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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO CÁCIO SILVA DE OLIVEIRA LEGISLAÇÃO DE INCENTIVO À EXPANSÃO DO SETOR EÓLICO BRASILEIRO COMO VIA PARA A REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES NA REGIÃO NORDESTE DO PAÍS NATAL 2020 CÁCIO SILVA DE OLIVEIRA LEGISLAÇÃO DE INCENTIVO À EXPANSÃO DO SETOR EÓLICO BRASILEIRO COMO VIA PARA A REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES NA REGIÃO NORDESTE DO PAÍS Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Orientador: Prof. Dr. Fabricio Germano Alves NATAL 2020 Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) O48l Oliveira, Cácio Silva de Legislação de incentivo à expansão do setor eólico brasileiro como via para a redução das desigualdades na Região Nordeste do país. / Cácio Silva de Oliveira. – Natal, 2020. 66fl.; il. Orientador: Fabricio Germano Alves Trabalho de Conclusão de Curso (Monografia) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, Instituto de Ciências Sociais Aplicadas. Curso de Bacharelado em Direito. 1. Eólica. 2. Nordeste. 3. Regulação. 4. Fomento. 5. Desigualdades. I. Alves, Fabrício Germano, orient. II. Título. CDD: 23 ed. 341.3471 Bibliotecário - Documentalista: Bárbara Costa – CRB/15 806 Dedico este trabalho a minha mãe, Maria dos Prazeres, por ser o exemplo de amor, empatia, dedicação e resiliência que me inspirou a chegar até aqui. AGRADECIMENTOS Agradecer é uma tarefa particularmente difícil, haja vista que cometemos injustiças em dois níveis, o primeiro em esquecer, no ato da escrita, algumas pessoas importantíssimas, o segundo é não agradecer da maneira devida, pois particularmente não considero as palavras que irei tecer aqui suficientes. Dito isto, agradeço a minha mãe, Maria dos Prazeres, por tudo que fez para me ajudar a chegar até este momento. Sem a ajuda e o esforço dela, essa trajetória não seria possível. Agradeço a Deus pela disposição e coragem para enfrentar as batalhas cotidianas, pela resiliência para encarar os acidentes de percurso e pela ajuda nos momentos de dificuldade. Agradeço a Luciano Medeiros pelo apoio incondicional em todos os momentos, pelo companheirismo e pelo incentivo diário. Agradeço ao meu pai Carlindo Barbosa e ao meu irmão Caio Silva pela ajuda e apoio. Agradeço ao professor Fabrício Germano Alves pelo apoio e compreensão durante a realização deste trabalho e pela dedicação e profissionalismo durante todo o curso, seja na condução de disciplinas ou na coordenação de atividades de pesquisa. Obrigado! Agradeço aos meus amigos por nunca me deixarem sozinho nos momentos em que precisei, pelo suporte nas lutas do dia-a-dia e pelos momentos de lazer e descontração. Em especial, agradeço a Ailton Maciel, Rafael Lima, Patrícia Albuquerque, Bárbara Tereza, Silvania Magalhães, Karla Souza e Geórgia Wathier por sempre me motivarem a continuar. Agradeço a Brenda Albuquerque, Luana Ribeiro, Rafael Heitor e Gustavo César pelos profissionais exemplares que são e por todo o apoio que me dedicaram. Sou grato à UFRN e ao IFRN, instituições que considero extensões uma da outra, que me acolheram e foram minha casa a partir de 2009. Agradeço a todos e todas que acreditaram no meu potencial durante essa trajetória e de alguma maneira contribuíram positivamente na minha caminhada. “The creatures outside looked from pig to man, and from man to pig, and from pig to man again; but already it was impossible to say which was which.” (George Orwell, Animal Farm) RESUMO O presente trabalho estuda a legislação de fomento à energia eólica com base no princípio constitucional da igualdade e da redução das desigualdades regionais e sociais, com enfoque na região Nordeste do Brasil. Considerando esses fatores, investiga-se o papel da legislação brasileira de incentivo à expansão do setor eólico como via para o desenvolvimento social do Nordeste, com observância das ações do Estado brasileiro como agente decisivo na implementação de políticas voltadas à ampliação dos benefícios sociais proporcionados pela construção de parques e indústrias do setor eólico. O estudo da desigualdade junto a um fator de mudança social justifica-se em razão da urgente necessidade de redução das desigualdades sociais e regionais, uma vez que o Nordeste é a região mais desigual do país. Através de uma pesquisa exploratória de abordagem quantitativa e qualitativa, discutem-se dados legislativos, demográficos e socioeconômicos em conjunto com uma revisão bibliográfica dos principais trabalhos sobre o tema. A partir de tal discussão é possível demonstrar que a atuação estatal através de leis de fomento à expansão da energia eólica se caracteriza como via importante para a redução das desigualdades no Nordeste do Brasil. Palavras-chave: Eólica; Nordeste; Regulação; Fomento; Desigualdades. ABSTRACT The present monography studies the legislation of wind energy sector promotion based on the constitutional principle of equality and the reduction of regional and social inequalities, focusing on the Northeast region of Brazil. Considering these factors, the role of Brazilian legislation to encourage the expansion of the wind sector as a way to social development in the Northeast is investigated, observing the actions of the Brazilian State as a decisive agent in the implementation of policies aimed at expanding the social benefits provided by the construction of wind farms and industries. The study of inequality with a factor of social change is justified by the urgent need to reduce social and regional inequalities, since the Northeast is the most unequal region in the country. Through an exploratory research with a quantitative and qualitative approach, legislative, demographic and socioeconomic data are discussed together with a bibliographic review of the main works on the subject. From this discussion, it is possible to demonstrate that state action through laws promoting the expansion of wind energy is characterized as an important way to reduce inequalities in Northeast Brazil. Keywords: Wind power; Northeast; Regulation; Promotion; Inequalities. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 12 2 AS DESIGUALDADES NA REGIÃO NORDESTE DO BRASIL ............................. 16 2.1 CONTEXTO HISTÓRICO ........................................................................................ 16 2.2 INDICADORES SOCIAIS ........................................................................................ 18 2.3 POTENCIALIDADES PARA REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES ....................... 23 3 A TUTELA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL QUANTO À REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS E SOCIAIS ............................................................... 25 3.1 O PRINCÍPIO DA IGUALDADE .............................................................................. 25 3.2 O PRINCÍPIO DA REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS E SOCIAIS 28 4 O PAPEL DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA NO FOMENTO AO DESENVOLVIMENTODA ENERGIA EÓLICA NO NORDESTE ........................... 31 4.1 OBJETIVOS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ............................ 31 4.2 REGULAÇÃO DA ENERGIA EÓLICA NO BRASIL .............................................. 33 4.3 EXTRAFISCALIDADE E LEGISLAÇÃO DE INCENTIVO TRIBUTÁRIO AO SETOR ............................................................................................................................ 37 4.3.1 Legislação Federal ....................................................................................................... 38 4.3.2 Legislação Estadual ..................................................................................................... 39 5 A ENERGIA EÓLICA COMO PROPULSORA DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL NO NORDESTE ................................................................................................. 42 5.1 COMPETITIVIDADE DA FONTE EÓLICA NO MERCADO .................................. 42 5.2 CONTRIBUIÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO SOCIAL E A REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES ........................................................................................................ 46 6 CONCLUSÃO .................................................................................................................. 