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EE !.raz!.raz ntente TiaiTiai nalinali ^an^an de cde c iaisiais v'istiv'isti 4ue4ue dial,dial, CC 3on3on rialrial lorelore itmitm le le cc ilosilos jbsc jbsc açãaçã ïg ïg oo iificiific lo Ilo I est:est: irogirog o. j;o. j; E:E: iasias •lais•lais "íras:"íras: cmeicmei ;es;es ii pobrpobr cão,cão, crisècrisè R(R( î eogî eog i nia-:i nia-: COLEÇÃO GEOGRAFIACOLEÇÃO GEOGRAFIA OLIVER DOLFUSOLIVER DOLFUS A AnáliseA Análise GeográficaGeográfica O Espaço GeográficoO Espaço Geográfico PlERRE MOMBEIGPlERRE MOMBEIG O BrasilO Brasil N N ee ilil SS m i t hm i t h Desen Desen volvimevolvime nto Dnto D esigualesigual Yi-Fu TuYi-Fu TuANAN TopofiliaTopofilia Espaço e Lugar - PEspaço e Lugar - P erspectierspectiva dava da ExperiênciaExperiência MM i c h e l B e c u e ri c h e l B e c u e ryy AA Exploração dos OceanosExploração dos Oceanos Josê A. F. DinizJosê A. F. Diniz Geografia da AgriculturaGeografia da Agricultura PP i ei er rr r ee GG e o r g ee o r g e Geografia Agrícola do MundoGeografia Agrícola do Mundo A A GeografiGeografi a Ativa Ativ aa Geografia da PopulaçãoGeografia da População Geografia EconômicaGeografia Econômica Geografia Industrial do MundoGeografia Industrial do Mundo Geografia RuralGeografia Rural Geografia UrbanaGeografia Urbana Os Métodos da GeografiaOs Métodos da Geografia Panorama do Mundo AtualPanorama do Mundo Atual Populações AtivasPopulações Ativas I nI nA E l i a s d e C aA E l i a s d e C a s t r os t r o O Mito da NecessidadeO Mito da Necessidade C.C. M c E v e d yM c E v e d y Atlas Atlas Histórico-GHistórico-G eográfico eográfico UniversalUniversal Y Y v v e se s L a c o s t e L a c o s t e Geografia do SubdesenvolvimentoGeografia do Subdesenvolvimento Os PaísesOs Países Subdesenvolvidos Subdesenvolvidos R.J.R.J. JOHNSTONJOHNSTON Geografia eGeografia e GeógrafosGeógrafos J.J. O . A y o d eO . A y o d e Introd Introd ução ução d d ClimatoClimato logia logia dos Trdos Tr ópicosópicos D a v i d C l a r k D a v i d C l a r k Introd Introd ução ução à Gà G eografia eografia UrbanaUrbana K.J.K.J. G r e g o r yG r e g o r y AA Natu Natu reza reza da da Geografia Geografia FísicaFísica C l a u d e M a n g a z o lC l a u d e M a n g a z o l Lógica do Lógica do Espaço Espaço InduIndu strialstrial A. A. C hC h r i s t o f o l e t t i r i s t o f o l e t t i e o u t r o se o u t r o s Perspectiva da GeografiaPerspectiva da Geografia J a c q u e s VJ a c q u e s V e r r i ê re r r i ê ree AsAs Políticas da PopulaçãoPolíticas da População DD a v i d a v i d D D rr ee ww ProceProcessos Interativos Homemssos Interativos Homem -Meio-Meio Amb Amb ientient ee D. K. FD. K. Fordeso rdes Uma Visão Crítica da Geografia doUma Visão Crítica da Geografia do SubdesenvolvimentoSubdesenvolvimento L u c i a H e l e n a OL u c i a H e l e n a O . G e r a r d i e B a r b a r a -. G e r a r d i e B a r b a r a - C h r i s t i n eC h r i s t i n e N. N. S i l v aS i l v a Quantificação em GeografiaQuantificação em Geografia _ _ BB ee rr tt jj jj a a KK . . BB ee cc kk ee rr ee CC l a u d i o A . l a u d i o A . G . E g l e r G . E g l e r BrasilBrasil Uma Nova Potência RegionalUma Nova Potência Regional na Economia-Mundona Economia-Mundo 3 9 E D I Ç Ã O3 9 E D I Ç Ã O gg gg B E R T R A N D B E R T R A N D B R A S IB R A S I LL Copyright ©Copyright © Cambridge University Pres Cambridge University Press, s, 19921992 Capa: projeto gráfico de Felipe TabordaCapa: projeto gráfico de Felipe Taborda 19981998 Impresso no BrasilImpresso no Brasil Printed in B Printed in B razraz il il CIP-Brasil. Catalogação-na-fonteCIP-Brasil. Catalogação-na-fonte Sindicato Nacional dSindicato Nacional d os Editores de os Editores de Livros, RJLivros, RJ.. Becker, Bertha K.Becker, Bertha K. B35B35 6b 6b BrasBrasil: il: umum a a nova nova potência potência regional regional na na economia-mueconomia-mu ndo ndo / / BerthaBertha 3a 3a ed. ed. K. Becker, K. Becker, Claudio Claudio A. G. A. G. Egler. Egler. —3a —3a ed. ed. - - Rio Rio de de Janeiro:Janeiro: Bertrand Brasil, 1998.Bertrand Brasil, 1998. 272p. 272p. —(Co—(Coleção Geografia)leção Geografia) Inclui bibliografiaInclui bibliografia ISBN 85-286-0172-2ISBN 85-286-0172-2 1. Geopolítica —1. Geopolítica —Brasil. 2. Planejamento regional —BrasBrasil. 2. Planejamento regional —Brasil. il. 3.3. Brasil Brasil ——Condições Condições econômicas. Ieconômicas. I . Egler, Claudio . Egler, Claudio A. G. A. G. II. Título.II. Título. III. Série.III. Série. C D D - 3 2 0 . 1 2 0 9 8 1C D D - 3 2 0 . 1 2 0 9 8 1 9 4 -1 5 3 7 CDU-3 2 : 9 1 8 .19 4 -1 5 3 7 CDU-3 2 : 9 1 8 .1 Todos os direitos reservados pela:Todos os direitos reservados pela: BCD UBCD U NIÃO NIÃO DE EDITORAS S. DE EDITORAS S. A.A. Av. Rio Branco, 99 —20° andar —CentroAv. Rio Branco, 99 —20° andar —Centro 200200 40-40- 004 004 ——Rio de Janeiro —Rio de Janeiro —RJRJ Tel.: (021) 263-2082 Fax: (021) 263-6112Tel.: (021) 263-2082 Fax: (021) 263-6112 Não Não é permitida a é permitida a reproreproduçãdução total ou o total ou pardal desta obra, por quaisqupardal desta obra, por quaisquerer meios, sem a prévia autorização por escrito da Editora.meios, sem a prévia autorização por escrito da Editora. Aten Atendemodemos s pelo Rpelo Reeeembmbololso so PoPostastal.l. SS u m á r i ou m á r i o LL i si stt aa dd ee F F i g u r a si g u r a s 77 LL iis ts t aa dd ee T T a b e l a sa b e l a s 1111 PP r e f á c i or e f á c i o 1313 II A AmbivalA Ambivalência ência de uma Potênde uma Potên cia Recia Re gionalgional 1717 Um Um continencontinen te te desconhecido desconhecido 1818 Capitalismo histórico, economia-mundo eCapitalismo histórico, economia-mundo e semiperiferia 24semiperiferia 24 Uma Uma via via autoritária autoritária para para a a modernidade modernidade 2929 Este Este livro livro 3636 XXI I A A IIn c o r p on c o r p o r ar a ç ã oç ã o dd oo B B r ar a s is ill nn aa E Ec o n o m i ac o n o m i a -M-M u n d ou n d o :: dd aa CC o l ôo l ô n in iaa àà I In d u s t r i a l in d u s t r i a l iz a ç ã oz a ç ã o NN a c i o n a la c i o n a l 33 77 O O período período colonial colonial 4040 O O império império mercantil mercantil 5353 O O Estado Estado e e a a industrialização industrialização nacional nacional 6767 A questão nacional, redefinida, passa hoje no plan o interno pela questão socia l e a const ruçã o da nação; e a autonomia , no plano exte rno, passa pela ques tão tecnológica e da dívida . A inflação e a dívida externa constituem os desafios que o Brasil enfrentará nas próximas décadas e cuja solução dependerá também da trajetória dos Estados Unidos na economia-mundo. 168 5 _______________ O L e g a d o d a M o d e r n i z a ç ã o C o n s e r v a d o r a e a R e e s t r u t u r a ç ã o d o T e r r i t ó r i o O Brasil ingressou na modernidad e pela via autoritária, e o projeto geopolítico do Brasil-Potência, e laborado e gerido pe las Forças Armadas, deixou marcas profundas sobre a socieda de e o espaço nacionais. A economia brasileira alcançou a posição de oitavo PIB do mundo , seu pa rque indust ria l atingiu elevado grau de complexidade e diversificação, a agricultura apresentou indicadores flagrantes de tecnificação e dinamis mo, e uma extensa rede de serviços interligou a quase-totalida- de do território nacional. No enta nto , a m aior ia da .população bras ilei ra não partic i- pqu^ire tame nte ^das .benesses do crescimento económico. Õ Brasil.inaugurava. a m odernidade da pobreza. Não a pobreza primitiva , mas aque la iluminada pela pequena janela das te las dos aparelhos de televisão, que se espalhavam nas centenas de milhares de casas, casebres e favelas. Conectando ricos, reme diados e pobres no m undo ilusório e utópico das novelas e dos noticiários programados, a ideologia eletrônica da televisão 169 cumpriu no Brasil um papel único no mundo, en quanto instru mento de política social e formação de opinião durante o pe ríodoautoritário e mesmo depois dele. A mode rnidad e funde-se com a pobreza em um tecido com plexo. Como explicar a habil ida de de m ilhares de mecân icos existentes ao longo de um a vasta rede rodoviária, capazes de manter uma frota diversificada de veículos, sem que jamais tenham freqüentado uma escola e, em grande número, sequer saibam ler e escrever? Não se trata do “arcaico” e do “mode rno” separa dos po r uma nítida linh a divisória, dos “dois brasis”, ou da Belíndia, uma Bélgica com uma índia. É mais do que isto, é