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Autoras: Profa. Larissa Martins Garcia Profa. Erika Gomes Alves Colaboradoras: Profa. Roberta Pasqualutti Ronca Profa: Kelly Cristina Sanches Profa: Christiane Mazur Doi Fisioterapia Ortopédica Funcional Professoras conteudistas: Larissa Martins Garcia / Erika Gomes Alves Larissa Martins Garcia Larissa Martins Garcia é graduada em Fisioterapia pela Universidade Federal de São Carlos (2008). Possui mestrado (2012) e doutorado (2018) em Ciências pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP). Possui aprimoramento profissional em Fisioterapia em Ortopedia e Traumatologia pelo Hospital das Clínicas da FMRP-USP (2009). É pós-graduada em Formação em Educação a Distância pela Universidade Paulista (UNIP). Atualmente, é fisioterapeuta do Centro de Reabilitação do Hospital das Clínicas da FMRP-USP, supervisora do curso de especialização em Fisioterapia Traumato-Ortopédica do Hospital das Clínicas da FMRP-USP e docente do curso de Fisioterapia e da pós-graduação em Fisioterapia Traumato-Ortopédica da UNIP, campus Ribeirão Preto-SP. Erika Gomes Alves Erika Gomes Alves é graduada em Fisioterapia pela Universidade Nilton Lins (2011). Possui mestrado (2016) em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam-AM). Possui pós-graduação em Fisioterapia em Ortopedia e Traumatologia pelo Iapes (2014) e em Geriatria e Gerontologia pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA-2014). Atualmente, é supervisora do curso de especialização em Saúde Pública com ênfase em Estratégia em Saúde da Família pela Escola de Saúde Pública de Manaus (Esap/SEMSA) e docente do curso de Fisioterapia da UNIP, campus Manaus-AM. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) G216f Garcia, Larissa Martins. Fisioterapia Ortopédica Funcional / Larissa Martins Garcia, Erika Gomes Alves. – São Paulo: Editora Sol, 2021. 200 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Classificação. 2. Diagnóstico. 3. Tratamento. I. Garcia, Larissa Martins. II. Alves, Erika Gomes. III. Título. CDU 617.3 U510.39 – 21 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcello Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Bruno Barros Bruna Baldez Sumário Fisioterapia Ortopédica Funcional APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................9 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................9 Unidade I 1 ASPECTOS BÁSICOS DO COMPORTAMENTO DAS ESTRUTURAS MUSCULOTENDÍNEAS NAS LESÕES ............................................................................................................. 11 1.1 Estágios da resposta inflamatória ................................................................................................. 11 1.2 Recursos terapêuticos ........................................................................................................................ 13 1.3 Fisiopatologia das tendinopatias ................................................................................................... 17 2 OMBRO ................................................................................................................................................................ 19 2.1 Tendinopatias do manguito rotador ............................................................................................ 19 2.1.1 Características anatomopatológicas ............................................................................................... 19 2.1.2 Biomecânica .............................................................................................................................................. 22 2.1.3 Sinais e sintomas .................................................................................................................................... 22 2.1.4 Avaliação .................................................................................................................................................... 23 2.1.5 Reabilitação ............................................................................................................................................... 27 2.1.6 Reabilitação do manguito rotador (sem ruptura ou lesão parcial) .................................... 27 2.1.7 Reabilitação do manguito rotador (lesão extensa) ................................................................... 33 2.1.8 Reabilitação pós-operatória ............................................................................................................... 33 2.2 Osteoartrite (OA) da articulação glenoumeral ......................................................................... 37 2.2.1 Reabilitação após artroplastia total do ombro ........................................................................... 37 2.3 Capsulite adesiva .................................................................................................................................. 39 2.3.1 Características anatomopatológicas ............................................................................................... 39 2.3.2 Prevalência e incidência ....................................................................................................................... 40 2.3.3 Fatores de risco ........................................................................................................................................ 40 2.3.4 Sinais e sintomas .................................................................................................................................... 40 2.3.5 Classificação .............................................................................................................................................. 41 2.3.6 Diagnóstico ............................................................................................................................................... 42 2.3.7 Diagnóstico diferencial ......................................................................................................................... 42 2.3.8 Avaliação .................................................................................................................................................... 43 2.3.9 Reabilitação ............................................................................................................................................... 44 3 COTOVELO ........................................................................................................................................................... 45 3.1 Epicondilite lateral ............................................................................................................................... 45 3.1.1 Incidência e prevalência .......................................................................................................................46 3.1.2 Etiologia e fatores de risco ................................................................................................................. 46 3.1.3 Diagnóstico ............................................................................................................................................... 46 3.1.4 Diagnóstico diferencial ......................................................................................................................... 46 3.1.5 Sinais e sintomas .................................................................................................................................... 47 3.1.6 Avaliação .................................................................................................................................................... 47 3.1.7 Reabilitação ............................................................................................................................................... 52 3.2 Epicondilite medial .............................................................................................................................. 54 3.3 Reabilitação pós-operatória de epicondilites medial e lateral .......................................... 54 3.4 Síndrome do túnel cubital ................................................................................................................ 55 3.4.1 Características anatomopatológicas ............................................................................................... 55 3.4.2 Sinais e sintomas .................................................................................................................................... 57 3.4.3 Etiologia ...................................................................................................................................................... 57 3.4.4 Classificação .............................................................................................................................................. 57 3.4.5 Avaliação .................................................................................................................................................... 58 3.4.6 Tratamento conservador ...................................................................................................................... 60 3.4.7 Tratamento cirúrgico ............................................................................................................................. 62 3.5 Síndrome do pronador ....................................................................................................................... 62 3.5.1 Características anatomopatológicas ............................................................................................... 63 3.5.2 Sinais e sintomas .................................................................................................................................... 