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O48ll Oliveira, Joaquina Maria Batista de. Leitura, interpretação e produção textual / Joaquina Maria Batista de. -- Manaus: CEUNI-FAMETRO, 2021. 224p. ISBN: 978-85-64293-02-1 1. Língua portuguesa 2. Leitura 3. Interpretação 4. Produção textual I. Título. CDU.:801.7 Todos os direitos reservados © FAMETRO IME Instituto Metropolitano de Ensino Ltda Wellington Lins de Albuquerque | Presidente - IME Maria do Carmo Seffair Lins de Albuquerque | Reitora Cinara da Silva Cardoso | Vice-Reitora Iyad Amado Hajoj | Diretor de EaD e Expansão Leonardo Florêncio da Silva | Diretor Editorial e Gestor de EaD Adilsimar Saraiva Maciel | Coordenação Pedagógica EaD Luciana Braga | Projeto Gráfico, Capa e Editoração Ana Augusta de Oliveira Simas | Supervisora de Revisão e Revisora Anne Caroline do Nascimento Ribeiro | Revisora Karoline Alves Leite | Revisora Liene Costa | Revisora Amenayde Cristine Corrêa | Assistente Editorial Imagens | depositphotos.com Responsável Técnico: Lorena de Fátima Vidal (CRB: 410/11-AM) Biblioteca CEUNI-FAMETRO FAMETRO Av. Djalma Batista, Nossa Sra. das Gracas. Manaus, AM "Nos termos da Lei n.º 9.610/98, o autor desta obra é titular de todo o complexo de direitos autorais sobre a presente criação. Assim, é vedada a cópia, reprodução, edição ou distribuição desta obra sem autorização expressa do Autor ou da Edito- ra e, ainda é vedado utilizar, citar, publicar esta obra integral ou parcialmente sem deixar de indicar ou anunciar o nome, pseudônimo ou sinal convencional do autor sob pena da aplicação das medidas previstas nos Art. 101 a 110 da Lei n.º 9.610/98." Ficha catalogada na Biblioteca CEUNI-Fametro “Sejam todos e todas bem-vindos ao EaD do Centro Universitário Fametro” O Centro Universitário Fametro acredita que o papel de uma instituição de ensino é formar não apenas profissionais, mas também formar profissionais no Ensino Superior, com valores éticos, humanísticos e com respeito ao meio ambiente capazes de contribuir para o desenvolvimento da nossa Amazônia. A Fametro, portanto, tem premissas claras a cumprir como instituição de ensino de qualidade. Praticar o ensino, pesquisa e extensão é a sua principal bandeira. A Fametro, ao longo das últimas duas décadas, vem se consolidando como a melhor instituição de ensino do Norte, um espaço democrático e docentes com variadas visões de mundo. Somos uma instituição de ensino plural que avança a cada ano em busca sempre de desenvolver a economia da Amazônia. Nossa estrutura é moderna, estamos em diversos municípios levando uma educação inclusiva e de qualidade. Conheça o Centro Universitário Fametro e viva a experiência em estudar numa instituição com o corpo docente com mestres e doutores e de qualidade de ensino comprovada pelo MEC. Maria do Carmo Seffair Reitora Pa la vr a da R ei to ra “É a educação que faz o futuro parecer um lugar de esperança e transformação”. UNIDADE I Linguagem e seus domínios 1.1 Linguagem verbal 1.2 Linguagem não verbal 1.3 Linguagem mista 1.4 Conceitos e importância da leitura 1.5 Tipos e técnicas de leitura 1.6 Análise e estrutura de um livro/texto 1.7 Interpretação do conteúdo de um livro 1.8 Crítica de um livro como transmissão de conhecimentos 1.9 Anotação Su m ár io 13 15 16 16 16 25 31 32 33 38 UNIDADE II Interpretação: da palavra à comunicação 2.1 Tipologia textual 2.2 Narração 2.3 Descrição 2.4 Injunção 2. 5 Dialogal 2.6 Dissertação 2.7 Organização do texto 2.8 Análise UNIDADE III Semiótica e texto não-verbal: principais conceitos 3.1 Linguagem verbal 3.2 Linguagem não verbal 3.3 Linguagem mista 3.4 Interpretação de texto não verbal 45 64 65 72 75 78 83 92 97 103 104 104 104 111 UNIDADE IV Coesão e coerência textual 4.1 Coerência 4.2 Tipos de parágrafos dissertativos 4.3 Texto dissertativo: reconhecer e produzir 4.4 Texto dissertativo: artigo de opinião Referências Caderno de Exercícios 131 144 147 164 172 184 189 U ni da de 1 Videoaula 1 Videoaula 2 13 LINGUAGEM E SEUS DOMÍNIOS1 É através da linguagem que o ser humano se constitui social e individualmente. A linguagem se divide em verbal e não verbal e pode ser também mista. Segundo Bechara (2004), a linguagem é qualquer sistema de signos simbólicos empregados na intercomunicação social para expressar e comunicar ideias e sentimentos, isto é, conteúdo da consciência. Sendo assim, a língua é o grande potencial da linguagem verbal, sendo vital para o desenvolvimento da 1 Fonte: BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. 37. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004. 14 Anotações: humanidade. Segundo Faraco e Mandryk (2012), “a realidade humana é, de fato, inseparável da língua”. Neste sentido, é através dela que constituí- mos a interação verbal – maior modo de comuni- cação humana e, também, como nos constituímos como pessoas. Assim, a língua é parte fundamental e determinante na vida do homem e na manutenção da vida em sociedade. Os falantes, portanto, desde o seu nascimento, já estão inseridos em uma língua, no caso dos brasileiros, da língua portuguesa. Esta língua é assimilada de modo muito rápido pelo fa- lante, que já mantém uma característica inata para aprendê-la, segundo o linguista americano Noam Chomsky. Além disso, a língua é moldada de acordo a situação de convívio social, o que possibilita afir- mar que todos os nativos de uma língua conhecem plenamente a sua língua. É importante lembrar que o compêndio gra- matical é diferente da língua. Pode ser entendido como um livro com as regras e normas descritas e um conjunto de regras pré-estabelecidas da língua. A língua envolve toda a prática linguística utilizada por indivíduos em uma comunidade e pode não es- tar dentro das regras gramaticais, mas dentro da organização linguística da comunidade de falantes. Assim, ela é um conjunto de práticas sociais mais amplo que a gramática. Um falante nativo não “erra” a sua língua, uma vez que as questões históricas e geográficas influenciam na língua falada pela co- munidade. Deste modo, considerar que uma comu- nidade fala melhor que a outra, que os falantes de um Estado falam melhor que os de outros Estados, é uma forma de inferiorizar grupos sociais. O que devemos considerar é a situação e a intenção. No campo da linguagem verbal, temos os três grandes 15 eixos desta disciplina: leitura, interpretação e es- crita, sem deixar de lado a linguagem não-verbal, presente na interpretação do mundo e da escrita. 1.1 LINGUAGEM VERBAL Existem várias formas de comunicação. Quan- do o homem se utiliza da palavra, ou seja, da lingua- gem oral ou escrita, dizemos que ele está usando uma linguagem verbal, pois o código é a palavra. Tal código está presente quando falamos com alguém, lemos ou escrevemos. De acordo com Fiorin (2002), a linguagem ver- bal é, então, a matéria do pensamento e o veículo da comunicação social. Assim como não há socie- dade sem linguagem, não há sociedade sem comu- nicação. Como realidade material – organização de sons, palavras frases - a linguagem é relativamente autônoma: como expressão de emoções, ideias, propósitos, no entanto, ela é orientada pela visão de mundo, pelas injunções da realidade social, his- tórica e cultural de seu falante. A linguagem verbal é a forma de comunicação mais presente em nosso cotidiano. Mediante a pa- lavra falada ou escrita, expomos aos outros as nos- sas ideias e pensamentos, estabelecemos comuni- cação e existimos em um mundo feito de palavras. Ela está presente em textos, em propagandas, em reportagens (jornais, revistas, etc.), em obras lite- rárias e científicas, na comunicação entre as pes- soas, em discursos (políticos, representantes de classe, candidatos a cargos públicos, etc.); e em várias outras situações. A linguagem verbal é produzida com a utilização da língua e pode-seapresentar na modalidade oral (falada) ou escrita. 16 1.2 LINGUAGEM NÃO VERBAL Linguagem não verbal é o uso de imagens, figu- ras, desenhos, símbolos, dança, pintura, música, mí- mica, escultura e gestos como meio de comunicação. Neste contexto, temos a simbologia que é uma forma de comunicação não verbal. Exemplos: sinalização de trânsito, semáforo, logotipos, ban- deiras, uso de cores para chamar a atenção ou ex- primir uma mensagem. É muito interessante obser- var que, para manter uma comunicação, utilizamos tanto a linguagem verbal quanto a não verbal. 1.3 LINGUAGEM MISTA Linguagem mista ou híbrida é o uso simultâ- neo da linguagem verbal e da linguagem não verbal. Muito comum nas histórias em quadrinhos e nas propagandas. É uma linguagem com muito poten- cial, pois a união de ambas, amplia o poder comu- nicacional. 2. CONCEITOS E IMPORTÂNCIA DA LEITURA Em conformidade com Paulo Freire2, a leitu- ra de mundo antecede a da palavra, logo, a leitura posterior não se pode desconsiderá-la, visto serem interdependentes. Linguagem e realidade se entre- A linguagem mista ou híbrida é feita com a utilização da linguagem verbal e não verbal ao mesmo tempo. A linguagem não verbal é feita sem a utilização da língua e engloba: sons, cores, gestos, símbolos. 2 FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: Autores Associados: Cortez, 1989. 