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Yuri Nunes Silva Tratamento Metas do tratamento Diminuir ao máximo as complicações micro e macrovasculares. recomendam redução da HbA1c para menos de 7% na maioria dos pacientes, com o objetivo de reduzir a incidência de doença microvascular. O ideal é que a glicemia de jejum (GJ) e a glicemia pós-prandial sejam mantidas em 80 a 130 mg/dℓ e < 180 mg/dℓ, respectivamente. Metas mais rigorosas de HbA1c(≤ 6,5%) podem ser consideradas para pacientes com curta duração de doença e longa expectativa de vida, sem DCV significativa, quando isso puder ser alcançado sem hipoglicemia significativa ou outros efeitos adversos do tratamento. Metas menos restritivas ou rigorosas (p. ex., HbA1c < 7,5 a 8,5%) para idosos frágeis, pacientes com história de hipoglicemias graves de repetição, expectativa de vida limitada, complicações diabéticas crônicas avançadas, quadros demenciais. Bases fisiopatogênicas para o tratamento O DM2 é uma doença complexa e progressiva, caracterizada por alterações metabólicas, e as principais são: ➢ diminuição da sensibilidade à insulina no músculo ➢ excessiva produção hepática de glicose (por resistência insulínica no fígado) ➢ declínio progressivo da função das células beta (β). Na sua gênese, participam fatores genéticos e ambientais (p. ex., sedentarismo e obesidade). Adicionalmente, outros componentes desempenham importante papel na patogênese do DM2: ➢ Os adipócitos (lipólise acelerada), ➢ O trato gastrintestinal (deficiência/resistência incretínica), ➢ As células alfa (α) pancreáticas (hiperglucagonemia), ➢ O rim (reabsorção aumentada de glicose pelos túbulos renais) ➢ O cérebro (resistência insulínica e disfunção de neurotransmissores). Coletivamente, esses componentes compreendem o que foi denominado por DeFronzo “octeto ominoso ou nefasto”. No fígado, a RI manifesta-se por uma produção excessiva de glicose durante o estado basal, ao passo que, no músculo, ela se expressa pela captação deficiente de glicose. Lipólise exagerada e aumento dos ácidos graxos livres (AGL) circulantes resultam da RI nos adipócitos. Enquanto as células β são capazes de aumentar sua secreção de insulina o suficiente para compensar a RI, a tolerância à glicose permanece normal. Yuri Nunes Silva No entanto, ocorre progressiva redução da quantidade de células β, em consequência de apoptose aumentada, proliferação diminuída e desdiferenciação em células α. Inicialmente, eleva-se apenas glicemia pós-prandial; depois, a GJ começa a aumentar, levando ao surgimento do DM2 manifesto. Em resumo, a perda progressiva da massa e da função da célula é multifatorial. Nesse processo, estariam envolvidos: ➢ Glicotoxicidade ➢ Lipotoxicidade ➢ Deficiência/resistência incretínica ➢ O estresse oxidativo ➢ A inflamação, ➢ Bem como a deposição de amiloide nas células β e certos fatores genéticos. Opções de tratamento As opções de tratamento para o DM2 incluem modificações no estilo de vida (MEV) e administração de medicamentos com diferentes mecanismos hipoglicemiantes. As atuais diretrizes recomendam MEV juntamente com a metformina (na ausência de contraindicações) como tratamento inicial de escolha para o DM2. Se o controle glicêmico permanecer inadequado (HbA1c > 7% ou acima da meta estipulada) após 3 meses de tratamento ou venha a se deteriorar durante o seguimento, adiciona-se um segundo fármaco com mecanismo de ação diferente e de acordo com as características ou necessidades dos pacientes. Na presença de um maior descontrole glicêmico, a terapia dupla deve ser considerada inicialmente em vez da monoterapia com MET. • HbA1c acima de 7,5%. A terapia baseada em insulina (insulina basal, esquema basal– bolus ou combinação fixa insulina/aGLP-1) é mandatória, quando houver sintomas (poliúria, polidipsia e perda de peso) e HbA1c > 9%. • Após a resolução da hiperglicemia aguda, pode-se suspender a insulinoterapia e introduzir a terapia oral em combinação dupla, tríplice ou quádrupla, se necessário. Diretrizes