64 3.5.3 Avaliação .................................................................................................................................................... 64 3.5.4 Diagnóstico diferencial ......................................................................................................................... 65 3.5.5 Reabilitação ............................................................................................................................................... 65 3.6 Síndrome do nervo interósseo anterior ...................................................................................... 68 4 PUNHO E MÃO ................................................................................................................................................. 69 4.1 Síndrome do túnel do carpo (STC) ................................................................................................ 69 4.1.1 Características anatomopatológicas ............................................................................................... 69 4.1.2 Prevalência e incidência ....................................................................................................................... 70 4.1.3 Sinais e sintomas .................................................................................................................................... 71 4.1.4 Classificação .............................................................................................................................................. 71 4.1.5 Fatores de risco ........................................................................................................................................ 71 4.1.6 Diagnóstico diferencial ......................................................................................................................... 71 4.1.7 Avaliação .................................................................................................................................................... 72 4.1.8 Reabilitação ............................................................................................................................................... 77 4.2 Tenossinovite de De Quervain ......................................................................................................... 78 4.2.1 Características anatomopatológicas ............................................................................................... 78 4.2.2 Etiologia e fatores associados ........................................................................................................... 79 4.2.3 Avaliação .................................................................................................................................................... 79 4.2.4 Diagnóstico diferencial ......................................................................................................................... 80 4.2.5 Reabilitação ............................................................................................................................................... 80 4.3 Dedo em gatilho ................................................................................................................................... 80 4.3.1 Características anatomopatológicas ............................................................................................... 81 4.3.2 Sinais e sintomas .................................................................................................................................... 81 4.3.3 Classificação .............................................................................................................................................. 82 4.3.4 Diagnóstico diferencial ......................................................................................................................... 82 4.3.5 Tratamento conservador ...................................................................................................................... 82 4.3.6 Tratamento cirúrgico ............................................................................................................................. 84 Unidade II 5 DOENÇAS OSTEOMETABÓLICAS E DEGENERATIVAS ......................................................................... 89 5.1 Osteoporose ............................................................................................................................................ 89 5.1.1 Etiologia e fatores de risco ................................................................................................................. 89 5.1.2 Classificação .............................................................................................................................................. 90 5.1.3 Manifestações clínicas e diagnóstico ............................................................................................. 90 5.1.4 Recursos terapêuticos ...........................................................................................................................92 5.2 Osteomalácia .......................................................................................................................................... 92 5.2.1 Etiologia e fatores de risco ................................................................................................................. 92 5.2.2 Manifestações clínicas e diagnóstico ............................................................................................. 93 5.2.3 Recursos terapêuticos ........................................................................................................................... 93 5.3 Escorbuto ................................................................................................................................................. 94 5.3.1 Etiologia e fatores de risco ................................................................................................................. 94 5.3.2 Manifestações clínicas e diagnóstico ............................................................................................. 94 5.3.3 Recursos terapêuticos ........................................................................................................................... 96 5.4 Raquitismo .............................................................................................................................................. 96 5.4.1 Etiologia e fatores de risco ................................................................................................................. 96 5.4.2 Classificação .............................................................................................................................................. 97 5.4.3 Manifestações clínicas e diagnóstico ............................................................................................. 98 5.4.4 Recursos terapêuticos ........................................................................................................................... 99 5.5 Osteoartrose .........................................................................................................................................100 5.5.1 Etiologia e fatores de risco ...............................................................................................................100 5.5.2 Classificação ............................................................................................................................................100 5.5.3 Manifestações clínicas e diagnóstico ...........................................................................................101 5.5.4 Recursos terapêuticos .........................................................................................................................103 6 PATOLOGIAS DA COLUNA VERTEBRAL ..................................................................................................105 6.1 Escoliose .................................................................................................................................................107 6.1.1 Etiologia ....................................................................................................................................................107 6.1.2 Manifestações clínicas e diagnóstico ...........................................................................................108 6.1.3 Recursos terapêuticos ......................................................................................................................... 110 6.2 Alterações anteroposteriores da coluna vertebral ................................................................113 6.2.1 Etiologia ....................................................................................................................................................114 6.2.2 Manifestações clínicas e diagnóstico ...........................................................................................114 6.2.3 Recursos terapêuticos ......................................................................................................................... 115 6.3 Hérnia de disco ....................................................................................................................................118 6.3.1 Etiologia ....................................................................................................................................................119 6.3.2 Manifestações clínicas e diagnóstico .......................................................................................... 120 6.3.3 Recursos terapêuticos ........................................................................................................................ 