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AULA 1 ESPAÇO GEOGRÁFICO, ECONOMIA E COMÉRCIO INTERNACIONAL Prof. Rodolfo dos Santos Silva 2 INTRODUÇÃO Esta disciplina tem como objetivo estudar o espaço geográfico e as formas como o ser humano se apropria dos recursos disponíveis, de forma espontânea ou planejada, com base nos mecanismos de exploração com maior ou menor racionalidade, interferindo nas formas encontradas na natureza e se apropriando dos diferentes saberes, de forma a modificar os espaços conforme seus interesses, sejam eles institucionais, culturais, econômicos ou sociais. Serão apresentadas as bases teóricas do conhecimento geográfico e os fundamentos teóricos da economia. São duas ciências distintas que se complementam na análise do sistema econômico e geográfico, o qual se intensifica na complexidade da política, do espaço, do comércio e do mundo dos negócios. Atualmente, análises da realidade utilizando-se de instrumentos disponibilizados pela economia e pela geografia têm contribuído para apontar as constantes dificuldades econômicas, políticas e sociais vivenciadas pelas populações em diferentes espaços geográficos do mundo. As análises são realizadas com base no momento atual, porém não deixando de levar em consideração a formação econômica, geográfica e sócio-histórica dos países. Nesta aula, apresenta-se uma conceituação teórica básica da geografia, tendo como referencial teórico alguns de seus maiores expoentes. Depois, são apresentados os fundamentos econômicos tendo como base as escolas do pensamento econômico e as contribuições de seus principais economistas. O objetivo desta aula é conduzi-lo(a), por meio de uma linha histórica- geográfica, aos principais conflitos econômicos e sua relação com a geografia e a política. Os descobrimentos, o aperfeiçoamento das técnicas e o desenvolvimento das tecnologias vão implicar na ampliação da produção, na busca por novos espaços de fontes de matérias-primas e de mercados consumidores, intensificando a luta pela dominação de territórios que possam garantir maiores vantagens aos Estados e ao capital. TEMA 1 – BASE TEÓRICA DO CONHECIMENTO GEOGRÁFICO A geografia e a economia são fundamentadas em conhecimentos científicos que vêm desde a Antiguidade, evoluíram com o tempo e continuam seu processo de transformação com a introdução de novos conhecimentos adquiridos junto às novas realidades e conjunturas existentes. Ambas as ciências tornaram- 3 se mais específicas a partir do século XVIII, com a expansão colonial europeia e o desenvolvimento da industrialização. Ao lecionar geografia na Universidade Konigsberg, na Prússia Oriental, Immanuel Kant (1724-1824), filósofo prussiano, teve como seu seguidor mais entusiasta o geólogo e botânico Alexandre von Humboldt (1769-1859). Humboldt desenvolveu estudos sobre as paisagens e descreveu com precisão muitos espaços geográficos e ambientes naturais, antes desconhecidos pela academia científica e pelos povos da Europa. Karl Ritter (1770-1859), em sua Geografia comparada, propôs o estudo geográfico dos lugares, uma relação entre o indivíduo e sua localização geográfica. Friedrich Hatzel (1844-1904), influenciado pelas ideias darwinistas, propagou conceitos de que o ser humano era produto dos recursos proporcionados pelo ambiente natural e, quanto mais explorasse tais recursos, maior seria sua chance de progredir. Ao afirmar a relação entre espaço geográfico e poder, Ratzel proporcionou a base teórica utilizada para a legitimação da expansão do Império Alemão. As teorias desenvolvidas por Hatzel forneceram ao campo da geografia um leque de estudos sobre o ser humano e sua relação com o território. Desenvolvida no contexto de pós-guerra franco/prussiana e da Comuna de Paris, a escola francesa tem em Paul Vidal de La Blache (1845-1918) um dos maiores opositores às teorias desenvolvidas por Hatzel. La Blache, responsável por embasar teoricamente a geografia clássica francesa, desenvolveu o possibilismo, que entendia que a natureza não determinava o comportamento do ser humano e o ser humano não dominava a natureza. Contudo, a natureza oferecia ao ser humano os recursos necessários para transformá-la. Para esse autor, o ser humano ocupou diversos pontos da superfície terrestre e, onde esteve, adaptou-se utilizando habilidades e técnicas para explorar os recursos ambientais existentes. No desenvolvimento de seus estudos, La Blache promoveu a necessidade de levantar os recursos humanos, os recursos econômicos e os recursos naturais para exploração de cada região. Lacoste (2008) afirma que a geografia não serve apenas como disciplina escolar, sem pretensões políticas ou econômicas, em que simplesmente professores ensinam e alunos aprendem sobre as capitais dos países, regiões, relevos, clima e vegetação. A geografia é um forte instrumento científico e epistemologicamente ligado ao conhecimento, unindo práticas e estratégias de controle e de manutenção de poder. Ela é necessária a todos aqueles que mantêm 4 em seu controle o aparelho estatal, “pois a Geografia serve, em princípio, para fazer a guerra” (Lacoste, 2008, p. 22). TEMA 2 – FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA ECONOMIA A economia, como a maioria das ciências, tem sua base na Grécia Antiga, mas é a partir do século XVI, com as escolas mercantilistas e fisiocratas que suas grandes linhas são traçadas. A economia moderna tem suas raízes em Adam Smith (1723-1790), com a divisão do trabalho e o liberalismo econômico. Defendendo o laissez faire, laissez passer, esse economista escocês alcançou notoriedade ao publicar em 1776, A riqueza das nações: investigação sobre a sua natureza e suas causas. Na obra, o autor lança os alicerces do liberalismo econômico ao defender a não intervenção do Estado no mundo dos negócios, destacando a existência de uma mão invisível, conduzida por interesses individuais, que seria a responsável por levar a sociedade a colher os resultados de uma economia que promoveria o bem-estar de toda a coletividade. Outro grande nome da economia foi David Ricardo (1772-1823), que baseou a sua teoria na análise da produção, distribuição e tributação do produto. Esse autor, ao analisar os custos da produção agrícola, formulou teorias sobre os problemas econômicos, de como os resultados do processo produtivo são distribuídos de forma diferenciada entre as classes que compõem a sociedade, e afirmou que todos os custos se resumem aos custos do trabalho, dando sua contribuição para a teoria do valor do trabalho e da mercadoria. Ricardo também contribuiu para a economia internacional por meio de sua Lei dos Custos Comparativos ou Teoria das Vantagens Comparativas. No desenvolvimento dessa Lei, Ricardo buscou demonstrar que cada país deveria se especializar na produção dos bens que possuísse melhor dotação de fatores. Assim, o país importaria um produto, mesmo que pudesse produzi-lo, mas o preço de importação deveria ser inferior ao preço do produto fabricado internamente. A especialização favoreceria os países na troca de bens e serviços com outros países. No desenvolvimento de suas teorias, esse autor britânico deu as bases necessárias para que Karl Marx (1818-1883) formulasse a sua teoria crítica à economia capitalista. O economista e filósofo alemão Karl Marx desenvolveu a sua teoria fundamentado na crítica ao modo de produção capitalista e em especial aos economistas clássicos. Em 1844, publicou Manuscritos econômico-filosóficos, no 5 qual critica os socialistas utópicos por não perceberem o processo de alienação capitalista e também os economistas políticos da época, por defenderem o processo de exploração e acumulação capitalista. Para Marx, a ansiedade do lucro e da acumulação de capital levava o ser humano a viver em uma sociedade desumanizadapelo aumento da propriedade privada. Em resposta à teoria do valor do trabalho, de Ricardo, Marx escreve a Teoria da Mais-Valia. Se Ricardo entendia que era nos custos do trabalho que estava o valor da mercadoria, Marx afirma que a riqueza gerada pelo trabalho, valor da mercadoria, está sendo acumulada pelo capitalista individualmente e não pelos trabalhadores que a produziram. Em 1848, junto de seu amigo Friedrich Engels, escreveu o Manifesto Comunista, no qual realizaram uma análise da sociedade por meio do materialismo histórico e propuseram a união do proletariado para uma sociedade revolucionária igualitária, de transição, do socialismo para o comunismo. TEMA 3 – SISTEMAS ECONÔMICOS E SOCIAIS O espaço geográfico é o resultado da ação do ser humano sob determinada área da superfície terrestre, ao passo que o sistema econômico é a forma política, econômica e social de organização dos seres humanos para produzir os bens e serviços de que necessitam, assim como decidem a melhor maneira para distribuição e consumo desses bens e serviços, de modo a garantir que contemplem toda a sociedade. O capitalismo e o socialismo são as formas de organização em sistemas econômicos nos diferentes espaços geográficos da superfície terrestre. 3.1 Do capitalismo liberal ao capitalismo do bem-estar social O capitalismo, baseado no sistema de livre mercado, é conduzido de forma predominante pela iniciativa das forças de mercado e pelos interesses privados, em que há a propriedade dos meios de produção. Defendendo uma intervenção mínima do Estado na economia, o liberalismo de Adam Smith e seus seguidores formularam as bases de sustentação econômica desse sistema, quem tem no livre jogo da oferta e da procura a forma de regulação entre os preços das mercadorias e dos salários dos trabalhadores. Nesse sistema, os capitalistas, donos dos meios de produção, comércio e bancos, têm como principal objetivo o lucro, ao passo 6 que o trabalhador busca manter sua reprodução por meio dos ganhos salariais obtidos. No início do século XX, mais precisamente nas décadas de 1920 e 1930, o capitalismo passou por crises de produção e consumo, o que acabou levando o Estado a intervir diretamente na economia. A partir da década de 1930, surge um modelo de capitalismo em que prevalecem as forças de mercado, porém há forte presença do Estado nos setores que necessitam de regulação e de investimentos em infraestruturas. Existem setores da economia pelos quais os investidores privados não se interessam, principalmente por demandarem elevados níveis de recursos e muito tempo para se obter o retorno lucrativo. Jonh Maynard Keynes (1883-1946), em sua obra Teoria geral do emprego, do juro e da moeda (1936), questionou a autorregulação do mercado e sua mão invisível e criticou a crença dos liberais de que para toda produção haveria demanda. Keynes defendeu a intervenção estatal em uma economia em desequilíbrio, com políticas adequadas de investimentos para geração de emprego e renda e incentivos à iniciativa privada para promoção da demanda efetiva. É visível nas economias capitalistas, ainda que se queira defender o contrário, uma considerável atuação do Estado na economia. 3.2 Do socialismo da URSS ao socialismo chinês O sistema econômico socialista tem como característica a centralização das decisões por parte de um órgão central de planejamento estatal. Nesse sistema, existe uma predominância da propriedade coletiva dos meios de produção. Surgido com base no socialismo científico marxista, esse sistema econômico foi implantado primeiramente em 1917, com o surgimento da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Após a Segunda Guerra Mundial, com a divisão espacial da superfície terrestre em dois grandes blocos econômicos, um socialista e outro capitalista, países como China, Cuba e Coreia do Norte se tornaram socialistas. Com a queda do muro de Berlim (1989) e a desintegração da URSS (1992), muitos países socialistas se tornaram adeptos do chamado socialismo de mercado. Neste modelo de economia socialista, há uma abertura para que as grandes multinacionais e o capital privado internacional também possam atuar em países socialistas, mas com certo controle estatal, como vem ocorrendo atualmente na China. 7 TEMA 4 – O ESTADO E SUA ORGANIZAÇÃO ESPACIAL Os Estados se dão em torno de um território, onde vive determinada população que busca extrair dele todos os recursos para sua sobrevivência. Com base em normas, regras e leis, essa população vive sob um regime de governo. Os regimes de governo, de acordo com Mallmann, Balestrin e Silva (2017), podem ser divididos em monarquias, quando poder é exercido por um soberano por meio de cargo vitalício e hereditário, e repúblicas, quando o poder é exercido por um chefe de Estado eleito para esse fim por um período de tempo preestabelecido. Atualmente, poucos são os países no mundo regidos por monarquias. Existem diferentes maneiras de se escolher o chefe de Estado nas repúblicas. Em alguns países, a população escolhe democraticamente seus governantes com diversificações na participação política. Em outros, os governantes são impostos à população por meio de golpes de Estado, sem o direito de escolha, como ocorre nos regimes ditatoriais e totalitários. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), até o início da Primeira Guerra Mundial, existiam pouco mais de 50 países. Atualmente, são mais de 193 países separados por fronteiras territoriais. Há ainda alguns territórios em disputas e outros que não são reconhecidos pelos membros da organização. Figura 1 – Divisão territorial dos países Créditos: Frees/Shutterstock. 8 Essa configuração espacial foi se desenvolvendo historicamente não de forma harmoniosa, mas depois de muitos conflitos. Há mais de 4.000 anos, muitos povos já organizavam seus territórios por meio de um Estado, com hierarquia social, e espaços que se configuravam, apesar de suas complexidades, em verdadeiras cidades. Foi o desenvolvimento de espaços de cultivos e colheitas, realizados por determinados grupos de pessoas, que proporcionaram o abastecimento da urbanidade. É na cidade que diferentes ofícios puderam ser exercidos, como o de sacerdote, soldado, comerciante, legislador, construtor de templos e edifícios, entre tantos outros. Tudo isso favoreceu com que alguns pudessem planejar, adquirir conhecimentos e escrever. A evolução da escrita impulsionou o surgimento de novas civilizações, tornando mais fácil a comunicação e a divulgação de novas maneiras de fazer as coisas entre os povos. Dos conquistadores gregos aos romanos, dos chineses aos hindus, surgem novas formas de administração da vida em sociedade. Neste contexto, as cidades-Estado gregas serviram como base essencial de organização política, com a inserção de preceitos democráticos e de conceitos culturais, religiosos e filosóficos. A ampliação das rotas de comércio, com as facilidades geradas pelas inovações tecnológicas da navegação e dos transportes terrestres, favoreceu o deslocamento de grandes contingentes populacionais por diversos espaços da superfície terrestre, intercambiando costumes, formas de organização, de produção e de comercialização. Também favoreceu os desbravadores, conquistadores e colonizadores, que na maioria das vezes utilizando-se de suas estratégias e poderio militar, e de forma violenta, impuseram aos conquistados seus interesses e valores. Neste contexto de guerras e conquistas grandes impérios foram formados. Durante a Idade Média (500-1500 d.C.), após a desintegração do Império Romano, a fragmentação dos territórios em diversos reinados consolidou a possessão daqueles que se consideravam povos civilizados, e dos outros povos, que eram percebidos como bárbaros. Também os espaços foram divididos religiosamente sob apredominância do cristianismo e do islamismo. As disputas por territórios entre árabes, cristãos e turcos promoveram modificações substanciais nas cidades, dadas as dinâmicas de estruturação em sua organização, que se conformavam de acordo com alterações promovidas por esses povos no poder. Lefebvre (2013) afirma que as cidades surgiram muito 9 antes desse período, mas, na Idade Média, era a Terra o grande laboratório dos seres humanos. Foi só a partir da industrialização que a cidade passa a ter essa função. De acordo com Mallmann, Balestrin e Silva (2017), as grandes descobertas dos séculos XV, XVI e XVII foram fundamentais para todos os campos, não apenas o geográfico, o econômico, o cultural e o religioso, mas também para o desenvolvimento tecnológico, político e científico. Houve nesse período o surgimento do Estado moderno, que representou a divisão dos territórios em determinado espaço geográfico, unindo povo, território e governo. Para tais autores, o Renascimento deu sua contribuição para questionamentos acerca da prevalência do poder religioso sobre o laico, e abriu espaços para que as línguas dos diferentes povos pudessem fortalecer seus laços e impulsionassem o surgimento de novos Estados. No absolutismo, as decisões estavam centralizadas nas mãos de um soberano, que concentrava o poder e os desejos das camadas sociais, não tão díspares quanto as que surgirão com o capitalismo industrial, porém interessado em melhorar suas condições de vida. No entendimento de Hobsbawm (2002), o modelo de Estado vivenciado em algumas partes da Europa não existia na maior parte do mundo não desenvolvido. Muitos territórios eram colônias das grandes nações europeias e pouquíssimos podiam ser percebidos como Estado-nação. Na África e na Ásia, as unidades políticas existentes não poderiam ser vistas como um Estado, dada as suas organizações bastante distintas em relação às da Europa. Impérios muito antigos, como os da China, dos otomanos e da Pérsia, possuíam organizações sem paralelos aos modelos europeus do século XIX. Para o autor, Estados como os dos impérios czaristas (Rússia) e Habsburgo (Austro-Húngaro) eram Estados imperialistas obsoletos como modelos de Estados, mas, devido ao status que possuíam como forças imperiais, se faziam presentes no mundo “desenvolvido”. A queda da monarquia francesa e a ascensão da dinastia napoleônica na França colocaram esse país no caminho da industrialização ainda na primeira metade do século XX, mas foi na outra metade, com Napoleão III, que o país entrou na modernidade da industrialização burguesa. Na guerra contra a Prússia, a França perdeu parte de seu território (Alsácia e Lorena) e sua relação com o comércio internacional. A Guerra Franco-Prussiana unificou os povos de língua germânica e deu à Prússia, comandada por Otton Von Bismark (1815-1898), a possibilidade de criar um grande império alemão (1871-1818). O crescimento da 10 Alemanha, como nação próspera e industrial, gerou concorrência e a ameaça de um conflito eminente – o que acabou tornando-se uma realidade com a Primeira Grande Guerra Mundial. O conflito ocasionado pelas contradições do modo de produção capitalista envolveu disputas territoriais, crises de consumo e de produção, e divergências entre trabalhadores e classes capitalistas, que eram responsáveis pela produção e pelo comércio, mas viviam realidades opostas. De um lado, os que conviviam em ambientes de misérias, e de outro, os que conviviam em ambientes de fartura e privilégios. Tudo isso impactou um modelo de capitalismo liberal que não soube responder à intensificação do conflito que já se anunciava. De acordo com Aquino et al. (1997), esse modelo de capitalismo era concentrado na Europa, que mantinha o predomínio econômico e político sobre o restante do mundo. Apesar de Japão e Estados Unidos já terem se tornado importantes militar e comercialmente, ainda assim prevalecia a dominância dos países europeus. Para esses autores, a Europa de 1914 era organizada desigualmente, pois “dos 23 Estados europeus, 20 eram monarquias e só França, Suíça e Portugal eram repúblicas. Predominavam regimes políticos constitucionais, mas o parlamentarismo, forma típica do liberalismo político, limitava-se à Grã-Bretanha, Bélgica e França” (Aquino et al., 1997, p. 237). A corrida armamentista proporcionou uma Tríplice Aliança (Alemanha, Áustria-Hungria e Itália), e a Tríplice Entente (Inglaterra, França e Rússia) não suportou uma paz armada, dando início a uma intensa batalha por territórios em âmbito mundial. 1917, conforme Aquino et al. (1997), foi um ano decisivo para o final da Primeira Guerra, pois os Estados Unidos entraram no conflito ao lado da Tríplice Entente. A Rússia saiu do conflito após a queda da monarquia czarista e a chegada dos bolcheviques ao poder. Com o fim da guerra, em 1919, a geografia política e territorial mundial se alterou. 11 Figura 2 – Alteração na geografia política e territorial mundial Crédito: João Miguel A. Moreira. Entre 1918 e 1921, o processo de consolidação da URSS passou por problemas sociais, econômicos e políticos. Os soviéticos criaram o Exército Vermelho e a Polícia Política e também desfizeram as relações existentes entre Igreja e Estado. Estabeleceram o fim da grande propriedade fundiária, promoveram mudanças no modo de produção – no qual as fábricas passaram a ser controladas por comitês operários –, estatizaram bancos, estradas de ferros e diversas outras empresas. Na assinatura do tratado de paz com a Alemanha, em março de 1918, as concessões feitas pela Rússia fizeram com que ela perdesse boa parte de seu território e grandes riquezas minerais. Todas essas medidas proporcionaram reações imediatas da burguesia capitalista local e de seus aliados, que a todo custo tentaram derrubar do poder os bolcheviques. Contando com o apoio de tropas estrangeiras, antigos mandantes czaristas não obtiveram êxito contra as estratégias do bolchevismo e acabaram sendo derrotados e expulsos do país. O socialismo como sistema econômico prevaleceu na Rússia, com a consolidação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, em 1922. Após a Primeira Guerra Mundial, o liberalismo econômico, que havia superado o modelo imperialista de governar, recebeu um duro golpe com a grande crise provocada pelo pós-guerra e pela Revolução Russa de 1917, dando vez ao surgimento de novas formas de governo e de sistemas econômicos. As crises econômicas e políticas que afundaram o capitalismo a partir da década de 1920 impuseram aos Estados a necessidade de reorganizar e reestruturar suas 12 economias. A fuga do Imperador Guilherme II, quando a Alemanha já estava derrotada, acabou por deixar nas mãos de civis a assinatura do tratado de paz, em condições totalmente desfavoráveis ao país. A Alemanha, na assinatura do Tratado de Versalhes (França), em 29 de junho de 1919, foi severamente penalizada, tendo que devolver territórios e colônias antes conquistados, entre eles Alsácia e Lorena à França e indenizar os países vencedores do conflito. Além disso, a rica região de produção industrial de Sarre, geograficamente estratégica para a Alemanha, foi cedida à França, para exploração, por 15 anos. Figura 3 – Tratado de Versalhes Fonte: <http://net.lib.byu.edu/~rdh7/wwi/versa/vmap3.gif>. Acesso em: 4 jun 2019. A Alemanha do pós-guerra, já dentro de um novo modelo de Estado, que ficou conhecido como República de Weimar, em um primeiro momento foi mantida com certo isolamento, principalmente pela intransigência francesa, que queria o seu enfraquecimento. A necessidade de arcar com tais custos fez com que a Alemanha passasse por uma crise econômica sem precedentes, com uma das maiores inflações percebidas até hoje. Conforme Vasconcellos (2012), nessa hiperinflação, um dólar americano chegoua valer 4.000.000.000.000 de marcos alemães. O período foi marcado por inúmeras manifestações e levantes oposicionistas, além do surgimento de partidos que vão do comunismo ao de extrema direita, condenando, internamente, as imposições sofridas pela Alemanha por meio do tratado. Esse isolamento provocou a aproximação da 13 Alemanha ao socialismo da URSS, e os EUA, percebendo isso, acabaram por manter fortes relações econômicas com os alemães, não aceitando cumprir e nem assinar as restrições econômicas estabelecidas pelo Tratado de Versalhes. O fim da Primeira Guerra Mundial proporcionou o desmembramento de territórios e o surgimento de diversos países (Tchecoslováquia, Polônia, Hungria, Iugoslávia, entre outros), e mobilizou os Estados a se prepararem para o enfrentamento de conflitos internos e uma futura nova guerra de proporções geográficas ainda maiores. A partir da década de 1920, as dificuldades de reestruturação foram muitas, e países como França e Inglaterra, antes potências econômicas, passavam por dificuldades para financiar a reconstrução de seus territórios. Enquanto isso, Itália e Alemanha viam crescer em seus domínios discursos de descontentamentos com as formas de governo, criando espaços para o aparecimento de partidos políticos de tendências nacionalistas e fascistas. Foi nesse contexto que surgiu o Partido Nazista, na Alemanha. Enquanto os países europeus buscavam se recuperar das ruínas ocasionadas pela máquina de destruição de seus inimigos, os Estados Unidos viam sua indústria crescer com o fornecimento de material bélico e para a reconstrução e recuperação desses países. No final da década, o mundo passou a enfrentar uma grande crise econômica. Primeiro, a evolução nos métodos e nas técnicas produtivas, em seguida, a concentração de poucas e grandes indústrias com alto padrão de desenvolvimento tecnológico e grande capacidade produção, dando origem aos cartéis e trustes. Essa concentração foi predatória para as pequenas e médias indústrias e também para milhões de empregos. Isso afetou os negócios e ocasionou um dos maiores problemas para o mundo capitalista, a quebra da Bolsa de Valores de Nova York. Como consequência, surgiu uma nova composição geográfica e nova natureza do comércio internacional. TEMA 5 – A NOVA COMPOSIÇÃO GEOGRÁFICA E A NATUREZA DO COMÉRCIO INTERNACIONAL O fechamento das vagas no mercado de trabalho, em decorrência da falência de inúmeras empresas, ocasionou queda no consumo e desaquecimento na economia. O liberalismo de mercado, pregado por Adam Smith e seus seguidores, entre eles o presidente norte-americano Herbert Hoover, fizeram crer que a ampliação do volume de estoque e o aumento da produção gerariam novas demandas, aumentando o fluxo de renda da economia. Essa crença na condução 14 natural do mercado, inclusive do mercado internacional, e as facilidades para aquisição de ações no mercado financeiro levaram a economia americana a uma grande euforia, elevando o valor e a quantidade de ações ofertadas na Bolsa de Valores de Nova York. Porém, em 24 de outubro de 1929, a bolsa quebrou, e junto dela a economia norte-americana, impactando todas as economias mundiais. Os EUA, a partir da introdução de novas formas de produção, tecnologia e um grande contingente de imigrantes, com inversões de muitos recursos financeiros, se tornaram a grande potência econômica entre o final do século XIX e início do século XX. O desenvolvimento da agricultura, com a introdução de técnicas de plantio e aumento das áreas plantadas, e os investimentos estatais em estradas e ferrovias, com meios de transportes para escoar a produção ligando as diversas regiões às grandes cidades do