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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE DIREITO PÚBLICO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO JÚLIO SILVESTRE MARTINS PERSPECTIVAS DA TRIBUTAÇÃO DOS TOKENS NÃO FUNGÍVEIS (NFTS) NO CONTEXTO BRASILEIRO NATAL/RN 2022 JÚLIO SILVESTRE MARTINS PERSPECTIVAS DA TRIBUTAÇÃO DOS TOKENS NÃO FUNGÍVEIS (NFTS) NO CONTEXTO BRASILEIRO Monografia apresentada para obtenção do título de Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande Do Norte – UFRN. Orientadora: Profa. Dra. Karoline Lins Câmara Marinho de Souza NATAL/RN 2022 JÚLIO SILVESTRE MARTINS PERSPECTIVAS DA TRIBUTAÇÃO DOS TOKENS NÃO FUNGÍVEIS (NFTS) NO CONTEXTO BRASILEIRO Monografia apresentada ao Curso de Direito, do Centro de Ciências Sociais Aplicadas, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito. Aprovada em: 17/02/2022. BANCA EXAMINADORA _______________________________________ Prof. Dra. Karoline Lins Câmara Marinho de Souza Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Orientadora ______________________________________ Prof. Me. Jules Michelet Pereira Queiroz Examinador _______________________________________ Prof. Dr. Otacílio dos Santos Silveira Neto Examinador Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Martins, Júlio Silvestre. Perspectivas da tributação dos Tokens Não Fungíveis (NFTs) no contexto brasileiro / Júlio Silvestre Martins. - 2022. 68f.: il. Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Departamento de Direito. Natal, RN,2022. Orientadora: Profa. Dra. Karoline Lins Câmara Marinho de Souza. 1. Direito Tributário - Monografia. 2. Tokens Não Fungíveis (NFTs) - Monografia. 3. Tecnologias disruptivas - Monografia. 4. Arte - Monografia. 5. Criptoativos - Monografia. I. Souza, Karoline Lins Câmara Marinho de. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/Biblioteca CCSA CDU 34:336.2 Elaborado por Eliane Leal Duarte - CRB-15/355 AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente à Universidade Federal de Rio Grande do Norte, instituição que me formou não só como profissional, mas como ser humano. Aqui, deixo meus agradecimentos a todos os professores que fizeram parte da minha graduação, em especial à minha orientadora, Dra. Karoline Marinho, que aceitou fazer parte desse trabalho e contribuiu imensamente para sua construção. De igual forma, agradeço aos membros da banca que se propuseram a contribuir com o presente estudo. Mais a mais, gostaria de agradecer aos meus pais, Silvia Helena e Walfredo, por terem proporcionado o maior conforto e acolhimento possíveis durante toda minha jornada acadêmica, e à minha irmã, Isadora, que mesmo de longe me acompanha diariamente em meus pensamentos. Vocês foram peças cruciais para as minhas conquistas, e lhes devo todo meu sucesso. Também registro meus agradecimentos aos profissionais que moldaram minha perspectiva sobre o Direito, sobretudo aos defensores públicos com quem tive o prazer de estagiar, Dra. Camila, Dr. Nelson e Dra. Natércia, que me inspiraram cotidianamente. Em mesma linha, agradeço a todos os projetos de extensão que marcaram minha história, principalmente a SOI e a UNEMUN, pelos quais carrego um carinho imenso. Agradeço, finalmente, a todos aqueles que serviram de apoio e afago durante esse trajeto, como Mariana, João Paulo e Luiz Henrique, grandes amigos que atravessam as paredes da universidade. Gostaria de registrar, ainda, agradecimentos especiais a algumas amigas que me acompanharam desde o primeiro até o último momento na universidade: à Isabela, que me ensina sobre amizade e poesia todos os dias, à Jasmine, cuja atenção e carinho são incomparáveis, à Débora, que se faz presente desde as minhas primeiras memórias, e à Victória, cujo companheirismo e presença foram essenciais, obrigado. “A arte é uma flor nascida no caminho da nossa vida, e que se desenvolve para suavizá-la” (Arthur Schopenhauer) RESUMO A presente monografia tem por objetivo analisar os Tokens Não Fungíveis (NFTs) no ordenamento jurídico brasileiro sob a perspectiva do Direito Tributário. Os NFTs se configuram como cadeias de código criptografado que conferem a um indivíduo um título de propriedade sobre arquivos digitais específicos, notoriamente obras de arte. Portanto, busca-se definir a sua natureza jurídica e algumas de suas características principais, a fim de delimitar o tratamento a lhe ser conferido. Por serem itens associados a obras de arte, investiga-se se eles possuem a mesma natureza que obras físicas, ou se detém características mais semelhantes aos dos demais criptoativos, relacionadas ao seu caráter disruptivo. Após, busca-se avaliar a possibilidade de tributação destes itens, traçando algumas considerações acerca de princípios tributários essenciais, como a capacidade contributiva. Em seguida, pondera-se acerca da delimitação da competência tributária e suas nuances dentro do contexto da revolução tecnológica promovida pelos criptoativos. Ato contínuo, traz-se alguns exemplos de tributação dos NFTs em ordenamentos jurídicos estrangeiros, de forma a guiar a futura experiência brasileira. Finalmente, avalia-se a possibilidade de incidência do IOF, IPI, ICMS, ISSQN e IR. Ao final, conclui-se que, atualmente, apenas o Imposto de renda seria compatível com os NFTs. Além disso, propõe-se o desenvolvimento de um imposto específico para bens disruptivos emergentes. Utiliza-se, principalmente, do método de pesquisa dedutivo, investigando a partir de outros trabalhos acadêmicos e de avaliações doutrinárias e legislativas. PALAVRAS-CHAVE: Direito Tributário. Tokens Não Fungíveis. Tecnologias disruptivas. Arte. Criptoativos. ABSTRACT The present monography aims to analyze Non-Fungible Tokens (NFTs) in the brazilian legal order by the lenses of the country’s Tax Law. NFTs represent chains of encrypted codes that grant an individual a proprety asset over specific digital files, notably works of art. Therefore, the paper intends to define the legal nature of the assets, as well as some of their main characteristics, analyzing the possibilites of the treatment that should be given to such items. As they are evidently connected to art, this study investigates if the Tokens have the same nature as physical works, or if they should be trated exclusively as a disruptive invention, much like other cryptoassets. Moreover, the research avaluates the possibilities o taxation regarding theses items, drawing some considerations about brazillian tax principles, i.e., the contributory capacity. After that, the paper ponders some considerations about tax jurisdiction, aiming to define which federative entity is able to tax NFTs in the context of its technological revolution. In sequence, it’s shown some of the international prerrogatives regarding the theme, explaining how certain countries tax NFTs. Finally, it’s evaluated which taxes are compatible and should be applied to NFTs between IOF, IPI, ICMS, ISSQN and IR. It is concluded that currently only the income tax would be compatible with NFTs. In addition, it is proposed to develop a specifictax for emerging disruptive goods. The monography was built using the exploratory and deductive methods, mostly through the analysis of other academic papers, doctrinary reviews and laws. KEYWORDS: Taxation Law; Non-Fungible Tokens; Disruptive Technologies; Art; Cripto assets; LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS Art. Artigo CBE Capitais Brasileiros no Exterior CGT Capital Gain Tax CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CTN Código Tributário Nacional DST Digital Service Tax EUA Estados Unidos da América HMRC Her Majesty’s Revenue & Customs ICMS Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços ICO Initial Coin Offering IOF Imposto sobre Operações Financeiras IPI Imposto sobre Produtos Industrializados IR Imposto de Renda IRC Internal Revenue Code IRPF Imposto sobre Renda de Pessoa Física IRPJ Imposto sobre Renda de Pessoa Jurídica IRS Internal Revenue Service IT Income Tax ITR Imposto Territorial Rural ISSQN Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza LC Lei Complementar NFT Non-Fungible Token PL Projeto de Lei STF Supremo Tribunal Federal TIPI Tabela de incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 9 2 A DEFINIÇÃO DA ARTE NO CONTEXTO DIGITAL ................................................ 12 2.1 Tokens Não Fungíveis, Criptoativos e Blockchains ....................................................... 17 2.2 A Natureza Jurídica e o Valor dos NFTs ....................................................................... 22 3 A TRIBUTAÇÃO DE NOVAS TECNOLOGIAS COMO FORMA LEGÍTIMA DE INTERVENÇÃO ESTATAL ................................................................................................ 29 3.1 Considerações Sobre a Competência para Tributar NFTs .......................................... 35 3.2 A Tributação dos NFTs em Ordenamentos Internacionais .......................................... 38 4 PERSPECTIVAS QUANTO À TRIBUTAÇÃO DOS NFTS NO BRASIL ................... 