123 6.4 Espondilose ...........................................................................................................................................128 6.4.1 Etiologia ................................................................................................................................................... 128 6.4.2 Manifestações clínicas e diagnóstico .......................................................................................... 129 6.4.3 Recursos terapêuticos ........................................................................................................................ 130 6.5 Espondilolistese ...................................................................................................................................131 6.5.1 Etiologia ................................................................................................................................................... 132 6.5.2 Manifestações clínicas e diagnóstico .......................................................................................... 133 6.5.3 Recursos terapêuticos ........................................................................................................................ 134 Unidade III 7 ARTICULAÇÕES PERIFÉRICAS: MEMBROS INFERIORES .................................................................138 7.1 Quadril ....................................................................................................................................................138 7.1.1 Deformidades angulares de quadril ............................................................................................. 139 7.1.2 Bursite .......................................................................................................................................................141 7.1.3 Síndrome do piriforme ...................................................................................................................... 143 7.2 Joelho ......................................................................................................................................................146 7.2.1 Bursite ...................................................................................................................................................... 146 7.2.2 Síndrome anserina .............................................................................................................................. 148 7.2.3 Tendinopatia patelar........................................................................................................................... 149 7.2.4 Cisto de Baker ........................................................................................................................................151 7.2.5 Deformidades angulares de joelho ............................................................................................... 152 7.3 Tornozelo e pé......................................................................................................................................154 7.3.1 Tendinite .................................................................................................................................................. 155 7.3.2 Tendinopatia do tendão de calcâneo ..........................................................................................156 7.3.3 Síndrome dolorosa plantar do calcâneo .................................................................................... 157 7.3.4 Pé cavo ..................................................................................................................................................... 159 7.3.5 Pé plano ................................................................................................................................................... 162 7.4 Distrofia simpático reflexa ..............................................................................................................163 7.4.1 Diagnóstico ............................................................................................................................................ 164 7.4.2 Sinais e sintomas ................................................................................................................................. 165 7.4.3 Avaliação ................................................................................................................................................. 166 7.4.4 Reabilitação ............................................................................................................................................ 167 8 AMPUTAÇÃO ...................................................................................................................................................170 8.1 Etiologia .................................................................................................................................................171 8.2 Níveis de amputação ........................................................................................................................171 8.3 Amputação de membro superior .................................................................................................172 8.4 Amputação de membros inferiores .............................................................................................173 8.5 Principais complicações ...................................................................................................................174 8.6 Avaliação ................................................................................................................................................174 8.7 Reabilitação de pacientes amputados .......................................................................................176 8.7.1 Pré-operatória ....................................................................................................................................... 176 8.7.2 Pós-operatória ...................................................................................................................................... 176 8.7.3 Pré-protetização .................................................................................................................................. 178 8.7.4 Pós-protetização .................................................................................................................................. 179 9 APRESENTAÇÃO A fisioterapia ortopédica funcional estuda os procedimentos de prevenção, avaliação, tratamento e reabilitação pertinentes às disfunções musculoesqueléticas, em suas diferentes fases de evolução e manifestação. Para isso, podem ser utilizados diversos recursos fisioterapêuticos como: termoterapia, eletroterapia, fototerapia, terapia manual e cinesioterapia. Esta disciplina tem como objetivo dar aos alunos conhecimento e capacidade de elaborar e questionar os tratamentos fisioterapêuticos referentes aos distúrbios musculoesqueléticos, reunindo seus conhecimentos de métodos de avaliação, recursos terapêuticos e demais áreas já estudadas, promovendo o direcionamento do raciocínio fisioterapêutico relativo ao diagnóstico funcional, objetivo de tratamento e evolução. Este livro-texto foi desenvolvido para que o estudante seja capaz de discutir as bases fisiopatológicas e funcionais envolvidas na elaboração dos tratamentos fisioterapêuticos, assim como discutir os fundamentos dos métodos utilizados na rotina fisioterapêutica, sua validade e seus limites. O conteúdo deste livro proporcionará um aprofundamento da abordagem fisioterapêutica nas disfunções de caráter musculoesquelético. INTRODUÇÃO Iniciaremos com aspectos básicos do comportamento das estruturas musculoesqueléticas nas lesões revendo as fases do processo de cicatrização dos tecidos moles, recursos fisioterapêuticos que auxiliam nesse processo e, consequentemente, otimizam os resultados da reabilitação. Em seguida, revisaremos a fisiopatologia das tendinopatias e os aspectos importantes para a reabilitação dessas disfunções de um modo geral. Posteriormente, discutiremos sobre doenças ortopédicas específicas dos membros superiores. Depois, trataremos das principais doenças osteometabólicas, seus fatores etiológicos, características clínicas e recursos terapêuticos e abordaremos a osteoartrose, discorrendo sobre as principais alterações, tratamentos e medidas de prevenção. Na sequência, serão apresentadas informações sobre os distúrbios da coluna vertebral. Este trecho fornece uma visão ampla sobre as causas, medidas de avaliação e tratamento fisioterapêutico dos diferentes distúrbios posturais. Em seguida, veremos dois componentes, sendo o primeiro referente a disfunções dos membros inferiores, incluindo quadril, joelho, tornozelo e pé, com objetivo de direcionar o raciocínio para a elaboração de um programa de tratamento apropriado e conciso, a fim de favorecer a recuperação do paciente. Ainda nesse primeiro componente, será abordada uma complicação comum associada a disfunções musculoesqueléticas, tanto nos membros superiores quanto inferiores, conhecida como distrofia simpático reflexa. O segundo componente trará informações sobre amputação, discorrendo sobre as principais causas, classificações e medidas de tratamento nas diferentes fases. 10 O objetivo é fornecer um material de fácil compreensão para o estudante. Um livro que, de maneira clara e objetiva, forneça ao aluno conhecimentos anatômicos e fisiopatológicos básicos para a compreensão das diversas lesões musculoesqueléticas, bem como auxilie na elaboração da avaliação, do diagnóstico cinético-funcional e da reabilitação fisioterapêutica individualizada referente a essas lesões. 