Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 1/48 A deusa romana Iustitia como alegoria do direito. Seus olhos vendados denotam imparcialidade, sua balança indica a ponderação de interesses e sua espada simboliza o seu poder coercitivo.[1] Direito Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre. Em sua acepção mais restrita, o direito, em seu sentido objetivo,[nota 1] é o sistema de normas que regula as condutas humanas por meio de direitos e deveres. Esse sistema se impõe em praticamente todos os âmbitos das relações sociais e, como tal, exerce um papel de enorme importância mas também de grande ambiguidade, visto que seu conteúdo e aplicação são influenciados por numerosos fenômenos, como a religião, a política, a economia, a cultura, a moral e a linguagem. Sua natureza precisa, incluindo suas condições de validade e os fundamentos de sua normatividade, é objeto de um antigo e complexo debate, em que se destacam as correntes juspositivista e jusnaturalista e suas múltiplas ramificações. O conteúdo do direito é articulado a partir de fontes hierarquizadas em ordenamentos jurídicos. Como o direito é um fenômeno inerente ao processo civilizatório e, em certa medida, particular a cada sociedade, a formação, hierarquia e importância de cada fonte variam significativamente em cada Estado. No mundo todo prevalecem os ordenamentos jurídicos da família romano-germânica de direitos, nos quais as leis escritas são mais amplamente utilizadas e constituem a principal fonte do direito, e da família da common law, fundados principalmente em decisões precedentes. Outras famílias de direitos comuns pelo mundo incluem a dos direitos consuetudinários e a da xaria, dentre outras, sendo comuns ordenamentos mistos, que incorporam elementos de uma ou mais famílias. Apesar dessas diferenças, diversos processos históricos, políticos e culturais têm ocasionado um movimento de aproximação dos direitos nacionais e, na Contemporaneidade, as fontes do direito tendem a ser articuladas de maneira semelhante. Quando criadas pelo Estado, por meio de uma assembleia com competência legislativa ou de uma autoridade com poder regulamentar, as normas jurídicas são formalizadas em leis, decretos, regulamentos e outros documentos. Estados também podem celebrar tratados entre si e com organizações com personalidade jurídica internacional, que criam regras com efeitos em âmbito externo e interno. Por sua vez, indivíduos e organizações podem celebrar contratos, que, subordinados às normas estabelecidas pelo Estado, criam regras juridicamente vinculantes. As normas jurídicas privadas e públicas são aplicadas, no âmbito de um processo, por tribunais e outros indivíduos com poder jurisdicional, normalmente com base em uma série de métodos interpretativos e à luz da doutrina jurídica, dos costumes e de decisões judiciais que formam a jurisprudência sobre o tema. Além do binômio direito interno e direito internacional, historicamente o direito tem sido dividido em dois domínios maiores, sobretudo nos países cujos ordenamentos pertencem à família romano- germânica de direitos, e em ramos que agregam normas e teorias que compartilham um mesmo objeto e outras características. Assim, enquanto o direito público diz respeito ao Estado e à sociedade, incluindo ramos como o direito administrativo e o direito penal, o direito privado lida com a relação entre indivíduos e organizações, em áreas como o direito civil e o direito agrário. https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Hugo-de-Groot-von-Sch%C3%BCtz-Thomasius-Drei-B%C3%BCcher-vom-Rechte-des-Krieges_MG_0231_-_crop.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Justi%C3%A7a_(mitologia) https://pt.wikipedia.org/wiki/Wikip%C3%A9dia:P%C3%A1gina_principal https://pt.wikipedia.org/wiki/Norma_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_subjetivo https://pt.wikipedia.org/wiki/Religi%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Pol%C3%ADtica https://pt.wikipedia.org/wiki/Atividade_econ%C3%B4mica https://pt.wikipedia.org/wiki/Cultura https://pt.wikipedia.org/wiki/Moral https://pt.wikipedia.org/wiki/Linguagem https://pt.wikipedia.org/wiki/Validade_da_norma_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Normatividade_(direito) https://pt.wikipedia.org/wiki/Positivismo_jur%C3%ADdico https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_natural https://pt.wikipedia.org/wiki/Fontes_do_direito https://pt.wikipedia.org/wiki/Ordenamento_jur%C3%ADdico https://pt.wikipedia.org/wiki/Civiliza%C3%A7%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Estado https://pt.wikipedia.org/wiki/Fam%C3%ADlia_romano-germ%C3%A2nica_de_direitos https://pt.wikipedia.org/wiki/Common_law https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_consuetudin%C3%A1rio https://pt.wikipedia.org/wiki/Xaria https://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_Contempor%C3%A2nea https://pt.wikipedia.org/wiki/Assembleia https://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Legislativo https://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_regulamentar https://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_ordin%C3%A1ria https://pt.wikipedia.org/wiki/Decreto https://pt.wikipedia.org/wiki/Regulamentos https://pt.wikipedia.org/wiki/Tratado https://pt.wikipedia.org/wiki/Organiza%C3%A7%C3%A3o_internacional https://pt.wikipedia.org/wiki/Personalidade_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Contrato https://pt.wikipedia.org/wiki/Processo_judicial https://pt.wikipedia.org/wiki/Tribunal https://pt.wikipedia.org/wiki/Jurisdi%C3%A7%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Hermen%C3%AAutica_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Doutrina_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Costume https://pt.wikipedia.org/wiki/Jurisprud%C3%AAncia https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_internacional https://pt.wikipedia.org/wiki/Ramos_do_direito https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_p%C3%BAblico https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_administrativo https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_penal https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_privado https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_civil https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_agr%C3%A1rio 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 2/48 Contudo, as transformações sociais produzidas desde a Modernidade têm tornado essa divisão crescentemente incapaz de afiliar ramos do direito nascidos de novas necessidades sociais, sobretudo quanto a interesses transindividuais, meta-individuais e coletivos. As origens e o processo de adoção da palavra direito são conhecidos apenas parcialmente, embora esteja claro que ambos estão conectados à Roma Antiga. Em latim clássico o termo usado para designar um direito era ius,[nota 2] que daria origem a "jurídico" e "justiça", dentre outros.[3] Esse termo se originou da raiz sânscrita yu (que indica unir ou juntar, e, por extensão, o vínculo contido no direito) ou yoh (que indica algo sagrado), e, em sua origem, indicava algo vinculante ou obrigatório e talvez possuidor de uma garantia divina.[3] Contudo, diferentemente do uso moderno mais comum do termo direito, que designa um conjunto de regras e, portanto, salienta a sua dimensão normativa, dentre os romanos o termo ius estava imediatamente associado à noção de iustitia e era entendido como "a arte de realizar a justiça".[4] Assim, a despeito do caráter normativo do direito romano, esse povo não utilizava o termo ius em referência a esse seu aspecto, mas sim salientando a sua dimensão prática, isto é, a proclamação da justiça pelo juiz.[5][4] O termo direito, por sua vez, pode ser traçado até directum[4] (latim medieval erudito) e derectum[6][5] (latim vulgar), e sua forma adjetiva directus, que indica algo "dirigido" ou "guiado" em linha direta, ou ainda "sem desvio".[7][8] Esse adjetivo é particípio passado do verbo dirigere ("endireitar", "ajustar", "desenhar em linha reta", "alinhar"), que se originou do verbo latino regere ("governar", "guiar", "liderar")[7][8] e, mais anteriormente, do adjetivo rectus ("reto", "direto").[9] Essas palavras evoluíram do termo em língua protoindo-europeia reg-,[9] que indica o ato de endireitar algo[10][11][12] e está na origem dotermo proto-germânico rehtan, que mais tarde originou o inglês right (por meio do inglês antigo riht) e o alemão recht (por meio do alto-alemão antigo reht); do grego antigo orektos (estendido, ereto); dos termos em persa antigo rasta- ("reto", "direto") e aršta- ("retidão"); do galês rhaith; e do bretão reiz ("justo", "sábio").[9] Em relação à cronologia do seu uso pelos romanos, as línguas românicas contemporâneas invariavelmente comunicam o conceito de direito com termos que possuem uma mesma origem (o termo lusófono direito tem correspondência direta com diritto, do italiano, derecho, do espanhol, droit, do francês, dret, do catalão, drech, do occitano e drept, do romeno, dentre outros), e, portanto, parece claro que eles se difundiram anteriormente à queda do Império Romano do Ocidente.[4] Quanto às circunstâncias da sua adoção, uma teoria amplamente conhecida[nota 3] se ampara no Thesaurus Linguae Latinae e em análises da simbologia relacionada ao direito para demonstrar que o uso desse termo tem uma correspondência com a cultura grega e seria uma referência à posição ereta do fiel da balança, esta última um símbolo de equilíbrio associado à ideia de justiça no Antigo Egito do século XX AEC.[13][14][nota 4] Na Grécia Antiga, entre os sécs. XII e X AEC, a balança e o ideal de justiça vieram a ser associados a Zeus, que julgava o Homem em função de sua própria lei e de sua própria vontade.[15] Mais tarde, pelos tempos de Homero, Zeus foi substituído, como símbolo da justiça, pela deusa Têmis, mas com a diferença que essa deusa julgava os homens em função da lei de Zeus; a deusa Têmis, portanto, era uma encarnação secundária do direito, pois seu julgamento era delimitado por uma lei externa a si mesma, estabelecida por um terceiro, Zeus.