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“É O SONHO DA GENTE INDO EMBORA!”: 
RELAÇÕES TERRITORIAIS E A REIVINDICAÇÃO 
EXISTENCIAL DA COMUNIDADE QUILOMBOLA 
LAGOAS-PI (2005-2014) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
EMANOEL JARDEL ALVES OLIVEIRA 
 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO 
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA 
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: HISTÓRIA E ESPAÇOS 
LINHA DE PESQUISA: LINGUAGUENS, IDENTIDADES E ESPACIALIDADES 
 
 
 
 
 
“É O SONHO DA GENTE INDO EMBORA!”: RELAÇÕES TERRITORIAIS E A 
REIVINDICAÇÃO EXISTENCIAL DA COMUNIDADE QUILOMBOLA LAGOAS-
PI (2005-2014) 
 
 
 
 
EMANOEL JARDEL ALVES OLIVEIRA 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL/RN 
2020 
 
 
EMANOEL JARDEL ALVES OLIVEIRA 
 
 
 
 
 
“É O SONHO DA GENTE INDO EMBORA!”: RELAÇÕES TERRITORIAIS E A 
REIVINDICAÇÃO EXISTENCIAL DA COMUNIDADE QUILOMBOLA LAGOAS-
PI (2005-2014) 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada como requisito parcial para 
obtenção do título de Mestre em História no Programa de 
Pós-Graduação em História; Área de Concentração em 
História e Espaços; Linha de Pesquisa: Linguagens, 
Identidades e Espacialidades; Centro de Ciências Humanas, 
Letras e Artes da Universidade Federal do Rio Grande do 
Norte, sob a orientação do Prof. Dr. Magno Francisco de 
Jesus Santos. 
 
 
 
 
 
 
NATAL/RN 
2020 
 
 
 
 
 
 
 
 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN 
Sistema de Bibliotecas - SISBI 
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes 
- CCHLA 
 
Oliveira, Emanoel Jardel Alves. 
 "É o sonho da gente indo embora!": relações territoriais e a reivindicação existencial da comunidade 
quilombola Lagoas-PI (2005-2014) / Emanoel Jardel Alves Oliveira. - Natal, 2020. 
 128f.: il. Color. 
 
 Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Pós-Graduação em 
História, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2020. 
 Orientador: Prof. Dr. Magno Francisco de Jesus Santos. 
 
 
 1. Quilombo Lagoas-PI - Dissertação. 2. Territorialização - Dissertação. 3. Reivindicação Existencial - 
Dissertação. I. Santos, Magno Francisco de Jesus. II. Título. 
 
RN/UF/BS-CCHLA CDU 94(=414)(812.2) 
 
 
 
Elaborado por Heverton Thiago Luiz da Silva - CRB-15/710 
 
 
 
 
 
 
 
EMANOEL JARDEL ALVES OLIVEIRA 
 
 
 
“É O SONHO DA GENTE INDO EMBORA!”: RELAÇÕES TERRITORIAIS E A 
REIVINDICAÇÃO EXISTENCIAL DA COMUNIDADE QUILOMBOLA LAGOAS-
PI (2005-2014) 
 
 
Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre no Curso de Pós-
Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, pela comissão 
formada pelos professores: 
 
_______________________________________________________ 
Prof. Dr. Magno Francisco de Jesus Santos – UFRN 
(Orientador) 
 
 
_______________________________________________________ 
Prof. Dr. Renato Amado Peixoto – UFRN 
(Avaliador Interno) 
 
 
_______________________________________________________ 
Profa. Dra. Martha Campos Abreu – UFF 
(Avaliadora Externa) 
 
 
 
NATAL, 03 DE SETEMBRO DE 2020 
 
 
DEDICATÓRIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Aos quilombolas da comunidade Lagoas, 
que sonham, lutam e reivindicam o direito à vida. 
 
 
AGRADECIMENTOS 
Às pessoas comuns que sobrevivem ao agora 
Embora uma vida resumida em vinte e cinco anos não seja tão longa, muitas foram as 
pessoas que caminharam comigo até aqui. Primeiramente, agradeço a minha família – minha 
mãe (Eliete Alves Oliveira), minha avó (Heloísa Alves Oliveira), meu pai (José Antônio de 
Moura) e minhas tias (Hilia Maria Ferreira e Eleniza Alves Martins Costa) – que me criaram e 
se fizeram de ponte, entre mim e a educação, para que eu conseguisse alcançar alguns sonhos. 
Estendo também os meus agradecimentos a minha madrinha (Maria Alina dos Santos) e aos 
meus irmãos (Maria Ingrid de Oliveira Moura e José Antônio de Moura Jr.), que acompanham 
de perto as minhas lutas e são essenciais em minha vida. Saibam que todos os meus esforços 
são para além de uma realização pessoal. 
Apesar do mestrado ter um tempo curto de curso, algumas pessoas caminharam e 
marcaram a minha vida ao longo dos últimos três anos. Nesse sentido, agradeço ao meu antigo 
orientador e amigo, Mairton Celestino da Silva, por me estimular a fazer o mestrado e viabilizar 
alguns contatos e fontes. A minha trajetória acadêmica é marcada, em grande medida, pela sua 
generosidade e paixão pela história. Agradeço também ao meu cunhado, Douglas Rafael, que 
me recebeu em seu apartamento durante todo o período de seleção do mestrado. O seu apoio 
foi essencial durante esse período. Da mesma forma, sou grato a todos os meus amigos do 
mestrado, em especial a: Camila Rafaela, Danielle Neves, Eudymara Queiroz, Flademir Dantas, 
Hugo Barbalho, João Guilherme, Juscelino Barros, Kallyne Araújo, Mirthis Costa, Luana 
Azevedo, Luana Ramalho, Patrícia Azevedo, Pedro Dantas, Ristephany Kelly, Rodrigo Guerra, 
Tarcísio Bezerra e Victor Costa; pelos diversos momentos em que estivemos juntos. Grande 
sorte, a minha, em ter conhecido todos vocês! 
Além dos amigos potiguares, tive o privilégio em compartilhar momentos felizes com 
pessoas que já eram familiares. Agradeço aos amigos, George Costa e Tamires Duarte, com 
quem vivenciei dias incríveis. Da mesma forma, sou grato a Paulo Lúcio e Douglas Dantas, que 
trouxeram muitas alegrias durante algumas semanas em Natal-RN. Em especial, agradeço a 
Emanuel Batista, que compartilhou comigo, além das despesas de uma casa, todo um ano 
marcado pelo consumo de artes e culturas: textos, músicas, filmes e séries; regados pela leveza 
que um semblante conhecido poderia trazer. A presença de vocês foi revigorante durante o 
mestrado, obrigado! 
 
 
Além desses nomes, quero agradeço, de modo geral, a todos os profissionais da Pós-
Graduação em História e Espaços da UFRN. Em especial, ao meu orientador, Magno Francisco 
de Jesus Santos, que sempre foi prestativo, atencioso e profissional. Caminhar com vocês 
durante esse percurso foi uma experiência gratificante, daquelas que são levadas para o resto 
da vida. Por fim, e não menos importante, minha gratidão se estende a CAPES pelo incentivo 
e investimento na pesquisa, sobretudo por viabilizar a minha permanência em Natal-RN e 
possibilitar a minha qualificação enquanto profissional da área de História. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fogo!... Queimaram Palmares, 
Nasceu Canudos. 
Fogo!...Queimaram Canudos, 
Nasceu Caldeirões. 
Fogo!...Queimaram Caldeirões, 
Nasceu Pau de Colher. 
Fogo!...Queimaram Pau de Colher... 
E nasceram, e nascerão tantas outras comunidades 
que os vão cansar se continuarem queimando. 
Porque mesmo que queimem a escrita, 
Não queimarão a oralidade. 
Mesmo que queimem os símbolos, 
Não queimarão os significados. 
Mesmo queimando o nosso povo, 
Não queimarão a ancestralidade. 
 
Nêgo Bispo 
 
 
RESUMO 
O presente trabalho tem como objetivo analisar a historicidade da organização e 
territorialização da comunidade quilombola Lagoas-PI, assim como evidenciar a reivindicação 
existencial dos lagoanos frente à luta pela titulação das suas terras, que ocorreram durante os 
anos de 2005 à 2014. Nesse sentido, partimos da ressemantização do conceito de quilombo, 
enquanto categoria analítica, para compreender como os lagoanos se apropriaram dos seus 
direitos constitucionais, se organizaram, realizaram a territorialização de suas terras e 
reivindicaram a sua existência. Dessa maneira, esta pesquisa tem como mote apresentar as 
mobilizações dos representantes das cento e dezenove (119) localidades, que são situadas em 
seis (06) municípios no sudeste do estado, para construirum território quilombola. Quer dizer, 
tenciona abordar, a partir da iniciativa organizacional desses sujeitos e dos convênios 
estabelecidos com algumas entidades, a respeito da territorialização e materialização da 
comunidade quilombola Lagoas, compreendendo as suas ações como contra colonizadoras e 
descoloniais. Além disso, pretende discutir acerca dos conflitos territoriais que ameaçaram a 
sua existência, destacando a luta por políticas públicas em razão do racismo ambiental sofrido 
pela comunidade. 
Palavras-chave: Quilombo Lagoas-PI; Territorialização; Reivindicação Existencial. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
The present work aims to analyze the historicity of the organization and territorialization of the 
Lagoas-PI quilombola community, as well as to highlight the existential claim of the Lagoans 
regarding the struggle for the title of their lands, which occurred during the years 2005 to 2014. 
In this sense, we started from the re-semantics of the concept of quilombo, as an analytical 
category, to understand how the lagoons appropriated their constitutional rights, organized 
themselves, carried out the territorialization of their lands and claimed their existence. Thus, 
this research aims to present the mobilizations of representatives from one hundred and nineteen 
(119) locations, which are located in six (06) municipalities in the southeast of the state, to build 
quilombola territory. That is to say, it intends to approach, based on the organizational initiative 
of these subjects and the agreements established with some entities, regarding the 
territorialization and materialization of the Lagoas quilombola community, understanding their 
actions as against colonizers and decolonials. In addition, it intends to discuss the territorial 
conflicts that threatened its existence, highlighting the struggle for public policies due to the 
environmental racism suffered by the communit 
 
Keywords: Quilombo Lagoas-PI; Territorialization; Existential Claim. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE SIGLAS 
FCP – Fundação Cultural Palmares...........................................................................................18 
INCRA – O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária ..........................................18 
CONAQ – Coordenação Nacional de Quilombos......................................................................24 
SEPPIR – Promoção da Igualdade Racial.................................................................................24 
ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.......................................................44 
ABA – Associação Brasileira de Antropologia..........................................................................44 
OIT – Organização Internacional do Trabalho...........................................................................45 
CECOQ – Coordenação Estadual das Comunidades Negras Rurais Quilombolas ....................48 
INTERPI – Instituto de Terras do Piauí.....................................................................................52 
PDHC – Projeto Dom Helder Câmara.......................................................................................56 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE IMAGENS 
Imagem 1 – Audiência pública realizada no dia 27 de maio de 2007, na câmara municipal de 
São Raimundo Nonato-PI..........................................................................................................70 
Imagem 2 – Reuniões de definição e aprovação dos limites do território pleiteado e identificado 
pelas famílias do quilombo Lagoas............................................................................................76 
Imagem 3 – Levantamento dos marcos geodésicos limitantes da Datas de Sesmarias para 
reconstituição da malha fundiária do Território do quilombola de Lagoas.................................78 
Imagem 4 – Cadastramento das famílias remanescentes do quilombo Lagoas, usando-se 
formulários específicos do INCRA............................................................................................80 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
MAPAS 
 
Mapa 1 – Localização do território Quilombola Lagoas no estado do Piauí. Fonte: Relatório 
técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas....................................................................................................................... ................17 
Mapa 2 – Mapa do Território pleiteado pelas famílias remanescentes quilombolas de 
Lagoas................................................................................................................................83 
Mapa 3 – Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no 
Brasil................................................................................................................................101 
Mapa 4 – Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no 
Piauí..................................................................................................................................105 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
O DEVIR QUILOMBOLA, uma introdução......................................................................... 15 
CAPÍTULO I – “NÓS SÓ O FIZEMOS PORQUE SOMOS CAPAZES”: A 
COMUNIDADE LAGOAS E A APROPRIAÇÃO DOS DIREITOS QUILOMBOLAS.........34 
1.1 De organização criminosa à organização de direito: a historicidade do conceito de 
quilombo ...................................................................................................................................36 
1.2 Fundamentação constitucional: direitos étnico-raciais e territoriais da comunidade 
quilombola Lagoas ...................................................................................................................48 
1.3. Relações de convênio: Projeto Dom Helder Câmara e a Cáritas Brasileira .......................55 
CAPÍTULO II – OS CONTRA COLONIZADORES E A TERRITORIALIZAÇÃO DO 
QUILOMBO LAGOAS..........................................................................................................58 
2.1. A contra colonização sob uma perspectiva descolonial .................................................63 
2.2 O conhecimento e produção: a territorialização do quilombo Lagoas.............................69 
2.3 A materialização do quilombo Lagoas: mapas, gráfico e tabelas ...................................82 
CAPÍTULO III – A REIVINDICAÇÃO EXISTENCIAL DA COMUNIDADE 
QUILOMBOLA LAGOAS ....................................................................................................91 
3.1 Conflitos quilombolas: do racismo institucional ao ambiental...........................................92 
3.2 O mapa dos conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil: um olhar 
voltado para as comunidades quilombolas ................................................................................99 
3.3 “Um grito no semiárido”: a crise existencial da comunidade quilombola Lagoas...........105 
O PERIGO DE UMA ÚNICA NARRATIVA, considerações finais ...................................113 
REFERÊNCIAS....................................................................................................................118 
 
15 
 
O DEVIR QUILOMBOLA, uma introdução 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Somos reconhecidos como comunidade 
quilombola, mas título que é bom, não temos. De 
repente a gente vê essas terras sendo invadidas 
por grandes empresas, que a gente não sabe da 
onde vem… E olha só como essas terras estão! 
Isso é um pedaço da gente, um pedaço da 
comunidade. É o sonho da gente indo embora!1 
Nailde Marques, Quilombo Lagoas 
 
1 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde noBrasil. 22 de dezembro de 2009. 
Disponível em: http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-
piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-
caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e. Acessado em: 22 de maio de 2020. 
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
16 
 
Devir. Quilombo. Sonho. Se você fizer uma rápida pesquisa no Google sobre os 
conceitos destas palavras, irá encontrar alguns significados que nos permitem estabelecer 
relações entre estes termos. Por exemplo, ao buscarmos compressões significativas a respeito 
de “devir”, encontraremos nos primeiros resultados expressões voltadas para um “processo de 
mudanças efetivas pelas quais todo ser passa”, “movimento permanente que atua como regra, 
sendo capaz de criar, transformar e modificar tudo o que existe”, ou algo que “passa a ser, fazer 
e existir”; em relação ao termo “quilombo”, com dois cliques podemos ter acesso aos 
significados “lugar secreto em que ficavam ou para onde iam os escravos fugidos”, 
“comunidade de resistência negra na época escravista” e “comunidades negras 
contemporâneas”; já sobre a palavra “sonho”, a nossa navegação levará a definições como 
“ação de reunir pensamentos”, “anseio permanente” ou “ideia que uma pessoa ou grupo almeja 
com veemência”. 
Ao sintetizar os significados, podemos obter alguns resultados relativos às realidades 
das comunidades quilombolas contemporâneas no Brasil. Um destes, pelo menos o mais 
interessante para mim, é: “processo de mudanças efetivas que as comunidades negras 
contemporâneas idealizam com veemência”; pois consegue reunir elementos-chave que 
definem as situações dos quilombolas no país. Nesse sentido, o devir quilombola pode ser 
compreendido, como exemplo, a partir das mudanças constitucionais que foram realizadas, ao 
longo dos anos, através das reivindicações dos quilombolas, assim como também por meio dos 
sonhos existentes que são expressados nos anseios de diversas “Naildes”, em todo o território 
brasileiro. No entanto, embora a sintetize dos conceitos desses termos nos remeta à ideia de um 
“caminho quilombola promissor”, é importante pensarmos que, muitas vezes, o devir 
quilombola encontra-se rodeado pela não titulação e invasão das terras quilombolas, isto é, pela 
frustração dos sonhos de inúmeras comunidades frente aos seus direitos constitucionais. 
Na epígrafe introdutória, a quilombola Nailde Marques manifesta uma fala que 
representa o desconforto da comunidade Lagoas em relação aos descasos do Estado, pois são 
inseridos num campo de disputas territoriais que os lagoanos se encontram.2 Localizado no 
território da Serra da Capivara,3 o quilombo Lagoas faz parte de seis (06) municípios do sudeste 
 
2 Ressalta-se que os termos utilizados: lagoanos, quilombo Lagoas; território lagoano e comunidade quilombola 
Lagoas são variáveis da noção de “comunidades remanescente quilombola Lagoas”. Além disso, a comunidade 
recebe esse nome por possuir muitas localidades, em seu território, com o nome “Lagoas”, a exemplo de “Lagoa 
das Emas e Lagoa das Pedras”. 
3 Um do 11 territórios do Piauí: sendo estes: Carnaubais – PI, Chapada das Mangabeiras – PI, Cocais – PI; Entre 
Rios – PI, Planície Litorânea – PI, Serra Da Capivara – PI, Tabuleiros Do Alto Parnaíba – PI, Vale do Canindé 
– PI, Vale Do Guaribas – PI, Vale do Sambito – PI e Vale dos Rios Piauí e Itaueira – PI. 
17 
 
piauiense – São Raimundo Nonato, Fartura, Várzea Branca, Dirceu Arcoverde, São Lourenço 
e Bonfim –, no qual é constituído por cento e dezenove (119) localidades, possuindo 
aproximadamente mil e quinhentas (1.500) famílias,4 caracterizando-se assim como o maior 
território quilombola do país em núcleos familiares. 
Mapa 1: Localização do território Quilombola Lagoas no estado do Piauí. 
 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
A região localizada no mapa 1, corresponde ao atual território da comunidade 
quilombola Lagoas, cujo está inserido no semiárido e na caatinga do estado do Piauí, que por 
sua vez é marcado pela escassez de chuvas, assim como também por altas temperaturas. De 
acordo com a antropóloga Ana Tereza Faria, “[...] a distribuição espacial das várias 
comunidades do quilombo se deu preferencialmente em torno de pequenas aguadas, que são 
áreas baixas formadas naturalmente ou aprofundadas por escavação”,5 cujo costumam acumular 
água durante o período chuvoso. Nesse sentido, podemos compreender que as pequenas lagoas 
 
4 É registrado no relatório técnico a existência de mais de 1.490 famílias nesse território. 
5 FARIA, Ana Tereza Dutra Pena de. Comunidade quilombola Lagoas. - Belo Horizonte: FAFICH, 2016. p. 05. 
18 
 
foram fontes importantes para o estabelecimento e permanência das comunidades negras e dos 
seus animais na região. Inclusive, a “[...] rica nomeação local das comunidades enfatiza a 
centralidade dessas fontes de água, e também inclui nomes de animais e outras características 
da paisagem”,6 isto é, a partir da nomeação das localidades podemos perceber algumas 
particularidades do território lagoano. 
Lagoa Grande, Lagoa do Calango, Lagoa dos Bois, Lagoa de São Victor, Lagoa de 
Dentro, Lagoa dos Canudos, Lagoa da Gameleira, Lagoa do Angico, Lagoa do 
Serrote, Lagoa do Umbuzeiro, Lagoa dos Queixadas, Lagoa da Gameleira, Lagoa do 
Travessão, Lagoa dos Meninos, Lagoa do Mulungu, Lagoa do Cipó, Lagoa do Mocó, 
Lagoa da Pedra, Lagoa do Jacaré, Lagoa do Riacho, Lagoa dos Currais, Lagoa dos 
Prazeres, Lagoa Rasa, Lagoa das Caraíbas, Lagoa das Cascas, Lagoa da Vaca, Lagoa 
dos Tobões, Lagoa do Amaro, Lagoa do Capim, Lagoa dos Porcos, Lagoa do 
Pompilho, Lagoa da Gangorra, Lagoa da Taboa, Lagoa dos Torrões, Lagoa do 
Germano, Lagoa das Emas, Lagoa do Encanto, Lagoa do Mel, Lagoa dos Martins, 
Lagoa dos Moisés, Lagoa das Pombas, Lagoas, Lagoa dos Soares, Lagoa dos 
Raimundos, Lagoa do Peixe, Lagoa Ruim, Lagoa do Gato, Lagoa do Calixto, Lagoa 
do Gado Corredor, Lagoa das Caraíbas (Lindjonson), Lagoa Nova, Lagoa do Boi, 
Lagoa das Flores, Lagoa da Firmeza, Lagoa do Cansanção, Lagoa da Onça, Lagoa dos 
Torrões, Lagoa do Preá [...].7 
As quase sessenta (60) localidades que possuem o nome “Lagoa”, além das demais 
existentes, situam-se na microrregião de São Raimundo Nonato, a 600 km de distância de 
Teresina-PI, capital do estado. A formação da comunidade Lagoas, ocorreu a partir da 
autodeclaração enquanto “comunidade remanescente de quilombo”, cujo a comunidade foi 
certificada, em 2008, pela Fundação Cultural Palmares (FCP), tornando-se registrada no 
Livro de Cadastro Geral. No entanto, ressalta-se que a comunidade ainda não recebeu a 
titulação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Desse modo, 
em consequência da não titulação, os lagoanos vem enfrentando,8 ao longo desses anos, 
injustiças ambientais e ameaças de invasão de algumas empresas mineradoras e carvoeiras 
na região de São Raimundo Nonato.9 
Os impasses enfrentados pela comunidade Lagoas, estão relacionadosdiretamente 
com as discussões acerca da territorialização da comunidade.10 Sendo assim, três questões 
centrais nos chamam atenção: (1) Como ocorreu o processo de organização da comunidade 
 
6 FARIA, Ana Tereza Dutra Pena de. Comunidade quilombola Lagoas. - Belo Horizonte: FAFICH, 2016. p. 06. 
7 Idem, p. 07. 
8 Os “lagoanos”, foi a expressão utilizada pela antropóloga Simone Matos, para se referias ao conjunto de 
moradores do quilombo Lagoas. Consultar: MATOS, Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da 
territorialidade quilombola: uma etnografia. (Dissertação em Antropologia). Teresina (PI), agosto de 2013. 
9 MATOS, Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da territorialidade quilombola: uma 
etnografia, 2013. 
10 MORAES, M. D. C. Espaço, territórios e redes: polissemia e variantes conceituais In: Memórias de um sertão 
desencantado (modernização agrícola, narrativas e atores sociais nos cerrados do sudoeste piauiense); Tese de 
Doutorado- UNICAMP; SP, 2000, pp. 134-151. 
19 
 
quilombola Lagoas? (2) De que modo a territorialização e a produção do relatório técnico 
representam uma forma de materialização da comunidade? (3) Quais são os problemas 
enfrentados pelos lagoanos e como podem comprometer a existência da comunidade? Para 
responder tais questões, analisaremos o respectivo conjunto de fontes: O “Relatório técnico 
de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas”,11 as entrevistas realizadas na comunidade, pela antropóloga Simone Matos, e o 
Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no brasil,12 a fim de apresentar 
evidências relacionadas às estratégias utilizadas pelos lagoanos durante os processos de 
organização e territorialização da comunidade, assim como discutir a respeito da 
reinvindicação existencial dos lagoanos, que ocorreram entre os anos de 2005-2014. 
Portanto, o que me interessa aqui é entender como a comunidade quilombola Lagoas 
passou, primeiramente, a ser construída a partir de sua organização e, em seguida, através da 
sua territorialização. Além disso, procuro destacar as reinvindicações existenciais dos lagoanos, 
com a finalidade de discutir a respeito da relação entre o Estado e o neoliberalismo, sobretudo, 
pensar como essa ligação afetou a comunidade Lagoas durante o período pesquisado. Em outras 
palavras, este trabalho objetiva compreender como as ações dos lagoanos se configuraram 
enquanto atos contra colonizadores frente ao racismo ambiental sofrido pela comunidade. No 
entanto, considerando tudo o que foi dito, é importante confessar que até a minha chegada nesse 
objeto de estudo alguns caminhos foram percorridos. 
A minha inserção inicial, no complexo das discussões dessa área, se deu através do 
interesse particular em discutir a respeito de como as comunidades quilombolas 
contemporâneas construíam a sua identidade a partir das relações entre memória e território. 
No início da segunda metade de 2017, após a defesa do meu trabalho monográfico,13 surgiu a 
oportunidade de debater com a turma de Licenciatura em Educação do Campo, da Universidade 
Federal do Piauí (UFPI/CSHNB),14 a respeito do tema “Currículo como narrativa étnico-racial”, 
 
11 Relatório Técnico resultante de atividades realizadas no exercício de junho 2009 a julho de 2010, na comunidade 
quilombola de Lagoas apresentado por equipe interinstitucional (INCRA, INTERPI), com vistas à instrução do 
Processo/SR (24) INCRA/PI/Nº 54380.002161/2008-03. 
12 Disponível em: <http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-agricultores-familiares-e-comunidades-
quilombolas-de-sao-raimundo-nonato-lutam-contra-instalacao-de-empresas-de-mineracao-e-carvoarias-em-seu-
territorio>. 
13 OLIVEIRA, Emanoel Jardel Alves. Quilombo Amarra Negro: história, aspectos culturais e a publicização de 
uma memória, 2006- 2015. 2017. 78 f. Monografia (Licenciatura em História) – Universidade Federal do Piauí, 
Picos, 2017. 
14 Na ocasião, fui convidado por alguns discentes para debater sobre os termos “raça e etnia” na turma do curso de 
Licenciatura em Educação do Campo – Ciências da Natureza. 
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-agricultores-familiares-e-comunidades-quilombolas-de-sao-raimundo-nonato-lutam-contra-instalacao-de-empresas-de-mineracao-e-carvoarias-em-seu-territorio
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-agricultores-familiares-e-comunidades-quilombolas-de-sao-raimundo-nonato-lutam-contra-instalacao-de-empresas-de-mineracao-e-carvoarias-em-seu-territorio
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-agricultores-familiares-e-comunidades-quilombolas-de-sao-raimundo-nonato-lutam-contra-instalacao-de-empresas-de-mineracao-e-carvoarias-em-seu-territorio
20 
 
no qual, nesta feita, me detive a abordar sobre as noções conceituais de raça e etnia,15 focando 
o debate na dimensão histórica dos campos semânticos de ambas as noções. 
Foram os contatos acadêmicos que me proporcionaram outras oportunidades referentes 
a debater temas como: “Educação e Diversidade”16 e “Raça, Gênero e Etnia”.17 Discutir essas 
temáticas, no que tange os quilombolas, me possibilitou viajar para algumas cidades do sudeste 
e centro-norte do Piauí, através da rede solidária Cáritas Brasileira,18 no qual participei como 
palestrante de algumas oficinas e mesas redondas. Nessas ocasiões, a finalidade era dialogar, 
juntamente com educadores, lideranças de movimentos sociais e outros profissionais, de modo 
que pudéssemos refletir sobre esses temas, aplicando-os em questões contextuais das escolas 
municipais do semiárido piauiense.19 
Em uma dessas circunstâncias, tive o privilégio de compor uma mesa redonda 
juntamente com Maria Rosalina dos Santos,20 na Secretaria Municipal de Educação de 
Paulistana-PI. Na ocasião, a representante do movimento quilombola do Piauí iniciou seu 
pronunciamento saudando as figuras históricas de Zumbi dos Palmares, Dandara dos Palmares 
e Esperança Garcia,21 ressaltando a força dos negros no Brasil e a importância do diálogo entre 
os diversos setores públicos com os movimentos sociais negros, pois, de acordo com a mesma, 
por muito tempo foram negados não somente os direitos constitucionais, mas também os de se 
pronunciarem em ambientes educacionais e acadêmicos. Na continuidade de sua expressão, a 
militante ressaltou que “iria falar tudo o que tinha a dizer, pois carregava consigo a voz de mais 
 
15 MUNANGA, Kabengele. Uma abordagem conceitual das noções de raça, racismo, identidade e etnia. 3º 
Seminário Nacional Relações Raciais e Educação. 05, nov., 2003. Disponível em: 
<https://www.geledes.org.br/wp-content/uploads/2014/04/Uma-abordagem-conceitual-das-nocoes-de-raca 
racismo-dentidade-e-etnia.pdf> Acesso em: 10 jan. 2018. 
16 Participei como palestrante no projeto “Educação e Diversidade”, promovido pela Escola Municipal Liberato 
Vieira, na cidade de Ipiranga-PI entre os dias 17 de outubro e 29 de novembro de 2017. Nesta feita, tratei sobre o 
racismo na escola e a importância do dia da Consciência Negra. 
17 Integrei uma mesa redonda na “Ecoescola Thomas A. Kempis”, no dia 13 de Dezembro de 2017, na cidade de 
Pedro II-PI. Nessa abordagem, discuti sobre a raciologia no Brasil e a herança afro-brasileira. 
18 Nacionalmente, a Cáritas é um organismo da Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB), atuando em 
mais de 400 municípios em toda a nação, no fomento às iniciativas de Economia Solidária, Segurança Alimentar 
e Nutricional, Fundos solidários envolvendo jovens, mulheres, catadores(as) de materiais recicláveis, pequenos(as) 
agricultores(as), acampados(as) e assentados(as) de reforma agrária, ribeirinhos, quilombolas e indígenas. 
19 O semiárido brasileiro é uma região definida na lei federal nº 7.872 de 27de setembro de 1989, estando presente 
na região nordeste e sudeste, associado ao importante bioma da caatinga. No Piauí, fez-se em 2003 uma atualização 
dos dados relativos aos munícipios que compõe esse ambiente que atualmente, totalizando 148 municípios, 
abrangendo uma área de 156.241,25 Km², o que corresponde a cerca de 62,00% do estado do Piauí. LIMA, I. M. 
M.F.; ABREU, I. G.; LIMA, M. G. Semi-árido Piauiense: Delimitação e Regionalização. Carta CEPRO, Teresina 
(PI), v. 18, p.162-183, 2000. Disponível em: <http://files.iracildefelima.webnode.com/200000035-
72dff73d90/Defini%C3%A7%C3%A3o%20atual_%20Amb.%20Semi-%C3%A1rido_2004.pdf> Acessado em: 
15 jan. 2019. 
20 Coordenadora Estadual das Comunidades Quilombolas do Piauí – CECQPI –, líder sindical, trabalhadora rural 
e líder quilombola da comunidade Tapuio em Queimada Nova – PI. 
21 Sujeitos considerados referências históricas para o movimento negro no Brasil e no Piauí. 
https://www.geledes.org.br/wp-content/uploads/2014/04/Uma-abordagem-conceitual-das-nocoes-de-raca%20racismo-dentidade-e-etnia.pdf
https://www.geledes.org.br/wp-content/uploads/2014/04/Uma-abordagem-conceitual-das-nocoes-de-raca%20racismo-dentidade-e-etnia.pdf
http://files.iracildefelima.webnode.com/200000035-72dff73d90/Defini%C3%A7%C3%A3o%20atual_%20Amb.%20Semi-%C3%A1rido_2004.pdf
http://files.iracildefelima.webnode.com/200000035-72dff73d90/Defini%C3%A7%C3%A3o%20atual_%20Amb.%20Semi-%C3%A1rido_2004.pdf
21 
 
de quinhentos anos de silêncio”.22 Além disso, fez críticas ao sistema educacional por não 
cumprir propriamente as prescrições da Lei 10.639/2003.23 
O pronunciamento de Rosalina dos Santos, nesse contexto, soou semelhante a alguns 
discursos que eu já havia escutado, no qual me fez recordar a minha rápida passagem, enquanto 
representante cultural no Centro Acadêmico de História – CAHIS Ozildo Albano –, cujo 
participei da gestão “Ubuntu:24 entrar, permanecer e enegrecer”.25 O insight, naquele momento, 
se deu em decorrência da nossa gestão ser composta por vários(as) negros(as), que eram 
ligados(as) a entidades estudantis e colocavam a questão do racismo no Brasil como pauta 
importante, sobretudo para pensarmos esse problema dentro das Universidades Públicas. Em 
algumas reuniões do Centro Acadêmico, das assembleias grevistas e durante a ocupação 
estudantil no campus de Picos-PI em 2016,26 estivemos pautando a importância de se 
pronunciar em relação aos temas que estavam sendo discutidos, considerando os longos anos 
de opressão que os negros sofreram no Brasil, não somente pela falta de direitos constitucionais, 
mas também pelo silenciamento que pode ser compreendido como um desdobramento da falta 
de visibilidade desses sujeitos, seja na historiografia, política, universidades, entre outros 
espaços que refletem as consequências do colonialismo no Brasil.27 
Nessas duas experiências, podemos observar que existe pelo menos um ponto em 
comum, entre os sujeitos mencionados, que foi o destaque dado a importância da inserção e 
participação dos negros(as) nos diversos espaços possíveis, que por diversas vezes podem ser 
legitimados através do direito de estarem inseridos e se pronunciarem diante qualquer situação 
adequada. Desse modo, entendemos que a visibilidade e a participação desses sujeitos na 
contemporaneidade, se apresenta, neste trabalho, como um ponto importante, principalmente 
nesse momento em que o devir-negro se estabelece no mundo.28 Nesse sentido, considerando 
 
22 Expressão utilizada para significar todo o silenciamento dos negros e negras na História do Brasil. 
23 Lei que implementa Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das relações Étnico-Raciais e para o 
Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana, sancionada no dia 09 de janeiro de 2003. 
24 Ubuntu é uma antiga palavra africana e tem origem na língua Zulu (pertencente ao grupo linguístico bantu) e 
significa que “uma pessoa é uma pessoa através de outras pessoas. 
25 Gestão do Centro acadêmico de História UFPI – Picos, entre 2015 a 2016. 
26 Momento em que no Brasil se discutia sobre a PEC 241, que previa o congelamento dos investimentos públicos 
durante 20 anos. 
27 “O colonialismo, para além de todas as dominações por que é conhecido, foi também uma dominação 
epistemológica, uma relação extremamente desigual de saber-poder que conduziu à supressão de muitas formas 
de saber próprias dos povos e nações colonizados, relegando muitos outros saberes para um espaço de 
subalternidade.” – Nota de definição contida no prefácio do livro “Epistemologias do Sul”. SANTOS, Boaventura 
de Sousa; MENESES, Maria Paula. (Orgs,) Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez, 2010. 
28 Considerado como um preciso momento em que a história e as coisas se voltam para a questões pertinentes aos 
negros e negras, e em que a Europa deixou de ser o centro de gravidade do mundo. Além disso, o devir negro 
representa a institucionalização do termo negro enquanto padrão de vida. Sobre a noção de devir-negro: 
MBEMBE, Achille. A crítica da razão negra, Lisboa: Editora Antígona, 2014. GUATTARI, Félix; ROLNIK, 
Suely. Micropolítica. Cartografias do desejo. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2011. 
22 
 
esse valioso período em que a história tem-se voltado para a subalternidade, no qual, 
consequentemente, inúmeros teóricos tem discutido sobre os perigos de uma história única aos 
moldes eurocêntricos,29 consideramos importante refletir a respeito das consequências do poder 
e do saber colonialista na contemporaneidade, assim como da necessidade dos negros 
produzirem, demarcarem e simbolizarem novos espaços. 
Diante desse precioso momento, algumas instituições, revistas eletrônicas, reportagens 
e entre outros meios de comunicação em todo o Brasil estiveram dispostos a discutir sobre os 
problemas que envolvem o racismo, a falta de políticas públicas para negros(as), a demarcação 
das terras quilombolas, entre outros temas que atravessam o cotidiano dos(as) negros(as) no 
nosso país.30 Todavia, cabe ressaltar que a visibilidade tida atualmente passou por um processo 
de conquista, principalmente quando tratamos das comunidades negras rurais, que por várias 
décadas no Brasil careceram de estudos em decorrência da supervalorização, nas ciências 
sociais, da realização de pesquisas sobre os povos negros no contexto urbano. 
Nessa perspectiva, Carlos Santos (2015) coloca que a superestimação dos pesquisadores 
ocorreu porque os “[...] grupos negros urbanos, destacaram traços culturais de origem africana, 
os quais seriam indicativos de uma etnicidade”,31 isto é, as marcas indentitárias,32 eram mais 
perceptíveis em grupos negros urbanos, estabelecendo assim um contraste com os povos negros 
do espaço rural, sendo este o principal aspecto que motivou os principais estudos acadêmicos 
sobre os negros nos centros urbanos. 
 