11 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL Unidade I 1 ASPECTOS BÁSICOS DO COMPORTAMENTO DAS ESTRUTURAS MUSCULOTENDÍNEAS NAS LESÕES 1.1 Estágios da resposta inflamatória As lesões musculoesqueléticas possuem uma prevalência muito alta, ou seja, representam 18% de todas as consultas de atenção primária à saúde, e sua incidência está sempre aumentando. Caro aluno, com esse primeiro dado, já podemos imaginar o quanto a fisioterapia ortopédica é e está sendo requisitada para o tratamento dessas lesões e, com isso, o tamanho de sua importância. Faz parte do nosso cotidiano como fisioterapeutas atender pacientes com lesão musculoesquelética e dor associada, o que gera grande incapacidade a esses indivíduos. Apesar da alta prevalência, a dor musculoesquelética é subtratada. Olhe que interessante: uma pesquisa por telefone, com 5.803 pessoas com esse tipo de dor em oito países da União Europeia, relatou que aproximadamente 1 em cada 4 pessoas com dor musculoesquelética não havia procurado tratamento médico, embora até 57% delas apresentassem dor constante. O subtratamento da dor aguda pode ter importantes consequências a longo prazo, porque é necessário tratamento adequado para impedir a transformação em dor crônica. A dor aguda grave e persistente produz ativação sustentada de nociceptores periféricos, remodelação da arquitetura neuronal e perda de interneurônios inibitórios, os quais levam à hiperalgesia secundária e, eventualmente, à sensibilização central de longo prazo dos neurônios espinhais de segunda ordem (MALANGA; YAN; STARK, 2015). Sabemos que lesões musculoesqueléticas resultantes da execução de tarefasrepetitivas e/ou forçadas podem ocorrer devido a excesso de alongamento, compressão, atrito e isquemia. Embora o resultado da inflamação seja a substituição ou reparação dos tecidos lesionados (músculos, tendões, ligamentos) por tecido saudável e regenerado, nem sempre isso acontece, acarretando inflamação crônica ou sistêmica, fibrose e até ruptura tecidual. O resultado é dor e perda da função motora. É importante que nós, fisioterapeutas, busquemos compreender as fases do processo de cicatrização após lesão dos tecidos moles, bem como a capacidade desses tecidos de suportar tensão para estabelecer um adequado programa de tratamento. O profissional de saúde é capaz de melhorar, atrasar ou danificar o processo de cicatrização, dependendo do seu nível de conhecimento. O processo de cicatrização é frequentemente dividido em três fases: a fase inflamatória, a fase proliferativa e a fase de maturação ou remodelamento. A fase inflamatória começa imediatamente após a lesão e pode durar aproximadamente 7 dias, lembrando que as fases se sobrepõem. Vasos sanguíneos são danificados, por isso vasoconstrição imediata é seguida por vasodilatação, ocasionando aumento do fluxo sanguíneo na área. A permeabilidade dos 12 Unidade I vasos sanguíneos aumenta, as plaquetas se ligam ao colágeno e liberam fosfolipídios para estimular o mecanismo de coagulação. A fibrina e a fibronectina formam ligações cruzadas com o colágeno para construir uma rede de fibrina. Isso resulta em uma estrutura temporária e frágil, que contém a hemorragia local e é a única fonte de resistência à tração da ferida durante essa primeira fase (HOUGLUM, 1992). Em seguida, ocorre migração de leucócitos polimorfonucleares para a área para atacar qualquer organismo externo que possa ter invadido o local. A partir de 24 horas até os dias subsequentes, as células monocíticas convergem para a área e, juntamente com os leucócitos polimorfonucleares, atuam como macrófagos para desbridar a área lesada de tecido necrótico, detritos e material estranho. No final dessa fase, haverá migração de fibroblastos para a área, que serão responsáveis pela produção de colágeno, o qual irá se transformar em tecido cicatricial. Importante frisar que, durante todo o processo inflamatório, há uma interação complexa entre componentes celulares e químicos. Muitas das estruturas celulares migram para o local da lesão devido à liberação de produtos químicos conhecidos como estímulos quimiotáticos. Por exemplo, além de fornecer resistência à tração no local da ferida, a fibronectina é quimiotática para macrófagos. Outro exemplo de substância quimiotática é a histamina, uma substância potente que é liberada pelos mastócitos, pelas plaquetas e pelos leucócitos. A histamina produz vasodilatação e aumenta a permeabilidade vascular, causando edema local. Lembrando que a histamina também possui propriedades quimiotáticas que atraem leucócitos para a área para combater as bactérias. Como você deve se lembrar, os sinais e sintomas clássicos na fase inflamatória são: dor, edema, calor e rubor. Esse quadro clínico é resultado do aumento da vasodilatação, da permeabilidade vascular e do vazamento de fluidos dos tecidos danificados. A dor resulta de uma combinação de aumento da pressão nos tecidos e da sensibilidade dos receptores de dor às substâncias químicas na área. Acredita-se que a bradicinina, a histamina e as prostaglandinas sensibilizem os receptores de dor, de modo que seu nível de irritação se torne mais baixo e mais facilmente excitável. Na prática clínica notamos que a perda de função é resultado de inibição reflexa, pois a dor e o edema restringem mecanicamente o movimento. O dano direto ao tecido também pode ser um fator que resulta em diminuição da força muscular, principalmente quando os músculos e tendões são lesionados. À medida que o tecido necrótico vai sendo removido, ocorre um acúmulo de fibroblastos, miofibroblastos e células endoteliais, marcando o início da fase proliferativa. A migração e proliferação dessas células são estimuladas pela presença de fatores de crescimento produzidos a partir de plaquetas e macrófagos. Os fibroblastos começam a sintetizar a matriz extracelular, e novos capilares se formam. A combinação dos novos capilares com fibroblastos e miofibroblastos é chamada de tecido de granulação. À medida que a formação do tecido de granulação aumenta, a rede de fibrina diminui. Com eventos de destruição e construção de tecidos ocorrendo ao mesmo tempo, a resistência à tração tecidual está em seu nível mais baixo e é facilmente suscetível a danos se for aplicada força excessiva durante esse estágio. Macrófagos e plaquetas liberam substâncias quimiotáticas que estimulam os fibroblastos, que por sua vez produzem colágeno tipo 3 (fibras finas e fracas). O ácido hialurônico, um glicosaminoglicano, atua 13 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL para atrair água para o local, aumenta a matriz intercelular e facilita a migração celular. À medida que o tecido cicatricial amadurece durante essa fase, ele desenvolve terminações nervosas sensíveis à pressão e à tensão. A vascularização do tecido cicatricial permanece imatura e fraca e pode sangrar facilmente. O colágeno que está sendo produzido não possui uma organização consistente. Devido à extensa vascularização e inervação do local em cicatrização, ao aumento de fluido e à relativa imaturidade dos novos tecidos, a cicatriz nessa fase permanece vermelha e edemaciada, pode ser facilmente danificada e permanece sensível ao alongamento ou à pressão. Por volta do sétimo dia, há um aumento significativo na quantidade de colágeno, de modo que a resistência à tração da ferida melhora significativamente. No 12º dia, o colágeno tipo 3 imaturo é substituído pelo colágeno tipo1, que é mais resistente. Durante esse último estágio da fase de proliferação, a contração da ferida através dos miofibroblastos começa a ocorrer, resultando finalmente em uma redução do tamanho dela. À medida que a transição é feita da fase proliferativa para a fase de maturação, ocorrem alterações no tecido cicatricial, que se torna mais denso à medida que a vascularização diminui e sua matriz perde parte de seu fluido. As fibras de colágeno continuam a amadurecer e se tornam mais densamente compactadas. Embora seja difícil definir claramente o delineamento entre essas duas fases, alguns autores acreditam que a fase proliferativa se estenda até o 21° dia do processo de cicatrização (HOUGLUM, 1992). A fase de maturação ou remodelamento tem maior duração, podendo se estender por um ano ou mais após a lesão. Durante esse período, o número de fibroblastos, miofibroblastos, macrófagos e capilares diminui. A quantidade de líquido dentro da cicatriz é reduzida, ele fica mais branco à medida que o colágeno se torna mais denso e a vascularização diminui. Conforme estresse vai sendo aplicado ao colágeno nessa fase, suas fibras tornam-se mais organizadas e a resistência da cicatriz aumenta. Nós observamos que, durante essa fase final de cicatrização, o novo tecido é remodelado até que uma estrutura forte e permanente seja formada, ou seja, ocorre restauração da área à sua estrutura anterior (regeneração) ou substituição por uma cicatriz (reparo). É geralmente aceito que a maioria dos tecidos moles cicatrize através do processo de reparo, usando tecido cicatricial para substituir estruturas anteriores. Nós precisamos levar em conta que a restauração da força tênsil varia de acordo com as fases do processo de cicatrização e de acordo com o tipo de tecido. 