[16] Por fim, pelo tempo de Hesíodo o panteão grego viu surgir a deusa Dice, filha de Zeus e Têmis, cuja representação incluía a balança em sua mão esquerda e uma espada na direita.[16] A essa deusa foi atribuída a função de administrar a justiça ao Homem, isto é, de utilizar a balança para julgar os fatos de acordo com a lei de Zeus e declarar o que era justo em situações concretas.[16] Os romanos teriam incorporado as mesmas alegorias em seu panteão, respectivamente nas figuras de Júpiter, Dione e Iustitia.[16] Em comum a ambas alegorias, Dice e Iustitia identificavam o direito, e assim podiam declarar o que era era justo, quando os pratos da Etimologia https://pt.wikipedia.org/wiki/Modernidade https://pt.wikipedia.org/wiki/Interesses_difusos https://pt.wikipedia.org/wiki/Interesses_individuais_homog%C3%AAneos https://pt.wikipedia.org/wiki/Interesses_coletivos https://pt.wikipedia.org/wiki/Roma_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim_cl%C3%A1ssico https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_subjetivo https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A2nscrito https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_romano https://pt.wikipedia.org/wiki/Justi%C3%A7a https://pt.wikipedia.org/wiki/Juiz https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim_medieval https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim_vulgar https://pt.wikipedia.org/wiki/Partic%C3%ADpio https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_protoindo-europeia https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_protogerm%C3%A2nica https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_inglesa https://pt.wikipedia.org/wiki/Ingl%C3%AAs_antigo https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_alem%C3%A3 https://pt.wikipedia.org/wiki/Alto-alem%C3%A3o_antigo https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_persa_antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_galesa https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_bret%C3%A3 https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADnguas_rom%C3%A2nicas https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_italiana https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_espanhola https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_francesa https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_catal%C3%A3 https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_occitana https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_romena https://pt.wikipedia.org/wiki/Queda_do_Imp%C3%A9rio_Romano_do_Ocidente https://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_Romano_do_Ocidente https://pt.wikipedia.org/wiki/Thesaurus_Linguae_Latinae https://pt.wikipedia.org/wiki/Per%C3%ADodo_helen%C3%ADstico https://pt.wikipedia.org/wiki/Balan%C3%A7a https://pt.wikipedia.org/wiki/Antigo_Egito https://pt.wikipedia.org/wiki/Gr%C3%A9cia_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Zeus https://pt.wikipedia.org/wiki/Homero https://pt.wikipedia.org/wiki/T%C3%AAmis https://pt.wikipedia.org/wiki/Hes%C3%ADodo https://pt.wikipedia.org/wiki/Dice https://pt.wikipedia.org/wiki/J%C3%BApiter_(mitologia) https://pt.wikipedia.org/wiki/Dione https://pt.wikipedia.org/wiki/Iustitia https://pt.wikipedia.org/wiki/Thesaurus_Linguae_Latinae https://pt.wikipedia.org/wiki/Per%C3%ADodo_helen%C3%ADstico https://pt.wikipedia.org/wiki/Balan%C3%A7a https://pt.wikipedia.org/wiki/Antigo_Egito https://pt.wikipedia.org/wiki/Gr%C3%A9cia_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Zeus https://pt.wikipedia.org/wiki/Homero https://pt.wikipedia.org/wiki/T%C3%AAmis https://pt.wikipedia.org/wiki/Hes%C3%ADodo https://pt.wikipedia.org/wiki/Dice https://pt.wikipedia.org/wiki/J%C3%BApiter_(mitologia) https://pt.wikipedia.org/wiki/Dione https://pt.wikipedia.org/wiki/Iustitia 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 3/48 balança estivessem em equilíbrio (em grego clássico: íson) e, assim, o seu fiel estivesse perfeitamente ereto, isto é, direito (em latim: directum ou derectum, formados por dis + rectum e indicando algo "muito rectum ou totalmente rectum"[5]).[17] Portanto, enquanto na Grécia o direito veio a ser conhecido como íson na linguagem mais popular, em Roma ele veio a ser designado informalmente pelo termo derectum,[4] mas com uma conotação diferente daquela do termo ius, referindo-se especificamente à sua dimensão moral (indicando aquilo que é escorreito, o caminho reto a ser seguido), e não sua dimensão prática ou de proclamação da justiça pelo juiz.[18] Dito de outro modo, o termo derectum teria surgido como consequência de a maior parte da população romana apreender o direito por seu aspecto orientador das condutas, e não por seu aspecto técnico (a arte de realização da justiça), expresso pelo termo ius.[19] Apesar de sua rejeição pelas classes mais educadas, que o consideravam vulgar, o termo derectum difundiu-se dentre a sociedade romana e provavelmente coexistiu com o termo ius até os sécs. VII e VIII EC, quando os conteúdos dos manuais de direito romano começaram a cair em desuso.[19] Por essa época o uso do termo técnico ius foi suplantado pelo termo vulgar derectum, que então já era parte do vocabulário comum, tanto na linguagem falada quanto na escrita.[19] O termo ius conheceria uma ressurgência com o renascimento do direito romano,[19] iniciado com a redescoberta do Corpus Juris Civilis pelos juristas italianos no século XII,[20] mas por essa época os termos directum e derectum já eram amplamente utilizados para designar todo o conjunto ou uma norma jurídica específica.[21] Do latim, eles evoluíram em português sucessivamente para directo (1277), dereyto (1292) e dereijto (1331), até chegar à sua grafia atual, documentada pela primeira vez no século XIII.[22] O direito é um fenômeno inerente às sociedades humanas, exclusivo a elas e relacionado à sua própria formação.[23][24][25] Toda sociedade humana, das culturas arcaicas às mais avançadas tecnologicamente, possui estruturas normativas que impõem "padrões, regras e valores" aos seus membros e que constituem instrumentos de controle social, isto é, regulam os comportamentos individuais e coletivos a fim de assegurar uma certa ordem social.[26] Mesmo nas sociedades mais simples o direito é elemento estruturante do controle social, permitindo "prevenir, remediar ou castigar os desvios das regras prescritas".[26] O nascimento do direito, portanto, remonta a tempos imemoriáveis, e tratar de sua história implica reconhecer seu surgimento em diferentes sociedadese momentos históricos.[27] Embora não se possa identificar uma data, mesmo aproximada, para o seu surgimento, sabe-se que a vida em cidades data de pelo menos 7000 AEC e, por essa época, seguramente o direito já estava presente.[28] Inicialmente as regras aplicáveis às sociedades eram transmitidas sem grande preocupação com a sua sistematização, oralmente[29] e por meio de uma simbologia capaz de expressar normas e valores de maneira figurativa mas com clareza e precisão imediatas.[30][nota 5] Assim, no âmbito das sociedades ágrafas o direito evidentemente não era legislado, mas sim constituído essencialmente de costumes, que foram se perpetuando através das gerações e se consolidando na forma de tradições e rituais.[33][nota 6] Como a mobilidade e o intercâmbio entre as primeiras sociedades eram limitados pelas distâncias geográficas e o desenvolvimento tecnológico, inicialmente os seus direitos apresentavam um grau acentuado de endogenia; os direitos de cada sociedade, portanto, eram bastante particulares e apresentavam pouca influência externa,[29] daí se falar em uma "multiplicidade de direitos" desde logo cedo.[33] História Sociedades arcaicas https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega_antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_falada https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_portuguesa https://pt.wikipedia.org/wiki/Pr%C3%A9-hist%C3%B3ria https://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_do_direito https://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_das_cidades https://pt.wikipedia.org/wiki/Oralidade https://pt.wikipedia.org/wiki/Costume https://pt.wikipedia.org/wiki/Tradi%C3%A7%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Ritual 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 4/48 O Código de Ur-Namu é o mais antigo texto de lei jamais encontrado (século XX AEC) As evidências sobre o funcionamento desses direitos também sugerem que inicialmente as normas de direito tinham como objeto privilegiado os interesses do grupo em detrimento da regulação de interesses individuais; não por acaso, o direito penal surgiu cedo na história do direito e talvez mesmo tenha sido a sua origem.[29] Da mesma forma, há consenso que os direitos primitivos eram fortemente contaminados pela religião, de modo que a autoridade das regras de direito estava fundada no sobrenatural: nas vontades das divindades, nas crenças dos antepassados e nos rituais.[35][36] Assim sendo, naturalmente os sacerdotes tornaram-se os primeiros reveladores e intérpretes das normas[37][31] e, na maior parte das sociedades arcaicas, as figuras do líder religioso, do legislador e do rei se confundiam ou estavam intimamente relacionadas.[38] Ao longo do tempo as vontades das divindades, as crenças dos antepassados e os rituais tenderam a se fundir em uma coisa só, isto é, as normas de cunho religioso transformaram-se em costumes e rituais, que, por sua vez, foram sendo substituídos por leis.[39] Por esse motivo, considera- se que os direitos primitivos possuíram três estágios de desenvolvimento: o direito oriundo dos deuses, o direito que toma a forma de costumes e o direito fundado nas leis.[39] Os primeiros textos expressando e organizando as normas jurídicas viram o dia concomitantemente ao surgimento da escrita,[34][40] por volta de 3200 AEC,[28] no seio das culturas que, por meio dessa nova tecnologia, buscaram registrar as informações sobre sua organização em um meio mais perene do que as memórias dos indivíduos.