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FUNDAMENTOS-TEÓRICOS-E-METODOLÓGICOS-DA-LÍNGUA-PORTUGUESA-1

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2 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 3 
2 A ÁFRICA TRAZIDA AO BRASIL E A AMÉRICA INDÍGENA 
ENCONTRADA PELOS BRANCOS: O CONTATO ENTRE LÍNGUAS ....................... 4 
2.1 A transmissão linguística irregular: algumas considerações ...................... 7 
3 CONCEPÇÕES E PRESSUPOSTOS SOBRE A LINGUAGEM E SOBRE A 
APRENDIZAGEM ........................................................................................................ 9 
4 O PORQUÊ CORRELACIONAR OS ESTUDOS DA LINGUÍSTICA 
FUNCIONAL COM OS ESTUDOS NEUROCIENTÍFICOS E COGNITIVOS NO 
ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA ...................................................................... 11 
5 OS SUJEITOS DA EDUCAÇÃO BÁSICA ................................................. 15 
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................... 49 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3 
1 INTRODUÇÃO 
 
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante 
ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um 
aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma 
pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é 
que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a 
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas 
poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em 
tempo hábil. 
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa 
disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das 
avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que 
lhe convier para isso. 
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser 
seguida e prazos definidos para as atividades. 
 
Bons estudos! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
2 A ÁFRICA TRAZIDA AO BRASIL E A AMÉRICA INDÍGENA ENCONTRADA 
PELOS BRANCOS: O CONTATO ENTRE LÍNGUAS 
 
Fonte: afreaka.com.br 
De acordo com Barbosa (2020), sendo a maior diáspora negra que se tem 
notícia, nos primeiros quatro séculos a partir de 1500, os registros históricos mostram 
que mais de quatro milhões de africanos foram trazidos à força ao Brasil para serem 
escravizados. Entretanto, esses cálculos divergem quanto ao número apresentado 
oficial: dados não oficiais chegam a apontar treze milhões e quinhentos mil africanos 
vindos para o Brasil até os idos de 1850, ano de extinção do tráfico dos povos de 
África, como afirma Lucchesi (1999, apud BARBOSA, 2020, p. 21). Esse número faz 
significativa diferença a ser considerada na constituição da sócio-histórica do Brasil. 
Essa afirmação vai ser defendida por Baxter (1995, apud BARBOSA, 2020, p. 21), 
quando propõe sair do impasse da hipótese da crioulização prévia, já que a mesma 
não permite uma avaliação crítica adequada, e considerar a proposta do contato entre 
línguas, a partir das vertentes rurais africanas e ameríndias. 
Sobre a “construção” do Brasil, com a chegada dos portugueses, a grande parte 
dos investigadores da história social brasileira vai compartilhar com a ideia de que os 
africanos foram mais importantes do que os indígenas na composição da realidade 
linguística atual do país. Esse dado é explicado por Lucchesi (1999), quando comenta 
que: 
 
5 
[...] desde os primeiros contatos, as comunidades autóctones brasileiras 
sentiram o violento impacto da transplantação da civilização cristã ocidental 
para o Brasil. Com efeito, ao longo desses cinco séculos, perpetrou-se um 
verdadeiro genocídio dos povos indígenas. Quando não eram chacinados 
pelas “expedições punitivas”, eram dizimados por moléstias adventícias 
contra as quais não haviam desenvolvido qualquer imunidade – uma simples 
virose dizimava tribos inteiras. Expulsos de suas terras, buscavam refúgios 
nas regiões mais recônditas e mais inacessíveis, onde encontravam abrigos 
da sanha “civilizatória”. Quando escravizados, não se adaptavam aos 
trabalhos forçados, sobretudo aos trabalhos agrícolas, em razão de suas 
características culturais intrínsecas. Sua adaptação à vida urbana era ainda 
mais remota. (LUCCHESI, 1999, apud BARBOSA, 2020, p. 21). 
Mesmo na incerteza quanto aos acontecimentos históricos sobre a língua geral, 
é certo que, com a vinda do Marquês de Pombal ao Brasil, ficou determinado a 
expulsão dos padres jesuítas, a libertação dos índios e o impedimento do uso de 
qualquer outra língua que não fosse a língua portuguesa em terras brasileiras. Essa 
foi a principal política para a generalização da língua portuguesa no Brasil, na segunda 
metade do século XVIII (BARBOSA, 2020, p. 22). 
Supostamente o distanciamento dos indígenas, talvez, esclareça o motivo da 
colossal atuação dos africanos na construção da sociedade brasileira. Desde o início, 
na grande aventura de construir um país, eles foram a base de toda a economia e sua 
força de trabalho durante a era colonial e império com base no trabalho forçado. Além 
da utilização no trabalho doméstico, também trabalharam arduamente para enriquecer 
o principal setor econômico da colônia: o cultivo da cana-de-açúcar nas vastas terras 
do Nordeste. Com o declínio da cultura açucareira, negros escravos foram vendidos 
para trabalhar nas minas de ouro e diamantes em Minas Gerais. Com o esgotamento 
dos depósitos, foram novamente vendidos a proprietários de grandes fazendas de 
café nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. A obra da escravidão negra remonta 
ao século 19 no Brasil Império, quando a escravidão foi gradualmente abolida: em 
1850, a Lei Eusébio de Queirós (Lei Eusébio de Queirós) fez pleno uso da lei, A lei 
proíbe navios transportando escravos de entrando em portos africanos para o Brasil. 
Em 1871, é promulgada a Lei do Ventre Livre, que tornava livre todos os filhos 
nascidos de mulheres escravizadas. Logo depois, em 1885, é também 
aprovada a Lei dos Sexagenários, que libertava todos os que eram 
escravizados e tinham a partir dos 60 anos, e cabia aos ex-proprietários 
indenizarem os libertos. Todo esse processo é finalizado quando a princesa 
regente, Dona Isabel, sanciona a Lei Áurea, no dia 13 de maio de 1888. 
(BARBOSA, 2020, p. 22). 
Considerando o estudo de Mussa (1991), no final do século XIX, apenas 15% 
da população do Brasil era formada por negros africanos e brasileiros, 41% por 
 
6 
brancos brasileiros e europeus, 42% de descendentes da miscigenação3 , e por quase 
nenhuma população indígena que, no século XVI, fora de 50%, como é possível ver 
no quadro abaixo: 
Quadro 3 – Etnias presentes na população brasileira entre 1538 a 1890 
 
Fonte: adaptado de Mussa (1991, apud BARBOSA, 2020, p. 22). 
Analisando o quadro 3, vê-se que é no século XVII que a população de 
africanos e negros brasileiros torna-se na metade da população brasileira. Lucchesi 
(1999, apud BARBOSA, 2020, p. 23) explica que seria este o momento mais propício 
para o surgimento de processos de pidginização e crioulização do português. 
 Em outras palavras, esse processo ocorre quando a população do 
superstrato é menor que a do substrato. Porém, é observável que esses 
índices populacionais vão mudar expressivamente no início do século XVIII 
e, mais ainda, no seguinte, quando ocorre uma drástica redução: o que tinha 
sido 50% da população, no século XVII, cai para 15% dois séculos depois. 
(BARBOSA, 2020, p. 23). 
De acordo com Barbosa (2020), quadro revela o massivo contato entre línguas 
durante os séculos, observando que a língua do dominante, a partir do século XVII, 
em momento algum, teve percentual inferior ao da língua dos dominados. 
Constatação essa que, segundo Baxter (1995, apud BARBOSA, 2020, p. 23), foi 
fundamental para o gradual abandono de outras línguas e o domínio do português. 
Da aquisiçãocomo segunda língua (L2) pela população de falantes africanos 
e indígenas, a língua portuguesa passa a ser a primeira língua (L1) dos 
descendentes dessa população. Esta aquisição irregular do português e a 
nativização dessa variante não-padrão como L1 das gerações posteriores. 
(BARBOSA, 2020, p. 23). 
 
7 
Segundo Lucchesi (1999, apud BARBOSA, 2020, p. 23), vai desencadear “[...] 
um processo de TLI que teve importantes consequências para a formação da atual 
realidade linguística brasileira, nomeadamente para as suas variedades populares”. 
3 A TRANSMISSÃO LINGUÍSTICA IRREGULAR: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 
Como se sabe o modo de adquirir a linguagem acontece de forma espontânea, 
sendo as crianças agentes que, de forma instintiva, no estágio de socialização, 
interage com familiares que serão o suporte para a aprendizagem de L1. Assim, de 
acordo com Barbosa (2020), 
Luchessi (1999) explica que a concepção de TLI é mais vasta do que o de 
pidginização/crioulização, 
[...] pois engloba, tanto os processos de mudança provenientes de contato 
entre línguas através dos quais uma determinada língua sofre alterações 
muito profundas na sua estrutura, do que resulta o surgimento de uma outra 
entidade linguística denominada pidgin ou crioulo, quanto os processos nos 
quais uma língua sofre contato com outras línguas, sem que essas alterações 
cheguem a configurar a emergência de uma nova entidade linguística 
qualitativamente distinta (LUCCHESI, 1999, apud BARBOSA, 2020, p. 23). 
 
E vai evidenciar essa diferença (LUCCHESI, apud BARBOSA, 2020, p. 23) 
quando mostra como o processo da TLI, durante os primeiros séculos de Brasil, 
desencadeou variações e mudanças nas variedades do PPB (português popular 
brasileiro), e que estas se concentram na erosão de marcas morfológicas que não 
possuem valor informacional, tais como: 
1. A concordância nominal e verbal 
a. Meus filhoØ trabalhaØ na roça. 
 2. Flexão de caso dos pronomes pessoais 
b. Ele viu nós na feira. 
c. Maria não gosta mais de eu. 
d. Num vô mais tu. (LUCCHESI, 1999, apud BARBOSA, 2020, p. 23). 
Esses exemplares mostram uma espécie de simplificação morfológica que 
define normalmente casos de relações intensas entre línguas, em que irão embasar 
uma grande parte da maioria das variações do PPB (português popular brasileiro), 
podendo ser definidas ser determinadas como espécies em partes reestruturadas pelo 
contato entre línguas. Ainda afirma (LUCCHESI, 1999, apud BARBOSA, 2020, p. 24), 
que os processos de TLI leve deixaram profundas marcas nessas variedades do PPB. 
 