uma estrutura híbrida, ambivalente, instável, porém muito dinâmica. Este é o legado da mod ernização conservado ra, que será analisado neste capítulo ao nível social, econômico e es pacial. L-0 Lpc ̂ o A modernidade da pobreza A modernização conservadora gerou uma pobreza específi ca, associada à modernid ade. A problemática social da semipe- riferia se manifesta em um grande descompasso entre expan são das red es de serviços e de equipamento s coletivos e o pre cário estado social da nação. O regime autoritário te ntou fazer uma massificação das políticas sociais, degradando com isso a qualidade dos serviços. O problema gerencial, operacional e administrativo das políticas sociais “foi o espaço esquecido do aparelho estatal” (Lessa, 1990). No entanto, a malha “pr ogramada” gerou efeito s imprevis tos —externalidades do modelo —significando profun das mu danças estr uturais, como foi o caso da “revolução demográfi ca” e da fragmentação social. Além disso, a dinâmica social escapa à regulação estatal; à estrutura oficialmente regulad a con 170 trapôs-se uma sociedade sub terrânea, “paralela”, “não oficial”, que criou suas próprias regras e suas formas específicas de resistência. A explosão demográfica que não houve O declínio da natalid ade constitui-se talvez na transforma ção mais importante para o país neste fim de século e tem implicações ainda não conhecidas. O desconhecimento d a nova realidade decorre do caráter inédito das tendências recentes, do fechamento d as informações em círculo restrito de especi alistas e da campanha internaciona l contra a ameaça da “explo são demográfica” (Martine, 1989). A transição demográfica no Brasil —passagem de altos para baixos níve is de natal idade e morta lidade —se distingue da tran sição clássica dos países europeus por duas características bás icas . A prime ira é a velocid ade da transiçã o brasileir a qua n do comp arada aos padrõ es tradicionais. O Brasil, como outros países periféricos, está comp letand o, em algumas década s, transformações que demoraram de um a dois séculos para se concretizarem na Europa. E tal velocidade está associada à redução violenta e surpreendente nos níveis de fecundidade, com conseqüência para o crescimento vegetativo da popula ção. O nível mais elevado do crescimento vegetativo brasileiro ocorreu nas décadas de 1950 e 1960 (2,9% ao ano) devido à queda do nível de mortali dade associada à industriali zação. Mas desde o final dos anos 60, a natalidad e começou a declinar, e o censo de 1980 revelou que a fecundidade caíra de forma drástica e generalizada em todo o país, tanto nas cidades como nas áreas ru rais (Fig. 5.1). Essa tendência se confirmou na déca da de 80; entre 1980 e 1984, o número médio de filhos de uma bra sileira teri a de 4,35 par a 3,53 , um decl ínio de 19%. Este 171 declínio foi ainda mais espetacular no Nordeste. Em conse qüência, o ritmo de crescimento demográfico caiu para 2,5% na década de 70, estimando-se que atualmente esteja em torno de 1,8% (Martine, 1989). / - ' / / / / / / / / 1840 1860 1880 1900 1920 1940 1960 1980 2000 2020 • TAXA DE NATALIDADE TAXA DE MORTALIDADE Figura 5.1 Transição demográfica no Brasil —1840-2020. (Fonte: Martine, 1989) A segunda característica é que a transição não se associa diretamente à melhoria nas condições materiais de parcelas cada vez maiores da população. O declínio das taxas de natalidade não foi fruto de uma política deliberada do governo, mas a modernização acelerada está na raiz de sua explicação. Trata- se de impactos ind iretos imprevistos de uma série de políticas e gastos governamentais para a m odernização da infra-estrutu ra básica e dos serviços públicos (Faria, 1988; Hirschman, 1986). 172 Particularmente, as políticas de telecomunicações, saúde, trans por tes e educação acelera ram a difusão de valores, do conhe cimento e de novas práticas e atitudes c ulturais que estimula ram o controle da natalidade e, ao mesmo tempo, os métodos de controle tom aram-se mais acessíveis. Em pesquisa recente, observou-se que 73% das mulh eres casadas na faixa de 15 a 44 anos já haviam utilizado a pílula anticoncepcional, sendo que 93% destas haviam comprado o produto diretame nte nas far mácias, sem nenhum preparo prévio ou acompanhamento médico (Martine, 1989). Em suma, a população brasileira e ntrou na era da pílula sem sair da era da miséria. A disjunção entre indica dores econômicos e sociais sugere que o c omportamento demográfico e social não está mais rigi damente ligado às oscilações da economia, não tendendo a se reverter por que das tem porárias de renda. Significa que, até o final do século, o Brasil apresentará padrões de fecundidade e de crescimento populacional próximos aos dos países desen volvidos nos dias atuais. O estado social da nação - Mais da metade da população brasileira é pobre. A pobreza da nação se m anifesta sobretudo nas altas taxas de analfabetis mo, nas baixas rendas e nas precárias condições devida. Quase um terço da populaç ão com mais de cinco anos é analfabeta, e está concentrada principalmente no Nordeste. Embora o número de escolas tenha au mentado, o ensino básico faliu: hoje a criança brasileira permanece, em média, apenas duas horas e meia por dia na escola, e as taxas de analfabetismo são desi guais por sexo e por regiões. (Tabela 5.1) 173 T a b e l a 5.1 Taxas médias de aljabetismo no Brasil por região e sexo - I . , 1970-1988 (% ), c[ \ v M N or te 1 N or d es te Su de st e Su l Cen t ro -Oeste Bras i l 2 H o m e n s 1970 54 ,9 38 ,8 74,1 72,1 58 ,7 6 2 ,0 1980 61 ,2 4 5 ,9 80 ,8 8 1 ,4 68 ,2 6 9 ,3 198 8 79 ,8 5 4 ,0 84 ,4 84 ,5 77,2 75,1 Mulhe re s 1970 53 ,7 3 9 ,6 69 ,0 68,1 55 ,1 58,6 1980 6 0 ,9 4 9 ,4 77 ,6 7 8 ,7 67 ,6 68 ,2 1988 8 0 ,6 59 ,4 8 2 ,9 83 ,2 77,8 75,8 To ta l 1970 54 .3 39 ,2 71 ,6 70,1 57 ,0 6 0 ,3 1980 61 ,1 47 ,7 79 ,2 80 ,1 67 ,9 6 8 ,8 1988 80 ,2 5 6 ,7 83 ,6 83 ,8 77 ,5 75 ,4 1 Dados de 1988, exclusive população rural. 2 Dados de 1988, exclusive população rural da região Norte. Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1970 e 1980. IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (PNAD), 19Ç8. A pobreza está relacionada à baixa remuneração do trabalho não qualificado em oposição à alta remuneração de serviços técnicos e gerenciais, e a distribuição desigual da renda aumen tou. (Tabela 5.2) Apesar da redução das desigualdades regionais —devido aos ganhos reais registrados no Nordeste e no Centro-Oeste — a concentração da renda cresceu. Cerca de 60% da população economicamente ativa que recebe algum rendimento (52,4 milhões de indivíduos dos quais 35 milhões de homens) não ultrapassam a casa de dois salários mínimos, o que demarca a linha de pobreza, atingindo o máximo no Nordeste e o mínimo 174 T a b e l a 5.2 Distr ibu ição da ren da no Brasil - 1970-89 % 1970 1980 1986 1989 Inferior 10- 1,2 1,1 1,0 0,6 50- 19,4 12,6 12,5 10,4 10+ 46,7 50,9 48,8 53,2 Superior i+ 14,7 16,6 15,2 17,3 I D IJ L, L c n b U i u r a i u g w i i r a w v v . . 1 0 Q , , Q n Q IBGE, Pesquisa Nacional po r Amostragem Domiciliar (PNAD), 1986, iy»y . no Sudeste. Um terço dos brasileiros que trabalham recebe até um salário mínimo (Tabelas 5 . 3 a e 5.3b). T a b e l a 5.3a Desigualdades de renda p or sexo - 19 81-19891 (renda média mensal em dólares) Sexo 1981 19 83 1985 1987 1989 TÕtãl 155,72 137,75 163 01 178,26 209,27 Homens 250,48 219,83 258,59 277,61 327,64 Mulheres 64 ,77 58,48 71,52 83,85 97,44 1 Exclusivepopulaç ão rural da região Norte. Fonte: IBGE, 1990b. 175 T a b e l a 5 . 3 b Desigualdades regiona is de renda - 1989 (renda média m ensal em dólares) Brasil1 Norte2 Nordeste Sudeste Sul Centro- Oeste Total Homens Mulheres 209,27 327,64 97,94 217,02 335,74 108,86 107,10 169,46 48,97 265,28 413,25 126,83 212,44 333,27 95,12 235,34 368,86 106,39 1 Exclusive população rural da região Norte. 