[41] Os sumérios produziram alguns dos primeiros documentos com conteúdo jurídico que se conhece, na forma de documentos de caráter negocial. Os primeiros deles foram registros de transações fundiárias, datados por volta de 3000 AEC,[42] e contratos relacionados a outros bens, incluindo a compra, venda e libertação de escravos, surgiram pela mesma época.[43] Não muito mais tarde, entre 2300 e 2200 AEC, o Império Acádio produziu os primeiros documentos conhecidos estabelecendo tratativas entre dois povos diferentes, e que são os registros mais remotos do direito internacional.[44] Quanto a textos de lei tratando da regulação interna da sociedade, embora se conheça indiretamente existência de leis como o Código de Urucaguina, produzido no século XXIV AEC, o mais antigo códice legal já encontrado por arqueólogos é o Código de Ur-Namu, produzido na Suméria provavelmente entre 2047 e 2030 AEC.[46] Mesmo em relação a documentos posteriores, esse documento mostrou-se avançado por empregar uma fórmula casuística para as regras que previa[nota 7] e por conter numerosas regras buscando proteger a maioria mais fraca contra os abusos da minoria mais poderosa.[48] Um outro documento inicial, por décadas considerado o mais antigo documento desse tipo, foi o Código de Hamurabi, que desde a publicação de sua primeira tradução parcial, em 1902,[49] tornou-se provavelmente o mais famoso códice das fases iniciais da Idade Antiga.[48][50] A fama desse documento babilônio se assenta no fato dele apresentar "o mais coerente e elaborado engajamento com questões de justiça no período inicial da história mundial", de maneira que não se veria igual Quando Anu, o sublime, Rei dos Anunáqui, e Bel, o Senhor do Céu e da Terra, [...] deram a Marduque, o filho dominante de Ea, Deus da justiça, o domínio do homem terreno [...], eles deram à Babilônia o seu nome ilustre, a criaram na terra e nela fundaram um reino eterno [...]; então Anu e Bel “ https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Ur_Nammu_code_Istanbul.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Ur-Namu https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_penal https://pt.wikipedia.org/wiki/Religi%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_da_escrita https://pt.wikipedia.org/wiki/Sum%C3%A9ria https://pt.wikipedia.org/wiki/Propriedade_rural https://pt.wikipedia.org/wiki/Contrato https://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_Ac%C3%A1dio https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_internacional https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Urucaguina https://pt.wikipedia.org/wiki/Arqueologia https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Ur-Namu https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Hamurabi https://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Babil%C3%B3nia https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Hamurabi https://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Babil%C3%B3nia https://pt.wikipedia.org/wiki/Anu https://pt.wikipedia.org/wiki/Anun%C3%A1qui https://pt.wikipedia.org/wiki/Bel_(mitologia) https://pt.wikipedia.org/wiki/Marduque https://pt.wikipedia.org/wiki/Enqui https://pt.wikipedia.org/wiki/Babil%C3%B4nia 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 5/48 Prólogo do Código de Hamurabi por outros mil anos.[48] Datado de c. 1760 AEC, ele continha 282 leis relativas a questões econômicas (como preços, tarifas, e comércio), familiares (como a regulação do casamento e do divórcio), criminais (tipificação e punição por crimes) e de direito civil (relativas, por exemplo, à escravidão e ao pagamento de dívidas).[51] As penas previstas variavam de acordo com a estratificação social dos infratores (escravo/livre, homem/mulher) e as circunstâncias dos crimes.[51] Além do mais, esse documento também é testemunha do nascente processo de intercâmbio entre os direitos de diferentes culturas, pois incorporou regras que hoje se sabe estavam presentes em leis estrangeiras, como o Código de Ur-Namu,[48] e influenciou outros corpos de leis, notadamente as Leis Bíblicas.[52] Exemplos arcaicos adicionais incluem o Código de Lipite-Istar (c. 1930 AEC), o Código de Esnuna (c. 1720 AEC), o Código dos Assírios (final do século XII AEC), as Leis Hititas (século XIII AEC), as Leis do Império Neobabilônico (século VI AEC), o Código da Aliança (c. 1000 AEC) e o Código Deuteronômico (século VII AEC),[53] além do Código de Atenas elaborado por Drácon (século VII AEC).[54] Todos esses documentos empregaram a fórmula casuística do Código de Ur-Namu eincluíram regras voltadas à solução de problemas do dia a dia.[55] Os gregos e os romanos foram os primeiros povos a distanciar a moral e a religião do direito,[41][56] e estes últimos foram os primeiros a organizar um verdadeiro direito, no sentido atual do termo, ao extrair, estudar e aplicar sistematicamente regras que poderiam ser utilizadas para resolver outros casos, a partir de decisões precedentes sobre casos concretos.[57] Outra distinção fundamental do direito romano frente aos demais direitos da época é que ele tratava principalmente de questões de interesse privado.[58] Assim, ele expressou, possivelmente pela primeira vez, "o advento do direito privado, isto é, o reconhecimento jurídico da esfera privada em oposição à esfera pública".[59] O marco inicial do direito romano, tal qual ele foi transmitido à posteridade, foi um corpo de normas chamado Lei das Doze Tábuas (em latim: Lex Duodecim Tabularum), que se originou em torno de 450 AEC, no início do período da República Romana.[60] Até então os romanos haviam regulado sua sociedade por meio de costumes e rituais desenvolvidos ao longo de séculos, e esse documento codificou parte das regras até então praticadas.[61] Embora não haja consenso sobre a veracidade da tradição de que teria se originado em um contexto de disputa entre a classe dos plebeus e a dos patrícios,[62][63] está claro que a Lei das Doze Tábuas foi influenciada pelos direitos de outros povos, sobretudo códices da Mesopotâmia[64] e a legislação ateniense elaborada por Sólon.[65] A cidade-estado onde a democracia se desenvolveu, Atenas possuía o direito da Antiguidade que apresentava maior desenvolvimento quanto ao processo judicial e à formação da legislação.[66] O código de Solon substituíra o de Drácon, como parte de uma ampla reforma institucional, social e econômica,[67] e a criação da corte suprema de Atenas, a Helieia, permitiu a qualquer pessoa recorrer de decisões injustas de tribunais inferiores, estabelecendo assim o princípio de que a lei se encontrava acima do magistrado, a quem cabia apenas aplicá-la.[67] Talvez mais importante, o chamaram a mim, Hamurabi, o exaltado príncipe, temente a Deus, para promover o domínio da justiça na terra, para destruir os ímpios e os malfeitores; para que os fortes não prejudiquem os fracos; para que eu governe as pessoas de cabeça negra como Samas e ilumine a terra para promover o bem- estar da humanidade.[45] ” Direito romano https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Hamurabi https://pt.wikipedia.org/wiki/Circa https://pt.wikipedia.org/wiki/Estratifica%C3%A7%C3%A3o_social https://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_b%C3%ADblica https://pt.wikipedia.org/wiki/Lipite-Istar https://pt.wikipedia.org/wiki/Circa https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Esnuna https://pt.wikipedia.org/wiki/Circa https://pt.wikipedia.org/wiki/Ass%C3%ADrios https://pt.wikipedia.org/wiki/Hititas https://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_Neobabil%C3%B4nico https://pt.wikipedia.org/wiki/Livro_do_%C3%8Axodo https://pt.wikipedia.org/wiki/Circa https://pt.wikipedia.org/wiki/Deuteron%C3%B4mio https://pt.wikipedia.org/wiki/Atenas_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Dr%C3%A1con https://pt.wikipedia.org/wiki/Gr%C3%A9cia_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Roma_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Moral https://pt.wikipedia.org/wiki/Religi%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_romano https://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_das_Doze_T%C3%A1buas https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/Rep%C3%BAblica_Romana https://pt.wikipedia.org/wiki/Codifica%C3%A7%C3%A3o_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Plebe https://pt.wikipedia.org/wiki/Patr%C3%ADcio https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%B3lon https://pt.wikipedia.org/wiki/Democracia https://pt.wikipedia.org/wiki/Atenas_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Processo_judicial https://pt.wikipedia.org/wiki/Processo_legislativo https://pt.wikipedia.org/wiki/Dr%C3%A1con https://pt.wikipedia.org/wiki/Helieia https://pt.wikipedia.org/wiki/Tribunal https://pt.wikipedia.org/wiki/Hamurabi https://pt.wikipedia.org/wiki/Utu 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 6/48 As leis do ateniense Sólon tiveram influência importante na codificação da Lei das Doze Tábuas romana direito ateniense foi muito influenciado pela filosofia grega e, por meio dela, permitiu aos romanos "construir um direito sistematizado e governado pela razão e pelo dever", a ponto de se poder falar em um "sistema científico".[68] A Lei das Doze Tábuas era parte daquilo que os romanos entendiam como ius civile ou direito dos cidadãos,[nota 8] e que era aplicável unicamente aos cidadãos romanos.[70] Conforme a república deu lugar a um império, seus governantes enfrentaram o crescente desafio de governar uma população cada vez mais diversa e decentralizada, e disputas entre os cidadãos romanos e os não-cidadãos, que viviam ou viajavam por seus territórios, mostraram a exaustão do ius civile frente a muitos desses casos.[61] Assim, gradualmente foi se desenvolvendo o chamado ius gentium ou direito dos povos, constituído por leis aplicáveis a todas as pessoas livres, independente de sua nacionalidade, e que, na visão dos romanos, era fundado nos princípios e valores compartilhados por toda a humanidade.[61][71] Mais tarde, com a sofisticação do direito romano, um outro desdobramento viu o dia na forma do ius honorarium, constituído de precedentes e soluções adotados por magistrados, particularmente o pretor, e que facilitava a aplicação das leis ao fornecer elementos para suprir suas lacunas e mesmo corrigi-las.