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Dissídio coletivo Apresentação Os dissídios coletivos foram, por muito tempo, a alma do direito coletivo do trabalho, pois as divergências entre empregados e empregadores sempre terminavam judicializadas. Com a exigência de prévia negociação coletiva para o ajuizamento da ação, os dissídios reduziram significativamente. Entretanto, os impasses na negociação coletiva são esperados e naturais, servindo como motivadores para que as entidades de empregados e de empregadores cedam no que for possível e pactuem melhores condições de trabalho. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai aprender sobre o dissídio coletivo e seu procedimento, assim como sobre as suas modalidades. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Definir dissídio coletivo.• Descrever o procedimento do dissídio coletivo.• Analisar as modalidades de dissídio coletivo.• Desafio As negociações coletivas deverão preceder o ajuizamento da ação de dissídio coletivo, pois se deve valorizar a autonomia da vontade coletiva e a possibilidade de as entidades sindicais encontrarem denominadores comuns. O Sindicato dos Empregados dos Calçados de Parnaíba (PI) chamou o Sindicato dos Empregadores da cidade para a negociação de reajuste salarial e aumento do vale-transporte dos trabalhadores do sindicato. Entretanto, no dia aprazado para a reunião, o Sindicato dos Empregadores não compareceu. O Sindicato dos Empregados o chamou mais duas vezes para a negociação, o que não foi atendido. O Presidente do Sindicato dos Empregados requereu ao Presidente do Sindicato dos Empregadores a assinatura de uma concordância para o ajuizamento de um dissídio coletivo, considerando o expresso na Constituição Federal, no art. 114, § 2º, de “comum acordo”. O Presidente dos Sindicato dos Empregadores se recusou a assinar. Você, como advogado do Sindicato dos Empregados, proporia qual solução ao presidente? Justifique juridicamente sua resposta. Infográfico O dissídio coletivo é uma ação ajuizada no Tribunal para a solução de conflitos entre as partes que compõem uma relação de trabalho. A ausência de regras claras sobre os requisitos da ação inicial do dissídio coletivo gera, muitas vezes, o ajuizamento equivocado da ação, fazendo com que as entidades sindicais percam tempo e recursos financeiros. No passado, o Tribunal Superior do Trabalho editou diversas resoluções para regrar o dissídio coletivo, as quais foram sendo revogadas ao longo do tempo, a exemplo da Instrução Normativa nº 04/93. Neste Infográfico, aprenda sobre os elementos da petição inicial do dissídio coletivo, os quais foram consolidados pela jurisprudência. Veja os elementos intrínsecos e extrínsecos necessários da petição inicial. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Conteúdo do livro As conquistas sociais dos trabalhadores não se resumem apenas ao aumento de vantagens financeiras, mas também às melhores condições de trabalho, como períodos de descanso maiores, planos de saúde, planos odontológicos, entre outras vantagens. Leia o capítulo Dissídio coletivo, da obra Direito coletivo do trabalho, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, em que você vai aprender sobre os conflitos de natureza econômica e jurídica, constando que o dissídio coletivo pode consistir em uma necessidade quando empregados e empregadores não conseguirem interpretar uma cláusula contratual, por exemplo. Também, veja sobre as modalidades de dissídio coletivo e seu procedimento. Boa leitura. DIREITO COLETIVO DO TRABALHO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Definir dissídio coletivo. > Descrever o procedimento do dissídio coletivo. > Analisar as modalidades de dissídio coletivo. Introdução O Direito Coletivo evoluiu para que os envolvidos na relação trabalhista pudes- sem negociar as melhores condições de trabalho para o seu caso específico, responsabilizando-se pela negociação e cumprindo voluntariamente as cláusu- las pactuadas. Entretanto nem sempre as entidades sindicais conseguem chegar a um consenso. O Poder Judiciário tem o dever de harmonizar os interesses das entidades sindicais quando estas não conseguirem chegar a um consenso, razão pela qual a Constituição Federal prescreve a possibilidade de essas entidades ajuizarem o chamado dissídio coletivo. Neste capítulo você estudará o dissídio coletivo como meio de resolução de conflitos coletivos. Você verá o conceito e o procedimento do dissídio coletivo, bem