Individualismo e coletivismo Dos muitos valores estudados entre culturas, os cinco resumidos na Figura 2.8 são os mais populares. A figura também lista os países que dão ênfase alta, média ou baixa a esses valores. Dois valores interculturais aparentemente inseparáveis são o individualismo e o coletivismo. O individualismo representa a valorização da independência e da singularidade pessoal. As pessoas altamente individualistas valorizam a liberdade pessoal, a autossuficiência, o con- trole sobre as próprias vidas e a apreciação das qualidades exclusivas que as distinguem das demais. Americanos, chilenos, canadenses e sul-africanos costumam ter níveis altos de in- dividualismo, enquanto Taiwan e Venezuela são países com baixo nível de individualismo.90 O coletivismo representa a valorização das nossas obrigações em relação aos grupos dos quais participamos e à harmonia do grupo. As pessoas com alto coletivismo se definem pela participação nos grupos, enfatizam sua conexão pessoal com outros membros do grupo e va- lorizam os objetivos e o bem-estar das pessoas nesses grupos.91 Países com baixo coletivismo OA6 McSchane_02.indd 50McSchane_02.indd 50 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 51 incluem Estados Unidos, Japão e Alemanha, enquanto os israelenses e taiwaneses têm níveis relativamente altos de coletivismo. Ao contrário do que muitos acreditam, individualismo não é o oposto do coletivismo. Na verdade, uma análise da maioria dos estudos anteriores mostrou que os dois conceitos não guardam uma relação entre si.92 Por exemplo, as culturas que valorizam muito a obrigação com o grupo ao qual uma pessoa pertence não dão necessariamente uma baixa prioridade à liberdade pessoal e à singularidade. Em geral, as pessoas em todas as culturas se definem tanto pela sua singularidade quanto por sua relação com as outras pessoas. É uma caracte- rística inerente do autoconceito de todos os indivíduos, tema analisado no próximo capítulo. Algumas culturas claramente enfatizam a singularidade ou as obrigações com o grupo mais do que outras, mas ambos têm seu lugar nos valores e no autoconceito das pessoas. Observe também que os japoneses têm níveis relativamente baixos de coletivismo, ao contrário do que afirmam muitos livros sobre relações interculturais, que dizem que o Japão é um dos países mais coletivistas do mundo! Esse erro de in- terpretação histórico têm muitas explicações, desde proble- mas com a definição e mensuração do coletivismo a relatos errôneos das primeiras pesquisas interculturais. Indepen- dente dos motivos, os estudos são consistentes em informar que os japoneses tendem a ter níveis relativamente baixos de coletivismo e moderados de individualismo (como indi- cado na Figura 2.8).93 A Infosys aproxima as diferenças interculturais89 A Infosys Technologies, uma empresa de terceirização de tecnologia na Índia, estava preparada para as diferenças in- terculturais quando adquiriu uma empresa australiana. Sean Fernando, gerente-geral de recursos humanos da Infosys na Austrália, oferece um exemplo claro de uma dessas diferen- ças culturais: quando precisavam viajar a trabalho, os fun- cionários da Infosys na Índia faziam suas malas sem hesitar e estavam prontos para partir mesmo sem ter detalhes sobre a viagem. A equipe australiana, por outro lado, queria saber mais sobre as acomodações, diárias e detalhes do projeto an- tes de se sentir à vontade. Em outras palavras, os funcionários indianos tinham níveis significativamente menores de aversão à incerteza. Outra diferença é que a equipe indiana esperava que o chefe desse instruções sobre o que fazer, enquanto os aus- tralianos esperavam ser consultados. Em outras palavras, os funcionários australianos tinham níveis muito menores de distância do poder. Fernando lembra de um incidente no qual um gerente de projetos australiano se reuniu com uma equipe de projeto da índia. Ele descreveu o projeto e sugeriu que compartilhassem ideias sobre maneiras de completá-lo com sucesso. “Eles não sabiam o que ele queria dizer”, conta Fernando. “Então uma das pessoas simplesmente disse: ‘Es- távamos nos perguntando quando você ia nos contar qual é o plano’”. Para minimizar o conflito intercultural, a Infosys Austra- lia realiza sessões de três horas nas quais os funcionários de ambos os países aprendem sobre suas culturas e conversam sobre como gerenciar funcionários com valores diferentes. C O N E X Õ E S 2 . 1 A Infosys está treinando seus gerentes para se conscientizarem das diferenças interculturais quando trabalham com funcionários de outros países. individualismo Valor intercultural que descreve quanto as pessoas em uma cul- tura enfatizam a independência e a singularidade pessoal. coletivismo Valor intercultural que descreve quanto as pessoas em uma cul- tura enfatizam seu dever em rela- ção aos grupos aos quais perten- cem e à harmonia do grupo. McSchane_02.indd 51McSchane_02.indd 51 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 52 PARTE II Comportamento Individual e Processos Distância do poder Distância do poder refere-se a quanto as pessoas aceitam uma distribuição desigual de poder em uma sociedade.94 Indivíduos com alta distância do poder aceitam e valorizam o poder desigual. Eles valorizam a obediência à autoridade, sentem-se confortáveis em receber ordens de seus superiores sem consulta ou debate e preferem resolver as diferenças com procedimen- tos formais em vez de diretamente. As pessoas com baixa distância do poder, por outro lado, esperam uma divisão relativamente igual do poder. Elas encaram sua relação com o chefe como uma relação de interdependência, não de dependência; ou seja, acreditam que seu chefe também depende delas, então esperam divisão de poder e consulta antes que sejam tomadas decisões que as afetem. As pessoas da Índia e da Malásia tendem a ter alta distância do poder, enquanto os dinamarqueses e israelenses têm baixa distância do poder. Coletivamente, os americanos têm nível entre médio e baixo de distância do poder. Para entender o efeito da distância do poder, pense sobre a experiência de um engenhei- ro do sudeste asiático que imigrou para o Canadá pouco tempo atrás. Em seu paísde origem, o engenheiro gerava relatórios de análise de dados e os apresentava para seu supervisor sem fazer recomendações. O chefe analisava as informações factuais e tomava uma decisão. In- cluir recomendações nesses relatórios seria um desrespeito pela posição mais elevada do supervisor, o que teria resultado em demissão. Mas quando o engenheiro foi morar no Ca- nadá, seu chefe esperava que ele propusesse recomendações junto com os dados técnicos. Excluir as recomendações em um relatório de engenha- ria no Canadá seria sinal de incompetência, um motivo para demissão. Para perma- necer empregado, o enge- nheiro precisou superar uma enorme mudança em termos de expectativas e valores de distância do poder.95 VALOR EXEMPLOS DE PAÍSES CRENÇAS REPRESENTATIVAS/COMPORTAMENTOS EM CULTURAS “ALTAS” Individualismo Alto: Estados Unidos, Chile, Canadá, África do Sul Médio: Japão, Dinamarca Baixo: Taiwan, Venezuela Define o eu mais pela singularidade; objetivos pessoais têm prioridade; decisões têm pouca consideração sobre efeito entre outros; relacionamen- tos são vistos como mais instrumentais e fluidos. Coletivismo Alto: Israel, Taiwan Médio: Índia, Dinamarca Baixo: Estados Unidos, Alemanha, Japão Define o eu mais pela participação em um grupo; objetivos de autossacrifí- cio e harmonia têm prioridade; comportamento regulado por normas inter- nas do grupo; participações em grupos são vistas como estáveis, com forte diferenciação com grupos externos. Distância do poder Alto: Índia, Malásia Médio: Estados Unidos, Japão Baixo: Dinamarca, Israel Relutante em discordar ou contradizer o chefe; espera-se e prefere-se que os gerentes sejam tomadores de decisão; percepção de dependência (ver- sus interdependência) com o chefe. Aversão à incerteza Alto: Bélgica, Grécia Médio: Estados Unidos, Noruega Baixo: Dinamarca, Singapura Prefere situações previsíveis; valoriza emprego estável, leis estritas e baixo conflito; rejeita desvios do comportamento normal. Orientação para a realização Alto: Áustria, Japão Médio: Estados Unidos, Brasil Baixo: Suécia, Holanda Foco em resultados (versus relacionamentos); decisões baseadas em con- tribuição (equidade versus igualdade); baixa empatia ou demonstrações de emoções (versus forte empatia e solidariedade). FIGURA 2.8 Cinco valores interculturais. Fontes: As descrições e resultados sobre individualismo e coletivismo vêm da metanálise informada por D. Oyserman, H. M. Coon, and M. Kemmel- meier, “Rethinking Individualism and Collectivism: Evaluation of Theoretical Assumptions and Meta-Analyses,” Psychological Bulletin 128 (2002), pp. 3–72. As outras informações vêm de G. Hofstede, Culture’s Consequences, 2d ed. (Thousand Oaks, CA: Sage, 2001). distância do poder Valor intercultural que descre- ve quanto as pessoas em uma cultura aceitam a distribuição desigual de poder na socie- dade. aversão à incerteza Valor intercultural que descre- ve quanto as pessoas em uma cultura toleram a ambiguidade (baixa aversão à incerteza) ou se sentem ameaçadas pela ambiguidade e a incerteza (alta aversão à incerteza). orientação para realização/ proteção Valor intercultural que descre- ve quanto as pessoas em uma cultura enfatizam as relações competitivas versus colaborati- vas com as outras pessoas. McSchane_02.indd 52McSchane_02.indd 52 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 2 Comportamento, Personalidade e Valores Individuais 53 Aversão à incerteza Aversão à incerteza é quanto as pessoas toleram a ambiguidade (baixa aversão à incer- teza) ou se sentem ameaçadas pela ambiguidade e incerteza (alta aversão à incerteza). Os funcionários com alta aversão à incerteza preferem situações estruturadas nas quais as regras de conduta e tomada de decisão estão documentadas claramente. Em geral, eles preferem comunicações diretas e não ambíguas ou indiretas. A aversão à incerteza tende a ser alta na Bélgica e na Grécia e ainda mais elevada no Japão. Em geral, ela é baixa na Dinamarca e em Singapura. Coletivamente, os americanos têm nível entre médio e baixo de aversão à incerteza. Orientação para realização/proteção A orientação para realização/proteção reflete uma visão competitiva versus cooperativa das relações com outras pessoas.96 As pessoas com alta orientação para a realização valorizam a assertividade, a competitividade e o materialismo. Elas apreciam pessoas fortes e aceitam a acumulação de dinheiro e de bens materiais. As pessoas de culturas orientadas para a prote- ção, por outro lado, enfatizam os relacionamentos e o bem-estar alheio. Elas enfocam a inte- ração humana e a solidariedade, não a competição e o sucesso pessoal. A Suécia, a Noruega e a Holanda têm níveis bastante baixos de orientação para a realização (ou seja, têm forte orientação para a proteção). A Áustria e o Japão, por outro lado, têm altos níveis de orienta- ção para realização. Os Estados Unidos fica um pouco acima da média em orientação para realização/proteção. Ressalvas com conhecimento intercultural A pesquisa organizacional intercultural recebeu bastante atenção nas últimas duas décadas, provavelmente em consequência do crescimento da globalização e da diversidade cultural dentro das organizações. Nosso conhecimento sobre dinâmica intercultural se multiplicou e muitas dessas descobertas serão discutidas neste livro, especialmente com relação à liderança, à resolução de conflitos e às táticas de influência. Entretanto, também é preciso fazer algumas ressalvas sobre o conhecimento intercultural. Um problema é que muitos estudos dependem de amostras pequenas e convenientes (ex.: estudantes) para representar toda uma cultura.97 O resultado é que muitos estudos interculturais tiram conclusões que não podem ser generali- zadas para as culturas que pretendem representar. Um segundo problema é que os estudos interculturais muitas vezes pressupõem que cada país possui uma cultura.98 Na realidade, muitos países (incluindo os EUA) se tornaram culturalmente diversos. À medida que mais países adotam a globalização e o multicultura- lismo, torna-se ainda menos apropriado pressupor que cada país possui uma única cultura unificada. Uma terceira preocupação é que as pesquisas e textos sobre relações interculturais con- tinuam a depender de um grande estudo realizado quase quatro décadas atrás, com 116.000 funcionários da IBM em dezenas de países. O estudo estimulou muitas pesquisas intercultu- rais subsequentes, mas suas descobertas estão começando a ficar desatualizadas, pois os valo- res de algumas culturas mudaram com o passar dos anos. Por exemplo, parece estar havendo uma convergência de sistemas de valores na Ásia à medida que esses países interagem mais uns com os outros e adotam práticas de negócios padronizadas.99 Diversas análises recentes recomendam que estudos futuros não dependam do estudo da IBM como valores de referên- cia para determinadas culturas.100 Diversidade cultural nos Estados Unidos Lendo alguns estudos interculturais, é fácil imaginar que os Estados Unidos são um país ho- mogêneo no qual as pessoas têm crenças e valores idênticos ou bastante semelhantes. Obvia- mente, qualquer um que more nos EUA ou visite o país por tempo o suficiente sabe que isso não é verdade. Mas até os americanos podem se surpreender com a diversidade cultural do país, mesmo quando excluímos a incrível variedade de novos cidadãos que cresceu em outras partes do mundo.101 McSchane_02.indd 53McSchane_02.indd 53 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 54 PARTE II Comportamento Individual e Processos No Capítulo 1, descrevemos o alto nível de diversidade no local de trabalho nos Estados Unidos. As características de diversidade superficial estão em evolução constante, como a porcentagem crescente de americanos não brancos, e especialmente da população hispâni- ca como maior grupo étnico não branco dos EUA. Atualmente, entretanto, a maioria dos especialistas em diversidade no local de trabalho reconhece que a diversidade profunda émais importante e tem maior impacto no ambiente de trabalho. Essas diferenças em crenças, valores e expectativas muitas vezes se aglomeram em torno de fatores demográficos como idade, gênero e etnia. Em uma seção anterior deste capítulo, citamos evidências de que os Estados Unidos têm alto nível de individualismo e baixo de coletivismo. Essa generalização esconde variações significativas dentro do país. Uma metanálise de estudos anteriores revela que, em média, os afro-americanos são significativamente mais individualistas do que os brancos de origem europeia e hispânicos, enquanto os de origem asiática têm o menor nível de individualismo entre esses grupos demográficos. Os americanos de origem europeia têm níveis ligeiramente menores de coletivismo do que os de origem asiática e hispânica.102 Diversidade regional nos Estados Unidos Os Estados Unidos também possuem uma forte tradição de variações inter-regionais. Um estudo recente revela que os perfis de per- sonalidade típica variam entre as regiões. Os valores de neuroticismo são mais elevados no nordeste e sudeste do país e menores no meio-oeste e sudoeste. As regiões da Nova Inglaterra, Atlântico Central e Pacífico têm maior abertura para a experiência, enquanto os moradores dos estados das Grandes Planícies, do meio-oeste e do sudeste do país têm as menores pon- tuações. As diferenças regionais são menos marcantes para as outras dimensões de persona- lidade Big Five. Outros estudos revelaram agrupamentos regionais dos valores de Schwartz e outros sistemas de crença semelhantes.103 Além disso, alguns estudos informam que os ame- ricanos têm estereótipos distintos de pessoas de regiões diferentes e que tais estereótipos são semelhantes aos perfis de personalidade reais nessas regiões.104 O coletivismo também pare- ce variar no país. Usando indicadores sociais (porcentagem morando sozinho, profissionais independentes, residências com netos, etc.) e não levantamentos, um estudo informa que o coletivismo é mais forte nos estados do sul, na Califórnia e no Havaí, mas menor entre os estados das montanhas, noroeste e Grandes Planícies.105 Algumas possibilidades explicam a ocorrência das variações regionais.106 Uma explicação é que instituições locais, não nacionais (ex.: prefeituras, sistemas educacionais e grupos reli- giosos dominantes) influenciam as práticas de socialização, o que reforça os valores pessoais. Um argumento correlato é que, em parte, o ambiente natural molda a cultura. As pessoas podem enfatizar valores diferentes em consequência do ambiente físico (plano versus monta- nhoso), condições climáticas (temperado versus tropical) e condições socioeconômicas (bai- xa renda versus relativamente próspero). Uma terceira explicação é que as pessoas migram para locais que acreditam ser mais consistentes com seus valores e com a ideia que fazem de si mesmos. Uma pessoa criada no meio-oeste, por exemplo, poderia ficar mais motivada para morar na Califórnia se seus valores enfatizassem descoberta e mudança, não tradição e dedicação. Esse breve panorama da cultura americana destaca duas questões importantes. Primeiro, é preciso lembrar que os Estados Unidos, assim como muitos outros países, possuem diversas formas de diversidade superficial e profunda. Descrever os americanos como se fossem uma cultura homogênea é uma distorção da realidade. Segundo, a diversidade cultural se estende além das diferenças demográficas. Como observamos, os Estados Unidos possuem uma rica tradição de diversidade cultural entre regiões e esses agrupamentos são menos visíveis do que as diferenças demográficas. No Capítulo 1, também observamos que existem diferenças entre gerações. No geral, os líderes organizacionais e os funcionários precisam estar cientes dessas formas complexas de diversidade e se sensibilizarem com o quanto elas produzem variações em autoconceitos, percepções sociais e atitudes. Esses três temas serão examinados em mais detalhes nos próximos dois capítulos. McSchane_02.indd 54McSchane_02.indd 54 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 McShane_Iniciais.indd xxivMcShane_Iniciais.indd xxiv 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 Esta página foi deixada em branco intencionalmente. Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094 M175c McShane, Steven L. Comportamento organizacional : conhecimento emergente, realidade global [recurso eletrônico] / Steven L. McShane, Mary Ann Von Glinow ; tradução : Francisco Araújo da Costa. – 6. ed. – Porto Alegre : AMGH, 2014. Editado também como livro impresso em 2014. ISBN 978-85-8055-404-5 1. Comportamento organizacional. I. Von Glinow, Mary Ann. II. Título. CDU 005.32 McShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd iiMcShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd ii 28/07/14 13:4328/07/14 13:43 98 PARTE II Comportamento Individual e Processos tre os membros de duas operações residenciais holandesas para indivíduos com deficiências intelectuais, em compara- ção com membros que não receberam o treinamento. Nas primeiras fases do programa, os alunos aprenderam sobre o significado e o valor da IE, analisaram o feedback de seus pri- meiros testes de IE, aplicaram dimensões de IE a estudos de caso e desenvolveram dois objetivos pessoais para melhora- rem seus perfis de IE. As fases posteriores do programa con- sistiram em feedback profissional para os alunos com base em vídeos nos quais eles encontravam clientes difíceis.50 A Sony Europe incorpora o treinamento de IE em seu programa de desenvolvimento de executivos, e inclui um exercício em que os líderes mantêm um diário das suas expe- riências emocionais no decorrer de uma semana de trabalho. Na Exactech, Inc., uma fabricante de aparelhos ortopédicos, mais de vinte participantes do programa de desenvolvimento de liderança aprendem a melhorar suas habilidades de IE em autoconhecimento e interação com outros membros da equi- pe.51 Coaching individual, muita prática e feedback frequente são particularmente eficazes no desenvolvimento da IE. A inteligência emocional também aumenta com a idade, parte do processo chamado maturidade.52 Antes de mudarmos de assunto, precisamos mencionar o debate que existe sobre a IE enquanto conceito.53 O conceito não é tão claro quanto alguns autores gostariam. Mesmo o nome “inteligência” é errôneo, pois a IE é uma habilidade, não uma forma de inteligên- cia. Os críticos também sugerem que os traços de personalidade e inteligência gerais são redundantes com a maior parte da contribuição da IE para o conhecimento. Essas críticas são sérias, mas o significado da IE está ficando mais claro e diversos estudos (citados nas páginas anteriores) sugerem que a IE é relevante para o comportamento no local de trabalho. Em geral, a inteligência emocional oferece um potencial considerável, mas também temos muito que aprender a respeito da sua mensuração e de seus efeitos sobre as pessoas no local do trabalho. Até agora, este capítulo introduziu o modelo das emoções e atitudes e também a inteli- gência emocional como os meios pelos quais gerimos nossas emoções no local de trabalho. As duas seções seguintes analisam duas atitudes específicas: satisfação no trabalho e com- promisso com a organização. Essas duas atitudes são tão importantes na nossa compreensão do comportamento no local de trabalho que alguns especialistas sugerem que as duas sejam combinadas e chamadas de “postura profissional global”.54 SATISFAÇÃO NO TRABALHO A satisfação no trabalho é a avaliação que uma pessoa faz do próprio emprego e do seu contexto profissional. Ela é provavelmente a atitude mais estudada no comportamento orga- nizacional.55 Trata-se de uma apreciação das características percebidas do trabalho, do am- biente de trabalho e das experiências emocionais nele vividas. Os funcionários satisfeitos têm avaliações favoráveis de seus empregos, baseadas em suas observações e experiências emo- cionais. A satisfação no trabalho pode ser considerada uma coleção de atitudesa respeito de diferentes aspectos do contexto de emprego e trabalho. Você pode gostar dos seus colegas de trabalho, mas pode estar menos satisfeito com a sua carga de trabalho, por exemplo. Em que medida os funcionários estão satisfeitos no trabalho? A resposta depende da pes- soa e do local de trabalho, mas também depende do país. Pesquisas globais indicam com alguma consistência que a satisfação no trabalho tende a ser maior nos países nórdicos (Di- namarca, Suécia, Noruega e Finlândia), bem como na Índia e nos Estados Unidos. Os níveis mais baixos de satisfação global no emprego são registrados normalmente na Hungria e em OA3 satisfação no trabalho Avaliação que uma pessoa faz do próprio emprego e do seu contexto profissional. A inteligência emocional é um preditor significativo do completamen- te com êxito do programa de treinamento intenso para socorristas paraquedistas da Força Aérea dos EUA. Os candidatos com melhor autoconsciência de suas emoções, que sabem gerenciá-las e manter o otimismo e uma atitude positiva, têm maior probabilidade de completar o programa de 21 meses. McSchane_04.indd 98McSchane_04.indd 98 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 caraujo Retângulo CAPÍTULO 4 Emoções, Atitudes e Estresse no Local de Trabalho 99 diversos países asiáticos (como a China continental, Hong Kong e Coreia do Sul).56 Além dis- so, como mostra a Figura 4.4, mais de 85% dos americanos têm satisfação entre média e alta com seus empregos, um nível que se manteve consistente nas três últimas décadas.57 Esses resultados permitem a conclusão de que os americanos estão felizes no trabalho. Talvez, mas não tanto quanto essas estatísticas sugerem. Um dos problemas é que a pesqui- sa por trás delas utiliza uma única pergunta direta, como “qual é o seu grau de satisfação com o seu emprego?”