8 
Lucchesi (2001, apud BARBOSA, 2020, p. 24) vai argumentar, a partir de fatos 
históricos do desenvolvimento do Brasil, para justificar a importância da TLI na 
formação do PPB, mostrando as condições em que viveram as populações no Brasil, 
nos últimos 500 anos, começa com a aculturação das populações indígenas e 
africanas desde a primeira metade do século XVI, seguida dos grandes 
deslocamentos desses povos das áreas mais urbanizadas para os recônditos lugares 
no interior do país, dificultando mais ainda o aprendizado do PE (português europeu), 
que se concentrou definitivamente nas zonas urbanas com a elite branca colonial. 
Esses acontecimentos foram importantes para compreender o motivo de os primeiros 
africanos e indígenas terem desenvolvido a língua portuguesa de forma tão deficiente, 
e a L2 se transforma em L1 para as próximas gerações, numa situação precária 
escolarização, e em lugares de difícil acesso. 
Para Barbosa (2020), após os primeiros cem anos de colonização, surgem, nos 
séculos XVII e XVIII, muitas cidades no interior do país, levando a acontecer um êxodo 
urbano. Somente no século XVIII, é implantado um sistema oficial de educação 
pública com a chegada do Marquês de Pombal. Entretanto só tinham acesso às 
escolas, os homens brancos. Tanto as mulheres brancas, quanto os africanos e os 
índios e sua progenitura permaneciam analfabetos. A escolarização tardia e para 
poucos faz com que a maior parte da população brasileira fosse analfabeta até a 
metade do século passado. 
Como advento da independência, no século XIX, o Brasil afasta-se de Portugal, 
assim, nessa circunstância, dar-se início aos primeiros movimentos nacionalistas em 
diversas áreas, inclusive no linguístico. Para Barbosa (2020) com a industrialização, 
crescem demasiadamente os centros urbanos, o que vai gerar um percurso inverso 
ao visto nos séculos anteriores: as populações do campo “invadem” as grandes 
cidades, acontecendo um permanente êxodo rural. 
Os meios de comunicação de massa e a precarização do ensino público vão 
acentuar a polarização sociolinguística: de um lado o afastamento da norma 
culta do padrão estabelecido pela gramática normativa e, do outro lado, os 
dialetos populares que estiveram isolados por séculos nas periferias urbanas 
e zonas rurais. BARBOSA, 2020, p. 25). 
Dessa forma. Em consonância com Barbosa (2020), é possível afirmar que, 
neste último século, o português popular do Brasil não faz um caminho em direção ao 
https://www.sinonimos.com.br/progenitura/
 
9 
padrão europeu, mas sim, traça um vetor linear rumo ao que é chamada norma urbana 
culta, em processo cíclico contínuo. 
Assim sendo, após esses breves diálogos com a história, Lucchesi (2001) 
reafirma que: 
Se não é possível determinar com absoluta segurança a intensidade desses 
processos crioulizantes e a sua repercussão para a língua do país como um 
todo, o certo é que o português sofreu profundas alterações ao ser adquirido 
inicialmente pelos índios aculturados e posteriormente por contigentes cada 
vez mais expressivos de escravos trazidos da África, desencadeando um 
processo de transmissão lingüística irregular que marcou decisivamente a 
formação das atuais variedades populares da língua portuguesa no Brasil. 
(LUCCHESI, 2001, apud BARBOSA, 2020, p. 25). 
Barbosa (2020) conclui que a partir do exposto, mesmo que a tese da TLI não 
dê conta de todas as indagações sobre as origens da língua portuguesa no Brasil, é 
claramente observável sua grande contribuição na agenda das pautas necessárias 
para entender muito da realidade linguística brasileira construída nesses últimos cinco 
séculos de história, já que são inegáveis as suas considerações sobre a língua vinda 
de Portugal já em “mutação” nos porões-embrionários dos milhares de navios 
negreiros. 
 
4 CONCEPÇÕES E PRESSUPOSTOS SOBRE A LINGUAGEM E SOBRE A 
APRENDIZAGEM 
Desde os gregos, há a discussão sobre linguagem (a partir da discussão sobre 
o “conhecimento”), passando por várias abordagens. Bertoque e Casseb Galvão 
(2015, p. 125) explicam que: 
[...] da noção de língua como representação do pensamento, apresentada por 
Aristóteles (séc. IV); do sistema abstrato de regras autônomo, também, como 
representação do pensamento, proposto por Saussure (1916); do dispositivo 
biológico de uma gramática universal (GU), apresentado por Chomsky 
(1957); passando pela proposta psicocognitiva de Langacker (1972, 1986, 
2008, 2009) e de Tomasello (2008, 2010), até o sistema linguístico 
multifuncional que intermedeia as relações sociais, defendido por Bakhtin 
(1920), Halliday (1989), Dik (1989) e Givón (1984, 1993, 2011), observa-se 
que há um continuum que amplia a visão de língua/linguagem e, por 
conseguinte, o olhar sobre as análises linguísticas. (BERTOQUE, CASSEB, 
2015, apud BERTOQUE, 2018, p. 276). 
 
10 
De acordo com Bertoque (2018), essa variedade de perspectivas nos mostra 
que não existe abordagem de estudo “certa” ou “errada”, existem perspectivas 
distintas que fazem recortes para fins específicos, por causa desses diversos olhares 
e lentes, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) identificam vários pontos de 
vista para explicar o que é linguagem, dentre eles, destaca-se: 
 
(BRASIL, 1998, apud BERTOQUE, 2018, p. 277). 
Em consonância com Bertoque (2018), a concepção de linguagem apresentada 
nos PCN é ampla e perpassauma gama de abordagens, construídas ao logo dos 
anos. Fundamentarmo-nos numa abordagem que ponderamos ser ampla, pois 
considera o falante, o uso e o social (Neves, 2006, apud BERTOQUE, 2018, p. 277): 
a Linguística Funcional, que inter-relaciona aspectos linguísticos, discursivos, 
cognitivos e sociais. 
Desta forma pode-se dizer que a linguagem é compreendida como uma forma 
de interação social, intermediado e constituído pelo sistema linguístico (língua). Pode-
se dizer que, a língua é mais do que um veículo ou um instrumento mediador do 
conhecimento; é parte constitutiva das relações sociais, do conhecimento, da cultura, 
da identidade Bertoque (2018). 
A língua influencia e é influenciada pelas relações interindividuais, por isso, a 
gramática, o discurso e a cognição são analisados como domínios 
interdependentes, porque apesar de distintos, funcionam simultaneamente e 
perpassam um ao outro, dando à língua um caráter dinâmico, fluido, 
inacabado, em constante processo de mudança e variação (DIK, 1989; 
NEVES, 2006; BERTOQUE, 2010, 2014 apud BERTOQUE, 2018, p. 278). 
 
11 
Sabe-se que a língua pode ser expressa por meio da fala, da escrita ou dos 
sinais - no caso da língua de sinais. Já a linguagem, que não se resume à fala (sua 
articulação e propagação) ou aos sinais, é o todo desse processo complexo de 
interação: implica as relações pragmático-discursivas que, via processos semânticos, 
organizam o sistema linguístico (BERTOQUE, 2018). 
No que se refere ao ensino de Língua Portuguesa, na perspectiva funcionalista, 
há a uma propensão de dar início pela análise dos usos da língua em variados 
contextos comunicativos para, depois, conciliar a discussão teórica (conceituar, 
categorizar). Portanto, tende para uma proposta teórico metodológicas que parte da 
prática para a teoria. Isso porque entende-se que o aprendizado se dá por meio da 
compreensão da funcionalidade da língua na e pela interação social (BERTOQUE, 
2018). 
5 O PORQUÊ CORRELACIONAR OS ESTUDOS DA LINGUÍSTICA FUNCIONAL 
COM OS ESTUDOS NEUROCIENTÍFICOS E COGNITIVOS NO ENSINO DE 
LÍNGUA PORTUGUESA 
 
Fonte: guiadoestudante.abril.com.br 
Nicolescu (1999, apud BERTOQUE, 2018, p. 290) propõe que “aprender a 
conhecer” significa, especialmente, estabelecer pontes entre os diversos saberes 
para que o conhecimento adquira importância na vida cotidiana. Como se pode ver, 
o aprendizado acontece pela associação das informações, além disso, o uso dos 
sentidos (audição, olfato, visão, tato, paladar) acionam diferentes áreas no cérebro, 
fortalecendo as conexões relevantes para a aquisição do conhecimento. 
De acordo com Bertoque (2018), a linguagem é um processo de interação 
social, que envolve domínios linguísticos (fonológicos/fonéticos, morfológicos, 
 
12 
sintáticos, semânticos), discursivos (pragmático-discursivos), cognitivos, por meio de 
um aparato biológico. 
Ela é processada por áreas cerebrais e a realização de outras atividades que 
acionam as mesmas áreas do processamento da fala, por exemplo, permite 
o fortalecimento de sinapses naquela região, contribuindo para o 
desenvolvimento da linguagem. Por isso, compreender a maneira como o 
cérebro aprende, o que é e como é processada a linguagem no cérebro e nas 
interações sociais é fundamental para o planejamento da aula (seleção de 
materiais e métodos), a fim de proporcionar uma aprendizagem mais 
significativa. (BERTOQUE, 2018, p.290). 
Por exemplo, ao ensinar a construir um gênero como a “piada”, é importante 
que o professor saiba que se trata de uma narrativa que, conforme Feltes (2009, p. 
163, apud BERTOQUE, 2018, p. 290), gera uma rede de integração conceitual porque 
a “piada é uma das manifestações discursivas cujo efeito esperado é provocar o 
humor, a risibilidade” e o “humor estaria condicionado à ruptura de um esquema 
cognitivo”. Esses esquemas cognitivos se constituem a partir da associação que o 
cérebro faz, com base em inputs do contexto social, e no fortalecimento ou eliminação 
de sinapses. 
De acordo com Bertoque (2018), é importante também promover condições 
para fazer associações das informações, por meio da apresentação e discussão do 
uso de um determinado fenômeno em vários contextos de uso efetivo da língua e 
promover a recorrência (retomada dos conteúdos, correlacionando aos novos 
conteúdos). Outro exemplo é a aplicação de oficinas que permite a criação de 
ambientes de aprendizagem eficientes porque criam um espaço “novo” de 
aprendizagem, fora do cotidiano escolar e porque promovem discussão, análise e 
produção (LAVOR et al., 2014, apud BERTOQUE, 2018, p. 290), ou seja, o estudante 
precisa “colocar a mão na massa”, o que proporciona um alto grau de reflexão sobre 
o conteúdo estudado. 
O ambiente escolar possui uma configuração que influencia os trabalhos 
naquele espaço. Segundo as orientações dos PCN (BRASIL, 1998, apud 
BERTOQUE, 2018, p. 290), as práticas de linguagem, na escola; 
“[...] devem, necessariamente, tomar as dimensões discursivas e pragmáticas 
da linguagem como objeto de reflexão, de maneira explicita e organizada, de 
modo a construir, progressivamente, categorias explicativas de seu 
funcionamento”. (BRASIL, 1998, apud BERTOQUE, 2018, p. 290). 
 