indicam a insulinoterapia em pacientes muito sintomático (4 Ps) e hiperglicemia (glicemia ≥ 300 mg/dℓ e/ou HbA1c > 10%) e com estresse metabólico, como IAM e AVC. Yuri Nunes Silva Classes terapêuticas BIGUANIDAS O único representante disponível deste grupo é a metformina. Utilizada como tratamento inicial para a maioria dos pacientes com DM2. Mecanismo de ação Não tem efeito direto sobre as células beta. Melhora a sensibilidade periférica e inibe a gliconeogênese hepática (75% de sua ação). Aumenta a atividade da tirosinoquinase do receptor de insulina, estimulando translocação de GLUT-4. Estimula a secreção de GLP-1. E aumenta receptores de GLP-1 na célula beta. Metformina (comp. 500 mg, 850 mg e 1 g). Deve ser administrado junto com alimentação. • Retarda absorção e reduz efeitos colaterais. Começa com 500 a 850 mg/dia e aumenta se necessário for para chegar ao controle glicêmico. Dose máxima de 2550 mg/dia (em duas a três tomadas). Metabolismo e excreção Não é metabolizada pelo fígado. Excretada intacta na urina. Indicações e eficácia Reduz a glicemia, diminui a insulinemia e o peso corporal, praticamente sem causar hipoglicemia. Reduz triglicerídeos (TG) e LDL. Não é teratogênico (usado na DMG e amamentação). Pode ser usada na pré-diabetes e síndrome do ovário policístico. Efeitos colaterais Sintomas gastrointestinais (até 20%). Acidose láctica é a reação adversa mais temida da metformina (TFG< 30 ml/min). Reduz a absorção de vitamina B12. E feitos adversos incomuns são reações cutâneas de hipersensibilidade, hepatite colestática e anemia hemolítica em pacientes com deficiência de glicose 6-fosfato desidrogenase. Contraindicações ✓ Disfunção renal grave ✓ TFG< 30 ml/min. ✓ Cirrose hepática ✓ DPOC ✓ IC ✓ IAM ✓ Sepse ✓ Alcoolismo ✓ Histórico de acidose lática Somente 1 g caso TFG<45. Suspensa 1 a 2 dias após realizar exames com contrates radiológicos ou procedimentos cirúrgicos. SULFONILUREIAS Mecanismo de ação Estimulam a secreção pancreática de insulina, pela ação no receptor SUR1, presente nas células β. Estimulam secreção e não síntese. Requerem células β funcionantes para que atuem. Yuri Nunes Silva Tipos classificadas como de primeira (clorpropamida) e segunda (glibenclamida, gliclazida, glipizida e glimepirida) gerações. GLIBENCLAMIDA ➢ Tempo de ação de 16 a 24 horas. ➢ Uma a duas tomadas diárias. ➢ Dose usual de 2,5 a 20 mg/dia. ➢ Pode causar hipoglicemias graves. GLICLAZIDA ➢ Deve preferir de formulação de liberação modificada (Diamiron- 30 a 60 mg) confere ação prolongada (24 horas) e menor risco de hipoglicemia. ➢ Dose recomendada varia de 30 a 120 mg/dia. ➢ Dose única diária. GLIMEPIRIDA ➢ Dose única diária. ➢ Dose inicial de 1 a 2 mg/dia. ➢ Dose usual de manutenção 2 a 4 mg/dia. ➢ Máximo de 8 mg/dia. Indicação e eficácia Decréscimo da glicemia e da HbA1c. Com o tempo declina o efeito, perda da função pancreática. Efeitos colaterais A hipoglicemia é o principal efeito colateral das sulfonilureias. Ganho de peso relacionado ao aumento da insulina. Contraindicações ✓ Insuficiência renal ou hepática ✓ Gravidez (exceto glibenclamida) ✓ amamentação (exceto glibenclamida e glipizida). GLITAZONAS Mecanismo de ação Sua ação é análoga a da metformina. Aumentam o efeito periférico da insulina. agem muito mais no estímulo à captação de glicose pelo músculo esquelético. Aumento da expressão dos receptores periféricos de insulina, secundário ao estímulo de um fator de transcrição presente no núcleo da célula(o PPAR-gama). Tipos Atualmente, o único representante do grupo disponível é a pioglitazona. Rosiglitazona causa risco de IAM (retirado do mercado). Posologia ➢ Pioglitazona: 15, 30 e 45 mg. ➢ Iniciar com 15 a 30 mg/dia (única tomada). ➢ Dose máxima é de 45 mg/dia. Indicação e eficácia Eficácia comparável às sulfonilureias e à metformina. Devido ao mecanismo de ação intranuclear das glitazonas, seu efeito anti-hiperglicêmico pleno é um tanto atrasado (até 12 semanas). Usada em pacientes com esteato- hepatite