. Muitos funcionários insatisfeitos relutam em revelar seus sentimen- tos em uma pergunta direta porque isso equivale a admitir que fizeram uma má escolha profissional e não aproveitam a vida. Temos evidências de que os escores de satisfação no trabalho são inflacionados. As pesquisas que informam índices altos de satisfação também informam que a maioria dos funcionários está insatisfeita com diversos aspectos de seu trabalho, inclusive o salário, as oportunidades de promoção e o reconhecimento por seus sucessos. Além disso, um estudo recente relata que, dada a oportunidade, apenas metade dos americanos com certeza permaneceria com o mesmo empregador no próximo ano.58 Em suma, os funcionários nos Estados Unidos, Dinamarca, Índia e outros países têm sa- tisfação no trabalho relativamente alta, mas provavelmente não tanto quanto afirmam nas avaliações gerais. Outro problema é que os valores culturais dificultam a comparação da satisfação no em- prego entre diferentes países. Os chineses e japoneses tendem a reprimir suas emoções em público, então provavelmente evitam avaliações extremas na pesquisa, como “muito satisfei- to”. Um terceiro problema é que a satisfação no trabalho muda com as condições econômicas. Os funcionários com os maiores níveis de satisfação nas pesquisas atuais tendem a estar em países nos quais as economias estão em crescimento.59 0% 20% 40% 60% 80% 120% 100% 1974 4,5% 9,7% 38,1% 47,6% 4,5% 8,5% 35,7% 51,2% 5,0% 10,1% 38,2% 46,7% 2,8% 8,9% 39,2% 49,1% 3,6% 10,4% 39,8% 46,2% 3,3% 10,6% 40,5% 45,6% 3,2% 9,7% 38,7% 48,4% 3,5% 9,2% 36,5% 50,8% 4,1% 8,2% 38,3% 49,4% 3,7% 10,3% 36,2% 49,8% 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 Muito satisfeito Moderadamente satisfeito Um pouco insatisfeito Bastante insatisfeito FIGURA 4.4 Estabilidade da satisfação no trabalho nos Estados Unidos. Fonte: Baseado nos dados coletados e informados pelo National Opinion Research Center/University of Chicago. McSchane_04.indd 99McSchane_04.indd 99 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 100 PARTE II Comportamento Individual e Processos Satisfação no trabalho e comportamento no trabalho Brad Bird presta muita atenção à satisfação no trabalho.“Na minha experiência, o elemento com o maior impacto sobre um orçamento, mas que nunca aparece nele, é o moral”, avisa Bird, que dirigiu Ratatouille e outros filmes premiados na Pixar Animation Studios. “Se você tem um moral baixo, para cada dólar que você gasta, obtém 25 centavos de valor. Se tem um moral elevado, para cada dólar que gasta, obtém três de valor”.60 A opinião de Brad Bird sobre a importância da satisfação no trabalho é refletida nas ações dos líderes em muitas organizações. Diversas empresas monitoram cuidadosamente a satisfação no trabalho e as atitudes relacionadas dos funcionários, além de competirem ativamente pelos prêmios de melhor lugar para se trabalhar. Em algumas empresas, as bonificações dos executi- vos dependem em parte dos índices de satisfação no trabalho dos funcionários. O motivo para essa atenção é simples: a satisfação no trabalho afeta muitos dos comportamentos individuais introduzidos no Capítulo 2 (desempenho da tarefa, cidadania organizacional, desistência, ab- senteísmo, etc.). Um modelo útil para organizar e compreender as consequências da insatisfação no emprego é o modelo saída-opinião-lealdade-negligência (EVLN, em inglês). Como o nome sugere, o modelo EVLN identifica quatro maneiras de os funcionários reagirem à insatisfação:61 • Saída. A saída inclui deixar a empresa, transferir-se para outra unidade de trabalho ou pelo menos tentar sair da situação insatisfatória. A teoria tradicional é que a insatisfa- ção no trabalho se acumula ao longo do tempo e acaba se tornando suficientemente forte a ponto de motivar os funcionários a buscarem melhores oportunidades de tra- balho em outro lugar. A teoria provavelmente está correta em algumas situações, mas a opinião mais recente é que “eventos de choque” específicos energizam os funcionários rapidamente e os levam a pensar e realizar comportamentos de saída. Por exemplo, a reação emocional que você vivencia em relação a uma decisão injusta tomada pela gestão ou a um episódio de conflito com um colega de trabalho o motivam a analisar anúncios de emprego e a falar com os amigos a respeito de oportunidades onde eles trabalham. Isso dá início ao processo de realinhamento do seu autoconceito mais com outra empresa do que com o seu empregador atual.62 • Opinião (voz). A voz é uma tentativa de mudar a situação insatisfatória, em vez de fugir dela. A opinião pode ser uma resposta construtiva, como recomendar à gestão manei- ras de melhorar a situação, ou pode ser uma resposta de confrontação, como apresentar queixas formais ou formar uma coalizão para se opor a uma decisão.63 Em casos extre- mos, alguns funcionários poderiam adotar comportamentos contraproducentes para chamar a atenção e forçar mudanças na organização. • Lealdade. Na versão original desse modelo, a lealdade não era um resultado da insatis- fação. Em vez disso, determinava se as pessoas optavam por sair ou opinar (a lealdade elevada resultava em opinião; a lealdade baixa produzia saída).64 Autores mais recentes descrevem a lealdade como um resultado, mas de maneiras diversas e um tanto obscu- ras. Geralmente, eles sugerem que os funcionários leais reagem à insatisfação por meio da espera paciente (alguns dizem que eles “sofrem calados”) para que o problema se resolva sozinho ou seja resolvido por outras pessoas.65 • Negligência. A negligência inclui diminuir o esforço, prestar menos atenção à qualidade e aumentar o absenteísmo e o atraso. Geralmente, é considerada uma atividade passiva que produz consequências negativas para a organização. Qual das quatro alternativas EVLN os funcionários utilizam? Depende da pessoa e da situação.66 A personalidade, os valores e o autoconceito do indivíduo são fatores importantes. Por exemplo, as pessoas com elevada escrupulosidade são menos propensas a incorrer na negligência e mais propensas a emitir opiniões. A experiência pregressa também influencia qual ação EVLN seráaplicada. Os funcionários que foram malsucedidos ao emitir opiniões no passado são mais propensos a adotar a saída do emprego ou a ser negligentes quando futuramente se sentirem insatisfeitos no trabalho. Outro fator é a lealdade, como foi original- mente concebida no modelo EVLN. Especificamente, os funcionários são mais propensos a sair quando são pouco leais à empresa e mais propensos a emitir opiniões quando são muito leais. Por fim, a resposta à insatisfação depende da situação. Os funcionários são menos pro- pensos a usar a opção de saída do emprego quando existem poucas alternativas de emprego, modelo saída-opinião- lealdade-negligência (EVLN) As quatro maneiras, como o nome sugere, de o funcioná- rio reagir à insatisfação no trabalho. McSchane_04.indd 100McSchane_04.indd 100 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 4 Emoções, Atitudes e Estresse no Local de Trabalho 101 por exemplo. Os funcionários com posições centrais no processo de trabalho, de modo que outros funcionários são dependentes deles (ver Capítulo 10), têm maior probabilidade de emitirem opiniões quando estão insatisfeitos.67 Satisfação no trabalho e desempenho O trabalhador feliz é também um trabalhador mais produtivo? A maioria dos líderes corporativos tende a concordar. Mas na maior parte do século passado, os estudiosos do comportamento organizacional desafiaram essa crença, concluindo que a satisfação no trabalho tem efeitos mínimos no desempenho profissional. Agora, os especialistas em CO acreditam que o senso comum pode estar correto e que há uma relação positiva moderada entre satisfação no trabalho e desempenho. Em outras palavras, os trabalhadores tendem a ser um pouco mais produtivos quando têm atitudes mais positivas em relação a seus empregos e locais de trabalho.68 Por que a relação entre satisfação no trabalho e desempenho não é ainda mais forte? Um motivo é que atitudes gerais (como satisfação no trabalho) não são boas preditoras de com- portamentos específicos. Como explica o modelo EVLN, a insatisfação pode levar à rotativi- dade, reclamações ou espera paciente em vez de a desempenhos piores (uma forma de negli- gência). Um segundo motivo é que a insatisfação pode afetar o desempenho apenas quando o desempenho no trabalho está sob o controle dos funcionários. Quem trabalha em uma indús- tria de processamento químico, por exemplo, produziria mais ou menos a mesma quantidade e qualidade de produtos independente de sua opinião sobre o emprego. Um terceiro elemento é que o desempenho no trabalho pode causar a satisfação, não vice-versa.69 Funcionários com desempenho superior recebem mais recompensas (incluindo reconhecimento) e, por conse- quência, ficam mais satisfeitos do que os funcionários com baixo desempenho, que recebem menos recompensas. A relação entre satisfação no trabalho e desempenho não é mais forte porque muitas organizações não sabem recompensar muito bem o desempenho elevado. Satisfação no trabalho e satisfação do cliente A Wegmans Food Markets em Roches- ter, Nova Iorque, e a HCL Technologies em Noida, Índia, estão em lados opostos do planeta e trabalham em setores muito diferentes, mas ambas têm o mesmo lema inusitado: Funcio- nários em primeiro lugar, clientes em segundo. Por que essas empresas não colocam os clientes no topo da lista de partes interessadas? O motivo é que a satisfação do cliente é um resultado natural da satisfação dos funcionários. Em outras palavras, é difícil manter os clientes felizes se o moral dos funcionários está baixo. “Para mim, parece apenas bom senso que quem co- meça com uma equipe feliz e motivada tem muito mais chances de ter clientes felizes”, sugere Sir Richard Branson, que aplica o mesmo princípio no Virgin Group.70 Essas empresas estão aplicando o modelo da cadeia serviços-lucro, que propõe que a satisfação no trabalho tem um efeito positivo no atendimento ao cliente, que por sua vez favorece os retornos financeiros dos acionistas. A Figura 4.5 apresenta um diagrama do pro- cesso. Mais especificamente, as práticas do local de trabalho afetam a satisfação no trabalho, que influencia a retenção, a motivação e o comportamento dos funcionários. Esses resultados Práticas organiza- cionais Satisfação e comprometi- mento do funcionário Motivação e comportamento do funcionário Retenção de funcionários Satisfação do cliente/valor percebido Qualidade do serviço Fidelidade do cliente e indicações Rentabilidade da empresa e crescimento FIGURA 4.5 Modelo da cadeia serviços-lucro. Fonte: O modelo é baseado em J.I. Heskett, W.E. Sasser, and L.A. Schlesinger, The Service Profit Chain (New York: The Free Press, 1997); A.J. Rucci, S.P. Kirn, and R.T. Quinn, “The Employee-Customer-Profit Chain at Sears,” Harvard Business Review 76 (1998), pp. 83–97; S.P. Brown and S.K. Lam, “A Meta-Analysis of Relationships Linking Employee Satisfaction to Customer Responses,” Journal of Retailing 84, no. 3 (2008), pp. 243–55. McSchane_04.indd 101McSchane_04.indd 101 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 102 PARTE II Comportamento Individual e Processos afetam a qualidade do serviço, que por sua vez influencia a satisfação do cliente, as percep- ções de valor, as indicações e, em última análise, a lucratividade e o crescimento da empresa.71 O modelo da cadeia serviços-lucro depende de duas explicações fundamentais relaciona- das por que funcionários satisfeitos tendem a produzir clientes mais felizes e fiéis.72 Primeiro, os funcionários geralmente estão em um estado de espírito mais positivo quando se sentem satisfeitos com seus empregos e condições de trabalho. Funcionários bem-humorados expres- sam emoções positivas e simpatia de forma mais natural e com mais frequência. Quando os funcionários se sentem bem, seu comportamento “infecta” a maioria dos clientes (mas não todos), então estes se sentem mais felizes e, por consequência, fazem uma avaliação positiva da experiência de serviço (ou seja, melhor qualidade de serviço). Segundo, os funcionários satisfeitos são menos propensos a sair dos seus empregos, então têm um conhecimento melhor e mais habilidades para atender aos clientes. A rotatividade mais baixa também permite que os clientes sejam atendidos pelos mesmos funcionários, tendo, as- sim, um atendimento mais consistente. Algumas evidências indicam que os clientes cultivam lealdade a determinados funcionários, não à empresa, então a manutenção da baixa rotatividade tende a fidelizar o cliente. A seção Conexões 4.1 apresenta um exemplo forte de como o modelo da cadeia serviços-lucro aumentou os resultados financeiros do Clydesdale Bank na Escócia. Satisfação no trabalho e ética empresarial Antes de encerrarmos o tema da satisfação no trabalho, é preciso mencionar que essa também é uma questão ética que influencia a reputação da organização na comunidade. As pessoas passam uma parcela significativa de seu tempo trabalhando em organizações, e em muitas sociedades espera-se que as empresas ofereçam ambientes de trabalho seguros e prazerosos. Na verdade, os funcionários de muitos países monitoram de perto as avaliações das melhores empresas nas quais se trabalhar, um indício de que a satisfação é uma virtude muito valorizada e, logo, valiosa para os empregadores. Isso fica claro quando uma organização gera baixa satis- Funcionários felizes, clientes felizes Alguns anos atrás, os funcionários do centro de atendimento do Clydesdale Bank não formavam um grupo feliz. Até 12% dos 200 membros da equipe desse grande banco escocês se ausentava todos os dias. A rotatividade anual de funcionários girava em tor- no de 65% por ano, um nível tão alto que os gerentes passavam boa parte do tempo contratando e treinando. Kevin Page, diretor do centro de atendimento do Clydesdale na época, brincou que “éramos uma empresa de recrutamento e treinamento especiali- zada”. O atendimento dos clientes sofria, os custos operacionais ficavam 25% acima da média do setor na Europa e a produtivida- de dos funcionários ficavasignificativamente abaixo da média. Dois anos depois, o centro de atendimento do Clydesdale se tornou um exemplo positivo em nível global. A satisfação no trabalho e o comprometimento aumentaram significativa- mente. O absenteísmo caiu para 4% por dia e a rotatividade é metade do que era. Os clientes estão muito mais satisfei- tos com suas ligações para o centro de atendimento. Devido a essa melhoria drástica, o Clydesdale Bank recebeu o prêmio de melhor centro de atendimento da região (incluindo Europa, Oriente Médio e África). Alguns meses depois, ele foi conside- rado o melhor grande centro de atendimento do mundo, derro- tando 1.000 candidatos em todos os setores. Como o Clydesdale Bank conseguiu essa incrível revira- volta? De acordo com Kevin Page, atual diretor de operações do Clydesdale Bank, a tática é tratar os funcionários bem para que eles tratem os clientes bem. Page e sua equipe de gestão escutaram e agiram em relação às preocupações dos fun- cionários, melhoraram o ambiente de trabalho, introduziram programas de desenvolvimento de carreira, aperfeiçoaram o treinamento e concederam mais liberdade a eles para que de- cidissem como atender os clientes. “Nossa equipe começou a levar seus empregos mais a sério”, diz Page. “Eles passaram a entender que suas funções eram importantes e a se sentir melhor consigo mesmos”.73 C O N E X Õ E S 4 . 1 O Clydesdale Bank escocês melhorou o atendimento dos clientes com o aumento da satisfação dos funcionários. modelo da cadeia serviços-lucro Teoria que explica como a satisfação dos funcionários no trabalho influencia a rentabilidade da empresa indiretamente através da qualidade do atendimento, fidelidade do cliente e fatores relacionados. McSchane_04.indd 102McSchane_04.indd 102 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 4 Emoções, Atitudes e Estresse no Local de Trabalho 103 fação no trabalho. A empresa tenta ocultar o fato, mas quando os problemas de moral vêm a público, os líderes corporativos costumam tentar melhorar a situação imediatamente. COMPROMISSO COM A ORGANIZAÇÃO O compromisso com a organização representa a outra metade (com a satisfação no trabalho) do que alguns especialistas chamam de “postura profissional global”. O compromisso com a organização, chamado mais especificamente de compromisso afetivo, é o vínculo emocio- nal, a identificação e o envolvimento do funcionário com uma determinada organização.74 O compromisso afetivo é o sentimento de lealdade que um indivíduo tem em relação ao local onde trabalha. O compromisso afetivo costuma ser diferente do compromisso de continuidade, que é uma ligação calculista com a organização. Os funcionários têm alto compromisso de con- tinuidade quando sentem que precisam continuar com a organização por que seria muito custoso sair dela. Em outras palavras, eles escolhem ficar porque o valor calculado (em geral, financeiro) de permanecer é maior do que o valor de trabalhar em algum outro lugar. Um funcionário tem alto compromisso calculista quando diz: “Odeio este lugar, mas não tenho dinheiro para cair fora!” Essa relutância em sair pode existir porque o funcionário poderia perder um grande bônus ao sair precocemente ou está bem estabelecido na comunidade onde trabalha.75 Consequências do compromisso de continuidade e afetivo O compromisso afetivo pode ser uma vantagem competitiva importante.76 Os funcionários leais são menos propensos a sair dos seus empregos e a se ausentarem do trabalho. Eles tam- bém têm uma motivação maior para trabalhar e mais cidadania organizacional, como tam- bém um desempenho profissional um pouco melhor. O compromisso com a organização aumenta a satisfação do cliente porque os funcionários antigos têm mais conhecimento das práticas de trabalho e porque os clientes gostam de negociar com os mesmos funcionários. Uma risco é que os funcionários muito leais tendem a ser bastante conformistas, resultando em menos criatividade. Também há casos de funcionários dedicados que violaram as leis 25% 36% 38% 39% 43% 47% 52% 53% 60% 65% 65% 0% Hungria Média europeia Singapura Itália Média global Média asiática Índia Polônia SuéciaMédia da América do Norte China 15% 30% 45% 60% 75% Totalmente comprometido: A lealdade organizacional pelo mundo Porcentagem dos funcionários pesquisados em países selecionados que afirma se sentir “totalmente comprometida” com seus empregadores. Mais de 134.000 pessoas foram entrevistadas em 29 países. McSchane_04.indd 103McSchane_04.indd 103 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 104 PARTE II Comportamento Individual e Processos para defender a empresa. Contudo, a maioria das empresas padece de compromisso afetivo de menos, não demais, por parte dos funcionários. Ao contrário do que ocorre com o compromisso afetivo, os funcionários com altos níveis de compromisso de continuidade tendem a ter avaliações de desempenho mais baixas e são menos propensos a adotar comportamentos de cidadania organizacional. Além disso, os funcionários sindicalizados com alto compromisso de continuidade são mais propensos a reclamar formal- mente, enquanto os funcionários com alto compromisso afetivo se envolvem na resolução mais construtiva dos problemas quando suas relações com o empregador azedam.77 Embora possa ser necessário algum nível de ligação financeira, os empregadores não devem confundir o compro- misso de continuidade com a lealdade do funcionário. Os empregadores ainda precisam con- quistar o coração dos funcionários (compromisso afetivo), além de vinculá-los financeiramente à empresa (compromisso de continuidade). Construção do compromisso com a organização Existem quase tantas maneiras de construir lealdade organizacional quanto tópicos neste livro-texto, mas a lista a seguir é mais proeminente na literatura: • Justiça e apoio. O compromisso afetivo é mais alto nas organizações que cumprem suas obrigações junto aos funcionários e seguem valores humanitários como justiça, cortesia, perdão e integridade moral. Esses valores estão relacionados com o conceito de justiça organizacional, que discutiremos no próximo capítulo. Da mesma forma, organizações que apoiam o bem-estar dos funcionários tendem a cultivar níveis superiores de lealdade.78 • Valores compartilhados. A definição de compromisso afetivo se refere à identificação de um indivíduo com a organização; tal identificação é maior quando os funcionários acreditam que seus valores são coerentes com os valores dominantes da organização. Além disso, os funcionários sentem mais conforto e segurança quando concordam com os valores subjacentes às decisões da empresa, o que aumenta sua motivação para per- manecer nela.79 • Confiança. Confiança se refere às expectativas positivas que uma pessoa tem em re- lação à outra nas situações que envolvem risco.80 Confiança significa depositar fé na outra pessoa ou grupo. Também é uma atividade recíproca: para angariar confiança, você deve demonstrá-la. O comprometimento dos funcionários com a organização é mais forte quando eles confiam em seus líderes, o que explica por que as demissões são um dos golpes mais fortes à