1.2 Recursos terapêuticos É comum na prática clínica que nós utilizemos diversos recursos para auxiliar o processo de cicatrização tecidual, preparar uma área para o exercício subsequente ou otimizar os efeitos do exercício na reabilitação. Os principais objetivos da fisioterapia no tratamento das condições musculoesqueléticas são reduzir a dor, manter ou recuperar a amplitude de movimento (ADM) articular e maximizar a funçãoe a qualidade de vida sem efeitos adversos, permitindo, assim, que as pessoas lidem melhor com seus problemas de saúde crônicos. Analgesia é importante porque o alívio da dor tende a resultar em melhora espontânea da função e, consequentemente, da qualidade de vida do paciente. Vamos relembrar a teoria da comporta da dor proposta por Melzack e Wall (1965)? Esse conceito diz que a percepção da dor é modulada na coluna dorsal da medula espinhal por entradas concorrentes de fibras nervosas Aβ não nociceptivas de grande diâmetro (transmitindo informações cutâneas térmicas, mecânicas 14 Unidade I ou elétricas) e fibras nervosas C nociceptivas de menor diâmetro (transmitindo informações sobre dor). Como a condução nervosa é muito mais rápida nas fibras nervosas de maior diâmetro, os impulsos dessas fibras chegam à medula espinhal antes dos impulsos das fibras nervosas nociceptivas de menor diâmetro, fechando a comporta e bloqueando a percepção de dor. Outras maneiras possíveis pelas quais as modalidades fisioterapêuticas podem aliviar a dor incluem a ativação do sistema opioide endógeno, que proporciona abertura da comporta pela ativação das fibras nervosas nociceptivas. Essa abertura da comporta desencadeia a liberação de endorfinas pelo sistema opioide, resultando em fechamento da comporta de dor. Podemos reduzir a dor musculoesquelética com termoterapia, que é a aplicação de calor ou frio. A termoterapia pode aliviar a dor, aumentando a temperatura tecidual, o que aumenta o fluxo sanguíneo, a taxa metabólica e a extensibilidade do tecido, enquanto o resfriamento tecidual inicialmente diminui o fluxo sanguíneo, causando vasoconstrição seguida de vasodilatação para evitar danos hipóxicos, o que reduz o metabolismo, a excitabilidade neuronal, a inflamação e a extensibilidade do tecido. Faz parte da nossa rotina como fisioterapeutas a aplicação de crioterapia para lesões musculoesqueléticas agudas com inflamação e a aplicação de calor para dores musculares, articulares e rigidez. O frio ou o calor podem ser úteis para dores lombares agudas e dores musculares, mas o calor parece trazer melhores resultados nesses casos. Formas simples de termoterapia (compressas de água quente ou fria) podem ser utilizadas por nós para tratamento de condições musculotendinosas de indivíduos com sensação cutânea normal. Essas formas de terapia são autoadministradas há milênios, porque são seguras, fáceis de aplicar, acessíveis e eficazes (HURLEY; BEARNE, 2008). A crioterapia é a aplicação de qualquer substância ou meio físico que diminua a temperatura da área de contato do corpo e dos tecidos adjacentes (figura seguinte). É utilizada no tratamento de lesão aguda, dor crônica, espasmo muscular, dor muscular de início tardio, inflamação e edema. O uso da crioterapia logo no estágio inflamatório é amplamente aceito porque minimiza a dor e o edema. É importante lembrar que, nesse estágio inicial, é contraindicada a utilização de calor, já que aumentaria a circulação. Como você já deve ter visto durante alguns esportes na televisão, muitas modalidades estão disponíveis para aplicação de crioterapia, incluindo bolsas de gelo picado, pacotes de gelo com gel acessíveis no mercado, massagem com gelo, imersão e sprays. Ou seja, a eficácia de cada modo de crioterapia para diminuir a temperatura nos tecidos profundos e superficiais pode variar. Vamos pensar em alguns exemplos: o gelo úmido é mais eficaz do que o gelo em cubos ou picado na redução da temperatura da superfície da pele e de temperaturas intramusculares durante um período de aplicação de 20 minutos. Já os sprays vaporizadores contêm mentol, um contrairritante que produz a sensação de resfriamento e analgesia através da ativação dos canais iônicos receptores de potencial transitório em neurônios sensoriais periféricos sensíveis ao frio sem realmente resfriar a pele. Portanto, embora o mentol tópico possa ser uma ferramenta eficaz para o controle da dor, é ineficaz para resfriar a pele e o tecido subcutâneo (MALANGA; YAN; STARK, 2015). A crioterapia tem múltiplos efeitos fisiológicos no tecido lesionado. A diminuição da temperatura da pele e do músculo reduz o fluxo sanguíneo para os tecidos resfriados, ativando um reflexo vasoconstritivo simpático. Reduções no fluxo sanguíneo induzidas pelo frio diminuem o edema e retardam a liberação 15 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL de mediadores inflamatórios (por exemplo, leucócitos), reduzindo, assim, a inflamação da área afetada. Ao resfriar a temperatura do tecido, haverá redução da demanda metabólica de tecidos hipóxicos, prevenindo potencialmente danos hipóxicos secundários no tecido lesionado. Sendo assim, a crioterapia induz um efeito anestésico local, que diminui o limiar de ativação dos nociceptores teciduais e a velocidade de condução dos sinais nervosos que transmitem dor. A redução da temperatura muscular pode também reduzir o espasmo muscular através da inibição de uma alça reflexa da medula espinhal. Figura 1 – Aplicação de crioterapia com gelo picado Já quando aplicamos calor no corpo do paciente, ocorre aumento da temperatura tecidual. Essa aplicação de calor após resolução do processo inflamatório pode ser benéfica para auxiliar na eliminação de resíduos através do aumento do fluxo sanguíneo, aumentar a extensibilidade dos tecidos, minimizar o espasmo muscular e, consequentemente, a dor. As modalidades de calor superficial incluem garrafas de água quente, compressas térmicas, banhos quentes, sauna, parafina, vapor e radiação infravermelha. Por sua vez, as modalidades de calor profundo incluem diatermia por ondas curtas, micro-ondas e ultrassom. Figura 2 – Aplicação de calor com radiação infravermelha 16 Unidade I O aumento da temperatura tecidual estimula a vasodilatação e aumenta o fluxo sanguíneo do tecido, que por sua vez aumenta o suprimento de nutrientes e oxigênio para o local da lesão, auxiliando o processo de cicatrização tecidual. Alterações nas propriedades viscoelásticas do tecido colagenoso induzidas pelo calor podem ser eficazes para melhorar a ADM. Você já sabe que modalidades eletrotermofototerapêuticas são frequentemente utilizadas por fisioterapeutas que tratam pessoas com todos os tipos de problemas musculoesqueléticos. A aplicação de energia com recursos eletrotermofototerapêuticos altera os processos fisiológicos, e, como resultado, podemos ter redução da dor, do edema e da atrofia muscular. Vamos fazer uma revisão breve sobre alguns desses recursos? De acordo com Johnson e Martinson (2007), estimulação elétrica nervosa transcutânea (TENS) é uma modalidade de tratamento eficaz para dores musculoesqueléticas crônicas. Fuentes et al. (2010) conduziram uma revisão sistemática com metanálise e mostraram que a terapia com corrente interferencial incluída em um plano de tratamento multimodal parece produzir um efeito de alívio da dor em condições dolorosas musculoesqueléticas agudas e crônicas em comparação com nenhum tratamento ou placebo. Para desordens musculoesqueléticas, a terapia com estimulação elétrica de alta voltagem (EEAV) pode ser utilizada para redução do edema. Estimulação elétrica funcional (FES) e corrente russa podem ser utilizadas para aumentar a força e resistência musculares, bem como reeducar o controle motor em indivíduos com fraqueza muscular intensa (BÉLANGER, 2012). A fotobiomodulação tem como objetivo alterar as reações fotoquímicas nas membranas celulares, resultando em alterações na permeabilidade celular e no movimento dos íons cálcio para promover a cicatrização dos tecidos e o alívio da dor. A fotobiomodulação corretamente aplicada em lesão musculoesquelética pode oferecer alívio clinicamente relevante da dor e iniciar um curso mais rápido de melhora, tanto isolado quanto combinado com demais intervenções fisioterapêuticas. O ultrassom pode ser usado para reduzir inflamação e dor e acelerar o processo de cicatrização tecidual. As ondas sonoras de alta frequência produzem vibraçãomecânica nos tecidos e isso pode produzir efeitos térmicos e não térmicos. Altas doses de ultrassom causam aquecimento do tecido, o que diminui a dor e a viscosidade do fluido e aumenta a taxa metabólica e o fluxo sanguíneo e, nesse caso, valem as mesmas contraindicações da aplicação de calor durante a fase inflamatória. As doses mais baixas de ultrassom têm efeitos mecânicos não térmicos e são indicadas para facilitar o processo de cicatrização dos tecidos (HURLEY; BEARNE, 2008). A terapia manual é a aplicação de manipulações com alta velocidade, técnicas que melhoram a mobilidade dos tecidos moles e nervos, alongamento sustentado, mobilizações oscilatórias ou massagem para reduzir a dor e aumentar a amplitude e a qualidade do movimento. A manipulação realizada por nós, fisioterapeutas, consiste em movimentos fortes e de alta velocidade. A mobilização articular é menos agressiva e utilizada com mais frequência do que as manipulações e é capaz de proporcionar analgesia e/ou ganho de ADM. A massagem também pode ser realizada para redução da dor, já que ela libera analgésicos endógenos que fecham a comporta da dor. Também reduz edema, aumenta a circulação, melhora o tônus e a flexibilidade muscular. 17 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL É fundamental que saibamos as indicações e contraindicações adequadas de cada recurso e como aplicar para que se obtenha os melhores resultados para os nossos pacientes. Vale lembrar que o modelo médico se concentra estreitamente nos efeitos físicos da doença e cuidados com a saúde, portanto, ele não é adequado para condições osteomusculares em que as pessoas têm que aprender a lidar com problemas de saúde crônicos. O modelo biopsicossocial é amplo e considera as consequências físicas, psicológicas, sociais e econômicas do problema de saúde. Ele fornece um pacote de cuidados de saúde que visa melhorar aspectos subjetivos da vida das pessoas e pode ser uma maneira mais eficaz e apropriada de gerenciar condições musculoesqueléticas crônicas. 