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A Vitrine
Katherine Laccom t́
 
 
A VITRINE
Copyright © 2016 por KATHERINE LACCOM´T
2ª Edição|2016
 
REVISÃO: Milena Assis
CAPA: Mia Klein
IMAGEM: FOTOLIA – www.fotolia.com
__________________________
Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte desse
livro, sem autorização prévia da autora por escrito, poderá ser reproduzida ou transmitida, seja em
quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer
outros.
Esta é uma obra fictícia, qualquer semelhança com pessoas reais vivas ou mortas é mera
coincidência.
SUMÁRIO
PALAVRAS DA AUTORA
PRÓLOGO
CAPÍTULO 01
CAPÍTULO 02
CAPÍTULO 03
CAPÍTULO 04
CAPÍTULO 05
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
EPÍLOGO
PALAVRAS DA AUTORA
 
“Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo
de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de colher”. Eclesiastes 3
Obrigada, Deus; por permitir-me colher mais um fruto. Obrigada por colocar pessoas
especiais em meu caminho. Obrigada por cada um que leu e de alguma forma se identificou com as
minhas simples palavras.
A todos aqueles que de alguma forma fazem parte dessa minha jornada literária, vão os
meus mais sinceros agradecimentos. Pois sozinha eu não sou absolutamente nada!
Katherine Laccom´t
PRÓLOGO
 
Zachary
Deveria ser pecado comer daquela maneira. Quando uma gota de chocolate cai entre seus
seios, minha língua coçou para limpá-la, foi difícil controlar, mas como sou um gentleman, pego um
guardanapo e a limpo.
— Por que você sempre foge de mim, Letícia?
Ela olha para o mar por alguns minutos.
— Parece que o campo gravitacional ao seu redor me absorve e isso é assustador. Não te
conheço, nunca te vi antes, mas há algo em você que poderia dizer que já o conheço há muito
tempo. Parece loucura...
— Olha para mim, Letícia.
Puxo-a para deitar-se em meu braço. Mal sabe ela que por algum motivo, sinto-me da
mesma maneira. O cenário é perfeito. Deitados em uma praia deserta, onde mini tochas foram
acesas, tornando o ambiente digno de filmes. Minha mão acariciando seu rosto sob aquele céu
estrelado. Tudo parece certo.
Sentia sua respiração acelerada, em seus olhos pude ver que ela estava faminta tanto quanto
eu. Em um impulso tomo sua boca em um beijo desesperado e ela responde, prontamente. Quanto
mais a beijava, mais queria dela. Por um nano segundo, desejei tudo, seu corpo, seu coração e sua
alma. Mas sou um cara muito racional para esse tipo de sentimentalismo, preferindo seu corpo e
seus desejos. Há muito tempo uma mulher não despertava essa fome em mim.
— Temos um problema, senhor! — Mag...
 
CAPÍTULO 01
 
Letícia
O dia não começou nada fácil! Com o condomínio sem energia elétrica, tive que descer dez
andares de saltos altos. Como se não bastasse, o trânsito está completamente parado. Buzino na
intenção de um milagre acontecer. Tinha uma reunião com Kevin, há uma hora... atrás! E ainda estou
aqui no meio desse caos. Falando em Kevin, volto a pensar na ligação que me fez ontem à noite.
Aquele americano não me engana, o tom de voz me diz que voltou de viagem com alguma ideia
mirabolante. Uma daquelas que provavelmente serei eu a responsável pela execução.
Assim que chego a empresa, estaciono meu carro na vaga de garagem reservada a mim no
edifício da Global, empresa em que trabalho. A GlobalSpace Consultoria & Investimentos, é uma
multinacional voltada a auxiliar investidores e reerguer empresas, reformulando-as. Kevin
Stevenson Cooper, o presidente da empresa, é um empreendedor norte-americano que mora há anos
no Brasil.
Saio em disparada para o elevador. Como não posso fazer essa coisa subir mais rápido, e
nem possuo o poder de me teletransportar, vou repassando a lista de tudo o que tenho para fazer.
Sou metódica, gosto de me organizar as coisas a minha maneira e com antecedência. Às vezes sou
chata e um poucos sistemática, só que tenho necessidade de controlar tudo o que posso.