29 QUIJANO, Anibal. Colonialidade do poder, Eurocentrismo e América Latina. In: A colonialidade do saber: 
eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas, Buenos Aires. CLACSO, Consejo 
Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005. MIGNOLO, Walter. Desobediencia epistémica: retórica de la 
modernidad, lógica de la colonialidad y gramática de la descolonialidad. Colección Razón politica, Ediciones del 
Signo, 2010. SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula (orgs.). Epistemologias do Sul. São Paulo: 
Cortez, 2010. TORRES, Maldonado Nelson. Pensamento crítico desde a subalternidade: os estudos étnicos 
como ciências descoloniais ou para a transformação das humanidades e das ciências sociais no século XXI. Afro-
Ásia, v.34, pp.105-129, 2006. GROSFOGUEL, Ramón. Para descolonizar os estudos de economia política e os 
estudos pós-coloniais: Transmodernidade, pensamento de fronteira e colonialidade global. Revista Crítica de 
Ciências Sociais, 80, Março 2008: pp.115-147.30 “O racismo e suas faces”, 2018 – UESB; “Discutindo o racismo no Brasil”, 2018 – Unimax Planck; e “Contra 
o racismo religioso”, 2017 – PUC-RJ. “Políticas públicas para negros”, 2016 – Artigo da Dra. Marcilene Garcia – 
UNESP – para a “Revista Raça”. “Povos quilombolas querem ocupar espaços na academia”, 2018 – UFMG – 
Reportagem. “Especial Quilombolas – Novas Lutas: os desafios de quilombolas no Ensino Superior”, 2018 – 
UFPA. “Quilombo: uma civilização contracolonialista, 2018 – UFPI. “UESPI negra – Quilombo, Território e 
Identidade”, 2018 – UESPI. 
31 SANTOS, Carlos Alexandre B. As comunidades negras rurais nas ciências sociais no Brasil: de Nina 
Rodrigues à era dos programas de pós-graduação em antropologia. Anuário Antropológico/2014, Brasília, UnB, 
v. 40, n. 1: 2015, p. 75. Disponível em: < 
http://www.dan.unb.br/images/pdf/anuario_antropologico/Separatas%202014_I/Ascomunidadesnegrasruraisnasc
ienciassociaisnoBrasil.pdf> Acessado em: 20 fev. 2018. 
32 BARTH, Fredrik. Ethnic groups and boundaries: the social organization of culture difference. London: 
George e Allen & Unwin, 1969. 
http://www.dan.unb.br/images/pdf/anuario_antropologico/Separatas%202014_I/AscomunidadesnegrasruraisnascienciassociaisnoBrasil.pdf
http://www.dan.unb.br/images/pdf/anuario_antropologico/Separatas%202014_I/AscomunidadesnegrasruraisnascienciassociaisnoBrasil.pdf
23 
 
Nesse mesmo seguimento, Lourdes Bandeira (1988) afirma que alguns estudiosos da 
temática, como Roger Bastide e Florestan Fernandes,33 corroboraram com essa perspectiva ao 
defenderem que “[...] as condições de vida do negro em situação rural eram culturalmente 
desagregadoras, pois dificultavam a persistência de cultos, ritos, tradições e deixavam-lhes 
poucas ocasiões e espaços de interação entre si”,34 ou seja, esses sociólogos fomentavam a ideia 
de que as vivências na zona urbana proporcionaram condições melhores para a persistência de 
traços culturais africanos, cujo, consequentemente, essas circunstâncias contribuíram para a 
focalização desses estudos nas camadas urbanas constituídas por negros, entre o final do século 
XIX até a segunda metade do século XX.35 
Embora esse contexto não fosse tão receptivo para o desenvolvimento de pesquisas 
sobre as comunidades negras rurais, o historiador Adelmir Fiabani coloca que no início do 
século XX algumas considerações começaram a serem tecidas a respeito desses sujeitos.36 
Inicialmente, em “A classe Operária” (1929),37 o quilombo era compreendido como fenômeno 
de resistência cultural africana, sendo relacionado, por Astrogildo Pereira, a um espaço ou 
movimento que representava a luta de classes. Ainda nessa perspectiva, Adelmir Fiabani (2008) 
afirma que entre as décadas de 1950 a 1980 “[...] acentuara-se as análises sobre o quilombo 
pelo viés marxista, que viam o quilombo, essencialmente, como forma de luta entre 
escravizadores e escravizados”.38 No entremeio desses anos, Décio Freitas, em 1971, publicou 
o livro intitulado de “Palmares: La guerrilha negra”,39 definindo o quilombo como uma 
expressão da luta de classes, sendo bem repercutida entre o movimento negro que naquele 
momento se reorganizava.40 
Ainda na década de 1970, os militantes do movimento negro de Porto Alegre criaram o 
Movimento Negro Unificado em São Paulo, com a finalidade de combater a discriminação 
racial.41 O conjunto de grupos e movimentos sociais que começaram a se organizar a partir de 
 
33 BASTIDE, Roger; FERNANDES, Florestan. Brancos e negros em São Paulo: ensaio sociológico sobre 
aspectos da formação, manifestações atuais e efeitos do preconceito de cor na sociedade paulistana. 2. ed. São 
Paulo: Nacional. 1959. 
34 BANDEIRA, Maria de Lourdes. Território negro em espaço branco: estudos antropológicos de Vila Bela. 
São Paulo: Brasiliense, 1988. p. 21. 
35 Ibid., p. 21. 
36 FIABANI, Adelmir. Os novos quilombos: luta pela terra e afirmação étnica no Brasil (1988-2008), 2008. 
FIABANI, Adelmir. Comunidades Negras do Brasil: história, organização e luta pela titulação das terras. In: 
PINHEIRO, Áurea da Paz; FALCI, Miridan Britto; LIMA, Solimar Oliveira. (Org.) Patrimônio e Cultura Negra. 
Parnaíba, 2014. 
37 Publicado no Jornal do Partido Comunista Brasileiro, que era órgão oficial de comunicação desse partido. 
38 FIABANI, Adelmir. Os novos quilombos: luta pela terra e afirmação étnica no Brasil (1988-2008), 2008. p. 28. 
39 Durante o exílio no Uruguai, Décio Freitas, em 1973, de retorno ao Brasil, lançou a primeira versão era língua 
portuguesa do livro pela editora Movimento. 
40 FIABANI, Adelmir. Os novos quilombos: luta pela terra e afirmação étnica no Brasil (1988-2008), 2008. 
41 Idem. 
24 
 
1970, em algumas regiões do país, eram de caráter político e possuíam reivindicações que 
conseguiram influenciar, sobretudo a partir da década de 1980, o governo brasileiro e seus 
principais órgãos, no que diz respeito ao reconhecimento de direitos. Nesse mesmo raciocínio, 
Solimar Lima e Daniely Santos (2013) colocam que “[...] esse reconhecimento tem 
possibilitado uma mudança dentro de vários setores do governo no processo de implementação 
de políticas públicas e práticas de ações afirmativas voltadas para a população negra”.42 Desse 
modo, entende-se que o movimento negro se inseriu num contexto importante no combate ao 
racismo, assim como na luta para reescrever a sua história, partindo então de uma perspectiva 
descolonial. 
Consequentemente, a partir do final da década de 1980, por ocasião do Centenário da 
Abolição e da promulgação da Constituição Brasileira de 1988, voltaram-se os olhares mais 
efetivamente para as comunidades negras rurais, que passaram a ser compreendidas como 
comunidades quilombolas. Diante dessa mudança, foram criados algumas organizações 
importantes, a exemplo da organização quilombola em âmbito nacional com o Movimento 
nacional das comunidades negras rurais quilombolas,43 a Coordenação Nacional de Quilombos 
- CONAQ, com sede em Bom Jesus da Lapa – BA,44 a FCP,45 e a Secretaria de Políticas de 
Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), que foi criada pelo Governo Federal no dia 21 de 
março de 2003.46 Com isso, destaca-se aqui que a organização quilombola se tornou um dos 
movimentos mais ativos, na luta pelo desenvolvimento sustentável das comunidades negras, na 
valorização da cultura, bem como propondo políticas públicas para estes povos.47 
Assim como em outras regiões do Brasil, o Movimento quilombola no Piauí surgiu em 
meados de 1988. De acordo com Solimar Lima e Daniely Santos (2013), esse contexto foi 
 
42 LIMA, Solimar Oliveira e SANTOS, Daniely Monteiro. Movimento Quilombola do Piauí: participação e 
organização para além da terra. Revista Espacialidades [online]. 2013, v. 6, n. 5. ISSN 1984-817x. Disponível em: 
https://cchla.ufrn.br/espacialidades/v6n5/Espacialidades_v6n5_10.pdf Acessado em: 20 de outubro de 2015. p. 
207-208. 
43 A partir da década de 1990, configura-se uma articulação própria quilombola com contornos nacionais. Em 
1995, foi realizado em Brasília, de 17 a 20 de novembro, o 1º Encontro Nacional de Comunidades Negras Rurais 
Quilombolas (TERRA DE DIREITOS, 2011, n.p.). 
44 FIABANI, Adelmir. Os novos quilombos: luta pela terra e afirmação étnica no Brasil (1988-2008), 2008. 
45 Uma instituição pública federal criada em 22 de agosto de 1988 (Lei nº 7.668). Sua principal função, portanto, 
é o reconhecimento das terras quilombolas, além de conduzir o processo de formulação de políticas públicas que 
atendam as demandas e especificidades dos povos remanescentes de quilombos (BRASIL, 2013). 
46 Sua criação é mais um reconhecimento das lutas históricas do Movimento Negro Brasileiro. Sua missão é 
estabelecer iniciativas contra as desigualdades raciais no país. Dentre seus principais objetivos podemos destacar: 
a promoção da igualdade e a proteção dos direitosde indivíduos e grupos raciais e étnicos, com ênfase na população 
negra; acompanhar e coordenar políticas de diferentes ministérios, especialmente o Ministério de 
Desenvolvimento Agrário, e outros órgãos do governo brasileiro para a promoção da igualdade racial, articulando 
e promovendo a execução de programas de cooperação com organismos públicos e privados, nacionais e 
internacionais (BRASIL, 2005). 208 
47 BRASIL, Ministério do Desenvolvimento Agrário. Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural. 
Brasília: MDA/SAF/DATER, 2007, p. 54-55. 
https://cchla.ufrn.br/espacialidades/v6n5/Espacialidades_v6n5_10.pdf
25 
 
marcado por uma “[...] época em que todos negavam a existência de quilombos no estado”.48 
Essa prerrogativa foi defendida por se alegar a existência de comunidades quilombolas 
ancestrais no estado, pois não havia tido a formação de quilombos nos registros da historiografia 
piauiense, o que gerou impasses tendo em vista a necessidade de melhorias das condições de 
vida das comunidades negras que viviam na zona rural do estado49. Nesse cenário, o Movimento 
Negro de Teresina, tendo como representantes Ruimar Batista, Amparo Aguiar, Áureo João, 
entre outros militantes,50 iniciaram um processo de formação de uma coordenação de lideranças 
quilombolas, com a finalidade de constituir uma formação política para os moradores das 
comunidades quilombolas do estado,51 a fim de discutir sobre a territorialização das terras 
pertencentes aos grupos negros rurais. 
Ao longo dos anos, e como resultado do processo de organização das comunidades 
quilombolas, houve a criação de Sindicatos e Associações Comunitárias nas comunidades, no 
qual objetivaram o desenvolvimento político-social, bem como a implementação de políticas 
públicas que atendessem as necessidades das comunidades quilombolas, que estavam 
asseguradas com a constituição de 1988. Dessa maneira, os modos de persistência que 
mantinham a luta pela territorialização, por parte das comunidades, ganhou força ao se atrelar 
a promulgação da Constituição Federal de 1988, no qual trouxe consigo o ideal de cidadania, 
assim como os direitos de exercê-la plenamente. 
Nessa conjuntura, as reivindicações quilombolas no estado do Piauí passaram a ganhar 
contorno nacional. Aos passos que ocorriam as lutas pela legitimação das terras, essas 
comunidades foram-se tornando visíveis por meio da organização quilombola, onde 
conseguiram desencadear vários processos de luta pela recuperação desses territórios que, 
consequentemente, foram ganhando visibilidade no contorno estadual. Concomitantemente, por 
meio das Universidades Federais e Estaduais do Piauí, muitos trabalhos passaram a pautar a 
história dos negros no estado em suas pesquisas, no qual a temática quilombola despertou o 
interesse dos novos pesquisadores. 
 
48 LIMA, Solimar Oliveira e SANTOS, Daniely Monteiro. Movimento Quilombola do Piauí: participação e 
organização para além da terra. Revista Espacialidades [online]. 2013, v. 6, n. 5. ISSN 1984-817x. Disponível em: 
https://cchla.ufrn.br/espacialidades/v6n5/Espacialidades_v6n5_10.pdf Acessado em: 20 de outubro de 2015. p. 
209. 
49 GOMES, Flávio S. (1996): “Ainda sobre os quilombos: repensando a construção de símbolos de identidade 
étnica no Brasil”. In: Almeida, M.H.T. Fry, P. e Reis, E. (orgs) Política e cultura: visões do passado e perspectivas 
contemporâneas. São Paulo, ANPOCS/HICITEC. 
50 LIMA, Solimar Oliveira e SANTOS, Daniely Monteiro. Movimento Quilombola do Piauí: participação e 
organização para além da terra. Revista Espacialidades [online]. 2013, v. 6, n. 5. ISSN 1984-817x. Disponível em: 
https://cchla.ufrn.br/espacialidades/v6n5/Espacialidades_v6n5_10.pdf Acessado em: 20 de outubro de 2015. 
51 Idem. 
https://cchla.ufrn.br/espacialidades/v6n5/Espacialidades_v6n5_10.pdf
https://cchla.ufrn.br/espacialidades/v6n5/Espacialidades_v6n5_10.pdf
26 
 
No entanto, embora as pesquisas sobre os remanescentes quilombolas tenham avançado, 
consideramos que as transformações ocorridas na sociedade piauiense, principalmente na área 
rural, exigem novas reflexões sobre formas organizativas dos povoados negros. A historiografia 
nacional,52 sobre a escravidão e a formação de quilombos, em diversos momentos, narra uma 
trajetória de construção desses grupos a partir de resistências, que se deram através de lutas, 
motins e, sobretudo, de fugas migratórias realizada pelos escravizados. Essa perspectiva, por 
vezes, tende a projetar uma ancestralidade ligada a formação dos quilombos contemporâneos, 
isto é, das comunidades constituídas pelos remanescentes de quilombos, no qual silencia outras 
possibilidades de organizações existenciais. 
Consta-se na historiografia piauiense bastantes relatos de casos de desobediência às 
ordens no contexto do Piauí escravista, cujo acarretaram constantes impasses nas relações entre 
senhores e escravos. Há um consenso nas produções historiográficas sobre a temática, firmadas 
por Solimar Lima (2005) e Luiz Mott (2010), no que diz respeito às violências das relações 
sociais escravistas no Piauí. Todavia, embora houvessem fugas como formas de resistências ao 
sistema escravista, nas pesquisas feitas por esses autores não se consta a formação de quilombos 
tradicionais, de modo que nos faz refletir sobre as formas de organização existencial das 
comunidades negras, após a abolição da escravidão. Nesse sentido, contribuindo para entender 
melhor as formas de organização desses grupos, os relatórios técnicos elaborados pelo INCRA 
nessas comunidades ao recorrerem à memória coletiva desses sujeitos, buscam reconstruir a 
história desses grupos, no qual evidencias que as maneiras de organização dessas comunidades 
aconteceram, em sua maioria, devido a concessões das terras, de compras e doações das 
mesmas.53 
Nos apresentando uma análise de diversidade de relações, entre os escravos e a 
sociedade escravocrata, os historiadores Flávio dos Santos Gomes e João José Reis (1996), na 
coletânea “Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil”, colocam que vários 
processos e aspectos multifacetados envolveram alguns quilombos em determinadas regiões do 
Brasil, sobretudo a partir do século XIX. Nessa perspectiva, os autores realizam uma abordagem 
lidando com comunidades quilombolas que foram destruídas antes da abolição da escravatura, 
pelo qual evidenciam que as classes dominantes do Brasil tiveram bastante êxito na 
 
52 Produzidas por autores, como Edson Carneiro, Arthur Ramos, Ernesto Ennes, Abdias do Nascimento e Décio 
Freitas. A exemplo de obra, podemos citar: A história do negro brasileiros, por Clóvis Barros. 
53 LIMA, Solimar Oliveira. Braço Forte: trabalho escravo nas fazendas da Nação do Piauí-(1822-1871). Passo 
Fundo: UPF, 2005.MOTT, Luiz Roberto de Barros. Piauí colonial: população, economia e sociedade. Teresina: 
APL, 2010. 
27 
 
desterritorialização de centenas de quilombos históricos.54 Nesse seguimento, e por 
consequência da abolição, entende-se que a grande maioria dos quilombos que ainda existiam, 
se caracterizam por serem de novas formações, onde muitos deles estabeleceram relações com 
às populações de seu entorno. Desse modo, como assinalamos anteriormente, esses novos 
grupos que foram se estabelecendo, são o que atualmente reconhecemos como remanescentes 
de comunidades de quilombos, que se constituíram a partir de diferentes processos de 
organização existencial. 
Em um estudo mais amplo sobre essa abordagem, o antropólogo e historiador Richard 
Price (1999) afirma que a história dos quilombos nas Américas sempre esteve ligada à terra, 
desde o controle coletivo do território (no desenvolvimento da agricultura, caça, pesca e coleta), 
assim como no estabelecimento de outras formas organizativas, pelos quais esses grupos 
dinamizaram várias relaçõescom os proprietários das terras, no qual compreender que “O Brasil 
de hoje não abriga, em sua maioria, os tipos de sociedades quilombolas – com evidente 
continuidade histórica das comunidades rebeldes do tempo da escravidão”, de modo que não 
possuí “profunda consciência histórica e organização política semi-independente”, como ainda 
existem em outras partes das Américas, a exemplo da Jamaica, Suriname, Guiana Francesa e 
Colômbia.55 
Nesse sentido, entendemos que assim como em grande parte do Brasil, no estado do 
Piauí essas comunidades possuíram origens variadas, a exemplo de formações após a falência 
de uma fazenda, concessões para a plantação, de doações de terras por senhores a ex-escravos, 
outras compradas por escravos libertos, ou ainda doações a escravos por ordens religiosas. 
Sendo assim, é válido salutar que esses grupos, com diversas origens formativas, possuem em 
comum, fora a “negritude”, as formas de permanências ao longo de décadas em territórios que 
exploraram, caracterizando-se assim enquanto comunidades remanescentes de quilombos, isto 
é, não obstante houvessem quilombolas ancestrais no Piauí, essas comunidades se enquadram 
nas novas concepções conceituais do quilombo, sendo então considerados sujeitos de direitos 
frente ao Estado. 
A variedade do conjunto de formações dessas comunidades são retratadas em algumas 
pesquisas que foram produzidas sobre as comunidades quilombolas no Piauí, no qual 
encontramos uma quantidade razoável de trabalhos na área de História sobre alguns desses 
 
54 REIS, João José & GOMES, Flávio dos Santos. Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São 
Paulo: cia. das Letras, 1996. 
55 PRICE, Richard (1999): “Reinventando a História dos Quilombos: Rasuras e Confabulações”. In: Afro-Ásia, 
23, 1999. p. 9. 
28 
 
grupos que estão distribuídos entres os territórios de Carnaubais, Chapada das Mangabeiras, 
Cocais; Entre Rios, Planície Litorânea, Serra Da Capivara, Tabuleiros Do Alto Parnaíba, Vale 
do Canindé, Vale Do Guaribas, Vale do Gambito, Vale dos Rios Piauí e Itaueira, onde estão 
localizadas cerca de 150 comunidades em todo o estado.56 A respeito das pesquisas produzidas, 
mesmo havendo um número considerável de comunidades remanescentes de quilombos, 
observa-se que a maioria desses trabalhos tratam sobre questões que envolvem a memória e a 
identidade desses sujeitos, sendo o território tratado como algo dado, naturalizado. 
Entre os poucos trabalhos que abordam a territorialidade das comunidades do Piauí, nas 
áreas de antropologia e sociologia,57 encontramos ainda um destaque sendo dado a memória e 
identidade desses povos, no qual a historicidade dos territórios quilombolas não recebem tanta 
evidencia, isto é, a territorialização ainda não é abordada como objeto de estudo central, a 
exemplo do trabalho “Povos de Lagoas-PI na construção da territorialidade quilombola: uma 
etnografia”,58 escrito pela antropóloga Simone de Oliveira Matos (2013), que embora discuta o 
processo de territorialidade dessa comunidade, no decorrer do seu estudo elenca outros pontos, 
como a ideia de dissertar sobre a “etnografia de comunidades negras rurais localizadas no 
município de São Raimundo Nonato”, a fim de descrever “os processos socioculturais dos 
grupos que viviam na região focalizada, em condições sociais de escravidão”, como também 
trata esses sujeitos como possuintes de um “caráter múltiplo e fluido das identidades”.59 
 
56 MELO, Cláudio Rodrigues de. Histórias e memórias de migrantes da comunidade negra rural de Tapuio 
Queimada Nova – PI. (Dissertação em História). Cláudio Rodrigues de Melo. – 2013. SOUSA, Maria Isabel 
Gomes dos Santos Batista de. Memória e trajetória da comunidade quilombola Custaneira. (Monografia em 
História). Maria Isabel Gomes dos Santos Batista de Sousa. – 2016. SOUSA, Áureo João de. Etnicidade e 
territorialidade na comunidade quilombola Custaneira/Tronco, município de Paquetá – PI, Brasil. 
(Dissertação em Sociologia). Áureo João de Sousa. - 2015. 454 f.: il. NUNES, Ranchimit Batista. Educação, 
gênero e afrodescendência: a educação escolar e a organização de mulheres quilombolas em Brejão dos Aipins, 
Piauí / Ranchimit Batista Nunes --2013. 166 f.: il. COELHO, Raimunda Ferreira Gomes. As educações escolar e 
social na formação da identidade racial de jovens nos quilombos de São João do Piauí / Raimunda Ferreira 
Gomes Coelho. – 2013. 229 f. SILVA, Raila Quelly Moura. História e memória da Comunidade Quilombola 
Saco da Várzea, São José do Piauí-PI. (Monografia em História), Raila Quelly Moura Silva. – 2013. CD-ROM: 
il.; 4 ¾ pol. (103 p.) TAVARES, Dailme Maria da Silva. A Capela e o Terreiro na Chapada Devoção Mariana 
e Encantaria de Barba Soeira no Quilombo Mimbó, Piauí. Dailme Maria da Silva Tavares (Dissertação em 
Ciências Sociais) Marília, São Paulo, dezembro de 2008. 
57 SOUSA, Áureo João de. Etnicidade e territorialidade na comunidade quilombola Custaneira/Tronco, 
município de Paquetá – PI, Brasil. (Dissertação em Sociologia). Áureo João de Sousa. - 2015. 454 f.: il. MATOS, 
Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da territorialidade quilombola: uma etnografia. 
(Dissertação em Antropologia). Teresina (PI), agosto de 2013. 
58 MATOS, Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da territorialidade quilombola: uma 
etnografia, 2013. 
59 Como tratar os sujeitos da pesquisa: Campesinato? Quilombolas? Agricultura familiar? Povos tradicionais? 
Identidade étnico-racial elaborada no seio de lutas étnico-raciais?”, afirmando que todos esses caminhos eram 
possíveis devido esses sujeitos. MATOS, Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da 
territorialidade quilombola: uma etnografia, 2013. p. 19 
29 
 
Cabe ressaltar que tanto a memória como a identidade desses povos são dois elementos 
importantes para essas comunidades. Todavia, o que queremos denotar aqui é que no caso 
comunidade Lagoas o território se entende como o objeto central. Essa afirmativa pode ser 
entendia de forma clara a partir da própria Constituição de 1988, que prevê a necessidade da 
autodeclaração desses sujeitos. Nesse sentido, para que os remanescentes de quilombos possam 
obter a legalidade do território, é fundamental, primeiramente, que a memória da comunidade 
seja acionada, de modo que nela contenham lembranças acerca do passado escravista de seus 
ancestrais naquele território, sem que haja a necessidade de que história desses grupos esteja 
ligada a uma ancestralidade quilombola (no sentido de quilombo tradicional). Em segundo 
lugar, a auto-atribuição garante instantaneamente a constituição dessa identidade, 
possibilitando, a partir disso, a territorialização da comunidade. Desse modo, tanto a memória 
como a identidade são dispositivos acionados para a construção do território, sendo este último 
o único elemento que necessita ser, obrigatoriamente, construído. 
Nesse sentido, consideramos que importantes capítulos da história das comunidades 
quilombolas do Piauí foram escritas. No entanto, pretende-se aqui desnaturalizar a formação do 
território quilombola Lagoas, problematizando a sua produção com a finalidade de buscar a sua 
historicidade, no campo das práticas que foram estabelecidas. Diante de tais considerações, em 
termos gerais, esta pesquisa pretende analisar como o quilombo Lagoas se constituiu enquanto 
uma comunidade, a partir de sua organização e territorialização. Além do mais, discutiremos a 
respeito das reivindicações existenciais dos lagoanos, a fim de perceber como algumas ações 
do Estado contribuíram para o surgimento de alguns conflitos que comprometem a existência 
da comunidade. 
Em relação as escolhas teórico-metodológicas, e embora neste trabalho não exista a 
pretensão de realizar uma abordagem sobre como ocorreu a construção identitária dacomunidade Lagoas, pontuamos aqui que a noção de grupo étnico,60 utilizada nessa pesquisa, 
parte da compreensão de Fredrik Barth (2000) sobre os estudos de etnicidade, no qual considera 
os grupos étnicos como um tipo organizacional que passou por diferenciações ao longo dos 
processos de interação. Desse modo, entendemos que a comunidade Lagoas é um grupo 
resultante de diferenciações organizacionais sofridas ao longo do tempo, isto é, a identidade 
étnica da comunidade é o resultado de como o grupo se constitui. Observemos o relato de Maria 
Ferreira: 
 
60 BARTH, F. Os grupos étnicos e suas fronteiras. In LASK, T. (Org). O guru, o iniciador e outras variações 
antropológicas-Fredrik Barth. Rio de janeiro: Contra Capa Livraria, p. 25-67, 2000. [Tradução de John C. 
Comerford]. 
30 
 
Eu não alcancei o cativeiro, mas tinha gente que foi do cativeiro. Nós mesmos, minha 
família era de índio, minha avó foi pega a dente de cachorro. Minha vó era índia gente 
brabo do mato! Meu avô era índio, filho de índia. A avó dessa velha [esposa] aí, era 
do cativeiro. Minha família é uma mistura: tem índio, preto e branco. Meu pai era 
branco e minha mãe era preta. Minha mãe era da região de Lajes [região de Sítio da 
Aldeia] e meu pai também.61 
Diante desse fragmento, entende-se que no território visado havia configurações de 
sujeitos étnicos diferentes, que por motivos próprios passaram a interagir e constituir famílias. 
Sendo assim, compreendemos que o quilombo Lagoas é um grupo étnico que possuí diversas 
formas de constituição e de organização existencial. Todavia, como apontamos anteriormente, 
não daremos foco a esse aspecto, mas sim a questão territorial. Nesse sentido, relativo aos 
teóricos que discutem a noção de territorialização,62 temos como referência as abordagens de 
Moraes (2000) e Raffestin (1993), no qual entendemos que o território da comunidade Lagoas 
passou por um processo de construção, isto é, todo o processo de produção territorial (simbólico 
e material) foi realizado por atores, no caso: alguns líderes quilombolas e a equipe técnica do 
INCRA; que conheceram e dominaram o espaço que se tornou território, por possuir um 
conjunto de representações que foram determinadas coletivamente. 
Para orientação dos trabalhos e apresentação dos resultados, considerou-se, ainda, 
elementos da Instrução Normativa/INCRA/No 57, de 20 de outubro de 2009 e, 
especialmente, a Lei Estadual do Piauí No 5.595, 01 de agosto de 2006, “que dispõe 
sobre a regularização fundiária de áreas ocupadas por remanescentes de Comunidades 
dos Quilombos, e dá outras providências”.63 
Desse modo, o fato das ações desses sujeitos se apoiarem em uma fundamentação legal, 
inclusive com leis especificas do próprio estado, nos direciona a uma análise dos processos de 
organização da comunidade Lagoas, a fim de destacar quais foram as mobilizações realizadas 
pelos lagoanos. Além da territorialização, outro processo importante foi a construção do 
relatório técnico sobre a comunidade. Nesse sentido, a participação da comunidade foi 
extremamente importante, pois os limites pleiteados foram determinados pelo próprio grupo. 
No processo de produção desse território, alguns critérios tiveram que ser considerados, a 
exemplo das relações entre os grupos étnico-raciais incidentes dentro deste território, assim 
como as trajetórias históricas próprias, as relações territoriais específicas, a presunção de 
ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida, além da 
 
61 Maria Ferreira, 86 anos – Comunicação oral – Localidade Umburana, entrevista concedida a Simone Matos, p. 
50. 
62 MORAES, M. D. C. Espaço, territórios e redes: polissemia e variantes conceituais In: Memórias de um sertão 
desencantado (modernização agrícola, narrativas e atores sociais nos cerrados do sudoeste piauiense); Tese de 
Doutorado- UNICAMP; SP, 2000, pp. 134-151. RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução: 
María Cecilia França, 1993. 
63 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010, p. 11. 
31 
 
identificação e validação sócio-histórica do território pleiteado, que foram efetivados no 
relatório técnico realizado pela representante (Simone Matos) da Cáritas Brasileira. 
O período em que se desenvolveu esse processo, foi realizado entre os dias 22 de junho 
e 09 de julho de 2009, no qual ocorreram reuniões em várias localidades, sendo as famílias do 
território quilombola que indicaram as lideranças que iriam acompanhar a equipe institucional 
do INCRA, na indicação dos pontos limites do território pleiteado de acordo com marcos 
históricos e geográfico, apresentados por estes representantes, e que posteriormente foram 
georreferenciados e materializados em formato de mapa pela equipe Institucional do INCRA. 
O desenvolvimento de critérios de entendimento dos termos e conceitos repassados 
pela comunidade à equipe técnica, visando promover a um correto entendimento da 
questão territorial transmitida, passou pela realização de várias reuniões onde pôde-se 
captar o sentimento do grupo, referente aos aspectos norteadores do que representava 
para eles “a definição de território”. A construção desse entendimento ocorreu 
concomitante aos apontamentos feitos pelo grupo para aquilo que eles entendiam por 
território. Definições como “limite de respeito”, dentre outros, promoveram o desafio 
de traduzir o saber local para os saberes necessários à produção do presente relatório.64 
Todo o atento às questões que partiam desses povos, foi direcionado para construir um 
território em que fosse demarcado e definido de acordo com os conhecimentos, da própria 
comunidade, acerca do que eles compreendiam como território e os seus limites. Desse modo, 
todas essas informações passaram a compor o relatório técnico, com a finalidade de reunir um 
conjunto de informações sobre a comunidade Lagoas. Nesse sentido, entendemos que a 
produção do relatório técnico é uma forma de materialização do território da comunidade, pois 
nele estão inseridos um conjunto de gráficos, mapas e imagens que foram reunidas para a 
produção desse documento. Sedo assim, partiremos das orientações de Jeremy Black (2005),65 
ao considerar os mapas como instrumentos utilizados para materializar espaços, como também 
para transmitir a ideia de veracidade sobre conhecimento do espaço. No caso da comunidade 
Lagoas, analisaremos os mapas, gráficos, tabelas e imagens, que estão no relatório técnico, 
compreendendo-os enquanto instrumentos de materialização e domínio sob o território 
requerido. 
Considerando a territorialização da comunidade Lagoas e o estabelecimento de seus 
limites, outro ponto importante são as reinvindicações existenciais dos lagoanos, que lutam pela 
titulação do seu território e, consequentemente, por políticas públicas para conseguirem 
desenvolver suas atividades diárias. Desse modo, partindo da compreensão de que muitos 
 
64 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de lagoas. 
Teresina, 2010. 
65 BLACK, Jeremy. Mapas e História: construindo imagens do passado. Trad. Cleide Rapuci. Bauro, SP. Edusc, 
2005. 
32 
 
conflitos territoriais estão relacionados com o exercício do racismo ambiental, utilizamos as 
considerações de Selene Herculano (2008) sobre o tema para discutir como a comunidade 
Lagoas é afetada pela exploração predatória neoliberal,66 quer dizer, o racismo ambiental é “[...] 
institucionalizado com o discurso assimilacionista, afetando o modo de vida tradicional 
indígena, quilombola e de outros povos tradicionais, com a finalidade explícita de esvaziamento 
de suas terras para transformá-las em mercadoria”.67Como podemos observar, somente o reconhecimento não contribui efetivamente para 
que a comunidade consiga assistências de melhoria habitacional. Desse modo, a não titulação 
abriu possibilidades para que o território fosse invadido, ocasionando ações de injustiça 
ambiental. É pensando a respeito das reinvindicações existenciais dos lagoanos, que discutimos 
como o racismo ambiental tem incidido na comunidade, isto é, partiremos do pressuposto de 
que a não titulação do quilombo Lagoas tem gerado conflitos, estes que, por sua vez são 
mediados pelo Estado, pois o mesmo não confere a titulação da comunidade e ao mesmo tempo 
cede parte do território para ser explorado por empresas. Nesse sentido, o conceito de racismo 
ambiental nos ajuda a pensar que as ações do Estado, em grande medida, podem contribuir para 
a evasão dos moradores da comunidade Lagoas e, na pior das hipóteses, com a inexistência 
deste quilombo. 
Diante disso, a dissertação foi pensada em estabelecer os lagoanos como protagonistas 
deste trabalho, embora não seja discutido outros aspectos que atravessam esses sujeitos. O 
intuito maior, foi aproveitar este precioso momento em que os historiadores tem voltado suas 
pesquisas para discutir temas pertinentes relacionados aos negros(as) da nossa sociedade. Neste 
caso, centramos aqui o nosso objeto com a finalidade de discutir como os(as) negros(as) 
brasileiros tem produzido, demarcado e simbolizado novos espaços. Nesse sentido, a partir do 
conjunto de fontes que reunimos, no qual já mencionamos aqui, detalhamos as estratégias 
utilizadas por esses sujeitos nas mobilizações realizadas para a organização e territorialização 
da comunidade Lagoas, assim como também discutimos acerca das reinvindicações existências 
da comunidade, frente ao Estado democrático de direito. 
Sendo assim, o primeiro capítulo “Nós só o fizemos porque somos capazes”: a 
comunidade lagoas e a apropriação dos direitos quilombolas”, tem como fio condutor a 
presença dos moradores das localidades rurais e os assistentes técnicos do INCRA atuando nos 
 
66 HERCULANO, Selene. O clamor por justiça ambiental e contra o racismo ambiental. InterfacEHS, Revista 
de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente, 2008. 
67 SILVA, Liana Amin Lima da; MORAES, Oriel Rodrigues de Moraes. Racismo ambiental, colonialismos e 
necropolítica: direitos territoriais quilombolas subjugados no Brasil. Ensaios sobre racismos: pensamento de 
fronteira. 2019, p. 37. 
33 
 
processos de organização e territorialização do quilombo Lagoas. A partir de uma discussão 
historiográfica, apresento uma breve abordagem a respeito da ressemantização do conceito de 
quilombo, cujo identifico a comunidade Lagoas enquanto um quilombo contemporâneo, isto é, 
que se enquadra na categoria de “comunidade remanescente quilombola”. Já por meio do 
relatório técnico sobre a comunidade e das entrevistas que foram concedidas a antropóloga 
Simone Matos, abordo sobre a fundamentação legal que embasam as ações dos quilombolas, 
bem como trato também das relações existentes entre os povos das comunidades negras, o 
projeto Dom Helder Câmara e a entidade Cáritas Brasileira, a fim de evidenciar as estratégias 
utilizadas por esses sujeitos durante o processo de organização e territorialização da 
comunidade quilombola Lagoas, que, por sua vez, se caracteriza enquanto uma comunidade 
imaginada. 
No segundo capítulo, intitulado “Os contra colonizadores e a territorialização do 
quilombo Lagoas” a partir do relatório técnico, destaco os esforços dos lagoanos, juntamente 
com a equipe técnica do INCRA e da antropóloga Simone Matos, para a materialização 
territorial do quilombo Lagoas. Desse modo, analiso de forma mais detalhada como ocorreu o 
processo de construção do relatório técnico da comunidade Lagoas, no qual destaco como as 
viagens pelo território, a elaboração dos mapas, gráficos, tabelas e estatísticas funcionam como 
uma forma de domínio sob o território. Sendo assim, a ênfase desse capitulo se estabelece 
através da descrição detalhada de todo os procedimentos utilizados na elaboração desse 
documento, destacando os resultados obtidos e a participação da comunidade na aprovação do 
mesmo. 
O terceiro e último capítulo, “A reivindicação existencial da comunidade quilombola 
Lagoas”, a partir do “Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e problemas de saúde 
no Brasil”, discuto como as ações do Estado, em relação a comunidade quilombola, são 
configuradas pelo racismo ambiental. Desse modo, pontuo que a não titulação do quilombo 
Lagoas abre margem para que o território da comunidade seja invadido, assim como também 
possibilitou a evasão de seus moradores, pondo em risco a extinção da comunidade Lagoas. 
Sendo assim, é dado ênfase as reinvindicações da comunidade na luta pela sua existência. 
 
 
 
 
 
34 
 
CAPÍTULO I 
 
 
“NÓS SÓ O FIZEMOS PORQUE SOMOS CAPAZES”: A 
COMUNIDADE LAGOAS E A APROPRIAÇÃO DOS 
DIREITOS QUILOMBOLAS 
 
 
 
O termo quilombo que antes era imposto como 
uma denominação de uma organização criminosa 
reaparece agora como uma organização de 
direito, reivindicada pelos próprios sujeitos 
quilombolas. Ao acatarmos essas denominações, 
por reivindicação nossa, mesmo sabendo que no 
passado elas nos foram impostas, nós só o fizemos 
porque somos capazes de ressignificá-las. Tanto é 
que elas se transformaram do crime para o direito, 
do pejorativo para o afirmativo. Isso demonstra 
um refluxo filosófico que é um resultado direto da 
nossa capacidade de pensar e de elaborar 
conceitos circularmente.68 
Nêgo Bispo 
 
68 SANTOS, Antônio Bispo dos. Colonização, quilombos: modos e significados. Instituto Nacional de Ciência e 
Tecnologia de Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa. Universidade de Brasília, 2015, p. 95. Disponível em: 
http://cga.libertar.org/wp-content/uploads/2017/07/BISPO-Antonio.-Colonizacao_Quilombos.pdf. Acessado em: 
20 de novembro de 2018. 
http://cga.libertar.org/wp-content/uploads/2017/07/BISPO-Antonio.-Colonizacao_Quilombos.pdf
35 
 
1.1 De organização criminosa à organização de direito: um breve resumo sobre a 
historicidade do conceito de quilombo 
A escrita de qualquer relator de saberes,69 como uma prática, estabelece relações com 
linhas de pensamentos, indivíduos e grupos sociais que geralmente estão conectados com 
projetos culturais e políticos. Isso ocorre, explicam as historiadoras Ângela de Castro Gomes e 
Patrícia Hansen (2016), porque “[...] os intelectuais têm um processo de formação e 
aprendizado que atuam em conexão com outros atores sociais e organizações, intelectuais ou 
não, que possuem intenções e projetos no entrelaçamento entre o cultural e o político”.70 Ou 
seja, as formações desses sujeitos são, consequentemente, influenciadas por contatos sociais, 
culturais e políticos, que, por sua vez, são perceptíveis em seus escritos e falas. 
Ao longo das últimas três décadas, por meio do exercício contínuo da escrita, algumas 
linhas de pensamentos e postulações teóricas foram revisadas a partir de novas compreensões, 
o que contribuiu para o estabelecimento de diferentes perspectivas em vários temas. Às vezes, 
os próprios intelectuais revisam seus trabalhos ao acrescentarem novas informações ou por 
mudarem de perspectiva teórica sobre determinado assunto. Noutras ocasiões, novos 
pensadores, como no caso de Nêgo Bispo,71 dão vozes a muitos grupos ao reivindicarem os 
direitos destes, demonstrando, assim, que a aprendizagem, as relações sociais e organizacionais 
são contínuas em suas produções textuais e ações políticas. 
Na historiografia de diversos temas que abordam sobre os aspectos sociopolíticos de 
alguns grupos, como no caso das comunidades quilombolas, podemos perceber a existência das 
relações sociais e organizacionais de diferentesformas. Uma dessas, pelo menos a mais 
importante neste tópico, é a polissemia lexical do conceito de quilombo, que nos ajuda a 
compreender importantes momentos históricos dos quilombolas brasileiros, tanto em relação 
aos anos que foram ligados à invisibilidade constitucional como aos que evidenciaram a luta e 
conquista de direitos legais. 
 
