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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE DIREITO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO GABRIELLA MEDEIROS MARCOLINO DA SILVA CONSTRIÇÃO DE BENS PELO PODER PÚBLICO: ANÁLISE SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DA RETENÇÃO DE VEÍCULOS AUTOMOTORES PELO NÃO PAGAMENTO DO IPVA Natal/RN 2019 GABRIELLA MEDEIROS MARCOLINO DA SILVA CONSTRIÇÃO DE BENS PELO PODER PÚBLICO: ANÁLISE SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DA RETENÇÃO DE VEÍCULOS AUTOMOTORES PELO NÃO PAGAMENTO DO IPVA Monografia apresentada junto ao Curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador(a): Profª. Drª. Michele Nóbrega Elali Natal/RN 2019 Silva, Gabriella Medeiros Marcolino da. Constrição de bens pelo poder público: análise sobre a constitucionalidade da retenção de veículos automotores pelo não pagamento do IPVA / Gabriella Medeiros Marcolino da Silva. - 2019. 55f.: il. Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Departamento de Direito. Natal, RN, 2019. Orientadora: Profa. Dra. Michele Nóbrega Elali. 1. Direito tributário - Monografia. 2. Inadimplência - Monografia. 3. Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor (IPVA) - Monografia. 4. Retenção de bens - Monografia. 5. Apreensão de veículo - Monografia. I. Elali, Michele Nóbrega. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/CCSA CDU 343.359.2 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Elaborado por Shirley de Carvalho Guedes - CRB-15/404 “Você não sabe o quanto eu caminhei pra chegar até aqui. Percorri milhas e milhas antes de dormir. Eu não cochilei. Os mais belos montes escalei. Nas noites escuras de frio chorei” Cidade Negra - A Estrada AGRADECIMENTOS Aos meus pais, que tanto abdicaram de suas vidas para que eu e meus dois irmãos pudéssemos trilhar nossos caminhos com oportunidades. Aos meus colegas de curso por partilharem essa longa caminhada junto a mim, pela amizade e apoio durante esses longos cinco anos. À minha querida orientadora Michele Nóbrega Elali pela entrega e compreensão. Sem dúvidas, a terei sempre como uma inspiração e referência. A todos os meus professores que, em alguma oportunidade, interferiram na minha bagagem acadêmica e contribuíram para a chegada deste momento. A meu amado namorado Serginho por todo amor e força que desprendeu a mim durante a execução deste trabalho e por todo companheirismo que partilha comigo nesta vida. Meus sinceros agradecimentos a todos que me deram o privilégio de aprender e compartilhar conhecimento no curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. RESUMO Os artigos 131, § 2º combinado com o art. 230, V, ambos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) preveem a possibilidade de recolhimento a depósito de veículo que possua débitos relacionados ao Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor (IPVA) junto ao Fisco Estadual. O presente trabalho tem como escopo proceder uma análise constitucional destes dispositivos. Em primeiro lugar, restringiu-se a matérias introdutórias sobre o tema, como definição do IPVA, fato gerador e crédito tributário, dentre outras. Posteriormente, analisou-se o poder de polícia da Administração Pública, suas particularidades e seus limites. Como ponto central, buscou-se realizar uma interpretação conforme a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) no que se refere a aplicabilidade dos direitos fundamentais à propriedade, ao devido processo legal, bem como à ampla defesa e ao contraditório. Debruçou-se, ainda, no princípio do não-confisco, esculpido no artigo 150, IV, da CRFB. Outrossim, procedeu- se à análise de entendimentos jurisprudenciais relevantes ao tema, como julgamentos proferidos pelos tribunais estaduais e pelo Supremo Tribunal Federal. Por fim, conclui- se pela impossibilidade de retenção do veículo com débitos relacionados ao IPVA que porventura estejam em atraso, por se tratar de coação do Fisco ao constranger o contribuinte a adimplir seu débito fiscal por meio indireto de cobrança de tributo, mesmo existindo legislação específica disciplinando o procedimento de execução fiscal. Palavras-chave: IPVA. Inadimplemento. Retenção. Propriedade. Inconstitucionalidade. ABSTRACT The articles 131, § 2º combined with art. 230, V, both from the Brazilian Transit Code (CTB) provide for the possibility of collecting in vehicle deposit that has debts related to the Tax on Property of Automotive Vehicle (IPVA) with the State Treasury. The purpose of this paper is to carry out a constitutional analysis of these devices. First, it was restricted to introductory material on the subject, such as definition of IPVA, taxable event and tax credit, among others. Subsequently, the police power of the Public Administration, its particularities and its limits were analyzed. As a central point, an interpretation was sought according to the Constitution of the Federative Republic of Brazil (CRFB) regarding the applicability of fundamental rights to property, due process of law, as well as ample defense and contradictory. It also dealt with the principle of non-confiscation, sculpted in article 150, IV, of the CRFB. Likewise, it has analyzed jurisprudential understandings relevant to the subject, such as judgments handed down by the state courts and by the Federal Supreme Court. Finally, it is concluded that it is impossible to withhold the vehicle with debits related to the IPVA, which may be in arrears, because it is a matter of the tax authorities' constraint to constrain the taxpayer to pay their tax debt indirectly through the collection of taxes, even if there is legislation the tax enforcement procedure. Keywords: IPVA. Default. Retention. Property. Unconstitutionality. LISTA DE ABREVIATURAS ADIN - Ação Direta de Inconstitucionalidade CONTRAN - Conselho Nacional de Trânsito CRFB - Constituição da República Federativa do Brasil CRLV - Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo CTB - Código de Trânsito Brasileiro CTN - Código Tributário Nacional CVT - Comissão de Viação e Transportes DETRAN - Departamento Estadual de Trânsito DPVAT - Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres FIPE - Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas IPVA - Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores PSD - Partido Social Democrático SET - Secretaria de Tributação STF - Supremo Tribunal Federal STJ - Superior Tribunal de Justiça TJBA - Tribunal de Justiça do Estado da Bahia TJRJ - Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro TRF - Taxa Rodoviária Federal TRU - Taxa Rodoviária Única SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 8 2. DO IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE DE VEÍCULOS AUTOMOTORES (IPVA)........................................................................................................................ 10 2.1 Breve apanhado histórico ............................................................................. 10 2.2 Sujeito ativo e passivo na relação tributária............................................... 11 2.3 Fato gerador ................................................................................................... 12 2.4 Competência tributária .................................................................................. 13 2.5 Obrigação tributária ....................................................................................... 15 2.6 Crédito tributário ............................................................................................ 15 2.7 Lançamento .................................................................................................... 16 3. DO PODER DE POLÍCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ............................... 18 3.1 Conceito .......................................................................................................... 18 3.2 Limites ............................................................................................................. 18 3.3 Características ............................................................................................... 19 3.3.1 Discricionariedade ...................................................................................20 3.3.2 Autoexecutoriedade ............................................................................... 20 3.3.3 Coercibilidade .......................................................................................... 21 4. DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS RELEVANTES........................................... 24 4.1 Direito à propriedade ..................................................................................... 26 4.2 Princípios processuais: do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa ........................................................................................................ 29 4.3 Princípio do não-confisco.............................................................................. 31 5. ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS PERTINENTES ................................. 34 5.1 Das súmulas 70, 323 e 547 do Supremo Tribunal Federal ......................... 