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Natal/RN 2022 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA QUÍMICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA QUÍMICA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Estudo e otimização do processo de cristalização fracionada a partir do sistema NaCl-CaCl2-H2O Márcia Fernanda Teixeira de Menezes Orientador: Profª. Drª. André Luís Lopes Moriyama Natal/RN 2022 Márcia Fernanda Teixeira de Menezes Estudo e otimização do processo de cristalização fracionada a partir do sistema NaCl-CaCl2-H2O Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Química, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos necessários para obtenção do título de mestre em Engenharia Química, sob a orientação do Profª. Drª. André Luís Lopes Moriyama. Menezes, Márcia Fernanda Teixeira de. Estudo e otimização do processo de cristalização fracionada a partir do sistema NaCl-CaCl2-H2O / Márcia Fernanda Teixeira de Menezes. - 2022. 73 f.: il. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Tecnologia, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Química, Natal, RN, 2022. Orientador: Prof. Dr. André Luís Lopes Moriyama. 1. Águas subterrâneas - Dissertação. 2. Cristalização fracionária - Dissertação. 3. Equilíbrio sólido-líquido do sistema NaCl-CaCl2-H2O - Dissertação. I. Moriyama, André Luís Lopes. II. Título. RN/UF/BCZM CDU 556.3(81) Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Central Zila Mamede Elaborado por Ana Cristina Cavalcanti Tinôco - CRB-15/262 À minha mãe, que me ilumina aqui na Terra. E ao meu Pai, que está me iluminando lá do Céu. AGRADECIMENTOS Agradeço, primeiramente, aos meus pais pelo empenho em plantar em mim, tão humildemente, seus bons valores e por sempre terem me dado a liberdade para fazer as minhas próprias escolhas. Espero, sobretudo, ter dado orgulho às pessoas que mais me orgulham neste universo. À vocês, Lúcia Teixeira e Fernando Menezes. Ao meu irmão Ketson Henrych por ter um coração maior do que os seus dois metros de altura, sempre me apoiando e torcendo pelo meu sucesso. E à minha sobrinha Kerstin, nosso pequeno furacão. À Jhonattan Cabral, que esteve ao meu lado durante esses últimos seis anos, obrigada por todo o apoio e companheirismo. Aos meus amigos Joyce Oliveira, Grazyele Diniz e todos os outros que fizeram parte dessa caminhada. Sem vocês teria sido muito mais difícil. Ao meu orientador André Luís Lopes Moriyama, por toda a paciência e serenidade. À Universidade Federal do Rio Grande do Norte por toda a estrutura e a todos os professores do Departamento de Engenharia Química, que foram essenciais por cada etapa da minha formação. E por fim, mas não menos importante, ao CNPQ pelo apoio financeiro. “Sem coragem, nunca conheceriam o mundo de maneira tão rica quanto ele anseia ser conhecido.” (GILBERT, 2015) RESUMO O semiárido brasileiro, em determinados períodos, sofre com a escassez de água. Além das chuvas insuficientes, outro fator que contribui com esse cenário é a presença de solos cristalinos de rasa profundidade, que prejudicam o armazenamento de água nos aquíferos subterrâneos. Todavia, mesmo se armazenada em elevadas quantidades nos aquíferos, devido à alta quantidade de sais, a água se torna imprópria para consumo humano. De acordo com a Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúde, a longo prazo, águas com elevada quantidade de íons em solução poderão acarretar em complicações de saúde aos indivíduos que a consumirem. Tendo em vista a resolução desse problema, recomenda-se o uso de técnicas de dessalinização. O presente estudo foi realizado com base em dados físico-químicos da água de poços da comunidade de Boa-Fé em Mossoró/RN, a partir de dados coletados por Antas (2017), e foi proposta uma estratégia de recuperação dos sais e de obtenção de uma água apropriada para consumo. Realizou-se, então, um estudo de cristalização fracionária com base em diagramas de equilíbrio sólido-líquido, aplicado ao sistema NaCl-CaCl2-H2O em distintas temperaturas de operação (50 °C e 75 °C). A primeira etapa do projeto se baseou no estudo do sistema a 75 °C, a partir do qual foi possível definir rotas de cristalização. Nessa condição, a rota que mostrou melhor desempenho na remoção dos sais foi a que apresentou extração de 83,85% de NaCl e 72,16% de CaCl2.2H2O. Mesmo os percentuais sendo elevados, eles não se mostraram suficientes para levar o sistema ao valor estabelecido para o padrão de potabilidade. Foi necessário, portanto, iniciar a segunda etapa do estudo, em que foram definidas estratégias de otimização que levassem a uma maior recuperação desses sais: o resfriamento do processo para a temperatura de 50 °C; a diluição da corrente de saída para o sistema a 75 °C; e a diluição da corrente de saída para o sistema resfriado de 75 °C a 50 °C. Com as otimizações, algumas estratégias se mostraram suficientes para a obtenção de uma água dentro dos padrões de potabilidade, resultando em porcentagens de extração de até 97,09% de NaCl e 94,82% de CaCl2.2H2O. Em um terceiro momento, foi efetuada a simulação do processo de cristalização fracionária no programa SPECS v5.63©, com a finalidade comparar as metodologias e de validar a estratégia estabelecida através dos diagramas de equilíbrio. Contudo, o modelo termodinâmico extended UNIQUAC e a equação de estado SRK, utilizados pelo programa, não são os indicados para descrever um sistema eletrolítico. Por essa razão, o estudo comparativo realizado revelou uma diferença significativa entre os métodos, de aproximadamente 11,15%. Verificou-se, portanto, que o estudo se mostrou eficaz na proposição de estratégias de recuperação dos sais e de obtenção de uma água dentro dos padrões de potabilidade. Palavras-chave: Águas subterrâneas. Cristalização fracionária. Equilíbrio sólido-líquido do sistema NaCl-CaCl2-H2O. ABSTRACT The Brazilian semi-arid region, in certain periods, suffers from water scarcity. In addition to insufficient rainfall, another factor that contributes to this scenario is the presence of shallow crystalline soils, which impair water storage in underground aquifers. However, even if stored in high amounts in aquifers, due to the high amount of salts, the water becomes unfit for human consumption. According to Ordinance 2,914/2011 of the Ministry of Health, in the long term, water with a high amount of ions in solution may lead to health complications for individuals who consume it. To solve this problem, the use of desalination techniques is recommended. The present study was carried out based on physical-chemical data from well water in the community of Boa-Fé in Mossoró/RN, based on data collected by Antas (2017), and a strategy for recovering salts and obtaining drinking water. A fractional crystallization study was then carried out based on solid-liquid equilibrium diagrams, applied to the NaCl-CaCl2-H2O system at different operating temperatures (50 °C and 75 °C). The first stage of the project was based on the study of the system at 75 °C, from which it was possible to define crystallization routes. In this condition, the route that showed the best performance in the removal of salts was the one that presented extraction of 83.85% of NaCl and 72.16% of CaCl2.2H2O. Even though the percentages were high, they were not enough to bring the system to the value established for the potability standard. It was, therefore, necessary to start the second stage of the study, in which optimization strategies were defined that would lead to a greater recovery of these salts: cooling the process to a temperature of 50 °C; dilution of the output current to the system at 75 °C, and the dilution of the output current for the system cooled from 75 °C to50 °C. With the optimizations, some strategies proved to be sufficient to obtain water within potability standards, resulting in extraction percentages of up to 97.09% of NaCl and 94.82% of CaCl2.2H2O. In a third moment, the simulation of the fractional crystallization process was carried out in the SPECS v5.63© program, to compare the methodologies and validate the strategy established through the equilibrium diagrams. However, the thermodynamic model extended UNIQUAC and the equation of state SRK, used by the program, are not suitable to describe an electrolytic system. For this reason, the comparative study carried out revealed a significant difference between the methods, of approximately 11.15%. In conclusion, it was found that the study proved to be effective in proposing strategies for recovering salts and obtaining water within potability standards. Keywords: Groundwater. Fractional crystallization. Solid-liquid equilibrium of the NaCl-CaCl2- H2O system.. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Delimitação do semiárido brasileiro. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 Figura 2 – Classificação dos aquíferos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 Figura 3 – Províncias hidrogeológicas do Nordeste brasileiro. . . . . . . . . . . . . . . 19 Figura 4 – Zonas de ocorrência de águas subterrâneas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 Figura 5 – Localização dos aquíferos do RN. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 Figura 6 – Localização da Comunidade de Boa-Fé em Mossoró/RN. . . . . . . . . . . 23 Figura 7 – Esquema geral de um processo de dessalinização. . . . . . . . . . . . . . . 25 Figura 8 – Métodos de cristalização evaporativa e por resfriamento. . . . . . . . . . . . 27 Figura 9 – Representação gráfica dos diagramas ternários. . . . . . . . . . . . . . . . . 28 Figura 10 – Diagrama ternário do sistema NaCl-CaCl2-H2O a (a) 50 °C e (b) 75 °C. . . 35 Figura 11 – Diagrama de blocos do processo de cristalização. . . . . . . . . . . . . . . 36 Figura 12 – Pontos de mistura escolhidos para a cristalização do NaCl. . . . . . . . . . 37 Figura 13 – Pontos de mistura escolhidos para a cristalização do CaCl2.2H2O. . . . . . . 