1.3 Fisiopatologia das tendinopatias Historicamente, várias palavras diferentes foram usadas para descrever a patologia relacionada ao tendão, incluindo “tendinose” (implicando etiologia degenerativa), “tendinite” (implicando etiologia inflamatória) e “tendinopatia”, a mais favorecida recentemente e menos específica etiologicamente. Essa diversidade de linguagem reflete um desacordo histórico na comunidade científica quanto ao papel exato da inflamação na etiologia da tendinopatia. Entre os anos de 1990 e 2000, os estudos afirmavam não haver inflamação nas tendinopatias crônicas ou nas fases iniciais por não encontrarem presença de células inflamatórias como leucócitos e macrófagos, como vimos no começo deste livro-texto. Em vez de inflamação, os tendões lesados demonstraram um número aumentado de fibroblastos, hiperplasia vascular e desorganização do colágeno, o que é consistente com tendinose. Esses achados foram responsáveis pelo termo “hiperplasia angiofibroblástica”, que se refere às alterações degenerativas que ocorrem quando um tendão falha na cicatrização adequada após lesão ou microtrauma repetitivo resultante de uso excessivo. A sobrecarga do tendão está ligada a alterações na forma celular, bem como ao aumento dos marcadores de inflamação e à degradação da matriz. A maneira pela qual as células interagem com a matriz extracelular é uma área de grande interesse; a inflamação e o remodelamento da matriz induzida por danos parecem estar concentrados nas proximidades da matriz interfascicular altamente celular. Portanto, pode-se inferir que as interações entre o tendão, a matriz interfascicular e o tecido adiposo adjacente são fundamentais para o desenvolvimento de tendinopatia, sendo esta uma potencial fonte de citocinas e células inflamatórias. Isso pode ajudar a explicar a presença de inflamação persistente na tendinopatia, um fenômeno que demonstrou ter efeitos importantes nas células tendíneas in vitro (DEAN et al., 2017). A diminuição da popularidade do termo “tendinite” representou ceticismo em relação ao papel da inflamação na degeneração do tendão. Muitos estudos que alegaram ausência de inflamação na tendinopatia se baseavam mais na crença do que em dados científicos robustos. Vários estudos afirmaram que não existiam células inflamatórias nas amostras de pacientes com tendinopatia, mas haviam procurado apenas neutrófilos, e não outros tipos de células inflamatórias. De fato, as evidências que apoiam o papel da inflamação na patogênese da tendinopatia tornaram-se cada vez mais avassaladoras nos últimos anos, com a maioria dos estudos demonstrando um aumento no número de macrófagos em tendões lesados. Sabe-se que os macrófagos desempenham um papel essencial na inflamação e no reparo tecidual. 18 Unidade I Estudos mais recentes, graças ao avanço nas técnicas de análise imuno-histoquímicas, começaram a evidenciar presença de reação inflamatória tanto na tendinopatia crônica quanto nas fases iniciais da doença. Esses estudos encontraram presença de macrófagos e linfócitos T e B, aumento da concentração de IL1, IL6, COX1, COX2 e substância P e aumento de citocinas e fatores de crescimento, que são evidências da presença de reação inflamatória. Mediadores inflamatórios possuem um importante papel na degradação da matriz extracelular e, consequentemente, na tendinopatia. O fato é que existe uma complexidade dos processos envolvidos na inflamação dos tendões, e, além disso, eles podem mudar com o estágio da doença (REES; STRIDE; SCOTT, 2014; MILLAR; MURREL; MCINESS, 2017). É comum, na prática clínica, nos depararmos com pacientes com tendinopatia, uma disfunção que impacta a qualidade de vida deles e é responsável por muitos afastamentos do trabalho. A patogênese da tendinopatia é multifatorial e complexa. Aumento da idade, uso excessivo, condições metabólicas e vasculares são fatores de risco frequentemente presentes. A tendinopatia possui achados histopatológicos, clínicos e radiológicos característicos. As alterações histopatológicas incluem desorganização do colágeno, aumento da deposição de substância fundamental mucoide, aumento da celularidade geral, bem como aparecimento de células redondas tipo condroide. À medida que o grau de degeneração do tendão aumenta, menores são as chances de regeneração desse tecido. Os sintomas frequentemente são pouco compatíveis com os achados histopatológicos e radiológicos, o que significa que uma porcentagem de pacientes não tem sintomas relacionados à tendinopatia, mesmo apresentando resultados de exames histopatológicos e radiológicos que indicam degeneração do tendão. Estudos sugerem que a presença de dor na tendinopatia não se relaciona apenas a alterações mecânicas no tendão, mas também a alterações na maneira como as células locais e os nervos periféricos reagem a essa alteração, contribuindo, assim, para a ativação das vias nociceptivas dos centros superiores. Os fatores que podem predispor à tendinopatia podem ser divididos em duas categorias: intrínsecos e extrínsecos. Lúpus eritematoso sistêmico, insuficiência renal crônica, idade e doenças endócrino-metabólicas como diabetes mellitus, obesidade, dislipidemia e hipertensão arterial sistêmica são fatores intrínsecos. Os fatores sobrecarga, tipo de atividade, técnica errada e uso de equipamentos inadequados se aplicam tanto a atividades esportivas quanto laborais e são considerados fatores extrínsecos. Além disso, condições ambientais (frio ou calor extremo) e uso de determinados medicamentos também são considerados fatores extrínsecos (WOO; RENSTROM; ARNOCZKY, 2007). A lesão tendinosa é dividida em três estágios: tendinopatia reativa, desorganização tendínea e tendinopatia degenerativa. No primeiro estágio, ocorre proliferação não inflamatória de células da matriz, espessamento tendíneo sem alterações no colágeno e nas estruturas neurovasculares. Esse espessamento é uma tentativa de reduzir o estresse por aumento da área de secçãotransversa, diferentemente da adaptação normal do tendão, quando há aumento da resistência e, nesse caso, o tendão responde aumentando sua rigidez com poucas mudanças na espessura. Nessa fase, o tendão tem potencial para voltar ao normal se a sobrecarga for suficientemente reduzida. No estágio de desorganização tendínea, ocorre tentativa de cicatrização, porém com maior desarranjo da matriz. Há um aumento nos condrócitos e alguns miofibroblastos, com aumento na produção de 19 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL proteínas (proteoglicanos e colágenos). Esse aumento dos proteoglicanos resulta em separação do colágeno e desorganização da matriz. Ocorre aumento da vascularização e da inervação. Pode haver alguma reversão desse quadro com adequação da carga e exercícios que estimulem a estrutura matricial. O estágio de tendinopatia degenerativa é caracterizado por progressão das alterações da matriz, surgimento de áreas necróticas e, consequentemente, de áreas acelulares e redução de colágeno. Há pouca chance de reversibilidade dessa fase e grande possibilidade de ruptura tendínea (COOK; PURDAM, 2009). É indiscutível a presença de um processo degenerativo do tendão. O termo “tendinite” realmente deve se manter em desuso, lembrando que existem evidências da presença de células inflamatórias, e a presença de mediadores químicos inflamatórios contribui para a degradação da matriz extracelular, portanto, não se pode descartar a presença de inflamação nas tendinopatias. Modelos degenerativos não inflamatórios e inflamatórios se complementam. É importante ter em mente essas questões ao propor um tratamento, pois cada indivíduo pode ter maior, menor ou nenhum componente inflamatório. Você já provavelmente percebeu que os fisioterapeutas falam bastante sobre exercícios excêntricos, e vale lembrar que eles podem resultar em remodelamento na junção musculotendinosa, incluindo hipertrofia e aumento da atividade de fibroblastos, o que leva ao aumento da produção de colágeno. Portanto, essa forma de exercício pode facilitar a cicatrização em tendinopatias crônicas, o que resultaria na resolução de sintomas de dor. Nos últimos anos, muito temos ouvido falar sobre a importância do manejo adequado da carga na reabilitação para tendinopatias. Tem sido sugerido que a carga durante os exercícios terapêuticos precisa ser suficientemente alta para provocar mudanças fisiológicas dentro do tendão. Sendo assim, devem ser prescritos exercícios de fortalecimento progressivo e individualizado com carga, tanto na modalidade excêntrica quanto na concêntrica. Lembre-se de que exercícios concêntricos envolvem encurtamento das fibras musculares, enquanto exercícios excêntricos envolvem alongamento dessas fibras. Relembre sempre origem, inserção e função dos músculos que precisam ser fortalecidos, isso irá facilitar o raciocínio para a prescrição do exercício excêntrico. 