34 5.2 Acórdão proferido no julgamento do Agravo de Instrumento sob nº 0020383-62.2015.8.05.0000 – TJBA .................................................................... 35 5.3 Acórdão proferido no julgamento da Apelação Cível sob nº 0001675- 86.2012.8.19.0029 – TJRJ .................................................................................... 36 5.4 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.998 ........................................... 38 6. DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 131, § 2º COMBINADO COM O ART. 230, V, DO CTB ....................................................................................................... 41 6.1 Violação ao direito à propriedade ................................................................ 42 6.2 Violação ao princípio do não-confisco ........................................................ 43 6.3 Violação ao direito à ampla defesa e ao contraditório ............................... 45 6.4 Violação ao devido processo legal .............................................................. 46 6.5 Projeto de Lei nº 8.494/2017 .......................................................................... 47 7. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 48 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 51 8 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho busca analisar a inconstitucionalidade da apreensão de veículos automotores em virtude da existência de débitos oriundos do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), medida administrativa disciplinada pelo art. 131, § 2º combinado com o art. 230, V, ambos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Objetiva-se esclarecer acerca da aplicabilidade do direito constitucional do contribuinte à propriedade e ainda ao devido processo legal, no que se refere ao procedimento administrativo acima citado. A remoção ou apreensão do veículo tem como escopo forçar o contribuinte a efetuar o pagamento dos débitos provenientes do inadimplemento do IPVA, de modo que o Estado apodera-se do bem do particular sem a observância de qualquer disposição constitucional aplicável à matéria. A fim de dar fluidez ao trabalho, este foi dividido em cinco capítulos. O primeiro capítulo dedicou-se a conceitos introdutórios sobre o tema, como apanhado histórico, definição do IPVA, fato gerador, competência tributária, sujeito ativo e passivo na relação tributária, crédito tributário, lançamento e notificação do contribuinte. Por seu turno, o segundo capítulo reservou-se à análise do poder de polícia da Administração Pública, como o conceito, seus limites e as características, quais sejam, discricionariedade, autoexecutoriedade, coercibilidade e, por fim, a indelegabilidade. Noutro pórtico, o terceiro capítulo procede-se a uma abordagem sobre os princípios constitucionais aplicáveis ao procedimento administrativo de remoção do veículo, especialmente aos direitos fundamentais à propriedade, ao devido processo legal, bem como à ampla defesa e ao contraditório, elencados no art. 5º, caput, combinado com os incisos LIV e LV da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), respectivamente, além do princípio do não-confisco, esculpido pelo art. 150, inciso IV. Já o quarto capítulo debruçou-se sobre entendimentos jurisprudenciais perfilhados pelos tribunais estaduais, bem como pelo Supremo Tribunal Federal. Analisou-se ainda as Súmulas nº 70, 323 e 547 do STF. 9 Por fim, o quinto e último capítulo cuidou-se particularmente pelo tema central do trabalho, qual seja, a análise a respeito da inconstitucionalidade do recolhimento a depósito dos veículos automotores com débitos relacionados ao IPVA. Neste tópico, mostrou-se a incompatibilidade do art. 131, § 2º combinado com o art. 230, V, do CTB, com a CRFB. Percebe-se, nesta narrativa, a vulnerabilidade e hipossuficiência do contribuinte frente ao Estado, razão pela qual mostra-se necessária uma maior proteção daquele na relação tributária anteriormente delineada. E é, substancialmente, neste viés, que o presente trabalho pretende esclarecer os pontos controvertidos entre a remoção de veículos e a constitucionalidade das normas do CTB. A metodologia utilizada para a construção e desenvolvimento deste trabalho foi a pesquisa bibliográfica por meio da legislação brasileira, doutrina, bem como da análise de entendimentos jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal (STF) e ainda dos Tribunais de Justiça dos estados brasileiros. A pesquisa, atenta a essa controvérsia e à relevância do tema, vez que intrinsecamente presente no cotidiano do contribuinte brasileiro, propõe-se a demonstrar a necessidade de adequação do procedimento administrativo objeto deste trabalho às disposições constitucionais, as quais devem ser observadas pela Administração Pública, especialmente o fisco estadual, no que tange à cobrança de débitos dos proprietários de veículos automotores. Portanto, externa-se a importância de ser despendido empenho rumo à junção de conhecimentos que proporcionem a edificação de uma norma jurídica em consonância com a Carta Magna, a fim de evitar arbitrariedades advindas do Estado. 10 2. DO IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE DE VEÍCULOS AUTOMOTORES (IPVA) Trata-se de tributo com finalidade exclusivamente fiscal, isto é, objetiva custear as atividades estatais em razão da ocorrência do fato gerador, qual seja, a propriedade de veículo automotor. 2.1 Breve apanhado histórico Antes de adentrar à análise a respeito do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) em seus diversos aspectos, necessáriotrazer à baila o contexto histórico de criação deste imposto. Inicialmente, importante destacar que o referido imposto não está previsto no Código Tributário Nacional (CTN), tendo surgido apenas no ano de 1985, por meio da Emenda Constitucional nº 27/85 na Constituição de 1967, época do Regime Militar, em substituição à Taxa Rodoviária Única (TRU)1. A intenção do Estado em cobrar tributos sobre a propriedade de veículo surgiu no ano de 1968, momento no qual se instituiu a Taxa Rodoviária Federal (TRF), de competência da União, que objetivava arrecadar receita para manutenção e aprimoramento das rodovias federais. Conforme afirma SILVA2, tal fato ocasionou a edição de leis pelos Estados e Municípios da federação, os quais instituíram suas próprias taxas com diversos critérios quantitativos, o que gerou uma bitributação pelos entes da Administração Pública, por um mesmo fato gerador, qual seja, a propriedade de veículo automotor. Nesse sentido, diante do caos que se tornou o sistema tributário nacional no que tange à tributação da propriedade de veículo, foi criada a Taxa Rodoviária Única, por meio do Decreto-Lei nº 999/69, com o escopo de unificar as demais taxas que havia sido implementadas pelos demais estados, sob a competência dos Estados e do Distrito Federal, conforme determinado no art. 1º, § 1º do referido Decreto-Lei3. 1 MINARDI, Josiane. Manual do Direito Tributário. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2015. 2 SILVA, Paulo Roberto Coimbra. IPVA: Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores. 1. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2011. 3 BRASIL. Decreto-lei nº 999, de 21 de outubro de 1969. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/1965-1988/Del0999.htm>. Acesso em: 01 abr. 2019. 11 Acresce-se ainda que, em que pese possuir o nome de “taxa”, a TRU não era cobrada em razão do exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição, conforme disciplina o art. 77 do CTN4. Ato contínuo, no ano de 1985, ainda sob a vigência da Constituição de 1967, o IPVA adentrou ao ordenamento jurídico brasileiro por meio da Emenda Constitucional nº 27/1985. Já com a CRFB/88, foi atribuída aos Estados e ao Distrito Federal a competência tributária para legislar sobre veículos automotores, nos termos do art. 155, III. 2.2 Sujeito ativo e passivo na relação tributária O ordenamento jurídico, ao criar determinado tributo, determina qual será sua hipótese de incidência, isto é, "a previsão abstrata da situação a que atribui o efeito jurídico de gerar a obrigação de pagar"5. A previsão abstrata está relacionada ao pressuposto de materialização da previsão normativa no plano real, o que acarretaria na existência de fato gerador a justificar o nascimento de uma obrigação tributária. Dessa forma, uma vez identificada a hipótese tributária e a concretização desta no plano fático, tem-se configurado o fato jurídico tributário e instituída a relação tributária, na qual de um lado está o Estado, e do outro, o contribuinte. Aquele ocupando o polo ativo da relação, enquanto este o passivo, sendo credor e devedor, respectivamente. Portanto, caso o contribuinte realize o que está previsto em lei, aquele estará obrigado a arcar com o ônus tributário. Em se tratando de obrigação de pagar, faz-se necessária a análise de dois fatores, quais sejam, a definição de quem são as partes na relação e ainda da determinação do valor a ser pago pela parte devedora. A indicação das partes é imprescindível para a constituição do critério pessoal para definição do tributo, ou seja, a quem será devido e quem deverá ser cobrado pelo pagamento do tributo. 4 BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Brasília, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>. Acesso em: 03 abr. 2019. 