lealdade: quando o emprego dos funcionários fica menos seguro, eles confiam menos em seus empregadores e na relação de trabalho.81 • Compreensão organizacional. Compreensão organizacional refere-se ao quanto os fun- cionários compreendem a empresa, incluindo sua direção estratégica, dinâmica social e arranjo físico.82 Essa consciência é um pré-requisito necessário para o compromisso afe- tivo, pois é difícil se identificar com algo que você não conhece bem. Além disso, a falta de informação produz incerteza, e o estresse resultante pode distanciar os funcionários da fonte de incerteza (ou seja, da organização). A solução é garantir que os funcionários desenvolvam um modelo mental razoavelmente claro e completo da organização. Isso acontece fornecendo aos funcionários as informações e oportunidades para se mante- rem a par dos eventos da organização,interagirem com os colegas, descobrirem o que acontece em partes diferentes dela e aprenderem sobre sua história e planos futuros.83 • Envolvimento do funcionário. O envolvimento do funcionário aumenta o compromis- so afetivo ao reforçar a propriedade psicológica e identidade social dele com a organi- zação.84 Os funcionários sentem que fazem parte da organização quando participam das decisões que guiam o futuro dela (ver Capítu- lo 7). O envolvimento do funcionário também cria lealdade, pois conceder esse poder demonstra que a empresa confia em seus funcionários. compromisso com a organizacional (afetivo) O vínculo emocional, a identifi- cação e o envolvimento do fun- cionário com uma determinada organização. compromisso de continuidade Vínculo calculista de um funcio- nário com a empresa, por meio do qual este se sente motivado a ficar apenas porque sair seria custoso. confiança Expectativas positivas nutridas por uma pessoa em relação a outra nas situações que envol- vem risco. McSchane_04.indd 104McSchane_04.indd 104 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 CAPÍTULO 4 Emoções, Atitudes e Estresse no Local de Trabalho 105 O compromisso com a organização e a satisfação no trabalho são duas das atitudes no local de trabalho mais estudadas e debatidas. Cada uma delas está ligada a episódios emocio- nais e a julgamentos cognitivos a respeito do local de trabalho e da relação com a empresa. As emoções também desempenham um papel importante em outro conceito que está na mente de todo o mundo hoje em dia: o estresse. A seção final deste capítulo fornecerá uma visão global do estresse relacionado ao trabalho e de como ele pode ser gerido. ESTRESSE ASSOCIADO AO TRABALHO E SEU GERENCIAMENTO Os últimos anos têm sido duros para muitos funcionários da France Telecom. A ex-estatal foi privatizada e reestruturada, o que gerou 22 mil cortes de vagas (cerca de 20% da força de tra- balho da empresa) entre demissões em massa e atrito. A gerência desenvolveu uma doutrina “hora de mudar” para deslocar regularmente as pessoas para novos locais e tipos diferentes de funções. Vários engenheiros de telefonia foram transferidos para centrais de atendimento, por exemplo. Nos dois últimos anos, mais de duas dúzias de funcionários da France Telecom cometeram suicídio e outra dúzia tentou se suicidar. Muitos deixaram bilhetes dizendo que não podiam mais suportar a pressão ou acusando a gestão de aterrorizá-los. O CEO que lide- rou a transição renunciou por causa disso. Stephane Richard, o atual CEO da France Telecom, afirma que será mais sensível ao estresse dos funcionários. “A gestão anterior precisava mudar a natureza do trabalho das pessoas devido à mudança tecnológica e ao aumento da concor- rência, mas a empresa subestimou as consequências”, reconhece Richard.85 Muitos funcionários da France Telecom estavam com níveis extremos de estresse. Os especialistas têm dificuldade para definir o estresse, mas ele costuma ser descrito como uma resposta adaptativa que é percebida como um desafio ou ameaça ao bem-estar pessoal.86 O estresse é uma condição fisiológica e psicológica que nos prepara para nos adaptarmos a con- dições ambientais hostis ou nocivas. Nossa frequência cardíaca aumenta, os músculos enri- jecem, a respiração acelera e aumenta a transpiração. Nosso corpo também movimenta mais sangue para o cérebro, libera adrenalina e outros hormônios, alimenta o sistema liberando mais glicose e ácidos graxos, ativa sistemas que aguçam nossos sentidos e conserva recursos ao poupar nosso sistema imunológico. Uma escola de pensamento sugere que o estresse é uma avaliação negativa do ambiente externo. Contudo, os críticos dessa perspectiva de avalia- ção cognitiva lembram que o estresse seria descrito mais precisamente como uma experiência emocional, que pode ocorrer antes ou depois da avaliação consciente da situação.87 Seja ele uma emoção complexa ou uma avaliação cognitiva do ambiente, o estresse se tornou uma experiência onipresente no cotidiano da maioria das pessoas. Três a cada quatro americanos (e porcentagens semelhantes na Alemanha, Canadá, Austrália e Grã-Bretanha) dizem que frequentemente ou às vezes sentem estresse em seu cotidiano. Outro levantamento recente informou que 77% dos americanos estão estressados com uma ou mais questões no trabalho; salários baixos, distâncias longas entre casa e escritório, cargas de trabalho excessi- vas e risco de demissão estão entre os estressores mais importantes. Em um levantamento re- cente com 115.000 funcionários de 33 países, os respondentes do Japão informaram o maior número de problemas de saúde relacionados com o estresse, seguidos por Canadá, Ucrânia, Finlândia, Hong Kong e Hungria.88 O estresse pode ser descrito como uma experiência negativa. É a chamada angústia, o nível de desvio fisiológico, psicológico e comportamental do funcionamento saudável. No entanto, algum nível de estresse, o chamado eustresse, é um fator necessário à vida, pois ativa e motiva as pessoas a atingirem metas, mudarem seus ambientes e vencerem os desafios. Por exemplo, mais de dois terços dos 42.000 funcionários americanos entrevistados afirmaram que o estres- se no trabalho os deixa energizados ou não tem efeito sobre eles.89 Nosso foco está nas causas e na gestão da angústia, pois ela se torna um problema crônico em muitas sociedades. Síndrome geral da adaptação Mais de 500 anos atrás, a palavra estresse começou a ser utilizada para descrever a resposta hu- mana a condições ambientais nocivas. Entretanto, foi apenas na década de 1930 que o pesquisa- dor Hans Selye (considerado o pai da pesquisa sobre estresse) documentou pela primeira vez a OA4, OA5 McSchane_04.indd 105McSchane_04.indd 105 23/06/14 14:3223/06/14 14:32 caraujo Retângulo Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094 M175c McShane, Steven L. Comportamento organizacional : conhecimento emergente, realidade global [recurso eletrônico] / Steven L. McShane, Mary Ann Von Glinow ; tradução : Francisco Araújo da Costa. – 6. ed. – Porto Alegre : AMGH, 2014. Editado também como livro impresso em 2014. ISBN 978-85-8055-404-5 1. Comportamento organizacional. I. Von Glinow, Mary Ann. II. Título. CDU 005.32 McShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd iiMcShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd ii 28/07/14 13:4328/07/14 13:43 5 Bases da Motivação dos Funcionários O Standard Chartered Bank enfrentou a crise financeira mundial melhor do que a maioria dos outros bancos, em parte porque criou um ambiente capaz de formar uma equipe bastante engajada. “Se mais empresas investis- sem positivamente no envolvimento dos funcionários, acho que teríamos melhorias significativas em termos de produtividade e desempenho”, afirma Tim Miller, exe- cutivo sênior do Standard Chartered. Os negócios do banco londrino em Hong Kong foram premiados três ve- zes com o Gallup Great Workplace Award. Na Tailândia, Uganda, Índia (Scope International-India) e Coreia (First Bank Korea Ltd.) o banco também é reconhecido como empregador de alta qualidade em nível mundial ou nos respectivos países. Mais da metade dos funcionários do Standard Charte- red tem altos níveis de envolvimento, em comparação com apenas 25-30% na maioria das organizações. Os funcioná- rios do banco não foram sempre tão motivados, entretanto. Os índices de envolvimento dos funcionários do Standard Chartered mais do que dobraram durante a última déca- da, pois a empresa introduziu práticas específicas. Primei- ro, ela treinou seus gerentes para instruir mais ativamente os funcionários sobre indicadores-chave de desempenho (ICDs), feedback construtivo e formação de competências. Segundo, o Standard Chartered investiu mais no desenvol- vimento dos funcionários, a ponto de quase todosos mem- bros da equipe do banco entenderem suas funções e terem confiança na realização de seus objetivos. Terceiro, o Standard Chartered usa oportunidades de desenvolvimento de carreira e um programa de compra de ações para recompensar o desempenho. Quarto, o banco apoia interações sociais por meio de eventos de voluntariado em equipe e atividades divertidas e estrutu- radas no local de trabalho. Finalmente, o Standard Char- tered enfoca os pontos fortes dos funcionários, não seus defeitos. “Nossa cultura se baseia bastante no movimento da psicologia positiva de se concentrar nos pontos fortes”, explica Tim Miller. “Sabemos que quando as pessoas fa- zem o que gostam, elas são muito mais produtivas do que em funções nas quais têm menos interesse”. O foco do Standard Chartered no envolvimento dos funcionários está gerando resultados no bem-estar dos funcionários e também na rentabilidade da organização. “Usar esse foco [envolvimento dos funcionários] produ- ziu resultados espetaculares”, diz Miller. “Nossas agências mais envolvidas têm crescimento de depósitos significa- tivamente maior, razões custo/renda melhores e menos atrito do que as agências menos envolvidas”. 1 O estabelecimento de metas, o feedback baseado em pontos fortes, as recompensas e os diversos eventos de formação de laços sociais são projetados para manter e melhorar a motivação dos funcionários no Standard Chartered Bank. Essa motivação sustentou o desempe- nho da empresa durante toda a crise financeira mundial e transformou-a em um dos melhores ou mais admira- dos locais de trabalho em diversos mercados emergen- tes. Motivação se refere às forças internas da pessoa que afetam a direção, a intensidade e a persistência de seu comportamento voluntário. 2 Os funcionários moti- vados estão dispostos a exercer um determinado nível de esforço (intensidade) durante certa quantidade de tempo (persistência) rumo a uma meta particular (di- reção). A motivação é um dos quatro impulsionadores essenciais do comportamento e desempenho individual (ver Capítulo 2). Este capítulo introduz as teorias fundamentais da mo- tivação dos funcionários. Iniciaremos com uma análise do envolvimento dos funcionários, conceito cada vez mais popular associado à motivação. A seguir, explica- mos como impulsos e emoções são os principais fatores da motivação dos funcionários. Três teorias que enfo- cam impulsos e necessidades são introduzidas e avalia- das, a saber, a hierarquia das necessidades de Maslow, a teoria das necessidades aprendidas de McClelland e a teoria dos quatro impulsos. Depois, passamos nossa Motivação melhora desempenho. McSchane_05.indd 117McSchane_05.indd 117 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 118 PARTE II Comportamento Individual e Processos ENVOLVIMENTO DO FUNCIONÁRIO Hoje em dia, quando discutem a motivação dos funcionários, os executivos gostam de usar a expressão envolvimento do funcionário. Apesar da definição do termo ainda ser controver- sa,3 ele pode ser definido cautelosamente como a motivação emocional e cognitiva (racional) de um indivíduo, particularmente um esforço focalizado, intenso, persistente e intencional voltado para os objetivos relacionados ao trabalho. Em geral, é descrito como um envolvi- mento emocional, um comprometimento e uma satisfação com o trabalho. O envolvimento do funcionário também inclui um alto nível de absorção no trabalho, ou seja, a experiência de enfocar intensamente a tarefa, com consciência limitada dos eventos que estão além de tal trabalho. Finalmente, o envolvimento do funcionário muitas vezes é descrito em termos de autoeficácia, que é a crença de possuir capacidade, clareza de função e recursos para comple- tar o trabalho (ver Capítulo 3). O envolvimento dos funcionários é um tema muito discutido pelos líderes empresariais da atualidade, pois parece ser um bom preditor de desempenho para indivíduos e unidades de trabalho. O Standard Chartered Bank descobriu que as agências com maiores índices de envolvimento oferecem atendimento ao cliente significativamente melhor, têm rotatividade 46% menor e produzem crescimento da margem de lucro 16% maior do que agências com baixo envolvimento. Na JCPenney, as lojas que estão entre as 25% com maior envolvimento geram renda operacional 36% maior do que lojas de tamanho semelhante que estão entre as 25% com menor envolvimento. A varejista de eletrônicos Best Buy informa que um aumento de 0,1 (em uma escala de 0,0 a 5,0) no índice de envolvimento dos funcionários de uma loja está associada com um aumento de 100.000 dólares em sua rentabilidade anual. Um relatório recente do governo britânico concluiu que o envolvimento dos funcionários é tão importante para a competitividade internacional do país que o governo deveria promover a conscientiza- ção e apoiar as práticas de envolvimento em todos os seto- res da economia.4 Pelos estudos, nem sempre fica claro se o envolvimento dos funcionários causa o sucesso das empre- sas ou se empresas de sucesso conseguem envolver melhor seus funcionários. Entretanto, as intervenções do Standard Chartered, da Best Buy e de algumas outras organizações sugerem que o envolvimento dos funcionários leva aos bons resultados da empresa mais do que vice-versa. OA1 atenção para o popular modelo da decisão racional da motivação dos funcionários: a teoria das expectativas. A seguir, introduzimos a modificação do comportamento organizacional e a teoria social cognitiva, seguidas do estabelecimento de metas e feedback, considerados os conceitos e práticas motivacionais mais úteis e robustos nas organizações. O capítulo se encerra com o tema da motivação por meio da justiça organizacional, incluindo as dimensões e dinâmica da teoria da equidade e justiça procedimental. Objetivos de aprendizagem Após ler este capítulo, você deve ser capaz de: OA1 Definir envolvimento dos funcionários. OA2 Explicar a função dos impulsos e emoções na mo- tivação e no comportamento dos funcionários. OA3 Resumir a hierarquia das necessidades de Maslow, a teoria das necessidades aprendidas de McClelland e a teoria dos quatro impulsos, e discutir suas consequências para a motivação dos funcionários. OA4 Discutir a teoria das expectativas na prática, in- cluindo suas consequências práticas. OA5 Descrever a modificação do comportamento orga- nizacional e a teoria social cognitiva e explicar sua relevância para a motivação dos funcionários. OA6 Descrever as características do estabelecimento de metas e do feedback eficazes. OA7 Resumir a teoria da equidade e descrever manei- ras de melhorar a justiça procedimental. envolvimento do funcionário A motivação emocional e cog- nitiva de um indivíduo, particu- larmente um esforço focalizado, intenso, persistente e intencio- nal voltado para os objetivos relacionados ao trabalho. impulsos Características cerebrais fixas que corrigem deficiências ou mantêm um equilíbrio interno ao produzir emoções para estimu- lar os indivíduos. McSchane_05.indd 118McSchane_05.indd 118 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 5 Bases da Motivação dos Funcionários 119 O desafio dos líderes organizacionais é que a maioria dos funcionários simplesmente não é muito envolvida.5 Os números variam, mas o normal é que apenas cerca de 30% dos funcio- nários americanos estejam altamente envolvidos, o que é ligeiramente superior à média global. Cerca de metade de todos os funcionários tem envolvimento médio e cerca de um quinto tem envolvimento baixo ou ativamente negativo. Os funcionários com envolvimento ativamente negativo não estão simplesmente desmotivados para trabalhar, eles estão frustrados o suficien- te para causar problemas no local de trabalho e minar a motivação dos colegas. Os funcioná- rios de diversos países asiáticos (especialmente Japão, China e Coreia do Sul) e alguns países europeus (especialmente Itália, Holanda e França) têm os menores níveis deenvolvimento, enquanto os maiores índices costumam ocorrer nos Estados Unidos, Brasil e Índia. O que nos leva à pergunta: o que impulsiona o envolvimento do funcionário? Estabeleci- mento de metas, engajamento, justiça organizacional, compreensão organizacional (saber o que acontece na empresa), oportunidades de desenvolvimento do funcionário, recursos suficientes e uma visão atraente da empresa são algumas das influências mencionadas com mais frequência.6 Em outras palavras, criar uma força de trabalho envolvida exige que seja colocada em prática a maioria dos tópicos deste livro, como o modelo MARS (Capítulo 2), a criação de um comprome- timento afetivo (Capítulo 4), as práticas motivacionais (Capítulo 5) e a liderança (Capítulo 12). IMPULSOS E NECESSIDADES DO FUNCIONÁRIO Para descobrir como cultivar uma força de trabalho mais envolvida e motivada, primeiro pre- cisamos compreender as forças motivacionais ou motivos principais do comportamento dos funcionários.7 Nosso ponto de partida são os impulsos (também chamados de necessidades primárias), que definimos como características cerebrais fixas que corrigem deficiências na tentativa de nos manter equilibrados. Para tanto, os impulsos produzem emoções que nos dão energia para atuar em nosso ambiente.8 Os impulsos estão recebendo cada vez mais atenção porque pesquisas recentes da neurociência destacam o papel central das emoções nas deci- sões e comportamento dos seres humanos. Não existe uma lista amplamente aceita dos im- pulsos humanos, mas vários são identificados com bastante consistência nas pesquisas, como os impulsos de interação social, competência ou status, o de saber o que está acontecendo ao nosso redor e o de defesa contra danos fisiológicos e psicológicos.10 Os impulsos são inatos e universais, o que significa que todos os têm e que eles existem desde o nosso nascimento. Além disso, os impulsos são os motivos principais do comporta- OA2, OA3 A B&Q, a terceira maior varejista mundial de materiais de cons- trução e decoração, possui uma das equipes mais engajadas do mundo. A empresa britânica trei- na, envolve e recompensa seus funcionários, mas, mais do que isso, ela encoraja atividades diver- tidas nas quais a equipe satisfaz seu impulso de se vincular. Por exemplo, os funcionários de todas as 330 lojas da B&Q participaram de uma dança de cinco minutos simultânea em todas as lojas. O evento filantrópico tentou quebrar o recorde de maior flash mob do mundo. “Nossa equipe fica sorri- dente, e espero que isso se tradu- za em excelente atendimento para o cliente”, um gerente de loja da B&Q explicou sobre a flash mob.9 McSchane_05.indd 119McSchane_05.indd 119 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 120 PARTE II Comportamento Individual e Processos mento, pois geram emoções que por sua vez colocam as pessoas em um estado de prontidão para atuar em seu ambiente. As emoções têm um papel crucial na motivação.11 Na verdade, ambas as palavras (emoção e motivação) têm origem no mesmo termo em latim, movere, que significa “mover”. A Figura 5.1 mostra como os impulsos e as emoções se traduzem em necessidades sen- tidas e em comportamentos. Os impulsos, e as emoções que produzem, geram necessidades humanas. Nós definimos necessidades como forças voltadas para objetivos. Elas são forças motivacionais de emoções direcionadas a determinados objetivos para corrigir deficiências ou desequilíbrios. Como explica um importante neurocientista, “os impulsos se expressam diretamente nas emoções subjacentes e acabamos nos conscientizando de sua existência por meio de sentimentos subjacentes”.12 Considere o exemplo a seguir: você chega no trabalho e descobre um estranho sentado em sua mesa. Essa situação produz emoções (preocupação, curiosidade) que o motivam a agir. Essas emoções são geradas por impulsos, como o de defender e o de conhecer. Quando são fortes o suficiente, eles o motivam a agir em relação à situação, nesse caso tentando desco- brir quem é essa pessoa e talvez buscando confirmação junto aos colegas de que seu emprego ainda está seguro. Você sente a necessidade de saber o que está acontecendo, de se sentir seguro e possivelmente de corrigir a sensação de violação pessoal. Observe que suas reações emocionais ao ver o estranho sentado em sua mesa representam as forças que o perturbam, mas é você que canaliza essas emoções em direção a objetivos específicos. Diferenças individuais nas necessidades Todos têm os mesmos impulsos, que são parte fixa da nossa neurologia criada pela evolução, mas cada um desenvolve diferentes intensidades de necessidades em determinadas situações. A Figura 5.1 explica por que essa diferença ocorre. O lado esquerdo do modelo mostra que o autoconceito do indivíduo (assim como personalidade e valores), as normas sociais e a ex- periência pregressa amplificam ou suprimem emoções baseadas em impulsos, gerando assim necessidades mais fortes ou mais fracas.13 As pessoas que se definem como muito sociáveis costumam sentir uma forte necessidade de interação social se ficam sozinhas por um tempo, enquanto as pessoas que se consideram menos sociáveis sentiriam uma necessidade menos intensa de se socializar durante o mesmo período. Essas diferenças individuais também ex- plicam por que as necessidades podem, em parte, ser “aprendidas”. A socialização e o reforço podem forçar as pessoas a alterarem um pouco seus autoconceitos, gerando necessidades mais fortes ou mais fracas de interação social, realização, e assim por diante. Analisaremos as necessidades aprendidas em uma parte posterior deste capítulo. O autoconceito, as normas sociais e a experiência pregressa também regulam as decisões motivadas e o comportamento de uma pessoa, conforme ilustra o lado direito da Figura 5.1. Considere o exemplo anterior do estranho sentado à sua mesa. Provavelmente, você não iria até a pessoa e exigiria que ela saísse imediatamente da sua mesa porque tal comportamento rude é contrário às normas sociais na maioria das culturas. Funcionários que se conside- ram francos poderiam abordar