13 
O funcionamento da língua envolve situações reais de comunicação, em 
oposição o ensino com frases soltas impede o conhecimento das dimensões 
discursivas e pragmáticas, que são extremamente importantes para compreender os 
sentidos e, inclusive, da organização linguística (ordem de uma oração, por exemplo). 
Os usos linguísticos nos diversos contextos comunicativos também permitem a 
associação das informações, promovendo a compreensão dos efeitos de sentido e a 
análise da língua de maneira científica na escola. Essas estratégias possibilitam a 
interação com o ambiente que, segundo Cosenza e Guerra (2011, apud BERTOQUE, 
2018, p. 290), é importante porque a interação “confirmará ou induzirá a formação de 
conexões nervosas e, portanto, a aprendizagem ou o aparecimento de novos 
comportamentos, que delas decorrem”. Os autores explicam que “os comportamentos 
são aprendidos e não programados pela natureza” (COSENZA E GUERRA, 2011, 
apud BERTOQUE, 2018, p. 290) 
Devido a linguagem fazer parte da vivencia e da identidade humana, ela 
representa um caráter enigmático e multifacetado. Assim, é um fenômeno 
interdisciplinar que exige conhecimento, metodologias e métodos mais abrangentes 
e/ou diversos. 
Para Bertoque (2018), o processo de associação, fundamental para o 
fortalecimento de eliminação de sinapses, justifica o uso e a adequação de vários 
procedimentos, suportes ou ferramentas de linguagem e gêneros discursivos. 
Elementos para o planejamento da aula 
 
BERTOQUE, 2018, p. 291 
 
14 
Bertoque (2018), afirma que tanto os procedimentos, os suportes ou 
ferramentas de linguagem quanto os gêneros discursivos são fundamentais no 
seguimento de ensino assim como conhecer o conteúdo. É preciso entar em acordo 
com todos esses componentes possibilitando o acionamento do cérebro em várias 
áreas, principalmente, nas campos de processamento da fala, da compreensão etc. 
Atentar-se para esses elementos não significa que é preciso fazer dinâmicas, 
oficinas, teatros etc., em todas as aulas, mas que é importante variar as 
condições da aplicação, inclusive numa mesma aula. Assistir uma cena de 
um filme ou ler um conto, discutir (compreender e interpretar) e fazer exercício 
são exemplos dessa variação que possibilitam acionar várias áreas do 
cérebro no processo de aprendizagem. (BERTOQUE, 2018, p. 291) 
 
O cérebro humano reage bem diante da motivação adequada, conforme 
mostram as pesquisas sobre o sistema límbico, também chamado de “área da 
recompensa”, porque consiste no circuito neuronal relacionado às respostas 
emocionais e aos impulsos motivacionais” (ESPERIDIÃO-ANTONIO, 2008, apud 
BERTOQUE, 2018, p. 291). 
Para a maioria das pessoas, que nãoapresentam algum transtorno, a 
motivação tende a ser mais recorrente quando há um elemento ou uma situação à 
qual considera novidade (HERCULANO-HOUZEL, 2009, BERTOQUE, 2018, p. 291). 
Assim, além do conteúdo “novo”, a adoção de elementos diferentes auxilia no 
estabelecimento da motivação. Quando nos referimos à motivação, reafirmamos que 
não significa ter de fazer “aula-show”, mas adotar procedimentos, suportes de 
linguagem e gêneros discursivos que possibilitem a formação de “novos cenários” na 
sala de aula. 
Cosenza e Guerra (201, BERTOQUE, 2018, p. 291) sugerem que outros 
elementos se relacionam para acionar a motivação. São eles: preferência, 
experiências anteriores, necessidades e estado emocional. No entanto, de modo 
geral, 
 “[...] o cérebro tem uma motivação intrínseca para aprender, mas só está 
disposto a fazê-lo para aquilo que reconheça como significante”, por isso, o 
professor precisa se indagar “por que aprender isso? E em seguida: qual a 
melhor forma de apresentar isso aos alunos, de modo que reconheçam como 
significante?” (COSENZA, GUERRA, 2011, BERTOQUE, 2018, p. 292). 
Desta forma é preciso associar os saberes que o aprendiz já tem, que faz parte 
de seu contexto, com os saberes recentes. É possível partir do contexto do educando, 
 
15 
expondo um tema do interesse dele, e logo após, relacionar com demais conteúdos 
(por meio da interpretação de texto ou da intertextualidade), também, com os que não 
são do meio ou do interesse direto do estudante, pois ele necessita estar a par 
conhecer outras realidades e aprender a relacioná-las, para formar noções de 
similaridade, oposição, igualdade, semelhança etc., enfim, para “ler os mundos 
possíveis” e se posicionar diante deles (BERTOQUE, 2018). 
Considerando que, para o aprendizado, é importante o esforço cognitivo, mas 
não o tempo todo, nossa proposta é que o docente saiba “dosar” e 
sistematizar a relação entre procedimento de ensino, suporte de linguagem, 
gênero discursivo e conteúdo/tema da aula. Portanto, se o conteúdo é muito 
complexo, é preciso iniciar com ferramentas mais simples, com gêneros 
discursivos mais simples e aumentar a complexidade aos poucos. Do mesmo 
modo, se o assunto não é do interesse ou do contexto dos estudantes, pode-
se adotar um suporte ou procedimento que seja mais atrativo. (BERTOQUE, 
2018). 
Um outro aspecto é a extensão da aula, o cérebro cansa. Portanto, de acordo com 
Bertoque (2018) em aulas com duas horas de duração, por exemplo, é importante 
fazer um continuum passando por níveis de complexidade alternados (menor 
complexidade, complexidade mediana, maior complexidade, menor complexidade...), 
6 OS SUJEITOS DA EDUCAÇÃO BÁSICA 
 
Fonte: brasildefatope.com.br 
As escolas públicas brasileiras, nas últimas décadas, passaram a atender um 
número cada vez maior de estudantes vindos das classes populares. De acordo com 
Krupek (2008), ao assumir essa função, que historicamente justifica a existência da 
escola pública, aumentou a necessidade de discutir sobre o papel do ensino básico 
no projeto de sociedade que se quer para o país. 
 
16 
E o papel da escola define-se de formas diferentes no que se refere as atuais 
políticas públicas. Para Krupek (2008), do ponto vista das teorias críticas da educação, 
as primeiras questões que se apresentam são: Quem são as pessoas da escola 
pública? De onde elas vêm? Quais são as referências sociais e culturais trazidas para 
a escola? 
Sabe-se que uma pessoa é a criação de seu tempo histórico, do meio social 
que pertence, mas é, também, um ser único, que age no mundo de acordo como o 
compreende e como dele é possível participar. 
Krupek (2008), ao definir qual formação que se quer oportunizar a essas 
pessoas, a escola colabora para estabelecer qual a forma de participação que lhes 
competirá na sociedade. Desta forma, as análises sobre currículo têm, em sua 
essência, um forte caráter político. 
Desta forma Krupek (2008), nessas diretrizes, propõe uma reorientação na 
política curricular com o objetivo de construir uma sociedade justa, onde as 
oportunidades sejam iguais para todos. 
Para isso, os sujeitos da Educação Básica, crianças, jovens e adultos, em geral 
oriundos das classes assalariadas, urbanas ou rurais, de diversas regiões e com 
diferentes origens étnicas e culturais (FRIGOTTO, 2004, apud KRUPEK, 2008 p. 14), 
devem ter acesso ao conhecimento produzido pela humanidade que, na escola, é 
veiculado pelos conteúdo das disciplinas escolares. 
Assumir um currículo disciplinar significa dar ênfase à escola como lugar de 
socialização do conhecimento, pois essa função da instituição escolar é 
especialmente importante para os estudantes das classes menos 
favorecidas, que têm nela uma oportunidade, algumas vezes a única, de 
acesso ao mundo letrado, do conhecimento científico, da reflexão filosófica e 
do contato com a arte. (KRUPEK, 2008 p. 14). 
Os conteúdos disciplinares devem ser desenvolvidos, na escola, de forma 
contextualizada, determinando, associações transdisciplinares e pondo sob dúvida 
tanto a austeridade com que tradicionalmente se mostram quanto o estatuto de 
verdade atemporal dado a eles. Desta perspectiva, Krupek (2008) propõe que tais 
conhecimentos contribuam para a crítica às contradições sociais, políticas e 
econômicas presentes nas estruturas da sociedade contemporânea e propiciem 
compreender a produção científica, a reflexão filosófica, a criação artística, nos 
contextos em que elas se constituem. 
 