como suas modalidades. Conceito de dissídio coletivo O estudo do dissídio coletivo parte da compreensão de três categorias que permitirão delinear a importância do instituto: a representação sindical, o conflito coletivo e as fontes de Direito do Trabalho. O Direito do Trabalho foi forjado a partir da união dos trabalhadores em torno da luta por melhores condições de trabalho na Revolução Industrial, nos séculos XVIII e XIX. Dissídio coletivo Eduardo Zaffari Carlos Henrique Bezerra Leite recorda que o trabalho surge na histó- ria humana como um castigo, em que o instrumento de tortura tripalium serviu para nomear o labor humano, que, na Antiguidade, era considerado uma atividade indigna e destinada às camadas mais baixas da sociedade. Identificando, basicamente, cinco regimes de trabalho humano — primitivo, escravo, feudal, capitalista e comunista —, o autor ressalta que, atualmente, o trabalho é reconhecido como um direito humano consoante prescrito no art. 23 da Declaração Universal dos Direitos do Homem. No Brasil, o trabalho é reconhecido como um valor estruturante do Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, IV) e um direito fundamental social, conforme art. 6º da Constituição Federal de 1988 (CF) (LEITE, 2017). O Direito do Trabalho, entretanto, surge com a sociedade industrial e trabalho assalariado, fundamentando-se em razões políticas, econômicas e jurídicas. Em termos econômicos, a Revolução Industrial trouxe profunda transformação, com o surgimento da máquina a vapor e da energia elétrica na indústria. Substitui-se o trabalho escravo, das corporações e servil por trabalhadores assalariados. A conexão entre os fatores econômicos e as regras trabalhistas se tornaram cada vez mais próximas, surgidas para conter os abusos dos empregadores e proteger os trabalhadores à época (NASCI- MENTO, 2015). Para Delgado “[...] o Direito do Trabalho é produto do capitalismo, atado à evolução histórica desse sistema, retificando-lhe distorções econômico- -sociais e civilizando a importante relação de poder que sua dinâmica econô- mica cria no âmbito da sociedade civil, em especial no estabelecimento e na empresa” (DELGADO, 2017, p. 89). Em outras palavras, o Direito do Trabalho é produto do capitalismo, pois há a necessidade de elementos socioeconômicos, políticos e culturais, que despontaram apenas nesse sistema. O estudo do surgimento desse ramo do Direito se direciona à compreensão da relação entre capital e trabalho. Em termos políticos, Amauri Marcaro do Nascimento afirmava que a transformação do Estado liberal em um Estado mais intervencionista cria a condição de possibilidade de se impedir que o capitalista pudesse impor as condições de trabalho livremente aos seus trabalhadores. O Estado passa a intervir na ordem econômica e social, limi- tando a plena liberdade das partes na pactuação das relações de trabalho (NASCIMENTO, 2015). Dissídio coletivo2 Amauri Mascaro do Nascimento escreveu, juntamente com Irany Ferrari e Ives Gandra da Silva Martins Filho, um clássico da história do Direito do Trabalho, a obra História do Trabalho, do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho, cuja primeira edição data de 1998. Aprofunde seus estudos sobre a história do trabalho e das relações de trabalho com a leitura desse clássico (NASCIMENTO; FERRARI; MARTINS FILHO, 1998). Em termos de aspectos jurídicos, os trabalhadores se uniram e lutaram pela organização do movimento sindical, que passoua ser tolerado e conseguiu impor a confecção de leis que regem trabalhos coletivos e individuais de trabalho, respeitando-se a dignidade da pessoa humana e a função social do contrato. Alie-se, nos aspecto jurídico, o surgimento da ideia de justiça social, fomentada pelo marxismo, que une os trabalhadores, e a doutrina social da Igreja, com suas Encíclicas, como a Rerum Novarum (1891), que iniciou uma linha seguida até a atual Laborem Exercens (1981). Godinho concorda que o Manifesto Comunista (1848), as Encíclicas e a criação da Organização Inter- nacional do Trabalho (1919) foram fundamentais para a formação do Direito do Trabalho (DELGADO, 2017). A luta por melhores condições de trabalho no Brasil é realizada igualmente pelos sindicatos, que, conforme o art. 8º da CF, têm o dever de “[…] defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em ques- tões judiciais ou administrativas”, assim como “é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho” (BRASIL, 1988, docu- mento on-line). Os sindicatos