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Por causa de sua natureza inesperada e grave, a obstrução das vias aéreas por corpo estranho (OVACE) deve ser reconhecida e tratada rapidamente. Durante o tratamento odontológico, é grande o potencial de objetos caírem na parte posterior da cavidade oral e, subsequentemente, dentro da faringe. Na verdade, uma grande variedade de instrumentos e objetos é removida das gargantas de pacientes todos os anos. Existem relatos de casos de recuperação de grampos de isolamento, peça de mão pediátrica, espelho odontológico, chave de parafuso de implantes, instrumentos endodônticos, coroas dentárias, – tanto encontrados em material oral quanto em fezes – após esses objetos terem sido “engolidos” acidentalmente. Artigos publicados têm documentado a recuperação de dique de borracha, instrumentos endodônticos, dentes, pilares e núcleos, além de um crucifixo. No paciente odontológico consciente, existem chances de que qualquer objeto caído na faringe seja deglutido e passe para o esôfago ou seja expelido após a tosse, de forma que a incidência real de obstrução das vias aéreas ou aspiração de corpo estranho para traqueia, brônquios e pulmões é baixa. Existe ainda uma grande probabilidade de que qualquer objeto que penetre nas vias aéreas seja pequeno em diâmetro o suficiente para passar pela laringe (a parte mais estreita das vias aéreas superiores no adulto) sem causar uma obstrução. Em uma situação como esta, o objeto continua através da traqueia (se a gravidade ajudar, caso o paciente esteja sentado) e vai repousar no tronco principal de um dos brônquios ou ainda em bronquíolos menores no pulmão. Ainda que uma situação de emergência ameaçadora potencialmente fatal não exista imediatamente, certos passos importantes devem ser dados rapidamente para assegurar a remoção do objeto em um período de tempo razoável a fim de evitar sérias consequências. Entretanto, existe a possibilidade de que tal objeto se fixe na laringe e obstrua completamente a traqueia. Desta forma, todos os membros do consultório odontológico devem estar familiarizados com o correto manejo da obstrução aguda das vias aéreas superiores. Incidência Os pacientes idosos, especialmente aqueles portadores de distúrbios neurológicos e reflexo de vômito deficiente devido ao uso de álcool, convulsões, acidente vascular encefálico, parkinsonismo, trauma e demência senil, também estão sob sérios riscos de aspiração. Vários tipos de objetos, comida e conteúdo estomacal podem ser aspirados. Mais de 90% das mortes causadas por aspiração de objetos por indivíduos em idade pediátrica ocorrem em crianças com menos de 5 anos de idade; 65% destas mortes ocorrem em bebês com menos de 1 ano. Os itens comumente aspirados são pedaços de cachorros- quentes, balas arredondadas, castanhas, passas, moedas, brinquedos, bem como outros objetos duros e coloridos. Uma terceira categoria de indivíduos sob risco são aqueles submetidos a procedimentos de sedação, particularmente procedimentos odontológicos ou intubação de emergência. Na maioria dos casos de corpos estranhos causando obstrução das vias aéreas, os mesmos se encontram localizados exatamente nas vias aéreas em lugares onde não se consegue nem ver nem sentir o objeto com a boca sem o uso de equipamentos especiais, como um laringoscópio ou um fórceps de intubação de Magill (itens que não são comumente encontrados nos consultórios odontológicos). O cirurgião-dentista deve ser capaz de reconhecer o problema instantaneamente e agir rapidamente na tentativa de remover o objeto que esteja obstruindo as vias aéreas do paciente. A obstrução aguda das vias aéreas é a principal causa de parada cardiorrespiratória não traumática em bebês e crianças. Em bebês e crianças, as taxas de sobrevivência após uma parada cardiorrespiratória são baixas (2 a 17%) e muitos dos que sobrevivem sofrem sequelas cerebrais sérias e permanentes. Prevenção Mesmo com todos os cuidados preventivos, pequenos objetos como inlays, onlays, brocas ou restos de material podem cair na orofaringe do paciente e, consequentemente, ser aspirados ou deglutidos. Com a introdução da odontologia de posição sentada, na qual o paciente é colocado em uma posição semissupina durante o tratamento, este tipo de incidente tem aumentado. Quando objetos são deglutidos, geralmente penetram no trato gastrintestinal. Durante o ato da deglutição, a epiglote fecha a entrada da traqueia de forma que líquidos ou sólidos não penetrem na traqueia. O esôfago é o sítio mais comum do trato gastrintestinal onde objetos se tornam impactados por causa de sua Obstrução das vias aéreas por corpo estranho natureza – o esôfago é um tubo através do qual líquidos e sólidos descem. Mais de 90% dos objetos estranhos que são deglutidos passam pelo esôfago e vão para o estômago e intestinos através de todo o trato gastrintestinal sem complicações. Entretanto, as complicações estão associadas a objetos tanto deglutidos como aspirados. Objetos deglutidos que entram no trato gastrintestinal podem produzir obstruções ao longo deste trato, abscesso peritonial, perfuração e peritonite. Os objetos que são aspirados tanto para o brônquio principal direito como para o esquerdo podem produzir infecção, abscesso pulmonar, pneumonia e atelectasia. Quando aspirados para dentro da traqueia, essa condição pode levar à morte. Duas principais medidas preventivas – o dique de borracha e o anteparo com gaze. Tais medidas minimizam significativamente a ocorrência de deglutição de corpos estranhos. Outras medidas preventivas são posicionamento do paciente, presença da assistente do dentista, sucção, fórceps de intubação de Magill e uso de ligadura. Dique de borracha O dique de borracha isola efetivamente o campo de operação da cavidade oral ou das vias aéreas, prevenindo a deglutição de objetos estranhos. O uso do dique de borracha é recomendado em todos os procedimentos possíveis. Infelizmente, o uso do dique de borracha, em vários tipos de procedimentos odontológicos, tais como tratamento periodontal e cirurgia, não é possível. Anteparo com gaze Uma cortina na faringe criada com a inserção de uma gaze 4 3 4 inserida na parte posterior da cavidade oral previne efetivamente a entrada de partículas pequenas ou líquidos nas vias aéreas. Este anteparo com gaze é particularmente utilizado em pacientes sedados (sedação oral, intranasal ou endovenosa) ou que estejam recebendo anestesia geral, nos quais os reflexos de proteção das vias aéreas se encontram comprometidos. O paciente não sedado geralmente não tolera o anteparo com gaze, uma vez que o mesmo interfere na deglutição