55 REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 58 LISTA DE SIGLAS ABEEOLICA – Associação Brasileira de Energia Eólica ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica CCEE – Câmara de Comercialização de Energia Elétrica CF – Constituição Federal COFINS - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social CONFAZ – Conselho Nacional de Política Fazendária EPE – Empresa de Pesquisa Energética ETENE – Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste FDI – Fundo de Desenvolvimento Industrial do Ceará GINI – Coeficiente de Gini IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços MEC – Ministério da Educação MME – Ministério de Minas e Energia ONU – Organização das Nações Unidas PASEP – Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público PCH – Pequena Central Hidrelétrica PIB – Produto Interno Bruto PIS – Programa Integração Social PROEDI – Programa de Estímulo ao Desenvolvimento Industrial do Rio Grande do Norte PROEOLICA – Programa de Desenvolvimento da Cadeia Produtiva Geradora de Energia Eólica PROINFA – Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica REIDI – Regime Especial para o Desenvolvimento da Infraestrutura STF – Supremo Tribunal Federal STJ – Superior Tribunal de Justiça 12 1 INTRODUÇÃO O Nordeste do Brasil é conhecido pela beleza natural que ostenta, pelo importante patrimônio cultural que detém e também pelos quitutes típicos da culinária local, que é reconhecida internacionalmente. Até pouco tempo, era difícil imaginar que as praias que se espalham pelo litoral e as típicas paisagens da Caatinga e da Mata Atlântica, que permeiam a costa e o interior dos Estados, poderiam abrigar uma relevante fonte de energia renovável, capaz de impulsionar o desenvolvimento sustentável na região e no país: a força e a regularidade dos ventos. A região nordestina ocupa o terceiro lugar no ranking do PIB dentre as cinco regiões do Brasil1 e é composto por nove Estados, que são Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Piauí, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe. Juntos, tais entes federados abrigam uma população de 53.081.950 habitantes, constituindo assim a segunda região mais populosa do país.2 Embora possua extensas riquezas econômicas, a região Nordeste abriga populações que enfrentam uma histórica luta contra a seca e a pobreza, frutos da histórica escassez de políticas públicas voltadas à ampliação do acesso ao emprego e à qualificação da população, bem como pelos demais problemas estruturais enfrentados pela parcela menos abastada de indivíduos residentes na região. A falta de saneamento básico, a dificuldade na obtenção de água potável e a dependência por um sistema de transporte público deficitário, somados a falta de efetividade plena nas ações do poder público acabam por aprofundar as diferenças na distribuição de renda existentes na região, que é a mais desigual do país. Nesse contexto, importante observar que a redução das desigualdades sociais e regionais se constitui como objetivo fundamental da República (art. 3º, inciso III) e também como princípio norteador da ordem econômica (art. 170, inciso VII) no âmbito da Constituição 1 LEÃO, Hellen Cristina Rodrigues Saraiva. PIB do Nordeste cresce acima da média Nacional. Diário Econômico ETENE, Ceará, ano II, n. 117, 2019. Disponível em: https://www.bnb.gov.br/documents/1342439/5804193/117_02_12_2019.pdf/8f2ab569-ac5c-4f8a-0521- f9a07aefcc2b. Acesso em: 01 mai. 2020. 2 IBGE. População nos Censos Demográficos, segundo as Grandes Regiões e as Unidades da Federação. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: https://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Demografico_2010/Sinopse/Brasil/sinopse_brasil_tab_1_4.zip. Acesso em: 30 nov. 2020. 13 Federal. Embora presentes na Constituição Federal, tais princípios ainda não surtem os efeitos desejados no âmbito da sociedade, uma vez que se observam estridentes desigualdades sociais e regionais pelo Brasil, notadamente identificadas pela existência de regiões privilegiadas e de regiões excluídas economicamente ao longo da história. O fato é que o processo de crescimento econômico brasileiro favoreceu algumas regiões, que se tornaram imponentes centros em desenvolvimento, porquanto outras áreas do país foram legadas a uma quase inércia econômica. Assim, as regiões Sul e Sudeste despontaram com altas taxas de industrialização e oportunidades enquanto as demais regiões foram legadas ao subdesenvolvimento,3 situação que começou a mudar no Nordeste somente a partir dos anos 2000, embora sejam necessários muitos avanços para que se alcance o patamar das regiões mais desenvolvidas em conjunto com taxas de distribuição de renda menos desiguais. Na contramão dessa conjuntura, a energia eólica vem despontando como um meio não só capaz de produzir energia elétrica de maneira sustentável, mas também como uma ferramenta apta a contribuir para o desenvolvimento regional bem como para a redução das desigualdades, uma vez que os parques eólicos costumam ser instalados em regiões menos desenvolvidas e consequentemente com maiores necessidades de emprego e infraestrutura. A energia eólica vem obtendo participação cada vez mais expressiva na Matriz Energética Nacional, além de ter aumentado substancialmente sua presença nos leilões de energia elétrica realizados pela Agência Nacional de Energia Elétrica. O Nordeste é a principal região brasileira na produção de energia a partir de fonte eólica e hoje produz 86% da capacidade instalada no país. Além disso, a produção do Nordeste vem batendo recordes e possui um potencial viável de geração que pode chegar a 552 GW, oportunizando a construção de um número significativo de novos parques eólicos, dos quais se pode obter benefícios de ordem social e estrutural – ajudando assim na redução das disparidades entre as regiões4. Sublinha-se que a energia eólica é uma das principais fontes de energia elétrica utilizadas no mundo, principalmente em razão de sua característica renovável, cuja implementação dos parques e a operação dos aerogeradores ocorre com danos mínimos ao meio 3 BERCOVICI, Gilberto. Constituição econômica e desenvolvimento: uma leitura a partir da Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 88. 4 BEZERRA, Francisco Diniz. Energia Eólica no Nordeste. Caderno Setorial ETENE, Ceará,ano IV, n. 66, 2019. Disponível em: https://www.bnb.gov.br/documents/80223/4804489/66_2019_Eolica.pdf/5091550b-0dbb- 9613-8502-c1ef650ad074. Acesso em 15 nov. 2020. p. 1-6. https://www.bnb.gov.br/documents/80223/4804489/66_2019_Eolica.pdf/5091550b-0dbb-9613-8502-c1ef650ad074 https://www.bnb.gov.br/documents/80223/4804489/66_2019_Eolica.pdf/5091550b-0dbb-9613-8502-c1ef650ad074 14 ambiente, se comparada a outros métodos de geração. Assim, aliada a uma política estatal voltada ao desenvolvimento sustentável, a energia eólica detém potencial capaz de impulsionar mudanças sociais e regionais, além de favorecer o meio-ambiente. Assim, pretende-se demonstrar a viabilidade da produção de energia eólica como ferramenta para o desenvolvimento da região Nordeste e como meio para a concretização do princípio da redução das desigualdades regionais e sociais, presente na Constituição Federal. A partir de tal discussão, buscar-se-á uma avaliação de estratégias e/ou métodos capitaneados pelos Poderes Executivo e Legislativo, com vistas a fomentar a expansão da indústria eólica no Nordeste e consequentemente a ampliação dos benefícios sociais em potencial. A investigação de tal problemática por meio de uma revisão da literatura científica faz- se necessária em razão do potencial de expansão da energia eólica nas próximas décadas, processo que se tornará cada vez mais perceptível nas paisagens do Nordeste. É necessário evidenciar o quanto tal expansão afetará a população das áreas com maior potencial eólico e os benefícios sociais que serão obtidos, notadamente no que tange ao emprego e a infraestrutura da região. Ademais, será possível discutir todos esses aspectos sob o vértice do princípio da redução das desigualdades regionais insculpido no art. 43 da Constituição Federal, considerando a energia eólica como ferramenta para concretização desse preceito. Esta pesquisa é, quanto à abordagem, quantitativa e também qualitativa, pois além de discutir dados demográficos, sociais e econômicos, também discute a legislação federal e estadual e seus respectivos impactos no processo de desenvolvimento da indústria eólica na região Nordeste. Quanto à natureza, é uma pesquisa aplicada que busca contribuir com a solução da desigualdade que assola a região geográfica estudada. Em relação ao objetivo, este estudo é exploratório, pois em conjunto com uma revisão bibliográfica visa proporcional um debate mais amplo acerca dos problemas sociais do Nordeste e de como a legislação avançou para incentivar a expansão da geração eólica como meio de transformação social na região. Dessa forma, o presente estudo foi divido em quatro capítulos, onde será abordada, primeiramente, a questão das desigualdades sociais no Nordeste do Brasil, questão relevante para que se compreenda o movimento histórico-econômico que resultou em uma situação de desigualdade severa na região, agravada pelas dificuldades relacionadas à escassez de água causada pela dinâmica climática da área. 15 Após, estuda-se o princípio da redução das desigualdades sociais e regionais e o princípio da igualdade, de modo a explicitar de que forma o Constituinte delimitou as atribuições dos Poderes da República e dos Entes Federados para a consecução de uma sociedade brasileira mais justa e igualitária, visando dirimir as desigualdades históricas que prejudicam o Nordeste, por exemplo. Por conseguinte, analisa-se o papel da legislação brasileira no fomento ao desenvolvimento da energia eólica na região nordeste, considerando os marcos regulatórios do setor, o atendimento aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU e a política tributária voltada ao fomento do setor, através de ações consoantes com a extrafiscalidade. Por fim, uma revisão da literatura existente sobre o tema busca aferir sobre a competitividade da energia eólica no mercado e as contribuições da expansão do setor para o desenvolvimento social e a redução das desigualdades, considerando fatores como geração de emprego e renda, além do desenvolvimento educacional. Dessa forma, será possível verificar se o fomento legislativo ao setor por meio da isenção de tributos e outros benefícios se justifica a partir do impacto socioeconômico causado pelos empreendimentos eólicos nas cidades circunvizinhas. 