44 5 CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 57 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 61 9 1 INTRODUÇÃO A arte, em sua essência, sempre foi matéria central de debates na Filosofia. Uma das interpretações de Arthur Schopenhauer, por exemplo, sustentava que a arte em si movia o mundo, pois este é definido como um conjunto entre representação e vontade, características fundamentais da realização artística (SCHOPENHAUER, 2005). Esta ligação intrínseca entre arte e sociedade observada pelos filósofos clássicos ainda é verificável, a determinado ponto, na contemporaneidade, sendo certo pontuar que a arte e os seus meios de produção evoluem em conjunto com a sociedade ao seu redor. Nesse sentido, observando-se a revolução tecnológica do século XXI, é notório que a arte integrou o meio digital de forma maciça, o que levantou críticas por parte de artistas e pesquisadores puristas que não classificam as obras produzidas virtualmente como sendo, de fato, arte. Muitas vezes, este pensamento é fundamentado no fato de que as técnicas usadas para a confecção destes itens não se assemelham às das artes clássicas. (WANG; WANG, 2021). De toda forma, a popularização das redes sociais e do e-commerce possibilitou que as obras digitais sejam replicadas e compartilhadas a níveis nunca antes vistos. Merece destacar, no ponto, que as revoluções tecnológicas modificaram completamente as formas de exercer transações comerciais e empreender, afetando diretamente o mercado artístico. Destarte, surgem as questões problemas introdutórias a este trabalho: quais são os meios modernos de transações artísticas e como eles devem ser tributados? Nesse contexto, surgem Non-Fungible Tokens (NFTs), ou “Tokens Não Fungíveis”, os quais são ativos imateriais que delimitam a propriedade de documentos eletrônicos mediante o registro em blockchains. Seu funcionamento, portanto, muito se assemelha ao das bitcoins, criptomoedas de alto valor que não são atreladas a qualquer órgão financeiro central (MEIRA; DALL’ORA; SANTANA, 2020). Entretanto, as bitcoins são fungíveis e intercambiáveis, enquanto os NFTs são únicos, designados a uma unidade de arquivo virtual específico. Em virtude da sua natureza e da recente expansão do mercado criptografado, os NFTs rapidamente se popularizaram como ferramenta de comercialização de arte digital (NADINI et al., 2021). Sobre a matéria, em que pese em primeira análise os Tokens em questão representem a possibilidade de artistas expandirem seu nicho comercial virtualmente e se beneficiarem do sistema de blockchain, os NFTs apresentam algumas características que merecem um olhar crítico. A título de exemplo, a criação dos ativos mediante transações em criptomoedas demanda uma quantidade exorbitante de energia, o que, por conseguinte, gera um impacto 10 significativo no meio ambiente, contribuindo de modo direto para a progressão do efeito estufa. (FOWLER; PIRKER, 2021; EGIYI; OFOEGBU, 2020). Não suficiente, a despeito dos Tokens em estudo serem infungíveis, ou seja, insubstituíveis, eles não tornam os itens de arte digital aos quais dizem respeito irreplicáveis. Levando em conta que o valor dos NFTs pode vir a alcançar 60 milhões de dólares (NADINI et al., 2021), e que a sua compra, em tese, sequer garante a posse exclusiva do item a que eles dizem respeito, é preciso levantar a discussão de que se eles de fato são apenas forma de produção e comercialização artística, ou moeda de investimento que detém maior apelo ideológico em vez de prático. Nesse contexto, verifica-se que a revolução digital afetou diretamente o que se entende por comércio, produtos, e prestação de serviços. Todavia, diversos ativos que estão atrelados ao e-commerce criptografado ainda possuem tratamento jurídico-formal impreciso, como é o caso dos NFTs. Assim, identifica-se um claro desafio do Direito Tributário moderno: como tributar essa nova tecnologia disruptiva? A ausência da atuação do Fisco sobre essa área, apesar de favorável ao elevado crescimento econômico virtual, gera lacunas e desproporções entre os comércios físicos “comuns” e os e-commerces, principalmente aqueles atrelados às blockchains. No ponto, é axiomático que a expansão da economia digital e a inerente dificuldade em determinar a sua jurisdição obstaculizam o exercício arrecadatório de tributos por parte do Estado, contribuindo para o “desajustamento dos sistemas fiscais e para própria fragmentação da soberania fiscal” (VALADA, 2019, p. 64; CORREA, AFONSO, FUCK, 2020). Nesse sentido, é preciso questionar se o sistema tributário brasileiro está apto a atuar frente às novas tecnologias, e, nesse caso, quais seriam os tributos a incidir sobre os Tokens Não-Fungíveis. Ademais, é preciso se debruçar acerca da competência tributária nesses casos. Explicitados os elementos introdutórios, é necessário evidenciar os principais objetivos do presente estudo, os quais se concentram nas seguintes questões-problema: “qual a natureza jurídica dos Tokens Não Fungíveis? Qual o tratamento que estes itens merecem receber pelo Direito Tributário? Eles podem ser considerados arte? Quem detém a competência para tributá-los?”. Em suma, delimita-se como o objetivo geral deste Trabalho a identificação da natureza jurídica dos NFTs e a sua respectiva incidência tributária. Linha contínua, a pesquisa manifesta sua justificativa a partir necessidade de regulamentação das novas tecnologias disruptivas integradas ao mercado digital, no caso, sobre os NFTs. Conforme demonstrado no curso do trabalho,os Tokens apresentam um crescente 11 índice de popularidade, movimentando centenas de milhões de dólares anualmente, de forma que é preciso avaliar as nuances do crescimento desregulado desse setor econômico, bem como quais as possíveis atuações do Fisco sobre essa matéria. Em contraste, o tema encontra pouco lastro acadêmico, jurídico e administrativo, de modo que o presente estudo traz atenção à problemática de forma inovadora. Para garantir a efetividade dos objetivos suscitados, mediante técnicas que permitam a tomada de conclusões mais assertivas, esta pesquisa utiliza do método de abordagem dedutivo, em conjunto com técnicas de pesquisa exploratória. Destarte, faz-se uso de métodos qualitativos, almejando analisar trabalhos acadêmicos, legislação pátria, e avaliações doutrinárias sobre o tema para que, ao fim, delimite-se as considerações autorais. Pretende-se, portanto, realizar um levantamento bibliográfico imprescindível a esta pesquisa em documentos científicos e em leituras doutrinárias de autores como Roque Antônio Carraza e José Roberto Afonso, os quais foram peças-chave para o presente estudo. No primeiro capítulo, buscar-se-á a delimitação de alguns conceitos que identifiquem o que seria uma obra de arte, almejando identificar se os NFTs podem se enquadrar como tal. Nessa abordagem, o trabalho prosseguirá na busca para entender como funcionam os Tokens, investigando seus mecanismos principais e o motivo da sua emergente popularidade. No mesmo capítulo, delimitar-se-á a natureza jurídica dos ativos, bem como debaterá sobre o seu real valor, almejando compreender seu grau de essencialidade para posterior análise tributária. No segundo capítulo, procura-se justificar a necessidade de tributação dos Tokens, assim como delimitar algumas características relevantes do sistema tributário brasileiro, como os princípios da capacidade contributiva e da legalidade. Após, pondera-se acerca da competência tributária para a tributação dos NFTs, matéria ainda pouco discutida academicamente. Em seguida, será proposta uma análise acerca do tratamento de alguns ordenamentos jurídicos estrangeiros sobre criptoativos, de forma a melhor compreender a abordagem a ser dada pelo Fisco brasileiro. No último capítulo, finalmente, busca-se analisar a possibilidade de incidência de alguns dos principais tributos existentes no Brasil, analisando cada um de seus fatos geradores e sua potencial compatibilidade com os NFTs. No estudo, optou-se pela análise de cinco impostos específicos, quais sejam, o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o Imposto de Produtos Industrializados (IPI), o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o Imposto Sobre Serviços De Qualquer Natureza (ISSQN), e, finalmente, o Imposto de Renda (IR). 12 2 A DEFINIÇÃO DA ARTE NO CONTEXTO DIGITAL Antes de se partir ao estudo acerca dos Tokens Não Fungíveis, é necessário esboçar um panorama geral sobre a caracterização da arte pela filosofia através dos séculos, objetivando, posteriormente, definir se os NFTs se enquadram como tal. Nesse sentido, é preciso entender o que pode ser considerado como arte de maneira tradicional, e analisar a forma com que ela se configura digitalmente — meio em que os NFTs se propagam. Frise-se que o presente estudo reconhece que a definição da arte é quase impossível, por ser uma área que está em constante mutação e desenvolvimento, de forma que se busca apenas traçar algumas características gerais quanto a sua composição para, ao final, ter uma noção maior da sua natureza essencial. Preliminarmente, o conceito clássico de arte pode ser compreendido como a representação da realidade feita por um indivíduo. Por óbvio, não necessariamente uma obra vai retratar o que de fato se encontra no mundo material, mas, a grosso modo, o princípio da “arte” pode ser definido como a da percepção de um artista sobre a vida (CHAUI, 2020). Nesse seguimento, é interessante levantar a concepção aristotélica da arte, a qual se materializa mediante a representação autoral da natureza. Deve-se atentar, todavia, que a representação não se confunde com a cópia, uma vez que a arte recria o mundo a partir da concepção do artista, não apenas o representa de forma idêntica ao preexistente (BOAL, 1991). Cumpre mencionar, contudo, que o conceito de representação, embora muito aceito ao se buscar definições da arte, já foi rejeitado em momentos específicos da história. O modernismo americano do século XX, por exemplo, buscou destruir e reconstruir os ideais clássicos, efetivamente