17 
Essa concepção de escola orienta para uma aprendizagem específica, 
colocando em perspectiva o seu aspecto formal e instituído, o qual diz respeito aos 
conhecimentos historicamente sistematizados e selecionados para compor o currículo 
escolar (KRUPEK, 2008). 
Nesse sentido, a escola deve incentivar a prática pedagógica fundamentada 
em diferentes metodologias, valorizando concepções de ensino, de 
aprendizagem (internalização) e de avaliação que permitam aos professores 
e estudantes conscientizarem-se da necessidade de “...uma transformação 
emancipadora. É desse modo que uma contra consciência, estrategicamente 
concebida como alternativa necessária à internalização dominada 
colonialmente, poderia realizar sua grandiosa missão educativa” 
(MÈSZÁROS, 2007, KRUPEK, 2008 p. 15). 
Nesta perspectiva um projeto educativo, necessita atender de forma igualitária 
as pessoas, independente da sua condição social e econômica, a qual etnia e cultura 
pertencem e às necessidades especiais para aprendizagem caso apresentem. Esses 
atributos precisam ser empregados como competências para propiciar o aprendizado 
cabendo à escola lecionar, para todos. 
7 GÊNEROS DE DISCURSO, ESCRITA E ENSINO 
De acordo com Cavalcanti (2019), no final da década de 1970, no Brasil, o 
contexto acadêmico se organizava em torno da vontade de ver os desenvolvimentos 
pelos quais passavam os estudos das Ciências da Linguagem refletidos nas relações 
de ensino/aprendizagem de língua materna. Havia principalmente um atrativo pelo 
modo de como as pessoas aprendem a linguagem com a textualidade, seja nas 
atividades de escuta/leitura ou nas de produções oral/escrita. 
A partir da década de 1990, os gêneros textuais e/ou discursivos ganham 
cada vez mais enfoque, ora como conteúdos de ensino, ora como 
instrumentos em atividades didáticas. Esse novo movimento resulta, mais 
uma vez, do investimento da comunidade acadêmica em pesquisas com o 
discurso e com a textualidade aplicados às relações de ensino/aprendizagem, 
em suas diversas vertentes teóricometodológicas (CAVALCANTI, 2019, p. 
997). 
É, justamente, nesse momento, com a divulgação dos Parâmetros Curriculares 
Nacionais (1997/1998), que o uso do texto em sala de aula ganha a proporções para 
trabalhar com os usos da linguagem, em suas variadas demonstrações, e seus os 
gêneros. 
 
18 
Com base em estudos elaborados por Bunzen (2004, apud CAVALCANTI, 
2019, p. 997) e Motta-Roth(2008 apud CAVALCANTI, 2019, p. 997), pode-se 
identificar, nas pesquisas desenvolvidas no Brasil fundamentadas em diferentes 
perspectivas de teorias de gêneros, algumas escolas teóricas: a Escola de Sidney, 
baseada em postulados da Linguística Sistêmico-Funcional, a Escola de Genebra, 
que desenvolveu o Interacionismo sociodiscursivo, a Escola Americana ou Nova 
Retórica, com foco nas inter-relações entre texto e contexto e a Escola Britânica de 
ESP (English for Specific Purposes), com foco na organização retórica dos gêneros. 
Na perspectiva de Cavalcante (2019), esses movimentos de entrada do texto e 
dos gêneros na sala de aula, nas últimas décadas, no Brasil, apresentam-se bastante 
diversificados – não somente pelas várias abordagens teóricometodológicas, mas 
também pelas consequências que a opção por uma delas pode produzir nas práticas 
de ensino/aprendizagem. Essas consequências estão relacionadas, por exemplo, 
com a forma como se dá o trabalho com e sobre a linguagem ou, ainda, com a forma 
como se dá a relação do sujeito-aluno com o seu texto (CAVALCANTI, 2019, p. 997). 
De acordo com Cavalcante (2019), o trabalho com e sobre a linguagem ganha 
uma nova dimensão quando é pensado a partir da textualidade e dos gêneros: 
interessariam às práticas escolares explorar, nas aulas de línguas, as questões 
relativas ao uso linguístico (variação linguística, questões de estilo relativo ao texto ou 
gênero, questões de ortografia e uso de norma linguística relativas à textualidade 
produzida e/ou lida). As várias formas da prática de ensino, na percepção de 
Cavalcante (2019), gira em torno da concepção de gênero ou texto, em que são 
colocadas (ou não) em foco as formas de constituição e funcionamento dos gêneros 
e dos textos, considerando (ou não) as relações históricas, sociais e intersubjetivas 
fundantes de sua materialidade e funcionamento, considerando (ou não) suas 
diversas manifestações e modalidades, isto é, sua heterogeneidade. 
Assim, há enfoques didático-pedagógicos dos gêneros que abrem menos ou 
mais espaço para um trabalho com e sobre a linguagem; no primeiro caso, 
os estudos de gêneros seriam adicionados ao trabalho com linguagem, como 
em seções separadas no bloco do conteúdo de ensino, e no segundo caso, 
os estudos partem dos gêneros para entender o uso que os sujeitos fazem 
dos textos, nas diversas esferas de atividade presentes na vida dos 
estudantes. (CAVALCANTI, 2019, p. 997). 
Desta forma os resultados das variadas abordagens da textualidade e dos 
gêneros nas interações do sujeito-aluno com o seu texto, no que se refere à prática 
 
19 
de escrita, está justamente associada à concepção de linguagem, materializada em 
atividades linguísticas/linguageiras, como espaço de formação da subjetividade. 
Cavalcante (2019), entende que a temática da escrita dos gêneros atingiu, de 
forma irreversível, o contexto educacional brasileiro, desde o nível da escola básica 
até o universitário, atingindo, consequentemente, a formação de professores. Desta 
forma, observa-se, também, que o vínculo entre professor e aluno tem sido objeto de 
estudo de educadores e profissionais preocupados com ensino/ aprendizagem de 
linguagem. 
8 OS NOVOS ESTUDOS DO LETRAMENTO E O ENSINO COM GÊNEROS 
TEXTUAIS/DISCURSIVOS 
Sabe-se que letramento não é só ler e escrever, mas exercer as práticas sociais 
de leitura e escrita de gêneros que circulem na sociedade em que se vive, conjugadas 
com as práticas sociais de interação oral (SOARES, 2002, apud MARTINS, 2017, p. 
105). Subentende-se, então, que é necessário levar em consideração o ensino com 
os gêneros a partir dos fatores didáticos que permitam os mais variados usos e 
funções da leitura e escrita, ou seja, considerando as condições de produção da 
linguagem para diferentes interlocutores. 
Quando se trata de letramento, não pode deixar de mencionar as contribuições 
de Street (2014) e Barton (2000), os quais advertem para um letramento que esteja 
voltado para as práticas sociais, não se limitando apenas à esfera escolar. Barton 
(2000 apud MARTINS, 2017, p. 105), ressalta a necessidade de se problematizar as 
ações com a linguagem escrita de forma situada, sendo que cada evento de 
letramento estará ancorado numa prática social de letramento que vai além dos limites 
imediatos e está inscrita numa materialidade social e histórica. 
De acordo com Martins (2017), os estudos que envolvem o letramento 
ressaltam uma heterogeneidade de práticas situadas de uso da língua sem que haja 
estigma às que não correspondem ao domínio escolar. As ocorrências de letramento, 
normalmente, são atividades que incluem textos escritos, seja para serem lidos ou 
para se falar sobre eles; pode-se dizer que são situações comunicativas 
intermediados por textos escritos. Já as práticas de letramento, de acordo com Martins 
(20018), normalmente, são os modos culturais gerais em que as pessoas utilizam as 
 
20 
práticas da leitura, da escrita e da linguagem em um evento de letramento; são 
modelos/padrões que construímos através dos usos culturais da leitura e da escrita. 
Entende-se então, que os eventos e as práticas de letramento ocorrem nos mais 
diversos contextos sociais – incluindo a escola e as diversas agências de letramento 
(KLEIMAN, 2002, apud MARTINS, 2017, p. 105) – e possibilitam diferentes 
letramentos aos sujeitos neles envolvidos, ao mesmo tempo em que os próprios 
sujeitos interferem em novos eventos e práticas de letramento. 
O sistema educacional vivencia dificuldades em promover o desenvolvimento 
das habilidades necessárias para uma aprendizagem significativa. Nos Parâmetros 
Curriculares Nacionais (PCNs -1998) encontram-se diversas reflexões sobre a 
formulação do ensino da língua portuguesa (LP). De um lado, as pesquisas revelam 
os registros do fracasso escolar e indicam a impossibilidade de um ensino tradicional 
frente à situação atual, já que muitas práticas pedagógicas estão distantes de 
situações reais de uso da língua. De outro, a realidade vivenciada na educação 
brasileira, apesar do trabalho que vem sendo realizado, atesta que os avanços só são 
alcançados a longo prazo, e existe uma constante busca de respostas para esse 
fracasso escolar. Conforme constam nos PCNs, no que se refere às discussões a 
respeito desse problema, a questão da leitura e da escrita foi apontada como a 
principal causa desse fracasso. Diante disso, faz-se necessária a reestruturação do 
ensino da língua portuguesa, com o objetivo de garantir, de fato, a aprendizagem de 
estudantes e o direito ao ensino. Os Parâmetros Curriculares Nacionais apresentam 
uma síntese do que foi possível aprender e avançar através das discussões 
promovidas sob a forma de reorientação curricular ou de projetos de formação de 
professores em serviço, com o intuito de revisar as práticas tradicionais de 
alfabetização e de ensino da língua portuguesa, bem como das produções científicas 
mais recentes nas áreas da linguística aplicada, da análise do discurso e da gramática 
textual, principalmente. Por um lado, os Parâmetros Curriculares Nacionais 
apresentam as diretrizes que apontam os currículos e seus conteúdos mínimos, de 
modo que seja assegurada uma informação básica comum, apesar das grandes 
diferenças regionais, culturais e políticas encontradas no nosso país. 
 