país, possibilitaram o desenvolvimento urbano e industrial, além de tornar o país um dos maiores produtores agrícolas do mundo e impulsionar suas exportações. Conforme Souza (2005, p. 39) “Entre 1910/1920, as exportações norte-americanas cresceram 372% e as importações 239%. Durante os anos de 1920, a economia norte-americana cresceu 54%, contra 25% na década anterior”. Poucos meses antes da crise de 1929, a economia americana parecia estar no certo do liberalismo econômico, conforme previa a Lei de Say, para toda oferta haveria demanda. O presidente norte-americano Herbert Hoover entendia que o Estado não deveria se preocupar com o mercado, responsável por sua própria autorregulação. As ações na Bolsa de Valores disparavam em função das facilidades encontradas para o seu financiamento e de sua popularização. O crescimento da produção também gerava expectativa sobre as possibilidades de lucros que essas empresas aufeririam no futuro, gerando grande especulação sobre o valor de suas ações. Quase tudo levava à crença de que os ganhos seriam fáceis e de que prosperidade não teria fim. A corrida para a prosperidade gerava um grau de confiança em boa parte dos americanos, que apostavam com veemência nos “loucos anos vinte” (roaring twenties). Em 23 de outubro de 1929, teve início o período que ficou conhecido como o “Crash de Wall Street”, quando as ações da General Motors (GM) foram colocadas à venda com quedas em seus valores em relação aos preços ofertados em dias anteriores. Daí para frente, o sonho americano de enriquecimento e prosperidade tornou-se um pesadelo. Na Quinta-Feira Negra, nome pelo qual ficou conhecido o dia 24 de outubro de 1929, milhões de ações foram colocadas 15 à venda com sérias consequências não só para os investidores mas para toda a economia americana. A recessão atingiu globalmente a economia, arrastando os diversos países interdependes do sistema capitalista, e o mundo conheceu uma crise que envolveu o setor agrícola, industrial e comercial, resultando na grande depressão do século XX. Saiba mais Veja o filme Os loucos anos 20, sobre a crise de 1929: <https://www.youtube.com/watch?v=kKvmKVstkXc>. Para a proteger suas economias da grande depressão, muitos países se fecharam em Estados autoritários e totalitários. Os EUA, em 1932, elegeram um democrata em substituição aos políticos liberais anteriores que acreditavam fortemente nas leis de mercado como aquelas que colocariam a economia de volta ao caminho do crescimento e da prosperidade. A crise havia se tornado um grande problema político para os governantes. A população acreditava que a saída poderia vir do próprio Estado, e políticos como Franklin Dellano Roosevelt (EUA), Getúlio Vargas (Brasil), Benito Mussolini (Itália), Francisco Franco (Espanha), Antônio Salazar (Portugal) e Adolf Hitler (Alemanha) também. Cada um ao seu modo buscou enfrentar a crise do capitalismo. Nos EUA, Franklin Dellano Roosevelt assumiu o governo em substituição ao seu compatriota republicano Hebert Hoover, e conclamou as empresas e os trabalhadores para um novo acordo (New Deal). O New Deal passou a representar a solução para o futuro da economia americana. Por meio de uma política baseada em programas sociais e econômicos, Roosevelt implementou medidas para combater o desemprego, distribuir renda, sobretaxar as grandes fortunas e facilitar o consumo ao ampliar o crédito e controlar a taxa de juros. Com o New Deal, o Estado passou a coordenar as ações da economia americana, com fortes inversões públicas em bancos e na iniciativa privada para garantir a produção e o consumo. Os gastos públicos e os investimentos em grandes projetos estatais deram aos programas de Roosevelt forte aceitação popular e conotação de bem- estar social, o que o levou a ser o único presidente eleito nos EUA por quatro mandatos consecutivos. No Brasil, Getúlio Vargas assumiu o governo do país em 1930 e implantou uma ditadura até 1945. Entre suas ações governamentais estão a criação de políticas votadas à normatização do trabalho e do controle estatal da economia. 16 Durante o período da grande depressão, ogoverno brasileiro adquiriu milhões de toneladas de café dos grandes produtores nacionais e mandou queimá-las para manter o preço do produto no mercado internacional. Teve como principais parceiros econômicos durante a década de 1930 os governos da Itália e da Alemanha, chegando a deixar dúvidas sobre de que lado o Brasil se posicionaria durante o confronto da Segunda Guerra Mundial. Uma forte pressão americana, com promessas de apoio ao projeto de industrialização e de transferências de tecnologias em diversos setores, inclusive de apoio militar, fez com que Getúlio se posicionasse ao lados dos aliados na guerra. Houve mudança significativa no comércio internacional a partir da década de 1930, e a maioria dos países passou a buscar uma reestruturação política e econômica. De modelo hegemônico internacional, a Europa perdeu espaços para as economias americana e japonesa, e afundou-se em problemas econômicos e sociais, com disputas internas entre as diversas tendências políticas que buscavam propor formas de reconstrução dos países, sejam por vias do socialismo, do liberalismo ou do conservadorismo. Assim, grupos radicais conservadores, que combatiam as ideias liberais e o socialismo, por medo de aproximação com os soviéticos, chegaram ao poder em alguns países. Esses grupos conservadores pregavam a instalação de modelos de economia e política de agressividade centralizadora, confiscadora e de controle ditatorial. Os modelos, defendidos por grupos de extrema direita, passaram a exacerbar o nacionalismo, a pregar o racismo, o antiliberalismo, a intolerância aos socialistas e comunistas e também aos grandes grupos econômicos e empresas monopolistas internacionais. Foi assim que o fascismo se firmou como modelo político e econômico na Itália e o nazismo se configurou na Alemanha. Na Itália, com a Marcha sobre Roma, realizada em 1922, o fascismo chegou ao poder com Benito Mussolini. Os fascistas culpavam os comunistas, socialistas e liberais pela crise econômica e social vivenciada pela Itália e, também, por não darem a ela o merecido retorno pelo envolvimento na Primeira Guerra Mundial. Com propostas de enfrentamento da crise por meio de decisões políticas ditatoriais, Mussolini se tornou o “Duce”, inclusive com a permissão dos membros da Coroa Espanhola para governar por decretos. O Partido Fascista punia com rigor seus adversários políticos e mantinha sob ameaças o restante da população que pudesse se revoltar. Promulgou leis que mudaram as relações de trabalho no país e não mediu esforços para exportar o fascismo a outras nações. 17 O Tratado de Versalhes impôs ao povo alemão condições difíceis de serem aceitas, o que ocasionou, além dos problemas econômicos, o surgimento de muitos grupos internos que divergiam do acordo assinado pelos liberais e da República de Weimar, e pretendiam derrubá-los do poder. Entre esses grupos estavam os representantes do Partido Nacional-Socialista, inimigo declarado dos marxistas, judeus e estrangeiros. Os liberais não resistiram à crise econômica e, aos percalços da grande depressão de 1929, os conflitos internos se intensificaram. Em 1932, o Partido Nazista chegou ao poder, e, a partir daí, a política econômica e externa da Alemanha mudou. O governo passou a realizar obras públicas e a investir pesadamente no setor industrial, principalmente no fortalecimento do poderio bélico do país, fortalecendo o capitalismo nacional. 18 REFERÊNCIAS AQUINO, R. S. L. de. et al. História das sociedades: das sociedades modernas às sociedades atuais. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1997. CARLOS, A. F. A. O espaço urbano: novos escritos sobre a cidade. São Paulo: Labur, 2007. CASTRO, I. E. de. Geografia e política: território, escalas de ação e instituições. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005. CORRÊA, R. L. Região e organização espacial. São Paulo: Ática, 2000. FRANCO JUNIOR, H.; CHACON, P. P. História econômica geral. São Paulo: Atlas, 1991. GARBOSSA, R. A.; SILVA, R. dos S. O processo de produção do espaço: impactos e desafios de uma urbanização. Curitiba: InterSaberes, 2016. HOBSBAWM, E. J. A era das revoluções. São Paulo: Paz e Terra, 2012. HOBSBAWM, E. J. A era dos impérios: 1875-1914. São Paulo: Paz e Terra, 2002. LACOSTE, Y. A geografia, isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. 14. ed. Campinas: Papirus, 2008. LEFEBVRE, H. O direito à cidade. São Paulo: Centauro, 2013. MALLMANN, L.; BALESTRIN, N. L.; SILVA, R. dos S. Estado e políticas sociais no Brasil: avanços e retrocessos. Curitiba: InterSaberes, 2017. SOUZA, N. de J. de. Desenvolvimento econômico. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. VASCONCELLOS, M. A. S. de. Introdução à macroeconomia. In: PINHO, D. B.; TONETO JUNIOR, R.; VASCONCELLOS, M. A. S. Manual de economia. São Paulo: Saraiva, 2012. AULA 2 ESPAÇO GEOGRÁFICO, ECONOMIA E COMÉRCIO INTERNACIONAL Prof. Rodolfo dos Santos Silva 2 INTRODUÇÃO Tendo em vista que a maior parte da população mundial vive nas cidades, as grandes metrópoles despontam como fonte de atrativos para boa parte da população que vive longe delas. A cada dia que passa são mais e mais pessoas que deixam o campo para buscar nas cidades por melhores condições de viver e morar. As transformações econômicas, políticas e sociais contribuem para alterar o papel a ser desempenhado pelas metrópoles. Assim como as alterações históricas nas estruturas de poder modificaram os papéis dos agentes econômicos, dos agentes políticos, das instituições e das grandes corporações, as inovações tecnológicas em todos os campos, especialmente no campo da informação e da comunicação, tornam possível afirmar que essas inovações são diferentes de todas as outras assim como também o é a sua capacidade de influenciar e de transformar. Atualmente, em todos os continentes, existem os grandes centros de aglomeração urbana, que se apresentam como verdadeiras metrópoles, constituídas historicamente no espaço geográfico e influenciadas diretamente pelo contexto da globalização. Este texto discute a importância da globalização na composição da geopolítica do pós-Segunda Guerra Mundial e como isso afetou a formação da economia e da política internacional. Na sequência, são apresentadas algumas reflexões sobre as teorias utilizadas, como base de sustentação do modelo de desenvolvimento capitalista, dentre elas a teoria keynesiana e também sobre a ascensão das grandes corporações internacionais. O terceiro e o quarto temas trazem como reflexão a globalização sob a roupagem do neoliberalismo e a forma como os agentes e os setores da sociedade são influenciados por essa nova roupagem. O quinto e último tema destaca as transformações morfológicas ocorridas nas metrópoles após a sua inserção em contexto de globalização e os novos conteúdos de internacionalização. TEMA 1 – A GLOBALIZAÇÃO E A ECONOMIA DO PÓS-GUERRA O processo de globalização e internacionalização da economia é um tema constante em todas as disciplinas acadêmicas, mas na pós-graduação surge como uma necessidade para entender a atual conjuntura econômica e política e a forma como geograficamente estão se estruturando os Estados e suas economias diante das turbulências constantes dos processos mercadológicos e 3 suas tecnologias. Além disso, as alternâncias de poder e de modelos econômicos e políticos em diferentes países tornam mais difícil uma continuidade e homogeneidade das políticas de produção, consumo e de comércio exterior implementadas. No entendimento de Harvey (2005), a globalização surge com o processo de expansão das diversas empresas dos países industrializados, por meio da destinação de suas plantas industriais para os países do Terceiro Mundo, onde estariam mais próximas de um possível mercado consumidor e de grande disponibilidade de matérias-primas. Damesma maneira, pode se destacar que isso ocorreu, principalmente após a Segunda Guerra Mundial, quando muitos Estados passaram a depender da contribuição das instituições criadas em Bretton Woods, dos outros países e de suas corporações. É possível afirmar também que, após o conflito, as disputas ideológicas e por territórios abriram espaços para que muitos fatores culturais, políticos, econômicos e sociais pudessem se sobrepor aos locais. A estruturação da economia capitalista do pós-Segunda Guerra Mundial se iniciou antes mesmo do fim do conflito, com a realização da Conferência Internacional de Bretton Woods, realizada no condado de mesmo nome, situado no Estado de New Hampshire, nos EUA, em 1944. Lá ficou estabelecida a hegemonia americana sobre as grandes nações capitalistas, tendo a moeda daquele país sido elevada à moeda de padrão internacional em substituição à libra inglesa. Também foram criadas instituições para fins de reconstrução dos países destruídos pela Guerra e de manutenção e ampliação dos objetivos da geopolítica do capitalismo, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Com o acirramento das contradições entre os EUA e a URSS após 1945, ano do término da Segunda Guerra Mundial, as estratégias montadas por ambos para a expansão de seus interesses sobre os demais países geraram um novo conflito geopolítico que ficou conhecido como Guerra-Fria. Essa guerra, além de provocar uma corrida armamentista e ideológica, também provocou, forçosamente ou não, a aliança de muitos países aos sistemas econômicos propostos tanto por EUA quanto pela URSS: o capitalismo e o socialismo. O avanço do socialismo implicou uma redução da presença dos países capitalistas, principalmente com o processo de independência e descolonização levado a cabo por socialistas em países da Ásia e da África, que antes estavam sob domínio das grandes nações capitalistas. 4 Saiba mais A Guerra Fria tem esse nome por não haver uma declaração formal de guerra entre as grandes nações em disputas pela hegemonia geopolítica- econômica internacional. De um lado, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e China, buscando ampliar a abrangência do socialismo para diferentes territórios e países do globo terrestre e, de outro, Estados Unidos, Inglaterra e França, buscando manter e ampliar a presença do capitalismo. O acirramento desse conflito se dá com a declaração do Presidente da República dos EUA, Harry Truman, no Congresso Americano em 1947, de que o país não permitiria o avanço do socialismo e utilizaria de todas as suas forças para combater o comunismo. Para reforçar a Doutrina Truman, o Secretário de Estado norte-americano Jorge Marshall, apresentou, no mesmo ano, um plano de reconstrução dos países europeus destruídos pela guerra. Esse plano ficou conhecido como Plano Marshall e foi o responsável por oferecer desde subsídios e técnicos agrícolas até o financiamento de grandes infraestruturas viárias, ferroviárias e aeroviárias, alinhando os países aos objetivos do capitalismo americano. Em 1955, a URSS, juntamente com os países do Leste Europeu, anunciou o Pacto de Varsóvia, propondo um programa de autoajuda entre os países já declarados socialistas. O Pacto contribuiu para uma relação econômica, política e social mais estreita entre os países do leste europeu e a URSS, que usou o pacto para justificar a sua atuação militar nos demais países do Pacto. As políticas implementadas a partir da década de 1950 levaram o mundo a uma preocupação constante com a possibilidade de um novo grande conflito belicoso internacional. Dessa forma, as grandes potências econômicas e políticas foram forçadas a uma coexistência pacífica. Cada uma a seu modo passou a elevar seus níveis de produção e consumo de seus territórios, visando apresentá- los como o melhor sistema econômico a ser seguido, e ao mesmo tempo ampliar o número de países de cada sistema. A manutenção de um sistema econômico capitalista que poderia fazer frente ao discurso de socialização dos resultados dos bens e serviços produzidos pela sociedade, com avanços significativos na qualidade de vida dos trabalhadores, tem respostas, do lado capitalista, nas propostas implementadas por Franklin Dellano Roosevelt nos EUA (1933) e por William Henry Beveridge na 5 Inglaterra (1942), cujos planos visavam o bem-estar social de todos os membros da sociedade e tiveram suas práticas embasadas na teoria keynesiana. John Maynard Keynes escreve em seu livro Teoria geral do emprego, do juro e da moeda, publicado em 1936, uma crítica ao modelo econômico baseado na teoria do laissez faire, responsabilizando os defensores do liberalismo pela grande crise econômica do sistema capitalista vivenciada em 1929 e que se estendeu até o início da Segunda Guerra Mundial (Keynes, 1996). A maior crítica desse autor britânico aos liberais era em relação à defesa que esses economistas faziam sobre a existência de uma autorregulação na economia. Segundo Keynes, isso levaria a economia à perfeição sem a interferência do Estado. Para Keynes, esse princípio percebia a existência do desemprego como voluntário e defendia a crença na regulação do mercado pelo próprio mercado. Com base em sua teoria da demanda efetiva, esse autor defendeu que o Estado é um indutor de investimentos que contribui para a elevação do volume de emprego em uma economia capitalista e que esse volume de emprego depende também da proporção da renda que é gasta na produção e no consumo (Keynes, 1996). TEMA 2 – DA TEORIA KEYNESIANA À HEGEMONIA DAS GRANDES CORPORAÇÕES Na mesma linha de Keynes, segue Rosenstein-Rodan (1902-1985), cuja teoria defende que os países mais pobres podem alcançar níveis de desenvolvimento se houver investimentos para isso. Esses investimentos devem ser realizados de forma programada e planejada em infraestrutura (rodovias, ferrovias e portos) e também no setor produtivo, em setores de grande interesse para o Estado, tudo ao mesmo tempo, pois há um forte grau de correlação entre eles. Tais investimentos, são investimentos de grande porte, que só o Estado possui condições de fazê-los. Os Estados mais pobres, segundo esse autor, necessitam de ajuda dos países mais ricos para alcançarem níveis de equilíbrio entre a oferta e a demanda, que poderiam melhorar as condições de vida de suas populações e seguirem o caminho do desenvolvimento econômico. As investidas dos EUA, das grandes empresas capitalistas e das instituições de Bretton Woods sobre os países pobres e aqueles em processo de reconstrução vão contribuir para o processo de internacionalização da economia. Com financiamentos e deslocamentos de plantas industriais das grandes empresas para esses países, assevera-se a presença de empresas 6 transnacionais e sua dependência de fornecedores de diferentes países, assim como se expande o nível e importação e exportação e as relações entre as matrizes, onde estão localizadas essas empresas, e suas filiais, em diferentes países. Nesse contexto, o papel desempenhado por essas instituições e a forte presença delas junto aos Estados locais vão criar ciclos de altos e baixos em diferentes escalas, até o ponto em que esse modelo de desenvolvimento entre em crise. A globalização é um fenômeno que possui diferentes interpretações. Geógrafos como Massey (2009) e Souza (2005) a percebem como uma forma ideológica de expressar o espaço como sujeito ao tempo, sem levar em conta as diferenças espaciais existentes, como se tudo estivesse sendo submetido ao tempo, reduzindo a importância do espaço ao fim da fila na história e valorizando ideologicamente o tempo. O que significa que as nações que não acompanharam o desenvolvimento no tempo dos Estados hegemônicos capitalistas são consideradas atrasadas. Para estabelecer esse “conceito”, os ideólogoshegemônicos levam em consideração apenas o tempo para afirmar que as nações se desenvolveram, não considerando a história dos povos e seu interesse ou não pelo capitalismo, como os aborígenes da Ásia, da África ou da Amazônia que sobrevivem com aquilo que as florestas lhes proporcionam, sem a preocupação com os interesses do capital. Para tais autores, não há uma unicidade em relação ao que os mundo desenvolvido e mundo atrasado representam. O que se pergunta é: atrasado para quem? Desenvolvido para quem? Adam Smith (1988) e David Ricardo (1996) criticaram os defensores do mercantilismo e do protecionismo estatal que valorizavam a expansão das atividades do Estado para o exterior, porém impunham barreiras às atividades de importações. Para esses economistas, a relação entre os países era essencial para a promoção da produção desses países e sua especialização em determinados seguimentos. Ambos entendiam que a integração entre os países e seus mercados seriam inevitáveis (Smith, 1988; Ricardo, 1996). Atualmente é possível perceber que o avanço das tecnologias promove, consciente ou acidentalmente, a entrada dos países no contexto da globalização. Sob o ponto de vista do capitalismo, a globalização promove a unificação de muitos mercados em um único mercado. Muitas vezes, os produtos, serviços e preços podem se tornar semelhantes conforme o nível de integração entre os países e seus mercados. Não é à toa que os aeroportos internacionalizados possuem o mesmo 7 cheiro, tipos de produtos e serviços que se assemelham tanto em Nova York, Tokyo ou em qualquer outro aeroporto de uma grande metrópole no mundo. Os avanços tecnológicos na produção, transportes e comunicação e também de gestão ocorridos nas últimas décadas do século XIX provocaram uma forte integração entre produtores e mercados de diferentes países, a qual foi analisada pelos economistas neoclássicos como um processo de internacionalização da economia. Essa internacionalização levou a um processo de intensificação dos produtos e atividades econômicas de outros países, influenciando as economias locais. Para superar a crise de 1929, os Estados passaram a intervir severamente nas economias, tomando medidas drásticas para incentivar a produção e o consumo locais. Até mesmo a economia americana impôs barreiras protecionistas aos produtos estrangeiros, o que acabou provocando reações de outros países, que também impuseram barreiras aos produtos norte-americanos, impactando negativamente sobre o processo de integração dos mercados na década de 1930. Para que um país esteja inserido em um processo de globalização total, ele necessita estar em harmonia com as leis e as regras comerciais estabelecidas internacionalmente. Isso influencia na relação entre os preços, a qualidade e a quantidade dos produtos e serviços ofertados. Para Mankiw (2005), a redução de barreiras alfandegárias e tarifas ou dos transportes representa queda nos custos dessa integração, abrindo a possibilidade de que mais países possam ter seus mercados inseridos nesse processo. Para esse autor, essa integração comercial já existe há séculos e é necessária à satisfação de novas demandas proporcionadas por acréscimos na renda de parcela importante das populações dos países, mas há ressalvas, pois essa globalização integra e promove um determinado modelo de desenvolvimento e da mesma forma que integra e abre mercados, também é o responsável por desestimular e fechar outros. Para Santos (2015), esse modelo de desenvolvimento implementado pelas instituições de Bretton Woods sofreu esgotamento, dadas as contradições internas do capitalismo. Como forma de superação, as nações imperialistas do capitalismo apresentaram um modelo de expansão e internalização de suas ações, aproximando-se de um modelo que é perverso e que busca resolver as permanentes crises do capitalismo, que é estrutural, com ações que não possuem objetivos de resolver problemas estruturais, aprofundando ainda mais essa crise. Com a valorização do domínio das técnicas, de suas tecnologias e da informação, 8 criam um modelo que busca acobertar, sempre por meio de um discurso ideológico, os interesses das nações hegemônicas e de suas corporações, um pensamento único sobre todo o planeta que ressalta a tirania do dinheiro e da informação. TEMA 3 – GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO – UMA NOVA ROUPAGEM DO CAPITALISMO Essa crise estrutural se tornou mais evidente a partir da década de 1970 com os aspectos de preocupações ambientais levantadas pelo Clube de Roma e pela Conferência Internacional sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo em 1972. As teses defendidas de que os recursos naturais não são inesgotáveis e as crises do petróleo de 1973 e 1979 colocam em xeque toda “política de estado de bem-estar social” implementada pelos países capitalistas. Essas crises tornam mais difícil a vida nos países mais pobres, dependentes da importação de combustíveis fósseis e seus derivados. Para Mallmann, Balestrin e Silva (2016), a economia capitalista tomou outro rumo depois desses acontecimentos. O discurso ideológico das grandes corporações capitalistas e seus atores voltaram suas críticas aos sistemas de proteções sociais como os responsáveis pelo empobrecimento dos Estados. As crises do petróleo mobilizaram as instituições financeiras e o capital corporativo em uma campanha de desregulamentação e redução da presença do Estado na economia. Os argumentos se voltaram para a culpabilização do Estado pelos seus gastos para manter as políticas de “bem-estar social” e, para custear tudo isso, houve a necessidade de maior arrecadação e cobranças de impostos, sobrecarregando os que ganhavam mais e o setor produtivo. Além disso, também se posicionavam contrários a todo um conjunto de leis que regulamentavam o trabalho, a produção, o comércio, o setor financeiro e até mesmo as exportações e importações, aumentando os custos da classe capitalista. As iniciativas voltadas a colocar um fim nas políticas de bem-estar social nos EUA tiveram seu início na década de 1970, ainda no governo de Jimmy Carter, porém é com Ronald Reagan que foram adotadas medidas mais contundentes para desregulamentar e desonerar a classe capitalista americana. Os trabalhadores perderam muitos dos direitos alcançados durante todo período do pós-Segunda Guerra. O setor financeiro passou a ter maior presença na economia e na política norte-americana. O Estado reduziu os impostos para os 9 mais ricos e para as grandes corporações capitalistas, o que afetou sua política de arrecadação e de investimentos nos setores essenciais aos trabalhadores e à população mais pobre do país. A consequência de tudo isso foi o aumento do desemprego e da desigualdade ente os mais ricos e os mais pobres. Na Inglaterra, Margaret Thatcher ficou conhecida como a Dama de Ferro por tomar medidas que colocaram fim à estabilidade de emprego dos trabalhadores e às garantias sociais alcançadas durante a política de bem-estar social. Os operários britânicos reagiram com greves que duraram meses, mas a Dama de Ferro não cedeu. As manifestações dos trabalhadores e sindicatos na Inglaterra foi acobertada pela Guerra das Malvinas, que foi utilizada pelo Estado para desviar as atenções dos graves problemas sociais pelos quais passava. Margaret Thatcher agiu com rigor e