5 PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 2016. 12 Dito isto, o sujeito passivo da relação tributária da cobrança do IPVA é o proprietário de veículo automotor, enquanto que o sujeito ativo compete aos Estados e ao Distrito Federal. Destaca-se que a simples posse de veículo automotor, por si só, não implica na legitimidade do possuidor para figurar no polo passivo da relação tributária, em virtude da ausência de vinculação obrigatória da posse ao conceito de propriedade, porquanto faz-se necessária a ocorrência da capacidade econômica do contribuinte, a qual está intrinsecamente ligada apenas ao proprietário do veículo automotor6. 2.3 Fato gerador O art. 114 do Código Tributário Nacional institui como sendo fato gerador a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência7. Ocorre que, pela simples leitura do referido dispositivo, não é possível estabelecer normas específicas a disciplinar o fato gerador de um tributo, visto que o art. 114 revela-se como uma norma geral, podendo ser aplicada a qualquer relação jurídica, não apenas a relação tributária8. Todavia, a par das considerações tecidas acima, é possível afirmar que só há fato gerador tributário caso haja rigorosa correspondência entre o ato jurídico configurado e previsão normativa, caso contrário, não restará configurado o fato gerador e, por consequência, inexiste obrigação tributária9. Noutro pórtico, por via de regra, o fato gerador de uma obrigação tributária tida como principal está prevista em lei ordinária editada pelo ente competente em instituir o tributo, dentro dos limites de sua competência, conforme determina a Constituição, limitando-se, portanto, às reservas que lhe foram feitas. A título de exemplo, no âmbito 6 PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 432. 7 BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Brasília, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>. Acesso em: 15 mai. 2019. 8 SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Código Tributário Nacional. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 262. 9 CASSONE, Vittorio. Direito Tributário. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 195. 13 de sua competência tributária, ao determinar o fato gerador do IPVA, o Governo do Estado do Rio Grande do Norte editou a Lei nº 6.967/9610. No que se refere ao IPVA, este possui como fato gerador a propriedade de veículo automotor terrestre11. Por óbvio, não há dificuldades em identificar o fato gerador, visto que o próprio nome do imposto sugere isto. Importante acrescentar que o IPVA revela-se como um imposto real, uma vez que, para fins de tributação, considera isoladamente o patrimônio relacionado à propriedade de veículo automotor, sem qualquer subjetividade. 2.4 Competência tributária O Estado Democrático de Direito estabelece certos limites ao poder de tributar, a fim de coibir abusos estatais. Assim, a competência tributária está relacionada às limitações ao poder de tributar determinadas pela Constituição da República. Nesse sentido, pode-se definir como competência tributária a aptidão de uma pessoa política para instituir tributos. Premente destacar, contudo, que não se deve confundir competência com a chamada capacidade tributária. Esta está relacionada na capacidade de um ente figurar no polo ativo da relação jurídica tributária, isto é, ser titular no completo desempenho da competência tributária12, enquanto àquela possui natureza legislativa. Desse modo, sendo a competência tributária a atribuição dada ao ente político de criar leis instituidoras de tributos, pode-se afirmar que essa detém as particularidades equivalentes às atribuídas à competência legislativa, sendo estas,privatividade (ou exclusividade), indelegabilidade, incaducabilidade, inalterabilidade, irrenunciabilidade e facultatividade13. 10 ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. Lei nº 6.967, de 30 de dezembro de 1996. Dispõe sobre o Imposto de Propriedade de Veículos Automotores - IPVA e dá outras providências. Natal, RN, 31 dez. 1996. Disponível em: <http://www.al.rn.leg.br/portal/_ups/legislacao//6.967.pdf>. Acesso em: 15 maio 2019. 11 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 134509. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Diário da Justiça. Brasília, 13 set. 2002. 12 BRITTO, Lucas Galvão de. O Lugar e o Tributo. São Paulo: Noeses, 2014, p. 114. 13 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2013, p. 590-777. 14 No que se refere à privatividade, pode-se afirmar que a competência é privativa visto que somente o ente competente pode legislar acerca de seus tributos. Isto posto, a União não poderá legislar acerca de tributo a incidir sobre a propriedade de veículos automotores, uma vez que, conforme disciplina o art. 155, III, da CRFB, tal tributo é de competência exclusiva dos Estados e Distrito Federal. Noutro pórtico, a incaducabilidade está relacionada ao fato de que o decurso do tempo não afasta a competência de determinado ente, enquanto que a irrenunciabilidade refere-se à impossibilidade de um ente renunciar a seu direito de instituir tributos de sua competência. Já a inalterabilidade pressupõe que apenas a Constituição da República possui a prerrogativa de mudar a competência tributária, razão pela qual a legislação não pode alterar os conceitos, institutos e formar utilizados pela Carta Maior para delimitar a competência, nos termos do art. 110 do CTN14. Assim, no momento que a Constituição prevê que o IPVA irá incidir sobre a propriedade de veículo automotor, a legislação infraconstitucional não poderá alterar tal previsão com o fito de determinar que o IPVA possua como fato gerador a mera posse de veículo. Premente pontuar que, em que pese a legislação infraconstitucional não poder modificar a competência tributária, esta poderá ser alterada mediante Emenda Constitucional. Por último, a facultatividade reside no fato dos Entes Federativos não serem obrigados a instituir, de forma efetiva, todos os tributos de sua competência. Tal princípio origina-se da própria literalidade do art. 145 da CRFB, haja vista que este disciplina que a União, os Estados, o Distrito Federal, assim como os Municípios, “poderão” instituir tributos. Por esta razão, a par do comando utilizado pelo legislador constituinte, a doutrina entende que a competência tributária é facultativa, e não obrigatória.15 Como já dito anteriormente, a hipótese de incidência tributária do IPVA está positivada por meio do art. 155, III, da CRFB. Contudo, em que pese possuir previsão constitucional, esta apenas traz normas gerais sobre o imposto, limitando-se a 14 MINARDI, Josiane. Manual do Direito Tributário. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 50. 15 Idem. p.49 15 disciplinar apenas sobre o sujeito ativo da relação jurídico-tributária, qual seja, Estados-membros e Distrito Federal. Acresce-se ainda que não há qualquer lei federal regulando a instituição do referido tributo. Tal fato acarretou na competência legislativa plena dos Estados- membros, bem como do Distrito Federal, ante a ausência de lei complementar disciplinando a matéria, nos termos do art. 24, §3º, da CRFB. Assim sendo, os Estados e o DF possuem legitimidade para ditar normas gerais indispensáveis à cobrança do IPVA, através do pleno exercício de sua competência concorrente, até que seja editada lei complementar advinda da União, nos termos do §4º, do art. 24, da CRFB. Importante destacar que o Supremo Tribunal Federal já se debruçou sobre o tema por meio de acórdão proferido no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 414.259, de Minas Gerais, de relatoria do Ministro Eros Grau16. 2.5 Obrigação tributária A obrigação tributária corresponde ao liame existente entre o sujeito passivo e o sujeito ativo da relação tributária, o qual surge no momento de ocorrência da hipótese tributária no plano fático, isto é, no momento em que o contribuinte pratica o fato gerador na vida real, preenchendo todos os requisitos previstos na legislação. 2.6 Crédito tributário Como já afirmado anteriormente, a obrigação tributária surge de forma automática a partir do nascimento do fato gerador. Todavia, essa só torna-se exigível pelo Fisco com o lançamento. Com o lançamento, constitui-se o crédito tributário, o qual decorre da obrigação principal e possui a mesma natureza jurídica desta, nos termos do art. 139 do CTN17. Neste momento, com o vencimento do crédito, a obrigação torna-se exigível. 16 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 414.259. Relator: Ministro Eros Grau. Diário da Justiça. Brasília, 14 ago. 2008. 