Sou executiva de sucesso com uma carreira meteórica. Trabalhava para uma indústria de
descartáveis em Minas Gerais e em uma feira de negócios, Kevin acompanhou de longe algumas
negociações minhas. De oito contratos que eu queria para aquele dia, fechei doze. Provando assim
meu talento. Poucos dias depois, ele entrou em contato comigo com uma proposta irrecusável para
trabalhar na Globalspace, uma das maiores consultorias internacionais.
Sempre fui grata a empresa que me deu a chance de desenvolver meu potencial e por essa
gratidão, fiquei quase um mês pesando prós e contras. Mas aqueles que um dia me contrataram
porque viram futuro em mim, disseram que não seria justo impedir-me de alçar grandes voos.
Então, assinei contrato com o Kevin e minha carreira deslanchou. Hoje, figuro entre os dez
executivos mais importantes do país.
Ocupo um lugar onde os homens são maioria e ser de pele clara é quase uma regra. Eu sou a
contradição! Mulher, negra e muito orgulhosa de quem sou. Estudei muito e batalhei o dobro para
estar onde estou. Nada veio de graça e muito menos com favores sexuais. Minha pele negra
contrasta com meus raros olhos castanhos-amarelados. Meu sorriso aberto é minha marca! Para
mim, sorrir é o primeiro passo para ser feliz. Sou muito afetuosa, mas não meço palavras. Por um
amigo, sou capaz de tudo! Todos que me conhecem, sabem que não devem cortarem a minha frente.
Mas é bom que não confundam minha amabilidade com burrice. Porque para isso, sou intolerante.
As portas do elevador se abrem e saio apressada. No caminho para minha sala, vou
cumprimentado as pessoas que encontro. Alguns se tornaram grandes amigos, outros se tornaram
minha família. Trabalhar em um bom ambiente é essencial na área em que atuamos. Nossa vida é de
constante estresse. Estar em uma empresa que dê essa autonomia, é um privilégio.
Assim que entro em minha sala, dou de cara com a minha secretária, que é também minha
melhor amiga.
— Letícia, o senhor Cooper está te esperando há mais de uma hora.
— Lorena, o mundo não está cooperando comigo, hoje. Pelo menos você tem que me ajudar
– jogo minha pasta e bolsa sobre a mesa e saio disparada em direção a sala do presidente.
Chegando ao destino, percebo que há uma nova secretária na presidência. Novamente?
Qualquer dia desses tenho que perguntar para alguém o porquê dessa rotatividade de morenas tipo
dançarinas de funk nessa presidência. Aproximo-me da nova menina:
— Bom dia. Acredito que o senhor Cooper esteja me esperando.
Ela sorri como uma boneca... plastificada. Estranha...
— Letícia?
A nova secretária mal termina de falar e Kevin sai de sua sala.
— Bom dia, Lê. Como está? – ele cumprimenta-me com um beijo no rosto.
Kevin e sua família são mais que amigos meus. Eles fazem questão de serem presentes em
minha vida. E sou mais que grata quanto a isso.
— Já tive manhãs melhores – respondo.
— Mandei preparar um café da manhã especial na sala de reuniões, acompanhe-me.
Assim que entramos em sua sala de conferencia, olho com descrença a mesa posta com um
café da manhã completo. Ter esses momentos aqui na empresa não é novidade. Mas essa é a tática
que usamos quando temos negociações difíceis.
— É bom que esse café valha a pena, senhor presidente – falo enquanto sento em uma das
cadeiras. A mais próxima aos croissants.
— Valerá, Lê – Kevin sorri.
Ele tem por volta de quarenta e cinco anos, pele clara, cabelos escuros, olhos verdes, um
corpo esbelto para idade. Na verdade, Kevin tem uma aparência incrível para quem tem uma
posição tão exigente quanto a dele. Está sempre impecavelmente vestido. Sua elegância natural e
generosidade com que trata as pessoas, o tornamuito mais bonito. Sua esposa, Evellyn, é uma
graça. Tão elegante quanto seu marido e sempre calorosa. Ela ama tanto o Brasil, que há dias que
passa a impressão de que nasceu aqui. Seus filhos não saíram diferente dos pais. Os três rapazes de
dezessete, dezenove e vinte anos, são extremamente educados e muito galantes. Cópias de seu pai.
Enquanto sua secretária serve meu café, que por sinal é mais uma coisa estranha, admiro a
opulência da sala de vidro transparente no meio do décimo segundo andar. É como uma bolha.
Daqui, pode-se ver todos os outros ambientes que compõem o andar mais importante da Global.