[72][nota 9] Ao longo da história de Roma, cada uma dessas fontes do direito romano evoluiu consideravelmente em conteúdo e importância, permitindo ao direito transformar-se e manter sua vitalidade.[75] Pelos idos de Cícero, o ius honorarium parece ter sido a maior e mais importante fonte do direito e, pela época de Diocleciano, já durante o Império, uma rica tradição de jurisprudência se encontrava consolidada.[76] Pouco a pouco, as análises dos resultados das decisões relativas ao ius gentium e ao ius honorarium passaram a ser estendidas ao ius civile e, gradualmente, levaram a uma maior integração das fontes do direito romano e à constituição de uma legítima ordem jurídica (em latim: ordo iuris).[77][75] Durante o império também surgiu um quarto elemento do direito romano, chamado ius novum, constituído de leis, opiniões do Senado Romano (em latim: senatusconsulta), decretos do imperador e decisões de outros magistrados (em latim: cognitio extra ordinem) sobre assuntos que não estavam vinculados pelas regras comuns do direito.[75] Com a maior complexidade do direito, a administração da justiça passou a necessitar de um grupo maior de profissionais para operar o sistema de leis e decisões que havia sido desenvolvido. Assim, na segunda metade do século III AEC surgiu uma nova classe de especialistas treinados em direito, chamados juristas, que não participavam diretamente da administração da justiça mas trabalhavam na interpretação do direito e na produção de pareceres formais sobre ele. O trabalho de sucessivas gerações de grandes juristas e a constituição de uma ciência jurídica — a jurisprudentia[78] — elevaram-no ao seu ápice durante os sécs. I e II, que constituem o período clássico do direito romano.[61] Nos mil anos entre a Lei das Doze Tábuas e as codificações de Justiniano, os romanos desenvolveram o sistema jurídico secular mais sofisticado e abrangente da Antiguidade. O direito romano ainda é central na tradição da família romano- germânica do continente europeu e de algumas de suas ex-colônias nas Américas, Ásia e África, e foi fundamental para o desenvolvimento do direito internacional, do direito canônico e “ https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Solon.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%B3lon https://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_das_Doze_T%C3%A1buas https://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia_da_Gr%C3%A9cia_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Jus_civilehttps://pt.wikipedia.org/wiki/Cidadania_romana https://pt.wikipedia.org/wiki/Ius_gentium https://pt.wikipedia.org/wiki/Ius_honorarium https://pt.wikipedia.org/wiki/Magistrado https://pt.wikipedia.org/wiki/Pretor https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%ADcero https://pt.wikipedia.org/wiki/Diocleciano https://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_Romano https://pt.wikipedia.org/wiki/Ordem_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/Ius_novum https://pt.wikipedia.org/wiki/Senado_romano https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/Imperador_romano https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Juristas_(direito_romano)&action=edit&redlink=1 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 7/48 Rafael Domingo Osle O imperador bizantino Justiniano foi responsável pela elaboração do Corpus Iuris Civilis No século que se seguiu à divisão entre o Império Romano do Ocidente e o Império Romano Oriental, Teodósio II ordenou uma compilação das leis romanas, o Código de Teodósio (em latim: Codex Theodosianus), que foi aplicado em ambas as metades do império. Não muito depois, o Império Ocidental sucumbiu às migrações bárbaras que vinham ocorrendo na região,[61] e o imperador bizantino Justiniano buscou reconquistar alguns dos territórios ocidentais que haviam sido perdidos para invasores germânicos, de forma a restabelecer o controle e um senso de unidade dentro do Império.[61] Como parte desse desafio, o governo de Justiniano empreendeu um grande esforço de codificação das leis do império, e que resultou no Corpus Iuris Civilis,[61] formado por três documentos: Institutos (em latim: Institutiones), uma introdução ao sistema jurídico romano; Digesto (em latim: Digesta) ou Pandectas (em grego: Pandectae), uma coleção de excertos de textos de juristas consagrados; e o Código Justiniano propriamente dito (em latim: Codex Iustinianus), um conjunto de doze volumes com as leis imperiais.[79][nota 10] O Corpus Iuris Civilis tornou-se a fonte primária do direito nas áreas controladas pelo Império Bizantino,[81] ao passo que a península Itálica e as demais províncias do Império Romano do Ocidente foram gradualmente perdendo elementos importantes de sua identidade romana, com evidentes reflexos em seus direitos.[82] Apesar da queda do Império Romano do Ocidente, o direito romano continuou a ser aplicado em seu antigo território e também no Império Bizantino. Contudo, rapidamente o direito existente nessas duas regiões deu origem a direitos distintos, devido a processos evolutivos próprios.[83] No Império Bizantino, graças às codificações de Justiniano e à preservação das instituições e do tratamento científico do direito, o direito romano, tal qual inicialmente moldado por Justiniano, continuou a ser utilizado por séculos.[83] Na sequência da elaboração do Corpus Iuris Civilis, Justiniano decretou limites para a sua interpretação por comentaristas, temeroso que o conteúdo da nova legislação fosse eclipsado por uma torrente de interpretações conflitantes.[84] Essa limitação parece ter relaxado com o passar dos séculos, e o trabalho dos juristas bizantinos jamais deixou de existir efetivamente.[85] Conjuntamente a isso, os imperadores que sucederam Justiniano continuaram a promover mudanças no direito, de acordo com os problemas sociais e econômicos que foram se apresentando e também porque as codificações justinianas jamais se tornaram a única fonte do direito no império.[85] O Corpus Iuris Civilis foi um produto do governo bizantino, mas com conteúdo em latim e tratando do direito romano, isto é, de instituições e conceitos criados por uma cultura distante e cujas raízes se perdiam no tempo; como consequência, seu conteúdo jamais esteve inteiramente ao alcance da cultura jurídica predominantemente grega dos juristas bizantinos.[85] Assim, os sucessores de Justiniano realizaram esforços a fim harmonizar e atualizar o direito bizantino, que existiu formalmente até a liquidação final do império, em 1453, mas continuou a influenciar a evolução dos direitos das nações que anteriormente eram parte da esfera de influência bizantina.[86] da common law. Juristas romanos criaram conceitos, ideias, regras e mecanismos jurídicos que a maioria dos sistemas jurídicos ocidentais ainda utiliza.[74] ” Idade Média https://pt.wikipedia.org/wiki/Rafael_Domingo_Osle https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Mosaic_of_Justinianus_I_-_Basilica_San_Vitale_(Ravenna).jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Justiniano https://pt.wikipedia.org/wiki/Corpus_Juris_Civilis https://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_Romano_do_Ocidente https://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_Romano_Oriental https://pt.wikipedia.org/wiki/Teod%C3%B3sio_II https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Teod%C3%B3sio https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/Migra%C3%A7%C3%B5es_b%C3%A1rbaras https://pt.wikipedia.org/wiki/Justiniano https://pt.wikipedia.org/wiki/Corpus_Iuris_Civilis https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/Pen%C3%ADnsula_It%C3%A1lica https://pt.wikipedia.org/wiki/Queda_do_Imp%C3%A9rio_Romano_do_Ocidente 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 8/48 Os glosadores tiveram papel fundamental na redescoberta e reconstrução do direito romano Em paralelo, no território antes controlado pelo Império Ocidental, inicialmente o direito romano, na forma do Código de Teodósio, continuou a ser utilizado pelas populações de origem romana.[83] Não obstante, com a ausência de um governo central e de uma classe de profissionais bem treinados para compreender e operar esse direito, ao longo dos séculos ele incorreu em processos de fragmentação e barbarização, ou seja, de fusão com os costumes dos povos germânicos que controlavam as diferentes regiões anteriormente romanas e de diversificação por conta da crescente feudalização.[87] Pela época do reino de Justiniano, no antigo território ocidental surgiram ao menos três codificações empreendidas por povos germânicos, sendo a mais famosa a Lei Romana dos Visigodos (em latim: Lex Romana Visigothorum), que consistiam de compilações pouco refinadas de fontes jurídicas romanas.[88] Como Roma havia construído o direito mais compreensivo e sofisticado até então,[77] ele acabou adotado em grande medida pelos governos que a sucederam, embora de maneira pouco analítica e marcadamente desigual nas diferentes regiões.[68][89] Assim, embora o direito romano jamais tenha deixado de existir completamente nas regiões que anteriormente eram parte do Império Ocidental, documentos do período mostram uma crescente quantidade de erros conceituais e ausência de originalidade e competência nas interpretações doutrinárias a seu respeito.[90] Ao longo dos séculos de declínio do direito romano, contudo, essas atividades se encarregaram de manter vivas a memória e a admiração por sua qualidade,[90] e eventualmente permitiriam avanços consideráveis nos direitos locais dos reinos europeus.[91] Pelo século XI a Europa emergia da idade das trevas, e isso foi acompanhado de uma revalorização da cultura clássica, que levaria à criação das universidades e ao Renascimento do século XII.[92][90] Como efeito mais imediato, esse movimento encorajou uma renovação no estudo do direito romano, sobretudo no sul da França e no norte da Itália.[90][93] Embora o estudo do Corpus Iuris Civilis tenha avançado em alguma medida por conta disso, sobretudo nas universidades de Pavia e Ravena, esse avanço foi limitado e só ganhou verdadeiro impulso com a redescoberta em Pisa, no final do século XI, de uma cópia completa do Digesto de Justiniano.