2 OMBRO 2.1 Tendinopatias do manguito rotador Você sabia que as disfunções do manguito rotador estão entre as doenças musculoesqueléticas mais prevalentes e representam uma das condições mais comuns relacionadas ao ombro? Elas afetam com mais frequência os pacientes na quinta, sexta ou sétima décadas de vida e podem variar de tendinose aguda a lesões crônicas irreparáveis. Vamos falar sobre elas. 2.1.1 Características anatomopatológicas Certamente, a essa altura, você já ouviu falar sobre os músculos do manguito rotador, certo? O manguito rotador é composto pelas seguintes unidades musculotendíneas: supraespinhal, infraespinhal, redondo menor e subescapular. Esses quatro músculos se originam no corpo da escápula e se inserem nas tuberosidades do úmero. Os tendões do manguito rotador aderem estreitamente à cápsula da 20 Unidade I articulação glenoumeral e fornecem reforço circunferencial, exceto no intervalo dos rotadores e no recesso axilar. O intervalo dos rotadores é uma área triangular delimitada pela margem superior do subescapular e pela margem anterior do supraespinhal. O intervalo dos rotadores contém o ligamento coracoumeral, o ligamento glenoumeral superior e o tendão do bíceps. Os ligamentos coracoumeral e glenoumeral superior funcionam para limitar a rotação externa com o braço aduzido e impedir a translação inferior da cabeça do úmero. A) SE SU B) SE Rm IE Figura 3 – A) Vista anterior do ombro e do manguito rotador. SE = supraespinhal; SU = subescapular. B) Vista posterior do ombro e do manguito rotador. SE = supraespinhal; IE = infraespinhal; Rm = redondo menor O ombro é um complexo composto pelas articulações glenoumeral, acromioclavicular, esternoclavicular e escapulotorácica (figura seguinte). A articulação glenoumeral tem a cabeça umeral convexa, articulando-se com a glenoide, que é côncava, semelhante a uma bola e um soquete. Anormalidades ou rupturas do arco coracoacromial podem contribuir para a disfunção do manguito rotador. A) Articulação acromioclavicular Acrômio Articulação glenoumeral (cápsulas) Úmero Esterno Articulação esternoclavicular Escápula Clavícula B) Caracoide GlenoideGlenoide Labrum Úmero Acrômio Escápula Figura 4 – (A) Vista anterior do ombro. (B) Vista axial do ombro 21 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL Várias bursas estão próximas da articulação glenoumeral e contribuem para a função do ombro. A bursa subescapular encontra-se profundamente ao subescapular, entre o músculo e o colo da glenoide. As bursas subacromial e subdeltoidea são superficiais ao manguito rotador. A bursa subacromial situa-se entre o acrômio e o manguito rotador e cefálica à articulação glenoumeral, enquanto a bolsa subdeltoidea se estende lateralmente ao espaço subacromial na metáfise do úmero proximal. As bursas variam em tamanho e separam o manguito rotador do músculo deltoide. Elas podem inflamar após trauma ou condições de uso excessivo; sendo assim, a bursite pode causar dor e limitação da função. O músculo deltoide possui três cabeças (anterior, média e posterior), todas inervadas pelo nervo axilar. Sua origem é muito ampla, incluindo terço distal da clavícula, acrômio e terço lateral da coluna escapular, e a inserção é na tuberosidade deltoidea na diáfise do úmero. As três cabeças do deltoide fornecem significativa ADM do ombro e são os músculos primários para abdução, elevação e extensão da articulação glenoumeral. Quando pensamos nas causas da disfunção do manguito rotador, é provável que uma somatória de fatores contribua para seu aparecimento. Impacto subacromial, degeneração tendínea, instabilidade glenoumeral, insuficiência vascular, trauma e anomalias congênitas podem contribuir para o desenvolvimento e a progressão das lesões do manguito rotador. Sabemos que a incidência de lesões do manguito rotador aumenta com a idade. Vale lembrar que nem sempre a presença de dor na articulação do ombro significa a existência de lesão. Existe uma região pouco vascularizada nos tendões do manguito rotador próximo à inserção na cabeça do úmero. Essa insuficiência vascular associada à sobrecarga ou a algum evento traumático pode levar à ruptura do manguito rotador. Uma outra causa de lesão no manguito rotador é a síndrome do impacto. Acrômio ganchoso (tipo III), irregularidades do arco coracoacromial como um ligamento coracoacromial espessado ou ossificado podem comprimir os tendões do manguito rotador durante a movimentação ativa do braço, o que provoca degeneração ou até ruptura desses tendões. Vamos nos aprofundar um pouco mais nesse conhecimento? O desequilíbrio muscular (principalmente fraqueza dos músculos supraespinhal ou subescapular) e a tensão capsular promovem translação excessiva e superior da cabeça do úmero em direção ao acrômio e, consequentemente, aumento da pressão no manguito. Isso promove compressão da articulação glenoumeral durante o movimento ativo do ombro e predispõe à lesão do manguito rotador. Instabilidade pode levar à lesão do manguito rotador. A insuficiência dos estabilizadores estáticos do ombropermite a translação da articulação glenoumeral, que gera tensão no manguito rotador e pode até avulsionar os tendões. Uma lesão SLAP (labrum superior anterior-posterior) pode provocar algo semelhante, pois a frouxidão do lábio superior permite que a cabeça do úmero translade superiormente em direção ao arco coracoacromial. 22 Unidade I Trauma de alta energia é comum em indivíduos jovens e pode reduzir a estabilidade da articulação glenoumeral através de lesões labrais ou ligamentares, colocando tensão no manguito rotador. O microtrauma por uso repetitivo também pode causar lesão no manguito com o tempo. Lembrete A lesão do manguito rotador é causada provavelmente por múltiplos fatores, mas o resultado da dor no ombro e perda de função é o mesmo para todos os pacientes. 2.1.2 Biomecânica O manguito rotador tem várias funções no movimento e na estabilidade da articulação glenoumeral. Proporciona compressão articular e resistência à translação glenoumeral, além de permitir alguma rotação em todos os planos de movimento. Existe uma interação complexa entre os músculos que circundam a escápula e o ombro, proporcionando a essa articulação amplos graus de liberdade de movimento. O papel principal do manguito rotador é proporcionar estabilidade dinâmica em toda a ADM. Os músculos subescapular, infraespinhal e redondo menor deprimem a cabeça do úmero, neutralizando a tração superior do deltoide. O infraespinhal é um depressor eficaz da cabeça umeral com o ombro a 90° de abdução e rotação neutra, enquanto o subescapular atua como depressor da cabeça com o ombro em rotação externa. Dessa maneira, o manguito rotador fornece compressão direta da articulação e permite que a cabeça do úmero mantenha uma posição relativamente constante em relação à glenoide. O manguito rotador mantém a cabeça do úmero centralizada na glenoide durante os movimentos e ao mesmo tempo permite que o deltoide faça sua função (SKIRVEN et al., 2011). O supraespinhal auxilia o deltoide no início da abdução do úmero, especialmente nos primeiros 30°. O infraespinhal e o redondo menor são os únicos músculos do manguito que produzem rotação externa. Lesões nesses tendões, especialmente as crônicas, podem levar ao déficit importante de ADM de rotação externa, bem como à redução da força. O subescapular funciona como um importante rotador interno, mas também contribui para a abdução do ombro e depressão da cabeça do úmero. Vários músculos contribuem para a rotação interna, mas o subescapular é mais importante nos extremos desse movimento. Isso é demonstrado em pacientes com uma ruptura do subescapular, que não conseguem realizar o teste de compressão abdominal. Assim, pode-se esperar que a perda da função do manguito rotador resulte em perda de força para elevação do braço, surgimento precoce de fadiga, perda de estabilidade dinâmica e subluxação da articulação. 2.1.3 Sinais e sintomas É frequente que nossos pacientes relatem dor, fraqueza ou uma combinação desses sintomas. O início dos sintomas pode ser agudo ou crônico, sendo a dor noturna uma queixa comum. Os pacientes podem relatar um único evento traumático; no entanto, a maioria descreve dor no ombro que piora à realização de atividade e progride ao longo do tempo. A dor geralmente está localizada na região 23 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL anterior do ombro ou no acrômio, mas pode irradiar para a lateral do braço no trajeto do deltoide. A dor piora ao levantar objetos na frente do corpo, realizar atividades acima da cabeça e posicionar o braço nas costas. 2.1.4 Avaliação A palpação pode provocar dor principalmente na tuberosidade maior, inserção do supraespinhal e articulação acromioclavicular. A inspeção é capaz de fornecer informações valiosas, como, por exemplo, presença de atrofia muscular nas fossas supraespinhal e infraespinhal. A atrofia nessas áreas pode ser um sinal de ruptura crônica do manguito rotador ou possível déficit neurológico, como a compressão do nervo supraescapular. É importante realizar a inspeção do deltoide para avaliar a massa muscular e observar os contornos e as irregularidades do bíceps a fim de descartar uma possível ruptura do seu tendão. É fundamental inspecionar a região posterior durante a flexão ativa do ombro para verificar se existe discinesia escapular ou escápula alada. Exemplo de aplicação A discinesia escapular está associada a alterações cinemáticas do ritmo escapuloumeral. Sabe-se que em um ombro saudável existe um ritmo cinemático natural entre a abdução glenoumeral e a rotação escapulotorácica para cima. Existem seis princípios cinemáticos associados à abdução completa do ombro. Vamos então relembrar a biomecânica do ritmo escapuloumeral: primeiramente, descreva no papel cada um desses seis princípios; lembre-se de descrever os movimentos que ocorrem nas articulações escapulotorácica, esternoclavicular, acromioclavicular e na clavícula, escápula e úmero. Escreva também os fatores de risco intrínsecos e extrínsecos da discinese escapular. Isso nos ajuda a identificar disfunções e, consequentemente, traçar planos adequados de tratamento. É importante que observemos se existe rigidez do ombro, lembrando que as ADMs ativa e passiva do ombro devem ser avaliadas e comparadas com o lado contralateral. Recomenda-se principalmente a mensuração das ADMs de flexão, rotação interna, rotação externa com o braço ao lado do corpo e com abdução de 90°. Os testes provocativos de impacto que os fisioterapeutas mais utilizam na clínica são o Neer e o Hawkins/Kenneddy. Para o teste de impacto de Neer, o paciente permanece em pé e o examinador, com uma mão, estabiliza o ombro e, com a outra mão, eleva rapidamente o membro superior (figura seguinte). Para o teste de Hawkins/Kennedy, o paciente permanece em pé e o examinador posiciona o membro superior a 90° de flexão e força a rotação interna. Ambos os testes provocam atrito das estruturas subacromiais com o arco coracoacromial, e a presença de dor é sugestiva de impacto do ombro (figura 6) (MAGEE, 2010). 