Kevin senta-se em frente a mim. E eu, faminta como sou, perco o foco com tantas maravilhas
culinárias.
— Vai soltar a bomba agora no café ou vai esperar para o almoço? – pergunto impaciente.
Há um pãozinho gritando meu nome.
— Preciso da sua ajuda com essa edição da Vitrine – ele foi direto.
Pego mais um pãozinho de queijo e saboreio enquanto ele continua com o seu discurso
ensaiado.
— Quero que você seja a apresentadora dessa edição.
Sabia que tinha alguma coisa muito importante por trás desse café.
— Não acho que seja uma boa coisa, não sou a pessoa mais indicada para isso.
— Quando se trata de negociação, você é a melhor! E nós realmente precisamos da sua
ajuda. O país passa por um momento difícil e esse evento pode trazer boas perspectivas para a
economia fragilizada.
— Eu não trabalho para o governo e nem com ele – falo sem emoção. Sei que Kevin tem
relações estreitas com a capital do Brasil. Posso garantir que ele trabalha arduamente para
melhorar nossa terra. Mas ainda assim, eu prefiro me manter distante daqueles que ganham rios de
dinheiro e ainda roubam seu povo.
Percebo que Kevin está ponderando suas palavras antes de dizê-las.
— A Vitrine é um evento que tem como principal foco ajudar o seu país. Trazemos grandes
empresários para investir e destes investimentos, milhares de empregos são gerados, famílias
adquirem renda e crianças passam a ter oportunidades – ele encara-me com seu olhar penetrante.
— Você sabe disso. Pois nos ajudou com algumas parcerias que não só abriram mais vagas de
empregos como também contemplou toda a comunidade em torno dos projetos – ele estreita seus
olhos e fala suavemente: — Lembra daquele projeto em que você reformulou as exigências e
insistiu que o investidor fizesse algo de importante para o orfanato ao lado? – assinto. — O grupo
coreano não só reformou como adotou e hoje aquele lugar é referência. Você se negaria a participar
de um evento imprescindível como esse, somente porque não quer ter algo a ver com o governo?
Agora o conterrâneo do Tio Sam pegou pesado! Ele sabe o quanto aprecio a política “fazer
um mundo melhor”. Ele sabe que os órfãos são meu ponto fraco. E colocando minha posição dessa
maneira crua, passa a ideia de que tenho um coração de gelo visando somente lucros!
Meus pensamentos voam e volto ao meu passado. Perdi meus pais muito cedo e como
ambos eram filhos únicos, fui morar com minha avó materna até que Deus a levou também. Eu tinha
quatorze anos quando um casal amigo da vovó me acolheu por dois anos. Meus pais e vovó
deixaram alguns bens em meu nome, uma conta que me ajudou com os estudos e com as despesas de
sobrevivência. De lá para cá, venho me virando sozinha.
Eu sei o quanto é difícil não ter família, não ter um colo de mãe, um pai que tenta consertar
as coisas de casa e nunca dão certo, ou um irmão para implicar. Ser sozinho no mundo dói!
Lembro-me de ter chorado uma vez por não ter família. Naquela ocasião, minha vó disse que eu
tinha que ser forte, porque a vida não seria fácil. Desde então, não me recordo da última vez que
chorei.
Graças à Deus nunca tive dificuldades financeiras. Não era rica, mas tinha o suficiente para
ter uma vida confortável até o dia em que conheci o João Paulo. Eu estava terminando a faculdade
de Direito e era uma romântica sonhadora que fazia planos em se formar, casar e ter filhos; como
qualquer outra pessoa que passou boa parte da vida sozinho. João Paulo era meu parceiro de
estudos, estávamos sempre juntos. Ele era loiro dos olhos castanhos e pele bronzeada. Um homem
muito bonito que conquistou a órfã carente com seu senso de humor e palavras bonitas.
Começamos a namorar e poucos meses depois foi morar comigo na casa que meus pais
tinham deixado para mim. Eu fazia tudo por ele, absolutamente tudo! No seu aniversário de vinte e
sete anos eu dei a ele o carro dos seus sonhos. Como o meu dinheiro era aplicado em um fundo de
investimentos, tive que comprar financiado. Mas qualquer sacrifício para o amor da minha vida,
era válido! Era o que eu pensava naquela época.
