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2007 - Efetividade no controle das políticas públicas demandadas judicialmente

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CURSO INTENSIVO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM 
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - CIPAD 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Antonio Mandoju 
Hans Springer da Silva 
Marco Aurelio Rocha Rabello 
 
 
 
 
EFETIVIDADE NO CONTROLE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DEMA NDADAS 
JUDICIALMENTE: 
Um estudo de caso no âmbito da Assistência Farmacêu tica Básica do SUS, em 
um município de porte demográfico médio 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro, novembro de 2007 
 
 
 
 
CURSO INTENSIVO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM 
 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - CIPAD 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
EFETIVIDADE NO CONTROLE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DEMA NDADAS 
JUDICIALMENTE: 
Um estudo de caso no âmbito da Assistência Farmacêu tica Básica do SUS, em 
um município de porte demográfico médio 
 
 
por 
 
 Antonio Mandoju 
Hans Springer da Silva 
Marco Aurelio Rocha Rabello 
 
 
 
 
 
Trabalho de conclusão do Curso Intensivo de Pós-
Graduação em Administração Pública da 
Fundação Getúlio Vargas. 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro, novembro de 2007 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
MANDOJU, Antonio; SILVA, Hans Springer da; RABELLO, 
Marco Aurélio Rocha. Efetividade no controle das políticas 
públicas demandadas judicialmente: um estudo de caso no 
âmbito da Assistência Farmacêutica Básica no SUS, em um 
município de porte demográfico médio. 2007. 132f. Trabalho de 
Conclusão de Curso de Especialização (Curso Intensivo de Pós-
Graduação em Administração Pública - CIPAD) - Fundação 
Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 2007. 
 
 
 
Resumo: O trabalho examina a eficácia social (efetividade) da 
intervenção do Judiciário no SUS de um município de porte 
médio, visando garantir o acesso a medicamentos básicos 
demandados pela população jurisdicionada. 
 
 
 
Palavras-Chave: Judicialização da Saúde, Direitos Fundamentais, 
Efetividade dos Princípios Constitucionais, Políticas Públicas, 
SUS. 
 
 
 
Agradecimentos 
 
 
 
 
Aos nossos professores pelos insumos cognitivos que nos permitiram chegar até aqui. 
 
 
Aos nossos colegas pela valiosa colaboração na realização deste trabalho. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS 
 
PROGRAMA FGV MANAGEMENT 
 
Curso Intensivo de Pós-Graduação em Administração P ública 
 
 
 
 
 O Trabalho de Conclusão de Curso “EFETIVIDADE NO CONTROLE DAS 
POLÍTICAS PÚBLICAS DEMANDADAS JUDICIALMENTE: Um est udo de caso no 
âmbito da Assistência Farmacêutica Básica do SUS, e m um município de porte 
demográfico médio”, elaborado por Antonio Mandoju, Hans Springer da Silva e 
Marco Aurelio Rocha Rabello e aprovado pela Coordenação Acadêmica do Curso 
Intensivo de Pós-Graduação em Administração Pública, foi aceito como requisito parcial 
para a obtenção do certificado do curso de pós-graduação, do Programa FGV 
Management. 
 
 Rio de Janeiro, de de 2007. 
 
 
 
_________________________________ 
Prof. Armando dos Santos Cunha 
 Coordenador Acadêmico 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Termo de Autenticidade 
 
 
Os alunos Antonio Mandoju, Hans Springer da Silva e Marco Aurélio Rocha 
Rabello, abaixo-assinados, do Curso Intensivo de Pós-Graduação em Administração 
Pública, do Programa FGV Management, realizado no período de 07 de outubro de 
2005 a 14 de junho de 2007, declaram que o conteúdo do trabalho de conclusão de 
curso intitulado “EFETIVIDADE NO CONTROLE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS 
DEMANDADAS JUDICIALMENTE: Um estudo de caso no âmbi to da Assistência 
Farmacêutica Básica do SUS, em um município de port e demográfico médio” é 
autêntico, original, e de nossa autoria exclusiva. 
 
 Rio de Janeiro, 23 de novembro de 2007. 
 
___________________________________________ 
 
Antonio Mandoju 
 
__________________________________________ 
 
Hans Springer da Silva 
 
__________________________________________ 
 
 Marco Aurelio Rocha Rabello 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
 
 
1. INTRODUÇÃO 8 
 
2. OBJETO DO ESTUDO 14 
 
3. MATERIAL E MÉTODO 18 
 
4. A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA 
PERSPECTIVA DO JUDICIÁRIO 
23 
 
4.1. A Conformação dos Direitos Sociais na Tipologia das Normas 
Constitucionais 
24 
4.2. A Inserção dos Direitos Sociais nas Normas Constitucionais 33 
4.3. O Controle das Políticas Públicas à Luz dos Fundamentos do 
Neoconstitucionalismo 
 
41 
 
5. FORMULAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO E COORDENAÇÃO DAS 
POLÍTICAS DE SAÚDE NO ÂMBITO DO SUS, VISTAS SOB A 
PERSPECTIVA DA POLÍTICA NACIONAL DE MEDICAMENTOS 
 
 
47 
 
5.1. Lógica Sistêmica versus Lógica da Descentralização 47 
5.2 A Política Nacional de Medicamentos 49 
 
6. O SUS EM ESTUDO 57 
 
6.1 O Sistema Local de Saúde 57 
6.2 Apresentação e Análise do Programa de Assistência 
Farmacêutica Básica em Execução no SUS Local 
 
66 
 
7. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DA DEMANDA JUDICIAL POR 
MEDICAMENTOS NO SUS LOCAL 
 
79 
 
8. CONCLUSÃO 87 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 96 
 
GLOSSÁRIO 98 
 
APÊNDICE 103 
 
 
 
 
8 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
O presente estudo versa, sobre as mudanças de atuação do Judiciário 
principalmente a partir da promulgação da Constituição de 1988. Na verdade, versa 
sobre as relações do Judiciário com os demais poderes – no presente caso mais 
especificamente com o Executivo –, a partir da vigência da nova Carta Magna, a qual, 
sem dúvida, delineou, em nível normativo, uma relação Estado/sociedade 
deliberadamente mais democrática, amparada nos preceitos de cidadania. 
 
É interessante salientar que mesmo no ambiente específico do Judiciário 
observa-se, nesse contexto de mudanças, certa oposição em relação ao papel da 
Constituição, no que tange à incorporação explícita nos textos constitucionais de 
elementos normativos vinculados a valores e a opções políticas gerais (v.g. redução 
das desigualdades sociais) e específicas (v.g. prestação pelo Estado de serviços de 
educação). (BARCELLOS, 2006). 
 
Nessa vertente de atuação do Judiciário, ou seja, com fulcro nos preceitos 
constitucionais, o principal alvo recai sobre os direitos sociais e, neste campo, as 
questões envolvendo o direito universal à saúde concentram uma grande demanda por 
representação. 
 
A grande questão que vem sendo colocada, no farto material produzido sobre a 
matéria, é se os direitos sociais inscritos na Constituição são de aplicabilidade imediata 
ou se dependem de legislação integrativa, ou seja, programática, para sua consecução. 
Neste sentido, o debate entre os formuladores/implementadores de políticas e o 
Judiciário tem demandado uma discussão ao mesmo tempo rica e conflitante. 
 
 Vale ressaltar, que os direitos sociais, considerados como direitos fundamentais 
de segunda geração (BOBBIO, 1992), dependem de prestações positivas do Estado 
para que melhores condições de vida social e econômica possam ser oferecidas aos 
 
9 
 
indivíduos; ao contrário dos direitos individuais (de primeira geração), os quais 
requerem uma abstenção do Estado para não ferir a esfera da liberdade dos cidadãos. 
 
Esta monografia insere-se nesse contexto. A idéia de realizar um trabalho 
científico em torno da questão que ora se aborda partiu de uma inspeção, de cunho 
mais operacional, realizada pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro 
(TCE/RJ), em outubro de 2006. Uma visão mais geral da situação constatada será 
apresentadaa seguir. 
 
A inspeção, realizada pelo TCE/RJ em um município de porte demográfico 
médio, originou-se de uma solicitação do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ/RJ) 
e se constituiu basicamente do seguinte escopo: avaliação dos reiterados 
descumprimentos por parte da Administração Municipal às ordens emanadas pelo Juízo 
da Comarca com jurisdição sobre a mesma, no tocante ao fornecimento de 
medicamentos; e, avaliação de cunho mais geral das condições operacionais do 
Sistema Único de Saúde (SUS) local. 
 
De imediato, constatou-se que o período correspondente aos descumprimentos 
no fornecimento de medicamentos remontava a 1999 e eram originários de um 
considerável volume de medidas judiciais interpostas à municipalidade, constituindo, 
assim, uma formidável base de dados, notadamente a partir de 2001, ano em que os 
registros começaram a ser informatizados, o que, sem dúvida, oferecia subsídios a uma 
pesquisa empírica dessa demanda judicial por medicamentos. 
 