69 A expressão “relator de saberes” é utilizada, preferencialmente, por Nêgo Bispo para se identificar como um 
mestre ao invés de ser reconhecido como “intelectual”. A respeito, conferir em: 
https://www.saberestradicionais.org/antonio-bispo-dos-santos/. Acessado em: 03 novembro de 2019. 
70 GOMES, Ângela Maria de Castro; HANSEN, Patrícia Santos. Intelectuais mediadores: práticas culturais e 
ação política. – 1ª ed. – Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016. p. 13. 
71 Antônio Bispo dos Santos, conhecido popularmente como Nêgo Bispo, é um lavrador e quilombola piauiense 
formado por mestras e mestres de ofícios que atua como ativista político e militante de grande expressão no 
movimento social quilombola e nos movimentos de luta pela terra. Além disso, é poeta, escritor e intelectual, sendo 
autor de inúmeros artigos e poemas. Durante a sua trajetória, foi professor/mestre convidado do projeto “Encontro 
de Saberes na Universidade de Brasília”. Atualmente, Nêgo Bispo tem se dedicado à Coordenação Estadual das 
Comunidades Quilombolas do Piauí (CECOQ/PI) e atuado na linha de frente da Coordenação Nacional de 
Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ). 
https://www.saberestradicionais.org/antonio-bispo-dos-santos/
36 
 
No cenário piauiense, relativo ao contexto da invisibilidade negra, não muito diferente 
de outras províncias do Brasil, no que tange a experiência com o colonialismo e imperialismo, 
durante muito tempo a região do Piauí foi considerada pelos colonizadores como “terra de 
ninguém”.72 Mesmo sendo povoada por diversos grupos indígenas, o olhar colonialista entendia 
que esses povos não exerciam dominação sobre as suas terras, que, por sua vez, careciam de 
uma organização administrativa à moda portuguesa.73 
Tendo em vista os plantios da cana-de-açúcar não terem rendido as vantagens 
pretendidas pela coroa portuguesa, o Piauí se desenvolveu a partir dos caminhos da pecuária. 
De acordo com a historiadora Miridan Falci (1995), a administração era feita por “[...] dois 
tipos de conquistadores: o sertanista de contrato, encarregado de dominar e prear os indígenas 
para vender; e os sesmeiros da poderosa Casa da Torre, que eram criadores de gado”.74 A 
criação de gado, principalmente a partir do século XVIII, contou com a utilização da mão-de-
obra negra. A respeito, o historiador Solimar Lima (2005) aponta que “[...] durante séculos, a 
criação de animal nas fazendas do estado repousou nas costas dos afrodescendentes cativo, 
sendo mais pesadas do que as conhecidas no sul do Brasil, não deixando espaços para enlevos 
poéticos”.75 
As práticas de castigo e violência simbólica, exercidas pelos colonizadores, repreendiam 
os negros e, concomitantemente, garantiam a manutenção e a estabilidade das relações 
escravistas. Sobre o tema, Daniely Santos e Solimar Lima (2013) publicaram um artigo na 
Revista Espacialidades,76 que aborda discussões relativas à sociedade escravocrata piauiense, 
tanto relacionadas aos longos anos de cativeiro como a respeito da resistência negra durante a 
colonização, destacando que “[...] durante os longos anos de cativeiro foram recorrentes os 
processos de resistências da população negra cativa [...],”77 no qual visavam superar a condição 
de escravizados. 
 
72 Para mais informações sobre o tema, consultar: OLIVEIRA, Ana Stela de Negreiros. Povos indígenas do 
sudeste do Piauí: conflitos e resistência nos séculos XVIII e XIX. V Encontro nordestino de História. Recife, 
UFPE, 2004. Disponível em: <http://snh2013.anpuh.org/resources/pe/anais/encontro5/08-hist-mem-
indigena/Artigo%20de%20Ana%20Stela%20de%20Negreiros%20Oliveira.pdf> Acessado em: 13 de janeiro de 
2020. 
73 BRANDÂO, Tanya Maria Pires. O escravo na formação social do Piauí: perspectivas do século XVIII. 
Teresina: Editora da Universidade Federal do Piauí, 1999. 
74 FALCI, Miridan Britto Knox. Escravos do sertão. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves. 1995, p. 52. 
75 LIMA, Solimar Oliveira. Braço Forte: trabalho escravo nas fazendas da Nação do Piauí (1822- 1871). Passo Fundo: 
UPF, 2005, p. 11. 
76 A Revista Espacialidades é uma publicação com periodicidade semestral dos discentes do Programa de Pós-
Graduação em História – área de concentração em História e Espaços -, da Universidade Federal do Rio Grande 
do Norte, campus de Natal – RN. 
77 SANTOS, D. M.; LIMA, S. O. Movimento Quilombola do Piauí. Revista Espacialidades, v. 6, n. 05, p. 197-
215, 23 dez. 2013. p. 197. Disponível em: https://periodicos.ufrn.br/espacialidades/article/view/17606. Acessado 
em: 22 de novembro de 2019. 
http://snh2013.anpuh.org/resources/pe/anais/encontro5/08-hist-mem-indigena/Artigo%20de%20Ana%20Stela%20de%20Negreiros%20Oliveira.pdf
http://snh2013.anpuh.org/resources/pe/anais/encontro5/08-hist-mem-indigena/Artigo%20de%20Ana%20Stela%20de%20Negreiros%20Oliveira.pdf
https://periodicos.ufrn.br/espacialidades/article/view/17606
37 
 
Nesse sentido, a resistência negra, manifestou-se em diferentes formas. Uma delas, e 
provavelmente a mais comum, foi à fuga de escravizados para as florestas e sertão 
afora. São a partir dessas fugas que, em geral, surgiram os denominados quilombos, 
lugares onde os escravizados refugiavam-se, com o principal objetivo de assegurar 
sua liberdade.78 
Apesar de não constarem trabalhos que evidenciam a formação de quilombos no Piauí, 
a partir de fugas, os historiadores ressaltam que, em diversos lugares do Brasil, os casos de 
desobediência dos escravizados acarretaram constantes impasses nas relações entre senhores e 
escravos, que, por sua vez, corroboraram para que houvessem fugas e, posteriormente, a 
constituição de quilombos. Nessa perspectiva, há um consenso nas produções historiográficas 
a respeito da temática, firmadas por Solimar Lima (2005), Luiz Mott (2012), Miridan Falci 
(1995) e Tânia Brandão (1999),79 sobre a existência de violências nas relações sociais 
escravistas e os recorrentes processos de resistências da população negra cativa no Piauí. 
Ainda na Revista Espacialidades, Daniely Santos e Solimar Lima (2013) pontuaram que 
a historiografia brasileira estabeleceu uma narrativa sobre a formação de quilombos no Brasil, 
através de fugas, que tinha como base o conceito de quilombo pautado na definição do Conselho 
Ultramarino de 1740, que considerava o quilombo como “[...]toda habitação de negros fugidos 
que passem de cinco, em parte desprovida, ainda que não tenham ranchos levantados nem se 
achem pilões neles”. De acordo com os historiadores, essa definição silenciou outras 
possibilidades de análises sobre a resistência dos quilombolas, pois não abarcava as suas 
diversas formas organizacionais. 
A historiografia tradicional sobre a escravidão e a formação dos quilombos no Brasil 
narra, na maioria das vezes, uma trajetória de construção dos quilombos a partir da 
resistência através de fugas migratórias realizadas pelos escravizados. Silenciam, 
assim, outras possibilidades analíticas de resistência dos mesmos. Quando analisamos 
a trajetória de formação das comunidades quilombolas piauienses, deparamo-nos com 
outros processos de resistências. Através da construção histórica da memória coletiva 
dos moradores aquilombados, nova ferramenta de análise da formação dos quilombos 
piauienses emerge, como a formação de comunidades remanescentes de quilombos 
através de concessões e doações de terras das fazendas públicas e particulares 
existentes no sertão nordestino.80 
Assim como os historiadores,percebo que esse raciocínio cristalizou e simplificou as 
diversas formas de organização existencial quilombola, no qual resumiu a fuga como o maior 
símbolo de resistência que ocasionou a formação de quilombos. Além disso, essa análise se 
 
78 SANTOS, D. M.; LIMA, S. O. Movimento Quilombola do Piauí. Revista Espacialidades, 2013. p. 198. 
79 LIMA, Solimar Oliveria. Braço Forte: trabalho escravo nas fazendas da Nação do Piauí-(1822- 1871). Passo Fundo: 
UPF, 2005; MOTT, L. R. B. Piauí Colonial. Teresina: APL; Fundac; Detran, 2012; FALCI, Miridan Britto Knox. 
Escravos do sertão. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1995; BRANDÂO, Tanya Maria Pires. O 
escravo na formação social do Piauí: perspectivas do século XVIII. Teresina: Editora da Universidade Federal 
do Piauí, 1999. 
80 SANTOS, D. M.; LIMA, S. O. Movimento Quilombola do Piauí. Revista Espacialidades, 2013. p. 199. 
38 
 
caracterizou por tratar de forma exclusiva as relações de senhores e escravos como expressões 
de rejeição ao sistema escravista, onde, consequentemente, pensou os espaços habitados por 
esses grupos enquanto lócus de isolamento da população negra. 
Mesmo reconhecendo as contribuições das pesquisas historiográficas brasileiras que 
foram pioneiras sobre a temática,81 destaco que elas não conseguiram evidenciar as diferentes 
experiências dos escravizados com a sociedade escravocrata, assim como também não 
abordaram a respeito dos processos de organização existencial desses grupos. A premissa que 
apontei anteriormente, fundamenta-se a partir da memória coletiva dos remanescentes 
quilombolas, que contribuem na construção da história de suas respectivas comunidades. 
Através dos relatos desses grupos, tem-se que os modos de organização existencial dos seus 
territórios aconteceram de variadas formas, como exemplo: concessões, compras e doações das 
terras. 
Foram nessas circunstâncias que muitas comunidades negras resistiram e se 
organizaram existencialmente ao longo dos anos. De organização criminosa à organização de 
direito, e da imposição à ressignificação do conceito de “quilombo”, as comunidades 
quilombolas brasileiras enfrentaram diversas dificuldades, nesse meio tempo, relativas ao 
racismo institucional.82 
Mesmo após a abolição da escravidão, o dia-a-dia circunstancial dos negros no Brasil 
não havia mudado muito em relação aos últimos anos da escravidão no país. Sendo marcado 
por um contexto em que, a exemplo, as produções intelectuais do médico maranhense 
Raimundo Nina Rodrigues,83 sobretudo as obras: “As raças humanas e a responsabilidade penal 
no Brasil”,84 e “As coletividades anormais”;85 ainda influenciavam perspectivas de análises 
articuladas aos discursos racialistas, como a “responsabilidade penal”, que inferiorizavam 
negros e mestiços. 
 
81 Produzidas por autores, como Edson Carneiro, Arthur Ramos, Ernesto Ennes, Abdias do Nascimento e Décio 
Freitas. A exemplo de obra, podemos citar: A história do negro brasileiro, por Clóvis Barros. 
82 SOUZA. Arivaldo S. de. Racismo Institucional: para compreender o conceito. Revista ABPN v. 1, n. 3 – jan. 
de 2011, p. 77-87. Disponível em: http://www.abpn.org.br/Revista/index.php/edicoes/article/viewArticle/39. 
Acesso em: 25 de junho de 2011. 
83 Raimundo Nina Rodrigues foi um médico legista, psiquiatra, escritor, antropólogo e etnólogo brasileiro. Mais 
conhecido como Nina Rodrigues, foi considerado o fundador da antropologia criminal brasileira e pioneiro nos 
estudos sobre a cultura negra no país. Foi o primeiro estudioso brasileiro a abordar o problema do negro 
como questão social relevante para a compreensão da formação racial da população brasileira, que por sua vez, 
adotou uma perspectiva racista, nacionalista e cientificista em suas obras. 
84 Ler: NINA RODRIGUES, Raimundo. As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil. 4 ed. São 
Paulo: Companhia Editora Nacional, 1938. (Coleção Biblioteca Pedagógica dirigida por Fernando de Azevedo). 
85 __________ Lucas da Feira _________. As coletividades anormais. Coletânea organizada e prefaciada por 
Arthur Ramos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1939. (Coleção Biblioteca de Divulgação Científica). 
https://pt.wikipedia.org/wiki/Medicina_legal
https://pt.wikipedia.org/wiki/Psiquiatria
https://pt.wikipedia.org/wiki/Antropologia
https://pt.wikipedia.org/wiki/Etn%C3%B3logo
https://pt.wikipedia.org/wiki/Brasil
https://pt.wikipedia.org/wiki/Antropologia_criminal
https://pt.wikipedia.org/wiki/Cultura_negra
https://pt.wikipedia.org/wiki/Quest%C3%A3o_social
https://pt.wikipedia.org/wiki/Popula%C3%A7%C3%A3o_brasileira
https://pt.wikipedia.org/wiki/Racista
https://pt.wikipedia.org/wiki/Nacionalista
https://pt.wikipedia.org/wiki/Cientificista
39 
 
Foi justamente nesse “meio tempo” – de organização criminosa à organização de direito 
–, que a historiadora Beatriz Nascimento discutiu sobre o passado e presente das comunidades 
quilombolas brasileiras, se atentando principalmente em analisar a semântica do conceito de 
“quilombo” e as suas implicações na continuidade histórica dos negros no país. Preocupando-
se com as interpretações conceituais dos quilombos do século XX, a historiadora compreendia 
que a definição de quilombo institucional era extremamente ideológica e subestimava a 
capacidade dos negros de se agruparem e serem atuantes, no que diz respeito as tentativas de 
afirmação cultural. 
Em contraposição a versão Ultramarina do conceito de quilombo, Beatriz Nascimento 
(1981) afirmava que a população negra, historicamente, se caracterizava pela luta em favor da 
liberdade dentro do Brasil, tanto que incomodou, por diversas vezes, a ordem e provocou 
impasses às autoridades brasileiras.86 Nesse mesmo sentido, ao pesquisar algumas comunidades 
quilombolas do Rio de Janeiro, o historiador Flávio Gomes (1997) analisou, a partir de uma 
analogia com a “Hidra de Lerna”, como os quilombos se organizavam existencialmente na 
região do Iguaçu, no século XIX. Em sua abordagem, o autor discutiu como o surgimento de 
inúmeros quilombos foram compreendidos como uma ameaça à sociedade escravocrata, o que 
provocou diversos entraves com as autoridades, que, por sua vez, planejaram a destruição das 
comunidades.87 
De acordo com Beatriz Nascimento (2018), as fugas e formações dos quilombos não 
devem ser reduzidas apenas a uma ameaça ao sistema escravocrata, mas também devem ser 
representadas como um “[...] caráter libertário e considerado um impulsionador ideológico na 
tentativa de afirmação racial e cultural do grupo”,88 pois o quilombo “[...] se forma mais na 
necessidade humana de se organizar de uma forma específica que não aquela arbitrariamente 
estabelecida pelo colonizador”,89 isto é, as fugas representavam a necessidade de se organizar 
culturalmente na sociedade, sendo a aglutinação um aspecto essencial do quilombo. 
As produções historiografias acerca da temática ainda são insuficientes, no que se refere 
a compreender as diversas formas de organização social, pois “[...] a grande dificuldade mesmo 
 
86 NASCIMENTO, Maria Beatriz. Sistemas sociais alternativos organizados pelos negros: dos quilombos às 
favelas. 1981. In: Beatriz Nascimento, Quilombola e Intelectual: Possibilidades nos dias da destruição. Maria 
Beatriz Nascimento. Diáspora Africana: Editora filhos da África, 2018. 
87 GOMES, Flávio dos Santos. A Hidra e os pântanos: quilombos e mocambos no Brasil (séc. XVII-XIX). Tese 
de doutorado, Departamento de História, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de 
Campinas, 1997. 
88 NASCIMENTO, Maria Beatriz. Sistemas sociais alternativos organizados pelos negros: dos quilombos às 
favelas. 1981. In: Beatriz Nascimento, Quilombola e Intelectual: Possibilidades nos dias da destruição. Maria 
BeatrizNascimento. Diáspora Africana: Editora filhos da África, 2018, p. 211. 
89 NASCIMENTO, Maria Beatriz. Por uma História do Homem Negro. In: RATTS, Alex. Eu sou Atlântica: sobre 
a Trajetória de Vida de Beatriz Nascimento. São Paulo: Imprensa Oficial/Kuanza, 1974a, p. 70. 
40 
 
é estabelecer, num período de longa duração, a história de várias comunidades em diversas 
regiões do Brasil, sendo que todos os quilombos existiram em várias épocas no Brasil”,90 o que 
gerou diversos “[...] lapsos em termos de análise deste fenômeno em toda a historiografia 
brasileira, provocando uma ruptura dos negros com o seu passado e agravou o desconhecimento 
de sua condição hodierna”.91 
Uma das maneiras de compreender a ausência de estudos que abarcam a complexidade 
das organizações existenciais dos quilombolas no Brasil pós-abolição, é através das variações 
do seu conceito e as implicações efeituais para as comunidades negras que resistiram ao longo 
do século XX. Ao realizar uma consulta na definição de quilombo descrita pelo Conselho 
Ultramarino, identifico alguns problemas relativos às generalizações que definem as 
comunidades quilombolas apenas como “agrupamentos de negros”. Sobre a generalização 
dessa definição, Beatriz Nascimento (2018) coloca que muitos quilombos possuíam um número 
populacional com mais de vinte mil quilombolas, quantidade esta que não pode ser resumida a 
definição de “um pequeno grupo de negros que fugiam”. 
Palmares e muitos outros quilombos, entre Sergipe e Minas Gerais, possuíam cerca 
de vinte mil homens. Não se pode entender da mesma forma, enquanto grupo social, 
cinco fujões e vinte mil. Mas as dificuldades e passividades da literatura sobre 
quilombos permitem que este mal-entendido permaneça mergulhado no seu 
obscurantismo preconceituoso.92 
 A visão limitada a respeito da resistência quilombola, que ainda é atual, decorre 
justamente da documentação oficial que denominou o quilombo apenas como um qualquer 
agrupamento de negros. É preciso estar atento ao contexto histórico do documento oficial, a 
exemplo do Conselho Ultramarino de 1740, que proibia a formação de comunidades negras, 
pois, de acordo com a visão colonialista, ameaçavam a economia colonial. Quer dizer, o olhar 
oficial possuía apenas um único direcionamento, que, por sua vez, era voltado para o perigo 
que os quilombos representavam ao controle exercido pela colônia em relação aos interesses 
metropolitanos. 
É justamente em contraposição a essa perspectiva que as discussões propostas por 
Beatriz Nascimento são importantes. Enquanto o sistema colonial havia definido, no século 
 
90 NASCIMENTO, Maria Beatriz. Historiografia do Quilombo. 1977. In: Beatriz Nascimento, Quilombola e 
Intelectual: Possibilidades nos dias da destruição. Maria Beatriz Nascimento. Diáspora Africana: Editora filhos da 
África, 2018. 
91 NASCIMENTO, Maria Beatriz. Sistemas sociais alternativos organizados pelos negros: dos quilombos às 
favelas. 1981. In: Beatriz Nascimento, Quilombola e Intelectual: Possibilidades nos dias da destruição. Maria 
Beatriz Nascimento. Diáspora Africana: Editora filhos da África, 2018, p. 212. 
92 NASCIMENTO, Maria Beatriz. Quilombos: mudança social ou conservantismo? 1976. In: Beatriz 
Nascimento, Quilombola e Intelectual: Possibilidades nos dias da destruição. Maria Beatriz Nascimento. 
Diáspora Africana: Editora filhos da África, 2018, p. 63. 
41 
 
XVIII, que o quilombo seria um pequeno agrupamento de cinco negros fugidos, a autora 
problematizava, no século XX, a diferença e complexidade que exista entre cinco e vinte mil 
negros – como no quilombo Palmares – ,93 pois o quilombo não poderia somente ser 
compreendido como uma ação negativa à escravização, mas também “[...] como uma tentativa 
de homens manterem sua autonomia cultural e racial”,94 o que fugiria do estereótipo de 
quilombo apenas como um refúgio. Noutras palavras, em sintonia com as contribuições de 
Beatriz Nascimento, o que me interessa aqui é compreender as outras faces da resistência 
quilombola, é entendê-lo como um grupo organizado: um novo núcleo social. 
A depreciação das comunidades quilombolas, como uma espécie de refúgio de negros, 
sinalizava que a construção histórica dos quilombos brasileiros foi mistificada, pois “[...] o 
quilombo não é como a historiografia tem tentado traduzir, simplesmente um reduto de negros 
fugidos, simplesmente a fuga pelo fato dos castigos corporais”, pelo contrário, pontua Beatriz 
Nascimento, o estabelecimento de quilombos numa sociedade opressora era a “[...] tentativa de 
independência de homens que procuram por si só estabelecer uma vida para si, uma organização 
social para si”.95 
Em alguns trabalhos, como exemplos: “Liberdade por um fio: história dos quilombolas 
no Brasil”,96 organizado pelos historiadores João José Reis e Flávio dos Santos Gomes (1996), 
e Encruzilhadas pela Liberdade,97 de Walter Fraga Fialho (2006); são adentradas algumas 
discussões pertinentes ao debate de Beatriz Nascimento sobre as relações sociais entre os 
quilombolas e a sociedade escravocrata, e as formas diversas de organização existencial dos 
quilombos no Brasil. 
Ao estudar as relações entre os quilombos e a sociedade baiana, a exemplo, João José 
Reis (1996) demonstrou que algumas comunidades quilombolas haviam se organizado de 
formas diferentes da tradição palmarina, revelando-se em oposição a visão simplista do 
 
93 CARNEIRO, Edison. O Quilombo dos Palmares. 1958. Disponível em: http://www.brasiliana.com.br/obras/o-
quilombo-dos-palmares. Acessado em 17 de junho de 2020. 
94 NASCIMENTO, Maria Beatriz. Quilombos: mudança social ou conservantismo? 1976. In: Beatriz 
Nascimento, Quilombola e Intelectual: Possibilidades nos dias da destruição. Maria Beatriz Nascimento. 
Diáspora Africana: Editora filhos da África, 2018, p. 68. 
95 NASCIMENTO, Maria Beatriz. Historiografia do Quilombo. 1977. In: Beatriz Nascimento, Quilombola e 
Intelectual: Possibilidades nos dias da destruição. Maria Beatriz Nascimento. Diáspora Africana: Editora filhos 
da África, 2018, p. 130. 
96 REIS, João José & GOMES, Flávio dos Santos. Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São 
Paulo, Cia das Letras, 1996, 509p. 
97 FILHO, Walter Fraga. Encruzilhadas da liberdade. História de escravos e libertos na Bahia (1870-1910). 
Campinas: Editora da Unicamp, 2006. 
http://www.brasiliana.com.br/obras/o-quilombo-dos-palmares
http://www.brasiliana.com.br/obras/o-quilombo-dos-palmares
42 
 
quilombo enquanto um espaço isolado do contexto social.98 De acordo com o autor, o quilombo 
“Oitizeiro” foi uma comunidade dirigida por homens livres e escravizados fugidos, onde 
conseguiram estabelecer um índice de integração no mercado regional. Ainda nesse sentido, o 
historiador observou que nas relações entre os quilombolas e a sociedade baiana, a figura do 
coiteiro assumiu um papel de extrema importância, no qual caracterizou-se como elemento 
problemático entre a proteção e a repressão aos negros. 
Não distante dessa discussão, o quilombo de “Catucá-PE” foi estudado pelo historiador 
Marcus Joaquim M. de Carvalho (1996),99 que pesquisou as mudanças de localização dos 
quilombos rurais para as proximidades dos engenhos. Em sua pesquisa, o historiador trabalhou 
com o recorte temporal entre 1817 e 1825 – dentro do contexto de uma fase de rebelião –, no 
qual discutiu especificamente sobre um grupo de negros que buscavam construir uma sociedade 
alternativa, onde houvesse liberdade para os quilombolas. Durante esse período, o autor destaca 
que houveram estratégias de resistência às repressões, nos quais foram adotadas as práticas de 
quilombos móveis, que na sua estruturação interna poderiam estabelecer espécies de sucessões 
familiares e relações de integração com outros grupos. 
No estado do Maranhão, o historiadorMatthias Assunção (1996) também identificou 
algumas multiplicações de quilombos,100 no século XIX, apontando quatro tipologias de 
comunidades, apresentando assim formas diversificadas de como foram sendo constituídos 
esses grupos no estado. Neste contexto, o Maranhão, às vésperas da Independência, 
representava a mais alta concentração de escravos do Império, registrando cinquenta e cinco 
por cento. Nesse sentido, Matthias Assunção aborda que a multiplicação de quilombos 
proporcionaram alterações no perfil das lideranças, de modo que algumas comunidades haviam 
perdido alguns referenciais africanos, culminando na caracterização de tais quilombos como 
crioulos. 
Como pode ser observado nos exemplos anteriores, a diversidade organizacional e 
complexidade das relações, entre quilombolas e a sociedade escravocrata, aconteceram em 
alguns estados e não se deram de maneira uniforme. A busca pela autonomia, que nesse 
contexto era conquistada com o estabelecimento dos quilombos, não deixou de existir com a 
 
98 REIS, João José. Escravos e coiteiros no quilombo do Oitizeiro – Bahia, 1806. REIS, João José & GOMES, 
Flávio dos Santos. Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo, Cia das Letras, 1996, 
509p. 
99 CARVALHO, Marcus Joaquim M. de. O quilombo de Malunguinho, o rei das matas de Pernambuco. REIS, 
João José & GOMES, Flávio dos Santos. Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo, Cia 
das Letras, 1996, 509p 
100 ASSUNÇÃO, Matthias Rohrig. Quilombos Maranhenses. REIS, João José & GOMES, Flávio dos Santos. 
Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo, Cia das Letras, 1996, 509p 
43 
 
abolição. Ao longo dos anos, as comunidades negras resistiram de diversas formas, 
permanecendo em terras doadas, concedidas ou compradas por seus membros, isto é, viviam 
estabelecidas como “[...] uma organização social empreendida pelos negros, que se projetou no 
século XX e perdura até hoje”.101 
Nessa perspectiva, me alinho mais uma vez às contribuições de Beatriz Nascimento para 
situar o objeto de estudo desta pesquisa, a comunidade quilombola Lagoas-PI, nas discussões 
que envolvem as dificuldades enfrentadas pelos quilombolas na contemporaneidade, sobretudo 
no que diz respeito ao reconhecimento dos seus direitos constitucionais. Nessa discussão, duas 
questões se caracterizam como centrais: a primeira relacionada ao INCRA não ter certificado a 
comunidade, ocasionando o aumento de necessidades relativas a políticas públicas; e a segunda, 
consequentemente motivada pela primeira, que desencadeou disputas ambientais, pois no 
território requerido houve a instalação de empresas de mineração e carvoaria. Todavia, destaca-
se que ambas dificuldades não se configuram, necessariamente, como problemas especiais do 
quilombo Lagoas, uma vez que estes atravessaram diversas comunidades que também passaram 
pelos mesmos processos.102 
As relações burocráticas e as tensões que envolveram a comunidade Lagoas fazem parte 
de um rol de discussões sobre direitos democráticos que marcaram os anos antecessores à 
promulgação da Constituição Federal de 1988. As décadas de 1980 e 1990, foram palco de 
debates acerca do Estado brasileiro e a sua relação com instituições democráticas. Pautadas, 
principalmente, na concepção de democracia participativa, essas discussões priorizaram tanto 
temas sobre direitos coletivos como também relacionados à preservação e utilização do meio 
ambiente, patrimônio cultural, regras de consumo, grupos étnicos, entre outros. Nesse contexto, 
as demandas que partiram desses temas foram impulsionadas por lideranças quilombolas e 
movimentos sociais, de modo que resultaram no apoio jurídico-constitucional, considerando 
assim esses grupos enquanto unidades legítimas de direitos. 
Essa nova perspectiva de democracia proporcionou visibilidade e a participação de 
novos agentes sociais, isto é, os quilombos passaram a ser considerados como comunidades de 
direitos. Nesse momento, três agenciadores sociais encontraram a oportunidade de atuar em 
concordância fundamentada pelos direitos constituintes, sendo estes: as associações da 
 
101 NASCIMENTO, Maria Beatriz. Historiografia do Quilombo. 1977. In: Beatriz Nascimento, Quilombola e 
Intelectual: Possibilidades nos dias da destruição. Maria Beatriz Nascimento. Diáspora Africana: Editora filhos 
da África, 2018, p. 131. 
102 No livro referenciado: CARNEIRO, Andréa Flávia Tenório e AYALA, Caroline. Incra e os desafios para 
regularização dos territórios quilombolas: algumas experiências/Aniceto Cantanhede Filho. Brasília: MDA: 
Incra, 2006. 184p; encontra-se reunido algumas discussões acerca dos desafios enfrentados pelas comunidades 
quilombolas, durante o processo de regularização de seus territórios. 
44 
 
sociedade civil; o Ministério Público; e as comunidades quilombolas. Em relação ao último 
agente, o reconhecimento dado as comunidades quilombolas só se tornou possível graças à 
ampliação dos direitos coletivos, sobretudo, no tocante aos direitos relacionados a propriedade 
das terras ocupadas pelas comunidades negra rurais, que foram descritas no artigo 68 do Ato 
das Disposições Constitucionais Transitórias – CF/1988, como “remanescentes das 
comunidades dos quilombos”.103 
A inserção desses sujeitos, enquanto portadores de direitos legais, apresentou-se 
enquanto uma ideia substancial em relação à conclusão do processo da abolição, que, por sua 
vez, foi inacabado, como forma de reparação dos problemas sociais gerados pelo sistema 
escravista no Brasil. Além disso, a nova conotação semântica – do termo “quilombo” para 
“remanescentes das comunidades quilombolas” –, foi um desdobramento das articulações e 
disputas políticas de intelectuais, parlamentares, dos movimentos sociais e dos líderes 
quilombolas, justamente na data comemorativa do Centenário da Abolição da Escravidão 
(1988),104 que decidiram ressemantizar o conceito de quilombo, apresentando a sua 
reapropriação, esta que ampliou a noção do conceito e contemplou diversas comunidades 
negras que outrora não possuíam nenhuma espécie de reconhecimento. 
Apesar dessa conquista ter representado um grande avanço histórico, em relação aos 
direitos coletivos dos quilombolas, de acordo com Bianca Mazurec (2012) “[...] na literatura, 
os artigos contidos no ADCT são considerados o “depósito” de questões controversas para as 
quais os parlamentares não haviam chegado a um acordo, nem havia mais tempo para 
negociar”.105 Ou seja, a conquista coletiva dos quilombolas foi direcionada para esse depósito 
por ser considerada controversa, isto é, tema que necessitava de novas reflexões, pois ainda não 
possuía uma ideia maturada a respeito do tema, assim como dos seus desdobramentos e 
implicações constitucionais. 
Nessas circunstâncias, a ressemantização do conceito provocou inúmeras discussões 
sobre quem seriam esses novos sujeitos de direitos. De acordo com Arruti (2006) e Figueiredo 
(2008),106 a princípio, os debates entre o saberes jurídico e antropológico, promovidos pela 
 
103 FIGUEIREDO, Leandro Mitidieri. Remanescentes de quilombos, índios, meio ambiente e segurança nacional: 
ponderação de interesses constitucionais. Incra e os desafios para regularização dos territórios quilombolas: 
algumas experiências/Aniceto Cantanhede Filho. Andréa Flávia Tenório Carneiro. Caroline Ayala. Brasília: MDA: 
Incra, 2006. 184 p. 
104 CHAGAS, M. F. A política do reconhecimento dos "remanescentes das comunidades dos quilombos. In 
Horiz. antropol. vol.7 no.15 Porto Alegre, 2001. 
105 MAZUREC, Reconhecimento Étnico Quilombola no Licenciamento Ambiental. 2012, p. 122. 
106 ARRUTI, J. M. Mocambo: antropologia e história do processo de formação quilombola. Bauru, SP: Edusc,2006. FIGUEIREDO, A. L. V. O “Caminho Quilombola”: interpretação constitucional e reconhecimento de 
direitos étnicos. Tese de Doutorado – Universidade Candido Mendes, Instituto Universitário de Pesquisa do Rio 
de Janeiro Rio de Janeiro: UCAM/ IUPERJ, 2008. 
45 
 
Associação Brasileira de Antropologia (ABA) em 2000, questionaram se os novos quilombolas 
seriam remanescentes de quilombos tradicionais, pois, embora a palavra quilombo fosse de 
origem africana, a definição utilizada na historiografia brasileira, até então, era fundamentada 
pelo Conselho Ultramarino de Portugal, desde 1740.107 
A partir dessas discussões, a interpretação jurista – de que os remanescentes de 
comunidades quilombolas deveriam ser historicamente ligados a comunidades quilombolas 
tradicionais –, se sobressaiu em relação as compreensões antropológicas – acerca da defesa de 
uma nova interpretação semântica sobre o conceito de quilombo –, no qual resultou na 
aprovação do Decreto nº 3.912/2001,108 estabelecendo que a Fundação Cultural Palmares só 
poderia reconhecer a propriedade sobre as terras dos quilombos existentes desde 1888 e que 
ainda estavam sendo ocupados pelos seus remanescentes, até o dia 5 de outubro de 1988 
Mesmo tendo havido essa determinação, a Fundação Cultural Palmares continuou 
promovendo o debate sobre a importância da ressemantização do conceito, no qual destacou, a 
partir dos estudos antropológicos que foram realizados sobre as comunidades negras rurais, que 
os quilombos eram também algo do presente, não sendo necessariamente ramificações de 
quilombos ancestrais, isto é, a nova compreensão ressignificou os quilombos, conforme 
afirmou Nêgo Bispo, os “[...] passando de uma organização criminosa para uma organização 
de direitos”. 
Somente dois meses após o Brasil ter assinado a convenção de nº 169 da Organização 
Internacional do Trabalho (OIT),109 é que publicaram o Decreto nº 4.887/2003, no qual 
revogaram o decreto anterior, considerando assim os remanescentes de comunidades 
quilombolas como um grupo étnico-racial, “[...] tornando-se obrigatória a autoatribuição de 
qualquer comunidade enquanto grupo “quilombola” e empoderando tais grupos no processo de 
decisão política ou de intervenções sobre seus territórios ou modos de vida”.110 
 
107 SCHMITT, Alessandra; TURATTI, Maria Cecília Manzoli; CARVALHO, Maria Celina Pereira de. A 
atualização do conceito de quilombo: identidade e território nas definições teóricas. Ambiente & Sociedade - 
Ano V - No 10 - 1o Semestre de 2002. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1414- 
753X2002000100008&script=sci_abstract&tlng=pt Acessado em: 17 de maio de 2015. MARQUES, Carlos 
Eduardo e GOMES, Lílian. A Constituição de 1988 e a ressignificação dos quilombos contemporâneos: limites 
e potencialidades. RBCS Vol. 28 n° 81 fevereiro/2013. Disponível em: Acessado em: 17 de maio de 2015. 
YABETA, Daniela e GOMES, Flávio. Memória, cidadania e direitos de comunidades remanescentes (Em 
torno de um documento da história dos quilombolas da Marambaia). Afro-Ásia, 47 (2013), p. 79-117. Disponível 
em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0002-05912013000100003&script=sci_abstract&tlng=pt > Acessado 
em: 20 de maio de 2019. 
108 Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/D3912.htm > Acessado em: 09/07/2019. 
109 A Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre Povos Indígenas e Tribais em 
Estados Independentes, apresenta importantes avanços no reconhecimento dos direitos indígenas coletivos, com 
significativos aspectos de direitos econômicos, sociais e culturais. 
110 MAZUREC, Reconhecimento Étnico Quilombola no Licenciamento Ambiental. 2012, p. 135. 
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0002-05912013000100003&script=sci_abstract&tlng=pt%20
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/D3912.htm
46 
 
É a partir dessas disputas históricas sobre a interpretação conceitual da noção de 
quilombo, que consideramos a relação entre pesquisador e objeto inserida numa discussão sobre 
a oposição de perspectivas – que foram situadas no debate entre juristas e antropólogos –, e no 
cruzamento de pontos de vista,111 – tecidos entre os conhecimentos acadêmicos dos 
antropólogos e os saberes dos remanescentes das comunidades quilombolas. Nesse sentido, 
estamos aqui nos situando entre os cruzamentos desses conhecimentos e saberes, para que assim 
possamos nos distanciar da perspectiva jurista/ultramarina, que ainda reflete na atualidade. 
O cruzamento entre os pontos de vista – antropológico e dos quilombolas –, que 
formularam uma nova conotação semântica acerca do conceito de quilombo, precede as 
relações que são estabelecidas entre o pesquisador e o objeto, sem possuir a sua intervenção 
direta. Assim, por exemplo, um estudo da recepção das compreensões teóricas sobre etnicidade 
– que contribuiu para identificar os remanescentes quilombolas enquanto grupo étnico –, 
proposto por Fredrik Barth, entre as décadas finais do século XX e a primeira década do século 
XXI, nos revela cruzamentos históricos da circulação de argumentos e novas interpretações no 
Brasil, isto é, foram a partir dos esforços das comunidades quilombolas e dos antropólogos para 
ressemantizar o conceito de quilombo, que novos aportes teóricos começaram a circular, 
sobretudo em contraposição aos estudos anteriores que definiam os quilombos em perspectivas 
que não contemplavam a diversidade organizacional das comunidades negras brasileiras. 
Por esse ângulo, as relações entre o pesquisador e objeto se dão de forma incontornável, 
de modo que essa “[...] questão incide, antes de tudo, sobre a maneira como os passos 
preliminares da pesquisa conformam o objeto e, inversamente, sobre o modo como as 
características do objeto influem sobre os parâmetros da pesquisa”.112 Desse modo, 
compreendemos que toda relação cruzada – dos conhecimentos antropológicos e das 
comunidades quilombolas para a ressemantização do conceito de quilombo –, é propriamente 
importante, sobretudo, quando o pesquisador considera a relevância da historicidade semântica 
dos conceitos e como esta deve ser situada em sua pesquisa. Sendo assim, seria absurdamente 
problemático e anacrônico pesquisar a comunidade quilombola Lagoas, ainda levando em 
consideração o conceito tradicional/colonizador de quilombo. 
Ainda nesse seguimento, entendemos que “[...] a historicização, por sua vez, coloca em 
relação escalas espaço-temporais variadas com diferentes regimes de historicidade e com 
 