38 Figura 14 – Otimização a partir do resfriamento do sistema. . . . . . . . . . . . . . . . 39 Figura 15 – Otimização a partir da diluição da corrente de saída para o sistema a 75 °C. . 40 Figura 16 – Otimização a partir da diluição da corrente de saída para o sistema a 75 °C e 50 °C. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 Figura 17 – Seleção da base de dados e dos íons no SPECS. . . . . . . . . . . . . . . . 41 Figura 18 – Seleção do modelo termodinâmico no SPECS. . . . . . . . . . . . . . . . . 42 Figura 19 – Plotando o diagrama ternário no SPECS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 Figura 20 – Simulando o processo de cristalização no SPECS. . . . . . . . . . . . . . . 44 Figura 21 – Especificando a composição do sistema. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 Figura 22 – Ponto de alimentação no diagrama ternário. . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 Figura 23 – Ponto da primeira cristalização evaporativa no diagrama ternário. . . . . . . 50 Figura 24 – Ponto de separação do NaCl no diagrama ternário. . . . . . . . . . . . . . . 52 Figura 25 – Ponto da segunda cristalização evaporativa no diagrama ternário. . . . . . . 54 Figura 26 – Ponto de cristalização do CaCl2.2H2O no diagrama ternário. . . . . . . . . 56 Figura 27 – Cristalização do NaCl para a (a) Estratégia A, (b) Estratégia B, (c) Estratégia C e (d) Estratégia D. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 Figura 28 – Cristalização do CaCl2.2H2O para a (a) Estratégia A1, (b) Estratégia B2, (c) Estratégia C3 e (d) Estratégia D4. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60 Figura 29 – Cristalização do CaCl2.2H2O resfriando o sistema de 75 °C a 50 °C. . . . . 62 Figura 30 – Estratégia de cristalização dos sais à 75 °C com a diluição da corrente de saída. 63 Figura 31 – Estratégia de cristalização dos sais utilizando uma etapa a 50 °C e outra a 75 °C e a diluição da corrente de saída. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 Figura 32 – Estudo do ciclo de diluição para a temperatura de 75 °C. . . . . . . . . . . . 66 Figura 33 – Diagramas ternários dos dados calculados pelos SPECS para as temperaturas (a) de 50 °C e (b) de 75 °C. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 Figura 34 – Diagrama ternário dos dados experimentais e calculados pelos SPECS para a temperatura de 50 °C. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 Figura 35 – Diagrama ternário dos dados experimentais e calculados pelos SPECS para a temperatura de 75 °C. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Propriedades físico-químicas do NaCl. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 Tabela 2 – Propriedades físico-químicas do CaCl2. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 Tabela 3 – Dados obtidos no poço da comunidade de Boa-Fé. . . . . . . . . . . . . . . 32 Tabela 4 – Dados de equilíbrio para o sistema NaCl-CaCl2-H2O a 50 °C. . . . . . . . . 33 Tabela 5 – Dados de equilíbrio para o sistema NaCl-CaCl2-H2O a 75 °C. . . . . . . . . 34 Tabela 6 – Dados referentes aos pontos de mistura escolhidos para a cristalização do NaCl. 37 Tabela 7 – Dados referentes aos pontos de mistura escolhidos para a cristalização do CaCl2.2H2O. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 Tabela 8 – Dados obtidos no poço BF1 da comunidade de Boa-Fé. . . . . . . . . . . . 46 Tabela 9 – Concentração dos sais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 Tabela 10 – Dados da corrente de alimentação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 Tabela 11 – Dados da primeira etapa de evaporação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 Tabela 12 – Dados da primeira etapa de cristalização. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 Tabela 13 – Dados da segunda etapa de evaporação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 Tabela 14 – Dados da segunda etapa de cristalização. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57 Tabela 15 – Frações mássicas dos pontos de mistura (M1) e de saturação (S1) definidos para as Estratégias A, B, C e D. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 Tabela 16 – Massa de NaCl recuperada em cada estratégia. . . . . . . . . . . . . . . . . 59 Tabela 17 – Frações mássicas dos pontos de mistura (M2) e de saturação (S2) definidos para as estratégias a, b, c e d. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61 Tabela 18 – Massa de CaCl2.2H2O recuperado em cada estratégia. . . . . . . . . . . . . 61 Tabela 19 – Porcentagem de CaCl2.2H2O recuperado em cada estratégia. . . . . . . . . 62 Tabela 20 – Dados da cristalização à 75 °C considerando a diluição da corrente de saída. 63 Tabela 21 – Dados da cristalização considerando a diluição da corrente de saída e a mescla de temperaturas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 Tabela 22 – Porcentagens obtidas com as estratégias. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65 Tabela 23 – Energia transferida para a evaporação em cada estratégia. . . . . . . . . . . 65 Tabela 24 – Quantidade de sais recuperados em cada ciclo de diluição. . . . . . . . . . . 66 Tabela 25 – Quantidade de sais recuperados no SPECS e no estudo dos diagramas de fases. 69 Tabela 26 – Energia transferida para os cristalizadores na melhor rota de extração. . . . 70 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 2 REFERENCIAL TEÓRICO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 2.1 O SEMIÁRIDO BRASILEIRO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 2.2 AQUÍFEROS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 2.3 PROVÍNCIAS HIDROGEOLÓGICAS DO NORDESTE BRASILEIRO . . 18 2.4 ÁGUAS SUBTERRÂNEAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 2.4.1 Aquíferos do Rio Grande do Norte . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . 21 2.4.2 Localidade de estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 2.5 ANÁLISE DE POTABILIDADE DA ÁGUA . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 2.6 A TECNOLOGIA NO COMBATE À ESCASSEZ DA ÁGUA . . . . . . . . 25 2.6.1 Dessalinização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 2.7 CRISTALIZAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26 2.7.1 Cristalização fracionária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 2.7.2 Representação da cristalização através de diagramas ternários . . . . . 28 2.8 CLORERO DE SÓDIO E CLORETO DE CÁLCIO . . . . . . . . . . . . . 29 2.9 SIMULAÇÃO DE PROCESSOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 2.9.1 SPECS v5.63© . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 3 METODOLOGIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 3.1 COLETA DOS DADOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 3.2 CONFECÇÃO DOS DIAGRAMAS TERNÁRIOS . . . . . . . . . . . . . . 32 3.3 ETAPAS DO PROCESSO DE CRISTALIZAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . 35 3.4 ESTRATÉGIAS DE CRISTALIZAÇÃO FRACIONÁRIA DOS SAIS . . . . 36 3.4.1 Otimização do processo realizando o resfriamento do sistema . . . . . . 39 3.4.2 Otimização do processo realizando a diluição da corrente de saída . . . 39 3.5 ENERGIA TRANSFERIDA PARA A ETAPA DE EVAPORAÇÃO DO CRIS- TALIZADOR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 3.6 ANÁLISE DE CORRELAÇÃO NO SPECS . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 3.7 SIMULAÇÃO DA CRISTALIZAÇÃO NO SPECS V5.63© . . . . . . . . . 43 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 4.1 ANÁLISE DE POTABILIDADE DA ÁGUA . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 4.2 CONCENTRAÇÃO DE SAIS NO SISTEMA . . . . . . . . . . . . . . . . 47 4.3 ETAPAS DA CRISTALIZAÇÃO FRACIONÁRIA . . . . . . . . . . . . . . 48 4.3.1 Alimentação do sistema . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 4.3.2 Primeira etapa: cristalização evaporativa do NaCl . . . . . . . . . . . . 49 4.3.3 Segunda etapa: separação do cristal de NaCl . . . . . . . . . . . . . . . 51 4.3.4 Terceira etapa: cristalização evaporativa do CaCl2 . . . . . . . . . . . . 53 4.3.5 Quarta etapa: separação do cristal de CaCl2.2H2O . . . . . . . . . . . . 55 4.4 ESTRATÉGIAS DE CRISTALIZAÇÃO FRACIONÁRIA DOS SAIS A 75 °C 57 4.4.1 Otimização 1: resfriamento do sistema . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61 4.4.2 Otimização 2 e 3: diluição da corrente saturada de saída . . . . . . . . . 62 4.5 CICLO DE DILUIÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66 4.6 ESTUDO DE CORRELAÇÃO UTILIZANDO O SPECS V5.63© . . . . . . 67 4.7 COMPARAÇÃO ENTRE OS DADOS DE CRISTALIZAÇÃO UTILIZANDO O SPECS V5.63© . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 5 CONCLUSÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71 REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72 14 1 INTRODUÇÃO O semiárido brasileiro sofre, em determinados períodos, com a falta de água, devido aos frequentes momentos de escassez das chuvas. Segundo a Fundação Joaquim Nabuco (FUNDAJ, 2018), outro fator que colabora com a situação é a presença de solos cristalinos de rasa profun- didade, que dificultam o armazenamento de água nos aquíferos subterrâneos. Por isso, mesmo quando armazenada em quantidades consideráveis nesses aquíferos, a elevada salinidade faz com que a água se torne imprópria para consumo humano. Uma das comunidades localizadas nessa região é a de Boa-Fé, em Mossoró/RN, que se situa predominantemente na província hidrogeológica do Escudo Oriental Nordeste e é composta, em sua grande parte, por rochas cristalinas e águas subterrâneas com alto teor salino (CPRM, 2000). De acordo com a Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúde (BRASIL, 2011), a longo prazo, uma água que apresenta elevada quantidade de íons em solução poderá se tornar uma fonte de problemas de saúde aos indivíduos que a consumirem. Tendo em vista a resolução desse incoveniente, territórios do semiárido foram abrangidos pelo Programa Água Doce do Governo Federal. Esse projeto, fundado pelo Ministério do Meio Ambiente no ano de 2004, é responsável pela instalação e manutenção de dessalinizadores na região semiárida, como forma de amenizar o problema da seca, oferecendo água de qualidade para as localidades deficitárias. Os dessalinizadores, em contrapartida, apresentam duas correntes de saída: uma corrente de água doce e uma de água concentrada em sais. Essa segunda corrente, se lançada arbitrariamente no meio ambiente, pode causar a contaminação do lençol freático ou gerar consideráveis impactos ambientais ao solo (NEVES et al., 2017). Desta maneira, visando a redução de efeitos prejudiciais ao meio ambiente, se torna importante uma intervenção que vise ao mesmo tempo a recuperação dos sais e a obtenção de uma água própria para consumo. O uso da cristalização fracionária aparece, então, como uma via para resolução do problema. Em uma operação de cristalização, substâncias que se apresentavam, no início do pro- cesso, no estado líquido, gasoso ou sólido amorfo são transformadas em sólidos cristalinos (COSTA; GIULIETTI, 2012). Porém, se presentes vários solutos em uma mesma solução, a sepa- ração poderá ser realizada através da cristalização fracionária, que é capaz de separar misturas de sais que possuem diferentes solubilidades. As aplicações industriais relacionadas à cristalização fracionária, geralmente, envolvem fases de aquecimento, resfriamento, evaporação, diluição e separação dos sólidos (CISTERNAS; RUDD, 1993). Uma das maneiras de realizar os cálculos que envolvem este tipo de operação unitária é através dos diagramas de equilíbrio sólido-líquido, a partir dos quais é possível representar as diferentes fases do processo, os balanços de massa e os dados de equilíbrio entre as fases. Os diagramas utilizados no presente estudo fazem referência ao sistema NaCl-CaCl2-H2O em duas diferentes temperaturas de operação (50 °C e 75 °C). Um dos sais presente no sistema é o cloreto de sódio, de fórmula química NaCl. Esse sal possui um vasto campo de aplicação, podendo ser usado para impedir o crescimento de microorganismos em alimentos, como parte da 15 cadeia produtiva de diversos artefatos (como vidros, plásticos e borrachas), e até mesmo como conservante (MENDES et al., 2012). O outro sal é o cloreto de cálcio, de fórmula química CaCl2. Em relação a sua aplicação industrial, destaca-se que, a partir da eletrólise ígnea do CaCl2, seja possível a obtenção do cálcio metálico, que pode ser utilizado na eliminação de gases residuais, como agente redutor ou como desoxigenador. Outros derivados desse sal podem ser utilizados na produção de tintas e de fertilizantes (PEIXOTO, 2004). O presente estudo foi realizado com base em dados físico-químicos da água de poços localizados na comunidade de Boa-Fé em Mossoró/RN, a partir de coleta realizada por pes- quisador da Universidade Federal Rural do Semiárido – UFERSA (ANTAS, 2017). Em um primeiro momento, foram definidas rotas de cristalização para o sistema à 75 °C, a rotas foram nomeadas como: Estratégia A1, Estratégia B2, Estratégia C3 e Estratégia D4. Dentre as rotas, foi determinada a que apresentou melhor rendimento entre as demais. Verificou-se, em seguida, se o percentual de sais removido era suficiente para atender aos padrões de potabilidade estabelecidos pelo Ministério da Saúde. Em um segundo momento, ainda em busca de melhores rendimentos, foram estabelecidas três formas de otimização do processo: o resfriamento do sistema para a temperatura de 50 °C, a diluição da corrente de saída aplicada ao sistema a 75 °C e a diluição da corrente de saída aplicada ao sistema resfriado de 75 °C a 50 °C. Tais otimizações foram nomeadas, respectivamente, de Otimização 1, Otimização 2 e Otimização 3. Da mesma maneira, verificou-se se os limites estabelecidos pela Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúdeforam atendidos. Por fim, foi realizada uma simulação do processo de cristalização no programa SPECS v5.63©, assim como efetuado um estudo comparativo com o objetivo de validar a estratégia estabelecida através da análise dos diagramas de equilíbrio. O objetivo do trabalho foi, portanto, estabelecer estratégias que atendessem às especi- ficações definidas pelo padrão de potabilidade, com a finalidade de propor para a comunidade soluções para o problema da água salobra no poço investigado. Sendo interessante, em uma perspectiva futura, a realização de testes experimentais para verificar o sucesso prático das rotas propostas. 16 2 REFERENCIAL TEÓRICO Neste capítulo serão abordados os aspectos teóricos que irão auxiliar na compreensão das atividades propostas para este trabalho, assim como facilitar a interpretação dos resultados obtidos. 2.1 O SEMIÁRIDO BRASILEIRO O semiárido brasileiro exibe como uma de suas características a alternância entre períodos de secas e cheias (SILVA et al., 2011). Com índice pluviométrico médio de 200 a 800 mm anuais ele é considerado, de acordo com a Fundação Joaquim Nabuco (2018), o mais chuvoso em comparação com outras regiões do mundo. Mesmo assim, a frequência da chuva é escassa, dando origem, ocasionalmente, a rigorosos períodos de seca. Além da escassez da chuva, outro fator que agrega à ocorrência das secas na região é a presença de solos cristalinos de rasa profundidade, o que reduz o abastecimento dos aquíferos subterrâneos. O Ministério do Meio Ambiente aponta como principais causas da escassez da água em uma região: a variabilidade temporal e espacial das precipitações, as elevadas taxas de evaporação e a predominância de rochas cristalinas. Tais fatores auxiliam também na ocorrência de águas salobras e salinas, que tornam boa parte da água disponível imprópria para consumo humano (BRASIL, 2012). Elaborado pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, conforme as Resolu- ções n° 155, de 23 de novembro de 2017, e n° 107, de 27 de julho de 2017, o mapa da Figura 1 destaca a atual delimitação do semiárido brasileiro, região que compreende 1262 municípios e que representa aproximadamente 12% do território nacional (SUDENE, 2017). O Rio Grande do Norte, sozinho, engloba 147 desses municípios (CARDOSO et al., 2020). 17 Figura 1 – Delimitação do semiárido brasileiro. Fonte: Elaborado por Sudene (2017). 18 2.2 AQUÍFEROS Os aquíferos são reservatórios subterrâneos de água caracterizados por possuirem for- mações geológicas permeáveis, condição que possibilita o armazenamento de água em grande quantidade (FARIAS, 2016). Eles podem ser classificados de acordo com a porosidade das rochas (FERREIRA et al., 2007), em: • Porosos: que apresentam água armazenada entre os grãos, isto é, possuem os espaços entre as rochas preenchidos por água. A rocha característica desse aquífero é a chamada sedimentar; • Fissurais: que apresentam água circulando pelas fraturas das rochas resultantes de pro- cessos tectônicos, que são relativamente impermeáveis. As rochas características desse aquífero podem ser ígneas ou metamórficas; • Cársticos: que apresentam água armazenada em rochas carbonáticas, as quais produzem fraturas por meio da dissolução cárstica (do carbonato pela água), podendo gerar uma espécie de rio subterrâneo quando há a ocorrência de fraturas consideravelmente extensas. As rochas características desse aquífero podem ser sedimentares, ígneas ou metamórficas. Observa-se, na Figura 2, a representação dos tipos de aquífero mencionados. Figura 2 – Classificação dos aquíferos. Fonte: Elaborado por Ferreira et al. (2007). O acesso às águas subterrâneas confinadas nos aquíferos ocorre, geralmente, através da perfuração de poços. 2.3 PROVÍNCIAS HIDROGEOLÓGICAS DO NORDESTE BRASILEIRO O Nordeste é composto por dois tipos estruturais de províncias hidrogeológicas: emba- samento cristalino e bacias sedimentares. O embasamento cristalino exibe solos comumente rasos, com baixa capacidade de infiltração e reduzida drenagem natural. As águas subterrâneas 19 aparecem, nessas circunstâncias, com características salobras, principalmente por estarem ar- mazenadas em fraturas e estarem em contato por longos períodos de tempo com o substrato rochoso. Enquanto que as bacias sedimentares apresentam solos profundos, com alta capacidade de infiltração e drenagem natural satisfatória, o que propicia o armazenamento de água de boa qualidade no lençol freático (FORMOSO, 2010). Figura 3 – Províncias hidrogeológicas do Nordeste brasileiro. Fonte: Elaborado por CPRM (2000). De acordo com as diretrizes do Programa de Água Subterrânea para o Semiárido Bra- sileiro do Serviço Geológico do Brasil (CPRM, 2000), a região nordeste pode ser dividida em quatro províncias hidrogeológicas, que apresentam as seguintes características: • Província do Escudo Oriental Nordeste: composta, em sua grande parte, por rochas cris- talinas, possuindo águas subterrâneas com elevada taxa de salinidade, havendo também a 20 ocorrência de locais com pequenas bacias sedimentares; • Província do São Francisco: que há a predominância de aquíferos fraturados cársticos com potencialidade baixa e média, se tornando mais amplos se associados ao intemperismo ou à dissolução cárstica acentuada em ambientes formados por calcários ou dolomitos; • Província do Parnaíba: é considerado o maior potencial de águas subterrâneas da região Nordeste, em que as formações geológicas alternam camadas de alto e baixo grau de permeabilidade; • Província Costeira: se refere à faixa litorânea do Brasil, formada por nove subprovín- cias. Os aquíferos com maior índice de produtividade, e que são bastante usados para abastecimento, são os cársticos inconsolidados e fracamente consolidados com idade cenozóica. A Figura 3 representa a faixa territorial compreendida pelas províncias hidrogeológicas descritas. O Rio Grande do Norte, conforme pode-se observar, é constituído pela Província Costeira e pela Província do Escudo Oriental Nordeste. Estando boa parte do Estado inclusa na zona composta, predominantemente, de formações rochosas cristalinas. 