17 laçam dinamicamente, de modo que a compreen- são do texto a ser alcançada por sua leitura crítica, implica a percepção das relações entre o texto e o contexto. Para o educador, o mundo do leitor é fun- damental para a compreensão da leitura. Por exemplo, se alguém gosta de carros e tra- balha em uma concessionária de veículos, saberá o nome das marcas, dos modelos e, provavelmente, acompanha toda a tecnologia de produção dos au- tomóveis. Este alguém, certamente, terá domínio do vocabulário relacionado ao tema, carros. Por isso, se for necessário ler algum material sobre este tema, será mais fácil compreender o texto. Por outro lado, se esse alguém não sabe nada sobre enfermagem, algumas ou muitas expressões serão incompreensí- veis. E, se o assunto não faz parte do seu mundo, terá muito mais dificuldade de compreensão. Portanto, ainda segundo Paulo Freire (1989), a compreensão do texto a ser alcançada por sua lei- tura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto. O contexto, então, é fundamental para a compreensão, não só de leitura, mas também de interpretação e produção dos mais diversos tipos de texto. O contexto se dá de dentro para fora do tex- to. É como se determinadas palavras, expressões levassem do sentido do texto para o mundo real. Esse mundo real é o contexto. É possível partir de contextos para o texto, quando se observa o mundo, os acontecimentos e, depois, vai-se aos textos para compreender o fato através das palavras. Sendo as- sim, o contexto é um dos fatores determinantes para o entendimento da leitura. Contexto é tudo aquilo que, embora não esteja no texto, é importante para sua compreensão. É o ambiente, é o sujeito da ação e sua função social, são os fatores sociais, culturais e psicológicos. É a situação concreta a que o texto se refere. Há diferentes tipos de contextos (social, político, cultural, estético, esportivo, educacional, histórico...). 18 Anotações: Exemplo 1 Fonte: <http://g1.globo.com/jornal-nacional/noti- cia/2018/04/>. Exemplo 2 Fonte: <https://www.otempo.com.br/capa/brasil/>. A palavra guerra aparece nas duas manche- tes, porém ela tem significado diferente, na primei- ra, sabe-se que há conflito armado na Síria e ocorre verdadeiramente uma guerra; já no exemplo dois, trata-se da grande violência proporcionada pelo tráfico, mas não pode ser compreendida na mes- ma acepção do exemplo 1. Como sabemos disso? Simplesmente pelo contexto, somos brasileiros e sabemos que não estamos em guerra armada, por isso, somos levados a compreender sob outra óti- ca. Outro exemplo é quando lemos uma placa como a da figura, sabemos que o lugar de compra é a casa onde está a placa. Como sabemos isso? Fonte:< http://www.fatoreal.blog.br/seguranca/falta-de-se- guranca-e-uma-solucao-criativa/>. 19 Anotações:É simples, a partir do nosso conhecimento de mundo, ou seja, o contexto nos indica um conheci- mento para além do que está escrito. Então, isto vai ao encontro do pensamento de Paulo Freire, ao afir- mar que não lemos apenas palavras, lemos, antes, o mundo. Caso não sejamos bons leitores do mundo, teremos dificuldade na leitura das palavras. Ob- servem que, para compreendermos um conceito, tivemos que refletir sobre ele, ampliá-lo, entender o que significa a palavra mundo, o que é contexto, para então, compreender plenamente o que o autor entende por leitura do mundo. Assim deve ser feito em todo ato de leitura, pois ler é um processo, é uma ação que envolve re- flexão, busca, paciência e, principalmente, prática. Quanto mais lemos, mais adquirimos habilidade. Devemos também considerar a inter-relação entre leitor e texto, pois ele não é um ser passivo, sem conhecimento anterior. Quando se põe a desvendar um texto, os conhecimentos anteriores são aciona- dos e pode haver um diálogo com o texto. Soares (2000) amplia a concepção de leitura ao apresentar a relação entre leitor e autor mediado pelo mundo: Leitura não é esse ato solitário; é in- teração verbal entre indivíduos, e in- divíduos socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e com os outros; o autor, seu universo, seu lugar na estrutura so- cial, suas relações com o mundo e os outros (SOARES, 2000, p. 18). Portanto, o processo de interação entre livro e leitor é discutido por Leffa (1999) ao considerar a 20 leitura como um processo interativo entre os es- quemas do leitor e do autor, vivendo um momento sócio histórico. Dessa forma, a concepção de leitu- ra interativa compreende leitura não como uma ati- vidade de decodificação de itens linguísticos, como um processo dinâmico de construção de sentidos. Nessa concepção de interação, o leitor não é mero receptor de mensagens, ele se porta como coautor. Ampliando o conceito de leitura, Kleiman (2002) entende como um processo cognitivo que envolve uma relação entre “o sujeito leitor e o texto enquanto objeto, entre linguagem escrita e com- preensão, memória, inferência e pensamento”. Para a autora, a leitura só pode acontecer quando aspectos cognitivos são acionados, dentre eles: compreensão, memória, inferência e pensamento. Destes quatro aspectos, dois merecem destaque: memória e inferência. Em primeiro plano, a memória é fator primor- dial na leitura porque será acionada para relembrar conhecimentos que se unirão ao novo conhecimen- to da leitura. Todas as vezes que se faz uma leitura, vem à mente outras leituras já feitas. Certamente que, a memória só pode ser acionada se houver co- nhecimentos prévios. Quanto mais leitura se tem, maior é o repertório para ser relembrado. O segun- do termo utilizado, inferência3 , também é impor- tante para a realização de uma leitura completa: A Inferência textual está relacionada à com- preensão da leitura. Significa interpretar os ele- mentos que estão explícitos e implícitos no texto, de modo que o leitor consiga ampliar a análise de Inferência é uma dedução feita com base em informações ou um raciocínio que usa dados disponíveis para se chegar a uma conclusão. Inferir é deduzir um resultado, por lógica, com base na interpretação de outras informações. Inferir também pode significar chegar a uma conclusão a partir de outras percepções ou da análise de um ou mais argumentos. 3 < https://www.significados.com.br/>. 21 tudo que foi escrito e compreender a ideia central do texto. A inferência textual pode requerer al- gum conhecimento prévio sobre o tema da leitura. Quando se realiza o atode ler, nem sempre as in- formações estão claras e visíveis, nem é possível compreender um texto apenas fazendo uma leitura literal. Para ampliar a compreensão, alguns concei- tos devem ser considerados, como os de IMPLÍCI- TOS E EXPLÍCITOS4. Informações explícitas são aquelas gritante- mente expostas no texto. Não há necessidade de se aguçar a mente, de fazer um grande esforço para compreender as informações. Neste caso, a inter- pretação deve se voltar apenas ao que foi redigido no texto. Já os implícitos são os elementos que o leitor deverá deduzir a partir de informações explícitas. O implícito requer a capacidade do leitor de deduzir o que o autor quis dizer no texto, mas não disse. Ou seja, é necessário que o leitor enxergue o que não está escrito, o que está nas entrelinhas. Vamos ler o implícito dos textos5 abaixo: Implícito: se a tartaruga não for monitorada, dificilmente se saberá a idade dela. Implícitos – 1) o inchaço é passageiro, não é duradouro; 2) se for um número grande, pode trazer consequências mais graves. No campo dos implíci- tos estão os PRESSUPOSTOS E SUBENTENDIDOS que também são responsáveis por fazer uma boa Quantos anos vive uma tartaruga? A tartaruga vive entre 80 e 100 anos. [...] As tartarugas estão entre os animais de vida mais longa e é o único animal hoje que vive mais que o homem. [...] Um dos critérios usados para saber a idade da tartaruga é contar os anéis que formam seu casco. Mas, com o passar do tempo, esse critério deixa de ser útil porque o número de anéis aumenta muito e não é mais possível distingui-los. Muitas vezes, o tamanho da tartaruga pode ser um indicativo da sua idade. SUPERINTERESSANTE, fev.1995. 4 Marcelo Rosenthal; Lilian Furtado; Tiago Omena; Pedro Henrique. Interpretação de Textos e Semântica para concursos: teoria, es- quemas, exercícios e questões de concursos comentadas. Cam- pus concurso. Acessado em <www.elsevier.com.br> 5 <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/storage/materi- ais/0000014237.pdf>. 22 Anotações: leitura. Vamos agora verificar qual a distinção entre eles: PRESSUPOSTOS: o autor do texto emprega palavras ou expressões com a intenção de que o lei- tor realize a inferência. Ele não passa uma informa- ção completa, mas o uso de determinada palavra ou expressão dá a ideia pretendida. Os pressupostos podem ser marcados por: Verbos – os alunos deixaram o curso de língua inglesa, porque essa matéria não foi incluída no edi- tal do concurso. • Com o emprego de DEIXARAM, o autor dá a entender que os alunos vinham cursando o Inglês, até a publicação do edital; não está escrito no texto que estavam cursando, mas, pressupõe-se por conta do verbo. Advérbios – “João também não fez o que foi solicitado. ” • Com o emprego do advérbio TAMBÉM, o autor da frase afirma que além de João, outras pessoas não fizeram o solicitado. Adjetivos – Os candidatos estudiosos têm grandes possibilidades de aprovação. • Com o emprego do adjetivo ESTUDIOSOS, o autor pretende dizer que há candidatos estudiosos e candidatos não estudiosos. E mais: que o candidato não estudioso tem menos possibilidades de aprovação. Orações adjetivas – Os funcionários que fize- ram greve foram demitidos. • Com a oração adjetiva QUE FIZERAM GRE- VE com caráter restritivo, o autor leva o leitor a pressupor que aqueles que não fi- zeram greve continuaram empregados. Palavras denotativas – Mesmo João fez to- dos os exercícios. 