se distanciando da “representação” como ideia de reflexo, e objetivando a produção artística que propunha uma concreta intervenção material no imaginário coletivo (EAGLETON, 1995). Trata-se, portanto, de uma interpretação individual e autêntica do processo criativo, a qual, mesmo já sendo observada anteriormente no curso da história, se manifesta de forma evidenciada nos movimentos artísticos contemporâneos. Para além da representação, outros conceitos são de fundamental importância ao se tratar da essência artística, a começar pelo belo. O belo, para uma vertente da filosofia clássica, é aquilo que transforma um simples item de percepção em uma obra de arte. Para Schopenhauer, por exemplo, são o belo e sua metafísica que possibilitam a contemplação e o escapismo ao se apreciar uma obra, o que serve como estopim para a “exposição de ideias” do artista original, configurando, em essência, a arte em si (apud NUNES, 2017). No entanto, partindo-se desta concepção do belo, a definição da arte se torna consideravelmente restrita, visto que a beleza, ao decorrer da filosofia, foi retratada como rara, 13 somente dominada pelos chamados “gênios”, que seriam os verdadeiros artistas, conforme definiu Schopenhauer (SCHOPENHAUER, 2005). Assim, mesmo que o conceito de belo seja classicamente intrínseco à produção artística e essencial para que se compreenda o que se considera como arte atualmente, ele não precisa ser identificado em todas as obras. Isso porque os objetivos centrais da arte não mais se resumem à contemplação e à sensibilidade, características derivadas do belo clássico, passando a propor novas perspectivas, como as críticas sociais e a utilização de novas técnicas como meio de desafiar a própria produção artística. (CHAUI, 2020). Em contraste ao belo, tem-se o conceito de técnica. Enquanto o belo se caracteriza pela subjetividade, a técnica se configura como um caminho de produção mecânico e objetivo, atrelado às chamadas ciências “úteis”, a exemplo da medicina e da agricultura, que foram subjugadas no curso da história em favor das “liberais”, como a gramática e a música (CHAUI, 2020). A técnica, portanto, se aproxima da capacidade de replicação de algo, haja vista que para se aperfeiçoar nas ciências úteis, é necessário manter um determinado padrão e constância em tudo aquilo que se produz, enquanto para se aperfeiçoar nas artes liberais era preciso ter domínio do belo. Nesse sentido, os itens produzidos apenas a partir da “técnica” não seriam, à primeira vista, considerados como obras de arte, uma vez que no modo de produzir tecnicista não haveria inspiração — componente fundamental da produtividade artística. Entretanto, desde o advento das Revoluções Industriais até a contemporaneidade, a arte e a técnica encontraram em si uma possibilidade de crescimento conjunto, tendo a produção artística aproveitado de novos materiais industrializados para seu próprio aperfeiçoamento. (CHAUI, 2020). Dessarte, com a criação dos referidos produtos industrializados — como tintas e pincéis sintéticos, por exemplo — a arte e a técnica desenvolveram uma ligação simbiótica, quase incapaz de ser desfeita. Assim, é possível levantar a seguinte questão: como diferenciar um produto de cunho artístico em relação aos demais? Nesse ínterim,observa-se que todos os pontos elencados até então convergem para revelar que a caracterização da arte como arte é feita, de fato, a partir da identificação de sua funcionalidade objetivada. Sobre a matéria, a funcionalidade da arte é assunto extensamente discutido no curso da filosofia, mas que encontra duas linhas de pensamento tradicionais, quais sejam: a concepção pedagógica e a concepção expressiva das artes. A primeira escola, de origem aristotélica e posteriormente desenvolvida por Kant, sustenta que o papel central da construção artística é educar moralmente a sociedade, levando à elevação e libertação da alma a partir da reflexão e 14 do sublime1 (KANT, 1995). É preciso notar, nesse ponto, que a materialização dos sentimentos não depende apenas do artista, mas também estaria fortemente ligada ao que se chama de “Juízo de gosto”, ou seja, a percepção de terceiros consumidores da arte sobre aquela obra (KANT, 1995). Linha contínua, é a partir da escola pedagógica que artistas contemporâneos expressam o dever da arte em estimular o pensamento geral e político, incluindo em si as críticas sociais, como se observa nas obras de Augusto Boal (1995). Em suma, esta vertente define que a função da arte se encontra exatamente no elo que ela cria com a sociedade, de modo que as obras devem objetivar o engajamento social “a serviço da emancipação do gênero humano, oferecendo-se como instrumento do esforço de libertação”. (CHAUI, 2020, p. 415). Em outra abordagem, a concepção expressiva das artes mais se assemelha às definições clássicas de representação e belo. No ponto, para autores como Collingwood (1958), a produção artística tem a função de evocar sentimentos e expressões dos indivíduos, almejando, ao fim, a ampliação da consciência. A expressividade, ainda, estaria presente também no momento de fabricação das obras, haja vista que estas representam um catalisador para processar os sentimentos de um artista. Frente ao exposto, evoca-se uma ideia da arte como uma alegoria, de modo que, para esta corrente filosófica, ela encontra sua função na própria produção cultural (CHAUI, 2020). Para ambas as correntes, portanto, percebe-se que a arte tem um caráter linguístico-informacional e subjetivo. No presente estudo, enfim, acata-se estas duas linhas de pensamento gerais, não excluindo uma em detrimento da outra. Portanto, pode-se definir que a “arte” como instituição, de forma clássica, se materializa como a reconstrução da realidade de forma autêntica a partir do ponto de vista de um produtor, denominado de artista, cuja fabricação incorpora tanto técnicas de produção aperfeiçoadas, quanto sentimentos e inspirações dos artistas que as compõem. Estes itens podem ter múltiplas funções, mas sempre é possível identificar uma função pedagógica, ou uma função expressiva em sua essência. Em que pese não seja absoluta, essa definição coloca em evidência o elemento central do desenvolvimento artístico: a subjetividade. Mais a mais, “obra de arte” pode ser definida como a materialização da arte em si, sendo o artefato que exprime as impressões obtidas pelo artista, e que carrega consigo um conteúdo semântico que seu produtor deseja expressar (ALMEIDA; VITA, 2019). É a obra de arte, 1 Para Kant, o sublime se configura como a própria elevação e arrebatamento do espírito humano “diante da beleza como algo terrível, espantoso, aproximação do infinito” (CHAUI, 2020, p. 415). 15 portanto, que tem maior relevância para o direito, pois é a partir dela que as instituições das artes adentram o mundo material e, por conseguinte, o jurídico. Dado o panorama histórico e filosófico das concepções de arte, é preciso analisar o contexto atual dos meios artísticos, especificamente ao se perceber as novas tecnologias emergentes no meio digital. No ponto, destaca-se que a produção de arte ligada à tecnologia virtual não é uma prática recente, mas sim advinda de toda evolução eletroeletrônica do século XX, em especial da década de 1960. Nesse sentido, é interessante perceber o papel do artista em manipular e extrair o máximo de utilidade das inovações tecnológicas que o circundam, expandindo o seu potencial expressivo (SOGABE, 2004) — como se observa, por exemplo, com os computadores. É evidente que a internet possibilita que a arte digital, bem como quaisquer mídias e produtos de dados, sons e imagens, sejam transmitidos de forma sistêmica entre inúmeros usuários, o que, segundo Hito Steryl (2020), chega até mesmo a configurar um próprio estado da matéria. Destarte, a arte encontra um obstáculo novo, inerente à realidade virtual: uma obra continua sendo considerada como tal, mesmo com um alto índice de reprodutibilidade? Sua autenticidade e valor se perderia ao se reconhecer que ela não é única? Nesse contexto, a reprodutibilidade das obras artísticas como um todo já vem sendo trabalhada por décadas, mas as novas tecnologias digitais trouxeram uma nova perspectiva sobre a matéria. A arte em si sempre foi reprodutível, afinal, algumas das técnicas de aprendizado tradicionais utilizadas entre estudantes e professores de arte são, principalmente, derivadas da replicação guiada. Contudo, com a revolução eletrônica, as obras passaram a ser replicáveis de forma técnica e em série, a ponto de não ser possível distinguir a peça original e as suas cópias — é o caso, por exemplo, do compartilhamento de gravuras por meio das redes sociais. (BENJAMIN, 1994). Em primeira análise, a alta reprodutibilidade acarreta a democratização da cultura, tendo em vista que o acesso às obras se torna mais fácil e direto, desconstruindo a ideia de arte como de um privilégio elitista. A título de exemplo, é possível elencar os museus virtuais como uma criação tecnológica positiva para o mundo das artes. Em que pese as definições clássicas de “museus” os definem como um espaço físico voltado à curadoria e preservação de obras de arte e produções científicas materiais (BURCAW, 1975 apud SCHWEIBENZ, 1998), eles são, em essência, um intermédio para a disseminação de conhecimento independente dos meios pelos quais o faça. 16 Assim, os museus virtuais se mostram como um avanço, compartilhando e difundindo culturas e coleções por diversos mediante redes de internet, sendo capazes de atingir um público mais diversificado e amplo