2.4 ÁGUAS SUBTERRÂNEAS As águas subterrâneas se caracterizam por estarem localizadas sob a superfície da Terra, preenchendo os espaços vagos entre os grãos do solo, as rochas e as fissuras, sendo a fonte hídrica mais abundante em água doce do planeta (LACERDA, 2012). Figura 4 – Zonas de ocorrência de águas subterrâneas. Fonte: Elaborado por Lacerda (2012). 21 A Figura 4 expressa as zonas de ocorrência das águas subterrâneas: a zona saturada (poros preenchidos por água), a zona não saturada (poros preenchidos por água e ar) e o nível freático. As rochas saturadas permitem o armazenamento de grandes quantidades de água, formando os chamados aquíferos. Segundo Silva et al. (2011), a escassez de águas superficiais aumenta, em todo o mundo, a demanda pelas águas subterrâneas. Estima-se que no Brasil pelo menos metade do abastecimento de água potável tenha como origem os recursos hídricos subterrâneos, sendo possível a extração de aproximadamente 292 milhões de m³/ano de águas subterrâneas através dos mais de 100 mil poços perfurados no País. Contudo, mesmo que a extração de águas subterrâneas seja uma alternativa acessível às comunidades rurais da região nordeste, essas fontes hídricas geralmente apresentam teores elevados de salinidade, sendo inviável para consumo humano, segundo Neves et al. (2017). E, para Formoso (2010), as condições climáticas e a formação cristalina, se somadas, potencializam a problemática das águas subterrâneas salobras do semiárido e compactuam para que, nas comunidades rurais, por falta de opção, as pessoas consumam água com salinidade superior ao indicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que recomenda o limite de 500 ppm. A salinidade das águas subterrâneas pode ser definida através dos teores de sais dissolvi- dos na matriz, sendo o efeito intensificado em regiões áridas e semiáridas. Os mecanismos de salinização podem ocorrerpor processos primários, ou naturais, e secundários, ou antrópicos (FIRMINO, 2017). Alguns estudos foram realizados nesse sentido, de modo que é possível, através de um rol exemplificativo realizado pela autora, atribuir a salinização a alguns fatores, tais como: a dissolução de sais provenientes de halitas, a dissolução natural de evaporitos, a exploração descontrolada de aquíferos, o desmatamento, a irrigação com águas inadequadas e o sistema de drenagem ineficiente. 2.4.1 Aquíferos do Rio Grande do Norte Com a finalidade de realizar uma avaliação dos recursos hídricos subterrâneos existentes no Rio Grande do Norte, foi feita uma síntese considerando os aquíferos presentes no Estado. Na Figura 5 identifica-se a presença de cinco aquíferos: o aquífero Açu, o aquífero Barreiras, o aquífero Aluvião, o aquífero Jandaíra e o aquífero Cristalino. 22 Figura 5 – Localização dos aquíferos do RN. Fonte: Elaborado por Trolei e Silva (2018). O aquífero Açu apresenta constituição majoritariamente arenosa, enquanto que o Bar- reiras apresenta litologia heterogênea, sendo majoritariamente composto por arenitos pouco argilosos, conglomerados e argilas. Já o aquífero Aluvião aparece como sendo uma fonte de água subterrânea que apresenta larguras que variam entre 50 e 400 m ao longo do leito dos rios, e o Jandaíra é constituído por calcários cinzas e cremes, siltitos, folhetos, argilitos e dolomitos. Por fim, o aquífero Cristalino é o que possui maior extensão territorial, ocupando a maior parte do Estado. Ele é constituído por rochas de embasamento cristalino, apresentando água captada com alto teor de sais (TROLEI; SILVA, 2018). 2.4.2 Localidade de estudo A localidade de estudo escolhida foi a Comunidade de Boa-Fé em Mossoró, devido ao alto teor salino identificado nos poços por Antas (2017). Essa região, situada na província hidrogeológica do Escudo Oriental Nordeste, é composta, no geral, por rochas cristalinas e águas subterrâneas com alto teor de salinidade, segundo a CPRM (2000). No contexto de sua localização geográfica, o local apresenta latitude de 05°03’ e longitude de 37°20’. Sendo importante também destacar que a região se situa no Grupos Barreiras, como é possível observar na Figura 6 (BELTRAO et al., 2005). 23 Figura 6 – Localização da Comunidade de Boa-Fé em Mossoró/RN. Fonte: Beltrão et al. (2015). As águas subterrâneas do grupo barreiras se encontram armazenadas em horizontes arenosos e se comportam como um aquífero livre. Nos poços manuais a profundidade varia entre 24 8 e 15 m, captando apenas aquíferos freáticos. As águas que possuem baixa concentração de sais dissolvidos se relacionam, geralmente, às áreas sedimentares. Porém, é possível que existam algumas anomalias relacionadas à contaminação com outros tipos de formação geológica. Em geral, os sedimentos do Barreiras apresentam espessura entre 30 e 50 m e são fontes de recursos de água subterrânea, em que os poços perfurados nessa região atingem comumente o aquífero Jandaíra (LIMA et al., 2006). 2.5 ANÁLISE DE POTABILIDADE DA ÁGUA É comum que a água obtida através de poços artesanais, que muitas vezes são as únicas fontes disponíveis em algumas comunidades, possua uma elevada quantidade de sais. Então, para determinar se ela é própria para o consumo humano, são comparadas suas características físico-químicas com os padrões de potabilidade definidos pela Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúde. Os padrões consideram aspectos como: a condutividade elétrica, a concentração de metais (cálcio, sódio, potássio e magnésio, por exemplo) e a concentração de cloretos. A condutividade elétrica da água é um parâmetro relativo à capacidade de conduzir corrente elétrica, sendo um aspecto proporcional à concentração dos íons dissociados (SOUZA et al., 2015). O limite de condutividade elétrica da água, de acordo com a Portaria 1.914/2011, para o consumo humano é de 1,99 dS.m−1. Os metais presentes na água podem influenciar em sua qualidade. Intoxicações causadas por substâncias metálicas podem se dar de maneira lenta, sendo necessário, portanto, que haja o controle de qualidade para evitar possíveis danos aos consumidores. A dureza da água é calculada através da soma da concentração dos cátions Ca2+ e Mg2+. Ela pode ser uma dureza temporária, resistente à ação de sabões e que ocasiona incrustações, ou permanente, resistente à ação de sabões, porém, não produtora de incrustações. Já o Na+ é um cátion facilmente solúvel em água, por isso grandes quantidades podem ser encontradas dissolvidas, sendo as águas subterrâneas mais concentradas em sódio do que as superficiais. Os íons de K+ aparecem como um elemento presente em diversos alimentos, não existindo evidências científicas sobre o risco à saúde do consumidor, segundo Souza et al (2015). O limite estabelecido pela Portaria 1.914/2011 para a dureza da água é de 500 mg.L−1 e para a concentração de sódio é de 200 mg.L−1, para que a água seja liberada para consumo humano. Os íons potássio (K+) e carbonato (CO2−3 ) não apresentam limites máximos estabelecidos pelo Ministério da Saúde. De acordo com Souza et al. (2015), o íon cloro (Cl−) sofre uma reação ao ser adicionado em ambiente aquoso, formando o ácido hipocloroso, que se dissocia gerando íons hidrogênio e íons hipoclorito. A soma dessas concentrações se chama cloro residual livre, que é o principal responsável pela ação desinfetante da água. Restam, porém, dessas reações íons cloreto em solução, os quais em excesso podem não ser benéficos ao organismo em caso de haver consumo. Também de acordo com a Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúde, a concentração máxima de íons cloreto para água destinada ao consumo humano é de 250 mg.L−1. 25 2.6 A TECNOLOGIA NO COMBATE À ESCASSEZ DA ÁGUA De acordo com Lacerda (2012), diversas alternativas tecnológicas têm sido desenvolvidas para reduzir o problema da escassez de água no semiárido. Dentre as quais são ressaltadas: a implantação de cisternas, os sistemas simplificados para o abastecimento de água, a dessa- linização de águas salobras, as barragens subterrâneas, a mobilização, o controle social e o desenvolvimento tecnológico. O combate à escassez da água exige a implementação de uma série de medidas de conservação e eficiência e, mesmo que a dessalinização represente apenas uma pequena parcela na obtenção da água tratada do mundo, para comunidades locais, essa tecnologia desempenha um papel fundamental (MILLER, 2003). No Brasil, a instalação de estações de tratamento de água para realizar a dessalinização de águas salobras, foi efetuada pelo Governo Federal em 2004, através do Programa Água Doce, com a finalidade de obter água potável para a população que sofre com a escassez. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, foram estabelecidos convênios com os dez Estados que compõe o semiárido: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Sergipe e Rio Grande do Norte. 2.6.1 Dessalinização De acordo com Formoso (2010), três quartos do volume total de água do planeta é salgada e, devido a elevada quantidade de sais, ela se torna inapropriada para o consumo ou para outras atividades do campo. Para se tornar viável para o abastecimento humano, devem ser aplicadas técnicas de dessalinização. Figura 7 – Esquema geral de um processo de dessalinização. Fonte: Adaptado de Torri (2015). Na dessalinização uma corrente salina é alimentada no processo e, através do forneci- mento de energia (na forma de calor, pressão ou eletricidade), duas correntes são produzidas, sendo uma de água dessalinizada e outra concentrada em sais (Figura 7). Os processos de dessa- linização podem ser divididos em processos térmicos e por membrana, que incluem: destilação multiestágios, multiefeitos, por compressão de vapor, solar, por osmose inversa e por eletrodiálise. 26 A escolha do processo mais vantajoso deve ter como base fatores como: a qualidade da fonte de água, a energia requerida, os custos e o volume de água a ser produzido (TORRI, 2015). De acordo com Neves et al.