23 Com o emprego da palavra denotativa de in- clusão MESMO, pressupõe-se que todos fizeram os exercícios, inclusive João. Também se depreende que João era a pessoa com a menor expectativa de que fizesse os exercícios. SUBENTENDIDOS: a partir de uma informa- ção, pelo menos aparentemente independente – já que o autor não usa palavra ou expressão eviden- ciando a intenção, o leitor realiza uma leitura das entrelinhas, de elementos que não estão expostos, explícitos, mas que são lógicos em relação ao con- texto. Às vezes, para se observar o subentendido, é necessário conhecer o contexto (momento políti- co, social e até mesmo pessoal do autor). Vejamos nos exemplos6 abaixo como se dá o subentendido: O adolescente é um bicho ético, que detesta a hipocrisia: está procurando, em cada experiência nova, um fundamento da arte de viver. Para isso, a verdade é essencial. Cada experiência é decisiva porque ele sabe que em cada escolha está se cons- truindo como pessoa. Tudo tem que ser falado, dis- secado em miúdos. Coloquei uma carta Numa velha garrafa Mais uma carta De solidão Coloquei uma carta Um pedido da alma Salvem meu coração LS JACK. Uma carta. In: ÁLBUM:V.I.B.E.[s.l.] Subentendido – quando sai da adolescência pode se tornar hipócrita. Os adultos são mais hipócritas que os adolescentes. Subentendido – na letra da canção o autor relata que colocou uma carta em uma garrafa e embora não esteja escrito neste trecho que a garrafa será jogada na água, nosso conhecimento de mundo, nossa interpretação do contexto nos leva a esta compreensão, a este subentendido.6 < http://portaldoprofessor.mec.gov.br/storage/ materiais/0000014237.pdf>. 24 Inferência: dedução feita com base nas informações Explícitos: interpretação do que foi realmente escrito no texto Implícitos: enxergar nas entrelinhas do texto Pressuposto: palavras do texto que remetem ao entendimento Subentendido: não há palavras que remetam ao entendimento. Apenas o contexto. Na Lanchonete, Zezinho pede uma média com leite e pão com manteiga. Depois de pagar, ele bebe o café, sente que não tem açúcar e pergunta: Zezinho: Tem açúcar? Garçonete: Tem sim. Zezinho: Tenho que pagar de novo? Garçonete: Não Zezinho: Então me dá 2kg... Esquematizando as informações destacadas acima a respeito da inferência, temos: Leitura: perspectivas disciplinares. São Paulo: Ed. Ática, 2000. p. 18-29. Diante das abordagens, já foi possível perceber que a leitura é fundamental para o desenvolvimento do ser humano. Subentendido - a garçonete subentende que o açúcar era para adoçar o café e não um pacote. Não foi dito pelo Zezinho a quantidade de açúcar, mas no contexto da lanchonete, entende-se que é uma quantidade suficiente apenas para adoçar o café. 25 Anotações: Neste sentido, na universidade, será impres- cindível para dar conta das exigências, pois nenhu- ma formação acadêmica se faz sem leitura e escrita. Observe no esquema abaixo os principais conceitos relacionados à leitura estudados. 1.5 TIPOS E TÉCNICAS DE LEITURA Vamos agora estudar a respeito dos tipos de leituras que podemos fazer e das técnicas que po- dem tornar as leituras mais eficazes. Não se trata de receita para ler melhor, mas de processos de es- tudo bem definidos e detalhados que, se seguidos, podem proporcionar melhor desempenho na habili- dade da leitura. LEITURA Mundo Memória Pressuposto Subentendido Interação Inferência 26 Para Adler7 (1974), o processo de compreen- der um livro pode ser assim dividido: • Deve se aproximar dele, primeiro, consi- derando-o um todo, com uma unidade e uma estrutura de partes; • e, segundo, considerando seus elemen- tos, suas unidades de linguagem e pensa- mento. Para auxiliar neste campo, a obra “A Arte de Ler”, de Mortimer J. Adler (1974) será de grande subsídio. Assim como a obra de Molina, “Ler Para Aprender”. 7 ADLER, Mortimer J. A arte de ler: Como adquirir uma educação lib- eral. Tradução de: Inês Fortes de Oliveira. Rio de Janeiro: AGIR ed- itora, 1974. Copyright de ARTES GRÁFICAS INDÚSTRIAS REUNIDAS S. A. (AGIR). 27 Anotações:Significa que o livro ou texto trata de um as- sunto em geral, o todo; mas esse todo é dividido em partes, capítulos e subtópicos. Além disso, deve-se considerar a linguagem do texto, a organização e o pensamento veiculado por ele. Na leitura que se faz, devem-se considerar estas questões: Qual o todo deste texto – o assunto geral? Como está dividido? Como se organiza?A linguagem é simples ou precisa de mais atenção? Qual o pensamento veiculado pelo autor? Qual ideia realmente o autor quer passar? Adler (1974) lista três leituras distintas para que se obtenha um bom resultado. • A primeira leitura pode ser chamada es- trutural ou analítica. O leitor procede do todo para as partes. • A segunda leitura pode ser chamada inter- pretativa ou sintética. O leitor procede das partes para o todo. • A terceira leitura pode ser chamada crítica ou avaliadora. O leitor julga o autor e vê se concorda ou não com ele. Para realizar a primeira leitura, ESTRUTURAL OU ANALÍTICA, é preciso saber: 1. que tipo de livro se lê, isto e, qual o assunto dele; 2. o que o livro, como um todo, procura dizer; 3. em quantas partes esse todo se divide e 4. dos problemas principais, quais são os que o autor está procurando resolver. Para a segunda leitura, INTERPRETATIVA OU SINTÉTICA, os passos são: 28 Anotações: 1. descobrir e interpretar as palavras impor- tantes do livro; 2. fazer o mesmo para as sentenças impor- tantes e 3. para os parágrafos que exprimem argu- mentos. 4. saber quais de seus problemas o autor re- solveu, e quais deixou sem solução. Quanto à leitura CRÍTICA OU AVALIADORA, vá- rias observações podem ser feitas – quatro ao todo. Antes de criticar ou julgar um autor, tem-se sempre que compreendê-lo. Conheci muitos “leitores” que fazem, primeiro, a terceira leitura. Pior do que isso, nunca chegam a fazer as duas primeiras. Pegam o livro e logo começam a mostrar os defeitos dele. Estilo cheios de opiniões, e o livro é apenas um pretexto para exprimi-las. Não deviam ser chamados “leitores”. São como muitas pessoas que vocês conhecem, que acham que conversar é falar e, nunca, ouvir. Essas pessoas não merecem o esforço que se faz falando com elas, e, muitas vezes, nem mere- cem ser ouvidas. (ADLER 1974, p. 106) Esta leitura apresenta nível mais de comple- xidade maior porque, como leitor, precisa-se ana- lisar a obra lida e discutir o assunto a partir de ou- tros conhecimentos já existentes, bem como fazer algumas críticas. A respeito do conceito de crítica, deve-se compreender numa visão mais ampla, pois muitos acreditam que criticar é falar mal, é discor- dar, é procurar defeito. No campo da ciência, criti- 29 Anotações:car é estabelecer juízos a partir de outros conheci- mentos. Pode-se questionar: • A respeito deste assunto, em que o autor amplia a discussão? • Quais elementos novos o autor estabelece para esta teoria, para este tema? • Quais aspectos o autor não trata? • Em que se parece com as ideias de outros autores? • Em que difere de outros autores? • Comparando com a realidade, como o se aproxima ou se distancia dela? Há que se ter, pois, muito cuidado para não fazer críticas com base no senso comum, manifes- tando meramente sua opinião, sem nenhuma base teórica. Não se emite opinião pura e simples quan- do se trata de teoria, de conceito, de informação científica. Por isso, dizer que concorda ou discorda só porque “acha”, não é o suficiente para fazer uma crítica da leitura. Para melhor compreensão do processo de lei- tura estabelecido por Adler (1974, p. 209-210), far- -se-á uma análise de texto como exemplo. Vamos tomar como base uma notícia veicula- da pela revista Isto É,8 que trata sobre o estudo de pessoas com necessidades especiais. Cresce o número de estudantes com necessidades especiais Nos últimos cinco anos, de 2014 a 2018, o número de matrículas de estudantes com neces- sidades especiais cresceu 33,2% em todo o país, 8 <https://istoe.com.br/>. em 31/01/19 - 11h02 30 Anotações: segundo dados do Censo Escolar divulgados hoje (31) pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesqui- sas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). No mesmo período, também aumentou de 87,1% para 92,1% o percentual daqueles que estão incluídos em clas- ses comuns. Em 2014, eram 886.815 os alunos com defi - ciência, altas habilidades e transtornos globais do desenvolvimento matriculados nas escolas bra- sileiras. Esse número tem aumentado ano a ano. Em 2018, chegou a cerca de 1,2 milhão. Entre 2017 e 2018, houve aumento de aproximadamente 10,8% nas matrículas. De acordo com dados do CEN- SO, na rede pública está o maior ín- dice dos estudantes em classes comuns. Nas escolas, 97,3% dos alunos com necessi- dades educacionais es- peciais estavam nessas classes em 2018. Na rede particular, o per- centual foi 51,8%. Por lei, pelo Plano Nacional de Educação (PNE), o Brasil deve incluir todos os es- tudantes de 4 a 17 anos na escola. Os estudantes com necessidades especiais devem ser matriculados preferencialmente em classes co- muns. Para isso, o Brasil deve garantir todo o sistema educacional inclusivo, salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especia- lizados, públicos ou conveniados. nas matrículas. De acordo com dados do CEN- SO, na rede pública está o maior ín- dice dos estudantes em classes comuns. Nas escolas, 97,3% dos alunos com necessi- dades educacionais es- peciais estavam nessas Nacional de Educação (PNE), o Brasil deve incluir todos os es- tudantes de 4 a 17 anos na escola. Os estudantes com necessidades especiais devem ser matriculados preferencialmente em classes co- muns. Para isso, o Brasil deve garantir todo o sistema educacional inclusivo, salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especia- lizados, públicos ou conveniados. 31 Anotações:Segundo os dados do Censo, 38,6% das es- colas públicas de ensino fundamental e 55,6% das privadas têm banheiros para pessoas com necessidades especiais. Além disso, também no ensino fundamental, 28% das escolas públicas e 44,7% das particulares têm dependências adequadas para pessoas com necessidades especiais. No ensino médio, 60% das escolas públicas e 68,7% das escolas particulares dispõem de banhei- ro especial e 44,3% das públicas e 52,7% das priva- das têm dependências adequadas. 