venceu as duas batalhas, a que travou com os argentinos pelas Ilhas Malvinas ou Falkland e a que travou contra os trabalhadores e seus sindicatos. A vitória nas Guerra das Malvinas (1982) reconduziu o Partido Conservador e Margaret Thatcher ao poder. No Brasil, as crises do petróleo de 1973 e 1979 colocaram um fim aos anos de crescimento acelerado, denominado de Milagre Econômico pela Ditadura Militar. Os anos do “milagre” deram lugar a um arrocho salarial e manipulação dos dados econômicos, dentreos quais os que mais sofreram foram os trabalhadores assalariados. Baseados na “teoria do bolo”, o regime militar quis fazer crer que o bolo cresceria, com investimentos estatais e arrocho salarial, a economia melhoria e toda a sociedade teria o seu pedaço do desenvolvimento. O país cresceu, às custas de um financiamento de empréstimos externos, os setores mais escolarizados e a classe média alta e os mais ricos receberam a sua parte, porém os trabalhadores assalariados e os mais pobres não fizeram parte da distribuição do bolo. Assim, os trabalhadores de países como Argentina, Bolívia, Venezuela, Colômbia e México também passaram por um crescimento de determinados setores da economia, porém viram crescer o desemprego e a desigualdade social. Em 1979, liderados pelo governo americano, que elevou as taxas de juros para cobrir as perdas com a segunda crise do petróleo, as instituições financeiras internacionais seguiram na mesma linha. Isso apertou ainda mais as condições já desesperadoras dos países endividados. O México puxou a fila, declarando a moratória e suspendendo o pagamento de suas dívidas com os credores internacionais, em 1982. Com medo de não receberem seus recursos investidos 10 nos países latino-americanos, muitas agências financiadoras acabaram reduzindo ou cessando seus empréstimos ou refinanciamentos a esses países. O enfrentamento da crise acirra ainda mais os problemas enfrentados pelos países, piorando seus índices sociais e econômicos, colocando em dúvida também a credibilidade de seus políticos. A década de 1980 ficou conhecida como “a década perdida”, uma página a ser virada na história econômica dos países endividados latino-americanos. Foi um período no qual a ampliação do déficit público e do balanço de pagamentos, os altos índices inflacionários, o desemprego elevado e o aumento da pobreza e da desigualdade social deixaram marcas profundas na economia. As crises econômicas das décadas anteriores à década de 1990 colocaram em descrédito todo o sistema financeiro e as políticas econômicas de curto prazo que prometiam melhorar as condições de vida das populações dos países com base em um processo de globalização que apresentava como condição única a redução da participação do Estado na economia. As receitas apresentadas como solução aos países não deram conta de resolver a grave crise enfrentada. Com a queda do Muro de Berlim em 1989 e a desintegração da URSS, em 1992, o sistema capitalista se apresentou ao mundo como sistema hegemônico resultante da Guerra Fria. Assim, o modelo de globalização passou a ser implementado com um novo discurso, mas com a mesma roupagem, denominada de neoliberalismo. TEMA 4 – GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO – A PORTA DE ENTRADA DO GLOBAL PARA O LOCAL Para Garbossa e Silva (2016), essa nova roupagem da globalização passa a utilizar com mais veemência o discurso neoliberal, atrelado às teorias econômicas formalizadas pelos economistas Friedrich von Hayek (1899) e Milton Friedman (1912-2006), que apresentavam como proposta uma supressão da participação do Estado na economia, abrindo espaços para o domínio das grandes corporações industriais e financeiras internacionais. Ao mesmo tempo, abriu-se o caminho para a propagação de muitas inovações tecnológicas em diversas áreas, que implicaram diversificação dos setores de informações e telecomunicações, produção, transportes e gestão. Conforme os mesmos autores, esses ensinamentos passaram a ser seguidos por lideranças políticas das grandes potências internacionais a partir da segunda metade dos anos de 11 1970, primeiro na Inglaterra com Margaret Thatcher, depois Ronald Reagan nos Estados Unidos e também por Helmut Kohl na Alemanha (Garbossa; Silva, 2016). Essa globalização, acompanhada de novos conteúdos e discursos, mantém seus interesses sobre os diferentes territórios. Para Harvey (2005), esse modelo de globalização afeta de forma significativa o local, pois as empresas que monopolizavam os setores das economias locais passam a ter a concorrência das grandes corporações monopolistas internacionais. Para esse autor, o capitalismo não pode prescindir dos monopólios e do poder que eles exercem sobre o Estado e sobre a economia local (Harvey, 2005). Para que o capitalismo tenha continuidade e possa continuar se expandindo, há a necessidade de se buscarem formas de reunir os poderes monopolistas locais em associação com os poderes monopolistas externos, reduzindo ou eliminando toda espécie de legislação ou influência de espaço ou localização que possam limitar as ações das corporações internacionais, sendo para isso necessário inclusive derrubar as tradicionais barreiras da política do território nacional. O neoliberalismo acompanha esse discurso de globalização, que impõe a submissão do Estado aos interesses das corporações e das nações hegemônicas internacionais. Nesse sentido, Santos (2015) enfatiza que, para se tornarem hegemônicas, as nações e suas corporações se utilizam de uma série de instrumentos de pressão sobre os Estados com o intuito de promover toda espécie de desregulação que possa influenciar as opções do mercado global em detrimento do mercado local. A porta de entrada é a abertura do mercado financeiro para o capital estrangeiro, pois entende-se que o controle das finanças é essencial para tornar os demais setores da economia hegemonizados. O autor considera possível não se conseguir atingir todos os setores, pois alguns deles resistem à subordinação do capital e mantêm-se autônomos, com capacidade própria de reprodução. Tal condição é extremamente precária, pois existem dificuldades dos Estados em suportarem as pressões dos atores hegemônicos e assim também os negócios locais de resistirem à concorrência desses atores. Sendo assim, “o papel avassalador do sistema financeiro e a permissividade do comportamento dos agentes hegemônicos, que agem sem contrapartida, levando ao aprofundamento da situação, isto é, da crise” (Santos, 2015, p. 35). Harvey (2005) entende que essa hegemonização globalizante se dá em diferentes setores que podem ser oligopolizados com a estruturação de megaempresas que se aliam para dominar toda a oferta de determinado bem ou 12 serviço, como nos casos das montadoras de automóveis, do setor aéreo, do setor elétrico ou ainda do setor farmacêutico. Dessa forma, essas megaempresas capitalistas buscam garantir, por meio de sua condição de empresas transnacionais, que seus “direitos de propriedade intelectual” sejam garantidos pelos Estados, visando reprimir quem ousar burlar a legislação que lhes favoreça. Nessa condição, os Estados passam a subverter os interesses locais para atender aos interesses hegemônicos globais, com consequências diretas para a economia interna, principalmente sobre o setor produtivo industrial com auto grau de tecnologia que tenham similaridades com os produtos ofertados por esses setores hegemônicos. Na mesma linha de Harvey (2005), Wallerstein (1995) afirma que o capitalismo criou um sistema de atuação em escalas que se ampliam cada vez mais, tornando os Estados submissos às grandes corporações nacionais ou supranacionais. Os diferentes atores da sociedade atuam dentro de uma lógica que facilita a disseminação dos valores em escala global sobre a escala local, dificultando subsídios e financiamentos às práticas consideradas atrasadas e fomentando as ações de empresas nacionais e transnacionais que atuam dentro dessa lógica de globalização apoiadas pelo FMI e pelo Banco Mundial. Para esse autor, esse modelo é um Sistema Mundo carregado de preceitos ideológicos de leis, regras e normas para favorecer um modelo de produção e consumo que não são compatíveis com os modelos da maioria das sociedades, gerando desigualdades e concentração de riquezas. Valores como justiça, direitos sociaise igualdade são colocados em um mesmo conjunto de valores contraditórios como o lucro e como a exploração desmedida de recursos naturais. As contradições são muitas. O discurso da globalização neoliberal se opõe aos monopólios quando estes estão nas mãos do Estado ou de setores conservadores nacionais, porém dificilmente se opõem aos setores monopolizados pelas grandes multinacionais, como é o caso daqueles setores que, além de estarem sendo dominados por grandes empresas, não levam em conta as preocupações sociais ou ambientais do local. Muitos desses setores buscam garantir pretensos “direitos de propriedade intelectual”, como é o caso de monopólios farmacêuticos que agem de forma a ampliar o seu controle sobre o mercado, tanto o fornecedor quanto o consumidor, com elevados investimentos e maximização do capital. Buscam disponibilizar seus produtos por meio de 13 intensos trabalhos de marketing junto aos setores de saúde (médicos, enfermeiros, atendentes...). Além disso, investem grandes quantidades de capital em grupos com capacidade de fazer lobbies junto aos políticos locais visando aprovar medidas de interesse do setor, como instrumentos jurídicos protetivos de suas patentes e facilidades em contratos junto ao setor público. De acordo com Harvey (2005, p. 226), “essa indústria está, com avidez, buscando ainda mais poder monopolista, à medida que procura estabelecer direitos de propriedade sobre materiais genéticos de todos os tipos (inclusive em relação a plantas raras de florestas tropicais, tradicionalmente coletadas pelos habitantes indígenas)”. TEMA 5 – A METRÓPOLE EM UM CONTEXTO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA ECONOMIA A partir de 1990, a configuração geopolítica toma uma nova forma com a desintegração dos países do leste europeu. O avanço das propostas neoliberais intensifica a disputa por territórios e por novas formas de exploração dos bens e serviços que se tornaram essenciais para o processo de acumulação capitalista. Nesse contexto, as grandes metrópoles são inseridas em uma dinâmica de concentração e propagação dos interesses do grande capital e de suas corporações. Além disso, as metrópoles historicamente representam um espaço geográfico onde habitam grandes contingentes populacionais e, atualmente, muito mais do que a indústria de transformação, elas se organizam para atender a determinadas funções de amplitude global nas diferentes áreas de serviços e comércio visando atender às exigências de uma ampla rede de grandes empresas e corporações. As grandes metrópoles exercem influência sobre os fluxos migratórios, apresentando-se como centros de empregos, de serviços de toda ordem e de acolhimento daqueles que buscam uma melhor qualidade de vida. A esperança de muitos se torna um problema para os administradores públicos, pois o crescimento acelerado não consegue atender, com boa infraestrutura, os habitantes que necessitam de um conjunto de redes de serviços como o abastecimento de água e saneamento básico, de energia elétrica, de parques e áreas de lazer, de transportes, de segurança e de moradia digna em áreas não degradadas e de fácil acesso ao trabalho, à escola, à saúde e ao comércio de bens e serviço e muito mais. 14 As metrópoles se estendem sobre uma grande área espacial, ultrapassando os limites de seu território, formando as grandes manchas urbanas, que, de acordo com Santos (2015), são aglomerações que possuem relação com a modernização nas culturas agrícolas, com a substituição dos trabalhadores por máquinas no campo, induzindo o processo migratório que ocasiona uma nova forma de regulação do território, demandando avanços na forma de condução das políticas urbanas. Para esse autor (Santos, 2015), as metrópoles são utilizadas para unificar os novos conteúdos produzidos pelo sistema capitalista, e a globalização representa a maximização extrema do processo de internacionalização do mundo capitalista. As metrópoles possuem características socioespaciais diferenciadas em relação a outras cidades, principalmente as metrópoles em âmbito internacional. Para Silva (2017), são nessas metrópoles que vivem as camadas de maior poder aquisitivo. A maioria dessa população mais afortunada possui propriedade nas áreas centrais da cidade, seja para fins de moradia, seja para exploração comercial e financeira. Grande parte dessa população mora nos arredores das metrópoles cercadas por grandes enclaves, segregados espacial e socialmente das populações mais pobres. As populações mais pobres ocupam a outra extremidade da metrópole, vivendo em grandes assentamentos humanos com pouca ou quase nenhuma infraestrutura. Marcada por grandes contingentes de trabalhadores, esses assentamentos são a residência de muitos trabalhadores assalariados do setor formal ou informal da economia, que vieram para a metrópole dado ao seu poder de atração, pois é nela que estão as melhores condições de trabalho, de saúde, de educação e de esperança de uma vida melhor. Esse modelo de globalização tem influenciado sobremaneira o processo de reestruturação produtiva e modificado com a mesma intensidade a organização e o funcionamento das metrópoles, transformando suas relações externas e reconfigurando sua dinâmica espacial. Atuando dentro de uma coesão de interesses históricos de reprodução do capital, a configuração espacial da metrópole, no entendimento de Lencioni et al. (2011), mantém uma série de fluxos materiais e imateriais que são capturados por redes urbanas internacionais, que se conectam entre si, produzindo situações de homogeneização, diante de uma alta complexidade de constituição desses espaços de aglomerações que não foram e nem se produziram organizadamente e muito menos por uma lógica de planejamento urbano. 15 Essas dificuldades despontaram em função da complexidade das aglomerações urbanas, como configurações espaciais contraditórias, de necessidades convergentes e, ao mesmo tempo, de interesses divergentes. Há, nesse contexto, uma série de demandas, de estruturas que se constituem como públicas. As estruturas públicas, assim como o atendimento às demandas impelidas pela sociedade, são constantemente colocadas em risco pela alternância dos interesses privados das classes que gravitam em torno da governança e gestão do poder local. Com o advento da globalização, pela flexibilização e desregulamentação das leis locais, determinados grupos privados possuem a liberdade para escolher como e quanto pagar de impostos, onde estabelecer sua moradia, onde adquirir e implementar seus negócios, contribuindo para alterar a morfologia urbana, incluindo a coisa pública, de acordo com os interesses de alguns grupos privados em detrimento da maioria. Scott (2012) afirmava que havia mais de 300 metrópoles no mundo, que se constituíam em cidades-regiões, com população de mais de um milhão de habitantes. O que há em comum entre essas aglomerações metropolitanas é que possuem, nesse contexto de globalização, grandes ícones dos conteúdos da economia internacional como as grandes redes de supermercados, redes de hotéis, empresas de fast foods, entre outros. Todos esses ícones do capitalismo mundial podem ser encontrados em qualquer grande metrópole do mundo capitalista. Além disso, a expansão desses aglomerados metropolitanos passa a constituir-se em grande desafio para os pesquisadores e os gestores de políticas públicas. De acordo com Garbossa e Silva (2016), no mundo existem 23 metrópoles com mais de 10 milhões de habitantes. Essas aglomerações urbanas reúnem em seus territórios os principais centros de dominação da sociedade capitalista, em que se concentram as funções superiores de direção, produção e gestão do planeta. Nelas se encontram os principais processos de ligação com os lugares, onde são articuladas redes de comunicação que interligam esses lugaresa diferentes localidades em todo o mundo. Para cada localidade são atribuídos diferentes papéis e funções dentro de uma hierarquia de geração de riqueza, de processamentos de informações e de direcionamentos que condicionam o comportamento de muitos agentes políticos, econômicos e até mesmo dos próprios membros da sociedade. 16 As metrópoles são centralidades que também possuem uma dinâmica própria para além do poder político, econômico e financeiro. Nas metrópoles, dentro de sua complexidade se situam as maiores ofertas de emprego, de serviços educacionais, de saúde e culturais. São nelas que se encontram as maiores oportunidades, as maiores concentrações de grandes afortunados, mas também do contraste da fome e da miséria. É nas metrópoles que está aquilo que é o que há de melhor e de pior em uma aglomeração urbana. 17 REFERÊNCIAS GARBOSSA, R. A.; SILVA, R. S. O processo de produção do espaço urbano: impactos e desafios de uma urbanização. Curitiba: InterSaberes, 2016. _____. Geografia política e geopolítica. Curitiba: InterSaberes, 2018. HARVEY, D. A produção capitalista do espaço. São Paulo: Annablume, 2005. KEYNES, J. M. A teoria geral do emprego, do juro e da moeda. São Paulo: Círculo do Livro, 1996. LEFEBVRE, H. O direito à cidade. São Paulo: Centauro, 2013. LENCIONI, S. et al. (Org.). Transformações socioterritoriais nas metrópoles de Buenos Aires, São Paulo e Santiago. São Paulo: FAUUSP, 2011. MALLMANN, L.; BALESTRIN, N. L.; SILVA, R; S. Estado e políticas sociais no Brasil: avanços e retrocessos. Curitiba: InterSaberes, 2017. MANKIW, N. G. Introdução à economia. São Paulo: Cengage Learning, 2005. MASSEY, D. Pelo espaço: uma nova política da espacialidade. Tradução Hilda Pareto Maciel, Rogério Haesbaert. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. RICARDO, D. Princípios de economia, política e tributação. Tradução de Paulo Henrique Ribeiro Sandroni. São Paulo: Círculo do Livro, 1996. SANTOS, M. Por uma outra globalização. 24. ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2015. SCOTT, A. J. 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AULA 3 ESPAÇO GEOGRÁFICO, ECONOMIA E COMÉRCIO INTERNACIONAL Prof. Rodolfo dos Santos Silva 2 CONTEXTUALIZANDO A geografia não serve apenas para a formação escolar, ela serve também para um conhecimento muito mais amplo, ao poder e ao Estado, conforme afirmam Yves Lacoste, David Harvey, Henri Lefebvre e tantos outros geógrafos. A economia, por sua vez, é também um instrumento de poder e conhecimento que demonstra como a sociedade produz os bens e serviços que necessitam e como tais bens podem ser distribuídos de forma a satisfazer as necessidades desses indivíduos. De modelos econômicos liberais, no qual os indivíduos buscam satisfazer as suas necessidades contribuindo para o desenvolvimento de todos, sem a interferência do Estado, ao modelo de política econômica keynesiano, implantado a partir da década de 1930, no qual o Estado atua como um agente econômico e propulsor da economia, buscando o pleno emprego dos fatores de produção. Também se discute, nesta aula, as teorias mercantilistas e sua contribuição para o desenvolvimento do comércio internacional. Após o período mercantilista, quando surge o Estado Absolutista, criam-se formas de controlar o mercado interno e, como consequência, também o mercado externo. Passa-se pela importância da industrialização e da teoria liberal para a formação de um discurso de abertura das fronteiras dos Estados para o comércio internacional. Outra abordagem é a forma como os Estados buscaram proteger os seus mercados dos produtos industrializados dos países mais desenvolvidos economicamente. Aborda-se as crises econômicas e as duas guerras como forma de alavancar um outro modelo de economia internacional, com apoio da ONU e de suas organizações para o desenvolvimento, como foi o caso da CEPAL. Discute-se, ainda, a formação dos blocos econômicos como medidas de proteção utilizadas pelos países em diferentes continentes. TEMA 1 – O COMÉRCIO INTERNACIONAL E A GEOPOLÍTICA DO DESENVOLVIMENTO Tem-se como consenso que os seres humanos, por volta de 12.000 anos atrás, tinham como suas principais atividades a caça, a pesca e a coleta, vivendo em bandos e em cavernas, utilizando ferramentas rústicas extraídas da natureza. Com o desenvolvimento de ferramentas, novas técnicas de caça e pesca e o domínio do cultivo das terras e da domesticação dos animais, os seres humanos passam a gerar excedentes de produção. Logo, passaram a criar formas de trocas 3 desse excedente com outros grupos de seres humanos por produtos que não possuíam. Com a criação de instrumentos de navegação passaram a ir cada vez mais longe para alcançarem localidades que dispunham dos recursos de que necessitavam. Produtos que eram mais procurados e aceitos tornaram-se objetos bastantes valorizados e facilmente trocados por outros objetos. Assim, surgiu a mercadoria-moeda, cuja necessidade entre os povos daquela época era comum, pois era algo raro. O sal, a pimenta, o chá e o couro já foram utilizados como moeda de troca. Apesar da mercadoria-moeda possuir características essenciais, como interesse comum e raridade, não possuía a durabilidade e muitas delas não eram de fácil manuseio. Com a criação da moeda metálica, por volta do Século VII a.C., no reino da Lídia, região onde hoje se localiza o Iraque, tornou mais fácil a realização do comércio. O metal, de difícil deterioração e fácil manuseio, impulsionou a realização de trocas e fomentou o comércio. Após a cunhagem da moeda em ouro e prata, a moeda ganhou todas as características necessárias para transformá-la no grande instrumento facilitador das trocas: raridade, de fácil aceitação, de valor intrínseco e durabilidade. De acordo com Huberman (1986), até o Século XI d. C., apesar da moeda existir já há algum tempo, ainda o comércio não havia alcançado tanta expressão, principalmente devido às condições de acessibilidade ao que se era produzido. As poucas estradas existentes na Europa Ocidental neste período eram bastante precárias, os perigos de assaltos e as cobranças de taxas pelos senhores das terras desencorajavam qualquer mercador. Com o advento das Cruzadas, os caminhos se ampliaram e muitas estradas deram espaços para o surgimento de pequenas localidades de comércio. Para o autor, poucas eram as cidades, muitas delas eram cercadas e possuíam apenas funções de justiça e de manutenção dos exércitos. A partir do Século XII, em muitas das fortalezas, diversas pessoas vindas de diferentes lugares passaram a se estabelecer em seu entorno, dentre elas mercadores, comerciantes que traziam de tudo para vender a quem lá habitavam e ficavam por ali mesmo. Além disso, as cidades italianas, que estavam entre as mais desenvolvidas, assim como Constantinopla, fortaleciam-se com a ampliação do comércio no mar mediterrâneo. “No mar do Norte e no Báltico, os navios corriam de um ponto a outro para apanhar peixe, madeira, peles, couros e peliças. 