atuarão nos chamados conflitos trabalhistas, que são aqueles surgidos entre empregados e empregadores, decorrentes de insatisfação com as circunstâncias fáticas, econômicas, jurídicas ou de outros vieses oriundos da relação de trabalho. Ao contrário do que se poderia pensar, os conflitos trabalhistas são um importante meio de desenvolvimento das relações trabalhistas e implemento de melhores condições de trabalho, pois obrigarão empregados e empregadores a encontrar soluções para as suas divergências, sejam essas de natureza econômica ou jurídicas. Uma vez que tais conflitos permitem a evolução das relações trabalhistas, é possível concluir que eles atuarão como fonte de Direito. Conforme leciona Maurício Godinho Delgado, as “[…] fontes do Direito consubstanciam a ex- pressão metafórica para designar a origem das normas jurídicas” (DELGADO, 2017, p. 146). Tais fontes se dividem em fontes materiais e fontes formais, a depender da concepção. Enquanto as fontes materiais constituem-se nos Dissídio coletivo 3 fatores políticos, econômicos, sociológicos ou filosóficos, as fontes formais representam a “[…] exteriorização final das normas jurídicas, os mecanismos e modalidades mediante os quais o Direito transparece e se manifesta” (DELGADO, 2017, p. 148). A distinção entre fontes materiais e formais para de- signar o origem do Direito e a sua forma de exteriorização, respectivamente, é mais facilmente encontrável na doutrina e jurisprudência. Entre as diversas fontes de Direito do Trabalho, destacam-se as sentenças normativas, que decorrem da atribuição constitucional de competência ao Poder Judiciário de fixar regras jurídicas trabalhistas nos processos de dissídio coletivo. Nos dizeres de Maurício Godinho Delgado, a “[…] sentença normativa estrutura um espectro de normas gerais, abstratas, impessoais, obrigatórias, como resultado de um único e específico processo posto a exame do tribunal trabalhista para aquele preciso e especificado fim, no exercício de função típica e tradicional do Poder Legislativo (e não do Judiciário)” (DELGADO, 2017, p. 169–170). As fontes de Direito, materiais e formais, foram estudadas pro- fundamente por Rubens Limongi França, professor catedrático da Universidade de São Paulo (USP) no século passado. Em artigo intitulado “Das formas de expressão do direito”, recentemente publicado na “Coleção doutrinas essenciais”, da Revista dos Tribunais, é possível se aprofundar no estudo realizado pelo eminente jurista. Rodolfo Pamplona Filho e Tercio Roberto Peixoto Souza afirmam que “[...] os dissídios coletivos são relações jurídicas formais, de competência originária dos Tribunais, destinadas à elaboração de normas gerais. Confia-se, assim, à jurisdição a função de criar direito novo, como meio de resolver as controvérsias dos grupos coletivos em conflito” (PAMPLONA FILHO; SOUZA, 2020, p. 1246). Não se pode confundir os dissídios coletivos com as chamadas ações plúrimas, em que há um litisconsórcio na ação individual, com diversos reclamantes em face de um mesmo reclamado ou mais reclamados. Enquanto no dissídio coletivo há uma finalidade específica decorrente do interesse de uma coletividade, na ação plúrima cada reclamante é considerado individual- mente em relação aos direitos pleiteados. Dissídio coletivo4 A jurisdição coletiva, representada no dissídio coletivo, terá por finalidade a constituição de sentenças normativas e a extensão ou a revisão de regula- mentos coletivos existentes. Dadas as finalidades distintas entre o dissídio individual e o coletivo, os procedimentos diferem entre si e se justificam na medida em que os efeitos são significativamente diferentes. No processo individual, os efeitos da jurisdição são oponíveis apenas entre os sujeitos individualizados na relação jurídica processual. Na demanda coletiva se estará em frente a um efeito normativo, com alcance, inclusive, face aqueles que não participaram do dissídio individual. Isso porque, via de regra, participam da relação processual da demanda coletiva uma das categorias de empregadores ou empregados, as quais estarão representando toda aquela coletividade. Enquanto o dissídio individual tem um amplo regramento que lhe disciplina, a demanda coletiva se socorre das regras dos processos individuais. Procedimento do dissídio coletivo A justiça do trabalho, inicialmente, julgava apenas demandas coletivas que versavam sobre reajustes salariais decorrentes da corrosão inflacionária, e o Decreto-Lei nº 1.237, de 