2 Exclusive população rural. Fonte: IBGE, 1990b. Além disso, os trabalhadores carecem de amparo legal. Embora legalmente se exija dos empregadores que assinem a carteira de trabalho de seus empregados, somente um pouco mais da metade dos trabalhadores tem carteira de trabalho assinada, carteira que garante o acesso ao seguro-desemprego, tribunais do trabalho e benefícios públicos. Esta maciça evasão do registro legal é uma das mais impressionantes violações da lei no país. Em todos esses aspectos, a pior situação ocorre no Nord este e entre as mulheres. Precárias condições de vida das famílias e mortalidade infantil são corolários dessas situações. O acesso desigual e inadequado aos serviços públicos reduz a renda real. Um dos piores problemas que afetam a saúde é a : ausência de rede de esgotos, situação que é particularmente grave no Nordeste (Tabela 5.4). Na década de 80, com a crise fiscal do Estado, os serviços sociais se deterioraram ao extremo, assi m como a escola pública. A violência se intensificou nas rua s, bair ros e domicílios, e o sistema de transporte coletivo, irregular e apinhado, tri tura a existência cotidiana do trabalhador, que gasta grande parte dos seus dias em longas viagens da residência para I o trabalho. í } Áf • 17ê T a b e l a 5 .4 Abastecim ento de água e esgoto po r regiões (%) - 1970-1986 Abastecimento de água Esgoto Região 1970 1980 1986 1970 1980 1986 Brasil 32,8 54,9 69,9 26,6 43,2 51,1 Norte .19,2^ 39,2 '81,9 -, 8,8 20,4 51,8 Nordeste Sudeste 1 2 , 4 ^ 51,6 31.6 72.6 47,4 84,íb 8,0 43,9 1-8,2 63,5 28,2 71,3 Sul 25,3 52,0 65,4 20,1 40,3 55,1 Centro- Oeste 19,9 41,7 58,8 15,0 21,8 29,6 1 Exclusive população rural da região Norte. Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1970 e 1980. IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (PNAD), 1986. O campo bra sileiro não é comparável às áreas rurai s da África, Ásia, nem mesmo com grande parte da América Latina. A pobreza rela cionada ao c ampo bras ilei ro está fo rtemente liga da aos centros urbanos . A maior parte da população de mise ráveis ocorre em áreas “urbana s”, isto é, núcleos urbanos com menos de 20.000 habitantes, onde a população d epende tanto de empregos sazonais e temporários_na agricultura como de empregos nas cidades?-® j • Informações sobre salários, renda, acesso às amenidades, prot eção trabalhis ta e alfabetismo. evidenciam que a pobrez a está concentrada no campo, no Nordeste e entre as mulheres. Em contrapartid a, as estatísticas sobre as condições sociais pou co dizem sobre as estratégias de sobrevivência criadas pela popul ação pa ra complementa r a renda familia r e resis tir à pobreza a bsolu ta. Indícios dessa estratégia pa recem ser o de clínio da fecundidade e a crescente mobilidade do trabalho. 177 A mo bil idade do trabalho A concentração do capital e o crescimento econômico não repousaram apenas na repressão salarial, mas também na ex traordinária intensificação da mobilidade histórica dos trabalha dores. O processo migratório resultou não só na ampliação da margem de pobreza, mas na emergência de novas frações sociais que compõ em o universo da sociedade capitalista. Simultane amente, intensificaram-se a rotatividade do emprego e a “poli- valência”, isto é, o exercício de múltiplas tarefas ou múltiplos empregos por um mesmo indivíduo. Esta mobilidade espacial e social foi induzi da pela mod erni zação das firmas, por políticas trabalhistas explícitas, bem como pol íticas não explíc itas, t end o dois condic ion antes p rincipais . De um lado, a atração exercida pelos espaços dinâmicos, com novas oportun idade s de emprego e/ou de acesso à,terra, sobre tudo no Sudeste, nas metrópoles e, secundariam ente, na fron teira (Centro-Oeste e Amazônia) (Fig. 5.2). De outro lado, a modernização da agricultura que liberou a mão-de-obra rural em todo o país, retirando do Nordeste a quase exclusividade que possuía como fornecedor de migrantes. A mecanização subsidiada pelo governo, cujo melhor exemplo é o cultivo da soja, transformou o Estado do Paraná, de uma “fronteira móvel cafeeira” no maio r exportad or de mão-de-obra em apenas uma década (1970/80). A concentração da propriedade da terra decorren te de sua valorização e do acesso diferenciado ao cré dito resultou na expropriação violenta de pequenos p roduto res (posseiros, parceiros, pequenos proprietários, etc.). Em conseqüência, a mobilidade passou a se dar na escala nacion al e se fragmen tou a estru tura de classes sociais. A mobilidade está em grande par te associada à formação de um novo mercado de trabalho com especificidades regionais. For mou-se um proletariado diversificado, cujo primeiro tipo é o prole tar iado móvel rural -urbano. Nas áreas onde o mercado de 178 t ti >s ! Figura 5.2 Fluxos migratórios no Brasil —1970-1980. (Fonte: Ablas e Fava, 1984) 179 PoticipoçaoR elativa CD Imigrantes Emigrantes Intensidadedosfluxo s 200 O 400 800 1200 UI i I i 1 i I Milhares de habitantes trabalho é melhor organizado, como São Paulo, assalariados rurais permanentes foram transformados em trabalhadores tem porár ios que vivem nas cidades e vão traba lha r diar iam ente no campo, “osbóias-frias”. Em áreas menos capitalizadas, o cam pesina to tradicional se adaptou, transformando-se em semipro- letários e semicamponeses, vendendo o seu trabalho alternati vamente para o mercado urbano ou rural depende ndo da esta ção, e residindo em áreas urbanas. Esse processo significou maior instabilidade e exploração do trabalho, pois permite manter baixos os salários, induz à ampliação da jornada de trabalho e “libera” os patrões das obrigações trabalhistas. Um segundo tipo de proletariado corresponde aos emprega dos no se tor urbano formal e informal das grandes cidades e que respond e em grande p arte por seu crescimento. Ressalta, de um lado, a formação de um operariado de melhor qualifi cação associado à expansão da indústria metal-mecânica em São Paulo. De outro lado, uma fantástica massa de em pregadores e empregados co nstituindo um a “economia paralela” que foge da regulação oficial. Ainda pouco estudada, essa massa inclui atividades muito diversificadas, que vão desde o pequeno ven dedor am bulante até as pequenas indústrias. A expansão e diversificação da classe média associada ao Crescimento dos setores secundário e terciário e do aparelho do Estado constituem um dos fatos mais marcantes da trans formação da sociedade brasileira nos anos 60 e 70. Sua situa ção é instável, na medida em que tem uma propens ão consu- mista superior aos meios de que dispõe para satisfazê-la e é sobre quem recai o pesado fardo dos impostos da “economia oficial”. O novo significado da urbanização Uma urbanização com ritmo acelerado, cujas taxas são das mais elevadas no mundo, constitui a maior força por trás da modernização autoritária, atuando como um instrume nto e um produto das pol ític as gove rnam entais , dos seus efeitos não prev istos e dos ajustes espontâneos da sociedade. Is to porque a urbanização é o nexo da articulação do Brasil à economia- mundo como semiperiferia. Os núcleos urbanos são a sede das novas instituições e da circulação de bens, capital e informa ções e são também o lugar onde a força de trabalho, expulsa pela modernizaçã o agrícola , res ide, circula e é ressoc ializada , ingressando na modernidade da pobreza. As transformações estrutu rais da economia e da sociedade que caracterizam a semiperiferia assumem forma concreta e expressão máxima na formação de uma cidade mundial, São Paulo, que se toma um dos centros de controle e acumulaçãode capital em escala planetária. São Paulo passaa terpodernão apenas como mais importante núcleo produtivo do país, mas sobretudo como veículo de articulação financeira, de informação, de P & D, de indústrias de ponta com a economia-mundo. Preenche, as sim, duplo papel: estabelece o nexo com a economia-mundo e exerce o comando da integração econômico-financeira-tecnológi- ca do território nacional como cabeça de sua rede urbana. Urbanização acelerada O Brasil se transformou em um país urbano, em poucas décadas, comprimindo no tempo um processo que alhures se fez muito mais lentamente. As áreas urbana s passaram a con centrar 80 milhões de indivíduos. Ao contrário dos países la- tino-americanos como os do Cone Sul, que têm urbanização mais estabilizada, o Brasil manifesta um processo extrem amente dinâmico devido, em grande parte, ao próprio crescimento urbano —que não se reduz à mera “inchação” das cidades —à mobilidade da população e à fronteira móvel. T a b e l a 5 .5 Taxa de urbanização no Brasil - 1950-1989 Ano PopulaçãoTotal População Urbana Absoluta % 1950 51.944.397 18.782.891 36,2 1960 70.197.370 31.533.681 44,9 1970 93.139.037 52.084.984 55,9 1980 119.002.706* 80.436.409 67,6 1989 144.293.110 107.239.796 74,3 * Não está incluída a população rural da região Norte. Fonte: IBGE, Censos Demográficos, 1950, 1960,1970 e 1980. IBGE, 1990b. Entre 1950-80, dobrou o número total de cidades, mas o crescimento mais significativo ocorreu