do que os museus físicos “tradicionais”, enquanto ainda mantém a essência das artes em seu cerne. Trata-se, portanto, de verdadeira democratização ao acesso cultural a partir da alta reprodutibilidade artística. Não suficiente, para além do consumo, a era digital também permite uma democratização das artes em um sentido produtivo. No ponto, o compartilhamento de técnicas por meio da internet possibilita o surgimento de diversos artistas que, sem ela, não conseguiriam estabelecer um nicho de mercado amplo ou desenvolver arte em si. Nesse sentido, surgem novas técnicas de produção verdadeiramente tecnológicas e digitais — como o uso de mesas digitalizadoras, por exemplo. Assim, artistas são capazes de produzir telas e pinturas com apenas um computador, tarefa que antes demandava o uso de tinta, pincéis, técnicas clássicas etc. Não se trata, observa-se, da dispensa dos processos “tradicionais”, mas efetivamente da criação de novos modos de produção, aludindo ao conceito antes exposto da relação simbiótica entre arte e técnica. Frise-se, no ponto, que a arte digital não é uma forma completamente distinta de produção artística, mas sim uma vertente capaz de incorporar diversos tipos de produções anteriormente conhecidas de um modo disruptivo, o que gera uma forma de “revolução criativa”, como definido por Bo Xing (TRAUTMAN, 2021, p. 15). É plenamente possível, portanto, se observar os conceitos referentes à arte clássica dentro do meio digital, haja vista que, em que pese o seu meio de produção e compartilhamentoser novo, a essência da arte é preservada. Em contrapartida, a democratização da cultura e dos seus meios de produção dentro do sistema capitalista sempre aparenta causar um efeito reacionário nas elites que historicamente os controlavam, gerando a desvalorização dos produtos criados de forma popular. Tradicionalmente, de fato, a produção artística tende a ser valorizada conforme a sua raridade e exclusividade, características que, por óbvio, estão diretamente atreladas a um contexto socioeconômico específico. O valor de troca2 atribuído às obras, nesse sentido, é ligado diretamente à força das comunidades que as coletam e as dominam, de forma que a produção e comércio da arte se caracteriza com um fenômeno completamente social (TRAUTMAN, 2021). 2 O “valor de troca” é aquele utilizado para a realização de transações de mercadorias. Ele é uniforme e qualitativamente idêntico, sua forma de materialização se dá a partir do dinheiro. (HARVEY, 2021) 17 Noutra abordagem, o enorme crescimento produtivo e consumista da arte no meio virtual também resulta na sua massificação. Isso porque o alto consumo de mídias gera, por si só, um aumento na demanda de novos conteúdos, o que é diretamente ligado ao fenômeno da “indústria cultural”, desenvolvido principalmente por Theodore Adorno. Em seu livro “Indústria Cultural e Sociedade”, o teórico enfatiza que a alta demanda artística e cultural faz com que as elites dominantes do mercado promovam, dentro de um contexto capitalista, uma produção padronizada de mercadorias que à primeira vista são esteticamente e mecanicamente diferenciadas, mas que sempre serão iguais em essência, vazias de qualquer significado mais profundo. Assim, a ideia de escolha e de diversidade de produtos se torna meramente ilusória, uma vez que todas as “qualidades e as desvantagens” destes objetos se tornam, de fato, meramente superficiais (ADORNO, 2009, p. 8). Adorno revela, portanto, que a indústria objetiva a capitalização da cultura, a partir da oferta de produtos simplificados e feitos de forma específica para persuadir indivíduos ao consumo cego — há, portanto, um esvaziamento da produção cultural, e, por conseguinte, da arte. Nas palavras de Marilena Chauí, o produto resultante da indústria cultural é a criação de um tipo de mercadoria que, em relação ao consumidor, “não pode chocá-lo, provocá-lo, fazê- lo pensar, fazê-lo ter informações novas que o perturbem, mas deve devolver-lhe, com nova aparência, o que ele já sabe, já viu, já fez” (2020). Esta ideia, por óbvio, vai de encontro com o que se entende como arte, tendo em vista que não se atinge nenhuma das funções artísticas definidas em tópico passado. Os NFTs, como será desenvolvido a seguir, surgem como uma espécie de mecanismo para possibilitar o crescimento do mercado digital, mas podem acabar se tornando a materialização das duas problemáticas levantadas anteriormente — a necessidade de uma elite em manter e especular em cima de um determinado valor atribuído à arte, e a produção massificada e vazia de produtos frente à uma indústria cultural. 2.1 Tokens Não Fungíveis, Criptoativos e Blockchains Dentro do contexto da revolução tecnológica observada desde meados do século XX, que teve como uma de suas consequências a popularização da arte digital, sempre foi difícil quantificar os valores a serem atribuídos às peças de cunho artístico feitas e disseminadas virtualmente. Isso ocorre pois seria quase impossível fixar um valor de uso referente a um item infinitamente replicável (TRAUTMAN, 2021). 18 Linha contínua, a replicabilidade desses artigos também faz com que seja extremamente difícil diferenciar, na prática, a pessoa que detém autoria e propriedade de determinada peça virtual daquela que apenas salvou uma cópia do arquivo em seu computador. Nesse contexto, os Non-Fungible Tokens, ou Tokens Não Fungíveis (NFTs) surgem, à primeira vista, como uma solução a essas problemáticas. Sobre o assunto, definem-se como NFTs as unidades de códigos insubstituíveis e não intercambiáveis3 que estão atreladas a um arquivo, normalmente de imagem, designadas a uma rede de blockchain. Portanto, os Tokens aqui retratados não são os produtos artísticos em si, mas sim a sua codificação dentro de um sistema de blockchain. A título elucidativo, a criação dos NFTs é feita mediante o envio da obra digital a uma rede de mercado criptografado para que seja feito o seu registro e posteriormente ele possa ser comercializado a partir do uso de criptomoedas (CHOHAN, 2021). Esse processo de registro é denominado minting, e normalmente é feito por uma empresa terceira mediante o pagamento da chamada gas fee, usada para remunerar os mineradores da blockchain. Os NFTs se tratam, portanto, de ativos digitais cuja existência está atrelada exclusivamente aos sistemas criptografados, motivo pelo qual alguns autores já os definem como uma criptomoeda própria (WANG et al., 2021). Cumpre ressaltar, no ponto, que ao gerar um NFT, o dono da arte ao qual ele está ligado não perde os seus direitos autorais sobre sua obra, podendo criar novos Tokens referentes a mesma imagem. Isso também implica, contudo, que mesmo com o registro da propriedade referente a um bloco de códigos específico, não há qualquer garantia de exclusividade ao se comprar ou desenvolver um NFT, podendo o arquivo digital em si ser replicado como qualquer outro item compartilhado virtualmente (CHOHAN, 2021). Dessarte, uma das principais discussões que circundam esse cripto ativo é o seu valor de uso, pauta a ser desenvolvida em tópico futuro. Outrossim, para a compreensão dos Tokens Não Fungíveis e de sua natureza é preciso definir o que se entende por “criptoativos”, “criptomoedas” e “blockchain”, bem como seus padrões básicos de funcionamento. Consoante Instrução Normativa da Receita Federal nº 1.888 de 2019, os criptoativos podem ser definidos como uma espécie de representação digital de valores, contabilizada a partir de uma unidade métrica própria. Os criptoativos são, ademais, 3 No ordenamento jurídico brasileiro, a delimitação de uma coisa como “infungível” advém da interpretação inversa do artigo 85 do Código Civil, o qual, em seu caput, fornece a seguinte definição de bem“fungível”: "São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade" (BRASIL, 2002). 19 transacionados por meio de tecnologias criptografadas ou associadas a registros distributivos, ou seja, por meio de cadeias de código notadamente anônimas, interligadas e de difícil acesso por terceiros. Para a Receita, ainda, os criptoativos tem a função de investimento, de ser chave de acesso à serviços, ou de ser instrumento de transferência de valores. (BRASIL, 2019). Pela definição supramencionada, os NFTs se enquadram como criptoativos, notadamente por se tratarem de registro em cadeia de código que, associados a um item artístico são criados no intuito de determinar um valor certo, bem como de exercer função de investimento. Não se confunde, frise-se, criptoativos com criptomoedas, haja vista que estas se configuram como espécie do gênero de criptoativos. De forma simplificada, uma criptomoeda é um item de câmbio utilizado para fazer transações essencialmente digitais, não podendo ser circulada, via de regra, em comércios físicos. Não se tratam, por conseguinte, de representações virtualizadas de moedas físicas oficiais, como o Real por exemplo, mas sim de uma espécie de câmbio autônomo (FOLLADOR, 2017). Mais a mais, as criptomoedas podem ser qualificadas como “conversíveis”, haja vista que é possível deduzir uma quantia monetária em moedas oficiais que se equipara ao seu valor de troca. Aqui resta um ponto de divergência entre as moedas e os NFTs, haja vista que estes são inconversíveis, por não representarem um valor de troca exato equiparadoa moedas oficiais, mas sim funcionarem de forma equiparada ao sistema de preços adotados pelo mercado tradicional. Além disso, as criptomoedas se caracterizam como “descentralizadas”, ou seja, elas não são reguladas por um órgão central que controla as ações que