Diante desse contexto, anteviu-se a possibilidade de abordar a questão da 
judicialização da Política de Assistência Farmacêutica a partir do levantamento de 
campo efetuado e da rica base de dados gerada. Com tal propósito planejou-se a 
inspeção, a qual foi conduzida metodologicamente na forma de um estudo de caso 
exploratório (YIN, 2005), de forma a atingir não só os objetivos propostos pela própria 
inspeção como também servir de referencial empírico ao presente estudo. 
 
 
10 
 
Deve ser ainda considerado que o Judiciário, ao ordenar o fornecimento de 
medicamentos, está executando, de maneira indireta, uma ação política tipicamente 
inerente aos órgãos do Poder Executivo. Além disso, esta ação direciona-se a uma 
clientela de certa forma anônima (no sentido de não estar necessariamente adscrita a 
um programa governamental), demandada geralmente individualmente ao invés de 
coletivamente e que condiciona alocação de recursos, previamente programados ou 
não. 
 
Vale lembrar que no tocante à Política de Assistência Farmacêutica não há 
grandes lacunas, ao menos em termos de formulação, pois seus regramentos 
normativos estão vigentes desde 1998, após a edição de Portaria do Ministério da 
Saúde (MS) específica sob a matéria. Ressalte-se que a Portaria regula a assistência 
farmacêutica em vários níveis de complexidade; todavia, neste estudo só será 
considerando o nível básico dessa assistência, cuja implementação compete 
precipuamente aos municípios, dada à natureza descentralizada peculiar à ação. 
 
 Para que se tenha uma idéia a respeito da relevância do tema tratado neste 
trabalho merece ser mencionado o seguinte fato: Em recente curso sobre o SUS, 
promovido pelo núcleo de saúde da Escola de Contas e Gestão do TCE/RJ, havia três 
secretários municipais de saúde entre os participantes, um deles, logo apoiado 
fortemente pelos demais, questionou a possibilidade de ser colocada em discussão a 
problemática da demanda judicial por medicamentos. 
 
 Por outro lado, o controle das políticas públicas pelo judiciário tem se mostrado 
um tema bastante recorrente entre os integrantes do Poder Público, já que tange à 
questão da garantia dos direitos fundamentais inscritos na Constituição. Na mesma 
vertente, foi observado, na literatura respeitante à matéria, que os conflitos do 
constitucionalismo contemporâneo têm promovido no âmbito do próprio judiciário o 
reconhecimento de que este Poder precisa construir uma dogmática jurídica consistente 
para o exercício do controle das políticas públicas, e, neste propósito, se mostra 
oportuno o desenvolvimento de critérios, parâmetros e indicadores que viabilizem o 
 
11 
 
exercício desse controle (BARCELLOS, op. cit.). O presente estudo espera contribuir 
em alguma medida com esse objetivo, no sentido de dotar o Judiciário de informações 
que ajudem a reconhecer as prioridades em torno do cumprimento de metas 
constitucionais, através da adoção de políticas por parte da autoridade pública. 
 
 Merece ainda ser lembrado que a inspeção promovida pelo TCE/RJ, a qual deu 
origem ao estudo de caso objeto empírico da presente monografia, partiu de solicitação 
do próprio TJ/RJ. Ora, critérios, parâmetros e indicadores de avaliação do 
desempenho da atuação estatal são elementos já presentes nos objetivos precípuos do 
TCE/RJ, tenham eles origem no texto constitucional, infraconstitucional ou mesmo de 
instrumentos de regulação (Portarias, Deliberações, etc.). Neste sentido, vislumbra-se 
um campo de atuação bastante fértil para o TCE/RJ, por meio de auditorias de 
desempenho e de programas, de forma sistemática ou mesmo em auxílio ao Judiciário, 
como no caso em discussão. Além disso, políticas públicas que visem a promoção de 
direitos fundamentais são promotoras da dignidade humana; nenhum outro atributo 
pode ser tão relevante. 
 
 Com o mesmo propósito, deve ainda ser considerado que as decisões do 
Judiciário foram respaldadas, de plano, nos princípios constitucionais, e essas decisões 
se limitaram a determinar o fornecimento de medicamentos (“Ação Ordinária de 
obrigação de fazer”), ou seja, não foi observada qualquer determinação diretamente 
direcionada ao município, ora sob estudo, no sentido de implementar ou mesmo 
fomentar decisões na esfera da Política de Assistência Farmacêutica Básica; sendo 
essa uma questão que seria naturalmente enfatizada no campo de atuação do TCE/RJ, 
por força de sua competência institucional. 
 
 Dessa forma, neste estudo foram consideradas as seguintes suposições: 
 
a) Levando-se em conta o fato de alguns medicamentos demandados 
judicialmente constarem do programa de Atenção Farmacêutica Básica, 
estando prevista dispensação gratuita pelos municípios, e considerando que 
 
12 
 
os mesmos integram a categoria denominada essenciais, sendo, por isso, 
habitualmente prescritos por médicos de serviços públicos (ou privados), 
supôs-se que, em alguma medida, as decisões do Judiciário coincidiram com 
as diretrizes normativas do SUS, contribuindo, indiretamente e de forma não 
intencional, à efetivação da descentralização da Política de Assistência 
Farmacêutica, conferindo, dessa forma, algum grau de efetividade àquelas 
decisões; 
 
b) Considerando-se que a demanda judicial por medicamentos está relacionada 
à dificuldade monetária dos propositores, supôs-se que as decisões foram 
socialmente justificadas, o que conferiu algum grau de eficácia social às 
mesmas, no sentido de promover, indiretamente e em alguma medida, a 
ocorrência de um dos princípios basilares do SUS: a eqüidade. 
 
 Diante do exposto, o presente estudo buscou precipuamente responder à 
seguinte questão: em que medida a intervenção judicial contribuiu para a efetividade da 
Política de Assistência Farmacêutica Básica executada pelo município alvo da 
pesquisa? 
 
 Para consecução dos objetivos proposto estruturou-se o presente trabalho, à 
parte desta introdução, em sete seções, a seguir apresentadas. 
 
 Na segunda Seção delineou-se o objeto da pesquisa, que como se sabe foi 
voltado à assistência farmacêutica no âmbito do SUS, com ênfase sobre a assistência 
farmacêutica básica , por ser a principal unidade de análise. 
 
 Na terceira Seção abordou-se o material levantado e o método de eleição. A 
inclusão desta parte foi considerada pertinente pelos autores pela importância que 
representa à validação do método de pesquisa utilizado:um estudo de caso único. 
 
 
13 
 
 A quarta Seção representa a contribuição da doutrina ao dilema da efetividade 
das normas constitucionais, no que concerne aos direitos fundamentais, em cuja 
constelação a saúde tem assento particular. 
 
 A quinta Seção aborda, sob a perspectiva da Política Nacional de Medicamentos, 
dificuldades relacionadas à formulação, implementação e coordenação de políticas 
públicas no âmbito do SUS. A compreensão dessa dinâmica de forma articulada aos 
aspectos levantados na seção anterior e de suma importância para este trabalho. 
 
 A sexta Seção apresenta o Sistema Local de Saúde objeto do estudo de caso, e, 
neste, a execução do Programa de Assistência Farmacêutica Básica, servindo de 
contexto ao fenômeno ora em discussão. 
 
 A sétima Seção apresenta e analisa a demanda judicial por medicamentos no 
âmbito do SUS estudado. 
 
 Na Seção dedicada à conclusão, espera-se que a conjunção dos aspectos 
teóricos apresentados ofereça, de forma articulada ao levantamento de campo e aos 
dados analisados, resposta aos objetivos propostos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
14 
 
2. OBJETO DO ESTUDO 
 
 A judicialização da saúde, e de outras áreas que demandam prestações 
positivadas na Constituição, oferece um campo bastante fértil à compreensão das 
relações entre os três poderes constituídos em regimes federativos. Em países com 
vocação democrática mais antiga, o debate em torno desses arranjos institucionais é 
habitual e tem inspirado os ordenamentos jurídicos de outras realidades, como a 
vigente no Brasil, por exemplo. 
 
 No campo da saúde, as demandas judiciais por prestações do Estado se 
concentram principalmente na área de serviços (com destaque para solicitação de 
exames laboratoriais complementares de média/alta complexidade e internações) e na 
área de fornecimento de medicamentos. A pesquisa empírica efetuada no município 
alvo deste estudo confirmou essa tendência. Especificamente sobre medicamentos, foi 
observada uma demanda de grande diversidade, tendo sido solicitado desde 
medicamentos essenciais, geralmente de baixo custo, vinculados à atenção 
farmacêutica básica a medicamentos ditos excepcionais, geralmente de alto custo, 
vinculados a patologias crônicas, de difícil manejo clínico e de menor prevalência. 
 
 Neste estudo não serão analisadas as demandas por serviços (exames e 
internações). Quanto à demanda por medicamentos, vale esclarecer, preliminarmente, 
como estão estruturadas programaticamente no SUS as ações da assistência 
farmacêutica. 
 