Uma semana depois, um cara ligou para a nossa casa querendo os documentos do carro que
ele havia comprado do João. Naquele momento, comecei a me dar conta de que não estava vivendo
um conto de fadas. Alguns dias se passaram, João tinha me convencido que o negócio era
irrecusável e que o dinheiro foi aplicado para o nosso futuro. Eu o amava. Eu o perdoei. Eu o
coloquei antes de mim. Eu assinei meu atestado de morte.
Depois de um dia exaustivo no estágio, passei no supermercado para comprar nosso jantar.
Nada me preparou para aquela cena. Uma das caixas do supermercado estava comemorando a
gravidez e abraçando pai do bebê. Não teria nada de estranho nisso se o homem que seus braços
enlaçavam não fosse o meu marido. Tive o privilégio de ouvir em primeira mão que o seu noivo
comprou uma casa linda para morarem depois do casamento. Meu mundo ruiu.
Eles não tinham me visto. Escondi-me porque eu precisava saber de toda a história,
precisava saber que casa era essa. Fiquei esperando o mercado fechar e ela sair. João já tinha ido
embora com sua mãe que também estava comemorando com o bastardo do filho. Bom, como a moça
só interagia comigo no seu local de trabalho e não sabia quem era meu marido, convidei-a para
jantar. Ela aceitou de bom grado e fomos para um restaurante perto de onde estávamos. Disse a ela
que ouvi as boas-novas e queria comemorar, ela acreditou.
Nesse maldito jantar, eu soube que eles estavam juntos há um ano. Nós estávamos juntos há
três. Ela contou-me que as famílias conviviam juntas e se davam muito bem, pois sua futura sogra
lutou bravamente para que eles ficassem juntos. Ela a amava. O que a pobre não sabia, era que a
sua sogra amada já tinha uma nora e que seu filho miserável já tinha uma esposa.
Durante todo o tempo, eu perguntava-me até onde ia a maldade das pessoas. Perguntei da
casa e quando ela detalhou a casa que terminamos de construir há poucos dias, meu estômago
embrulhou. Como pude ser tão cega? Construí aquela casa sozinha. Um belíssimo sobrado em um
bairro muito valorizado em Três Corações. Tudo o que havia de melhor, empenhei naquela
construção. Pensei seriamente que seria meu fim, pois doía muito!
Depois de saber da traição em primeira mão, engoli todo o ódio e a vergonha de ter
fracasso, corri para casa. Eu tinha que encontrar os documentos que provavam que as minhas
coisas, eram minhas. Foi quando tive outra desagradável surpresa, nada mais era meu! Nenhuma
das duas casas, um terreno e a nossa poupança estava vazia. Com exceção do bendito fundo de
investimento, perdi todo o resto, até a casa dos meus pais.
Eu estava completamente destruída. Sentindo-me o fracasso em pessoa, cogitei a ideia de
me matar ou de esperá-lo chegar da suposta viagem e tirar tudo a limpo. Mas do que adiantava tirar
tudo a limpo se as coisas eram claras como cristal? Fui traída, roubada, humilhada. Fui prejudicada
pela única pessoa que eu pensei que jamais faria mal a mim conhecendo a minha história. A vida
estava cobrando um preço caro pela minha ingenuidade.
Eu não tinha muitas coisas para juntar, nunca fui uma pessoa de guardar lembranças.
Enquanto arrumava minhas malas, repassei tudo o que eu deveria fazer. Como a casa recém
construída era financiada e havia muitas parcelas a serem pagas, eu teria o prazer de vê-lo se ferrar
para quitá-las. Era eu quem as pagavam e se o infeliz não fizesse, o bancoa tomaria. A casa que
morávamos, a que era dos meus pais, paguei para alguém entrar e destruir tudo. Mesmo com o
coração sangrando, tive que fazer isso. João não merecia nada de mim, não merecia nada de graça!
Naquela noite, antes de entrarem para acabar com a casa que era minha, embarquei para
Belo Horizonte. Chegando ao destino, hospedei-me em um hotel, onde finalmente me dei o direito
de sofrer. Os dias que se seguiram foram os piores da minha vida! Trancada em um quarto de hotel,
em uma cidade que não conhecia ninguém, sem vontade de sair, sem vontade de comer. Era somente
minha dor, minhas lembranças e eu. Perdi peso, minhas olheiras eram monstruosas assim como meu
humor. Tornei-me um fantasma. Estava à esperada de algo acontecer, qualquer coisa para o bem ou
para o mal.