1.6 ANÁLISE E ESTRUTURA DE UM LIVRO/TEXTO Veja abaixo um exemplo de análise da estrutura: Tipo e assunto: o texto é uma notícia de jor- nal. Seu assunto é a inclusão de pessoas com ne- cessidades especiais na escola. Constituição: dividido em 6 parágrafos com informações e muitos dados estatísticos. Enumeração das partes: • Apresenta o aumento de pessoas com ne- cessidades nas escolas; • Retrospectiva – de 2014 a 2018; Classificá-lo de acordo com seu tipo e seu assunto. Expor, com a máxima brevidade, sua constituição. Enumerar as partes principais em sua ordem e relação, e analisá-las como se analisou o todo. Definir o problema ou problema; que o autor está procurando resolver. 32 • Censo; • Lei - Plano Nacional de Educação (PNE); • Censo; • Diferença escola pública e escola particu- lar. Problema: a inserção de pessoas com ne- cessidades especiais nas escolas brasileiras. 1.7 INTERPRETAÇÃO DO CONTEÚDO DE UM LIVRO Proposições principais: • De 2014 a 2018, o número de matrículas de estudantes com necessidades especiais cresceu 33,2% em todo o país. • Entre 2017 e 2018, houve aumento de apro- ximadamente 10,8% nas matrículas. • Plano Nacional de Educação (PNE): o Bra- sil deve incluir todos os estudantes de 4 a 17 anos na escola, preferencialmente em classes comuns. • Todo o sistema educacional inclusivo: sa- las de recursos multifuncionais, classes, Vejamos agora como proceder para fazer a interpretação do conteúdo do livro ou do texto estudado: Compreender as proposições principais do autor, estudando suas sentenças mais importantes. Conhecer os argumentos do autor, descobrindo- -os na série de sentenças ou construindo-os fora delas. Indicar quais problemas o autor resolveu e que problemas não resolveu; e, quanto aos últimos, ver se o autor reconheceu seu fracasso. 33 Anotações:escolas ou serviços especializados, públi- cos ou conveniados. • Segundo os dados do Censo, metade das escolas públicas e particulares têm estru-tura para receber alunos com necessida- des especiais. Argumentos do autor: • O argumento principal do autor está nos dados estatísticos do Censo e de outras pesquisas. Problemas que o autor resolveu e não resolveu • O autor claramente aponta o crescimento das matrículas dos alunos com necessida- des especiais. Destaca de forma satisfa- tória o crescente número de alunos nesta condição nas escolas brasileiras. De forma superficial trata a respeito das condições das escolas para receber estes alunos, mas não enfatiza o descaso com muitos prédios escolares que sequer têm rampa para cadeirantes. Além disso, o autor não trata da formação dos professores para atender à necessidade deste público. 1.8 CRÍTICA DE UM LIVRO COMO TRANSMISSÃO DE CONHECIMENTOS Antes de iniciar esta etapa de leitura, atente para as Máximas Gerais propostas pelo autor: 1. Não começar a crítica antes de completar a análise e a interpretação. (Não digam que concordam, discordam ou deixam 34 Anotações: de julgar, antes de poderem dizer “Com- preendo”.) 2. Não discordar, como se se estivesse bri- gando ou disputando. 3. Respeitar a diferença entre o conhecimen- to e a opinião, apresentando os motivos de qualquer julgamento crítico que se fizer. Critérios Específicos de Observação Crítica Autor não está informado: • Qual a estrutura necessária para receber alunos com necessidades especiais; • Formação adequada de professores para esta necessidade dos alunos; • Recursos pedagógicos. Autor mal-informado: • Acredita que apenas banheiros adequa- dos é o suficiente para inserir um aluno com necessidade especial na escola. Autor ilógico: • Nos dados estatísticos percebe que ape- nas metade das escolas atendem às ne- cessidades dos alunos com necessidades especiais em relação ao banheiro, mas Mostrar em que o autor não está informado. Mostrar em que o autor está mal informado. Mostrar em que o autor é ilógico. Mostrar em que a análise ou concepção do autor é incompleta. 35 não faz nenhuma referência para mostrar a ineficiência das escolas neste campo. Análise incompleta: • Não demonstra a realidade das esco- las brasileiras, pois em grande parte não têm condições estruturais para receber surdos, cegos, autistas e demais neces- sidades especiais. Mostrando apenas os dados de matrícula aparenta dizer que es- tas crianças estão verdadeiramente tendo acesso à educação, mas resta saber se completam o ano escolar e o que apren- dem durante o ano. FAULSTICH9 (2002) também estabelece tipos de leitura pra os textos técnicos. Ele divide em 2 ti- pos de leitura, a INFORMATIVA e a INTERPRETATI- VA, como demonstrado: 9 FAULSTICH, Enilde L. de J. Como ler, entender e redigir um texto. Petrópolis: Editora Vozes, 2002. LEITURA TÉCNICA LEITURA INFORMATIVA LEITURA SELETIVA Identificar em cada parágrafo a palavra-chave da ideia central e as palavras-chave das ideias secundárias. Selecionar na sequência esse conjunto de palavras que formará o resumo do texto. LEITURA CRÍTICA Leitura abrangente do assunto. Reconhecer a hierarquia das ideias. Verificar como o texto está organizado, dividido. 36 É importante destacar que Faulstich (2002) segue as capacidades cognitivas estabelecidas por Benjamin Bloom10 et, al adaptadas para o processo de leitura interpretativa. Como pode ser observa- do, a leitura não é uma tarefa simples como muitos acreditam ser. Ela requer tempo e cuidado para que não seja superficial e sem significado. Compreender a leitura como um processo, contribui para a aquisição da habilidade na interpre- tação. Se se pensar em leitura como pegar o texto, 10 BLOOM. S. B. et. alii. Taxionomia dos objetos educacionais. Porto Alegre, Globo, 1973. LEITURA TÉCNICA LEITURA INTERPRETATIVA COMPREENSÃO Entender a mensagem literal defendida pelo autor, entender o ponto de vista, a tese. ANÁLISE Desdobrar o texto em partes percebendo a relação das partes com o todo. SÍNTESE Retirar de cada parágrafo as ideias centrais e ordenar as ideias principais. APLICAÇÃO Associar assuntos paralelos. Utilizar o assunto aprendido no texto em outros textos. projeção de novas ideias a partir do conhecimento adquirido. 37 Anotações:ler de qualquer jeito e finalizar, possivelmente se- rão perdidas muitas informações. Por isso, tem-se a ideia de processo: primeira leitura para conhecer o texto e fazer um rápido mapeamento; segunda leitura para apreender a essência do texto, a ideia defendida pelo autor e, só então, poder fazer críti- cas ao texto e relacionar o texto com outros textos. Destaca-se que um livro, um texto e um artigo podem ser relacionados a outros tipos de informa- ção como documentários, filmes, séries, novelas, desenhos animados, músicas e quadros. Lembre- -se de que todo o conhecimento de mundo deve ser acionado quando se faz uma leitura porque, só assim, é possível estabelecer relações, comparar e criticar. Neste capítulo, foram apresentados dois modelos de técnicas e de processo de leitura: a primeira, de Mortimer (1974), com 3 etapas bem detalhadas e que podem servir para leituras mais exigentes; a segunda, de Faulstich (2002) apresen- ta 2 etapas que servirão para leituras mais rápidas. Ao final desta unidade, o que se deve ter com- preendido é que a leitura é parte do processo de formação universitária. Não há formação, tampou- co, conhecimento sem leitura, por isso, quando se investe em uma formação acadêmica séria, consis- tente, para ter sucesso, deve-se ler todos os textos, todos os livros indicados e solicitados pelo profes- sor. Há que se ler com cuidado, com calma e paciên- cia. Mesmo que no começo pareça uma tarefa chata e enfadonha, não é bom desistir. Cada vez que se lê um texto completo, mais fácil fica a leitura do próxi- mo e, assim, constrói-se o gosto pela leitura. 38 Anotações: Formação + Leitura = Excelência Apesar de ser um assunto tratado pela dis- ciplina de Metodologia do Estudo, tratar-se-ão de algumas técnicas utilizadas na universidade duran- te o processo de leitura ou mesmo após a leitura. As informações são de Medeiros (2011) e são úteis para cumprir as principais atividades de leitura na universidade. Durante o estudo, em especial, um estudo independente em que está apenas o leitor e o texto, precisa: a) Anotar; b) Esquematizar o texto; c) Transformar o texto em roteiro; d) Realizar resumos. 1.9 ANOTAÇÃO Este é um ponto de partida para qualquer es- tudante, seja diante de uma aula expositiva, uma palestra ou um livro. Realizar anotações ajuda a compreender melhor o que está sendo lido e de- pois serve como ponto de partida para outras ati- vidades. Medeiros, (2011, p. 8) considera a anotação como “[...] processo de seleção de informações para posterior aproveitamento.” Antes de iniciar as anotações é preciso defi- nir onde elas serão feitas e isso depende do leitor e do propósito da leitura. Pode-se anotar no próprio livro/texto, em um caderno, em um bloco de ano- tações ou mesmo no computador ou tablet. Caso esteja lendo vários livros, é bom registrar a fonte de onde as anotações foram extraídas. 39 Anotações:Ex.: MEDEIROS, João Bosco. Como tornar o estudo e a aprendizagem mais eficazes. In: ___. Redação científica: a prática de fichamentos, resu- mos, resenhas. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2011. cap. 1, p. 5-18. Medeiros, 2011 classifica as anotações em: a) Anotações corridas: • Realizar a leitura total do texto, sem inter- rupção; • Reler o texto, levando em consideração as palavras desconhecidas; localizando-as no dicionário – anotar o mais próximo pos- sível; • Buscar em enciclopédias e almanaques, informações relevantes para a compreen- são do texto, sejam elas: históricas, geo- gráficas entre outras; • Só destacar os trechos e as palavras-cha- ve após ter compreendido o texto; • Realizar a redação da anotação corrida e submetê-la a uma avaliação própria; ha- vendo a necessidade de correções, refa- zer a redação. b) Anotações esquemáticas: “ordenamhierarqui- camente as partes principais do conteúdo de uma comunicação” (MEDEIROS, 2011, p. 8). • Deve ser realizada após o estudo do texto e as anotações corridas. • Pode ser apresentado como: 1) esquema vertical das ideias do autor; ou 2) por cha- ves ou diagramas. • Há diversos tipos de esquemas, dentre eles o mapa-conceitual, os organogramas; 40 Anotações: c) Anotações resumidas: “[...] proporciona melho- res resultados para a leitura, bem como para a pró- pria redação. [...] só consegue fazer um bom resu- mo quem realmente assimilou as ideias principais do texto” (MEDEIROS, 2011, p. 13). • Apresenta a síntese de informações extraí- das de livros, artigos e exposições orais. • O resumo consiste na condensação de um texto, apresentando as ideias principais, respeitando a estrutura e a inter-relação das ideias. • Deve ser feito em parágrafos mantendo as ideias do texto, mas com a escrita do alu- no; resumo não é cópia de partes do texto, é uma síntese das principais ideias, rees- crita pelo aluno. MEDEIROS (2011) chama atenção para dois fa- tores importantes: A técnica de SUBLINHAR, tão comum no ato de ler, porém mal utilizada pelos alunos, pois ten- dem a sublinhar indistintamente, sem considerar o que de fato importa. O autor indica que não deve ser feito na primeira leitura e deve-se sublinhar apenas as ideias principais, as palavras-chave. Também solicita atenção especial para o VO- CABULÁRIO, pois “[...] quem pouco lê tem vocabu- lário reduzido” (MEDEIROS, 2011, p. 16). A leitura se torna incompreensível, portanto, ineficaz, se não há domínio do vocabulário. Recomenda-se buscar no dicionário toda palavra desconhecida que apa- rece no texto ou tentar descobrir o sentido da pala- vra no contexto. 41 42 U ni da de 2 Videoaula 1 Videoaula 2 45 INTERPRETAÇÃO: DA PALAVRA À COMUNICAÇÃO Parece simples afirmar que a interpretação de um tex- to está diretamente ligada às palavras do texto e só elas são importantes. Já vimos na uni- dade que trata da leitura a sua ampla concepção, envolvendo o conhecimento de mundo. Todo o aprendizado sobre a leitura é importante para esta etapa em que trataremos da interpreta- ção textual. É preciso ter em mente que interpretar um texto não é um processo complexo, mas envolve diversos campos do conhecimento, como o sen- 46 tido das palavras, gênero e processo de comunica- ção. Primeiramente, vamos tratar do sentido que as palavras apresentam no texto, pois assim teremos condição de focar nossa atenção e direcionar a in- terpretação do texto para o sentido que as palavras ganham no texto. No que se refere a palavra, há dois sentidos, a denotação e a conotação. Estes mecanismos devem servir para que o leitor atente melhor para o que foi escrito/dito e, assim, interpretar mais fa- cilmente o que foi comunicado. O sentido do texto nem sempre está no sentido real da palavra, ou seja, no sentido literal, por isso, o produto do texto vela significados para desvelá-los (...). Para que o leitor entenda os textos, é preciso perceber a relação en- tre o que se diz e o que se quer dizer (PLATÃO E FIO- RIN11 , 2006, p. 328). Dependendo do contexto em que as palavras estão inseridas, seu sentido pode ser alterado e ter significado fora do usual. Por isso, é importante conhecer os dois sentidos. Vejamos: Ex: Eu acredito em anjo, por isso peço prote- ção a eles. Neste exemplo, a palavra anjo significa: no cristianismo, no judaísmo e no islamismo, ser pu- ramente espiritual, servidor de Deus e mensageiro entre Ele e os homens. Podemos observar que o sentido desta palavra é o usual, o literal, logo, po- demos afirmar que ela está no sentido denotativo. 11 SAVIOLI, F. Platão & FIORIN, J. Luiz. Lições de texto: leitura e redação. São Paulo: Ática, 2006, p. 328. SENTIDO DENOTATIVO É o literal, comum; aquele que exprime a significação usual da palavra. 47 Se utilizarmos anjo em outro contexto. Ex: Aquele menino sempre foi um anjo. Vamos observar que o sentido da palavra é fi- gurativo, é uma forma de dizer que o menino é bom, não está empregada de modo literal. De modo sintético, podemos dizer que: Vamos compreender o conceito aplicado a al- guns exemplos: Exemplo 1 É preciso ter cuidado com as palavras. Elas são verdadeiras armas. Algumas vezes mortais. Certas pessoas têm o dom de dizer as mais afiadas, que entram feito uma flecha envenenada. Porém, em muitos casos, o atingido é aquele que usou a arma, ou seja, o falador. Esse, por exemplo, pode SENTIDO CONOTATIVO Figurado: depende de um contexto particular. PALAVRA DENOTAÇÃO CONOTAÇÃO SENTIDO REAL SENTIDO FIGURADO 48 Anotações: sofrer horríveis arrependimentos por ter dito o que não deveria ter dito. Mas como não dizer aquilo que pensamos? Há maneiras de dizer sem dizer, e de dizer, desdizendo. (Ana Miranda. O oráculo in- sondável. In: Correio Braziliense, Caderno C, p. 10, 2/4/2006 (com adaptações). Veja a relação feita pela autora do texto. Ela associa a palavra “palavra” a “armas”, afiadas, fle- cha. Temos aqui o sentido conotativo, pois as pa- lavras não são armas de verdade, a autora está uti- lizando o sentido figurado. Neste caso, o trabalho do leitor, para interpretar o texto, é maior, pois ele precisa compreender o sentido que palavras que- rem dar ao texto. No caso do texto em questão, quando afirma que as palavras são armas, ela quer dizer que podem machucar, ofender, causar danos; quando se refere a flechas, quer enfatizar o quan- to uma palavra pode adentrar a mente e ficar por muito tempo. Portanto, a associação de palavras a armas simboliza o perigo. Como afirma Affonso Ro- mano De Sant’anna: Há vários modos de matar um homem: com o tiro, a fome, a espada ou com a palavra - envenenada. Não é preciso força. Basta que a boca solte a frase engatilhada e o outro morre - na sintaxe da emboscada. Diariamente utilizamos expressões que são conotativas e precisam ser traduzidas para obter- mos o sentido que verdadeiramente querem dar. Em outros casos, as palavras estão no seu sentido literal: 49 Anotações:A menina passou o dia de cara amarrada. A sacola foi amarrada para maior segurança. O temporal varreu as ruas assustadoramente. A vizinha varreu a rua. Ele ficou no fundo do poço por causa das drogas. O homem desceu até o fundo do poço para colocar o equipamento. Observe algumas expressões idiomáticas co- notativas que utilizamos no dia a dia: Olha o passarinho! Na metade do século 19, os fotógrafos tinham de permanecer parados por até 15 minutos, a fim de que sua imagem fosse impressa dentro da má- quina. Fazer as crianças ficarem imóveis por tanto tempo era um verdadeiro desafio. Por isso, gaiolas com pássaros ficavam penduradas atrás dos fotó- grafos, o que chamava a atenção dos pequenos. As- sim, a expressão “Olha o passarinho” ficou conheci- da como a frase dita pelo fotógrafo na hora da pose para a foto. Motorista barbeiro Antigamente, os barbeiros eram conhecidos não apenas por realizar o corte de cabelo e barba, mas também por desempenhar tarefas como: ex- tração de dentes, remoção de calos e unhas, entre outros. Geralmente, os serviços extras deixavam consequências desagradáveis aos clientes. No sé- culo 15, o termo “barbeiro” era atribuído a atividades mal executadas. Com o tempo, passou a ser rela- cionado aos motoristas. Daí a expressão “motorista barbeiro”, ou seja, mau motorista. 50 Anotações: Bafo de onça A onça é um animal carnívoro que se lambuza bastante na hora de comer a caça. Por esta razão, fede muito e sua presença é detectada a distância, na mata. Assim, pessoas que possuem o hálito fé- tido passaram a ser chamadas de “bafo de onça”. A expressão também faz referência ao hálito de quem está (ou esteve) alcoolizado. Santinha do pau oco Expressão que se refere à pessoa que se faz de boazinha, mas não é. Nos séculos 18 e 19, os contrabandistas de ouro em pó, moedas e pedras preciosas utilizavam estátuas de santos ocas por dentro.O santo era “recheado” com preciosidades roubadas e enviado para Portugal. Disponível em: http://www.soportugues.com.br/ secoes/proverbios/index.php. Outro aspecto fundamental na interpretação do texto é saber como a comunicação/oral ou es- crita está sendo produzida, qual é o centro dela. Para isso, precisamos estudar o processo da comu- nicação, como afinal acontece esse processo tão comum entre os seres humanos? A teoria da comu- nicação será estudada a partir da perspectiva do estudioso desta questão Roman Jakobson12 (2007). Ele estabeleceu alguns elementos importantes quando acontece ou para que aconteça a comuni- cação. Nas palavras do autor: 12 JAKOBSON, Roman. Linguística e Comunicação. Tradução de Izidoro Blikstein e José Paulo Paes. São Paulo: Editora Cultrix, 2007. 