21 
9 O AMBIENTE DIGITAL E O ENSINO DE GÊNEROS ARGUMENTATIVOS 
 
Fonte: figuradelinguagem.com 
Estudos e experiências acadêmicas como as desenvolvidas por Oakley (2013), 
Gorospe (2015), Pegrum et al (2016) demonstram que são inumera as 
probabilidades de utilizar as tecnologias digitais a favor da educação, de modo mais 
eficaz e eficiente, de modo que o aluno e professor tenham a oportunidade de 
aprender e (co)construir o saber de forma mediada e interativa. 
Essa Proposição conduz a realidade no grande avanço que a tecnologia nos 
impões, sendo docentes ou não, ao sedeparar com os vários de gêneros textuais que 
estão relacionados com o uso internet, ou seja, os gêneros que circulam na esfera 
digital (MARCUSCHI, 2008, apud MARTINS, 2017, p. 105). Em um prisma 
acadêmico, esses gêneros têm levantados debates significativos, objetivando um 
ensino, principalmente de língua materna, que apoie uma pedagogia dos 
multiletramentos, portando o estudo dos mais váriados tipos de textos e gêneros 
textuais a uma abordagem mais relevante e crítica para a realidade do alunado, 
como se observa nas pesquisas de Marcuschi (2008), Cristóvão (2010), 
Coscarelli (2016), Kersch (2014, 2015, 2016) e Paiva (2013, apud MARTINS, 2017, p. 
106). 
A partir desse aporte teórico, Martins (2017), notou que, ao utilizar alguns 
gêneros textuais que circulam no ambiente digital, diversas áreas podem ser 
exploradas na sala de aula. Mas o docente, infelizmente, ainda deixa de usá-los por 
diversos motivos: falta de acesso, falta de formação apropriada ou até mesmo por 
falta por inabilidade medo de introduzir essas ferramentas ao ensino. E de acordo com 
Martins (2017), outro ponto que pode ser destacado é que, com o avanço e 
popularização da internet e das tecnologias relacionadas ao texto, antes circunscrito 
 
22 
majoritariamente à linguagem verbal e ao impresso, ele passa a dialogar com 
informações multimídia, isto é, as informações passaram a ser transmitidas através 
de diversos meios (multimeios), por exemplo, som, hipertextos, gráficos, infográficos, 
vídeo, etc. 
Por isso é que defendemos a necessidade de utilizar e avaliar o ambiente 
digital e os gêneros que ali circulam, a fim de desenvolver uma didática que 
possa usar em sala de aula os gêneros do ambiente digital como ferramenta 
de aprendizagem no ensino da língua materna, isto é, adotar esses gêneros 
como mais um material didático para auxiliar na formação de futuros 
professores no processo ensino-aprendizagem. (MARTINS, 2017, p. 106). 
Esta proposta está sustentada pelas concepções interacionistas acerca dos 
gêneros textuais (BRONCKART, 2001; SCHNEUWLY; DOLZ, 2004) e dos 
multiletramentos (COPE & KALANTZIS, 2010; STREET, 2008), como também, 
ressalta o estudo feito por Paiva (2013) sobre as habilidades de leitura e letramentos 
no processamento de leitura em ambientes digitais, haja vista este ter nos orientado 
na análise das respostas dos alunos quanto às habilidades complexas de leitura, 
empreendidas durante nossa proposta didática. Segundo Paiva (2013), ao tratar das 
habilidades de leituras de infográficos digitais, não há diferença entre as habilidades 
de leitura para ler no meio impresso e digital, mas sim, uma ocorre ampliação do uso 
da linguagem decorrente do advento do meio digital que exige do leitor mais 
habilidades de leitura em decorrência de três fatores: novos modos de localização de 
informação; novas exigências de relacionamento de informações e diferenças no 
modo como usamos informações. Para Paiva (2013), não concebemos esquemas 
cognitivos totalmente novos para uma atividade de linguagem, mas esquemas pré-
concebidos reformulados, pois compreendemos a linguagem como um instrumento 
moldado pelo sociointeracionismo histórico de Vygotsky (1984). 
Assim, Paiva (2013, p. 73-74) propõe três habilidades complexas necessárias 
para a leitura em qualquer meio: 
• navegar-localizar: habilidades interligadas e interdependentes, pois é preciso 
saber navegar pelas tecnologias do impresso e digital para localizar informações; 
• relacionar-avaliar: nos textos, há diferentes informações em diferentes modos, 
sendo necessário saber relacionar essas informações e avaliá-las como corretas, 
pertinentes e adequadas ao seu propósito, isso tanto no meio impresso quanto ao 
digital; 
 
23 
• compreender-usar: ler um texto exige a utilização do que se compreendeu 
anteriormente para poder compreender uma informação na sequência da leitura, 
recursivamente. (PAIVA, 2013, apud MARTINS, 2017, p. 106). 
10 CONCEPÇÃO DE LÍNGUA/LINGUAGEM, LETRAMENTO, 
MULTILETRAMENTOS E O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA 
 
Fonte: slideplayer.com.br 
O sistema educacional tem tido dificuldades em propiciar o desempenho das 
habilidades indispensáveis para um aprendizado significativo. Para Bitencourt (2021). 
Nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs -1998) encontram-se diversas 
reflexões sobre a formulação do ensino da língua portuguesa (LP), de um lado, as 
pesquisas revelam os registros do fracasso escolar e indicam a impossibilidade de um 
ensino tradicional frente à situação atual, já que muitas práticas pedagógicas estão 
distantes de situações reais de uso da língua, de outro, a realidade vivenciada na 
educação brasileira, apesar do trabalho que vem sendo realizado, atesta que os 
avanços só são alcançados a longo prazo, e existe uma constante busca de respostas 
para esse fracasso escolar. 
Conforme constam nos PCNs, no que se refere às discussões a respeito 
desse problema, a questão da leitura e da escrita foi apontada como a 
principal causa desse fracasso. Diante disso, faz-se necessária a 
reestruturação do ensino da língua portuguesa, com o objetivo de garantir, de 
fato, a aprendizagem de estudantes e o direito ao ensino. Os Parâmetros 
Curriculares Nacionais apresentam uma síntese do que foi possível aprender 
e avançar através das discussões promovidas sob a forma de reorientação 
curricular ou de projetos de formação de professores em serviço, com o intuito 
de revisar as práticas tradicionais de alfabetização e de ensino da língua 
portuguesa, bem como das produções científicas mais recentes nas áreas da 
 
24 
linguística aplicada, da análise do discurso e da gramática textual, 
principalmente. (BITENCOURT, 2021, p. 23). 
Por um lado, os Parâmetros Curriculares Nacionais retratam as diretrizes que 
abordam os currículos e seus conteúdos mínimos, de forma que seja garantida uma 
informação básica comum, independente das diferenças que há de uma região para 
a outra e também as diferenças culturais e políticas. Por outro, percebe-se que, entre 
os docentes e o sistema de ensino, há um obstáculo e/ou dificuldade em abrir mão de 
um ensino alienado em prol de um ensino voltado para a investigação de fenômenos 
linguísticos, como vem sendo indicado por vários campos da linguística. 
O ensino da língua portuguesa sempre foi motivo de debate entre os que 
trabalham na prática e os que são pesquisadores, pois há uma discrepância entre 
professores de sala de aula e professores pesquisadores. De acordo com Bitencourt 
(2021), durante décadas houve mudanças na educação brasileira, entretanto, a forma 
de hierarquizar e elitizar ainda perduram através do predomínio da norma culta da 
língua, reflexo de concepções de língua/linguagem que se estabeleceram ao longo do 
tempo no processo de ensino e aprendizagem brasileiro. 
10.1 Concepção de língua/linguagem 
Entende-se que as concepções da língua/linguagem foram e ainda são 
utilizadas como apoio para o ensino da língua materna na escola. Geraldi (2004, apud 
BITENCOURT, 2021, p. 23) indica três concepções de linguagem que orientam e 
direcionam a prática pedagógica de professores de língua portuguesa: a linguagem 
como expressão. Diversos estudiosos já discutiram a ligação entre as concepções e 
o encadeamento para o ensino de língua, mas é a forma como se vê a linguagem que 
indica o caminho e define os passos a serem percorridos por professores. De acordo 
com Araújo, Sousa Filho e Lima (2018, apud BITENCOURT, 2021, p. 24), a primeira 
concepção, a da linguagem como expressão do pensamento, considera a expressão 
construída na mente dos indivíduos, por isso, o que as pessoas dizem é reflexo do 
que está em suas mentes. Logo, a enunciação é vista como um ato individual e 
monológico. 
[n]essa perspectiva, o ensino de língua prioriza os aspectos normativos e a 
aula de língua é confundida com aula de gramática, havendo, portanto, a 
ênfasedo trabalho sob a forma em detrimento do uso. Assim, o profissional 
que se pauta nessa concepção focará, em sua prática, a gramática 
 
25 
normativa/prescritiva como ponto principal do processo ensino e 
aprendizagem (LIMA, 2018, apud BITENCOURT, 2021, p. 24). 
Em consonância com Bitencourt (2021), pode-se perceber que essa concepção 
é pautada na escrita da norma culta, e tem o texto como ferramenta para ensinar o 
que está certo ou errado nessas regras, deixando de lado a oralidade, um eixo 
importante para o desenvolvimento de habilidades cognitivas. Soares (1998, apud 
BITENCOURT, 2021, p. 24), mostra que essa concepção caracterizou o ensino de 
língua nas escolas durante muito tempo como um sistema fechado, deixando 
transparecer que a linguagem escrita deveria ser encarada como algo inacessível ou 
até mesmo imutável, daí essa primeira concepção da linguagem ter tanta 
aceitabilidade nas escolas durante um longo período. 
Entende-se assim que o conhecimento e o esclarecimento sobre uma 
concepção de linguagem e língua podem transformar a prática do trabalho 
pedagógico em sala de aula quando falamos em ensino da língua. Por isso, 
é de extrema importância o conhecimento e o domínio das teorias sobre a 
linguagem. (BITENCOURT, 2021, p. 24). 
Na segunda concepção, a linguagem como instrumento de comunicação e o 
ensino descritivo da língua, a linguagem é vista como um código pronto (ARAÚJO; 
SOUSA FILHO; LIMA, 2018, apud BITENCOURT2021, p. 25) à disposição dos 
usuários, que a utilizarão como mero instrumento de comunicação. Por meio desta 
compreensão de linguagem, de acordo com Travaglia, a língua é vista como um 
código, isto é, um conjunto de signos que se combinam segundo regras (2002, p. 22). 
Dessa maneira, para a comunicação ser efetiva, é necessário que o emissor e o 
receptor dominem os códigos. 
[...] essa noção de linguagem desvincula a língua de suas características 
mais importantes: ‘de seu aspecto cognitivo e social’, ou seja, para essa 
concepção o falante tem em sua mente uma mensagem a transmitir a um 
ouvinte, isto é, informações que quer repassar a outro. Para isso, ele 
transporta essa mensagem para um código (codificação) e a remete para o 
outro através de um canal. Essa visão levou ao estudo da língua enquanto 
código virtual, isolado de sua utilização (MARCUSCHI, 2008, apud 
BITENCOURT2021, p. 25). 
 