ou restringe o volume de ar que poderia ser inspirado através da boca. Esse tipo de anteparo para proteção das vias aéreas não deve ser feito com gaze 2 3 2, uma vez que esse tamanho de gaze é muito pequeno e pode ser deslocado facilmente, sendo, portanto, também facilmente aspirado. Em caso de deglutição de objeto, o paciente deve ser posicionado de lado com a cabeça mais para baixo que o tronco e com a parte superior do corpo pendendo para o lado da cadeira. Uma cortina na faringe criada com a inserção de uma gaze 4 3 4 na região posterior da cavidade oral previne efetivamente que líquido ou partículas pequenas adentrem as vias aéreas, ao passo que a mesma é muito grande para ser deglutida ou aspirada. Posição da cadeira A posição supina, a qual é recomendada com o objetivo de prevenir a síncope, se torna prejudicial para um paciente que precise utilizar o corpo da língua para segurar contra o palato um objeto que “cai” em direção à orofaringe. A gravidade atua forçando este objeto posteriormente em direção à faringe. Se não existirem equipamentos facilmente disponíveis ao lado da cadeira para remover o objeto,o paciente deve ser posicionado de lado com a cabeça mais para baixo que o tronco e com a parte superior do corpo pendendo para o lado da cadeira (Trendelenburg*). Esta posição utiliza a gravidade a favor do paciente, permitindo que o objeto caia da sua boca. Assistente odontológica e sucção Na maioria dos consultórios odontológicos, a assistente fica sentada do lado oposto ao dentista. Quando um objeto cai dentro da boca do paciente e existe o risco de o mesmo ser deglutido, a assistente pode ter disponível um ou mais instrumentos que podem ser utilizados na remoção do objeto, tais como as pinças clínicas ou as hemostáticas. Se não houver nada disponível para este fim, um dispositivo de sucção de alta potência com uma ponta de largo diâmetro pode ser utilizado para remover o objeto da boca do paciente. Os sugadores de saliva nem sempre são úteis para este objetivo, uma vez que a forca de sucção pode não ser suficiente para remover o corpo estranho. Quando disponível, um fórceps de intubação de Magill permite que a assistente remova o objeto da parte posterior da cavidade oral com mais facilidade. Fórceps de intubação de Magill O fórceps de intubação de Magill, o qual deve ser incluído no kit básico de emergências do consultório, é designado para permitir a remoção de objetos pequenos e grandes da parte distal da cavidade oral e da faringe. Sua curvatura angulada permite um posicionamento mais confortável na mão, enquanto que sua ponta romba permite a boa apreensão do objeto. Nenhum outro instrumento, incluindo a pinça clínica (de algodão) e a pinça hemostática, são designados para este fim. Figura: O fórceps de intubação de Magill deve ser incluído no kit de emergência do consultório odontológico. Figura: Uso apropriado do fórceps de intubação de Magill. A pinça hemostática (A) e a pinça de algodão (B) não são designadas para o uso facilitado na remoção de corpos estranhos. Fórceps de língua O fórceps designado para segurar a língua tem serrilhados que permitem que a língua seja agarrada firmemente e puxada para fora da boca sem causar lesão iatrogênica. Ligadura O uso de ligadura (fio dental) pode ajudar na prevenção da aspiração ou deglutição de objetos utilizados na odontologia e na remoção dos mesmos da parte mais distal da cavidade oral e da faringe. Alguns dos objetos que devem ser presos ao fio dental são grampos de isolamento, instrumentos endodônticos, rolos de algodão, chumaços de gaze, assim como todos os outros pequenos objetos colocados na cavidade oral durante o tratamento odontológico. A presença do fio dental diminui a probabilidade de que o paciente possa engolir um objeto ou que inadvertidamente deixe o consultório com um rolinho de algodão esquecido na boca. Figura: Fórceps para pinçamento da língua. Figura: O fio dental é amarrado ao objeto para permitir uma rápida remoção. Figura: A, Rolinho de algodão sem fio dental. B, Rolinho de algodão com fio dental. Manejo Quando um objeto penetrar na orofaringe de um paciente que se encontra deitado em posição supina ou semissupina, não se deve permitir que o paciente se sente. A cadeira odontológica deve ser movimentada para uma posição ainda mais deitada (p. ex., posição de Trendelenburg, se possível) enquanto a assistente remove o objeto com o fórceps de intubação de Magill. A colocação do paciente em Trendelenburg permite que a gravidade ajude a mover o objeto para mais próximo da cavidade oral, tornando-o visível e facilitando sua remoção por meio do fórceps de Magill. Se o objeto não puder ser visualizado (p. ex., o paciente o “engole”), devem ser feitas radiografias de modo que sua localização possa ser determinada; o paciente não deve ser liberado do consultório sem os arranjos para que a radiografia seja feita. Uma vez que os sinais e sintomas clínicos nem sempre indicam se o objeto se encontra no trato gastrintestinal ou no trato respiratório, o cirurgião-dentista deve acompanhar o paciente (se possível) para o serviço hospitalar de emergência ou laboratório de radiologia mais próximo. Na maioria dos casos o radiologista recomenda uma radiografia do abdome ou uma visão anteroposterior (AP) ou lateral do tórax. É desejado que o objeto, quando encontrado, seja visto na radiografia abdominal em vez de na torácica, como, por exemplo, dentro de um brônquio. Em qualquer situação na qual o objeto é encontrado dentro do trato gastrintestinal ou do tórax, a assistência médica especializada deve ser requerida – gastroenterologista, pneumologista ou anestesiologista. Os manejos subsequentes serão provavelmente direcionados pelo seu médico particular. Se a localização do objeto não puder ser identificada na radiografia ou se existir qualquer dúvida sobre onde ele está localizado, ou ainda qualquer complicação potencial estiver presente, o médico deve ser consultado imediatamente. Usualmente, os sinais ou sintomas exibidos pelo paciente podem auxiliar a identificar se o objeto penetrou na traqueia. Tais sinais e sintomas incluem início inesperado de tosse, engasgo, chiado e dificuldade respiratória. Mais de 90% dos pacientes que aspiram objetos exibem tais sinais e sintomas 1 hora após a aspiração. Alguns poucos pacientes experimentam um intervalo de tempo de até 6 horas antes que os sintomas se tornem evidentes. 