(2017), o rejeito da dessalinização das águas salobras ou salinas, definido anteriormente como concentrado, pode contaminar o lençol freático e gerar consideráveis impactos ambientais no solo. A depender do equipamento e da qualidade da água do poço, é possível que seja gerado um rejeito da ordem de 40 a 70% do total de água salobra coletada. Conforme pesquisa realizada pelo autor, no semiárido do Rio Grande do Norte, a disposição do rejeito em grande parte das comunidades é feita de forma irregular, ocorrendo o lançamento ao meio ambiente sem critério algum. Com o objetivo de evitar impactos ambientais consideráveis, pode-se instaurar um sistema integrado de dessalinização. Nesse sistema, o rejeito pode ser aproveitado na aquicultura, na irrigação de plantas ou na alimentação de caprinos e ovinos, higiene pessoal, limpeza geral e produção de sais, por meio de cristalizadores e/ou evaporadores (LACERDA, 2012; NEVES et al., 2017). 2.7 CRISTALIZAÇÃO Na operação de cristalização, substâncias que inicialmente se apresentam no estado líquido, gasoso ou sólido amorfo, são convertidas em sólidos cristalinos. Na cristalização de soluções, por exemplo, acontece uma mudança de fase em que o soluto, anteriormente diluído, passa a se apresentar no estado sólido, segundo Costa e Giulietti (2012). Esta operação unitária pertence ao grupo das mais antigas do gênero e, para ilustrar esse fato, Beckmann (2013) mencionou o papel das primeiras civilizações das áreas costeiras, que usavam grandes lagos abertos para cristalizar o sal e, posteriormente, utilizá-lo para consumo. Contudo, o sal obtido através do método de evaporação apresentava muitas impurezas, o que tornou necessário, com o passar do tempo, o desenvolvimento de técnicas industriais mais sofisticadas. Processos produtivos que envolvem a cristalização possuem grande importância na indús- tria química, uma vez que a demanda de produtos cristalizados está continuamente aumentando. Produtos químicos como pigmentos, corantes, catalisadores, proteínas, agroquímicos e do tipo alimentício e farmacêutico envolvem cristalização ou precipitação como uma parte essencial de sua fabricação (TAVARE, 1994). Para Costa e Giulietti (2012), a cristalização, no âmbito de processos, se revela como um sistema multicomponente e multifásico com transferência de calor e de massa entre as fases. O modo como o processo é produzido e, até mesmo, as impurezas presentes na solução podem acarretar em uma alteração na forma dos cristais ou em suas características físicas. Portanto, um cristalizador deve operar de maneira a satisfazer as especificações de pureza e tamanho do produto. Para isso, existem várias técnicas de manipulação do sistema, que Tavare (1994) definiu como a classificação dos cristalizadores. Os cristalizadores podem ser classificados, então, de diversas maneiras: 27 • Pelo modo de operação: batelada, semibatelada ou contínuo; • Pela técnica empregada para atingir a supersaturação: resfriamento, evaporação, diluição ou reação química; • Pela forma que os cristais em crescimento são colocados em contato com a solução supersaturada: suspensão ou circulação da solução, de modo a garantir a uniformidade do sistema; • Pelo modo de controle: operação controlada ou não controlada; • Pela quantidade de fases: bifásico, trifásico ou multifásico; • Pelo tipo de sistema: unitário ou multicomponente. Figura 8 – Métodos de cristalização evaporativa e por resfriamento. Fonte: Elaborado por Lewis et al. (2015). A cristalização de uma solução pode se desenvolver por métodos como resfriamento e evaporação do solvente (LEWIS et al., 2015). A operação de evaporação, por exemplo, origina uma solução concentrada. Se a etapa de concentração prosseguir até que a solução chegue em um estado de supersaturação, será possível precipitar o soluto no aspecto de um sólido cristalino (FOUST et al., 1982). Na cristalização por resfriamento ocorre a diminuição da temperatura até que o sistema atinja seu estado supersaturado. Essa técnica é a mais utilizada na indústria e a mais fácil de se controlar. Entretanto, ela requer que a solubilidade seja suficientemente dependente da temperatura para que se atinja um bom rendimento (BECKMANN, 2013). Essas técnicas funcionam de acordo com o ilustrado na Figura 8. 28 2.7.1 Cristalização fracionária Segundo Cisternas e Rudd (1993), quando presentes múltiplos solutos em uma solução, a separação de cada soluto pode ser realizada através da operação de cristalização fracionária. Em outras palavras, esse tipo de cristalização é capaz de separar misturas de sais que diferem em solubilidade. Nesses casos, a presença de um segundo soluto apresenta grande influência no comportamento do primeiro. Por isso, não é possível representar o sistema através de diagramas de fases separados, deve-se procurar um diagrama que represente todo o sistema (FOUST et al., 1982). De acordo com Cisternas e Rudd (1993), as aplicações industriais que envolvem esse tipo específico de operação geralmente envolvem fases de aquecimento, resfriamento, evaporação, diluição e separação dos sólidos. Sequenciando essas etapas é possível estabelecer estratégias de recuperação dos solutos de interesse. 2.7.2 Representação da cristalização através de diagramas ternários Os dados de solubilidade das soluções eletrolíticas aquosas são de grande importância para uma variedade de processos químicos e geoquímicos, sendo uma ferramenta para o projeto e para a simulação de operações unitárias, como a cristalização e a extração sólido-líquido (YANG et al., 2010). Esses dados podem ser representados através de diagramas de equilíbrio de fases. Um sistema que envolve três componentes pode ter a quantidade das substâncias representadas por meio de um sistema de coordenadas ternárias (TREYBAL, 1980). Nesse sentido, destaca-se que o projeto do processo, os balanços de massa e os dados de equilíbrios de fases podem, simultaneamente, ser representados no mesmo diagrama, segundo Cisternas e Rudd (1993). Figura 9 – Representação gráfica dos diagramas ternários. Fonte: Dipippo, Sako and Tester (1999). 29 As representações gráficas do equilíbrio sólido-líquido podem ser demonstradas utilizando- se diagramas ternários, por meio de triângulos equiláteros. Tais diagramas apresentam, como base, a seguinte composição: vértices, que representam os componentes puros, como é possível observar no sistema NaCl-Na2SO4-H2O representado na Figura 9 (DIPIPPO; SAKO; TESTER, 1999); lados, que representam as misturas binárias; e regiões em que coexistem os três com- ponentes. Tais regiões podem ser monofásicas ou bifásicas (sólido-líquido), sendo esta última a mais importante quando se trata de separação entre diferentes componentes. A adição ou a subtração de componentes é realizada através do movimento ao longo da linha que liga o ponto, em uma determinada composição, ao vértice referente ao componente. 2.8 CLORERO DE SÓDIO E CLORETO DE CÁLCIO O cloreto de sódio aparece na natureza em sua forma cristalina cúbica e possui, em seu estado puro, cerca de 60% de cloro e 40% de sódio em massa, segundo Mendes et al. (2012). Na Tabela 1 é possível verificar as principais propriedades do sal. Tabela 1 – Propriedades físico-químicas do NaCl. Propriedades Massa molecular (g.mol−1) 58,44 Forma cristalina Cúbica Cor Translúcido Densidade (g.cm−3) 2,165 Ponto de fusão (°C) 801 Ponto de ebulição (°C) 1413 Fonte: Adaptado de Mendes (2012). O NaCl era usado na antiguidade como um meio de pagamento, sendo a palavra “salário” derivada da palavra “sal”. No século atual, ele é a substância mais usada na manufatura química (PEIXOTO, 1999). Outros produtos de grande importância são extraídos a partir dele, como o carbonato de sódio (Na2CO3) e o hidróxido de sódio (NaOH). O campo de aplicação industrial do NaCl possui uma vasta diversidade. Segundo Mendes et al. (2012), o sal pode ser usado para fins de conserva, de modo a alterar o pH do meio e impedir o crescimento de microrganismos em alimentos; como tempero ouproduto medicinal; na produção de cloro, de vidro, de plásticos, de borrachas e de diversos outros produtos; na indústria de panificação, de laticínios, de sabão e, em menor proporção, em indústrias de tabaco, de explosivos, de cerâmica, de tratamento de águas e etc. Além disso, em países que sofrem com acúmulo de neve no inverno, o sal é utilizado como uma espécie de “limpa gelo” nas estradas, por ser uma substância que diminui o ponto de fusão do gelo, o que facilita o escoamento da água no estado líquido. 30 Já o cálcio é um elemento químico abundantemente encontrado na natureza, principal- mente na forma de gipsita e de anidrita. Em forma de cloreto, porém, não é tão comum. De qualquer maneira, o cloreto de cálcio (CaCl2) pode aparecer em lagos salinos ou depósitos sub- terrâneos, estando presente em soluções aquosas compostas por sais de variados cátions, como magnésio e bromo (SAITO, 2014). Na Tabela 2 é possível verificar as principais propriedades do sal. Tabela 2 – Propriedades físico-químicas do CaCl2. Propriedades Massa molecular (g.mol−1) 110,98 Forma cristalina Cristais ou prismas Cor Branco Densidade (g.cm−3) 2,15 Ponto de fusão (°C) 772 Ponto de ebulição (°C) 1600 Fonte: Elaborado por Mendes (2012). Conforme Peixoto (2004), tanto o cálcio quanto as suas substâncias derivadas possuem uma variedade de usos industriais. Na indústria, por exemplo, a partir da eletrólise ígnea do CaCl2 é possível a obtenção do cálcio metálico, o qual pode ser utilizado na eliminação de gases residuais; como agente redutor; como desoxigenador, dessulfurizador e descarbonizador de ligas metálicas e etc. Enquanto que os compostos derivados podem ser utilizados desde a produção de tintas até a produção de fertilizantes. 2.9 SIMULAÇÃO DE PROCESSOS A simulação computacional, na engenharia química, é uma importante ferramenta uti- lizada para descrever processos, resolvendo sistemas de equações algébricas não lineares e integrando numericamente equações diferenciais ordinárias de forma mais simplificada. Os softwares de simulação fazem uso de variados modelos com o objetivo de representar, dentro de certos limites, o comportamento real de sistemas. Automaticamente, os simuladores são capazes de monitorar erros e de ajustar os métodos de resolução com o intuito de manter a precisão, tornando mais fácil a estruturação e a resolução dos problemas (TORRES, 2014). 