Nessa perspectiva, para Bitencourt (2021), o professor que utiliza tal 
concepção de linguagem no ensino e aprendizagem da língua portuguesa garante ao 
aluno o acesso ao sistema alfabético e à gramática para recorrer a esse código, às 
vezes, como emissor, ou seja, codificador, outras vezes como recebedor, 
 
26 
decodificador, e é essa concepção de linguagem que determina o ensino da língua 
como sendo descritivo. Segundo Soares (1998, apud BITENCOURT2021, p. 25), é a 
partir da década de 1970 que se passa a tratar, no Brasil, a língua nacional nas 
escolas como “instrumento de comunicação”. A partir dessa concepção, que tem 
vínculo com a teoria da comunicação, o ensino de língua portuguesa respaldou-se 
convenientemente desse código. Dessa forma, Bitencourt (2021), afirma que 
predominou a tendência gramatical positivista, a gramática descritiva, prevalecendo 
as descrições sintáticas e morfológicas e as atividades voltadas para a produção 
textual embasadas em três tipologias: narração, dissertação e descrição. 
Com o progresso de novos conhecimentos na chamada tendência linguística, 
como a sociolinguística, a análise do discurso, a semântica e a linguística textual, 
intituladas como linguística discursiva, o ensino de LP passa por mudanças de 
perspectivas de metodologias. No entanto, as mudanças não perpassam o tradicional 
e, tampouco, dão conta do método interacionista. 
Diante dessa perspectiva, para Bitencourt (2021), diz que as correntes 
existentes a partir dos anos 1980 contribuíram para uma mudança significativa na 
concepção de linguagem, dando, assim, nova direção para a prática no ensino da 
língua portuguesa. A linguagem, com as contribuições de Mikhail Bakhtin, passa a ser 
vista como social e de caráter dialógico. De forma interacional, a língua não é mais 
usada apenas para a comunicação, mas também para estabelecer os processos 
educacionais. Com os estudos existentes a partir da linguística textual, da análise do 
discurso, da sociolinguística e, principalmente, da linguística aplicada, é que se passa 
a considerar, de fato, que as manifestações de uma língua, escrita ou oral, estão 
inseridas em um processo de construção interativa. Estes estudos estão no esteio da 
concepção que vê a linguagem como processo de interação. 
Na concepção defendida por Bakhtin (2012), tem-se uma visão enunciativa e 
discursiva da linguagem, visto que ela é entendida não como uma categoria 
gramatical abstrata, mas sim como um fato social, fundamentalmente 
saturada por posicionamentos axiológicos. Sob essa perspectiva, o autor 
opõe-se à noção de língua tal como era concebida no objetivismo abstrato, 
na qual havia dissociação entre o social e o individual, e no subjetivismo 
idealista, ao passo que desenvolve uma filosofia de linguagem pautada no 
aspecto comunicativo e dialógico, abordando a língua em sua prática viva na 
comunicação social, considerando sua realização mediante a interação 
verbal e social dos locutores (ARAÚJO, 2018, apud BITENCOURT, 2021 p. 
26). 
 
27 
Na compreensão de Bitencourt (2021), a linguagem não é formulada no 
individualismo, mas incorporada ao mundo social e histórico dos sujeitos, isto é, do 
sujeito e dos outros e para os outros e com os outros é que ela se constitui, assim, 
não há um sujeito pronto, acabado, na interação, mas um sujeito que se completa e 
se constrói nas suas falas (BAKHTIN, 2017, p. 113). A enunciação, em si, não pode 
ser encarada como individual, unicamente, deve ser considerada de natureza social. 
Assim, sobre a linguagem as ideias de Doretto e Beloti se comunicam com as ideias 
de Bakhtin quando afirmam que 
[...] assim, a linguagem é vista como processo de interação, a língua é usada 
não apenas para a comunicação, mas, também, para estabelecer a interação 
social (agir sobre agir entre). O indivíduo realiza ações, atua sobre o 
interlocutor. Considera-se os contextos social, histórico e ideológico. A 
linguagem é, pois, um lugar de interação humana, de interação comunicativa 
pela produção de efeitos de sentidos entre interlocutores, em uma dada 
situação de comunicação e em um contexto sócio-histórico e ideológico 
(DORETTO E BELOTI 2011, apud BITENCOURT, 2021 p. 26). 
Ainda segundo as autoras citadas por Bitencourt (2021), a gramática, nessa 
concepção de linguagem, torna-se internalizada, ou seja, para um falante, é primordial 
o domínio das regras nessa interação com seus interlocutores, nas situações reais de 
comunicação. Para essa perspectiva, o ensino não é baseado na gramática normativa 
e nem na descritiva, mas em uma gramática contextualizada, que tem o texto como 
objeto de estudo. E, como o predomínio está nas interações verbais sociais, o estudo 
é considerado a partir dos gêneros discursivos. 
Franchi, em a Linguagem – atividade constitutiva, procura compreender as 
várias concepções de linguagem, apesar de negar algumas, fazendo uma seleção 
destas e indicando seu ponto de vista particular, afirmando que a linguagem deve ser 
reconhecida como atividade constitutiva. Nesse contexto, o teórico afirma que 
[...] certamente a linguagem se utiliza como instrumento de comunicação, 
certamente comunicamos por ela, aos outros, nossas experiências, 
estabelecemos por ela, com os outros, laços 'contratuais' por que interagimos 
e nos compreendemos, influenciamos os outros com nossas opções relativas 
ao modo peculiar de ver e sentir o mundo, com decisões consequentes sobre 
o modo de atuar nele. Mas, se queremos imaginar esse comportamento como 
uma ‘ação’ livre e ativa e criadora, suscetível de pelo menosrenovar-se 
ultrapassando as convenções e as heranças, processo em crise de quem é 
agente e não mero receptáculo da cultura, temos então que apreendê-la 
nessa relação instável de interioridade e exterioridade, de diálogo e solilóquio: 
antes de ser para a comunicação, a linguagem é para a elaboração; e antes 
de ser mensagem, a linguagem é construção do pensamento; e antes de ser 
veículo de sentimentos, ideias, emoções, aspirações, a linguagem é um 
processo criador em que organizamos e informamos as nossas experiências. 
(FRANCHI, 1992, apud BITENCOURT, 2021 p. 26). 
 
28 
Para o autor, a linguagem é utilizada como instrumento de comunicação, pois 
comunicamos por ela nossas experiências e estabelecemos laços porque interagimos 
e influenciamos os outros com nossas opções, nosso modo de ver e sentir o mundo e 
de atuar nele. Franchi (1992) vê a linguagem como um processo criador no qual 
organizamos e informamos nossas experiências. Conforme explica, se queremos 
esse comportamento como ação livre, ativa e criadora, ultrapassando as convenções, 
há que se ter a apreensão da linguagem numa relação instável de interioridade e 
exterioridade, de diálogo e solilóquio. Afirma, ainda, que a linguagem não é apenas 
instrumento de interação entre os homens, é instrumento de intervenção e da dialética 
entre cada um de nós e o(s) outro(s). É na interação de um “eu” com o “tu” que nos 
organizamos e nos mantemos como seres que significam. A escolha das palavras dos 
enunciados, o ritmo, o tom, a intensidade da voz são aspectos que interferem, positiva 
ou negativamente, na interlocução. 
Dessa forma, entende-se que, por uma concepção de linguagem como 
processo de interação, é necessário, de uma maneira ou outra, circular por todas as 
concepções e utilizar aquilo que é importante e diz respeito ao objetivo de ensino. Rios 
afirma que a linguagem se constitui no eixo de tudo porque 
[...] é pela linguagem que nos expressamos em nossas interações sociais, 
construímos nossas significações, nossos discursos – nossas 
representações, ou seja, a linguagem é condição essencial de constituição 
do sujeito. O sujeito se dá na e pela linguagem. De acordo com Bakhtin 
(1990), o sujeito se constitui como tal à medida que interage com os outros, 
suas produções discursivas resultam deste mesmo processo no qual o sujeito 
internaliza a linguagem e constitui-se como ser social. Isto implica que não 
há um sujeito pronto, que entra em interação, mas um sujeito se completando 
e se construindo nas suas falas e nas falas dos outros (RIOS, 2005, apud 
BITENCOURT, 2021 p. 27). 
As ideias de Rios (2005) nos permitem pensar que a linguagem é a condição 
social do sujeito. Um sujeito que vai se construindo ao adotar determinados valores 
através do dialogismo entre o eu e os outros, um sujeito que vai sendo interpelado 
pelas ideologias, não na sua individualidade, mas socialmente. Nessa perspectiva, a 
autora diz que a complexidade do pensamento Bakhtiniano concebe o eu e o outro 
como inseparáveis porque tem como elemento articulador a linguagem. Isto posto, 
fica claro meu posicionamento no que se refere ao trabalho com a língua portuguesa 
e à clareza de que há uma grande necessidade de se ter conhecimento desse 
elemento articulador que é a linguagem, de compreender que o diálogo revela uma 
forma de ligação entre a linguagem e a vida. Ainda segundo Rios (2005), a língua não 
 