16 2 AS DESIGUALDADES NA REGIÃO NORDESTE DO BRASIL A região Nordeste do Brasil é vista pela população geral e pelos turistas como um lugar de exuberantes paisagens naturais e especialmente pelas famosas praias e faixas litorâneas. Os retratos da seca também remetem à região, em tiragens que exibem a vegetação da caatinga em conjunto com as dificuldades sociais enfrentadas pela população, que ao longo dos anos faz questão de preservar muitas das características culturais marcantes. Entretanto, o Nordeste é uma região conhecida pelas dificuldades enfrentadas por sua respectiva população, que enfrenta problemas socioeconômicos estruturais, dentre eles a seca em conjunto com a insuficiente distribuição de água potável para as famílias necessitadas. A qualidade de vida dessas pessoas é afetada ainda pelo desemprego dentre outras questões, que só podem ser resolvidas a partir de ações enérgicas do poder público. Tal situação é diagnosticada historicamente pelas pesquisas censitárias realizadas por diferentes institutos, onde o principal deles, o IBGE, fornece dados confiáveis sobre questões sociais tanto nas áreas urbanas quanto no campo. Com base nessas informações, é possível tecer uma breve análise sobre as condições socioeconômicas da região e a partir de tais considerações avaliar de que forma o setor eólico pode contribuir para o processo de mitigação das desigualdades enfrentadas pelos habitantes dos nove Estados que compõem esse segmento do Brasil. 2.1 CONTEXTO HISTÓRICO Nesse contexto, é importante salientar que a identidade cultural de cada um dos nove Estados nordestinos possui diferenças complexas, não podendo a região ser caracterizada como um bloco cultural uno. Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Piauí, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe possuem diferenças culturais entre si, seja no comportamento religioso, na música, nos sotaques, nas vestimentas ou mesmo na culinária. Outrossim, muitas semelhanças culturais se perpetuaram no processo de construção histórico-social da região, fomentando uma forte identidade regional entre os nordestinos5. 5 ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz de. A invenção do Nordeste. Recife: FJN, Ed. Massangana; São Paulo: Cortez, 2001. p. 66 17 No contexto histórico, o Nordeste foi a primeira área a ser “descoberta” pelos portugueses em 1500, ano em que desembarcaram das caravelas onde hoje é a cidade de Porto Seguro, no Estado da Bahia6. Dali alguns anos, Portugal daria início ao processo de colonização do espaço brasileiro, que levaria a profundas alterações nas paisagens e no modo de vida da população nativa, que passou a ser subjugada pelos colonizadores7. O Brasil Colonial transcorreu sem que houvesse uma formação de identidade regional em relação ao nordeste, uma vez que a participação política não era comum aos indivíduos que habitavam a área, estando adstrita somente à família real portuguesa no antigo regime, onde nem mesmo a elite social da colônia possuía liberdades políticas. Segundo Bernardes, “sem Estado nacional e sem vida política mínima, não é possível a emergência da região nem da questão regional”8. A formação da identidade regional começou a engatinhar à medida que os proprietários elitizados, os militares, os clérigos e os comerciantes passaram a transitar entre as fronteiras erigidas pelas capitanias hereditárias em razão de interesses econômicos ou de laços de amizade ou parentesco. Tal movimentação passou a fomentar uma identidade comum entre essesindivíduos, que não era contrária àquela difundida pelos colonizadores, mas diferente em alguns aspectos. Posteriormente, com a ascensão do Império e, posteriormente, da República, a identidade do povo se desenvolveria de maneira mais acentuada 9. Nesse contexto, é importante salientar que a desigualdade era muito comum e vista com normalidade, uma vez que a base da economia colonial era composta por escravos negros e indígenas, que foram obrigados a extrair o pau-brasil e depois a trabalhar na agricultura e no beneficiamento da cana de açúcar, como também em outras atividades agrícolas comuns à época. Por outro lado, enquanto esses indivíduos eram tratados de maneira aviltante, crescia o número de grandes proprietários, comerciantes e outras classes privilegiadas, que dispunham de 6 BOXER, Charles R. O império marítimo português 1415–1825. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 98. 7 AMANTINO, Marcia. O mundo das feras: os moradores do Sertão Oeste de Minas Gerais - Século XVIII. São Paulo: AnnaBlume, 2008. p. 47. 8 BERNARDES, Denis de Mendonça. Notas sobre a formação social do Nordeste. Lua Nova, São Paulo, n. 71, p. 41-79, 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext &pid=S0102- 64452007000200003&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 27 nov. 2019. 9 BERNARDES, Denis de Mendonça. Genealogia, história e propriedade. Integração e ruptura. Seminário Internacional Brasil: de um Império a outro (1750-1850). São Paulo: USP, 2005. 18 benefícios sociais, onde mesmo os mais pobres se encontravam distantes da vulnerabilidade social enfrentada pelos indivíduos subjugados à escravidão e à sobrevivência em condições geralmente sub-humanas10. Desde então, transcorreram muitas mudanças, como a ascensão do Império, a Lei Áurea, a Primeira e a Segunda República, o Regime Militar e, por fim, a atual ordem constitucional, inaugurada pela Constituição Federal de 1988. Nesse sentido, é pertinente analisar o estado de desenvolvimento econômico e social da região Nordeste em comparação com as demais regiões do país à luz dos índices de qualidade de vida hodiernamente utilizados. 2.2 INDICADORES SOCIAIS Considerando a sistemática de exploração a partir da colônia e o histórico de desinteresse político em promover melhorias sociais, é possível averiguar se o princípio da redução das desigualdades regionais insculpido na Constituição Federal tem sido efetivado ou não pelos governos, notadamente pelo desenvolvimento e aplicação de políticas públicas capazes de promover mudanças em busca de uma aproximação da condição socioeconômica entre o Nordeste e as regiões brasileiras mais ricas, considerando as especificidades de cada uma delas. Desse modo, é também possível avaliar o papel da expansão da geração eólica como mecanismo capaz de auxiliar na consumação do intento constitucional voltado à redução das desigualdades regionais em relação a região nordestina. Para efeito de comparação, os nove Estados do Nordeste juntos possuem uma população de 53.081.950 habitantes, equiparando-se a países como Coréia do Sul e superando Espanha e Argentina. Esse nível populacional faz do Nordeste a segunda região mais populosa do país, onde precedida pelo Sudeste, em primeiro lugar com 80.364.410 habitantes, e sucedido pela região Sul, em terceiro lugar com 27.386.891 habitantes11. Contudo, a população da região encontra muitas dificuldades socioeconômicas que se refletem em baixas posições nos rankings de bem-estar social e distribuição de renda. As pessoas 10 BERNARDES, 2007, op. cit., p. 52. 11 IBGE. Sinopse do Censo Demográfico 2010: população nos censos demográficos, segundo as grandes regiões e as unidades da federação. Brasil: Ibge, 2010. Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Demografico_2010/Sinopse/Brasil/sinopse_brasil_tab_1_4.zip. Acesso em: 28 nov. 2020. 19 mais afetadas são aquelas em situação de vulnerabilidade, sem acesso aos serviços básicos como saneamento, alimentação e saúde, cuja ineficiência está ligada a falta de planejamento e gerenciamento pelo poder público. Um exemplo da desigualdade regional que afeta o Nordeste brasileiro é o desemprego, que no trimestre julho-setembro de 2019 esteve na casa dos 14% na região, figurando como a maior taxa de desocupação entre as cinco regiões do país12. A desocupação é um fator agravante em relação à qualidade de vida, vez que a população se vê incapaz de prover o próprio sustento e também o sustento das famílias em razão da falta de oportunidade, recorrendo muitas vezes à informalidade como meio de sobrevivência. A informalidade é uma notória indicação de falha na condução das políticas públicas, que junto a um contexto de instabilidades políticas e econômicas, nos moldes experienciados pelo Brasil nos últimos anos, acaba por aprofundar as desigualdades sociais e regionais, legando o trabalhador a atividades que o invisibilizam perante o ordenamento jurídico, uma vez que a informalidade não dá acesso a direitos ou a qualquer garantia presente na legislação trabalhista. De acordo com Jakobsen13 o trabalho informal consubstancia-se em um conjunto de atividades urbanas exercidas fora do ambiente normativo, geralmente em mercados desregulamentados e competitivos, onde é difícil separar trabalho e capital. Normalmente essas atividades dispõem de baixa remuneração e requerem pouca qualificação formal, ambiente onde o trabalhador encontra também instabilidade no que tange à continuidade da atividade. Diante de tais característica e dos números cada vez mais alarmantes, o trabalho informal é considerado um problema estrutural no Brasil, bem como encontra-se presente em outras Nações em desenvolvimento ao redor do mundo. No caso pátrio, a informalidade vem quebrando recordes e em outubro de 2019 alcançou 24,4 milhões de pessoas trabalhando por conta própria e 11,8 milhões laborando sem carteira assinada, de acordo com dados do IBGE14. 