2.9.1 SPECS v5.63© O simulador SPECS, desenvolvido no IVC-SEP para o Windows 32 bits, é utilizado para a realização de cálculos de separação e de equilíbrio de fases. Para isso, o programa integra uma variedade de modelos termodinâmicos e algoritmos, que poderão ser aplicados a diferentes sistemas. A versão utilizada no presente trabalho é a 5.63. Com ela, é possível modelar misturas 31 complexas de óleos, de polímeros e soluções aquosas de eletrólitos, fazendo uso de diferentes equações de estado e de modelos de coeficiente de atividade. Outras possibilidades envolvem: a confecção de diagramas P-xy e T-xy; os cálculos que envolvem a regressão de parâmetros de interação binários, a caracterização de óleos, a viscosidade e a pressão de vapor; os diagramas de fase de sistemas eletrolíticos aquosos e etc, sendo este último o mais importante para este trabalho (PRETEL, 2001). 32 3 METODOLOGIA Neste capítulo serão apresentados os materiais e descritos os métodos que foram utilizados para o desenvolvimento do projeto. 3.1 COLETA DOS DADOS A coleta das amostras de água foi realizada por Antas (2017) entre o período de outubro de 2013 e novembro de 2014 em comunidades do Oeste Potiguar, dentre as quais se localiza a comunidade de Boa-Fé em Mossoró. As amostras foram coletadas com um intervalo de 3 meses, com a finalidade de compreender todas as estações do ano. As amostram foram, então, divididas da seguinte maneira: E1 (outubro/novembro), E2 (fevereiro/março), E3 (junho/julho) e E4 (outubro/novembro). Sendo os períodos E1 e E4 secos e os períodos E2 e E3 chuvosos. De cada amostra coletada no poço da comunidade de Boa-Fé (BF) foram obtidas infor- mações relativas à concentração de íons e da condutividade elétrica, de acordo com a Tabela 3. Tabela 3 – Dados obtidos no poço da comunidade de Boa-Fé. Localidade CE K+ Na+ Ca2+ Mg2+ Cl− CO32+ (dS.m−1) (mmol.L−1) BF1 6,20 0,11 25,82 29,49 8,71 64,40 1,40 BF2 6,40 2,03 26,89 33,00 9,00 64,00 0,40 BF3 6,20 0,69 33,18 29,10 17,20 71,40 0,00 BF4 5,72 0,81 55,01 36,50 24,50 66,00 0,00 Fonte: Elaborado por Antas (2017). Dentre os dados disponibilizados, o ponto escolhido foi o BF1, por apresentar baixas quantidades dos íons potássio, magnésio e carbonato, ao mesmo tempo que apresenta uma alta condutividade elétrica, e elevadas quantidades dos demais íons. Considerando, então, a hipótese de que os elementos de baixa concentração não eram impactantes no processo, eles não foram considerados no estudo para fins de facilitação dos cálculos. Com isso, foi possível realizar o estudo da cristalização do sistema NaCl-CaCl2-H2O a partir dos dados encontrados na literatura já citada. 3.2 CONFECÇÃO DOS DIAGRAMAS TERNÁRIOS Após o cálculo da concentração dos sais (NaCl e CaCl2) no sistema, foi escolhida uma maneira de estudar o processo de cristalização. A metodologia escolhida foi através do uso direto dos diagramas de fase ternários. Para isso, foram utilizados diagramas referentes ao sistema NaCl-CaCl2-H2O em duas diferentes temperaturas (75°C e 50°C), o que fornece informações que 33 permitem maior flexibilidade quanto à análise do problema. Os dados de solubilidade da Tabela 4, representados através de frações mássicas, são referentes ao sistema na temperatura de operação de 50 °C e foram disponibilizados por Yang et al. (2010). De acordo com o procedimento experimental descrito pelo autor, a mistura de sais em solução aquosa foi feita em um Erlenmeyer de 250 cm3 com agitação magnética, o qual foi imerso em um termostato para controle de temperatura. Após o estabelecimento do equilíbrio químico, a concentração da fase sólida no resíduo úmido foi identificada através do método de Schreinemaker. Esses dados compõem o diagrama de fases. Tabela 4 – Dados de equilíbrio para o sistema NaCl-CaCl2-H2O a 50 °C. wCaCl2 wNaCl wH2O Fase sólida 0,5634 0,0000 0,4366 CaCl2.2H2O 0,5341 0,0343 0,4316 CaCl2.2H2O 0,4454 0,1296 0,4249 CaCl2.2H2O 0,4348 0,1435 0,4217 CaCl2.2H2O 0,4182 0,1636 0,4183 CaCl2.H2O + NaCl 0,3818 0,1599 0,4583 NaCl 0,3705 0,1637 0,4658 NaCl 0,3306 0,1446 0,5248 NaCl 0,2882 0,1363 0,5755 NaCl 0,2743 0,1343 0,5913 NaCl 0,1768 0,1418 0,6814 NaCl 0,1502 0,1550 0,6949 NaCl 0,1288 0,1683 0,7028 NaCl 0,1148 0,1756 0,7096 NaCl 0,0924 0,1921 0,7155 NaCl 0,0514 0,2269 0,7217 NaCl 0,0285 0,2458 0,7257 NaCl 0,0000 0,2702 0,7298 NaCl Fonte: Adaptado de Yang et al. (2010). Da mesma maneira, os dados de solubilidade na temperatura de operação de 75 °C, disponibilizados por Yang, Liu e Liang (2011), são representados através de frações mássicas, de acordo com a Tabela 5. A medição do equilíbrio de fase, conforme descrito pelo autor, foi realizado fazendo uso de um agitador termostático, sendo utilizado para preparar a solução: água duplamente desionizada e produtos químicos de grau analítico. 34 Tabela 5 – Dados de equilíbrio para o sistema NaCl-CaCl2-H2O a 75 °C. wCaCl2 wNaCl wH2O Fase sólida 0,0000 0,2835 0,7165 NaCl 0,0760 0,2184 0,7056 NaCl 0,1027 0,1927 0,7046 NaCl 0,1521 0,1404 0,7075 NaCl 0,1965 0,1181 0,6854 NaCl 0,2351 0,0957 0,6692 NaCl 0,3203 0,0587 0,6210 NaCl 0,3523 0,0404 0,6073 NaCl 0,3896 0,0283 0,5821 NaCl 0,4025 0,0323 0,5652 NaCl 0,4482 0,0450 0,5068 NaCl 0,4643 0,0457 0,4900 NaCl 0,4602 0,1137 0,4261 NaCl 0,4871 0,1234 0,3895 CaCl2.2H2O + NaCl 0,5000 0,1052 0,3948 CaCl2.2H2O 0,5228 0,0662 0,4110 CaCl2.2H2O 0,5571 0,0256 0,4173 CaCl2.2H2O 0,5727 0,0152 0,4121 CaCl2.2H2O 0,6208 0,0000 0,3792 CaCl2.2H2O Fonte: Adaptado de Yang, Liu e Liang (2011). Foi possível, então, plotar o diagrama ternário para as temperaturas de 50 °C e de 75 °C a partirdo programa OriginPro® 2018. Desse modo, os dados apresentaram o comportamento da Figura 10 (a) para a temperatura de operação de 50 °C e da Figura 10 (b) para a temperatura de 75 °C. As linhas que interligam os pontos A e B são as solubilidades do NaCl e do CaC2.2H2O nas temperaturas de 75 °C e de 50 °C, ou seja, as curvas AC e BC indicam a saturação dos sais simples. Já o ponto C é o ponto eutético (NaCl + CaC2.2H2O), sendo importante ressaltar que o sistema é do tipo eutético simples, isto é, não apresenta sais duplos nem soluções sólidas, de acordo com Yang, Liu E Liang (2011). As regiões bifásicas se referem às regiões de cristalização, tanto do NaCl (de cor amarronzada) quanto do CaC2.2H2O (de cor arroxeada). Observa-se também que o diagrama de 75 °C possui uma maior região bifásica - NaCl + H2O, enquanto que o diagrama de 50 °C uma região bifásica - CaCl2 + H2O - ligeiramente superior. Destacandp-se que, na região acima das duas curvas de solubilidade (AC e BC), a presença de uma região monofásica contendo os três constituintes. Ou seja, a partir da avaliação das rotas de cristalização dos sólidos, será possível utilizar tais particularidades para obtenção da estratégia mais vantajosa. 35 Figura 10 – Diagrama ternário do sistema NaCl-CaCl2-H2O a (a) 50 °C e (b) 75 °C. Fonte: Autoria própria. Com os diagramas plotados e os dados de concentração dos sais em solução, é possível iniciar o estudo do processo de cristalização. As etapas do processo serão descritas na subseção a seguir. 3.3 ETAPAS DO PROCESSO DE CRISTALIZAÇÃO Para o estudo das etapas do processo da cristalização são necessários os dados de frações mássicas das correntes de entrada e, eventualmente, de saída das etapas intermediárias. Com esses dados e com as etapas do processo bem definidas, os balanços de massa serão determinados e os cálculos para obtenção da massa (em grama) das correntes poderão ser realizados. Neste trabalho, os cálculos foram efetuados utilizando a ferramenta Solver do Microsoft Office Excel, todos em conformidade com as regiões presentes nos diagramas ternários, plotados pelo programa OringinPro® 2018. A base do processo seguirá as etapas de evaporação, cristali- zação, separação e secagem, conforme a Figura 11. E destaca-se que o método de cristalização aplicado ao sistema foi o evaporativo, sendo incluído, em uma etapa posterior de otimização, o método de resfriamento. 36 Figura 11 – Diagrama de blocos do processo de cristalização. Fonte: Autoria própria. Onde: F = corrente de alimentação; evap1 = quantidade de solvente evaporada; crist1 = sólido obtido pelo processo de cristalização; S = solução saturada em sais (rejeito do processo). Os balanços de massa e a descrição de cada etapa serão detalhados nos Resultados e Discussões. 3.4 ESTRATÉGIAS DE CRISTALIZAÇÃO FRACIONÁRIA DOS SAIS Foram estudadas, com base no diagrama ternário do sistema NaCl-CaCl2-H2O, algumas estratégias de cristalização dos sais. Para isso, foram escolhidos quatro pontos dentro da região bifásica do NaCl, que foram denominados: A, B, C e D. Dentro do diagrama ternário à tempera- tura de 75 °C (Figura 12), o critério de escolha dos pontos teve como base o envolvimento da maior área disponível no diagrama, de um modo que viabilizasse a recuperação do sal através de um processo de evaporação seguida de cristalização. As condições dessa região permitem a cristalização do cloreto de sódio, sendo, em cada ponto, extraída uma quantidade diferente do sal. Cada ponto foi, então, analisado com o objetivo de verificar qual seria o mais vantajoso. 37 Figura 12 – Pontos de mistura escolhidos para a cristalização do NaCl. Fonte: Autoria própria. A Tabela 6 mostra a fração mássica dos componentes em cada estratégia estabelecida para a extração do NaCl. Tabela 6 – Dados referentes aos pontos de mistura escolhidos para a cristalização do NaCl. H2O NaCl CaCl2 Fração mássica (Ponto A) 0,5700 0,1357 0,2943 Fração mássica (Ponto B) 0,5060 0,1559 0,3381 Fração mássica (Ponto C) 0,4361 0,1780 0,3859 Fração mássica (Ponto D) 0,3973 0,1902 0,4124 Fonte: Autoria própria. Em seguida, para cada ponto da região bifásica do NaCl, foram escolhidos pontos experimentais (1, 2, 3 e 4) dentro da região do CaCl2.2H2O, como é possível visualizar na Figura 13. 