29 
é um sistema fechado, e a forma como se fala e se apropria das palavras dos outros 
coloca também os interlocutores como participantes do processo de constituição do 
sujeito. Dessa maneira, para prosseguir com a compreensão das concepções citadas 
anteriormente, vejamos a seguir a concepção de Letramento. 
10.2 Concepção de letramento 
Ao abordar a palavra letramento, é necessário pensar na aceitação desta nos 
meios acadêmicos, apesar de que o lugar onde ela deveria ser conhecida e debatida 
é na escola. No entanto, essa movimentação devida sobre a concepção de letramento 
ainda perpassa o significado de alfabetização, haja vista que a compreensão do 
primeiro termo está intrinsecamente em junção com o segundo, pelo próprio nome 
(letramento) remeter ao processo de leitura e de escrita e porque quem é alfabetizado 
recebe a condição de ser leitor. Compreende-se que a pessoa alfabetizada é aquela 
capaz de ler e escrever corretamente. Nesse sentido, na maioria das vezes, as 
pessoas tomam como sinônimos as palavras alfabetismo e letramento. A 
alfabetização tem um sentido mais restrito, no qual o indivíduo alfabetizado se 
apropria do sistema da escrita, do alfabeto e da ortografia. Letramento, por sua vez, 
tem uma acepção bem mais ampla, difícil de definir com precisão, uma vez que se 
trata de um fenômeno que envolve uma gama de conhecimentos, habilidades, 
capacidades, valores, usos e funções sociais da leitura e da escrita (SOARES, 1998). 
Segundo a autora, a alfabetização é a ação de alfabetizar, codificar em língua escrita 
e decodificar a língua escrita, enquanto o letramento é o processo de inserção do 
usuário da língua em prática sociais de leitura e escrita que o capacite a fazer uso 
competente da leitura e da escrita. Por isso, Soares afirma: 
Por outro lado, o que não é contraditório, é preciso reconhecer a possibilidade 
e necessidade de promover a conciliação entre essas duas dimensões da 
aprendizagem da língua escrita, integrando alfabetização e letramento, sem 
perder, porém, a especificidade de cada um desses processos, o que implica 
reconhecer as muitas facetas de um e outro e, consequentemente, a 
diversidade de métodos e procedimentos para ensino de um e de outro, uma 
vez que, no quadro desta concepção, não há um método para a 
aprendizagem inicial da língua escrita, há múltiplos métodos, pois a natureza 
de cada faceta determina certos procedimentos de ensino, além de as 
características de cada grupo de crianças, e até de cada criança, exigir 
formas diferenciadas de ação pedagógica. (SOARES, 1998, apud 
BITENCOURT, 2021 p. 29). 
 
30 
Logo, é preciso ter a compreensão das duas dimensões de aprendizagem e 
fazer uso consciente tanto da alfabetização quanto do letramento para o processo de 
ensino e aprendizagem da língua. Saber diferenciar as especificidades de cada uma 
das duas dimensões promove uma ação pedagógica mais eficiente. Segundo Rojo 
(2012), uma parcela significativa da população brasileira com acesso à escolaridade 
não é de leitores. Além disso, a população letrada pertence às elites intelectuais. Para 
reflexão sobre essas ideias, Rojo afirma: 
A escolarização, no caso da sociedade brasileira, não leva à formação de 
leitores e produtores de textos proficientes e eficazes e, às vezes, chega 
mesmo a impedi-la. Ler continua sendo coisa das elites, no início de um novo 
milênio. Isso se dá em boa parte, porque as práticas didáticas de leitura no 
letramento escolar não desenvolvem senão uma pequena parcela das 
capacidades envolvidas nas práticas letradas exigidas pela sociedade 
abrangente: aquelas que interessam à leitura para o estudo na escola, 
entendido como um processo de repetir, de revozear falas e textos de 
autoridade – escolar, científica – que devem ser entendidos e memorizados 
para que o currículo se cumpra. Isto é feito, em geral, em todas as disciplinas, 
por meio de práticas de leitura lineares e literais, principalmente de 
localização de informação em textos e de sua repetição ou cópia em 
respostas de questionários, orais ou escritos. Mas ser letrado e ler na vida e 
na cidadania é muito mais que isso: é escapar da literalidade dos textos e 
interpretá-los, colocando-os em relação com outros textos e discursos, de 
maneira situada na realidade social; é discutir com os textos, replicando e 
avaliando posições e ideologias que constituem seus sentidos; é, enfim, 
trazer o texto para a vida e colocá-lo em relação com ela. Mais que isso, as 
práticas de leitura na vida são muito variadas e dependentes de contexto,cada um deles exigindo certas capacidades leitoras e não outras (ROJO, 
2004, apud BITENCOURT, 2021 p. 29). 
Para Rojo (2004), a escola é repetidora dessa desigualdade entre letrados e 
não letrados através das práticas de valoração dos textos/gêneros escolares. E, para 
que haja mudança dessa prática, é importante que a escola leve em consideração a 
gama diversificada de textos/gêneros discursivos que circulam na sociedade, além de 
avaliar as posições ideológicas diante do contexto em que o indivíduo está inserido. 
O ato de ler não pode ser desassociado das práticas sociais diante das novas 
exigências da sociedade, é preciso repensar o ensino da leitura e da escrita, fazendo 
do cidadão protagonista da sua própria história, inserindo-o no contexto social em que 
vive. Comungando das ideias de Rojo (2004), o Ministério da Educação Secretaria de 
Educação Básica entende a alfabetização 
[...] como o processo específico e indispensável de apropriação do sistema 
de escrita, a conquista dos princípios alfabético e ortográfico que possibilita 
ao aluno ler e escrever com autonomia. Entende-se letramento como o 
processo de inserção e participação na cultura escrita. Trata-se de um 
processo que tem início quando a criança começa a conviver com as 
 
31 
diferentes manifestações da escrita na sociedade (placas, rótulos, 
embalagens comerciais, revistas, etc.) e se prolonga por toda a vida, com a 
crescente possibilidade de participação nas práticas sociais que envolvem a 
língua escrita (leitura e redação de contratos, de livros científicos, de obras 
literárias, por exemplo). Esta proposta considera que alfabetização e 
letramento são processos diferentes, cada um com suas especificidades, mas 
complementares e inseparáveis, ambos indispensáveis. (BRASIL, 2008, 
apud BITENCOURT, 2021 p. 30). 
Pode-se perceber que o que defende o Ministério da educação é o mesmo 
defendido pelos teóricos em relação à alfabetização e letramento. Na diferença entre 
alfabetização e letramento, a primeira se confirma quando o indivíduo se apropria do 
sistema de escrita, seja na escola, seja por outros meios, além de codificar e 
decodificar o código da língua escrita e a forma como ela é estruturada. Já o 
letramento é um processo que mostra como a língua é usada no dia a dia e se refere 
aos usos e sentidos que os textos adquirem na vida social dos usuários da língua. 
Sendo assim, letramento e alfabetização são indispensáveis. É importante alfabetizar 
letrando, pois o ato da leitura e da escrita não são realizados mecanicamente, são 
associados às práticas sociais. Magda Soares diz que o conceito de letramento 
considera que um indivíduo pode ser analfabeto, isto é, não saber ler e nem escrever, 
mas ser de algum modo letrado (SOARES, 2004, p. 24). As crianças, segundo a 
autora, chegam à escola analfabetas porque não aprenderam a ler e nem escrever, 
mas já estão fazendo parte do mundo do letramento. 
10.3 Letramento autônomo e letramento ideológico 
Para Rojo (2009), a clareza sobre a diferenciação entre letramento e 
alfabetização estabelecida com os novos estudos de letramento está no fato de o 
letramento poder ser dividido em dois sentidos: o sentido autônomo, que olha o 
letramento independente do contexto social, e o sentido ideológico, que vê as práticas 
de letramento como indissociáveis, ligadas às estruturas culturais e de poder. Soares 
(2004) chama essa divisão do letramento de “dimensões”: a dimensão individual e a 
dimensão social. Segundo a autora, 
[...] quando o foco é posto na dimensão individual, o letramento é visto como 
um atributo pessoal, parecendo referir-se à ‘simples posse individual das 
tecnologias mentais complementares de ler e escrever’. Quando o foco se 
desloca para a dimensão social, o letramento é visto como fenômeno cultural, 
um conjunto de atividades sociais que envolvem a língua escrita. Na maioria 
das definições atuais de letramento, uma ou outra dessas duas dimensões é 
priorizada: põe-se ênfase ou nas habilidades individuais de ler e escrever, ou 
 
32 
nos usos, funções e propósitos da língua escrita no contexto social (SOARES, 
2004, apud BITENCOURT, 2021 p. 31). 
A definição das duas dimensões, a individual e a social, é complexa, de acordo 
com a autora. Identificar as que estão atrás de diferentes definições é apenas o início 
para enfrentar um problema maior, que é o da definição adequada de letramento. Isto 
porque é necessário levar em consideração a complexidade e a heterogeneidade das 
dimensões individual e social. Na dimensão social, letramento é o que as pessoas 
produzem, fazem com as habilidades de leitura e escrita em um contexto específico e 
como essas habilidades se relacionam com os valores e práticas sociais (SOARES, 
2004). Assim, nega-se a afirmativa de que o letramento é o conjunto de habilidades 
individuais, afirmando que o letramento é o conjunto de práticas sociais que tem uma 
certa ligação com a leitura e a escrita. 
Dessa forma, os indivíduos se envolvem em seu contexto social. Entretanto, há 
também declarações desarmônicas em relação à dimensão social do letramento: uma 
interpretação progressista “liberal”. De acordo com essa perspectiva das relações 
entre letramento e sociedade, as habilidades de leitura e escrita não podem ser 
dissociadas de seus usos. E assim surge o termo “letramento funcional”, definido 
como conhecimentos e habilidades de leitura e escrita que tornam uma pessoa capaz 
de “[...] engajar-se em todas aquelas atividades em que o letramento é exigido em sua 
cultura” (SOARES, 2004). 
Bevilaqua (2013) faz uma reflexão em relação ao letramento e aos 
multiletramentos. Segundo a autora, em 1994 alguns teóricos de três países reuniram-
se em Nova Londres para discutir os problemas pelos quais o sistema de ensino 
anglo-saxão estava passando. Desse encontro, surgiu o “manifesto programático”, 
construído em conjunto, cujas temáticas eram a crescente diversidade linguística e 
cultural e a multiplicidade de canais e meios (modos semióticos) de comunicação 
(resultados das novas tecnologias). Esses dois temas foram responsáveis pelo prefixo 
“multi” da denominação multiletramentos. A autora afirma que 
Foi por meio de estudos fundamentados, metodologicamente, na etnografia 
(em diferentes níveis) que os NLS elaboraram concepções de letramento 
autônomo e letramento ideológico [...] também termos-chave para esse 
campo teórico. O letramento autônomo corresponde a um modelo de 
letramento que desconsidera o contexto social, pois está centrado no ensino 
de aquisição de habilidades e fundamentado em noções de neutralidade e 
universalidade do conhecimento a ser transmitido. Segundo esse modelo, 
baseado em uma visão de padrão (padronização), 32 o letramento, por si 
mesmo, ou seja, autonomamente, é capaz de produzir efeitos sobre práticas 
 