111 WERNER, Michael e ZIMMERMANN, Bénédicte. Pensar a história cruzada: entre empiria e reflexividade. 
Textos de história, vol. 11, nº 1/2, 2003. 
112 WERNER, Michael e ZIMMERMANN, Bénédicte. Pensar a história cruzada: entre empiria e reflexividade. 
Textos de história, vol. 11, nº 1/2, 2003, p.100. 
47 
 
posições de observação elas mesmas historicamente situadas”.113 Compreendendo dessa forma, 
nos aproximamos também de Reinhart Koselleck (2006), quando este escreve sobre as 
mudanças semânticas dos conceitos e as transformações que ocorrem na linguagem atualizada, 
ao considerar que os “[...] acontecimentos históricos não são possíveis sem atos de linguagem, 
e as experiências que adquirimos a partir deles não podem ser transmitidas sem uma 
linguagem”.114 
Dessa maneira, observamos que os processos históricos que contribuíram para pensar 
uma nova semântica para o conceito de quilombo não teriam ocorrido se não houvessem a 
modificação da noção de “quilombo” para a de “remanescentes de comunidades quilombolas”, 
embora o termo “remanescente” “[...] tenha sido objeto de duras críticas pelo movimento 
nacional das comunidades quilombolas, por trazer uma conotação pejorativa dos que 
“restaram”, “sobraram”, remetendo a existência quilombola ao passado e não a coexistência do 
presente”.115Em outras palavras, o que estamos afirmando é que as ressignificações que as 
comunidades quilombolas passaram constitucionalmente, no sentido de construção de 
identidades étnicas, políticas, culturais e territoriais, só foram possíveis por haver uma 
ancestralidade negra que não está, necessariamente, relacionada a um quilombo tradicional, 
mas sim a uma ancestralidade étnica e territorial.116 
Posto isso, de modo geral, todo o sistema burocrático, os conflitos territoriais e a 
reinvindicação existencial da comunidade, devem ser entendidos ainda enquanto um 
desdobramento das discussões que circundaram os anos que antecederam e sucederam a 
Constituição Federal de 1988. Dessa maneira, as compreensões que o Estado democrático de 
direito e determinados grupos da sociedade brasileira têm sobre as comunidades quilombolas, 
ainda são superficiais,117 que, por sua vez, promovem diversos questionamentos e, inclusive, 
 
113 WERNER, Michael e ZIMMERMANN, Bénédicte. Pensar a história cruzada: entre empiria e reflexividade. 
Textos de história, vol. 11, nº 1/2, 2003, p.106. 
114 KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos; tradução do original 
alemão Wilma Patrícia Maas, Carlos Almeida Pereira; revisão da tradução César Benjamin. Rio de Janeiro, RJ: 
Contraponto: Ed. PUC-Rio, 2006, p. 267. 
115 SCHMITT, Alessandra; TURATTI, Maria Cecília Manzoli; CARVALHO, Maria Celina Pereira de. A 
atualização do conceito de quilombo: identidade e território nas definições teóricas. Ambiente & Sociedade - 
Ano V - No 10 - 1o Semestre de 2002. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1414- 
753X2002000100008&script=sci_abstract&tlng=pt Acessado em: 17 de maio de 2015, p. 33. 
116 GONÇALVES, Cláudia Pereira. Política, cultura e etnicidade: indagações sobre encontros intersocietários in 
Antropologia em primeira mão / Programa de Pós Graduação em Antropologia Social, Universidade Federal de 
Santa Catarina. Florianópolis: UFSC, 1995. 
117 A exemplo da Bancada Ruralista, que já pediu a suspensão dos territórios quilombolas e já propôs 25 projetos 
que ameaçam o processo de demarcação dos remanescentes quilombolas. Em relação ao assunto: Disponível em: 
<http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/581965-ruralistas-pedem-suspensao-dos-processos-de-demarcacao-de-
terras-indigenas-e-quilombolas>, acessado em: 10 de julho de 2019; e 
<https://deolhonosruralistas.com.br/2017/09/11/bancada-ruralista-ja-propos-25-projetos-de-lei-que-ameacam-
demarcacao-de-terras-indigenas-e-quilombolas/ >, acessado em 10 de julho de 2019. 
http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/581965-ruralistas-pedem-suspensao-dos-processos-de-demarcacao-de-terras-indigenas-e-quilombolas
http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/581965-ruralistas-pedem-suspensao-dos-processos-de-demarcacao-de-terras-indigenas-e-quilombolas
https://deolhonosruralistas.com.br/2017/09/11/bancada-ruralista-ja-propos-25-projetos-de-lei-que-ameacam-demarcacao-de-terras-indigenas-e-quilombolas/
https://deolhonosruralistas.com.br/2017/09/11/bancada-ruralista-ja-propos-25-projetos-de-lei-que-ameacam-demarcacao-de-terras-indigenas-e-quilombolas/
48 
 
alegações relacionadas a possíveis ilegitimidades das comunidades remanescentes quilombolas 
brasileiras. Todavia, o conjunto de normas constitucionais que fundamentam todas as 
mobilizações dos quilombolas ainda representam bases legais para a reinvindicação dos seus 
direitos, pois embasam os processos de organização e territorialização das comunidades, como 
no caso do quilombo Lagoas, a partir de mobilizações entre a comunidade e os agentes externos 
que estabeleceram convênios através desse conjunto de leis. 
1.2 Fundamentação constitucional: direitos étnico-raciais e territoriais da comunidade 
quilombola Lagoas 
Atuante no estado, desde o final da década de 1990, o Movimento Quilombola do Piauí 
estabeleceu relações com à Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras 
Rurais Quilombolas (CONAQ) – que é uma coordenação representativa de membros das 
comunidades quilombolas de todo o Brasil –, e promoveu assim uma maior relação entre o 
estado e as comunidades, como também uma melhor articulação com o movimento nacional.118 
No entanto, embora existam essas coordenações, as comunidades quilombolas piauienses não 
conseguiram construir uma personalidade jurídica, possuindo, assim, apenas membros 
representativos, a exemplo dos atuantes Antônio Bispo dos Santos e Maria Rosalina dos Santos, 
que possuem um histórico de contribuição na reinvindicação dos direitos quilombolas.119 
Mesmo não havendo um corpo jurídico que atuasse na causa quilombola no estado, as 
comunidades que receberam assistência do INCRA passaram a conhecer melhor a respeito dos 
direitos constitucionais, que são previstos em lei. No caso do quilombo Lagoas, para que os 
lagoanos pudessem estar cientes em relação aos seus direitos étnicos e territoriais, foi necessário 
recorrer a uma fundamentação legal para respaldar o início da organização e territorialização 
da comunidade, bem como para assegurar as ações que se constituiriam durante esse processo. 
Desse modo, consta-se no relatório técnico da comunidade um conjunto de leis, artigos, 
decretos e uma medida provisória, que passaram a nortear esses povos em suas atividades 
organizacionais e territoriais: 
As ações objeto do presente relatório têm como fundamento legal: (1) art. 68 do Ato 
das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal; - (2) arts. 215 
e 216 da Constituição Federal; (3) - Lei nº 4.132, de 10 de setembro de 1962; (4) - Lei 
 
118 O movimento quilombola do Piauí é representado pela Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas 
(CECOQ). 
119 LIMA, Solimar Oliveira e SANTOS, Daniely Monteiro. Movimento Quilombola do Piauí: participação e 
organização para além da terra. Revista Espacialidades [online]. 2013, v. 6, n. 5. ISSN 1984-817x. Disponível em: 
https://cchla.ufrn.br/espacialidades/v6n5/Espacialidades_v6n5_10.pdf Acessado em: 20 de outubro de 2015. p. 
207-208. 
https://cchla.ufrn.br/espacialidades/v6n5/Espacialidades_v6n5_10.pdf
49 
 
nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999; (5) - Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964; (5) 
- Decreto nº 59.428, de 27 de outubro de 1966; (6) - Decreto nº 433, de 24 de janeiro 
de 1992; (7) - Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993; (8) - Medida Provisória nº 
2.183-56, de 24 de agosto de 2001; (9) Lei nº 10.267, de 28 de agosto de 2001; (10) - 
Decreto nº 4.887, de 20 de novembro de 2003; (11) - Convenção Internacional nº 169, 
da Organização Internacional do Trabalho sobre povos indígenas e tribais, 
promulgada pelo Decreto nº 5.051, de 19 de abril de 2004; (12) - Lei nº 10.678, de 23 
de maio de 2003; (13) - Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007; (14) - Convenção 
sobre Biodiversidade Biológica, promulgada pelo Decreto nº 2.519, de 16 de março 
de 1998.120 
Esse composto de normas serviu para fundamentar as ações iniciais das cento e 
dezenove (119) localidades que reivindicavam a demarcação do território. Além das leis, artigos 
e decretos específicos para os remanescentes quilombolas, observa-se que existiam outras 
prescrições que foram inseridas na fundamentação legal, com a finalidade de respaldar as 
mobilizações durante os processos de organização e territorialização da comunidade. Nesse 
sentido, esse composto de normas nos chama atenção por possuir diretrizes que foram 
promulgadas anteriormente a Constituição Federal de 1988, a exemplo das Leis: nº 4.132, de 
10 de setembro de 1962; nº 4.504, de 30 de novembro de 1964; e o Decreto nº 59.428, de 27 de 
outubro de 1966; que são referentes ao Estatuto da Terra e de outras providências. 
A partir desse conjunto de leis, a comunidade recebeu orientações para a 
regulamentação dos direitos e obrigações concernentes aosbens imóveis rurais, para os fins de 
execução da Reforma Agrária e promoção da Política Agrícola. Além disso, essas 
determinações consideram a Reforma Agrária e idealizam um conjunto de medidas que visam 
promover melhor a distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, 
a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade, bem como para 
assegurar e conservar os recursos naturais das propriedades. 
De modo geral, as prescrições que fundamentaram as ações das localidades estavam 
amplamente ligadas às discussões de Reforma Agrária e aos desenvolvimentos possíveis que 
poderiam ser executados a partir do conjunto legal, que referenciava as mobilizações desses 
grupos. Nessa perspectiva, como foi mencionado anteriormente, após uma série de discussões 
que procuraram localizar os quilombolas dentro de uma nova estrutura semântica, a publicação 
do Decreto nº 4.887/2003 considerou os “remanescentes de comunidades quilombolas” como 
um grupo étnico-racial. Sendo assim, quais seriam os “por quês” das ações mobilizadas pelas 
comunidades estarem pautadas em discussões sobre Reforma Agrária, tendo em vista a 
Constituição Federal de 1988 ter proporcionado bases sólidas em relação ao direito à terra? 
 
120 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010, p. 11-12. 
50 
 
 Embora a comunidade tenha sido reconhecida enquanto um quilombo contemporâneo, 
compreendo que a demarcação e posse das terras sempre foram importantes para os lagoanos. 
Desse modo, mesmo compreendendo que o processo de territorialização só acontece a partir da 
autodeclaração da comunidade, quero chamar a atenção aqui para as discussões territoriais e o 
quanto elas são essenciais para os quilombos, pois as relações com a terra antecederam o 
processo de construção da identidade quilombola do grupo, isto é, antes mesmo das cento e 
dezenove (119) localidades se tornarem apenas uma, todas elas possuíam relações com as terras 
em que habitavam, já o sentido de identidade quilombola foi construído ao longo dos anos. 
Dessa maneira, essa afirmativa talvez explique os “por quês” da fundamentação legal 
utilizada pela comunidade Lagoas para assegurar as suas ações nos processos de organização e 
territorialização. Ou seja, entendemos aqui que o conjunto de normas que tratam a respeito do 
estatuto da terra, pelo qual serviu de fundamentação para embasar esses processos, possui uma 
relação direta com a existência desses sujeitos e a utilização dessas terras, no qual encontraram 
respaldo constitucional para que o Estado efetivasse políticas públicas relacionadas a 
valorização e permanência desses grupos em suas localidades. 
A relação das comunidades quilombolas brasileiras com a terra, antes de se 
autodeclararem, era identificada e resumida apenas em “terras de preto”,121 que eram habitadas 
por algumas comunidades negras rurais. No contexto nacional, essa identificação nem sempre 
foi associada à uma tradição ou ancestralidade quilombola, que, por sua vez, só obteve esse tipo 
de reconhecimento com a redação do Artigo 68 na Constituição Federal, com a proposta de 
associar as suas vivencias à memória pública da escravidão e da abolição. De acordo com as 
historiadoras Hebe Mattos e Ana Rios (2005) e o historiador Robert Slenes (1996), as 
comunidades quilombolas contemporâneas passaram a referenciar a memória do cativeiro e a 
posse coletiva da terra a partir do “[...] seu mito de origem em doações senhoriais realizadas no 
contexto da abolição”.122 
Nesse mesmo seguimento, a comunidade quilombola Lagoas também associou a posse 
da terra à sua história de vida, e aos conflitos fundiários enfrentados, como aspectos que os 
enquadravam como povos de direito no Artigo 68. Nos relatos de alguns moradores, constam-
 
121 ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Terras de Preto. Terras de Santo. Terra de Índio. Em: Habette, J. 
/Castro, E. M. (Orgs.): Cadernos NAEA, UFPA, 1989, p. 165-196. ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Terras 
de Preto no Maranhão: Quebrando o mito do isolamento. São Luís: Centro de Cultura Negra do Maranhão (CCN-
MA) e Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH), 2001. 
122 MATTOS, Hebe; RIOS, Ana Lugão. Memórias do Cativeiro, Família, Trabalho e Cidadania no Pós-
Abolição. Rio de Janeiro: Record, 2005; SLENES, Robert W. (1996): “Histórias do Cafundó”. Em: Vogt, 
Carlos/Fry, Peter (Orgs.): Cafundó. A África no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras e Editora da 
UNICAMP, pp. 37-102 
51 
 
se memórias ligadas ao cativeiro e a ancestralidade negra nas terras, como relata a quilombola 
Maria Ferreira: 
Eu não alcancei o cativeiro, mas tinha gente que foi do cativeiro. Nós mesmos, minha 
família era de índio, minha avó foi pega a dente de cachorro. Minha vó era índia gente 
brabo do mato! Meu avô era índio, filho de índia. A avó dessa velha [esposa] aí, era 
do cativeiro. Minha família é uma mistura: tem índio, preto e branco. Meu pai era 
branco e minha mãe era preta. Minha mãe era da região de Lajes [região de Sítio da 
Aldeia] e meu pai também. (Maria Ferreira, 86 anos. Comunicação oral, Localidade, 
Umburana).123 
Relatos como esse, ligados à memória, contribuíram para ampliação dos direitos 
quilombolas. Além do Artigo 68, em 2000 foi promulgado o Art. 216 que decretou que conferia 
às comunidades quilombolas o significado de patrimônio cultural em relação à sua própria 
memória, história e expressão cultural, pois os “[...] bens de natureza material e imaterial, 
tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à nação, à 
memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”,124 garantiram a proteção 
do patrimônio cultural brasileiro, compreendendo os termos culturais e sociais como de direitos, 
entre eles os afrodescendentes. Nesse caso, a compreensão das comunidades quilombolas como 
patrimônios culturais, passou a fortalecer as reivindicações frente à luta pela territorialização 
das suas terras, os compreendendo assim como remanescentes de um campesinato negro 
formado no contexto da desagregação do escravismo no país, ao longo da segunda metade do 
século XX. 
De acordo com Hebe Matos e Martha Abreu (2011), “[...] as novas formas de se 
conceber a condição de patrimônio cultural nacional tem permitido que diferentes grupos 
sociais, utilizando as novas leis e o apoio de especialistas, revejam as imagens e alegorias de 
seu passado”.125 Nesse sentido, essas novas formas passaram a fazer com que a comunidade 
Lagoas decidisse o que os definiam como povo identitário, seja através das festas, das tradições 
orais ou dos locais de memória. No caso da comunidade, os sentidos de religiosidade se 
expressam em festas de Reis e de São Gonçalo, assim como em novenas, nas celebrações dos 
terços, nos benzimentos e curandeirismo. Desse modo, foi a partir das relações com a terra e 
com os aspectos culturais que a comunidade se inseriu na luta para que as suas ligações com os 
territórios não fossem esquecidas. 
 
123 MATOS, Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da territorialidade quilombola: uma 
etnografia. (Dissertação em Antropologia). Teresina (PI), agosto de 2013, p. 50. 
124 BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 
1998b. 
125 MATTOS, Hebe. ABREU, Martha. “Remanescentes das Comunidades dos Quilombos”: memória do 
cativeiro, patrimônio cultural e direito à reparação. Iberoamericana, XI, 42, 2011, p. 148. Disponível em: 
<https://www.iai.spk-berlin.de/fileadmin/dokumentenbibliothek/Iberoamericana/42-
2011/42_Mattos_y_Abreu.pdf> Acessado em: 16 de junho de 2020. 
https://www.iai.spk-berlin.de/fileadmin/dokumentenbibliothek/Iberoamericana/42-2011/42_Mattos_y_Abreu.pdfhttps://www.iai.spk-berlin.de/fileadmin/dokumentenbibliothek/Iberoamericana/42-2011/42_Mattos_y_Abreu.pdf
52 
 
De todo modo, não pretendemos aqui discutir a respeito de como se deu o processo de 
construção identitária dos lagoanos ou a partir de que momento eles começaram a se 
reconhecerem enquanto um grupo étnico. O que ressaltamos, é que a questão territorial é algo 
presente em todas as cento e dezenove (119) localidades (antes do processo de construção da 
comunidade Lagoas), sendo este um aspecto que antecede o processo de construção de uma 
identidade da comunidade Lagoas. Desse modo, embora a historicidade do território 
quilombola envolvam questões espaciais e étnicas, queremos destacar aqui a sua dimensão 
espacial e a sua relação com o social. Nesse sentindo, o nosso foco é tratar sobre a historicidade 
do território da comunidade e evidenciar as mobilizações que contribuíram para a organização 
e territorialização da comunidade Lagoas,126 isto é, compreende-se que “[...] evidentemente, o 
território se apoia no espaço, mas não é o espaço. É uma produção, a partir do espaço”.127 
Ainda na perspectiva anterior, outra norma que não aparece na fundamentação legal do 
relatório técnico, mas que é citada várias vezes no corpo do documento, foi a Lei estadual do 
Piauí nº 5.595, sancionada em 1º de agosto de 2006, que trata a respeito da regularização 
fundiária de áreas ocupadas por remanescentes de comunidades dos quilombos. Nesse sentido, 
Wellington Dias (governador do estado), por meio de suas atribuições, apresentou os incisos I, 
V e XIII, do art. 102, da Constituição Estadual, no qual decretou, a partir das ações do Instituto 
de Terras do Piauí – INTERPI, o Programa Estadual de Regularização das terras ocupadas por 
remanescentes das comunidades dos quilombos. Nesse contexto, esses incisos declararam 
competência ao INTERPI, no que diz respeito a adotar os procedimentos administrativos para 
a identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas, de 
modo que assegurasse a participação de técnicos da secretaria nas mobilizações das 
comunidades remanescentes de quilombolas do Estado. 
Além de reforçar os direitos constitucionais federativos, a Lei nº 5.595, no art. 4º, 
decretou que o INTERPI poderia “[...] estabelecer convênios, contratos, acordos e instrumentos 
similares com órgãos da administração pública federal, municipal, organizações não 
governamentais e entidades privadas observadas a legislação pertinente [...]”,128 garantido 
assim a participação dos quilombos em todas as fases do procedimento administrativo, 
 
126 É essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O território se forma a partir do espaço, é 
resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível. 
Apoja-se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente (por exemplo, pela representação), o ator~ 
"territorializa" o espaço. Consultar: RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução: María Cecilia 
França, 1993, p. 143. 
127 RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução: María Cecilia França, 1993, p. 144. 
128 Disponível em < https://www.normasbrasil.com.br/norma/lei-6383-1976_81079.html > Acessado em: 10 de 
junho de 2019. 
https://www.normasbrasil.com.br/norma/lei-6383-1976_81079.html
53 
 
diretamente ou por meio de representantes por eles indicados, como aconteceu com a 
comunidade remanescente quilombola Lagoas. Nesse sentido, a possibilidade aberta nessa lei 
colaborou para mobilizar e organizar melhor as comunidades remanescentes quilombolas do 
estado, sobretudo aquelas que, no ano de aprovação da lei, ainda se encontravam no processo 
de reconhecimento e titulação dos seus territórios. 
Em relação ao INTERPI, este se portou como o principal órgão responsável pela 
administração e regularização das terras das estaduais. Criado através da Lei nº 3.783, de 16 de 
dezembro de 1980, o Instituto de Terras do Piauí passou a desempenhar a função de órgão 
executor da política fundiária do Estado, que, por sua vez, investiu na promoção de arrecadação 
de terras devolutas. Inserido na legislação federal e estadual, o instituto reconheceu algumas 
posses como legítimas, a exemplo de famílias que ocupavam as terras ou que já haviam as 
comprado. Ainda sobre a Lei, no seu art. 11º, declarou que o Poder Executivo, por meio do 
INTERPI, garantiria e legitimaria à sua autoria, no que diz respeito a regularização fundiária 
das ocupações incidentes sobre terras públicas estaduais. Ou seja, o Instituto de Terras do Piauí 
emergiu assumindo funções importantes desde a década de 1980. 
A história do INTERPI, por sua trajetória, foi amplamente ligada à regularização 
fundiária das terras do estado. O instituto se estabeleceu como autarquia estadual, exercendo 
uma personalidade jurídica no direito público. Em relação aos remanescentes quilombolas, de 
acordo com as pesquisas da Fundação Cultural Palmares em 2013,129 haviam cento e oito (108) 
certificações para cento e dezessete (117) comunidades identificadas no Piauí, no qual o 
INTERPI, juntamente com o INCRA, corroborou com a titulação de cinco territórios no mesmo 
período. A parceria existente entre esses dois órgãos, de acordo com Almendra Filho (2018), 
só foi possível em decorrência das objetivações de ambos, que estão relacionadas a 
regulamentação das propriedades rurais e que abarcam as comunidades negras. 
Os objetivos são: executar atividades visando apoiar a implementação do programa 
de regularização da posse de terras e o fortalecimento dos direitos às propriedades 
rurais através de, inter alia: (a) fortalecimento e modernização do INTERPI; (b) 
executar a identificação, a demarcação e o cadastro de terras estaduais; (c) executar o 
programa de regularização da posse de terra; e (d) apoiar a operacionalização dos 
Centro de Regularização da Posse de Terras.130 
Quase todas essas atividades são objetivações desses dois órgãos, pois como aponta 
Almendra Filho (2018) “[...] o papel específico do INTERPI é voltado para a concessão de 
títulos de propriedade, para aquelas pessoas que ocupam áreas públicas, de forma irregular e 
 
129 Disponível em: < www.palmares.gov.br. > Acesso em: 17/03/2019. 
130 ALMENDRA FILHO, José Horácio Gayoso e. Estudo exploratório do INTERPI na implementação da 
política fundiária do Estado do Piauí / José Horácio Gayoso e Almendra Filho. - 2018. 106 f., p. 45. 
http://www.palmares.gov.br/
54 
 
produzem nelas e cumprem a sua função social”.131 Nesse sentido, a Lei estadual de nº 5.595 
ao estabelecer vínculo com o INTERPI, passou, por meio deste, a promover e reforçar 
convênios com instituições competentes que contribuíram com projetos sociais e educacionais. 
Além disso, visavam também promover a subsistência econômica dos moradores da 
comunidade remanesce quilombola Lagoas. Sendo assim, todos os convênios estabelecidos e 
as fundamentações legais objetivaram quatro aspectos importantes: 
Apresentar o levantamento fundiário, contendo a seguinte descrição e informações: 
(1) apresentar planta e memorial descritivo do perímetro da área reivindicada pelas 
comunidades remanescentes de quilombo, bem como mapeamento e indicação dos 
imóveis e ocupações lindeiros de todo o seu entorno e, se possível, a indicação da área 
ser averbada como reserva legal, no momento da titulação; (2) Análise das 
informações retiradas do cadastramento das famílias remanescentes de comunidades 
de quilombos, utilizando-se formulários específicos do INCRA; (3) Levantamento e 
especificação detalhada de situações em que as áreas pleiteadas estejam sobrepostas 
a unidades de conservação constituídas, a áreas de segurança nacional, a áreas de faixa 
de fronteira, terras indígenas ou situadas em terrenos de marinha, emoutras terras 
públicas arrecadadas pelo INCRA ou Secretaria do Patrimônio da União e em terras 
dos estados e municípios; e (4) Apresentar os resultados do levantamento ocupacional 
e agroambiental de caracterização do território quilombola pleiteado pelos 
remanescentes do quilombo Lagoas, localizado nos municípios de São Raimundo 
Nonato, Fartura, Bonfim, Dirceu Arcoverde, Várzea Branca e São Lourenço.132 
Nesse sentido, observamos que os objetivos circulavam em torno da construção do 
território quilombola, no qual visava materializar a área demarcada, reunir dados acerca do 
número de famílias e levantar informações pertinentes em relação às unidades de conservação. 
Relativo ao cadastramento das famílias no território que passaria a ser construído, havia também 
a preocupação em organizar informações a respeito de eventuais ocupantes não-quilombolas, 
com a descrição das áreas por eles ocupadas, com a respectiva extensão, as datas dessas 
ocupações e a descrição das benfeitorias existentes, assim também em relação a descrição das 
áreas pertencentes a quilombolas, que têm título de propriedade. Além disso, procuraram 
também informações sobre a natureza das ocupações dos não-quilombolas, como a 
identificação dos títulos de posse ou domínio eventualmente existentes e informações sobre a 
forma e fundamentos relativos à expedição do documento que deveria ser obtido junto ao órgão 
expedidor. 
Sendo assim, para que os objetivos pudessem ser alcançados, assim como para 
orientação dos trabalhos e apresentação dos resultados, considerou-se os elementos da Instrução 
a Lei Estadual do Piauí No 5.595, que previa o estabelecimentos dos convênios, a exemplo dos 
 
131 ALMENDRA FILHO, José Horácio Gayoso e. Estudo exploratório do INTERPI na implementação da 
política fundiária do Estado do Piauí / José Horácio Gayoso e Almendra Filho. – 2018, p. 78. 
132 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010, p. 10-11. 
55 
 
que foram estabelecidos com a Cáritas Brasileira (regional Piauí) e do Projeto Dom Helder 
Câmara, que, na verdade, foram mais reafirmadas, pois ambas instituições já estabeleciam 
contato com algumas localidades do território que visava ser construído. Desse modo, no 
próximo tópico abordaremos sobre as relações de convênios entre as localidades e as 
instituições citadas anteriormente, realizadas na comunidade e em escritório, como a finalidade 
de evidenciar a capacidade dos lagoanos de estabelecer contatos e de se organizar para iniciar 
o processo de territorialização da comunidade Lagoas. 
1.3 Relações de convênio: Projeto Dom Helder Câmara e a Cáritas Brasileira 
Na década de 1980, momento em que as discussões sobre o movimento negro estavam 
em alta, a Igreja Católica no Piauí passou a estabelecer relações com as comunidades 
quilombolas piauienses, realizando trabalhos de identificação das comunidades. De acordo com 
os historiadores Solimar Lima e Daniely Santos (2013), as relações iniciais estabelecidas 
possuíam a intenção de organizar as várias comunidades com a finalidade de conhecer a 
realidade desses grupos e assim elaborar soluções no que diz respeito aos problemas sociais que 
afligiam as comunidades rurais. 
A Comunidade Eclesiástica de Base na Comunidade Quilombola Tapuio foi iniciada 
pela juventude que se reunia, mas não tinha nada de concreto concluído. Não tinha 
espaço físico, os mais velhos não participavam muito, achavam que não tinha sentido 
algum. A primeira ação concreta foi um mutirão para construirmos o salão 
comunitário. Tivemos o apoio de pedreiros da nossa comunidade. As telhas foi um 
apoio que conseguimos das Cáritas. O piso nós conseguimos com o dinheiro 
arrecadação de uma festa organizada por nós. Essa ação concreta conquistou a 
confiança da comunidade.133 
Assim como na comunidade Tapuio, outras comunidades quilombolas piauienses 
também contaram com a solidariedade de agentes externos. Nesse sentido, os autores apontam 
que as comunidades eclesiásticas de base “[...] entraram nas comunidades negras rurais 
realizando um trabalho que consistia em, além de evangelizar, organizar vários grupos de 
trabalhadores rurais para discutir e achar respostas aos vários problemas que afligiam as 
comunidades rurais”.134 
Não distante dessa experiência, a formação territorial da comunidade Lagoas foi 
estabelecida, inicialmente, a partir da mobilização de agentes externos (Cáritas Brasileira e 
Projeto Dom Helder Câmara), através de convênios, juntamente com as localidades que 
 
133 SANTOS, C. A. B. P. Quilombo Tapuio (PI). 2006. 278 f. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) - 
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, Universidade de Brasília, Brasília, 2006, p. 177. 
134 SANTOS e LIMA. Movimento Quilombola do Piauí: participação e organização para além da terra. Revista 
Espacialidades [online]. v. 6, n. 5, 2013, p. 191. 
56 
 
começaram a se organizar para discutir sobre a unificação destas em um único território. Além 
disso, as primeiras relações que foram estabelecidas com esse intuito, serviram para ir sanando 
as dúvidas dos diversos sujeitos que estavam interessados em saber como ocorreria esse 
processo. 
Apoiados nessas discussões, esses povos começaram a desenvolver atividades 
organizacionais para, em seguida, realizarem a construção e domínio do território, pois 
entendemos que em um território tão extenso, no caso da comunidade Lagoas, nada é dado de 
partida, no qual deve-se considerar que havia um imbricado complexo de terras reunidas, que, 
por sua vez, estavam sob o domínio de povos que possuem direitos frente ao Estado, isto é, que 
necessitavam se reconhecer enquanto quilombolas e possuir um território unificado que 
estivesse sob o próprio controle da comunidade. 
Ainda no seguimento anterior, vale ressaltar que compreendemos, a princípio, que os 
diversos grupos das localidades começaram a se imaginar enquanto uma comunidade, sendo 
inicialmente num sentido étnico,135 isto é, que se autodeclarou quilombola, para que depois 
pudesse ocorrer todo o processo de territorialização – construção do quilombo em que habita 
esse grupo étnico –, que se configura como a materialização dessa comunidade. Desse modo, 
neste tópico, discutirei a importância dos convênios estabelecidos pela comunidade, com o 
Projeto Dom Helder Camara e a Cáritas, e de que forma essas relações contribuíram com a luta 
dos lagoanos. 
Iniciando com o Projeto Dom Helder Câmara (PDHC), e de acordo com Rosane Gurgel 
(2016),136 esse projeto tem contribuído massivamente no que diz respeito à agricultura familiar 
e à assessoria técnica no sertões do Nordeste, pois o mesmo parte de um acordo firmado entre 
o MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário), através da Secretaria de Desenvolvimento 
Territorial (SDT), e o FIDA (Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola), que são 
programas atuantes no fortalecimento de políticas de agricultura familiar e de Reforma Agrária 
no semiárido nordestino. Nesse sentido, o projeto foi criado como uma resposta governamental 
à demanda de movimentos sindicais e sociais: ONGs e Igrejas; com a finalidade de desenvolver 
à agricultura familiar na região semiárida nordestina. 
 
135 Entendemos que a autodeclaração, enquanto quilombola, é só o início do reconhecimento enquanto grupo 
étnico, pois, assim como o território, uma identidade étnica também passará por um processo de construção. 
Todavia, não focaremos aqui como se deu a construção identitária da comunidade Lagoas, de modo que só 
focaremos, nesse primeiro capítulo, somente nesse princípio de imaginação enquanto comunidade étnica, que é o 
que nos dará base para discutir o processo de materialização (territorialização)dessa comunidade imaginada. 
136 GURGEL, Rosane Fernandes de Sousa. Agricultura familiar e assessoria técnica: uma análise da experiência 
do Projeto Dom Helder Câmara no Território Sertão do Apodi/RN / Rosane Fernandes de Sousa Gurgel. - 2016. 
105 f. : il. 
57 
 
Pensando em orientar sobre políticas públicas de combate à pobreza, assim como apoiar 
o desenvolvimento rural sustentável, o PDHC adotou o paradigma da agroecologia como 
norteador de suas ações, que nada mais é do que romper com a noção de transferência de 
tecnologias, adotando um enfoque de geração participativa de conhecimentos. Desse modo, a 
intenção é reunir famílias agricultoras e assessoria técnica como forma de potencializar as 
atividades nas comunidades. 
Sobre a influência da Igreja Católica na organização de movimentos sociais que 
passaram a integrar redes, a figura de Dom Hélder Câmara está como o maior 
proponente da América Latina de uma luta não violenta pela libertação das populações 
exploradas e pobres. Neste sentido, a luta do movimento da Igreja contra a pobreza e 
a exploração das classes trabalhadoras era construída sob uma interpretação bíblica 
feita sobre o Novo Testamento, que pode ser lido como guia para um movimento 
totalmente pacifista.137 
Iniciado em 2002, o PDHC é um projeto que foi criado pelo Governo Federal e, logo 
em seguida, o inseriram no plano de desenvolvimento rural do país. De acordo com Josiani 
Morais e Angelo Callou (2017),138 o PDHC atende as famílias do campo, principalmente para 
promover o aumento da produção dos grupos que constituem as localidades rurais, como 
também para contribuir na diminuição da pobreza, se tornando, assim, um agente relevante para 
o fortalecimento da agricultura familiar, desenvolvendo metodologias participativas que 
possam contribuir para o aumento da capacidades e oportunidades dos sujeitos inseridos nas 
localidades que recebem o projeto.139 Desse modo, no que se refere a atuação do PDHC na 
comunidade remanescente quilombola Lagoas, considera-se que: 
A elaboração deste relatório de identificação foi patrocinada pelo Projeto Dom Helder 
Câmara. No dia 10 de setembro de 2010, tal documento foi transferido para o domínio 
das famílias remanescentes da comunidade quilombola de Lagoas. Portanto no dia 14 
de setembro de 2010, resguardados pelo § 5º do VI do Art. 10, na qual faculta à 
comunidade interessada apresentar peças técnicas necessárias à instrução do RTID, 
encaminharam o relatório Técnico Antropológico para apreciação, e no dia 27 de 
setembro de 2010 foi recomendada por Antropólogo do INCRA sua incorporação 
como peça do RTID.140 
Compreende-se então, que o PDHC atuou como patrocinador no desenvolvimento do 
relatório técnico da comunidade, tanto durante a elaboração do documento como também ao 
 
137 ARAÚJO, E. R de; JALFIM, F. T.; SIDERSKY, P. R. A Estratégia de Assessoria Técnica do Projeto Dom 
Helder Câmara. 2. ed. p. 9-19, 2010. 
138 MORAIS, Josiani Alves de e CALLOU, Angelo Brás Fernandes. Metodologias participativas e 
desenvolvimento local: a experiência do Projeto Dom Hélder Câmara no assentamento Moacir Lucena. 
NTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 165-177, jan./mar. 2017. 
139 ARAÚJO, E. R; JALFIM, F. T.; SIDERSKY, P. R. A estratégia de assessoria do projeto Dom Helder 
Câmara. 2. ed. Recife: Projeto Dom Helder Câmara, 2010, p. 166. 
140 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010, p. 12. 
58 
 
transferi-lo, após finalizado para as lideranças da comunidade. Nesse sentido, entendemos que 
as relações de convênios que a comunidade Lagoas estabeleceu, a partir da Lei Estadual do 
Piauí No 5.595, foi fundamental para o relato e materialização do processo de territorialização, 
ao construir o relatório técnico com informações a respeito da comunidade quilombola Lagoas. 
Partindo desse raciocínio, entendemos que todo o conjunto de leis funcionaram como 
estratégias elaboradas pelo Estado para organizar o acesso das comunidades remanescentes 
quilombolas a políticas públicas. 
Em compreensões gerais, das relações estabelecidas entre a comunidade quilombola e 
o PDHC, no início das táticas organizacionais, objetivava-se colaborar com a permanência das 
famílias, no que diz respeito a participação em uma gestão mais sustentável em suas atividades 
produtivas, pois se essas atividades se tornassem mais produtivas, logo os quilombolas 
poderiam permanecer em suas terras, o que contribuiria para uma estabilidade dos núcleos 
familiares. Sendo uma meta bastante restrita, o projeto conseguiu ampliar os seus objetivos 
específicos, a exemplo de apresentar novas oportunidades para as mulheres que estão 
envolvidas nos projetos, isto é, a temática de gênero também foi agregada nos programas de 
formação. 
Essa questão só foi possível a partir de 2007, quando o PDHC lançou documentos novos 
que objetivaram o fortalecimento de questões especificas, como os processos (participativos e 
solidários) que eram desenvolvidos nas localidades, com a finalidade de construir socialmente 
o desenvolvimento sustentável dos agricultores familiares e assentados. Todas essas medidas, 
em algum ponto, necessitaram de parcerias que estevam ligadas ao desenvolvimento territorial, 
sobretudo no que diz respeito a perspectiva da convivência com o semiárido, que, 
consequentemente, garante a transversalidade de etnia e gênero para que os recursos sócio-
políticos, culturais, ambientais, tecnológicos e econômicos possam ser desenvolvidos.141 
Nesse processo, a metodologia participativa assumiu funções importantes, pois 
contribuiu para que os sujeitos que trabalhavam com agricultura familiar conseguissem 
desenvolver suas potencialidades, isto é, as metodologias favoreciam todo o processo de 
aprendizado, a fim de que fosse estabelecido uma construção participativa dos conhecimentos 
específicos de cada localidade, partindo da vivência prática das famílias. Desse modo, o PDHC 
se constituiu um projeto de “[...] ações referenciais voltadas para o desenvolvimento sustentável 
do semiárido do Nordeste do Brasil, que orienta a suas ações embasado no conceito de 
 
141 GURGEL, Rosane Fernandes de Sousa. Agricultura familiar e assessoria técnica: uma análise da experiência 
do Projeto Dom Helder Câmara no Território Sertão do Apodi/RN / Rosane Fernandes de Sousa Gurgel. - 2016. 
105 f. : il. p. 61-62. 
59 
 
convivência com o semiárido, articulando as dimensões sociopolíticas, ambientais, culturais, 
econômicas e tecnológicas”.142 
Sendo assim, a metodologia participativa foi estabelecida visando apoiar a promoção de 
políticas públicas, que possibilitassem o fortalecimento das práticas organizacionais autônomas 
e solidárias da comunidade Lagoas, a fim de conseguir estimular e potencializar a participação 
direta de jovens, bem como promover, apoiar e fortalecer as ações de inclusão étnica. Ou seja, 
por estar vinculado a um modelo contemporâneo no âmbito da extensão rural, o PDHC 
consegue intervir “[...] nas dimensões sociopolíticas, ambientais, culturais, econômicas e 
tecnológicas”,143 em comunidades rurais, como no caso da comunidade Lagoas, respeitando os 
princípios e saberes específicos dos ambientes em que estão inseridos. 
Nesse mesmo seguimento, outra instituição estabeleceu convênio com a comunidade 
Lagoas: a Rede Cáritas. Criada em 12 de novembro de 1956, na terceira assembleia da 
Confederação Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB), em Serra Negra – SP, a Cáritas 
Brasileira era presidida pelo clérigo Dom Hélder Câmara, que na época era bispo auxiliar no 
Rio de Janeiro. O objetivo inicial era articular nacionalmente todas as “obras sociais” católicas 
e “[...] coordenar o Programa de Alimentos doados pelo governo dos Estados Unidos da 
América – EUA, por meio daCNBB”.144 No que diz respeito ao ponto de vista jurídico, a 
Cáritas ficou reconhecida como uma entidade pública federal, demarcando assim uma conexão 
entre o Estado e a Igreja Católica, isto é, juridicamente a Cáritas não é a uma instituição da 
Igreja Católica, mas sim um dos seus organismos. 
O marco legal que reconhece a Cáritas como de utilidade pública federal junto ao 
Estado, possibilita a sua inserção no campo da economia, viabilizando, inclusive, a 
captação de recursos para o desenvolvimento da Economia Popular Solidária (EPS). 
Até a década de 1960, o referido Programa de Distribuição de Alimentos foi 
desenvolvido na perspectiva denominada de “Desenvolvimento da Comunidade”, 
tornando-se a marca característica da Organização no cuidado com os pobres.145 
Ligada à Igreja Católica e influenciada pela teologia da libertação, inclusive tendo como 
uma de suas pautas “[...] realizar a assistência social gratuitamente, mediante convênios e 
 
