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Histeria e o Caso Dora - Wikipsicopato

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Histeria e o Caso Dora
A histeria é uma classe de neuroses que apresentam quadros clínicos muito
variados. Seu desenvolvimento está diretamente ligado a conflitos psíquicos
inconscientes e ao recalcamento de fantasias, que se exprimem sob a forma de
simbolizações. A doença, muitas vezes, traz consigo sintomas conversivos (na
histeria de conversão) ou fóbicos (na histeria de angústia), embora eles não
sejam obrigatórios. Outras características comuns, relacionadas ao
recalcamento, são as amnésias e ilusões da memória. Freud considerou como
conflito central da histeria a “impossibilidade de o sujeito liquidar o complexo de
Édipo e evitar a angústia da castração, que o leva a rejeitar a sexualidade”
(Roudinesco, 1998). Essa característica explicaria a sensação de asco que
histéricos geralmente apresentam em situações que normalmente causariam
excitação sexual. O Caso Dora, relatado por Freud (1905), é um importante
exemplo de caso de neurose histérica, e será resumidamente comentado aqui a
fim de ilustrar o quadro da doença.
Dora era uma moça de 18 anos que foi encaminhada a Freud por seu pai. Ela
vivia com ele, sua mãe e seu irmão, tendo sido sempre muito próxima ao pai. Ele
teve em sua vida muitas enfermidades, e Dora sempre se responsabilizou por
seus cuidados. A maturidade da garota foi também responsável por aproximá-los
desde cedo, já que o pai encontrou nela uma agradável companheira e
confidente. A relação entre seus pais, importante ressaltar, não era muito boa,
sendo os dois bastante distantes. Quando Dora tinha seis anos, a família se
mudou para outra cidade, e lá fizeram amizade com um casal, o Sr. e a Sra. K. O
pai de Dora se aproximou bastante da Sra. K., que muitas vezes cuidou dele
quando sua saúde piorava. A princípio, Dora tinha também grande afeição por
ela, mas depois de certa época passou a não mais suportá-la, afirmando que ela
e seu pai tinham um caso amoroso. A moça, inicialmente, tinha boa relação
também com o Sr. K, mas aos 16 anos acusou-o de lhe fazer uma proposta
amorosa, passando desde então a evitá-lo.
Quanto à saúde de Dora, ela já apresentava desde a infância sintomas histéricos.
Com sete anos apareceu o primeiro sintoma conversivo, enurese norturna,
passando, ao longo dos anos, por dispnéia, tosse nervosa, afonia, enxaquecas,
depressão e insociabilidade histérica. Todos esses sintomas estavam
relacionados a um recalcamento sofrido por Dora algum tempo antes.
Uma das interpretações de Freud a respeito deste caso de histeria se baseia
principalmente na relação entre Dora, seu pai e a Sra. K. Dora, em sua infância,
teria se apaixonado por seu pai, acontecimento bastante comum nas crianças,
compreendido como Complexo de Édipo. Essa paixão, embora aceitável pela
criança quando ainda é muito jovem e não permeada por questões morais, com o
passar do tempo pode se traduzir em culpa, já que começa a perceber que esse
relacionamento não seria possível, nem aceito. Dora deve então ter recalcado tal
lembrança, tornando-a inconsciente, de forma a proteger seu próprio eu. Esses
sentimentos e lembranças ficaram adormecidos por algum tempo, mas alguns
fatos foram responsáveis por trazer esse material à tona, embora nunca de forma
explícita.
A histeria que Dora desenvolveu representava uma identificação com seu pai,
estando este no lugar de sujeito desejante. Ela compartilhava com ele, portanto,
o desejo pela Sra. K. Em toda fantasia, entretanto, o sujeito ocupa o lugar do
sujeito desejante mas também o lugar do objeto de desejo, sendo possível
entender então que a moça se identificava também à Sra. K. Esta senhora era
uma mulher jovem que tinha o amor de seu pai, assim como ela havia desejado
ter. A identificação com ela possibilitou, inicialmente, que Dora cultivasse a
amizade entre as duas, mesmo desconfiando da relação entre ela e seu pai. Em
um segundo momento, entretanto, a moça deixou de aceitar essa situação,
passando a odiar a Sra. K, por ter roubado seu posto, e a acusar seu pai. Essa
mudança ocorre justamente quando as lembranças recalcadas voltam com mais
força, provavelmente pelo que será explicado a seguir.
O afeto que a moça tinha pelo Sr. K., na verdade, acabou se traduzindo em um
apaixonamento, que Dora tentou veementemente evitar. Para evitar tais
sentimentos, acabou trazendo outros à tona, justamente os que havia recalcado
na infância: o desejo pelo pai. Quando o Sr. K. mostrou então interesse por ela,
Dora passou a evitar o relacionamento entre os dois. E foi então que deixou de
aceitar também o relacionamento do pai com a Sra. K. É importante lembrar que
a paixão de Dora pelo pai ainda se mantinha em nível inconsciente, sendo que
ela não podia compreender seus sentimentos, nem guiar suas ações
racionalmente.
Quando confrontada com essas hipóteses, sobre já haver se apaixonado (ou
ainda estar apaixonada) por seu pai ou pelo Sr. K., Dora negou prontamente, ou
simplesmente afirmou não lembrar disso. Nesse caso, a moça não estava
mentindo conscientemente. O que ocorre é que essas lembranças foram
apagadas quando ocorreu o recalque, deixando em seu lugar amnésias, ou
mesmo ocupando-o com memórias falsas. Isso é bastante comum nos casos de
neurose, em que também ocorrem confusões e dúvidas quanto às lembranças
em decorrência de alterações na cronologia dos fatos, fator que também faz
parte do processo de recalcamento.
Os sintomas apresentados por Dora, como a tosse de que ela tanto se queixava
quando foi consultar Freud, têm também relação com o recalque dessa fantasia.
Dora acreditava, por certas razões, que a relação sexual que seu pai e a Sra. K.
tinham era basicamente oral. Tendo esta paixão inconsciente por seu pai, ela se
identificava com a amante dele, e desejava estar em seu lugar. Sua tosse era a
forma como essa fantasia do sexo oral se converteu em um sintoma. Ao mesmo
tempo, esse sintoma também representava uma identificação ao pai, era o
desejo de entender por que o pai se sentia atraído pela amante, por que era ela
seu objeto de desejo. O sintoma também pode ser entendida como uma
identificação ao pai quando lembramos que este teve tuberculose quando ela
tinha seis anos, doença facilmente relacionada a tosse. É possível observar, pelo
exemplo de Dora, como os conflitos psíquicos recalcados se traduzem, de forma
simbolizada, em sintomas corporais, nos casos de histeria de conversão.
O caso Dora tem ainda muitas outras questões importantes que podem ser
analisadas e relacionadas com a histeria. Freud mesmo considerou a
possibilidade de mais de uma interpretação para os relatos da moça, que, por ter
se originado de apenas três meses de análise, não possibilitou investigações
mais aprofundadas, nem novos fatos. A intenção desse breve texto, entretanto, é
apenas destacar alguns aspectos importantes observados em casos de histeria,
especialmente na histeria de conversão, exemplificando-os com um caso real.
Referências:
Freud, S. (1905). Estudos sobre a histeria. Em: Edição Standard Brasileira das
Obras Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago.
Laplanche, J. (1991). Vocabulário de Psicanálise. São Paulo: Martins Fontes.
Roudinesco, E. (1998). Dicionário de Psicanálise. Rio de Janeiro: J. Zahar.
Débora Augustin
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