Uma das camareiras se compadeceu com meu estado. Eu estava tão aquém de tudo, que sua
pena nem me incomodava. Ela trazia minhas refeições e falava sempre palavras de carinho. Ela se
importou. Ninguém se importava comigo. Durante anos fui iludida e cegada pelo meu próprio
coração, não me dei conta de que estava sozinha. As pessoas só se aproximavam se eu tivesse algo
a dar.
Com o tempo fui me abrindo e contando tudo o que vivi até ali. A senhora me abraçava
enquanto eu colocava o resto das minhas amarguras para fora. Ela amparou-me em cada desespero
ao recordar. Ela secou cada lágrima que caiu. Em uma tarde ensolarada, ela sentou-se à minha
frente segurando a minha mãe e disse:
— Agora que seu luto se dissipou, você pode voltar a viver. Você é mais forte do que
pensa menina, chegou a hora de renascer.
Como se alguém tivesse ligado o interruptor da minha vida, eu renasci. Sai do hotel, aluguei
um pequeno flat, conheci pessoas, distribui currículos e voltei a ser eu! Em poucos dias fui
contratada para trabalhar no departamento de recursos humanos de uma indústria de descartáveis.
Fiz a prova da Ordem dos Advogados, peguei minha carteira e fui promovida pela primeira vez.
Usei o meu sofrimento para crescer. Trabalhei meu psicológico ao máximo para que as más
experiências não regessem minha vida. E eu consegui! Hoje sou inteira, tenho as rédeas da minha
vida. Sou bem resolvida, sem ressentimentos, sem amarguras e sem um coração partido. Esse
último que não pretendo dar a chance de se arrebentar uma segunda vez. Ainda sou romântica, eu
quero sim, encontrar alguém que queira estar comigo.
Voltando a realidade, vejo o brilho nos olhos do meu chefe. Ele sabe onde minha cabeça
estava e já sabia a minha resposta.
— Farei o meu melhor, porque adoro um desafio. Mas não ouse usar os órfãos em
chantagens futuras, já atingiu toda sua cota com isso.
Enquanto Kevin sorria vitorioso, Jônatas, seu assistente, coloca algumas pastas a minha
frente.
— Aqui estão compiladas todas as informações sobre os convidados. Um mini dossiê de
cada um para que você não fique às cegas.
— Vou apresentar projetos ou serei espiã? – pergunto ironicamente.
— Lê, obrigado por concordar. Sei que você está cheia de compromissos e terá que abrir
mão de alguns para se dedicar a Vitrine. Mas prometo que te recompensarei...
Levanto a mão o cortando:
— Meu querido, nada de recompensas, sou profissional demais para isso. Meus serviços
têm preço, meus honorários são caros. Não vou só apresentar os projetos, vou convencê-los de que
o Brasil, mesmo em crise é um dos melhores lugares do mundo para investir. Ao invés de agrados,
prepare seu bolso. Já tem data marcada?
Jonatas responde prontamente:
— O encontro acontecerá daqui dez dias – esse menino é eficiente.
— Será aqui no Rio mesmo? – pergunto.
— As negociações começam na quinta-feira da semana que vem aqui no Rio. No sábado,
embarcam para Fortaleza para desfrutarem de um final de semana paradisíaco. Na segunda-feira
almoçarão com a Presidenta – faço uma careta. — Então voltaremos ao Rio para os acertos dos
investimentos, caso tenhamos algum interessado.
— Que confiança, hein? Senti daqui a positividade – pego as pastas e mais um croissant de
chocolate. Despeço-me e vou para minha sala, tenho que começar a organizar meus compromissos.
Tenho que admitir que o Kevin é um visionário, encontrou uma enorme oportunidade de
expandir seus serviços, como também ajudar o país que lhe acolheu de braços abertos, a capitar
investimentos para o seu crescimento. Então nasceu o projeto “A Vitrine”, evento que reúne
importantes empresários mundiais, para lhes apresentar projetos de investimentos no Brasil. Esse
projeto é parceria entre a Global e o Governo Federal.
Em cada evento, são convidados dez empresários, mas, somente os seis primeiros que
confirmam, estarão presentes. Para que um investidor seja convidado a participar, ele deve
preencher alguns requisitos. Tais como: ter seu nome em listas como grandes investidores, quantas
franquias e sucursais possuem pelo mundo e o ramo de negócios que investem que costumam
investir.