2 de maio de 1939, permitia a instauração de ofício das demandas coletivas em caso de suspensão do trabalho, conforme seu art. 57. Funcionando como um moderador de interesses entre o capital e o trabalho, o juiz do trabalho passou, ao longo do tempo, a julgar outros demandas proletárias, além de interesses econômicos. O dissídio coletivo é o processo por meio do qual se solucionarão confli- tos coletivos por sentença judicial, que criará, ou modificará, determinadas condições de trabalho. A justiça do trabalho também poderá ser instada a dar interpretação a determinada norma legal ou convencional. Considerando que se discutem interesses de grupos de trabalhadores e empregadores, devidamente representados por suas entidades de classe, são os interesses coletivos que serão julgados, não s interesses individuais. Será da justiça do trabalho, por exemplo, o dever de julgar a ilegalidade ou abusividade de determinada greve. Com a competência para declarar a existência ou inexistência da relação jurídica, de criar, extinguir ou modificar condições de trabalho, a Justiça do Trabalho é usada quando os sindicatos não conseguem negociar ou quando surge impasse intransponível. A sentença do dissídio coletivo, denominada sentença normativa, terá o condão de criar direito em substituição a eventuais acordos ou convenções coletivas anteriores. Dissídio coletivo 5 Os Tribunais Regionais do Trabalho têm entendido que os autores das ações coletivas têm o dever de juntar cópias dos acordos ou convenções coletivas vigentes, devidamente depositados junto ao Ministério do Trabalho (atualmente denominado Secretaria Especial de Previdência e Trabalho), sob pena de não recebimento da petição inicial. A competência originária para processar e julgar os dissídios coletivos é dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) da base territorial dos sindicatos em conflito. Quando a base territorial ultrapassar a jurisdição de determinado Tribunal Regional do Trabalho, ela será da competência do Tribunal Superior do Trabalho (TST). No TST, a competência para o julgamento dos dissídios coletivos é da Seção de Dissídios Coletivos, conforme art. 2º da Lei nº 7.701, de 21 de dezembro de 1988, pois a competência era do Pleno do TST anteriormente. Sérgio Pinto Martins salienta que, no Estado de São Paulo, em que há dois TRTs, a competência será do TRT da 2ª Região (São Paulo)caso a base territorial dos sindicatos abranja mais de uma região; entretanto, se a base territorial dos sindicatos estiver dentro da jurisdição exclusiva do TRT da 15ª Região (Campinas), será exclusivamente deste a competência (MARTINS, 2016). Usualmente será designada uma turma especializada para o julgamento dos dissídios coletivos nos Tribunais divididos em turmas, mas competirá ao Pleno nos Tribunais, que assim não são divididos. Segundo Sérgio Pinto Martins, o “[...] poder normativo é a competência atribuída à Justiça do Trabalho para estabelecer normas e condições de trabalho nos dissídios coletivos” (MARTINS, 2016, p. 918). O art. 94 do Decreto- -Lei nº 1.237/1939 previa que, na falta de disposição expressa de lei ou de contrato, as decisões da Justiça do Trabalho deverão fundamentar-se nos princípios gerais de direito, na equidade, buscando harmonizar o interesse dos litigantes com os interesses sociais, impedindo que os interesses privados se sobrepusessem aos públicos. Foi a Constituição de 1946 que, pela primeira vez, prescreveu que a lei iria regulamentar os casos em que as sentenças normativas teria a possibi- lidade de estabelecer regras para as relações trabalhistas (art. 123). Embora Dissídio coletivo6 a Constituição de 1969 tenha repetido a possibilidade da sentença normativa estabelecer regras para as relações de trabalho, o que seria estabelecido por lei específica, não se chegou a confeccionar a lei que regulamentaria a possiblidade. A Constituição Federal de 1988 dispensou a necessidade de regulamentação posterior, conforme redação constante no parágrafo 2º do art. 114 da CF: § 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as dis- posições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. (BRASIL, 1988, documento on-line). Além dos limites impostos pela CF ao prescrever a separação de poderes, em que não poderá a Justiça do Trabalho disciplinar em vedação à proprie- dade privada, à livre concorrência, à função social da propriedade privada e à valorização do trabalho humano, a Reforma