38 Figura 13 – Pontos de mistura escolhidos para a cristalização do CaCl2.2H2O. Fonte: Autoria própria. Da mesma maneira, a Tabela 7 apresenta as frações mássicas estabelecidas para os componentes, considerando a região de extração do CaCl2.2H2O. Tabela 7 – Dados referentes aos pontos de mistura escolhidos para a cristalização do CaCl2.2H2O. H2O NaCl CaCl2 Fração mássica (Ponto 1) 0,3591 0,0986 0,5422 Fração mássica (Ponto 2) 0,3032 0,0483 0,6485 Fração mássica (Ponto 3) 0,3186 0,0618 0,6196 Fração mássica (Ponto 4) 0,3689 0,1071 0,5240 Fonte: Autoria própria. No diagrama apresentado, cada número representa o ponto de mistura escolhido, consi- derando a linha de saturação inferior da região bifásica. Da mesma maneira, foi realizado um estudo para verificar qual ponto renderia uma maior quantidade de sal, isto é, qual deles seria mais vantajoso no quesito recuperação do cloreto de cálcio di-hidratado. Considerando que, nas estratégias de recuperação de ambos os sais, as letras representam a extração do cloreto de sódio e os números a extração do cloreto de cálcio di-hidratado, as 39 estratégias avaliadas no trabalho foram: Estratégia A1, Estratégia B2, Estratégia C3 e Estratégia D4. 3.4.1 Otimização do processo realizando o resfriamento do sistema Após a definição da melhor estratégia de acordo com a subseção anterior, três estra- tégias de otimização foram aplicadas. A primeira, denominada Otimização 1, se refere a um resfriamento do sistema, ou seja, uma etapa de 75 °C seguida de uma etapa de 50 °C. Figura 14 – Otimização a partir do resfriamento do sistema. Fonte: Autoria própria. Observa-se, com base na Figura 14, que depois da recuperação do cloreto de sódio, foi realizado um resfriamento na corrente do processo, de modo que a cristalização do segundo sal fosse operada a uma temperatura de 50 °C. Essa mudança de condição operacional foi, portanto, avaliada para verificar se haveria ou não um aumento na quantidade extraída do CaCl2.2H2O. 3.4.2 Otimização do processo realizando a diluição da corrente de saída É possível perceber que, após a recuperação do NaCl e do CaCl2.2H2O, permanece no processo uma corrente concentrada em sais. É interessante que essa corrente, definida como o rejeito do processo, possa ser aproveitada de alguma maneira. Percebeu-se que, diluindo a corrente de saída, o sistema recairia na região de cristalização do NaCl. Foi possível, então, explorar essa característica para tentar realizar a recuperação desses sais remanescentes. Na Figura 15 é possível observar o fluxograma dessa proposta de estratégia, denominada Otimização 2, para um processo isotérmico operando a 75ºC. 40 Figura 15 – Otimização a partir da diluição da corrente de saída para o sistema a 75 °C. Fonte: Autoria própria. O mesmo princípio foi aplicado a um sistema não-isotérmico, operando a 75 e 50 ºC, como é possível verificar na Figura 16. Essa estratégia foi denominada Otimização 3. Figura 16 – Otimização a partir da diluição da corrente de saída para o sistema a 75 °C e 50 °C. Fonte: Autoria própria. Desta maneira, nosso estudo buscará encontrar a estratégia de operação que possua à melhor taxa de recuperação dentre as estudadas e que atenda aos critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde para os padrões de potabilidade. Este resultado poderá ser comparado com uma simulação realizada no programa SPECS v5.63© para o mesmo processo, para fins de verificação da adequação do software ao sistema estudado. 3.5 ENERGIA TRANSFERIDA PARA A ETAPA DE EVAPORAÇÃO DO CRISTALIZADOR A energia transferida para a etapa de evaporação dos cristalizadores foi calculada com base no conceito de quantidade de calor latente, também chamado de calor latente de transição de fase,por ocorrer liberação ou absorção de calor devido a uma mudança de fase das substâncias (PILLING, 2021). A quantidade de calor latente pode ser calculada através da seguinte relação: Q = m.Lv (1) Onde: m = massa de água evaporada; Lv = calor latente de vaporização. 41 A quantidade de calor calculada no trabalho será relativa à quantidade de água evaporada pelo cristalizador evaporativo. Sendo importante ressaltar, para fins de conversão, que 1 cal = 4,184 J. 3.6 ANÁLISE DE CORRELAÇÃO NO SPECS Para o uso do software, primeiramente é necessário selecionar a base de dados de eletrólitos e, logo depois, fazer a seleção dos componentes (H2O, Na+, Ca2+ e Cl− no caso proposto). O programa, então, determinará quais serão os sais formados a partir desses íons. Esta etapa pode ser averiguada na Figura 17. Figura 17 – Seleção da base de dados e dos íons no SPECS. Fonte: Autoria própria. Após a adição dos componentes foi realizada a seleção do modelo termodinâmico. No SPECS v5.63©, para misturas de eletrólitos, o modelo Extended UNIQUAC é o único disponível. 42 A equação de estado selecionada foi a Soave-Redlich-Kwong (SRK), também por ser a única disponibilizada pelo programa, como pode-se observar na Figura 18. Figura 18 – Seleção do modelo termodinâmico no SPECS. Fonte: Autoria própria. Depois da seleção do modelo termodinâmico, é possível plotar o diagrama de fases do sistema. Para isso, estão disponíveis algumas opções de modelos de diagrama: ternário, ortogonal molar, ortogonal mássico e de pontos de saturação de dois sais. O tipo de diagrama escolhido foi o diagrama ternário (ou triangular). Além disso, foi também escolhida a temperatura (K) e a pressão (atm) de operação do sistema, como é possível observar na Figura 19. 43 Figura 19 – Plotando o diagrama ternário no SPECS. Fonte: Autoria própria. Definidas as especificações, o programa pode ser executado. Dentre os resultados obtidos, tem-se o diagrama ternário na temperatura especificada e seus respectivos pontos calculados. Tais informações serão utilizadas para fazer um estudo de correlação com os pontos experimentais coletados para a realização do projeto (YANG et al., 2010; YANG, LIU e LIANG, 2011), isto é, os conjuntos de dados experimentais serão correlacionados aos calculados pelo SPECS v5.63© a fim de se verificar o ajuste entre ambos. 3.7 SIMULAÇÃO DA CRISTALIZAÇÃO NO SPECS V5.63© Para realizar a simulação do processo de cristalização e, posteriormente, validar os cálcu- los realizados pelo estudo de equilíbrio sólido-líquido foi igualmente utilizado o software SPECS v5.63©. Da mesma maneira, primeiro faz-se a seleção da base de dados de eletrólitos e, logo 44 depois, realiza-se a escolha dos componentes (H2O, Na+, Ca2+ e Cl−), como é possível averiguar na Figura 3.9. Depois de selecionar os componentes, foi escolhido o modelo termodinâmico. Do mesmo modo, foi utilizado o modelo Extended UNIQUAC e a equação de estado SRK. Em seguida, foram inseridas as condições iniciais no programa, especificando-se a temperatura de alimentação (K), a temperatura de operação do processo (K), a pressão de operação do processo (atm) e a taxa de evaporação (%). Foi feita também a consideração de que haveria uma perfeita separação entre o sólido e o líquido. Tais especificações podem ser verificadas na Figura 20. Figura 20 – Simulando o processo de cristalização no SPECS. Fonte: Autoria própria. Além disso, era também necessário especificar a composição da alimentação em mols, de acordo com a Figura 21. 45 Figura 21 – Especificando a composição do sistema. Fonte: Autoria própria. Depois dessas etapas, o programa estava apto para executar a simulação. Os resultados produzidos, como a quantidade de sólidos obtidos e a energia transferida ao cristalizador, serão utilizados para comparação com os resultados obtidos através dos cálculos pelo Microsoft Office Excel. 46 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES Neste capítulo serão apresentados e discutidos os resultados que foram obtidos a partir da metodologia descrita anteriormente. 4.1 ANÁLISE DE POTABILIDADE DA ÁGUA Como citado anteriormente na seção 3.1 do capítulo 3, o ponto de coleta escolhido para estudo foi o BF1. Nesta subseção será realizada a verificação da qualidade da água de acordo com os valores obtidos de condutividade elétrica (CE) e das concentrações dos íons presentes em solução. Na Tabela 8 é possível observar esses parâmetros: Tabela 8 – Dados obtidos no poço BF1 da comunidade de Boa-Fé. Localidade CE K+ Na+ Ca2+ Mg2+ Cl− CO32+ (dS.m−1) (mmol.L−1) BF1 6,20 0,11 25,82 29,49 8,71 64,40 1,40 Fonte: Elaborado por Antas (2017). Primeiramente, é possível avaliar o valor da condutividade elétrica da solução. Foi encontrado, para o ponto BF1, um valor de CE igual a 6,20 dS.m−1. Porém, o valor limite definido pela Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúde para as águas próprias para consumo humano é de 1,99 dS.m−1. Verifica-se, então, que o valor está mais do que 3 vezes acima do limite, o que remete a uma elevada concentração de íons dissociados em solução. Pode-se verificar, em seguida, se a concentração de cada íon ultrapassa o limite imposto pela Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúde. O íon K+ apresentou um valor de concentração igual a 0,11 mmol.L−1. Porém, a Portaria não estabelece um limite máximo ou mínimo para a presença de potássio na água usada para consumo humano. Já o íon Na+ apresentou uma concentração no valor de 25,82 mmol.L−1, isto é, uma concentração de 1009,56 mg.L−1. Verifica- se, portanto, que ultrapassa o limite imposto de 200 mg.L−1. Em seguida, avaliando a quantidade de íons Ca2+ e Mg2+ da solução, ou seja, a dureza da água, observa-se um valor de 29,49 mmol.L−1 de Ca2+ e 8,71 mmol.L−1 de Mg2+. Convertendo para a unidade de mg.L−1, observa-se uma concentração de 1178,90 mg.L−1 de Ca2+ e 211,70 mg.L−1 de Mg2+. Sabe-se que o limite máximo permissível para a dureza da água, isto é, para a soma de ambas as concentrações é de 500 mg.L−1. Verifica-se, então, que a soma de ambas as concentrações é de 1390,5968 