o estranho diretamente, enquanto aqueles com autoconcei- tos diferentes ou que tiveram experiências negativas com o confronto direto provavelmente coletariam mais informações junto aos colegas antes de abordar o estranho. Em suma, seus impulsos (de conhecer, defender, vincular, etc.) e as emoções resultantes deles dão a você Autoconceito, normas sociais e experiência pregressa Impulsos (necessidades primárias) e emoções Necessidades (secundárias) Decisões e comportamento FIGURA 5.1 Impulsos, necessidades e comportamento. McSchane_05.indd 120McSchane_05.indd 120 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 5 Bases da Motivação dos Funcionários 121 energia para agir, enquanto seu autoconceito, normas sociais e experiência pregressa dirigem essa energia para comportamentos direcionados por objetivos. A Figura 5.1 fornece um modelo útil para compreender como os impulsos e emoções são as principais fontes de motivação do funcionário e como as características individuais (auto- conceito, experiência, valores) influenciam o comportamento voltado para objetivos. Você verá partes dessa teoria quando discutirmos a teoria dos quatro impulsos, a teoria das expec- tativas, a teoria da equidade e outros conceitos neste capítulo. O restante da seção descreve as teorias que tentam explicar a dinâmica dos impulsos e necessidades. Teoria da hierarquia de necessidades de Maslow Sem dúvida nenhuma, a teoria da motivação humana mais conhecida é a teoria da hierarquia de necessidades de Maslow (ver Figura 5.2). Desenvolvida pelo psicólogo Abraham Maslow na década de 1940, o modelo condensa e integra a longa lista de necessidades e impulsos que foram estudados anteriormente em uma hierarquia de cinco categorias básicas (da inferior para a superior):14 fisiológicas (necessidade de comida, ar, água, abrigo, etc.), segurança (neces- sidade de segurança e estabilidade), pertencimento/amor (necessidadede interação e afeto com outras pessoas), estima (necessidade de autoestima e estima/status social) e autorrealização (necessidade de sucesso pessoal e concretização do próprio potencial). Além de desenvolver essas cinco categorias, Maslow identificou o desejo de saber e o desejo de beleza estética como dois impulsos inatos que não se encaixam na hierarquia. Maslow sugeriu que somos motivados simultaneamente por várias necessidades primárias (impul- sos), mas a fonte mais forte é a necessidade mais baixa não satisfeita no momento. À medida que uma pessoa satisfaz uma necessidade de nível mais baixo, a próxima necessidade mais alta na hierarquia se torna o motivador primário e con- tinua assim até que seja satisfeita. Limites e contribuições da obra de Maslow Apesar de sua popularidade, a teoria da hierarquia de necessidades de Maslow é rejeitada pela maioria dos especialistas em mo- tivação.15 Os estudos concluíram que as pessoas não evoluem necessidades Forças voltadas para objetivos que as pessoas sentem. Teoria da hierarquia de necessidades de Maslow Teoria motivacional das ne- cessidades dispostas em uma hierarquia, por meio da qual as pessoas são motivadas a sa- tisfazer uma necessidade mais elevada à medida que uma ne- cessidade inferior é satisfeita. Autorrea- lização Estima Pertencimento Segurança Fisiológicas FIGURA 5.2 Hierarquia de necessidades de Maslow. Fonte: Baseado em informações de A.H. Maslow, “A Theory of Human Motivation,” Psychological Review 50 (1943), pp. 370–96. McSchane_05.indd 121McSchane_05.indd 121 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 122 PARTE II Comportamento Individual e Processos por meio da hierarquia como prevê a teoria. A teoria da hierarquia das necessidades também sugere que as necessidades são atendidas por períodos prolongados, enquanto as evidências sugerem que o atendimento existe por períodos muito menores. Embora a teoria da hierarquia de necessidades tenha falhado no teste de realidade, Maslow merece crédito por trazer uma abordagem mais holística, humanística e positiva para o estudo da motivação humana:16 • Perspectiva holística. Maslow explicou que as diversas necessidades devem ser estuda- das em conjunto (holisticamente), pois o comportamento humano normalmente é ini- ciado por mais de uma delas ao mesmo tempo. Anteriormente, os especialistas em mo- tivação haviam dividido as necessidades ou impulsos em dezenas de categorias, cada uma das quais era estudada individualmente.17 • Perspectiva humanista. Maslow introduziu a ideia, então inédita, de que as necessidades de ordem superior são influenciadas por fatores pessoais e sociais, e não apenas pelos ins- tintos.18 Em outras palavras, ele foi o primeiro a reconhecer que o pensamento humano (incluindo autoconceito, normas sociais e experiência pregressa) afeta a motivação. Os especialistas anteriores em motivação haviam enfocado quase exclusivamente os instin- tos humanos, sem considerar que a motivação poderia ser influenciada pelo pensamento. • Perspectiva positiva. Maslow popularizou o termo autorrealização, sugerindo que as pessoas são naturalmente motivadas a atingir seu potencial e que as organizações e as sociedades precisam ser estruturadas para ajudá-las a continuar e desenvolver tal motivação.19 Essa visão positiva da motivação contrasta com a ideia dominante de que as necessidades são ativadas por deficiências, como a fome. Na verdade, Maslow é con- siderado um pioneiro do comportamento organizacional positivo. O CO positivo afirma que o foco nos aspectos positivos da vida, em vez de nos negativos, aumentará o su- cesso organizacional e o bem-estar individual (ver Capítulo 3). Em outras palavras, a abordagem defende a construção de qualidades e perspectivas positivas em indivíduos ou instituições em vez do foco em tentar corrigir o que eles podem ter de errado.20 O que há de errado com o modelo de hierarquia de necessidades? Em última aná- lise, a teoria de Maslow não conseguiu explicar a motivação humana, porque as pessoas não se encaixam numa hierarquia única de necessidades que é igual para todos. As evidências cada vez mais indicam que as pessoas possuem hierarquias diferentes. Algumas colocam o status social no topo da sua hierarquia pessoal; outras consideram o desenvolvimento e o crescimento pessoais uma prioridade permanente sobre as relações ou o status social. As ne- cessidades dos funcionários são fortemente influenciadas pelo autoconceito, pelos valores pessoais e pela personalidade.21 Se seus valores mais importantes envolvem estímulo e autodi- recionamento, você provavelmente presta mais atenção às necessidades de autorrealização. Se poder e conquista dominam seu sistema de valores, as necessidades de status provavelmente estão no alto de suas necessidades. Essa ligação entre os valores e as necessidades sugere que uma hierarquia de necessidades é única para cada pessoa e que possivelmente pode mudar ao longo do tempo, assim como os valores mudam ao longo da vida.22 Teoria das necessidades aprendidas Mais no início deste capítulo, foi afirmado que os impulsos são inatos, enquanto as neces- sidades são moldadas, ampliadas ou suprimidas pelo autoconceito, pelas normas sociais e pela experiência pregressa. Maslow observou esse fato quando escreveu que as características individuais influenciam a força das necessidades de ordem superior, como a necessidade de pertencer. O psicólogo David McClelland investigou mais a fundo a ideia de que a força da necessidade pode ser alterada pelas influências sociais. Em especial, ele reconheceu que as ne- cessidades de uma pessoa podem ser fortalecidas mediante reforço, aprendizagem e condições sociais. McClelland examinou três necessidades “aprendidas”: realização, poder e afiliação.23 Necessidade de realização As pessoas com forte necessidade de realização (nRea) que- rem atingir objetivos razoavelmente difíceis por meio de seu próprio esforço. Elas preferem trabalhar sozinhas em vez de em equipes e escolhem tarefas com um grau moderado de risco (nem tão fáceis e nem impossíveis de concluir). As pessoas com alta nRea também desejam feedback e reconhecimento inequívocos por seu sucesso. O dinheiro é um motivador fra- McSchane_05.indd 122McSchane_05.indd 122 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 5 Bases da Motivação dos Funcionários 123 co, exceto quando está associado a feedback e reconhecimento.24 Os funcionários com baixa nRea, por outro lado, executam melhor o seu trabalho quando o dinheiro é utilizado como incentivo. Os empreendedores de sucesso tendem a ter uma alta nRea, possivelmente porque estabelecem objetivos difíceis para si próprios e prosperam quando enfrentam concorrência.25 Necessidade de afiliação A necessidade de afiliação (nAfi) refere se ao desejo de buscar a aprovação das outras pessoas, estar de acordo com seus desejos e expectativas, e evitar o con- flito e a confrontação. As pessoas com uma forte nAfi tentam projetar uma imagem favorável de si mesmas. Elas tendem a apoiar ativamente as outras pessoas e a colocar panos quentes nos conflitos de trabalho. Os funcionários com alta nAfi geralmente trabalham bem em papéis de coordenação para mediar conflitos e em posições de vendas, em que a tarefa principal é culti- var relações de longo prazo. No entanto, tendem a ser menos eficazes na alocação de recursos escassos e na tomada de decisões com potencial para gerar conflitos. As pessoas em posição para tomar decisões devem ter uma necessidade de afiliação relativamente baixa para que suas escolhas e ações não sejam influenciadas por uma necessidade pessoal de aprovação.27 Necessidade de poder As pessoas com uma alta necessidade de poder (nPod) querem exercer controle sobre as outras e se preocupam em manter sua posição de liderança. Elas se baseiam frequentemente na comunicação persuasiva, dão mais sugestões nas reuniões e tendem a avaliar publica- mente as situações com mais frequência. McClelland ob- servou que existemdois tipos de nPod. Os indivíduos que desfrutam do poder para o seu próprio bem, e o usam para promover os interesses pessoais, além de ostentá-lo Adriana Cisneros (direita) demonstrava uma forte necessidade de realização muito antes de começar a trabalhar no império latino-ameri- cano de mídia e entretenimento. “Ela é muito motivada. E é incansável. Tem excelentes ideias e quer transformá-las em realidade”, afirma Gustavo Cisneros (esquerda), pai de Adriana e CEO do Cisneros Group em Coral Gables, Flórida. Adriana, diretora de estratégia e vice- -presidente da empresa, afirma que sua necessidade de realização é ao mesmo tempo aprendida e genética. “A educação é uma parte importante dessa história”, ela sugere. “Meus pais sempre deram todo o apoio quando os filhos tinham ideias malucas”.26 necessidade de realização (nRea) Necessidade aprendida segun- do a qual as pessoas querem cumprir metas razoavelmente difíceis e desejam feedback e reconhecimento inequívocos por seu sucesso. necessidade de afiliação (nAfi) Necessidade aprendida segun- do a qual as pessoas buscam a aprovação das outras, querem estar de acordo com os desejos e expectativas delas e evitar o conflito e a confrontação. necessidade de poder (nPod) Necessidade aprendida segun- do a qual as pessoas querem controlar o ambiente, incluindo os recursos humanos e mate- riais, para se beneficiarem (po- der personalizado) ou às outras pessoas (poder socializado). McSchane_05.indd 123McSchane_05.indd 123 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 124 PARTE II Comportamento Individual e Processos como um símbolo de status, têm poder personalizado. Outros têm principalmente uma alta necessidade de poder socializado porque desejam o poder como um meio de ajudar as outras pessoas.28 McClelland argumenta que os líderes eficazes devem ter uma alta necessidade de poder socializado em vez de personalizado, ter um alto grau de altruísmo e responsabilidade social e se preocupar com as consequências das suas próprias ações sobre as outras pessoas. Necessidades de aprendizagem McClelland acreditava que as necessidades podem ser aprendidas (mais exatamente, fortalecidas ou enfraquecidas), e os programas de treinamento que desenvolveu apoiavam essa ideia. Em seu programa de motivação para a realização, alunos escreviam histórias voltadas para a realização e praticavam comportamentos voltados para a realização em jogos de negócios. Eles também concluíam um plano de realização detalhado para os próximos dois anos e formavam um grupo de referência com outros alunos para apoiar sua nova motivação para a realização.29 Os participantes desses programas de motivação para a realização fundavam mais novos negócios, tinha maior envolvimento com a comunidade, investiam mais na expansão de seus negócios e empregavam o dobro dos funcionários em relação a uma amostra empareada de não participantes. Para aumentar a motivação para a realização, os programas de treinamento alteravam os autoconceitos dos participantes e re- forçavam experiências, amplificando emoções relacionadas geradas por impulsos inatos. Na redação de planos de realização, por exemplo, os participantes eram encorajados (e apoiados por outros participantes) a vivenciarem a emoção do sucesso que esperavam no futuro. Teoria dos quatro impulsos Uma das mensagens centrais deste capítulo é que as emoções desempenham uma função importante na motivação do funcionário. Essa visão é apoiada por uma série de novas pes- quisas em neurociências, mas está quase completamente ausente das teorias de motivação contemporâneas em comportamento organizacional. Os cientistas sociais de diversos campos (psicologia, antropologia, etc.) cada vez mais concordam que os seres humanos possuem vá- rios impulsos fisicamente conectados, incluindo a interação social, a aprendizagem e o suces- so. Uma das poucas teorias motivacionais a aplicar esse conhecimento emergente é a teoria dos quatro impulsos.30 Desenvolvida pelos professores Paul Lawrence e Nitin Nohria, da Harvard Business School, a teoria dos quatro impulsos afirma que todos temos o impulso de adquirir, vincular, aprender e defender: • Impulso de adquirir. É o impulso de buscar, pegar, controlar e reter objetos e experiên- cias pessoais. O impulso de adquirir vai além do básico dos alimentos e da água; inclui melhorar o autoconceito de uma pessoa por meio do status relativo e do reconhecimen- to na sociedade.31 Desse modo, é a base da concorrência e também da nossa necessida- de de estima. A teoria dos quatro impulsos afirma que o impulso de adquirir é instável porque o propósito da motivação humana é alcançar uma posição mais alta do que a das outras pessoas, não apenas satisfazer as necessidades fisiológicas. • Impulso de se vincular. É o impulso de formar relações sociais e desenvolver compro- missos de cuidados mútuos com as outras pessoas. Ele explica por que as pessoas for- mam identidades sociais alinhando seu autoconceito com diversos grupos sociais (ver Capítulo 3), além de por que indivíduos com pouco contato social tendem a ter mais problemas de saúde graves.32 O impulso de vincular motiva as pessoas a cooperarem e, consequentemente, é um ingrediente fundamental no sucesso das organizações e no desenvolvimento das sociedades. • Impulso de aprender. É o impulso de satisfazer a nossa curiosidade, conhecer e com- preender a nós mesmos e ao ambiente à nossa volta.33 Quando observamos algo que seja inconsistente com o nosso conhecimento atual, ou que esteja além da nossa com- preensão, vivenciamos uma tensão que nos motiva a preencher essa lacuna de informa- ção. Na verdade, estudos revelaram que as pessoas sem acesso a qualquer informação nova desejarão até mesmo as informações enfadonhas; o impulso de aprender gerou emoções tão fortes que os participantes do estudo acabaram ansiando por relatórios do mercado de ações com um mês de defasagem!34 O impulso de aprender está rela- cionado com as necessidades de ordem superior do crescimento e da autorrealização, descritas anteriormente. McSchane_05.indd 124McSchane_05.indd 124 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 5 Bases da Motivação dos Funcionários 125 • Impulso de defender. É o impulso de nos protegermos física e socialmente. Provavel- mente o primeiro impulso a se desenvolver, ele cria uma resposta “lutar ou fugir” diante de um perigo pessoal. O impulso de defender vai além de nos protegermos fisicamente; ele inclui defender as nossas relações, nossas aquisições e nossos sistemas de crenças. Esses quatro impulsos são inatos e universais, o que significa que são partes inerentes de nossos cérebros e são encontrados em todos os seres humanos. Eles também são inter- dependentes. Não há uma hierarquia de impulsos, de modo que nenhum depende do outro ou é inerentemente inferior ou superior a outro. A teoria dos quatro impulsos também afir- ma que eles formam um conjunto completo, ou seja, o modelo não exclui nenhum impulso fundamental. Outra característica fundamental é que três dos quatro impulsos são proativos e que tentamos satisfazê-los regularmente. Apenas o impulso de defender é reativo, pois é desencadeado por ameaças. Assim, qualquer noção de satisfação dos impulsos é, na melhor das hipóteses, temporária. Como os impulsos influenciam a motivação dos funcionários A teoria dos quatro impulsos é derivada de pesquisas recentes em neurociências sobre o processo de marcadores emocionais e sobre como as emoções são canalizadas em decisões e comportamentos. Como descrevemos em capítulos anteriores, nossas percepções do mundo ao nosso redor são sinali- zadas de forma rápida e inconsciente com marcadores emocionais.35 De acordo com a teoria dos quatro impulsos, estes determinam quais emoções são ligadas aos estímulos recebidos. Pense em nosso exemplo anterior: se chega ao trabalho um dia e vê um estranho sentado em sua cadeira, você pode sentir rapidamente preocupação, curiosidade ou ambos. Essas emo- ções são criadas automaticamentepor um ou mais dos quatro impulsos. Nesse exemplo, as emoções produzidas provavelmente são fortes o bastante para exigir sua atenção e motivá-lo a agir com base nessa constatação. Na maior parte das vezes, não temos consciência das nossas experiências emocionais por- que elas são sutis e fugazes. No entanto, as emoções se tornam experiências conscientes quan- do são suficientemente fortes ou quando sentimos emoções conflitantes. Sob essas circuns- tâncias, nosso conjunto de habilidades mentais se baseia nas normas sociais, na experiência pregressa e nos valores pessoais para direcionar a força motivacional das nossas emoções para ações capazes de lidar com a situação (ver Figura 5.3). Em outras palavras, nosso conjunto de habilidades mentais escolhe os cursos de ação que são aceitáveis para a sociedade, são consistentes com nossa bússola moral e têm alta probabilidade de atingir o objetivo.36 Esse é o processo descrito no começo deste capítulo, a saber, de que os impulsos produzem emoções; nosso autoconceito, normas sociais e experiência pregressa as traduzem em necessidades vol- tadas para objetivos, e essas características individuais também traduzem as necessidades em decisões e comportamento. Impulso de adquirir Normas sociais O conjunto de habilidades mentais canaliza as forças emocionais criadas pelos impulsos Escolha e esforço voltados para objetivos Valores pessoais Experiência pregressa Impulso de se vincular Impulso de aprender Impulso de defender FIGURA 5.3 Teoria dos quatro impulsos da motivação. Fonte: Baseado em informações de P.R. Lawrence and N. Nohria, Driven: How Human Nature Shapes Our Choices (San Francisco: Jossey-Bass, 2002). teoria dos quatro impulsos Teoria da motivação baseada nos impulsos inatos de ad- quirir, vincular, aprender e defender que incorporam tanto as emoções quanto a racionalidade. McSchane_05.indd 125McSchane_05.indd 125 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 126 PARTE II Comportamento Individual e Processos Avaliação da teoria dos quatro impulsos Embora tenha sido introduzida recentemen- te, a teoria dos quatro impulsos se baseia em uma profunda base de pesquisa que remonta a mais de três décadas. Os impulsos foram identificados a partir de estudos psicológicos e antropológicos. Além disso, Shalom Schwartz escreveu recentemente que a teoria dos quatro impulsos corresponde bem às dez dimensões em seu modelo circumplexo de valores pessoais (ver Capítulo 2).37 A tradução dos impulsos em comportamentos voltados para objetivos tem sua origem em um considerável volume de pesquisa sobre as emoções e os processos neurais. A teoria explica por que as necessidades variam entre os indivíduos e evita o pressuposto de que todos têm a mesma hierarquia de necessidades. Observe também que a teoria dos quatro impulsos satisfaz dois dos critérios de Maslow para qualquer teoria motivacional: ela é holísti- ca (relacionada a todos os impulsos, não apenas a um ou dois) e humanista (reconhece o papel do pensamento humano e das influências sociais, não apenas o instinto). A teoria dos quatro impulsos também proporciona uma compreensão mais clara do papel da inteligência emo- cional na motivação e no comportamento dos funcionários. Os funcionários com inteligência emocional elevada são mais sensíveis às demandas concorrentes dos quatro impulsos, são mais capazes de evitar o comportamento impulsivo decorrente destes impulsos e podem julgar a melhor maneira de agir para satisfazerem essas demandas de impulso em um contexto social. Mesmo com seus alicerce sólido de pesquisa, a teoria dos quatro impulsos está longe de ser completa. A maioria dos especialistas argumentaria que existe um ou dois impulsos adicionais que deveriam ser incluídos. Além disso, as normas sociais, os valores pessoais e a experiência pregressa provavelmente não representam o conjunto total de características individuais que traduzem as emoções em esforço voltado para objetivos. Por exemplo, a per- sonalidade e o autoconceito provavelmente exercem uma função importante na tradução dos impulsos em necessidades e das necessidades em decisões e comportamentos. Consequências práticas da teoria dos quatro impulsos A principal recomendação da teoria dos quatro impulsos é garantir que os empregos e locais de trabalho proporcionem uma oportunidade equilibrada para que os quatro impulsos sejam satisfeitos.38 Na realidade, as recomendações são duas. A primeira é que os melhores locais de trabalho para a motiva- A Radialpoint, uma das empresas mais bem administradas do Ca- nadá, desenvolve tecnologias de ponta para a Verizon, a Bell Canada e outras gigantes da Internet. O CEO e cofundador Hamnett Hill acredita que equilibrar a satisfação