[94][nota 11] Esse documento foi imediatamente estudado pelos glosadores da Universidade de Bolonha, que, ao longo de um século e meio de trabalho, sucederam em estabeleceras bases teóricas para a compreensão atual do direito romano.[96] Na Universidade de Bolonha milhares alunos de toda Europa aprendiam as técnicas de operação do direito lá desenvolvidas, e não o conteúdo de leis ou direitos específicos, e, a partir dela, os avanços no estudo do direito romano se difundiram por toda a Europa.[92][nota 12] Diversos motivos têm sido propostos para explicar esse fenômeno, dentre os quais a sobrevivência de instituições jurídicas romanas nos direitos praticados em diferentes partes da Europa; a versatilidade e amplitude do direito romano, que permitia resolver diversas questões para as quais os direitos dos países não tinham resposta; a adoção de novas leis, por diversos países, inspiradas no direito romano; e a crença no direito romano como sendo o direito comum a toda a cristandade.[98] Esta última questão, de fato, parece ter sido a principal motivação dos glosadores.[98][99] Por um motivo ou por outro, o a partir do século XI o direito romano passou a permear todos os direitos da Europa, embora em diferentes medidas e com suas próprias cronologias.[100] Em um movimento que prenunciava o processo de formação dos Estados nacionais,[101][99] ele encontrou a simpatia dos monarcas europeus, pois mostrou-se útil em seus esforços para impor seu poder real frente à nobreza feudal.[102] Consequentemente, muitos reinos viram surgir codificações inspiradas no direito romano, ao passo que muitos daqueles que detinham poder localmente https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Luigi_Serra_-_Irnerio_che_glossa_le_antiche_leggi.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Glosadores https://pt.wikipedia.org/wiki/Feudalismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Brevi%C3%A1rio_de_Alarico https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_das_trevas https://pt.wikipedia.org/wiki/Universidade https://pt.wikipedia.org/wiki/Renascimento_do_s%C3%A9culo_XII https://pt.wikipedia.org/wiki/Sul_da_Fran%C3%A7a https://pt.wikipedia.org/wiki/Norte_da_It%C3%A1lia https://pt.wikipedia.org/wiki/Pavia https://pt.wikipedia.org/wiki/Ravena https://pt.wikipedia.org/wiki/Glosadores https://pt.wikipedia.org/wiki/Universidade_de_Bolonha https://pt.wikipedia.org/wiki/Cristianismo 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 9/48 protestaram em busca de manter seus costumes locais e antigos privilégios.[103] Esse processo, contudo, foi apenas parcialmente efetivo, pois nenhum reino da época possuía a força necessária para substituir completamente os direitos locais por uma burocracia centralizada.[104] Assim, em primeiro lugar, apenas os casos envolvendo a alta justiça passaram a ser julgados pela cortes reais, enquanto tudo o mais permaneceu sob a jurisdição da nobreza local. Depois, o direito local continuou a ter preferência em relação ao direito romano, e este passou a ser utilizado como fonte subsidiária.[104][nota 13] Em última instância, em praticamente toda a Europa o ius commune (em português: direito comum) europeu, uma combinação de direito romano, direito canônico[nota 14] e direito local (em latim: ius proprium) continuou em uso até o final do século XVIII.[106][100][91] Elementos do Corpus permaneceram uma fonte imediata do direito até tempos recentes, como na Alemanha, até em 1900, e na Escócia, África do Sul e Sri Lanka, até pelo menos a segunda metade do século XX; além disso, a técnica romana influenciou fortemente o processo das codificações nas Américas, na Europa e na Ásia a partir do século XVIII.[107][108] Em grande medida por conta do Corpus, o direito romano tornou-se a fundação da família romano-germânica de direitos e pode ser considerado "uma das mais poderosas forças formativas no desenvolvimento da civilização ocidental".[107] Uma situação semelhante, mas em última instância excepcional, diz respeito à Inglaterra. No século XII a situação do direito desse país era essencialmente a mesma da Europa Continental: seu direito local era fundado nos costumes; diferentes condados, e até mesmo em unidades administrativas menores, possuíam diferentes direitos; o direito romano era estudado nas universidades e monastérios.[109] Também como no continente, o direito romano penetrava o direito inglês por meio do direito canônico e das cortes eclesiásticas, que julgavam temas como casamentos e divórcios.[110] Contudo, a partir de Henrique II o reino foi construindo um sistema de justiça relativamente bem organizado, e isso deu início a um processo de unificação do direito do país.[103] O direito romano continuou a ser ensinado nas universidades, e, no século XIII, havia uma marcada distinção entre o direito romano, científico, e o direito dos tribunais ingleses, vernacular.[93] Como na Europa, por essa época o perfil profissional desejado pela comunidade jurídica inglesa passou a compreender não apenas o direito romano, mas também o direito dos tribunais.[91] O profissional ideal, portanto, passou a ser "mestre de ambos os direitos" (em latim: utriusque iuris magister) e, nessa qualidade, a conhecer bem o direito comum produzido pelos tribunais (em inglês: common law).[91] Essas bases do direito inglês[nota 15] se definiriam mais claramente durante a Era Tudor, quando os Inns of Court se impuseram às universidades quanto à formação dos juristas.[110] A partir dos sécs. XV e XVI a Idade Moderna trouxe consigo um novo ideário, que rompeu com a mentalidade medieval em benefício da razão como valor dominante[112] e teve como consequência lógica uma busca crescente por igualdade e progresso.[113] Embora valores de independência do indivíduo já estivessem presentes no direito romano, o ideário moderno mostrou-se "radicalmente novo" ao combinar individualismo (a libertação do indivíduo da tutela e da dependência de uma pluralidade de amarras sociais) e universalismo (a busca de libertação do indivíduo de seu próprio condicionamento) e torná-los os dois pilares de uma liberdade integral do indivíduo.[114] Modernidade e Contemporaneidade A partir dos séculos XV e XVI homens de um novo tipo revolucionarão a ideia que o Homem tem de si mesmo, de suas possibilidades e de seu lugar no universo. Eles derrubarão a “ https://pt.wikipedia.org/wiki/Alta_justi%C3%A7a https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_portuguesa https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_can%C3%B3nico https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/Fam%C3%ADlia_romano-germ%C3%A2nica_de_direitos https://pt.wikipedia.org/wiki/Inglaterra https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_da_Inglaterra https://pt.wikipedia.org/wiki/Condados_do_Reino_Unido https://pt.wikipedia.org/wiki/Henrique_III_de_Inglaterra https://pt.wikipedia.org/wiki/Latim https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_inglesa https://pt.wikipedia.org/wiki/Casa_de_Tudor https://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_Moderna https://pt.wikipedia.org/wiki/Modernidade 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 10/48 Vincent Citot O direito natural de Hugo Grócio influenciou fortemente a "era das codificações" Essa nova visão de mundo gradualmente ganhou toda a Europa, infiltrando primeiro as instituições e depois as mentalidades e maneiras, e chegou ao Novo Mundo, que, influenciado por ele, gradualmente passou a buscar sua própria independência.[115] Enfim, em tempos mais recentes ela se generalizou por todo o planeta;[115] como já se colocou, "essa globalização dos valores da modernidade ocidental é um fato histórico".[115] O desenrolar da Modernidade foi marcado por mudanças maiores, dentre as quais a emergência do absolutismo, que findou com o sistema feudal medieval e fez surgir o Estado- nação burguês centralizado e burocrático;[116][117] a individualização cultural e linguística das nações;[116] a Renascença e a Reforma, intimamente ligadas à emergência de um humanismo fundado no valor do indivíduo e em suas possibilidades de acesso ao conhecimento;[118] a Revolução Científica, que forneceria bases para o Iluminismo;[119] e, enfim, o reconhecimento dademocracia como condição indispensável para a liberdade individual.[120] Como consequências dessas transformações, e em grande medida influenciada pelo pensamento político de Jean-Jacques Rousseau,[121] a Europa e depois o mundo assistiram ao advento do direito individualista e universalizante moderno,[122] que teve como expressão mais visível a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,[123] considerada o marco fundador da nova relação do direito com o Estado e,[123] portanto, um fundamento do direito na modernidade.[121][nota 16] O estabelecimento desse novo direito, cujo conteúdo é próprio a cada país, só foi possível com a formação do Estado-nação e sua estrutura sólida e ramificada, capaz de reclamar o desenvolvimento de um direito unificado e específico a ele;[125] com o desenvolvimento de uma administração pública como algo mais amplo que a prestação da justiça e a gestão do tesouro;[126] e com a gradual separação entre as funções de administração, prestação de justiça[126] e legislativa.[127][nota 17] A partir de então, o Estado de direito veio a se consolidar como novo paradigma em todo o mundo, "equilibrando os direitos e as garantias individuais baseados numa concepção abstrata de indivíduo portador de direitos a serem salvaguardados pelo Estado e contra o Estado".[123] A ciência do direito em si conheceu um grande desenvolvimento a partir dos novos valores modernos, em consonância com os valores políticos e sociais em transformação.[129] Durante a Renascença, o interesse renovado na Antiguidade Clássica forneceu um novo contexto intelectual para o estudo do direito romano na Europa, sobretudo pela escola do humanismo jurídico da França, que promoveu uma nova atitude crítica em relação a ele, contextualizando- o e historicizando-o. Ao fazer isso, ela passou a admirar e advogar a racionalidade do direito romano, mas acabou por questionar a sua autoridade e validade prática, pois, ao constatar que ele fôra um produto da sociedade romana e mudara com as circunstâncias de seu tempo, concluiu que o direito francês deveria ser um produto da sociedade francesa e adaptado às suas necessidades.