17 Art. 139. O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta. 16 2.7 Lançamento O lançamento tributário constitui o crédito e é definido pelo art. 142 do CTN18. Através do lançamento (e após o vencimento), a obrigação tributária torna-se exigível pelo Fisco. Ademais, importante destacar que o lançamento tributário é atividade privativa da Fazenda Pública, como preconiza o art. 142, parágrafo único, do CTN19. Noutro pórtico, o lançamento atesta a ocorrência do fato gerador e formaliza a relação jurídico-tributária entre o contribuinte e a Administração Pública. No lançamento é possível identificar o sujeito passivo (contribuinte), o valor do tributo (calculado geralmente por meio da multiplicação de uma alíquota pela base de cálculo), as multas, os juros e a respectiva correção monetária. No caso do lançamento do IPVA, este se dá de ofício, vez que o Fisco, detentor de todos os dados necessários, ao verificar a ocorrência do fato gerador (propriedade de veículo automotor), quantifica o montante do tributo e identifica o sujeito passivo, nos termos do art. 149, I, do CTN20. Sendo assim, no lançamento do IPVA não há participação do sujeito passivo na constituição do crédito tributário, em virtude da Administração já possuir todos os elementos informativos para realização do lançamento. 2.8 Notificação do contribuinte No que se refere à notificação do contribuinte do IPVA - a qual é pressuposto de constituição do crédito tributário - se dá por meio da divulgação do calendário para pagamento do referido imposto. No âmbito do Estado do Rio Grande do Norte, a cada início do exercício financeiro, a Secretaria de Tributação (SET) publica a tabela com os valores do IPVA 18 Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. 19 Art. 142. (...) Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional. 20 Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: (...) I - quando a lei assim o determine; 17 e o calendário de pagamento, os quais ficam disponíveis no site da secretaria21. Outrossim, o contribuinte pode ter acesso ao valor do tributo, bem como sua respectiva data de vencimento e o boleto para pagamento, no site do Departamento Estadual de Trânsito(DETRAN-RN) através de consulta realizada por meio da placa e do RENAVAM do veículo22. Válido acrescentar que o Superior Tribunal de Justiça já debruçou-se sobre o tema, por meio do Recurso Especial sob nº 1.320.825, do Estado do Rio Janeiro, julgado sob o rito dos recursos repetitivos, de relatoria do Ministro Gurgel de Faria. No referido julgamento, a Corte Superior considerou que a notificação do contribuinte do IPVA pode ser realizada por qualquer meio idôneo, como o envio de carnê para pagamento à residência do proprietário do veículo ou mesmo com a publicação do calendário para pagamento. 21 http://www.set.rn.gov.br/contentProducao/aplicacao/set_v2/impostos/gerados/ipva_calendario.asp. Acesso em: 16 jun. 19. 22 http://www2.detran.rn.gov.br/externo/consultarveiculo.asp. Acesso em: 16 jun. 19. 18 3. DO PODER DE POLÍCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 3.1 Conceito O tema atinente ao poder de polícia coloca em confronto o cidadão, o qual almeja exercer de maneira plena os seus direitos, e a Administração, que tem como dever limitar o exercício dos direitos do particular, em prol do bem-estar coletivo. Nesse sentido, é possível afirmar que o poder de polícia tem como fundamento a supremacia do interesse público sobre o interesse do particular.23 Por outro lado, no ordenamento jurídico brasileiro, o emprego do poder estatal para delimitar e adequar as liberdades e os direitos individuais, deve ser entendido como uma exceção, razão pela qual só é possível ser exercido sob estrita reserva legal, nos termos do art. 5º, II, da CRFB.24 Por fim, o CTN, em seu art. 78 define poder de polícia como a atividade vinculada à Administração que restringe ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regulando a prática de ato ou abstenção de fato, em virtude de interesse predominantemente público relacionado à segurança, à higiene, à ordem, etc. Pode- se afirmar, portanto, que todo ato de polícia deve ser direcionado ao bem-estar coletivo em detrimento do interesse individual do cidadão. 3.2 Limites Assim como todos os demais atos praticados pela Administração, ainda que possua certa dose de discricionariedade, o poder de polícia deve obedecer às limitações impostas pela legislação brasileira. Neste pórtico, como já dito anteriormente, o poder de polícia só deverá ser exercido quando existir interesse público. Isto posto, o exercício deste poder só será justificado quando utilizado a fim de afetar pessoas determinadas, na medida em que, 23 PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito Administrativo. 32. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Ltda, 2019, p. 314-315. 24 MOREIRA NETO, Diego de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. 16. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Ltda, 2014. 19 caso a autoridade se afaste do interesse da coletividade, restará caracterizado desvio de poder, de modo a acarretar a nulidade do ato, não afastando ainda sua responsabilidade civil, penal e administrativa.25 Acresce-se ainda que mesmo quanto ao meio de ação, o poder de polícia sofrerá limitações advindas da lei. Neste ponto observa-se a aplicação do princípio da proporcionalidade dos meios aos fins, ou seja, a autoridade pública não poderá ir além do necessário para garantir o interesse da coletividade, uma vez que objetiva-se alcançar o bem-social, sem necessariamente restringir, ou mesmo acabar, com os direitos dos particulares.26 Dessarte, o Estado, no momento de utilização de meios coercitivos que interferem diretamente na liberdade e propriedade do indivíduo, deve portar-se com extremo cuidado, com o propósito de em nenhum momento exceder os meios necessários ao alcance do resultado almejado, sob pena de acarretar na nulidade de seu próprio ato.27 Além da observância obrigatória da proporcionalidade em suas ações atinentes ao exercício do poder de polícia, a Administração ainda deverá se ater à necessidade e à eficácia da medida. A primeira está relacionada à pertinência do ato, enquanto a segunda refere-se à adequação do ato na garantia do interesse coletivo. 3.3 Características No que se refere às características do poder de polícia, estas causam certa divergência na doutrina. De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello serão características do poder de polícia a discricionariedade e a autoexecutoriedade28. Todavia, o pensamento aqui perfilhado converge com a posição adotada pela escritora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a qual aponta como características do poder 25 PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito Administrativo. 32. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Ltda, 2019, p. 329. 26 Idem. 27 MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 312. 28 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, 17. ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 383. 20 de polícia a discricionariedade e autoexecutoriedade, assim como a coercibilidade e a indelegabilidade. 3.3.1 Discricionariedade Quanto à discricionariedade, esta é observada na atuação da Administração, quando esta puder escolher entre uma ou outra solução, segundo seus próprios critérios de oportunidade e conveniência, não disciplinados pelo legislador, para decidir quando deve agir ou a forma desse agir, todas estritamente válidas pelo ordenamento jurídico. Por outro lado, diz-se vinculado, o ato administrativo que a lei impõe a forma e modo de agir da Administração, na medida em que só há uma única solução para o caso concreto, não podendo a autoridade escolher, por sua própria conveniência, outra ação, de forma que não é possível qualquer apreciação subjetiva da Administração, devendo esta agir conforme determina a lei. Contudo, ainda que o poder de polícia seja, em regra, discricionário, não é conferida total liberdade à Administração, dado que, apesar de discricionário, a lei impõe limitações, especialmente sob a forma e a finalidade. Por esse motivo, pode-se afirmar que a discricionariedade acarreta liberdade de atuação nas margens disciplinadas pela lei, de sorte que, caso a autoridade extrapole essas limitações, o ato administrativo passa de discricionário para arbitrário, isto é, em confronto com a lei. 29 3.3.2 Autoexecutoriedade A autoexecutoriedade é um dos atributos do poder de polícia através do qual o Poder Público pode obrigar o administrado ao cumprimento de suas decisões, sem, necessariamente, recorrer ao Poder Judiciário. Por este atributo, a Administração compele materialmente o particular, utilizando, para tanto, de meios diretos de coação. 29 PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito Administrativo. 32. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Ltda, 2019, p. 481-482. 21 Entretanto, a autoexecutoriedade não é aplicável a todos os atos advindos do poder de polícia. A Administração só poderá se utilizar deste atributo caso haja previsão expressa na lei, ou que, em análise ao caso concreto, verifique-se a urgência na implantação da medida, sob pena de grave prejuízo ao interesse público.30 No primeiro ponto, a ação deverá ser tomada obedecendo o procedimento legal, garantindo ao administrando o direito de à ampla defesa e ao contraditório, nos termos do art. 5º, inciso LV, da CRFB. Neste pórtico, observa-se que o simples inadimplemento do IPVA pelo contribuinte não traduz urgência a justificar a remoção/retenção de veículo automotor pela Administração, com o fito de coagir o contribuinte a efetuar o pagamento do referido tributo. A par do exposto, necessário destacar que neste caso não se deve aplicar o atributo da autoexecutoriedade dos atos administrativos, visto que afronta frontalmente dispositivosconstitucionais, especialmente o direito à ampla defesa e contraditório, assim como o direito à propriedade e o princípio do não confisco, todos expressamente previstos na Carta Magna. 