Não será fácil convencer os seis a fecharem negócio. Mas se eu conseguir pelo menos dois
com esse atual cenário político e econômico do país, já ficarei satisfeita. Nosso país é conhecido
pela instabilidade política. Quem está de fora, percebe claramente que a intenção dos nossos
políticos, não são inteiramente boas. Acredito que nós brasileiros, eternos esperançosos,
preferimos acreditar que tudo pode melhorar.
No meio tarde fiquei curiosa sobre meus convidados. Abrindo a primeira pasta, começo a
rir. De cara há imagem de um sheik de quarenta e cinco anos, com oito esposas. Isso mesmo, OITO!
Investimento de risco é com ele mesmo. Se os outros seguirem a mesma linha, será uma Vitrine
muito divertida. Fecho-a e a coloco de lado. Vou estudar as personalidades em casa, são muitas
coisas a serem assimiladas e várias estratégias a serem traçadas.
CAPÍTULO 02
 
Zachary
Obrigado por nos prestigiar com sua presença. Estamos aqui...
Distraio-me em meio ao discurso do prefeito. Se não fosse pela minha assessoria insistir
que devo construir a minha imagem de bom moço, jamais estaria aqui. Cercado por puxa-sacos,
outros que tentam se aproximar na esperança de fazer contato, e mulheres que querem uma foto para
divulgar em suas redes sociais. Dessas, eu não reclamo, se alguma delas quiser fotografar minha
cama, nua, levarei com o maior prazer.
— Por que ainda frequentamos esses lugares? – Ethan aproxima-se tão exaurido disso tudo
quanto eu.
Um garçom passa substituindo meu copo vazio por um cheio. Volto minha atenção a Ethan:
— Porque temos nomes a zelar.
Ele ri.
— Desde quando? Isso é besteira – ele reclama.
Tenho muitos conhecidos, mas poucos amigos. Na verdade, somente Ethan e King são meus
amigos. Nossos pais, o de Ethan e o meu, são amigos desde a faculdade. Minha amizade com ele
começou ainda na barriga, pode-se dizer. Todos conhecem sua fama de arruaceiro, um evento desse
é só para ele se embebedar e traçar alguma mulher desconhecida.
Nesse momento, duas belas mulheres com seios deslumbrantes se aproximam e pedem para
bater uma foto conosco. Prontamente atendemos, mas dispenso-as em seguida. Ethan anotou o
telefone das duas, prometendo que as chamaria para uma de suas famosas festinhas depravadas. Em
outros tempos, eu levaria uma delas ou as duas para longe dali e as foderia. Mas ultimamente nem
isso tem me despertado.
— Aqueles documentos da fusão estão prontos, Zach – Ethan fala, tirando-me da divagação.
Assinto e ele continua a falar: — Enviarei para você lê-los amanhã. Faça as alterações que forem
necessárias e reenvie para que eu assine.
— Ok. Manda aquela sua assistente ruiva me entregar às sete no Solarium.
— Candace? Cara, você tem que parar de foder minhas assistentes. Sabe como é difícil
achar mulheres competentes para fazer o que elas fazem? Nunca parou para pensar o porquê de eu
nunca fodê-la?
— Sei exatamente o quanto é difícil, Ethan. Por isso, a pedi.
— Bastardo. Por falar em apartamento, vou começar uma obra no meu apartamento no
Solarium.
Uma das coisas que mais quis foi um prédio residencial em Manhattan. Logo que ele foi
construído, eu e outros amigos adquirimosapartamentos lá. Excelente localização e os imóveis são
espetaculares, tanto que quis o prédio inteiro. Com a crise econômica que assolou o mundo há
tempos atrás, os preços dos imóveis despencaram e foi a oportunidade perfeita para fazer uma
oferta. São dez andares, sendo dois apartamentos por andar. Reformei a cobertura, transformando-a
em uma gigantesca casa nos céus da cidade. Reformulei a fachada do prédio, modernizei os
elevadores e troquei o nome do edifício. Aquele lugar é o meu refúgio.
Ethan chama minha atenção.
— Tem algum apartamento disponível no Solarium?
Servem-me mais uma bebida.
— Ouvi comentários que o Cooper está pensando em se desfazer do dele.
— Por falar no Kevin, recebi um convite para participar da Vitrine.
— Você vai? – pergunto.