as envolvem. Esse controle é inatamente feito pelos próprios usuários do câmbio sistematicamente, por meio das redes de blockchain (FOLLADOR, 2017). Para inserir as criptomoedas dentro desse sistema, é realizado o procedimento de Initial Coin Offering (ICO), que consiste em captações públicas de recursos, por meio de usuários, para que os ativos sejam emitidos nas redes criptografadas (TRINDADE; VIEIRA, 2020). Esse processo de investimento pode servir como fundamento para equiparar os criptoativos a valores mobiliários, o que faria com que aqueles estejam sujeitos ao pagamento de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), matéria a ser desenvolvida posteriormente. Nesse contexto, as blockchains surgem para substituir o papel dos bancos ou dos governos estatais, a partir da fiscalização e controle das transações criptografadas. Essas redes funcionam de forma a registrar todas as circulações que uma determinada criptomoeda faz dentro do mercado digital. Ao realizar uma compra utilizando-se do referido câmbio, emite-se 20 uma espécie de comprovante de uso em cadeia, impedindo, por exemplo, a utilização recorrente do mesmo ativo para se realizar múltiplas compras (MEIRA; DALL’ORA; SANTANA, 2020). Esses “comprovantes”, que nada mais são do que códigos, são criptografados em uma rede de dados compartilhada, formando o que se chama “nós”, os quais constroem uma espécie de base de dados e cadeias de blocos de informações. Em vista disso, são por meio desses nós que se geram os cálculos e procedimentos para atestar a validade das operações feitas, os quais dificultam a possibilidade de fraude dentro desse sistema. Isso porque para que uma criptomoeda seja fraudada, é necessário alterar toda a cadeia de transações atrelada a ela, o que demanda um poder de processamento praticamente inatingível. Esse circuito de comprovação da autenticidade é o que, no direito digital, se denomina blockchain, e o processo de cálculos efetuados para gerar uma nova cadeia de informações é chamado de mineração (MEIRA; DALL’ORA; SANTANA, 2020). Ademais, para que os dados sejam criados e inseridos no sistema, é necessário que as partes envolvidas autentiquem a sua identidade por meio de chaves pessoais, cujo conteúdo se refere a apenas um indivíduo, o que, em tese, também dificultaria a incidência de atividades fraudulentas (LANA, 2021). A autenticação de identidade, contudo, não é pública, gerando uma espécie de anonimato que pode dificultar o processo tributário a ser realizado sobre os ativos. A culminação das características relatadas faz com que esse sistema de verificação pessoal seja denominado de peer-to-peer, ou “entre pares” em português (NAKAMOTO, 2008). Também se caracteriza como mineração o processo que atesta a validade de cada uma dessas etapas (UHDRE, 2021). É importante compreender o processo de mineração uma vez que é por meio dele que os indivíduos denominados de moradores promovem a emissão de novas criptomoedas, bem como autenticam as transações de cripto ativos já existentes. Isso porque é a partir da resolução do problema matemático gerador de um novo bloco de dados que se desenvolvem novas criptomoedas, originadas como forma de remuneração e recompensa aos colaboradores. Por outro lado, o processo avaliatório das transações também estimula a circulação do câmbio porque os próprios usuários das redes criptografadas pagam os mineradores para que estes validem suas operações. Esse valor pago pelos usuários é denominado de mining fee. (UHDRE, 2021). O valor das minerações e, por conseguinte, do minting, é considerado aleatório, visto que não há precisão exata do valor que será alcançado ao resolver as operações matemáticas necessárias, pois este depende da quantidade de indivíduos que estejam tentando minerar a blockchain (FOLLADOR, 2017). 21 Via de regra, o contato entre o comprador dos tokens e os mineradores é feito por uma empresa intermediadora, comumente chamada de exchange. É esta empresa que media a transação de moedas criptografadas e demais Tokens como os NFTs, bem como que faz o repasse das mining fees para os prestadores de serviço, de forma que recai em si a maior parte da responsabilidade quanto a compra e venda de ativos. Para tanto, ela pode tanto utilizar de moedas tradicionais, como euro e dólar, ou aceitar pagamentos diretamente das chamadas wallets, softwares virtuais que resguardam as criptomoedas e outros ativos de um determinado usuário (FINANCIAL ACTION TASK FORCE, 2014). Compreender a terminologia adotada no e-commerce é essencial para estudar as operações relacionadas aos Tokens, e, posteriormente, poder ser avaliada a possibilidade de incidência dos tributos. Diante de todas as características enumeradas, NFTs vêm sido tratados pelos acionistas e investidores como a “solução” para os problemas da compra e venda de arte digital, uma vez que eles se beneficiam do rápido desenvolvimento do cripto mercado, o qual apresenta frequentes picos de valorização econômica estratosféricos. O caráter autônomo, especulativo e não-governamental das transações com criptomoedas é fator essencial para sua ampliação e difusão (CHEAH; FRY, 2015). Dessa forma, é possível afirmar que os NFTs alteraram de forma sistemática o mercado de arte digital ao conseguir fixar de modo claro a propriedade desses objetos por meio do registro em rede. Cabe ressaltar, em adendo, que mesmo que os NFTs tenham surgido em 2015, sua real valorização aconteceu entre os anos de 2020 e 2021, momento no qual os Tokens perpassam por um crescimento exponencial no mercado de investimento. A título de exemplo, estima-se que todas as movimentações financeiras atreladas a NFTs somavam um patrimônio de aproximadamente doze milhões de dólares no período de dezembro de 2020, e passaram a acumular o montante de quatrocentos e quarenta milhões de dólares em março de 2021 — apenas três meses depois (WANG et al., 2021; DOWLING, 2021). Nessa conjuntura, há registros de vendas de Tokens Não Fungíveis que individualmente alcançam o valor de sessenta e nove milhões de dólares, como o intitulado “EVERYDAYS: THE FIRST 5000 DAYS, 2021” (TRAUTMAN, 2021). Mesmo que nem todas as vendas dos NFTs sejam feitas em valores tão altos, é inegável que houve uma recente tendência dos artistas digitais em registrar seus produtos nas redes criptografadas, buscando possibilidades para uma melhor monetização de seus trabalhos (CHOHAN, 2021). A corrente defensora dos Tokens, ainda, argumenta que, ao se relacionar a propriedade intelectual com redes de blockchain, haveria a viabilização de negócios jurídicos e mercantis 22 mais objetivos dentro da arte, um campo conhecido pela sua subjetividade. Também é defendido que a criação dos NFTs promove o alcance da mercadoria a consumidores que jamais teriam acesso a ela em um mercado físico e tradicional, de forma similar aos museus digitais supramencionados. Em complemento ao apresentado, também se argumenta que a fabricação desses ativos seria capaz de suprimir inúmeras despesas típicas do mercado artístico tradicional, como aquelas vinculadas à infraestrutura de lojas e galerias, por exemplo. (TRAUTMAN, 2021). Evidencia-se, contudo, que o surgimento de novas tecnologias digitais modifica a economia de tal forma que a riqueza tende a se concentrar ainda mais em uma pequena classe de indivíduos, principalmente ao se observar a enorme quantidade de dinheiro que esse nicho econômico movimenta. Dessa forma, a atuação Estatal se mostra particularmente necessária para a garantia de proteção social e combate à desigualdade no mercado (CORREIANETO, AFONSO; FUCK, 2020). 2.2 A Natureza Jurídica e o Valor dos NFTs Nos moldes traçados em linhas pretéritas, os NFTs, assim como a maior parte das inovações tecnológicas disruptivas do século XXI, se configuraram como itens extremamente populares para investidores, apresentando uma expansão e desenvolvimento consideravelmente acelerados em um curto período de tempo. Nesse sentido, cabe aos operadores do Direito se adaptarem à nova tecnologia para garantir seu tratamento adequado dentro do ordenamento jurídico, incluindo-a em suas análises e tutelas. É alarmante constatar, em continuidade, que o crescimento desse setor é estimulado pelo ineficiente cenário fiscal constatado nos comércios eletrônicos. O tratamento desproporcional do Fisco, em conjunto com diversas lacunas na legislação pátria, viabiliza que empresas de tecnologia e e-commerce gerem lucros consideravelmente maiores do que aqueles percebidos no mercado tradicional. De forma exemplificativa, constata-se que o comércio digital paga apenas cerca de 8,5% de impostos referentes a atividades domésticas, enquanto os comércios tradicionais costumam pagar 20,9% (CORREIA NETO; AFONSO; FUCK, 2020). Para que haja uma melhor presença Estatal sobre os itens em questão, é necessário definir de forma clara a natureza jurídica dos Tokens Não Fungíveis, afinal, é esta delimitação que guiará a aplicabilidade do Direito sobre a matéria. Não suficiente, para delimitar o grau de atuação do Estado e em especial do Fisco sobre os Tokens, pretende-se realizar uma análise acerca da origem e dimensão dos valores atrelados a esses ativos. 