3.3.3 Coercibilidade A coercibilidade é a determinação coercitiva das medidas empregadas pela Administração. De fato, toda ação oriunda do poder de polícia é imperativa, isto é, compulsório para o administrado, outrossim, admite-se, inclusive, a utilização de força pública para garantir a efetividade da medida, quando constatada resistência por parte do administrado. Acresce-se ainda que a utilização de força policial independe de autorização do Poder Judiciário. 31 Contudo, a coercibilidade, apesar de admitir o uso de força policial, não permite a violência descabida, a ponto de configurar abuso de autoridade, justificando o ajuizamento de ações criminal e de reparação civil.32 30 Idem. p. 326. 31 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 1998, p. 122. 32 Idem. 22 Neste pórtico, a par do tema aqui trabalhado, põe-se em exame, se a constrição do veículo com débitos em atraso junto ao Fisco Estadual não constitui sanção política imposta pela Administração Pública, que, utilizando-se do atributo da coercitividade de seu poder de polícia, constrange o administrado ao pagamento de seus tributos. Indubitavelmente, a sanção administrativa presta-se para conferir efetividade à norma jurídica, a fim de garantir seu cumprimento. Por outro lado, entretanto, conforme preceitua Hugo de Brito Machado33, toda sanção deve observar, obrigatoriamente, o devido processo legal, com o escopo de assegurar o direito de defesa do infrator. Todavia, há casos em que o Fisco, ao aplicar sanções aos contribuintes, suprime o exercício de direitos fundamentais, os quais, em maioria, não possuem relação com o ato ilícito cometido por aquele. A esse tipo de sanção, o autor denomina de “sanção política”, visto que são aplicadas ao arrepio da norma jurídica, como meio de indireto de cobrança de tributos. Portanto, este tipo de sanção revela-se inconstitucional por afrontar diretamente o princípio do devido processo legal previsto no art. 5º, LIV, da Constituição da República. Ademais, por meio deste tipo de medida, o contribuinte se vê em uma conjuntura na qual só há duas opções, quais sejam, ou paga o tributo como fora lançado pelo Fisco, sem contestá-lo, ou fica sem o seu bem e sem exercer seu direito fundamental à propriedade, o qual sequer possui relação direta ao inadimplemento dos tributos, o que, sem dúvida, mostra-se desproporcional e desarrazoado.34 3.3.4 Indelegabilidade Por último, no que se refere à indelegabilidade do exercício do poder de polícia a particulares, tal atributo justifica-se em razão do exercício de atividade estatal típica e, por isso, deve ser pelo Estado exercida. Isso ocorre, pois, o poder de polícia engloba 33 SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Editora Atlas LTDA, 2018, p. 359. 34 Idem. 23 privilégios próprios do poder público, como a repressão, dado em que não é possível de serem exercidos por um particular sobre outro.35 Acresce-se, entretanto, que os atos atinentes ao consentimento e à fiscalização podem ser delegados a entes privados, conforme decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do Recurso Especial nº 817.534 do Estado de Minas Gerais, de relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques36. 35 PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito Administrativo. 32. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Ltda, 2019, p. 327. 36 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 817.534. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Diário da Justiça. Brasília, 10 de nov. de 2009. 24 4. DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS RELEVANTES Antes de tudo, é imprescindível tratar da moldura constitucional que envolve o tema então trabalhado, especialmente diante do estágio em que se encontra o sistema jurídico brasileiro, caracterizado em sua essência como pertencente a um Estado Democrático de Direito que se insere no movimento neoconstitucional e implica, mais e mais, numa constitucionalização do direito37 – isto é, no “entrelaçamento” da Constituição com todos os ramos do ordenamento jurídico. No atual momento, Constituição e normas infraconstitucionais se harmonizam e se combinam entre si, fazendo com que a lei se inspire e se norteie através do espírito constitucional, o que não poderia deixar de ser relevante para este estudo, na medida em que este trabalho trata, essencialmente, de questões suscitadas pela eficácia de direitos e garantias individuais que são expressamente reconhecidos ao longo da Constituição Federal Brasileira de 1988. Neste estudo, interessa discutir quatro direitos e princípios constitucionais específicos: o direito da propriedade privada; o princípio do não confisco; o princípio do devido processo legal; e o princípio do contraditório e da ampla defesa. Todos eles têm em comum o fato de pertencerem, historicamente, ao mesmo contexto de nascimento: a fundação dos Estados Liberais entre os Séculos XVII e XVIII, ao exemplo dos Estados Unidos da América e das repúblicas revolucionárias francesas, responsáveis por estabelecer direitos civis e políticos38, as “liberdades” que muitos autores classificam como “direitos humanos de primeira geração39”, embora essa compartimentação sofra diversas críticas atualmente, mas que não é do escopo deste trabalho analisar. Na qualidade de direitos e garantias civis, as quatro nascem, essencialmente, como direitos de caráter “negativo”, ou seja, são direitos oponíveis ao Estado, que 37 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2018. 38 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 4. ed. São Paulo: Max Limonad, 2000. 39 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. 25 delimitam sua esfera legítima de atuação e exigem do ente estatal uma abstenção40, que se consubstancia no respeito e no reconhecimento de direitos inerentes ao ser humano, conhecido nessa época como “cidadão”. São direitos que visam ao fim do comportamento arbitrário do Estado, corrigindo a situação desigual entre o poder estatal ilimitado e a vulnerabilidade dos cidadãos por meio da celebração de um pacto: as constituições. Historicamente, isso se deu em decorrência da ascensão de um tipo de sociedade em que os interesses da burguesia, como classe política, começavam a predominar mais e mais sobre o todo social41, dentro do contexto das Revoluções Industriais e da queda dos regimes absolutistas, o que exigia uma adequação do sistema jurídico que fosse capaz de refletir as novas necessidades da sociedade, com destaque para o respeito à propriedade privada e à integridade individual, o que, em suma, significava o estabelecimento de limites bem definidos à ação do Estado42, que já não podia dispor como bem entendesse dos bens e dos corpos de seus cidadãos. É ainda interessante para este trabalho, em que são discutidos a cobrança de impostos e os limites do direito tributário, saber que movimentos decisivos na história aconteceram justamente em função da tributação arbitrária e ilimitada, ao exemplo da Declaração da Independência das Treze Colônias, motivada de forma preponderante pela tributação absurda da Inglaterra sobre o comércio de suas possessões coloniais americanas43. No Brasil, os exemplos são incontáveis: a Inconfidência Mineira, a Revolta de Felipe dos Santos, a Revolução Pernambucanade 1817, entre muitos outros44. Nestes termos, fica evidente que a tributação (e a forma com que se tributa) representa uma relação extremamente sensível entre o Estado e os particulares, uma fonte de atritos que o direito constitucional tende a suavizar através dos princípios e direito então estudados. 40 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. 41 HOBSBAWM, Eric. A Era das Revoluções 1789-1848. Ed. rev. São Paulo: Paz e Terra, 2012. 42 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. 43 HOBSBAWM, Eric. A Era das Revoluções 1789-1848. Ed. rev. São Paulo: Paz e Terra, 2012. 44 FAUSTO, Boris. História do Brasil. 14. ed. São Paulo: EDUSP, 2013. 26 4.1 Direito à propriedade Não é por acaso que o direito à propriedade esteja sendo tratado antes dos três princípios constitucionais mencionados anteriormente: trata-se, sem dúvidas, do principal lastro jurídico limitador da ação do Estado sobre os bens dos particulares, o que, obviamente, se relaciona de forma íntima com o direito tributário. Como definição desse direito, portanto, tem-se que o direito à propriedade é a prerrogativa do particular, de forma legítima, de usufruir, dispor e manter um bem específico por tempo indeterminado. Tradicionalmente, diz-se que o direito à propriedade é um direito “sagrado e inviolável45” – sem dúvidas, uma herança do contexto histórico do nascimento dos Estados liberais, quando o objetivo era encerrar as ameaças comuns aos direitos dos particulares. Essa visão, contudo, tem mudado ao longo das últimas décadas, principalmente com a ascensão, no Brasil, da ideia de função social da propriedade, que permitirá, após a Constituição de 1988, uma maior flexibilização de seu caráter “absoluto46” por força das aspirações e das necessidades da sociedade, que, contudo, não podem se confundem de forma estrita com os interesses do Estado. Essa flexibilização, porém, não é aberta, nem genérica, e depende necessariamente do respeito à lei pertinente. Como bem ilustra o professor Pietro Perlingieri: Do inteiro quadro constitucional deriva que a propriedade privada não pode ser esvaziada de qualquer conteúdo e reduzida à categoria de propriedade formal, como um título de nobreza. Ela representa não um desvalor, mas um instrumento de garantia do pluralismo e de defesa em relação a qualquer tentativa de estatalismo.47 Ao longo dos últimos séculos, o direito à propriedade privada vem sendo um dos tópicos jurídicos mais debatidos e controversos em todo o mundo, fruto dos diferentes momentos históricos vivenciados pelas mais diversas sociedades ao redor 45 BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. 