142 GURGEL, Rosane Fernandes de Sousa. Agricultura familiar e assessoria técnica: uma análise da experiência 
do Projeto Dom Helder Câmara no Território Sertão do Apodi/RN / Rosane Fernandes de Sousa Gurgel. - 2016. 
105 f. : il. p. 62. 
143 CALLOU, A. B. F; TAUK SANTOS, M. S. Desafios da comunicação rural em tempo de desenvolvimento 
local. In: CALLOU, A. B. F.; TAUK SANTOS, M. S. (Org.). Extensão rural – extensão pesqueira: estratégias 
de ensino e pesquisa. 1. ed. Recife: FASA, 2013. p. 477-482. CAPORAL, F. R. Extensão rural e agroecologia: 
temas sobre um novo desenvolvimento rural, necessário e possível. Brasília: Ministério do Desenvolvimento 
Agrário, 2007. 
144 FORTE, Joannes Paulus Silva; GONÇALVES, Alícia Ferreira. A Cáritas Brasileira e a Economia Popular 
Solidária: o Agente de Cáritas e a Caridade Libertadora. Horizonte, Belo Horizonte, v. 11, n. 32, p. 1506-1524, 
out./dez. 2013, p. 1507. 
145 Idem, p. 1508. 
60 
 
campanhas junto às comunidades locais [...]”,146 a Cáritas – tendo como representante a 
antropóloga Simone Matos – foi convidada a compor a equipe multidisciplinar para a 
elaboração de um relatório antropológico, no qual objetivava identificar grupos que se 
autodeclaravam remanescentes de quilombolas, principalmente no município de São Raimundo 
Nonato.147 
Nesse sentido, Karoline Rodrigues (2007) afirma que a “[...] Cáritas participou de 
grande parte desse processo, contribuindo de forma muito significativa para a 
internacionalização da Igreja Católica e expansão da sua tradicional prática na mediação da 
pobreza”.148 Sendo uma entidade sem fins lucrativos, a Cáritas em conformidade com a LOAS 
– Lei Orgânica da Assistência Social, especialmente o Art. 3º, Lei 8.742, tem como princípio 
“[...] promover ações de assistência social voltadas aos mais diversos grupos sociais e participar 
das obras e movimentos direcionados à assistência e promoção humana e formar e capacitar 
agentes para a ação social”.149 
No conjunto de suas funções, a Cáritas promoveu inciativas para a melhoria de questões 
relacionadas à segurança alimentar e nutricional, economia solidária e fundos solidários, que 
envolveram mulheres, jovens e pequenos(as) agricultores(as), como relata Raimundo Marques, 
da localidade Lagoa das Emas: “[...] aqui nós era esquecido, não andava pessoas, começamos 
a ser visto com a Cáritas, quando começou a construir cisterna”.150 Nesse sentido, a Cáritas 
contribuiu nas “lutas emancipatórias, a partir de processos coletivos, organizativos, 
promovendo o protagonismo de grupos e comunidades, bem como no fortalecimento de 
iniciativas em redes de articulação, fórum e ações de incidência política”,151 que visam a 
inclusão e transformação social. Na perspectiva de apoiar a luta emancipatória da comunidade 
quilombola Lagoas, sobretudo no início das táticas realizadas entre os moradores das 
comunidades e os agentes sociais, a Cáritas também contribuiu realizando um: 
[...] estudo das relações entre os grupos étnico-raciais incidentes dentro deste território 
pleiteado pelas famílias de Lagoas, bem como sua trajetória histórica própria, dotadas 
de relações territoriais específicas e de presunção de ancestralidade negra relacionada 
com a resistência à opressão histórica sofrida, além da identificação e validação sócio-
 
146 Cáritas brasileira, 2005. 
147 No contexto das mobilizações iniciais, foi a entidade convidada pelos líderes quilombolas que articulavam a 
territorialização da comunidade Lagos, por considerarem o tempo de atuação na região. 
148 RODRIGUES, Karoline Parrião. Cáritas e ação social católica: “caridade libertadora” como solidariedade. III 
Jornada Internacional de Políticas Públicas, São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007, p. 04. 
149 Cáritas brasileira, 2005. 
150 Entrevista concedida a Simone Oliveira, em 2009. 
151 RODRIGUES, Karoline Parrião. Cáritas e ação social católica: “caridade libertadora” como solidariedade. III 
Jornada Internacional de Políticas Públicas, São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007, p. 05. 
61 
 
histórica do território pleiteado foram efetivadas pela cientista social da Cáritas 
Diocesana, Simone de Oliveira Matos.152 
O desenvolvimento desse estudo de conhecimento sobre as histórias das comunidades 
e como elas se relacionavam, pode ser compreendido como um processo de conhecimento e 
domínio sobre o território que visava ser demarcado, isto é, a organização de líderes para a 
comunidade, como também as relações estabelecidas com os agentes da Cáritas Brasil e do 
Projeto Dom Helder Câmara. Desse modo, os vínculos que foram estabelecidos empunhavam, 
em troca, que os agentes sociais e as lideranças quilombolas conhecessem melhor o território 
que seria pleiteado, do mesmo modo que, as quase mil e quinhentas (1.500) famílias, passaram 
a reconhecer esses sujeitos, o que caracterizou essas ligações enquanto atitudes fundamentais 
para a realização de todo o processo de construção do território, isto é, de levantamento da 
malha fundiária, da construção da planta e do memorial descritivo, do cadastramento das 
famílias, da realização do laudo agroambiental, entre outros. 
Sendo assim, considerando a dimensão da comunidade e a quantidade de moradores 
estabelecidos nela, essas agenciações, em grande medida, corroboraram para uma melhor 
dinâmica entre a comunidade, os seus líderes e os agentes externos que foram estabelecidos 
através dos convênios, que só puderam avançar positivamente por estarem respaldados no 
conjunto de normas constitucionais e, de forma especial, por meio da Lei Estadual de nº 5.595. 
Nesse sentido, compreendendo a importância da fundamentação legal ao qual a comunidade se 
embasou e como ela foi útil para a demarcação do território, no próximo capítulo discutiremos 
acerca da territorialização da comunidade e como as suas ações podem ser compreendidas 
enquanto um ato contra colonizador. 
 
 
 
 
 
 
 
 
152 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010, p. 12. 
62 
 
CAPÍTULO II 
 
 
 
 
OS CONTRA COLONIZADORES E A 
TERRITORIALIZAÇÃO DO QUILOMBO LAGOAS 
 
 
E vamos compreender por contra colonização todos os 
processos de resistência e de luta em defesa dos 
territórios dos povos contra colonizadores, os 
símbolos, as significações e os modos de vida 
praticados nesses territórios. A guerra da colonização 
nada mais é que uma guerra territorial, de disputa de 
territorialidades. Nesse contexto, nós, povos contra 
colonizadores, temos demonstrado em muitos 
momentos da história a nossa capacidade de 
compreender e até de conviver com a complexidade 
das questões que esses processos tem nos 
apresentado.153 
Nêgo Bispo 
 
153 SANTOS, AntônioBispo dos. Colonização, quilombos: modos e significados. Instituto Nacional de Ciência 
e Tecnologia de Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa. Universidade de Brasília, 2015, p. 48. Disponível em: 
http://cga.libertar.org/wp-content/uploads/2017/07/BISPO-Antonio.-Colonizacao_Quilombos.pdf. Acessado em: 
20 de novembro de 2018. 
http://cga.libertar.org/wp-content/uploads/2017/07/BISPO-Antonio.-Colonizacao_Quilombos.pdf
63 
 
2.1 A contra colonização sob uma perspectiva descolonial 
Na conferência realizada pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em 
2007, a antropóloga Manuela da Cunha apresentou considerações importantes sobre as relações 
e dissensões entre saberes tradicionais e o saber científico, que merecem atenção, sobretudo no 
Brasil, por tratar da diversidade de saberes, de como eles são constituídos e se diferenciam em 
um mesmo espaço. A respeito, a autora pontuou que “[...] poderíamos começar notando que, de 
certa maneira, os conhecimentos tradicionais estão para o conhecimento científico como as 
religiões locais para as universais”,154 ou seja, os saberes tradicionais são diversos e estão 
inseridos em infindas comunidades locais, diferentemente do conhecimento científico que 
busca pela universalidade. 
Da mesma forma que a ciência moderna se expressa, a cultura dominante também teve 
a pretensão de ser universal, cujo se apresentou a partir da força de intervenção política, 
econômica e militar do colonialismo e do capitalismo moderno. Nesse sentido, Manuela da 
Cunha destacou que a epistemologia dominante suprimiu diversas práticas socioculturais que 
contrariavam os seus interesses, provocando assim a redução da diversidade epistemológica do 
mundo. Em contraposição às práticas estendidas pela colonialidade, a antropóloga observou 
que o único caminho aceitável, entre os saberes tradicionais e o saber científico, seria o de 
discutir e valorizar a diversidade epistêmica que (re)existe na contemporaneidade, isto é, 
somente a partir de um “giro decolonial”, conceito cunhado por Ramón Grosfoguel e Walter 
Mignolo (2008),155 é que outras expressões epistêmicas poderão coexistir no mundo. 
Inserido nessa perspectiva, ao discutir sobre territorialidade e as relações étnico-raciais 
a partir dos quilombos, Nêgo Bispo iniciou um debate importante acerca dos modos e 
significados quilombolas e a força contra colonizadora que esses povos possuem. Essa visão, 
mesmo que indiretamente, estabelece relação com dois grupos de estudos: os Estudos 
Subalternos descoloniais e os Estudos Étnicos; que são direcionados a novas produções 
historiográficas nas Américas, no qual discutem, por exemplo, a respeito dos mecanismos de 
produção da vida politeísta, da biointeração e dos saberes orgânicos criados pelos povos contra 
colonizadores em contraposição ao monoteísmo, a monocultora e a perspectiva de mundo 
capitalista. 
 
154 CUNHA, Manuela Carneiro Da. Relações e dissensões entre saberes tradicionais e saber científico. Revista 
USP, São Paulo, n.75, 2007, p. 293. 
155 GROSFOGUEL, Ramón; MIGNOLO, Walter. Intervenciones decoloniales: una breve introducción. Tabula 
Rasa. Revista de Humanidades. Bogotá, n. 9, p. 29-37, 2008. 
64 
 
Em relação aos Estudos Subalternos descoloniais, o sociólogo Ramón Grosfoguel 
(2008) coloca que uma perspectiva epistêmica proveniente do lado subalterno da diferença 
colonial visa, em tese, contribuir para a criação de uma perspectiva crítica que seja capaz de 
transcender algumas compreensões epistêmicas colonialistas. De acordo com o sociólogo, 
embora alguns membros do Grupo Latino-americano de Estudos Subalternos terem conseguido 
produzir trabalhos alternativos e radicais, tais estudos não alcançaram a libertação do sistema 
epistêmico dos Estudos Regionais dos Estados Unidos. Além disso, o autor aponta que raras 
exceções optaram por fazer pesquisas sobre a perspectiva subalterna, pois o interesse maior 
estava voltado para a corrente pós-estruturalista. 
Os latino-americanistas deram preferência epistemológica ao que chamaram “os 
quatro cavaleiros do Apocalipse”, ou seja, a Foucault, Derrida, Gramscie e Guha. 
Entre estes quatro, contam-se três pensadores eurocêntricos, fazendo dois deles 
(Derrida e Foucault) parte do cânone pós-estruturalista/pós-moderno ocidental. 
Apenas um, Guha, é um pensador que pensa a partir do Sul.156 
Entre muitas razões que conduziram o grupo Latino-americano de Estudos Subalternos 
à desagregação, Ramón Grosfoguel coloca que o principal motivo foram as críticas, de outros 
grupos de Estudos Subalternos, que afirmavam que os Estudos Latino-americano consideravam 
a subalternidade uma crítica pós-moderna, fugindo, assim, dos propósitos dos estudos 
subalternos que visavam produções críticas à colonialidade. Em contraste ao Grupo Latino-
americano, o autor pontua que o Grupo Sul-asiático de Estudos Subalternos apresentou 
importantes contribuições críticas ao eurocentrismo, pois se inseriam num movimento 
intelectual de crítica pós-colonial que se opunha à crítica pós-moderna. No entanto, embora 
estes grupos tenham realizado pesquisas importantes, o sociólogo ressalta que as críticas da 
perspectiva descolonial estão para além dos aspectos que diferenciam esses grupos. 
Há três aspectos importantes que têm de ser aqui referidos: 1) uma perspectiva 
epistémica descolonial exige um cânone de pensamento mais amplo do que o cânone 
ocidental (incluindo o cânone ocidental de esquerda); 2) uma perspectiva descolonial 
verdadeiramente universal não pode basear-se num universal abstrato (um particular 
que ascende a desenho – ou desígnio –universal global), antes teria de ser o resultado 
de um diálogo crítico entre diversos projetos críticos políticos/éticos/epistémicos, 
apontados a um mundo pluriversal e não a um mundo universal; 3) a descolonização 
do conhecimento exigiria levar a sério a perspectiva/cosmologias/visões de 
pensadores críticos do Sul Global, que pensam com e a partir de corpos e lugares 
étnico-raciais/sexuais subalternizados.157 
 
156 GROSFOGUEL, Ramón. Para descolonizar os estudos de economia política e os estudos pós-coloniais: 
Transmodernidade, pensamento de fronteira e colonialidade global. Revista Crítica de Ciências Sociais. Tradução 
de Inês Martins Ferreira, 2008, p. 42. 
157 Idem, p. 44. 
65 
 
Nesse sentido, percebemos que, enquanto projetos epistemológicos, o pós-modernismo 
e o pós-estruturalismo e os estudos pós-coloniais encontram-se aprisionados no interior do 
cânone ocidental. Mesmo que não seja intencional, essas perspectivas tendem a reproduzir, 
dentro dos seus domínios de pensamento e prática, uma determinada forma de colonialidade do 
conhecimento que parte da Europa. Com isso, notamos também que tanto as primeiras 
produções coloniais como também os estudos pós-coloniais e pós-modernos possuem uma base 
fundamentalista, tendo algo em comum, como exemplo, a perspectiva de mundo eurocêntrica 
que sustenta toda uma tradição epistêmica acerca dos grupos subalternos. 
Os paradigmas eurocêntricos hegemônicos que, ao longo dos últimos 500 anos, 
inspiraram a filosofia e as ciências ocidentais do nosso sistema-mundo estão enraizadas nas 
lógicas: patriarcal, capitalista, colonial e moderna; que assumem um ponto de vista universalista 
e objetivo. De acordo com Ramón Grosfoguel, ninguém escapa das irredutíveis hierarquias de 
classe, sexuais, de gênero, espirituais, linguísticas, geográficas e raciais desse sistema mundial, 
sendo assim, é importante definir bem o lócus da enunciação de quem fala, isto é, o lugar 
geopolítico e corpo-político do sujeito que fala. 
O que defendo é o seguinte: todo o conhecimento se situa, epistemicamente, ou no 
lado dominante, ou no lado subalterno das relações de poder, e isto tem a ver com a 
geopolítica e a corpo-política do conhecimento.A neutralidade e a objetividade 
desinserida e não-situada da geopolítica do conhecimento é um mito ocidental.158 
Partindo dessa perspectiva, podemos compreender que a filosofia ocidental sempre 
privilegiou a “egopolítica do conhecimento” e desfavoreceu à “geopolítica do conhecimento”, 
fazendo com que o homem ocidental representasse o seu conhecimento como o único capaz de 
alcançar uma consciência universal e dispensasse o conhecimento não-ocidental, pois seria 
incapaz de alcançar a universalidade. Em contrapartida as essas imposições, compreendemos 
que os Estudos Subalternos direcionados às Américas são, indubitavelmente, importantes para 
romper com a racionalidade eurocêntrica. 
No mesmo sentido dos Estudos Subalternos, o sociólogo Maldonado Torres (2006) 
coloca que os Estudos Étnicos partiram da necessidade de conhecer o mundo não-europeu. Para 
que esses desejos fossem concretizados e viabilizados, tais estudos passaram a direcionar as 
suas próprias pesquisas das ciências sociais para o estudo das sociedades não-europeias e não-
estadunidenses. Percebemos que, a partir dessa necessidade, os Estudos Étnicos deram um 
passo importante. Certamente, os objetivos se encontravam para além de “apenas 
 
158 GROSFOGUEL, Ramón. Para descolonizar os estudos de economia política e os estudos pós-coloniais: 
Transmodernidade, pensamento de fronteira e colonialidade global. Revista Crítica de Ciências Sociais. Tradução 
de Inês Martins Ferreira, 2008, p. 46. 
66 
 
conhecimento” sobre outros continentes, mas vieram muito com propósito de iniciar estudos 
descolonizadores. 
Ao buscar estabelecer estudos interdisciplinares, os Estudos Étnicos se apropriaram de 
diversas disciplinas, a exemplo de sociologia e geografia. Tais contatos entre as disciplinas 
contribuíram para lançar luz sobre a complexidade do mundo com o qual os Estados Unidos 
agora se defrontava. Com isso, os Estudos Étnicos passaram a representar uma nova percepção 
sobre a história, buscando se distanciar da historiografia europeia, que outrora era pensada 
como o ápice da civilização humana. Desse modo, os Estudos Étnicos visavam como objeto de 
estudo os distintos grupos minoritários dentro de um estado-nação, a exemplo dos grupos de 
afro-americanos, asiático-americanos, povos indígenas e latinos, sendo orientados por uma 
agenda de descolonização interna. 
Partindo desses debates, podemos compreender que a noção de “povos contra 
colonizadores”, do mestre Nêgo Bispo, se relaciona com a proposta descolonial dos Estudos 
Subalternos e do Estudos Étnicos, no que refere pensar a territorialização quilombola como uma 
ação contra colonizadora, considerando que a territorialização é “[...] um processo que envolve 
o exercício de relações de poder e a projeção dessas relações no espaço”.159 Desse modo, 
compreendo que discutir a territorialização do quilombo Lagoas-PI, a partir da perspectiva de 
Nêgo Bispo, faz com que as estruturas institucionais e epistemológicas que estão relacionadas 
à colonialidade sejam descolonizadas, pois as ações da comunidade partem da capacidade de 
pensar, agir e se relacionar com outros grupos não-quilombolas, isto com a finalidade de 
territorializar e ocupar legalmente os seus espaços. 
No caso da comunidade quilombola Lagoas, destaco que a sua ação contra colonizadora 
ocorreu desde início com a articulação das leis que fundamentam os seus direitos, com os 
convênios estabelecidos e com a sua capacidade de mobilização organizacional. Em relação ao 
último aspecto citado, ressalta-se que entre os anos de 2005 e 2007 as informações sobre a 
mobilização organizacional da comunidade são bastantes específicas de algumas localidades, a 
exemplo do que consta sobre os “[...] debates iniciais ocorridos a partir de 2005, com presença 
de lideranças (nacionais, estaduais e locais) do Movimento Quilombola, que giravam em torno 
da organização e mobilização política do grupo, inicialmente, nas localidades Lagoa das Emas 
e Lagoa do Moisés”.160 
 
159 SOUZA, Marcelo Lopes de. Os conceitos fundamentais da pesquisa sócio-espacial. Rio de Janeiro: Bertrand 
Brasil, 2013, p. 89. 
160 MATOS, Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da territorialidade quilombola: uma 
etnografia. (Dissertação em Antropologia). Teresina (PI), agosto de 2013. p. 122. 
67 
 
Foi a partir dessas localidades que houve o interesse inicial de organização da 
comunidade, que passaram a se compreender, assim como visualizaram outras localidades 
próximas, como povos que possuíam ou estabeleciam relações de sociabilidade entre si.161 No 
entanto, antes de iniciar o processo de conhecimento e produção do território, foi necessário 
que essas localidades se organizassem e construíssem uma noção de unidade a partir das 
relações comunitárias que existiam entre elas. Nessa perspectiva, a antropóloga Simone Matos 
(2013), em sua pesquisa sobre a comunidade quilombola Lagoas, reforça a existência do 
sentimento de unidade e das relações de parentesco entre moradores de algumas localidades, 
enfatizando a ideia mútua de identificação entre os moradores. 
Nos percursos etnográficos, nas narrativas dos agentes sociais percebem-se, 
inicialmente, certas descontinuidades ou interrupções. No esforço para entender como 
se foi dando a organização do grupo pelas relações de parentesco, ficam evidentes, 
nas narrativas locais, as estreitas relações de sociabilidade e de solidariedade entre 
aqueles que viviam em condições sociais semelhantes. Disso resulta que ex-
escravizados/as ou escravizados/as constituíram alianças, no sentido de uma grande 
família, “uma irmandade”. São situações que remontam ao tempo de bisavós e 
bisavôs, na Fazenda São Victor e a outras com as quais proprietários desta tinham 
relações, como Lagoa do Quari (QuariVelho), as Lagoas e Cansanção.162 
Os lapsos de memória dos moradores entrevistados, bem como a falta de documentação 
acerca da história dessas localidades, resultaram em “certas descontinuidades ou interrupções”. 
Ainda assim, partindo dos relatos dos moradores, a pesquisadora afirma que as relações de 
parentescos e de sociabilidade entre esses sujeitos contribuíram para a construção de “uma 
grande família” ou “uma irmandade”, pois houveram dinâmicas de mudanças entre os 
moradores de uma localidade para a outra, o que nos leva a compreender uma das formas de 
relações que as localidades possuíam. 
Ainda nesse sentido, a quilombola Maria Bonsolhos relatou que “[...] são tudo da mesma 
gente, tudo parente [...]”,163 ao se referir aos moradores das localidades de São Victor, Moisés, 
Retiro, Baixão do Boi, entre outras; e o quilombola Raimundo Bonsolhos, conhecido 
popularmente como “véi Derré”, contou também que os povos de algumas localidades próximas 
eram parentes e, além disso, mantiveram algumas relações ao longo dos anos, a exemplo da 
participação nos festejos que aconteciam na localidade Lagoa das Pedras. 
Lagoa Pedra, Lagoa do Calango, Lagoa dos Martins – somos parentes bem pertinho, 
fomos criados tudo junto, eles moravam no Boi Morto e nós, nas Lagoinhas, depois 
quando nós viemos para cá [Lagoa das Emas] pouco tempo depois eles vieram pra cá 
[Lagoa dos Martins]. Da Lagoa da Pedra, muita gente daquele povo lá era filho de um 
 
161 MATOS, Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da territorialidade quilombola: uma 
etnografia. (Dissertação em Antropologia). Teresina (PI), agosto de 2013. p. 126. 
162 Idem, p. 51. 
163 Idem, p. 81. 
68 
 
primo de meu pai, nós íamos para as festas por lá, que nós éramos festeiros, Lagoa 
dos Prazeres, o velho José Aragão era primo do meu pai.164 
A partir desses relatos, Simone Matos reforçou em sua pesquisa a ideia de que essas 
relações de parentesco “[...] foram constituindoum território da mesma gente [...]”,165 
justificando que a afinidade existente entre os moradores, que é apresentada através do 
parentesco e das relações sociais estabelecidas, contribuiu para construir um sentido de unidade 
entre as localidades, facilitando assim a organização desses povos em um único território.166 
No entanto, chamo atenção para a afirmativa da pesquisadora, em relação à tentativa de 
legitimar que os moradores das localidades distintas – por possuírem relações de parentesco e 
de sociabilidade – se organizaram em um território, apresentando assim um sentido de espaço 
dado, isto é, que não possui historicidade. 
Em contraponto à perspectiva da autora, entendo que o território do quilombo Lagoas 
foi construído a partir de ações contra colonizadoras, isto é, dos limites que foram estabelecidos 
e da demarcação posta pela comunidade. Desse modo, compreendo que historicizar o processo 
de territorialização da comunidade é apresentar evidências de como ocorreu a construção do 
território lagoano, de como se deram as ações contra colonizadoras, e também de produzir o 
que Michel Foucault colocou como uma “história dos espaços”,167 considerando o território 
lagoano enquanto um espaço que possui historicidade. 
Nesse sentido, o quilombola Lagoas identifica-se, na minha perspectiva, como um 
território que passou pelos processos de conhecimento e produção a partir da organização de 
seus membros, dos mapas que foram elaborados, da constituição e levantamento da malha 
fundiária em campo e em cartório, da planta e memorial descritivo e dos cadastramentos das 
famílias remanescentes quilombolas – que tratam sobre o tamanho dos núcleos familiares e da 
faixa etária da população, das prática de associativismo no território, dos aspectos 
socioeconômicos e educativos desses povos. Desse modo, compreendo, e detalho de forma mais 
específica no próximo tópico, como todos estes aspectos foram ações contra colonizadoras, que, 
por sua vez, evidenciam a importância e o significado existencial da comunidade quilombola 
Lagoas. 
 
164 MATOS, Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da territorialidade quilombola: uma 
etnografia. 2013, p. 51 
165 Idem, p. 81. 
166 Idem, p. 56. 
167 FOUCAULT, Michel. Gênese e Estrutura da Antropologia de Kant. São Paulo: Edições Loyola, 2011, p. 
212. 
69 
 
2.2 Conhecimento e Produção: a territorialização do quilombo Lagoas 
O território da comunidade Lagoas possui a sua dimensão histórica, assim como 
qualquer o de outro quilombo, mas nem sempre foi assim. Antes do estabelecimento dos seus 
limites, assim como antes de todo o processo de conhecimento e produção do território, 
sabemos que existia um conjunto de localidades – mais especificamente cento e dezenove (119) 
– que em parte eram dispersas, mas também se correlacionavam a partir de proximidades 
geográficas e parentais. Nesse sentido, em 2007, iniciaram as primeiras mobilizações entre 
lideranças quilombolas do Piauí e alguns moradores das localidades, objetivando o 
empoderamento e autoconhecimento da comunidade enquanto quilombola. 
Foram através das mobilizações, que esses sujeitos participaram de eventos 
associativos, assim como de debates sobre o quilombo enquanto um grupo identitário e político, 
isto é, nesses encontros era reforçada a necessidade de se construir uma identidade quilombola, 
de se compreenderem enquanto quilombolas, pois não podiam estar somente ligados a “[...] 
representações herméticas de um passado, mas sim de uma organização social inserida em um 
contexto político e econômico atual”,168 que, inclusive, possuíam respaldo constitucional para 
reivindicar a demarcação e titulação do seu território. 
No caso das comunidades quilombolas brasileiras, a construção identitária é um 
processo extremante essencial que ocorre de variadas formas, a exemplo de algumas 
comunidades quilombolas no Sul do Brasil – quilombos “Teixeiras” e “Beco dos Colodianos” 
– cuja a sua “[...] construção identitária se deu no âmbito do processo de identificação e 
reconhecimento para fins de inserção em um programa governamental”,169 assim como “[...] 
entre algumas comunidades remanescentes de quilombo do estado do Rio de Janeiro, cujo o 
processo de construção e reafirmação identitária ocorreu por meio do jongo”.170 A partir desses 
aspectos culturais, podemos compreender que a construção identitária dos quilombolas 
representa um passo importante para a comunidade. No entanto, o fortalecimento do sentido de 
unidade não é reforçado somente através da cultura, mas também a partir da capacidade 
organizacional desses grupos, como podemos observar na imagem a seguir. 
 
 
 
168 BARTH, F. O guru, o iniciador e outras variações antropológicas. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2000. 
169 BENEDETTI, Adriane Cristina. Luta por Reconhecimento e Construção de Identidade em Comunidades 
Quilombolas no Sul do Brasil. Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 7, n. 2, 2014, p. 33. 
170 MAROUN, Kalyla. A construção de uma identidade quilombola a partir da prática corporal/cultural do 
jongo. Porto Alegre, v. 20, n. 01, 2014, p. 13. 
70 
 
Imagem 1: Audiência pública realizada, no dia 27 de maio de 2007, na câmara municipal de São Raimundo 
Nonato-PI. 
 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
Realizada no dia 27 de maio de 2007, esta audiência pública reuniu, na câmara 
municipal de São Raimundo Nonato-PI, homens e mulheres do quilombo Lagoas com a 
finalidade de discutir sobre os aspectos políticos, administrativos e técnicos das ações que 
seriam desenvolvidas na comunidade. Desse modo, foram apresentaram alguns procedimentos 
administrativos de regularização do território e realizaram uma exposição técnica abrindo 
espaço para dúvidas da comunidade. Além disso, estabeleceram uma rotina de reuniões, sendo 
realizadas com o objetivo de definir responsabilidades coletivas e individuais, para que então 
pudessem iniciar o processo de conhecimento e produção territorial. Nesse contexto, ressalta-
se que as discussões conceituais, em relação à compreensão contemporânea dos quilombos, 
objetivavam a qualificação e orientação dos procedimentos que seriam estabelecidos durante as 
atividades de produção do território. 
As reuniões associativas continuaram sendo estabelecidas em 2008, promovendo 
avanços relacionados à elaboração de uma ata de apresentação das localidades que se 
autoconheciam como quilombolas, tendo como resultado a visita da Fundação Palmares. Desse 
modo, a partir desses progressos, alguns esforços se concentram para organizar e uniformizar 
as lideranças nas localidades, com a finalidade de conhecer, por naturezas diferentes – a 
exemplo das viagens entre os municípios e cadastramento das famílias –, o espaço que seria 
 
71 
 
territorializado. Nesse sentido, compreendemos que cada uma das formas de conhecimento 
forneceu típicos específicos de informações – sobre o território pleiteado; reconstituição e 
levantamento da malha fundiária; planta e memorial descritivo; cadastramentos das famílias; 
laudo agroambiental do território –, que, simultaneamente, corroboravam com a construção do 
território. 
As interações entre os quilombolas nas assembleias representam, para mim, ações 
estáveis de interação, que a partir dos contatos com os agentes externos (movimento quilombola 
do estado, Cáritas Brasileira e Projeto Dom Helder Câmara), conseguiram assegurar 
procedimentos legais de acordo com as suas ações contra colonizadoras. Num espaço 
circunscrito e visível, as agenciações passaram a construir a territorialização da comunidade 
Lagoas, isto é, o conhecimento do espaço passou a gerar autonomia sobre o mesmo com a 
finalidade de que essas formas de conhecimentopudessem facilitar políticas públicas 
relacionadas à agricultura familiar, ao aumento do número de casas e de escolas, entre outras 
ações que partiam da demanda da própria comunidade. 
Após a comunidade ser apresentada à Fundação Palmares, por meio da equipe técnica 
do INCRA, houve a atribuição do título de “comunidade quilombola” concedida e, 
consequentemente, iniciaram-se as primeiras visitas dos agentes do INCRA nas localidades. 
Nesse sentido, um dos primeiros passos organizacionais foi a constituição de uma equipe 
técnica, de acordo com cada especialidade – nas áreas de administração, engenharia, assistência 
de serviços, entre outras –, que ficaram responsáveis para realizarem atividades específicas, de 
acordo com seus conhecimentos profissionais, nas cento e dezenove (119) localidades. Nessas 
circunstâncias, cada membro da equipe técnica possuía elementos importantes de conhecimento 
específico, entre eles: a competência técnica desses indivíduos, disponibilidade de tempo para 
se dedicarem aos trabalhos necessários e, sobretudo, o compromisso com os direitos 
constitucionais relacionados ao direito.171 
A partir dessa formação, a equipe técnica iniciou as mobilizações do processo de 
conhecimento da comunidade. Para tanto, foi necessário definir quais seriam os pontos a serem 
traçados, os seus objetivos e, por seguinte, iniciar o processo de conhecimento e produção do 
território lagoano. A compreensão no período, era de que esses sujeitos deveriam realizar um 
 
171 A equipe técnica se configurou da seguinte forma: Alan Feitosa Pinho (Técnico administrativo do INCRA), 
Deodato do Nascimento Aquino (Perito federal agrário do INCRA), Edvaldo Henrique Ferreira Soares 
(Engenheiro agrimensor do INTERPI), Francisca Maria Noleto Batista Ramos (Téc. nível médio do INTERPI), 
Lacy Lourdes de Assunção Sobrinha (Assistente de administração do INCRA), Maria Marlene de Melo Furtado 
(Técnica em cadastro rural do INCRA), Raimundo Nonato da Silva Amorim (Assistente de administração do 
INCRA) e Valdeci de Moraes Uchôa (Assistente de serviço do INTERPI). 
72 
 
levantamento de materiais bibliográficos, isso para fundamentar as suas ações, bem como 
diversos dados secundários que permitiriam uma melhor compreensão do contexto ao qual as 
comunidades estavam inseridas. Nesse sentido, havia a preocupação em reunir a maior parte de 
informações possíveis, pois era necessário que o relatório técnico fosse um acervo de dados e 
conhecimentos gerais sobre o território a ser pleiteado. 
Em consideração a grande dimensão do território visado, foi necessário, além de uma 
equipe técnica, que se formassem outros grupos. Neste caso, os novos grupos foram 
constituídos pelos próprios povos das localidades, no qual “[...] se organizaram em 12 (doze) 
núcleos populacionais, sendo priorizada a proximidade geográfica, as relações de parentescos, 
compadrio, organização social, política, cultural já pré-existente,172 com o objetivo de facilitar 
o desenvolvimento das atividades subsequente de regularização fundiária, tais como: “[...] 
cadastramento, levantamento agroambiental, fundiário, etc., procedimentos administrativos à 
posteriori ao território pleiteado/identificado”.173 
Como podemos observar, antes das mobilizações iniciarem, foi necessário que as cento 
e dezenove (119) localidades se organizassem em doze (12) núcleos, levando em consideração 
os critérios, em sequência: proximidade geográfica, relações de parentesco, compadrio, 
organização social, política e cultural que preexistiam à territorialização da comunidade 
Lagoas. Desse modo, percebo que é a partir dessa divisão e desses critérios que a comunidade 
iniciou o seu processo de conhecimento territorial, sendo a memória um aspecto importante em 
toda essa trajetória. De acordo com Alex Ratts (1996),174 durante o processo organizacional e 
de territorialização das comunidades quilombolas brasileiras, a memória coletiva de cada grupo 
é acionada de modo que a territorialidade “[...] se estende por todos os lugares onde passa a 
memória do grupo, onde estes fizeram sua trajetória ou seus antepassados cruzaram”.175 
No entanto, é importante salientar que algumas informações, que possibilitaram um 
conhecimento prévio sobre algumas localidades, foram subsidiadas por estudos preliminares 
antropológicos executados em três (03) viagens às localidades: (18/04 à 02/05/2006; 18/07 à 
31/07/2006 e 26/01 à 29/01/2007); realizadas pelo analista e antropólogo do INCRA, Eduardo 
 
172 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010, p. 15. 
173 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010, p. 15. 
174 RATTS, Alecsandro. Conceição dos Caetanos: memória coletiva e território negro. Palmares em Revista. 
Brasília. No. 1, 1996, p. 97-115. 
_____. A geografia entre as aldeias e os quilombos: territórios etnicamente diferenciados. In: ALMEIDA, Maria 
Geralda de & RATTS, Alecsandro JP. (Orgs.). Geografia: Leituras Culturais. Goiânia: 2003, v. 1, p. 29-48. 
175 RATTS, Alecsandro. Conceição dos Caetanos: memória coletiva e território negro. Palmares em Revista. 
Brasília. No. 1, 1996, p. 99. 
73 
 
Campos Rocha. Nessas viagens, a territorialidade da comunidade foi explorada durante os 
caminhos percorridos e guardados pela memória dos grupos. Nesse processo, Alex Ratts (1996) 
coloca que “[...] além dos laços de parentesco, as relações sociais consistentes desenvolvidas 
pelo grupo com outros atores sociais, lhes permitem uma espacialidade segura para além dos 
limites de seu território e o avanço da efetivação de sua cidadania”.176 
Nessas circunstâncias, as mobilidades feitas no território e as assembleias que foram 
realizadas nos ajudam a compreender melhor sobre as implicações políticas e simbólicas de 
dominação do território do quilombo Lagoas. Por exemplo, as mobilidades realizadas na 
comunidade, os contatos que foram estabelecidos entre as lideranças quilombolas e os agentes 
da comunidade, se configuram aqui como uma montagem elaborada que constituem e 
legitimam as lideranças ao envolverem esses sujeitos no processo de contra colonização. Além 
disso, os convênios que foram assentados colaboravam para enfrentar algumas ameaças ao 
território, a exemplo das empresas carvoeiras, no que diz respeito a denunciarem as empresas, 
na luta por políticas públicas e ao reforçarem o discurso sobre a necessidade da colaboração 
participativa dos povos nesse processo. 
Sendo assim, os procedimentos para o trabalho que foram desenvolvidos durante o 
processo de conhecimento do território consideraram os instrumentos: entrevistas estruturadas, 
oficinas, utilização de formulários e caminhadas. Desse modo, estes instrumentos foram 
contemplados com pesquisas bibliográficas que permitiram uma melhor compreensão a 
respeito dos seguintes pontos: memória histórica e organização existencial na ocupação do 
território; delimitação e mapeamento do território; identificação e caracterização; identificação 
dos conflitos; caracterização dos sistemas produtivos e construção do calendário de atividades 
da comunidade. Além desses pontos, todos os residentes do território foram cadastrados, tanto 
os quilombolas quantos os não quilombolas. 
Nesse sentido, o trabalho coletivo era de extrema importância tendo em vista o tamanho 
do território, o difícil acesso as localidades, os deslocamentos, alimentação e hospedagens, que 
foram importantes durante esse processo. Ressalta-se que, de acordo com a equipe técnica, a 
comunidade os receberam de forma participativa e quando tiveram algumas dúvidas sobre as 
informações que estavam sendo coletadas, elas foram respondidas. Além disso, a equipe técnica 
conversava com os moradores das localidadespara que eles contassem a respeito de suas 
histórias, sendo um aspecto importante para que a equipe técnica conduzisse as atividades 
 
176 RATTS, Alecsandro. A geografia entre as aldeias e os quilombos: territórios etnicamente diferenciados. In: 
ALMEIDA, Maria Geralda de & RATTS, Alecsandro JP. (Orgs.). Geografia: Leituras Culturais. Goiânia: 2003, 
v. 1, p. 32. 
74 
 
propostas, pois essas informações serviam para que os agentes socais pudessem conhecer mais 
sobre as vivências e as lutas enfrentadas por esses sujeitos. Desse modo, consta-se no relatório 
técnico que “[...] havia grande disposição e expectativa em relação à contribuírem para a 
construção do relatório que territorializaria a própria comunidade”.177 
A respeito da territorialização da comunidade, Simone da Silva (2011) coloca que o 
processo da territorialização das comunidades quilombolas no Brasil deve ser compreendido a 
partir do “[...] percurso acerca da trajetória do negro em nosso país que busca evidenciar a 
importância da terra/território e da memória, pois estes são estruturantes na luta política destas 
populações que historicamente foram marginalizadas”.178 Isto é, compreende-se que a história 
de vida desses grupos, assim como a sua identidade, estão relacionadas com a territorialização 
da comunidade, tendo em vista a importância material e simbólica do território, pois “[...] para 
o negro, o simples ato de apropriação do espaço para viver, apropriação da terra, passou a 
significar um ato de luta contra aqueles que não queriam essa territorialização negra”.179 
Nessa perspectiva, além das atividades em campo, as assembleias continuaram sendo 
realizadas em São Raimundo Nonato-PI, onde, geralmente, acontecia a apresentação da equipe 
de trabalho, que tiravam as dúvidas dos lagoanos em relação ao relatório técnico e atualizavam 
a respeito dos avanços da comunidade, bem como discutiam o que deveria ser estabelecido no 
cronograma das atividades. Nessas reuniões, foram ressaltadas também o quão eram 
importantes o cadastramento das famílias quilombolas, assim como das que também não se 
enquadravam no perfil. Nas assembleias, após todos as pautas e dúvidas serem sanadas, as atas 
das reuniões eram lidas e assinadas por todos os presentes. 
A partir das oficinas e de um melhor conhecimento a respeito das especificidades de 
cada localidade, foram construídos: linhas do tempo, mapas que tratavam sobre os limites do 
território, dos pontos específicos da comunidade, dos conflitos, dos modos de uso em relação a 
moraria, plantação, dentre outros. Nesse sentido, foram produzidas imagens, tabelas, gráficos, 
assim como também foram armazenadas fotos e documentos que revelavam a historicidade da 
comunidade e a sua relação com as terras. Sendo assim, as oficinas tiveram um papel importante 
para a nova organização da comunidade, pois as entrevistas, a marcação dos pontos notáveis, a 
exemplo dos limites, as caminhadas transversais e o cadastramento das famílias, só foram 
possíveis porque a comunidade trabalhou em conjunto à equipe técnica. 
 