4 Um dos centros desse comércio nos mares do norte era a cidade de Bruges,em Flandres” (Huberman, 1986, p. 21). Já na Idade Média, quando os Estados ainda não tinham uma certa organização, as cidades desempenhavam o papel de concentrar as atividades econômicas. Nelas se situavam as atividades produtivas e as de comércio, tudo dentro de regulamentações locais. Com o surgimento dos Estados-Nações a partir do Século XV, as leis passaram a ser ditadas em âmbito nacional e o controle passou a ser absoluto do rei. Esse Estado Absolutista se colocava acima das diferentes camadas sociais, e sob o pretexto de protegê-las agia em nome delas e de si próprio, buscando manter os privilégios de uma nobreza em decadência. Para manter os seus domínios, o Estado mantinha um intenso processo de mercantilização de sua economia, objetivando alcançar os recursos de que necessitava por meio da cobrança de tributos. Ao mesmo tempo que se expandia e explorava suas colônias, o Estado Absolutista proporcionava o surgimento de uma nova classe social e de poder, a classe dos mercadores e comerciantes. De acordo com Franco Junior e Pan Chacon (1991, p. 111), “o Estado Absolutista assumiu, assim, o papel de controlador da economia, regulando os desvios, contrações e crises da adolescência do capitalismo. Nascidos no mesmo contexto, Estado Moderno e capitalismo caminhavam lado a lado, cada um viabilizando o outro por meio do mercantilismo”. O desenvolvimento do capitalismo e o fortalecimento da classe mercantil propiciou a formação dos burgos (cidades) do comércio e das manufaturas. A classe dominante dessas cidades passou a ser conhecida como burguesia. A existência de artesãos qualificados, de pequenas e médias manufaturas e um número significativo de grandes comerciantes possibilitou à Inglaterra, em meados do Século XVIII, as condições para protagonizar a Revolução Industrial. Só mais tarde, no Século XVIII, Bélgica, França, Alemanha e Itália vão contribuir para o fenômeno da industrialização se expandir por diversos países do mundo. Para Hobsbawm (2012), o período entre 1789 e 1848 foi do triunfo da burguesia liberal e da industrialização capitalista, no qual a revolução burguesa superou a monarquia e a indústria capitalista superou todas as formas de produção existentes, alcançando geograficamente parte da Europa e da América do Norte. Com a Revolução Francesa (1789), o liberalismo passou a ser o lema da burguesia em todo o mundo. Os ideais liberais contagiaram os setores do comércio, da indústria e até mesmo parte da classe média e a maioria dos 5 capitalistas. Com a tomada do poder na França por Napoleão Bonaparte, dentro de sua proposta de expansão do império francês, boa parte dos ideais revolucionários se perderam. De acordo com Aquino et al. (1997), em 1814, logo após derrotar Napoleão em Leipzig, os países vencedores (Rússia, Prússia, Inglaterra e Áustria), reuniram-se com a maioria dos países europeus que sofreram perdas com os avanços das tropas napoleônicas para conter os avanços liberais e nacionalistas e dividir o domínio territorial europeu entre tais países. A aliança entre esses países foi uma forma conservadora para manter os laços das oligarquias tradicionais e evitar os avanços do liberalismo e do socialismo que colocavam em risco os afortunados dos grandes impérios do Século XIX. Conforme Aquino et al. (1997), a aliança garantiu a distribuição dos territórios entre os países de acordo com a Lei de Compensações, tendo como maior beneficiada a Inglaterra que, além de receber inúmeras concessões antes atreladas ao poder territorial francês, também passou a ter o caminho livre para ampliar seus negócios no continente europeu e a consolidar seus domínios sobre os mares e outros territórios para além. É certo que as alianças entre as grandes nações tiveram primeiramente objetivos de arrebatar aliados para manter a hegemonia sobre os territórios, porém, a partir de então, as nações passam a se aliar não só com objetivos de estratégias bélicas, mas também para o desenvolvimento dos mercados. TEMA 2 – O COMÉRCIO INTERNACIONAL E AS NAÇÕES IMPERIALISTAS As nações imperialistas europeias mantiveram sua intenção de controlar o mercado e os outros países objetivando garantir seus objetivos intervencionistas. Apesar da dura repressão e tentativas de controles contra os ideais liberais e socialistas, muitas revoltas populares pipocaram por toda a Europa e até mesmo na América. Muitas ex-colônias europeias se tornaram independentes, inclusive as da América Latina. Em 1815, a classe dominante e a monarquia da Rússia, Prússia e Áustria resolveram criar a Santa Aliança, cuja finalidade foi manter distante qualquer ameaça dos ideais libertários e garantir a intervenção em qualquer país europeu onde houvesse conflitos provocados por comunistas ou liberais. A Santa Aliança, por meio de diversos congressos realizados entre os países-membros, discutia e aprovava propostas comuns de repressões e intervenções nos países. A Inglaterra não via com bons olhos esse poder intervencionista da Santa Aliança, pois esta atrapalhava o desenvolvimento do 6 comércio europeu e podia também atrapalhar os seus negócios nos demais continentes. Os objetivos expansionistas das nações imperialistas europeias vão encontrar resistências do outro lado do continente. Os EUA, temendo o avanço dominial dos países europeus, reage por meio de seu presidente James Monroe, que, em 1823, sobe à tribuna do parlamento para discursar contra o colonialismo europeu em territórios americanos. A Doutrina Monroe, aprovada pelo congresso americano, foi uma afirmação de que os EUA reagiriam a qualquer iniciativa de colonização europeia que ameaçasse a integridade territorial e política de qualquer nação independente americana. A Doutrina Monroe se constituiu primeiro em um mecanismo de defesa dos norte-americanos, depois, serviu para esconder as reais intenções de expansão comercial e política dos EUA sobre a América. Os ideais liberais influenciaram o nacionalismo em países como Alemanha e Itália, que, movidos pelas suas regiões de produção industrial, buscaram ter sua autonomia em relação às demais nações europeias. Para Hobsbawm (2002), o capitalismo teve seus altos e baixos durante a segunda metade do Século XIX, porém, sua produção industrial não deixou de crescer aceleradamente. A indústria do ferro e do aço, indicadores de crescimento do período, proporcionaram aos principais países produtores mais do que o dobro de suas vendas no período, graças à expansão vertiginosa do comércio internacional. EUA, Alemanha, Rússia, Suécia entraram para o rol das grandes economias capitalistas. Os investimentos estrangeiros, principalmente os ingleses e franceses, cruzaram os oceanos e promoveram profundas alterações em países como o Brasil e Argentina. “O investimento estrangeiro na América Latina atingiu níveis assombrosos nos anos 1880, quando a extensão da rede ferroviária argentina foi quintuplicada e como o Brasil atraíram até 200 mil imigrantes por ano” (Hobsbawm, 2002, p. 59). As alianças europeias, assim como os interesses individuais expansionistas das nações imperialistas levaram, conforme já estudado anteriormente, à Primeira Grande Guerra Mundial. A Primeira Guerra Mundial não teve consequências apenas bélicas e territoriais, mas possibilitou a introdução de inovações em todas as áreas. No campo político, o Estado passou a ter que aprender a lidar com descontentamentos de seus habitantes, com as oposições e com pressões vindas do exterior. No campo econômico, foram instituídas normas 7 para o trabalho, para a importação e exportação de produtos, houve controle sobre a produção, sobre o consumo e sobre formação de preços. Houve a imposição de racionamentos e de priorização de fabricação de determinados produtos em detrimento da produção de outros. O endividamento externo e a busca denovas alianças econômicas e políticas foram outra marca deixada pelo conflito. O avião foi utilizado como arma beligerante e outras tantas inovações tecnológicas não só contribuíram para a expansão do conflito em âmbito mundial como também para ceifar a vida de milhões de pessoas. Durante o conflito, a Rússia de Nicolau II se enfraqueceu econômica e politicamente, sua população foi a mais penalizada. Na área rural, milhares de pessoas morreram pela falta de alimentos e de acesso às condições básicas de vida, nas cidades o desemprego, a precariedade das condições de trabalho e da informalidade beiravam a miséria extrema. Filas intermináveis para comprar pão ou conseguir qualquer outro mantimento levaram a uma grande revolta, primeiramente liderada pelas mulheres e depois por milhares de pessoas, que culminou na repressão e mortes impostas pelo Estado. Em março de 1917, houve a revolução Russa, que colocou no poder provisoriamente os mencheviques e os descontentes com o governo czarista. Porém, esse governo provisório reprimiu com violência uma passeata que pregava o fim do capitalismo e o estabelecimento de um governo socialista. Apoiados pela elite dominante e pelos antigos aliados czaristas (Inglaterra, França e Japão) que pretendiam manter e ampliar seus investimentos na Rússia, o governo menchevique e os brancos czaristas foram depostos por Lênin, que liderou os bolcheviques e iniciou o processo de criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS. A Primeira Guerra Mundial não mudou só a configuração política e espacial, os EUA passaram a ser a grande nação motora do capitalismo mundial. A partir de então, esse país, aliados aos ingleses, buscou evitar a aproximação dos países europeus ao socialismo soviético. As crises econômicas tomaram conta da Europa durante a década de 1920, principalmente pelo processo de reconstrução dos países e também pela ampliação da capacidade das grandes indústrias das potências capitalistas; houve pouca demanda para muita produção. O resultado foi a crise de 1929. A crise de 1929 intensificou os problemas dos países europeus e a Itália se reconheceu fascista e apresentou seu modelo econômico e político ao mundo. 8 No poder desde 1922, após a “Marcha sobre Roma”, Benito Mussolini ascendeu ao poder com o compromisso de tirar o país da crise de desemprego, inflação alta e de instabilidade econômica e política. A “Grande Itália”, lema utilizado pelos fascistas, “camisas negras”, levou o governo a intervir na economia com construção de um elevado número de obras públicas para incentivar o emprego e promover o consumo, com incentivos à produção agrícola e concessões ao setor industrial. Apresentou a “Carta del Lavoro”, por meio da qual criou leis de proteção e incentivo aos trabalhadores, além de proibir as greves de patrões e empregados. Também, por meio das Corporações, uniu empregados e trabalhadores sobre um mesmo princípio, o da colaboração com o Estado. Visando a desviar os problemas internos e expandir o fascismo, o país acabou se envolvendo em conflitos bélicos, como o da “Guerra da Etiópia” (1935–1936) e a Guerra Civil Espanhola, quando se aproximou o nacional-socialismo alemão. O nacional-socialismo alemão nasceu durante a República de Weimar, logo após um levante socialista, liderados por Rosa de Luxemburgo e Karl Liebkencht, entre 1918 e 1919, na Baviera, Remânia e Berlim, que fora esmagado pelo Estado, sendo seus líderes todos executados. De acordo com Aquino et al. (1997), após esse evento o Governo Provisório buscou manter seu poder por meio de uma Assembleia Constituinte, embasada nos princípios do liberalismo econômico, com centralização do poder nas mãos do Estado. Com uma política de desvalorização constante da moeda, as exportações facilitaram a concentração da riqueza, principalmente dentre os exportadores de produtos industrializados e dos banqueiros. Quem mais perdeu com as altas inflacionárias foram os trabalhadores assalariados, os setores médios e as pequenas empresas. O descontentamento com o modelo econômico e político da Alemanha levou ao fortalecimento de grupos socialistas e de liberais que forçavam o Estado a tomar medidas por decretos. O aparecimento de grupos de ultradireita financiados por grandes empresas do setor industrial e financeiro, juntamente com a propagação de ideias contrárias ao comunismo bolchevique junto à pequena burguesia alemã, proporcionaram as bases de sustentação do Partido Nazista. Em 30 de janeiro de 1933, Adolf Hitler, do Partido Nazista foi escolhido como Chanceler da Alemanha e, em 1934, com a morte do Presidente Hinderburg, o Chanceler também assumiu a Presidência da República da Alemanha. Para se manter no poder, o Führer Alemão perseguiu os comunistas e opositores, pregou uma ideologia antissemita e passou a controlar os meios de comunicação e a 9 manter uma ideologia de apologia ao nazismo. Na economia buscou mobilizar o país para a retomada dos bens e dos territórios perdidos com o Tratado de Versalhes, com investimentos em indústrias bélicas e grandes obras públicas. Proibiu greves e apoiou a criação de corporações de trabalhadores e empresários visando a manter o país no caminho do pleno emprego. No setor externo, buscou formar alianças com países fornecedores de matérias-primas e manteve o interesse em unificar os povos de línguas germânicas e retomar territórios importantes, como os da Áustria e da Polônia. A Segunda Guerra Mundial trouxe consequências irreparáveis a todos os países, principalmente Europa e Ásia, onde os conflitos foram mais intensos. Estimam-se que foram aproximadamente 40 milhões o número de mortos, 20 milhões só na URSS, sem levar em conta os que sofreram algum tipo de sequela devido aos efeitos da guerra. Ao terminar a guerra, os primeiros anos dos principais países localizados em territórios que foram assolados pelos conflito foram duríssimos, pois boa parte de sua infraestrutura estava destruída (portos, aeroportos, ferrovias, rodovias, centrais de energia e pontes), o que tornou sua recuperação ainda mais difícil, pois esses países sofreram com a “escassez de produtos, inclusive alimentos, fome e até mortes por falta de meios de subsistência; a escassez de carvão, além do impacto sobre a produção, também dificultava o aquecimento doméstico, essencial na época do inverno. Estas dificuldades se refletem nos índices do Produto Interno Bruto” (Saes; Saes, 2013, p. 436). A nação que saiu mais fortalecida do conflito foi os EUA. O país, além de ser o único a possuir a bomba atômica, ainda pôde se tornar hegemônico diante dos demais países capitalistas, tendo a garantia dos acordos firmados em Bretton Woods, antes mesmo da guerra terminar. Foi a única grande potência a sair da guerra com uma economia melhor do que a de quando começou o conflito. Todas as demais economias sofreram muito mais perdas com a guerra, ao passo que os EUA se tornaram a maior potência econômica, política, beligerante e financeira do mundo, saindo de um contexto de endividamento para uma das maiores emprestadoras de recursos do mundo. Mesmo antes de acabar a guerra, o Presidente Franklin de Lano Roosevelt (1933–1945) articulava formas de recursos para financiar as populações atingidas pela guerra, a União das Nações para a Reconstrução e Reabilitação – UNRR, uma espécie de embrião da ONU, foi utilizada como um instrumento de ajuda aos povos exilados da Segunda Guerra 10 Mundial. Com o término da Guerra, foi criada a Organização das Nações Unidas – ONU. TEMA 3 – DA CRIAÇÃO DA ONU ÀS CONTRIBUIÇÕES DA CEPAL PARA O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DA AMÉRICA LATINA Com a criação da ONU, na cidade de São Francisco, na Califórnia (EUA), em 24 de outubro de 1945, o objetivo era selar um acordo de paz entre os países e impedir que outro conflito nas mesmas proporçõesocorresse. Na época, 51 países assinaram o acordo, hoje, a ONU possui 193 países filiados à Organização e tem sua sede em Nova York. Também tem como missão a promoção dos direitos humanos e o desenvolvimento econômico e social. Para isso, a ONU possui escritórios espalhados pelo mundo e todo um sistema com instituições e agências específicas que contribuem para melhorar as condições de vida no planeta. Possui um organograma de funcionamento com diversos ramos de atuação. A Assembleia Geral é o seu órgão máximo. Ademais, existem o Conselho de Segurança, o Conselho Econômico e Social, o Conselho de Direitos Humanos, o Tribunal de Justiça e o Secretariado. A ONU foi muito importante no processo de reconstrução e desenvolvimento dos países. Em 1948, por meio do Conselho Econômico e Social, criou a Comissão Econômica para a América Latina – Cepal. A Cepal foi criada para estudar como poderiam ser melhoradas as condições de vida das populações que vivem na América Latina e Caribe. Atualmente, a Cepal conta com a participação de todos os países latino-americanos e caribenhos e mais os EUA, Grã-Bretanha, França e Holanda. A sede administrativa da Cepal está localizada na Cidade de Santiago, capital do Chile. Lideradas por Raul Prebisch e Celso Furtado, os estudos realizados pela Comissão chegaram à conclusão de que a principal causa da origem da pobreza e da miséria da América Latina estava nas relações de trocas desiguais, produtos primários de baixo valor agregado por bens industrializados e de tecnologia, dotados de alto valor agregado com outros países. Para superação dessa condição, os estudiosos da Cepal propuseram que os países deveriam promover a industrialização e a diversificação de sua produção de bens e serviços. As teorias defendidas pelos membros da CEPAL foram fundamentais para a busca de uma maior integração dos países latino-americanos. A distribuição de renda, a construção de infraestruturas de energia, de rodovias, ferrovias, portos, 11 reforma agrária e planejamento econômico eram algumas das condições apontadas por Raul Prebisch, Celso Furtado e Oswaldo Sunkel como forma de superação das condições de subdesenvolvimento desses países. Uma das grandes influências da CEPAL foi a criação da Associação Latino-Americana de Livre Comércio – ALALC, no início dos anos de 1950. O incentivo a ALALC foi fundamental para a organização do comércio entre os países do continente, ampliando a comercialização entre eles e dando condições de melhorias nos mercados nacionais. Também houve grandes melhorias, em cada país, no seu processo produtivo, buscando resultados com o menor custo possível dentro de suas dotações relativas de fatores de produção. Além disso, alcançaram relativamente índices importantes na substituição de importações e ampliação de seus parques industriais, melhorando em muito a capacidade de produção e exportação de bens manufaturados. Entre as décadas de 1950 e 1960, muitas grandes indústrias com sedes nos países centrais tiveram que destinar suas plantas industriais para os países periféricos. Incentivos, isenções e melhorias na infraestrutura foram alguns dos apontamentos necessários feitos pela Cepal como forma de atrair investimentos fixos de grandes multinacionais que pudessem melhorar a produção de bens de consumo, principalmente bens de produção e bens de capital. Máquinas e equipamentos para produzir outros bens e, dessa forma, a indústria local alcançar maior eficiência e poder de concorrência com produto estrangeiro e elevar seu nível de substituição de importações. Motivados pela Cepal, os governantes passaram a proporcionar condições para que essas plantas industriais contribuíssem para o desenvolvimento econômico e social desses países. O pensamento estruturalista dos membros da Cepal fortaleceu as ideias nacionalistas de muitos políticos da América Latina. No Brasil, o populismo colocado em prática por governantes entre 1950 a 1964 foi nessa linha. Getúlio Vargas criou várias empresas para proporcionar infraestrutura e substituir importações. Dentre as empresas criadas nesse período está O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico – BNDE, em 1952, que inicialmente foi criado para auxiliar o programa de reaparelhamento econômico, serviu como o grande Banco de fomentação de empreendimentos básicos para o desenvolvimento econômico do país, tanto públicos quanto privados. A Petrobrás foi criada em 1953, depois de muitas manifestações populares na defesa do petróleo brasileiro, e começou as suas operações em 1954. Além disso, o governo criou a Empresa 12 de Energia Elétrica Brasileira, expandiu as atividades da Companhia Siderúrgica Nacional e melhorou as condições de produção da Companhia Vale do Rio Doce. Enquanto o Brasil e outros países latino-americanos buscavam se organizar por meio da ALALC, a Europa já havia criado o seu Mercado Comum Europeu. TEMA 4 – O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO ECONÔMICO EUROPEU E SEU MERCADO COMUM Com a colocação em prática do programa de reconstrução da Europa por meio do Plano Marshall, fortaleceu-se a ideia da criação de um mercado comum europeu, visando a romper as barreiras existentes, facilitar a circulação de produtos, serviços e pessoas, integração comercial e financeira entre os países. Anteriormente, o continente já havia tido uma experiência positiva com a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, estabelecida em 1951, que facilitou as relações comerciais transnacionais. Em 1957, os governantes da Alemanha – RFA –, Itália, Holanda, Bélgica, Luxemburgo e França assinaram o Tratado de Roma, criando a Comunidade Econômica Europeia – CEE. Mais tarde, foram integrados também à CEE a Inglaterra, a Dinamarca e a Irlanda. Em 1981, a Grécia também passou a fazer parte da CEE e, em 1986, Portugal e Espanha também aderiram ao mercado comum. Em 1992, em Maastrich (Holanda), 27 países assinaram o Tratado da União Europeia – UE. Esse tratado oficializou a constituição de um mercado comum com a criação de uma moeda também comum, o Euro, assim como políticas de integração econômica em vários setores importantes, como o de circulação de pessoas e de transportes. Em 2013, 28 países eram os membros da União Europeia e outros tantos ainda estão em negociações para se integrarem ao grupo. Os países-membros da UE (em ordem alfabética) são: Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia, Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Holanda, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Polônia, Portugal, Reino Unido, República Tcheca, Romênia e Suécia. Um dos maiores feitos da integração da UE foi sua unificação monetária, que se iniciou, no entendimento de Sandroni (2007), com a criação do Euro, adotado em 1° de janeiro de 1999, e que teve seu curso legal de circulação a partir de 1° de janeiro de 2002. Para o autor, conforme acordo de adesão, os países-membros tiveram algumas metas essenciais a seguir, dentre elas, a 13 abdicação de suas moedas, muitas delas centenárias, como foi o caso do Marco (Alemanha), Peseta (Espanha), Escudo (Portugal) e Franco (França). Além disso, “se comprometeram com as metas relacionadas com o déficit público (até 3% do PIB) e o endividamento interno (até 60% do PIB) e outras condições sobre inflação e taxas de juros fixadas pelo Tratado de Maastrich” (Sandroni, 2007, p. 320). Dessa maneira, o Tratado de Maastrich forçou os Estados europeus a adotarem como moeda o Euro, a comprometerem no máximo 60% de seu PIB com seu endividamento interno e, ainda, submeter as decisões adotadas pelo Banco Central Europeu (Eurobank). O Eurobank foi fundado em janeiro de 1999 e possui sua sede na Cidade de Frankfurt (Alemanha). Além disso, esse Banco possui um Conselho Diretor, composto por um Comitê Executivo e pelos Presidentes de todosos países que possuem o Euro como moeda comum. Dentre os objetivos do Banco está a centralização do crédito, a manutenção da estabilidade da moeda, o poder liberatório, o controle da emissão de moeda em cada país, a quantidade de divisas mantidas por cada país e a emissão de moeda. Para se adaptarem a tantas mudanças, os países europeus, principalmente as economias mais frágeis, não conseguiram conter seu nível de endividamento, o que era pressuposto para aqueles que queriam se beneficiar com o novo mercado comum. Grécia, Portugal, Espanha e Itália estão entre os países que tiveram dificuldades de manutenção de um mercado integrado, em uma proposta, cuja adaptação custou gastos maiores do que suas receitas, não conseguindo acompanhar o nível de desenvolvimento estabelecido pelo Tratado de Maastrich. Até mesmo as grandes economias industrializadas da Europa passaram por alto grau de endividamento, mas com um grande número de reservas cambiais conseguiram se sobressair em relação aos demais países. O grande problema foi a colocação da dúvida se de fato um mercado comum tão consistente conseguiria resistir a uma crise econômica como a de 2008. A crise de 2008 provocou grandes problemas às economias de todo o mundo, porém, é na UE que os impactos dessa crise vão abalar um mercado comum que parecia estar muito sólido. O abalo trouxe a ampliação do número de desempregados no continente europeu, que já convivia uma relação difícil com o desemprego tecnológico. A tentativa de implementação de medidas neoliberais, como contrapartida de muitos países para se manterem na zona do Euro, aponta para a desintegração dos direitos sociais e o fim de um estado de bem-estar social 14 dos países-membros. Essa desintegração tem contribuído para que muitos governantes sejam pressionados a rever esse processo de unificação europeia. TEMA 5 – O COMÉRCIO INTERNACIONAL E A FORMAÇÃO DOS BLOCOS ECONÔMICOS – NAFTA, ALCA E MERCOSUL As teorias do comércio internacional estão centradas nas relações de trocas de bens e serviços, conforme as dotações relativas de cada país na divisão internacional do trabalho. Com o fortalecimento das fronteiras entre os países, as barreiras alfandegárias se tonaram mais rígidas e o intercâmbio de mercadorias entre os países mais controlados. Do Século XIV até meados do Século XVIII, no comércio internacional prevaleceu a Teoria Mercantilista. Defendida por muitos teóricos da economia, como Thomas Gresham, Thomas Mun, Antoine de Montchristien, dentre outros, a Teoria Mercantilista defendia o controle das relações de comércio nas mãos do Estado e tinha como principal objetivo o saldo positivo na Balança Comercial, aumentando as exportações e restringindo ao mínimo possível as importações, retendo ouro e prata como sinal de acúmulo de riquezas. Nessas condições, algumas nações, como Holanda, França e Inglaterra, passaram a monopolizar o comércio internacional impondo os seus interesses aos de suas colônias e dos países com maior grau de dependência econômica. Para Costa, Santos (2011) e Sandroni (2007), a Inglaterra, como país monopolista e já avançado em seu processo de industrialização, passou a se opor ao comportamento dos países que atuavam dentro de uma linha de comércio internacional regida pela Teoria Mercantilista para impor uma linha de liberal de comercialização entre os países. No entendimento dos autores, a Inglaterra passou a pregar o livre mercado internacional, com o mínimo de interferência dos Estados sobre suas fronteiras economicamente, visando a garantir a entrada de seus produtos nesses países sem taxas alfandegárias, ou com a menor taxa possível. Um dos principais argumentos utilizados era de que a abertura ao comércio internacional proporcionaria aos países o acesso a uma maior quantidade de bens e, como consequência, um maior desenvolvimento econômico. Mas, dado ao avanço na produção de bens industrializados, as relações de trocas entre os países tenderam a ser mais vantajosas para a Inglaterra. Um lorde inglês chamado David Ricardo, em 1817, foi o responsável por criar uma teoria para justificar as vantagens obtidas por cada país nas relações 15 de trocas no comércio internacional. A teoria das vantagens comparativas pregava que cada país deveria se especializar naquilo que melhor pudesse produzir, ou seja, naquele produto ou serviço que, comparativamente ao ofertado no mercado internacional, os custos fossem mais vantajosos. Em oposição às teorias de abertura de mercado, surgiram também as medidas protecionistas, cujos Estados pretendiam proteger suas fronteiras e seu mercado interno para garantir sua produção e emprego e evitar a saída de divisas. A intensificação dessa atitude dos países acabou levando os países à Primeira Guerra Mundial, pois conforme Sandroni (2007, p. 162) “o protecionismo foi posto em prática em primeiro lugar pelos Estados Unidos e Alemanha, que disputavam os mercados de produtos industriais com a Grã-Bretanha, sendo seguidos gradualmente pela maioria dos países”. Após a ocorrência das duas grandes guerras mundiais, o comércio internacional passou por mudanças para se adaptar ao novo modelo de economia internacional posta, principalmente pelo processo de reconfiguração geopolítica e da Guerra Fria. Uma dessas mudanças foi a realização de um tratado de comércio internacional objetivando a criação de um órgão que pudesse contribuir de alguma forma para normatizar as transações econômicas entre os países. Um desses órgãos foi o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (General Agreement on Tariffs and Trade – GATT), criado em Genebra, na Suíça, em 1947, para contribuir para o desenvolvimento do comércio internacional, por meio da realização de acordos entre os países para reduzir tarifas alfandegárias, tratamento bilateral igualitário, eliminação de subsídios e de reserva de mercado para produtos internos por meio de cotas de importação. Em um primeiro momento, 23 nações foram signatárias do GATT. Em 1995, na cidade de Marrakesh, no Marrocos, foi criada a Organização Mundial do Comércio – OMC, que passou a ter os mesmos objetivos do GATT, que além de contar com um número maior de países, passou a existir de forma permanente, haja vista que o GATT era temporário. A partir da década de 1950, várias foram as crises econômicas que afetaram o mercado internacional e muitos países buscaram, por meio de relações comerciais com seus vizinhos, organizarem-se por meio de mercados comuns. Um dos primeiros mercados a se formar foram, conforme já vistos, a Associação Latino-Americana de Livre Comércio – ALALC – e a Comunidade Econômica Europeia do Carvão e do aço. No desenvolvimento dessas articulações entre os países para protegerem seus mercados surgiram ainda o Nafta e o Mercosul. 