[130] Paradoxalmente, o humanismo jurídico acabou defendendo uma separação estrita entre interesses históricos e práticos, e isso levou-o a permanecer um movimento sem forte influência na prática representação do tempo, ao inventar o progresso; derrubarão o teocentrismo, ao colocar o homem livre e racional no centro de suas preocupações; revolucionarão a antiga cosmologia geocêntrica; renovarão os cânones artísticos; e, na sequência, estabelecerão novas instituições políticas para garantir a liberdade individual.[111] ” https://pt.wikipedia.org/wiki/Vincent_Citot https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Hugo_Grotius_-_Imagines_philologorum.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Hugo_Gr%C3%B3cio https://pt.wikipedia.org/wiki/Absolutismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Estado-na%C3%A7%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Burguesia https://pt.wikipedia.org/wiki/Renascen%C3%A7a https://pt.wikipedia.org/wiki/Reforma_Protestante https://pt.wikipedia.org/wiki/Humanismo_renascentista https://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_Cient%C3%ADfica https://pt.wikipedia.org/wiki/Iluminismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Democracia https://pt.wikipedia.org/wiki/Jean-Jacques_Rousseau https://pt.wikipedia.org/wiki/Declara%C3%A7%C3%A3o_dos_Direitos_do_Homem_e_do_Cidad%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Administra%C3%A7%C3%A3o_p%C3%BAblica https://pt.wikipedia.org/wiki/Tesouro_nacional https://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Executivo https://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Judici%C3%A1rio https://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Legislativo https://pt.wikipedia.org/wiki/Estado_de_direito https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Humanismo_jur%C3%ADdico&action=edit&redlink=1 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 11/48 O Código Napoleônico de 1804, um produto influente da era das codificações jurídica.[131] Contudo, pela mesma época os Países Baixos e a Alemanha viram surgir uma nova escola do direito natural,[nota 18] influenciada pela filosofia grega e pelo racionalismo protestante.[132] Fundada por Hugo Grócio, ela defendia a existência de princípios jurídicos racionais inerentes à razão natural dos seres humanos — independentemente da religião e valores sobrenaturais — e sua busca em textos e documentos da Antiguidade, especialmente no direito romano.[133] Embora esse "novo direito natural do Iluminismo" não se confundisse o direito romano, utilizando-o apenas como base para seus próprios sistemas de leis, muitos dos seus princípios sobreviveram como princípios do direito natural.[134] Além de ter lançado as bases do direito internacional moderno, essa escola desencadeou e influenciou fortemente a era das codificações; mesmo nos países da common law, onde esse movimento não se fez tão presente, ele deixou suas marcas no direito privado.[135] O termo "era das codificações" foi cunhado pelo filósofo Jeremy Bentham para designar um movimento de codificação que varreu a Europa continental no século XVIII e se deu pela aplicação das teorias do direito natural na criação de legislações escritas abrangentes, com base, sobretudo, na razão natural (não religiosa ou de qualquer outra origem) do ser humano.[135] A teoria do direito natural fundado na razão forneceu critérios e padrões para a definição de direitos subjetivos essenciais e permitiu ao jurista questionar o valor e a qualidade do direito, ao passo que o fenômeno da codificação "abriu as portas para a possibilidade de repensar e reformular todos os princípios, premissas e pilares fundamentais dos sistemas jurídicos europeus".[135] Isso daria origem aos códigos especializados, que deveriam conter, de maneira coerente e sistematizada, a totalidade dos princípios e regras relativos a cada ramo do direito.[135] O fenômeno da codificação foi particularmente significativo na França nos anos seguintes à Revolução de 1789, mas também foi importante na Confederação Germânica e se espalhou, em diferentes graus, por todo o mundo durante os sécs. XIX e XX.[135] O Código Napoleônico de 1804 foi a conquista mais proeminente da era das codificações; considerado um monumento à perfeição da razão, transpôs para o direito a articulação intelectual da soberania nacional: a França, como Estado unificado, deveria ter um direito comum para todos os cidadãos, baseado na razão e não nos costumes.[135][95] Sua influência iniciou-se com as Guerras Napoleônicas, mas estendeu-se a outras partes da Europa (Bélgica, Luxemburgo, Holanda, Itália, Espanha, Portugal, Hungria, Romênia e Grécia), e à América Latina, Turquia, Egito, China, Japão e Luisiana (Estados Unidos).[136] Já o posterior o Código Civil Alemão de 1900, embora tenha tido influência considerável do direito romano e seja um produto tardio do movimento de codificação,[95] teve uma origem fundada no positivismo jurídico. O Código Napoleônico inspirou um movimento semelhante na Alemanha, interessado em sistematizar e unificar as várias leis heterogêneas vigentes no país, mas que foi oposto pela Escola Histórica do Direito, que defendia que um direito para todos os reinos alemães não poderia ser identificado unicamente a partir da razão, porque o direito seria um produto da cultura e dos hábitos de cada sociedade.[137] Seu membro mais ilustre, Friedrich Carl von Savigny, defendia que povo tem uma história, um caráter e uma consciência próprios — um "espírito nacional" (em alemão: Volksgeist) — que imprimem suas marcas no direito e nas instituições jurídicas.[138] Seu discípulo Georg Friedrich Puchta daria continuidade a esse trabalho e, com base no método da jurisprudência dos conceitos, deu passos importantes para o estabelecimento do direito como uma ciência jurídica positiva, com uma existência independente dos aspectos éticos, políticos e econômicos da vida social.[139] Nessa nova concepção, as regras de direito somente Era das codificações https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Code_Civil_1804.pnghttps://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_Napole%C3%B4nico https://pt.wikipedia.org/wiki/Racionalismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Protestantismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Hugo_Gr%C3%B3cio https://pt.wikipedia.org/wiki/Iluminismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Jeremy_Bentham https://pt.wikipedia.org/wiki/Raz%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_subjetivo https://pt.wikipedia.org/wiki/Codifica%C3%A7%C3%A3o_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Ramos_do_direito https://pt.wikipedia.org/wiki/Confedera%C3%A7%C3%A3o_Germ%C3%A2nica https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_Napole%C3%B4nico https://pt.wikipedia.org/wiki/Guerras_Napole%C3%B4nicas https://pt.wikipedia.org/wiki/Luisiana https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_Civil_Alem%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Positivismo_jur%C3%ADdico https://pt.wikipedia.org/wiki/Escola_Hist%C3%B3rica_do_Direito https://pt.wikipedia.org/wiki/Friedrich_Carl_von_Savigny https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_alem%C3%A3 https://pt.wikipedia.org/wiki/Georg_Friedrich_Puchta https://pt.wikipedia.org/wiki/Jurisprud%C3%AAncia_dos_conceitos https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_Civil_Alem%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Positivismo_jur%C3%ADdico https://pt.wikipedia.org/wiki/Escola_Hist%C3%B3rica_do_Direito https://pt.wikipedia.org/wiki/Friedrich_Carl_von_Savigny https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_alem%C3%A3 https://pt.wikipedia.org/wiki/Georg_Friedrich_Puchta https://pt.wikipedia.org/wiki/Jurisprud%C3%AAncia_dos_conceitos 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 12/48 poderiam ser extraídas de um sistema integrado de normas positivadas.[140] Embora no longo prazo tenha prevalecido o interesse em unificar e codificar o direito civil alemão, o Código Civil Alemão, que começou a ser elaborado algumas décadas depois, foi muito influenciado pela perspectiva da Escola Histórica do Direito[141] e influenciaria o direito de numerosos países, notadamente Japão, Suíça, Grécia, Rússia e os países escandinavos.[142] Um dos eixos centrais da Modernidade, a globalização foi acompanhada de um fenômeno de difusão de modelos jurídicos que se convencionou chamar "globalização do direito".[143] Esse fenômeno jurídico, iniciado com a Modernidade e que se estende até a Contemporaneidade, corresponde à "constituição progressiva de uma base de regras e princípios comuns que se traduz em um movimento de aproximação dos sistemas jurídicos dos Estados"[144] ou ainda à "intensidade em que o mundo inteiro vive sob um conjunto único de regras jurídicas [...] imposto por um único ator coercitivo, adotado por consenso global ou alcançado por desenvolvimento paralelo em todas as partes do globo".[145] Dito de outro modo, a globalização do direito constitui "a criação de um fundo comum de regras de aplicação geral" que não se confunde com uma verdadeira "ordem jurídica transnacional" que supera os direitos do Estado, mas sim que, normalmente, se difunde pela incorporação de regras comuns pelos diferentes direitos nacionais.[144] A aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948 é um exemplo disse tipo, que, embora seja um documento não vinculante, orientou, voluntariamente, o desenvolvimento dos direitos nacionais rumo a objetivos comuns:[146] ela levou à criação, negociação e aprovação de regras em direito internacional pelos Estados, que em seguida têm sido incorporadas aos direitos nacionais.[147] Contudo, embora o desenvolvimento expressivo do direito internacional ao longo do século XX seja um eixo da globalização do direito, esta corresponde "a uma etapa radicalmente nova e qualitativamente diferente", pois, enquanto a internacionalização do direito foi apoiada e levada a cabo pelos Estados-nação, "a globalização escapou amplamente de suas garras e seu escopo não é mais apenas econômico, mas também social, cultural e político".