23 Quanto à natureza jurídica, conforme desenvolvido ao decorrer do capítulo, conclui-se que os NFTs podem, à primeira vista, se assemelhar a itens artísticos, uma vez que eles se encontram atrelados a obras digitais. Todavia, é evidente que os Tokens não se encaixam nos parâmetros de “arte” tradicionais das escolas apresentadas anteriormente. Isso porque, ao se analisar a sua funcionalidade, não é possível observar nenhum dos padrões delimitados tanto pela escola pedagógica quanto pela escola expressiva, que se baseiam na subjetividade do item artístico. No ponto, mesmo que os arquivos vinculados aos Tokens possam transmitir ideais clássicos de arte, como o belo e a representação da natureza, observa- se ao se investigar a real finalidade dos códigos que os NFTs surgem e se desenvolvem de modo a apenas possibilitar a venda da propriedade artística a partir da sua inserção no criptomercado. Ademais, é interessante perceber que, principalmente nos grupos de NFTs mais populares do mundo como os CryptoPunks e Cryptokitties, os arquivos são feitos de forma padronizada, sem qualquer traço de inspiração, autenticidade ou mesmo técnica. No caso dos CryptoPunks, a situação é ainda mais peculiar, haja vista que as imagens são produzidas por meio de inteligência artificial e algoritmos, consequentemente tornando as peças impessoais (LARVA LAB, 2021). Esse processo esvaziado de concepção e desenvolvimento das obras ligadas aos ativos em muito se assemelha com aquele descrito no livro Indústria Cultural e Sociedade, de Theodor Adorno. Conforme Adorno (2009), no contexto de produção em grande escala das obras — como ocorre no mercado digital —, os produtos artísticos chegam a um estado de massificação tão elevado que os seus criadores sequer veem necessidade em “empacotar” os objetos como se arte fossem, o que aparenta ser o rumo tomado pela produção de NFTs como itens especulativos. Isso porque o ponto central de venda desses artigos não se configura mais como o bem intelectual em si, mas sim o próprio registro na blockchain como moeda de investimento. Não suficiente, observado o esquema de produção em massa de NFTs, como o dos supramencionados CyberPunks, evidencia-se que os ativos, na prática, não possuem real diferença entre si. Essa ideia também já fora trabalhada por Adorno, conforme verifica o seguinte excerto: O esquematismo do procedimento mostra-se no fato de que os produtos mecanicamente diferenciados revelam-se, no final das contas, como sempre os mesmos. [...] As qualidades e as desvantagens discutidas pelos conhecedores servem apenas para manifestar uma aparência de concorrência e possibilidade de escolha. (ADORNO, 2009, p.8). 24 O que antes poderia se considerar produção artística se torna nada além de puro negócio e ideologia, não havendo verdadeira necessidade social nos produtos. Nesse contexto, observa- se, principalmente, que o que diferencia os Tokens Não Fungíveis dos ativos digitais comuns é apenas o poder de escolha e o poder de compra daqueles que os transacionam. Por todo o exposto, percebe-se que, em essência, os NFTs detêm natureza jurídica mais semelhante àquela das criptomoedas e demais criptoativos do que de obras de arte em si, possuindo um apelo ideológico acima do prático. Sobre a matéria, evidencia-se que o câmbio criptografado também não possui um tratamento jurídico bem definido no ordenamento brasileiro, mas são, em geral, tutelados de duas formas principais pela doutrina emergente, quais sejam: como bens/ativos financeiros e como moedas estrangeiras (MEIRA; DALL’ORA; SANTANA, 2020). Por óbvio, cada uma dessas formas gera efeitos distintos. Ao serem tratadas como bens/ativos financeiros, as criptomoedas se concretizam como meio de acrescer ao capital do seu detentor, de forma que devem, a título exemplificativo, ser declaradas no Imposto de Renda — esse é o tratamento já firmado em países como os Estados Unidos. Já ao serem consideradas como moedas oficiais, a sua tutela se equipara com aquela dada às transações financeiras, incidindo sobre elas o Imposto sobre Operações Financeiras, por exemplo (MEIRA; DALL’ORA; SANTANA, 2020). A caracterização dos criptoativos como moedas oficiais, contudo, pode ser descartada a partir do art. 164 da Constituição Federal de 1988, uma vez que, segundo o instituto, apenas o Estado pode emitir moedas oficiais, com a União tendo competência exclusiva para tal. Essa normativa vai de encontro à natureza descentralizada dos Tokens delimitada anteriormente, uma vez que estes são emitidos por empresas privadas especulativas (FERRAREZI, 2020). Não suficiente, o Supremo Tribunal Federal (STF) já estabeleceu precedente no sentido de que moedas oficiais devem, essencialmente, ter exclusividade de circulação promovida por um governo específico, bem como apresentar previsão expressa em lei (FERRAREZI, 2020). Desta feita, os criptoativos, e, portanto, os NFTs, em mais se assemelham ao conceito de “bens”, não estando aptos a tratamento de moeda oficial. Os NFTs se diferenciam da criptomoeda, contudo, ao se notar que eles possuem natureza de metadados, ou seja, são cadeias de código que fazem referência a dados de outrem, no caso, do arquivo virtual artístico ao qual estão atrelados (LANA, 2021). De forma equiparada aos câmbios criptografados, o valor de uso atrelado aos Tokens Não Fungíveis aparenta ser mínimo, apenas o de item de luxo conferidor de status, e o de moeda de troca especulativa. 25 Sobre isso, o autor David Harvey explica de forma clara qual seria a real finalidade e interesse atrelados aos itens de especulação: O objetivo do produtor é obter valor de troca, não valor de uso. A criação do valor de uso para outras pessoas é um meio para atingir esse fim. No entanto, a qualidade especulativa da atividade significa que o que importa é o valor de troca potencial. [...], mas há sempre um risco. (HARVEY, 2021, p.29) No ponto, avalia-se qual seria o valor de uso e o valor de troca dos Tokens. Em vias elucidativas, o valor de uso é aquele que está atrelado à própria utilidade de um item — por exemplo, o valor de uso de uma casa seria a sua capacidade de fornecer abrigo e segurança, além da possibilidade de estabelecer moradianela (HARVEY, 2021). Os NFTs, portanto, não mostram ter quase nenhum real valor de uso atrelado a si. No ponto, o seu mérito de uso tende a ser exatamente o seu valor de troca, ou seja, a quantia com a qual pretende-se lucrar ao completar a sua venda posterior. Em adendo, a discussão acerca do real valor dos NFTs se agrava ao constatar que a expansão dos Tokens se deu no período de pandemia do COVID-19, cenário em que grande parte do mundo passa por estagnação econômica. Não obstante, mesmo que a crise financeira tenha afetado de forma severa a classe trabalhadora, a burguesia se encontra cada vez mais rica, tendo inclusive o número de bilionários existentes, e, por conseguinte, o índice de concentração de renda, aumentado consideravelmente (PETERSON-WITHORN, 2021). Nesse sentido, com o enfraquecimento do mercado “tradicional”, essa oligarquia econômica precisa expandir seu nicho de investimento para outras áreas ainda não exploradas e que não apresentam, de fato, quase nenhum valor prático, como aparenta ser o caso dos NFTs (CHOHAN, 2021). Em suma, conforme elucida Chohan (2021, p. 8, tradução nossa), os Tokens surgem, para a classe burguesa, como forma de “gastar seus excedentes de crédito pelo mero desejo de fazê-lo”.4 Cabe mencionar, ainda, que o discurso inicial de que NFTs podem servir para democratizar o mercado das artes se demonstra consideravelmente frágil. Além das reflexões já apresentadas, a criação desses ativos tende a promover o que se chama de escassez cultural — fenômeno que se caracteriza pela concentração do acesso à cultura à classe rica. Isso acontece nesse nicho porque, como supracitado, a criação de Tokens Não-Fungíveis condiciona 4 Texto original: “This means that they can throw financial capital around on whimsical ideas, which in the context of coronavirus restrictions, means that virtual assets, whimsical as their existence might be, offer a curious avenue to spend surplus cash for the mere sake of it”. 26 a produção artística à obtenção do lucro, mesmo que esses códigos, em tese, não tenham valor certo. Um caso que ilustra esse cenário é o da queima da pintura “Morons” de Banksy no ano de 2021. O quadro, originalmente mantido por uma galeria em Nova York, e que satirizava justamente a venda hiper lucrativa de trabalhos artísticos, foi comprado por uma grande empresa, a Injective Protocol, e queimado em uma transmissão ao vivo. Posteriormente, a tela foi transformada em arquivo digital e atrelado a um NFT. A deterioração da peça, em essência, foi justificada como tentativa de valorizar a venda do cripto ativo, transformando-o em uma verdadeira moeda de investimento inflacionada (DYLAN-ENNIS, 2021) Outrossim, além de se atestar que o valor de uso atrelado aos tokens infungíveis é mínimo, eles ainda se configuram como prejudiciais ao meio-ambiente, sobretudo em virtude dos altos índices de gás carbônico emitidos ao se realizar operações mercantis criptografadas. Isso ocorre devido à alta demanda energética para a produção e troca de criptomoedas e criptoativos em geral, sendo que, atualmente, a principal fonte de energia utilizada nessa indústria é a fóssil, de notório teor poluente (GALLERSDÖRFER; KLAASSEN; STOLL, 2020). A título de exemplo, conforme estudo realizado em 2018, a produção e uso de bitcoins por si só poderia aumentar a temperatura do planeta em dois graus Celsius (MORA et al., 2018). A questão se agrava, ainda, devido à natureza descentralizada e autônoma do cripto mercado e das redes de blockchain, uma vez que, por estas características liberais, os sistemas em questão tendem a valorizar o ganho máximo de dinheiro em detrimento da ética do processo para a riqueza. Assim, as grandes empresas atreladas às criptomoedas tendem a utilizar a fonte