 A assistência farmacêutica no SUS é implementada basicamente através de 
quatro componentes, os quais serão apresentados sucintamente a seguir: 
 
 – Programa de Medicamentos Excepcionais – integrado por um amplo elenco de 
medicamentos que visam apoiar patologias diferenciadas ou de interesse 
epidemiológico, por exemplo: hepatite crônica B e C, doença de Alzheimer, doença de 
Parkinson, osteoporose. Este programa é financiado pela União, embora a aquisição 
 
15 
 
dos medicamentos seja efetuada pelas Secretarias Estaduais, que os distribui aos 
municípios, os quais se responsabilizam por cadastrar os pacientes. As demandas 
Judiciais por medicamentos deste Programa se devem geralmente a falhas na 
aquisição por parte das Secretarias Estaduais, as quais se justificam alegando que a 
União repassa os recursos financeiros despendidos em descompasso com a realidade 
de preços do mercado. Embora a pesquisa empírica tenha evidenciado a ocorrência de 
um número considerável de processos judiciais determinando o fornecimento de 
medicamentos que integram este Programa, para efeito deste estudo não serão 
consideradas as questões inerentes ao mesmo, tendo em vista o baixo nível de 
descentralização das ações em nível municipal. 
 
 – Programa de Assistência Farmacêutica Estratégica – visa apoiar doenças de 
alta prevalência em saúde pública, por exemplo: tuberculose, hanseníase, DST/AIDS. O 
MS adquire os medicamentos, repassa às Secretarias Estaduais que, por sua vez 
repassam aos municípios. Não foi observado, na pesquisa, demanda por 
medicamentos deste grupo, não havendo, portanto interesse para o estudo em questão. 
 
 – Programa de Saúde Mental – disponibiliza um elenco relativamente pequeno 
de medicamentos, suficiente, contudo, para impactar os principais problemas da área 
de saúde mental. A União financia 80% do Programa e os Estados 20%. Os 
medicamentos são adquiridos pelo Estado e repassados aos municípios, os quais 
devem suplementar o elenco de acordo com o perfil nosológico vigente no nível local. O 
Programa está em via de ser descentralizado aos municípios e deverá integrar o 
Programa de Atenção Farmacêutica Básica que será abordado em seguida. Na 
pesquisa empírica realizada foi observado que muitos dos medicamentos demandados 
são da área de saúde mental. Ainda que as lacunas evidenciadas no suprimento 
estejam relacionadas, em grande parte, a problemas da esfera da aquisição pela 
Secretaria Estadual de Saúde, diversos aspectos levantados serão considerados. 
 
 – Programa de Assistência Farmacêutica Básica – como o próprio nome indica, 
visa apoiar a Atenção Básica. O elenco obrigatório selecionou 46 medicamentos. Todos 
 
16 
 
incluídos na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME), integrada, no 
elenco de 2002, por 320 fármacos. O Programa foi formulado sob forte enfoque de 
descentralização aos municípios, lamentavelmente, decorridos oito anos de sua 
implementação, esta meta não foi ainda atingida em sua plenitude. 
 
Entre todos os Programas citados este é o mais significativo para as 
argumentações que serão desenvolvidas neste estudo, no seguinte sentido: 
 
a) O Programa tem uma natureza bastante difusa, em termos de cobertura; 
constituindo-se em uma importante unidade de análise diante da 
problemática: implementação de políticas públicas versus o controle dessas 
políticas pelo judiciário; 
 
b) Em termos de formulação, é o que apresenta ações mais descentralizadas, 
no nível de execução municipal, favorecendo a compreensão do processo de 
descentralização e implementação da política correspondente no âmbito do 
SUS; 
 
c) O ordenamento normativo do SUS, amparado nos preceitos do pacto 
federativo, estimula a suplementação das regras em nível local de forma a 
adaptar os Programas à realidade nosológica municipal. Neste sentido, a 
análise deste Programa permite verificar a relação entre as decisões judiciais 
e, em resposta, a tomada de decisão político-administrativa do SUS local, 
levando-se em conta que a pesquisa foi efetuada neste nível decisório; 
 
d) A articulação do referencial teórico a ser utilizado com a pesquisa empírica 
efetuada provavelmente permitirá a generalização, analítica (YIN, op. cit.), 
quando da verificação de outras realidades municipais. 
 
 Já foi abordado que o principal objetivo deste estudo é compreender se a 
demanda judicial por medicamentos na Atenção Farmacêutica Básica contribuiu na 
 
17 
 
alocaçãoeficiente e eficaz dos recursos públicos despendidos, em um dado município 
de porte demográfico médio. Também já foi aventada a possibilidade de generalização 
a outros contextos municipais, na esfera da atuação do TCE/RJ. Neste propósito, a 
resposta a algumas questões prevalece, merecendo ser citadas as seguintes: 
 
 – Como o Judiciário classifica o direito à saúde? 
 
 – Como é tratada no âmbito processual a judicialização da saúde? 
 
– Quais as relações existentes entre as políticas públicas, cuja implementação 
compete ao executivo, e a aplicação das normas constitucionais pelos tribunais quando 
intervêm indiretamente por aquela implementação? 
 
 – Que efeitos causaram a tutela antecipada sobre a Administração Pública do 
município ora objeto da pesquisa? 
 
 – Quais as justificativas apresentadas pelo Judiciário para determinar a 
concessão dos medicamentos? 
 
 – Que critérios econômicos são levados em conta pelo Judiciário ao determinar a 
concessão de medicamentos básicos? 
 
 – Qual o impacto da realocação de recursos destinados à saúde pública 
condicionado pela demanda judicial por medicamentos? 
 
 – Qual o impacto social das determinações judiciais? 
 
 – Qual a relação entre o princípio da descentralização, um dos pilares do SUS, e 
a demanda judicial por medicamentos na Assistência Farmacêutica Básica? 
 
 
 
 
18 
 
3. MATERIAL E MÉTODO 
 
Como já foi observado, o presente estudo teve como ponto de partida uma 
inspeção realizada pelo TCE/RJ, em outubro de 2006. Para a consecução dos objetivos 
propostos na inspeção a equipe escolheu como estratégia de avaliação do escopo o 
método estudo de caso. Nesse propósito, os procedimentos da inspeção foram 
projetados e conduzidos na forma mais próxima possível ao preconizado por Robert Yin 
(op. cit., 2006), reconhecido especialista do método mencionado. 
 
A avaliação, de cunho mais exploratório, trouxe à baila questões relevantes na 
esfera da judicialização da saúde; mas, sobretudo, demonstrou que, no caso em tela, o 
fenômeno da judicialização estava fortemente relacionado a pelo menos três grandes 
questões interligadas, previstas nas diretrizes organizativas do SUS, quais sejam: 
 
a) Falhas nos mecanismos de descentralização vigentes no SUS; 
b) Falhas nos mecanismos de coordenação pactuados nos fóruns apropriados 
do SUS; 
c) Falhas na competência municipal em formular suplementarmente o Programa 
de Assistência Farmacêutica de acordo com as necessidades locais. 
 
Em função das falhas apontadas, a atenção farmacêutica municipal apresentou 
grandes lacunas no fornecimento de medicamentos, criando as condições favoráveis à 
intervenção do Judiciário. Além disso, no município sob análise estão de certa forma 
presentes condições que potencializam a representação dos autores em juízo, quais 
sejam: um atuante órgão integrante da Defensoria Pública e escritórios modelos das 
duas faculdades de direito instaladas na cidade, à parte do considerável contingente de 
profissionais privados, da área do direito, que atuam na região. 
 
Além dos fatores assinalados, os quais foram explorados neste estudo, 
aventaram-se também hipóteses para o renitente descumprimento da Secretaria de 
Saúde em fornecer os medicamentos demandados judicialmente. Como será visto mais 
adiante, a pesquisa permitiu identificar que esses descumprimentos estavam 
 
19 
 
relacionados a questões gerenciais, organizacionais e operacionais na esfera da 
logística de suprimentos, em função da diversidade de fármacos demandados 
judicialmente. 
 
Para efeito da inspeção realizada pelo TCE/RJ, em outubro/2006, os 
encaminhamentos metodológicos efetuados foram suficientes para responder as 
questões propostas na ocasião. Com o presente estudo se buscou maior compreensão 
do fenômeno da judicialização da saúde. Para tal propósito, o estudo de caso 
exploratório ofereceu, uma vez articulado à contribuição teórico-conceitual levantada, 
os subsídios necessários, à compreensão do fenômeno no contexto pesquisado. Aliás, 
a conjugação da pesquisa empírica à contribuição teórica sobre o tema em discussão 
representou o grande divisor entre a avaliação preliminarmente realizada visando à 
auditoria e este estudo, com pretensão mais científica. Contudo, os autores são 
partidários de que avaliações, com objetivos mais voltados à esfera decisória dos 
Administradores Públicos, e pesquisas, com objetivos mais voltados à contribuição 
científica a um dado problema, não representam, necessariamente, categorias 
excludentes; sobretudo quando, ambas, estão direcionadas à melhoria no modelo de 
gestão institucional. 
 