não alcoólica. Yuri Nunes Silva Efeitos colaterais Observam-se reações adversas em menos de 5% dos pacientes. edema periférico, anemia dilucional discreta e ganho de peso. Pode surgir, ainda, hipoglicemia quando as glitazonas são associadas à insulina ou aos secretagogos de insulina. Contraindicações ✓ doenças hepáticas graves ✓ alcoolistas ✓ indivíduos com reconhecida alergia a esse fármaco ✓ pacientes com DM tipo 1 ✓ gestantes ✓ IC ✓ DCV grave ✓ Dispneia e edema de MMII ✓ Obesidade grave (IMC> 40) ✓ Uso de insulina INIBIDORES DA DIPEPTIDIL PEPTIDASE-4 Tipos Também chamados gliptinas. Atuam como inibidores competitivos reversíveis da DPP-4 (enzima que rapidamente degrada o GLP-1 e o GIP). vildagliptina, sitagliptina, saxagliptina, linagliptina e alogliptina. Mecanismo de ação As gliptinas atuam estimulando o sistema das incretinas (GLP-1 e GIP) ao inibir seu metabolismo pela DPP- 4. Estímulo da secreção de insulina pelas células β e inibição da secreção de glucagon. Eficácia Maior eficácia na redução da HbA1c é observada quando as gliptinas são associadas à metformina ou a iSGLT-2. Posologia O esquema recomendado para vildagliptina é de 50 mg 2 vezes/dia. As doses preconizadas para os demais compostos são: ➢ 100 mg/dia para sitagliptina ➢ 25 mg/dia para alogliptina ➢ 5 mg/dia para saxagliptina e linagliptina. Tolerabilidade Em geral, as gliptinas são bem toleradas, não se associando a hipoglicemia significativa nem a reações adversas gastrintestinais. As gliptinas são particularmente atrativas para pacientes idosos, uma vez que são bem toleradas e raramente causam hipoglicemia. Por não atuar na perda de peso e não melhorar desfechos CV tem havido diminuição na prescrição. Contraindicações ➢ DM1 ➢ Gestantes ➢ Lactantes ➢ Casos graves de IC GLINIDAS Neste grupo, incluem-se repaglinida e nateglinida. Aumentam a secreção de insulina pelas células β. Há vários anos, elas não são mais recomendadas no tratamento do DM2, por serem menos eficazes que os demais secretagogos de insulina. Yuri Nunes Silva INIBIDORES DA Α- GLICOSIDASE O único representante deste grupo no Brasil é a acarbose. Atua no intestino delgado, em que retarda a digestão e a absorção dos carboidratos. Não é mais usado. Modesto efeito redutor na glicemia e efeitos colaterais gastrintestinais. INIBIDORES DO COTRANSPORTADOR 2 DE SÓDIO E GLICOSE Tipos Os iSGLT-2 são também denominados gliflozinas. há três fármacos comercializados no Brasil: dapagliflozina, canagliflozina e empagliflozina. Todos administrados em dose oral única diária. Mecanismo de ação Aproximadamente 90% da glicose filtrada pelos glomérulos é reabsorvida no túbulo contornado proximal pelo cotransportador de sódio e glicose-2 (SGLT-2) e os 10% restantes pelo SGLT-1. As gliflozinas promovem redução glicêmica por meio da inibição do SGLT-2, o que resulta em bloqueio da reabsorção renal de glicose no túbulo proximal e aumento de sua excreção urinária. Pelo aumento da excreção renal de glicose, tais agentes promovem ainda modesta redução de peso e, pelo efeito diurético, redução da volemia e da pressão arterial. Tolerabilidade As gliflozinas são bem toleradas. Sua reação adversa mais frequente é a infecção fúngica dos sistemas genital e urinário. Tais eventos parecem estar relacionados ao aumento na glicosúria, favorecendo o crescimento dos microrganismos. AGONISTAS DO RECEPTOR DO GLP-1 O GLP-1 é um hormônio liberado pelas células L enteroendócrinas localizadas no íleo e no cólon. Apresenta múltiplas ações: ➢ estimula a secreção de insulina de maneira glicose- dependente ➢ inibe a secreção de glucagon e o débito hepático de glicose ➢ retarda o esvaziamento gástrico ➢ provoca saciedade ➢ reduz o apetite ➢ propicia perda ponderal ➢ melhora a sensibilidade periférica à insulina. Aumento captação pelo músculo esquelético e adipócitos. Yuri Nunes Silva ➢ cardioproteção e neuroproteção. Fisiologicamente, o GLP-1 é rapidamente degradado pela enzima DPP-4. Por isso, vêm sendo desenvolvidos análogos do GLP-1 