de energia mais barata possível, ao invés daquela cujo impacto no meio ambiente seria menor (MORA et al., 2018). Não se descarta, frise-se, a possibilidade de uso de fontes de energia limpa na emissão de cripto ativos, mas é preciso reconhecer que este cenário só se concretizará quando o custo benefício destas for maior do que o dos poluentes (MORA et al., 2018). Esse ponto, enfim, evidencia a necessidade de atuação e controle Estatal frente aos NFTs. Para além das questões já suscitadas, faz-se necessário, também, descartar a natureza jurídica dos Tokens Não Fungíveis como sendo a materialização de direitos autorais. Isso porque, em análise supérflua, seria possível enquadrar os NFTs como propriedade intelectual, fundamentando-se no artigo 7º da Lei nº 9.610/1998. O dispositivo legal supramencionado identifica como obras protegidas pelos direitos autorais todas aquelas “criações do espírito, 27 expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro” (BRASIL, 1998). A manifestação intelectual, desta feita, está intrinsecamente ligada à subjetividade do seu desenvolvedor. Nessa abordagem, a doutrina majoritária define, em consonância com as definições clássicas dos direitos autorais, que a originalidade, isto é, a inspiração e a criatividade pessoal do autor, é requisito essencial para que uma obra seja protegida por direitos autorais (LANA, 2021). Esses conceitos, inclusive, aludem àqueles estabelecidos anteriormente ao se tratar de arte clássica. Nesse sentido, ao se observar que o surgimento do NFT é condicionado à existência de uma criação artística prévia, e que ele passa a individualizar esta obra por meio do registro de sua propriedade, é comum que se ocorra associações diretas à salvaguarda do direito dos seus criadores. De fato, o arquivo ao qual o NFT se relaciona é protegido pela tutela dos direitos autorais, mas isso ocorre independentemente do seu registro em blockchain, afinal, a arte em si se enquadra claramente no conceito estabelecido no art. 7º da Lei nº 9.610/1998, mesmo que desenvolvida virtualmente (LANA, 2021). No ponto, o art. 8ª da Lei dos Direitos Autorais define alguns itens que não se enquadram como propriedade intelectual, dentre os quais se destaca: “VII - o aproveitamento industrial ou comercial das ideias contidas nas obras” (BRASIL, 1998). Em essência, como já explicitado, os NFTs consistem apenas em registros criptografados de propriedade, criados de forma quase automatizada, para que se possibilite a compra e venda do item artístico em questão. Não há, de fato, qualquer aproveitamento criativo ou artístico ao se comprar um NFT, tratando-se, portanto, de mero desenvolvimento tecnológico para viabilização comercial das artes (LANA, 2021). Cabe pontuar, linha contínua, que não há subjetividade ou originalidade na criação destes ativos, de forma que, em síntese, não é possível identificar qualquer sinal de autoria humana, sendo incabível a incidência de direitos autorais sobre eles. De todo modo, como aludido previamente, relacionar à existência de um NFT aos direitos autorais da obra ao qual ele diz respeito não apresenta muito sentido prático, tendo em vista que a emissão do ativo não garante a propriedade da arte, mas sim a do código ao qual aquele arquivo diz respeito (LANA, 2021). Diante do exposto, define-se a natureza jurídica dos Non-Fungible Tokens como sendo a de bens/ativos financeiros em forma de metadados com registro em blockchain, cujo conteúdo não permite a incidência de direitos autorais. Finalmente, observadas as constatações feitas 28 acerca do seu valor de uso e valor de troca, é evidente que a atuação do Fisco frente aos Tokens Não Fungíveis deve ser feita de forma ampla e incisiva. O tratamento dado a eles, ainda, não poderá ser equiparado aos da obra de arte, uma vez que não apresentam o mesmo padrão de comportamento destes itens. Nesse ínterim, todas as problemáticas levantadas no desenvolvimento deste capítulo revelam que o surgimento de novas tecnologias disruptivasdeve ser acompanhado também de uma revolução tributária, a qual necessita, nas palavras de Correia Neto, Afonso e Fuck (2020, p. 33): “alcançar manifestações de riqueza antes irrelevantes e agora em ascensão, sem prejuízo de aperfeiçoarem-se também os meios e procedimentos de aplicação das leis tributárias em vigor”. Para tanto, é necessário contextualizar alguns princípios basilares do Direito Tributário brasileiro, bem como definir conceitos como o fato gerador da tributação dos NFTs, e, ainda, traçar algumas considerações acerca da competência para tributar esses itens, assuntos a serem tratados a seguir. 29 3 A TRIBUTAÇÃO DE NOVAS TECNOLOGIAS COMO FORMA LEGÍTIMA DE INTERVENÇÃO ESTATAL Como aludido em tópico anterior, o grande avanço das novas tecnologias digitais provoca diversos desafios à administração pública, principalmente no que tange ao grau de intervenção que será dado ao novo item. No caso dos Tokens Não Fungíveis, a situação é agravada ao se tratar de uma tecnologia essencialmente virtual e intangível, cuja popularidade e presença mercantil cresce exponencialmente. O presente estudo, enfim, partirá no caminho de definir qual a abordagem tributária que deve ser dada aos NFTs. Preliminarmente, de forma a justificar a necessidade de tributação dos NFTs e qualquer outro item, é necessário levantar algumas considerações sobre a Ordem Econômica Constitucional5 e o papel do Estado como interventor sobre o mercado. Quanto à matéria, é cediço que a economia deve ser moldada dentro dos limites constitucionais, os quais incluem o princípio da livre iniciativa, sedimentado no primeiro artigo da Carta Magna de 1988 (BRASIL, 1988). É preciso evidenciar, todavia, que a valorização exacerbada das liberdades individuais em detrimento da coletividade fundamentou a perpetuação do neoliberalismo no mundo globalizado, afetando o Brasil principalmente a partir do final da década de 1970. Essa corrente promove, dentre outras pautas, a intervenção estatal mínima no mercado, sob a justificativa de que a economia em si tende a se autorregular, potencializando os lucros das empresas. Contudo, observou-se o fracasso desse sistema econômico, constatando-se que a desregulamentação da economia e, por conseguinte, a regressividade tributária, gera um esvaziamento de direitos do cidadão (RIBEIRO, 2019). Particularmente ao se tratar de tecnologias e do e-commerce, a falta de regulamentação estatal em favor do “livre mercado” pode fazer com que o surgimento de um novo item disruptivo como os Token Não Fungíveis estimule comportamentos monopolistas e práticas anticoncorrenciais por parte de agentes específicos, que investiram na área antes da intervenção governamental. Isso abre possibilidades, por exemplo, para que grandes empreendimentos e corporações possam agir com padrões excludentes em relação a comerciantes menores (BAPTISTA; KELLER, 2016). 5 A “Ordem Econômica Constitucional” pode ser definida como o conjunto de normas que institucionaliza uma determinada ordem econômica fundamentando-se, por óbvio, nos princípios constitucionais vigentes (SOUZA; FRANÇA, 2008). 30 Nesse contexto, em contraponto à proteção exclusiva da livre iniciativa, a Constituição Federal prevê no seu artigo 170 que a ordem econômica também deve observar os ditames da justiça social, assegurando a todos uma existência digna (BRASIL, 1998). Não suficiente, o mesmo artigo elenca que a economia deve promover, dentre outros fatores, a redução das desigualdades regionais e sociais, os direitos do consumidor, e a defesa do meio ambiente, inclusive “mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação” (BRASIL, 1998). Para que se garanta a proteção de todos os princípios e garantias fundamentais elencados anteriormente, portanto, é que se faz necessária a atuação estatal sobre o sistema econômico. Uma das principais atribuições do Estado para a regulamentação econômica é, enfim, a cobrança de tributos. No ordenamento jurídico brasileiro, encontra-se a definição de “tributos” no art. 3º do Código Tributário Nacional (CTN), o qual lê: “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (BRASIL, 1966). Para além de um simples valor, portanto, esse instituto se configura como obrigação. Em paralelo à norma supramencionada, o art. 150, I da Constituição Federal consolida um princípio basilar do Direito Tributário, qual seja, o da legalidade. Segundo este instituto, nenhum tributo deve ser constituído ou majorado sem antes haver uma lei que o permita fazê- lo, entendimento diretamente ligado à norma presente no art. 5º, II da CRFB/88, cujo conteúdo elucida que ninguém será obrigado a fazer algo senão em virtude da lei. (BRASIL, 1988). Nesses termos, o princípio da legalidade é essencial para garantia da segurança jurídica, servido como elemento cerceador de abusos por parte do Estado, haja vista que ele determina que “a tributação deve ser decidida não pelo chefe do governo, mas pelos representantes do povo, livremente eleitos para fazer leis claras” (COÊLHO, 2020, p. 227). Ao se falar de tutela jurídica sobre novos itens disruptivos, este princípio é comumente utilizado para alegar a inconstitucionalidade da intervenção estatal, principalmente pelo fato de que as novas tecnologias não se enquadram, à primeira vista, nos conceitos de “mercadoria” ou “serviços” estabelecidos na CRFB/88 e em leis já promulgadas (PAULA, 2021). De todo modo, a intervenção estatal por meios tributários pode se mostrar efetiva devido às suas facetas de fiscalidade e extrafiscalidade. No ponto, define-se “fiscalidade” como a