12 IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Trimestral. Rio de Janeiro: IBGE, 2019. Disponível em:ftp://ftp.ibge.gov.br/Trabalho_e_Rendimento/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domicilios_continua/Tri mestral/Quadro_Sintetico/2019/pnadc_201903_trimestre_quadroSintetico.pdf. Acesso em: 28 nov. 2020. p. 5. 13 JAKOBSEN, Kjeld et al. Mapa do trabalho informal: perfil socioeconômico dos trabalhadores informais na cidade de São Paulo. Fundação Perseu Abramo, 2000. 14 GARCIA, Diego. Informalidade no trabalho volta a bater recorde, diz IBGE. Folha de São Paulo. São Paulo, p. 111-111. 31 out. 2019. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2019/10/informalidade-no- trabalho-volta-a-bater-recorde-diz-ibge.shtml. Acesso em: 11 nov. 2020. 20 No caso do Nordeste, o nível de informalidade é o maior do país, alcançando em 2018 a marca de 59% dos trabalhadores da região, seguida pelo Norte com 56,3%. As atividades que mais concentraram esse tipo de relação são os serviços domésticos e a agropecuária, que geralmente absorvem indivíduos que não possuem o ensino fundamental completo, vez que estes ocupam 60% das vagas de trabalho informal15. Diante dessa informação, cabe observar que a educação formal no Nordeste também enfrenta dificuldades, uma vez que a região possui menor índice de escolarização do país, com 86,9% da população, segundo o IBGE. O percentual de pessoas que concluíram o ensino médio na área também deixou o Nordeste na pior posição entre as regiões, com 38,9%. Ademais, o analfabetismo também é um grande problema, uma vez que o Nordeste ostenta índices muito maiores que as demais regiões, chegando a alcançar o dobro da média nacional16. Em contraste com tais dificuldades, o Nordeste ocupa a terceira posição no ranking do PIBpor região, com participação de 14% no montante Nacional, superado pelo Sudeste, em primeiro e pelo Sul, em segundo, com 52,9% e 17% respectivamente17. Contudo, é cediço que a desigualdade e a pobreza são problemas que estão presentes em todo o país, conforme dados obtidos através do Sistema de Contas Regionais, atualizado em 2018 pelo IBGE18. Na seara do PIB per capita, por sua vez, o Nordeste encontra-se, dentre todas as grandes regiões brasileiras, na última posição do ranking.19 O ranking é elaborado pelo IBGE considerando dados de população, PIB regional e PIB per capita nacional, cuja razão gera um índice que é utilizado para fins de classificação. O Nordeste, em 2017, possuía um índice de 0,5 15 IBGE. Síntese de Indicadores Sociais 2019: trabalho por nível de instrução, sexo e cor ou raça. Rio de Janeiro: IBGE, 2019. Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Indicadores_Sociais/Sintese_de_Indicadores_Sociais/Sintese_de_Indicadores_Sociais_2019/ xls/1_Trabalho_xls.zip. Acesso em: 11 nov. 2020. 16 Id. PNAD Contínua 2018: educação avança no país, mas desigualdades raciais e por região persistem. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de- noticias/releases/24857-pnad-continua-2018-educacao-avanca-no-pais-mas-desigualdades-raciais-e-por-regiao- persistem. Acesso em: 11 nov. 2020. 17 IBGE. Sistema de Contas Regionais: Brasil 2018. 2018. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101765_informativo.pdf. Acesso em: 25 out. 2020. p. 4. 18 Id. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua 2019: rendimento de todas as fontes. 2019. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101709_informativo.pdf. Acesso em: 25 out. 2020. p. 10. 19 IBGE. op. cit., 2018, p. 10. 21 enquanto o Norte, penúltimo colocado, obteve 0,6 – terminando à frente da região vizinha. Contudo, o Nordeste aproximou-se da média brasileira, que era de 0,53 em 2017.20 Nesse sentido, cabe explanar sobre a relação entre PIB per capita e desigualdade. De acordo com Cruz et al21 “a desigualdade exerce efeito positivo no crescimento para níveis de PIB per capita mais elevados e efeito negativo para níveis de PIB per capita baixo” ademais, destaca-se que os baixos investimentos em educação mitigam as taxas de crescimento do PIB per capita, ao passo que o aporte de recursos no aumento do nível educacional dos indivíduos alavanca o índice. Destarte, observa-se em regiões onde o nível do PIB per capita é elevado, a desigualdade gera efeitos positivos no crescimento econômico. Contudo, em área que possuem baixos níveis do índice, a desigualdade, além de seus efeitos severos na redução da qualidade de vida da população, contribui para um decrescimento do PIB per capita. Esse fenômeno ocorre em razão do aumento na busca por qualificação devido ao parco investimento público em educação em áreas com desigualdade, mas com PIB per capita alto. Dessa maneira, indivíduos menos abastados tendem a investir em educação, ação que tem potencial para alavancar o índice em regiões menos abastadas, sendo assim, o aumento da qualificação educacional e profissional, além da empregabilidade, são forças motrizes para o crescimento de uma região vítima das desigualdades sociais22. A conjuntura de má classificação da região Nordeste nos indicadores sociais tem inegáveis reflexos na qualidade de vida da população que ali reside. Nesse contexto, é importante observar o posicionamento da região no âmbito do Índice de Desenvolvimento Humano, criado pela ONU, que leva em consideração indicadores de países no que tange à riqueza, alfabetização, educação, esperança de vida e natalidade, com medição de 0 a 1. No Brasil, utiliza-se uma variação desse índice, o IDH Municipal (IDHM) que igualmente considera longevidade, saúde e renda, mas também adequa a metodologia global ao 20 IBGE. Sistema de Contas Reionais: Brasil 2017. Contas Nacionais, n. 68, 2019. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101679_informativo.pdf. Acesso em: 16 mai. 2020. 21 CRUZ, Poliano Bastos da; TEIXEIRA, Arilton; MONTE-MOR, Danilo Soares. O Efeito da Desigualdade da Distribuição de Renda no Crescimento Econômico. Rev. Bras. Econ. Rio de Janeiro, v. 69, n. 2, p. 163-186, 2015. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034- 71402015000200163&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 04 dez. 2019. 22 Ibid. 22 contexto e à disponibilidade de dados brasileiros, sendo considerado melhor aplicável para avaliar o desenvolvimento dos municípios e das regiões metropolitanas do país. Nesse contexto, o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), criado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e atualizado pela última vez em 2010 mostrou que o Nordeste obteve a média 0,663, seguido pelo Norte com 0,667, depois Sul com 0,754, após Centro-Oeste com 0,757 e por fim pelo Sudeste com 0,766, que ocupou a primeira posição. Em comparação com o estudo anterior, de 2000, todas as regiões obtiveram avanços, especialmente o Norte e o Nordeste, que mesmo ocupando as últimas posições do ranking, foram as regiões que mais cresceram em relação às demais. O IDHM nacional, por sua vez, é de 0,72723. Outra métrica importante é o Coeficiente de GINI, que ao avaliar determinados dados de uma região é capaz de mensurar as desigualdades na distribuição de renda ali presentes. Esse índice é importante em razão da ineficiência das métricas de PIB e de renda per capita para aferir a distribuição de riquezas. O coeficiente vai de 0 a 1 e quanto mais próximo estiver de 0 maior é a distribuição, quanto mais perto de 1 maior é a concentração de renda. O Índice de Gini do rendimento médio mensal real domiciliar per capita divulgado pelo IBGE em referência ao ano de 2018 mostrou o Sul com 0,448, o Sudeste com 0,508, o Centro- Oeste com 0,486, o Norte com 0,517 e o Nordeste com 0,520, enquanto a média nacional é de 0,545. Desta feita, observa-se que o Nordeste é a região que mais concentra renda no país, bem como possui o menor rendimento médio mensal (R$ 917,00), obtendo também a pior posição entre as regiões nesse quesito24. Desta feita, considerando os dados evidenciados, é patente situação de desigualdade e vulnerabilidade que atinge o Nordeste e sua respectiva população, quando comparado às demais regiões. Tal situação vem se desenvolvendo em meio a um contexto histórico de pouca valorização da região, que sofre até os dias de hoje com a ausência de políticas públicas e é 23 PNUD, IPEA, FJP. Desenvolvimento humano nas macrorregiões brasileiras: 2016. Brasília: PNUD, IPEA, FJP, 2016. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/20160331_livro- idhm.pdf. Acesso em 05/11/2020. 24 IBGE. PNAD Contínua 2018: 10% da população concentram 43,1% da massa de rendimentos do país. 2019. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de- noticias/releases/25700-pnad-continua-2018-10-da-populacao-concentram-43-1-da-massa-de-rendimentos-do- pais. Acesso em 05/11/2020. 23 fustigada pela seca e pela pobreza, reflexo da falta de oportunidades e do histórico desempenho econômico díspar em relação às regiões mais abastadas. A região alcançou uma melhora nos índices entre os anos 2000 e 2012, quando a situação econômica do país era estável e os programas de transferência de renda implementados pelo Governo Federal passaram por relevante ampliação. Assim, houve o início do processo de desconcentração de renda e melhoria nos índices sociais, além de crescimento econômico acima da média brasileira. Todavia, tais avanços não foram suficientes para garantiro pleno desenvolvimento sustentável da região, que até hoje passa por dificuldades sociais acima da média25. 