51 Anotações:Analisemos os fatores fundamentais da comunicação linguística: qualquer ato de fala envolve uma mensagem e quatro elementos que lhe são conexos: o emissor, o receptor, o tema (topic) da mensagem e o código utilizado. A re- lação entre esses quatro elementos é variável (JAKOBSON, 2007, p. 19). Esses elementos podem aparecer sozinhos ou em conjunto em um texto e constituem uma hierar- quia entre elas, por isso, é importante saber qual é o verdadeiro eixo da comunicação, a função primá- ria, as funções secundárias e a intenção do escritor, para qual elemento, a comunicação, volta-se. Amemos! Quero de amor Viver no teu coração! Sofrer e amar essa dor Que desmaia de paixão! (Álvares de Azevedo) Na poesia de Álvares de Azevedo temos a 1ª pessoa e a 2ª pessoa, mas o predomínio é da 1ª pes- soa, pois é o EU que direciona o texto, é, portanto predominantemente emotivo, embora tenha trecho conativo. Importante também destacar que “o pro- blema essencial para a análise do discurso é o do código comum ao emissor e ao receptor e subja- cente à troca de mensagens” (JAKOBSON, 2007, p. 21). Como será visto posteriormente, o código ver- bal é a língua portuguesa e deve ser comum tanto para o emissor quanto para o receptor, sem isso, não há comunicação entre ambos. Para esta teoria, Jakobson (2007, p. 122) definiu que: 52 O REMETENTE envia uma MENSAGEM ao DESTINATÁRIO. Para ser eficaz, a mensagem requer um CONTEXTO a que se refere (Ou “referente”, em outra nomenclatura, algo ambíguo), apreen- sível pelo destinatário, e que seja ver- bal ou suscetível de verbalização; um CÓDIGO total ou parcialmente comum ao remetente e ao destinatário (ou, em outras palavras, ao codificador e ao decodificador da mensagem); e, finalmente, um CONTACTO, um canal físico e uma conexão psicológica en- tre o remetente e o destinatário, que os capacite a ambos a entrarem e per- manecerem em comunicação. Todos estes fatores da comunicação verbal foram esquematizados pelo autor como: CONTEXTO REMETENTE MENSAGEM DESTINATÁRIO ------------------------------------------------------- CONTACTO - CANAL CÓDIGO 53 Vamos analisar melhor cada um destes ele- mentos propostos por Jakobson (2007): Vejamos como esse processo de comunicação se dá, analisando algumas situações concretas: Situação de escrita: Quando escrevemos, temos a intenção que al- guém leia o conteúdo e o entenda. Quem escreve é o emissor. Quem lê é o receptor. O meio, o veículo nos quais vamos fixar as palavras, podem ser papel, computador, celular, muro, camisa, entre outros. EL EM EN TO S DA C OM U N IC AÇ ÃO REMETENTE: também considerado EMISSOR – o que manda, envia, fala, escreve uma mensagem. Está centrada no EU – primeira pessoa singular; DESTINATÁRIO: também denominado RECEPTOR – o que recebe a mensagem. Está centrado no TU/VOCÊ – 2ª. Pessoa; CONTEXTO: também conhecido como REFERENTE - é a informação, o conteúdo, o assunto a ser tratado; CÓDIGO: símbolo utilizado para a realização da comunicação. Se for verbal é a língua falada; se for não verbal é o gesto, o som, as cores etc.; CONTACTO: também denominado de CANAL – é o veículo/meio por onde passa ou se fixa o código; MENSAGEM: significado da comunicação, entendimento. 54 Anotações: Estes são chamados de canal. O assunto, os fatos, o raciocínio que o emissor expõe são denominados referentes ou contextos. A língua que o emissor uti- liza é o código. E o entendimento é a mensagem. Jornal da TV: O apresentador do jornal é o emissor. Quem assiste ao jornal é o receptor. Imagine que a notícia seja um campeonato de futebol. Este é referente ou contexto, ou seja, é o assunto do qual se trata. Sua voz e todos os aparatos tecnológicos da TV são o canal, são o veículo por onde passa a comunicação. Ele usa principalmente a língua portuguesa, que é o código. A compreensão do tema é a mensagem. Um telefonema: Quem liga é o emissor, quem atende é o re- ceptor. O assunto tratado é o referente ou contexto. A voz e o telefone são os veículos por onde o código passa, é o canal. A língua portuguesa é o código. O entendimento do assunto é a mensagem. Uma mensagem no muro: Fonte: tumblr.com 55 Anotações:Quem escreveu a mensagem no muro é o emissor, todos os que lerem a informação, serão receptores. O assunto tratado é o referente ou con- texto. O canal, ou seja, o veículo onde está fixado o código é o muro. A língua portuguesa escrita é o código. O entendimento é a mensagem. Uma camisa: Fonte: <https:usesambarelove.com.br>. Quem vai usar a camisa será o emissor, todos os que lerem a informação, serão receptores. O as- sunto tratado é o referente ou contexto. O canal, ou seja, o veículo onde está fixado o código é a camisa. A língua portuguesa escrita é o código. O entendi- mento é a mensagem. Assim, para que a comunicação possa acon- tecer de forma satisfatória, todos estes elementos devem ser considerados, sob pena de termos um ruído na comunicação: 56 Após compreender este assunto, vamos am- pliar nosso estudo para as funções da linguagem, tema que está diretamente ligado aos elementos da comunicação já estudados. É importante tê-los compreendido para entender com facilidade o que será estudado agora. Cada função da linguagem está relacionada a um elemento de comunicação. Assim, cada um dos fatores determina uma diferen- te função da linguagem. Estes elementos, dificil- mente, são encontrados isolados nos textos, visto que podem ser interdependentes ou complemen- tam informações. Se a informação se volta para o emissor – FUNÇÃO EMOTIVA. Se a informação se volta para o receptor – FUNÇÃO CONATIVA. Se a informação se volta para o canal – FUNÇÃO FÁTICA. Se a informação se volta para o código – FUNÇÃO METALINGUÍSTICA. Se a informação se volta para o contexto – FUNÇÃO REFERENCIAL. Se a informação se volta para a mensagem – FUNÇÃO POÉTICA. Jakobson (2007, p. 123-126) determina as funções como forma de compreender em que elemento da comunicação a informação está centrada, tendo em vista que se o objetivo da comunicação for o emissor, o centro da comunicação é ele, ou seja, o assunto a ser tratado é o próprio emissor. Se sabemos desta informação, certamente teremos mais facilidade para compreender o texto em questão. Ruído: é tudo o que dificulta a comunicação, interfere a transmissão e perturba a recepção ou compreensão da mensagem; tudo o que possibilita a perda de informação durante o transporte da mensagem entre o emissor e o receptor. 57 Detalhando cada uma delas, temos: • Função EMOTIVA ou “expressiva”, centra- da no REMETENTE/EMISSOR, “visa a uma expressão direta da atitude de quem fala em relação àquilo de que está falando. Tende a suscitar a impressão de uma cer- ta emoção, verdadeira ou simulada”. Nesta função, o tema é tratado em 1ª pessoa do singular, são as opiniões, os sentimentos do emissor. Vejamos o exemplo: • Função CONATIVA, centrada no receptor. Esta função age diretamente sobre o receptor de modo a fazer com que ele execute a solicitação, a ordem,o pedido do emissor. São comunicações que partem do emissor com a intenção de que sejam executadas pelo receptor. É a função feita em 2ª pessoa – TU/VOCÊ; é a função do verbo no imperativo, os verbos de ordem; também pode ser feita em forma de pedido ou solicitação. A PRIMEIRA NOITE DE LIBERDADE Cristovão Tezza Fui levado pela velha até o sótão; o excesso de gentileza era a evidência de que me enganavam. Docilmente me deixei levar; mãos nas minhas cos- tas, ela me conduzia balbuciando consolos. Não ou- sei fazer perguntas. De qualquer modo, me respon- deriam com mentiras. Obs: só poderá ser função emotiva se a comunicação for feita em 1ª pessoa. Caso contrário, será outra função. Observe no exemplo que o texto está em 1ª pessoa singular, sabemos disso pelos pronomes e pelos verbos, como destacados. O objetivo desta comunicação é tratar do sujeito que fala, que escreve para contar sobre si mesmo. Temos aqui a comunicação centrada no emissor. 58 Ex: Use camisinha! (ordem) Beba Coca-Cola! (ordem) Diga não às drogas! (ordem) Se dirigir, não beba! (ordem) “Se você procura o melhor imóvel, vá logo ao endereço certo” (uso da 2ª. Pessoa você) (Folha de São Paulo) Por favor, dê-me o caderno de anotações! (pedido) • Função FÁTICA, vão aparecer em mensa- gens que servem basicamente para pro- longar ou interromper a comunicação, para verificar se o canal funciona (“Alô, está me ouvindo?”), para atrair a atenção do interlocutor ou confirmar sua atenção continuada (pois, é; huhum; é...; então; isso, isso...; hummm). • Função METALINGUÍSTICA, voltada para o código. No caso, se a linguagem for ver- bal, o código dos brasileiros é a língua por- tuguesa. Assim, toda comunicação feita para tratar do código está na função me- talinguística. Dizemos que seria o código – língua portuguesa que tem como assun- to o próprio código – a língua portuguesa. Ex: o dicionário usa a língua verbal escrita – língua portuguesa para tratar do signifi- cado das palavras da língua portuguesa. Observe que temos um material em língua portuguesa que trata da língua portugue- sa, é, portanto, função metalinguística. Obs: diz-se que a função fática não favorece uma comunicação. Seu objetivo maior é manter uma conversa ou checar se o canal está funcionando e pode ser utilizado, é o caso do alô, para checar se o telefone – canal desta comunicação – está funcionando; caso também de quando checamos aparelhagem de som: “alô, som, testando, 1,2,3”. Obs: deverá vir em 2ª pessoa, mesmo que oculta ou com verbos no imperativo. 