177 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010. 
178 SILVA, Simone Rezende da. A trajetória do negro no Brasil e a territorialização quilombola. Revista Nera 
– ano 14, Nº. 19, 2011, p. 76. 
179 Idem, p. 77. 
75 
 
Após o colhimento de boa parte dessas informações, a retomada dos trabalhos pelo 
INCRA ocorreu no dia 27 de maio de 2009, sendo dada a devida publicidade ao reinício das 
atividades através da Audiência Pública realizada na Câmara Municipal, na sede do município 
de São Raimundo Nonato-PI, que contou com a presença de inúmeras lideranças, tais como: 
Coordenadora Nacional do Serviço de Regularização de Território Quilombola, 
Superintendente Regional SR do INCRA, Delegado do MDA, Coordenadores da Cáritas, 
Projeto Dom Helder, Lideranças da CECOQ, proprietários interessados, representantes da 
comunidade Lagoas, Presidente da Câmara dos Vereadores de São Raimundo Nonato, além de 
parte da equipe técnica. 
Como os procedimentos administrativos tiveram início sob a luz da Instrução 
Normativa no. 49, de 29 de setembro de 2008, o início dos trabalhos em campo foram precedidos 
por algumas reuniões entre os povos das localidades e o Grupo Técnico interdisciplinar, estas 
ocorreram nos dias 25/06/2009 (em São Victor e Angical) e 29/06/2009 (em Lagoa das Emas e 
Lagoa da Pedra), visando apresentar os procedimentos a serem adotados na territorialização da 
comunidade. Entre os dias 22 de junho e 09 de julho de 2009, ocorreram reuniões em várias 
localidades, no qual as famílias do território quilombola indicaram as lideranças que iriam 
acompanhar a equipe Institucional do INCRA, na indicação dos pontos limites do território, de 
acordo com marcos históricos e geográficos apresentados por estes representantes, que 
posteriormente seriam georreferenciados e materializados em formato de mapas e tabelas, pela 
equipe Institucional do INCRA. 
O desenvolvimento de critérios de entendimento dos termos e conceitos repassados 
pela comunidade à equipe técnica, visando promover a um correto entendimento da 
questão territorial transmitida, passou pela realização de várias reuniões onde pôde-se 
captar o sentimento do grupo, referente aos aspectos norteadores do que representava 
para eles “a definição de território”. A construção desse entendimento ocorreu 
concomitante aos apontamentos feitos pelo grupo para aquilo que eles entendiam por 
território. Definições como “limite de respeito”, dentre outros, promoveram o desafio 
de traduzir o saber local para os saberes necessários à produção do presente 
relatório.180 
Os representantes da comunidade que acompanharam os trabalhos de indicação e 
levantamento dos pontos limites em campo foram: Belmiro Ferreira dos Santos, Sirgisnando 
dos Santos, Raimundo Pereira Marques, Raimunda Pereira Marques, Nailde Marques dos 
Santos, Andrelino Alves de Miranda, Cláudio Teófilo Marques, Martins Magalhães de Araújo, 
João Batista Ferreira de Aragão, Jovita Teófilo Marques, Júlio Paes Landim, Raimundo Ferreira 
dos Santos e Manoel Sindaux. Em virtude das grandes dimensões espaciais, foram realizados 
 
180 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010. p. 14. 
76 
 
momentos juntos com as lideranças representantes do quilombo para materialização dos pontos 
pleiteados, objetivando a confecção da planta do território, para posterior delimitação, como 
podemos visualizar na Imagem 2. 
Imagem 2: Reuniões de definição e aprovação dos limites do território pleiteado e identificado pelas famílias do 
quilombo Lagoas. 
 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
Na reunião ilustrada, temos o momento em que alguns representantes quilombolas, 
juntamente com alguns técnicos do INCRA, estiveram aprovando os limites do território que 
foram identificados pela comunidade Lagoas-PI. Nesse sentido, a organização da comunidade 
em doze (12) núcleos populacionais, motivada pelo tamanho da comunidade, foi essencial no 
que diz respeito as relações com os convênios estabelecidos. O contato que a equipe técnica 
estabelecia com a comunidade possuía um aspecto importante a considerar, que são as incursões 
acontecidas dentro do território, no qual existia uma eficácia nas visitas às localidades, 
realizadas pela equipe técnica e as lideranças quilombolas, que eram expressadas nas relações 
simbólicas, políticas e sociais. 
No levantamento fundiário do território, houve a descrição que identificou alguns 
ocupantes que não são quilombolas, no qual é apresentado a descriçãodas áreas por eles 
 
 
 
 
 
 
 
77 
 
ocupadas, com a respectiva extensão, as datas dessas ocupações e as benfeitorias existentes. 
Além disso, conta também a descrição das áreas pertencentes a quilombolas, que têm título de 
propriedade. Fazendo parte da construção do território, foi produzido a planta e o memorial que 
descrevem o perímetro da área reivindicada pela comunidade. A reconstituição e o 
levantamento da malha fundiária em campo e cartório, de certo modo, concretizou o 
levantamento dos pontos limites pleiteado pelas famílias do território quilombola Lagoas, bem 
como identificou o reconhecimento do seu perímetro e de estudos técnicos sócio-histórico-
antropológicos, no qual procedeu-se o levantamento da malha fundiária de todas as áreas 
inseridas internamente no território quilombola. 
A metodologia empregada no levantamento fundiário, foi de caráter investigativo 
executada pelo Engenheiro Agrimensor do INTERPI (Instituto de Terras do Piauí), Edvaldo 
Henrique Ferreira Soares, através de 3 (três) incursões no campo, na qual totalizou 67 dias 
(11/11 a 06/12/2009; 07/04 a 04/05/2010 e 11/05 a 22/05/2010). 
Os trabalhos de levantamento se iniciaram com a realização de pesquisas junto ao 
cartório de 1o Ofício da Comarca de São Raimundo Nonato-PI. Durante o período de 
11/11 a 06/12 de 2009 foram empreendidas várias buscas nos Processos de Autos de 
Demarcação das Datas: São Victor, Serra Velha, Dois irmãos, Conceição, Barrinha, 
porções de terra que estão inseridas totalmente e/ou parcialmente no quilombo 
pleiteado de Lagoas. Buscou-se também os processos das Datas de Sítio da Aldeia e 
Fazenda Nova, porém tanto no Cartório quanto no Fórum da comarca de São 
Raimundo não foi encontrado em seus arquivos os referidos processos.181 
Nesse sentido, foi necessário que se efetivasse a reconstituição de todos os imóveis 
originais da época da demarcação utilizando o software MicroStation Manager, inseridos 
integralmente na Data São Victor e parcialmente nas Datas: Serra Velha, Dois irmãos, 
Conceição, Barrinha. Tal reconstituição teve como base o levantamento de informações de 
documentos da época da demarcação das referidas Datas, principalmente extraídas das folhas 
de pagamentos, do memorial descritivo dos imóveis pertencentes aos primeiros condôminos, 
bem como do levantamento de informações junto aos remanescentes quilombolas, amarração e 
georreferenciamento de marcos geodésicos em campo, com o uso de GPS geodésico. 
Em relação a utilização do georreferenciamento na comunidade quilombola Lagoas, o 
aparelho contribuiu para estabelecer com mais precisão as coordenadas dos limites da 
comunidade, isto é, o GPS georreferenciou a comunidade ao definir melhor a sua forma, 
dimensão e localização, que se deram a partir de métodos de levantamento topográfico. Da 
 
181 Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de Lagoas, 
2010, p. 15. 
78 
 
mesma forma que aconteceu na comunidade Lagoas, a utilização do georreferenciamento 
acontece em outras comunidades, como no caso da Comunidade Quilombola do Abacatal, no 
Município de Marituba – PA, no qual as “[...] atividades de georreferenciamento se deram 
através do levantamento Relativo Estático com GPS Geodésico realizado pelos alunos do Curso 
de Tecnologia em Geoprocessamento da UFPA em parceria com o ITERPA”.182 
Para a realização desse levantamento foram utilizados receptores de medição extra com 
a finalidade de ter mais precisão no estabelecimento dos limites. Nesse sentido, consta-se que 
os receptores do GPS de navegação possuem avançadas tecnologias proporcionando um erro 
médio em torno de 3 metros.183 Desse modo, conhecido todos os proprietários iniciais, que 
estavam inseridos no território pleiteado, bem como a extensão de seus respectivos imóveis, 
procederam-se buscas e levantamento da cadeia dominial destes em cartório, partindo-se da 
origem, ou seja, do desmembramento do público para o privado até os dias atuais, chegando-se 
assim a identificar todos os legítimos proprietários que atualmente estão inseridos dentro de tais 
imóveis, como podemos observar na imagem 3. 
Imagem 3: Levantamento dos marcos geodésicos limitantes da Datas de Sesmarias para reconstituição da malha 
fundiária do Território do quilombola de Lagoas. 
 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
 
182 E. Leal, C. Costa, H. Siqueira. O georreferenciamento como ferramenta de acesso, garantia e regularização 
de territórios historicamente reconhecidos. Comissão V - Gestão Territorial e Cadastro Técnico Multifinalitário, 
2018, p. 02. 
183 FILHO, Luiz Otávio Morais [et al.], 2014. Curso de capacitação para o Cadastro Ambiental Rural 
(CapCAR): noções de geotecnologias – Lavras: UFLA. 36 p.; il. 
 
79 
 
Além do conhecimento de todos os possíveis proprietários, os técnicos do INCRA 
realizaram também o levantamento de toda a malha fundiária do território pleiteado e, 
consequentemente, identificaram os proprietários ou posseiros, sejam eles quilombolas ou não 
quilombolas que seriam notificados para eventuais trabalhos em seus imóveis, bem como a 
viabilização da publicidade das ações a todos os interessados, possibilitando futuramente a 
ampla defesa de seus interesses e possíveis contestações, caso julguem necessário. Nesse 
sentido, o levantamento e buscas dos registros de matrículas dos proprietários, inseridos dentro 
do perímetro do território quilombola, foram realizados no cartório de 1o Ofício da comarca de 
São Raimundo Nonato-PI.184 Tais informações passaram a orientar a emissão de certidões que 
qualificaram a situação da malha fundiária das propriedades inseridas integralmente e/ou 
parcialmente no território quilombola de Lagoas. 
Nesse contexto, foi importante o conhecimento de todos os proprietários e posseiros 
inseridos no perímetro do território quilombola, visto que o início dos trabalhos de campo, 
principalmente a vistoria prévia para levantamento de benfeitorias, era orientado que houvesse 
uma comunicação prévia a eventuais proprietários ou ocupantes de terras localizadas na área 
pleiteada, com antecedência mínima de 3 (três) dias úteis. Nesse sentido, para a confecção da 
planta e do memorial descritivo da área reivindicada, bem como o mapeamento e indicação dos 
imóveis e ocupações lindeiras de todo o seu entorno, foram implementadas atividades de campo 
durante os períodos de 07/06 a 18/06/2010 e 07/07 a 21/07/2010 pelos profissionais: Deodato 
do Nascimento Aquino (Engenheiro Agrônomo) e Edvaldo Henrique Ferreira Soares 
(Engenheiro Agrimensor do INTERPI) objetivando a identificação in loco dos eventuais 
posseiros/proprietários localizados no entorno do território pleiteado/identificado. 
Desse modo, foram realizadas visitas em todas as residências pertencentes aos 119 
aglomerados populacionais inseridos dentro do perímetro do território quilombola Lagoas. Na 
ocasião, foi efetivado o cadastramento das famílias remanescentes quilombolas utilizando 
formulários específicos do INCRA. Ademais, a fim de garantir a localização exata de todas as 
residências das famílias dos remanescentes quilombolas cadastrados, georreferencioram todas 
as casas com a finalidade de assegurar o registro do posicionamento geográfico e da distribuição 
espacial dos domicílios cadastrados. Salienta-se ainda, que tais cadastros contemplaram 
informações acerca da situação populacional, organizacional, econômica, social da população 
 
184 Pela servidora Maria Marlene de Melo Furtado (Técnica em Cadastro Rural INCRA) nos períodos de: (09 de 
novembro a 06 de dezembro de 2009; 07 de abril a 26 de maio de 2010 e 07 a 18 de junhode 2010, totalizando-se 
88,5 dias). Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território 
quilombola de Lagoas, 2010. 
80 
 
residente nas localidades pertencentes ao território de Lagoas, sempre levando em consideração 
a noção de territorialidade da própria comunidade. Considerando as relações de parcerias já 
estabelecidas no âmbito de Acordo de Cooperação Técnica INCRA/INTERPI, os trabalhos de 
preenchimento dos cadastros foram operacionalizados por equipe técnica multidisciplinar.185 
Imagem 4: Cadastramento das famílias remanescentes do quilombo Lagoas, usando-se formulários específicos do 
INCRA. 
 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
Na imagem 4, podemos ver a atuação destes profissionais no acompanhamento dos 
preenchimentos dos formulários, juntos das lideranças quilombolas locais e representantes da 
CECOQ (Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Piauí). Sendo assim, foi 
garantida a participação dos representantes das comunidades em todas as fases administrativas 
do processo, em consonância com Art. 6º do Decreto Presidencial nº 4887, de 20 de novembro 
de 2003. Além disso, pensou-se também a respeito do laudo agroambiental do território. Nesse 
 
185 Composta pelos seguintes servidores: Alan Feitosa Pinho (Técnico Administrativo INCRA), Francisca Maria 
Noleto Batista Ramos (Téc. Nível médio – INTERPI), Lacy Lourdes de Assunção Sobrinha (Assistente de 
Administração INCRA), Maria Marlene de Melo Furtado (Técnica em Cadastro Rural INCRA), Raimundo Nonato 
da Silva Amorim (Assistente de Administração INCRA) e Valdeci de Moraes Uchôa (Assistente de Serviço – 
INTERPI). Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território 
quilombola de Lagoas, 2010. 
 
81 
 
sentido, os trabalhos de campo objetivando o levantamento das informações agronômicas, 
ambientais, ecológicas, e geográficas, obtidas em campo e junto a instituições públicas, foram 
executados pelo Perito Federal Agrário, Deodato do Nascimento Aquino, tendo início no dia 
22 de junho de 2009, se estendendo em vários períodos intermitentes até meados do mês de 
junho de 2010. 
Tais informações subsidiaram a elaboração do RTID (Relatório Técnico de 
Identificação e Delimitação) do Território pleiteado pelas famílias de Lagoas, identificado e 
referendado pelo laudo técnico-científico antropológico. Os estudos efetuados dentro do 
perímetro do território pleiteado/identificado foram sempre acompanhados por representantes 
indicados pelas famílias de remanescentes quilombolas. Portanto, tiveram efetiva participação 
junto ao técnico do INCRA os senhores: Belmiro Ferreira dos Santos, Raimundo Pereira 
Marques, Andrelino Alves de Miranda, Cláudio Teófilo Marques, Martins Magalhães de 
Araújo, João Batista Ferreira. 
É importante ressaltarmos o que é o SIG, no qual se caracteriza por ser uma ferramenta 
computacional que se encontra extensamente difundida nas diversas áreas. O SIG é um 
aplicativo capaz de relacionar dados tabulares a entidades geométricas vetoriais (pontos, linhas 
e superfície) ou imagens (raster). Esses dados são trabalhados a partir de camadas de 
informações e disponibilizados sob forma de mapas georreferenciados.186 Segundo Ferreira 
(1997), o Sistema de Informações Geográficas vêm sendo considerado uma ferramenta 
essencial no processo de mapear e descrever os mecanismos de mudanças que operam no meio 
ambiente, além de indicar respostas às várias questões sobre planejamentos urbanos, meio rural, 
regional e levantamento dos recursos renováveis.187 
Todavia, essa não foi a única maneira de se conhecer o território. Sabendo que existia 
uma complexa rede de terras e de grupos de famílias para que se fosse possível identificar a 
área da comunidade como território claramente delimitado e conhecido. Com a elaboração de 
tabelas, gráficos e mapas, a comunidade passou a ter uma percepção jurídica a respeito do que 
está envolto ao território (número de pessoas, animais, plantas e etc.). Sendo assim, diante do 
conjunto de informações que os líderes quilombolas levantaram, juntamente com a equipe 
técnica, entendo que todas essas informações constituíram o processo inicial de domínio e 
construção do território Lagoas. É partindo desses conhecimentos que foram armazenados, que 
 
186 ALMEIDA, C. N. Modelagem integrada de recursos hídricos com apoio de um Sistema de Informações 
Geográficas. 2006. 125p. Tese (Doutorado em Hidráulica e Saneamento), Universidade de São Paulo, Escola de 
Engenharia de São Carlos. São Carlos, 2006. 
187 FERREIRA, C. C. M. Zoneamento agroclimático para implantação de sistemas agroflorestais com 
eucaliptos, em Minas Gerais. Viçosa, MG: Universidade Federal de Viçosa, 1997. 158p. 
82 
 
trataremos no tópico seguinte a respeito das especificidades dos resultados obtidos, de modo 
que discutiremos como a reunião de dados, informações e a materialização, através de mapas, 
gráficos e tabelas, legitimou a construção do território Lagoas. 
2.3 A materialização do quilombo Lagoas: mapas, gráfico e tabelas 
Durante muitos anos, a historiografia brasileira sobre “quilombo” conseguiu narrar 
diversas experiências em que destacavam a memória, a identidade, os conflitos e a importância 
da terra para esses povos. Em contrapartida, ignoravam a historicidade dos territórios 
quilombolas, quer dizer, postergavam os processos históricos relacionados a territorialização 
das comunidades, que, por sua vez, não parecia ter importância enquanto objeto de estudo. No 
entanto, de acordo com Simone da Silva (2011), em todo o “[...] processo atual de 
territorialização das populações rurais negras é necessário empreender o percurso acerca da 
trajetória do negro em nosso país, evidenciando a importância da história do território e da sua 
memória[...]”,188 pois estas são categorias essenciais na luta política dos quilombolas. 
No tópico anterior, no caso do quilombo Lagoas, considerei a preposição de que o 
conhecimento e a produção do território aconteceram simultaneamente ao construírem a noção 
de comunidade e ao estabelecerem os limites do território. Todavia, todo o processo de 
territorialização seria incompleto senão houvesse a reunião de todas as informações que 
passaram a compor o relatório técnico. Nesse sentido, entendemos que a produção do relatório 
técnico é uma forma de materialização do território da comunidade, pois nele estão inseridos 
um conjunto de gráficos, mapas e imagens que são testemunhas concretas “[...] de mentalidades, 
enfeixando elementos referentes ao imaginário e a cultura em seu caráter administrativo, 
político e estratégico”.189 
Nessa perspectiva, parto da compreensão de que os mapas são instrumentos utilizados 
para materializar espacialidades, assim como também para transmitir a ideia de veracidade 
sobre conhecimento e territorialização da comunidade Lagoas, isto é, os mapas funcionam 
como “[...] uma construção social, um documento elaborado com determinado objetivo, os 
mapas históricos estão permeados por interesses políticos”.190 Além disso, compreendo também 
que nas tabelas constam importantes elementos significativos para a compreensão do número 
de famílias e como estas se organizam, sendo os mapas e as tabelas instrumentos de 
 
188 SILVA, Simone Rezende da. A trajetória do negro no Brasil e a territorialização quilombola. Revista Nera 
– ano 14, Nº. 19, 2011, p. 76. 
189 VILLA, Carlos Eduardo Valencia. Georreferência de mapas históricos: os casos de Cartagena de Índias 
Colonial e do Rio de Janeiro Imperial. Revista de história, Juiz de Fora, v. 21, n. 2, p. 2015, p. 518. 
190 Idem, p. 519. 
83materialização e dominação do território quilombola Lagoas. Nesse sentido, o perímetro do 
território pleiteado pelas famílias quilombolas, construído a partir de indicações de marcas 
indentitárias, pelas lideranças das comunidades, referendados posteriormente em assembleia 
geral por grande parte das famílias quilombolas, foram materializados. 
Mapa 2: Mapa do Território pleiteado pelas famílias remanescentes quilombolas de Lagoas. 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
No mapa 2, podemos observar que o território Lagoas está inserido em jurisprudência 
de seis municípios do Estado do Piauí, sendo eles: São Raimundo Nonato, Fartura, Várzea 
Branca, São Lourenço, Bonfim e Dirceu Arcoverde; cujo apresenta uma área aproximadamente 
de sessenta mil e novecentos e dezessete hectares (60.917), que foram identificados a partir de 
pontos referenciais apontados pelos quilombolas, distanciando em média a cada três a cinco 
quilômetros um do outro, o que não representou fidedignamente os limites variantes do 
território demarcado, pois a delimitação abarcou variações das propriedades lindeiras e de 
registros de imóveis inseridos no território. 
Ainda sobre as identificações, uma pequena quantidade dos agricultores da comunidade 
Lagoas não possuem terras próprias para moradia e trabalho, onde muitos utilizam as áreas 
pertencentes a familiares ou oriundas de herança (sem ser inventariada), o que as vezes dificulta 
às atividades agrícolas destinadas a subsistência. Apesar de alguns moradores descreverem 
84 
 
como adquiriram as terras – a exemplo do quilombola Raimundo Marques que relatou: “[...] 
em mil novecentos e cinquenta e três (1953), meu pai falou com o demarcador que queria uma 
terra e ele passou essa pra ele, foi pagando de pouquinho” –,191 a antropóloga Simone Matos 
(2013), em uma conversa com alguns moradores da localidade “Baixão do Boi”, afirmou que 
alguns conflitos foram gerados a partir da não regularização do território. 
[...] tomei conhecimento de que o pai de D. Cida, irmão do esposo de D. Juliêta da 
localidade Retiro, adquiriu por compra 20 ha de terra, onde fixou residência. O diálogo 
entre D. Cida e um agregado de uma fazenda próxima a essa localidade, relata 
conflitos vivenciados, atualmente, entre ele e o dono da fazenda: após vinte anos 
vivendo na localidade Barreiro dos Porcos, este agregado (Sr. Gildo) está sendo 
forçado a sair, sem definição de acordos trabalhistas pelo tempo de trabalho. Segundo 
ele: “nem uma madeira ele deixa eu tirar; quando quero fazer uma roça, venho pegar 
aqui no Baixão do Boi ou comprar”. Ele diz que o dito fazendeiro tenciona cercar 
terras próximas à localidade Baixão do Boi.192 
Nesse caso, podemos compreender que a comunidade Lagoas, por ser um quilombo 
contemporâneo, está envolta a conflitos que ainda são reflexos “[...] da dissolução das formas 
de organização do sistema escravista pós abolição”,193 se configurando como a continuidade 
das disputas de territorialidades que “[...] nascem da sobreposição, no mesmo recorte espacial, 
de reivindicações de diversos grupos, portadores de distintas identidades, lógicas culturais, 
modos de produção e de relacionamentos com o meio-ambiente”.194 Nesse sentido, considero 
que o levantamento de toda a malha fundiária do território e, consequentemente, dos 
proprietários ou posseiros, sejam eles quilombolas ou não quilombolas, possibilitou a 
comunidade a agir em ampla defesa dos seus interesses e contestações. 
No caso da comunidade Lagoas, podemos compreender que o mapa, enquanto uma 
ferramenta, possibilitou condições concretas para os lagoanos visualizarem de forma 
representativa o que estava acontecendo no território, no que diz respeito a delimitação ter 
abarcado algumas propriedades lindeiras. Ainda nesse sentido, o mapa ampliou informações 
importantes acerca dos pontos geográficos indicados pelos lagoanos, o que evidencia a 
participação desses povos no processo de reconhecimento e delimitação da comunidade. Nessa 
perspectiva, o antropólogo Rafael dos Santos (2004) considera que “[...] o conjunto de 
documentos cartográficos possuem informações importantes, principalmente sobre o 
 
191 Entrevista concedida a Simone de Oliveira Matos em 29 de jul. de 2009 e 07 de jan. de 2012. Comunicação 
oral R Marques, 86 anos – Lagoa das Emas). 
192 MATOS, Simone de Oliveira. Povos de Lagoas-PI na construção da territorialidade quilombola: uma 
etnografia. (Dissertação em Antropologia). Teresina (PI), 2013, p. 54. 
193 ARRUTI, J. M. Mocambo: antropologia e história no processo de formação quilombola. Bauru: Edusc, 2006. 
p. 42. 
194 ZHOURI, A.; LASCHEFSKI, K. Conflitos ambientais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010, p. 12. 
85 
 
reconhecimento, a delimitação e a demarcação que contribuem na titulação dos seus 
territórios”.195 
Gráfico 1: Composição percentual do Território quilombola de Lagoas. 
 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
 De forma mais detalhada, o gráfico apresenta a composição percentual da área total do 
quilombo Lagoas, sendo, aproximadamente, 25.184,85 hectares (41,34%) correspondentes a 
jurisprudência do município de São Raimundo Nonato, 13.835,86 hectares (22,71%) no 
município de Fartura, 11.195,81 hectares (18,38%) inseridos em Várzea Branca, 7.123,39 
hectares (12, 84%) correspondentes a São Lourenço, 2.232,188 hectares (3,10%) no município 
de Dirceu e apenas 994,2045 hectares (1,63%) correspondentes a Bonfim. Embora o território 
distribua a comunidade em seis municípios, e cada um desses tenham características 
específicas, unidades sociais independentes e distribuições geográficas diferentes, ressalto que 
as experiências históricas relacionadas a natureza étnica, as relações de parentesco e as 
sociabilidades realizadas os agregam nesse território comum. 
Além disso, essas relações contribuem ao auxiliarem “[...] os programas em 
desenvolvimento ligados à Presidência da República, ao INCRA, ao Ministério da Justiça, à 
 
195ANJOS, Rafael Sanzio Araújo dos. Cartografia e cultura: territórios dos remanescentes de quilombos no 
brasil. VIII congresso luso-brasileiro de ciências sociais, Coimbra, 2004, p. 12. 
 
41 , 34 
84 , 12 
10 , 3 
63 , 1 
, 38 18 
, 22 71 
São Raimundo 
São Lourenço 
Dirceu 
Bonfim 
Várzea Branca 
Fartura 
86 
 
Fundação Cultural Palmares e aos vários Institutos de Terras dos Estados brasileiros”,196 no que 
diz respeito a implementação de programas específicos para a comunidade em seus respectivos 
municípios. Nessa perspectiva, o cadastramento das famílias do território quilombola também 
foi importante, pois expressa, de maneira simplificada e sistematizada, a situação 
socioeconômica das famílias pertencente à comunidade. 
Tabela 1: Distribuição do número de famílias, pessoas e comunidades cadastradas nos 12 (doze) núcleos 
populacionais. 
Núcleos Famílias Pessoas Comunidades 
1-NÚCLEO SÃO VICTOR 300 990 19 
2- NÚCLEO XIQUE-XIQUE 65 223 9 
3- NÚCLEO LAGOA DOS MENINOS 168 543 12 
4- NÚCLEO LAGOA DAS PEDRAS 185 683 12 
5- NÚCLEO DO ANGICAL 134 458 13 
6- NÚCLEO FAZENDA DO MEIO 57 222 3 
7- NÚCLEO LAGOA DAS EMAS 206 749 14 
8- NÚCLEO DE MONTES CLAROS 64 151 9 
9- NÚCLEO DE UMBURANA 43 148 4 
10- NÚCLEO DO ESPINHEIRO 117 391 10 
11- NÚCLEO DA LAGOA NOVA 93 360 6 
12- NÚCLEO LAGOA DA FIRMEZA 66 210 8 
TOTAL 1.498 5.128 119 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
De acordo com a tabela 1, verifica-se que o núcleo de São Victor apresenta o maior 
número de famílias, pessoas e comunidades, sendo cadastradas 300 (trezentas) famílias comaproximadamente 990 (novecentos e noventa) pessoas em 19 (dezenove) comunidades, 
totalizando assim 20% das 1.498 (um mil quatrocentos e noventa e oito) famílias cadastradas 
no quilombo Lagoas. Em seguida vêm-se o núcleo de Emas com 206 (duzentos e seis) famílias 
com aproximadamente 749 (setecentos e quarenta e nove) pessoas em 14 (quatorze) 
comunidades. Foram consideradas como unidades familiares as pessoas ligadas por laços de 
parentescos, dependência doméstica ou normas de convivência. Em alguns casos, com o 
objetivo de restringir o conceito de família aos laços consanguíneos, foi adotado como unidades 
familiares os casais sem filhos, casais com filhos e mulher chefe de família (sem cônjuge). 
Nesse cadastramento, as informações sobre cada pessoa na família, ou domicílio, foram 
obtidas através da autodeclaração associada à pessoa de referência, isto é, a pessoa responsável 
pela família ou assim considerada pelos demais membros. Considerando essas informações, 
podemos compreender que o maior agrupamento de famílias se encontra no núcleo de São 
 
196 ANJOS, Rafael Sanzio Araújo dos. Cartografia e cultura: territórios dos remanescentes de quilombos no 
brasil. VIII congresso luso-brasileiro de ciências sociais, Coimbra, 2004, p. 12. 
87 
 
Victor, principalmente na sede da localidade, pois possuem relações históricas no que se refere 
a serem áreas de cultivo que se deram através de processos hereditários, pois há tempos 
longínquos esta localidade era a sede de uma antiga fazenda escravocrata, constituída pela casa 
grande e a senzala. 
Em compressões gerais, apesar de ser consenso à auto atribuição da comunidade como 
remanescente de quilombo, verifica-se que não existia uma associação jurídica formal que 
representasse e contemplasse todas as famílias quilombolas das localidades, logo no que se 
refere ao aspecto associativista, a comunidade ainda se encontrava como incipiente à 
organização, existindo algumas associações de famílias quilombolas – a exemplo da associação 
dos pequenos produtores rurais de São Victor, Lagoa das Emas, Angical, Jatobazeiro e Lagoa 
da Pedra –, onde a representação é bem localizada, muitas vezes representativa de poucas 
localidades. 
Tabela 2: Número de chefe de famílias sócio efetivo em Associação inserida no Território quilombola de Lagoas. 
NÚMERO DE CHEFE DE FAMÍLIAS 
1- NÚCLEO SÃO VICTOR 
2- NÚCLEO XIQUE-XIQUE 
3- NÚCLEO L. DOS MENINOS 
4- NÚCLEO L. DAS PEDRAS 
5- NÚCLEO DO ANGICAL 
6- NÚCLEO FAZ. DO MEIO 
7- NÚCLEO L. DAS EMAS 
8- NÚCLEO DE MONTES CLAROS 
9- NÚCLEO DE UMBURANA 
10- NÚCLEO DO ESPINHEIRO 
11- NÚCLEO DA L. NOVA 
12- NÚCLEO L. DA FIRMEZA 
 ASSOCIAÇÃO 
SIM NÃO 
172 
27 
71 
87 
59 
35 
70 
16 
12 
49 
16 
29 
128 
38 
97 
98 
75 
22 
136 
48 
31 
68 
77 
37 
 TOTAL 643 855 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
Nesse sentido, a partir da análise da tabela 2, podemos observar que a comunidade 
possui uma fragilidade no que diz respeito a não possuírem uma organização social mais sólida, 
pois a maioria dos representantes (chefes de família) ainda não participam da associação, sendo 
de aproximadamente 855 chefes de famílias, representando assim 57% de todas as famílias 
inseridas no território quilombola de Lagoas. Essa situação se torna preocupante visto que se 
regularizado o título do território, este será emitido em nome de uma associação, logo, 
teoricamente, quem não é sócio, possivelmente, fica mais fragilizados diante da lei, mesmo 
todas as famílias quilombolas sendo proprietárias do território. 
88 
 
A fragilidade está totalmente relacionada à agricultura de subsistência e a pecuária 
extensiva desenvolvidas na localidade, pois se constituem de práticas estritamente familiar, 
destacando na criação de ovinos, caprinos e na apicultura, bem como a partir da produção de 
milho, feijão, mandioca e mamona, sendo estes os que representam a principal fonte de renda 
e subsistência dos quilombolas. O grande problema, é que muitos quilombolas não possuem a 
noção exata do quanto corresponde a sua renda real. Desse modo, não levam em conta o que 
produzem, consomem e arrecadam na atividade agropecuária, dados que contribuem para 
estimação da renda real. 
Tabela 3: Percentual da renda da população pertencente à comunidade Quilombola de Lagoas 
NÚMERO DE FAMÍLIAS 
1-NÚCLEO SÃO VICTOR 
2-NÚCLEO XIQUE-XIQUE 
3-NÚCLEO L. DOS MENINOS 
4-NÚCLEO L. DAS PEDRAS 
5-NÚCLEO DO ANGICAL 
6-NÚCLEO FAZ. DO MEIO 
7-NÚCLEO L. DAS EMAS 
8-NÚCLEO DE MONTES 
CLAROS 
9-NÚCLEO DE UMBURANA 
10-NÚCLEO DO ESPINHEIRO 
11-NÚCLEO DA L. NOVA 
12-NÚCLEO L. DA FIRMEZA 
 RENDA FAMILIAR INTRA 
NÚCLEO (%) 
 
0 - 50 51-150 151 – 510 511 – 1020 > 1020 
4,7 
1,5 
3,0 
4,3 
2,2 
0,0 
5,3 
1,6 
2,5 
0,0 
2,2 
12,1 
43,7 
53,8 
53,0 
53,5 
56,0 
50,9 
57,8 
53,1 
47,5 
42,7 
54,8 
45,5 
25,7 
23,1 
16,7 
20,5 
21,6 
21,1 
22,8 
25,0 
35,0 
30,8 
32,3 
22,7 
23,3 
21,5 
20,8 
15,1 
18,7 
21,1 
12,1 
15,6 
15,0 
23,9 
9,7 
18,2 
2 , 7 
0 , 0 
6 , 5 
6 , 5 
1 , 5 
7 , 0 
1 , 9 
4 , 7 
0 , 0 
2 , 6 
1 , 1 
1 , 5 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010. 
Desta maneira, observa-se na tabela 3, que a grande maioria da população de todos os 
núcleos populacionais do território quilombola Lagoas, sem exceção, possuem a maior renda 
mensal oscilando entre 51 e 150 reais, sendo esta a faixa que contempla os beneficiários do 
programa assistencialista bolsa-família. Ademais, outra grande contribuição na renda local 
familiar provém dos proventos de aposentadoria, renda entre 511 e 1.020 reais. Sendo assim, o 
nível de precariedade é notório, existindo famílias que sobrevivem exclusivamente do auxílio 
do governo federal. Torna-se importante frisar que, além das fontes acima citadas, todos os 
remanescentes quilombolas entrevistados dependem diretamente da exploração de gêneros 
alimentícios de subsistência e da criação de pequenos animais domésticos. 
Outro fator importante, das localidades situadas no território da Comunidade Lagoas, 
muitas contam com unidades escolares, porém apenas o núcleo de São Victor apresenta escola 
que dispõe de ensino médio. Desta forma os alunos que pretendem avançar nos estudos têm que 
se deslocarem principalmente à sede municipal de Fartura e Várzea Branca. Da população 
89 
 
pesquisada, constata-se que os núcleos de Lagoa da Pedra e Lagoa das Emas apresentam em 
termos proporcionais à maior população de analfabetos funcionais, representando 39,1% e 
37,4% respectivamente, de toda população cadastrada em seus respectivos núcleos, como 
consta na tabela 4. 
Tabela 4: Escolaridade da população pertencente à comunidade Quilombola de Lagoas. 
POPULAÇÃO DO QUILOMBO 
LAGOAS 
1-NÚCLEO SÃO VICTOR 
2- NÚCLEO XIQUE-XIQUE 
3- NÚCLEO L. DOS MENINOS 
4- NÚCLEO L. DAS PEDRAS 
5- NÚCLEO DO ANGICAL 
6- NÚCLEO FAZ. DO MEIO 
7- NÚCLEO L. DAS EMAS 
8- NÚCLEO DE MONTES CLAROS 
9- NÚCLEO DE UMBURANA 
10- NÚCLEO DO ESPINHEIRO 
11- NÚCLEO DA L. NOVA 
12- NÚCLEO L. DA FIRMEZA 
 ESCOLARIDADE INTER NÚCLEO (%) 
Analfabeto Ensino Fundamental Ensino médio Superior 
33,2 
11,8 
24,1 
39,1 
30,5 
28,6 
37,4 
26,7 
9,2 
19,8 
33,7 
33,1 
50,5 
76,9 
67,9 
54,1 
64,5 
61,2 
56,2 
63,6 
74,6 
65,3 
56,1 
52,0 
15,1 
11,3 
6,8 
6,6 
4,8 
8,3 
5,9 
9,1 
13,8 
13,6 
9,8 
13,7 
1 , 3 
0 , 0 
1 , 2 
0 , 2 
0 , 3 
1 , 9 
0 , 5 
0 , 6 
2 , 3 
1 , 4 
0 , 3 
1 , 1 
Fonte: Relatório técnico de caracterização ocupacional, fundiário e agroambiental do território quilombola de 
Lagoas, 2010Como podemos observar, a maior proporção da população de todos os núcleos ainda 
não concluiu o ensino fundamental, estando no nível de escolaridade entre a 1ª e 8ª série, 
destacando o núcleo de Xique-Xique com 76,9% de toda a população. Porém, deste total há um 
grande contingente representado principalmente por jovens e adultos que já abandonaram os 
estudos, principalmente para constituir família e pelas dificuldades de acesso decorrente da falta 
de escola dentro da comunidade. Verifica-se na tabela 4, que apenas 2,3% da população do 
núcleo de Umburana frequenta o curso superior, sendo esta a maior proporção quando 
comparado com os outros núcleos populacionais. 
Acerca de informações gerais, além dessas famílias cadastradas, distribuídas em todos 
os 12 (doze) núcleos, acrescentam-se mais 152 (cento e cinquenta e duas) residências que não 
foram efetivamente cadastradas, pois se tratavam, na grande maioria, de residências fechadas 
ou desocupadas, decorrente do êxodo temporário de algumas famílias, que partiram para outros 
estados em busca de trabalho nos canaviais de São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso ou 
viajaram com o intuito de realizar tratamentos médicos. Assim como na comunidade Lagoas, 
esse êxodo temporário também ocorre em outros quilombos. De acordo com a historiadora 
Simoní Leal (2020), o quilombo “Contente”, localizado no município de Paulistana-PI, possui 
90 
 
dados que apresentam as principais motivações de migração dos quilombolas, sendo estes: o 
desemprego com 44%, a seca com 35%, a falta de educação com 22%.197 
Um fato em comum no quilombo Lagoas é que depois de atingido a maioridade ou 
concluído o ensino médio, os homens tendem a migrar para outros estados, principalmente 
Brasília, Minas Gerais e São Paulo, essencialmente jovens do sexo masculino, em busca de 
trabalho nas usinas de “corte de cana”. Entretanto, quando não saem da comunidade, optam por 
construir suas casas nas proximidades do núcleo familiar, continuando a cultivar nas terras do 
pai, mesmo depois de terem constituído uma nova unidade familiar, engrossando assim a massa 
de cidadãos sem um pedaço de terra suficiente para a garantia de sua reprodução física, social, 
econômica e cultural. É nesse sentido, que no próximo capítulo discutiremos acerca dos 
problemas causados pela não titulação da comunidade e como os lagoanos reivindicam a sua 
existência frente aos conflitos vivenciados. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
197 LEAL, Simoní Portela. “Já conheci com essa nação, o chamado negro”: etnicidade, territorialidade e 
educação nas Comunidades Quilombolas de Barro Vermelho e Contente em Paulistana-PI (2000-2019). 
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Piauí, Programa de Pós Graduação em História, Teresina, 2020. 
91 
 