34 Dependendo da gravidade da ocorrência, pode ocorrer apneia imediatamente em até um terço destes pacientes. Os sintomas podem progredir para cianose e outros sinais sérios de hipoxemia. Figura: A, Visão anteroposterior do tórax demonstrando uma taça de borracha de profilaxia (seta). B, Coroa de ouro aspirada para o pulmão esquerdo do paciente. Em situações nas quais o objeto presumivelmente penetrou na traqueia, um protocolo bem definido deve ser seguido, a começar por assegurar que o paciente não se sentará (sentar verticalmente pode impulsionar o objeto ainda mais profundamente na traqueia ou brônquio). O paciente deve ser posicionado em decúbito lateral esquerdo com a cabeça mais baixa que o corpo. O paciente pode tossir espontaneamente; se não, a tosse deve ser encorajada na tentativa de expelir o objeto. O reflexo natural de tosse é poderoso e em muitos casos auxilia o paciente a adequadamente expelir o objeto aspirado. Se o paciente parar de tossir e relatar que o objeto foi deglutido, ainda assim ele não deve ser liberado do consultório até que seja encaminhado para o médico ou radiologista para se certificar de que o corpo estranho não está localizado na região traqueobronquial. Apenas se o objeto foi expelido ou removido, o paciente poderá ser liberado do consultório. Além disso, antes de o paciente deixar o consultório, uma consulta médica deve ser feita com um especialista (p. ex., pneumologista) a fim de discutir a prevenção, o reconhecimento e o controle das complicações pós- aspiração. Se o objeto não foi removido, o cirurgião- dentista deve acompanhar o paciente ao serviço de emergência para diagnóstico definitivo e tratamento. Se estiver determinado que o objeto se encontra na região traqueobronquial, o mais provável é que ele esteja no brônquio direito. Quando comparado com o brônquio esquerdo, o brônquio principal direito percorre um caminho mais retilíneo em sua bifurcação com a traqueia. O brônquio principal direito deixa a traqueia em um ângulo de 25 graus enquanto o brônquio principal esquerdo a deixa em 45 graus. A remoção do objeto do brônquio pode envolver o uso de broncoscopia fibróptica para localizar (visualizar) o objeto e de um broncoscópio para removê-lo. Se a broncoscopia não obtiver sucesso (raro), um procedimento cirúrgico conhecido como toracotomia pode ser necessário. Uma emergência potencialmente fatal não está presente nassituações anteriormente descritas. No entanto, o paciente não deve ser liberado do consultório a menos que o objeto tenha sido removido. Um manejo médico adicional será necessário para a prevenção de consequências mais sérias (infecção, pneumonia, broncoespasmo). Reconhecimento da obstrução das vias aéreas A obstrução aguda das vias aéreas superiores no paciente consciente ocorre mais frequentemente enquanto o indivíduo está comendo. Nos adultos, a carne é a causa mais comum de obstrução das vias aéreas. Vários fatores comuns são identificados nestes casos, tais como (1) pedaços grandes e mal mastigados de alimentos; (2) níveis elevados de álcool no sangue; (3) risos ou fala durante a mastigação; e (4) uso de prótese total superior ou inferior. Uma incidência ainda mais elevada destes casos ocorre em pacientes que estão recebendo medicamentos com ações anticolinérgicas. Outras causas de obstrução das vias aéreas são: Anormalidades estruturais congênitas das vias aéreas Infecções, tais como epiglotite aguda Tonsilite Abscessos retrofaríngeos Angina de Ludwig e laringite Trauma Tumores e hematomas Processos patológicos das cordas vocais, entre os quais laringoespasmo e paralisia Processos inflamatórios, tais como angioedema e reação anafilática, ingestão de corrosivos e toxinas, e queimaduras térmicas Apneia do sono A obstrução das vias aéreas por corpos estranhos é dividida em duas categorias: obstrução parcial e obstrução completa. Para fins de manejo, a obstrução parcial de vias aéreas é subdividida em outras duas categorias: obstrução parcial com boa troca gasosa e obstrução parcial com troca gasosa inadequada. Obstrução completa das vias aéreas Inicialmente, a descarga simpática aumenta significativamente, aumentando a pressão arterial, a frequência cardíaca e a frequência respiratória. Como resultado do aumento do trabalho da respiração, a PaO2 (tensão arterial do oxigênio[O2 ]) diminui, a PaCO2 (tensão arterial do gás carbônico[CO2 ]) aumenta e ocorre uma queda no pH. Após 3 ou 4 minutos, a pressão arterial e a frequência cardíaca caem significativamente e o esforço respiratório diminui. Os gases sanguíneos deterioram-se ainda mais. Após 8 ou 10 minutos, os sinais vitais desaparecem e o eletrocardiograma degenera de um ritmo sinusal normal para uma bradicardia nodal, depois para um ritmo idioventricular; o eletrocardiograma termina então por apresentar fibrilação ventricular ou assistolia. Se a obstrução é aliviada em até 4 a 5 minutos, todos os parâmetros monitorados geralmente retornam ao normal rapidamente e concomitantemente com o retorno da consciência. Entretanto, os seres humanos, especialmente aqueles com saúde comprometida, não toleram bem a asfixia. Dailey dividiu as características clínicas da obstrução das vias aéreas superiores em humanos em três fases: Fase 1 A primeira fase ocorre nos 3 minutos iniciais da obstrução. O paciente está consciente porém em óbvia dificuldade respiratória, demonstrando respiração paradoxal com evidente luta para respirar (movimentos respiratórios exagerados associados a evidente ausência de troca gasosa), bem como aumento na pressão arterial e na frequência cardíaca. O paciente geralmente agarra a garganta com as mãos em um movimento conhecido como sinal de engasgo. Embora os esforços respiratórios estejam evidentes, nenhum ar está sendo trocado com o meio e nenhuma voz pode ser produzida. Podem estar evidentes retrações nas musculaturas intercostal e supraclavicular, sons respiratórios estão ausentes e o paciente se torna cianótico. Fase 2 Os minutos 2 ao 5 fazem parte da segunda fase. A vítima perde a consciência e os esforços respiratórios cessam. Inicialmente, a pressão arterial e o pulso estão presentes. Fase 3 A fase três começa a partir de 4 ou 5 minutos. Após um breve período, a pressão arterial e o pulso desaparecem, uma vez que a dissociação eletromecânica leva a uma completa parada cardiorrespiratória. Obstrução parcial das vias aéreas Uma tosse forçada geralmente pode ser observada na vítima com boa troca gasosa. Um chiado pode ser escutado entre as tosses. O paciente com obstrução parcial das vias aéreas deve ser estimulado a continuar tossindo sem que haja nenhuma intervenção física pelo socorrista. Aqueles com inadequada troca gasosa exibem reflexos de tosse fracos e ineficazes, além de um característico som “cantado” durante a inspiração. O grau de respiração paradoxal está relacionado com o grau