Nessa vertente, merece ser ressaltado que a unidade metodológica de análise 
escolhida para a pesquisa em questão, a despeito de outras perfeitamente factíveis em 
função da abrangência do fenômeno, foi limitada à Política de Assistência Farmacêutica 
Básica, com o objetivo precípuo de se avaliar o grau de efetividade obtido pelo 
Judiciário ao intervir na execução da Política de Assistência Farmacêutica Básica, no 
município alvo. Este posicionamento se deve principalmente a três motivos: 
 
1) Efetividade é o resultado esperado na implementação de qualquer política 
pública por parte dos órgãos com competência para executá-la, notadamente 
no presente caso, em que, essa política, está representando a consecução de 
conteúdo programático com assento na Constituição (art. 196); 
 
 
20 
 
2) O Judiciário ao intervir em seara tipicamente vinculada aos órgãos executivos 
precisam estar atentos aos efeitos dessa intervenção, sobretudo quando 
continuada e abrangente, sob pena de reproduzir vieses dos órgãos 
originários dessas políticas; 
 
3) A competência do Judiciário, em determinar a “Ação Ordinária de Obrigação 
de Fazer”, por si só, e ainda que respaldada em princípios constitucionais, 
não garante o fomento à formulação e implementação das políticas públicas 
por parte dos órgãos com competência para tal e, tampouco, sua efetividade. 
 
 O universo da pesquisa correspondeu a todos os medicamentos concedidos por 
força das medidas judiciais interpostas, no período 2001/2006. 
 
 Já foi destacado que, na inspeção previamente realizada, a pesquisa abrangeu 
somente os medicamentos concedidos no período de 2005/2006, o que correspondeu a 
689 medicamentos de acordo às respectivas Unidades Farmacêuticas (comprimidos, 
líquidos e injetáveis). Esses medicamentos foram, inicialmente, classificados em ordem 
decrescente de solicitação. Na oportunidade, os dados foram tratados por meio de 
amostragem não probabilística, na qual cada medicamento concedido foi considerado 
uma categoria de acordo com a Unidade Farmacêutica dispensada. Para efeito dessa 
pesquisa foram selecionados 10% dos medicamentos mais requisitados, permitindo 
extrair do universo quase 60% das unidades farmacêuticas demandadas. 
 
 No estudo em questão, com pretensões mais ambiciosas, já que se buscou 
inferir quanto à efetividade das decisões judiciais, a pesquisa foi ampliada no tempo, 
contemplando, assim, os medicamentos concedidos desde 2001; porém, o 
detalhamento estatístico será exposto na Seção dedicada à apresentação da demanda 
judicial por medicamentos no SUS avaliado. 
 
 Os sujeitos da pesquisa corresponderam aos atores sociais entrevistados 
durante a inspeção realizada previamente a este estudo. Entre outros merecem ser21 
 
citados: Gestor do SUS local; Assessores Jurídicos; Diretor de Finanças; Diretor 
Administrativo; Assessora de Controle Interno; Diretora da Divisão de Farmácia; 
Diretora do Departamento de Epidemiologia; Diretor da Divisão de Almoxarifado; 
Coordenadora da Atenção Básica; Diretores dos Hospitais e Assistentes Sociais. 
 
 Da mesma forma, os dados coletados corresponderam àqueles obtidos quando 
da inspeção realizada previamente, na qual se procedeu ao método estudo de caso. 
Entre os documentos levantados e analisados merecem destaque: 
 
a) 27 Processos protocolados na Comarca do município, remetidos e autuados 
no TCE/RJ, contendo solicitação de adoção de medidas cabíveis pelo 
reiterado descumprimento das decisões proferidas pelo citado Juízo, por 
parte do SUS estudado; 
 
b) processos relativos às licitações e contratos, originários de todas as 
fundamentações legais previstas na Lei Federal 8666/93, cujo objeto tenha 
sido aquisição de medicamentos, correspondentes aos exercícios de 2004, 
2005 e 2006 (até julho); 
 
c) documentos referentes às aquisições de medicamentos e os correspondentes 
pagamentos efetuados, no cumprimento de mandados judiciais, dos 
exercícios de 2004, 2005, 2006 (até julho); 
 
d) documentos mais voltados para as atividades administrativo-financeiras: 
Estrutura Organizacional da Saúde; balancetes da Receita de dezembro 
2003/2005 e julho 2006); balancetes de Despesa de dezembro 2003/2005 e 
julho 2006; Quadro de Detalhamento da Despesa (QDD) de 2004/2006; 
 
e) documentos mais voltados para as atividades político-assistenciais: Plano 
Municipal de Saúde (os dois últimos formulados); Deliberações das duas 
últimas Conferências de Saúde; Livro de Atas do Conselho Municipal de 
 
22 
 
Saúde, referentes ao exercício de 2005 e 2006; cadastros das Unidades de 
Saúde do Sistema (públicas e filantrópicas/privadas contratadas); relatórios 
de produção de serviços ambulatoriais e hospitalares; relação discriminada 
dos Sistemas de Informação Informatizados que operam no SUS local; 
documento descritivo das rotinas (fluxos) de aquisição de medicamentos, 
discriminado por nível de atenção (básica, média e alta complexidade 
ambulatorial e hospitalar); Atos Legais/Normativos (Leis, Portarias, 
Resoluções) promulgados pela Prefeitura e/ou Secretaria de Saúde/ 
Fundação/ Fundo, referentes à assistência farmacêutica, desde 2000; 
catálogo de medicamentos padronizados para fins de abastecimento da rede, 
nos diversos níveis assistenciais (atenção básica, média e alta complexidade 
e inclusive programas); documentos comprobatórios da Programação vigente 
na Assistência Farmacêutica, em todos os níveis de complexidade, inclusive 
referentes à farmácia básica, medicamentos excepcionais e saúde mental; 
relatório de consumo de medicamentos, classificados em ordem decrescente 
de valor (R$) e de ocorrência, nos exercícios de 2001/2006. 
 
 Finalizando, vale ressaltar, como bem nos ensina Robert Yin (op. cit.), que o 
método estudo de caso único não se presta a generalizações estatísticas, 
necessitando, neste propósito, de replicações em contextos diferentes, submetidos ao 
mesmo fenômeno. Não obstante, são adequados a generalizações analíticas; residindo 
aqui, uma conveniente oportunidade de pesquisa em outras Administrações 
jurisdicionadas ao TCE/RJ. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
23 
 
4. A EFETIVAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE NA P ERSPECTIVA DO 
JUDICIÁRIO 
 
 Ainda que o enfoque desde trabalho esteja mais voltado à tutela judicial da 
Assistência Farmacêutica (Básica), algumas questões, de ordem mais geral, no campo 
do direito à saúde, podem ser colocadas, à guisa de provocação inicial, quais sejam: 
Por quê o direito à saúde necessita ser tutelado pelo Poder Judiciário para que se 
efetive dada prestação positiva de um bem ou interesse, por parte do Poder Executivo? 
Em outras palavras: O fato de o direito à saúde ser garantido na Constituição não é 
suficiente para efetivá-lo? Ou, ainda: Que fatores condicionam a tensão observada no 
cumprimento de um dado comando constitucional por parte de poderes dotados de 
igual hierarquia? 
 
 Em torno das questões colocadas, vale, inicialmente, refletir sobre a questão do 
direito à saúde na forma como fora disposto no art. 196 da Constituição: 
 “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas 
 sociais e econômicas que visem a redução do risco de doenças e de outros 
 agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua 
 promoção, proteção e recuperação”. 
 
 A dicção ambígua do artigo vem dando margem à ampla discussão 
jurisprudencial; pois, ao mesmo tempo em que faz referência ao direito à saúde e ao 
dever do Estado, fala em políticas sociais e econômicas as quais não estão 
especificadas, conferindo ao artigo um caráter de norma programática, ou seja, 
limitando o controle da intervenção judicial no que diz respeito a sua aplicação imediata, 
porquanto a atividade estatal se apoiaria na edição de dispositivos integrativos com 
vistas a sua plena consecução. 
 
 A questão da Constituição enquanto documento inerente à organização do poder 
político versus sua capacidade de vincular a ação dos governantes tem raízes 
históricas. Embora seja inquestionável que a realidade histórica condiciona a 
Constituição, disso decorrendo inclusive sua pretensão de eficácia, cumpre reconhecer 
 
24 
 
que o compromisso constitucional, enquanto produto de um pacto entre forças políticas 
e sociais, é também capaz de conformar a realidade, notadamente frente ao desafio de 
convivência e harmonia das diferentes pretensões demandadas por uma sociedade 
cada vez mais plural e complexa. 
 
 Nessa vertente, um dos grandes desafios do Direito Constitucional 
contemporâneo e, portanto, do Judiciário, é a efetivação dos direitos sociais, dada à 
primazia desses na constelação dos Direitos Fundamentais. Dessa forma, a discussão 
em torno da juridicidade da norma constitucional cresce em importância no que 
concerne à obrigatoriedade do cumprimento pelo Poder Público dos regramentos que 
consagram esses direitos sociais. 
 
