Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
ROTINAS QUE AFETAM AS ESCOLHAS ALIMENTARES DAS FAMÍLIAS: Uma revisão de literatura Débora da Silva Soares Chaves¹; Rosiane Rodrigues dos Santos²; Davison Arruda da Silva ¹ Debora da Silva Soares Chaves discente do curso de nutrição (Universidade da Amazônia - Unama) ² Rosiane Rodrigues dos Santos discente do curso de nutrição (Universidade da Amazônia - Unama) Davison Arruda da Silva docente do curso de nutrição (Universidade da Amazônia - Unama) E-mail para correspondência: deborasoares26@gmail.com; rosianerodrigues2006@gmail.com RESUMO Os pais influenciam a alimentação que está agregada ao poder aquisitivo, ao nível de escolaridade e conhecimento nutricional, fator que costuma ser decisório para formação do hábito alimentar na primeira infância. O objetivo desse estudo é de revisar a literatura sobre a influência das rotinas dos pais na formação dos hábitos alimentares da criança na primeira infância e na família. Trata-se de um estudo de revisão de literatura, realizado com artigos obtidos através de pesquisas nas bases de dados Scientific Eletronic Library Online (SCIELO), Google Acadêmico e Periódicos da Capes, em idiomas português, inglês e espanhol nos últimos 5 anos. Foram identificados 84 artigos para a elaboração e construção do presente estudo, porém depois de uma refinada análise observamos que apenas 15 poderiam ajudar na composição e construção desse material. Identificou-se que os estilos parentais que parece mais associados a prejuízos alimentares da criança, são os que se relacionam à formas controladoras e/ou negligentes. Por outro lado, o estilo parental de apoio parece buscar entender os sinais e desejos internos do filho e estimular sua integração com o meio social ao qual está inserido. Quanto mais cedo os pais compartilharem refeições saudáveis com as crianças, mais rápido ela irá entender a importância da alimentação como ato protetor para evitar excesso de peso, obesidade e doenças crônicas. Os pais sendo o foco das intervenções alimentares podem influenciar de forma ativa na preferência e no desenvolvimento dos hábitos alimentares infantis bem como de toda a família. Palavras chave: Comportamento alimentar, conhecimento, crescimento e desenvolvimento, dieta, doença crônica, escolaridade, família. Abstract Parents influence diet, which is linked to purchasing power, level of education and nutritional knowledge, a factor that is usually decisive for the formation of eating habits in early childhood. The objective of this study is to review the literature on the influence of parents' routines on the formation of children's eating habits in early childhood and within the family. This is a literature review study, carried out with articles obtained through searches in the Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Google Scholar and Capes Periodicals databases, in Portuguese, English and Spanish over the last 5 years. 84 articles were identified for the preparation and construction of this study, but after a refined analysis we observed that only 15 could help in the composition and construction of this material. It was identified that the parenting styles that seem most associated with children's eating disorders are those that are related to controlling and/or negligent forms. On the other hand, the supportive parenting style seems to seek to understand the child's internal signals and desires and encourage their integration with the social environment in which they are inserted. The sooner parents share healthy meals with children, the faster they will understand the importance of nutrition as a protective act to avoid overweight, obesity and chronic diseases. Parents being the focus of dietary interventions can actively influence the preference and development of children's eating habits as well as the entire family. Key words: Eating behavior, knowledge, growth and development, diet, chronic illness, education, family. 