59 Em que língua está escrita? Ou qual a forma de composição? Qual o assunto? Se a resposta para as duas for: “a língua portu- guesa, teremos função metalinguística. Vamos a alguns exemplos: a) A gramática é metalinguística Em qual língua está escrita? Língua portuguesa. Qual o assunto? Normas e regras da Língua portuguesa. Temos então, o código para tratar do código. B) Um manual de redação Qual a forma de composição? Redação. Qual o assunto? Normas e regras da produção de redação. Temos então, o código para tratar do código, ou seja, temos um material escrito em língua por- tuguesa, utilizando redação para tratar do assunto redação. Uma poesia cujo assunto é a poesia: Qual a forma de composição? Poesia. Qual o assunto? Poesia. Temos então, o código para tratar do código, ou seja, a poesia foi feita para tratar dela mesma. E se o assunto da poesia fosse o amor, ainda seria metalinguística? Não, porque o código não estaria tratando dele mesmo, estaria tratando de outro assunto. Observe: “Gastei uma hora pensando no verso Que a pena não quer escrever (...) mas a poesia deste momento Obs: uma forma de reconhecer a função metalinguística é fazer duas perguntas: 60 Anotações: Inunda minha vida inteira” (Carlos Drummond de Andrade) Temos função poética por conta da estrutura em verso, mas se perguntarmos, qual a forma de composição? A resposta é: em verso; qual o as- sunto? A escrita de um verso. Temos função meta- linguística porque o código se volta para o código. Também podemos afi rmar que há função emotiva no 1º e 4º versos por conta da 1ª pessoa do singular – eu. Importante destacar que também temos função metalinguística na linguagem não verbal ou mista, como podemos observar abaixo: Neste caso, a palavra jornalismo carrega os símbolos do jornalismo. Utilizou-se a palavra para representar os elementos relacionados à palavra. Podemos dizer que o código (palavra) está sendo 61 utilizado para tratar do próprio código (elementos da profi ssão). • Função REFERENCIAL, está centrada na informação, o fato, o assunto. O objetivo desta função é tratar especifi camente do assunto sem interferência do emissor e sem apelo ao receptor. Há uma preten- sa busca pela imparcialidade. É feita em 3ª pessoa singular/plural ou mesmo na 1ª pessoa do plural. Esta é a função dos tex- tos acadêmicos, de toda comunicação científi ca. Quando os favores acabam, começa a ingratidão Por Delmo Menezes - 5 de agosto de 2016 Ingratidão é uma forma de fraqueza. “A ingratidão é o mais horrendo de todos os pe- cados”, já dizia Alexandre Her- culano. Ser ingrato tem a ver com o ser humanista, porque o humanista atribui suas vitórias a ele mesmo, e não a um ser supremo. Johann Goethe diz: “Jamais conheci homem de valor que fosse ingrato”. O ingrato não reconhece que sem ajuda, não chegaria a lugar nenhum. Es- quece com muita facilidade as coisas boas que lhe fi zeram. Vive no “seu mun- do”, busca apenas os seus próprios inte- Quando os favores acabam, começa a ingratidão forma de fraqueza. “A ingratidão é o mais horrendo de todos os pe- cados”, já dizia Alexandre Her- culano. Ser ingrato tem a ver com o ser humanista, porque o humanista atribui suas vitórias a ele mesmo, e não a um ser supremo. Johann Goethe diz: “Jamais conheci homem de valor que fosse ingrato”. O ingrato não reconhece que sem ajuda, não chegaria a lugar nenhum. Es- quece com muita facilidade as coisas boas que lhe fi zeram. Vive no “seu mun- do”, busca apenas os seus próprios inte- Obs: atente para não confundir, a função emotiva está ligada à 1ª pessoa do singular. A função referencial aceita a 1ª. pessoa do plural. Quando a comunicação é feita com vistas a tratar do assunto, sem utilizar a 1ª pessoa singular ou a 2ª pessoa. Assim, se o tema é “trabalho infantil”, deve-se tratar especifi camente do assunto sem dar opinião pessoalizada – eu acho, eu penso, eu acredito ou fazer apelo ao receptor – você deve ter cuidado. O exemplo abaixo demonstra como o assunto é tratado de modo isento de opinião e apelos. 62 resses. É um tipo de pessoa que se torna cega para o amor (e doação) de quem está ao lado. O pior erro de um ingrato, é afastar as pessoas que mais se im- portam com ele. As pessoas esquecem que um dia podem precisar de você novamente. A ingratidão é falta de bom senso, de visão, de sabedoria e de humildade. O ingrato não vê o que os outros veem e nem sentem o que os outros sen- tem, não por que não querem ou não desejam, mas por incapacidade, por fraqueza moral e ausência de amor. Há na cabeça do ingrato, um vazio de amor ao próximo, que se manifesta não eventualmente, mas permanentemente. [...] Função POÉTICA, quando a mensagem é cen- tro da informação. Embora ela esteja voltada para a mensagem, esta função tem características muito particulares, quais sejam: estrutura em forma de verso, estrofes e pode ter linguagem figurada. Importante considerar as duas formas de composição: prosa e verso. Prosa – toda comunicação feita em parágrafos; Verso – toda comunicação feita em linhas. Exemplo: Minha terra tem palmeiras (1ª Linha – 1º Verso) Onde canta o sabiá (2ª Linha – 2º Verso) As aves que aqui gorjeiam, não gorjeiam como lá [...] Não permita Deus que eu morra sem que eu volte para lá Sem que desfrute os primores que não encontro por cá. [...] Podemos considerarque a função é poética Obs: pode-se dizer que toda comunicação estruturada em forma de versos – em linhas – está na função poética, independente de outras características que possa ter. 63 por conta da estrutura em versos. Também po- demos considerar que no 1º, 4º e 5º versos temos também função emotiva por conta da 1ª pessoa do singular – eu. Observe outro exemplo: “Só uma coisa me entristece O beijo de amor que não roubei A jura secreta que não fiz A briga de amor que eu não causei.” (Abel Silva) Neste exemplo, temos uma letra de música que é também função poética por causa da estru- tura em verso, mas também é emotiva por conta da 1ª. Pessoa singular em todos os versos. Vejamos o esquema dos fatores fundamentais com um esquema correspondente das funções: REFERENCIAL EMOTIVA POÉTICA CONATIVA FÁTICA METALINGUÍSTICA Fonte: Jakobson (2007). Dificilmente encontramos mensagens em que FUNÇÕES DA LINGUAGEM EMOTIVA CONATIVA FÁTICA REFERENCIAL METALINGUÍSTICA POÉTICA Centrada no emissor EU Centrada no receptor TU_VOCÊ Feita para checar o canal Voltada para o assunto O código é utilizado para tratar do próprio código Atenta para a mensagem. Estrutura em versos 64 Anotações: haja apenas uma dessas funções. Normalmente elas se organizam em nossa vida de modo que a uti- lizamos de acordo com nossas necessidades. Em um mesmo texto temos, em alguns casos, mais de uma função, por isso, nas questões de prova, deve- mos atentar para o que predomina, o que se apre- senta de forma mais intensa. 2.1 TIPOLOGIA TEXTUAL Abordar a tipologia textual, enquanto ele- mento de interpretação textual, é considerar que quando se tem conhecimento sobre ela, facilita in- terpretação e, consequentemente a sua produção, isto porque cada texto atende a uma estrutura dife- rente e a uma finalidade própria. Assim, ao se depa- rar com um texto descritivo e o conhece, é possível antecipar algumas considerações, antes mesmo de conhecer o conteúdo tratado nele. Por exemplo, sabe-se que trata de caracterização, de especifica- ção e de detalhamento, pois os textos descritivos têm estas características. Tradicionalmente, os tipos textuais são clas- sificados de três formas: narrativo, descritivo e dissertativo (informativo ou argumentativo). Atual- mente, foram acrescidos mais dois tipos para me- lhor agrupamento: o injuntivo e o dialogal. Embora tenham características diferentes na sua composi- ção e organização, nem sempre, são constituídas apenas por um tipo textual. É normal haver mais de uma tipologia em um mesmo texto, neste caso, teremos uma predominância de um tipo textual. Se tomarmos um romance como exemplo, veremos que possui características da narrativa, mas em di- 65 versos trechos encontraremos a descrição. Obser- vem a síntese do que estudamos nesta etapa: Para que fique mais fácil compreender, vamos analisar abaixo cada tipo textual, iniciando pela NARRAÇÃO: 2.2 NARRAÇÃO O centro do texto narrativo é o FATO, a história a ser contada – seja verídica ou inventada. Para que o fato seja contado, alguns elementos são necessá- rios como personagens, espaço e tempo. Na narração, há um narrador que relata um fato, ocorrido num determinado espaço e tempo. Ele pode aparecer de forma clara no texto ou de modo implícito. Os fatos são apresentados em uma se- quência de ações que vão se desenrolando com cer- ta lógica até que atinja o ponto máximo do problema da narração e assim tenha o desfecho, ou seja, o final da trama. Toda narração precisa de um conflito, sem este não há fato para contar. Os conflitos são de diversas ordens: inveja, assassinato, brigas por di- versos motivos, assalto, doença, guerra, traição, mistérios, amor, paixão etc. Pode-se dizer que os conflitos são a base dos fatos, portanto, sem con- flitos não há narração. Vejamos alguns exemplos de textos narrativos: Observe o texto e vamos verificar se ele apresenta as características da tipologia narrativa: NARRAÇÃO Fato DESCRIÇÃO Característica INJUNÇÃO Ordem DIALOGAL Diálogo DISSERTAÇÃO Informação 66 Texto 1 - Poesia HISTÓRIA ANTIGA No meu grande otimismo de inocente, Eu nunca soube por que foi... um dia, Ela me olhou indiferentemente, Perguntei-lhe por que era... Não sabia... Desde então, transformou-se de repente A nossa intimidade correntia Em saudações de simples cortesia E a vida foi andando para frente... Nunca mais nos falamos... vai distante... Mas, quando a vejo, há sempre um vago ins- tante Em que seu mudo olhar no meu repousa, E eu sinto, sem, no entanto, compreendê-la, Que ela tenta dizer-me qualquer cousa, Mas que é tarde demais para dizê-la... (RAUL DE LEONI) Texto 2 - Música Faroeste caboclo Legião Urbana E Santo Cristo há muito não ia pra casa E a saudade começou a apertar “Eu vou me embora, eu vou ver Maria Lúcia Já tá em tempo de a gente se casar” Chegando em casa então ele chorou E pro inferno ele foi pela segunda vez Com Maria Lúcia Jeremias se casou E um filho nela ele fez [...] O texto conta a história de duas pessoas que se separaram e ficaram com uma história mal resolvida. De modo muito sintetizado, temos uma narração. 