nas c idades médias e grandes. As cidades de mais de 100.000 habitantes passaram de 11 para 95, representando em 1980, 48,7% da população urbana do país. Dois movimentos complementares caracteri zam a urbanização: a acentuação da concentração e a tendência à dispersão espacial (Davidovich e Friedrich, 1988). (Fig. 5.3) Em termos de concentração, as regiões metropolitanas au mentaram sua participação relativa, nos anos 70, de 25,5% para 29,0% do total da população urbana. A indústria teve papel central no crescimento das metrópoles e das aglomerações urbanas imediatamente abaixo deste nível. Somente as regiões metro politanas de São Paulo e Rio dejane iro —com 12 milhões e 9 milhões de habi tante s, respectivamente —jun tas respondi- Figura5.3 Urbanização brasileira pormesorregião -1970-1980. (Fonte : Egler, 1989) ' j~ T '/ 7. ) p> j'-. >* n am, em 1980, por 75,4% do pessoal ocupado e quase 65% do valor da transformação na industrial em todo o país. Estas metrópoles são secundadas,.tanto ao nível do cresci mento demográfico, como de situação de renda, por dois tipos de cidades: a) as que correspondem à desconcentração ind us trial de São Paulo ou à implantação da fronteira científico-tec- nológica, e tiveram crescimento demográfico superio r ao da própri a região metro pol itana paulista , como é o caso de Cam pinas e São José dos Campos; b ) regiões me tropolit anas com indústrias ou pólos industriais avançados, como Belo Horizon te (metalurgia e material de transporte), Salvador (petroquími ca), Curitiba e Porto Alegre (indústrias diversificadas). A tendência à dispersão urban a, tanto em termos p opulacio nais, como de renda, se faz por três modalidades, movidas po r fatores que não se ligam diretamente à indústria, geralmente correspondendo a posições de contato entre áreas de economi as diversas. A primeira modalidade é a extçnsão contínua de centros urbanos a partir da cidade mundial; trata-se de cidades ricas que balizam regiões de agricultura diversificada e regiões basicamente pecuarist as por onde avança a agricu ltura moder na da soja e da cana-de-açúcar. A segunda é a formação de uma ampla frente urbana de interiorização correspondente às grandes capitais estaduais dos Estados do centro-norte, quejbalizaina urbanização no in terior como pontos de contato e intermediação entre as bordas da cidade mundia l e áreas de avanço da fronteira. Papel central na pre sen ça de grandes popula çõe s e de renda s rela tivamente elevadas deve-se ao Estado. O expoente máximo de ssa situação é Brasília, a capital da geopolítica, que registrou a maior pro porção no país da PEA urbana nas mais a ltas c lasses de renda. A terceira modalidade da dispersão é característica da fron teira. Inclui centros regionais e locais que constituem a base logística das frentes de expansão agropecuárias e minerais; inclui também o crescimento explosivo de pequenos núcleos disper sos vinculados à abertura da floresta ou a garimpos, que se -Wi A/\ ( H <\. o Ir ^ 9184 '0 . | 0 , Ct\ . r c 'u- A U- constit uem em locais de reprodução d a força de trabalho móvel, razão pela qual muitos são tam bém efêmeros, deslocando-se com o deslocamento das frentes (Becker, 1984). Pobreza urbana A urbanização foi sustentada em grande parte por um a es magadora maioria de mão-de-obra barata e pobre (Santos, 1979). E ainda assim, o trabalho urbano significa ascensão, pois a pro porção de tra ba lhadores na faixa inferior a um salário mínimo foi de cerca de 25% no Brasil urbano, bem inferior à perc enta gem de 38% do país como um todo. Apesar da multiplicidade de tempos e espaços, persiste, ao nível regional, a polaridade riqueza/pobre za entre o Nordeste e São Paulo. No Nordeste, além da pobreza rural, a urbaniz ação com industrialização induzida não resu ltou na elevação da renda dos trabalhadores, mesmo nas grandes concentrações metro pol itanas . Existe um padrã o nordestino de urbanização: as cidades apresentam prevalência de baixa renda, em que mais de 50% da PEA urbana recebem até um salário mínimo. Ao nível intra-regional e intra-u rbano —a dispa ridade se re produz . A região metropoli tana de São Paulo é muito mais rica do que a do Rio dejaneiro, e a pobreza está contida dentro das grandes metrópoles. Na região metropolitana de São Paulo, a proporção de traba lhadores ganhando até um salá rio mínimo é 9,2%; na do Rio dejaneiro é superior a 14,0%, e na de Belo Horizonte alcança quase 21%. Crescimento econômico com pobreza crescente, movimen tos espontâneos na economia informal e estruturas econômi cas formais se complementam para sustentar o crescimento metropolitano. A pobreza, por um lado, constitui um entrave à maior expansão das grandes empresas; mas, por outro, per- 185 mite a proliferação de fabricação menos capitalizadas e criado ras de emprego. O mercado unifica a economia urbana e, quan to maior a cidade, maior a possibilidade de multiplicação de atividades informais. Explica-se, assim, a expansão do empre go —ainda que rotativo e mal remun erado —na indús tria me tropolitana, ao contrário do que ocorre nas economias centrais. No caso brasi leiro, a periferia cresce com a indúst ria e a migra ção da população de baixa renda. O lugar da riqueza torna-se literalmente o lugar da pobreza (Santos, 1989). As metrópoles tornaram-se também o lugar da crise urbana, das carências sociais de vários tipos manifestando em movi mentos de “posse iros”, de “invasões dos sem-teto” e loteamen- tos clandestinos. Elas têm os problemas de gestão complexa comum às grandes aglomerações urbanas que se repartem entre distintas adm inistrações locais, bem como os problemas espe cíficos das cidades de economias periféricas, resultando em ele vado potencial de conflitos reivindicatórios de direito à ci dadania. As grandes aglomerações urbanas tornaram-se o palco prin cipal da luta pela redemocratização da sociedade e pela preser vação do parque in dustrial nacional. Amais viva expressão deste processo foi a eleição de Luiza Erundina, mulher , mig rante nordestina e ativista do Partido dos Trabalhadores, para a Prefeitura da cidade mundial brasileira em 1989. Complexos e redes: a armadura do território Entre 1967 e 1982 uma crescente transnacionalização da estrutura produtiva e um elevado endividamento externo se verificaram no país. O Estado autoritário, de modo distinto dos demais países vizinhos do Cone Sul, procurou su stentar níveis elevados de investimento, não apenas expandindo a rede de 186 infra-estrutura, como tambémavançando à frente do setor pri vado em segmentos industriais considerados estratégicos para a consolidação do projeto geopolítico. Complexos industriais Com o resulta dode sta política, em 1979, o setor industrial respondia por_38%^clo PIB, e a participação dos manufatura dos, que segundo o critério do Banco Mundial corresponde ao segmento mais dinâmico da indústria, atingia 28% do PIB. A estrutura ind ustrial brasileira sofreu uma transformação subs tancial nas últimas du as décadas (Tabela 5.6). Esta mudança é explicada, em grande parte, p or variações nas participações de apenas quatro ramos industriais: metalurgia e produtos quí micos, que aument aram sua participação, e têxteis e alimentos que reduziram sua participação (Penalver, et al, 1983:9). T a b e l a 5.6 Taxas de crescimento das categorias industriais no Brasil - 1966-1980 (índices percentuais anuais) Indústrias 1966/67 1 96 8/7 3 , 1974/80 Bens de consumo 4,8 11,9 5,0 a) duráveis 13,4 23,6 7,7 transportes 13,1 24,0 3,3 elétricos 13,9 22,6 15,5 b) não-duráveis 3,6 9,4 4,5 Bens de capital 4,5 18,1 -7,1 'Bens intermediários 6,8 13,9 6,8 1^onte: Penalver, M. ct a!., 1983 fv. C i a T 10 ^ 187 n Ç i Pv C - y u i ' t u ffv Em 1962, a metalurgia e os produtos químicos respondiam por 20,5% do tota l da produção industria l, en quanto têxteis e produtos alimentares atingiam 34,3%. Em 1980, a situação havia se invertido, com os dois primeiros ramos dinâmicos respon dendo p or 33,8% e estes últimos por 21,1% do valor da pro dução manufatureira. A situação se manteve essencialmente a mesma pa ra os demais ramos, exceto a indúst ria mecânica, cuja par tic ipação cresceu regu larm ente de 2,9% em 1962 para 7,8% em 1976, declinando ligeiramente para 6,4% em 1980. Os efeitos desta dinâmica, aliados ao próprio movimento interno da economia, vão se refletir de modo contraditório sobre a distribuição territorial da indústria no Brasil. De um lado, reforçam-se