33 
cognitivas e sociais, sendo desnecessário considerar as condições sociais, 
culturais e econômicas inerentes à vida social. Para desafiar o modelo de 
letramento autônomo, os NLS propõem o modelo de letramento ideológico, 
segundo o qual, na prática, o letramento varia de um contexto a outro. Esse 
modelo compreende letramento como uma prática social e não simplesmente 
uma habilidade técnica e neutra. (BEVILAQUA, 2013, apud BITENCOURT, 
2021 p. 31). 
Portanto, a definição de letramento para o termo no plural – letramentos – foi 
reafirmada pelo fato de serem múltiplos, determinados pelo poder e por variarem no 
tempo, no espaço e de acordo com o contexto. Diante dessa perspectiva, surgiram, 
com o desdobramento dos Novos Estudos do Letramento (NLS), as categorias 
analíticas dos letramentos autônomos e dos ideológicos. O letramento autônomo 
concentra uma noção técnica e não leva em consideração o contexto social, tendo 
como alicerce a intelectualidade. Além disso, as habilidades de leitura e escrita são 
isentas de valores e baseadas em uma ideologia que tem a sociedade centrada na 
escrita erelacionada com o progresso e com a mobilidade social. 
Segundo Street, há problemas no termo “letramento ideológico”, visto que ele 
está imbuído de pressuposições ideológicas e políticas (2003 apud BEVILAQUA, 
2013, p. 104). Nesse sentido, o grupo dos Novos Estudos do Letramento definiram os 
termos “prática de letramento” e “evento de letramento”. A prática de letramento foi 
definida como um modo de ver a cultura mais ampla da forma de pensar a prática da 
leitura e da escrita em contextos culturais. Já o evento de letramento tem sido definido 
como qualquer ocasião em que o papel da escrita é fundamental (HEATH, 1982; 
BARTON; HAMILTON, 1998; STREET, 2003, p. 78 apud BEVILAQUA, 2013, p. 104). 
Diante disso, passo à verificação dos conceitos dos multiletramentos que abarcam os 
letramentos em geral. 
10.4 Multiletramentos 
O Grupo de Nova Londres foi o primeiro a criar o conceito de multiletramentos, 
debatido em 1996. Eles associaram a multimodalidade e a multiculturalidade para criar 
esse termo/conceito novo que caracteriza o letramento de caráter multimodal e 
multicultural. Assim sendo, Rojo (2012), em relação aos multiletramentos, considera 
importantes dois tipos de multiplicidade: cultural das populações e semiótica de 
constituição de textos. Essa multiplicidade indica, para a mistura de culturas, segundo 
Canclini (2008), que as produções culturais letradas circulam em nossa sociedade e 
 
34 
são constituídas a partir de um conjunto de textos heterogêneos de diferentes 
letramentos. Nessa perspectiva, o autor diz que é necessário introduzir gêneros do 
discurso de novas tecnologias, novas mídias, variadas linguagens, pois entende-se 
que os textos produzidos a partir de muitas linguagens que exigem capacidades, 
práticas de compreensão e produção delas para determinar uma definição são 
descritos como multimodais ou multissemióticos. 
Rojo (2012) ressalva que são fundamentais novas ferramentas de vídeo e 
áudio, tratamento da imagem, edição e diagramação, já que as escritas manuais e 
impressas por si só não são suficientes para o estabelecimento dos multiletramentos. 
E completa dizendo que a transgressão estabelecida pelas relações de poder são 
características dos multiletramentos: A estudiosa afirma ainda que 
A lógica interativo-colaborativa das novas ferramentas dos (multi) 
letramentos, no mínimo dilui e no máximo permite fraturar ou 
subverter/transgredir as relações de poder preestabelecidas, em especial as 
relações de controle unidirecional da comunicação e da informação (da 
produção cultura, portanto) e da propriedade dos ‘bens culturais imateriais’ 
(ideias, textos, discursos, imagens, sonoridades). Não é preciso me alongar 
sobre a intensa luta que tem sido travada a respeito do (não) controle da 
internet e de seus textos. (ROJO, 2012, apud BITENCOURT, 2021 p. 33). 
De acordo com Rojo, a alteração das relações que direcionam a comunicação 
e a informação é diluída à medida que as mídias digitais, como ferramenta dos 
multiletramentos, permitem uma interação e a colaboração produtiva. Nessa linha de 
pensamento, Bevilaqua (2013) compreende que o letramento é objeto de estudo dos 
NLS e dos multiletramentos, sendo que este último apresenta um ajustamento teórico 
que se diferencia do letramento. Os estudos estão centrados no ensino do letramento, 
ou seja, dos multiletramentos. Assim, os teóricos elaboraram conceitos-chave diante 
das novas e profundas mudanças estabelecidas pelo “novo capitalismo” e pela ampla 
“tecnologização” que o acompanha. Assim, Bevilaqua nos mostra que 
O conceito de Design de sentidos é o eixo estruturador de toda a teoria dos 
Multiletramentos, pois é por meio desse conceito que a teoria instanciará 
concepções de construção de sentido, interesse, agenciamento e 
multimodalidade, primordiais para o ensino requerido na contemporaneidade 
e explicitadas no decorrer do texto. Segundo Cope e Kalantzis (2009, p. 
1756), o conceito de Design fora instituído com o propósito de contrapor-se a 
concepções tradicionais de ensino pautadas em uma visão estática e 
monomodal da linguagem (foco na escrita). Design institui uma concepção 
dinâmica de representação (de linguagem, de aprendizagem, de mundo), 
sendo definido como ato de construção de sentido. (BEVILAQUA, 2013, apud 
BITENCOURT, 2021 p. 33). 
 
35 
 Portanto, tendo em vista essas ponderações de Bevilaqua sobre os 
multiletramentos, tem-se informações para a compreensão de que, na sociedade 
atual, a teoria dos multiletramentos contribui efetivamente para o ensino da língua 
portuguesa, já que contrapõe as concepções tradicionais de ensino. Assim sendo, 
para os teóricos citados, é excelente o conceito de “design”, por apresentar uma dupla 
e feliz coincidência de sentidos: estrutura (sistemas, formas e convenções de sentido) 
e ato de construção de sentido (processo criativo pelo qual o sujeito, definido como 
meaning-maker, ou produtor de sentido, constrói e representa sentidos, passando a 
agente, designer de sentido e não simples receptor de habilidades e competências). 
Bevilaqua afirma que Design 
[...] então, se refere ao modo como as pessoas fazem uso de recursos de 
significação disponíveis em um dado momento em um ambiente específico 
de comunicação para realizar seus interesses. Da mesma forma como são 
teorizados pelos NLS, os sentidos são constituídos por dimensões 
socioculturais e ideológicas, que variam enormemente de um contexto a 
outro. Por isso, o conceito de Design é, segundo essa teoria, central para a 
constituição de um currículo escolar atualizado com as novas tendências 
sociais. (BEVILAQUA, 2013, apud BITENCOURT, 2021 p. 34). 
De acordo com o que foi exposto, a teoria dos multiletramentos vem ao 
encontro da teoria de Bakhtin, que remete à compreensão de que o que importa na 
comunicação é a interação dos significados das palavras e seu conteúdo ideológico, 
bem como as condições de produção e da interação locutor/interlocutor. Logo, não 
existe discurso sem sujeito, nem sujeito sem ideologia. Há uma relação entre a 
linguagem e o mundo, e essa relação somente é possível porque existe a intervenção 
da ideologia (modo de funcionamento imaginário) e o indivíduo, que, norteado pela 
ideologia, torna-se sujeito de seu próprio discurso. Com isso, a linguagem, inserida 
em um contexto social, histórico e cultural, realiza-se e faz sentido. Bakhtin (1992) 
afirma que a alteridade se constitui no ser humano, e nessa constituição o “outro” é 
primordial, visto que esse sujeito se constitui na e através da interação, reproduzindo 
na prática e na fala o contexto social e imediato. Nessa perspectiva, Bevilaqua faz 
uma contribuição dizendo que 
[...] o Design é constituído por três aspectos: Available Designs (recursos 
culturais e contextuais para a construção do sentido, incluindo modo, gênero 
e discurso); Designing (processo de construção e recontextualização da 
representação do mundo por meio dos Available Designs) e Redesigned (o 
mundo transformado em novos Available Designs, que instanciam novos 
sentidos). Os autores esclarecem que esses elementos não constituem um 
arcabouço teórico estático para a prática de ensino; pelo contrário, o Design 
 
36 
representa o sentido como sempre movente, contra as noções inertes de 
aquisição e competência. [...]. No processo de Design acima, figuram como 
pano de fundo a criatividade, o dinamismo, a inovação, o interesse e a 
motivação do produtor de sentido. Essas categorias são eminentemente 
culturais e ideológicas, pois estão relacionadas com diferentes visões de 
mundo de diferentes sujeitos em diferentes contextos. Essa visão do 
processo semiótico, definida como prospectiva, coloca a reapropriação 
criativa do mundo no centro da representação e, portanto, do processo de 
aprendizagem. (BEVILAQUA, 2013, apud BITENCOURT, 2021 p. 34). 
Portanto, o sujeito de que fala a teoria dos multiletramentos é um sujeito que 
não vive um processo de construção

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