46 Idem. 47 PERLINGIERI, Pietro. Perfis do direito civil: Introdução ao direito civil constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 230. 27 do globo. Discute-se quem deve ter direito à propriedade (sua titularidade), que tipo de propriedade deve ser protegida (objeto do direito), os motivos para essa proteção (os fundamentos sociais e jurídicos) e até onde ela deve ser estabelecida (os limites à propriedade). A existência desse direito, contudo, é plenamente consensual nos ordenamentos jurídicos mais diversos, especialmente pelo direito internacional dos direitos humanos, onde é tratado de forma implícita e explícita por diversos tratados e convenções. A Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, emitida em 1948, em pleno pós-guerra, assinalava, em seu Artigo XVII, que “todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros48”. Séculos antes, os revolucionários franceses haviam feito um reconhecimento semelhante através da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, em que assinalavam, no artigo 17, que “como a propriedade é um direito inviolável e sagrado, ninguém dela pode ser privado, a não ser quando a necessidade pública legalmente comprovada o exigir e sob condição de justa e prévia indenização49”. Nas Américas, a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, de 1969, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, equaliza os dispositivos anteriores, ao sustentar, em seu artigo 21, que: “toda pessoa tem direito ao uso e gozo de seus bens. A lei pode subordinar esse uso e gozo ao interesse social50”. No Brasil, o reconhecimento do direito à propriedade esteve presente em todas as constituições nacionais, mas será somente na Constituição de 1988, cognominada de “A Constituição Cidadã”, que esse direito assumirá uma posição preponderante como meio de efetivação dos próprios objetivos do Estado brasileiro, o que se dá por força da já mencionada “função social”. 48 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1948. 49 ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE FRANCESA. Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão. 1789. 50 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Interamericana de Direitos Humanos. 1969. 28 Fora dos casos previstos em lei, que são majoritariamente excepcionais, o direito à propriedade permanece ainda revestido de sua “sacralidade” original, resguardando os particulares de quaisquer pretensões injustas do Estado sobre seus bens51 - em que o devido processo legal, como princípio constitucional, também tem implicações profundas. É importante lembrar que o tributo, foco do direito tributário, é essencialmente “toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”, nos termos do artigo 3º do Código Tributário Nacional, sendo, na qualidade de pecúnia, parte integrante da propriedade dos entes tributários que o direito busca proteger. Há, ainda, a possibilidade de que bens se transformem em tributos por meio da dação em pagamento, de acordo com o artigo 156, XI, do Código Tributário nacional, mas excepcionalmente. Diante disso, o que interessa neste estudo é o fato de que, ainda hoje, o direito à propriedade continua a desempenhar sua função original: a de limitar e proteger a propriedade dos particulares em face de terceiros, incluindo aí o Estado, seja a propriedade a pecúnia (a moeda, o recurso financeiro-monetário) ou, excepcionalmente, o bem. Essa preocupação fica patente com a assertividade do constituinte em reconhecer a propriedade como direito e garantia constitucional: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito [...] à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXII – é garantido o direito de propriedade; [...] Art. 170º A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano, na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observando-se os seguintes princípios: [...] II – propriedade privada; Embora esta seja uma análise geral, é possível concluir que o direito à propriedade é o grande definidor dos limites opostos ao direito tributário. Assim, nesta 51 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988: interpretação e crítica. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. 29 análise, importa esclarecer que a existência do direito à propriedade se reveste, portanto, de um caráter estrutural para a tributação. Vê-se que é a necessidade de preservação da propriedade que fundamenta princípios inerentes ao sistema jurídico que trata da atividadeda tributação: por exemplo, os princípios da legalidade, da anterioridade e da irretroatividade tributárias dispõem, cada um ao seu modo, a forma legítima pelo qual particulares se obrigam ao pagamento de tributo ao Estado, ou seja, ao desfazimento de parte de sua propriedade52. Este segmento deste estudo busca, portanto, demonstrar não as implicações em sentido estrito do direito à propriedade, mas sim o quanto esse direito estrutura e baseia o sistema tributário: se é a propriedade transformada em tributo quem ocupa a posição de objeto do direito tributário, as normas que tutelam e garantem a própria existência da propriedade merecem, portanto, uma análise logicamente antecedente por fornecerem o substrato geral à tributação. 4.2 Princípios processuais: do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa O devido processo legal na qualidade de instrumento jurídico garantidor de direitos e liberdades individuais surge no mesmo contexto do reconhecimento do direito à propriedade – a ascensão do Estado liberal – havendo, entre ambos, uma relação de aproximação, na medida em que o devido processo legal serve à proteção do direito à propriedade, tendo surgido justamente da necessidade de limitar o poder do Estado sobre o cidadão, seja sobre seus corpos, seja sobre seus bens53. Isso se demonstra de forma ostensiva ao longo das declarações internacionais do direito à propriedade: a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas, de 1948, diz ao longo do artigo 17, 2, que “todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros54”. 52 SABBAG, Eduardo. Direito Tributário Essencial. 6. ed. rev. e at. São Paulo: Forense, 2018. 53 HOBSBAWM, Eric. A Era das Revoluções 1789-1848. Ed. rev. São Paulo: Paz e Terra, 2012. 54 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1948. 30 Por outro lado, o Convenção Americana de Direitos Humanos dispõe, em seu artigo 21, 2, que “nenhuma pessoa pode ser privada de seus bens, salvo mediante o pagamento de indenização justa, por motivo de utilidade pública ou de interesse social e nos casos e na forma estabelecidos pela lei55”. A Constituição Brasileira também é especialmente concernente, conforme seu artigo 5º, LIV, assentando que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Trata-se, por si só, de um direito inerente à pessoa humana que não pode ser sumariamente desconsiderado, confundindo-se com um dos pressupostos do Estado Democrático do Direito e condicionando ao seu crivo a legalidade, a justiça e a eficiência dos sistemas jurídicos constitucionais. É uma verdadeira garantia aos indivíduos de que o direito será capaz de protegê-los, seja através da formalização de um processo de fato antes de qualquer penalização, seja através da imposição de que as próprias leis sejam elaboradas de forma razoável, como bem sintetiza o professor Alexandre Freitas Câmara: Assim é que o devido processo legal substancial (ou material) deve ser entendido como uma garantia ao trinômio “vida-liberdade-propriedade”, através do qual se assegura que a sociedade só seja submetida a leis razoáveis, as quais devem atender aos anseios da sociedade, demonstrando assim sua finalidade social. Tal garantia substancial do devido processo legal pode ser considerada como o próprio princípio da razoabilidade das leis.56 Isso implica, enfim, que a perda da propriedade somente pode acontecer de forma legítima e juridicamente estabelecida – o que se relaciona intimamente com o objeto deste trabalho, em que se estuda, efetivamente, a perda da propriedade em consequência de disposição do direito tributário. Trata-se de verdadeiro escudo jurídico capaz de proteger o indivíduo, nas suas mais diversas esferas, do arbítrio estatal, condicionando a atuação do Estado ao império da lei. Nestes termos, a relação entre o devido processo legal e o contrário e a ampla defesa é imanente. O devido processo legal vem sendo entendido como, necessariamente, aquele em que é necessário o estabelecimento do contraditório, 55 Idem. 56 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 14. ed. rev. e atu. Rio de Janeiro: Lumen Juris, v. I, 2006. 