[148] A globalização do direito, portanto, se apoia também em outros eixos não necessariamente tutelados pelos procedimentos convencionais do Estado:[149] esse fenômeno jurídico é inseparável da globalização em geral, e a globalização de certos valores contribui positivamente para a construção de regras comuns entre os Estados.[150] Para alguns autores seria possível falar em um processo de globalização do direito dividido em três fases que sobrepõem parcialmente.[151] A primeira delas, que vai da metade do século XIX até o princípio da Primeira Guerra Mundial, teve como mecanismos de ação a imposição do direito das metrópoles ocidentais ao mundo colonizado, a "abertura forçada" de nações não ocidentais que escaparam ao colonialismo e "o prestígio da ciência jurídica alemã" no mundo ocidental.[152] A segunda fase dessa globalização se estende do início do século XX a 1968, e foi alimentada principalmente pelos movimentos reformistas de todas as faixas políticas no Ocidente desenvolvido, pelos movimentos nacionalistas nos países periféricos e pelas elites dos países que se tornaram independentes após o fim da Segunda Guerra Mundial.[152] A terceira fase, correspondente ao período que vai do fim da Segunda Guerra Mundial até o princípio do século XXI, foi movida pela influência americana na sequência da Segunda Guerra Mundial e da Guerra Fria, e uma "nova consciência jurídica" dos Estados que, para poderem participar no mercado mundial, se veem compelidos a respeitar as "condições estabelecidas por empresas multinacionais e instituições reguladoras internacionais".[153] Globalização do direito Inflação regulamentar https://pt.wikipedia.org/wiki/Globaliza%C3%A7%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Declara%C3%A7%C3%A3o_Universal_dos_Direitos_Humanos https://pt.wikipedia.org/wiki/Primeira_Guerra_Mundial https://pt.wikipedia.org/wiki/Colonialismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Segunda_Guerra_Mundial https://pt.wikipedia.org/wiki/Guerra_Fria 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 13/48 Ao longo dos sécs. XIX e XX o positivismo jurídico se firmou como tendência dominante, tanto nos direitos romano-germânicos quanto nos da common law,[154] e o direito, apreendido como uma ordem normativa pura ou carregado das aspirações éticas do humanismo, continua amplamente ancorado no pensamento racionalista clássico e na premissa de que é "possível apreender objetivamente a realidade, racionalizá-la de acordo com categorias jurídicas abstratas e atuar sobre elas por meio de comandos escritos de valor geral, impessoal e permanente".[155] Assim, a chamada "inflação legislativa" se estabeleceu como uma forte tendência da Contemporaneidade, como testemunha da crença no poder da lei em produzir resultados práticos e alimentada pelo apelo à lei por parte de múltiplos grupos de interesse e de lobismo e pelo impulso regulador do Estado.[156] Apesar de críticas contundentes clamando por uma redução da pressão jurídica sobre a vida social, especialmente a vida econômica, e do estabelecimento de mecanismos para conter o reflexo regulatório da administração pública (por meio do controle parlamentar, da avaliação prévia das repercussões das lei, e de uma abertura maior à participação pública no processo legislativo), ela tem se mostrado persistente e imune a tentativas de redução radical do volume do arcabouço jurídico.[156] Em geral, mesmo a "política de menos Estado" tem se mostrado incapaz de realizar uma varredura, e, como já se colocou, mesmo os governos neoliberais mais extremados se veem obrigados a continuamente introduzir novas leis e a regulamentar novos setores e atividades.[156] Por fim, a Contemporaneidade tem sido marcado por uma crescente juridicização das relações sociais — a tendência generalizada de que conflitos sociais sejam discutidos sob o ponto de vista jurídico, que tem como uma de suas principais consequências a judicialização das relações sociais, entendida como a tendência de que litígios sejam submetidos ao judiciário, em detrimento de outros modos de solução de conflitos.[157] As discussõessobre esses fenômenos foram iniciadas na Alemanha no início do século XX por Otto Kirchheimer, no contexto da institucionalização dos conflitos de classes e da progressiva reorientação de disputas sociais e políticas para formas jurídicas de resolução de conflitos, que ocorriam na transição do Império Alemão para o modelo de Estado social que se iniciava com a República de Weimar.[158] Segundo Jürgen Habermas, essa foi uma etapa dos "surtos sucessivos de juridicização" que se iniciaram com a formação do Estado burguês e depois continuaram com as suas transições sucessivas para o Estado de Direito, o Estado de Direito democrático e o Estado de Direito social e democrático no decorrer do século XX.[117] A juridicização, portanto, é um "inevitável efeito secundário do êxito do compromisso social" do Estado e se manifesta em face de uma crescente interferência da economia e do Estado na esfera da experiência dos indivíduos.[158] Consequência de um movimento civilizatório, ela apresentou benefícios evidentes, embora frequentemente intangíveis e imensuráveis, como maior justiça social, maiores oportunidades para as mulheres e minorias, expansão das liberdades civis, procedimentos justos no interior das instituições e limites mais firmes ao governo;[159] e a expansão dos direitos subjetivos individuais e coletivos e um melhor conhecimento, por parte do cidadão ou pessoa moral, a respeito dos seus direitos.[nota 19][161] Contudo, nesse contexto o Poder Judiciário assumiu gradualmente um papel mais pronunciado na garantia e concretização de direitos encartados nas Constituições,[162] e foi se transformando em depositário das esperanças individuais e coletivas "como um verdadeiro superórgão capaz de resolver todas as diferenças existentes", em detrimento de meios alternativos de composição em conflitos.[163] No longo prazo, isso acarretou uma "crise no Poder Judiciário",[164] que tem como efeitos mais visíveis o abarrotamento dos tribunais,[165] que impede que atendam satisfatoriamente as demandas que lhe são submetidas,[161] e também uma "cultura da litigância" Juridicização e judicialização das relações sociais https://pt.wikipedia.org/wiki/Grupo_de_interesse https://pt.wikipedia.org/wiki/Lobismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Neoliberalismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Judici%C3%A1rio https://pt.wikipedia.org/wiki/Otto_Kirchheimer https://pt.wikipedia.org/wiki/Estado_de_bem-estar_social https://pt.wikipedia.org/wiki/Rep%C3%BAblica_de_Weimar https://pt.wikipedia.org/wiki/J%C3%BCrgen_Habermas 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 14/48 Herbert Hart que produz outras consequências indesejadas.[166] No âmbito econômico, além da litigância em si ser custosa, ela leva à adoção de estratégias “defensivas” nos negócios e reprime a inovação.[167] No âmbito do setor público, ela onera o Estado e reprime programas e projetos,[167] e leva à multiplicação do número de órgãos jurisdicionais e dos riscos de incerteza jurisdicional, que resultam em maior lentidão da justiça[168][169] e, em última instância, na necessidade de reformas do aparato do Judiciário.[170] Por fim, no âmbito das relações humanas, o direito de ação e o processo judicial por vezes passam a ser instrumentos de vinganças pessoais, tornando o Poder Judiciário "palco de rixas pessoais, íntimas e odiosas, quando não uma verdadeira loteria jurídica";[161] e expõem os limites do modelo judicial de resolução de conflitos, na medida em que ele — adversarial e fundado na oposição de interesses — se revela particularmente mal adaptado a conflitos envolvendo partes comprometidas em relacionamentos contínuos ou comunitários, como as relações de vizinhança e família.[171] Numerosas definições do direito convivem no quotidiano da comunidade jurídica, em geral salientando sua dimensão prática — por exemplo, como "a ciência da justiça" — ou, principalmente, sua dimensão normativa, isto é, a norma jurídica como seu elemento-base.[173] Dentre as definições de direito mais comumente aceitas, estão sua caracterização como um corpo ou sistema de regras que busca "guiar o comportamento humano" e "oferece razões para a ação",[174] ou ainda de "regras de ação ou conduta [...] com força legal vinculativa"[175] e "que regulam o comportamento das pessoas [...] através do estabelecimento de direitos e deveres".[176] Apesar da utilidade dessas definições, aqueles que se debruçaram mais longamente sobre essa questão têm sugerido que dificilmente o fenômeno jurídico poderá ter sua natureza expressa, satisfatoriamente, na forma de uma definição concisa.[177][nota 20] Na realidade, a busca por uma caracterização precisa do direito tem desafiado desde longa data operadores do direito, cientistas sociais e, principalmente, jusfilósofos,[179] em parte porque o direito é "um fenômeno social complexo que é [...] um dos aspectos mais intrincados da cultura humana"[174] mas também porque essa tarefa pressupõe que ele possui certas características e uma natureza universais, presentes onde e quando ele jamais existiu.[174][172][nota 21] Não por acaso, as tentativas de produzir uma definição de direito suscitaram questionamentos importantes a respeito das limitações dessa empreitada e da possibilidade de realizá- la.[174] Assim, enquanto invariavelmente os especialistas reconhecem a dificuldade de se produzir uma definição precisa mas também operacional de direito, alegando que a maior parte daquelas que já se pôde produzir são excessivamente genéricas ou restritivas,[nota 22][177][183][182] outros vão mais longe e consideram-na impraticável, embora nem sempre concordando a respeito da utilidade de se buscar realizá-la. Notadamente, enquanto já se sugeriu que tal definição não poderia ser produzida, e que, na realidade, não existiria Natureza Poucas questões sobre a sociedade humana têm sido postas com tanta persistência e obtido respostas, por parte de pensadores sérios, tão numerosas, variadas, estranhas e até paradoxais, como a questão "o que é o direito?". Mesmo se limitarmos a nossa atenção à teoria jurídica dos últimos 150 anos e deixarmos de lado a especulação clássica e medieval acerca da "natureza" do direito, encontraremos uma situação sem paralelo em qualquer outra matéria estudada de forma sistemática [...].