2 INTRODUÇÃO A sociedade contemporânea vivencia uma rotina bem diferente se compararmos à de outras gerações. Tudo gira em torno do instantâneo, acelerado, tudo tem que ser imediato uma vez que estamos na era digital. No entanto, essa velocidade acaba influenciando rotinas de alimentação em indivíduos de todas as faixas etárias, inclusive de crianças. A maioria é cercada por estresses cotidianos, exemplos: trabalho fora de casa, acompanhar o desenvolvimento dos filhos na escola, rotina da família dentro e fora de casa, alimentação e nutrição da família, dentre outros assuntos intrínsecos, dificultando o acesso a uma alimentação caseira e saudável (SCHUBERT; SCHNEIDER; MÉNDEZ, 2021). Desde os primórdios da humanidade, a alimentação é uma questão fundamental para a sustentação da vida. No decorrer das eras históricas, o cardápio tornou-se mais amplo. Porém, nos últimos anos as escolhas alimentares dos brasileiros apresentaram um significativo aumento no consumo de alimentos processados e ultraprocessados e diminuição da ingestão de alimentos in natura (MELO et al., 2020). De acordo com Melo et al. (2020), no mundo atual, repleto de fast-foods e facilidades trazidas pelos alimentos industrializados, a alimentação saudável tem sido deixada de lado, tal fator é cada vez mais refletido em pesquisas acerca de problemas trazidos com a má alimentação. A Obesidade abdominal, atualmente acometendo milhares de brasileiros, também denominada como obesidade androide, é caracterizada pelo aumento da concentração de gordura na região abdominal, sendo esta considerada um fator de risco independente para distúrbios metabólicos (FRÖHLICH et al., 2019). A prevalência de obesidade abdominal vem crescendo nos últimos anos, sendo mais frequente nas mulheres do que nos homens. Além disso, uma associação significativa entre obesidade abdominal e mortalidade é verificada na literatura científica. O médico e nutrólogo argentino Pedro Escudero recomendou, em 1934, que uma alimentação saudável fosse aquela qualitativamente completa, quantitativamente suficiente, harmoniosa em sua composição e apropriada à sua finalidade e a quem se destina. Durante muito tempo, as preocupações em relação à alimentação estiveram centradas no elevado consumo de alimentos com alto teor de açúcar, sódio e gordura. As preocupações são pertinentes, já que o elevado 3 consumo desses alimentos, aliado a fatores como sedentarismo e estresse, está relacionado à incidência de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (MARTINELLI; CAVALLI, 2019). Na literatura, existe um consenso de que a etiologia da obesidade é bastante complexa, apresentando um caráter multifatorial. Envolve, portanto, uma gama de fatores, incluindo os históricos, ecológicos, políticos, socioeconômicos, psicossociais, biológicos e culturais. Ainda assim, nota-se que, em geral, os fatores mais estudados da obesidade são os biológicos relacionados ao estilo de vida, especialmente no que diz respeito ao binômio dieta e atividade física (CUNHA, 2022). Tais investigações se concentram nas questões relacionadas ao maior aporte energético da dieta e na redução da prática da atividade física com a incorporação do sedentarismo, configurando o denominado estilo de vida ocidental contemporâneo. A partir do final dos anos 1990, o termo “promoção de práticas alimentares saudáveis” começa a marcar presença nos documentos oficiais brasileiros. Aliada à promoção de estilos de vida saudáveis, a promoção de práticas alimentares saudáveis se constitui uma estratégia de vital importância para o enfrentamento dos problemas alimentares e nutricionais do contexto atual. Segundo as Nações Unidas, promover exige que o Estado implemente políticas, programas e ações que possibilitem a progressiva realização do direito à alimentação, definindo, com isso, metas, recursos e indicadores para esse fim (GOMES JUNIOR; BORGES, 2019). Mas o que levou a população a mudar o