31 que, por sua vez, deve ser guarnecido de todos os meios legais e adequados da defesa do acusado. O contraditório, é, portanto, o direito do réu ou do interessado a ser ouvido, enquanto a ampla defesa é a capacidade do réu ou acusado de dispor de todos os meios para assegurar a sua pretensão, sejam provas, recursos ou artifícios judiciais legítimos. A Constituição Brasileira assinala, em seu artigo 5º, LV, que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. No nível internacional, a Convenção Americana de Direitos Humanos, diz, em seu artigo 8, 1, que “toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro do prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial [...] para que se determinem seus direitos ou obrigações57”. Mais adiante, a convenção declara, ainda no artigo 8, 2, que “durante o processo, toda pessoa tem direito [...] às seguintes garantias mínimas: concessão ao acusado do tempo e dos meios adequados para a preparação de sua defesa; [...] de defender-se [...]; de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior58”. Neste trabalho, é valiosa a compreensão de que, dentro de um sistema jurídico marcado pela prevalência do devido processo legal, coroado pelos princípios do contraditório e da ampla defesa, as consequências últimas do inadimplemento eventual de obrigações tributárias somente deveriam se materializar quando completadas as etapas do percurso juridicamente estabelecido, vencidos os prazos e recursos e percorridas as instâncias de decisão, sejam elas judiciais ou não. 4.3 Princípio do não-confisco O princípio do não confisco se relaciona intimamente com o direito à propriedade, sendo, em sua essência, um artifício jurídico destinado à sua preservação, opondo ao Estado, no exercício da função de demandante de tributos, 57 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Interamericana de Direitos Humanos. 1969. 58 Idem. 32 limites concretos à arrecadação e à capacidade de arrecadar. Trata-se, em suma, da norma constitucional que proíbe a absorção, por parte do Estado, de bens de particulares sem a sua devida indenização, ou seja: um tributo com efeito de punição59. Há quem denomine esse princípio como “da razoabilidade ou proporcionalidade da carga tributária60”. Trata-se de princípio diretamente reconhecido pela Constituição, quando assinala: Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] IV – utilizar tributo com efeito de confisco. Apesar disso, há uma certa confusão terminológica na redação do dispositivo constitucional. O autor, por exemplo, assinala que não existe vedação do “confisco”, porque o tributo, essencialmente, é uma modalidade de confisco – o que existe de fato é o impedimento à tributação “com efeito de confisco61”, em que o tributo tem a repercussão, para o particular, de uma sanção, ou seja, de uma pena cominada por força de ato ilícito. O que se busca é, então, inviabilizar a existência do direito tributário como direito sancionador ou penalizador. Como se sabe, o tributo, necessariamente, não é uma sanção, de modo que não há que se confundir o tributo com multa (compreendida como a prestação pecuniária originada em infração à lei)62, nos termos do artigo 3º do CódigoTributário Nacional. Caso fosse admissível o confisco como sanção, não haveria harmonia sistêmica, o que implicaria não apenas numa quebra da segurança jurídica, mas na necessidade de um rearranjo normativo a fim de que se reconfigurassem os pressupostos da atividade tributária. Por fim, o confisco, na qualidade de pena, porém, é lícito e legítimo dentro de circunstâncias especiais, quando assumirá, enfim, a função de sanção por 59 SABBAG, Eduardo. Direito Tributário Essencial. 6. ed. rev. e at. São Paulo: Forense, 2018. 60 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. Salvador: Juspodium, 2017. 61 Idem. 62 SABBAG, Eduardo. Direito Tributário Essencial. 6. ed. rev. e atu. São Paulo: Forense, 2018. 33 descumprimento de uma obrigação de natureza tributária, nos termos do artigo 113 do Código Tributário Nacional, hipótese em que não há que se falar em tributo63. É importante esclarecer que a pena de perdimento de bem (assim como a de multa) foi recepcionada pela Constituição de 1988, conforme seu artigo 5º, XLVI, b, onde se diz que a lei “regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, [...] perda de bens; [...] multa;”. 63 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. Salvador: Juspodium, 2017. 34 5. ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS PERTINENTES 5.1 Das súmulas 70, 323 e 547 do Supremo Tribunal Federal Em diversas oportunidades, o Supremo Tribunal Federal debruçou-se acerca da impossibilidade do Estado, no âmbito do seu poder de polícia, coagir o contribuinte a efetuar o pagamento dos tributos devidos por meio da retenção, apreensão, ou mesmo interdição, de bens, mercadorias e estabelecimentos. Tal entendimento restou sumulado por meio das Súmulas 70, 323 e 547. A Súmula 7064, aprovada em Sessão Plenária em 13/12/1963, preconiza a ilicitude da interdição de estabelecimentos comerciais com o fito de compelir o proprietário/comerciante ao pagamento de tributos, e até multas. Neste precedente, resta evidenciada a posição do STF, já àquela época, da arbitrariedade do Fisco em promover a interdição de estabelecimentos, sem garantir ao devedor a possibilidade de impugnação do débito. Noutro pórtico, a Súmula 32365, seguindo a mesma linha de raciocínio da súmula anteriormente mencionada, declara a inadmissibilidade do Estado efetuar a apreensão de mercadorias, com o único objetivo de coagir o contribuinte a adimplir os débitos fiscais. Por fim, a Súmula 54766, afirma não ser lícito a proibição pelo Fisco do contribuinte inadimplente adquirir estampilhas67, despachar mercadorias nas alfândegas ou mesmo continuar a exercer suas atividades profissionais de forma regular. Ora, impedir o contribuinte em débito de exercer suas atividades profissionais, demonstra, sem embargo, toda a arbitrariedade do Fisco, o qual, podendo se utilizar de medidas executivas menos onerosas ao devedor - como a própria ação de execução fiscal - opta por limitar direitos, subjugando o particular ao arbítrio do Estado. 64 Súmula 70 do STF: É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo. 65 Súmula 323 do STF: É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. 66 Súmula 547 do STF: Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais. 67 Pequena estampa; selo fiscal. 35 Após a análise das súmulas acima apresentadas, pode-se concluir, por analogia, da impossibilidade de retenção/apreensão do veículo automotor pelo inadimplemento dos débitos relacionados ao IPVA, porquanto tal medida revela-se como a mais pura forma de coação advinda do Estado Fiscal em forçar o contribuinte- devedor a quitar todas as dívidas, na medida em que este tem seu bem subtraído, só podendo reavê-lo após o pagamento de todos os tributos. 5.2 Acórdão proferido no julgamento do Agravo de Instrumento sob nº 0020383- 62.2015.8.05.0000 - TJBA No ano de 2016, o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em julgamento ao Agravo de Instrumento sob n° 0020383-62.2015.8.05.0000, de relatoria do Desembargador Maurício Kertzman Szporer, deferiu pedido de tutela antecipada de uma contribuinte que teve seu veículo apreendido em virtude de débitos em aberto a fim de determinar a liberação do automóvel, sem a necessidade de pagamento dos valores atinentes aos custos com reboque, assim como as diárias de permanência do veículo no depósito. O Acórdão proferido foi assim ementado, in verbis: AGRAVO DE INSTRUMENTO. APREENSÃO DE VEÍCULO EM "BLITZ DO IPVA" POR MOTIVO DE DÉBITO EM ABERTO. IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO REFORMADA. 1. Apesar de estar previsto no Código de Trânsito Brasileiro que "o veículo somente será considerado licenciado estando quitados os débitos relativos a tributos, encargos e multas de trânsito e ambientais, vinculados ao veículo" (art. 131, § 2º), bem como que "a restituição dos veículos apreendidos só ocorrerá mediante o prévio pagamento das multas impostas, taxas e despesas com remoção e estadia, além de outros encargos previstos na legislação específica" (art. 262, § 2º), a conduta da Administração Pública de apreender veículos por motivo de débito tributário ou de multa de trânsito viola direito fundamental do contribuinte, devendo, portanto, ser combatida. 