2.3 POTENCIALIDADES PARA REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES Embora demonstre significativa disparidades em relação às outras regiões no que tange à situação socioeconômica de sua respectiva população, conforme demonstrado pelos índices sociais, a região Nordeste possui potencialidades que podem se consubstanciar em um caminho bem-sucedido para a redução das desigualdades hoje patentes. Desta feita, embora tenha enfrentado um processo de desindustrialização nos últimos anos, a indústria nordestina tem relevante participação no contexto nacional, estando à frente do Centro-Oeste e do Norte, somente superado pelo Sudeste e Sul26. Tal posição reflete um potencial de expansão que pode impactar na geração de emprego e renda, reduzindo as desigualdades no âmbito social, uma vez que a indústria possui participação direta no emprego, correspondendo hoje a 20% do total de empregos gerados no Brasil. Nesse sentido, o fértil terreno industrial do Nordeste possui capacidade para expandir sua atividade, podendo se beneficiar do processo de expansão dos parques eólicos na região, que causam impactos positivos tanto na geração de empregos diretos quanto de indiretos, através do aumento da instalação de fabricas voltadas à produção de torres, pás, dentre outros recursos 25 MARINHO, Emerson; LINHARES, Fabricio; CAMPELO, Guaracyane. Os programas de transferência de renda do governo impactam a pobreza no Brasil?. Rev. Bras. Econ., Rio de Janeiro, v. 65, n. 3, p. 267-288, 2011. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034- 71402011000300003&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 03 dez. 2020. 26 MONTEIRO NETO, Aristides; SILVA, Raphael de Oliveira; SEVERIAN, Danilo. Perfil e dinâmica das desigualdades regionais do Brasil em territórios industriais relevantes. 2019. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/TDs/td_2511.pdf. Acesso em 05/11/2020. 24 destinado à construção de aerogeradores. Tais atividades industriais têm avançado junto à expansão da capacidade instalada, que têm se multiplicado na região. Tal movimentação ocorre porque o Nordeste tem sido reconhecido pelo seu respectivo potencial de geração eólica, que em conjunto aos movimentos mundiais de incentivo à adoção de mecanismos de geração energética com menor potencial poluidor, com vistas à preservação do meio-ambiente e a redução da emissão de gases que influenciam o efeito estufa. Dessa forma, o espaço para a geração de energia a partir de fontes renováveis e não poluentes tem se expandido, movimento que pode ser capitalizado pelo Nordeste em busca da redução de desigualdades sociais e regionais, de acordo com o princípio constitucional correspondente. 25 3 A TUTELA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL QUANTO À REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS E SOCIAIS A ordem jurídica que vige no Brasil desde 1988 é consubstanciada pela Constituição Federal promulgada naquele ano, como resultado do trabalho da Assembleia Constituinte eleita em 1987 após o fim da ditadura militar, que comandou o país por 21 anos. De classificação analítica quanto sua respectiva extensão, a Constituição Federal de 1988 regulamentou diversas áreas e assuntos concernentes ao país, incluindo saúde, educação, segurança e divisão dos poderes, enfatizando ainda os consagrados direitos e garantias fundamentais27. A Constituição Federal estabeleceu diversos princípios norteadores, bem como objetivos a serem alcançados pela Nação, cujas intenções em grande parte se voltaram para a concretização do princípio da igualdade material, com base no qual o ente estatal deve buscar tratar de forma desigual aqueles prejudicados pela desigualdade, de modo a concretizar a justiça social28. 3.1 O PRINCÍPIO DA IGUALDADE O princípio da igualdade material foi estabelecido pela Constituição Federal estabeleceu no caput de seu art. 5º a máxima “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade [...]”, bem como a diferença no tempo de contribuição previdenciária entre homens, mulheres e pessoas com deficiência no âmbito do art. 40, ou ainda o benefício de prestação continuada previsto no art. 203, V29. Dito isso, vale salientar que a igualdade jurídica material pode ser vista como uma igualdade “real”, que visa aplicar, no âmbito social, o conceito de igualdade jurídica formal, considerando, para tanto, as especificidades de cada indivíduo. Dessa maneira, o Estado Brasileiro possui uma Constituição Federal que regulamenta e objetiva o tratamento “desigual entre os desiguais”, buscando proporcionar ajuda àqueles que não possuem condições de obterem per si o acesso a direitos sociais básicos. 27 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 73. 28 NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 431. 29 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm. Acesso em: 1 set. 2019. 26 O desenvolvimento do princípio da igualdade formal teve como marco a Revolução Francesa, quando a população daquele país se insurgiu contra o poder monárquico absoluto, dando origem a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que garantiu algumas liberdades individuais e estabeleceu um tratamento de igualdade do Estado para com a população. Desse modo, a igualdade formal tradicionalmente foi utilizada para garantir a isonomia entre indivíduos no contexto das relações indivíduo-Estado, a exemplo das contendas jurídicas, disputas por propriedades e, de maneira mais ampla, para proteger o cidadão em face dos amplos poderes emanados pelo Estado e por seus respectivos governantes30. Junto à Magna Carta Inglesa de 1215, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão é um dos principais documentos históricos que fundamentam o desenvolvimento dos direitos humanos fundamentais31. Nesse compasso, a queda do Estado absolutista ocasionou consequências que influenciaram o constitucionalismo no Mundo, a exemplo dos movimentos independentistas que promulgaram a Constituição Americana em 1787, inspirada nos ideais da Revolução Francesa32. Conquistadas as liberdades individuais, que incluíam a proteção à propriedade, à segurança e à liberdade, supunha-se que tais benefícios abrangeriam a todos (igualdade formal), mas a realidade fática demonstrou que somente as pessoas melhor abastadas foram beneficiadas, ao passo que os indivíduos com menor poder econômico restaram privados de tais direitos, especialmente no que tange à propriedade, uma vez que não dispunham de recursos para adquiri- las33. Por volta do século XIX a população passou a reivindicar direitos sociais, econômicos e culturais, que marcaram a evolução do Estado Liberal para o Estado Social, quando foram conquistados direitos como a dignidade do trabalho, segurança na necessidade além de acesso à educação e cultura. Assim, os direitos sociais passaram a ser reconhecidos pelas Nações a partir 30 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 559. 31 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. p. 550. 32 Ibid. p. 55 33 MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional – Tomo IV. 3. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2000. p. 4. 27da Constituição Francesa de 1848 e desde a Primeira Guerra Mundial (1914) nenhuma Constituição deixou de abarcá-los, em maior ou menor escala34. Em suma, a partir do Estado Social inicia-se a tutela constitucional concreta para efetivação da igualdade material, ao passo que no Estado Liberal a igualdade tinha cunho formal, somente tutelando hipóteses individualistas. Nesse sentido, Miranda elucida que “na concepção liberal, a liberdade de cada um tem corno limite a liberdade dos outros; na concepção social, esse limite prende-se com a igualdade material e situada” e complementa “esta igualdade material não se oferece, cria-se; não se propõe, efectiva-se; não é um princípio, mas uma consequência”35. Embora tenha por objetivo alterar a realidade e subsidiar políticas que objetivam a redução das desigualdades sociais, a igualdade material não é capaz de promover alterações significativas no âmbito social per si, porquanto se trata de um princípio de ordem jurídica, insculpido no texto constitucional. Embora esteja à frente da igualdade formal em relação às potencialidades para a redução das desigualdades, a isonomia material somente fornece subsídios jurídicos para que o Estado atue contra as injustiças sociais. Diante disso, impõe considerar que para a ocorrência de mudança social efetiva, faz-se necessária uma intervenção estatal propriamente dita na sociedade, cuja ocorrência se dá através de políticas públicas dotadas de especificidade. Nesse contexto, emerge o princípio da igualdade fática, que obriga a busca pela efetivação da igualdade por parte do Estado, caracterizando-se como uma espécie de instrumentalização da isonomia material. Nesse compasso, Cunha Jr. assevera que “[...] a Constituição não se contentou com a igualdade formal. Foi mais além, para também consagrar a igualdade material, na medida em que elegeu como objetivo fundamental do Estado erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais e regionais”36. Assim, resta patente que o Constituinte incluiu na lei maior, além dos preceitos jurídicos garantidores da igualdade em sentido abstrato, meios concretos para compelir o ente estatal à implementação de políticas voltadas à redução das desigualdades sociais, bem como normas capazes de fundamentar a cobrança judicial de ordem individual ou coletiva contra o 34 Ibid. p. 5 35 Ibid. p. 9 36 CUNHA JR., Dirley da. Curso de direito constitucional. Salvador: Juspodivm, 2008. p. 641. 