padrão alimentar como passar dos anos? O quanto temos de poder de decisão sobre nossas escolhas alimentares? Por que comemos o que comemos? Por qual motivo a disponibilidade dos alimentos saudáveis está cada vez mais difícil? Essas e outras reflexões nos levam à necessidade de entendermos como funciona o processo de tomada de decisão até levarmos um alimento à boca (MELO et al., 2020). Através desse trabalho buscamos encontrar respostas com o auxílio das literaturas existentes, revisando os trabalhos bibliográficos atuais para que possamos responder a essas e as demais perguntas concernentes a este tema, identificando os desafios que permeiam o cotidiano de milhares de pessoas e como podemos ajudar a partir de estratégias dentro da educação nutricional e comportamental. Trazer para o público em geral um esclarecimento sobre uma alimentação saudável e qualidade de vida, uma vez que uma das funções mais importantes da 4 nutrição é ajudar uma pessoa a ter uma alimentação mais saudável e que possa proporcionar um estilo de vida com qualidade. MATERIAIS E MÉTODOS O presente estudo é uma revisão de literatura do tipo integrativa. Foram realizadas buscas no GOOGLE ACADÊMICO, SCIELO e PERIÓDICOS DA CAPES utilizando uma combinação das palavras “obesidade”, “alimentação saudável”, “comportamento alimentar” juntas para identificar artigos publicados entre os anos de 2018 a 2023 sobre as mudanças na dieta das famílias. Foram encontrados 84 artigos dentro dos critérios citados nas línguas português (Brasil) e Inglês. Com base na leitura de títulos e resumos. Foram excluídos os estudos de revisão de literatura que não correspondiam às questões relacionadas ao tema, como “alimentação escolar”, “experimentos relacionados à transtornos alimentares”, dentre outros. Restaram então 44 artigos que foram baixados e lidos na íntegra, e após este feito e aplicando os critérios de inclusão, totalizaram ao final 18 artigos. RESULTADOS A análise foi gerada mediante a leitura minuciosa das literaturas existentes. Com base no estudo de vários artigos que trazem essa abordagem sobre a realidade de muitas famílias e o quanto são atingidas por suas rotinas cheias de atividades diárias. A realidade brasileira é marcada por um padrão de ampla diversidade alimentar, que, ao mesmo tempo, é afetada pela grande desigualdade social de acessibilidade aos recursos e à falta de equidade entre a população. Nesse cenário, o GAPB2 (Guia Alimentar da População Brasileira) se apresenta como um instrumento que contém recomendações voltadas à população em geral, que foi elaborado tendo como base o comportamento dos agentes, seus hábitos culturais e regionais no país. Destaca-se que a escolha da dieta alimentar não está fundamentada apenas em recomendações nutricionais institucionalizadas, uma vez que perpassa outras instâncias da vida, sendo que suas decisões são influenciadas por uma miríade de opções, que dependem do ambiente e de fatores estruturais que foram dimensionados historicamente (AMBROSI; GRISOTTI, 2022). 5 Nos últimos anos, as escolhas alimentares dos brasileiros apresentaram um significativo aumento no consumo de alimentos processados e ultraprocessados e diminuição da ingestão de alimentos in natura. Segundo dados divulgados em 2020 pela Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), ao analisar os anos entre 2002 e 2018, houve uma redução considerável no consumo da famosa dupla brasileira: arroz e feijão, em 37% e 52%, respectivamente, nos domicílios do país. Isso indica a descaracterização da comida brasileira, assim como a desvalorização da comida de verdade. Nessa mesma perspectiva, o Relatório “Alimentos e bebidas ultraprocessados na América Latina: vendas, fontes, perfis de nutrientes e implicações (OPAS, 2018)”, corrobora para os achados da POF, ao apresentar que alimentos ultraprocessados, bebidas açucaradas e fast-food estão substituindo comidas caseiras mais nutritivas nas dietas das famílias da América