da obstrução das vias aéreas. Os sons vocais podem estar ausentes ou alterados porque as cordas vocais não conseguem funcionar normalmente. A fase inspiratória da respiração é notoriamente prolongada. Os pacientes com inadequada troca gasosa exibem cianose, letargia e desorientação se houver hipóxia grave e hipercarbia; estes pacientes devem ser tratados como se tivessem uma obstrução completa das vias aéreas. Manobras básicas das vias aéreas Uma vez que o paciente apresentando obstrução das vias aéreas perde a consciência, o suporte básico de vida, incluindo a manutenção das vias aéreas, deve ser iniciado imediatamente. Estes passos são designados a controlar a causa mais comum de obstrução das vias aéreas: a língua. Efetuar estes passos permite que o socorrista determine se a língua é a causa da obstrução ou se um manejo adicional é necessário. Nas situações nas quais a obstrução das vias aéreas inferiores é óbvia (p. ex., obstrução das vias aéreas que se desenvolve imediatamente após o paciente engolir uma coroa ou um instrumento odontológico), as etapas do suporte básico de vida são ignoradas e o socorrista deve imediatamente proceder ao estabelecimento de uma via respiratória pérvia. Figura: O paciente que perde a consciência deve ser colocado na posição supina com os pés ligeiramente elevados. Figura: Técnica da inclinação da cabeça e elevação do mento. Figura: Técnica do “ver, ouvir e sentir”. Etapa 1: P (posição). O paciente deve ser colocado em posição supina com os pés ligeiramente elevados. Etapa 2: C (circulação). Se a vítima estiver inconsciente, cheque o pulso por não mais que 10 segundos. Se o pulso estiver ausente, ou não puder ser detectado, inicie as compressões cardíacas. Se o pulso estiver presente, continue para o passo 3. Etapa 3: inclinação da cabeça e elevação do mento. Os tecidos moles do pescoço do paciente devem ser estendidos utilizando-se a técnica da inclinação da cabeça-elevação do mento. Em 80% dos casos nos quais a língua é a causa da obstrução das vias aéreas, este procedimento abre a via respiratória eficientemente. Etapa 4: A + B (vias aéreas e respiração). O ouvido do socorrista deve ser posicionado a 2,5 cm da boca e do nariz da vítima; o socorrista deve escutar e sentir a passagem de ar enquanto olha para o tórax da vítima e observa se existem movimentos respiratórios espontâneos. Lembre-se que a existência de movimentos respiratórios espontâneos não garante que o paciente esteja respirando (fazendo troca gasosa). Isso indica que o paciente está “tentando” respirar, mas que a via respiratória talvez esteja obstruída. O Guidelines for Basic Life Support de 2010 desenvolvido pela American Heart Association aboliu a técnica do “ver, ouvir, sentir” para a avaliação da respiração, uma vez que estabeleceu que a realização desses passos era inconsistente e demorada. Etapa 4a: elevação da mandíbula, se indicado. O socorrista posiciona seus dedos atrás da borda posterior do ramo da mandíbula do paciente e empurra a mandíbula anteriormente enquanto inclina a cabeça para trás e abre a boca da vítima. O deslocamento da mandíbula é um procedimento doloroso. Entretanto, esta manobra oferece ao socorrista a noção do grau daprofundidade da inconsciência do paciente. Se a vítima não responde a esta manobra, o grau de inconsciência é bastante profundo; ao passo que, se a vítima responde (p. ex., fazendo caretas, falando ou se movimentando), o nível de inconsciência não é tão profundo assim. Etapa 5: A + B. Repita o passo 4, se necessário. Etapa 6: respiração de resgate, se indicado Quando a língua é a causadora da obstrução das vias aéreas, a simples realização dos passos anteriores restabelece a patência das vias aéreas. Quando tais procedimentos são feitos apropriadamente mas as vias aéreas permanecem obstruídas (o que é diagnosticado por afonia, retração supraesternal, ausência contínua de sons e movimentos respiratórios), o socorrista deve considerar a probabilidade de a obstrução estar localizada nas vias aéreas inferiores (laringe ou traqueia) e deve proceder imediatamente ao estabelecimento de uma via respiratória de emergência. Estabelecimento de uma via respiratória de emergência Quando as vias aéreas de um paciente estão obstruídas, o estabelecimento de uma patência para as mesmas se torna o objetivo imediato do tratamento. Existe uma variedade de procedimentos para se atingir este objetivo. Dois tipos de procedimentos – a traqueostomia e a cricotireoidostomia – requerem intervenção cirúrgica e considerável conhecimento técnico para um manejo eficaz. Um terceiro procedimento, o qual não é cirúrgico, é o procedimento de escolha para o manejo inicial das vias aéreas obstruídas quando as técnicas de suporte básico de vida se mostram inadequadas. Trata-se da técnica de compressão subdiafragmática conhecida como compressão abdominal, ou manobra de Heimlich. Uma vez que este procedimento não é cirúrgico, complicações sérias são, embora possíveis, menos prováveis de acontecer, o que torna essa manobra particularmente atraente quanto ao seu uso no consultório odontológico. Procedimentos não invasivos Quando um objeto penetra na árvore traqueobrônquica, uma situação potencialmente fatal se desenvolve. A obstrução das vias aéreas pode ser parcial ou total. O manejo varia de acordo com o grau da obstrução e da efetividade dos reflexos de tosse do paciente. Sempre que possível, devem ser feitos procedimentos não invasivos manuais. Os procedimentos cirúrgicos, usados como último recurso, devem ainda estar dentro do grau de conhecimento do cirurgião-dentista. Uma vítima com obstrução parcial das vias aéreas que seja capaz de tossir e respirar adequadamente (p. ex., sem sinais evidentes de cianose) deve ser deixada tossindo, ou seja, a tosse deve ser somente estimulada verbalmente. Ainda que haja chiados audíveis entre as tosses, a tosse forçada é altamente efetiva na remoção destes objetos. Entretanto, se a vítima de uma obstrução parcial das vias aéreas inicialmente demonstra troca gasosa inadequada ou se anteriormente a troca era eficaz porém se deteriorou, essa vítima deve ser manejada como se tivesse uma obstrução completa. As vítimas de obstrução total das vias aéreas são incapazes de falar ou produzir qualquer som (afonia), respirar ou tossir. Essa vítima se mantém consciente enquanto o nível cerebral de oxigênio for suficientemente alto. Este paciente se mantém consciente por cerca de 10 segundos a 2 minutos, dependendo se a obstrução ocorreu durante a inspiração (quando o sangue possui mais oxigênio) ou expiração (quando o sangue possui menos oxigênio). Felizmente, a maioria