as tendências concentradoras do padrão espacial fundado na concorrência oligopólica. De outro, observa-se a disper são do investim ento em localizações privilegiadas, como por tos , dis trit os indust ria is incentivados e a Zona Franca de Manaus. (Fig. 5.4) É importante ressaltar que este movimento tem pouco a ver com a emergência d2 uma indú stria regional que se configuras se como uma estrutura produtiva relativamente autônoma. Pelo contrário, o deslocamento espacial do investimento industrial, que se acentua nos a nos 70, foi um processo complementar e articulado à acumulação no núcleo industrial consolidado. O desenho da nova divisão territorial do trabalho no Brasil assu me os contornos ditados pela própria estrutura industrial, com a conformação de complexos fortemente integrados, como é o exemplo do químico e do metal-mecânico. A divisão em complexos industriais é a mais adequada para analisar a nova divisão territorial do trabalho resultante da inserção do Brasil como semiperiferia na economia-mundo (Tabela 5.7). Primeiro, porque rompe com a segmentação entre indústria, agricultura e serviços de apoio à produção, perm itin do compreender, por exemplo, o Complexo Agroindustrial (CAI), como a forma contemporânea de expansão do capitalis mo no cam po brasileiro. Segundo, porque a e strutura em com- 188 CRESCIMENTO 1 9 7 0 / 80 ES3 1 - T i l s - io •/• £23 io •/• PRODUÇÃO INDUSTRIAL Figura 5A Produção industrial e força de trabalho por mesorregião -197 0-19 80. (Fonte: Egler, 1989) 189 plexo ind ust ria l pe rmite verifica r a separação territoria l entre as atividades de gestão e P & D das atividades produtivas ro tineiras. Assim, enquanto se centralizavam os escritórios de gerência e os centros de pesquisa e desenvolvimento, verifica- va-se a dispersão de fábricas por diversos pontos do território, depende ndo da qualificação necessária da força de trabalho. T a b e l a 5.7 Perfil de eficiência dos complexos industriais -1984 (evolução dos índices de produtividade) Complexos Setores Tamanho Ascendente Descendente Indefinido Relativo Químico 5,1 31,7 63,2 75,9 Metal-mecânico 69,9 22,8 7,3 32,1 Agroindustrial 44,8 39,0 16,2 22,0 Têxtil e calçado 91,5 8,5 — 11,2 Papel e impressão 43,3 34,4 22,1 4,5 Construção — 60,6 39,4 4,3 TOTAIS 45,8 29,2 25,0 100,0 Nota: Set or asce nde nte : pro du tiv ida de cres cen te de 1975 a 1984 . Setor descendente: produtividade decrescente de 1975 a 1984. Setor indefinido: produtividade decrescente só depois da crise de 1982. Fonte: Araújo, J. T. et a l , 1989. A configuração espacial do complexo químico no Brasil é ilustrativa deste processo. Originalmente concentrado no eixo entre São Paulo e Rio, onde estão estabelecidas as grandes cor pora çõe s mul tinacionais, algumas delas bastante antigas no mercado brasileiro - como é o caso da Bayer ou da Rhodia es tabelecidas no primeiro quartel deste século —ele se expandiu 190 e diversificou vigorosamente através de investime ntos maciços, principalmente de empresas estatais. Atuando na montagem das indústrias básicas do complexo, principalmente na petroquí mica, o Estado comandou o processo de descentralização do setor com a implantação do Pólo Petroquímico de Camaçari, na Bahia, e posterior men te o de Triunfo, no Rio Grande do Sul. No entanto, a dist ribu ição espacial do complexo mo stra que as indústrias de química fina, intensivas em tecnologia, conti nuam concentradas nas vizinhanças da cidade mundial, onde dispõem de m ão-de-obra treinada e quadros técnicos qualifica dos indispensáveis para a produção de substâncias químicas de rigorosa especificação. Do mesmo modo, os ce ntros de gestão do complexo químico, sejam de empresas estatais ou privadas, estão c entralizados no eixo Rio—São Paulo, mesmo aquelas cri adas para operar no Pólo de Camaçari, como é o caso da Nor deste Química S.A. (NORQUISA), cujo escri tório central se si tua no centro financeiro do Rio de Janeiro. De modo semelhante, o complexo metal-mecânico expan diu sua área de atuação não apenas no entorno da cidade mundial, mas, também, através da ação do Estado, em novas localizações. O eixo automobilístico do complexo continuou basicamente concen trado em São Paulo, exceto pela implanta ção da FIAT nas vizinhanças de Belo Horizonte. Entretanto, novas plantas indust riais, tanto montadoras de veículos, como de auto peças, in ici aram sua operação nas bordas da cidade m undial , principalmente no Vale do Paraíba Paul ista e no Sul de Minas Gerais, onde havia mão-de-obra treinada e com baixo nível de sindicalização. Especial destaque deve ser dado ao eixo eletroeletrônico, pois sua configuração espacial foi bastan te influenciada pela implan tação da Zona Franca de Manaus em 1967 que, devido às faci lidades de importação de peças e componentes, reorientou a montagem de aparelhos eletrônicos de consumo, como televi sões, rádios e aparelhos de som para o interior da Amazônia. A Zona Franca não deve ser confundida com um a Zona de Pro- 191 cessamento de Exportações, pois a maior parcela de sua pro dução destina-se ao mercado interno. No entanto, apesar de todas as vantagens fiscais oferecidas, o preço interno dos pro dutos oriundos de Manaus é quatro vezes maior do que os praticad os no mercado in ternac ion al (A rau joJ .T. et al , 1989), e os incentivos, que deveriam con tribuir para o avanço no desenvolvimento do setor, são integralmente transferidos para o exterior através da importação de componentes eletrônicos efetuados por filiais de grandes corporações multinacionais. A desarticulação entre as montadoras de pro dutos eletrôni cos e a indústria de componentes, principalmente de semi condutores de larga integração, têm sido um entrave para o desenvolvimento da microeletrônica no Brasil. Isto afeta tanto a indús tria de informática, como a bélica, que são consid era dos setores estratégicos pelas Forças Armadas. A eletrônica embarcada, que inclui desde equipamentos computadorizad os pa ra automóv eis até aviões, const itu i um,dos seg men tos m ais atrasados do complexo, justamente devido à dificuldade de estabelecer os laços entre a indústria mecânica nacional e a microeletrônica estabelecida no exterior. O terceiro complexo em importância no Brasil é o agroin dustrial; sua conformação representa diretamente os resulta dos da política agrícola da modernização conservadora. O de senvolvimento do sistemad ecrédito xural, os subsídios diretos à tecnificação e os incentivos à exportação foram os instru men tos básicos para promover a expansão da grande empresa no campo brasileiro (Tabela 5.8). Este processo converteu a agri cultura em condição necessária da acumulação na indústria, articuland o diretamente o complexo agroindustrial em forma ção, ao químico e ao metal-mecânico. As mud anças estrutu rais não se resumem aos aspectos eco nômicos e tecnológicos, mas abarcam tamb ém a estrutur a social. Novas relações se estabeleceram entre trabalhadores rurais, com ou sem terra, e com as corporações que ampliam sua área de atuação (Muller, 1982). Formas anteriores de produção foram 192 reinventadas sob o co ntrole do capital agroindustrial, como é o caso do colonato, típico das regiões cafeeiras do início do século, que assumem novas dimensões justamente onde os tratos cultura is são intensivos em mão-de-obra, como na cultu ra da vinha ou na criação de pequenos animais, assim como na generalização do trabalho temporário e sazonal, caso dosbóias- frias que habitam a periferia de pequenas e médias cidades. T a b e l a 5 .8 Empréstimos do sistema bancário nacional à agricultura -1973-1980 (em bilhões de cruzeiros) Período Banco do Brasil Bancos Privados Total Valor % Valor % 1973 36,6 22,9 62,4 13,7 37,6 1975 105,0 71,2 67,8 33,8 32,2 1977 212,0 154,5 72,9 57,4 27,1 1979 461,3 357,9 77,6 103,3 22,4 1980* 626,8 491,5 78,4 135,3 21,6 * Janeiro/julho. Fonte: Banco Central do Brasil - Departam ento Econômico. Avia autoritária brasileira de tratar a questão agrária foi capaz de garantir a mod ernização da agricultura, através de sua cres cente tecnificação, mantendo intocável a grande prop riedade. As conseqüências deste processo foram inevitáveis, com a libe ração maciça de grandes contingentes populacionais que se dirigiram para as pequenas e grandes cidades, funcionando como reserva de mão-de-obra, acentuand o a histórica concen tração da posse d a terra (Tabelas 5 . 