Latina e Caribe (MELO et al., 2020). GRAU DE PROCESSAMENTO/DEFINIÇÃO EXEMPLOS Alimentos in natura ou minimamente processados Obtidos diretamente de plantas ou de animais, não sofrem qualquer alteração após deixar a natureza, podendo ser submetidos apenas a processos como limpeza, remoção de partes não comestíveis, fracionamento, moagem, secagem, fermentação, pasteurização, congelamento, refrigeração e processos similares que não envolvam agregação de sal, açúcar, óleo gorduras ou outras substâncias alimento original. Hortaliças, frutas, raízes tubérculos, cereais, leguminosas, carne, ovos, leite e água Óleos, gorduras, sal e açúcar Extraídos de alimentos in natura o geralmente não consumidos isoladamente, mas usados para temperar e cozinhar alimentos e para criar preparações culinárias. Óleos vegetais, manteiga, banha de porco, açúcar e sal. Alimentos processados Alimentos in natura manipulados industrialmente com adição de sal ou açúcar. Ou outra substância de uso culinário que aumenta a durabilidade e torna esses alimentos mais agradáveis ao paladar. Vegetais preservados em salmoura ou solução de sal e vinagre Extrato de concentrados de tomate com adição de sal ou açúcar Frutas sem calda e cristalizadas Carne seca e toucinho, sardinha atum enlatados Queijos pães feitos de farinha de trigo, leveduras, água e sal Alimentos ultraprocessados Formulações industriais feitas inteiramente ou majoritariamente com substâncias extraídas de alimentos (óleos, gorduras, açúcar, amido, proteínas), derivadas de constituintes de alimentos (gorduras hidrolisadas, amido modificado) ou sintetizadas em laboratório com base em matérias orgânica como petróleo e carvão (corantes, aromatizantes realçadores de sabor de vários tipos de aditivos usados para dotar os produtos de propriedades sensórias atraentes). Envolvem, geralmente, técnicas manufatura e aditivos de uso exclusivamente industrial. Biscoitos, sorvetes, balas e guloseimas em geral Cereais açucarados Misturas para bolo barras de cereal macarrão e temperos instantâneos, salgadinhos Refrescos e refrigerantes, iogurtes e bebidas lácteas adoçados aromatizados, Bebidas energéticas Produtos congelados e protos para aquecimento como pratos de massa, pizzas, hambúrgueres, empanados do tipo nuggets, salsichas e outros embutidos Pães e produtos panificados cujos ingredientes incluem substância como gordura vegetai hidrolisada, açúcar, amido, soro do leite, emulsificante e outros aditivos. Fonte: Guia Alimentar Para a População Brasileira (3). 6 O consumo médio diário de energia na população brasileira com idade igual ou superior a 10 anos de idade em 2017–2018 foi de 1.754,61 kcal, sendo mais da metade (53,25%) proveniente de alimentos in natura ou minimamente processados; 15,78%, de ingredientes culinários processados; 11,28%, de alimentos processados; e 19,69%, de alimentos ultraprocessados (Tabela 1). Dentre os alimentos in natura ou minimamente processados, destaca-se o arroz, que correspondeu a 10,54% da energia total, seguido por carne bovina, com 7,46%; feijão, com 6,22%; e carne de aves, com 5,71%. A seguir, em ordem decrescente de contribuição para a energia total consumida, aparecem frutas (2,90%), leite (2,69%), macarrão (2,67%), carne suína (2,34%), raízes e tubérculos (2,08%) e verduras e legumes (1,72%) (Tabela 1). Dentre os ingredientes culinários, o grupo de maior contribuição para o aporte total de energia foi o de óleos vegetais (7,66%), seguido de açúcares (5,91%). Dentre os alimentos processados, o grupo de maior contribuição para o total de energia foi o de pães (7,86%), seguido pelos queijos (1,60%) (Tabela 1) (LOUZADA et al., 2023). Segundo o estudo realizado por Paiva et al., (2018), as escolas também detêm uma parte da responsabilidadena educação alimentar de crianças e adolescentes. São lugares excelentes para executar ações de EAN, porém há uma deficiência de métodos educacionais eficazes e que favoreçam a aprendizagem ativa de