16 De acordo com Costa e Santos (2012), o Tratado Americano de Livre Comércio (Nort American Free Trade Agreement – Nafta) foi criado em 1989 e representa um acordo de livre comércio estabelecido entre os Estados Unidos e Canadá e depois ampliou-se com a participação do México. Pretendia os EUA, com a formação do bloco econômico, fazer frente ao Mercado Comum Europeu, encaminhado pelos países que compõem a União europeia. O acordo entrou em vigor em 1994 e tinha como previsão a abolição total das tarifas alfandegárias entre os três países em 2010. Apesar dos avanços comerciais entre os membros do bloco, alguns entraves políticos e econômicos acabaram não tornando possível tal abolição na data prevista. O chile, apesar de ser um país geograficamente localizado ao sul da América, é membro associado do bloco e possui vantagens nas relações comerciais com todos os demais países-membros. Apesar de se constituir como bloco, o Nafta não permite a livre circulação de pessoas entre os países pertencentes a ele. Na década de 1990, os EUA buscaram impor a todosos países americanos uma Área de Livre Comércio das Américas – Alca –, que tinha como objetivo uma integração entre todos os países da América Latina e Caribenha, mais o Canadá. De iniciativa dos EUA, a Alca pretendia ser o maior mercado comum do planeta. Uma das propostas para essa Área de Livre Mercado era a integração monetária. A proposta americana era de que o Dólar fosse a moeda comum a todos. Para Sandroni (2007), o projeto da Alca tinha grande abrangência, que ia desde a integração monetária, a preservação da propriedade intelectual, a instalação de bases militares americanas, acordos de comércio e tarifas até barreiras de proteção entre os países-membros em relação aos demais blocos econômicos ou países não membros. A Alca não foi bem-vista por governantes de muitos países latino- americanos, especialmente o Brasil e a Argentina, que percebiam na proposta americana uma mão de única via. Todos os mercados do continente aberto aos interesses do governo americano, sem a devida contrapartida dos EUA. Além disso, a dolarização das economias de muitos dos países latino-americanos e caribenhos, iniciada nos primeiros anos da década de 1990, colocaram os países na dependência da oferta de dólares no mercado internacional. Muito diferente da proposta de unificação monetária da União Europeia, onde os países-membros se dispuseram a acabar com suas moedas para a criação de uma moeda comum, os EUA não se dispuseram a aceitar uma nova moeda e muito menos de pôr fim 17 ao Dólar e criar um Conselho Monetário dos países-membros da Alca. A proposta da Alca não avançou porque houve reações contrárias internas em praticamente todos os países atingidos pela Área de Livre Comércio das Américas. Um dos grandes entraves para a Alca foi a articulação já existente entre os países do cone sul das Américas, o Mercosul. De acordo com Costa, Santos (2012) e Sandroni (2007), o Mercosul começou a nascer após acordos comerciais realizados entre o Brasil e a Argentina e foi criado oficialmente com a assinatura do Tratado de Assunção, em 29 de novembro de 1991. Reunindo Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, o acordo teve como proposta criar uma relação de livre comércio entre os países do Cone Sul, por meio de uma integração progressiva, levando em conta o desenvolvimento de cada país. Além de manter uma ampliação da comercialização de bens e serviços, matéria-prima e mão de obra entre os membros do Mercosul, o acordo previa o estabelecimento de cobranças de taxas de importação e exportações comuns e também a realização de diversos foros para discussões sobre as políticas da área de livre comércio do Cone Sul, principalmente sobre a adesão de novos países ao Bloco. Saiba mais Saiba mais sobre a Primeira Guerra Mundial assistindo ao Vídeo: PRIMEIRA Guerra Mundial o fim de uma era dublado. Erivaldo Santos. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=s25JGNCSu4M>. Acesso em: 22 mar. 2019. 18 REFERÊNCIAS AQUINO, R. S. L. de; ALVARENGA, F. J. M. de; FRANCO, D. de A.; LOPES, O. G. P. C. 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Outro assunto de importância relevante são as características da moeda e sua abordagem como instrumento internacional de acumulação e de trocas. O texto apresenta ainda o padrão-ouro estabelecido pelas metrópoles para as suas colônias e o domínio internacional da Inglaterra sobre os mares e sobre o comércio internacional até ser superado pelas organizações criadas em Bretton Woods. Como havia muitas dificuldades para os países manterem o padrão-ouro, pois não possuíam reservas em metais preciosos, foram criadas moedas sem lastros. O que se aborda neste texto é a forma encontrada para que os países pudessem manter a sua relação de comércio exterior com uma moeda que apenas tinha seu valor mantido internamente. Nesse sentido, discute-se como a Conferência Monetária Internacional de Bretton Woods representou um marco na história monetária internacional. Tendo como referencial a criação do Banco Mundial, do FMI e do estabelecimento do Dólar como moeda internacional, são apresentados os argumentos que provocaram profundas alterações nas transações econômicas internacionais, principalmente após a criação da Agência Internacional de Desenvolvimento (AID) e do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade), que passaram a ser determinantes na reestruturação do capitalismo e no processo de reconstrução dos países após a Segunda Guerra Mundial. TEMA 1 – O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA MOEDA É na Antiguidade que surgiram as primeiras representações da moeda. As primeiras informações históricas sobre a moeda datam do século VII a. C., na Ásia Menor, e também no Peloponeso no sul da Grécia. O Rei tinha o costume de cunhar moedas para manter as transações econômicas no reino e com outros países. Naquela época, descobre-se que a fundição de metais e sua utilização como moeda poderia agregar valor e ao mesmo tempo durabilidade a metais de fácil aceitação no mercado, pois,além de evitar o seu desgaste devido ao manuseio, o ouro e a prata haviam se tornado metais preciosos de muita raridade. 3 Sua fácil aceitação, valor intrínseco, raridade e durabilidade proporcionaram uma organização monetária do comércio de bens e serviços. Antes da moeda havia o escambo, que representava várias formas de realização de trocas de bens e serviços sem a intermediação da moeda, e era a forma mais primitiva de realização de trocas, nas sociedades primitivas. Atualmente, o escambo tende a ser utilizado quando há uma falta de ou desvalorização intensa da moeda no mercado, devido às crises na economia e à falta de confiança dos consumidores e produtores em relação à moeda existente. Nesses momentos de crise, as moedas são substituídas por mercadorias que se tornam o instrumento de troca, substituindo as funções exercidas pela moeda, originando o que os economistas chamam de moeda mercadoria. O escambo foi utilizado muitas vezes na história. Os livros trazem exemplos das caravanas portuguesas quando chegaram à América carregadas de especiarias para trocar por madeira e metais preciosos com os habitantes locais. Assim, as especiarias faziam o papel da moeda, adquirindo a função de mercadoria moeda. Os tecidos, o couro, o sal, a pimenta, em muitos casos foram utilizados dessa forma. Com a cunhagem, a moeda metálica passou a ter como principal função facilitar as trocas, e assim também, a partir do momento em que passou a fazer esse papel, cumpriu também a função de atribuição de valor a determinado produto. Coordenada pelo Estado, ela fortaleceu as transações econômicas, possibilitou maior nível de acumulação de riquezas, abriu novos mercados para as nações e deu mais poder aos seus possuidores. A moeda propiciou o desenvolvimento de uma das mais importantes teorias econômicas, a do Fluxo Circular da Renda. Nessa teoria, as trocas são facilitadas pela moeda (fluxo monetário) e pelos bens e serviços (fluxo real) que percorrem o caminho da economia perfazendo um fluxo circular. Ao produzir bens e serviços, o setor produtivo gera mais empregos, e os empregados, com mais dinheiro no bolso, contratam e compram mais no mercado de bens e serviços. Para poder dispor de bens e serviços, o mercado tem de comprar dos produtores. Se os produtores vendem, contratam mais trabalhadores. Todo esse processo é realizado por intermédio da moeda. Quanto mais se produz, mais se contrata; quanto mais se contrata, mais moeda circula na economia e mais o mercado vende. 4 Conforme Costa e Santos (2011), no comércio exterior isso também acontece, dentro de uma dinâmica de trocas de bens e serviços de acordo com o nível de especialização obtidos por cada país na divisão internacional do trabalho. Essas relações de trocas são baseadas nos tratados de comércio exterior estabelecidos entre os países que possuem esse intercâmbio. Nesses intercâmbios, muitas vezes há uma deterioração das relações de troca quando um necessita vender ao outro uma quantidade de bens maior do que pode adquirir, o que leva muitas vezes, a um saldo monetário positivo para quem vende e negativo para quem compra. Essa política de vender mais e comprar pouco, para evitar a saída de moeda (divisas internacionais) tem base na teoria mercantilista, surgida no século XVI. A teoria justifica as práticas dos grandes Estados sobre as suas colônias, de trocar especiarias por ouro e prata, ou por qualquer outro produto (madeira nobre, por exemplo) que pudesse ser rapidamente convertido em ouro. Durante o período da Idade Média, a moeda ajudou a consolidar muitos reinos, devido à possibilidade de cunhagem e à garantia de seu curso por parte do Estado. Em muitos desses reinos, o ouro e a prata eram cunhados com o brasão do reino e valiam quanto pesavam, porém, em alguns deles, por causa da escassez de ouro e prata, muitos utilizavam metal não nobre ou forjavam o metal precioso misturado a outros metais de menor valor, o que disfarçava o valor da moeda e o tornava depreciável. A forma encontrada para que as pessoas percebessem a moeda cunhada em metal não precioso como um instrumento facilitador das trocas foi garantir seu curso por meio de leis e forçar sua aceitação. O curso forçado gerou desconfiança no papel importante desempenhado pela moeda como instrumento facilitador das trocas, tornando-a frágil diante das facilidades encontradas pelos governantes estatais para cunhar moedas sem valor intrínseco ou sem lastro. Isso gerou rápida desvalorização em relação aos bens e serviços. Quanto mais moeda era cunhada dessa forma, menos ela valia, o que gerava inflação. A inflação, originária do latim inflare, representa a elevação dos preços, como se fosse um balão inflando e que logo estoura. Um exemplo clássico dessa emissão ocorreu durante as década de 1980 e 1990 no Brasil, quando a desvalorização da moeda chegou à casa dos 1.900 % ao ano. Em 1° de julho de 1994, o Cruzeiro Real foi substituído pelo Real, a atual moeda do país. Um Real (R$1,00) passou a valer CR$ 2.750,00 (dois mil, setecentos e cinquenta Cruzeiros Reais). 5 É também na Antiguidade que surge a moeda papel, um tipo de moeda que poderia, a qualquer momento, ser convertido em metal precioso ou ser representativo de crédito concedido pelo governo aos seus credores. Na história econômica, dizem que esse tipo de moeda surgiu devido à escassez de ouro e prata, mas principalmente pela necessidade de guarda dos metais preciosos, por ter se tornado cada vez mais perigoso o seu transporte e por causa do elevado número de assaltos em alto mar por piratas ou nas estradas por grupos armados. Afirma-se que foi um judeu o responsável por iniciar esse processo de emissão de papel moeda ao criar um estabelecimento para guardar ouro denominado de ourivesaria. Conta-se que para cada quantidade de ouro guardada, o proprietário da ourivesaria concedia um certificado. Com essa certificação, com lastro correspondente à quantidade de ouro depositada, seu proprietário poderia trocar ou adquirir qualquer bem ou serviço que necessitasse. Nasce dessa relação entre ouro depositado e certificado para fins comerciais o papel-moeda com lastro metálico (ouro ou prata). Com a emissão do papel moeda lastreada em ouro, ou seja, com valor nominativo e de fácil aceitação no comércio, pois podia ser rapidamente convertido em metal precioso, algumas moedas internacionais passaram a ter, não mais seu valor intrínseco, mas um valor lastreado. Alguns metais baratos, mas de grande durabilidade e fácil manuseio, assim como moedas cunhadas ou papéis emitidos, passaram a circular como instrumentos monetários. Para garantir a aceitação desses instrumentos monetários, pois sua circulação e credibilidade dependia das instituições bancárias ou financeiras que os emitiam, o Estado tomou para si o controle dessa emissão. Alguns dos problemas que levaram o Estado a assumir, por meio de legislações e da criação de um banco emissor específico, estão relacionados ao fato de que muitas instituições financeiras emitiam papéis moedas (com possibilidades de lastro) que colocavam em risco o sistema monetário como um todo. Algumas dessas instituições não emitiam apenas papéis moedas com lastro e acabavam colocando em circulação mais papel-moeda que a quantidade de ouro em sua posse. Como eram constantes as crises econômicas no século XVIII, nesses momentos muitas pessoas que tinham papéis-moeda conversíveis em ouro corriam para os bancos para retirar a quantidade de ouro estabelecida nominalmente em cada papel-moeda. O resultado disso era uma quebradeira de muitos bancos e a desconfiança em relação ao sistema monetário. 6 TEMA 2 – O ESTADO E O SISTEMA MONETÁRIO A segurança do sistema monetário foi assumida pelo Estado, que garantiu o seu curso com a criação de leis. Quando uma determinadainstituição financeira tende a quebrar, por malversação de recursos, o Estado assume o risco e mantém o controle sobre o sistema financeiro. 2.1 O padrão ouro e o comércio internacional No entendimento de Rossetti (2003), o sistema do padrão ouro foi adotado pelos países como forma de garantir que suas moedas pudessem ter fácil circulação e aceitação, tanto em âmbito nacional quanto internacional. Como abordado anteriormente, a moeda-papel tinha sua conversão em ouro em qualquer tempo e, para que isso ocorresse, deveria haver, na mesma proporção do papel ou moeda emitida, uma correlação em ouro. Nesse sistema, as autoridades monetárias passaram a cobrar um valor mais alto para a venda de sua moeda cunhada em ouro e um valor mais baixo para comprar moeda ou papel-moeda de ouro de outros países. Durante a primeira metade do século XX, tornou-se quase uma regra a implantação de um padrão ouro relacionado às moedas dos países para o comércio internacional. Muitos países, como não possuíam uma moeda atrelada ao padrão ouro, mantinham a cotação de sua moeda relacionada a outra moeda forte com padrão em ouro. Para isso, ou mantinham suas reservas na moeda que estava atrelada ao padrão ouro, para convertê-la quando precisassem, ou mantinham um estoque em ouro para converter sua moeda, caso fosse necessário. Esse padrão ouro (ou a moeda de outro país com padrão ouro) era utilizado para manter a cotação da moeda local. Caso houvesse uma emissão acima da quantidade de reservas existentes, haveria uma desvalorização da moeda, e os preços dos bens e serviços subiriam. Normalmente essa conversão se dava em relação à moeda internacional, em libras esterlinas inglesas que, até 1944, era a principal moeda utilizada nas transações internacionais, apesar do dólar americano vir ocupando, a partir do início do século XX, espaços importantes no comércio internacional. Na medida em que o ouro foi se tornando escasso, também as reservas em ouro foram escasseando. Os países passaram a não possuir a mesma quantidade de ouro para lastrear a quantidade de papel-moeda emitida. A 7 dificuldade de manter as moedas lastreadas em libra esterlina, dólar ou ouro tornou comum, a partir da Primeira Guerra Mundial, a emissão da moeda fiduciária, que ficou conhecida por esse nome devido ao seu curso ser forçado mediante a confiança (fiducia em latim) dada ao Estado emissor de papel-moeda sem lastro ou parcialmente lastreada. Ainda durante a Segunda Guerra Mundial, os EUA, percebendo a fragilidade do mercado internacional e suas moedas, convocou em 1944 a Conferência Monetária Internacional de Bretton Woods. 2.2 A Conferência Monetária Internacional de Bretton Woods Em 1944, foi realizada no Condado de Bretton Woods, no Estado de New Hampshire – EUA, a Conferência Monetária e Financeira da Organização das Nações Unidas. A Conferência foi de suma importância para reorganização do comércio internacional após a Segunda Guerra Mundial. É importante destacar que essa Conferência foi realizada antes do término da Guerra, no mês de julho de 1944, convocada sob a liderança dos Estados Unidos, e reuniu 44 países. No entendimento de Garbossa e Silva (2018), Bretton Woods representou um marco na história monetária internacional. Para esses autores, foi nessa Conferência Monetária que os Estados Unidos apresentaram sua moeda como uma moeda internacional, propondo ao comércio internacional que todas as moedas pudessem ter no Dólar (US$) sua referência de moeda forte e lastreada (Garbossa; Silva, 2018). Para que os 44 países aceitassem e fossem signatários do Tratado de Bretton Woods, foram destacados os problemas econômicos gerados pela crise de 1929 e a necessidade de se reorganizar o comércio internacional diante das ações dos países que vinham, por meio de elevações tarifárias, ampliando o saldo e tornando superavitária sua balança comercial, em detrimento dos países vizinhos. Além disso, havia uma necessidade de redefinir o caminho a ser seguido pelas nações no pós-Guerra, pois o capitalismo internacional se deparava com aquilo que havia se tornado uma ameaça constante, o socialismo soviético. Um dos grandes objetivos era convencer os 730 delegados, dentre eles os representantes brasileiros, da necessidade de fortalecimento do capitalismo mundial por meio da escolha do dólar como moeda internacional. Justificava-se para isso que a moeda americana era lastreada em ouro. Além disso, era apresentada como proposta a criação de instituições bancárias e financeiras que 8 pudessem contribuir para a nova geopolítica do comércio internacional e do capitalismo mundial. Na Conferência de Bretton Woods, o dólar foi apresentado como a moeda internacional com maiores possibilidades para garantir a existência do livre mercado entre os países. Foi defendida como uma moeda estabelecida no padrão ouro, adequada à utilização por diversos países como referência monetária internacional. De acordo com Garbossa e Silva (2018), isso foi contestado pelo representante britânico na Conferência, John Maynard Keynes (1883-1946). Keynes foi um dos maiores nomes do pensamento econômico do século XX e se destacou por se opor às teorias da economia clássica de autorregulação do mercado. Na Conferência, esse economista defendeu a manutenção da hegemonia da libra esterlina, moeda inglesa, sobre as demais moedas, inclusive sobre o dólar. Os argumentos do célebre lorde inglês não foram suficientes para convencer os delegados presentes em Bretton Woods de que a Inglaterra, depois de passar pela Segunda Guerra Mundial, conseguiria bancar sua moeda, a libra esterlina, com lastro metálico. Dentre os objetivos principais dessa Conferência Monetária, além do interesse dos Estados Unidos em impor aos demais países sua moeda como moeda internacional, estava a busca pela estabilidade da moeda nos países participantes, o processo de reconstrução dos países destruídos pela guerra e a nova geopolítica mundial. As evidências urgentes de se pensarem estratégias para um futuro no qual haveria a necessidade de se enfrentarem os problemas ocasionados pela tragédia da Segunda Guerra Mundial e a nova geopolítica que apontava o fortalecimento da URSS e do avanço socialista proporcionaram a criação de instituições que serão a base de sustentação do sistema capitalista de Bretton Woods para frente. Uma dessas instituições foi o FMI. TEMA 3 – O FMI E AS ESTRATÉGIAS PARA ASSEGURAR UMA GEOPOLÍTICA CAPITALISTA O Fundo Monetário Internacional (FMI) foi outra instituição criada em Bretton Woods em 1944 e de grande importância para o desenvolvimento do comércio internacional. O FMI tem sua sede em Washington (EUA) e compõe junto com o Grupo Banco Mundial o Sistema Financeiro Internacional (SFI). Tem como objetivo a captação de fundos, por meio de uma cooperação dos países membros para manter o SFI. Cada país membro contribui com uma cota de 9 participação para o Fundo. Essa cota depende da posição do país em relação ao seu nível de desenvolvimento capitalista. Dentre outros objetivos estão a solvência do dólar em relação às moedas internacionais e a coordenação da paridade das demais moedas em relação à moeda americana, para evitar que alguns países busquem obter vantagens na exportação de seus produtos no mercado internacional por meio da desvalorização de suas moedas. Em 1944, na Conferência de Bretton Woods, foram apresentadas duas propostas de instituições para servir como organização de fomento e crédito para o desenvolvimento dos países e evitar novos confrontos bélicos internacionais: uma de John Maynard Keynes (1883-1946), Secretário do Tesouro britânico, e outra de Harry Dexter White (1892-1948), Secretário do Tesouro norte-americano. Keynes pretendia criar um modelo de banco de crédito internacional que promovesse a união de compensações internacionais,que tivesse o papel de agir como um regulador da atuação dos bancos centrais nacionais. Com um Banco Central Mundial pretendia captar recursos por meio dos Estados membros para fornecer créditos aos países, evitando excessos. Para Keynes, o banco não poderia ter ingerência sobre os países recebedores tomadores de empréstimos e os países pobres poderiam ser subsidiados por créditos adicionais com juros menores. Para White, deveria ser criada uma instituição com a capacidade de possuir fundos por meio de uma moeda forte, lastreada em ouro para financiar a reconstrução e o desenvolvimento dos países. Segundo a proposta de White, os países deveriam se ajustar às determinações da instituição para que pudessem receber recursos em moeda internacional, que deveria ser o dólar americano. Prevaleceu a proposta de White e assim foi criado o FMI. O FMI – Fundo Monetário Internacional, apesar ter sido criado na Conferência Monetária Internacional de Bretton Woods-EUA, em 1944, é uma instituição multilateral especializada da ONU – Organização das Nações Unidas, sediada em Washington nos Estados Unidos. É uma instituição que tem em seus quadros de associados quase todos os países industrializados do mundo capitalista. Cada país contribui com uma parte para a composição dos recursos do FMI. Uma de suas funções, para o qual foi criado, é controlar a paridade monetária das moedas dos países com o ouro, tendo a moeda americana como referência, no mundo capitalista. O FMI também é utilizado como um fundo aos quais os países podem recorrer de acordo com os problemas econômicos, detectados pelos agentes do Fundo nesses países. O Fundo atua como propositor 10 de medidas que podem ser adotados pelos países para melhoria de suas economias. De acordo com Sandroni (2007, p. 348), quando há solicitações de auxílios por parte dos países, “o FMI oferece assistência, fiel a uma política do tipo monetarista (taxa cambial única e fixa, moeda conversível, corte nos gastos públicos, contenção salarial etc.), que nem sempre atende aos interesses dos países”. O FMI, o Banco Mundial e o GATT foram, até a década de 1990, as organizações dominantes, com capacidade de intervenção em todos os continentes e de alterarem a geopolítica internacional. Apesar de inicialmente estarem ligadas às Organizações das Nações Unidas (ONU) e agirem como se representassem os interesses de todas as nações, implicitamente tais organizações agiam e agem com o objetivo de expandir os interesses do grande capital com sede nas maiores economias mundiais. O GATT, em 1995, passou por uma reformulação e tomou uma outra nomenclatura, a Organização Mundial do Comércio (OMC). Apesar de a cidade de Londres (Inglaterra) ter sido proposta por Keynes primeiramente como sede do FMI, os representantes norte-americanos sugeriram a capital dos EUA, Washington como sede. Por entender que geopoliticamente a Inglaterra perderia importância caso a sede da instituição ficasse em Washington, Keynes propôs então, a cidade de Nova York (EUA) como sede do FMI. Os EUA, por possuírem os maiores argumentos, o da força política e o de possuírem a maior quantidade em moeda padrão-ouro e ainda a possibilidade de a imprimirem, acabaram garantindo a cidade de Washington como sede do FMI. Assim, o padrão ouro que vinha sendo sustentado pela libra inglesa desde 1870 no comércio internacional acabou sendo substituído pelo US$ com a criação do FMI. Assim, a partir de 1944, o FMI se tornou uma instituição fundamental na geopolítica mundial, tendo como uma de suas organizações executivas o Grupo Banco Mundial (BIRD e AID). TEMA 4 – AS INSTITUIÇÕES DE BRETTON WOODS E A GEOPOLÍTICA INTERNACIONAL (O BANCO MUNDIAL E A AID) Dentre as instituições criadas pela Conferência Mundial de Bretton Woods está o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD). Pela sua importância geopolítica, o BIRD ficou conhecido e popularizado como Banco Mundial (World Bank), que foi criado para promover empréstimos e 11 financiamentos aos países destruídos pela guerra, assim como contribuir para o desenvolvimento econômico dos países mais pobres. Estrategicamente, o BIRD foi constituído com base em recursos capitalizados junto aos países membros. Em 1946, quando o BIRD começou a operar, ficou definido que os países com maior poder de comando sobre o Banco seriam aqueles com posse da maior quantidade de reservas em moeda internacional, definidas pela Conferência de Bretton Woods. Assim, os EUA ficaram sendo o país com maior poder de decisão dentro do Banco Mundial. No entendimento de Pereira (2010), diante das alterações geopolíticas com o Plano Marshall e a Guerra Fria, para dar conta de atender a seus objetivos, o Banco passou a criar outras instituições que pudessem contribuir para melhorar o atendimento às demandas surgidas após o período referenciado. Em 1956, foi criada a Corporação Financeira internacional (CFI), que visava especificamente atender os países em desenvolvimento, principalmente as demandas privadas desses países. Também foi criada, em 1966, a Agência Internacional de Desenvolvimento (AID), objetivando atender às demandas dos países mais pobres que ficaram de fora do projeto inicial de reconstrução e desenvolvimento do pós-guerra. Assim, países como o Brasil, a Índia e países africanos passaram a demandar e ter acesso aos empréstimos e investimentos dessas instituições financeiras e de desenvolvimento, dentro da lógica da aproximação desses países aos interesses do Banco Mundial e do propósitos estabelecidos pela Conferência de Bretton Woods. Em decorrência das demandas e dificuldades enfrentadas pelos países pobres e em desenvolvimento, o Banco Mundial e suas instituições passaram a ter uma influência muito grande sobre eles. Além de empréstimos e financiamentos, o BIRD passou a oferecer assessorias técnicas na elaboração de projetos e orientações sobre decisões internas desses países como na elaboração de políticas públicas e decisões políticas. Até porque um dos grandes objetivos das instituições de Bretton Woods, desde o princípio, foi alinhar os países ao modelo econômico dos Estados Unidos. Muitas vezes o tipo de projeto financiado tinha relação com modelos de desenvolvimento estabelecidos pelas linhas gerais do Banco, porém impactavam de forma negativa sobre as questões sociais dos países, como os graves problemas ambientais causados pelo financiamento de barragens e de rodovias. 