28 Estado, a fim de buscar, coercitivamente, a implementação das diretivas sociais ligadas à isonomia fática37. Nesse sentido, destaca Novelino que “o constituinte originário impôs aos poderes públicos, como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, a adoção de medidas voltadas à redução das desigualdades sociais e regionais” declarando ainda que tal previsão constitucional “não deixa qualquer tipo de dúvida sobre a possibilidade de se extrair do texto constitucional um princípio da igualdade fática”38. É cediço que o princípio da isonomia fática não é amplamente reconhecido pela doutrina, contudo, imperioso ressaltar que o princípio da igualdade fática assume características de instrumento voltado à aplicação prática da isonomia material, no anseio de dirimir as injustiças sociais. Nesse sentido, destaca Agra: “muitas vezes, a quebra da igualdade jurídica tem o escopo de realizar uma igualdade fática, pois, do contrário, tratar de forma isonômica pessoas, bens ou situações desiguais seria ensejar o aumento de desigualdades já existentes”39. Por fim, destaca-se que a igualdade fática foi reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça através do voto exarado pela Min. Regina H. Costa, que o fundamentou da seguinte maneira: “o mandamento de igualdade material [...] conduz à promoção da igualdade fática, pois [...] se há uma razão suficiente para ordenar um tratamento desigual, então está ordenado [...], portanto, o direito à criação de igualdade fática”40. 3.2 O PRINCÍPIO DA REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS E SOCIAIS O princípio da redução das desigualdades regionais e sociais é considerado um desdobramento do princípio da igualdade exarado pelo artigo 5º, caput, da Constituição Federal. Uma vez que o texto constitucional busca promover meios e estratégias para promover a isonomia material na realidade fática, as previsões normativas voltadas à promoção da equidade 37 NOVELINO. op. cit., p. 434. 38 Ibid. p. 434. 39 AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 197. 40 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1210713/RS. Relator: Ministra Regina Helena Costa. Jusbrasil. Brasília, 06 mar. 2018. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/552812164/recurso-especial-resp-1210713-rs-2010-0155536-3/decisao- monocratica-552812174. Acesso em: 30 nov. 2020. 29 entre as regiões do país constituem-se como ferramentas importantes para a construção de uma sociedade mais justa, como pretendeu o Constituinte. Desta feita, o princípio da redução das desigualdades sociais e regionais está insculpido na Constituição Federal como objetivo fundamental da República (art. 3º, inciso III). Tal objetivo revela o anseio do Constituinte pela eliminação da forte desigualdade, comum à realidade brasileira desde a época colonial. Trata-se de um princípio impositivo, dotado de caráter constitucional conformador, que se aplica em conjunto com o objetivo voltado à erradicação da pobreza e da marginalização (art. 3º, III). Ambos os objetivos possuem afinidade e complementaridade em relação ao desenvolvimento nacional (art. 3º, II) e à promoção do bem de todos (art. 3º, IV), alcançando aplicação conjunta para cessação das disparidades econômicas. De acordo com Eros Grau, o enunciado do princípio da redução das desigualdades regionais busca assegurar uma existência digna a todos os indivíduos, sendo esta uma finalidade da ordem econômica estabelecida pela Constituição Federal. Para Grau, esta reconhece explicitamente características infelizmente comuns à realidade nacional: a pobreza, a marginalização e as desigualdades, que se consubstanciam como um quadro de subdesenvolvimento inconteste, que se pretende, entretanto, reparar41. Desta feita, cabe analisar o conteúdo do art. 43 da Constituição Federal42. É possível extrair desse dispositivo a intenção do constituinte pela atenuação das desigualdades regionais, demandando ao legislador ações para aplicação plena da norma, definidas por lei complementar sobre “I - as condições para integração de regiões em desenvolvimento; II - a composição dos organismos regionais que executarão, na forma da lei, os planos regionais, integrantes dos planos nacionais de desenvolvimento econômico e social, aprovados juntamente com estes” (art. 43, §1º). Ademais, medidas como a igualdade de tarifas, a diferenciação de taxas de juros no financiamento de atividades prioritárias e a isenção ou redução de alíquotas tributárias federais figuram como ferramentas de incentivo regional no âmbito do texto constitucional e representam 41 GRAU, Eros R. A ordem econômica na Constituição de 1988. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2018. p. 219. 42 “[...] para efeitos administrativos, a União poderá articular sua ação em um mesmo complexo geoeconômico e social, visando a seu desenvolvimento e à redução das desigualdades regionais”. 30 importantes meios auxiliares da ação estatal na consecução da política voltada à isonomia material. Nesse sentido, é importante evidenciar o disposto no art. 151, I da Constituição Federal que veda à União “instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência emrelação ao Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro” embora admita “a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País”. O referido trecho constitucional veda a instituição de impostos com alíquotas diferentes para cada Estado, mas faz ressalva no que tange à concessão de desonerações fiscais para os casos de promoção da igualdade no desenvolvimento socioeconômico regional, onde se busca promover, por exemplo, a instalação de indústrias e outras empresas em regiões menos abastadas, gerando emprego e renda para a população da região, reforçando assim a aplicabilidade do preceito que visa a redução das desigualdades regionais43. A redução das desigualdades regionais e sociais também foi considerada um princípio norteador da ordem econômica brasileira (art. 170, inciso VII) no âmbito da Constituição Federal de 1988 e avaliza a adoção de medidas econômicas pelo Estado com vistas à consecução desse objetivo Constituinte, que deve ser considerado pelos entes federados na condução das políticas socioeconômicas. Considerando o exposto, observa-se que o Brasil possui fundamentos robustos para justificar a ação estatal na implementação dos princípios da igualdade e da redução das desigualdades regionais. Como o Nordeste é o enfoque do presente trabalho, analisar-se-á no capítulo seguinte o modo como a legislação brasileira, constitucional e infraconstitucional, foi capaz de incentivar a expansão da geração eólica na região. Após, será possível dissertar sobre o impacto social dessa expansão, especialmente com relação às contribuições para a redução das disparidades existentes entre o Nordeste e as regiões mais desenvolvidas. 43 ALVES, Antônio Cláudio. Princípio da Redução das Desigualdades Regionais e Sociais. Revista de Estudos Jurídicos, v. 1, n. 28, 2018. Disponível em: http://www.actiorevista.com.br/index.php/actiorevista/article/view/99. Acesso em: 05 nov. 2020. p. 6 31 4 O PAPEL DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA NO FOMENTO AO DESENVOLVIMENTO DA ENERGIA EÓLICA NO NORDESTE Na atualidade é possível observar diversas iniciativas relacionadas à geração de energia elétrica em conjunto com um baixo impacto ambiental, que visam a diminuição da poluição lançada na atmosfera, incentivando uma perspectiva sustentável para a produção de energia elétrica, fonte de energia mais difundida e utilizada pela humanidade na atualidade. Todavia, a matriz energética mundial é composta por mecanismos de geração elétrica com base na combustão de derivados do petróleo (31,9%) e de carvão (27,1%)44, que são fontes não renováveis e com grande potencial poluidor, conjuntura que vai de encontro, por exemplo, ao Protocolo de Quioto, que visa a redução das emissões através de metas para os países desenvolvidos45. Sob a perspectiva do movimento internacional pela sustentabilidade, vale sublinhar o papel de destaque da matriz elétrica brasileira, que se mostra bastante diferente da matriz mundial, vez que 82% das fontes de energia elétrica utilizadas no país são renováveis, enquanto a média mundial é de 24%46. Todavia, há espaço para avanços com o fortalecimento das energias com menor potencial para impactos ambientais, considerando a legislação internacional como vértice para o desenvolvimento de leis nacionais sobre o tema. 4.1 OBJETIVOS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL A matriz energética mundial com predominância de combustíveis fósseis em conjunto com o aumento das preocupações com a preservação ambiental e com a piora do efeito estufa têm incentivado a adoção de métodos mais sustentáveis para a produção de energia, especialmente no que tange à emissão de carbono. Nesse contexto, abriu-se espaço para o desenvolvimento e expansão, dentre outras, da geração por fonte eólica, que passou a ser adotada de maneira cada vez mais abrangente pelo mundo. 