das obstruções das vias aéreas ocorre durante a inspiração; desta forma, os pulmões estão inflados e preenchidos com oxigênio, o que mantém a vítima consciente por um período maior. O paciente também pode agarrar o pescoço, demonstrando o sinal universal de engasgo. O rápido controle desta situação é imprescindível, uma vez que a vítima irá perder a consciência e até morrer, a não ser que uma via respiratória pérvia seja restabelecida imediatamente. Diversos procedimentos manuais não invasivos estão disponíveis para tratar a obstrução aguda das vias aéreas. Cada técnica será descrita seguida da recomendação sequencial de cada uma delas em situações específicas. Estas técnicas são as seguintes: Golpes nas costas Compressão abdominal Compressão torácica Golpes nas costas Os golpes nas costas faziam parte dos protocolos anteriores para a remoção dos corpos estranhos que estavam obstruindo as vias aéreas. Entretanto, informações apresentadas na National Conference on Cardiopulmonary e Resuscitation and Emergency Cardiac Care de 1985 sugeriam que os golpes nas costas poderiam não ser tão eficazes nos adultos quanto seriam as compressões abdominais (manobra de Heimlich). Os protocolos de 2005 da American Heart Association e depois os de 2010 recomendam que as compressões abdominais sejam realizadas em uma rápida sequência até que a obstrução seja aliviada. Se esta abordagem se mostrar ineficaz, o socorrista deve considerar as compressões torácicas. As compressões abdominais não são recomendadas em bebês abaixo de 1 ano de idade, uma vez que esta manobra pode causar lesões no fígado. Entretanto, os golpes nas costas ainda permanecem como parte integrante do protocolo de controle das vias aéreas obstruídas nos bebês. Para que as pancadas nas costas sejam realizadas no bebê, o mesmo deve ser encaixado no braço do socorrista com a cabeça abaixo do nível do corpo e sua cabeça deve ser sustentada pelo socorrista firmemente, cuja mão deve estar posicionada no mento do bebê. Usando o “calcanhar” da mão, o socorrista deve dar até cinco golpes fortes entre as escápulas do bebê enquanto apoia o mesmo em sua coxa. Cada golpe deve ser administrado com força suficiente para tentar deslocar o corpo estranho. Compressões abdominais e torácicas As compressões manuais na região superior do abdome (manobra de Heimlich ou compressões abdominais) ou na parte mais inferior do tórax (compressões torácicas) são designadas para produzir um rápido aumento na pressão intratorácica, agindo como uma tosse artificial que pode ajudar a deslocar o corpo estranho. O objetivo de cada uma dessas compressões deve ser aliviar a obstrução. Vários estudos têm demonstrado que não há diferenças significativas entre as compressões abdominais e as compressões torácicas em relação a quantidade de fluxo de ar, pressão ou volume. Existem situações especiais nas quais uma técnica é preferível em relação à outra. As compressões torácicas são recomendadas para pacientes obesos cujo abdome é difícil de envolver com os braços. Se a vítima estiver nos últimos estágios da gravidez, o socorrista também deve utilizar as manobras de compressões torácicas, em vez de compressões abdominais. As compressões torácicas são menos prováveis de causar regurgitação do que as compressões abdominais. Além disso, as compressões torácicas são recomendadas nos bebês, uma vez que compressões abdominais são mais propensas a causar danos a órgãos (p. ex., fígado ou baço). A compressão abdominal é especialmente recomendada para os pacientes idosos, os quais possuem costelas mais frágeis e mais fáceis de serem fraturadas pelas compressões torácicas, e também para as crianças. Figura: O socorrista utiliza o “calcanhar” da mão para dar até cinco golpes fortes nas costas entre as escápulas do bebê. Lesões internas são possíveis de acontecer sempre que compressões torácicas ou abdominais são realizadas. Têm sido documentados danos a órgãos torácicos ou abdominais, tais como fígado, baço e estômago. A localização precisa das mãos pode minimizar a ocorrência destes efeitos adversos potencialmente sérios. O socorrista nunca deve posicionar suas mãos no apêndice xifoide do paciente ou ainda nas margens inferiores das costelas. Nas compressões abdominais, o socorrista deve posicionar suas mãos abaixodo apêndice xifoide, enquanto nas compressões torácicas as mãos são posicionadas acima desta região. Após a aplicação bem-sucedida de qualquer uma das manobras de compressão manual para aliviar a obstrução aguda das vias aéreas, o paciente deve ser avaliado pela equipe médica a fim de localizar possíveis lesões secundárias, tais como sangramento abdominal, antes de o paciente ser completamente liberado. Compressão abdominal (manobra de Heimlich) Hoje em dia, esta manobra é a primeira escolha para o alívio da obstrução das vias aéreas em adultos e crianças acima de 1 ano de idade. Quando sinais de boa troca gasosa (pequena obstrução das vias aéreas) estiverem presentes (tosse forçada, fala presente, chiado entre as tosses), o socorrista deve encorajar a vítima a tentar tossir e respirar espontaneamente. O socorrista não deve interferir com o próprio esforço da vítima em tentar expelir o corpo estranho, mas deve permanecer com ela, monitorando seus esforços e a sua condição. Se a obstrução leve permanecer, o serviço médico de emergência deve ser ativado. Os sinais de obstrução grave das vias aéreas são os seguintes: baixa ou nenhuma troca gasosa; tosse fraca, ineficiente ou até mesmo ausente; ruído agudo durante a inspiração ou ainda nenhum ruído; aumento na dificuldade respiratória; presença de cianose da membrana mucosa; afonia; e mãos levadas ao pescoço constituindo o sinal universal de engasgo. Na ocorrência de obstrução grave das vias aéreas, o socorrista deve perguntar à vítima se ela está engasgando. Se a vítima responder “sim” com a cabeça, o socorrista deve se identificar como sendo alguém que irá ajudar e pedir permissão para tentar solucionar a obstrução. Para uma vítima inconsciente, esse consentimento está implícito. Vítima consciente: Se o paciente estiver consciente e de pé ou sentado, as recomendações a seguir deverão ser realizadas após o socorrista ter determinado que as vias aéreas do paciente estão obstruídas ao perguntar “Você está engasgando?” e “Posso te ajudar?” e receber uma resposta positiva (balanço da cabeça respondendo positivamente) às duas perguntas: 1.Posicione-se por detrás da vítima e envolva-a com seus braços ao redor da cintura e abaixo dos braços do paciente. 2. Mantenha uma posição estável de modo que você não caia para trás ou para os lados durante o procedimento. 