dos impulsos dos funcionários é um fator por trás desse sucesso. “As pessoas querem um trabalho interessante que faça a diferença e seja recompensador”, Hill explica. Os 250 funcionários da empresa de Montreal satisfazem seu impulso de adquirir com o desenvolvimento pessoal, trabalhos desafiadores e recompensas por desempenho, mas eles também trabalham em uma cultura apoiadora, com for- mação de equipes e comunicação aberta. “Todos querem se sentir respeitados e valorizados, como se estivessem trabalhando com algo importante, e todos querem ter uma grande equipe ao seu redor”, afirma Hill.39 McSchane_05.indd 126McSchane_05.indd 126 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 5 Bases da Motivação dos Funcionários 127 ção e o bem-estar do funcionário ofereçam condições que ajudem os funcionários a satisfa- zerem seus quatro impulsos. Os funcionários buscam continuamente a satisfação dos seus impulsos inatos, então as empresas de sucesso fornecem níveis suficientes de recompensas, informações sobre eventos organizacionais, interação social e assim por diante para todos os funcionários. A segunda recomendação é que a satisfação dos quatro impulsos deve ser mantida em equilíbrio; isto é, as organizações devem evitar oportunidades demais ou de menos para sa- tisfazer cada impulso. O motivo dessa advertência é que os quatro impulsos se equilibram mutuamente. O impulso de se vincular equilibra o impulso de adquirir; o impulso de defen- der equilibra o impulso de aprender. Uma empresa que estimula o impulso de adquirir sem o impulso de se vincular pode causar confusão na política da organização e gerar conflito disfuncional. A mudança e a novidade no local de trabalho aumentarão o impulso de apren- der, mas, em excesso, desencadearão o impulso de defender a tal ponto que os funcionários se tornarão territoriais e resistentes à mudança. Desse modo, o local de trabalho deve oferecer oportunidades suficientes para manter os quatro impulsos em harmonia. Essas recomendações explicam por que o Standard Chartered Bank, descrito no início deste capítulo, tem uma equipe motivada e é considerada um dos melhores lugares onde tra- balhar no mundo. A empresa motiva os funcionários a buscarem objetivos desafiadores (im- pulso de adquirir), mas equilibra essa motivação com eventos sociais e recompensas igualitá- rias. A empresa encoraja novas ideias, mas também mantém uma certa estabilidade nas vidas profissionais da equipe e busca novas maneiras de melhorar o bem-estar dos funcionários. TEORIA MOTIVACIONAL DAS EXPECTATIVAS As teorias descritas até agora explicam principalmente as origens internas da motivação do funcionário. Mas como esses impulsos e necessidades se traduzem em esforço e comporta- mento específicos? A teoria dos quatro impulsos reconhece que as normas sociais, os valores pessoais e a experiência pregressa direcionam nossos esforços, mas não oferece mais detalhes. A teoria das expectativas, por outro lado, oferece um modelo elegante baseado na lógica para prever a direção escolhida, o nível e a persistência da motivação. Essencialmente, a teoria afirma que o esforço do trabalho é direcionado a comportamentos que as pessoas acreditam que levarão aos resultados desejados. Em outras palavras,somos motivados a alcançar ob- jetivos com a maior previsão de retorno.40 Como vemos na Figura 5.4, o nível de esforço de OA4 teoria das expectativas Teoria motivacional baseada na ideia de que o esforço de trabalho é direcionado para comportamentos que as pes- soas acreditam que levarão a resultados desejados. Resultado 3 DesempenhoEsforço +/– Resultado 2 +/– Resultado 1 +/– Probabilidade de que um nível de esforço específico resulte em um nível espe- cífico de desempenho. Expectativa E para DExpectativa E para D Probabilidade de que um nível de desempenho espe- cífico resulte em um nível específico de resultado. Expectativa D para RExpectativa D para R Satisfação prevista para o resultado. ValênciaValênciaExpectativa E para D Expectativa D para R Valência FIGURA 5.4 Teoria motivacional das expectativas. McSchane_05.indd 127McSchane_05.indd 127 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 128 PARTE II Comportamento Individual e Processos um indivíduo depende de três fatores: expectativa de esforço para desempenho (E-para-D), expectativa de desempenho para resultado (D-para-R) e valências de resultado. A motivação do funcionário é influenciada pelos três componentes do modelo da teoria das expectativas. Se qualquer um dos componentes enfraquecer, a motivação se enfraquece. • Expectativa E-para-D. Trata-se da probabilidade percebida pelo indivíduo de que seu esforço resultará em um determinado nível de desempenho. Em algumas situações, os funcionários podem acreditar que conseguem realizar a tarefa de forma inquestionável (uma probabilidade de 1). Em outras situações, esperam que até mesmo o nível mais elevado de esforço não resultará no nível de desempenho desejado (uma probabilidade de 0). Na maioria dos casos, a expectativa E-para-D fica em algum ponto entre esses dois extremos. • Expectativa D-para-R. Trata-se da probabilidade percebida de que um determinado comportamento ou nível de desempenho levará a um determinado resultado. Em ca- sos extremos, os funcionários podem acreditar que realizar uma determinada tarefa (desempenho) resultará definitivamente em um determinado resultado (uma proba- bilidade de 1) ou podem acreditar que o desempenho bem-sucedido não terá nenhum efeito sobre esse resultado (uma probabilidade de 0). Em geral, a expectativa D-para-R cai em algum ponto entre esses dois extremos. • Valências de resultado. A valência é a satisfação ou insatisfação prevista que um indiví- duo sente em relação a um resultado. Ela varia entre negativa e positiva (o intervalo real não importa, podendo ser de – 1 a +1 ou de – 100 a +100). Uma valência de resultado representa a satisfação prevista de uma pessoa com o resultado.41 Os resultados têm uma valência positiva quando são consistentes com nossos valores e satisfazem nossas necessidades; eles têm uma valência negativa quando se opõem a nossos valores e ini- bem a satisfação da necessidade. McSchane_05.indd 128McSchane_05.indd 128 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Comportamento Organizacional O Comportamento Humano no Trabalho Tradução da Décima Segunda Edição John W. Newstrom Comportamento Organizacional: O Comportamento Humano no Trabalho Tradução da décima segunda edição ISBN 978-85-7726-028-7 A reprodução total ou parcial deste volume por quaisquer formas ou meios, sem o consentimento escrito da editora, é ilegal e confi gura apropriação indevida dos direitos intelectuais e patrimoniais dos autores. Copyright © 2008 de McGraw-Hill Interamericana do Brasil Ltda. Todos os direitos reservados. Av. Brigadeiro Faria Lima, 201 – 17o andar São Paulo – SP – CEP 05426-100 Todos os direitos reservados. © 2008 de McGraw-Hill Interamericana Editores, S.A. de C. V. Prol. Paseo de la Reforma 1015 Torre A Piso 17, Col. Desarrollo Santa Fe, Delegación Álvaro Obregón México 01376, D. F., México Tradução da décima segunda edição em inglês de Organizational Behavior: Human Behavior at Work, 12th edition © 2007 de McGraw-Hill/Irwin, uma unidade de negócios de The McGraw-Hill Companies, Inc. ISBN da obra original: 978-0-07-287546-1 Diretor-geral: Adilson Pereira Editora de Desenvolvimento: Alessandra Borges Produção Editorial: Lummi • Editorial • Design Supervisora de Produção: Guacira Simonelli Preparação de Texto: Marcos Soel Silveira Santos Editoração Eletrônica: Crontec Ltda. Índice para catálogo sistemático: 1. Análise organizacional : Administração 658.001 2. Estudos organizacionais : Administração 658.001 Administração A McGraw-Hill tem forte compromisso com a qualidade e procura manter laços estreitos com seus leitores. Nosso principal objetivo é oferecer obras de qualidade a preços justos e um dos caminhos para atingir essa meta é ouvir o que os leitores têm a dizer. Portanto, se você tem dúvidas, críticas ou sugestões entre em contato conosco – preferencialmente por correio eletrônico mh_brasil@mcgraw-hill.com – e nos ajude a aprimorar nosso trabalho. Teremos prazer em conversar com você. Em Portugal use o endereço servico_clientes@mcgraw-hill.com. _______________________________________________________________ N532c Newstrom, John W. Comportamento organizacional [recurso eletrônico] : o comportamento humano no trabalho / John W. Newstrom ; tradução: Ivan Pedro Ferreira Santos ; revisão técnica: Carlos Tasso Eira de Aquino. – 12. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : AMGH, 2011. Editado também como livro impresso em 2008. ISBN 978-85-63308-87-0 1. Administração. 2. Comportamento organizacional. I. Título. CDU 005.32 _______________________________________________________________ Catalogação na publicação: Ana Paula Magnus – CRB 10/2052 Capítulo Sete Liderança Uma liderança tirânica pode levar a um desempenho extraordinário e a efeitos humanos intoleráveis. Hao Ma, Ranjan Karri e Kumar Chittipeddi1 Todos os grandes líderes possuem quatro características: princípios sólidos, orientação moral, visão e capacidade para formar um consenso. John Brock2 OBJETIVOS DO CAPÍTULO COMPREENDER A natureza da liderança e do adesismo. A diferença entre traços e comportamentos. Diferentes estilos de liderança. Abordagens tradicionais para a liderança. Abordagens contingenciais para a liderança. Substitutos para a liderança. A autoliderança e a superliderança. O coaching como um papel da liderança. Al Dunlap foi CEO da Scott Paper Company por dois anos. Logo após ter sido selecio- nado para liderar a empresa, ele adquiriu o apelido de “Al Serra Elétrica”, em razão do modo dramático como realizou cortes na organização e reduziu suas operações. No total, ele cortou 11 mil empregos, reduziu os gastos com pesquisa e desenvolvimento (P&D) em 50%, proibiu o envolvimento dos gerentes em projetos comunitários e eliminou todas as doações a instituições de caridade realizadas pela companhia. Sua rigidez e tenacidade estavam focadas em maximizar o valor do patrimônio dos acionistas. Os resultados foram o incremento no valor de comercialização das ações da Scott Paper de aproximadamente 225% e a bem-sucedida fusão com a Kimberly-Clark. A tentativa posterior de Dunlap de duplicar seu feito na Sunbeam foi desastrosa, ilustrando perfeitamente a lição apresentada na citação do início deste capítulo. • • • • • • • • 156 Capítulo 7 Liderança 157 A NATUREZA DA LIDERANÇA Liderança é o processo de infl uenciar e apoiar outras pessoas para que elas trabalhem entusiasti- camente para a obtenção de determinados objetivos. Ela é o fator crítico que auxilia um indivíduo ou um grupo de indivíduos a identifi car suas metas, para então motivá-los e ajudá-los na conquista dessas metas. Os três elementos mais importantes presentes na sua defi nição são infl uência/apoio, esforço voluntário e a conquista de metas. Sem a liderança, uma organização seria apenas uma confusão de pessoas e equipamentos, do mesmo modo que umaorquestra sem um maestro seria apenas um conjunto de músicos e instrumentos musicais. A orquestra e todas as outras organizações requerem liderança para desenvolver ao máximo seus preciosos ativos. O processo de liderança é similar, do ponto de vista dos seus efeitos, aos segredos químicos que transformam uma lagarta em uma borboleta, com toda a beleza que fazia parte do potencial da lagarta. Liderança é, dessa forma, um catalisador que transforma o potencial em realidade. Esse papel, em geral, é dramaticamente visto em organizações gigantes, por exemplo, quando o CEO Jack Welch liderou a transformação da General Electric, de um gigante adormecido, em 1980, para uma máquina efi ciente no século XXI. Também é igualmente importante em organizações meno- res como a Microsoft Corporation, que Bill Gates iniciou e conduziu ao patamar de proeminência mundial no desenvolvimento de softwares e de sistemas operacionais para microcomputadores. O exemplo inicial deste capítulo sobre os sucessos e fracassos de Al Dunlap ressalta o papel de ca- talisador desempenhado pelos líderes, ao mesmo tempo que demonstra o fato de que muitos estilos de liderança possuem um “lado obscuro” (por exemplo, a difi culdade em demitir trabalhadores e os perigos de um foco restrito em apenas um objetivo). Em todo caso, o teste fi nal para a liderança é o grau segundo o qual ela identifi ca, desenvolve, canaliza e enriquece o potencial que já está presente em uma organização e em seus membros. Neste capítulo será discutida a natureza da liderança — os comportamentos, os papéis e as habi- lidades que se combinam para formar diferentes estilos de liderança. As abordagens comportamen- tais são descritivas, oferecendo variedade de formas pelas quais as ações dos líderes normalmente se distinguem (por exemplo, os líderes podem ser positivos ou negativos, autocráticos ou participa- tivos, orientados para os funcionários ou orientados para as tarefas). As abordagens contingenciais são mais analíticas, encorajando os gerentes a examinar a situação enfrentada e a selecionar um estilo de liderança que se ajuste melhor a ela. Concluímos o capítulo com a análise de algumas idéias mais novas, como os substitutos para liderança, a superliderança e o coaching. Gestão e Liderança A liderança é uma parte importante da gestão, mas ela não é tudo. O papel primordial de um líder é infl uenciar os outros para que voluntariamente persigam os objetivos defi nidos (preferencialmente com entusiasmo).3 Os gerentes também planejam atividades, organizam as estruturas apropriadas e controlam os recursos. Os gerentes detêm posições formais, embora qualquer indivíduo possa utilizar sua infl uência informal para agir como um líder. Os gerentes obtêm resultados ao direcio- narem as atividades dos outros, enquanto os líderes criam uma visão e inspiram os outros para que a realizem, fazendo que eles ultrapassem suas próprias competências normais. Como existe uma diferença entre gerenciamento e liderança, líderes fortes podem tornar-se maus gerentes se um planejamento inadequado fi zer que os membros de seu grupo se movimentem na direção errada. Embora eles possam fazer que seus grupos continuem operando, simplesmente não conseguem que isso seja feito de modo a servir da melhor forma possível os objetivos da organização. Outras combinações também são possíveis. Um indivíduo pode ser um líder fraco e ainda as- sim ser um gerente efi caz, especialmente se estiver gerenciando um grupo de pessoas que possua uma compreensão clara acerca de suas atividades e uma forte motivação para o trabalho. Esse conjunto de circunstâncias é menos provável e, dessa forma, espera-se que bons gerentes tenham alta capacidade de liderança, entre outras habilidades. Felizmente, a capacidade de liderança pode ser adquirida por meio da observação atenta de modelos (outros líderes) efi cazes, participa- ção em treinamento gerencial e aprendizagem a partir de experiências no trabalho.4 Catalisador 158 Parte Três Liderança e Empowerment Os Traços dos Líderes Efi cazes As pessoas têm-se preocupado com a natureza da liderança desde os primórdios da história. As pri- meiras pesquisas realizadas buscavam identifi car os traços — características físicas, intelectuais ou de personalidade — que distinguiam os líderes dos não-líderes, ou entre líderes bem-sucedidos e malsucedidos. Muitos fatores cognitivos e psicológicos, como inteligência, ambição e pujança, foram estudados. Outros pesquisadores examinaram características físicas, como peso, altura, formato cor- poral e atratividade pessoal. Muitas corporações ainda hoje utilizam o controverso teste de persona- lidade indicador de tipos de Myers-Briggs, baseado no trabalho do psicólogo Carl Jung, para rotular os gerentes em quatro dimensões — extrovertidos ou introvertidos (E ou I, do inglês, extroverts ou introverts), possuidores de bom senso ou intuitivos (S ou N, do inglês, sensers ou intuitors), racionais ou emocionais (T ou F, do inglês, thinkers ou feelers) e julgadores ou perceptivos (J ou P, do inglês, judges ou perceivers). Claramente, o interesse e a especulação persistem em torno das características que fazem um bom líder. A pesquisa atual sobre os traços de liderança sugere que alguns fatores realmente ajudam a distinguir os líderes dos não-líderes (ver Figura 7.1).5 Os traços mais importantes (primários) são: elevado nível de força de vontade (motivação) pessoal, o desejo de liderar, a integridade pessoal e a autoconfi ança. A capacidade cognitiva (analítica), o conhecimento dos negócios, o carisma, a criatividade, a fl exibilidade e o calor humano também são fatores freqüentemente desejados, mas, de modo geral, são percebidos como secundários com relação à sua importância. Uma conclusão importante sobre esses traços de liderança é que eles não garantem, necessaria- mente, uma liderança bem-sucedida. Eles são vistos mais especifi camente como competências ou recursos pessoais que podem ou não ser desenvolvidos e utilizados. Muitas pessoas têm competên- cia para serem líderes efi cazes, porém algumas optam por não demonstrar os traços que possuem. Outros podem ter os traços necessários e o desejo de utilizá-los, no entanto, a oportunidade para fazê-lo pode não surgir nunca. Uma questão fi nal sobre liderança refere-se à possibilidade de a li- derança ser adquirida ou aprimorada com o passar do tempo, caso alguém tenha aspirações de tê-la. A tipologia Myers- Briggs Traços positivos FIGURA 7.1 Traços de Liderança Força de vontade (m otivação) e energia pessoais D es ej o de li de ra r Honestidade e integridade A uto co nfi an ça Capacidade cognitiva Traços Primários: Traços Secundários: Conhecimento dos negócios Carism a Criatividade e originalidade Fle xib ilid ad e e ad ap tab ilid ad e Afetividade positiva (calor humano) Capítulo 7 Liderança 159 Embora alguns traços possam ser difíceis de acumular no curto prazo, outros (como a autoconfi ança e o conhecimento dos negócios) podem ser desenvolvidos por estudantes dedicados. Alguns líderes exibem traços que podem, no entanto, ser disfuncionais para o desempenho de suas uni- dades e para o seu sucesso pessoal. Um traço negativo comum é o narcisismo, com o qual os líderes tornam-se excessivamente convencidos da própria importância, exageram suas próprias conquistas, buscam favores especiais e exploram os outros para benefício pessoal. A menos que seja cuidadosamen- te controlado, o narcisismo, na melhor das hipóteses, leva à decepção consigo mesmo; na pior, produz líderes que são perigosamente autoconfi antes, indivíduos em busca de poder que querem desesperada- mente alimentar seus próprios egos. Isso os leva a desconsiderar os direitos das outras pessoas, a ignorar a importância da empatia e a falhar no respeito dos sentimentos de seus subordinados. Comportamento de Liderança Grande parte das pesquisas já realizadas teve seu foco na identifi cação dos comportamentos de liderança. Dessa perspectiva,uma liderança bem-sucedida depende mais dos comportamentos, habilidades e ações apropriados, e menos dos traços pessoais. A diferença é similar àquela exis- tente na física entre a energia potencial e a energia cinética: um tipo (os traços) fornece o potencial básico, e o outro (o comportamento, as habilidades e as ações) representa a liberação e a expressão bem-sucedidas desses traços, de modo muito semelhante ao da energia cinética. Tal distinção é sig- nifi cativa, uma vez que os comportamentos e as habilidades podem ser aprendidos e modifi cados, ao passo que muitos traços são relativamente fi xos no curto prazo. Os três tipos mais gerais de ha- bilidades de liderança que os líderes utilizam são: as habilidades técnicas, as habilidades humanas e as habilidades conceituais. Embora essas habilidades estejam inter-relacionadas na prática, para efeito de estudo elas podem ser consideradas separadamente. Habilidade Técnica A habilidade técnica refere-se ao conhecimento e à capacidade de uma pessoa com relação a qualquer tipo de processo ou técnica. Alguns exemplos são as habilidades aprendidas por contadores, engenheiros, digitadores e fabricantes de ferramentas. Uma habili- dade técnica é o elemento diferenciador do desempenho no trabalho nos níveis operacional e profi ssional, mas, à medida que os funcionários são promovidos a posições de liderança, suas habilidades técnicas tornam-se proporcionalmente menos importantes, conforme mostrado na Figura 7.2. Como gerentes, eles dependem cada vez mais das habilidades técnicas de seus subor- dinados; em muitos casos, eles nunca haviam exercitado nenhuma das habilidades técnicas que passaram a supervisionar. FIGURA 7.2 Variações no Uso das Habilidades de Liderança em Diferentes Níveis Organizacionais Habilidades conceituais Habilidades humanas Habilidades técnicas Alta gerênciaGerência médiaSupervisor 100 50 0 P o rc en ta g em d o t ra b al h o 160 Parte Três Liderança e Empowerment Uma Questão Ética Líderes são necessários; e os bons líderes são valorizados por suas organizações. Eles motivam suas forças de trabalho com visões convincentes sobre o futuro, guiam suas empresas em crises difíceis, criam culturas corporativas de apoio e aumentam o patrimônio de seus acionistas. Quando o desempenho é positivo, os líderes são reverenciados. Mas quanto eles valem? Muitos CEOs são ricamente recompensados, recebendo milhões de dólares por ano na forma de salários, bônus e opções de ações. Isso pode ser estressante para alguns observadores, que acreditam que esses líderes tornam-se ricos à custa dos outros funcionários. A relação entre as maiores remunerações para os CEOs e aquelas dadas a trabalhadores médios tem aumentado acentuadamente nas últimas décadas, nos Estados Unidos, de um patamar de 20:1 para seu ponto atual de 300:1. Durante um período no qual a remuneração média dos trabalhadores permaneceu relativamente estável, seria ético utilizar os recursos corporativos para pagar somas cada vez maiores para os CEOs, ao mesmo tempo que o hiato salarial existente entre eles e seus trabalhadores cresce? O que você acha? Habilidade Humana A habilidade humana é a capacidade para trabalhar de forma efi caz com as pessoas e desenvolver o trabalho em equipe. Ela envolve ampla variedade de comportamentos — a energização de indivíduos, o oferecimento de feedback, o coaching, a atenção, a demonstração de empatia e a sensibilidade, e a demonstração de compaixão e o apoio com as pessoas necessitadas. Uma pesquisa do instituto Gallup mostrou que a maioria dos trabalhadores considerou “possuir um chefe que se preocupe com os funcionários” como algo mais importante que o recebimento de recompensas monetárias e de benefícios adicionais. 