 Para uma maior compreensão sobre o problema colocado, ou seja, a 
imperatividade das normas constitucionais disciplinadoras dos direitos sociais, propõe-
se, nesta Seção, articulá-lo a alguns aspectos teórico-conceituais presentes nas obras 
de alguns renomados autores particularmente inclinados ao estudo do direito 
constitucional democrático. Neste sentido, privilegiou-se a revisão dos textos que 
abordam o problema sob as seguintes perspectivas: a tipologia das normas 
constitucionais contemporâneas (BARROSO, 2003), a inserção dos direitos sociais no 
constitucionalismo (NOBRE JÚNIOR, 2006) e os fundamentos presentes no chamado 
neoconstitucionalismo (BARCELLOS, 2006). 
 
4.1 A Conformação dos Direitos Sociais na Tipologia das Normas Constitucionais 
 
 Uma Constituição encerra essencialmente as seguintes características: Organiza 
o exercício do poder político, define os direitos fundamentais dos indivíduos e traça os 
fins públicos a serem alcançados pelo Estado. Um fenômeno que vem sendo 
observado no Estado moderno é uma progressiva tendência a se ampliar as matérias 
que são inseridas no texto constitucional. Assim novos elementos, direitos e institutos 
têm merecido assento nas Constituições, refletindo a superação de uma visãoestritamente liberal das mesmas. Por outro lado, a inserção de regras menores, ditas 
 
25 
 
regulamentares, coopera para diminuir a imponência das Constituições e ao mesmo 
tempo afetam o caráter mais perene que era, em certa medida, inerente às mesmas. 
 
 A tendência acima assinalada vem impondo aos poderes públicos, notadamente 
ao Judiciário, uma maior preocupação quanto à interpretação do texto constitucional no 
que tange à discricionariedade e aos comportamentos omissivos dos demais poderes 
públicos (Executivo e Legislativo). 
 
 A classificação das normas constitucionais tem merecido a atenção de 
renomados estudiosos do Direito Constitucional. De uma maneira geral as 
classificações dizem respeito à eficácia e aplicabilidade dessas normas. Neste estudo, 
será considerada a sistematização proposta por Barroso (2003), que se enquadra na 
seguinte tipologia: 
 
A. Normas constitucionais que têm por objeto organizar o exercício do poder 
político: NORMAS CONSTITUCIONAIS DE ORGANIZAÇÃO; 
B. Normas constitucionais que têm por objeto fixar os direitos fundamentais dos 
indivíduos: NORMAS CONSTITUCIONAIS DEFINIDORAS DE DIREITO; 
C. Normas constitucionais que têm por objeto traçar os fins públicos a serem 
alcançados pelo Estado: NORMAS CONSTITUCIONAIS PROGRAMÁTICAS. 
 
Uma breve explanação sobre cada uma dessas categorias será apresentada a 
seguir. 
 
A. Normas Constitucionais de Organização 
 
 São também conhecidas como normas de estrutura ou competência. Em sentido 
cronológico, da expressão do Direito foi, primeiramente, representado por esta 
categoria, pois, os aspectos nela preceituados já tinham assento nas leis de natureza 
constitucional antes da formulação escrita, ou seja, sistematizada, das Constituições. 
 
 
26 
 
 Vale ressaltar que as normas desta categoria não disciplinam a vida jurídica, ou 
seja, não regem comportamentos a serem seguidos na esfera coletiva, por meio de um 
conjunto de ordens e proibições. Sua função é estruturar organicamente o Estado, 
possuem um caráter instrumental e procedem a incidência das demais, disciplinando 
inclusive a criação e aplicação das normas de conduta. Neste sentido não se 
apresentam como juízos hipotéticos, sendo dotadas de um efeito constitutivo imediato 
das situações que enunciam. 
 
 Dessa forma, as normas constitucionais de organização encerram uma 
variedade de conteúdo, entre os quais merecem ser citados: 
o veiculam decisões políticas fundamentais, ao definirem a forma de Estado e 
de governo (p. ex. Art. 1º e Art. 2º da Constituição Federal - CF); 
o definem competência dos órgãos constitucionais (p. ex. Art. 21, 25 e 30 da 
CF); 
o criam órgãos públicos (p. ex. Art. 44, 92 e 125 da CF); 
o estabelecem normas processuais ou procedimentais da própria Constituição 
(p. ex. Art. 60, § 4º, I). 
 
B. Normas Constitucionais Definidoras de Direito 
 
 Além de organizar o exercício do poder político, definem os direitos fundamentais 
dos indivíduos submetidos à soberania estatal, os quais podem ser agrupados em 
quatro grandes categorias: direitos políticos, direitos individuais, direitos sociais e 
direitos difusos. Entre os quatro citados, interessam mais a este trabalho os direitos 
individuais e os sociais, sendo assim, serão abordados a seguir. 
 
 Direitos Individuais – são frequentemente denominados liberdades públicas. 
Tiveram como primeira expressão legislativa a Declaração de Direitos inglesa, de 1689, 
mas foram aperfeiçoados pelo movimento iluminista francês e pela Declaração dos 
Direitos do Homem e do Cidadão. Representam a afirmação jurídica da personalidade 
humana; são dirigidos à proteção de valores relativos à vida, à liberdade, à segurança e 
 
27 
 
à propriedade; contém limitações ao poder político, delineando a esfera de proteção 
jurídica do indivíduo em face do Estado, impondo, assim, deveres de abstenção aos 
órgãos públicos, preservando a iniciativa e a autonomia dos particulares. 
 
 Direitos Sociais – corresponde aos direitos econômicos, sociais e culturais. Sua 
origem é mais recente; foram consagrados na Constituição mexicana, de 1917. Através 
dessa categoria de direitos superou-se a expectativa meramente liberal, de cunho 
individual. Sua preceituação criou para o Estado deveres de prestações positivas, 
visando à promoção da igualdade material. Dessa forma, a intervenção estatal destina-
se a neutralizar as distorções econômicas geradas na sociedade, assegurando direitos 
na esfera da segurança social, do trabalho, à liberdade sindical, à participação no lucro 
das empresas, à educação e cultura, entre outros. 
 
 Vale marcar, neste ponto, que, em termos de acionabilidade e aplicabilidade a 
efetivação dos direitos sociais é, pronunciadamente, mais complexa do que os direitos 
políticos e os individuais. Nada obstante, há que se reconhecer que a realização efetiva 
dos direitos individuais e políticos dependem de pré-condições econômicas e sociais 
bem definidas, inerentes a necessidades básicas de alimentação, saúde, instrução e 
rendimentos mínimos, gerando, em alguma medida, uma relação de co-dependência 
entre as duas categorias de direitos fundamentais. Na verdade, os direitos sociais visam 
à tutela desses bens jurídicos, constituindo, assim, pressupostos para o exercício dos 
demais direitos e liberdades. Considere-se, contudo, que os direitos políticos e 
individuais têm a seu favor o fato de requererem, para suas realizações, em geral, a 
abstenção do Estado, ou seja, independem do ônus de atividades materiais. 
 
 Ainda no campo da aplicabilidade deve ser acentuado, pela importância que 
representa para este trabalho a questão atinente à área da saúde, que os direitos 
fundamentais e, nesta categoria, principalmente os sociais, geram situações jurídicas 
subjetivas, ou, simplesmente, direitos subjetivos. De difícil conceituação, o direito 
subjetivo pode ser entendido como o poder de ação assente no direito objetivo, e 
destinado à satisfação de certo interesse, em outras palavras, seria um interesse 
 
28 
 
juridicamente protegido, no qual há uma relação jurídica bilateral entre as partes, a 
saber: de um lado, a possibilidade subjetiva de exigir (direito subjetivo), de outro a 
obrigação de cumprir (dever jurídico). Dessa forma, não há qualquer fundamento 
doutrinário que impeça a aplicação dos atributos conceituais do direito subjetivo ao 
Direito constitucional, já que estes se enquadram no esquema presente nas normas 
constitucionais de direitos, a saber: dever jurídico, violabilidade e pretensão; resultando 
para os seus beneficiários situações jurídicas desfrutáveis (ainda que incidam de forma 
diferenciada sobre os titulares), a serem materializadas em prestações positivas ou 
negativas, que serão abordadas mais adiante. Essas prestações são exigíveis (dever 
jurídico) do Estado (ou outro destinatário da norma). Na hipótese de não serem 
entregues espontaneamente (violação do direito), conferem ao titular a possibilidade de 
postular o cumprimento (pretensão). 
 
 Em síntese, o direito subjetivo se diferencia de outras posições jurídicas pelas 
seguintes características: 
a) a ele corresponde sempre um dever jurídico; 
b) ele é violável, isto é: existe possibilidade de quea parte contrária deixe de 
cumprir o seu dever; 
c) a ordem jurídica coloca à disposição de seu titular um meio jurídico (ação 
judicial) para exigir o cumprimento. 
 