9 a e 5.9b). Na década de 70, como efeito de medidas anteriores ligadas às áreas fiscal e fi nanceira e de melhoria das condições de acessibilidade —atra 193 vés de grandes eixos viários que articulam as áreas de maior desenvolvimento econômico do país com espaços pouco inte grados à produ ção —a agricultura apresentou um a ampliação extrao rdiná ria da superfície cultivada. Registrou-se um aumento absoluto de 70 .708.955 hectares na área dos estabelecimentos, o mais elevado desde 1940, como resp osta aos fortes incenti vos governamentais à ocupação da mata amazônica e do cer rado, consubstanciados em programas especiais, criados em 1975, para o desenvolvimento do Brasil Norte e Central (Mes quita , O. e Silva, S.T. 1988). T a b e l a 5.9a Percentagem do total de área pertencente às 5% maiores propriedades rurais no Brasil — 1960-1980 1960 1970 1980 Brasil 67,9 67,0 69,3 Norte 90,1 64,5 68,6 Nordeste 65,3 66,7 68,3 Sudeste 55,2 53,0 53,9 Sul 56,6 56,3 57,9 Centro-Oeste 64,6 67,4 65,3 Fonte: Hoffmann, 1982. Mesmo no Nordeste, onde a persistência dos domín ios agro- mercantis se faz marcante até os dias atuais, a modernização está presente no s grandes projetos de irrigação e na revitaliza ção da agricultura canavieira, que recebeu subsídios vultosos para a produção de álcoo l combustível. As novas formas de adaptação tornaram as oligarquias regionais dependentes de financiamentos e de bens e insum os agrícolas, do mesmo modo 194 que os agricultores do S udeste ou Sul. A questão é q ue isto foi conseguido através de tratamento privilegiado por parte do aparelho do Estado, que garantiu não apenas linhas de crédito especiais, como mercados cativos para a produção regional. T a b e l a 5.9b Posse da terra no Brasil - 1985 (em percentagem de estabelecimentos rurais) menos de 100 ha 100 a 1.000 ha mais de 1.000 ha n9 área n9 área n9 área Brasil 90,0 21,2 8,9 35,1 0,1 43,7 Norte 83,0 22,0 15,9 30,2 1,1 47,8 Nordeste 94,3 28,6 5,1 39,3 0,6 32,1 Sudeste 75,8 25,6 23,4 46,7 0,8 27,7 Sul 94,1 39,0 5,4 35,9 0,5 25,1 Centro-O este 6 2, 4 4,8 30,7 25,9 6,9 69,3 Fonie: IBGE, Sinopse P reliminar do Ce nso Agrícola, 1985. Considerada em seu conjunto, boa parte da modernização conservadora na agricultura brasileira pode ser resumida na introdução e difusão d o cultivo de soja no Brasil. Em 1960, a área colhida com essa oleaginosa era de 171 mil hectares, produzin do 206 mil tonelada s; vinte anos depo is, o Brasil cultivava 8.765 mil hectares, colhendo 15.159 mil toneladas. (Fig. 5.5) Consid erando o conjunto do setor soja —grãos, farelo/torta e óleo —passou ele a rivalizar com o café para oc upa r o primei ro lugar em valor, com 12% da pauta da s exportações brasilei ras em 1980 (Homem de Melo, 1983). A rápida expan são da área cultivada, abrindo inclusive a fronteira ecológica dos cer rados p ara a agricultura, seria impossível sem os melhoramen tos genéticos, a tecnificação maciça dos tratos c ulturais e a grande 195 escala das plantas de beneficiamento. A soja é um produto da nova fase da agricultura brasileira, onde o complexo agroin dustrial assume papel preponderan te na moldagem do espaço rural. 26000 2 1000 CO tu01 ü 16000< ÜJQ CO £ 11000 <r _j 2 6000 1000 Figura 5.5 Evolução da área cultivada com soja. (Fonte: IBGE, produção agrícola municipal, vários a nos) As redes nac ionais A organização espacial das redes de circulação de mercado rias, distribuição de energia elétrica e de telecomunicações constitui um indicador, mesmo que superficial, dos efeitos do proc esso de modernização sobre o terr itór io, na medida em que foram transformadas estruturas espaciais pretéritas e cons- 196 truídas novas formas adequadas ao processo de produção e gestão da empresa capitalista em sua fase avançada. Neste sentido, as redes m anifestam a territorialidade dos complexos industriais. (Fig. 5.6) Figura 5.6 Redes nacionais. (Fonte: Egler, 1989) 197 A rede de circulação de mercadorias, expressa na malha rodoviária nacional, delimita, grosso modo, a área de mercado integrada. Não se trata propriamente de uma estrutu ra monta da a partir do setor m anufatureiro, pois que reflete as heranças do passado agrário-mercantil, quando assumia a forma de “bacias de drenagem ” destinadas a integrar as áreas produtivas aos portos litorâneos, tal como a rede ferroviária. Sobre estas “bacias” superimpõe-se o traçado dos grandes eixos nacionais, que convergem para o centro manufatureiro no Centro-Sul do país, como, por exemplo, a BR-116, antiga Rio—Bahia, que se constitui no primeiro grande eixo de interligação entre o Nor deste e o núcleo industrial do Sudeste. A rede de energia superimpõe-se à área industrial central, mostrando a capacidade da atividade manufatureira de cons trui r sua base técnica territorial, que, no caso específico da rede de distribuição de energia elétrica, foi montada nos últimos tri nta anos com maciço investimento estatal. É corrente conside rar as fontes de energia como um fator-chave de localização industri al. Entretanto, dado o caráter tardio da industrialização brasi leira, que já nasceu buscando atingir economias de escala, e considerando a mobilidade da energia elétrica, a constituição do parque industrial ocorreu concomitantem ente com a cons trução da rede de distribuição de energia, o que resultou na extraordinária concordância entre a localização de plantas industria is e os circuitos da rede de energia elétrica. O resultado espacial deste processo, pode ser percebido quando se compara o sistema de geração e distribuição de energia elétrica no Sudeste com seu congênerenordestino. Enquanto na área industrial central observa-se o adensamento dos circuitos, formando uma rede complexa, o sistema nordes tino se apresenta com eixos isolados que atendem os principais núcleos urba nos da região. Finalmente, a rede nacional de telecomunicações, expressa no sistema de microondas, mostra que os maiores aglomera dos urbanos estão interligados no que diz respeito à circulação 198 rápida de informações a longa distância. A construção desta rede, iniciada durante os anos sessenta e intensificada durante a década de setenta, mostra os efeitos da centralização dos processos decisórios na cidade mund ial e atende, principalmen te, às demandãsTiõ^sêtõrfmànceiro, que de pende de ligações rápidas e confiáveis a longa distância para operar competitiva- mente. A principal observação que deve ser feita quanto à rede de telecomunicações é que, desde o momento de sua concepção, já necessariamente é um a rede nacional. Em poucas pa lavras, é a materialidade espacial da forma mais avançada de operação capitalista, a em presa financeira multilocacional. É neste sen tido que é possível compreender o rápido desenvolvimento do sistema nacional de comunicações a longa distância que, em duas décadas, interligou todo o território nacional, sem que a grande maioria da população te nha acesso sequer a um apare lho telefônico. O espaço transfigurado O caráter híbrido da semiperiferia se manifesta também ao nível da estrutura espacial. A cidade mundial e a m alha progra mada tendem a sup erar as dimensões das regiões históricas, a das regiões de política oficial, bem como a e strutura centro- periferia. Mas a fluidez do espaço é incomple ta, pelo menos por três razões. Primeiro, a proposta de modernização conservadora é em si limitada, privilegiando grupos sociais, setores de atividades e lugares selecionados. Segundo, é forte a inércia espacial exer cida pelo padrão histórico conce ntrado do antigo arquipélago econômico, escala em que os domínios exercem expressão máxima e diferenciada. Terceiro, a dimensão continental do 199 país que perm ite expand ir a mobilização de recursos e o povo amento, m as favorece também a desigualdade. Apolitização da estrutura espacial neste contexto foi levada ao extremo, com o espaço tornando-se instrumento e condição da mode rnização conservadora. A gestão estatal do território foi eminentemente estratégica, envolvendo não apenas sua administração em termos econômicos, mas também as relações de poder. Entre 1955 e 1970, a política regional procuro u se identificar com a construção da nação. A macrorregião foi a escala ótima de operação do tripé, tanto para promove r a uni ficação do mercado nacional, como para a centralização do poder governamental. Na década de 70, os grandes projetos geridos pelas em presas estata is, em joint -ventures ou isoladamente, substituem a política regional através de novos ajustes com as frações