6 Nenhum líder em qualquer nível organizacional escapa da exigência de habilidades humanas efi cazes. Isso representa uma parte importante da liderança que será discutida ao longo de todo o livro. A ausência de habilidades humanas tem provocado a queda de muitos gerentes e CEOs. Habilidade Conceitual A habilidade conceitual é a capacidade de pensar em termos de mode- los, estruturas e relações amplas, como os planejamentos de longo prazo. Ela se torna cada vez mais signifi cativa à medida que consideramos os cargos gerenciais hierarquicamente mais importantes. As habilidades conceituais lidam com idéias, enquanto as habilidades humanas referem-se às pes- soas e as habilidades técnicas dizem respeito às coisas. A análise das habilidades de liderança ajuda a explicar por que excelentes chefes de depar- tamento tornam-se, às vezes, maus vice-presidentes. Eles podem não estar utilizando a mistura adequada das habilidades exigidas para os trabalhos de nível superior, particularmente, habilidades conceituais adicionais. Flexibilidade Situacional Uma liderança bem-sucedida requer um comportamento que reúna e estimule seguidores na direção de objetivos defi nidos em situações específi cas. Todos os três elementos — líder, seguidores e situação — são variáveis que se afetam mutuamente na determinação do comportamento de liderança adequado. A liderança é claramente situacional. Em uma situação, a ação A pode ser o melhor conjunto de atos de liderança, mas, na próxima situação, a ação B pode ser a melhor opção. Tentar fazer que todos os líderes se ajustem a um padrão fi xo suprimirá as diferenças criativas e resultará em inefi ciência, uma vez que muitas peças quadradas tentarão encaixar-se em orifícios circulares. A liderança é uma parte de um sistema complexo, de forma que não há um modo simples de responder à seguinte questão: o que faz um líder? Algumas vezes, os líderes devem resistir à tentação de se tornarem visíveis em determinada situação. Embora uma boa liderança envolva um conjunto de comportamentos, ela não deve ser confundida com a mera realização de atividade quando nenhuma atividade for necessária. A pujan- ça e a constante interação com os outros não garantem uma boa liderança. Em certas ocasiões, a ação apropriada de liderança é permanecer em um segundo plano, retirando as pressões do grupo; manter-se em silêncio para que os outros possam falar; fi car calmo em tempos de turbulência; hesitar propositadamente e adiar a tomada de decisões. Em outras ocasiões, um líder deve ser Três elementos a serem considerados Capítulo 7 Liderança 161 mais decisivo, direcionador e controlador. A tarefa principal de um líder é reconhecer diferentes situações e adaptar-se a elas de forma consciente. Adesismo (Followership) Com poucas exceções, os líderes das organizações também são seguidores (liderados). Eles quase sempre prestam contas a alguém. Mesmo o presidente de uma empresa pública ou de uma organi- zação sem fi ns lucrativos deve reportar-se a um conselho de diretores. Os líderes devem ser ca- pazes de desempenhar os dois papéis, relacionando-se de maneira efi caz tanto de modo ascendente quanto descendente. E, da mesma forma que os líderes devem oferecer alguma coisa para seus superiores e funcionários, eles precisam da validação das autoridades superiores, assim como do apoio de seus seguidores. Nas organizações formais com diversos níveis hierárquicos, a capacidade para seguir alguém (subordinação dinâmica) é um dos primeiros requisitos para uma boa liderança. Ser um seguidor efi caz é uma oportunidade para o teste de futuros líderes, uma ocasião em que os funcionários são diretamente monitorados para se verifi car se eles exibem potencial para a liderança. Um desempe- nho habilidoso nos papéis atuais abre as portas para futuras oportunidades de liderança. Por outro lado, muitas pessoas falham em seus cargos não como resultado de quaisquer carências de habili- dades, mas pela ausência de habilidades para atuar como um seguidor. Essas habilidades ajudam os funcionários a darem suporte a seus líderes atuais e a serem subordinados efi cazes. Os comportamentos relacionados ao adesismo (followership) incluem: Não competir com o líder para estarno centro das atenções. Ser leal e oferecer apoio, ser um jogador com espírito de equipe. Não se tornar uma “pessoa que sempre diz sim”, que concorda automaticamente com tudo. Agir como o “advogado do diabo”, mediante a formulação de questões profundas. Confrontar construtivamente as idéias, os valores e as ações do líder. Antecipar potenciais problemas e preveni-los. Bons seguidores, então, precisam ser bem-sucedidos em seus próprios cargos, ao mesmo tempo que ajudam seus gerentes a serem bem-sucedidos nas posições deles. Simultaneamente, subordi- nados efi cazes também podem preparar-se para promoções, por meio do desenvolvimento de suas habilidades conceituais e de liderança. De forma similar, bons líderes nunca devem se esquecer de como é estar na linha de frente dos negócios. Muitos líderes efi cazes lembram a si mesmos da importância de seus papéis como seguidores ao visitarem periodicamente suas lojas, trabalhando um turno na fábrica ou realizando outras atividades para fi car em contato com os funcionários do primeiro nível de operações. ABORDAGENS COMPORTAMENTAIS PARA O ESTILO DE LIDERANÇA O padrão total das ações explícitas e implícitas dos líderes conforme visto pelos funcionários é chamado estilo de liderança. Ele representa uma combinação consistente de fi losofi a, habilida- des, traços e atitudes que é exibida no comportamento de uma pessoa. Cada estilo também refl ete, implícita ou explicitamente, as crenças de um gerente com relação às competências de um subor- dinado (Teoria X ou Teoria Y, tópicos discutidos no Capítulo 2). Conforme enfatizado ao longo de todo este livro, as percepções dos funcionários sobre os estilos de liderança são os elementos que realmente importam para eles. Os funcionários não respondem somente ao que os líderes pensam, fazem e dizem, mas também àquilo que eles percebem que seus líderes são. A liderança está verdadeiramente nos olhos de quem a vê. Esta seção discute uma variedade de estilos que se distinguem com base na motivação, no poder ou na orientação em direção às tarefas e às pessoas. Muitas classifi cações diferentes de estilos de liderança têm sido propostas e, posteriormente, consideradas úteis. As mais simples delas são ba- seadas em uma dimensão simples; outras enfocam duas ou mais formas de distinguir entre estilos. Embora cada estilo seja normalmente utilizado em combinação com outros estilos, ou até mesmo aplicado diferentemente entre os vários funcionários, os estilos de classifi cação serão discutidos separadamente, de modo a se ressaltar os contrastes existentes entre eles. Em geral, os esquemas • • • • • • Comportamentos relacionados ao adesismo (followership) 162 Parte Três Liderança e Empowerment mais antigos de classifi cação utilizavam uma abordagem universalista, na medida em que buscavam identifi car aquele único melhor estilo de liderança. Contudo, esse objetivo posteriormente mos- trou-se impossível de ser alcançado. Líderes Positivos e Negativos Os líderes abordam as pessoas para motivá-las de diversas formas. Se a abordagem enfatizar as recompensas — econômicas ou de qualquer outra natureza —, o líder usa liderança positiva. A melhoria na educação dos funcionários, maiores demandas por autonomia e outros fatores tornaram uma motivação satisfatória dos funcionários mais dependente da liderança positiva. Se a ênfase for colocada em ameaças, medo, grosseria e penalidades, o líder estará aplicando uma liderança negativa. Essa abordagem pode obter desempenho aceitável de curto prazo em mui- tas situações, mas possui custos humanos muito elevados. Os líderes negativos agem ostentando sua dominação e superioridade em relação às pessoas. Para fazer que o trabalho seja realizado, eles adotam com seu pessoal penalidades como a perda do emprego, a advertência na presença de outras pessoas e alguns dias de suspensão de pagamento. Eles demonstram autoridade na falsa crença de que ela possa assustar a todos de modo que se tornem produtivos. Eles são mais chefes que líderes. Existe um contínuo para os estilos de liderança, variando de um pólo altamente positivo para outro altamente negativo. Praticamente todos os gerentes utilizam uma mistura de estilos positivos e negativos em algum ponto dessa linha, contudo, um estilo dominante destaca-se no interior do grupo. O estilo relaciona-se ao modelo de comportamento organizacional utilizado pelo indivíduo. O modelo autocrático tende a produzir um estilo negativo; o modelo protecionista é, de algum modo, positivo; e os modelos apoiador, colegiado e sistêmico são claramente positivos. Uma liderança positiva geralmente produz nível de satisfação profi ssional e desempenho mais elevados. Líderes Autocráticos, Consultivos e Participativos A forma como um líder utiliza o poder também estabelece um tipo de estilo. Cada estilo — autocrá- tico, consultivo e participativo — tem seus benefícios e limitações. Um líder normalmente usa os três estilos durante certo período, porém um estilo tende a ser o dominante em relação aos demais. Um exemplo disso é uma supervisora de fábrica que geralmente é autocrática, mas participativa na determinação da escala de férias e consultiva na seleção do representante do departamento para o comitê de segurança. O Que os Gerentes Estão Lendo O professor Bob Quinn sugere que os líderes normalmente ajam a partir de seu estado nor- mal, utilizando comportamentos que já haviam funcionado para eles no passado, bem como imitando o estilo de outras pessoas que foram bem-sucedidas. As crises, contudo, desafi am os gerentes para que se ergam em direção a novos patamares e demonstrem seu estilo fun- damental de liderança. Isso envolve as seguintes transformações: 1. Deixar de estar centrado no conforto para tornar-se centrado nos resultados. 2. Substituir o direcionamento externo pelo direcionamento interno. 3. Abandonar a postura autofocada para transformar-se em um indivíduo focado nas outras pessoas. 4. Transformar-se de uma pessoa fechada em uma pessoa aberta. Quando os líderes entram em seu estado fundamental, eles se tornam mais conscientes, autênticos, revitalizados e capazes de transformar os outros. As práticas freqüentemente uti- lizadas por líderes fundamentais incluem ação refl exiva, envolvimento autêntico, um questio- namento que demonstre consideração, visão realista e amor justo. Fonte: QUINN, Robert E. Building the Bridge as You Walk On It: a Guide for Leading Change. São Francisco: Jossey-Bass, 2004. Recompensas ou penalidades? Os estilos e o uso do poder 162 Capítulo 7 Liderança 163 Os líderes autocráticos centralizam em si mesmos o poder e a tomada de decisões. Eles estru- turam toda a situação de trabalho para seus funcionários, que deverão apenas fazer o que lhes for soli- citado e não pensar de modo autônomo. Os líderes exercem toda a autoridade e assumem completa responsabilidade por seus atos. A liderança autocrática é tipicamente negativa, baseada em ameaças e punições, mas também pode parecer positiva, conforme demonstrado pelo autocrata benevolente que decide recompensar alguns de seus funcionários. Algumas vantagens da liderança autocrática decorrem do fato de que normalmente ela é satis- fatória para os líderes, permite decisões rápidas, possibilita a utilização de subordinados menos competentes e proporciona segurança e estrutura para os funcionários. A principal desvantagem é que muitos funcionários a reprovam, especialmente se ela for extremada o sufi ciente para criar medo e frus- tração. Além disso, ela raramente produz o grau de comprometimento organizacional, entre os funcionários, necessário para a obtenção de índices de rotatividade a absenteísmo baixos. O estilo de liderança de Al Dunlap, descrito no início deste capítulo, era claramente autocrático. Os líderes consultivos abordam um ou mais funcionários e pedem a eles que apresentem suas contribuições antes de tomarem as decisões. Esses líderes podem, dessa forma, escolher utilizar ou ignorar as informaçõese os conselhos recebidos. Caso haja uma percepção de que as contribuições são utilizadas, os funcionários têm maiores chances de sentir um impacto positivo; caso as con- tribuições sejam continuamente rejeitadas, os funcionários provavelmente sentirão como se seu tempo estivesse sendo desperdiçado. Os líderes participativos claramente descentralizam autoridade. As decisões participativas não são unilaterais, ao contrário do que ocorre com a liderança autocrática, pois eles utilizam as con- tribuições e a participação de seus seguidores. O líder e o grupo agem como uma unidade social. Os funcionários são informados sobre as condições que afetam seus trabalhos, bem como são esti- mulados a expressar suas idéias, apresentar sugestões e agir. A tendência geral encaminha-se para o uso mais amplo das práticas participativas porque elas são consistentes com os modelos de comportamento organizacional apoiador, colegiado e sistêmico. Em virtude da sua importância e da sua utilização cada vez mais difundida, a gestão participativa será detalhadamente discutida no próximo capítulo. A Utilização da Consideração e da Estrutura pelo Líder A consideração e a estrutura, também conhecidos como orientação para o funcionário e orien- tação para a tarefa, são dois diferentes estilos de liderança utilizados com os funcionário. Os líderes que demonstram consideração estão preocupados com as necessidades humanas de seus funcioná- rios. Eles tentam construir o espírito de trabalho em equipe, oferecem apoio psicológico e auxiliam os funcionários com seus problemas pessoais. Líderes que se baseiam na estrutura, orientados para as tarefas, por outro lado, acreditam que podem obter resultados ao manterem as pessoas constante- mente ocupadas, ignorando problemas e emoções pessoais e encorajando-as a produzir. Consideração e estrutura, de alguma forma, parecem ser mutuamente independentes, e não de- veriam necessariamente ser vistas como pólos opostos de um contínuo. Um gerente pode ter as duas orientações em graus variados. Os gerentes mais bem-sucedidos são aqueles que combinam quantidades relativamente altas de consideração e estrutura, dispondo de um pouco mais de ênfase para a consideração. 7 As primeiras pesquisas sobre consideração e estrutura foram feitas na University of Michigan e na Ohio State University. Em diversos tipos de ambiente, como em fábricas de veículos utili- tários, construção de estradas e escritórios de companhias seguradoras, o líder com mais foco na consideração demonstrou ter conseguido obter níveis de satisfação e produtividade um pouco mais elevados. Estudos subseqüentes confi rmam essa tendência geral e relatam efeitos colaterais benéfi -cos, por exemplo, índices de queixas menores, rotatividade mais baixa e grau de estresse reduzido no interior do grupo.8 Contrariamente, a ocorrência de estresse, rotatividade e de outros tipos de problemas possuía probabilidade maior de incidência nos casos em que o gerente havia sido incapaz de demonstrar consideração.a Orientações para o funcionário e para a tarefa Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094 M175c McShane, Steven L. Comportamento organizacional : conhecimento emergente, realidade global [recurso eletrônico] / Steven L. McShane, Mary Ann Von Glinow ; tradução : Francisco Araújo da Costa. – 6. ed. – Porto Alegre : AMGH, 2014. Editado também como livro impresso em 2014. ISBN 978-85-8055-404-5 1. Comportamento organizacional. I. Von Glinow, Mary Ann. II. Título. CDU 005.32 McShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd iiMcShane_Iniciais_6ed_eletronica.indd ii 28/07/14 13:4328/07/14 13:43 8 Dinâmica de Equipe A fábrica da Reckitt Benckiser (RB) em Derby, Grã-Breta- nha, é um modelo de eficiência, mas você não vai encon- trar muitos chefes por lá. As duas áreas de produção da unidade ultracompetitiva (uma faz líquidos de alto volume como o detergente Woolite®, a outra é a única produtora de aerosóis da Europa) operam com equipes autolidera- das. As equipes são responsáveis pelo treinamento, pela melhoria da produtividade e pelo controle de qualidade. A fábrica emprega 200 funcionários e possui apenas três gerentes de produção. Os funcionários recebem bonifica- ções de equipe baseadas na qualidade dos produtos e na rapidez com que resolvem problemas de qualidade. As equipes autodirigidas também alicerçam a pro- dução da fábrica de produtos de saúde da RB em Hull, na Grã-Bretanha. “O pessoal nas linhas de frente decide como vai trabalhar nas próximas três ou quatro semanas”, conta um líder de equipe na fábrica de Hull, que produz o antiácido Gaviscon® e outros medicamentos de venda livre. Outro líder de equipe se orgulha em dizer que sua equipe se tornou “uma das mais eficientes do norte da Europa” porque “tivemos a oportunidade de assumir o controle em relação à linha”. O espírito de equipe da Reckitt Benckiser se estende ao marketing, pesquisa e outras funções, muitas vezes com equipes virtuais. “Na maioria dos projetos de que partici- pei, os membros de equipe quase sempre estão em paí- ses diferentes”, explica Gaonan, que trabalha no grupo de serviços de informação (SI) da RB. “O que você acha que é a base das equipes globais?”, ele pergunta. “O elementos essencial é a confiança. O pessoal de SI que está em um local confia que seus membros de equipe que estão em outro continente entendem totalmente e podem ajudá-los a resolver seus problemas”. A cultura orientada para equipes da RB é reforçada pela socialização, recompensas e eventos de formação de equipe. Por exemplo, 65 funcionários de 34 países se reu- niram recentemente no Brasil para reformar instalações dedicadas a crianças em idade pré-escolar em situação vulnerável e para levantar fundos com uma caminhada na natureza. “Trabalho não faltava e todos trabalhamos incrivelmente bem em equipe... é o estilo da RB, é cla- ro!”, conta Mmalorato Mabaso, gerente da RB na África do Sul que participou do evento no Brasil. “A equipe se reuniu com uma só objetivo em mente: levar esperança às crianças”. 1 A ênfase da Reckitt Benckiser no trabalho em equipe é um dos motivos para a empresa ser uma rival impor- tante da Procter & Gamble e da Unilever, mas a empresa britânica de produtos de higiene e limpeza não é a única a aproveitar os benefícios das equipes. Mais da metade das organizações reunidas em uma pesquisa recente usa equipes em um ponto elevado ou muito elevado para conduzir os negócios do dia a dia. Além disso, 77% des- sas empresas contam com equipes para projetos únicos e 67%, para projetos contínuos. Em comparação, uma década atrás, apenas 50% dos executivos afirmava que seu trabalho era realizado em equipes. Duas décadas atrás, apenas 20% desses executivos afirmavam traba- lhar em equipes. 2 O trabalho em equipe também se tornou mais impor- tante na pesquisa científica. Um estudo recente com qua- se 20 milhões de publicações de pesquisa mostrou que a porcentagem de artigos escritos por equipes aumentou substancialmente ao longo das últimas cinco décadas. Es- ses artigos também tiveram um número muito maior de citações subsequentes, sugerindo que são superiores aos escritos por um único indivíduo. 