mg.L−1, isto é, bem superior ao valor limite definido. Porém, o Ca2+ apresenta concentração mais significativa na dureza da água do que o íon magnésio, que representa aproximadamente 15% do valor total da concentração. Em seguida, analisa-se a concentração de 64,40 mmol.L−1 de íons cloreto na solução, sabendo que o limite definido pela Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúde é de 250 mg.L−1. Do mesmo modo, realizando a conversão de mmol.L−1 para mg.L−1, encontra-se um valor 47 de 2283,17 mg.L−1. Percebe-se que a concentração de Cl− é significativamente superior ao limite estabelecido para águas apropriadas para consumo humano. Por fim, a concentração de CO3 2− na solução é igual a 1,40 mmol.L−1. Porém, o Ministério da Saúde não estabelece uma concentração limite para a quantidade de carbonato. De maneira geral, os íons em solução se apresentaram acima do limite superior estabele- cido pela Portaria 2.914/2011 do Ministério da Saúde. Isso significa que, se consumida a longo prazo, a água poderá ser uma fonte de problemas de saúde para os indivíduos que a ingerirem. Porém, tanto o íon potássio quanto o íon carbonato não possuem limites pré-estabelecidos pela Portaria. Por essa razão, assim como pela baixa concentração em solução, para o restante do desenvolvimento do projeto tais elementos não foram considerados para fins de estudo. Da mesma maneira em relação ao magnésio, pois comparada à concentração de íons cálcio na análise de dureza da água, ela não aparece com tanta relevância. Desse modo, o estudo da cristalização foi aplicado ao sistema NaCl-CaCl2-H2O. Na próxima subseção será realizado o cálculo da concentração em g.L−1 dos sais presentes em solução. 4.2 CONCENTRAÇÃO DE SAIS NO SISTEMA Para o ponto escolhido (BF1) foram disponibilizados dados de concentração dos íons presentes na água salobra, a qual apresentava 25,82 mmol.L−1 de Na+, 29,49 mmol.L−1 de Ca2+ e 64,40 mmol.L−1 de Cl−. A partir desses dados, foi possívelcalcular a concentração dos sais NaCl e CaCl2 no sistema, através da proporção estequiométrica entre a quantidade de mols e a concentração molar dos íons. 1 Na+ + 1 Cl– 1 NaCl Pela proporção estequiométrica 1:1 do NaCl, é possível dizer que para formar um mol do sal seria necessária a mesma quantidade de mols de Na+ e de Cl−. No nosso estudo, portanto, seria necessário 25,82 mmol.L−1 de Na+ e de Cl− para que o sal fosse formado. 1 Ca2+ + 2 Cl– 1 CaCl2 Enquanto que, para a formação do CaCl2, em que a proporção estequiométrica é 1:2, seria necessário 58,98 mmol.L−1 de Cl− e 29,49 mmol.L−1 de Ca2+ para que o sal fosse formado com as devidas proporções. O total de Cl− necessário para suprir a quantidade de cátions seria de 84,80 mmol.L−1, porém, encontra-se disponível apenas 64,40 mmol.L−1. Então, foi realizado o ajuste dos dados para os 64,40mmol.L−1 de ânions presentes e foram encontrados os valores da Tabela 9. 48 Tabela 9 – Concentração dos sais. NaCl CaCl2 Concentração (mmol.L−1) 19,61 22,39 Fonte: Autoria própria. Ou seja, ajustando a proporção do dados, é possível obter uma concentração de 19,61 mmol.L−1 de NaCl. E, depois de encontrada a concentração de CaCl2, no valor de 22,39 mmol.L−1, foi realizada a conversão da unidade de concentração. Sabendo, então, que a massa molar do NaCl é 58,44 mg.mmol−1 e que a do CaCl2 é 110,98 mg.mmol−1, é possível converter as unidade de concentração de mmol.L−1 para g.L−1. Encontra-se, portanto, uma concentração de NaCl de 1,1460 g.L−1 e de CaCl2 de 2,4848 g.L−1, isto é, um litro de água apresentava 1,1460 g de NaCl e 2,4848 g de CaCl2. Sendo assim, foi a partir dessa base de cálculo que foi realizado todo o estudo e que foram propostas as estratégias de cristalização dos sais. 4.3 ETAPAS DA CRISTALIZAÇÃO FRACIONÁRIA Nesta seção serão descritas todas as etapas realizadas na elaboração das estratégias de cristalização fracionária, desde a especificação do ponto de alimentação até a extração de ambos os sais. 4.3.1 Alimentação do sistema Após a obtenção das concentrações dos sais na solução, para definir o ponto de alimen- tação foram calculadas as frações mássicas dos componentes. Ou seja, sabendo que em 1 L de água estão presentes 1,1460 g de NaCl e 2,4848 g de CaCl2, é possível definir as frações mássicas de alimentação conforme a Tabela 10. Tabela 10 – Dados da corrente de alimentação. H2O NaCl CaCl2 Fração mássica da alimentação 0,9964 0,0011 0,0025 Fonte: Autoria própria. Tal ponto pode ser visualizado no diagrama ternário na seguinte posição (Figura 22): 49 Figura 22 – Ponto de alimentação no diagrama ternário. Fonte: Autoria própria. Percebe-se, que o ponto de alimentação se encontra bem próximo ao vértice da água, justamente por ser uma pequena quantidade de sais diluída em uma quantidade elevada de água. Nesse ponto, a alimentação se encontra em uma região monofásica, ou seja, o soluto está dissolvido completamente no solvente. Para que a extração dos sais aconteça, é necessário que haja, no diagrama ternário, um deslocamento para uma das regiões bifásicas. Nesse sentido, a solução passa por algumas etapas básicas: evaporação, cristalização, separação e secagem dos sais. Na próxima subseção será mostrado o passo a passo da Estratégia A1 através do diagrama ternário e seus respectivos balanços de massa. 4.3.2 Primeira etapa: cristalização evaporativa do NaCl A alimentação do processo (F), como citado anteriormente, se encontra em uma região monofásica próxima ao vértice da água. Realizando, então, a evaporação do solvente, de modo a traçar uma reta que parte do vértice (100% de água), passando pelo ponto de alimentação (F) e chegando ao ponto M1, cai-se na região bifásica, em que é possível a extração de determinada quantidade de NaCl em estado sólido, como visualizado na Figura 23. Os cálculos de tal procedimento são baseados em balanços de massa geral e por componente. 50 Figura 23 – Ponto da primeira cristalização evaporativa no diagrama ternário. Fonte: Autoria própria. Os balanços que representam essa etapa, podem ser definidos por: • Balanço de massa global: mF = mM1 +mevap1 (2) • Balanço de massa por componente (NaCl): mF .xNaClF = mM1.xNaClM1 +mevap1.xNaClevap1 (3) mM1 = mF .xNaClF xNaClM1 (4) • Balanço de massa por componente (CaCl2): mF .xCaCl2F = mM1.xCaCl2M1 +mevap1.xCaCl2evap1 (5) mM1 = mF .xCaCl2F xCaCl2M1 (6) 51 • Balanço de massa por componente (H2O): mF .xH2OF = mM1.xH2OM1 +mevap1.xH2Oevap1 (7) Calcula-se, então, a massa da água evaporada (evap1) e a massa da solução concentrada em sais (M1) a partir dos balanços de massa descritos. Primeiro, foi obtida uma quantidade de mM1 = 8,4427 g, por meio do balanço por componente do NaCl. Depois, aplicando o valor encontrado no balanço global, foi possível encontrar a quantidade de água evaporada. A composição e a massa da solução inicial e da solução concentrada, após evaporação do solvente, poderão ser verificadas na Tabela 11. Tabela 11 – Dados da primeira etapa de evaporação. H2O NaCl CaCl2 Massa da alimentação (g) 1000,0000 1,1460 2,4848 Fração mássica da alimentação 0,9964 0,0011 0,0025 Massa da solução concentrada M1 (g) 4,8119 1,1460 2,4848 Fração mássica da solução concentrada M1 0,5700 0,1357 0,2943 Fonte: Autoria própria. Observa-se que a massa de água evaporada foi de aproximadamente 995,1881 g, restando uma corrente concentrada em sais (M1). Como no processo considera-se uma separação perfeita, a massa de água evaporada é completamente isenta dos sais. É possível, portanto, acoplar essa corrente com um condensador, para que seja possível recuperar a água em sua fase líquida. A etapa de evaporação requer uma quantidade de energia para que se suceda. Conside- rando, então, que o calor latente de evaporação da água (Lv) é 540 cal.g−1, encontra-se que a energia transferida para a evaporação no primeiro cristalizador seria de aproximadamente 2248,49 kJ. 4.3.3 Segunda etapa: separação do cristal de NaCl No ponto M1, localizado na zona bifásica (NaCl + H2O), verifica-se a presença de uma fase líquida e de uma fase sólida. A fase sólida é composta em sua totalidade por NaCl, enquanto que a fase líquida se apresenta como uma solução saturada (S1). Isto é, nesta etapa, ocorre a separação entre ambas as fases, de modo que a primeira quantidade de sal possa, finalmente, ser obtida a partir do processo. No diagrama ternário da Figura 24 pode ser visualizada a representação gráfica referente a esta etapa e, os cálculos de tal procedimento são também baseados em balanços de massa geral e por componente. 52 Figura 24 – Ponto de separação do NaCl no diagrama ternário. Fonte: Autoria própria. Os balanços que representam essa etapa, podem ser definidos por: • Balanço de massa global: mM1 = mS1 +mcrist1 (8) • Balanço de massa por componente (NaCl): mM1.xNaClM1 = mS1.xNaClS1 +mcrist1.xNaClcrist1 (9) • Balanço de massa por componente (CaCl2): mM1.xCaCl2M1 = mS1.xCaCl2S1 +mcrist1.xCaCl2crist1 (10) mS1 = mM1.xCaCl2M1 xCaCl2S1 (11) • Balanço de massa por componente (H2O): mM1.xH2OM1 = mS1.xH2OS1 +mcrist1.xH2Ocrist1 (12) 53 mS1 = mM1.xH2OM1 xH2OS1 (13) É possível, então, calcular a massa de NaCl cristalizado (crist1) e a massa da solução saturada (S1) a partir dos balanços de massa descritos. Primeiro, foi encontrado que mS1 = 7,7487 g, por meio do balanço por componente para a água. Depois, aplicando o valor encontrado no balanço global, foi possível encontrar a quantidade de sólido obtido nesta primeira etapa de cristalização. A composição e a massa da solução saturada, após cristalização do sal, podem ser observadas na Tabela 12. Tabela 12 – Dados da primeira etapa de cristalização. H2O NaCl CaCl2 Massa da solução concentrada M1 (g) 4,8119 1,1460 2,4848 Fração mássica da solução concentrada M1 0,5700 0,1357 0,2943 Massa da solução saturada S1 (g) 4,8119 0,4520 2,4848 Fração mássica da solução saturada S1 (g) 0,6210 0,0583 0,3207 Massa do cristal (g) 0,0000 0,6940 0,0000 Fração mássica do sólido 0,0000 1,0000 0,0000
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