12 Como muitos países haviam encontrado o caminho dos bancos privados para seus financiamentos, o BIRD, por meio da AID, se especializou no assessoramento e atendimento aos países mais pobres, visando garantir empréstimos a fundo perdido e subsídios a esses países, por meio de incentivos a experiências inovadoras e projetos que pudessem minimizar as condições de pobreza desses países. Para muitos autores como Harvey (2005), Davis (2006), Chossudovsky (1999), dentre outros, o Banco financiou projetos e obras de infraestrutura, como rodovias, barragens, usinas e portos, que provocaram danos irreversíveis ao meio ambiente e trouxeram prejuízos às pessoas que necessitam dos rios, mares e florestas, que foram devastadas por tais projetos. A partir da década de 1970 e das Conferências sobre o clima e meio ambiente, o Banco passou a ter como estratégia a introdução, em seus documentos e suas ações, de questões relacionadas à preservação ambiental e a preocupações sociais. Para Santos (2015), acabar com a pobreza foi sempre um grande problema para o capitalismo globalizado, principalmente porque há uma relativização da pobreza ao não consumo, o que representa não existência de mercado para muitos dos produtos massificados globalmente. Dessa forma, a intenção do capitalismo de combater a pobreza de forma global, direcionada pelo Banco Mundial em diferentes regiõesgeográficas do planeta, é parcializada, segmentada e não resolve os verdadeiros problemas dos países. Para esse autor, o Banco Mundial, com conivência dos governos nacionais, “financia programas de atenção aos pobres, querendo passar a impressão de se interessar pelos desvalidos, quando, estruturalmente, é o grande produtor da pobreza” (Santos, 2015, p. 73). Para Pereira (2008), o Banco Mundial e a AID, a partir da década de 1960, serviram aos interesses ideológicos norte-americanos, apresentando-se como combatentes, mais discursivos do que efetivos, da pobreza, buscando sufocar os ideais socialistas de igualdade e de melhoria da qualidade de vida nos países pobres. Também se colocou como um promotor das grandes empresas e laboratórios agrícolas multinacionais, subsidiando alterações no modo de produção agrícola dos países periféricos pela produção de grandes extensões, baseada em alta tecnologia, de agrotóxicos e de outros defensivos agrícolas. Os maiores beneficiados de todo o trabalho desempenhado pelo Grupo Banco Mundial (Banco Mundial e AID) foram as grandes empresas multinacionais, principalmente as norte-americanas, o próprio governo dos EUA e Wall Street. O 13 Grupo passou a acompanhar o nível de crescimento dos países e de suas contas por meio dos seus balanços de pagamentos. TEMA 5 – O BALANÇO DE PAGAMENTOS E A GEOPOLÍTICA INTERNACIONAL O balanço de pagamentos tem sua origem ainda no período mercantilista quando um de seus principais articuladores, o economista inglês Thomas Mun (1575-1641), filho de um comerciante londrino, dedicou-se com êxito ao comércio exterior viajando pela Itália e pelo Oriente Médio. De 1615 até o fim da vida foi Conselheiro da Companhia das Índias Orientais e relatou toda a sua experiência na obra A Discourse of trade from England unto the East Indies (uma dissertação sobre o comércio da Inglaterra com as Índias Orientais) de 1621. Na obra, defendeu a necessidade da organização de uma contabilidade que levasse em conta as saídas e entradas de metais preciosos (ouro e prata, moedas com valores intrínsecos) no país, principalmente porque entendia que, por meio do comércio exterior, o país possuía seu principal instrumento do enriquecimento. Em sua principal obra England’s Treasury by Forreign Trade (O tesouro da Inglaterra obtido pelo Comércio Exterior), obra escrita em 1630, mas só publicada em 1664, defendeu que o comércio exterior era o principal instrumento para o país alcançar o enriquecimento. Essa relação do comércio exterior com a balança comercial está fortemente presente em uma das mais importantes obras sobre a política mercantilista escrita pelo economista austríaco Phillip von Hornick (1638-1712). Em sua obra, de 1684, “A Áustria acima das outras nações, se ela assim o desejar”, apresentou uma lista contendo “9 regras mais importantes da economia nacional”. No entendimento desse autor, para que um país como a Áustria pudesse ser rico, deveria ter como premissa estudar o solo de seu território com o máximo cuidado, considerando cada espaço como possibilidade agrícola. Deveria também manufaturar em seu território todos os produtos primários que não pudessem ser consumidos em sua forma natural. Defendeu ainda que a população deveria ser do tamanho que o país pudesse atendê-la satisfatoriamente e que os habitantes do país deveriam fazer todos os esforços para se contentar com os produtos domésticos. Enfatizou que todo o ouro e toda a prata da Áustria não deveriam ser retiradas sob nenhum pretexto, ou seja, o metal precioso deveria ser mantido no país. Propagou ainda que os produtos primários estrangeiros não deveriam receber em troca ouro ou prata e sim outros produtos domésticos manufaturados. Propôs que os produtos 14 importados estivessem em seu estado in natura para serem transformados dentro do território austríaco. Para os estrangeiros, conforme esse economista, deveriam ser vendidos produtos manufaturados, cabendo à Áustria importar apenas os produtos cuja oferta interna não fosse suficiente, mas com qualidade acima dos existentes internamente. A preocupação com a obtenção de um saldo positivo nas transações econômicas com outros países ou colônias levou os mercantilistas a desenvolverem um sistema contábil semelhante ao que chamamos modernamente de “Balanço de Pagamentos”. Um dos precursores desse sistema foi Edward de Misselden (1608-1654), que, em seus manuscritos, publicados em 1623, destacou como as transações do comércio internacional afetavam a política monetária dos países. Para tanto, ele concebeu um balanço de pagamentos contendo diversas contas em que sequencialmente figuravam os seguintes elementos: 1. Balança Comercial: a. Mercadorias visíveis; b. Itens invisíveis; 2. Conta de Capital: a. Capital de Curto Prazo; b. Capital de longo prazo; 3. Transferências unilaterais; 4. Ouro e prata; 5. Erros e omissões. Utilizando seu modelo de balanço de pagamentos, esse economista britânico calculou pela primeira vez o balanço de pagamentos de seu país. Na atual conjuntura, o balanço de pagamentos passou a ser estruturado e acompanhado pelo FMI, após a Conferência Monetária Internacional de Bretton Woods (1944) e do Acordo Geral de Tratados e Tarifas (GATT) de 1947. Conforme Sandroni (2007) e Rossetti (2003), o balanço de pagamentos representa o registro de todas as transações econômicas e financeiras que os habitantes de um país tem com outros países. Composto por quatro contas específicas, o balanço de pagamentos registra a entrada e saída de divisas relacionadas às transações com bens e serviços e capitais físicos e financeiros entre o país e os demais países. Conforme o tipo de transação econômica e financeira realizada, ela pode ser 15 registrada em diferentes grupos de contas, que se somam ao final do balanço de pagamentos. Desde 1947, o Fundo Monetário Internacional (FMI) vem baixando novas resoluções para o registro das contas de transações internacionais entre os residentes no país e os residentes em outros países. Os intervalos entre cada resolução têm sido de aproximadamente dez anos. A última resolução colocada em prática pelo Brasil, em 2015, é a 6ª edição do Manual de balanço de pagamentos (MBP) e foi publicada pelo Fundo Monetário Internacional em 2009. Até então, a 5ª versão do MBP, utilizada pelo país desde 2001, havia sido editada pelo FMI em 1993. Normalmente as versões novas dos manuais buscam trazer inovações ao balanço de pagamentos (BP) do país, harmonizando suas contas com as contas do setor externo, diante de compromissos e acordos assumidos juntos ao FMI e aos países que compõem o G20. A 6ª edição do Manual de Balanço de Pagamentos (MBP) coloca as contas externas do Brasil de acordo com as contas internacionais da maioria dos países do mundo que já aderiram à metodologia avançada de divulgação de seus BPs. Assim, o BP se situa com o mesmo padrão de contas em uma geopolítica que inclui os países europeus, os EUA, a África do Sul, a Arábia Saudita, a Austrália, o Canadá, o Chile, a Colômbia, a Coreia do Sul, as Filipinas, a Índia, a Indonésia, a Malásia, a Rússia e a Tailândia. A cada nova edição são incluídos novos procedimentos que abordam novos conceitos para as contas que já existiam no BP. Também são alteradas uma ou outra nomenclatura. Um novo estilo de apresentação é acrescentado, assim como utilizadas novas fontes de informações que consistirão na base de apresentação do BP do Brasil para o resto do mundo. Hoje, a composição do balanço de pagamentos brasileiro, conforme a 6ª edição do Manual de Balanço de Pagamentos (MBP), apresentando o registro estatístico de todas as transações – fluxo de bens e direitos de valor econômico – entre os residentes de uma economia e o restante do mundo, ocorridos em determinado período de tempo e divulgadospelo Banco Central, é a seguinte: 16 Quadro 1 – Composição do balanço de pagamentos brasileiro TRANSAÇÕES CORRENTES Balança Comercial o Exportações o Importações Balança de Serviços o Transportes o Viagens internacionais o Seguros o Serviços governamentais o Serviços financeiros o Computação e informação o Royalties e licenças o Aluguel de equipamentos o Serviços de comunicações o Serviços de construção o Serviços relativos ao comércio o Serviços empresariais, profissionais e técnicos o Serviços Pessoais, culturais e recreação Serviços diversos Rendas o Rendas – salário e ordenado o Rendas – lucros e dividendos o Rendas – juros Transferências Unilaterais Correntes CONTA DE CAPITAL CONTA FINANCEIRA o Investimento direto o Investimento estrangeiro direto Investimento em carteira o Investimento brasileiro em carteira Derivativos o Outros investimentos o Outros investimentos brasileiros o Outros investimentos estrangeiros ERROS E OMISSÕES Haveres da Autoridade Monetária Fonte: Banco Central do Brasil, 2018. Por meio do Quadro do Balanço de Pagamentos, signatários das resoluções da ONU, com a edição de seus manuais, podem acompanhar todas 17 as entradas e saídas de divisas do país, observando as relações existentes entre indivíduos do país com outros países. A balança comercial registra os valores das exportações e das importações. Se o valor das exportações superar o das importações, há um superávit na balança comercial. Se acontecer o contrário, teremos um déficit; e, se os valores forem equivalentes, a balança comercial estará em equilíbrio. Na Balança de Serviços são registradas as despesas e receitas de diversos tipos realizadas pelo país, tais como: transportes, viagens internacionais, seguros, serviços governamentais, serviços financeiros, computação e informação, royalties e licenças, aluguel de equipamentos, serviços de comunicações, serviços de construção, serviços relativos ao comércio, serviços empresariais, profissionais e técnicos, serviços Pessoais, culturais e recreação, e ainda serviços diversos. Há ainda a Conta de Rendas, que relaciona as rendas advindas de salários e ordenados, as rendas de lucros e dividendos e as rendas de juros. Também, constam no balanço de pagamentos as transferências unilaterais, em que são registradas as contas de donativos ou de manutenção de embaixadas e serviços consulares, ou mesmo de imigrantes que mandam parte de seus recursos para familiares em seus países de origem. Nas Contas de Capital e Contas Financeira, são apresentados os resultados com investimentos diretos realizados no país, assim como os investimentos e reinvestimentos das empresas estrangeiras estabelecidas no Brasil e as saídas de investimentos de empresas nacionais estabelecidas no exterior. Também são relacionados os investimentos em carteira tanto de residentes do país quanto de estrangeiros, assim como são apresentados ainda os investimentos em derivativos. Na conta Erros e Omissões é apresentada uma rubrica contendo o registro das diferenças decorrentes de erros e omissões por variação na taxa de câmbio ou na tabulação final dos resultados dos haveres da autoridade monetária. O Resultado Final do Balanço de Pagamentos é apresentado por meio das entradas das receitas totais (entradas) menos as saídas de receitas, representado um déficit (se o saldo for negativo) ou um superávit (se o saldo for positivo). Se as receitas forem iguais as saídas, haverá um equilíbrio no Saldo do Balanço de Pagamentos. 18 REFERÊNCIAS BANCO CENTRAL DO BRASIL. Informações econômicas – financeiras: séries temporais metadados. BCB, 2018. Disponível em: <https://www4.bcb.gov.br/pec/series/port/metadados/mg182p.htm>. Acesso em; 26 mar. 2019. CHOSSUDOVSKY, M. A globalização da pobreza: impactos das reformas do FMI e do Banco Mundial. São Paulo: Moderna, 1999. DALLA COSTA, A. J. SANTOS, J. R. S. Economia internacional: teoria e prática. Curitiba: InterSaberes, 2011. DAVIS, M. Planeta favelas. Rio de Janeiro: Boitempo, 2006. GARBOSSA, R. A.; SILVA, R. S. Geografia política e geopolítica. Curitiba: InterSaberes, 2018. HARVEY, D. A produção capitalista do espaço. São Paulo: Annablume, 2005. KEYNES, J. M. Teoria geral do emprego, do juro e da moeda. Tradução Manuel Resende. São Paulo: Saraiva, 2012. PEREIRA, J. M. M. O Banco Mundial como ator político, intelectual e financeiro (1944 – 2008). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. ROSSETTI, J. P. Introdução a economia. São Paulo: Atlas, 2003. SANDRONI, P. Dicionário de economia do século XXI. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2007. SANTOS, M. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2015. VASCONCELLOS, M. A. S. de.; GARCIA, M. H. Fundamentos de economia. São Paulo: Saraiva, 2008. AULA 5 ESPAÇO GEOGRÁFICO, ECONOMIA E COMÉRCIO INTERNACIONAL Prof. Rodolfo dos Santos Silva 2 CONVERSA INICIAL Este texto discute como os seres humanos se apropriam do espaço geográfico para realizar transações econômicas nos diferentes locais, lugares e territórios, garantindo a produção e o consumo, seja através de novas metodologias, como supply chain, de envolvimento dos gestores e suas relações com a cadeia de suprimentos, ou com supply value. Através da cadeia de suprimentos e da cadeia de valores, busca-se atingir maiores vantagens competitivas nos circuitos espaciais de produção. Busca-se também entender como as vantagens competitivas se dão em um contexto de globalização dentro de uma sistemática de interligações entre os países, e como elas envolvem seus circuitos de produção e suas relações de interdependência com o Estado e com as grandes corporações capitalistas. Vamos discutir, também, a influência da reestruturação produtiva, a partir da década de 1970, sobre a nova lógica de localização, produção e acumulação capitalista e, dessa forma, como esse modelo de produção fordista de massa, padronizado, foi substituído por um modelo de racionalização e flexibilidade. Também buscamos entender o processo de remodelação sobre a maneira de produzir bens e serviços, o que dinamizou a concorrência intercapitalista, e como isso influenciou a já bastante complexa divisão internacional do trabalho. Também abordamos a ampliação dessa complexidade a partir da implementação de políticas governamentais neoliberais nas economias capitalistas, a partir da década de 1990, e como a neoliberalização influenciou os padrões e processos de produção e atividades relacionadas em diferentes lugares, locais, territórios e escalas. TEMA 1 –CADEIA DE SUPRIMENTOS (SUPPLY CHAIN) As relações econômicas entre os países, através da globalização, proporcionam uma série de bens e serviços, que ultrapassam suas fronteiras geográficas. Nessa relação entre o país produtor e o destino de sua produção no comércio internacional, está o supply chain, um termo inglês bastante utilizado para designar os procedimentos de uma cadeia de produção que formam as demandas correntes de um país, desde a extração da matéria-prima até o consumidor final. Para se chegar a um resultado melhor dentro desse encadeamento produtivo, há que se considerar o envolvimento de todos os 3 agentes econômicos e instituições que fazem parte do processo. Nessa cadeia produtiva estão o coletor, ou extrativista, ou ainda o produtor da matéria-prima, os demais envolvidos no processo de produção, os fornecedores, os estoques e o armazenamento, o setor de distribuição, as empresas de comércio varejista e atacadistas, até chegar ao consumidor final. Crédito: Thyago Macson. Quando se tem uma boa gestão da Cadeia de Suprimentos (Supply Chain), é muito provávelque os resultados alcançados estejam dentro dos objetivos traçados, atendendo aos interesses dos negócios empresariais e dos consumidores. Para isso, é importante que o produtor compreenda que, ao confeccionar determinado produto até o momento em que ele passe a agregar valor de mercado, e se torne uma mercadoria acabada, é necessário um longo caminho, de muitas etapas. Essas etapas estão relacionadas a cada parte do processo produtivo. Para entender melhor: na cadeia produtiva de roupas de algodão, para que tudo ocorra conforme o planejado, é necessário acompanhar desde o cultivo da terra, sua preparação, os cuidados com o plantio do algodão, os defensivos agrícolas, a colheita, o ensacamento através de fardos, o deslocamento até o seu processo de transformação em fios para a industrialização têxtil. Nesse processo de industrialização, o tecido pode receber corantes artificiais que determinarão suas cores conforme o fabricante de roupas assim o desejar. O fabricante poderá transformar em tecidos aqueles que serão encaminhados para atender ao mercado atacadista ou varejista interno ou externo. Assim, chega-se até o consumidor final. 4 A padronização do circuito de produção espacial, com o fluxo de informações no rastreamento do conjunto de atividades que se engrenam progressivamente nesse circuito de produção espacial, vai desde a escolha da terra, passando pela utilização de fertilizantes, até o produto acabado, distribuído e comercializado. O processo inclui a boa gestão da cadeia de suprimentos (supply chain management), pois ela tende a favorecer o processo de integração, enquanto elo de produção, e garantir a ampliação dos ganhos de escalas das empresas envolvidas no processo, envolvendo também o setor externo até o consumidor final. Para melhorar o fluxo de informações, há uma série de instrumentos que a informática oferece, através de softwares avançados, que facilitam análise e o acompanhamento de toda a Cadeia Produtiva e dos valores que envolvidos. TEMA 2 – CADEIA DE VALOR (SUPPLY VALUE) E VANTAGENS COMPETITIVAS EM UM CIRCUITOS ESPACIAL DE PRODUÇÃO Uma Cadeia de Valor (Value Chain) tem muitas vantagens competitivas, quando há uma cadeia produtiva consistente. De acordo com Alves (2015), elas se estabelecem em um circuito de produção espacial que vai do produtor da matéria-prima ao consumidor final, representando um ciclo de vida mais longo para os negócios através de suas vantagens competitivas. Há uma interdependência entre todos os participantes desse processo, pois qual cada um tem sua importância. Para se alcançar uma vantagem competitiva, objetivo primeiro de uma empresa, não basta apenas a produção realizada pela empresa, e sim todo o ciclo de produção e o circuito espacial de produção. A vantagem competitiva, dentro de um circuito espacial de produção, segue uma lógica que ultrapassa o custo de produção da empresa, mensurado através de um planejamento estratégico, buscando alcançar o maior valor possível que os compradores estão dispostos a pagar pelos bens e serviços que a empresa tende a oferecer. Quanto maior for o valor pago pelo conjunto de compradores, para além dos custos de produção, em cada um dos processos de produção internos da empresa, mais rentável será a empresa. Para a obtenção de uma compensadora vantagem competitiva da produção de bens e serviços realizados pela empresa em seu Suply Chain (Cadeia de Suprimentos), ou circuito espacial de produção, é necessário proceder à avaliação e análise de cada processo interno da empresa utilizando o Value Chain (Cadeia 5 de Valor), um instrumento analítico que possibilita também a identificação, avaliação e a correlação existente entre a cadeia de produção da empresa e as vantagens competitivas apresentadas. Dessa forma, é possível inferir que as vantagens competitivas da cadeia de valor são intrínsecas às diversas atividades desempenhadas por uma empresa, e também na forma de interação dessas atividades. A empresa executa as atividades com um custo menor ou melhor do que a empresa concorrente. De acordo com Porter (1989), a análise de fontes de vantagem competitiva tem de ocorrer na Cadeia de Valor ou Cadeia de Suprimentos (Suply Chain), ou seja, nas atividades distintas que uma empresa realiza, com vistas a projetar, produzir, comercializar e entregar. Para além disso, na sua continuidade, busca- se ofertar uma rede de suporte ao cliente. Nesse encadeamento de valores, Porter (1989) aponta que a empresa é uma parte de um conjunto maior de atividades agregadas dentro de uma Cadeia de Valor. A cada atividade realizada com sucesso, acrescentam-se novos valores, desde a sua fonte de matéria-prima, passando por todo o processo de produção e comercialização, até a chegada ao seu consumidor final. Para isso, a cada valor adicionado, é possível, através da observação estratégica de cada parte de sua estrutura, identificar as atividades mais relevantes e seus diferentes custos e benefícios oportunizados. Ainda no entendimento de Porter (1989), as vantagens competitivas são estabelecidas não só pela identificação dos custos e valores da empresa em sua cadeia de suprimentos e cadeia de valores, mas sim pela combinação com os valores estabelecidos pelas empresas concorrentes, em cada uma das etapas, abordadas dentro de uma análise de sistema que envolve as cinco forças que regem a competição em um setor. Na opinião do autor, as cincos forças são os clientes, os fornecedores, os novos entrantes em potencial, os produtos substitutos e a rivalidade entre os concorrentes. Se bem utilizada, a análise dessas cinco forças evidencia a formação dos custos e valores, quando combinadas com o desempenho de várias empresas que atuam no mesmo setor, incluindo fornecedores, fabricantes, transportadores, até atacadistas e varejistas. A rivalidade entre os concorrentes é identificada a partir da eficiência dos sistemas que garantem os fluxos de informações sobre o desenvolvimento do produto, desde a matéria-prima até o consumidor final. Na atualidade, os sistemas de informática e de softwares garantem suporte de acompanhamento dos fluxos de produção e de deslocamento do produto, facilitando aos analistas a 6 compreensão da evolução dos custos e das vantagens obtidas em cada parte do processo, em relação às empresas concorrentes. Essa compreensão tende a facilitar a intervenção dos produtores no fluxo deficitário, resultando em maiores vantagens competitivas para as empresas. Santos (2008) destaca a existência de diferentes circuitos quando se trata de observar a economia mundial sobre o prisma geográfico. TEMA 2 – CIRCUITO INFERIOR, CIRCUITO SUPERIOR E ECONOMIA INTERNACIONAL Conforme Santos (2008) a globalização apresenta uma sistemática de interligações entre os países, fazendo com que dependam um do outro. O processo decorre das facilidades proporcionadas pelos sistemas de comunicação e da integração entre as grandes corporações e os Estados capitalistas. Esse sistema enfatiza a relevância das análises geográficas, quando se discute a história e a influência das grandes corporações sobre os espaços. Cada espaço apresenta impacto particular quando é atingido pelas forças de transformações e pelas modernizações tecnológicas. Os países subdesenvolvidos não ocupam uma linha histórica de evolução, da mesma forma que os países desenvolvidos. Não podem ser denominados de em desenvolvimento, porque os espaços onde as forças de transformação podem alterar a realidade ainda são extremamente seletivos. É de se levar em conta que as mudanças são instáveis e multipolarizadas, trazendo como consequência a fragilidade na tomada de decisões de seus governantes e nos interesses divergentes das forças de transformação internas e externas. Com o processo de globalização, há uma concentração espacial da produçãoe do consumo em certas áreas geográficas dos países subdesenvolvidos, que varia conforme a renda, o que é determinado por uma hierarquização das atividades em âmbito regional. Assim, a produção e o consumo dependem da localização e da capacidade do indivíduo no espaço, que não são as mesmas em todos os lugares, nem quantitativamente e nem qualitativamente, porque os modos de produção e consumo locais ainda persistem, mesmo quando os produtos e as formas de consumo padronizadas do modelo de produção globalizado se estendam de forma a atingir escalas abrangentes em cada país. Nesse sentido, Santos (2008), para entender o impacto dessas mudanças, que atingem especialmente as cidades, separa o 7 processo econômico e de organização do espaço em dois subsistemas: o circuito superior e o circuito inferior. O circuito superior tem ligação com o processo de modernização e padronização tecnológica, sob monopolização das grandes corporações e de Estados desenvolvidos, estando normalmente relacionado a processos econômicos e políticos que influenciam internamente países em escala nacional ou internacional. O circuito inferior tem forte relação com as atividades e os pequenos negócios que envolvem as populações dos centros urbanos das regiões e localidades mais pobres dos países subdesenvolvidos. Para Santos (2008), apenas o circuito moderno foi alvo de pesquisas intensivas, por envolver as grandes atividades comerciais e os grandes negócios urbanos, acreditando que pudessem representar toda a economia da cidade, o que de certa forma não envolvia o circuito inferior, das pequenas atividades e suas particularidades espaciais. 