Trabalhista, Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT, Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943), prescrevendo as matérias que poderão ser negociadas pelas entidades sindicais (art. 611-A) e os conteúdos expressamente vedados (art. 611-B), o que impedirá a discussão de matérias vedadas previstas na CLT (art. 611-B). O prazo para a instauração do dissídio coletivo será nos 60 dias anteriores ao término de vigência da convenção, acordo ou sentença normativa em vigor quando do ajuizamento, sob pena de a sentença normativa não retro- ceder ao dia seguinte à perda de vigência da norma coletiva anterior. O prazo prescrito no art. 616, § 3º, da CLT tem a finalidade de evitar a inexistência de normatividade específica pelo impasse de negociação ou recusa de alguma das entidades sindicais. O dissídio coletivo, no caso de atividades essenciais, poderá ser instaurado a requerimento do Ministério Público do Trabalho (MPT) em caso de greve, nos termos do art. 114, § 3º da CF. O ajuizamento da ação ex officio decorre da cumulação do art. 856 da CLT combinado com o art. 8º da Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989. Usualmente, porém, as ações coletivas são ajuizadas pelas entidades sindicais, haja vista a previsão constitucional de sua intervenção conforme art. 8º da Carta Magna. Quando não houver entidade profissional ou econômica na base territorial, terá a respectiva federação nacional a legitimidade ativa para a proposição da ação de dissídio coletivo. A ação deverá ser ajuizada na forma escrita, e a petição inicial deve obser- var o regramento do Código de Processo Civil (CPC) quanto aos requisitos (art. Dissídio coletivo 7 319, CPC), aqui usado subsidiariamente. Dirigida ao presidente do TRT, con- forme art. 856 da CLT, a petição inicial deverá informar os suscitados na ação (art. 858, CLT), informando os motivos do dissídio e as bases para conciliação (art. 858, b, CLT). Não há a necessidade de procuração pelo sindicato, posto que esse representa a categoria por prescrição constitucional, mas deverá ser comprovada a autorização de seus afiliados pela ata da assembleia geral da categoria do sindicato, com a demonstração de que a negociação coletiva ou arbitragem restaram frustradas. Há a necessidade, ainda, de comprovação das normas coletivas em vigor, juntando-se acordo, convenção ou sentença normativa atual. Sérgio Pinto Martins afirma que é necessário indicar as pretensões cole- tivas aprovadas em assembleia de categoria profissional, apontando o que impediu a negociação coletiva e apresentando as reivindicações em forma de cláusula de cada um dos pedidos, justificando cada uma das cláusulas motivadamente (MARTINS, 2016). Autuada a petição inicial, as partes serão intimadas a comparecer para audiência de conciliação o mais breve possível, dentro do prazo de 10 dias, conforme art. 860 da CLT. Necessariamente, o MPT será intimado a intervir no processo. O representante do empregador ou da entidade sindical, acompanhado de seus respectivos advogados, comparecerá à audiência de conciliação e negociará, podendo o magistrado que preside o ato apresentar aos interes- sados uma solução intermediária que, aceita pelas partes, será submetida à primeira sessão do Tribunal para homologação, nos temos do art. 863 da CLT. O acordo realizado pelas partes em audiência, a ser submetido à sessão do Tribunal para homologação, não comporta recurso pelas partes, salvo se forem excluídas cláusulas negociadas. Inexistindo acordo entre as partes, ou não comparecendo alguma delas à audiência de conciliação designada, o dissídio coletivo será submetido à sessão da Turma responsável pelo julgamento para a apreciação. Nos dis- sídios coletivos não se consideram os efeitos da revelia, posto que se trata da criação ou modificação de norma jurídica. Embora a CLT não prescreva a possibilidade de contestação pelas entidades suscitadas (sindicatos de empregadores reclamados, por exemplo), a apresentação de contestação é recomendável e esperada, pois, na defesa, poderão ser propostos termos de solução alternativos ou ser impugnados os termos propostos pelo autor do dissídio coletivo. Dissídio coletivo8 Na contestação não há uma instrução tal qual no dissídio individual, posto que o art. 864 da CLT prescreve a possibilidade de realização de diligências (como a pesquisa sobre índices inflacionários, por exemplo). Da audiência contestada, o processo será submetido à sessão do Tribunal e será julgado, gerando uma sentença normativa (acórdão, conforme art. 204 do CPC, que é designado como sentença coletiva nos dissídios normativos). A sentença normativa devidamente publicada criará, ou modificará, direitos aplicáveis às relações trabalhistas daquela categoria profissional naquela base territorial durante o próximo período de tempo — usualmente um ano, limitado a dois —, conforme proposto no dissídio coletivo. Modalidades de dissídio coletivo O ajuizamento de um dissídio coletivo decorre da impossibilidade de ne- gociação coletiva entre as categorias profissionais e econômicas, em que há a necessidade de harmonizar os conflitos trabalhistas decorrentes de insatisfação com as circunstâncias fáticas, econômicas, jurídicas ou de outros vieses oriundos da relação de trabalho. Os dissídios coletivos são classifica- dos, basicamente, em duas modalidades, conforme os conflitos que deram origem à ação: os conflitos econômicos (ou de interesse) e os conflitos de natureza jurídica. Os conflitos de natureza econômica, ou de interesse, são aqueles em que os trabalhadores reivindicam novas e melhores condições de trabalho, assim como condições salariais (MARTINS, 2016). Afirma Delgadoque, nos conflitos de natureza econômica “[…] a divergência abrange reivindicações econômico- -profissionais dos trabalhadores, ou pleitos empresariais perante aqueles, visando alterar condições existentes na respectiva empresa ou categoria” (DELGADO, 2017, p. 1466). Nesta espécie de conflito a ser decidido no dissídio coletivo, haverá a criação ou modificação de uma norma, convenção, acordo ou sentença normativa (MARTINS, 2016). Dissídio coletivo 9 Segundo alguns doutrinadores, apenas existiria essa espécie de dissídio coletivo, posto que o art. 114, § 2º, da CF refere apenas os dissídios de natureza econômica, como consta no dispositivo legal: § 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as dis- posições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. (BRASIL, 1988, documento on-line, grifo nosso). Apesar disso, está superada a compreensão de que apenas se poderia ajuizar ação para a discussão de conflitos de natureza econômica. Observe, no seguinte julgado, que o TRT examina os conflitos econômicos objetivamente trazidos ao Poder Judiciário: EMENTA DISSÍDIO COLETIVO ORIGINÁRIO. Deferimento parcial dos pedidos que se encontram em consonância com os entendimentos majoritários desta Seção de Dissídios Coletivos, dos Precedentes deste Tribunal e dos Precedentes Normativos do TST ou por serem razoáveis. Indeferimento das demais pretensões pela ausência de indicadores econômicos objetivos ou por tratarem de matéria regulada na legis- lação ou própria para acordo entre as partes. (BRASIL, 2020, documento on-line). Os conflitos de natureza jurídica, ou de direito, por sua vez, são aqueles em que há divergência na aplicação ou interpretação de determinada norma jurídica. Os conflitos de natureza jurídica se referem à interpretação de deter- minadas normas jurídicas e/ou contratuais, o que levará à discussão, entre as categorias profissional e econômica, sobre a sua aplicação. Para Nascimento, a finalidade do dissídio de natureza jurídica “[…] não é a obtenção, mas a declaração sobre o sentido de um contrato coletivo ou de uma ou mais de uma cláusula de um contrato coletivo ou a execução de uma norma que o empregador não cumpre […]” (NASCIMENTO, 2009, p. 432). O art. 114, § 2º, da CF, traz em sua redação a ideia de que que haveria a necessidade de mútuo consentimento para o ajuizamento da ação de dissídio coletivo, o que leva muitas entidades patronais a contestar o dissídio coletivo, postulando a extinção da ação em razão da ausência desta concordância. Segundo esse entendimento, que se fundamentaria na CF, surgido o impasse na negociação coletiva, não poderia o outro sindicato ajuizar o dissídio coletivo. Observe a interpretação dada pelos Tribunais: Dissídio coletivo10 EMENTA DISSÍDIO COLETIVO REVISIONAL. PRELIMINARMENTE. AUSÊNCIA DE COMUM ACORDO. Comprovadas nos autos as tentativas de negociação e não logrando êxito a autocomposição dos interesses coletivos, têm as partes a faculdade de ajuizar ação de dissídio coletivo. A exegese do texto constitucional é no sentido de que o poder constituinte derivado consagrou mera faculdade ao tratar do consenso das partes na proposição da ação coletiva de natureza econômica. Na hipótese, como no caso em análise, em que é buscada a conciliação entre as partes (negociação prévia), mas esta não é alcançada, é possível o ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica por quaisquer das entidades sindicais, sob pena de se eliminar o direito constitucional de ação previsto como norma pétrea no inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal. JULGAMENTO CLÁUSULA A CLÁUSULA. Parcialmente deferidos os pedidos que se encontram em consonância com os entendimentos majoritários da Seção de Dissídios Coletivos, dos Precedentes deste Tribunal e dos Precedentes Normativos do TST. Indeferidos os demais pedidos visto que são maté- rias próprias para acordo ou reguladas por lei. (BRASIL, 2020, documento on-line). Os Tribunais têm entendido, conforme inteligência do dispositivo cons- titucional, que as entidades sindicais poderão ajuizar o dissídio coletivo por mútuo consentimento, ou seja, pactuando que se socorrerão do Poder Judiciário para decidir eventual impasse negocial. Entretanto a compreensão de que a entidade sindical poderia ajuizar o dissídio coletivo apenas mediante a concordância da outra parte consistiria em vedação de acesso à justiça, cujo direito fundamental vem prescrito no art. 5º, XXXV, da CF, em que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Referências BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 21 nov. 2020. BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (4ª Região). Seção de Dissídios Coletivos. 0021330- 90.2018.5.04.0000 DC. Desembargador Luiz Alberto de Vargas. Julgamento em: 12 ago. 2020. JusBrasil, set. 2020. Disponível em: https://trt-4.jusbrasil.com.br/jurispruden- cia/906317318/dissidio-coletivo-dc-213309020185040000. Acesso em: 21 nov. 2020. BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (4ª Região). Seção de Dissídios Coletivos. 0020872- 39.2019.5.04.0000 DC. Desembargador Claudio Antonio Cassou Barbosa. Julgamento em: 16 mar. 2020. JusBrasil, abr. 2020. Disponível em: https://trt-4.jusbrasil.com.br/ jurisprudencia/822179692/dissidio-coletivo-dc-208723920195040000. Acesso em: 21 nov. 2020. DELGADO, M. G. Curso de direito do trabalho. 17. ed. São Paulo: LTR, 2017. LEITE, C. H. B. Curso de direito do trabalho. 8. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2017. MARTINS, S. P. Direito processual do trabalho. 38. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. NASCIMENTO, A. M. Iniciação ao direito do trabalho. 40. ed. São Paulo: LTr, 2015. NASCIMENTO, A. M. Compêndio do direito sindical. 6. ed. São Paulo: LTr, 2009. Dissídio coletivo 11 NASCIMENTO, A. M.; FERRARI, I.; MARTINS FILHO, I. G. da S. (org.). História do trabalho, do direito do trabalho e da justiça do trabalho. São Paulo: LTr, 1998. PAMPLONA FILHO, R.; SOUZA, T. R. P. Curso de direito processual do trabalho. 2. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. Leituras recomendadas SUSSEKIND, A. Curso de direito do trabalho. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2010. TEIXEIRA FILHO, M. A. O processo do trabalho e a reforma trabalhista: as alterações introduzidas no processo do trabalho pela Lei 13.467/2017. São Paulo: LTr, 2017. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os edito- res declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Dissídio coletivo12 Dica do professor Alguns empregadores receiam que as normas coletivas negociadas sejam incorporadas aos contratos de trabalho de seus empregados e não possam mais ser retiradas, tal como acontece no contrato individual do trabalho, em que o empregador concede uma vantagem por mera liberalidade. No entanto, as sentenças normativas respeitam uma ultratividade mitigada, que permite que se concedam direitos aos trabalhadores por tempo limitado, conforme previsto na Súmula nº 277 do Tribunal Superior do Trabalho. Confira, nesta Dica do Professor, as teorias sobre a aderência da norma coletiva ao contrato de trabalho. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Exercícios 1) O trabalho foi considerado indigno por longo período na história da humanidade. Sobre o trabalho, é correto afirmar que: A) o legislador brasileironão considera o trabalho como um valor fundamental, deixando de prescrever normas a esse respeito. B) o trabalho fundamenta sua importância na Constituição Federal de 1988 em mais de um dispositivo. C) a Constituição Federal de 1988 não versa sobre o trabalho humano, deixando para a legislação infraconstitucional tratar. D) o ordenamento jurídico brasileiro deixa que os sindicatos regulem as relações de trabalho, não dispondo em lei sobre elas. E) no plano internacional, não se trata do trabalho humano, pois cada país deve tratar na melhor forma que entender sobre a matéria. 