3. Feche uma das mãos. 4. Posicione essa mão fechada contra o abdome da vítima. Essa mão deve permanecer na altura média do abdome, um pouco acima do umbigo do paciente e bem abaixo do apêndice xifoide. 5. Apreenda a mão que está fechada com a outra mão, e pressione rápida e fortemente a mão fechada contra o abdome da vítima fazendo movimentos para dentro e para cima. 6. Repita essas compressões para dentro e para cima até que o objeto seja expelido ou que a vítima perca a consciência. 7. Cada compressão deve ser forte o suficiente para deslocar o corpo estranho. 8. Caso a vítima seja tratada com sucesso, ela deve ser avaliada em relação à presença de possíveis complicações antes de ser liberada do consultório. Se a vítima for gestante ou obesa, as compressões torácicas devem ser administradas no lugar das compressões abdominais. Vítima inconsciente: Se uma vítima consciente se tornar inconsciente (não responsiva), o seguinte protocolo deve ser seguido, uma vez que se saiba que a causa da perda de consciência é a obstrução das vias aéreas por corpo estranho: 1. Coloque o paciente na posição supina e chame o serviço médico de emergência o mais rápido possível. 2. Inicie o suporte básico de vida começando por 30 compressões torácicas – antes de checar o pulso. 3. No paciente adulto ou na criança, cada vez que você parar as compressões para abrir as vias aéreas (A) e estabelecer duas ventilações (B), abra bem a boca dessa vítima para analisar a presença do objeto. Se o mesmo estiver visível, você deverá removê-lo utilizando um fórceps de intubação de Magill, uma pinça de algodão ou seus dedos. 4. Caso o objeto não esteja visível, continue o suporte básico de vida com as compressões torácicas repetindo os passos 2 e 3 até que o objeto seja removido ou que o serviço médico de emergência chegue ao local e assuma a situação. A realização apropriada da manobra de Heimlich deve se dar exclusivamente em tecidos moles. Nenhuma estrutura óssea, tais como costelas ou esterno, deve ser pressionada. Em todos os casos, o socorrista deve aplicar pressão com a mão abaixo da caixa torácica. A manobra de Heimlich não é um “abraço de urso”; quando realizada desta forma, pode causar danos aos órgãos abdominais como o baço e o fígado, ou ainda ao esterno ou às costelas. Após a realização desta manobra com sucesso, a equipe do consultório odontológico deve solicitar uma avaliação médica por parte da equipe de emergência antes da completa liberação do paciente. Compressões torácicas As compressões torácicas são uma alternativa – em situações especiais apenas – à manobra de Heimlich para o manejo da obstrução aguda das vias aéreas. Não há diferenças substanciais na efetividade destas manobras quando devidamente realizadas. Vítima consciente: Se a vítima gestante ou obesa com obstrução das vias aéreas por corpo estranho estiver consciente e de pé ou sentada, os seguintes passos devem ser realizados após o socorrista ter confirmado a obstrução ao perguntar “Você está engasgando?” e “Posso te ajudar?” e receber uma resposta afirmativa (cabeça balançando positivamente) às duas perguntas: 1. Posicione-se atrás do paciente e coloque seus braços diretamente por baixo das axilas do mesmo, envolvendo seu tórax. 2. Apreenda uma das suas mãos com a outra mão, posicionando seu polegar no meio do esterno do paciente, porém não no apêndice xifoide ou gradil costal. 3. Mantenha uma posição estável de modo que você não caia para trás ou para os lados durante o procedimento. 4. Realize compressões para dentro até que o objeto seja expelido ou que a vítima perca a consciência. Vítima gestante ou obesa inconsciente. Se a vítima estiver inconsciente, os seguintes passos devem ser realizados: 1. Coloque o paciente em posição supina e ligue para o serviço médico de emergência o mais rápido possível. 2. Inicie o suporte básico de vida começando por 30 compressões torácicas – antes de checar o pulso. 3. No paciente adulto ou na criança, cada vez que você parar as compressões para abrir as vias aéreas (A) e estabelecer duas ventilações (B), abra bem a boca dessa vítima para analisar a presença do objeto. Se o mesmo estiver visível, você deverá removê-lo utilizando um fórceps de intubação de Magill, uma pinça de algodão ou seus dedos. 4. Caso o objeto não esteja visível, continue o suporte básico de vida com as compressões torácicas repetindo os passos 2 e 3 até que o objeto seja removido ou que o serviço médico de emergência chegue ao local e assuma a situação. 5. Os protocolos atuais não recomendam a varredura digital às cegas. Se o objeto puder ser visualizado, ele deve ser removido. Varredura digital Nenhum estudo já avaliou o uso de rotina da varredura digital para limpar as vias aéreas na ausência de obstrução visível. Nos protocolos anteriores, a recomendação da utilização de varredura digital era baseada em recomendações empíricas, as quais sugeriam que a varredura digital era benéfica para o alívio da obstrução das vias aéreas. Entretanto, outros relatos indicavam prejuízos às vítimas ou ao socorrista. Os protocolos atuais não recomendam a varredura digital às cegas. Apenas quando o objeto pode ser visualizado é que devem ser feitas tentativas para a sua remoção manual. Um fórceps de intubação de Magill deve ser incluído no kit de emergências médicas do consultório odontológico. Este instrumentopode auxiliar na remoção de corpos estranhos das vias aéreas da vítima. Entretanto, o uso deste instrumento deve ser limitado apenas às situações nas quais o objeto pode ser visualizado. Procedimentos para o manejo da obstrução das vias aéreas em crianças e bebês Uma combinação de golpes nas costas e compressões abdominais ainda é o protocolo recomendado para bebês abaixo de 1 ano de idade. Procedimentos invasivos: traqueostomia e cricotireoidostomia Na maioria das vítimas, as técnicas não invasivas descritas anteriormente alcançam uma alta taxa de sucesso no tratamento da obstrução das vias aéreas. Entretanto, existem situações nas quais tais manobras não invasivas são ineficazes (p. ex., remoção de um rolinho de algodão das vias aéreas do paciente). Nesta situação e em outras, quando, por exemplo, a obstrução é causada pelo edema dos tecidos (edema de laringe ou da epiglote) devido a processos alérgicos ou doenças, os procedimentos invasivos podem se tornar necessários para que a vítima sobreviva. As aberturas cirúrgicas das vias aéreas podem ser realizadas de várias formas. As duas formas mais utilizadas são a traqueostomia e a cricotireoidostomia. Ambas essas técnicas possuem suas defesas e críticas dentro da comunidade médica, mas cada