3.1 O circuito inferior e o circuito superior O circuito inferior desponta como um grau de importância econômica muito grande, quando analisamos o pequeno comércio das cidades dos países pobres dos vários continentes. Esse circuito é formado por subsistemas dentro de um sistema econômico geral, sendo incomparável internacionalmente com as atividades econômicas de países desenvolvidos, porque o padrão de contabilidade oficial tem sua base nos manuais contábeis dos países desenvolvidos. Por isso, são incapazes de relacionar as atividades do circuito inferior e dimensionar quantitativamente a importância desse circuito, que inclui os profissionais autônomos que atuam na informalidade e as atividades fabris e comerciais de pequeno porte, que nem sempre estão oficialmente registradas nos órgãos municipais, estaduais ou federais. O processo de globalização acelerou o crescimento econômico e a modernização da produção de bens e serviços, porém acelerou também o empobrecimento daqueles que não puderam ser integrados a esse modelo de capitalismo, que inclui alguns e exclui a maioria. Conforme Davis (2006), Chossudowski (1989) e Santos (2008), há casos de aceleração do empobrecimento das populações de diversos países, principalmente na África, Ásia e América Latina e Caribe, que assumem colocar em prática uma proposta de progresso tecnológico que, como pano de fundo, conduz a disparidades sociais 8 e econômicas. Segundo esses autores, é no campo em que os custos sociais são maiores. Isso se deve às dificuldades das famílias de pequenos produtores rurais, que vivem praticamente da produção de subsistência, de arcarem com qualquer custo adicional, como tecnologias que poderiam ampliar suas possibilidades de produção, para que pudessem alcançar um melhor nível de vida. Essas populações mais pobres dependem inteiramente de doações estatais, as quais, na maioria das vezes, não chegam nem perto daqueles que mais necessitam. Conforme Santos (2008, p. 193), “a alocação de uma importante parte dos recursos nacionais é feita em nome do progresso em benefício daqueles que já são ricos e ao preço de uma injustiça crescente”. Oliveira (2006) aponta que a situação das grandes cidades no Brasil só não é tão fortemente atingida pela pobreza quanto na área rural, porque a tecnologia envolvida na agricultura de extensão, como defensivos agrícolas e maquinaria, assim como a exploração do trabalho do camponês assalariado, em grande parte, da forma mais precária imaginável, financiam os produtos que nos alimentam, e servem para minorar a pobreza urbana. Apesar disso, conforme Garbossa e Silva (2016), o modelo de urbanização também é marcado por uma concentração espacial perversa de renda, que reversa os espaços urbanos mais bem infraestruturados para as grandes empresas do capital imobiliário e financeiro, e para as áreas mais distantes do centro, com pouca ou sem nenhuma infraestrutura, como as ambientalmente degradas, às populações mais pobres. Esse contingente de migrantes que saem do campo e vão para a cidade normalmente viabilizam nos grandes centros a criação de um circuito de produção não moderno, que não está inserido na economia de alto padrão tecnológico, o que Santos (2008) chama de circuito inferior. Nesse circuito, são inseridos os trabalhadores informais, que vendem nas ruas os seus produtos, sejam eles artesanais, de pequenas manufaturas ou fruto da agricultura familiar. Há os vendedores de panos para enxugar a louça, redes, chapéus, roupas e óculos; os vendedores de água ou ainda aqueles que vendem alho, frutas ou verduras nas esquinas das metrópoles urbanas ou das cidades médias. Para o autor, todos esses produtos ou produtores não estão adequados a um determinado padrão industrial, e revelam as principais características de um circuito inferior, que envolve empresas familiares de pequeno porte e um grande número de trabalhadores autônomos. Aqui, “o capital é muito pequeno, a tecnologia, obsoleta ou tradicional e a organização, deficiente. A procura de dinheiro líquido é 9 desenfreada. As despesas de publicidade são quase inexistentes. Poucos comerciantes se preocupam em arrumar suas vitrinas” (Santos, 2008, p.198). Em âmbito internacional, pode-se afirmar que o circuito inferior e o circuito superior têm relação com a definição de Colin Clark (1905-1989), que delineou, através de cálculos estatísticos e matemáticos, em publicações entre 1940 e 1960, uma comparação entre as economias de diversos países, propondo a separação da economia em três setores distintos: terciário (comércio), secundário (indústria) e primário (agricultura). Apesar de ser questionado por muitos economistas, essa separação acabou prevalecendo, quando se trata de discutir a economia internacional e buscar entender as economias subdesenvolvidas. É comum considerar países nos quais o maior percentual do PIB está no setor primário da economia (agronegócio e commodities), como subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. Santos (2008) entende que nos três setores existem características do circuito inferior, mas destaca que o processo de terceirização acentua a precariedade nas relações de trabalho, conduzindo boa parte desse processo a problemas relativos à economia do circuito inferior. No entendimento desse autor, o circuito superior despontou com o processo de industrialização. A partir da década de 1960, com a introdução das tecnologias de ponta, que modernizaram a área rural, e com o aprimoramento de novas formas de crédito e a ampliação dos ganhos e lucratividade do setor bancário e financeiro, também os setores primários e secundários ganharam importância no circuito superior. De acordo com Benko (2002), é a partir da década de 1960 que o modelo de produção fordista entra em colapso, já não servindo mais para o processo de acumulação característico do modelo de desenvolvimento capitalista. A era eletrônica toma conta do modo de produção; as bases da produtividade/qualidade do modelo taylorista/fordista se rompem, cedendo espaço para um modelo de acumulação baseado na racionalização/flexibilização de transferência das plantas industriais para regiões geográficas onde os saláriose as condições de produção sejam mais vantajosas para o capitalista, o que acabar por estabelecer uma nova divisão internacional do trabalho. É a necessidade de superação de um modelo de acumulação baseado no welfare state, para um modelo de acumulação flexível. A dinâmica dessa acumulação não é controlada nem pelos Estados capitalistas nacionais, nem pelas formas institucionais de concentração do capital (multinacionais, trustes etc.). 10 Conforme Santos (2008), é a partir dessas alterações no modelo de acumulação capitalista que se insere o circuito superior, marcado pela modernização, que envolve o comércio e a indústria, os setores de importação e exportação, e os bancos, que fazem a ligação entre as atividades urbanas modernas locais e o circuito de acumulação superior. Para o autor, há uma forte dependência das empresas modernas de comércio, como lojas e grandes redes de hipermercados, em relação aos créditos oferecidos pelo setor financeiro. As facilidades oferecidas com a introdução de cartões de crédito, além das compras diretas via sistemas eletrônicos por aplicativos, fortalecem as grandes redes, do atacado ao varejo, representando os setores que mais crescem nos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. O setor moderno da indústria depende muito da capacidade tecnológica do país. Esse setor vem enfrentando a concorrência externa, que oferece no dia a dia inovações tecnológicas, dificilmente acompanhadas por um país que, no entendimento de Oliveira (2013), se compara a um ornitorrinco. O ornitorrinco é aquele animal aquático, mamífero, que põe ovos, tem bico de pato e aspecto bastante estranho. Para esse autor, o Brasil tem um elevado nível de desenvolvimento no setor de agronegócios e, ao mesmo tempo, um pequeno número de pessoas vivendo no campo. Com relação à indústria, grande parte ainda atua como se estivesse na Segunda Revolução Industrial, utilizando tecnologias que não conseguem acompanhar, em quantidade e qualidade, a produção externa. Quando se trata de custos, tem de ser socorrida por subsídios governamentais ou imposições de barreiras aos produtos externos correntes. Apesar disso, ainda se encontram no país indústrias de alto padrão tecnológico, em setores como aviação, biomedicina e biogenética. Por outro lado, as desigualdades sociais e econômicas se intensificam, demonstrando contrastes imensos entre os afortunados e os de extrema miserabilidade. O circuito superior passa por alterações no processo de acumulação, com o comércio, os bancos, o setor financeiro e imobiliário movimentando grande parte do PIB dos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. Aliado a isso, nesses países, grande parte dos produtos são feitos no modo de produção fordista/taylorista, com plantas industriais pesadas e localizadas em determinadas regiões geográficas, como no caso do Brasil. Desde a década de 1970, todos esses países, inclusive os altamente industrializados, vêm enfrentando um novo modelo de acumulação capitalista, de flexibilização com uma nova configuração 11 espacial, caracterizado pela agilidade na alteração dos produtos, na metodologia e nos procedimentos de produção. TEMA 4 – A NOVA LÓGICA DE LOCALIZAÇÃO, PRODUÇÃO E ACUMULAÇÃO CAPITALISTA Benko (2002) defende que, a partir da década de 1970, houve uma reestruturação produtiva, passando de um modelo de produção fordista de massa estandartizado, com uma estrutura rígida que buscava atender as demandas de mercado, para um modelo de racionalização e flexibilidade, que remodelou as práticas de produção anterior. Essa ruptura foi fundamentada na necessidade de o capitalismo tornar mais dinâmica a concorrência intercapitalista, reconfigurando o processo de acumulação dentro de uma nova divisão internacional do trabalho. Para esse autor, o modelo fordista/taylorista buscava desenvolver-se em regiões geográficas especificas, favorecidas por farta mão-de-obra e incentivos governamentais. Destaca-se o contexto de uma grande metrópole, como São Paulo, Vale do Huhr na Alemanha, e Vale do Sena na França, no nordeste dos EUA e em Milão, Gênova e Turim na Itália. Nessa nova divisão internacional do trabalho, há uma transferência das unidades corporativas e suas plantas industriais, desta vez com unidades de produção menores e mais ágeis, para regiões com salários mais baixos, além de menos rigidez e regulações por parte do Estado. Busca-se o aumento da produtividade através de planos de autonomia e iniciativas com responsabilidades mais profundas por parte dos trabalhadores, remodelando o mercado de trabalho, para que haja um retorno mais rápido, e com menores investimentos, objetivando o máximo de lucro e custos menores, facilitando assim o processo de acumulação. Esse novo modelo redistribui no mundo capitalista o mapa dos poderes, como resultado de um desenvolvimento econômico produtivo-social keynesiano, sob o acompanhamento do Estado – o qual, ao mesmo tempo em que atuava como empresário, também provia leis que estimulavam o welfare state. Esse modelo, que durante muito tempo sustentou as trocas e o comércio internacional, e também o progresso técnico, teve sua fase de maturação logo após o final da década de 1960. Diante das crises da década posterior, o modelo foi considerado esgotado em seu papel de ampliar a lucratividade na velocidade que os dirigentes do mundo capitalista necessitavam. 12 A partir da década de 1970, Conforme Benko (2002), o novo modelo de acumulação busca alterar os modos de produção e consumo, interferindo nas relações sociais internas do país, assim como nas suas relações com outros países. Há interferência também na localização dos setores produtivos, do comércio, da moradia dos trabalhadores, dos poderes locais e, até mesmo o tipo de produção que será estabelecida em determinada região. Essa reestruturação espacial da sociedade reforça a ideia de um modelo com mecanismo de interferência, podendo redefinir a forma de pensar o espaço, a ideologia dominante e as relações de trabalho. “A maior flexibilidade favorece a desintegração vertical das relações de proximidade entre dirigente e subcontratante, a troca contínua de informações e, portanto, a proximidade espacial, que permite a interação e a regulação final do processo de produção global” (Benko, 2002, p. 29). Harvey (2016) destaca que essa flexibilidade do novo modelo de acumulação capitalista se esforça para produzir uma paisagem favorável à sua reprodução e evolução. Diante das suas tantas contradições, os capitalistas se apoderam dos poderes estatais para moldar as paisagens geográficas de acordo com seus interesses. Para esse autor, não há passividade nas paisagens geográficas construídas pelo capital, pois elas se alteram conforme os investimentos autônomos e contraditórios do desenvolvimento tecnológico. As contradições entre capital e trabalho realizadas no lugar, no espaço e no tempo, são necessárias para que o capitalismo possa continuar se reinventando; caso contrário, já haveria se desintegrado e deixado de existir. Para esse autor, capital e trabalho devem atuar juntos para redefinir os investimentos naquilo que melhor contribui para o processo de acumulação capitalista. No Brasil, conforme Cano (2011), houve uma transformação radical nas estruturas de produção do país a partir da década de 1990, quando foram implementadas políticas econômicas em base nacional, proporcionando resultados que impactaram a produção, o consumo, o emprego e as relações internacionais. Para o autor, com o advento da Constituição Federal de 1988, as mudanças se deram também no campo das políticas sociais e da organização estatal, contribuindo para que houvesse uma maior integração entre as regiões. Esse modelo foi providencial para um maior desenvolvimento do processo de urbanização e para o crescimento dascidades. 13 Quando se trata de desenvolvimento econômico, social e industrial, a década de 1980 foi percebida por muitos economistas como uma década perdida. Mesmo sendo considerada atrelada ainda ao modelo fordista/taylorista, nessa década, a indústria de transformação despontava como a mais dinâmica dentre os setores da economia brasileira. Conforme Cano (2011), a industrialização brasileira deu um passo atrás, ficando muito aquém do que se esperava, enquanto o processo de reestruturação produtiva dos países capitalistas avançava em ritmo acelerado. Houve um processo de desconcentração industrial muito pequeno, mas a crise industrial foi grande, e afetou todos os setores da economia do país, que acabou colhendo resultados menos piores nos “segmentos mais vinculados às exportações agroindustriais, minerais e de insumos básicos, além dos vinculados à questão energética, como álcool de cana-de-açúcar e petróleo, este decorrente da forte extração na Bacia de Campos, no RJ” (Cano, 2011, p.13). Santos (2008) entende que as economias de países periféricos, como o Brasil, estão sujeitas a interferências de empresas oligopolistas transnacionais, e por isso não conseguem se contrapor à centralização dos recursos no circuito superior da economia. Para o autor, nas menores cidades há uma participação maior do circuito inferior na economia, porém isso não impede o crescimento da pobreza extrema nessas localidades. O Estado não consegue reduzir a transferência de capitais dessas empresas transnacionais para suas matrizes – pelo contrário, a atração das empresas para países pobres ocorre com o aceno de muitas vantagens, dentre as quais estão a cessão de infraestrutura, mão de obra barata, além de facilidades na remessa de lucros e dividendos para o exterior. A partir da implantação do neoliberalismo, no novo modelo de acumulação capitalista, houve uma maior abertura para a entrada de capitais externos e uma desregulação do mercado, e muitas facilidades para o escoamento de capitais dos países pobres para os países mais ricos. TEMA 5 – A LÓGICA DA FINANCEIRIZAÇÃO GLOBALIZADA E O NEOLIBERALISMO Harvey (2016) afirma que, para que esse modelo de acumulação capitalista se perpetue, é necessário que o capitalismo esteja sempre se reinventando, como ocorreu durante a longa e persistente crise de 1929. O capitalismo só conseguiu uma certa recuperação desse impacto após a Segunda Guerra Mundial, na década de 1950. O capitalismo também teve que se reinventar no enfrentamento 14 das crises cambiais e das manifestações em defesa de liberdades sociais e econômicas, ocorridas em praticamente todas as grandes cidades em 1968, assim como as crises do petróleo do início e do final da década de 1970. Para o autor, o desmantelamento das políticas de proteção aos trabalhadores e da desregulamentação de uma série de leis que favoreciam um controle maior do Estado, serviu para o benefício de um modelo de capitalismo financeirizado globalmente e hiperendividado, que teve sua base sustentada nas propostas econômicas neoliberais implementadas por Reagan, Thacher e Kohl, que corroboraram para a previsível crise econômica de 2008. A implementação de políticas governamentais neoliberais nas economias capitalistas foi medida decisiva para colocar em marcha um plano de redução do poder do Estado na economia, com vistas a promover mudanças que favorecessem as grandes empresas transnacionais. A partir de um discurso de estabilidade e autossustentação econômica, modernização do parque industrial e elevação do nível de produtividade, países em desenvolvimento colocaram em prática reformas que tinham como objetivo também a redução do déficit fiscal e da dívida pública. No caso brasileiro, isso teve início com o governo Collor, e continuou nos governos de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, sem deixar de influenciar também as políticas implementadas nos governos de Lula e Dilma Roussef. Segundo Cano (2011), as políticas empenhadas na dinâmica neoliberal trouxeram ao país um modelo que resultou em muitas mazelas, como “aumento do desemprego, queda dos salários reais, corte dos gastos sociais e aumento da violência hoje presentes em todas nossas regiões e cidades” (Cano, 2011, p. 26). Para Brenner (2018), a neoliberalização, característica singular do neoliberalismo, vem sendo imposta há mais de 40 anos de forma diversificada, com um padrão de processos e atividades relacionadas, que vem sendo reproduzido em diferentes lugares, locais, territórios e escalas, objetivando garantir os interesses do mercado nas práticas políticas do Estado. Para esse autor, a neoliberalização surgiu como uma alternativa hegemônica de reestruturação regulatória da economia mundial, com intenções diversificadas do liberalismo clássico, associado ao imperialismo britânico do século XIX, que ganhou impulso a partir da crise do modelo nacional-desenvolvimentista em bases keynesianas durante a década de 1970. Apesar de ter sido desigualmente implementadas durante os vários anos que se seguiram, foram apresentadas 15 como soluções milagrosas para a crise, extensamente divulgadas e implementadas por organizações como Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Banco Mundial e FMI. O modelo de neoliberalização, implementado depois da década de 1990, buscou reestruturar os arcabouços geoinstitucionais, de forma a atender a interesses não apenas dos EUA, como também das diretrizes forjadas no Consenso de Washington, e de instituições supranacionais, como a Organização Mundial do Comércio (OMC), o G8 ou OCDE. Esse modelo, aplicado como um receituário único para diversos países terceiro-mundistas, tinha como principais diretrizes: privatização de empresas estatais, desregulação, liberalização financeira, abertura ao capital estrangeiro, e criação de novos circuitos de interjurisdicionais, para promover, legitimar e influenciar as lideranças políticas, a sociedade e o Estado da necessidade de colocar tais medidas em prática. Para tanto, esse processo de neoliberalização, que antes aparentava uma certa desarticulação, transformou-se em uma organizada e orquestrada rede transnacional, cujos “padrões de influência, coordenação e trocas recíprocas foram estabelecidos entre programas de reforma neoliberalizadoras em contextos e escalas jurisdicionais diversos” (Brenner, 2018, p.182). 16 REFERÊNCIAS ALVES, A. R. Geografia econômica e geografia política. Curitiba: InterSaberes, 2015. BENKO, G. Economia, espaço e globalização: na aurora do século XXI. São Paulo: Hucitec, 2002. BRENNER, N. Espaços da urbanização: o urbano a partir da teoria crítica. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2018. CANO, W. Novas determinações para as questões regionais e urbanas. Campinas: Unicamp, 2011. CHOSSUDOVSKY, M. A globalização da pobreza: impactos das reformas do FMI e do Banco Mundial. São Paulo: Moderna, 1999. DAVIS, M. Planeta Favelas. São Paulo: Boitempo, 2006. GARBOSSA, R. A.; SILVA, R. dos S. O processo de produção do espaço: impactos e desafios de uma urbanização. Curitiba: InterSaberes, 2016. HARVEY, D. 17 contradições do capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2016. LEFEBVRE, H. O direito à cidade. São Paulo: Centauro, 2013. MALLMANN, L.; BALESTRIN, N. L.; SILVA, R. dos S. Estado e políticas sociais no Brasil: avanços e retrocessos. Curitiba: InterSaberes, 2017. OLIVEIRA, F. de. Crítica à razão dualística: o ornitorrinco. São Paulo: Boitempo, 2013. OLIVEIRA, J. F. de (org.). Economia para administradores. São Paulo: Saraiva, 2006. PORTER, M. Vantagem Competitiva: criando e sustentando um desempenho superior. São Paulo: Campus, 1989. SANTOS, M. O espaço dividido. São Paulo: Edusp, 2008. SOUZA, N. de J. de. Desenvolvimento econômico. 5. ed. revisada. São Paulo: Atlas, 2005. AULA 6 ESPAÇOGEOGRÁFICO, ECONOMIA E COMÉRCIO INTERNACIONAL Prof. Rodolfo dos Santos Silva 2 CONVERSA INICIAL Para a elaboração do estudo que compõe as aulas desta disciplina, reunimos as expressivas relações existentes entre a economia, a geografia, a política e o comércio exterior, muito bem fundamentadas por meio de diversos autores clássicos e contemporâneos que garantem a cientificidade deste trabalho. Anteriormente foram abordados as bases teóricas do conhecimento geográfico e os fundamentos teóricos da economia, destacando o espaço geográfico e os sistemas econômicos e sociais. Também debatemos a inserção das metrópoles em um contexto de internacionalização da economia e como elas são transformadas no tempo e no espaço de forma a atender os diferentes agentes econômicos que delas necessitam, principalmente as grandes corporações internacionais. Estudamos também os grandes blocos econômicos regionais que, diante da atual geopolítica mundial, buscam garantir o seu processo de integração. Outro tema foi a importância da moeda nas transações econômicas internacionais desde o surgimento até os dias atuais. Vimos o quanto é importante a criação de instituições que possam garantir à moeda internacional o seu curso, como o Banco Mundial e o FMI, e, também, a quase institucionalização de uma moeda lastreada em ouro ocorrida na Conferência Monetária Internacional de Bretton Woods. Outro assunto estudado foi a necessidade de se conhecer toda a cadeia de suprimentos para obter vantagens competitivas no mercado internacional. Por meio do supply chain, discutimos sobre o acompanhamento das demandas correntes de um país, desde a extração da matéria-prima até o consumidor final. Também foi abordado o supply value, que representa o acompanhamento dos valores gerados na cadeia produtiva e as vantagens competitivas obtidas em cada uma das etapas de sua constituição. Além disso, levantamos a importância geográfica dos circuitos inferior e superior para a economia internacional. Nesta aula destacam-se, primeiro, as teorias de David Ricardo e o teorema de Herckscher-Ohlin como essenciais para a formação de um arcabouço teórico para o debate sobre o comércio exterior. Defendidas e refutadas por muitos teóricos, as duas teorias continuam tendo validade como determinantes para o comércio entre as nações. Foram os princípios delas que proporcionaram as bases para a elaboração de importantes documentos sobre o comércio exterior 3 por entidades internacionais, como a CEPAL e, ainda, contribuíram na formação de outras organizações, como o GATT e a OMC. Vamos abordar, ainda, a necessidade de uma discussão sobre o supply- side economics, fundante das diretrizes do Consenso de Wahington, e suas implicações sobre geopolítica internacional, não apenas sobre os países do continente americano. Baseadas em pressupostos neoliberais, essas diretrizes tinham como principal argumento a estabilidade econômica e a política dos territórios. Discute-se também a criação de um grupo de países emergentes para a formação de um bloco econômico com expressão política, de cooperação econômica e ajuda mútua, reunindo os principais países considerados como economias emergentes para fazer frente aos blocos econômicos liderados pelas economias mais ricas participantes da OCDE. TEMA 1 – O PRINCÍPIO RICARDIANO DO COMÉRCIO EXTERIOR 1.1 A teoria das vantagens comparativas As principais teorias do comércio exterior estão fundamentadas na existência de diferenciações nas dotações relativas dos fatores de produção entre os países. Isso representa as condições em que cada país realiza a sua produção e as vantagens competitivas que oferece diante de uma economia em escala internacional. Cada país objetiva ampliar a oferta de seu excedente de produção a outros países. A fundamentação teórica que justifica os esforços dos países em se especializarem em determinado tipo de produção em larga escala, para trocarem seus excedentes, está baseada em David Ricardo (1772 -1823). Ricardo foi um dos expoentes da teoria econômica clássica que buscou desenvolver princípios orientadores do comércio internacional. Para esse autor, o comércio entre as nações deveria ser realizado com base na especialização de cada país na produção de determinados bens, enquanto os demais se encarregariam de outros tipos de produção. Essa teoria ficou conhecida internacionalmente como teoria das vantagens comparativas. Pelo princípio das vantagens comparativas, as nações deveriam se especializar na produção de mercadorias para exportação, cuja produção fosse mais eficiente, onde o custo fosse menor e as dotações relativas dos fatores de produção fossem maiores. Para explicar a sua teoria, Ricardo descreve o comércio realizado entre Portugal e Inglaterra, utilizando produtos bastante transacionados entre os dois 4 países: vinho (Portugal) e tecidos (Inglaterra). Para dar ênfase aos princípios teóricos, o autor destaca o valor do trabalho como um custo a ser considerado nas transações de ambos os produtos. Assim, busca comprovar que a Inglaterra tem desvantagem comparativa cada vez que for produzir vinhos em relação a Portugal. Para isso, argumenta que na produção de unidades de tecidos é utilizado, na Inglaterra, o trabalho de 100 homens. Caso a Inglaterra fosse produzir vinhos na mesma proporção que produz tecidos, seriam necessários 120 homens. Por outro lado, se Portugal tentar produzir a mesma proporção de tecidos, teria que despender do trabalho de 190 homens, enquanto que para produzir a mesma quantidade de vinho utilizaria o trabalho de 80 homens. Para o autor, ambos os países teriam elevados custos ao tentarem produzir bens para os quais não possuem dotações relativas de fatores produção. Se houver uma especialização de cada país naquilo que melhor produz a menores custos, é possível alcançar maiores vantagens comparativas e maiores ganhos relativos no comércio internacional. Os grandes teóricos da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), dentre eles Osvaldo Sunkel, Celso Furtado, Maria da Conceição Tavares e Raul Brebisch, foram enfáticos ao afirmarem que a teoria das vantagens comparativas teria validade caso fossem desconsiderados os avanços na industrialização na produção de bens e serviços para além do estágio econômico existente, ou seja, se o cenário fosse estático. Os escritos da CEPAL tendem a apontar a defesa da teoria das vantagens comparativas como uma justificativa ideológica para a manutenção da divisão internacional do trabalho. Ao estudar as consequências do subdesenvolvimento nos países da América Latina e da África, os membros da CEPAL constataram a inadequação das teorias de Ricardo diante de uma relação de troca tão desigual entre os países produtores de bens de alto valor agregado (os países centrais) e aqueles que produzem bens de baixo valor agregado (os países periféricos). Para os cepalinos, a ocorrência do aumento da oferta e da demanda provoca também uma evolução dos preços no mercado internacional, o que acarreta um desenvolvimento das economias internas, ocasionando elevação da renda da população e provavelmente da demanda por tecidos em menor escala que a demanda por vinhos. Para esses autores, era certo que haveria uma variação menor dos preços dos bens primários (vinhos) em relação aos bens industrializados (tecidos), o que colocava em dúvida se de fato a teoria ricardiana 5 estava sendo eficiente ao não analisar essa deterioração das relações de troca entre Portugal e Inglaterra. Para os teóricos da CEPAL, os produtos industrializados rapidamente alcançariam preços majorados em relação aos dos produtos primários. Dessa forma, os países que industrializam os produtos conseguem maior valor agregado no mercado internacional do que os países que produzem e vendem bens primários.Krugman e Obstfeld (2001) destacam que a teoria das vantagens comparativas possui muitas falhas, como no caso do modelo ricardiano simples, que prevê um grau elevado de especialização dos países em bens que não são possíveis de serem encontrados no mundo real. Os autores fazem ressalvas ao fato de que Ricardo, em sua teoria, comete equívocos ao afirmar que todos os países sempre ganharão com as transações econômicas internacionais, sem deixar espaços para discussões sobre as diferenças existentes na forma de produção e nos recursos utilizados pelos países. Criticam o fato de a teoria ricardiana ignorar o papel desempenhado pelos fluxos da economia de escala nas transações econômicas internacionais. Apesar das críticas de muitos economistas, Krugman e Obstfeld (2001) pontuam que, mesmo com tais falhas, as teorias de David Ricardo vêm sendo apreciadas e confirmadas por diversos estudos sobre a economia internacional, pois é difícil contestar o fato de que os países tendem a exportar os excedentes de sua produção. Para tais autores, “as diferenças de produtividades desempenham um papel importante no comércio internacional e que as vantagens comparativas em vez das absolutas é que importam – parecem ser corroboradas pela experiência” (Krugman; Obstfeld, 2001, p. 36). TEMA 2 – O TEOREMA DE HECKSCHER-OHLIN A teoria ricardiana do comércio exterior tem fundamentos na explicação das vantagens comparativas levando em consideração as diferenças de produtividade da mão de obra. Heckscher e Ohin desenvolveram uma teoria para explicar que outros fatores exercem influência sobre o comércio internacional, e não apenas a mão de obra. No teorema de Hekscher-Ohlin, a terra, o trabalho e o capital utilizados intensivamente de forma abundante são a base fundamental das vantagens comparativas de um país para a realização do comércio com outros países. 