44 INTERNATIONAL ENERGY AGENCY - IEA. Electricity Statistics: detailed, comprehensive annual data on electricity and heat. 2018. Disponível em: https://www.iea.org/statistics/electricity/. Acesso em: 30 mai. 2019. 45 MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Protocolo de Quioto. Disponível em: https://www.mma.gov.br/clima/convencao-das-nacoes-unidas/protocolo-de-quioto.html. Acesso em: 04 nov. 19. 46 EMPRESA DE PESQUISA ENERGÉTICA - EPE. Balanço Energético Nacional 2018. Disponível em: http://epe.gov.br/pt/abcdenergia/matriz-energetica-e-eletrica. Acesso em: 30 maio. 2019. 32 Nesse contexto, vale salientar a importância dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), lançados em 2015 como parte da agenda da Organização das Nações Unidas que visa combater a pobreza e a desigualdade, enquanto incentiva a adoção de fontes limpas de energia elétrica com vistas à redução do aquecimento global. Dentre os objetivos, todos se coadunam com a temática explorada neste trabalho, com destaque para o objetivo n. 10 - Reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles (ODS 10) e o objetivo n. 7 - Assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todos (ODS 7). O referido projeto, capitaneado pelas Nações Unidas, é de grande interesse internacional e vem influenciando nas ações políticas dos chefes de governo, que cada vez mais buscam adequar suas respectivas ações aos objetivos traçados pela agenda, subscrita pela Assembleia Geral da ONU, da qual fazem parte 193 países47. A base de sustentação energética do Brasil está na fonte hidrelétrica, que embora seja um método de geração não poluente, ocasiona severos impactos de ordem ambiental e social na área onde é implantado, uma vez que o funcionamento das turbinas requer uma grande quantidade de água represada nos reservatórios da usina. Em razão de tais impactos, a modalidade hidrelétrica vem acumulando perdas de competitividade frente a outros métodos de geração energética48. Na esteira das preocupações mundiais, o setor de geração eólica vem ganhando cada vez mais espaço na matriz energética dos países. No caso do Brasil, a fonte eólica atingiu 9% de participação na matriz nacional em 2019, figurando como a segunda fonte renovável mais relevante no país, atrás somente da fonte hidráulica, que hoje detém 64% da matriz. Todavia, a rápida expansão da geração eólica no país merece atenção, uma vez que começou a se intensificar somente a partir de 2014, quando possuía 3,6% da matriz energética nacional49. 47 BUZZO, Bruna. ODS da ONU: 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. eCycle. Disponível em: https://www.ecycle.com.br/6149-ods.html. Acesso em: 30 out. 2020. 48 ROCHA, Camilo. O impacto ambiental das hidrelétricas da Amazônia. 2019. Nexo. Disponível em: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/09/23/O-impacto-ambiental-das-hidrel%C3%A9tricas-da- Amaz%C3%B4nia. Acesso em: 30 mai. 2020. 49 EPE. Anuário Estatístico de Energia Elétrica 2019. Rio de Janeiro: EPE, 2020. Disponível em: https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/PublicacoesArquivos/publicacao- 160/topico-168/Anu%C3%A1rio%20Estat%C3%ADstico%20de%20Energia%20El%C3%A9trica%202020.pdf. Acesso em: 30 out. 2020. p. 63. 33 4.2 REGULAÇÃO DA ENERGIA EÓLICA NO BRASIL O crescimento da energia eólica no Brasil é fruto de décadas voltadas ao aperfeiçoamento de tecnologias e estudos sobre a capacidade de geração pela força dos ventos, em diferentes regiões do país. Os estudos acerca do potencial eólico brasileiro começaram nos anos 1970, quando o processamento de dados anemométricos colhidos em aeroportos brasileiros constatou a viabilidade técnica para implantação de aerogeradores de pequeno porte em Fernando de Noronha e nas praias do Nordeste50.A primeira turbina fixada em solo brasileiro foi instalada em Fernando de Noronha no ano de 1992. Esta possuía 23 metros de altura e foi destinada somente a testes, que foram percussores de estudos mais robustos, que foram responsáveis pelo aprofundamento dos conhecimentos sobre o potencial eólico brasileiro e sedimentaram o terreno para a instalação de novas turbinas no país. A partir de então, a tecnologia se desenvolveu gradualmente em algumas regiões, com destaque para o estado do Ceará, onde, posteriormente, foram instaladas turbinas de até 45 metros de altura51. Um marco importante na atividade regulatória do energético foi a Emenda Constitucional n. 09 de 1995, que autorizou o Estado a efetuar intervenções na economia e contratar empresas públicas e privadas para garantir o monopólio das atividades relacionadas à exploração de petróleo pela União. Embora voltado ao setor petrolífero, esse marco deu início a uma transição no papel estatal perante o setor energético, seara onde antes não costumava intervir, abrindo caminho para, algum tempo depois, subsidiar as ações para regulação das novas energias52. Considerado um segmento promissor, o setor eólico subsistiu sem muitos incentivos até meados de 2001, quando eclodiu a crise energética nacional. Essa crise ocorreu porque o 50 AMARANTE, O. A. C., BROWER, M., ZACK, J.; SÁ, A. L. Atlas do potencial eólico brasileiro. 2001. Disponível em: http://www.cresesb.cepel.br/publicacoes/download/atlas_eolico/Atlas%20do%20Potencial%20Eolico%20Brasilei ro.pdf. Acesso em: 10 nov. 2019. 51 ANEEL. Energia Eólica: Projetos em Operação no País. [s. d.]. Disponível em: http://www2.aneel.gov.br/aplicacoes/atlas/energia_eolica/6_6_1.htm. Acesso em: 10 nov. 2020. 52 BRASIL. Emenda Constitucional n° 9, de 09 de novembro de 1995. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc09.htm. Acesso em: out. 2020. 34 país acabara de atravessar um período de crescimento econômico que não foi acompanhado pela capacidade de abastecimento elétrico, causando assim o racionamento. Em razão de tal conjuntura, o governo federal passou a incentivar a geração de energia a partir de fontes limpas, para além da fonte hidrelétrica. Nesse contexto surgiu o Programa Emergencial de Energia Eólica (PROEÓLICA), criado a fim de viabilizar a implantação de 1050 MW através de parques eólicos até o fim de 2003, assegurando a compra da energia produzida nos empreendimentos pela Eletrobrás, durante 15 anos.53 O PROEÓLICA foi o primeiro programa voltado diretamente às fontes de energias renováveis no Brasil, implementado pela Medida Provisória n. 2152-2/2001, cuja ementa aduz “Cria e instala a Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica, do Conselho de Governo, estabelece diretrizes para programas de enfrentamento da crise de energia elétrica e dá outras providências”. O objetivo do programa, para além da necessidade de segurança energética, consistia na promoção de desenvolvimento econômico, social e ambiental, demonstrando desde tal época o potencial da energia eólica para a redução das desigualdades, através do progresso econômico-social.54 O PROEÓLICA, em razão de entraves técnicos e burocráticos, não conseguiu atingir os objetivos definidos no momento da publicação da medida provisória que o criou, embora tenha favorecido o ingresso de diversas empresas advindas do exterior no mercado nacional de energia eólica, contexto que ensejou a criação, pelo Governo Federal, de uma legislação mais robusta para o setor.55 No ano seguinte foi criado o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica, o PROINFA, através da Lei n. 10.438/2002. Com base em financiamento concedido pelo BNDES, o programa estabeleceu a implantação de 3300 MW, potência que foi dividida em três partes de 1100 MW para aquisição de energia elétrica respectivamente de fonte eólica, 53 Id. Medida Provisória n. 2152-2, de 01 de junho de 2001. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2152-2.htm. Acesso em 01 dez. 2020. 54 Id. Resolução nº 24, de 05 de julho de 2001. Brasília, 2001. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/resolu%C3%A7%C3%A3o/RES24-01.htm. Acesso em: 10 nov. 2019. 55 ALVES, Jose Jakson Amancio. Análise regional da energia eólica no Brasil. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional, v. 6, n. 1, 2010. Disponível em: http://rbgdr.net/012010/artigo8.pdf. Acesso em: 03 dez, 2020. p. 17 35 biomassa, ou pequenas centrais hidrelétricas, definindo, ainda, um índice de nacionalização de 60% dos equipamentos destinados à produção de energia.56 Nesta senda, cabe destacar que a expressão “fontes alternativas” é rechaçado por especialistas, que preferem utilizar a denominação “renováveis não convencionais” ou ”novas renováveis”. Elbia Gannoum, especialista do setor e presidente da ABEEólica prefere o termo “energias complementares”, uma vez que “[...] nossa matriz elétrica tem 65% de hídrica, e vamos manter essa fatia majoritária durante os próximos 20, 30 anos. Assim, as fontes eólica, solar, biomassa e PCH entram na matriz como complementares”.57 O PROINFA ofereceu subsídios através do BNDES na ordem de 70% dos custos de cada projeto, com exclusão de bens e serviços importados. Além disso, foram celebrados contratos de compra de energia a longo prazo pela Eletrobrás, que assegurava aos produtores de energia eólica uma receita mínima correspondente a 70% da energia contratada pela comercializadora, função que ficou a cargo da Eletrobrás no contexto do PROINFA, além de proteção contra os riscos do mercado de curto prazo58. Esse mecanismo é conhecido como feed- in e é utilizado pelo poder público com vistas a incentivar o desenvolvimento de algum projeto, a exemplo da expansão das energias renováveis.59 Ao final, foram instalados 52 parques eólicos no país por meio do PROINFA, totalizando 1298,6 MW de potência.60 Importante destacar um dos objetivos iniciais do PROINFA, que buscava a “valorização das características e potencialidades regionais e locais, com criação de empregos, capacitação e formação de mão-de-obra”61, o que demonstra que o projeto busca o desenvolvimento regional desde sua respectiva gênese. Estima-se que o PROINFA tenha gerado 56 BRASIL. Lei nº 10.438, de 26 de abril 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/leis/2002/L10438.htm. Acesso em: 03 dez, 2020. 