 A despeito do atual reconhecimento da índole normativa das regras que 
conferem direitos sociais, sua operatividade prática ainda representa um problema que 
demanda soluções. Além disso, as regras que conformam os direitos sociais produzem 
efeitos diferenciados (prestações positivas ou negativas); podendo, essas, serem 
distribuídos em três grupos, de acordo com a forma que incidem sobre os titulares: 
 
a) Regras que geram situações prontamente desfrutáveis, dependentes apenas 
de uma abstenção – a relação jurídica que se estabelece é semelhante à que 
resulta dos direitos individuais. Exemplo: o direito de greve (art. 9º da CF), 
cujo papel do Estado é abster-se de reprimir e punir; 
 
29 
 
 
b) Regras que ensejam a exigibilidade de prestações positivas do Estado – ao 
contrário da anterior, neste caso, o dever jurídico consiste em uma atuação 
efetiva, na entrega de um bem ou na satisfação de um interesse. Exemplos: 
os direitos à proteção da saúde (art. 196), previdência social (arts. 6º e 201), 
aposentadoria da mulher após trinta anos de contribuição (art. 201, § 7, I). 
Observa-se que, neste último exemplo, a objetividade da norma permite a 
pronta verificação do cumprimento ou não, ao passo que nos dois primeiros 
exemplos, muito mais fluidos, a verificação, além de complexa, encontra 
limites tanto de cunho econômico quanto político; 
 
c) Regras que contemplam interesses cuja realização depende da edição de 
norma infraconstitucional integradora. Exemplo: direito à “participação nos 
lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, conforme definido em 
lei” (art. 7º, XI), direito à “proteção em face da automação, na forma da lei” 
(art. 7º, XXVII). Observa-se, nestes casos, que a ausência de regra 
integradora paralisa a operação do comando normativo constitucional. 
 
 Pelo exposto, observa-se que os direitos sociais, nas hipóteses que não são 
prontamente desfrutáveis, dependem, em geral, de prestações positivas do Poder 
Executivo ou de providências normativas do Poder Legislativo. 
 
 Uma vez situada a posição do direito social à saúde no conjunto dos 
regramentos constitucionais apresentados, merece ser abordada a dificuldade de sua 
efetivação. Neste propósito, nada mais oportuno, a título ilustrativo, que a transcrição 
de um Agravo Regimental em Recurso Extraordinário, originário do Rio Grande do Sul 
(STF, AGRRE 271286-RS), o qual teve como relator o Min. Celso de Mello: 
 
a) O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica 
indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria 
Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente 
 
30 
 
tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder 
Público, a quem incumbe formular – e implementar – políticas sociais e 
econômicas idôneas que visem a garantir aos cidadãos o acesso universal e 
igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar; 
b) O direito à saúde, além de qualificar-se como direito fundamental que 
assiste a todas as pessoas, representa conseqüência constitucional 
indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera 
institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, 
não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob 
pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento 
inconstituciona;. 
c) O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política – que 
tem por destinatário todos os entes políticos que compõem, no plano 
institucional, a organização federativa do Estado brasileiro – não pode 
converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o 
Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela 
coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu dever, por 
um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a 
própria Lei Fundamenta; 
d) O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição 
gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras 
do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição 
da República e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente 
e solidáriode apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas 
que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria 
humanidade e de sua essencial dignidade. (grifos nossos) 
 
 Os realces nos textos da decisão do STF permitem observar que o “direito à 
saúde” recebeu tratamento heterogêneo por parte do citado órgão, a saber: prerrogativa 
jurídica, direito fundamental, norma programática e preceito fundamental. De uma 
maneira geral, esta situação é análoga à observada na vasta jurisprudência atinente à 
 
31 
 
matéria que vem sendo produzida, inclusive nos Estados e Regionais Federais. Em 
relação ao material empírico levantado para efeito deste trabalho, a tendência foi 
confirmada no teor exarado pelo Juízo local, como será visto mais adiante, no capítulo 
dedicado ao estudo de caso. Sem dúvida, esta condução é indicativa da disposição em 
dar efetividade à norma constitucional, superando-se por via judicial as omissões do 
Poder Público. 
 
C. Normas Constitucionais Programáticas 
 
 A importância de se abordar, neste estudo, esta última categoria de norma 
constitucional, se prende ao fato de o art. 196 da CF, atinente ao direito à saúde, fazer 
menção à necessária edição de políticas econômicas e sociais, enquanto pressuposto 
de garantia desse direito, conferindo, conforme já salientado no começo deste capítulo, 
ao lado do direito fundamental à saúde, um cunho programático ao dispositivo 
constitucional citado. Os comentários subseqüentes buscam atender a esse objetivo. 
 
 O Estado, enquanto organização soberana, por si mesmo destina-se à 
consecução de determinados fins. Se fossemos eleger entre esses fins um de 
dimensão geral, sem dúvida prevaleceria a realização do bem comum. Todavia, existem 
vários objetivos específicos contingenciais ou de maior permanência que orientam a 
atuação do Poder Público, em cada época, de acordo com a ideologia dominante que 
influenciam a ordenação jurídica, social e as políticas do Estado. 
 
 As normas programáticas foram incorporadas às Constituições modernas após o 
primeiro pós-guerra, ao lado dos direitos políticos e individuais de forma a conformar a 
ordem econômica e social a determinados postulados de justiça social, levando em 
conta o indivíduo em sua dimensão comunitária, protegendo-o das desigualdades 
econômicas e ampliando as condições de vida em sentido mais amplo. 
 
 Essas normas, enquanto disposições indicadoras de fins sociais a serem 
alcançados, têm por objeto, estabelecer determinados princípios ou fixar programas de 
 
32 
 
ação para o Poder Público. A título de exemplo de normas programáticas puras podem 
ser citados os seguintes dispositivos colhidos à nossa CF de 1988: o que consagra a 
“função social da propriedade” (art. 170, III), oque estabelece que “a ordem social tem 
como base o primado do trabalho e como objetivo o bem-estar e a justiça social” (art. 
193) e o que determina que o Estado “apoiará e incentivará a valorização e a difusão 
das manifestações culturais” (art. 215). 
 
 Os exemplos se prestam a demonstrar que as normas constitucionais 
programáticas são dirigidas aos órgãos estatais, informando, desde o seu surgimento, a 
atuação do Legislativo, ao editar leis, bem como a atuação da Administração e do 
Judiciário ao aplicá-las, de ofício ou contenciosamente. Não obstante, os efeitos dessas 
normas bipartem-se em imediatos e diferidos. No primeiro caso, o cumprimento é desde 
logo inquirível, enquanto no segundo, o controle sobre a efetivação é frágil, dada à 
competência discricionária conferida à atividade estatal que afasta a intervenção 
judicial. 
 
 Finalizando, merece ser trazido ao corpo deste trabalho a valiosa posição de 
Barroso (op. cit., p. 121), quanto aos efeitos das normas programáticas, no tocante aos 
titulares dos direitos individuais/coletivos garantidos por meio da aplicação/omissão das 
mesmas: 
 Delas não resulta para o indivíduo o direito subjetivo, em sua versão positiva, de 
 exigir uma determinada prestação. Todavia, fazem nascer um direito subjetivo 
 “negativo” de exigir do Poder Público que se abstenha de praticar atos que 
 contravenham os seus ditames. Em verdade, as normas programáticas não se 
 confundem, por sua estrutura e projeção no ordenamento, com as normas 
 definidoras de direitos. Elas não prescrevem, detalhadamente, uma conduta 
 exigível, vale dizer: não existe, tecnicamente, um dever jurídico que corresponda 
 a um direito subjetivo. Mas indiretamente, como efeito, por assim dizer, atípico, 
 elas invalidam determinados comportamentos que lhes sejam antagônicos. 
 Nesse sentido, é possível dizer-se que existe um dever de abstenção, ao qual 
 corresponde um direito subjetivo de exigi-la. 
 
33 
 
4.2 A Inserção dos Direitos Sociais nas Normas Cons titucionais 
 
 Na linha evolutiva dos direitos fundamentais costuma-se aludir a gerações de 
direitos (BOBBIO, 1992). É consenso que a formulação desses direitos tem origem 
histórica, advinda do enfrentamento à limitação do poder do Estado. Não obstante, a 
forma de reconhecimento seqüencial desses direitos não enseja cunho revogador, 
observando-se, mesmo, um sentido de complementaridade, de necessária e 
indispensável integração entre essas gerações. Alguns autores, escapando a possível 
imprecisão terminológica, referem-se a dimensões de direitos, ao invés de gerações. De 
toda forma, na atualidade são reconhecidas as seguintes gerações de direitos 
fundamentais: 
 
Direitos fundamentais de primeira geração – correspondem aos direitos 
individuais de liberdade ou de defesa, destinados a proteger os cidadãos contra 
as intervenções estatais, assegurando-se, por conseguinte, uma esfera 
necessária à liberdade destes. Esta geração de direitos, dada à influência, serviu 
para moldar o conceito clássico de Constituição que, nos termos do art. 16 da 
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, pressupunha, ao lado 
do estabelecimento da divisão de poderes, a garantia dos direitos individuais. 
 