6 De acordo com Sandroni (2007), Bertil Gotthard Holin (1899-1979) recebeu o Prêmio Nobel de Economia em 1977 por fornecer novas explicações sobre os fundamentos do comércio internacional. A partir da teoria desenvolvida por Eli Philip Heckscher (1879-1952), de quem é discípulo, em sua principal obra, Interregional and International Trade (Comércio Inter-regional e Internacional), de 1933, elaborou uma explicação sobre o comércio entre os países utilizando os fatores de produção como justificativa dos preços relativos dos produtos no comércio internacional. Diferentemente da teoria das vantagens comparativas de Ricardo, que relacionam os preços do produto no mercado internacional ao fator trabalho, o teorema Herckscher-Holin define que os preços dos bens produzidos dependem dos preços e da abundância ou da raridade dos fatores de produção que constituem o produto a ser importado e exportado pelos países. O teorema exemplifica que um país como a Inglaterra, que possui abundância de bens manufaturados, capital e trabalho, mas que apresenta insuficiência de terras, poderia exportar para a Austrália bens manufaturados em troca de bens primários. A Austrália, por sua vez, conta com grande quantidade de terras e pode produzir minério de ferro, madeira e outros bens primários em abundância e exportar para a Inglaterra. Na teoria de Herckscher-Holin, a procura por terra seria a responsável pelo aumento dos preços desse fator de produção devido à extração e à produção de bens primários para exportação; por outro lado, na Inglaterra, ocorreria o aumento dos preços da mão de obra, e os bens de capital subiriam em decorrência da produção para exportação, enquanto o preço da terra diminuiria. Por se tratar de uma teoria baseada na neoclássica e que tem seus argumentos fundamentados nos fatores de produção, sem levar em consideração as relações sociais e as condições geográficas e espaciais, que influenciam no preço, na produção da força de trabalho e no deslocamento da produção nas diversas regiões, conforme Sandroni (2007), tem sido muito criticada por diversos economistas. Porém, é defendida por economistas como Mankiw (2008), Krugman e Obstfeld (2001), para quem a teoria é uma das mais importantes do comércio internacional, por levar em consideração os recursos dos países. “Ela enfatiza o mecanismo entre as proporções nas quais fatores diferentes de produção estão disponíveis em países diferentes, e em que proporções esses fatores são utilizados para produzir bens diferentes, por isso também, chamada de teoria das proporções dos fatores” (Krugman, Obstfeld, 2001, p. 70). 7 Teorias como as dos suecos Herckscher e Holin e a do inglês David Ricardo buscam fundamentar as ações dos países nas suas buscas por uma maior participação no mercado internacional. Desde a década de 1940, o mundo passa por transformações geopolíticas e espaciais que necessitam de uma forte regulamentação nas transações econômicas entre os países. Logo após findar a Segunda Guerra Mundial, foram criadas instituições de comércio internacional para facilitar as relações de troca entre os países, e uma delas foi o GATT. TEMA 3 – AS INSTITUIÇÕES DO COMÉRCIO INTERNACIONAL: O GATT E A OMC O Acordo Geral de Tarifas Alfandegárias e Comércio (GATT) foi uma das instituições criadas a partir de Bretton Woods para estruturar e normatizar acordos de comercialização entre os países. Intencionalmente, o GATT, fundado em 1947, é fruto de uma iniciativa do governo norte-americano para reduzir os custos por parte dos países com tarifas internacionais dos produtos manufaturados. Em 1942, os EUA pretendiam criar a Organização Internacional do Comércio (ITO), cuja sigla vem do inglês International Trade Organization, que não prosperou por conta das dificuldades impostas pela Segunda Guerra Mundial. O GATT começou suas operações em 1948 e teve como papel contribuir para a manutenção das decisões tomadas em Bretton Woods em relação ao comércio internacional, principalmente na divulgação do dólar americano como moeda internacional e estabelecida dentro do padrão-ouro. A partir de discussões entre o FMI, o Banco Mundial e o FED (Banco Central americano), os Estados Unidos colocaram um fim ao padrão-ouro em 1971. Essa atitude do governo americano impôs limitações a um discurso e uma prática de impressão do dólar como lastreado em ouro, como justificativa para garantir que fosse uma moeda de aceitação internacional, que teve seu início em 1944, na Conferência de Bretton Woods. Essa abdicação do lastro em ouro para a manutenção de uma moeda internacional representou a não responsabilidade do governo americano em garantir o preço do ouro em dólares a US$ 35,00 a onça e que os países, principalmente aqueles que acumularam muitos dólares, pudessem converter os dólares em ouro àquele preço. Muitos países produtores de petróleo que haviam acumulado bilhões de dólares e pretendiam trocá-los por ouro se frustraram diante da decisão dos EUA. 8 A partir do interesse de suas 28 nações signatárias, que participavam de uma comissão da ONU liderada pelos EUA, o GATT foi criado para ser inicialmente temporário. Devido a sua definitiva importância na manutenção do dólar como moeda internacional e na rejeição por parte dos congressistas americanos em criar a ITO, o GATT foi mantido como organismo de comércio internacional até 1995, principalmente para combater o protecionismo exagerado que havia se estabelecido no comércio entre os países logo após o período pós- Segunda Guerra Mundial. Em 29 de novembro de 1949, 148 países assinaram o Acordo Geral de Tarifas e Comércio. Com a crise econômica e política criada com o fim do compromisso dos americanos em manter sua moeda atrelada ao ouro em 1971, o GATT também foi abalado enquanto instituição de comércio internacional. Porém, nos seus primeiros anos de organização, criou e buscou seguir regras e princípios que pretendiam manter a igualdade no tratamento entreos países comerciantes, sem discriminar, incentivando a redução de tarifas por meio de negociações entre as nações que comercializam entre si. O GATT buscou ampliar a todos os países-membros os acordos e tratados obtidos entre as nações que os entendessem como vantajosos para ambas, que realizassem concessões bilaterais. Essa instituição começou a perder importância a partir da década de 1990, devido ao forte apelo internacional por formação de blocos econômicos de proteção à disseminação de um modelo de capitalismo baseado na globalização, que colocava em risco as economias dos países que preferiam fortalecer e proteger seu mercado interno. Além disso, as nações industrializadas tinham forte poder de influência e podiam fazer prevalecer seus interesses sobre os interesses das nações com menor influência econômica e política. Dessa forma, os países mais pobres tinham resistência em apresentar suas reclamações a uma instituição internacional que demonstrava estar mais próximas dos países industrializados do que dos reclamantes. Foi no Uruguai, na oitava rodada de negociações sobre redução de tarifas e barreiras comerciais entre os países, que ficou decidida a criação de uma nova organização multilateral para dar conta de atender as reivindicações dos países membros. Em primeiro de janeiro de 1995, em uma conferência realizada em Marrakesh, no Marrocos, foi formalizado um acordo assinado por 97 países que pôs fim ao GATT. Em sua substituição foi criada a Organização Mundial do Comércio (OMC), um fórum no qual são discutidos os tratados e tomadas as decisões sobre os assuntos que envolvem as transações comerciais de bens e 9 serviços entre os países. Como principal instância de normatização e regulação dos países-membros que fazem parte de sua estrutura administrativa, a OMC busca intermediar pacificamente os conflitos existentes, observando as formatações dos contratos bilaterais ou multilaterais realizados entre as partes, facilitando o diálogo entre os participantes para que estes possam preservar e fortalecer as suas relações comerciais na assinatura de futuros contratos. Com sede estabelecida em Genebra (Suíça), contando com a participação de 164 países-membros, a OMC constituiu-se na principal instância de normatização e regulação do comércio internacional. As mudanças estabelecidas no comércio internacional, principalmente a partir da década de 1990, conforme Harvey (2016, p. 139), foram frutos de um esforço do capitalismo em produzir “uma paisagem geográfica favorável a sua própria reprodução e subsequente evolução”. Garbossa e Silva (2018) entendem que, para se adaptarem às mudanças geográficas e geopolíticas pós 1980, o capitalismo e suas nações hegemônicas buscaram fortalecer e criar instâncias de decisões políticas que influenciaram profundamente alterações espaciais em diversas nações, dentre elas as em desenvolvimento. Uma dessas instâncias foi o Consenso de Washington. TEMA 4 – A GEOPOLITICA DO CONSENSO DE WASHINGTON E O SUPPLY- SIDE ECONOMICS O Consenso de Washington, de acordo com Batista Junior (1994), surgiu em decorrência de uma articulação entre as instituições de Bretton Woods (Banco Mundial, FMI e o Tesouro dos Estados Unidos) que promoveu um encontro de diversos países, ocorrido entre novembro e dezembro de 1989, na cidade de Washington D.C. O Encontro foi convocado pelo Institute for International Economics e tinha como objetivo reunir os representantes governamentais de todos os países da América Latina e do Caribe, com exceção de Cuba, os países que compõem o Tratado Nort American Free Trade Agrement (NAFTA) e também os países envolvidos com a geopolítica dos territórios das Américas. Desse primeiro encontro, diversos outros foram necessários para colocar em prática as diretrizes do Consenso de Washington. No entendimento de Oliveira (2005), as reuniões que resultaram no Consenso de Washington ocorreram em decorrência do processo de globalização e internacionalização iniciado no final da década de 1970 e que se propagaram a 10 partir da década de 1980, impactando sobre as economias dos diversos países latino-americanos e caribenhos. Para Batista Junior. (1994), os resultados dos encontros do Consenso de Washington chegaram a ultrapassar o espaço geográfico das Américas e foram apresentados como solução para combater os problemas econômicos e sociais de diversos países pobres na Ásia e na África. A defesa de uma economia sustentada no supply-side economics fundamentou as diretrizes do Consenso de Wahington. A liberalização com base na economia de mercado sustentou a necessidade de implemantação de políticas de estabilização, em um primeiro momento, e depois de políticas que tinham como objetivo uma reforma estrutural. Para Oliveira (2005), foram 10 as principais diretrizes econômicas do Consenso de Wahsington que visavam atacar esses dois eixos estruturais das economias em desenvolvimento. Para promover a estabilização, as políticas visavam combater o déficit público e alcançar um superávit no balanço de pagamentos. Para tanto, o receituário apresentava como base para alcançar a estabilização a dolarização da economia, a desindexação salarial em realação à inflação e outras políticas de preços, forçar os bancos centrais a manterem o controle sobre a emissão de suas moedas e também reduzir gastos públicos a fim de gerar superávit primário para pagamentos de juros da dívida pública. Com relação à proposta de reforma estrutural, o Consenso tinha como orientação ampliação do mercado interno e a abertura ao mercado internacional; privatização de empresas estatais; reforma fiscal que minimizasse os custos do produtor de bens e serviços; desregulamentação do setor financeiro; e criação de programas de combate a miserabilidade e violência. Para Batista Júnior (1994), houve uma inadequação das propostas do Consenso de Washington ao dignosticarem os problemas latino-americanos, pois não levaram em consideração as diferenças políticas, econômicas, sociais e geográficas dos países. Para esse autor, os propositores do Consenso não observaram os fatores históricos do endividamento e dos problemas enfrentados, desde o periodo de colonização até a expansão do comércio internacional, quando as poucas perspectivas de exportações pararam no elevado protecionismo dos países desenvolvidos. As decisões norte-americanas de derrubar a estabilização de sua moeda atrelada ao ouro e permitir a elevação por parte de seu Federal Reserved System, de taxas de juros exorbitantes, no início da década de 1970, implicou em uma crise sem precedentes dos países pobres e 11 endividados do mundo, que tomaram empréstimos incentivados por uma crença de que havia uma autorregulação no mercado, uma supply-side economics, e que diante da estabilidade de uma moeda internacional baseada no padrão ouro não haveria risco de crise. Garbossa e Silva (2018) afirmam que o Consenso de Washington implicou em uma nova velha ordem econômica mundial. De acordo com esses autores, ele trouxe de volta para o contexto internacional a velha política econômica do laissez- faire, laissez-passer, da Inglaterra de Adam Smith do final do século XVIII e início do século XIX, só que travestida de uma nova roupagem defendida por Milton Friedamann e Friedrich Von Hayek. As teorias de Hayek e Friedmann proporcionaram as bases teóricas que fundamentaram as diretrizes do Consenso de Washington. Houve uma abertura nos países para a entrada de produtos e capitais estrangeiros, porém é certo que, durante os anos de 1990, as empresas locais não estavam preparadas para isso, nem mesmo os países se prepararam para uma inserção tão rápida. As instituições capitalistas locais, como caso a Federação das Indústrias de São Paulo, defenderam muito o discurso de abertura, porém não esperavam que de forma abruptatais produtos viessem a concorrer com suas próprias filiadas, como as indústrias de brinquedos, de calçados, de tecidos, os pequenos negócios e tantos outros. O fato é que até o setor automotivo enfrentou concorrência diante de um governo que, ao defender a entrada de produtos estrangeiros, afirmou que os carros produzidos no Brasil eram “carroças” se comparados com os produzidos na Europa ou nos Estados Unidos. O descontentamento dos setores atingidos foi geral, o que ocasionou em impeachment do primeiro governante brasileiro a implementar as medidas do Consenso, o que afundou o país em uma crise econômica e política. De acordo com Batista Junior (1994), o modelo proposto pelas instituições de Bretton Woods e defendido amplamente pelos EUA, cujas medidas não foram implementadas pelo seu principal defensor, passou a ser percebido, conforme o autor, como um modelo propositivo de mão única, com diretrizes forjadas apenas para os países latino-americanos e caribenhos implementarem. Os países considerados desenvolvidos, apesar de defenderem a implementação de tais medidas, não se dispuseram fazê-lo. Além de divulgadas como grande soluções para a estabilização econômica e política dos países pobres, as instituições de 12 Bretton Woods se encarregaram de forçar a execução de tais medidas nos países pobres da Ásia e da África. Oliveira (2005) destaca que as políticas neoliberais do Consenso de Washington foram implementadas no Brasil de forma mais moderada nos governos posteriores ao de Fernando Collor de Mello (1990/1992) e que apenas em 1998 a política de estabilização atrelada ao dólar foi rompida e muitas das diretrizes no país foram revistas. Da década perdida dos anos 1980 para os experimentos neoliberais dos anos 1990, o país atravessou períodos de instabilidade política com momentos de estabilidade, mas que ampliaram as incertezas com relação a produção industrial e redução do Estado na economia. Contudo, deixaram claro que a paridade com o dólar e outras medidas do Consenso só poderiam servir como antídoto se pudessem ser aplicadas a todos os países após um estudo das características e viabiliades políticas, econômicas e sociais de cada um, preservando a sua soberania. Conforme Batista Junior (1994), os países necessitam de muito mais do que simples medidas neoliberais que seguem um diagnóstico comum a todos sem levar em consideração as complexidades e especificidades existentes em cada território e Estado. Para a retomada do desenvolvimento, no caso brasileiro, o país necessita assumir liderança do conjunto dos países emergentes, pois, no entendimento de Zibechi (2013), o Brasil protagonizou, nos primeiros 10 anos do século XXI, uma postura de país periférico avançando para ser a sexta economia do planeta. Um dos grandes passos dados para isso foi a postura assumida diante do bloco econômico formado com Rússia, Índia, China e África do Sul, os BRICS. TEMA 5 – OS BRICS E A ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO (OCDE) 5.1 A formação dos BRICS Brasil, Rússia, Índia e China iniciaram conversas para criar um grupo com expressão política, de cooperação econômica e ajuda mútua, que reunisse países considerados como economias emergentes. No começo deste século, com grande interesse em garantir espaços na nova geopolítica internacional, protagonizados por blocos econômicos, como União Europeia e Nafta, e organizações multilaterais, como a OCDE, dos quais fazem parte as nações mais ricas do mundo, o grupo passou a realizar reuniões periódicas. O destaque em 13 âmbito global para as reuniões desses países dá-se em 2001, com a criação do termo BRIC pelo economista britânico Jim O’Neill. Esse executivo britânico da Goldman Sachs o utilizou para ressaltar as articulações existentes para a formalização de um possível bloco econômico desses países que apresentavam excelentes perspectivas de crescimento e de investimentos a médio e longo prazo. De acordo com Garbossa e Silva (2018), esse grupo de importantes países, mantidas as perspectivas de crescimento conforme os anos da primeira década do século XXI, tende a superar as maiores economias do mundo até 2050. Com a adesão de mais um país em ascensão na geopolítica mundial, a África do Sul, que agregou o “S” (de South África), em 2009, aumentou ainda mais tendência de fortalecimento do grupo. Assim, as reuniões dos BRICS, que inicialmente serviam para trocas de informações, em poucos anos se tornaram constantes, fato que expandiu significativamente suas ações de interação e cooperação política- econômica-financeira. Conforme Brasil (2015), os BRICS como agrupamento assumiram como compromisso entre si a busca por maior espaço político-econômico-financeiro na articulação e coordenação em âmbito do G20 e a ampliação da participação democrática e dos assentos no Conselho de Segurança da ONU para melhorar a governança internacional. Em junho de 2014, foi realizada em Fortaleza (CE) a Reunião Internacional da Cúpula dos BRICS, em que foram assinados diversos protocolos de intenções, dentre eles a criação de um Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) voltado para o fomento e o crescimento dos países- membros, o estabelecimento de um Arranjo Contingente de Reservas (ACR) para socorrer, caso haja necessidade, os países em seus balanços de pagamentos, além de acordos de cooperação multissetorial em diversas áreas, como saúde, ciência, tecnologia e inovação, infraestrutura, além de outros setores. Nos últimos da segunda década do século XXI, os resultados eleitorais colocaram no poder no Brasil, e em outros países da América Latina, grupos favoráveis a uma aproximação maior com os EUA e a OCDE, reduzindo o nível de empenho com o qual país vinha se dedicando na condução de um bloco econômico com os demais países do BRICS. 14 5.2 O Brasil e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE) O Brasil, durante as primeiras décadas deste século, figurou entre as grandes economias do mundo, e tem-se questionado se ele deve ou não se integrar aos países que fazem parte da Organização de Cooperação e Desenvolvimento (OCDE). De acordo com o Ministério das Relações e Exteriores do Brasil, desde a década de 1990 o país vem se beneficiando do envolvimento de vários órgãos da administração pública brasileira tanto federal quanto estadual, participando como associado ou convidado de instâncias da OCDE. Em 2015, o Brasil assinou um protocolo de cooperação com a OCDE que tinha como objetivo aproximá-lo ainda mais dessa importante organização internacional. De acordo com Sandroni (2007), até setembro de 1961, havia uma instituição que congregava os países mais ricos da Europa, a Organização Europeia de Cooperação Econômica (OECE), criada em 1948 para dar suporte à realização do Plano Marshall. Com a forte presença norte-americana na execução do Plano Marshall, a França liderou uma articulação entre os principais países- membros da OECE, dando passos importantes na direção da constituição de uma instituição que incluísse outros países que estavam contribuindo para a reconstrução e o desenvolvimento da Europa, dentre eles os EUA. Dessa forma, foi pensada e planeja a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), criada em setembro de 1961, em substituição à OECE, que acabou incluindo os EUA e o Canadá e, mais tarde, o Japão, em 1964. Além de França, Estados Unidos e Japão, são considerados países fundadores da OCDE Áustria, Bélgica, Dinamarca, Islândia, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Holanda, Noruega, Portugal, Reino Unido, Suécia, Suíça, Turquia, Alemanha e Espanha. Mais tarde outros países foram incluídos, dentre eles Finlândia, Austrália, Nova Zelândia, México, República Checa, Hungria, Polônia, Coréia do Sul, Eslováquia, Chile, Eslovênia, Israel, Estônia e Lituânia. Por produzir mais da metade de todaa riqueza do planeta, a OCDE é conhecida como grupo dos países ricos. Essa organização tem seu funcionamento movido por comissões econômicas e de desenvolvimento com o objetivo de incentivar o crescimento econômico dos países-membros, por exemplo mantendo elevados níveis de emprego, estabilidade de preços e investimentos. Além disso, promove debates entre os países sobre questões financeiras, sociais, ambientais e também sobre a expansão do comércio com outras nações. Para Sandroni (2007), algumas das 15 maiores contribuições dessa organização é a promoção, a assessoria e a assistência técnica para a elevação do nível de desenvolvimento dos países- membros. 16 REFERÊNCIAS ALVES, A. R. et al. Perspectivas e abordagens geográficas contemporâneas. Curitiba: InterSaberes, 2018. MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. O Brasil e a OCDE. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/politica-externa/diplomacia-economica- comercial-e-financeira/15584-o-brasil-e-a-ocde>. Aceso em: 9 jun. 2019. _____. Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (BRICS). Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/politica-externa/mecanismos-inter- regionais/3672-brics>. Acesso em: 9 jun 2019. BATISTA JUNIOR., P. N. O consenso de Washington: a visão neoliberal dos problemas latino-americanos. Cadernos da Dívida Externa, n. 6. São Paulo: PEDEX, 1994. _____. (Org.). Em defesa do interesse nacional. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994. GARBOSSA, R. A.; SILVA, R. dos S. 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