[172] “ ” https://pt.wikipedia.org/wiki/Herbert_Hart https://en.wikisource.org/wiki/Natural_Law;_or_The_Science_of_Justice:_A_Treatise_on_Natural_Law,_Natural_Justice,_Natural_Rights,_Natural_Liberty,_and_Natural_Society;_Showing_that_All_Legislation_Whatsoever_is_an_Absurdity,_a_Usurpation,_and_a_Crime._Part_First./1 https://pt.wikipedia.org/wiki/Norma_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia_do_direito 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 15/48 necessidade de produzi-la pois a operação do direito e a realização da justiça não dependeriam necessariamente de uma definição tecnicamente precisa do que é o direito,[184] outros, que concordam quanto à impossibilidade de definir o que é o direito, salientam como sendo igualmente evidente a necessidade de que a luta para defini-lo nunca seja abandonada.[185] Os principais esforços para definir o direito de maneira precisa e universal partem da constatação de que o direito é um domínio normativo — tal qual outros domínios que buscam orientar o comportamento humano, como a moral, a religião, as normas sociais e a etiqueta[174][186] — e buscam explicar em quê ele difere desses outros tipos de domínios normativos, como se dá a sua relação com eles e em que medida sua operação depende desses outros domínios, sobretudo o da moral.[174][187] Nessa linha, muitos buscaram individualizar o caráter do direito por meio do seu conteúdo, alegando que cada uma de suas normas “institui ao mesmo tempo um direito a um sujeito e um dever a um outro” e, portanto, que a norma jurídica se distinguiria por sempre regular uma relação intersubjetiva — diferentemente das normas morais, que sãounilaterais.[188] Como já se colocou, contudo, embora essa noção seja muito difundida por explicar a dimensão prática do direito, ela falha em diferenciar o direito de outros domínios normativos intersubjetivos, como aquele das normas sociais.[189] Outros, buscaram diferenciar o direito a partir de sua finalidade, alegando que ele regula relações intersubjetivas diferentes daquelas reguladas pelas normas sociais, isto é, apenas as relações intersubjetivas envolvendo ações necessárias à "conservação da sociedade".[189] Dito de outro modo, nem toda ação humana é necessária à conservação da sociedade mas, aquelas que o são, ao longo da história vão se distinguindo e passam a ser normatizadas, isto é, tornam-se direito.[189] Contudo, também aqui se apresenta uma forte objeção, pelo fato de as normas jurídicas — aquelas que seriam necessárias à conservação da sociedade — serem diferentes em cada sociedade e mudarem no curso do tempo, e, por esse motivo, ser impossível "fixar de modo unívoco os caracteres que fazem de uma norma uma regra essencial à conservação da sociedade.[190] Enfim, o debate a respeito da natureza do direito tem como eixo maior as questões das condições de validade e dos fundamentos da normatividade do direito.[174] Historicamente, duas tradições filosóficas principais têm se concentrado sobre esse propósito, as chamadas correntes jusnaturalista e juspositivista,[174][nota 23] que se desdobram em uma ampla variedade de concepções e teses e se opõe frontalmente quanto a algumas delas.[194] Embora alguns autores apontem a diminuição da importância dessa dicotomia na atualidade[195] e indiquem a emergência de rótulos, como direito pós-moderno, pós-positivismo e não-positivismo principiológico, que expressariam a sua superação, alguns aspectos da relação entre essas duas correntes permanecem profundamente divergentes e, portanto, continuam a alimentar um intenso debate.[196] A tradição do direito natural, também chamada jusnaturalista, é a mais antiga das duas principais correntes filosóficas que buscam explicar a natureza do direito, e, em sua forma contemporânea, remonta à Idade Média Tardia.[174] Embora suas bases possam ser traçadas até a Antiguidade, na forma das concepções mítico-religiosas que as civilizações grega e romana atribuíam ao direito, e algumas de suas concepções tenham sido objeto da atenção de filósofos cristãos iniciais, como Agostinho de Hipona, ela viria a se desenvolver como uma tradição filosófica autônoma a partir da Escolástica da Baixa Idade Média.[197][198] A Idade Moderna, por sua vez, viu surgirem novos vetores de justificação do direito natural, desprendidos da religião e fundados em uma "natureza [humana] racional e autônoma".[199] Tradição do direito natural https://pt.wikipedia.org/wiki/Moral https://pt.wikipedia.org/wiki/Religi%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Norma_social https://pt.wikipedia.org/wiki/Etiqueta https://pt.wikipedia.org/wiki/Validade_da_norma_jur%C3%ADdica https://pt.wikipedia.org/wiki/Normatividade_(direito) https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_natural https://pt.wikipedia.org/wiki/Agostinho_de_Hipona https://pt.wikipedia.org/wiki/Escol%C3%A1stica 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 16/48 A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão é vista, por jusnatualistas, como um exemplo da incorporação de princípios de direito natural ao direito positivado Dentre as diversas correntes específicas que se filiam a essa tradição filosófica, ao menos dois postulados centrais são comuns a todas elas.[200] O primeiro deles sustenta que "existem princípios morais de justiça que são universalmente válidos e acessíveis à razão humana” e pode ser dividido em dois postulados menores: de um lado a tese de que existem princípios morais de justiça que são universalmente válidos, e que, portanto, incidem sobre todas as pessoas, individual ou coletivamente, independentemente de onde e quando essas pessoas existem;[201] e a tese de que esses princípios morais de justiça são acessíveis à razão humana, ou seja, podem ser deduzidos ou intuídos.[202] E o segundo desses postulados maiores consiste na ideia de que o direito positivado seria uma expressão desses princípios morais universalmente válidos e acessíveis à razão humana, o que, por sua vez, implica que "um sistema normativo ou uma norma não podem ser qualificados de jurídicos se contradizem ou não passam pelo crivo de tais princípios”.[200] Assim, o jusnaturalismo carrega em seu cerne a noção de que a autoridade de que o direito se reveste — a sua normatividade — repousa sobre uma "criteriologia e autoridade externa [...] ao órgão produtor do direito",[201] isto é, provém "da natureza das coisas ou da natureza do homem, da razão humana ou da vontade de Deus".[203] As normas positivadas na legislação e nas outras fontes jurídicas seriam apenas uma expressão do direito natural.[204] Como o direito natural seria o fundamento do direito positivo, ele constituiria "um critério aferidor da atividade legislativa" e, portanto, imporia limites à atividade do legislador em termos do que pode ou não ser objeto de normas de direito.[201] Da mesma forma, em uma concepção jusnaturalista os conteúdos das normas positivadas devem ser julgados em relação aos princípios morais derivados do direito natural, e só seriam normas jurídicas as normas positivadas que são justas[205] — aquelas que se identificam com esses princípios morais (a chamada "versão forte" da tese jusnaturalista) ou não os contradizem (a "versão fraca").[200] Para os adeptos das teses jusnaturalistas, portanto, falar em "direito justo" é um pleonasmo e falar em "direito injusto" constitui uma contradição.[200] Nos termos de um famoso ditado, atribuído a Agostinho de Hipona, "lex iniusta non est lex" (em português: lei injusta não é lei).[174] Ao longo de sua história, o jusnaturalismo angariou críticas contundentes por permitir justificar toda sorte de valor moral[nota 24] e por fundar-se em "construções arbitrárias e subjetivas".[207] Mais especificamente, sua versão tradicional e mais difundida encontrou uma grande objeção com a emergência daquele que se tornou o "fator determinante da desqualificação recente do direito natural": a progressiva emergência da "ciência moderna e o seu paradigma da cientificidade"[199] e a consequente constatação de que "é, simplesmente, difícil sustentar que a lei moralmente ruim não é lei".[174] Assim, a tradição do direito natural passou por reformulações consideráveis no século XX, notadamente por meio do trabalho de Ronald Dworkin. Ao contrário de outros membros dessa tradição, Dworkin, um jusnaturalista atípico, jamais sustentou que um conteúdo moralmente aceitável seria um pré-requisito para a validade da norma jurídica, preferindo concentrar-se na distinção entre fatos e valores (entre o que a lei é e o que deveria ser) e em argumentar que a relação entre essas duas instâncias é muito mais confusa do que o positivismo jurídico gostaria de https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Declaration_of_the_Rights_of_Man_and_of_the_Citizen_in_1789.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Declara%C3%A7%C3%A3o_dos_Direitos_do_Homem_e_do_Cidad%C3%A3o https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_natural https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_portuguesa https://pt.wikipedia.org/wiki/Ronald_Dworkin 18/03/2023, 18:42 Direito – Wikipédia, a enciclopédia livre https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito 17/48 Hans Kelsen fazer ver. Para ele, "determinar o que é o direito, em casos particulares, depende inevitavelmente de considerações político-morais sobre o que deveria ser", e, além do mais, uma categoria específica de normas jurídicas, os princípios, seria essencialmente moral em seu conteúdo.[174] Embora as origens da tradição filosófica do positivismo jurídico,[nota 25] também referida como juspositivista,[nota 26] remontem aos trabalhos de filosofia política de Thomas Hobbes, ela foi articulada principalmente desde o início do século XIX por estudiosos como
Compartilhar