hegemônicas regionais. A espacialidade da semiperiferia Os modelos de análise disponíveis para apreender um a re alidade complexa como a brasileira podem ser grupados em duas vertentes básicas. O primeiro deles se fundamenta nas estruturais duais, na c oncepção do tradicional que se opõe ao moderno como um freio que dificulta o desenvolvimento eco nômico e a difusão do progresso técnico. A superação da con cepção dual ista foi feita através do conceito de “heterogeneida de estrutura l” proposto originariamente por Anibal Pinto (1965), que refutava a aplicação mecânica de modelos fundados na ‘homogeneidade ’ das estrut uras econômicas e sociais, típicos das economias centrais, na América Latina. O m érito da con cepção de Pinto estava em romper o ‘nó górdio’ imposto pelo dualismo, permitindo compreende r as sociedades latino-ame- ricanas, não como estruturas imperfeitas ou disformes, mas, 200 pelo contrá rio , como aquelas que têm na heterogeneidade seu traço constituinte fundamental. A questão que fica a descoberto, entretanto, é a de como compree nder o movimento de uma sociedade heterogênea. Ou seja, já que ela não “evolui” na direção da hom ogeneidade, qua l será o seu comportam ento dinâmico? É nesse ponto que o conceito de semiperiferia de Wallerstein assume importância. Enquanto síntese contraditória, ela combina, em um mesmo território e em um mesmo mom ento, espaços e tempos díspa res cujo ajuste é conseguido a partir de instrum entos políticos, onde o Estado assum e papel central. O Estado participou da introdução das rápidas mudanças do mundo contemporâneo, sincronizando-as com a permanên cia de estrutu ras diacrônicas, cuj o tempo é definido por rotinas solidamente enraizadas que tendem a “atrasar” o relógio da modernidade. Sao ritmos e cadências completamente distin tos, com diferentes velocidades que convivem em um mesmo per íodo tempora l, obrigando a uma complexa gestão dos rit mos de mudança. O espaço dos fluxos, conectado aos circuitos internacionais de capitais, mercadorias e informações, tende a “descolar-se” do espaço dos lugares, fundado na perm anência de territoria- lidades historicamente adquiridas, que constituem imensa resistência a transformações. A semiperiferia é o locus de fortes tensões que tendem a levar à fragmentação espacial, em várias escalas, de mosaicos de modernidade em uma superfície irre gular de miséria. O Brasil é ím par para exemplificar esta situação, contribu indo inclusive para melhor precisar o próprio conceito de semiperiferia. O status de potência regional foi alcançado atra vés de uma modernização conservadora, que produziu trans formações significativas, sem rom per com ordem social hierar quicamente organizada. A gestão autoritária do território foi um instrum ento essencial para produzir fronteiras, enquanto indutoras de rupturas; garantir domínios, enquanto suportes / ___ j , r do establishment e consolidar uma cidade mundial, enquanto nexo com a economia-mundo. A fron teira não se resume a uma vasta extensão de terras li vres, a ser explorada po r homens tamb ém —pretensam ente — livres, nem tampouco representa um determinado tipo de peri feria. Const itu i um espaço econômico, social e polí tico não plenamente est ru turado e pot encialm ente gerador de rea lida des novas. A geopalítica do Estado brasileiro construiu, não apenas uma, mas muitas fronteiras, que deveriam oferecer pers pectivas de cre scimento econôm ico, de solução de ten sões sociais e do pleno exercício do po der sob re o tempo e o espaço. Os domínios são áreas consolidadas, com estruturas políti cas relativamente estáveis, mantidas através de alianças com interesses locais e regionais que participam do bloco do p oder, dando sustentação ao projeto de modernização conservadora. Assim se perpetuaram formas quase monopolistas de propri edade da terra e do capital, graças a toda sorte de instrum entos pol íticos que garantem pr ivilég ios adquir ido s, criando ba rre i ras à entrada de novos concorrentes. Fronteiras e domínios são articulados através de uma cidade jnundial, que manifesta a nova forma de inserção do Brasil na economia-mundo. A cidade mundial na semiperiferia é, ao mesmo tempo e lugar, centro de gestão e acumulação de capital em escala planetária e núcleo de comando de uma vasta rede urban a que conecta a multiplicidade de espaços e tempos que compõem o território nacional. A emergência da cidade mundial é explicada, em parte, pelo movimento de acumulação do capital multinacional na econo mia-mundo. Entretanto, é da combinação deste movimento global com a atuação do Estado q ue se configura, no Brasil, um padrã o dinâmico ond e a concentração social e espacia l da r i queza é acompan hada pela dispersão seletiva do investimento público e privad o através da malha “program ada”, imposta pelo Estado, porém cujo traçado atende aos interesses que compõem o tripé. 202 ÿoa Vis t£* / j Macapo' Teresin; • PortoVelho T̂Macekf /Aracaju ^SALVADOR 'Goiânia ,BELÓ / / f vHORIZOÇiyE 'Campo 'Gronde ^ /CURITIBA wAFIoriandpolisPORTO ALEGRE A A CIDADE MUNDIAL COMPLEXO URBANO INDUSTRIAL CINTURÃO AGRO-INDUSTRIAL ' / / f y o d om ín io a g r o - m e r c a n t il FRENTES DE MODERNIZAÇÃO AAA A GRANDE FRONTEIRA * METROPOLES • CAP ITAIS ESTADUA IS RIODEJANEIRO SÃOPAULO Figura 5.7 O espaço transfigurado. A malha “program ada” manteve domínios, expandiu fron teiras e fortaleceu a cidade mundial, que na escala nacional assumem ex pressão mais geral respectivamente na persistên cia da questão regional no Nordeste, na configuração de uma imenoa Fronteira e na conformação de um vasto complexo urbano-industrial a partir do cen tro dinâmico do Sudeste. Estes movimentos ex propriaram e excluíram significativos contin gentes sociais, gerando conflitos que constituem matrizes de novas territorialidades, que passam a expressar projetos alter nativos da sociedade civil. 203 Reestrutu ração territo ria l A estrutura centro-periferia foi transfigurada pela moderni zação conservadora, redefinindo hierarquias e posições de pod er, reest ruturan do funções e unid ade s de produç ão, d istr i bui ção e gestão. A consol idação da cidade mun dial , de domí nios, e a abertura de fronteiras são expressões desse processo. As novas territorialidades que emergem do conflito entre a malha programada e o espaço vivido assumem feições específ icas em cada uma destas formações espaço tempo. (Fig. 5.7) A cidade mundial e o complexo urbano-industrial A nova forma de inser ção do Brasil na economia-m undo teve sua maio r expressão n a formação da cidade m undial —São Paulo —e de uma est rutura u rbano-indus tria l in timamente articula da, que emergiu da concentração e ampliação do núcleo eco nômico du rante os anos 60 e 70. Esta área é a parte do país mais integrada à economia-mundo e a mais dinâmica, tanto em ter mos de relações internas, como externas, promovendo a urb a nização acelerada do território e gerando focos de modernida de. As mudanças na distribuição territorial da po pulação ex pre ssa esse processo, que é ca racterizado pelo descompasso entre o intenso crescimento urban o, mesmo em áreas de pre domínio d as atividades agrícolas, e a fraca mudança no aden samento da popu lação, só expressiva em tomo de São Paulo e nas bord as da grand e fronteira. (Fig. 5.8) Os fluxos de informação estão amplamente concentrados em São Paulo, sede da maioria dos bancos privados, correspon dendo a 60% do sistema bancário nacional, incluindo 18 dos 23 bancos estrangeiros que operam no Brasil (Corrêa, 1989). 