3 Por que as equipes estão ficando tão importantes e como as empresas podem reforçar seu potencial para a eficácia organizacional? Encontramos a resposta para essa e outras perguntas neste capítulo sobre dinâmica de equipe, que começará definindo as equipes e examinan- do as razões pelas quais as empresas se baseiam nelas e por que as pessoas participam de grupos informais nos contextos organizacionais. Uma grande parte deste capí- PARTE III Grupo participa de atividade no Brasil. McSchane_08.indd 205McSchane_08.indd 205 23/06/1414:3123/06/14 14:31 206 PARTE III Processos da Equipe EQUIPES E GRUPOS INFORMAIS Equipes são grupos de duas ou mais pessoas que interagem e influenciam umas às outras, que se consideram mutuamente responsáveis por atingir objetivos comuns associados aos objetivos organizacionais e que se percebem como uma entidade social dentro de uma em- presa.4 Essa definição tem alguns componentes importantes que valem a pena ser enfatizados. Primeiro, todas as equipes existem para satisfazer alguma finalidade, por exemplo, consertar linhas de transmissão elétrica, montar um produto, conceber um novo programa de bem- -estar social, tomar uma decisão importante ou atingir algum outro objetivo. Segundo, os membros da equipe são mantidos unidos pela sua interdependência e necessidade de colabo- ração para atingir objetivos comuns. Todas as equipes requerem alguma forma de comuni- cação para que os membros possam coordenar e compartilhar objetivos comuns. Terceiro, os membros da equipe influenciam uns aos outros, embora alguns possam ser mais influentes do que outros em relação aos objetivos e atividades da equipe. Finalmente, uma equipe existe quando seus membros se veem como uma equipe. A Figura 8.1 descreve brevemente diversos tipos de equipes organizacionais. Algumas equipes são permanentes, enquanto outras são temporárias; algumas são responsáveis por criar produtos ou prestar serviços, enquanto outras existem para tomar decisões ou com- partilhar conhecimento. Cada tipo de equipe foi criado deliberadamente para atender a um propósito organizacional. Algumas equipes, como as de skunkworks, inicialmente não são sancionadas pela gestão, no entanto são chamadas de “equipes” porque seus membros traba- lham para um objetivo organizacional. Grupos informais A maior parte deste capítulo se concentra nas equipes formais, mas os funcionários também pertencem a grupos informais. Todas as equipes são grupos, mas muitos deles não satisfazem a nossa definição de equipe. Grupos incluem pessoas reunidas, tendo elas ou não interde- pendência ou objetivo focalizado na empresa. Os amigos que você encontra no almoço são um grupo informal, mas não seriam chamados de equipe porque têm pouca ou nenhuma interdependência (cada pessoa poderia almoçar sozinha com a mesma facilidade) e nenhum propósito determinado organizacionalmente. Em vez disso, os grupos informais existem principalmente para o benefício dos seus membros. Embora os termos sejam empregados como sinônimos, a palavra equipes praticamente substituiu grupos na linguagem dos negó- cios quando se faz referência a funcionários que trabalham juntos a fim de realizar tarefas organizacionais.5 OA1 tulo examinará um modelo de eficácia da equipe, que in- clui o ambiente da equipe e o da organização, a formação de equipes e os processos de equipe: o desenvolvimento, as normas, a coesão e a confiança. Depois voltaremos nossa atenção para dois tipos específicos de equipes: au- todirigidas e virtuais. A seção final deste capítulo exami- nará desafios e estratégias para tomar melhores decisões em equipe. Objetivos de aprendizagem Após ler este capítulo, você deve ser capaz de: OA1 Discutir os benefícios e limitações das equipes e explicar por que os funcionários participam de grupos informais. OA2 Apresentar o modelo de eficácia da equipe e dis- cutir como as características da tarefa, o tamanho e a composição da equipe influenciam em tal efi- cácia. OA3 Discutir como os quatro processos da equipe (desenvolvimento, normas, coesão e confiança) influenciam em sua eficiência. OA4 Discutir as características e fatores necessários para o sucesso das equipes autodirigidas e das equipes virtuais. OA5 Identificar quatro restrições à tomada de decisão da equipe e discutir as vantagens e desvantagens das quatro estruturas destinadas a aprimorá-la. McSchane_08.indd 206McSchane_08.indd 206 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 8 Dinâmica de Equipe 207 Por que os grupos informais existem? Uma razão para isso é que os seres humanos são animais sociais. A evolução gerou um impulso inato de nos vincularmos, criando uma ne- cessidade de pertencer a grupos informais.6 Isso é evidenciado pelo fato de que as pessoas investem tempo e esforço consideráveis formando e mantendo relações sociais sem quaisquer circunstâncias especiais ou outros motivos. Outra razão pela qual as pessoas participam de grupos informais é dada pela teoria da identidade social, segundo a qual os indivíduos se definem pelos grupos aos quais são afiliados (ver Capítulo 3). Desse modo, participamos de grupos, particularmente os que são vistos favoravelmente pelas outras pessoas e que têm va- lores similares aos nossos, porque eles moldam e reforçam nossos autoconceitos.7 Uma terceira razão pela qual as pessoas são motivadas a formar grupos informais é que tais grupos realizam tarefas que não podem ser realizadas por indivíduos que trabalham iso- ladamente. Por exemplo, os funcionários às vezes se reúnem para combater mudanças or- ganizacionais porque esse esforço coletivo tem mais energia do que quando os indivíduos tentam enfrentar a mudança sozinhos. Esses grupos informais, chamados de coalizões, são discutidas no Capítulo 10. Uma quarta explicação para a existência dos grupos informais é que nos sentimos confortados pela mera presença de outras pessoas e, portanto, somos mo- tivados a ficar próximos delas nas situações estressantes. Quando estão em perigo, as pessoas se juntam, mesmo que isso não tenha um efeito protetor. De modo similar, os funcionários tendem a socializar com mais frequência após ouvirem rumores de que a empresa pode ser adquirida por um concorrente. Como explicou o Capítulo 4, esse convívios social minimiza o estresse ao dar apoio emocional e/ou informacional para amortecer a experiência de estresse.8 Grupos informais e resultados organizacionais Os grupos informais não são criados para atender aos objetivos organizacionais. Todavia, eles têm uma profunda influência sobre as empresas e seus funcionários. Os grupos informais têm potencial para minimizar o estresse TIPO DE EQUIPE DESCRIÇÃO Equipes departamentais Equipes que consistem em funcionários com habilidades similares ou complementares e que estejam localizados na mesma unidade de uma estrutura funcional; geralmente, há uma interdependência míni- ma das tarefas porque cada pessoa trabalha com clientes ou funcionários em outros departamentos. Equipes de produção/serviços/lide- rança Caracteristicamente polivalentes (os funcionários têm competências diversas), os membros da equipe produzem coletivamente um produto/serviço comum ou tomam decisões contínuas; as equipes de produção/serviços possuem um tipo de interdependência de linha de montagem, enquanto as de lide- rança tendem a ter uma interdependência interativa estreita (recíproca). Equipes autodirigidas Similares às equipes de produção/serviços, exceto pelo fato de (1) serem organizadas em torno dos processos que dão origem a um trabalho que exige várias tarefas interdependentes e (2) por terem uma autonomia substancial sobre a execução dessas tarefas (ou seja, geralmente controlam os insu- mos, o fluxo e os resultados com pouca ou nenhuma supervisão). Equipes de assessoria Equipes que fornecem recomendações para os tomadores de decisão; incluem comissões, conselhos consultivos, conselhos de trabalhadores e painéis de avaliação; podem ser temporárias, mas muitas vezes são permanentes, sendo que algumas delas têm uma frequente rotatividade dos membros. Equipes de força-tarefa (projetos) Geralmente polivalentes, são equipes temporárias cuja atribuição é solucionar um problema, perceber uma oportunidade ou conceber um produto ou serviço. Skunkworks Equipes polivalentes, geralmente afastadas da empresa e relativamente livres da sua hierarquia; mui- tas vezes iniciadas por um líder de equipe empreendedor que toma emprestado pessoas e recursos para conceber um produto ou serviço (a chamadapirataria de recursos). Equipes virtuais Equipes cujos membros atravessam fronteiras de espaço, tempo e organizacionais e que são ligados pelas tecnologias da informação para realizar as tarefas organizacionais; podem ser uma força-tarefa temporária ou uma equipe de serviço permanente. Comunidades de prática Equipes (porém, muitas vezes, grupos informais) ligadas ente si pelo compartilhamento de especiali- zação e pela paixão por uma determinada atividade ou interesse; o propósito principal é compartilhar informações; costumam se basear em tecnologias da informação como principal fonte de interação. FIGURA 8.1 Tipos de equipes organizacionais. equipes Grupos de duas ou mais pes- soas que interagem e influen- ciam umas às outras, que se consideram mutuamente responsáveis por atingir obje- tivos comuns associados aos objetivos organizacionais e que se percebem como uma entidade social dentro de uma empresa. McSchane_08.indd 207McSchane_08.indd 207 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 208 PARTE III Processos da Equipe do funcionário porque, como acabamos de mencionar, os membros do grupo proporcionam apoio social emocional e informacional. Tal capacidade melhora o bem-estar do funcionário e, no processo, a eficácia organizacional. Os grupos informais também são a espinha dorsal das redes sociais, fontes importantes de criação de confiança, compartilhamento de informa- ções, poder, influência e bem-estar dos funcionários no local de trabalho.9 O Capítulo 9 des- creverá a importância crescente dos sites de rede social similares ao Facebook e ao LinkedIn para estimular a formação de grupos informais e a comunicação a eles associada. O Capítulo 10 explica como as redes sociais são uma fonte de influência em ambientes organizacionais. Os funcionários com redes informais fortes tendem a ter mais poder e influência porque recebem informações melhores e tratamento preferencial das outras pessoas, e seu talento é mais visível para os principais tomadores de decisão. VANTAGENS E DESVANTAGENS DAS EQUIPES É raro que um funcionário trabalhe sozinho na Menlo Innovations. A desenvolvedora de software de Ann Arbor, Michigan, organiza os funcionários em duplas todas as semanas. Dois funcionários compartilham um só computador enquanto analisam ideias na mesma parte de um grande projeto. Além de trocar de parceiro, toda segunda-feira os cerca de 25 funcioná- rios se focam em uma parte diferente do projeto, ou até mesmo passam para projetos dife- rentes. “O simples fato de uma pessoa contar para a outra em que estado está o projeto, dizer tudo em voz alta, traz à baila coisas que ninguém tinha notado antes”, explica Richard Sheri- dan, um dos quatro cofundadores da Menlo Innovations. “Isso os torna mais inteligentes”.10 O sistema de dança das cadeiras da Menlo Innovations indica que o trabalho em equipe é um ingrediente importante para o sucesso da empresa de software. Por que as equipes são tão importantes? A resposta para essa pergunta envolve uma longa história.12 As primeiras pesquisas sobre a mineração de carvão britânica nos anos 1940, sobre o milagre econômico japonês nos anos 1970 e uma imensa quantidade de investigações desde então revelaram que, sob as condições certas, as equipes tomam decisões melhores, desenvolvem produtos e servi- ços melhores e criam uma força de trabalho mais envolvida do que os funcionários trabalhan- do isoladamente o fariam.13 Do mesmo modo, os membros da equipe podem compartilhar rapidamente as informações e coordenar as tarefas, enquanto esses processos são mais lentos e propensos a erros nos departamentos tradicionais liderados por supervisores. Em geral, as As equipes são o alicerce do negó- cio na Ergon Energy. A distribuido- ra de eletricidade regional de Que- ensland, Austrália, organiza seus funcionários em torno de equipes e os recompensa pela segurança e desempenho da equipe. O traba- lho em equipe também é um dos seis valores centrais da Ergon. “O trabalho em equipe é um estilo de vida, e é algo que você sente desde o primeiro dia de trabalho”, afirma o site sobre carreiras da Ergon. “Nossos funcionários valorizam muito o trabalho em equipe”, conta um executivo da Ergon Energy. “É um segredo do nosso sucesso. Também temos uma cultura fami- liar aqui, aquela sensação de que todos são seus amigos”.11 McSchane_08.indd 208McSchane_08.indd 208 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 8 Dinâmica de Equipe 209 equipes prestam ao cliente um serviço superior porque lhe fornecem uma gama mais ampla de conhecimento e especialização do que as “estrelas” individuais podem oferecer. Em muitas situações, as pessoas podem estar mais motivadas quando trabalham em equi- pes do que quando trabalham sozinhas.14 Uma razão para essa motivação é que, como foi mencionado alguns parágrafos atrás, os funcionários têm um impulso para se vincular e são motivados a satisfazer os objetivos dos grupos aos quais pertencem. Essa motivação é parti- cularmente forte quando a equipe é parte da identidade social do funcionário. Segundo, as pessoas são mais motivadas em equipes porque são responsáveis perante os colegas de equipe que monitoram o seu desempenho mais estreitamente do que um supervi- sor tradicional. Isso é particularmente verdadeiro quando o desempenho da equipe depende do pior executor, como em uma linha de montagem, na qual a velocidade da montagem de um produto depende da velocidade do funcionário mais lento. Terceiro, em algumas circuns- tâncias, o desempenho melhora quando os funcionários trabalham perto dos outros porque os colegas se tornam parâmetros de comparação. Os funcionários também são motivados a trabalhar mais intensamente devido à apreensão de que seu desempenho seja comparado ao desempenho dos demais. Desafios das equipes Apesar dos muitos benefícios do trabalho das equipes, elas nem sempre são tão eficazes quan- to os indivíduos trabalhando sozinhos.15 Geralmente, as equipes são mais adequadas para o trabalho complexo, como projetar uma edificação ou auditar os registros financeiros de uma empresa. Sob essas circunstâncias, uma pessoa sozinha raramente possui todo o conheci- mento e as habilidades necessárias. Em vez disso, os trabalhos complexos são realizados com melhor qualidade com a divisão das tarefas entre funções mais especializadas, com as pessoas em tais cargos especializados se coordenando umas com as outras. Por outro lado, o trabalho normalmente é realizado de maneira mais eficaz pelos indivíduos isoladamente quando pos- suem todo o conhecimento e habilidades necessárias e quando ele não pode ser dividido em tarefas especializadas ou não é suficientemente complexo para se beneficiar da especialização. Mesmo quando o trabalho pode e deve ser especializado, uma estrutura de equipe pode não ser necessária se as tarefas realizadas por várias pessoas exigirem pouca coordenação. O principal problema das equipes é que elas têm custos adicionais chamados perdas de pro- cesso, que são os recursos (incluindo tempo e energia) despendidos para o desenvolvimento e a manutenção da equipe em vez da tarefa.16 Para um indivíduo, é muito mais eficiente trabalhar uma questão sozinho do que resolver diferenças de opinião com outras pessoas. Para que uma equipe tenha um bom desempenho, seus membros precisam entrar em acordo e compreender mutuamente seus objetivos, a estratégia para alcançar tais objetivos, suas funções específicas e as regras de conduta informais.17 Os membros da equipe precisam desviar tempo e energia que seriam destinados à realização do trabalho para que possam desenvolver e manter esses elemen- tos necessários para a equipe. O problema das perdas de processo é particularmente evidente quando mais funcionários são acrescentados ou substituem outros na equipe. O desempenho da equipe sofre quando ela acrescenta membros porque os funcionários precisam aprender como a equipe funciona e como se coordenar de maneira eficiente com os outros membros. As perdas de processotambém ocorrem bastante devido à necessidade de redistribuir a carga de trabalho. A indústria de software tem até um nome para esse fenômeno: a lei de Brooks (conhecida também como “mito do homem-mês”) diz que acrescentar mais pessoas a um projeto de software atrasado apenas o atrasa ainda mais! De acordo com algumas fontes, a Apple, Inc., pode ter caído nessa armadilha no desenvolvimento recente do seu aplicativo de fotografia profissional, chamado Aperture. Quando o projeto começou a ter o seu cronograma atrasado, o gestor encarregado dele aumentou o tamanho da equipe; algumas fontes dizem que em poucas semanas a equipe passou de 20 para 150 engenheiros e pessoal de garantia de qualidade. Infelizmente, acrescentar tantas pessoas atrasou ainda mais o projeto. O resultado? Quando finalmente foi lançado, o Aperture contava com nove meses de atraso e foi considerado um dos produtos mais cheios de bugs do catá- logo da Apple.18 perdas de processo Recursos (incluindo tempo e energia) despendidos para o de- senvolvimento e a manutenção da equipe em vez da tarefa. lei de Brooks O princípio de que acrescentar mais pessoas a um projeto de software atrasado apenas o atrasa mais. Também chamada de mito do homem-mês. McSchane_08.indd 209McSchane_08.indd 209 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 210 PARTE III Processos da Equipe Ócio social Talvez a limitação das equipes mais conhecida seja o risco de perda da produ- tividade decorrente do ócio social, que ocorre quando as pessoas exercem menos esforço (e geralmente têm um desempenho inferior) quando trabalham em grupos do que quando tra- balham sozinhas.19 O ócio social tende a ser mais grave quando o desempenho do indivíduo é menos propenso a ser notado, como quando as pessoas trabalham juntas em equipes grandes. O resultado do indivíduo também é menos perceptível quando a equipe produz um único re- sultado (em vez de cada membro da equipe ter sua produção estabelecida e mensurável), por exemplo, encontra uma única solução para o problema de um cliente. O ócio social é menor quando a contribuição de cada membro da equipe é mais perceptível, o que pode ser alcan- çado pela redução do tamanho da equipe, por exemplo, ou pela mensuração do desempenho de cada membro. A Strategic Investments & Holdings Inc., uma empresa especializada em aquisições de Buffalo, no estado de Nova Iorque, restringe propositalmente o número de seus diretores exatamente por esse motivo. “Quando o grupo é menor, não há como se esconder”, explica David Zebro, diretor da Strategic Investments. “Todos precisam fazer a sua parte”.20 O ócio social também depende da motivação do funcionário para realizar o trabalho. Ele é menos prevalente quando a tarefa é interessante, porque os indivíduos são mais motivados pelo próprio trabalho a cumprir suas obrigações. Por exemplo, um estudo recente revelou que a apatia dos alunos explica parte do ócio social que ocorre nas equipes de estudantes universitários. Esse fenômeno também é menos comum quando o objetivo da equipe é im- portante, possivelmente porque os indivíduos sentem mais pressão dos colegas de trabalho para ter um bom desempenho. Finalmente, o ócio social ocorre com menos frequência entre os membros que valorizam a participação na equipe e acreditam trabalhar para atender aos objetivos dela.21 Em suma, as equipes podem ser forças poderosas de vantagem competitiva ou significar mais problemas do que soluções, tanto que o desempenho e o moral no trabalho diminuem quando os funcionários são colocados em equipes. Para compreendermos quando as equipes são melhores do que os indivíduos trabalhando sozinhos, precisamos examinar mais de perto as condições que tornam as equipes eficazes ou ineficazes. As próximas seções deste capítulo discutirão o modelo de eficácia da equipe. MODELO DE EFICÁCIA DAS EQUIPES Por que algumas equipes são eficazes enquanto outras fracassam? Para responder a essa per- gunta, precisamos esclarecer o significado de eficácia da equipe. Uma equipe é eficaz quando beneficia a empresa, seus membros e sua própria sobrevivência.22 Primeiro, as equipes existem para servir a algum propósito organizacional, então a eficiência é medida parcialmente pela realização desse propósito. Segundo, a eficácia de uma equipe se baseia na satisfação e no bem- -estar dos seus membros. As pessoas participam de grupos para satisfazer suas necessidades, então a eficácia é medida parcialmente pela sua satisfação. Finalmente, a eficácia da equipe inclui sua própria viabilidade, sua capacidade para sobreviver, pois deve conseguir manter o comprometimento dos seus membros, particularmente durante a turbulência do desenvolvi- mento da equipe. Sem esse comprometimento, a equipe desmorona. A equipe também deve garantir recursos suficientes e encontrar um ambiente benevolente no qual atuar. Os pesquisadores desenvolveram vários modelos ao longo dos anos para identificar as características ou condições que tornam algumas equipes mais eficazes do que outras.23 A Figura 8.2 reúne os principais componentes desses modelos de eficácia das equipes. Exami- naremos de perto cada componente ao longo das próximas páginas. A melhor maneira de analisar a figura é como um metamodelo que conecta diversas teorias, pois cada componente (desenvolvimento da equipe, coesão da equipe, etc.) tem o seu próprio conjunto de teorias e modelos para explicar sua própria atuação. Ambiente da organização e da equipe O ambiente organizacional e da equipe representa todas as condições, para além das fronteiras da equipe, que influenciam a sua eficácia. Os membros da equipe tendem a trabalhar juntos com mais eficácia quando são ao menos em parte recompensados pelo OA2 ócio social O problema que ocorre quando as pessoas exercem menos esforço (e geralmente têm um desempenho inferior) quando trabalham em grupos do que quando trabalham sozinhas. McSchane_08.indd 210McSchane_08.indd 210 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 8 Dinâmica de Equipe 211 desempenho dela.24 Outro fator ambiental é a estrutura organizacional. As equipes se de- senvolvem quando organizadas em torno dos processos de trabalho, pois essa estrutura aumenta a interação e a interdependência entre os membros da equipe e diminui a intera- ção com as pessoas fora dela. As equipes de alto desempenho também dependem dos lí- deres organizacionais, que fornecem apoio e direção estratégica enquanto os membros da equipe se concentram na eficiência operacional e na flexibilidade.25 A configuração física do espaço de trabalho da equipe também pode fazer a diferença. Por exemplo, a Toyota Motor Company, a PSA Peugeot Citroën e outras empresas têm uma “sala de obeya” onde reúnem os membros de projetos com formações e habilidades diversas para resolver pro- blemas mais rapidamente. • Realizar tarefas • Satisfazer as necessidades dos membros • Manter a sobrevivência da equipe Eficácia da equipe • Desenvolvimento da equipe • Normas da equipe • Coesão da equipe • Confiança na equipe • Recompensas • Comunicação • Estrutura organizacional • Liderança organizacional • Espaço físico • Características da tarefa • Tamanho da equipe • Composição da equipeAmbiente da organização e da equipe Formação da equipe Processos de Equipe FIGURA 8.2 Modelo de eficácia da equipe. A PSA Peugeot Citroën, a segunda maior montadora da Europa, mon- tou uma “sala de obeya” (“sala grande”, em japonês) para acelerar a tomada de decisão em equipe. As paredes ficam forradas com gráfi- cos e anotações para que os mem- bros da equipe possam visualizar as principais questões do momento. A sala de obeya cria uma ambiente de equipe especial que encoraja a interação presencial para resolver rapidamente decisões críticas e focadas. Em uma sessão, por exemplo, os gerentes descobriram como reduzir significativamente os acidentes entre trabalhadores tem- porários. “Os temas dos projetos em andamento são colocados nas paredes, e marcados com vermelhoquando algo está errado”, explica Philippe Varin, executivo-chefe da PSA Peugeot Citroën. “Todos enfrentam o mesmo problema e tentam resolvê-lo”.26 McSchane_08.indd 211McSchane_08.indd 211 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 212 PARTE III Processos da Equipe ELEMENTOS DE FORMAÇÃO DA EQUIPE Além de estabelecerem um ambiente favorável à equipe, os líderes precisam formar cuidado- samente a própria equipe, determinando as características da tarefa e o tamanho, a composi- ção e as funções dela. Características da tarefa As equipes são mais eficazes do que os indivíduos em tipos específicos de tarefas. Elas são me- lhores em tarefas complexas demais para qualquer indivíduo isolado, como lançar um negócio em um novo mercado, desenvolver um sistema operacional de computador ou construir uma ponte. O trabalho complexo requer habilidades e conhecimentos que estão além das competên- cias de uma pessoa. As equipes são particularmente apropriadas quando o trabalho complexo pode ser dividido em funções mais especializadas, nas quais as pessoas requerem coordenação frequente. Algumas evidências também sugerem que as equipes funcionam melhor com tarefas bem estruturadas, pois é mais fácil coordenar esse tipo de trabalho entre várias pessoas.27 Uma característica