Direitos fundamentais de segunda geração – correspondem aos direitos sociais, 
ou direitos de prestação, no sentido de assegurar aos indivíduos melhores 
condições de vida social, econômica, reduzindo-se a desigualdade e buscando 
concretizar a justiça social. Ao invés de uma abstenção do Estado, tal geração 
de direitos requer, deste, ações positivas para a sua implementação em prol da 
coletividade. Observa-se, portanto, que os direitos de primeira geração, de cunho 
individualista, resumem-se num direito geral de liberdade, enquanto que os 
direitos sociais constituem um direito geral à igualdade. 
 
Direitos fundamentais de terceira geração – correspondem aos direitos difusos e 
coletivos, são fundados na consideração do homem como integrante de um 
 
34 
 
grupo. A determinação desta geração de direitos não é ainda muito precisa, no 
sentido de que os titulares não estão representados pelo indivíduo em si, mas na 
própria coletividade ou em agrupamentos sociais. Enquadram-se nesta geração 
os direitos ao meio ambiente equilibrado, à proteção dos consumidores, ao 
desenvolvimento, à paz, entre outros. 
 
Direitos fundamentais de quarta geração – estão relacionados aos efeitos da 
pesquisa científica e biológica (clonagem, alimentos transgênicos etc.), visam 
delinear parâmetros de controle que amenizem o instinto de ganho e proveito por 
parte de indivíduos e grupos desprovidos de escrúpulos. 
 
 As três primeiras gerações de direitos acima enunciadas estão disciplinadas no 
texto de nossa Constituição mais recente. Diferem, todavia, quanto à concretização. 
Neste sentido, observa-se que os direitos de primeira geração possuem um conteúdo 
essencialmente determinado no nível das próprias normas que os consagram. Em 
sentido oposto, os direitos sociais têm a delimitação de sua substância submetida, em 
considerável parcela, à opção legislativa, já que recebe em sua concretização influência 
da política econômica e social escolhida pelo eleitorado, ou seja, sua formulação 
concisa nos textos constitucionais faz emergir a necessidade de sua concretização 
pelos setores políticos em compasso com as circunstâncias sociais e econômicas 
preponderantes. De igual forma, os direitos de terceira geração possuem um grau de 
determinação escasso, não prescindindo, igualmente, da atuação do legislador para a 
delimitação do seu conteúdo; ademais sua concretização requer ampla participação e 
informação por parte dos seus titulares. 
 
 Em síntese, pode-se afirmar que, para a realização das normas constitucionais 
que definem as novas categorias de direitos fundamentais, se faz necessária a 
utilização das políticas públicas. Porém, no universo jurídico o termo política, que cunha 
a expressão acima, encerra um significado amplo, sendo, neste ponto, oportuno 
enunciá-lo em função da temática desenvolvida neste estudo. 
 
 
35 
 
 Nesse sentido, o conceito de Política Pública manifestado por Cristiane Derani 
(2004) merece ser citado dada a sua abrangência e clareza: “é um conjunto de ações 
coordenadas pelos entes estatais, em grande parte por eles realizadas, destinadas a 
alterar as relações sociais existentes”. 
 
 Para a autora, a política surge, no interior do Estado, em três momentos, a saber: 
 
1. Tomada de decisão estatal – da alçada de agentes públicos, com 
intermediação maior ou menor dos segmentos sociais, cujo conteúdo está 
circunscrito à atribuição constitucional e normativa de forma geral; 
2. Fase de alteração institucional, consistente em mudança estrutural ou 
organizacional no âmbito da Administração, preparatória das novas 
obrigações dos agentes públicos; 
3. Ações públicas propriamente ditas, no sentido de concretizarem os valores 
normativos postos pela Constituição. 
 
 De fato, corroborando com o conceito da autora, merece ser lembrado que o 
termo política foi utilizado com o significado de programa de ação governamental em 
diversos dispositivos constitucionais. Observe-se, neste sentido, entre inúmeros outros, 
o artigo 196, já citado anteriormente e o artigo 200, IV, ao frisar competir ao “Sistema 
Único de Saúde participar da formulação da política e da execuçãodas ações de 
saneamento básico”. 
 
 Uma vez estabelecida a significação de política pública, vale lembrar que as 
ações estatais e decisões administrativas, quando da elaboração daquela, pressupõe 
respaldo no sistema jurídico, seja de caráter constitucional ou legal, por força do 
disposto no art. 37, caput, da Lei Máxima. Contudo cabe questionar, enquanto objeto 
precípuo deste estudo, se, em termos de políticas públicas o papel do Judiciário é de 
neutralidade ou se reúne competência para intervir quando de sua execução, ou, com 
maior freqüência diante da omissão do Estado em implementá-las, notadamente no 
tocante à realização dos direitos fundamentais. 
 
36 
 
 
 A possibilidade de os órgãos judiciais deliberarem com vista a obrigar o governo 
a desenvolver ações relacionadas aos direitos fundamentais, ou para impedir atividades 
públicas que os violem, depende do grau de vinculação do Estado às normas que os 
consagram, ou seja, em conformidade com o sistema jurídico vigente. 
 
 No modelo de Constituição espanhola, por exemplo, constata-se uma maior 
dependência do legislador no que concerne à efetividade dos direitos fundamentais de 
segunda e terceira geração. 
 
 Já a Constituição brasileira de 1988, no art. 5º, § 1º, inserido no Capítulo I (Dos 
Direitos e Deveres Individuais e Coletivos) do Título II (Dos Direitos e Garantias 
Fundamentais), proclama: “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais 
têm aplicação imediata”. 
 
 Ora, considerando que os Direitos Sociais estão preceituados no Capítulo II , de 
imediato cabe questionar se o parágrafo acima enunciado incide ou não sobre os 
direitos fundamentais não listados no art. 5º da CF. 
 
 No propósito de ampliar o entendimento sobre a pronta justiciabilidade dos 
direitos fundamentais sociais, nada mais válido que tomar como referência alguns 
argumentos colhidos ao direito estrangeiro, fonte inspiradora que não foi desprezada 
pelos constituintes brasileiros, quando da elaboração do texto constitucional. 
 
 Neste propósito, uma das opiniões mais conceituada é aquela defendida por 
Robert Alexy, (Alexy, 2006) que enumerou alguns argumentos favoráveis e contrários 
ao dilema proposto. 
 
 No plano da admissibilidade ponderou o seguinte: 
 
 
37 
 
a) a liberdade para fazer ou omitir algo pressupõe a liberdade fática ou real, ou 
seja, a possibilidade de escolher entre o permitido, o que somente se dá 
quando se possuem as condições, os bens materiais e espirituais enquanto 
pressupostos da autodeterminação; 
b) as circunstâncias envolventes da moderna sociedade industrial fazem com 
que a liberdade fática de um grande número de titulares de direitos 
fundamentais não encontre seu substrato material num hábitat por eles 
dominado, dependendo essencialmente de atividades estatais. 
 
 No plano das objeções à aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais 
apresenta obstáculos de ordem formal e material, a saber: 
 
a) do ponto de vista formal, os direitos não seriam sindicáveis jurisdicionalmente 
ou e são em menor medida, justamente porque a maioria deles se apóia em 
objeto muito impreciso, de modo que a decisão acerca de seu conteúdo é um 
assunto da política. Isto significa que, de acordo com os princípios da divisão 
de poderes e da democracia, a competência para decidir sobre tais assuntos 
não cai dentro das atribuições dos Tribunais de Justiça, mas na do legislativo 
diretamente legitimado pelo povo; 
b) Do ponto de vista material, os direitos sociais são inconciliáveis com outras 
normas constitucionais, mais especificamente com aquelas definidoras de 
direitos de liberdade. Por exemplo, a norma tutelar do direito ao trabalho 
entraria em conflito com aquela asseguradora do direito à liberdade de 
empresa, limitando a intervenção estatal. 
 
 Diante das ponderações apresentadas, na opinião do autor a norma instituidora 
de direito fundamental social está definitivamente garantida sob o ponto de vista jurídico 
quando: a) a lei exigir, urgentemente, o princípio da liberdade fática; b) se assim 
dispuser em acordo com a divisão de poderes e a democracia; os princípios materiais 
opostos sejam afetados numa medida reduzida por meio da garantia do seu núcleo 
fundamental. De toda sorte, o autor sustenta ainda que, em todas essas hipóteses, 
 
38 
 
estariam satisfeitos os direitos fundamentais sociais mínimos: um mínimo vital, uma 
moradia simples, a educação escolar, a formação profissional e um nível mínimo de 
assistência médica. Assim, a garantia do mínimo se impõe diante da competência do 
legislador, ainda que os efeitos financeiros sejam consideráveis em função de serem 
muitos os que pretendem fazer valer tais direitos. 
 
 Num plano mais institucional, pode ser também citado como fonte de inspiração 
ao constituinte brasileiro o art. 18º/1 da Constituição da República Portuguesa: “Os 
preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são 
directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas”. 
 