hábitos alimentares saudáveis. Pesquisas nessa área devem ser estimuladas, e uma vez que a educação é uma ciência social, deve ser analisada como tal. Martins et al. (2019), realizou uma análise com uma amostra representativa de alunos do 9º ano de várias escolas públicas e privadas através de um questionário. Os estudantes responderam a um questionário autoaplicável inserido em smartphone, contendo questões sobre características sociodemográficas, de contexto familiar e escolar, e de práticas relacionadas à alimentação. Mais detalhes sobre o processo de amostragem podem ser obtidos na publicação da PeNSE (Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar). Os resultados mostraram que a prática de comer junto com os pais foi associada com a melhor qualidade da alimentação dos adolescentes, especificamente à maior frequência de consumo de feijão, frutas e hortaliças, e à menor frequência de consumo de guloseimas, ultraprocessados salgados e salgados fritos. Realizar refeições frequentemente com os pais foi 7 positivamente associado com o escore de alimentação saudável e inversamente com o de alimentação não saudável. DISCUSSÃO Nas últimas décadas ocorreram mudanças no padrão alimentar da população brasileira, caracterizado pela diminuição do consumo de alimentos in natura e minimamente processados, em detrimento do aumento da ingestão de produtos processados e ultraprocessados. Tais mudanças repercutem numa dieta com maior densidade energética, associado a um aumento na ingestão de aditivos químicos, açúcar, sódio, gordura saturada e trans e à diminuição do consumo de fibras (SILVA et al., 2019). Para Louzada et al., (2023), alimentos ultraprocessados são formulações industriais tipicamente prontas para consumo, feitas com inúmeros ingredientes frequentemente obtidos a partir de colheitas de alto rendimento, como açúcares e xaropes, amidos refinados, gorduras, isolados proteicos, além de restos de animais de criação intensiva. Eles usualmente contêm pouco ou nenhum alimento inteiro em sua composição, além de serem fartos em açúcar e gorduras e carentes de fibras e micronutrientes. Essas formulações são feitas para serem visualmente atrativas, terem aroma sedutor e sabores muito intensos ou “irresistíveis”, usando para tais finalidades combinações sofisticadas de flavorizantes, corantes, emulsificantes, edulcorantes, espessantes e outros aditivos que modificam os atributos sensoriais. Exemplos incluem refrigerantes, biscoitos de pacote doces e salgados, macarrão instantâneo, alimentos prontos para aquecer, doces, balas, chocolates e embutidos. Vivemos hoje uma era bem diferente, pois a realidade de muitas famílias se modificaram juntamente com os desafios do sustento do lar e dos filhos, muitas mulheres, que também são mães, que outrora desempenhavam o papel de cuidar da casa e dos filhos agora enfrentam desafios significativos de uma carga de trabalho dobrada ao equilibrar o trabalho doméstico, empreendedorismo, o cuidado com os filhos e a promoção de uma alimentação saudável. No entanto, é importante lembrar que o equilíbrio entre as responsabilidades domésticas e o cuidado com a alimentação não deve recair apenas sobre as mães, mas de todos que compões a família (BARBOSA et al., 2021). 8 Com os desafios econômicos, a complementação da renda ou até mesmo a renda principal acaba partindo agora de muitas mulheres que fazem parte de uma grande camada no mundo empresarial ou sócio econômico. Essas mulheres, muitas delas mães, alimentam-se fora de casa e raramente preparam as refeições para a família, por conta disso diversas vezes acaba tendo como base de sua alimentação produtos industrializados e de alta densidade energética, ricos em açúcares e gorduras, que vêm se incorporando às suas práticas alimentares com forte suporte publicitário (FERREIRA JUNIOR et al., 2021). Sabe-se que o papel da mulher contemporânea mudou muito, principalmente pelo acúmulo de funções, dentro e fora da