uma delas é igualmente importante para que a vítima tenha seus pulmões recebendo oxigênio. Esses procedimentos invasivos devem ser realizados apenas por pessoas treinadas e apenas quando o equipamento necessário se encontra disponível. A traqueostomia é um procedimento cirúrgico frequentemente utilizado no manejo de longo prazo das vias aéreas – com raras exceções, como no caso de fratura direta da laringe e manutenção de vias aéreas em bebês – e não é indicada para a maioria dos manejos das vias aéreas de emergência. O local para a realização da traqueostomia possui várias estruturas anatômicas importantes, tais como o istmo da glândula tireoide e muitos vasos importantes e de grosso calibre, além de nervos. Existe ainda o potencialrisco para perfuração acidental do esôfago. As complicações ocorrem mais facilmente com a traqueostomia, mesmo que ela seja realizada de forma calma e meticulosa, e sob condições controladas (como quando o paciente está sendo oxigenado e bem ventilado em um ambiente hospitalar), do que ocorrem com a cricotireoidostomia. Hemorragia e pneumotórax são as maiores complicações da traqueostomia. Além disso, existe um risco de penetração acidental do istmo da glândula tireoide. Na maioria dos casos, o sangramento associado à traqueostomia é uma complicação cirúrgica grande, a qual no consultório odontológico pode ser difícil de controlar satisfatoriamente. A punção da membrama cricotireóidea (cricotireoidostomia) envolve o estabelecimento de uma abertura nas vias aéreas do paciente no nível da membrana cricotireóidea e é uma forma aceitável de acesso de emergência às vias aéreas. A cricotireoidostomia é mais fácil e rápida de se realizar do que a traqueostomia, e o índice de incidentes e complicações é significativamente menor. Além disso, nenhuma estrutura anatômica significativa é encontrada perto da membrana cricotireóidea. A cricotireoidostomia tem sido reconhecida como o ponto mais acessível da porta de entrada para o trato respiratório inferior em direção à glote. A incisão é feita na pele, no tecido adiposo e na fáscia. Apesar do pequeno sangramento no local de incisão, sangramentos graves raras vezes são encontrados na realização da cricotireoidostomia. Uma vez que a cartilagem cricoide possui um segmento posterior intacto, a perfuração inadvertida da parede posterior da traqueia e a laceração do esôfago representam menores riscos. A incisão na membrana cricotireóidea começa a cicatrizar em poucos dias após a remoção do dispositivo. A habilidade de rapidamente localizar o sítio correto da cricotireoidostomia é crucial. A razão por trás de um procedimento cirúrgico de emergência de vias aéreas é que a abertura deve ser feita abaixo da obstrução para que o procedimento seja eficaz. Assim, uma consideração muito importante deve ser feita em relação ao local onde o corpo estranho está mais provavelmente localizado na traqueia. Anatomia A região mais estreita das vias aéreas do paciente adulto está localizada na laringe. A maioria dos objetos capazes de causar uma obstrução se prende nesta região. Um objeto pequeno o suficiente para passar através da laringe e entrar na traqueia geralmente passa pelo brônquio principal (usualmente o direito), criando uma oclusão em um dos pulmões ou em uma parte significativa do pulmão. Como discutido anteriormente, isso não representa uma ameaça imediata à vida do paciente, embora hospitalização e cirurgia para remoção do objeto possam ser necessárias. A parte mais estreita da traqueia nas crianças entre 3 e 5 anos de idade é encontrada a uma pequena distância abaixo das cordas vocais, na cartilagem cricoide. A obstrução é mais provável de ocorrer nesta região, tornando a cricotireoidostomia ineficaz. Assim, a traqueostomia é o procedimento cirúrgico de emergência preferido nas crianças de 3 a 5 anos, mas apenas indivíduos com experiência em traqueostomia em crianças e bebês devem tentar fazer este procedimento. (Quando as técnicas cirúrgicas não estão disponíveis, o manejo imediato desta situação deve ser feito com o uso contínuo das técnicas não cirúrgicas, tais como a compressão torácica e a compressão abdominal.) A cartilagem tireoide (a maior das cartilagens traqueais) e a cartilagem cricoide (a segunda maior) são as referências anatômicas para a realização da cricotireoidostomia. As cartilagens tireoide e cricoide são as duas únicas cartilagens traqueais que formam anéis completos; os outros “anéis” da traqueia são abertos na sua parte posterior. Sendo uma estrutura membranosa, a membrana cricotireóidea forma a conexão anterior entre estes dois anéis cartilaginosos e é o local mais preciso para a cricotireoidostomia. A membrana tem aproximadamente 10 mm de altura e 22 mm de largura. Pode ser facilmente localizada colocando-se o dedo na proeminência laríngea (pomo de Adão) da cartilagem tireoide e movendo-se o dedo inferiormente até encontrar uma ligeira depressão. A membrana cricotireóidea está mais ou menos 1 a 1,5 dedo abaixo da proeminência laríngea, na parte mediana do pescoço. A proeminência da cartilagem cricoide é inferior a esta depressão. A cartilagem cricoide se situa abaixo deste local de incisão, enquanto a cartilagem tireoide e as cordas vocais se situam acima desta região. Equipamento Um bisturi com uma lâmina reta (nº 11) pode ser utilizado para a realização da cricotireoidostomia de emergência tanto para a incisão da pele como da membrana. Alternativamente, uma lâmina de calibre 13 com 30 cm de comprimento pode ser utilizada. Etapa 1: preparo do pescoço Se há bastante tempo disponível (geralmente não é o caso), o pescoço do paciente deve ser preparado cirurgicamente. Entretanto, em uma situação de emergência, pode ser espalhado material antisséptico no pescoço do paciente antes que a incisão seja feita. O pescoço do paciente deve ser hiperestendido (inclinação da cabeça) para facilitar a identificação das cartilagens tireoide e cricoide, além da membrana cricotireóidea. Um rolo de toalha ou outro material pode ser colocado embaixo do pescoço do paciente de forma a manter a cabeça hiperestendida. Etapa 2: identificação de referências anatômicas O profissional destro deve posicionar-se à direita do paciente, de forma que a sua mão esquerda possa imobilizar a laringe do paciente e identificar as referências anatômicas enquanto a que mão direita será utilizada para realizar o procedimento. Na prática clínica, a mão direita geralmente é usadapara identificar as referências anatômicas e após isso o dedo indicador da mão esquerda é colocado por cima da região da membrana cricotireóidea. Etapa 3: imobilização da laringe A