2) O desenvolvimento social está diretamente ligado à melhoria das condições de trabalho na sociedade. Assim, pode-se afirmar que: A) os sindicatos têm o dever constitucional de representar seus afiliados na defesa de melhores condições de trabalho. B) os sindicatos devem fiscalizar as condições de trabalho de seus afiliados, mas não podem negociar melhorias de suas condições laborais. C) os sindicatos de trabalhadores não podem negociar diretamente com as empresas de seus afiliados. D) os sindicatos de empregadores poderão se recusar a negociar com os sindicatos de empregados. E) a negociação coletiva não poderá ser recusada pelos sindicatos de empregadores, mas os sindicatos de empregados podem recusar. 3) As normas coletivas poderão consistir em acordos, em convenções ou em sentenças normativas. Sobre isso, assinale a alternativa correta: A) A convenção coletiva é uma fonte heterônoma de direito. B) O acordo coletivo é uma fonte heterônoma de direito. C) A sentença normativa não cria direitos. D) A sentença normativa é fonte autônoma de direito. E) A convenção coletiva cria direitos. 4) Os dissídios coletivos tramitam no Poder Judiciário. Assim, observando as regras processuais sobre a matéria, pode-se afirmar que: A) os sindicatos dependem de mútuo consentimento para pleitear em juízo a negociação coletiva pelo dissídio coletivo. B) os sindicatos dos empregados poderão ajuizar dissídio coletivo e a ausência do sindicato dos empregadores irá gerar a sua revelia e confissão. C) os dissídios coletivos não admitem a revelia e a confissão dos suscitados, pois se trata de matéria em abstrato a ser apreciada pelo Judiciário. D) a lei prescreve expressamente a confissão e a revelia da entidade sindical ou da empresa que não comparecer na ação de dissídio coletivo. E) o demandado na ação de dissídio coletivo não poderá contestar a ação, pois não há previsão legal para contestação. 5) As regras do dissídio coletivo são escassas na CLT, usando-se as regras de dissídio individual subsidiariamente. É correto se afirmar que: A) o processo tramitará em primeiro grau de jurisdição. B) a primeira audiência será marcada dentro do prazo de 10 dias. C) não haverá audiências marcadas nessa espécie de procedimento. D) o processo não terá audiência de conciliação. E) o processo tramitará na Vara do Trabalho local. Na prática As dificuldades financeiras das empresas têm servido como fator impeditivo para o avanço de conquistas trabalhistas nos últimos anos. Entretanto, as entidades sindicais e os empregadores têm a obrigação de participar das negociações coletivas em razão da função social das empresas e da participação de seus trabalhadores nos rumos da atividade econômica. Veja, neste Na Prática, a conduta de uma empresa metalúrgica, sediada no Estado de São Paulo, que se recusava a participar de negociação coletiva. Observe que o Tribunal Regional do Trabalho adotou postura contundente com a empresa que se recusava a participar da negociação. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Saiba + Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja a seguir as sugestões do professor: O poder normativo e a consolidação da justiça do trabalho brasileira: a história da jurisprudência sobre o direito coletivo do trabalho A Justiça do trabalho serve como importante instância intermediária nas tensões entre empregados e empregadores, ao harmonizar seus interesses e criar o direito. Leia no artigo a seguir uma análise sobre o poder normativo da Justiça do Trabalho, segundo Alisson Droppa. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Proposta de acordo coletivo de trabalho 2018/2019 As entidades sindicais devem submeter a seus afiliados a proposta que negociarão com as entidades patronais. Veja a proposta de acordo coletivo apresentada pelo Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino Privado da Paraíba para os anos 2018/2019. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Prevalência do negociado sobre o legislado: limites e possibilidades Assista, no vídeo a seguir, a uma entrevista com a Juíza do Trabalho Andrea Pasold, para a Justiça do Trabalho na TV, sobre a prevalência do negociado entre as partes e o legislado. Veja como a Reforma Trabalhista alterou a legislação nacional. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.
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