24 Unidade I Figura 5 – Teste de impacto de Neer Figura 6 – Teste de Hawkins/Kennedy 25 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL Sabemos que os testes que sugerem lesão do manguito rotador identificam fraqueza muscular. O teste de Jobe é realizado com o braço abduzido a 30° no plano da escápula, com o polegar voltado para baixo em rotação interna do ombro e pronação do antebraço (figura seguinte). Nessa posição, o terapeuta aplica resistência contra a elevação do braço a fim de testar a integridade e força do supraespinhal. Fraqueza durante a rotação externa com o cotovelo ao lado do corpo sugere lesão no infraespinal e redondo menor (MAGEE, 2010). Figura 7 – Teste de Jobe A força do subescapular pode ser avaliada pelos testes de compressão abdominal e Gerber. No teste de compressão abdominal, o paciente é instruído a pressionar o abdômen com a palma da mão com o cotovelo à frente do corpo (figura seguinte). Para o teste de Gerber, é solicitado ao paciente que coloque a mão atrás das costas e em seguida levante-a de forma a deixar de apoiá-la nas costas (figura 9). A incapacidade de executar qualquer um desses testes é uma indicação de que o subescapular é insuficiente (MAGEE, 2010). 26 Unidade I Figura 8 – Teste de compressão abdominal Figura 9 – Teste de Gerber 27 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL É importante frisar que lesões parciais nem sempre afetam a função. Entretanto, se sintomáticas, podem alterar a mecânica do movimento do ombro e provocar fraqueza ou disfunção. Essas lesões podem evoluir para ruptura completa e, mesmo nesses casos, o paciente pode ou não relatar dor. Na prática clínica, percebemos que a lesão pode permanecer estática ou progredir. Com o tempo, o ventre muscular do tendão lesado diminui e perde sua elasticidade. Ocorre contratura nos tecidos moles adjacentes; o encurtamento crônico do tendão e a falta de elasticidade do ventre muscular levam à atrofia e à infiltraçãogordurosa do músculo. Nesse estágio, a função do manguito torna-se irrecuperável, e as fibras musculares não podem se regenerar. Ou seja, nem sempre as lesões no manguito rotador são sintomáticas, mas certamente causam fraqueza e déficit de função. 2.1.5 Reabilitação Depois de relembrarmos sobre anatomia, biomecânica, sinais e sintomas, vamos falar sobre a reabilitação. O tratamento conservador não é indicado para lesões extensas do manguito rotador nem para pacientes jovens que sofreram uma lesão traumática recente, principalmente se o tendão estiver retraído. Nosso paciente precisa ser instruído sobre o processo de cicatrização e sobre a importância de evitar certas posições ou atividades que pioram sua condição. Recursos analgésicos são fundamentais para que nossos pacientes consigam realizar os exercícios necessários para recuperar a ADM, a força e a função do ombro. Para isso, calor ou frio (ou ambos) podem ser utilizados, e a TENS pode trazer benefícios como recurso coadjuvante. Não existe evidência que apoie o uso de ultrassom terapêutico nas disfunções do manguito rotador, já que não houve superioridade desse recurso em relação ao placebo (SKIRVEN et al., 2011). Faz parte do nosso dia a dia, como fisioterapeutas, a prescrição de exercícios para reabilitação de indivíduos com dor no ombro ou lesão do manguito rotador, e isso inclui movimentos passivos, ativos, ativos assistidos e resistidos, assim como terapia manual. Não há consenso sobre um programa ideal de exercícios para tratar todos os pacientes com lesão do manguito rotador. A reabilitação de pacientes com lesão do manguito rotador sem ruptura ou com ruptura parcial é diferente da reabilitação de lesões extensas. 2.1.6 Reabilitação do manguito rotador (sem ruptura ou lesão parcial) Pacientes com lesão do manguito rotador sem ruptura ou com ruptura parcial podem apresentar limitação de ADM para flexão ou rotação interna (ou ambos), redução da força do manguito rotador e, ocasionalmente, diminuição da força dos músculos escapulares, bem como déficit de controle neuromuscular. Exercícios passivos, ativos assistidos ou ativos devem ser realizados em amplitudes livres de dor a fim de promover ganho ou manutenção da ADM e auxiliar a cicatrização dos tecidos moles. É importante incluir exercícios para ganho de ADM de flexão e rotação externa do ombro (figuras a seguir). A flexão deve ser realizada em decúbito dorsal, com o ombro ligeiramente anterior ao plano da escápula, o que permite um alongamento mais funcional e confortável. A rotação externa também deve ser realizada com o paciente em decúbito dorsal, o braço a 45° no plano da escápula e apoiado por um 28 Unidade I travesseiro. Essa posição minimiza tensão excessiva no manguito e no complexo capsuloligamentar e evita a posição do impacto em abdução de 90° (SKIRVEN et al., 2011). Figura 10 – Exercício passivo para ganho de ADM de flexão Figura 11 – Exercício ativo assistido para ganho de ADM de flexão 29 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL Figura 12 – Exercício passivo para ganho de ADM de rotação externa Exercícios para ganho de ADM de extensão, rotação interna e adução do ombro também devem ser incentivados por nós. O paciente deve manter cada uma dessas posições na amplitude máxima suportável por pelo menos 10 segundos, repetindo-se cada alongamento 10 vezes com frequência de duas a quatro vezes por dia. Quando a limitação de ADM é significativa, podem ser realizados alongamentos manuais e mobilizações articulares, que envolvem a translação de uma superfície articular em relação à outra. Mobilizações da articulação glenoumeral graus I e II auxiliam na redução da dor, já os graus III e IV alongam os tecidos moles e, portanto, proporcionam ganho de ADM. Quadro 1 – Classificações dos diferentes graus de mobilização articular Grau I Pequena amplitude de movimento no início da amplitude de movimento Grau II Grande amplitude de movimento no meio da amplitude de movimento (sem resistência) Grau III Grande amplitude de movimento no ponto de resistência Grau IV Pequena amplitude de movimento no ponto de resistência Exercícios de fortalecimento muscular usando faixas elásticas ou pesos livres também podem ser iniciados, principalmente para os músculos rotadores internos e externos, com o cotovelo ao lado do corpo e fletido a 90°. Exercícios de fortalecimento da musculatura escapular também devem ser realizados. É comum na prática clínica que nos deparemos com dificuldade em ganhar ADM de rotação interna, por isso pode ser acrescentado, quando necessário, o chamado alongamento do dorminhoco (figura a seguir). Esse alongamento pode ser realizado com o paciente em decúbito lateral, braço a 90° de abdução e cotovelo com 90° de flexão. A mão oposta leva o ombro para rotação interna, enquanto o tronco gira levemente em direção à extremidade afetada. O alongamento deve ser mantido por pelo menos 10 segundos e repetido 10 vezes (SKIRVEN et al., 2011). 30 Unidade I Figura 13 – Alongamento do dorminhoco É importante que aumentemos progressivamente a resistência para os exercícios de fortalecimento e acrescentemos exercícios resistidos para abdutores e flexores a 45°, bem como rotadores externos a 45° com o cotovelo apoiado (figura a seguir) e com maior abdução do ombro (figura 15). Exercícios de fortalecimento dos músculos rotadores internos (figura 16), serrátil anterior (figura 17), adutores da escápula (figura 18), bíceps e tríceps também podem ser acrescentados. Figura 14 – Fortalecimento dos músculos rotadores externos 31 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL Figura 15 – Fortalecimento dos músculos rotadores externos com maior abdução do ombro Figura 16 – Fortalecimento dos músculos rotadores internos 32 Unidade I Figura 17 – Fortalecimento do músculo serrátil anterior Figura 18 – Fortalecimento dos músculos adutores da escápula 33 FISIOTERAPIA ORTOPÉDICA FUNCIONAL Podemos avançar nos exercícios de fortalecimento da musculatura escapular enfatizando a protração e retração da escápula, assim como combinações de movimentos, incluindo abdução horizontal com retração escapular e rotação externa com resistência elástica. Com o braço a 45° de abdução e o cotovelo flexionado a 90°, podemos resistir a combinações de movimentos, incluindo abdução/rotação externa, adução/rotação interna, flexão do cotovelo/adução horizontal e extensão do cotovelo/abdução horizontal (SKIRVEN et al., 2011). Conforme o paciente vai evoluindo no ganho de força e controle neuromuscular, o treinamento precisa ser aprimorado com aumento da resistência, alteração da angulação ou combinação de movimentos. Pacientes com demandas mais altas devem ser submetidos a exercícios com combinações de movimentos funcionais em posições mais provocativas, como, por exemplo, abdução horizontal com rotação externa ou retração da escápula com rotação externa. Esses exercícios devem ser introduzidos nas fases finais da reabilitação, no paciente apropriado, e a resposta do paciente ao exercício deve ser monitorada. Vale ressaltar que praticantes de esporte devem continuar com os exercícios para os músculos do manguito rotador, escapulares e deltoide em posições específicas do esporte. O treinamento pliométrico usando bolas pesadas pode melhorar o controle neuromuscular, a força e a propriocepção, reproduzindo o ciclo alongamento-encurtamento em várias posições do ombro. 2.1.7 Reabilitação do manguito rotador (lesão extensa) As grandes e maciças rupturas do manguito rotador são aquelas com mais de 5 cm de diâmetro ou que envolvem avulsão de pelo menos dois tendões inteiros do manguito rotador. Alguns pesquisadores relataram resultados ruins após o tratamento conservador de lesões extensas do manguito rotador, enquanto outros estudos demonstraram resultados satisfatórios (SKIRVEN et al., 2011). O programa de reabilitação para pacientes com lesões extensas do manguito rotador começa com exercícios para ganho de ADM. Uma polia por cima da porta
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