57 SAFATLE, Amália. Os impactos sociais das novas renováveis. Página 22. 2017. Disponível em: https://pagina22.com.br/2017/08/24/os-impactos-sociais-das-novas-renovaveis/. Acesso em: 17 nov. 2020. 58 ALVES, op. cit., p. 18. 59 ALVES, op. cit., p. 20. 60 ABEEÓLICA. Números ABEEólica: fevereiro de 2019. Disponível em: http://abeeolica.org.br/wp- content/uploads/2019/02/N%C3%BAmeros-ABEE%C3%B3lica-02.2019.pdf. Acesso em 01 dez. 2020. p. 05 61 MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA. Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica. Disponível em: https://ppp.worldbank.org/public-private- partnership/sites/ppp.worldbank.org/files/documents/PROINFA-ANEXO1-InstitucionalMME_0.pdf. Acesso em 01 dez. 2020. 36 cerca de 150 mil empregos diretos e indiretos durante o período de construção dos parques, bem como no período de operação.62 Desta feita, tal política pode ser considerada como um desdobramento do princípio da redução das desigualdades sociais e regionais, vez que disponibiliza meios para que as regiões com aptidão para exploração da energia eólica possam receber investimentos. É sabido, ademais, que a região Nordeste é o principal polo eólico do Brasil desde o início dos anos 2000, motivo por que tal política pode ser considerada um incentivo ao desenvolvimento dessa região. Um fator importanteque ajudou a indústria eólica a expandir-se foi a crise econômica mundial iniciada em 2008, que ocasionou forte redução nos investimentos destinados ao setor eólico pelas grandes potências mundiais. Devido a falta de demanda e ao excedente nos estoques, os produtores de peças e aerogeradores precisaram exportar suas respectivas produções para os países em desenvolvimento a preços reduzidos e um dos destinos foi o Brasil. Dessa forma, houve um incremento no nível tecnológico dos parques eólicos, tornando a produção de energia mais competitiva a partir desse formato. Além disso, outro fator atrativo foram os incentivos e preços subsidiados que estavam em curso no país, em razão do PROINFA, permitindo assim que as empresas adquirissem financiamentos via BNDES para a construção dos parques.63 Dada a importância do PROINFA para o crescimento da exploração eólica em solo brasileiro, especialmente na região Nordeste, outro fator preponderante para o avanço do setor foi a inserção da fonte eólica em leilões competitivos a partir de 2009. Dois anos depois, em 2011, o setor eólico experienciou a primeira contratação expressiva de energia elétrica no âmbito dos leilões, na monta de 2.905 MW, firmando-se nesse período como a segunda fonte de energia elétrica mais competitiva do país.64 Nesta senda, evidenciam-se boas perspectivas para o mercado de energia eólica no Brasil, dada a previsão de uma expansão considerável do setor nos próximos anos, especialmente no âmbito da região Nordeste. A partir da inserção da energia eólica nos leilões de energia, no ano de 2009, diversas mudanças ocorreram na área, que obteve rápida expansão, de modo a 62 ALVES, op. cit., p. 19. 63 MELO, Elbia. Fonte eólica de energia: aspectos de inserção, tecnologia e competitividade. estudos avançados, v. 27, n. 77, p. 125-142, 2013. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ea/v27n77/v27n77a10.pdf. Acesso em: 01 mai. 2020. p.12 64 Ibid., p. 01. 37 ensejar maior competitividade da eólica no mercado, com consequente aumento do potencial para desenvolvimento social nas áreas onde os empreendimentos se fazem presentes. 4.3 EXTRAFISCALIDADE E LEGISLAÇÃO DE INCENTIVO TRIBUTÁRIO AO SETOR O Estado Social busca manter serviços básicos voltados à melhoria da qualidade de vida da população. Para isso, necessita obter receitas para sustentar o aparelho público, utilizado em prol da consecução de objetivos insculpidos na Constitucional Federal. Para isso, utiliza-se dos tributos, forma impositiva para que a população contribua com o projeto nacional, onde cada tributo possui uma destinação de recursos prevista pelo ordenamento jurídico. Nesse diapasão, importante salientar o conceito de extrafiscalidade, que se configura no momento em que um tributo é utilizado não para fins de custeio ou estruturação da máquina pública ou ordenação do uso de determinado bem, mas sim quando esse imposto é manejado pelo Estado com vistas a incentivar ou desencorajar comportamentos de atores econômicos de maneira proporcional aos interesses do coletivo social. Essa estratégia é empregada através de tributação progressiva ou regressiva, ou mesmo pela concessão de benefícios ou incentivos fiscais à determinada atividade ou setor econômico65. Para Marins, a extrafiscalidade é um fator regulador importante para o regramento da política econômica, uma vez que esta interfere diretamente no âmbito social através da regulação da distribuição de riquezas no país66. Em outras palavras, a extrafiscalidade tem o fito de “prestigiar situações tidas como social, política ou economicamente importantes, atingindo objetivos distintos e valores importantes”67. Busca-se, então, averiguar a efetividade dos benefícios concedidos ao setor eólico pelo Estado brasileiro com vistas a impulsionar o desenvolvimento da geração de energia elétrica através da força dos ventos, considerando o princípio da superação de desigualdades regionais e sociais, que está ligado aos potenciais benefícios socioeconômicos obtidos pela expansão da força eólica no Nordeste do país. 65 DA SILVA, Lediane Rano Fernandes. Extrafiscalidade, incentivos fiscais: ausência de igualdade e justiça no desenvolvimento regional. Revista Argumentum-Argumentum Journal of Law, v. 10, p. 227-244, 2019. Disponível em: http://ojs.unimar.br/index.php/revistaargumentum/article/view/1042. Acesso em: out. 2020. p. 228-229. 66 MARINS, James. Tributação e política. Livro 6. Curitiba: Juruá, 2005, p. 36-37. 67 DA SILVA, op. cit., p. 229. 38 4.3.1 Legislação Federal O intento do Governo Federal em expandir a produção de energia renovável no Brasil iniciou-se com o PROEÓLICA e obteve maior desenvolvimento durante a implantação do PROINFA. Ambos os programas foram efetivamente iniciados após a edição e publicação das respectivas medidas provisórias, pelo presidente da República, com fulcro no art. 62 da Constituição Federal. O PROINFA, lançado pelo governo através da Lei n. 10.438/2002 é voltado ao estímulo de fontes complementares de energia elétrica, de maneira geral. Tal programa permitiu o desenvolvimento das novas energias de uma maneira geral, entretanto, a energia eólica foi capaz de se destacar no contexto da geração e dos leilões de energia capitaneados pela CCEE, mostrando-se como fonte competitiva em relação às demais. Nessa conjuntura, a União buscou fortalecer o desenvolvimento do braço setorial composto pelas novas energias, trabalhando então em desonerações fiscais com fins de incentivo à expansão das energias eólica e solar, particularmente. Assim, foram criadas leis, resoluções e decretos que baratearam o custo para a implantação dos empreendimentos eólicos, em especial no que tange à aquisição de maquinário e demais equipamentos para a implantação dos parques. Um dos incentivos mais importantes na seara tributária é o Regime Especial para o Desenvolvimento da Infraestrutura (REIDI) criado pela Lei n. 11.488/2007 que, de acordo com Bezerra68, “beneficia com suspensão da exigência da Contribuição para o Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) incidentes sobre bens e serviços” com enfoque nos empreendimentos cujo objetivo é a construção de infraestrutura nos segmentos de portos, transportes, energia, irrigação e saneamento básico.69 A Lei n. 13.097/2015, por sua vez, reduziu a zero as alíquotas do PIS/PASEP, da COFINS, do PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação que incidem sobre a importação 68 BEZERRA., op. cit., p. 13. 69 BRASIL. Lei nº 11.488, de 15 de junho de 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11488.htm. Acesso em: 05 dez. 2020. 39 de peças para montagem de aerogeradores70, facilitando assim a estruturação de parques eólicos. Embora a legislação tenha mantido a taxação para importação de aerogeradores inteiros, a medida foi comemorada pelo setor eólico, uma vez que contribuiu para o aumento da competitividade da energia obtida através dos ventos.71 Outro incentivo importante às eólicas é consubstanciado nos Convênios ICMS, que são celebrados entre a União, na figura da CONFAZ e os Estados. Esses acordos precisam de ratificação das Assembleias Legislativas para fazerem efeito e no caso específico reduzem a taxação do ICMS sobre produtos de determinado setor. O art. 100 do Código Tributário Nacional prevê o referido instrumento nos seguintes termos: “Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e dos decretos: [...] IV - os convênios que entre si celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios72.
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