família. E as implicações desse novo papel reincidem sobre o desenvolvimento dos filhos, apesar que esse não é o objeto da discussão, mas faz parte do contexto em que a maioria das famílias estão inseridas. A realização da refeição familiar ou em companhia de amigos também tem uma função social importante, embora isso tenha se modificado nas últimas décadas, em virtude das inúmeras atividades humanas (PIASETZKI; BOFF; BATTISTI, 2020). De acordo com Paiva et al., (2018), com o ingresso da criança na escola, o processo de estabelecimento de hábitos alimentares passa a sofrer maior influência do meio; “a criança realiza refeições fora de casa (alimentação escolar, compra na cantina), o alimento passa a ter outra representação social importante (amigos), e o ambiente escolar torna-se a principal fonte de conhecimento formal sobre nutrição” e com a entrada na adolescência as escolhas alimentares se tornam mais autônomas e independentes. Entretanto, essa maior autonomia nas tomadas de decisões parece estar associada um aumento de comportamentos alimentares inadequados, ao contrário do que seria desejável. O padrão alimentar infantil está fora dos recomendados pelos órgãos responsáveis, além disso, observamos um sobressalto no número de crianças com sobrepeso e obesidade apresentando dislipidemias e aumento da glicemia, fatores predisponentes para doenças cardiovasculares. Estudos realizados nos últimos anos reforçam hipóteses de que a obesidade durante a infância aumenta as chances de desenvolvimento da obesidade na vida adulta se não for tratada, contribuindo com os riscos de desenvolver doenças cardiovasculares (PAIVA et al., 2018). Fatores como herança genética, aumento de porções diárias alimentares, diminuição de nutrientes e sedentarismo associado as novas tecnologias são considerados fatores de risco para a doença. A rotina e a 9 estrutura familiar modificaram, bem como a oferta crescente de produtos alimentícios, visando à praticidade em resposta ao estilo de vida moderno, são considerados agravantes à doença. Os adolescentes sofrem mudanças físicas, sociais e psicológicas nessa fase da vida e seu comportamento alimentar é influenciado por essas transformações, sendo afetado por fatores internos e externos. Os fatores internos dizem respeito à autoimagem, valores, preferências, necessidades fisiológicas, desenvolvimento psicossocial etc., já os fatores externos correspondem aos hábitos do grupo familiar, às regras sociais e culturais, à influência da mídia, ao convívio com os amigos e às próprias experiências do indivíduo (BITTAR; SOARES, 2020). Segundo Nogueira-de-Almeida et al., (2018), atualmente, os números da obesidade são impactantes e sua prevalência aumentou substancialmente nas últimas três décadas, tanto nos países desenvolvidos como naqueles em desenvolvimento. Estima-se que no mundo 41 milhões de crianças menores de cinco anos estejam obesas. O Brasil enfrenta de forma evidente um processo de transição nutricional. Ao mesmo tempo em que a desnutrição energético-proteica tem apresentado queda em sua prevalência, o sobrepeso e a obesidade rapidamente se candidatam ao posto de maior problema nutricional do país. O ambiente alimentar tem um importante fator influencial na disponibilidade e no acesso aos alimentos que desempenham papel significativo na saúde. Os pais, por serem os principais responsáveis pela aquisição dos alimentos, têm influência direta na preferência alimentar das crianças e em seu padrão alimentar por meio dos alimentos inseridos em casa, pelo uso de práticas de alimentação e pelo seu próprio comportamento alimentar. A influência da publicidade e da mídia, têm grande poderde prender a atenção das pessoas, sobretudo das crianças que podem alterar seus padrões alimentares ainda na infância (CUNHA e CAVALCANTE, 2022). Piasetzki, Boff e Battisti (2020), reafirma que os familiares são referência para as crianças, pois elas internalizam o que veem; não adianta só falar, é necessário colocar em prática. Desse modo, enfatiza-se a importância de sensibilizar, por meio de educação nutricional, os familiares responsáveis pelas crianças a manterem hábitos alimentares e estilos de vida saudáveis. 