laringe deve ser imobilizada de forma que as referências anatômicas não sejam perdidas durante o procedimento em si. A imobilização da laringe é fácil de ser conseguida. Ela deve ser feita antes de a incisão ser realizada e mantida até que as vias aéreas sejam obtidas com sucesso. O operador destro utiliza o polegar e o dedo médio da mão esquerda para segurar os polos superiores da cartilagem tireoide, deixando que o dedo indicador da mão esquerda repouse sobre a membrana. Uma vez que a laringe esteja imobilizada, o dedo indicador da mão esquerda pode ser utilizado novamente para palpar a cartilagem tireoide, a membrana e a cartilagem cricoide. Etapa 4: incisão na pele A incisão na pele deve ser vertical e na linha média; deve ter aproximadamente 2 cm a 3 cm. A incisão vertical minimiza a possibilidade de problemas vasculares significativos durante o procedimento, enquanto a incisão horizontal é mais sujeita a promover sangramento. A incisão vertical deve ser feita na espessura da cartilagem tireoide, da membrana e da cartilagem cricoide. Os sangramentos pequenos como resultado da incisão na pele devem ser ignorados. O estabelecimento de uma via respiratória patente é a preocupação principal; uma vez que este objetivo é alcançado, qualquer sangramento pode ser controlado. Etapa 5: reidentificação da membrana O dedo indicador da mão esquerda deve ser reinserido na incisão a fim de reidentificar a membrana cricotireóidea. O dedo deve ser, então, rapidamente movido para cima, para a cartilagem tireoide, e para baixo, para a cartilagem cricoide, para se certificar da localização correta da membrana cricotireóidea. A ponta do dedo pode se manter na incisão, mas deve repousar na parte mais inferior da cartilagem tireoide a fim de manter um ponto de referência sem interferir na incisão da membrana. Etapa 6: incisão na membrana Utilizando-se uma lâmina de bisturi nº 11, a incisão na membrana deve ser horizontal no terço inferior do espaço cricotireóideo. Esta área é a menos vascularizada da membrana. A incisão horizontal na linha média deve ter ao menos 1,5 cm de comprimento a fim de facilitar a colocação do dispositivo. Uma vez dentro da via respiratória, um borbulhamento será observado (se os esforços respiratórios ainda estiverem presentes). O bisturi deve ser removido e o dedo indicador da mão esquerda, reinserido dentro do espaço cricotireóideo para identificar a incisão e verificar seu correto posicionamento. Este dedo é mais uma vez movido para a parte inferior da cartilagem tireoide como um guia para a inserção do dispositivo. Etapa 7: dilatação da incisão Neste ponto, o espaço cricotireóideo deve ser alargado. O cabo do bisturi deve ser introduzido dentro da incisão horizontal e rotacionado 90 graus para abrir a via respiratória. Etapa 8: inserção do tubo Um tudo de traqueostomia ou de cricotireoidostomia deve ser inserido temporariamente, se o mesmo estiver disponível. Uma cricotireoidostomia devidamente realizada pode ser feita em 15 a 30 segundos. A anestesia não é necessária, uma vez que o paciente está inconsciente e, consequentemente, não responde aos estímulos da incisão com o bisturi. Uso de agulha de calibre 13 para a cricotireoidostomia Quando uma agulha de calibre 13 é utilizada, o tecido é preparado e a cartilagem tireoide, estabilizada da mesma forma que com o uso do bisturi, usando-se o dedo indicador para identificar a membrana cricotireóidea. A agulha é inserida nesta área e direcionada na direção do tórax até que a mesma entre no lúmem traqueal. A entrada na traqueia é confirmada pelo som de ar, ou sentindo-se o ar entrando ou saindo da traqueia, bem como pela ocorrência de tosse ou bolhas. A parede cartilaginosa posterior da cartilagem cricoide previne a superinserção da agulha e, consequentemente, a perfuração da parede traqueoesofágica. Se houver movimentos respiratórios espontâneos, a vítima pode recobrar a consciência, mas ainda ser incapaz de falar por causa da existência de obstrução na laringe. Quando o estado de consciência retorna, a abertura na traqueia não pode ser fechada antes que a obstrução seja removida. Se não houver movimentos respiratórios espontâneos, deve ser feita ventilação artificial por meio da cricotireoidostomia para proporcionar adequada oxigenação do sangue do paciente. A presença de circulação deve ser determinada por meio da palpação da artéria carótida. Uma vez que a via respiratória está restabelecida, o paciente pode receber oxigênio. Uma cânula nasal ou uma máscara facial pode ser colocada na abertura traqueal. Além disso, deve ser solicitada assistência médica para transferir o paciente para um hospital de emergência a fim de fornecer um acompanhamento definitivo do manejo (p. ex., remoção do corpo estranho ou fechamento da abertura traqueal) e observação. Contraindicações da cricotireoidostomia Embora a cricotireoidostomia seja uma medida útil e que pode salvar vidas, ela não é recomendada em todos os casos de obstrução das vias aéreas superiores. Seguem alguns exemplos de exceções: A cricotireoidostomia não deve ser realizada, a não ser com muita precaução, em crianças abaixo de 10 anos de idade, assim como provavelmente não deve ser feita em crianças abaixo de 5 anos de idade. Embora a traqueostomia seja o procedimento cirúrgico de emergência preferido em pacientes jovens, a cricotireoidostomia por punção é mais desejável nestes pacientes. Processos patológicos preexistentes da laringe (p. ex., epiglotite), inflamação crônica ou câncer tornam a cricotireoidostomia mais difícil. A falta de experiência com a técnica e com suas complicações é a maior contraindicação da cirurgia. A inexperiência pode ser o fator mais causador de complicações da cricotireoidostomia. Barreiras anatômicas, como, por exemplo, trauma do pescoço, devem aumentar os cuidados na decisão pela realização desta técnica. Quando existir a possibilidade de hemorragia, os benefícios da cricotireodostomia devem ser pesados cuidadosamente em relação aos riscos. A obstrução aguda completa das vias aéreas é bastante rara no âmbito odontológico. Porém, quando ocorre, os sinais e sintomas devem ser reconhecidos imediatamente, bem como iniciado rapidamente o tratamento. Desta forma, todos os membros do consultório odontológico devem receber treinamento adequado para o manejo da obstrução das vias aéreas por corpo estranho. Os procedimentos não invasivos para a desobstrução das vias aéreas são preferíveis em relação aos procedimentos cirúrgicos, mas esses procedimentos cirúrgicos servem como último recurso quando todos os outros falham.
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