204 Figura 5.9 Expansão da área metropolitana de São Paulo —1930-1980. (Fonte: Retrato do Brasil, 1984) Os bancos são os principais clientes dos serviços da EMBRA- TEL que ligam o cen tro nevrálgico da Av. Paulista às re stante s cidades mundiais. Para São Paulo vai metade do fluxo de cha madas da rede de telex nacional (Cardoso & Bovo, 1989). Con tíguo à cidade mundial, consolidou-se um domínio dinâmico, que absorveu grandes fatias do investimento estatal e das mul tinacionais, configurando-se como o locus privilegiado do tripé (Figs. 5.9 e 5.10). Aí se localiza a fronteira científico-tecnológi- ca, o eixo de expansão m etropoli tano que conec ta São Paulo ao 206 Figura 5.10 Expansão indu stri al no Estado de São Paulo —1975- 1986. (Fonte: Azzoni, 1989) Rio de Janeiro e uma grande área indus trial praticamente con tígua que, partindo da cidade mundial, ultrapassa os limites do Estado de São Paulo —incorporando porções dos Estados vi zinhos de Minas Gerais e Rio de Janeiro —e projeta um vetor em direção a Brasília, a capital da geopolítica (Vesentini, 1986) (Fig. 5.11). A sua volta, uma const elação de metrópoles —for mada por Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre -de staca -se pelo dinamismo do crescimento da indústr ia, con f gurando uma 207 hierarquia de funções e de poder vinculada às atividades pro dutivas, de distribuição e de gestão. Um vasto cinturão agroindustrial se espraia em todas as direções, desde os campos meridion ais até os cerrado s centrais, avançando em fronteiras ao longo dos princip ais eixos rodo viários, dinamizando centros regionais, capitais estaduais e a própria capital federal. A part ir daí, a modern idade se instala em focos isolados, na sua maioria resultantes da malha programada. Bolsões de pobreza e domínios conservadores perm anecem nas vizinhanças e mesmo dentro da pró pria cidade mundial e nas demais metrópoles. Em contrapartida, aí emergem a opo sição e as novas territorialidades mais significativas, que não podem ser des ligadas da nova forma de inserção na economia- mundo. É na bord a ocidental da cidade mundial, no território da ind ústria automobilística, que emergiu o “novo sindicalis mo”, autônomo em relação ao Estado, com ligações com fede rações sindicais internacionais. Novas formas de resistência à modernização conservadora foram geradas e difundidas a partir da cidade mundial e de seu entorno imediato. Movimentos sociais, de base localizada, representam projet alternativos da sociedade em busca de justiça social. O domínio agromercantil com frentes de modernidade O domínio agromercantil expressa a persistência de níveis dramáticos de pobreza rural e urban a e de modernas oligarqui as. No caso do Nordeste, através do expediente histórico de utilizar a fragilidade da economia regional às estiagens perió dicas como instrumento de solicitar tratamento diferenciado, construiu-se uma intrincada trama de subsídios e proteção 208 Figura 5.11 Brasília e cidades-satélites. (Fonte: adaptado do IBGE/CNG, 1966) 209 i li; ; t í: !íl; estatal, q ue resiste às forças da concorrência intercapitalista. Reside aí a “questão regional” nordestina. A proposta de industrialização regional promovida pela SUDENE facilitou a integração do domínio n ordestino à cida de mundial. Entretanto, foram os grandes projetos da década de 70 que criaram fronteiras de modernidade, seja em focos como é o caso do Pólo Petroquímico de Camaçari, nas vizinh an ças de Salvador, seja em eixos como foi o caso dos grandes proje tos de irrigação ao longo do vale do São Francisco. O Programa Nacional do Álcool —PROÁLCOOL levou à mo der nização da agro-indústria canavieira nordestina, embora de for ma distinta de sua congênere paulista, pois foi incapaz de com pletar plenamente a integração em complexo devido à sua grande dependência de fornecedores extra-regionais de equipamentos e insumos. Com o PROÁLCOOL, a luta pela terra e pela regulamentação dos direitos trabalhistas assumiu novas formas. Aherança das Ligas Camponesas, movimento social de camponeses que eclodiu na zona canavieira no final da década de 50, foi potenciada e unifica da pelos conflitos resultantes da expansão das plantações, o que transform ou os sindicatos de canavieiros em instrumentos de luta pelos direitos sociais e levou à conquista de territórios através da resistência, geralm ente apoiad a pela Igreja Católica, à expropriação promovida pela modernização da agricultura. A fronteira energética e de recursos também atua diretam en te sobre o domínio agromercantil. A exploração de gás natural e petróleo,oj[Jshore realizada pela PETROBRÁS, levou à implan tação de bases de apoio, terminais e instalações de beneficia- mento em vários pon tos do litoral, desde Campos, no Estado do Rio dejane iro, até Natal, no Rio Grande do Norte. Grandes pro jetos foram imp lantados, na forma de complexos terr itori ais, que incluem minas, plantações, unidades de beneficiamen- to, dutos, ferrovias e terminai s especializados, produzind o ferro e metais ferrosos, bauxita e alumina, soda e barrilha, celulose e papel, na maior par te destinados à exportação. o > ^ 2 1 0 f V l a t AiOv jU c o CK j d y JjV- (j- r Os impactos desses grand es projetos sobre o domínio agrá- rio-mercantil são restritos. De um lado forçam reacomodações entre os grup os do minantes locais, que se beneficiam de modo diferenciado do aporte de recu rsos; de outro, têm efeitos limi tados sobrea estrutura produtiva e de renda, já que em sua maioria operam com elevada produtividade ejntemaliza m boa parte de.sua demanda.porhens.e.serviço s, o_que pou co jesu lta i ^ termos de desenvolvimento regional. Há, no entanto, exter- nalidades ineren tes aos projetos. Uma delas é a rápida difusão de movimentos ecológicos, que gradativamente assumem di mensão nacional a partir do final dos anos setenta, passando a exercer pressões sobre as autoridades locais no sentido de minor ar a deterioração acelerada das condições ambientais. L a ^ M f c' - A grande fronteira A Amazônia assume hoje a expressão básica das fronteiras. Devido à ausência de organizações sociais preexistentes capa zes de oferecer resistência, o governo federal assumiu direta mente a iniciativa da modernização, implantando a malha program ada em tempo acelerado e numa escala gigantesca que transformou parte d as antigas regiões Centro-Oeste e Nordeste e toda a região Norte numa grande fronteira nacional. O valor simbólico da malha programada, entr etanto, foi maior do que o seu valor real para a ocupação da região. Programas e projetos, ainda que nem semp re materializados, provocaram um imediato aumento do valor da terra e dos conflitos sociais, incompatíveis com as relativamente baixas taxas de investimen to, ocupação e produção. Somente 24% da área total da região estavam ocupados por unidades produtivas em 1980, repre sentando 7% das terras cultivadas no país. 211 Os assentamentos estão restritos às áreas ao longo das prin cipais rodovias. Domínios agromercantis situados nas margens da floresta foram criados, favorecendo o crescimento da gran de metrópole regional, Belém, e das capitais estaduais, que atuam como elos de articulação à cidade mundial. Surgiram eles a partir de programas de colonização e de cerca de 600 projetos agro- pas tor is sub sidiados de grandes empresas nacú riais e es tran geiras, embora só 20% deles fossem efetivamente instalado. Focos de modernidade estão representado« pela Zona Fran ca de Manaus, cidade que cresce hoje mais rapidamente que Belém, e pelos grandes projetos d° exploração min eral com sede nas company-towns —núc leos de produção e gestão —em ioint- ventures ou isoladamente. Devido à recessão mundial do início dos anos 80, o investimento estrangeiro foi muito menor do que o esperado. Dos seis granaes projetos implantados segun do os objetivos do programa, somente um é totalmente estran geiro —Alcoa-Billington, o maior investimento estrangeiro já feito no Brasil. A mais importante empresa é a estatal Cia. do ----- D Vale do Rio Doce (CVRD), que nesse processo se transnacio- nalizou, diversificando atividades e ampliando sua participa ção no mercado mundial. (Fig. 5.12) Da estratégia de ocupação regional resultaram também in tensos c onflitos sociais e ecológicos. Com a expansão da pecu ária, da exploração florestal e da mineração, verificou-se um desmatamento a uma taxa exponencial. Estimativas do total desmatado na década são conflitivas e vão desde 12% (Mahar, 1988), 8,2% (Fearnside, 1986) até 5,1% (INPE), equivalentes 0 a 598.921 km2, 399.765 km2e 251.429 km2, respectivamente. O legado da modernização conservadora sobre o território c} ^ W é ambivalente. A sustentação do tripé levou o Estado a estender sua função reguladora e empresarial além de seu poder de gerar fundos públicos, esgotando assim sua capacidade de sustentar domínios, de abrir fronteiras e negociar com o capital multinacio nal. O território foi um instrumen to de consolidação e crescimen to do Leviatã, mas também expressão de sua vulnerabilidade. J J L . ^ ^ . y * ■0 1 ^ 0 -K ( — Rodovias Ferrovias — *. Hidrovi as p«jj projetosdeMineração ( r t ) Fe r ro @ Manganês @ Cobr e © N í qu el (J)Bauxita _____________ Figura 5.12 Sistema logístico global do programa Grande Carajás. (Fonte: Becker, 1990) 213
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