CAPÍTULO III 
 
 
 
A REIVINDICAÇÃO EXISTENCIAL DA 
COMUNIDADE QUILOMBOLA LAGOAS 
 
 
Do que todas essas comunidades são acusadas? De 
serem povos atrasados, improdutivos e sem cultura, 
portanto, um empecilho ao avanço e ao 
desenvolvimento da integridade moral, social e 
econômica e cultural dos colonizadores. O que 
podemos perceber é que essas comunidades continuam 
sendo atacadas pelos colonizadores que se utilizam de 
armas com poder de destruição ainda mais sofisticado, 
numa correlação de forças perversamente desigual. Só 
que hoje, os colonizadores, ao invés de se 
denominarem Império Ultramarino, denominam a sua 
organização de Estado Democrático de Direito e não 
apenas queimam, mas também inundam, implodem, 
trituram, soterram, reviram com suas máquinas de 
terraplanagem tudo aquilo que é fundamental para a 
existência das nossas comunidades, ou seja, os nossos 
territórios e todos os símbolos e significações dos 
nossos modos de vida.198 
Nêgo Bispo 
 
198 SANTOS, Antônio Bispo dos. Colonização, quilombos: modos e significados. Instituto Nacional de Ciência 
e Tecnologia de Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa. Universidade de Brasília, 2015, p. 76. Disponível em: 
http://cga.libertar.org/wp-content/uploads/2017/07/BISPO-Antonio.-Colonizacao_Quilombos.pdf. Acessado em: 
20 de novembro de 2018. 
http://cga.libertar.org/wp-content/uploads/2017/07/BISPO-Antonio.-Colonizacao_Quilombos.pdf
92 
 
3.1 Conflitos quilombolas: do racismo institucional ao ambiental 
Ao vivenciar e debater, na contemporaneidade, a situação dos quilombos rurais, o 
lavrador e ativista piauiense do movimento social quilombola, Antônio Bispo dos Santos, 
conhecido popularmente como Nêgo Bispo, analisa criticamente os ataques e as consequências 
das políticas desenvolvimentistas no Brasil. Na epígrafe acima, tem-se uma narrativa que 
sucede uma série de tentativas de ecocídios no nosso país,199 que, por sua vez, estão 
relacionadas a grupos rurais, povos indígenas e comunidades quilombolas brasileiras. De 
acordo com Nêgo Bispo, o modelo de desenvolvimento econômico do Brasil representa um 
projeto de sociedade autodestrutiva, no qual as suas medidas resultam em “queimar, inundar, 
implodir, triturar, soterrar e revirar” elementos que são essenciais para a existência desses 
grupos. 
Nessa perspectiva, as acusações sofridas pelos quilombolas acontecem, na maioria dos 
casos, em decorrência das disputas de terras, no qual esses sujeitos enfrentam problemas tanto 
relacionados à demarcação e reconhecimento de seus territórios como em razão das invasões 
acontecidas nestes. A reflexão proposta por Nêgo Bispo, sobre o exercício do poder do Estado, 
tem sido pertinente nas discussões atuais que atravessam a temática quilombola, sobretudo no 
que diz respeito as insinuações sofridas por esses povos, que podem ser observadas, a nível de 
exemplo, nos canais oficiais do Youtube do vigente presidente do Brasil, Jair Messias 
Bolsonaro, e de seu filho, o vereador Carlos Nantes Bolsonaro, que em suas funções 
representativas afirmam a existência de esquemas ilícitos no processo de titulação de algumas 
comunidades quilombolas do Brasil. 
Intitulados de: “A farsa de alguns quilombolas” e “Quilombolas: a verdade que 
omitem”;200 os vídeos compartilham uma matéria feita pelo Jornal Nacional em 2007,201 que 
tratava sobre uma investigação, no Recôncavo Baiano, de uma comunidade que estava prestes 
a ser reconhecida como “remanescente quilombola” e vinha sendo acusada de fraude por 
fazendeiros da região – questão que foi esclarecida pela sindicância da Fundação Palmares, que 
 
199 O conceito de ecocídio está ligado a danificação extensiva ou a destruição de um ou vários ecossistemas num 
determinado território, seja por ação humana ou por outras causas, implicando assim na qualidade de vida dos 
habitantes desse território. Disponível em: < https://eradicatingecocide.com >. Acessado em: 14 de março de 2019. 
Para se aprofundar na discussão conceitual e dos temas relacionados, consultar: Polly HIGGINS, Eradicating 
Ecocide: Law and Governance to Stop the Destruction of the Planet. Shepheard-Walwyn: Londres, 2010. 
200 Respectivamente: Bolsonaro, Carlos Nantes. “A farsa de Alguns quilombolas”. Publicado em 17 de abril de 
2018. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=FAmdjNoWqpk.> Acessado em: 02 de fevereiro de 
2019. Bolsonaro, Jair Messias. “Quilombolas: a verdade que omitem”. Publicado em 15 de abril de 2018. 
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ShinYQp--zA.> Acessado em: 02 de fevereiro de 2019. 
201 Matéria sobre a comunidade quilombola São Francisco do Paraguaçu, uma das 11 comunidades do Recôncavo 
Baiano reconhecidas como remanescentes de quilombos. 
https://eradicatingecocide.com/
https://www.youtube.com/watch?v=FAmdjNoWqpk
https://www.youtube.com/watch?v=ShinYQp--zA
93 
 
confirmou a legalidade dessa comunidade.202 Nesse sentido, compreendo que as afirmações 
contidas nostítulos podem ser entendidas como desdobramentos dos princípios que estão 
relacionados à política de cunho neoliberal, firmadas por esses políticos, que não conseguem 
visualizar um valor utilitário nas comunidades quilombolas, isto é, na visão desses sujeitos as 
comunidades não contribuem em nada para o Estado,203 sendo consideradas “atrasadas, 
improdutivas e sem cultura”, representando “um empecilho ao avanço e ao desenvolvimento 
da integridade moral, social, econômica e cultural dos colonizadores”. 
De acordo com o filósofo francês Jacques Rancière (2005), a centralidade do poder 
estatal, motivada pelas tecnologias de poder, – neste caso os princípios neoliberais – fomenta a 
perpetuação hegemônica de algumas esferas sociais, que, por sua vez, são controladas pelo 
Estado. Na perspectiva do autor, algumas ações institucionais do Estado, a partir das tecnologias 
de poder, objetivam “[...] suplantar as alteridades, identidade étnicas, ou seja, “matar o Outro 
como Outro”,204 quando compreendem este “Outro” como um sujeito subalternizado, a partir 
de algumas diferenças culturais, com a finalidade de anular os seus direitos coletivos partindo 
de diferenciações sociais, culturais e políticas. 
O Estado pode até lhe conferir oportunidade para (re)produção cultural, entretanto, as 
tecnologias de poder os quais o Estado têm se servido, em muitos casos, servindo ao 
propósito de uma “limpeza étnica”, é permeada pelo discurso da participação, da 
oportunidade construída pela lei para se ouvir o outro, espaço para vocalizar seus 
interesses e demandas, mas que instrumentaliza-se como bandeira a fim de que o 
Estado, ao ter conhecimento sobre esse outro, venha exitosamente banir e promover 
formas de “esquecimento” daquelas comunidades tradicionais. 205 
Os mecanismos utilizados pelo Estado tentam impedir, de diferentes formas, a 
inviabilização de conquistas das comunidades quilombolas por estas representarem, na visão 
neoliberal, um “[...] empecilho para o ímpeto capitalista de progresso, modernização e avanço 
 
202 YABETA, Daniela. Um território: São Francisco do Paraguaçu. Boletim Territórios Negros. (v.7, n.30, 
jul./ago. 2007). Disponível em: <http://www.koinonia.org.br/oq/artigos-detalhes.asp?cod=12682>. Acessado em: 
14 de março de 2019. 
203 PORTO, Maria Célia da Silva. Estado e neoliberalismo no Brasil contemporâneo: implicações para as 
políticas sociais. IV Jornada Internacional de Políticas Públicas. Universidade Federal do Maranhão, 2009. 
Disponível em: 
<https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&url=http://ww.joinpp.ufma.br/jornadas/joinppIV/eixos/
1_Mundialização/estado-e-neoliberalismo-no-brasil-
contemporaneo.pdf&ved=2ahUKEwjnmbHNpcXJAhX7ILKGHfHIAKoQFJAAegQIBBAB&usg=AOvVaw263
1XtxcixJReKdo153Kbx>. Acessado em: 20 de julho de 2019. 
204 RANCIÈRE, Jacques. Chroniques des Temps Consensuels. Paris. Ed. du Seuil. 2005, p.15. (Traduzido para 
o português, por José Carlos Macedo, como “Ossuário da purificação étnica” – Folha de São Paulo. 10 de março 
de 1997. 
205 GONÇALVES, Andréa Cristina Serrão. Direitos, embates, lutas e resistências: Comunidades Quilombolas 
face as Ações do Estado Neoliberal. III Jornada Internacional Políticas Públicas, 2015, p. 1. Disponível em: 
http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2015/pdfs/eixo3/direitos-embates-lutas-e-resistencias-comunidades-
quilombolas-face-as-acoes-do-estado-neoliberal.pdf. Acessado em: 22 de maio de 2020. 
http://www.koinonia.org.br/oq/artigos-detalhes.asp?cod=12682
https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&url=http://ww.joinpp.ufma.br/jornadas/joinppIV/eixos/1_Mundialização/estado-e-neoliberalismo-no-brasil-contemporaneo.pdf&ved=2ahUKEwjnmbHNpcXJAhX7ILKGHfHIAKoQFJAAegQIBBAB&usg=AOvVaw2631XtxcixJReKdo153Kbx
https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&url=http://ww.joinpp.ufma.br/jornadas/joinppIV/eixos/1_Mundialização/estado-e-neoliberalismo-no-brasil-contemporaneo.pdf&ved=2ahUKEwjnmbHNpcXJAhX7ILKGHfHIAKoQFJAAegQIBBAB&usg=AOvVaw2631XtxcixJReKdo153Kbx
https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&url=http://ww.joinpp.ufma.br/jornadas/joinppIV/eixos/1_Mundialização/estado-e-neoliberalismo-no-brasil-contemporaneo.pdf&ved=2ahUKEwjnmbHNpcXJAhX7ILKGHfHIAKoQFJAAegQIBBAB&usg=AOvVaw2631XtxcixJReKdo153Kbx
https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&url=http://ww.joinpp.ufma.br/jornadas/joinppIV/eixos/1_Mundialização/estado-e-neoliberalismo-no-brasil-contemporaneo.pdf&ved=2ahUKEwjnmbHNpcXJAhX7ILKGHfHIAKoQFJAAegQIBBAB&usg=AOvVaw2631XtxcixJReKdo153Kbx
http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2015/pdfs/eixo3/direitos-embates-lutas-e-resistencias-comunidades-quilombolas-face-as-acoes-do-estado-neoliberal.pdf
http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2015/pdfs/eixo3/direitos-embates-lutas-e-resistencias-comunidades-quilombolas-face-as-acoes-do-estado-neoliberal.pdf
94 
 
tecnológico em uma estrutura social calcada pelo ideal de lucro que se promove, tão somente, 
pela via da exploração”.206 Desse modo, podemos compreender que a manifestação do 
neoliberalismo, relativo a efetivação de capital nacional e internacional na economia brasileira, 
ocasiona a produção de diversos projetos que visam a implementação destes pautados na 
perspectiva “(neo)desenvolvimentista”, que, por sua vez, provoca conflitos entre o Estado e 
alguns grupos indígenas, camponeses e comunidades quilombolas. 
Na visão de Nêgo Bispo, por exemplo, a não atribuição do título de quilombo às 
comunidades brasileiras abre margem para a exploração e a destruição de alguns territórios, 
“[...] seja pela expansão do agronegócio com monoculturas transgênicas, seja para exploração 
de mineradoras ou construção de megaprojetos desenvolvimentistas, como complexos 
hidroelétricos, construção de portos, rodovias e ferrovias [...]”,207 que, consequentemente, 
provocam conflitos que revelam tanto o racismo ambiental como o institucional ligados ao 
processo de reconhecimento das comunidades quilombolas, o que as afetam existencialmente, 
pois sem a titulação dos seus territórios os quilombolas não conseguem se desenvolverem 
enquanto grupos étnicos. 
Assim como as discussões sobre as comunidades quilombolas se acentuaram na década 
de 1990, a historiadora Lays Silva (2012) coloca que esse período também foi um verdadeiro 
marco no que diz respeito aos debates ambientalistas nas Américas, pois foi a partir da “[...] 
consolidação e extensão de um movimento popular que, desde sua gênese na década de 1970, 
recebeu diversas nomenclaturas, a saber: movimento pela justiça ambiental (environmental 
justice movement); movimento contra o racismo ambiental (environmental racism) e 
movimento pela igualdade ambiental (environmental equity)”,208 que ocorreu a emergência da 
atuação de novos grupos “[...] em resposta às ameaças materializadas por situações desiguais 
de vulnerabilidade”.209 Nesse contexto, as discussões visavam identificar situações de injustiça 
ambiental, com a finalidade de desenvolver projetos voltados para políticas e leis de 
regulamentação ambiental. 
 
206 GONÇALVES, Andréa Cristina Serrão. Direitos, embates, lutas e resistências: Comunidades Quilombolas 
face as Ações do Estado Neoliberal. III Jornada Internacional Políticas Públicas, 2015, p. 2. Disponível em: 
http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2015/pdfs/eixo3/direitos-embates-lutas-e-resistencias-comunidades-
quilombolas-face-as-acoes-do-estado-neoliberal.pdf. Acessado em: 22 de maio de 2020. 
207 SILVA, Liana Amin Lima da; MORAES, Oriel Rodrigues de Moraes. Racismo ambiental, colonialismos e 
necropolítica: direitos territoriais quilombolas subjugados no Brasil. Ensaios sobre racismos: pensamento de 
fronteira. Org. LIMA, Emanuel Fonseca; SANTOS, Fernanda Fernandes dos; NAKASHIMA, Henry Albert 
Yukio; TEDESCHI, Losandro Antonio, 2019, p. 33. 
208 SILVA, Lays Helena Paes e. Ambiente e Justiça: sobre autilidade do conceito de racismo ambiental no 
contexto brasileiro. E-cadernos, n. 17, 2012, p. 85. Disponível em: <http://eces.revues.org/1123>. Acesso em: 28 
maio de 2020. 
209 Idem, p. 86. 
http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2015/pdfs/eixo3/direitos-embates-lutas-e-resistencias-comunidades-quilombolas-face-as-acoes-do-estado-neoliberal.pdf
http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2015/pdfs/eixo3/direitos-embates-lutas-e-resistencias-comunidades-quilombolas-face-as-acoes-do-estado-neoliberal.pdf
95 
 
Denota-se, assim, a existência de situações de injustiça ambiental, o que compreende, 
em sociedades desiguais, os grupos discriminados racialmente e as populações de 
baixa renda, ou seja, grupos vulneráveis e marginalizados que são obrigados a arcar 
com a maior carga dos danos ambientais oriundos do processo de desenvolvimento. 
Logo, a concepção de justiça ambiental seria edificada a partir de experiências das 
lutas protagonizadas por grupos vulneráveis e marginalizados [...].210 
As situações de injustiça ambiental estão amplamente ligadas às noções de racismo 
ambiental e racismo institucional. De acordo com Arivaldo Souza (2015), a desterritorialização 
dos povos negros foi estabelecida como uma prática racista, enquanto padrão de discriminação 
territorial, desde a diáspora africana, isto é, os conflitos ambientais que as comunidades 
quilombolas enfrentam na contemporaneidade são reflexos dessa desterritorialização. Nesse 
sentido, compreendemos que as diversas formas de práticas racistas, a exemplo da “[...] 
expulsão das comunidades quilombolas de seus territórios de vida, com a remoção forçada das 
comunidades e omissão do Estado quanto ao reconhecimento, demarcação e titulação coletiva 
da terra”,211 representa uma das faces do racismo ambiental, que corrobora com os interesses 
neoliberais. 
Desse modo, partindo da compreensão de que muitos conflitos territoriais estão 
relacionados com o exercício do racismo ambiental, podemos considerar que as terras dos povos 
indígenas e quilombolas não sofreram injustiças ambientais decorrentes do acaso, mas são 
afetadas pela exploração predatória neoliberal, quer dizer, o racismo ambiental é “[...] 
institucionalizado com o discurso assimilacionista, afetando o modo de vida tradicional 
indígena, quilombola e de outros povos tradicionais, com a finalidade explícita de esvaziamento 
de suas terras para transformá-las em mercadoria”.212 
Essa forma de classificação social da população com a ideia de raça, como apontou 
Arivaldo Souza (2015), faz parte de uma construção mental que permeia o imaginário da nossa 
sociedade, onde a racialidade aparece como força motriz justificada pela estrutura biológica. 
De acordo com Anibal Quijano (2005), os colonizadores codificaram uma linha de cor e traços 
fenótipos dos colonizados e as assumiram como características emblemáticas à categoria racial. 
Nesse sentido, os territórios quilombolas ainda aparecem inseridos na lógica de um “[...] 
 
210 RANGEL, Tauã Lima Verdan. Racismo ambiental às comunidades quilombolas. Bauru, v. 4, n. 2, p., 2016, 
p. 128. 
211 SILVA, Liana; MORAES, Oriel. Racismo ambiental, colonialismos e necropolítica: direitos territoriais 
quilombolas subjugados no Brasil. Ensaios sobre racismos. 2019, p. 33. 
212 Idem, p. 37. 
96 
 
primeiro espaço-tempo de um padrão de poder na elaboração teórica da ideia de raça para 
naturalizar as relações de dominação e opressão”.213 
Voltando o nosso olhar para as formas práticas de expressão do racismo ambiental, a 
respeito dos casos de injustiça que envolveram comunidades quilombolas no Piauí, constam-se 
dois que representam alguns conflitos no estado. O primeiro caso, encontra-se relacionado à 
implantação do Núcleo de Produção Comunitária Santa Clara, que foi empreendido pela Brasil 
Ecodiesel e atingiu os municípios de Floriano, Canto do Buriti e Eliseu Martins. Em relação a 
empresa, foram conferidas terras cedidas por estes órgãos: Governo do Estado do Piauí, 
Instituto de Terras do Piauí e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária/INCRA; 
que em certa medida apresentou dois lados do processo de reforma agrária no Brasil: a primeira 
sendo ligada à distribuição de terras para o plantio, por agricultores familiares; e a segunda 
relacionada às dificuldades de conjugação das políticas agrícolas, com políticas sociais, para a 
consolidação das comunidades e assentamentos rurais. 
Os assentados do Núcleo de Produção Comunitária Santa Clara estão vivendo, desde 
2006, altos e baixos do processo de implementação do projeto de produção de 
biodiesel, empreendido pela empresa Brasil Ecodiesel, em terras cedidas, por dez 
anos, pelo governo do Estado do Piauí, o Instituto de Terras do Piauí e a administração 
do Incra no Estado. Esta concessão se fez sob a forma de um comodato através do 
qual a terra passaria para os agricultores em 10 anos, mas estes estão tentando acelerar 
esta transferência e assumir a terra após o quinto ano do projeto.214 
Nessa circunstância, o que aparentemente parecia ser o estabelecimento de ligações 
entre assentamentos rurais e o projeto da mamona, como fonte de produção de biodiesel, 
converteu-se num projeto de produção de carvão vegetal que teve como base a utilização da 
mata nativa do cerrado piauiense. Após alguns obstáculos do Instituto Brasileiro do Meio 
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, no que diz respeito à produção de carvão 
vegetal na área, as comunidades quilombolas transformaram a usina de óleo vegetal em uma 
casa de farinha. No entanto, além do desmatamento do bioma, sendo aproximadamente uma 
área de 7.500 hectares, houve a baixa rentabilidade dos plantios, que, por sua vez, deixaram os 
quilombolas com dificuldades financeiras. 
Desde o início desse processo, as dificuldades existentes nos municípios foram 
enfrentadas pelos trabalhadores rurais em ambos técnicos, sociais e financeiros, o que 
 
213 QUIJANO, Anibal. “Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina”. In: LANDER, Edgardo (org.). 
A colonialidade do saber: Eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas Latino-americanas. Buenos Aires: 
Clacso, 2005, p. 117. 
214 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
Disponível em: http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-erro-de-calculo-colocou-projeto-de-
assentamento-rural-em-risco. Acessado em: 22 de maio de 2020. 
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-erro-de-calculo-colocou-projeto-de-assentamento-rural-em-risco
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-erro-de-calculo-colocou-projeto-de-assentamento-rural-em-risco
97 
 
contrariou o acordo entre a Ecodiesel e as famílias quilombolas, pois o planejado era que a 
empresa seria responsável pelo custeio do programa de energia, educação e saúde da 
comunidade; já as famílias estariam responsabilizadas pela colheita e limpeza das plantações 
de mamona e feijão, onde trabalhariam cultivando alguns legumes e pequenas criações, assim 
como plantariam mamona e feijão. Todavia, ao longo dos anos, a área do plantio de mamona 
foi diminuída, pois consideravam a terra extensa para a agricultura familiar praticada pelos 
assentados e quilombolas. 
O segundo caso, ocorreu a partir de 2006 nos municípios Redenção do Gurguéia, 
Avelino Lopes, Bom Jesus, Curimatá, Guaribas e Morro Cabeça no Tempo, onde inúmeros 
conflitos culminaram numa situação crítica de desmatamento dos biomas da Caatinga e Mata 
Atlântica, o que ocasionou, consequente, a destruição de alguns territórios de populações e 
trabalhadores rurais. Desse modo, compreendemos que a injustiça ambiental e alguns 
problemas ligados à saúde, foram os principais resultados do projeto Energia Verde, que foi 
implementado pela CODEVASF (Companhia de Desenvolvimento dosVales do São Francisco 
e Parnaíba) em parceria com o governo do Estado, situado no Plano de Desenvolvimento da 
Bacia do Rio Parnaíba. 
Licenciado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente e pelo Instituto Brasileiro do 
Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), o desmatamento do 
cerrado nativo, visando a produção de carvão vegetal pela JB Carbon S/A, 
denominado Plano de Manejo Florestal Sustentável, situa-se nas chapadas do extremo 
sul do Piauí, numa área particular conhecida como Condomínio do Chapadão do 
Gurguéia. Com indícios de irregularidades no tocante à titularidade das áreas de 
atuação da JB Carbon, o Instituto de Terras do Piauí (INTERPI) iniciou uma série de 
investigações e contestações acerca da origem das terras.215 
Referente às investigações e ao desmatamento na região, ocorreram danos ambientais 
relacionados a saúde dos trabalhadores e as populações locais, cujo o Ministério Público 
acionou o IBAMA e conseguiu a suspensão dessas atividades. No entanto, no início de 2007, 
até que houvesse essa intervenção, verificou-se que mais de 6.000 hectares haviam sido 
desmatados. No caso, o próprio IBAMA constatou, ao longo do processo, que o desmatamento 
foi ilegal por incidir sobre Mata Atlântica primária e pela dúvida sobre a legitimidade da 
titularidade das terras, o que provocou a suspenção das atividades da empresa. Nesse sentido, 
no final de 2007, a empresa conseguiu o apoio do governo do Piauí, que concedeu a licença 
para exploração, junto ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), para extrair 
 
215 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
Disponível em: http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-
piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-
caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e. Acessado em: 22 de maio de 2020. 
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
98 
 
minério de ferro nas proximidades da Serra Vermelha, “[...] localizada entre a Serra das 
Confusões e a Serra da Capivara, deflagrando mais ameaças ao patrimônio regional de relevante 
interesse arqueológico, histórico e científico”.216 
Nesse sentido, a partir destes dois casos, podemos compreender que o exercício da poder 
do Estado, no que diz respeito a proteção à vida dos quilombolas e assentados, falhou desde o 
momento em que cedeu as terras ocupadas e comprometeu a saúde e existência desses grupos. 
Além disso, configurou tais ações como práticas racistas, tanto no âmbito institucional como 
no ambiental, pois compreendemos que essas expressões constituem um “[...] conjunto de 
ideias e práticas das sociedades e seus governos, que aceitam a degradação ambiental e humana, 
com a justificativa da busca do desenvolvimento e com a naturalização implícita da 
inferioridade de determinados segmentos da população afetados [...]”,217 que, como 
consequência, sofrem os danos negativos do utilitarismo neoliberal em razão da tentativa de 
“[...] crescimento econômico a quem é imputado o sacrifício em prol de um benefício para os 
demais”.218 
No caso das comunidades quilombolas, o racismo institucional e ambiental se 
correlacionam ainda com a concepção de quilombo ligada à definição Ultramarina, no qual faz 
com que as comunidades contemporâneas tidas como “remanescentes” ainda sejam ligadas a 
concepção de outrora, isto é, como aqueles que sobraram, comunidades quilombolas que 
restaram após a abolição da escravidão, ignorando assim todo o processo de luta política que 
os quilombolas enfrentaram ao longo do século XX. Em outras palavras, podemos entender que 
ainda existe um cenário de desigualdade racial relacionado à injustiça ambiental, caracterizando 
o caso das comunidades quilombolas como alvo do racismo ambiental. 
De acordo com Maria Sueli Rodrigues Sousa (2019), o próprio processo de 
regulamentação se caracteriza enquanto um desdobramento do racismo institucional, pois o que 
vale “[...] é o que o Estado afirma; por isso, as empresas e o Estado não levam em conta a 
autodeclaração das comunidades, só vale se o Estado certificar e titular”,219 ou seja, uma das 
primeiras dificuldades enfrentadas para cumprir todo o processo é a necessidade “[...] de um 
 
216 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
Disponível em: http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-
piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-
caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e. Acessado em: 22 de maio de 2020. 
217 HERCULANO, Selene. Lá como cá: conflito, injustiça e racismo ambiental. I Seminário Cearense contra o 
Racismo Ambiental, 2006, p. 11. Disponível em: <http://www.professores.uff.br/seleneherculano/publicacoes/la-
comoca.pdf>. Acessado em: 28 de maio 2020. 
218 Idem, p. 12. 
219 SOUSA, M. S. R. de; SANTOS, J. J. F. Territorialidade quilombola e trabalho: relação não dicotômica 
cultura e natureza. Revista Katalysis, v. 22, 2019, p. 201. 
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
99 
 
profissional para realizar o RTID, O art. 9º da IN.57/2009 do INCRA, que terá a elaboração à 
cargo da Superintendência Regional do INCRA”.220 Além disso, Maria Sueli Sousa considera 
que a demora da execução de regulamentação das terras é ligada a uma falha administrativa da 
instituição, em lidar com as questões étnicas, pela falta de técnicos com diversidade exigida 
pelo RTID. 
Ainda nesse sentido, a autora pontua que o nível de detalhamento exigido para uma 
comunidade chegar à titulação é uma das facetas usadas pelo racismo, “[...] a resposta para tudo 
isso é racismo! Não o racismo declarado, mas aquele sinuoso, encoberto, menos identificável, 
com origem na estruturação e no funcionamento da sociedade”.221 A exemplo, o historiador 
Tauã Rangel (2016) coloca o Estado do Espírito Santo, cujo existem “[...] 100 comunidades 
quilombolas identificas, 68 reconhecidas e 38 certificadas, nenhuma foi titulada”,222 sendo esta 
uma realidade vivenciada por milhares de comunidades quilombolas que, por sua vez, 
reivindicam a sua existência frente à luta contra o racismo ambiental e institucional, por não 
conseguirem a regularização e posse das terras em que vivem. 
Sendo assim, considerando a importância de sediscutir sobre os conflitos 
desencadeados pelo racismo ambiental, no tópico a seguir daremos ênfase às proporções que 
surgem quando alguns grupos étnicos são marcados pela vulnerabilidade ao “[...] se deparam 
com a chegada do estranho, fortemente marcada pela chegada de novos empreendimentos 
responsáveis pela ruptura de um modo de vida local”.223 Além disso, abordaremos, 
principalmente, como se caracterizam as representações do “Mapa de conflitos envolvendo 
injustiça ambiental e saúde no Brasil” ao listar práticas de racismo e injustiça ambiental em 
diversos territórios do país. 
3.2 O mapa dos conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil: um olhar 
voltado para as comunidades quilombolas 
A atuação da Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA),224 se caracteriza por 
reivindicar a identificação, organização e o fortalecimento das lutas contra as desigualdades 
 
220 SOUSA, M. S. R. de; SANTOS, J. J. F. Territorialidade quilombola e trabalho: relação não dicotômica 
cultura e natureza. Revista Katalysis, v. 22, 2019, p. 202. 
221 Idem, p. 206. 
222 RANGEL, Tauã Lima Verdan. Racismo ambiental às comunidades quilombolas. Bauru, v. 4, n. 2, 2016, p. 
129. 
223 Idem, p. 127. 
224 “A Rede Brasileira de Justiça Ambiental foi criada em setembro de 2001, quando representantes de movimentos 
sociais, sindicatos, ONGs, entidades ambientalistas, organizações afrodescendentes e indígenas, e pesquisadores 
universitários do Brasil – com a presença de convidados dos EUA, Chile e Uruguai - se reuniram no Colóquio 
Internacional sobre Justiça Ambiental, Trabalho e Cidadania, na Universidade Federal Fluminense, na cidade de 
100 
 
injustiças ambientais existentes no Brasil. Sendo um dos projetos que clamam por justiça 
ambiental, a RBJA revela, em suas pesquisas, a existência de diversos casos conflituosos em 
que a injustiça e racismo ambiental são cotidianos na maioria dos municípios do país, que por 
sua vez atingem “[...] os povos no campo, na floresta e na zona costeira, ou ainda as populações 
urbanas de megalópoles como São Paulo e Rio de Janeiro, ou mesmo outras capitais e cidades 
menores”,225 que, consequentemente, evidenciam disputas entre grupos específicos, que 
possuem objetivos e interesses confrontantes, em relação ao uso do território – sendo as 
ameaças de existência desses povos, em seus territórios, que costumam ser um dos componentes 
centrais no que tangem os casos de injustiça ambiental. 
Conflitos ambientais encontram-se presentes em diversos continentes e países 
e vêm sendo objeto de produção acadêmica de diversos autores no campo das 
ciências sociais e ambientais, incluindo a Geografia Política e a Ecologia 
Política (ACSELRAD, 2004; ACSELRAD, HERCULANO & PÁDUA, 
2004; LITTLE, 2004; MARTINEZ-ALIER, 2002; HERCULANO & 
PACHECO, 2006; PORTO, 2007). Sua emergência e intensificação, 
principalmente nas últimas décadas de globalização econômica do 
capitalismo, resultam de uma visão economicista restrita de desenvolvimento 
pautada por critérios produtivistas e consumistas que desrespeitam a vida 
humana e dos ecossistemas, bem como a cultura e os valores dos povos nos 
territórios onde os investimentos e as cadeias produtivas se realizam.226 
A contemporânea crise socioambiental, ocorrida a partir da apropriação dos recursos 
naturais, em diferentes territórios, ao longo dos anos geraram a exclusão e a expropriação de 
diversos grupos em relação aos seus espaços habitacionais. Geralmente, em reação aos casos 
de injustiça ambiental, as populações afetadas e os movimentos sociais atuam na busca dos 
“[...] seus direitos fundamentais envolvendo questões como saúde, trabalho, cultura e 
preservação ambiental”.227 De acordo com Marcelo Porto e Tania Pacheco (2009), o contexto 
dessas lutas é marcado pela reivindicação da existência desses grupos em seus territórios, que 
são “[...] desenvolvidas por movimentos, estudiosos e militantes que buscam deslegitimar os 
discursos, práticas e políticas públicas voltadas para defender os modelos de desenvolvimento 
hegemônicos que hipervalorizam os benefícios dos grandes empreendimentos e da economia 
de mercado”,228 que, por sua vez, ocultam os riscos ambientais que atingem as populações 
envolvidas nesses conflitos. 
 
Niterói/RJ”: PORTO, Marcelo Firpo; PACHECO, Tania. Conflitos e injustiça ambiental em saúde no Brasil. 
Tempus. Actas em Saúde Coletiva, vol. 4, n. 4, 2009, p. 29. 
225 Idem, p. 30. 
226 Idem, p. 27. 
227 Idem, p. 28. 
228 PORTO, M. F. Conflictos, (in)justicia ambiental y salud en Brasil. Revista Ecologia Politica 37: 65-70, 
Barcelona. 2009, p. 33. 
101 
 
Foram a partir dessas discussões, que o projeto “Mapa de conflitos envolvendo injustiça 
ambiental e saúde no Brasil” passou a ser desenvolvido em 2008,229 no qual se caracteriza por 
listar territórios onde os riscos e impactos ambientais afetam diferentes populações, a exemplo 
de grupos camponeses e comunidades quilombolas, tornando assim públicas as vozes que 
buscam justiça ambiental. Vale ressaltar, que essas populações possuem um histórico de 
discriminação e invisibilidade, que, por sua vez, não são considerados como problemas sociais 
pelas instituições e mídia, tendo em vista serem ignorados por estes. Nesse sentido, observa-se 
que muitos casos são frequentemente ameaçados pela violência apenas por buscarem os seus 
direitos enquanto cidadãos, isto é, ao entrarem em defesa dos seus direitos, que incluem a posse 
do território, a garantia de saúde e a preservação de cultura, alguns grupos são perseguidos e 
afetados por ações de injustiça ambiental, como pode ser observado no mapa 3. 
Mapa 3: Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil 
 
Fonte: FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
Espalhados no mapa por todas as regiões do país, foram registrados, no primeiro 
resultado do projeto, mais de 300 casos de injustiça ambiental em todo o Brasil. Com isso, 
desde o início, o projeto foi idealizado a partir dos princípios da prática de uma ciência mais 
cidadã ao assumirem uma posição ética ligada à solidariedade com tais populações, 
 
229 Resultado da cooperação técnico-científica entre a Fiocruz e a FASE (Federação de Órgãos para Assistência 
Social e Educacional), ONG que está na secretaria executiva da RBJA desde sua criação. 
102 
 
reconhecendo assim que os problemas conflitantes apresentados fazem parte de alguns 
complexos que, em nossa compreensão, exigem a viabilidade de soluções a curto, médio e 
longo prazo. Em outras palavras, o projeto objetiva mudanças drásticas que incluem resoluções 
estruturais “[...] nos sistemas de produção e consumo das sociedades capitalistas modernas, bem 
como nas políticas públicas e práticas das organizações”.230 
A ideia de promoção da saúde relacionada à perspectiva de justiça ambiental, assumida 
pelo projeto, contribui com as políticas e ações sociais que buscam a defesa dos direitos 
humanos fundamentais, assim como a redução das desigualdades e, consequentemente, o 
fortalecimento da democracia no que diz respeito ao direito à da vida dos sujeitos que estão 
envolvidos nos variados tipos de conflitos. 
O objetivo maior do projeto é socializar informações e dar visibilidade a denúncias e 
conflitos ambientais envolvendo situações de injustiça ambiental e saúde no país, com 
a intenção de permitir o monitoramento de ações e de projetos que atendam às 
demandas das populações por justiça, saúde e cidadania. A ideia não é se restringir 
aos casos e territórios onde problemas sociais, ambientais e sanitários já estejam em 
nível avançado de deterioração, mas também apontar conflitos cujos riscos e/ou 
efeitos à saúde estejam ainda por ocorrer. São casos em quepopulações e movimentos 
sociais estejam se mobilizando contra a implementação de políticas e 
empreendimentos que gerem situações de injustiça ambiental, como hidrelétricas, 
fábricas poluentes, aterros de lixo, incineradores, grandes empreendimentos turísticos 
no litoral e condomínios residenciais, ou ainda a não demarcação de terras indígenas, 
de quilombolas ou para a reforma agrária.231 
Como podemos observar, os objetivos do projeto estão amplamente ligados a promover 
a vida e desenvolvimento de todos sujeito e comunidades que se encontram em meio a esses 
conflitos. Desse modo, podemos entender também que quando esses objetivos não são 
alcançados, todos os âmbitos que atravessam a vida desses povos – economia, política e 
decisões governamentais –, acabam abalando e prejudicando os direitos fundamentais de “[...] 
comunidades indígenas e quilombolas, agricultores familiares, pescadores artesanais, 
comunidades tradicionais diversas, mas também trabalhadores e moradores das cidades que 
vivem nas zonas de sacrifício”.232 Quer dizer, os casos apresentados no Mapa de conflitos 
envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil revelam algumas situações que são 
ocasionadas por modelos de desenvolvimento que, por sua vez, desprezam a vida das 
populações que habitam seus territórios. 
 