finalidade arrecadatória dos tributos, justificada pela necessidade de alimentação dos cofres públicos para o investimento em políticas e serviços em prol da coletividade (CARVALHO, 31 2019). Nesse sentido, já é perceptível a justificativa em tributar os NFTs com fundamento na fiscalidade, tendo em vista o enorme volume de dinheiro que as transações que lhe envolvem movimentam. Por outro lado, a “extrafiscalidade” é definida como a materialização da capacidade interventiva do Estado na economia, conferindo aos tributos objetivos que vão além dos meramente arrecadatórios (CARVALHO, 2019). Trata-se, destarte, da arrecadação com finalidade de influenciar setores econômicos como um todo, atribuindo função social aos tributos. Nesse fundamento, um tributo pode ser criado ou aplicado especificamente para atingir metas interventivas dentro do mercado, almejando uma regulação econômica (SOUZA; FRANÇA, 2008). Conclui-se que o Fisco pode, a partir da extrafiscalidade, incentivar ou desincentivar certas práticas, influenciar determinada área da economia, etc., a partir apenas da incidência tributária que deseja aplicar em determinado produto ou serviço. A regulamentação tributária por parte do Estado, assim, pode facilmente se caracterizar como mecanismo eficaz para a efetivação dos princípios da Ordem Tributária Constitucional supramencionados, culminando para promover a justiça social e o bem comum (SOUZA; FRANÇA, 2008). Plenamente justificável, pois, a tributação dos NFTs. Para além da discussão retratada, alguns princípios norteadores do Direito Tributário também devem ser evidenciados de forma a justificar o grau de atuação que o Fisco deve ter sobre os Tokens Não Fungíveis, de forma que se passará à análise do princípio da capacidade contributiva. Inicialmente, a capacidade contributiva se configura como aquele princípio promotor da isonomia e da justiça fiscal, cuja orientação sustenta que os tributos sejam cobrados de forma proporcional ao poder aquisitivo dos seuscontribuintes (PAULSEN, 2014). Esse instituto encontra fundamento, principalmente, no art. 145, § 1º da CRFB/88, o qual lê: Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte (BRASIL, 1998). Sobre a matéria, cabe destacar que “justiça fiscal” detém uma pluralidade de acepções, as quais merecem atenção. Inicialmente, é possível compreendê-la como uma espécie de atividade tributária plenamente quantitativa, pela qual se recolhe mais das pessoas ricas e menos das pobres. Contudo, não é possível resumi-la apenas a esta concepção, uma vez que ela engloba todo o trabalho social a ser dado a partir do processo tributário. No ponto, a justiça fiscal 32 também pode se configurar como a distribuição equitativa da carga tributária, de maneira proporcional ao retorno conferido pela prestação dos serviços públicos do Estado (GOUVÊA, 1999). Para além da justiça, ao se falar de inovações digitais tem-se que o Estado, e, por conseguinte, o Fisco, detém a obrigação de efetivar a segurança digital, regulando as desigualdades do ambiente mercantil em questão. Não se ignora, contudo, que o crescimento do e-commerce promoveu o aumento de operações transnacionais, tanto de pessoas, quanto de serviços e bens, o que coloca diversos entraves para os tributaristas, afinal, esse aumento de circulação demanda uma alta capacidade adaptativa dos operadores do direito para que estes garantam um ambiente equitativo (JUSWANTO; SIMMS, 2017). Essa questão, que se alia diretamente à justiça social, se mostra como um dos principais fundamentos para justificar a necessidade de regulamentação das novas tecnologias (BAPSTISTA; KELLER, 2016). De todo modo, o princípio da capacidade contributiva nada mais é do que a obrigação do Fisco em pessoalizar os contribuintes, determinando tratamentos diferentes àqueles que o demandarem, efetivando, portanto, a justiça fiscal. Cumpre ressaltar que apesar do dispositivo supramencionado indicar que apenas os impostos estariam sujeitos ao princípio, ele é aplicável, via de regra, aos tributos como um todo (CARVALHO, 2019). Desse conceito geral, ramificam- se dois subprincípios que merecem mais atenção para os fins do presente estudo, quais sejam, a seletividade e a progressividade. Destarte, quanto à seletividade, tem-se que esta se caracteriza pela gradação modificada de alíquotas6 a bens, serviços e produtos diferentes, com base na natureza e caracterização destes (CARVALHO, 2019). Por conseguinte, significa dizer que um mesmo tributo pode ser aplicado de forma diferenciada aos mais diversos itens com base em suas qualidades e, efetivamente, na sua utilidade social, tratando-se de manifestação expressa da extrafiscalidade (NOGUEIRA, 2015). As alíquotas, portanto, seriam inversamente proporcionais ao grau de essencialidade do item. A lógica aqui atribuída é a de que os consumidores dos bens supérfluos e de pouco valor de uso teriam uma capacidade financeira maior do que aqueles que consomem estritamente bens essenciais. É, portanto, prática impessoal relacionada ao princípio da capacidade contributiva, mesmo que de forma indireta. Em que pese válida e necessária, a seletividade por si só não se mostra completamente eficaz para a garantia da justiça fiscal, uma vez que não 6 Para o Direito Tributário, "alíquota" se refere ao “percentual da base de cálculo devido pelo contribuinte”. (MAZZA, 2018, p. 164). 33 pode, na prática, distinguir consumidores de baixa e alta renda, aplicando a mesma alíquota a um produto para indivíduos com perfis econômicos completamente distintos (ALVES, 2012). Por esse ângulo, todos os consumidores se beneficiam com as baixas alíquotas referentes a bens essenciais, enquanto apenas os ricos teriam acesso aos bens mais caros, cuja incidência de tributos seria mais considerável, uma vez que esses indivíduos possuem mais renda disponível para gastar com produtos supérfluos (ALVES, 2012). Para a resolução da problemática, portanto, é preciso que a seletividade não seja aplicada isoladamente, mas sim em conjunto com outras técnicas. Uma dessas técnicas é justamente a progressividade tributária, que, em síntese, consiste em um critério que dimensiona o montante devido de um tributo por meio da aplicação de alíquotas diferentes a determinado grupo de contribuintes tomando como base uma escala de capacidade contributiva. Cabe explanar que, via de regra, as alíquotas encontram sua progressividade com parâmetro na base de cálculo do tributo7, a exemplo do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF), cuja alíquota aumenta de forma diretamente proporcional a de renda do indivíduo, ou mesmo do Imposto Territorial Rural (ITR), cujos valores arrecadados se elevam com base no tamanho e produtividade da terra ruralizada. (PAULSEN, 2014). De igual forma à seletividade, essa técnica não alcança os objetivos almejados ao ser aplicada isoladamente. Os críticos à progressividade alegam, em síntese, que a taxação pessoalizada dos ricos faz com que estes reajam de forma prejudicial à arrecadação, fraudando as cobranças por meio de pessoas jurídicas ou mesmo fugindo para paraísos fiscais (GUGEL, 2017). De todo modo, o uso conjunto da seletividade e da progressividade estabelece um mínimo de isonomia no que diz respeito à tributação, sem mesmo ferir os ditames da igualdade tributária fixados no artigo 150, II, da CRFB/88, o qual dispõe que os entes federativos não podem instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontram em situação equivalente (BRASIL, 1988). Esses conceitos são essenciais para a proposta do presente trabalho, uma vez que os NFTs possuem duas características cruciais para delimitar os caminhos de sua tributação, quais sejam: luxuosidade e disruptividade. Quanto à primeira característica, pode-se definir como “luxuosos” aqueles artigos que apresentam pouco valor de uso mais elevado valor pessoal, não sendo necessários para a manutenção de necessidades vitais, mas sim para uma satisfação própria e vaidosa de um 7 Base de cálculo é a “grandeza econômica sobre a qual o tributo incide” (MAZZA, 2018, p. 164). Para os impostos, a base de cálculo se materializa como forma de valor, enquanto para as taxas ela se materializa por meio do custo para realização da atividade a que faz referência. (MAZZA, 2018). 34 indivíduo. Em adendo, para a caracterização do luxo também é essencial avaliar os fatores sociais que os circundam, principalmente a fortuna média dos seus consumidores (GUGEL, 2017). No ponto, cumpre ressaltar que a classificação de um item como sendo luxuoso não é imutável, haja vista que um produto em determinado contexto sociocultural pode ser considerado como artigo de luxo, mas também pode vir a se tornar um artefato comum ao decorrer do tempo. É o que ocorreu, por exemplo, com o açúcar, que antes era tratado como especiaria exclusiva aos mais ricos, e, ao decorrer dos séculos, tornou-se item de consumo generalizado (GUGEL, 2017). Essa mutabilidade, contudo, não deve impedir a atuação fiscal diferenciada nestes itens enquanto apresentarem característica de superfluidade. Ao se observar o apelo ideológico das NFTs, algumas características se sobressaltam como forma de justificar sua crescente popularidade, a maioria delas ligadas às nuances de “luxo” supramencionadas. Isso porque o apelo central dos NFTs é a possibilidade de comprar a propriedade de itens artísticos essencialmente virtuais em vias de transformá-lo em moeda de troca cujo valor de uso é ínfimo em comparativo com seu valor de troca. Não suficiente os Tokens também
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