67 Anotações:Sentindo o sangue na garganta, João olhou pras bandeirinhas e pro povo a aplaudir E olhou pro sorveteiro e pras câmeras e [...] E nisso o sol cegou seus olhos E então Maria Lúcia ele reconheceu Ela trazia a Winchester-22 A arma que seu primo Pablo lhe deu [...] E Santo Cristo com a Winchester-22 Deu cinco tiros no bandido traidor Maria Lúcia se arrependeu depois E morreu junto com João, seu protetor E o povo declarava que João de Santo Cristo Era santo porque sabia morrer [...] E João não conseguiu o que queria Quando veio pra Brasília, com o diabo ter Ele queria era falar pro presidente Pra ajudar toda essa gente que só faz... Não tinha medo o tal João de Santo Cristo Era o que todos diziam quando ele se perdeu [...] Ainda mais quando com um tiro de soldado o pai morreu [...] E João aceitou sua proposta E num ônibus entrou no Planalto Central [...] E o Santo Cristo até a morte trabalhava Mas o dinheiro não dava pra ele se alimentar [...] E João de Santo Cristo ficou rico E acabou com todos os traficantes dali. 68 [...] Já no primeiro roubo ele dançou E pro inferno ele foi pela primeira vez [...] Foi quando conheceu uma menina E de todos os seus pecados ele se arrependeu Maria Lúcia era uma menina linda E o coração dele pra ela o Santo Cristo prometeu [...] Mas acontece que um tal de Jeremias, Traficante de renome, apareceu por lá Ficou sabendo dos planos de Santo Cristo E decidiu que, com João ele ia acabar [...] Texto 3 - Fábula O VELHO, O MENINO E O BURRO Num lugar que você sabe, este fato aconte- ceu. A pessoa que eu descrevo, você, talvez, tenha conhecido. E se você não se lembra, procure na consciência. Porque se houver semelhança, não é mera coincidência. O burrico vinha trotando pela estrada. De um lado vinha o velho, puxando o cabresto. Do outro vinha o menino, contente, que o dia estava fresqui- nho e o sol brilhava no céu. Sentados no barranco estavam dois homens. No que viram o burro mais o velho e o menino, um cutucou o outro: – Veja só, compadre! Que despropósito! Em vez do velho montar no burro, vem puxando ele! O velho e o menino se olharam. Assim que viraram na primeira curva, o velho parou o burro e montou nele. Podemos observar que o texto é uma letra de música, mas que conta uma narrativa, relata um fato a partir da grande problemática da personagem João de Santo Cristo de conseguir uma vida melhor. Temos personagens, conflito, tempo, espaço que se desenvolvem numa ordem lógica. 69 Anotações:O menino segurou o cabresto e lá se foram os três, muito satisfeitos. Até que perto da ponte tinha uma casa com uma mulher na janela. – Olha só, Sinhá, venha ver o desfrute! O velho no bem-bom, montadono burro, e o pobre do meni- no gramando a pé! O velho e o menino se olharam de novo. As- sim que saíram da vista da mulher, o velho desceu do burro e botou o menino na sela. E foram andan- do um pouco ressabiados, o velho puxando o burro pelo cabresto, pensando no que o povo podia dizer. Logo, logo, passaram numa porteira onde estava parada uma velha mais uma menina. – Mas que absurdo, minha gente! Um velho que nem se aguenta nas pernas andando a pé, e o guri, bem sem-vergonha, escanchado no burro! Os dois se olharam e nem esperaram. O velho mais que depressa montou na garupa do burro e lá se foram os três. Dali a pouco encontraram um pa- dre que vinha pela estrada mais o sacristão: – Olha só, que pecado, onde é que já se viu? O pobre do burro, coitadinho, carregando dois pre- guiçosos! Mas isso é coisa que se faça? O velho e o menino, desanimados, desmonta- ram e nem discutiram: saíram carregando o burro. Mas nem assim o povo sossegou! Cada vez que pas- savam por alguém, era só risada! – Olha só os dois burros carregando o terceiro! Quando chegaram em casa, o velho sentou cansado, se assoprando: – Bem feito! — ele dizia. — Bem feito! – Bem feito o quê, vô? – Bem feito pra nós. Que a gente já faz muito de pensar pela própria cabeça, e ainda quer pensar 70 Anotações: pela cabeça dos outros. Agora eu sei por que é que meu pai dizia: “Quem quer agradar a todos a si próprio não faz bem! Pois só faz papel de burro e não agrada a ninguém!” Fato – conflito: montar ou não no burro Personagem: menino, padre, as pessoas Espaço: lugar que você sabe qual é Tempo: indeterminado Podemos afirmar que o texto é uma narrativa, pois seu propósito é relatar um fato, contar um con- flito através de personagens que agem num tempo e num espaço. Texto 4 - Piada - Bonito papel! Quase três da madrugada e os senhores com- pletamente bêbados, não é? Foi aí que um dos bêbados pediu: - Sem bronca, minha senhora. Veja logo qual de nós é o seu marido que os outros querem ir para casa. (Stanislaw Ponte Preta) Neste texto, também temos uma narração que se desenvolve a partir de um problema - os ho- mens estarem bêbados -, apresentando como per- sonagens os bêbados e uma senhora, no tempo de três horas da manhã, no espaço, a casa da senhora. 71 Texto 5 - Conto Tragédia brasileira Manuel Bandeira Misael, funcionário da Fazenda, com 63 anos de idade. Conheceu Maria Elvira na Lapa – prostituída, com sífilis, dermite nos dedos, uma aliança empe- nhada e os dentes em petição de miséria. Misael tirou Maria Elvira da vida, instalou-a num sobrado no Estácio, pagou médico, dentista, manicura… Dava tudo quanto ela queria. Quando Maria Elvira se apanhou de boca boni- ta, arranjou logo um namorado. Misael não queria escândalo. Podia dar uma surra, um tiro, uma facada. Não fez nada disso: mu- dou de casa. Viveram três anos assim. Toda vez que Maria Elvira arranjava namorado, Misael mudava de casa. Os amantes moravam no Estácio, Rocha, Catete, Rua General Pedra, Olaria, Ramos, Bom Sucesso, Vila Isabel, Rua Marquês de Sapucaí, Niterói, Encantado, Rua Clapp, outra vez no Estácio, Todos os santos, Catumbi, Lavradio, Boca do Mato, Inválidos… Por fim na Rua da Constituição, onde Misael, privado de sentidos e de inteligência, matou-a com seis tiros, e a polícia foi encontrá-la caída em decú- bito dorsal, vestida de organdi azul. Sintetizando a tipologia textual narração, temos: O conto apresenta uma clara estrutura narrativa: o fato é o casamento de Misael com Maria Elvira (personagens); o conflito se dá por conta dos namorados de Maria Elvira; o espaço são vários bairros do Rio de Janeiro, não há um tempo determinado. O texto se organiza de modo que o conflito vai tomando proporções maiores à medida que o texto progride, chegando ao clímax quando Misael fica privado de seus sentidos e mata a esposa, num desfecho trágico da trama. 72 Anotações: 2.3 DESCRIÇÃO A outra tipologia textual é a DESCRIÇÃO, cujo eixo norteador é a CARACTERIZAÇÃO. Descrever é apresentar o ser, objeto ou lugar da forma como é ou está; é detalhar, pormenorizar, apresentar seu estado. É um tipo de texto normalmente curto e quase nunca existe sozinho, está inserido em ou- tras tipologias como a narração, a dissertação ou mesmo a injunção. Esta tipologia é muito utilizada nos romances para caracterizar as personagens, o espaço, os objetos. É de fundamental importância na construção da narração para que o leitor possa compreender melhor os fatos que estão sendo nar- rados. Seu processo de composição se dá através de elementos como: adjetivos e verbos de ligação. Pode-se fazer descrição técnica e literária. A des- crição técnica é feita por diversos campos de co- nhecimento, tais quais: arquitetura, engenharia, psicologia. Já a descrição literária, fica por conta dos contos, dos romances, das poesias etc. Vejamos algumas descrições: ENREDO É a própria narrativa, a história contada. TEMPO Data: mês, ano, século, dia da semana. PERSONAGEM Pessoa, animal, objeto personificado. ESPAÇO Lugar onde acontece o fato. CONFLITO O problema vivido pelas personagens. NARRAÇÃO 73 Texto 1 - Trecho de música Eu queria ter na vida simplesmente Um lugar de mato verde Pra plantar e pra colher Ter uma casinha branca, de varanda, um quintal e uma janela Para ver o sol nascer Texto 2 - Poesia RETRATO Cecília Meireles Eu não tinha este rosto de hoje, assim calmo, assim triste, assim magro, nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo. Eu não tinha estas mãos sem força, tão paradas e frias e mortas; eu não tinha este coração que nem se mostra. Eu não dei por esta mudança, tão simples, tão certa, tão fácil: - Em que espelho ficou perdida a minha face? Texto 3 - Descrição técnica O motor está montado na traseira do carro, fi- xado por quatro parafusos à caixa de câmbio, a qual, por sua vez, está fixada nos coxins de borracha na extremidade bifurcada do chassi. Os cilindros estão dispostos horizontalmente e opostos dois a dois. Observe que as palavras destacadas são características do lugar e da casa. 74 Anotações: Cada par de cilindros tem um cabeçote comum de metal leve. As válvulas, situadas nos cabeçotes, são comandadas por meio de tuchos e balancins. O virabrequim, livre de vibrações, de comprimento reduzido, com têmpera especial nos colos, gira em quatro pontos de apoio e aciona o eixo excêntrico por meio de engrenagens oblíquas. As bielas con- tam com mancais de chumbo-bronze e os pistões são fundidos de uma liga de metal leve. (Fonte: Manual de instruções [Volkswagen]. In: Comunicação em prosa moderna. GARCIA Othon, Rio de janeiro: Editora FGV, 1996, p.388.) Texto 4 - Descrição literária Havia à Rua do Hospício, próximo ao campo, uma casa que desapareceu com as últimas recons- truções. Tinha três janelas de peitoril na frente; duas pertenciam à sala de visitas; a outra a um gabinete contíguo. O aspecto da casa revelava, bem como seu in- terior, a pobreza da habitação. A mobília da sala consistia em sofá, seis ca- deiras e dois consolos de jacarandá, que já não conservavam o menor vestígio de verniz. O papel da parede de branco passara a amarela e percebia-se que em alguns pontos já havia sofrido hábeis re- mendos. O gabinete oferecia a mesma aparência. O papel que fora primitivamente azul tomara a cor de folha seca. Havia no aposento uma cômoda de cedro que também servia de toucador, um armário de vinháti- co, uma mesa de escrever, e finalmente a marque- 75 Anotações:sa, de ferro, com o lavatório, e vestida de mosqui- teiro verde. Tudo isto, se tinha o mesmo ar de velhice dos móveis da sala, era como aqueles cuidadosamente limpo e espanejado, respirando o mais escrupuloso asseio. Não se via uma teia de aranha na parede, nem sinal de poeira nos trastes. O soalho mostrava aqui e ali fendas na madeira; mas uma nódoa sequer não manchava as tábuas areadas.” (José de Alencar) 2.4 INJUNÇÃO Na INJUNÇÃO,
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