resistentes à degradação pela DPP- 4. Particularmente indicados para pacientes com excesso ponderal ou aqueles com DCV estabelecida ou com risco muito alto para DCV Entre os representantes dessa categoria, encontramos agentes: ➢ de curta ação, com 1 a 2 aplicações diárias (exenatida, liraglutida e lixisenatida) ➢ de longa ação, com administração semanal (semaglutida, dulaglutida, exenatida de liberação sustentada e albiglutida) Os compostos de comprovados benefícios cardiovasculares são liraglutida, dulaglutida e semaglutida. LIRAGLUTIDA Análogo acilado do GLP-1 com meia-vida de 10 a 14 horas, o que possibilita sua aplicação, SC, 1 vez/dia. Resistente à degradação pela DPP- 4. A dose da liraglutida no tratamento do DM2 varia de 1,2 a 1,8 mg/dia, em aplicação única diária por SC. Inicia-se com 0,6 mg/dia e aumenta- se para 1,2 mg/dia após 1 semana. Se necessário, a dose é subsequentemente reajustada para 1,8 mg/dia. DULAGLUTIDA consiste em uma ligação entre duas cadeias do análogo do GLP-1 e um fragmento de imunoglobulina G (IgG). Essa estrutura lhe confere uma absorção mais lenta e menor depuração renal. Por isso, ela é aplicada semanalmente, na dose de 1,5 mg. SEMAGLUTIDA Maior redução de HbA1c e de peso corporal. A dose inicial é de 0,25 mg nas primeiras 4 semanas, passando a seguir para 0,5 mg 1 vez/semana (SC). Caso seja necessário melhor controle glicêmico, a dose pode ser elevada a 1 mg. A semaglutida oral está disponível em comprimidos de 7 e 14 mg para tomada única diária, 30 minutos antes da primeira refeição. Tolerabilidade dos GLP-1RA SGI (sobretudo, náuseas, vômitos e diarreia) e reações no local das aplicações são os principais efeitos colaterais dos GLP-1RA. Essas reações adversas tendem a desaparecer com o tempo, porém podem persistir por várias semanas, sobretudo as náuseas. Relacionada ao retardo do esvaziamento gástrico. Yuri Nunes Silva INSULINOTERAPIA A insulina é o agente mais potente para reduzir a glicemia. Em comparação aos fármacos orais, tem como inconveniente maior o fato de ser injetável, causar mais hipoglicemia e ocasionar maior ganho de peso. O uso de insulina está prioritariamente indicado quando a meta desejada de HbA1c não foi alcançada com a combinação de 2 ou 3 antidiabéticos. Indica-se também a insulinoterapia temporariamente, durante a gravidez e em doenças agudas, como sepse, IAM, AVC ou complicações agudas hiperglicêmicas (estado hiperosmolar hiperglicêmico e CAD). Insulinoterapia deve ser considerada ao diagnóstico para pacientes intensamente sintomáticos e com considerável descontrole glicêmico (p. ex., glicemia ≥ 300 mg/dℓ ou HbA1c > 9%. Esquema de insulinização Os principais esquemas de insulinoterapia para o DM2 estão resumidos a seguir. Esquema basal. Adição de insulina basal (NPH ao deitar ou análogos) em dose única diária, com manutenção dos antidiabéticos orais. Indicação: controle glicêmico inadequado com a combinação de medicamentos orais eagonistas do GLP-1RA injetáveis. Pode também ser usado como terapia inicial de diabéticos tipo 2 muito sintomáticos, sobretudo na presença de hiperglicemia intensa (GJ ≥ 300 mg/dℓ e/ou A1C ≥ 10). Esquema basal “plus”. Manutenção do esquema anterior e adição da insulina Regular (INS-R) ou, de preferência, um análogo de ação ultrarrápida (Asparte, Lispro ou Glulisina) antes da principal refeição do dia. Indicação: hiperglicemia pós- prandial, a despeito do esquema basal. Esquema basal-bolus. Insulinoterapia intensiva. Administração da insulina basal (NPH ou Detemir 2 vezes/dia ou análogos de longa ação 1 vez/dia), associada a injeções pré-prandiais de INS-R ou, de preferência, de análogos de ação ultrarrápida. Essa abordagem possibilita um controle glicêmico melhor, mas tem como principais inconvenientes a necessidade de múltiplas injeções diárias e um risco maior para hipoglicemias. Outro esquema de insulinoterapia intensiva é a bomba de infusão contínua SC, cuja maior limitação é o custo muito elevado. Ambas as opções são igualmente eficazes.