que é particularmente importante para as equipes é a interdependên- cia das tarefas, o quanto os membros da equipe têm de compartilhar materiais, informações ou especialização para realizar suas tarefas.28 Além da independência total, existem três níveis de interdependência das tarefas, conforme ilustrado pela Figura 8.3. O nível mais baixo de in- terdependência, chamado interdependência conjunta, ocorre quando um funcionário ou uma unidade de trabalho compartilha um recurso comum, como maquinário, apoio administrativo ou orçamento, com outros funcionários ou unidades de trabalho. Isso ocorreria em um con- texto de equipe no qual cada membro trabalha sozinho, mas compartilha matérias-primas ou maquinário para realizar suas tarefas que, com exceção desse aspecto, seriam independentes. A interdependência é mais alta sob a interdependência sequencial, na qual o resultado de uma pessoa se torna o insumo direto para outra pessoa ou unidade. A interdependência sequencial ocorre quando os membros da equipe são organizados em uma linha de montagem. A interdependência recíproca, na qual o resultado do trabalho é intercambiado entre os indivíduos, é o grau mais elevado de interdependência. As pessoas que projetam um produto ou serviço novo terão uma interdependência recíproca porque suas decisões de projeto afe- tam as outras pessoas envolvidas no processo. Qualquer decisão tomada pelos engenheiros de projeto influenciaria o trabalho do engenheiro de produção e do especialista em compras e vice-versa. Os funcionários com interdependência recíproca devem ser organizados em equi- pes para facilitar a coordenação de sua relação entrelaçada. Recurso compartilhado Interdependência conjunta Funcionário Funcionário Funcionário Interdependência sequencial Funcionário Funcionário Funcionário Interdependência recíproca Funcionário Funcionário Funcionário Funcionário FIGURA 8.3 Níveis de interdependência das tarefas. McSchane_08.indd 212McSchane_08.indd 212 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 8 Dinâmica de Equipe 213 Em geral, quanto maior o nível de interdependência das tarefas, maior a necessidade de organizar as pessoas em equipes em vez de mantê-las trabalhando sozinhas. Uma estrutura de equipe melhora a comunicação interpessoal e, desse modo, resulta em uma melhor coordena- ção. A alta interdependência das tarefas também motiva as pessoas a integrarem a equipe. No entanto, a regra de que uma equipe deve ser formada quando os funcionários têm alta interde- pendência se aplica quando os membros têm os mesmos objetivos de tarefas, como atender os mesmos clientes ou montar coletivamente o mesmo produto. Quando os membros da equipe têm objetivos diferentes (por exemplo, atender clientes diferentes), mas dependem de outros membros da equipe para atingir tais objetivos exclusivos, o trabalho em equipe pode criar con- flito em excesso. Sob essas circunstâncias, a empresa deve tentar reduzir o nível de interdepen- dência ou se basear na supervisão como um amortecedor ou mediador entre os funcionários. Tamanho da equipe Qual é o tamanho ideal para uma equipe? A varejista on-line Amazon segue a regra da “equi- pe de duas pizzas”, a saber, que a equipe deve ser pequena o suficiente para ser alimentada confortavelmente com duas pizzas grandes. A regra produz equipes de cinco a sete funcio- nários. No outro extremo da questão, alguns especialistas argumentam que as tarefas estão ficando tão complexas que muitas equipes precisam ter mais de 100 membros.29 Infelizmente, a primeira ideia (as equipes de duas pizzas) é excessivamente simplista e a segunda parece ter perdido de vista o significado e a dinâmica das verdadeiras equipes. Em geral, as equipes devem ser grandes o bastante para proporcionar as competências e perspectivas necessárias para realizar o trabalho, mas ainda pequenas o bastante para manter a coordenação eficiente e o envolvimento significativo de cada membro.30 “Você precisa obter um equilíbrio entre ter pessoas suficientes para fazer todas as coisas que precisam ser feitas, e manter a equipe pequena o bastante para que seja coesa e tome decisões com eficácia e rapidez”, diz Jim Hassell, um alto executivo da NBN Co que já trabalhou na Sun e na IBM.31 As equipes pequenas (com, digamos, menos de doze membros) operam com eficácia porque têm menos perdas de processo. Os membros das equipes menores também tendem a se sentir mais envolvidos porque conhecem os colegas de equipe (o que aumenta a confiança), têm mais influência sobre as normas do grupo e se sentem mais responsáveis pelo sucesso ou fracasso da equipe. As empresas devem ter equipes de 100 pessoas se a tarefa for altamente complexa? A resposta é que um grupo tão grande provavelmente não é uma equipe, mesmo que a gestão o chame assim. Uma equipe existe quando seus membros interagem e influenciam uns aos outros, são mutuamente responsáveis por cumprir as metas comuns associadas aos objetivos organizacionais e se veem como uma entidade social dentro de uma empresa. É muito difícil que todos em uma unidade de trabalho de 100 pessoas influenciem uns aos outros e que sin- tam uma coesão suficiente para que se percebam como membros de uma equipe. Os executivos na Whole Foods Market tinham consciência de que as equipes reais reú- nem muito menos do que 100 pessoas quando abriram sua imensa loja no Columbus Circle, na cidade de Nova Iorque. A loja tinha 140 operadores de caixas, demais para ser considerada uma equipe dessa função, então a Whole Foods Market dividiu o grupo em equipes com uma dúzia de funcionários em cada. Todos os operadores de caixas se encontram mensalmente como um grupo enorme para discutir questões de produção, mas as equipes menores traba- lham de maneira eficiente no dia a dia.32 Composição da equipe Na maioria dos locais de trabalho, os funcionários devem ter mais do que competências téc- nicas; eles também precisam ser capazes e dispostos a realizar um trabalho em um ambiente de equipe. As competências de equipe são tão importantes na Royal Dutch/Shell que a gigante do setor de energia realiza um exercício especial Gourami de cinco dias na Europa, América do Norte, Ásia e Oriente Médio para observar com quanta eficácia os universitários (possí- veis candidatos a empregos) trabalham sob pressão em um ambiente de equipe. “Trabalhar com os desafios do ‘mundo real’ do Gourami conscientizou todos nós sobre o valor de outras habilidades e aptidões e sobre a necessidade de trabalhar em equipe”, conta um estudante de engenharia mecânica que participou de um dos eventos.33 interdependência das tarefas Quanto os membros da equipe têm de compartilhar materiais, informações ou especialização para realizarsuas tarefas. McSchane_08.indd 213McSchane_08.indd 213 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 214 PARTE III Processos da Equipe As características ou comportamentos mencionados com mais frequência em relação aos membros de equipe eficazes são os “cinco Cs” ilustrados na Figura 8.4: cooperação, coorde- nação, comunicação, conforto e resolução de conflitos. As três primeiras competências são basicamente (mas não inteiramente) relacionadas à tarefa, enquanto as duas últimas ajudam principalmente na manutenção da equipe:35 • Cooperação. Os membros de equipe eficazes estão dispostos e são capazes de traba- lhar juntos em vez de sozinhos. Isso inclui compartilhar recursos e ser suficientemente adaptativo ou flexível para acomodar as necessidades e preferências dos demais mem- bros da equipe, como reescalonar o uso do maquinário para que outro membro com um prazo mais apertado possa utilizá-lo. • Coordenação. Os membros de equipe eficazes gerenciam ativamente o trabalho da equi- pe para que seja realizado de maneira mais eficiente e harmoniosa. Por exemplo, os membros eficazes mantêm a equipe no caminho certo e ajudam a integrar o trabalho realizado pelos diferentes membros. Em geral, isso exige que os membros de equipe eficazes conheçam o trabalho dos colegas, não apenas o próprio. • Comunicação. Os membros de equipe eficazes transmitem as informações livremente (em vez de acumulá-las para si), de maneira eficiente (usando o melhor canal e a me- lhor linguagem) e respeitosamente (evitando despertar emoções negativas). Eles tam- bém ouvem ativamente os colegas de trabalho. • Conforto. Os membros de equipe eficazes ajudam os colegas a manter um estado psico- lógico positivo e saudável. Eles demonstram empatia, oferecem conforto psicológico e colaboram com os sentimentos de confiança e autoestima dos colegas. • Resolução de conflitos. O conflito é inevitável nos contextos sociais, então os membros de equipe eficazes têm as habilidades e a motivação para resolver as discordâncias entre colegas. Isso requer o uso eficaz de vários estilos de resolução de conflitos e também de habilidades de diagnóstico para identificar e resolver as fontes estruturais do conflito. Coordenação • Alinhar o trabalho com as outras pessoas • Manter a equipe no caminho certo Comunicação • Compartilhar informações livre, eficiente e respeitosamente • Ouvir ativamente Conforto • Mostrar empatia • Fornecer conforto psicológico • Criar confiança Resolução de conflitos • Diagnosticar fontes de conflito • Usar o melhor estilo de resolução de conflitos Cooperação • Compartilhar recursos • Acomodar outras pessoas Competências do membro de equipe FIGURA 8.4 Cinco Cs da competência dos membros de equipe. Fontes: Baseado em informações de V. Rousseau, C. Aubé, and A. Savoie, “Teamwork Behaviors: A Review and an Integration of Frameworks,” Small Group Research 37, no. 5 (2006), pp. 540–70; M.L. Loughry, M.W. Ohland, and D. D. Moore, “Development of a Theory-Based Assessment of Team Member Effectiveness,” Educational and Psychological Measurement 67, no. 3 (2007), pp. 505–24. McSchane_08.indd 214McSchane_08.indd 214 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 8 Dinâmica de Equipe 215 Quais funcionários tendem a ter essas competências de equi- pe? No alto da lista estão aqueles com altos níveis de dois traços de personalidade, a escrupulosidade e a extroversão, além de alta inteligência emocional. Além do mais, o antigo ditado “uma maçã podre estraga o cesto” parece se aplicar às equipes; um integrante que não possua essas competências de trabalho em equipe pode minar a dinâmica da equipe inteira.36 Diversidade da equipe Outra dimensão importante da com- posição da equipe é a diversidade. A diversidade da equipe parece ter efeitos positivos e negativos em sua eficácia.37 Vamos começar pelos benefícios da diversidade. As pesquisas sugerem que, em si- tuações específicas, as equipes diversas são melhores do que as homogêneas na tomada de decisões. Um motivo é que pessoas de formações diferentes tendem a ver um problema ou uma oportu- nidade a partir de ângulos distintos. Os membros da equipe têm modelos mentais diferentes, então são mais propensos a identifi- car soluções viáveis para problemas difíceis. Uma segunda justificativa de por que as equipes diversifica- das tendem a tomar decisões melhores é que elas têm um conjunto mais amplo de competências técnicas. Por exemplo, cada equipe na Rackspace Hosting consiste em mais de uma dúzia de pessoas com habilidades diversas, por exemplo, gestão de contas, engenharia de sistemas, suporte técnico, experiência em faturamento e suporte de data center. A empresa de infraestrutura empresarial na web necessita dessa diversificação de competências técnicas dentro de cada equipe para atender as necessidades dos clientes atribuí- dos à equipe. Uma terceira razão em favor das equipes com membros diversificados é que elas proporcionam melhor representação dos constituintes da equipe, como outros departamentos ou clientes com experiências similarmente diversificadas. Uma equipe responsável por proje- tar e lançar um novo serviço, por exemplo, deve ter representação das várias especializações da organização para que as pessoas nessas unidades de trabalho apoiem as decisões da equipe. A diversidade da equipe oferece muitas vantagens, mas também apresenta uma série de desafios.38 Mais especificamente, funcionários com formações diversas demoram mais para se tornarem uma equipe de alto desempenho. Em parte, isso ocorre porque os respectivos membros levam mais tempo para se relacionar com pessoas diferentes deles, particularmente quando as outras pessoas têm perspectivas e valores diferentes (ou seja, quando têm um nível de diversidade profundo). As equipes diversificadas são suscetíveis a “rachaduras”, linhas di- visórias hipotéticas que podem dividir uma equipe em subgrupos ao longo das dimensões de gênero, étnicas, profissionais ou outras. Essas rachaduras diminuem a eficiência da equipe ao reduzir a motivação para se comunicar e coordenar com os colegas de equipe no outro lado das divisões hipotéticas. Em contraste, os membros das equipes com um nível de diversidade mínimo sentem uma satisfação maior, passam por menos conflitos e têm melhores relações interpessoais. Por consequência, as equipes homogêneas tendem a ser mais eficazes nas tare- fas que exigem um alto grau de cooperação e coordenação, como as equipes de atendimento de emergência. PROCESSOS DE EQUIPE O terceiro conjunto de elementos no modelo de eficácia da equipe, conhecidos coletivamen- te como processos da equipe, inclui o desenvolvimento, as normas, a coesão e a confiança da equipe. Esses elementos representam as características da equipe que evoluem continuamente. Desenvolvimento da equipe Os membros da equipe devem resolver várias questões e passar por vários estágios de desen- volvimento antes de emergir como uma unidade de trabalho de sucesso. Para isso, precisam se conhecer e confiar uns nos outros, compreender e chegar a um acordo sobre suas res- OA3 Muitas empresas tentam contratar astros com QIs nas alturas, mas estudos recentes sugerem que o desempenho mais elevado vem de funcionários que possuem boas competências de equipe. Um estudo inovador revelou que os melhores preditores do desempe- nho de uma unidade de trabalho são a sensibilidade social de seus membros (ou seja, sua inteligência emocional) e quão igualmente todos participam da discussão (ou seja, a alternância nas conver- sas). A inteligência geral (QI) ainda prevê a eficácia da equipe, mas muito menos do que as competências de equipe.34 McSchane_08.indd 215McSchane_08.indd 215 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 216 PARTE III Processos da Equipe pectivas funções, descobrir os comportamentos ade- quados e inadequados e aprender como se coordenar uns com os outros. Quanto mais tempo os membros da equipe trabalham juntos, mais desenvolvemmo- delos mentais comuns ou complementares, entendi- mento mútuo e rotinas de desempenho eficazes para completar o trabalho. Um modelo popular que captura muitas ativi- dades de desenvolvimento de equipes é exibido na Figura 8.5.40 O diagrama mostra as equipes passan- do sistematicamente de um estágio para o outro, en- quanto as linhas tracejadas ilustram que as equipes podem voltar para um estágio de desenvolvimento anterior à medida que novos membros a integrem ou que outras condições afetem a maturidade da equipe. A formação, o primeiro estágio do desenvol- vimento da equipe, é um período de teste e orienta- ção no qual os membros se conhecem mutuamente e avaliam os benefícios e os custos da participação. As pessoas tendem a ser educadas, a respeitar a autori- dade e a descobrir o que se espera delas e como se enquadrarão na equipe. O estágio de ataque é mar- cado pelo conflito interpessoal, pois os membros se tornam mais proativos e competem pelas várias fun- ções na equipe. Além disso, eles tentam estabelecer normas de comportamento adequado e padrões de desempenho. Durante o estágio de normatização, a equipe de- senvolve seu primeiro senso real de coesão, à medi- da que as funções são estabelecidas e se forma um consenso em torno dos objetivos do grupo ou um modelo mental complementar baseado na equipe. No estágio de realização, os membros aprendem a coordenar de maneira eficiente e a resolver conflitos. Nas equipes de alto desempenho, todos são altamen- te cooperativos, têm um alto nível de confiança uns nos outros, são comprometidos com os objetivos do grupo e se identificam com a equipe. Finalmente, o estágio de encerramento ocorre quando a equipe está prestes a se dissolver. Nele, os membros deslocam sua atenção das tarefas para as relações. O modelo de cinco estágios é consistente com o que os estudantes vivenciam nos projetos em equipe (como revela um estudo), mas está longe de ser uma representação perfeita do processo de desenvolvi- mento da equipe. Por exemplo, ele não mostra que algumas equipes permanecem em um determinado estágio por mais tempo do que as outras. O modelo também mascara dois pro- cessos distintos durante o desenvolvimento da equipe: o desenvolvimento da identidade de equipe e o desenvolvimento da competência de equipe.41 • Desenvolvimento da identidade de equipe. O processo envolve a transição que os indiví- duos fazem, de ver a equipe como algo que está “lá fora” para vê-la como algo ao qual pertencem. Em outras palavras, o desenvolvimento da equipe ocorre quando os funcio- nários mudam sua visão do “eles” para “nós”. Desenvolver a identidade de equipe tem a ver com se familiarizar com a equipe, torná-la parte da sua identidade social e moldá-la para se ajustar melhor ao seu protótipo de uma equipe ideal. Os Esquadrões das Forças de Segurança da Força Aérea dos Estados Unidos se destinam às operações “do outro lado da cerca”, então seu sucesso depende de um alto grau de desenvolvimento da equipe. “Tenho 13 caras sob o meu comando e todo dia eu trabalho com os mesmos 13 caras”, explica o líder de um dos esqua- drões, o sargento Eric Hammons. “Eles sabem que quando entro em uma sala, eu vou dobrar à direita. E também sabem que, como vou virar à direita, eles vão virar à esquerda”. Esses esquadrões se transformam em equipes de alto desempenho com o treinamento contínuo em situações realistas. A foto mostra uma dessas equipes Ghostwalker treinando em uma missão de fogo simulado.39 McSchane_08.indd 216McSchane_08.indd 216 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 CAPÍTULO 8 Dinâmica de Equipe 217 • Desenvolvimento da competência de equipe. O processo inclui o desenvolvimento de rotinas habituais com os colegas e a formação de modelos mentais compartilhados ou complementares.42 Os modelos mentais da equipe são imagens mentais visuais ou re- lacionais compartilhadas pelos membros. Por exemplo, os membros de uma equipe recém-formada podem ter visões diferentes a respeito do atendimento ao cliente (qua- lidade da interação, velocidade do serviço, especialização técnica fornecida e assim por diante). À medida que a equipe se desenvolve, essas visões convergem para um modelo mental compartilhado de atendimento ao cliente. Uma metanálise recente informou que as equipes são mais eficazes quando seus membros compartilham modelos mentais comuns do trabalho.43 Funções da equipe Uma parte importante do processo de desenvolvimento da equipe é a formação e o reforço das funções da equipe. Uma função é um conjunto de comportamentos que as pessoas deverão ter porque ocupam certas posições em uma equipe ou empresa.44 Em um contexto de equipe, algumas funções a ajudam a atingir seus objetivos; outras mantêm as relações dentro da equipe. Algumas funções são atribuídas formalmente a determinadas pessoas. Por exemplo, os líderes de equipe geralmente deverão iniciar a discussão, garantir que todos tenham oportunidade para apresentar suas opiniões e ajudar a equipe a chegar a um acordo sobre as questões discutidas. Os membros da equipe recebem funções específicas dentro de suas responsabilidades de trabalho formais. Contudo, eles também assumem funções informais que correspondem a suas personalidades e valores e também aos desejos dos outros membros da equipe. Essas funções informais, que são negociadas durante todo o processo de desenvolvimento da equi- pe, variam do apoio aos demais membros até a sugestão de novas ideias. As funções informais da equipe são compartilhadas, mas muitas são associadas a uma ou duas pessoas na equipe.45 função Conjunto de comportamentos que se espera das pessoas devido às posições que ocupam em uma equipe ou organização. Encerramento • Orientada para tarefas, comprometida • Coordenação eficiente • Alta cooperação e confiança • Conflitos resolvidos rapidamente Realização • Estabelecer regras • Concordar sobre os objetivos da equipe • Formar modelos mentais da equipe • Desenvolver coesão Normatização • Conflito interpessoal • Competir pelas funções da equipe • Influenciar objetivos e meios • Estabelecer normas Ataque • Descobrir expectativas • Avaliar o valor da participação • Respeitar a autoridade existente • Testar os limites do comportamento Formação FIGURA 8.5 Estágios de desenvolvimento da equipe. McSchane_08.indd 217McSchane_08.indd 217 23/06/14 14:3123/06/14 14:31 218 PARTE III Processos da Equipe Acelerar o desenvolvimento da equipe por meio da formação da equipe A forma- ção de equipes consiste nas atividades formais destinadas a aprimorar o desenvolvimento e o funcionamento de uma equipe de trabalho.46 Em grande medida, a formação da equipe tenta acelerar o respectivo processo de desenvolvimento, o qual pode ser aplicado às novas equipes, mas é introduzido com mais frequência naquelas existentes, que regrediram para estágios anteriores do desenvolvimento de equipe devido à rotatividade dos participantes ou à perda de foco. Algumas intervenções de formação de equipes são focadas em tarefas. Elas esclarecem os objetivos de desempenho das equipes, aumentam a sua motivação para atingi-los e esta- belecem um mecanismo de feedback sistemático sobre eles. Um segundo tipo de formação de equipes tenta melhorar as habilidades de resolução de problemas da equipe. Uma terceira categoria esclarece e reconstrói as percepções de cada membro quanto ao seu papel e também as expectativas que o membro tem em relação aos papéis dos demais membros. A formação de equipes pela definição dos papéis também ajuda a equipe a desenvolver modelos mentais compartilhados, ou seja, representações internas comuns do mundo externo; por exemplo, como interagir com os clientes, manter o maquinário e participar de reuniões. Pesquisas re- centes indicam que os processos e o desempenho da equipe dependem da eficiência com que seus membros compartilham os modelos mentais pertinentes ao modo como devem traba- lhar juntos.47 Atividades populares na formação de equipes 48 ATIVIDADE