10 CONCLUSÃO O consumo de alimentos ultraprocessados contribuem tanto para a obesidade como para a desnutrição, visto não serem fonte de todos os nutrientes necessários em sua composição nutricional para a obesidade por apresentarem alto teor calórico (CAVINATO et al, 2022). O comportamento alimentar caracteriza o modo como as pessoas se alimentam. As respostas comportamentais associadas ao ato da alimentação interferem na qualidade de vida e, quando inadequadas, favorecem o surgimento de algumas doenças crônico-degenerativas. O comportamento alimentar da criança é determinado inicialmente pela família e a posteriori por processos psicossociais e culturais (DANTAS; SILVA, 2019). A forte influência da família é mediada pelos estilos parentais. As atitudes relacionadas à regulação alimentar dos filhos caracterizam o que se denomina de controle parental alimentar, classificado em três tipos: controle restritivo, pressão para comer e vigilância ou controle discreto. O controle restritivo envolve a exclusão dos alimentos considerados não saudáveis e interfere na quantidade ingerida pelas crianças, refletindo uma preocupação excessiva das mães ou perante seus filhos no ambiente doméstico, exercendo influência negativa (DANTAS; SILVA, 2019). A pressão para comer é caracterizada pela pressão que os pais fazem para que a criança escolha alimentos mais saudáveis — frutas e vegetais —, ou que comam tudo o que está no prato. Para isso leva à perda da sensibilidade aos sinais internos de saciedade e a criança passa a utilizar os sinais externos (comida preferida, cheiro da comida) ou as emoções como indícios de fome ou saciedade. Consequentemente, a criança passa a depender de estímulos externos para iniciar, manter e terminar sua refeição (SANTOS; COELHO; SILVA, 2023). De acordo com Santos, Coelho e Silva (2023), a família é considerada o primeiro e o principal agente de socialização, transferindo e/ou moldando comportamentos e estilos de vida às crianças, muitas vezes por meio de suas próprias práticas. É no ambiente familiar que esse aprendizado se inicia, onde acontecem as primeiras experiências alimentares. 11 REFERÊNCIAS AMBROSI, Claudia; GRISOTTI, Márcia. O Guia Alimentar para População Brasileira (GAPB): uma análise à luz da teoria social. Ciência & Saúde Coletiva, [S.L.], v. 27, n. 11, p. 4243-4251, nov. 2022. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320222711.06552022 BARBOSA, Hávila Maria Abreu et al. Gerenciando o conflito trabalho-família no empreendedorismo feminino: evidências de um estudo com microempreendedoras individuais. Revista de Gestão e Secretariado, [S.L.], v. 12, n. 2, p. 94-121, 6 ago. 2021. Revista de Gestão e Secretariado (GESEC). http://dx.doi.org/10.7769/gesec.v12i2.1123. BITTAR, Carime; SOARES, Amanda. Mídia e comportamento alimentar na adolescência. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, [S.L.], v. 28, n. 1, p. 291-308, 2020. Editora Cubo. http://dx.doi.org/10.4322/2526-8910.ctoar1920. CUNHA, Claudio Leinig Pereira da. A Influência da Obesidade e da Atividade Física no Risco Cardiovascular. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, [S.L.], v. 119, n. 2, p. 244-245, 2022. Sociedade Brasileira de Cardiologia. http://dx.doi.org/10.36660/abc.20220381. DANTAS, Rafaela Ramos; SILVA, Giselia Alves Pontes da. O papel do ambiente obesogênico e dos estilos de vida parentais no comportamento alimentar infantil. Revista Paulista de Pediatria, v. 37, p. 363-371, 2019. FERREIRA JUNIOR, Elias Antonio et al. Ocorrências atendidas pelo corpo de bombeiros do Paraná pré e durante a pandemia da COVID-19. Disciplinarum Scientia - Ciências da Saúde, [S.L.], v. 21, n. 2, p. 79-88, 2021. Disciplinarum Scientia: Ciências da Saúde. http://dx.doi.org/10.37777/dscs.v21n2- 007. FRÖHLICH, Carine; GARCEZ, Anderson; CANUTO, Raquel; PANIZ, Vera Maria Vieira; PATTUSSI, Marcos Pascoal; OLINTO, Maria Teresa Anselmo. Obesidade abdominal e padrões alimentares em mulheres trabalhadoras de turnos. Ciência & Saúde Coletiva, [S.L.], v. 24, n. 9, p. 3283-3292, set. 2019. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018249.27882017. GOMES JUNIOR, Newton Narciso; BORGES, Bárbara Loureiro. O varejo moderno de alimentos: modernidade e insegurança alimentar e nutricional. Retratos de Assentamentos, [S.L.], v. 22, n. 1, p. 11-31, 1 ago. 2019. Retratos de Assentamentos. http://dx.doi.org/10.25059/2527- 2594/retratosdeassentamentos/2019.v22i1.339. LOUZADA, Maria Laura da Costa et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução temporal 2008⠳2018. Revista de Saúde Pública, [S.L.], v. 57, n. 1, p. 12, 15 mar. 2023. Universidade de São Paulo, Agência USP de Gestão da Informação Acadêmica (AGUIA). http://dx.doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004744. MAHAN, L. Kathleen et al. KRAUSE, ALIMENTOS, NUTRIÇÃO E DIETOTERAPIA: krause 14ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018. MARTINELLI, Suellen Secchi; CAVALLI, Suzi Barletto. Alimentação saudável e sustentável: uma revisão narrativa sobre desafios e perspectivas. Ciência & Saúde Coletiva, [S.L.], v. 24, n. 11, p. 4251-4262, nov. 2019. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/1413- 812320182411.30572017. 12 MARTINS, Bianca Garcia et al. Fazer refeições com os pais está associado à maior qualidade da alimentação de adolescentes brasileiros: refeição com os pais e qualidade da alimentação. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 35, n. 7, p. 1-13, 22 jul. 2019. Mensal. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00153918. MELO, Laryssa Rebeca de Souza et al. COMER BEM É COMER SAUDÁVEL: mas por que comemos o que comemos?. Comer Bem É Comer Saudável, Brasília, v. 270, n. 270, p. 1-7, maio 2020. Periódico. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/47217. Acesso em: 24 nov. 2023. NOGUEIRA-DE-ALMEIDA, Carlos Alberto et al. Classificação da obesidade infantil. Medicina (Ribeirão Preto. Online), [S.L.], v. 51, n. 2, p. 138-152, 22 nov. 2018. Universidade de São Paulo, Agência USP de Gestão da Informação Acadêmica (AGUIA). http://dx.doi.org/10.11606/issn.2176- 7262.v51i2p138-152. PAIVA, Ana Carolina Teixeira et al. Obesidade Infantil: análises antropométricas, bioquímicas, alimentares e estilo de vida. Revista Cuidarte, [S.L.], v. 9, n. 3, p. 1-13, 5 set. 2018. Universidade de Santander - UDES. http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.v9i3.575. PIASETZKI, Cláudia Thomé da Rosa; BOFF, Eva Teresinha de Oliveira; BATTISTI, Iara Denise Endruweit. INFLUÊNCIA DA FAMÍLIA NA FORMAÇÃO DOS HÁBITOS ALIMENTARES E ESTILOS DE VIDA NA INFÂNCIA. Revista Contexto & Saúde, [S.L.], v. 20, n. 41, p. 13-24, 23 dez. 2020. Editora Unijui. http://dx.doi.org/10.21527/2176-7114.2020.41.13-24. SANTOS, Jucimara Martins dos; COELHO, Tatiane Aparecida Almeida; SILVA, Rayane Freitas Gonçalo. Fatores que interferem na formação do hábito alimentar saudável na infância: uma revisão bibliográfica. Revista Científica do Ubm, [S.L.], p. 80-94, 3 jan. 2023. Revista Científica do UBM. http://dx.doi.org/10.52397/rcubm.v0i48.1422. SCHUBERT, Maycon Noremberg; SCHNEIDER, Sergio; MÉNDEZ, Cecilia Díaz. As antinomias na formação das rotinas alimentares contemporâneas: uma análise a partir das práticas sociais. Sociologias, [S.L.], v. 23, n. 58, p. 206-236, set. 2021. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/15174522-102097.SILVA, Mariane Alves; et al. O consumo de produtos ultraprocessados está associado ao melhor nível socioeconômico das famílias das crianças. Ciência & Saúde Coletiva, [S.L.], v. 24, n. 11, p. 4053-4060, nov. 2019. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/1413- 812320182411.25632017.
Compartilhar