 Os ensinamentos extraídos dos autores brasileiros não diferem muito daqueles 
obtidos no direito estrangeiro, porquanto são considerados argumentos favoráveis e 
contrários à pronta aplicabilidade das normas constitucionais e, bem assim, a 
intervenção judicial para garantia dos direitos sociais de segunda geração. Nesta 
vertente, merece destaque a posição de José Afonso da Silva (2006), que se manifesta 
favorável à incidência do art. 5º, § 1º, da Constituição aos direitos fundamentais dos 
arts. 6º a 11º do mesmo diploma, ressaltando, todavia, que o problema da 
aplicabilidade imediata não desaparece quanto a algumas normas definidoras de 
direitos sociais e coletivos, dado que a Constituição faz com que elas dependam de 
legislação ulterior. 
 
 Nobre Júnior (2006, pp. 1253/1254) enumera as situações, abaixo transcritas, 
que podem ser extraídas para o caso brasileiro em consonância com o sistema jurídico 
vigente, no tocante à atuação do Judiciário na esfera das políticas públicas: 
 
a) Tratando-se de norma constitucional dotada de densidade suficiente, a não 
depender de lei integradora, é possível o reconhecimento direto do direito 
social pelo Judiciário; 
b) Não portando tal qualidade, em regra, a exeqüibilidade do direito estaria a 
depender da intervenção do legislador, a quem compete o primeiro passo na 
 
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formulação de uma política pública, não se podendo esquecer que deva ser 
assegurado pelo Estado um mínimo existencial ao cidadão, requisito quase 
sempre presente nas normas completas; 
c) A subordinação da eficácia da norma sobranceira à mediação do legislador 
impõe a este ônus de agir, configurando a inércia inconstitucionalidade por 
omissão; 
d) Ainda quando dependente de complementação legislativa, as normas 
definidoras dos novos direitos invalidam, por inconstitucionalidade, os atos 
legislativos e administrativos que lhes sejam contrários, servindo, em face das 
diretrizes que costumam estabelecer, a limitar a liberdade de conformação do 
legislador; 
e) Igualmente tais normas, mesmo sem a completitude necessária, influenciam, 
mediante o recurso interpretativo, as atividades da Administração e do 
Judiciário. 
 
 Segundoo autor, essas seriam, em linhas gerais, as hipóteses nas quais a 
intervenção judicial na execução de políticas públicas seria plenamente possível, 
visando a concretização dos novos direitos fundamentais. 
 
 A despeito das hipóteses que possam ser exploradas a partir do conteúdo da 
norma constitucional, o controle da atuação do Estado pelo Judiciário na atividade de 
implementar os novos direitos fundamentais alberga limites, entre os quais merecem 
ser citados: 
 
 – A reserva do possível – a capacidade dos recursos financeiros do Estado 
representa, consensualmente entre os estudiosos do controle das políticas públicas 
pelo Judiciário, de fato, um obstáculo concreto à indiscriminada satisfação dos direitos 
sociais, que poderá provocar desequilíbrio financeiro na já combalida finanças públicas. 
Daí, a reserva do possível limitar as despesas desproporcionais, notadamente frente à 
pretensão de dispêndio de elevadíssima quantia em prol de um único beneficiário. 
Neste sentido, tem se pronunciado o Supremo Tribunal Federal (STF), enfatizando que 
 
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a cláusula da reserva do possível empreende que, na concretização, sempre onerosa 
dos direitos a prestações, observe-se a razoabilidade individual/social da pretensão 
versus a disponibilidade financeira do Estado. 
 
 Não obstante, não é admissível que a reserva do possível desonere o 
cumprimento de políticas públicas pelo Estado, na esfera dos direitos fundamentais, 
diante de situações nas quais se impõe a garantia do mínimo assistencial. Recordando-
se a lição de Alexy, referenciada anteriormente, o mínimo vital, por emanar diretamente 
da dignidade humana, impõe-se à liberdade de conformação do legislador. 
 
 – Outro limite à atuação judicial recai no que concerne ao exame das opções 
discricionárias assumidas pelos órgãos públicos. Quanto a este fator limitador vale 
trazer novamente à discussão as argumentações de Nobre Júnior (Ob. Cit., p. 1257) 
respeitante à matéria: 
 
 A discricionariedade consistirá, então, nas situações em que os formuladores ou 
 executores de políticas públicas, mais precisamente o Legislativo e o Executivo, 
 possuem liberdade de opção perante o sistema jurídico. 
 Nelas não haverá possibilidade de intervenção judiciária, porque se está diante 
 do livre espaço de movimentação da escolha política. O controle judicial estaria 
 confinado às hipóteses de desvio de finalidade, violação dos princípios gerais 
 do direito, mais precisamente da razoabilidade ou proporcionalidade, e da 
 inexistência dos motivos que ensejaram a escolha do agente público. 
 De esclarecer que discricionariedade não existirá quando a decisão estiver sob a 
 disciplina de norma constitucional de densidade suficiente ou que resguarde o 
 mínimo essencial. Da mesma forma, quando postura normativa ou administrativa 
 colida com valor consagrado pela Constituição, mesmo em norma não 
 imediatamente aplicável. A eficácia derrogatória daquele, aliada à sua força 
 hermenêutica, impediria que assim fosse. 
 
 
41 
 
4.3 O Controle das Políticas Públicas à Luz dos Fun damentos do 
Neoconstitucionalismo 
 
 A expressão neoconstitucionalismo designa o estado do constitucionalismo 
contemporâneo, o qual apresenta características metodológico-formais e características 
materiais. Do ponto de vista metodológico-formal, opera sob três premissas 
fundamentais: a normatividade, a superioridade e a centralidade da Constituição. Sob o 
ponto de vista material, prevalecem dois elementos: a incorporação explícita no texto 
constitucional de valores e opções políticas, notadamente vinculadas à promoção da 
dignidade humana e dos direitos fundamentais, e a expansão dos conflitos específicos 
e gerais entre as opções normativas e filosóficas inscritas no próprio sistema 
constitucional (colisões, reais ou aparentes, entre diferentes comandos constitucionais, 
dotados de igual hierarquia, demandando solução jurídica diversa). Essas duas 
características repercutem sobre a interpretação jurídica como um todo, dificultando o 
controle das políticas públicas por parte do Judiciário, requerendo, portanto, a 
elaboração de técnicas jurídicas que possam ser utilizadas no dia-a-dia da aplicação do 
direito (BARCELLOS, op. cit.). 
 
 A autora considera que, do ponto de vista metodológico-formal, existe consenso 
entre os aplicadores do direito quanto às premissas que caracterizam esta vertente; 
porém, do ponto de vista material, observam-se duas correntes de opiniões. Uma delas, 
descrita como substancialista, defende que cabe à Constituição impor ao cenário 
político um conjunto de decisões valorativas essenciais e consensuais; enquanto que a 
outra corrente, denominada procedimentalista, é de opinião que a Constituição deve 
garantir o funcionamento adequado do sistema de participação democrático, deixando a 
cargo da maioria, em dado momento histórico, a definição desses valores e opções 
políticas. Não obstante, não existe divergência entre as duas correntes no que tange à 
prevalência dos direitos fundamentais à face de qualquer grupo político, já que esses 
direitos representam elementos valorativos essenciais indispensáveis ao funcionamento 
adequado do sistema de deliberação democrático. 
 
 
42 
 
 Sendo assim, do ponto de vista do neoconstitucionalismo “a Constituição é 
norma jurídica central no sistema e vincula a todos dentro do Estado, sobretudo os 
Poderes Públicos. E, de todas as normas constitucionais, os direitos fundamentais 
integram um núcleo normativo que, por várias razões, deve ser especificamente 
prestigiado” (BARCELLOS, op. cit.). 
 
 Já foi abordado em outra parte desta Seção que a promoção dos direitos 
fundamentais gera conflitos, em decorrência da impossibilidade de hierarquizá-los fora 
da realidade sensível, dada à fundamentalidade que lhes são inerentes. Da mesma 
forma, já foi salientado que a promoção desses direitos exige omissões e ações 
estatais e que, as emissões têm a seu favor a lei da inércia, enquanto que as ações 
estatais envolvem dispêndio de recursos públicos. Compare-se, neste sentido, a 
liberdade de expressão com as prestações de saúde. 
 
 Dessa forma, ainda que as atividades do Legislativo, Executivo e do Judiciário 
estejam vinculadas ao cumprimento das normas constitucionais, conforme já 
enfatizado, compete à Administração Pública implementar ações e programas e garantir 
a prestação de determinados serviços por meio das políticas públicas, para que melhor 
se realize os fins constitucionais, mesmo quando detalhados pelo legislador. Ressalte-
se, outrossim, que as decisões do Judiciário produzem efeitos apenas pontuais, quando 
intervém nas atividades dessa área (BARCELLOS, op. cit.). 
 
 Ana Paula de Barcellos argumenta, no texto que serviu de apoio a esta 
subseção, que as políticas públicas envolvem gastos e que não havendo recursos 
ilimitados é preciso priorizar e escolher em que o dinheiro público será investido. Por 
isso, essas escolhas recebem influência direta das opções constitucionais, ou seja, 
decisões relacionadas a gastos públicos não estão integralmente reservadas à 
deliberação política. Nesta vertente, propõe, através de algumas premissas, o seguinte 
sistema de dedução: 
 
 
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