2. Agravo de instrumento provido. Decisão reformada para ordenar a liberação do automóvel da agravante sem a necessidade de pagamento dos valores referentes ao custo com o reboque e com as diárias de permanência do veículo no pátio da Administração. (Classe: Agravo de Instrumento,Número do Processo: 0020383- 62.2015.8.05.0000, Relator(a): MAURICIO KERTZMAN SZPORER,Publicado em: 19/03/2016) 36 O Eminente Relator Maurício Kertzman asseverou que, em que pese haver previsão expressa no Código de Trânsito Brasileiro acerca da remoção de veículos com débitos relativos a tributos, encargos ou multas de trânsito e ambientais68, a Administração Pública não poderia fazê-la em virtude da patente violação de direito fundamental do contribuinte/cidadão. Outrossim, o Douto Desembargador ainda acrescentou existir procedimento específico para que o Fisco Estadual - assim como os demais entes da federação - cobre seus créditos perante os administrados por meio do rito previsto na Lei de Execução Fiscal (Lei n° 6.830/80), razão pela qual a Administração Pública não pode se valer de meios indiretos de cobrança utilizando como argumento o exercício de seu poder de polícia. Em outra senda, afirmou que na eventual hipótese de inexistir o pré-requisito de adimplemento de todos os débitos para a emissão do Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV), a conduta do Estado estaria eivada de legalidade, posto estar no pleno exercício de seu dever de organizar a sociedade. Entretanto, pontua que o intuito de fiscalização do Estado nas denominadas “Blitz do IPVA” é, unicamente, a quitação da dívida, e não o licenciamento do automóvel, o que gera, indubitavelmente, a ilegalidade da atuação estatal, em virtude de ultrapassar os limites constitucionais e adentrar o patrimônio do contribuinte, numa clara violação ao direito constitucional e, frise-se, fundamental, à propriedade. Acrescente-se, ainda, que a decisão acima analisada, foi adotada por unanimidade pelos demais Desembargadores que compunham a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia na ocasião do julgamento. 5.3 Acórdão proferido no julgamento da Apelação Cível sob nº 0001675- 86.2012.8.19.0029 - TJRJ Inicialmente, antes de adentrar nos termos da decisão proferida, importante destacar que em 09 de outubrode 2017, a Assembleia Legislativa do Estado do Rio 68 Art. 131. (...) § 2º O veículo somente será considerado licenciado estando quitados os débitos relativos a tributos, encargos e multas de trânsito e ambientais, vinculados ao veículo, independentemente da responsabilidade pelas infrações cometidas. 37 de Janeiro editou a Lei Estadual sob nº 7.718/2017, a qual dispõe sobre a inadimplência do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). O art. 1º da referida lei expõe o que segue, in verbis: Art. 1º - A inadimplência do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores - IPVA, não poderá ser usada pelo Poder Executivo, como motivo impeditivo para que os proprietários dos veículos possam, junto ao DETRAN, vistoriar, inspecionar quanto às condições de segurança veicular, registrar, emplacar, selar a placa e licenciar veículo para a obtenção do Certificado de Registro e Licenciamento Anual, conforme prescreve o inciso III do Art. 22 do Código de Trânsito Brasileiro - CTB ( Lei nº 9.503/1997 ).69 Posto isso, o Estado do Rio de Janeiro proibiu o Departamento Estadual de Trânsito daquele estado (Detran-RJ) de impedir os proprietários de veículos que estejam inadimplentes com o pagamento do IPVA vistoriar, inspecionar, registrar, emplacar, selar a placa, bem como licenciar o veículo para a obtenção do Certificado de Registro e Licenciamento Anual (CRLV). Pois bem. No julgamento da Apelação Cível sob nº 0001675- 86.2012.8.19.0029, de relatoria do Desembargador Carlos José Martins Gomes, o TJRJ, por meio da sua Décima Sexta Câmara Cível, por unanimidade, deu provimento ao recurso interposto pelo contribuinte, a fim de determinar a liberação do veículo anteriormente retido em razão de débitos referentes ao IPVA. Outrossim, restou consignado em Acórdão que a liberação seria condicionada ao pagamento das diárias dos primeiros 30 (trinta) dias de permanência, bem como das multas e despesas administrativas atinentes à remoção do veículo (taxa de reboque) e ainda os períodos de IPVAs antes da vigência da Lei Estadual nº 7.718/17. O Acórdão acima referido foi assim ementado, in verbis: Ementa: Apelação cível. Ação ordinária objetivando a liberação de veículo que foi apreendido e removido ao depósito, mediante pagamento da taxa de reboque e diárias limitadas ao valor de 30 dias. Sentença de improcedência do pedido. Lei Estadual nº 7.718, de 09 de outubro de 2017, que prescreve em seu art. 1º que a inadimplência do IPVA, não poderá ser usada pelo Poder Executivo, como motivo 69 RIO DE JANEIRO (Estado). Lei nº 7.718, de 09 de outubro de 2017. Dispõe sobre a inadimplência do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores - IPVA. Rio de Janeiro, RJ. 38 impeditivo para que os proprietários dos veículos possam, junto ao DETRAN, vistoriar, inspecionar quanto às condições de segurança veicular, registrar, emplacar, selar a placa e licenciar veículo para a obtenção do Certificado de Registro e Licenciamento Anual, conforme prescreve o inciso III do Art. 22 do Código de Trânsito Brasileiro. Ao tempo da apreensão do veículo e sua remoção ao depósito em 2011, vigia o artigo 262 do CTB, que limitava em até 30 dias o ônus ao proprietário do pagamento pela permanência do veículo no depósito, posteriormente revogado pela Lei nº 13.281, de 2016, que acrescentou ao artigo 271 do CTB o § 10, o qual dispõe que o pagamento das despesas de remoção e estada será correspondente ao período integral, contado em dias, em que efetivamente o veículo permanecer em depósito, limitado ao prazo de 6 (seis) meses. Em prestígio ao princípio do tempus regit actum, deve-se limitar a cobrança das taxas e despesas de remoção e de estadia aos primeiros 30 dias de custódia do veículo, nos termos do revogado artigo 262 do CTB, isto porque, em se tratando de lei de efeitos materiais e mais gravosa ao cidadão, deve incidir a lei vigente na data em que o veículo foi apreendido, como forma de prestação à segurança jurídica e estabilidade das relações. Precedente desta Corte. Provimento do recurso, para determinar ao réu a liberação do veículo do depósito, condicionada ao pagamento pelo autor das diárias dos primeiros 30 dias de permanência, além das multas e taxa de reboque e períodos de IPVAs, se devidos, até a entrada em vigor da Lei Estadual nº 7.718/17. Sem custas em razão da isenção legal prevista no art. 17, inciso IX, da Lei Estadual nº 3.350/1999, e da taxa judiciária, nos termos da Súmula nº 76 deste Tribunal. Condenação em honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor atualizado da causa ao CEJUR-DPGE. (TJRJ - Apelação Cível nº 0001675-86.2012.8.19.0029, Relator(a): Desembargador Carlos José Martins Gomes, Publicado em: 31/05/2019) Nesta demanda a parte autora pleiteou a imediata liberação de seu veículo e sua retirada de depósito. Em exordial, o autor asseverou ser caminhoneiro e necessitar do veículo para sua atividade laborativa. Contudo, em sede de julgamento de primeira instância, o Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Magé julgou totalmente improcedentes os pedidos autorais. 5.4 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.998 O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) nº 2.998, na qual o órgão discutia as exigências para liberação de certificado de registro e licenciamento de veículo, como o pagamento de 39 multas e tributos, conforme prevê os artigos 124, VIII70, 12871 e 131, §2º72, todos do CTB. Questionou ainda a constitucionalidade do art. 161 do CTB73, que afirma constituir infração de trânsito a desobediência das resoluções expedidas pelo Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN). Em julgamento ocorrido no dia 10 de abril de 2019, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, deu interpretação ao art. 161, parágrafo único, conforme a Constituição, para afastar a possibilidade de sanções administrativas impostas pelo CONTRAN. Quanto aos arts. 124, VIII, 128, e 131, § 2º, do CTB, o STF declarou suas constitucionalidades, por maioria, sendo vencido o voto do Ministro Celso de Mello. Ato contínuo, o Ministro Marco Aurélio, relator da ação, afirmou que a circulação de veículos pressupõe certas formalidades legais que devem ser cumpridas pelos proprietários a fim de que estes preencham todos os requisitos determinados pela lei, incluídos o pagamento de tributos, encargos e multas de trânsito associados ao automóvel. Segundo o Relator, tal exigência não ocasiona restrição ao direito de propriedade do contribuinte, posto não se tratar de coação política advinda da Administração Pública com a intenção de compelir o cidadão ao pagamento de todos os débitos devidos. Data maxima venia, alinho-me ao voto vencido proferido pelo Ministro Celso de Mello. Em brilhante colocação, o referido Ministro afirmou existir uma sanção política a condição de pagamento dos débitos ao licenciamento do veículo. Isto posto, 70 Art. 124. Para a expedição do novo Certificado de Registro de Veículo serão exigidos os seguintes documentos: (...) VIII - comprovante de quitação de débitos relativos a tributos, encargos e multas de trânsito vinculados ao veículo, independentemente da responsabilidade pelas infrações cometidas; 71 Art. 128. Não será expedido novo Certificado de Registro de Veículo enquanto houver débitos fiscais e de multas de trânsito e ambientais, vinculadas ao veículo, independentemente da responsabilidade pelas infrações cometidas. 72 Art. 131. O Certificado de Licenciamento Anual será expedido ao veículo licenciado, vinculado ao Certificado de Registro, no modelo e especificações estabelecidos pelo CONTRAN. (...) § 2º O veículo somente será considerado licenciado estando quitados os débitos relativos
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