230 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
Disponível em: http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-
piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-
caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e. Acessado em: 22 de maio de 2020. 
231 PORTO, Marcelo Firpo; PACHECO, Tania. Conflitos e injustiça ambiental em saúde no Brasil. Tempus. 
Actas em Saúde Coletiva, vol. 4, n. 4, 2009, p. 32. 
232 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
103 
 
De acordo com a política que envolve o projeto, o mapeamento dos conflitos ambientais 
parte das demandas, das estratégias de resistência e das propostas de resolução dos problemas 
que envolvem própria a reinvindicação existencial desses grupos. É tanto, que o projeto não 
desenvolveu estudos, trabalhos ou avaliações de campo que “[...] aprofundassem, do ponto de 
vista técnico-científico, os detalhes dos impactos ambientais e à saúde”.233 Nesse sentido, as 
informações destacadas nos casos são, sobretudo, as vozes expressivas das populações 
atingidas, que ocorreram “[...] seja a partir de suas experiências, seja a partir de relatórios e 
artigos desenvolvidos por entidades, ONGs e instituições parceiras, inclusive grupos 
acadêmicos, instituições governamentais, Ministérios Públicos ou órgãos do judiciário”.234 
O fato de tais posições serem muitas vezes contraditórias com as versões apresentadas 
por outras instituições ou empresas envolvidas expressa, mais que o grau de incertezas 
e falta de informações existentes, o nível de conflito e de dificuldades no 
encaminhamento de soluções que atendam aos interesses legítimos das populações 
atingidas. Ao privilegiarmos a visão de tais populações, buscando não cair em 
reducionismos ou denúncias inconsequentes, estamos contribuindo, acreditamos, com 
o papel de dialogar com a sociedade e transformá-la para que sejamos mais 
democráticos, sustentáveis e saudáveis.235 
Desse modo, podemos compreender que as fontes de informação são extremamente 
importantes ao sistematizarem os casos apresentados e, também, por seguirem as orientações 
da Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA), que incluem a experiência de suas entidades, 
que por sua vez estão relacionadas com as suas discussões e com os seus grupos de trabalho, 
sendo estes: o GT Químicos e o GT Racismo Ambiental;236 destacando este último à 
responsabilidade de levantar, inicialmente, as informações que constam no Mapa do Racismo 
Ambiental no Brasil. Além desses grupos, o acesso às informações e a construção dos casos 
incorporaram a experiência de alguns grupos que discutem a temática, a exemplo de algumas 
entidades e grupos universitários, em parceria com movimentos sociais, que lutam por justiça 
ambiental no país.237 
 
233 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
234 Idem. 
235 Idem, 
236 Parcela dos documentos que circulam na RBJA e seus GTs encontram-se disponibilizadas no Banco Temático, 
ferramenta construída pela Fiocruz e Fase acessível na internet que permite a busca e consulta de documentos. 
237 Somente para citar alguns exemplos, destacamos: o Mapa dos Conflitos Ambientais no Estado do Rio de Janeiro 
construído pelo IPPUR/UFRJ; o Mapa dos Conflitos Socioambientais da Amazônia Legal, organizado pela Fase 
Belém; os dados constantes da Nova Cartografia Social, organizada pelo pesquisador Alfredo Wagner; trabalhos 
realizados por universidades e centros de pesquisa como o Gesta/UFMG, UFCE, UFBA, UFMT e UFMS, dentre 
outros; os relatórios da Plataforma DESCH sobre direitos humanos, em especial a Relatoria de Meio Ambiente; e 
as contribuições de inúmeras ONGs e fóruns atuantes na justiça ambiental e na própria RBJA. Tais fontes foram 
complementadas pelo acesso a informações da mídia ou de instituições, incluindo Ministérios Públicos e a Justiça, 
quando envolviam informações sobre ações ou processos em andamento. 
104 
 
Inicialmente, a proposta do projeto foi apresentar os casos de conflitos que existiam em 
todo o país, mais ou menos numa média de 15 conflitos por estado. No entanto, os conflitos 
chegaram a se concentrar entre cinco até trinta casos, que dependiam “[...] da intensidade de 
conflitos, sua extensão e mobilizações”.238 A exemplo, os estados de Roraima e Sergipe que 
continham uma quantidade de casos menores que os números levantados nos estados de Minas 
Gerais, Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo. Nesse sentido, o levantamento apresentou um quadro 
de denúncias que existiam desde janeiro de 2006, assim como alguns casos em que o início dos 
conflitos tinha ocorrido anteriormente a essa data. 
Para o fichamento dos casos, foram considerados, entre outros, os seguintes itens: – o 
tipo de população atingida e o local do conflito, como: povos indígenas, operários/as, 
quilombolas, agricultores/as familiares, moradores/as em encostas, ribeirinhos/as, 
pescadores/as e outros/as tantos/as, urbanos ou rurais; – tipo de dano à saúde 
(contaminação por chumbo, desnutrição, violência física, dentre outros) e de agravo 
ambiental (desmatamento, queimada, contaminação do solo e das águas por 
agrotóxicos, por exemplo); – a síntese do conflito e o contexto ampliado do mesmo, 
apresentando os principais responsáveis pelo conflito, as entidades e populações 
envolvidas na luta por justiça ambiental, os apoios recebidos ou não (como 
participação de órgãos governamentais, do Ministério Público e de parceiros da 
sociedade civil), as soluções buscadas e/ou encontradas; – os principais documentos 
e fontes de pesquisa usadas na pesquisa sobre o caso.239Na organização dos dados, as informações iam sendo inseridas num banco de dados que 
foi criado pelo programa do DataSus: o FormSus. Desse modo, de acordo com a medida em 
que as informações de cada estado chegavam, o material era organizado e enviado para ser 
avaliado “[...] por um pesquisador ou uma pesquisadora local – acadêmico ou militante de 
movimentos sociais e ONGs”,240 que eram encarregados de analisar a pesquisa realizada e, além 
disso, corrigiam ou complementavam os dados, de acordo com o necessário. Após essa etapa, 
as fichas que iam sendo aprovadas foram enviadas para editoração e padronização, para só então 
serem inseridas no banco de dados do Mapa.241 Nesse sentido, os casos que constam no Mapa 
foram sistematizados até o momento, o que não limitam as diversas situações existentes no país, 
que de certa forma refletem uma parcela importante e significativa em relação a exposição das 
populações atingidas. 
 
238 PORTO, Marcelo Firpo; PACHECO, Tania. Conflitos e injustiça ambiental em saúde no Brasil. Tempus. 
Actas em Saúde Coletiva, vol. 4, n. 4, 2009, p. 33. 
239 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
Disponível em: http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-
piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-
caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e. Acessado em: 22 de maio de 2020. 
240 Idem. 
241 Esta ferramenta foi criada por uma equipe técnica do ICICT/Fiocruz especializada no georreferenciamento de 
informações sobre saúde, utilizando-se do Google Earth como plataforma auxiliar de localização espacial dos 
territórios onde os casos estão inseridos. 
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/?conflito=pi-regiao-de-chapadoes-no-extremo-sul-do-piaui-patrimonio-singular-de-importancia-mundial-arqueologica-e-pela-transicao-entre-areas-ricas-dos-biomas-caatinga-e-cerrado-e-ameacada-por-projetos-de-e
105 
 
Sendo assim, compreendemos que as informações contidas no Mapa podem ser 
visualizadas como processos e dinâmicas que aperfeiçoam, em certa medida, as novas 
informações assim como as novas situações que possam, “[...] na continuidade do projeto, 
aprimorar, corrigir e complementar o presente resultado. Portanto é importante ressaltar que 
não consideramos o Mapa fechado”,242 ao contrário, o Mapa representa o momento iniciante de 
“[...] um novo espaço para denúncias, para o monitoramento de políticas públicas e, ainda, de 
desafio para que o Estado, em seus diversos níveis, responda às necessidades da cidadania, 
respeitando e implementando a Constituição Federal”.243 
3.3 “Um grito no semiárido”: a crise existencial da comunidade quilombola Lagoas 
No mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil, consta-se o caso 
da comunidade quilombola Lagoas no que diz respeito à luta contra a instalação de empresas 
de mineração e carvoarias em seu território. Nas reinvidicações da comunidade, os quilombolas 
afirmaram que houveram impactos ambientais relativos às alterações do regime tradicional de 
uso e ocupação do território, sendo estes: (1) desertificação; (2) queimadas; (3) irregularidade 
na autorização ou licenciamento ambiental; (4) irregularidade na demarcação de território; (5) 
dano a área protegida; poluição atmosférica; (6) poluição de recurso hídrico; que provocaram 
doenças não transmissíveis e crônicas, assim como insegurança alimentar e uma queda na 
qualidade de vida dos lagoanos. 
Mapa 4: Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Piauí 
 
Fonte: FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
 
242 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
243 Idem. 
106 
 
Centrados no território de São Raimundo Nonato, observa-se no mapa que existem doze 
municipios do Piauí, até o ano de 2014, que encontravam-se em situações conflituosas. Entre 
os municípios, destacam-se aqui os integrantes do território quilombola Lagoas, que por sua 
vez eram ameaçados de expulsão das suas terras pelas investidas de algumas empresas voltadas 
para a mineração e carvoaria. Nesse sentido, desde 2009, existem registros sobre algumas 
atividades da empresa mineradora São Camilo no território, sem que tenha houvesse nenhuma 
comunicação com os quilombolas. Além diso, nos registros constam que existiam falhas no 
licenciamento ambiental da empresa, isto é, “[...] as empresas de mineração e carvoaria estavam 
derrubando árvores nobres e promovendo queimadas em áreas ambientais sob a 
responsabilidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA)”,244 que, 
por sua vez, impossibilitavam o avanço de atividades, assim como ameaçavam a vida dos 
quilombolas. 
A gente está no semiárido e a gente tem que viver nessa região como nossos 
antepassados sempre viveram. As futuras gerações também precisam viver desse 
semiárido. Então isso é uma preocupação, se a gente não achar uma solução, se as 
autoridades não olharem pra isso, e vierem evitar essas devastações, não sei como vai 
ser o futuro – Claudio Teófilo, Quilombo Lagoas.245 
As palavras do quilombola Claudio Teófilo, representam a reivindicação existencial da 
comunidade Lagoas frente à produção ilegal de carvão e avanço das empresas de mineração no 
território lagoano.246 Na reportagem do Jornal Imirante,247 consta-se que durante o ano de 2008 
algumas mineradoras, de portes grandes e médios, investiram no Piauí cerca de R$ 800 milhões 
em pesquisa e na exploração de algumas terras. A guisa exemplo, a empresa Vale do Rio Doce 
realizou investigações referentes à busca pela constatação de ouro, ferro e manganês no 
município de São Raimundo Nonato, devido o estado ser rico em minério de ferro, que existe 
em quase toda sua extensão territorial.248 
Como consequência das ações conflituosas, o quilombola Raimundo Junior registrou, 
em 2009, um boletim de ocorrência contra a referida mineradora, pois a empresa o havia 
 
244 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
245 Idem. 
246 Nesse sentido, quando pontuo que as reivindicações dos lagoanos partem de uma questão existencial, estou me 
refiro que “[...] ser um quilombola significa compartilhar uma mesma existência, um modo de vida, em que as 
perspectivas culturais, religiosas, ambientais, econômicas, históricas, geográficas e sociológicas estão todas 
integradas”: SAHR, C. L. L. et al. Geograficidades quilombolas: estudo etnográfico da comunidade de São João, 
Adrianópolis - Paraná. Ponta Grossa: Editora UEPG, 2011, p. 92. 
247 IMIRANTE. Mineradoras investem R$ 800 milhões no Piauí. 01/03/2008. Disponível em: 
http://goo.gl/QfSXBR. Acessado em: 24 de fev. 2020. 
248 Segundo, Reinaldo Batista, Chefe de Fiscalização do 210 – Distrito do Departamento Nacional de Produção 
Mineral (DNPM) no Piauí, este foi um dos motivos para que ao longo de 40 anos tenham sido concedidos em 
torno de 700 títulos de pesquisa e exploração, e que em um período de apenas três anos, entre 2005 e 2008, tenham 
sido concedidos 1.400 novos títulos. 
107 
 
acusado de furtar algumas carreadasde pedras para alicerce na localidade de Lagoa do 
Nascimento, que é um dos povoados pertencentes ao território da comunidade quilombola 
Lagoas. Nesse caso, a acusação havia sido feita por um representante da Mineradora São 
Camilo, cujo afirmava que haviam sido retiradas “[...] cinco carreadas de pedra para alicerce, 
cujo foram vendidas para a obra no CEFET de São Raimundo Nonato”.249 Na ocasião, o 
quilombola Raimundo Junior contestou à acusação pontuando que a área explorada faz parte 
de uma propriedade particular que pertence a sua família e a outros moradores da localidade 
Lagoa do Nascimento. 
Segundo reportagem do São Raimundo.com, que disponibiliza o boletim de 
ocorrência, o declarante, Raimundo Junior, afirma ter conhecimento de que a empresa 
adquiriu uma propriedade na região do Morro do Mel de tamanho aproximado de 460 
hectares, mas que o Sr. Dalmo afirma que a Mineradora São Camilo tem o direito de 
exploração de uma área de 12.000 hectares. No entanto, nenhum proprietário de terra 
naquele local conhece tais direitos e como eles foram adquiridos, questionou 
Raimundo Junior.250 
Com a finalidade de resolver a situação, Raimundo Junior buscou informações no 
Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) sobre ter 
havido a possibilidade da concessão daquelas terras para a empresa, no qual, na ocasião foi 
informado que a mineradora não possuía nenhuma licença para exploração, nem para os 460 
hectares que ela havia comprado. Nesse sentido, como forma de reivindicação, os quilombolas 
juntamente com alguns grupos de agricultores da região participaram do documentário “O 
Semiárido Grita”, que foi organizado e produzido pelos alunos do Instituto Comrádio do Brasil, 
com a finalidade de trazer visibilidade para as injustiças ambientais que os lagoanos e outros 
assentados estavam sofrendo. 
Assim como no caso do quilombo Lagoas, outras comunidades quilombolas no Brasil 
também sofrem conflitos similares, a exemplo da comunidade quilombola “Pontal dos 
Crioulos”, que fica localizada no município de Amparo do São Francisco no estado de Sergipe. 
De acordo com Marcelo Porto e Tania Pacheco (2009), a comunidade possui cerca de 150 
famílias e ainda não recebeu a titulação de suas terras, pois tem travado conflitos contra grandes 
proprietários rurais, “[...] políticos e fazendeiros ligados, inclusive por parentesco, a um ex-
governador do Estado, sendo auxiliados também por um delegado de polícia”,251 que são os 
responsáveis por exercerem oposição à titulação da comunidade. 
 
249 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
250 Idem. 
251 PORTO, Marcelo Firpo; PACHECO, Tania. Conflitos e injustiça ambiental em saúde no Brasil. Tempus. 
Actas em Saúde Coletiva, vol. 4, n. 4, 2009, p. 36. 
108 
 
A partir desses conflitos, esse grupo foi acusado, pelos quilombolas da comunidade 
Pontal dos Crioulos, de terem invadido a comunidade algumas vezes e por terem feito “[...] 
demonstração de força com a exibição de armas, de impedirem a passagem de quilombolas por 
logradouros de uso comum, de destruírem plantações no entorno da lagoa, de matarem animais 
de criação e de agredirem fisicamente pessoas”.252 Desse modo, compreendemos que os 
conflitos ambientais, protagonizados pelas comunidades quilombolas, ocorrem em razão da luta 
pelo direito de usar o território e os recursos naturais existentes, pois “[...] as injustiças 
ambientais permanecem invisibilizadas e os conflitos surgem justamente pela emergência de 
formas organizadas de resistência e afirmação de outros projetos de desenvolvimento e 
sociedade”. 253 
Nessa perspectiva, considerando a emergência das reivindicações da comunidade 
Lagoas, em 2011 o INCRA iniciou o processo de regularização fundiária de terras do quilombo 
Lagoas, ao publicar o Relatório Antropológico de Identificação e Delimitação (RTDI). De 
acordo com o Projeto Dom Helder Câmara, os proprietários que possuíam imóveis na área do 
território quilombola foram notificados em 2012, no que se refere ao processo de desocupação 
das áreas que seriam regularizadas. Nesse caso, as áreas se tornariam uma propriedade coletiva, 
que por sua vez seriam administradas pela associação representativa das famílias. Nesse 
sentido, Nêgo Bispo considerou que a mobilização da comunidade foi importante no processo 
de regularização, pois “[...] as famílias já viviam um processo, já estavam mobilizadas; isso 
facilitou em muito o trabalho da equipe”.254 
Todavia, embora o andamento do processo de regularização fundiária seja importante 
para garantir a titulação do território, consta-se que isso “[...] não impede que a pressão da 
mineradora avance sobre diferentes comunidades no território Lagoas”.255 Nesse sentido, ainda 
em 2011, o Bispo da diocese de São Raimundo Nonato, João Santos Cardoso, reuniu algumas 
lideranças e representações de suas paróquias e pastorais com o objetivo de discutir a respeito 
das consequências da seca naquela região. A partir da reunião foi produzida uma lista de 
demandas, que por sua vez foi encaminhada para diferentes secretarias estaduais, assim como 
para o governo do Estado. No entanto, não houve resposta, o que corroborou para a ampliação 
do movimento junto a Comissão Pastoral da Terra (CPT), que converteram a lista de 
 
252 PORTO, Marcelo Firpo; PACHECO, Tania. Conflitos e injustiça ambiental em saúde no Brasil. Tempus. 
Actas em Saúde Coletiva, vol. 4, n. 4, 2009, p. 37. 
253 NUNES, J. A. Saúde, direito à saúde e justiça sanitária. Rev. Crítica de Ciências Sociais 2009; p. 149. 
254 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
255 Idem. 
109 
 
solicitações num documento em formato de denúncia, cujo aborda sobre a ausência de ações 
sociais públicas no município. 
Desta organização nasceu o Grito do Semiárido, uma iniciativa de luta popular de 
agricultores/agricultoras familiares em vista de uma política pública permanente no 
semiárido. O I Grito consistiu em uma audiência pública em São Raimundo Nonato 
que contou com mais de mil participantes, incluindo agricultores, quilombolas e 
representantes do poder público. Neste momento as inquietações acerca do avanço 
das mineradoras na região começavam a crescer. Em mensagem de correio eletrônico 
de novembro 2011 para o grupo da Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato, 
Hildebrando Pires, membro da organização, expressa sua preocupação com as 
ofensivas da mineradora São Camilo contra a comunidade do entorno do Morro do 
Mel.256 
De acordo com Hildebrando Pires, nesse contexto, a mineradora ainda buscava de todos 
os modos conseguir se instalar na região, sendo que mais de cem famílias fizeram um 
documento afirmando que não queriam deixar as suas terras a mercê da empresa, isso porque a 
mineração iria causar impactos ambientais assim como atingiria também a população local. De 
acordo com Antônio Euzébio de Souza, coordenador da CPT no Piauí, a mineração 
representava a degradação, de modo impactante, onde seria impossível estabelecer qualquer 
tipo de conciliação, tanto com a população como em relação ao meio ambiente. Nesse sentido, 
em 2012, outras instituições se aliaram ao movimento “Grito do Semiárido”, discutindo o tema 
“piauiense em convivência com o semiárido”,257 com a finalidade de reforçar algumas 
demandas das comunidades frente a luta pelas terras. 
Juntamente com outras associações,258 com o intuito de organizar o IV Grito do 
Semiárido, a Associação Territorial do Quilombo Lagoas optou por estabelecer uma 
metodologia que envolvesse mais as famílias residentes nas áreas de pesquisa de mineração, 
buscando fortalecer a luta da comunidade, que foi visitada “[...] para ouvir seu testemunho e 
também para mobilizá-la,”259pois as famílias ainda não entendiam como ocorria o processo e 
não tinha conhecimentos amplos sobre os impactos provocados pela mineração, pois estavam 
preocupadas, sobretudo, com a desapropriação, “[...] alguns dizem ter áreas de propriedade 
familiar onde já houve pesquisas. Segundo informações de famílias visitadas, a empresa entra 
nas terras sem autorização e perfura poços, deixando a área toda demarcada”.260 
 
256 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
257 O II Grito foi realizado na cidade de Picos em 2012. Em 2013, o III Grito aconteceu em São Raimundo Nonato 
e, diante da preocupação com o avanço das pesquisas de empresas do setor de mineração naquele território, este 
foi o tema do encontro: Política Pública para o Semiárido e a intervenção da mineração. 
258 Associação das Comunidades Pé do Morro e Morro do Mel, Federação dos Trabalhadores na Agricultura 
(FETAG/Polo Sindical de São Raimundo Nonato), Centro Popular Educacional e Cultural do Sertão Piauiense, 
Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato e CPT. 
259 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
260 Idem. 
110 
 
Algumas comunidades do Quilombo Lagoas (Angical, Lagoa do Amaro e Tobões, em 
Fartura-PI; Lagoa Nova, Lagoa das Flores, Caraíbas e Lagoa Nova, em Várzea 
Branca) receberam esta vista no dia 17 de setembro, da qual constatou-se que entre 
Várzea Branca, Fartura e São Raimundo Nonato, verifica-se grandes áreas de 
queimada de madeira autorizada pela SEMAR [Secretário de Estado de Meio 
Ambiente e Recursos Hídricos do Piauí], segundo os executores, dentro da área 
quilombola ainda sob responsabilidade do INCRA para regularização fundiária. Além 
disso, a equipe da visita às comunidades quilombolas afirmou que: As famílias estão 
assustadas, mas ainda não sabem o que fazer, nem a quem recorrer, visto que, segundo 
as informações, os representantes do poder público local e o Sindicato estão 
envolvidos com a proposta de apoio ao desmatamento.261 
Nessas circunstancias, algumas áreas numerosas de mata já estavam sendo desmatadas, 
cujo o destino da madeira era para a Mineradora GALVANI, em Angico dos Dias. Conta-se 
que na localidade Lagoa Nova, que a instalação da carvoaria já estava materializada com 32 
fornos construídos e 28 sendo que se encontravam ativos. De acordo com Carlos Rodrigues de 
Oliveira, encarregado da empresa de carvoaria, “[...] os 60 fornos irão funcionar na localidade 
e que enquanto tiver madeira estaremos trabalhando, quando um não aguentar mais, vem outro 
para continuar”,262 declaração que demonstra o racismo institucional, pois a empresa estava no 
território sob responsabilidade do INCRA, sendo que a Secretaria de Meio Ambiente do Estado 
do Piauí (SEMAR) havia também concedido a licença para retirada de madeira. 
No caso, compreendemos que havia o abuso e desrespeito por parte do Estado, assim 
como das empresas em relação a comunidade quilombola Lagoas, tais por existir a “[...] 
intensidade da atividade de pesquisa sem a informação necessária às comunidades; atividade 
de lavra sem audiência pública conforme determinação legal; 100 processos de pesquisa só no 
município de São Raimundo Nonato”,263 sendo que a comunidade não tinha tenham nenhuma 
informação relativa à realização dessas atividades, enquanto o Estado havia conferido uma 
licença para a SEMAR iniciar suas atividades. 
Segundo a Cáritas Brasileira, no território da comunidade quilombola Lagoas, cuja as 
famílias foram visitadas pela ocasião da preparação do IV Grito do Semiárido, foram realizadas 
pesquisas em seu território cujo verificou-se que “[...] grandes áreas de queimada de madeira, 
que, segundo os executores, estão autorizadas pela SEMAR”.264 
Tudo isso acontece dentro da área quilombola ainda sob responsabilidade do INCRA 
para regularização fundiária. Ao todo, 60 fornos funcionarão na comunidade 
quilombola. As comunidades do entorno do Morro do Mel relataram durante a visita, 
segundo reportagem da Cáritas Brasileira, que a mineradora São Camilo já comprou 
mais de mil hectares de terra, e até o momento nenhum diálogo foi estabelecido com 
as comunidades do entorno, como destacamos anteriormente. Norberto dos Santos, da 
 
261 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
262 Idem. 
263 Idem. 
264 Idem. 
111 
 
Comunidade de Lagoa Nova, em Várzea Branca, contou no vídeo produzido pela 
Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato, em setembro de 2014, durante a 
preparação para o IV Grito, que: Aqui é a vida de nós todos, da comunidade toda, 
vivemos disso aqui, tudo que criamos é dentro dessa propriedade, se ficamos sem ela 
acaba com tudo pra nós.265 
No mesmo sentido, Dona Aldete de Brito, moradora da mesma localidade que Norberto 
dos Santos, considerou sua preocupação em relação ao futuro da comunidade, sobretudo com 
as crianças, pois “[...] se destruir toda a caatinga, como é que essas crianças depois vão chegar 
na idade de 50 anos? Isso aqui não existe mais!”,266 pois a chegada da empresa visava a 
exploração da áreas de mata ainda virgem com carvoeiro. Desse modo, o tema da exploração 
manteve sendo discutido no IV Grito do Semiárido,267 que, a partir das discussões, realizaram 
uma marcha pelas ruas do centro de São Raimundo Nonato, contando com a participação de 
cerca de quatro mil pessoas que reivindicavam a não implantação de mineradoras na região. 
Na marcha, o vice-presidente da Associação Territorial do Quilombo Lagoas, Cláudio 
Teófilo Marques, marcou presença e relatou que o movimento funcionava em reação à chegada 
das mineradoras na região e aos impactos que a comunidade já vinha sentido. Além disso, 
Claudio Marques apontou que a iniciativa pretendia chamar atenção das autoridades para os 
casos que estavam acontecendo na região, pois do jeito que estava, com a região sendo ocupada 
pelas empresas, os quilombolas tenderiam a deixar suas terras, pois “[...] onde se instalam 
empresas de mineração, o futuro do povo é sair da região. Se não muda de Estado, muda sua 
vida inteira. Nós queremos ficar nos nossos municípios, em nossas terras”.268 
Nós estamos reagindo por que a mineração destrói as terras, expulsa os moradores da 
região para ir morar nas periferias da cidades e não ganham nada em troca. A nossa 
vida foi trabalhar na agricultura familiar e queremos continuar assim. […] A gente 
anda pela mata e vê no mínimo 40% dela morta. Isso é muito ruim não só para mim, 
mas para as futuras gerações. Se as autoridades não olharem para isso, não sei como 
será o futuro. Daqui a dez anos, se as coisas continuaram assim, nossa comunidade 
vai desaparecer. A gente do território não está satisfeito com a ideia dessas empresas 
tentando invadir as nossas áreas, porque aqui é uma área que faz parte de um território 
quilombola, aqui nesse território moram aproximadamente 1.500 famílias, […] a 
gente não tá satisfeito com essa empresa chegando aqui, não. A gente está muito 
preocupado com a chegada dessas empresas aqui, tanto na área da carvoaria, como da 
mineração.269 
Mesmo com o passar dos anos, como podemos observar, os relatos dos quilombolas 
sobre os conflitos ainda não cessaram. A respeito, o coordenador da Cáritas de São Raimundo 
 
265 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
266 Idem. 
267 De acordo com matéria do Jornal de Luzilândia, o Grito do Semiárido buscou denunciar que as atividades de 
pesquisa mineral na região têm sido intensas – há mais de 100 registros de processos de pesquisa apenas em São 
Raimundo Nonato -, e que as famílias afetadas não têm recebido as devidas informações. 
268FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
269 Idem. 
112 
 
Nonato, Hildebrando Pires, pontuou também que “[...] a SEMAR concedeu licença para plano 
de manejo de uma empresa, do ano de 2013 a julho de 2014, que naquele momento havia 
cortado algumas árvores, a exemplo da aroeira, umburana e angico”,270 e que em alguns lugares 
precisava de manejo ambiental, pois em outra região havia implantado uma carvoaria com 60 
fornos, sendo que os quilombolas não foram comunicados: “[...] a Associação do Quilombo 
nunca viu, as entidades de apoio também nunca viram”.271 Reafirmando o discurso, o 
quilombola Manoel Aragão comenta sobre o desmatamento: “Isso aqui é uma Umburana, 
Umburana essa que nós, trabalhadores e agricultores, somos proibidos de tirar para fazer uma 
porta para nossas casas. Aí vem uma grande empresa, que nem sabemos da onde é, e vai e leva, 
sem nenhuma combinação com os moradores”.272 
As irregularidades continuaram permanecendo. Nesse sentido, a historiadora Ana 
Estela, diretora do escritório do Instituto do Patrimônio Artístico e Histórico Nacional – PI 
(IPHAN-PI), relatou para o documentário “Grito do Semiárido” que estava assombrada com a 
situação que os lagoanos estavam passando. Nesse sentido, a historiadora ainda colocou que a 
comunidade Lagoas é reconhecida pela Fundação Palmares e “[...] até nós do IPHAN, que 
somos do governo federal, não podemos entrar na área quilombola e fazer nenhuma 
intervenção, não podemos fazer nada, nem escavar um sitio arqueológico, se não tiver 
autorização deles”,273 isto é, as instalações de carvoaria naquela região não deveriam ocorrer, 
pois representavam ações gravíssimas. 
Ao final das atividades do IV Grito do Semiárido, no dia 16 de novembro de 2014, um 
passo importante havia sido dado em favor da comunidade do quilombola Lagoas, que foi a 
criação da Associação Cultural do Quilombo Lagoas. Em compreensões gerais, o objetivo da 
associação era garantir que as comunidades pudessem ter oportunidades de acesso aos direitos 
constituídos pela lei, referente as comunidades remanescentes de Quilombo. No entanto, 
embora associação represente um marco importante para os lagoanos, destacamos que apesar 
de ter sido retomado em 2011, o processo de regularização fundiária do Quilombo Lagoas não 
obteve avanço desde então. 
 
 
 
 
270 FIOCRUZ, Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil. 22 de dezembro de 2009. 
271 Idem. 
272 Idem. 
273 Idem. 
113 
 
O PERIGO DE UMA ÚNICA NARRATIVA, 
considerações finais 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Histórias importam. Muitas histórias importam. 
Histórias têm sido usadas para expropriar e 
tornar maligno. Mas as histórias podem também 
serem usadas para capacitar e humanizar. 
Histórias podem destruir a dignidade de um povo, 
mas histórias podem reparar essa dignidade 
perdida.274 
Chimamanda Ngozi Adiche 
 
274 ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O perigo de uma história única. 2009. Disponível em: 
<https://www.youtube.com/watch?v=qDovHZVdyVQ> Acessado em 4 de junho de 2020. 
https://www.youtube.com/watch?v=qDovHZVdyVQ
114 
 
A fala de Chimamanda Adichie sobre “O perigo de uma única história”,275 retrata uma 
narração pessoal de experiências da autora, cujo destaca os perigos que uma história única pode 
ter. É seguindo esse raciocínio, que Chimamanda Adichie exemplifica suas vivências desde a 
tenra idade, onde aos dois anos começou a ler, se caracterizando assim enquanto uma leitora 
precoce que folheava alguns livros infantis britânicos e americanos. Consequentemente, 
Adichie passou a escrever precocemente, destacando nos seus escritos os sujeitos brancos de 
olhos azuis, apesar do fato dela ser negra e morar na Nigéria, isto é, a escrita da autora era 
amplamente influenciada pelas percepções de mundo eurocêntricas. 
O relato da autora é extremamente importante, pois demonstra como nós, pessoas num 
contexto marcado pela colonização ocidental, somos vulneráveis a uma história que valorizou, 
por muito tempo, os homens europeus e tudo o que eles produziram, configurando e 
estabelecendo, desse modo, um não lugar para os(as) negros(as). O fato da autora ter escrito 
suas histórias sobre pessoas brancas, se justifica porque tudo aquilo que ela havia lido eram 
livros nos quais os personagens se caracterizavam por ser estrangeiros, convencendo-a de que 
naturalmente estes tinham que ser representados em seus escritos. Todavia, em detrimento das 
discussões descoloniais, a autora passou a descontruir a categoria de gênero como um conjunto 
de normas que orientavam as ações dos sujeitos e regulavam a produção dos corpos 
considerados naturais e pré-discursivos, entendendo a importância da mulher, sobretudo a 
mulher negra, como protagonista de histórias. 
Isto só ocorreu, inicialmente, quando Adichie descobriu os livros africanos, mesmo não 
havendo muitos disponíveis, a autora teve contato com alguns exemplares que abordavam sobre 
meninas com a pele da “cor de chocolate”, cujos cabelos crespos não poderiam formar rabos-
de-cavalo, que também existiam na literatura. Sendo assim, Adichie começou a escrever sobre 
as coisas que eram do seu cotidiano, estabelecendo uma desconstrução de uma única narrativa 
histórica, que outrora havia privilegiado, sobremaneira, os homens europeus. Nesse sentido, as 
considerações finais aqui partem das reflexões acima embaladas por Chimamanda Adichie. 
Uma única narrativa histórica representa, ao nosso ver, tudo o que é contrário à ideia do “devir 
quilombola”, pois continuam estabelecendo ações colonialistas e, ao mesmo tempo, tentam 
sucumbir todos os esforços contra colonizadores destes sujeitos. 
Durante o trabalho, abordamos sobre alguns momentos que antecederam e sucederam o 
ano de 1888,276 cujo foram marcados por profundas disputas políticas envolvendo senhores de 
 
275 ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O perigo de uma história única. 2009. Disponível em: 
<https://www.youtube.com/watch?v=qDovHZVdyVQ> Acessado em 4 de junho de 2020. 
276 O ano de 1888 foi marcado pela abolição da escravatura no Brasil. 
https://www.youtube.com/watch?v=qDovHZVdyVQ
115 
 
escravos, abolicionistas, escravos e sujeitos livres no Brasil escravista. Nos anos posteriores ao 
pós-emancipação, a situação conflituosa continuou, contudo, o novo cenário político 
republicano sinalizou, para a grande massa de ex-escravos e seus descendentes, outras arenas 
de lutas, essas a serem construídas e imaginadas no campo do acesso aos direitos sociais. Nesse 
sentido, a luta ocorreu na, imperiosa e urgente, construção da cidadania de uma parcela da 
sociedade brasileira herdeira da escravidão, a exemplo das comunidades negras que surgiram 
como unidades legitimadoras de um lócus da luta antiescravista. 
Nesse contexto, a posse pela terra foi, portanto, o caminho a seguir durante o período 
republicano. Partindo dessa compreensão, no primeiro capítulo procuramos apresentar como o 
cenário brasileiro, relativo ao contexto da invisibilidade dos negros na primeira Constituição 
Política do Império, partiu de uma composição social elitista que detinha o poder em todo o 
país. Na década de 1820, por exemplo, estes grupos moderaram diretamente a grande parcela 
do poder político nacional, que controlavam a produção agroexportadora e constituíam um 
extenso conjunto de políticos e burocratas que lotavam os cargos institucionais do Executivo, 
Legislativo e Judiciário no Império. 
A composição social citada anteriormente, exerceu influência política durante as 
décadas seguintes do século XIX. Como vimos, essa configuração só passou por uma mudança 
drástica a partir da década de 1980, quando algumas organizações, a exemplo doMovimento 
Quilombola, estabeleceram relações com à Coordenação Nacional de Articulação das 
Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) e promoveram assim uma maior relação 
entre o Estado e as comunidades quilombolas brasileiras. No Piauí, mesmo não havendo um 
corpo jurídico que atuasse na causa quilombola, as comunidades quilombolas passaram a 
receber assistência do INCRA. No caso do quilombo Lagoas, os lagoanos estavam cientes em 
relação aos seus direitos étnicos e territoriais, cujo, a partir da organização da comunidade, 
recorreram a fundamentação legal que respaldaram a territorialização da comunidade, bem 
como para asseguraram as ações que foram constituídas durante esse processo. 
Nessa perspectiva, partindo das discussões do quilombola Nêgo Bispo, que se estendem 
como práticas que estão amplamente relacionadas com as comunidades quilombolas piauienses. 
Ao considerar os quilombolas enquanto sujeitos que são capazes de ressemantizar e elaborar 
conceitos, de se apropriarem dos seus direitos e de estabelecerem relações com outros grupos 
não quilombolas, o ativista piauiense nos deu base para traçar uma discussão em que 
evidenciamos o protagonismo dos lagoanos. Foi a partir dessa perspectiva, que observamos 
como os lagoanos escreveram sua própria história e, assim, se contrapuseram aos perigos de 
uma única narrativa. 
116 
 
Este fato se expressa ainda mais claramente no segundo capítulo, quando foi abordado 
sobre a importância dos saberes quilombolas no que diz respeito à territorialização da 
comunidade. Durante muitos anos, percebemos que a historiografia brasileira sobre os 
quilombos narrou diversas experiências em que destacavam a memória, a identidade, os 
conflitos e a importância da terra para esses povos. No entanto, ignoraram, mesmo que de forma 
não intencional, a historicidade dos territórios quilombolas, isto é, postergaram os processos 
históricos relacionados a territorialização das comunidades. Nesse sentido, apresentamos como 
os lagoanos conheceram e produziram o seu território ao partirem das memórias do cativeiro, 
das práticas culturais, do parentesco e das sociabilidades que existiam na comunidade. 
Além desses aspectos, demonstramos que a materialização da comunidade, através do 
relatório técnico, foi fundamental para a própria comunidade ter o controle sobre algumas 
informações, a exemplo da quantidade de famílias que existem na comunidade, a renda salarial 
desses grupos, a escolaridade dos lagoanos; fazendo com que eles possam reivindicar alguns 
direitos com base nessas informações. Foi justamente sobre este último aspecto, que 
desenvolvemos o terceiro capítulo. A respeito, observamos como alguns mecanismos utilizados 
pelo Estado tentaram impedir, de diferentes formas, a inviabilização de conquistas das 
comunidades quilombolas. 
A contemporânea crise socioambiental, ocorrida a partir da apropriação dos recursos 
naturais, em diferentes territórios, ao longo dos anos geraram a exclusão e a expropriação de 
diversos grupos em relação aos seus espaços habitacionais. Na visão de Nêgo Bispo, por 
exemplo, a não atribuição do título de quilombo às comunidades brasileiras abriu margem para 
a exploração e a destruição de alguns territórios, o que, consequentemente, provocou conflitos 
que revelam tanto o racismo ambiental como o institucional ligados ao processo de 
reconhecimento da comunidade quilombola Lagoas. As situações de injustiça ambiental, ao 
nosso ver, estiveram amplamente ligadas às noções de racismo ambiental, pois os relatos 
contidos no Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil demonstram 
como os conflitos ameaçam a existência da comunidade. 
No mais, acredito que a comunidade quilombola Lagoas possui outros pontos, além da 
questão territorial, a serem explorados, a exemplo da memória e a construção da identidade 
quilombola da comunidade. A análise singular proposta neste trabalho, ocorreu para além da 
delimitação da área de concentração do PPGH da UFRN – História e Espaços –, mas esteve 
relacionada, em grande medida, à lógica que circula em algumas comunidades quilombolas no 
Piauí, de que as universidades brasileiras são potencialmente colonizadoras. Desse modo, 
acredito que, a partir de alguns diálogos mais estreitos entre a comunidade acadêmica e os 
117 
 
quilombolas, novos temas possam ser abordados, partindo, é claro, de questões epistemológicas 
da comunidade quilombola Lagoas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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