— Cara, é no Brasil. Já estou lá! – reviro os olhos para a empolgação dele sobre as
brasileiras. Ele é meio obcecado por elas. Uma modelo loira se aproxima e ele a puxa para o seu
colo. – Senta aqui, gracinha.
Despeço-me e vou para casa antes que ele a curve e a foda aqui mesmo. No caminho para
casa, sinto-me inquieto. Na verdade, venho sentindo-me assim por algum tempo. Nos últimos
meses, mal tenho dormido, perdi as contas de quantas noites passei em claro. Já fui há diferentes
médicos e me submeti há alguns tratamentos, mas nada deu resultado. Tentei meu tratamento
alternativo por conta própria, trazendo mulheres para me satisfazer. E, mesmo depois de uma
intensa noite de foda, o sono não aparece.
Assim que entro em casa, caminho em direção à piscina. Tiro minha roupa ali mesmo e
jogo-me na água fria. A ideia é nadar até a exaustão, na esperança do cansaço sobressair e o sono
vir. Dou algumas voltas e paro na borda para contemplar a cidade. O vento está cada vez mais
gelado, saio e corro para tomar um banho um quente e deitar. E, mais uma vez, o sono não vem,
somente aquela angústia prenunciando algo, mas o quê?
* * *
Dias depois de confirmar a presença na Vitrine, recebo um e-mail com todos os detalhes
desse evento. Achei a ideia bem interessante, reunir pretensos investidores e apresentar-lhes
projetos que podem render-lhes bons frutos. O idealizador é Kevin Cooper, um amigo que possui
uma consultora de investimentos aqui nos Estados Unidos e no Brasil.
Já contratei sua empresa para algumas consultorias em empreendimentos que adquiri. Eles
já me livraram de empresas bombas e de investimentos fadados ao fracasso. Tenho Cooper em alta
conta, se ele me convidou é porque tem algo que provavelmente chamará minha atenção.
— Vem para cama, senhor O´Brian.
Daqui onde estou sentado, na poltrona que fica de frente para a enorme cama que ocupa boa
parte do quarto, assisto a linda assistente ruiva de Ethan dançar nos meus lençóis. Como é o nome
dela mesmo? Candy, Cendy, Mandy... Enfim, durante o sexo, a mulher soltou que estava se
apaixonando. Duas fodas e já acha que vou casar. Vai sonhando!
— Princesa, acho melhor você se arrumar. Um táxi encostará daqui a dez minutos para te
levar para casa – anuncio.
Ela sai da cama, nua, e fica na minha frente com as mãos na cintura. Lá vamos nós, assistir a
outro espetáculo dramático.
— Acha que pode me usar e depois me descartar como lixo?
Fico em silêncio. Discutir com mulheres já é ruim, discutir com uma mulher indignada é
muito pior. Eu não estou a fim dessa merda hoje. Ela sabia no que estava se metendo quando
transou a primeira vez comigo.
Levanto-me, coloco meu notebook debaixo do braço e vou para a sala. Isso já está virando
um circo e a minha enxaqueca está apontando. Encontro o remédio que o médico receitou para
essas dores de cabeça que estão se tornando constante. Se tomar dois, pode ser que eu consiga
deitar e cochilar. Depois de ingeri-los, sento no sofá e volto a ler o arquivo do Cooper.
A bela assistente ruiva sai do quarto pisando duro, encara-me com olhar mortal e sai
batendo a porta atrás de si. Mulheres! Não entendo por que pensam que podem mudar um homem.
Juro que não entendo. Em pleno século vinte e um ainda esperam um conto de fadas? Príncipes não
existem, somos todos uns canalhas que tem por finalidade foder.
Quando os homens falam que amam, não se iludam, nós amamos sexo! Quando encontramos
alguém que detém nosso interesse, nossos instintos primais nos obrigam a fazer o que for preciso
para mantê-las ao nosso lado. É onde entra o “eu te amo” e o “não posso viver sem ver”. É hilário
ver meus amigos sendo territorialistas com suas mulheres e tendo crises de ciúmes descabidas.
Nunca encontrei alguém que desperte isso e espero não encontrar.
Ter dinheiro acaba atraindo pessoas de índole duvidosa e nos transforma em pessoas
inescrupulosas. Eu sou poderoso, já nasci rico, sei que tenho parte do mundo aos meus pés. Mas
trabalho duro para conquistar a outra parte e aumentar minha fortuna. Dizem por aí que “dinheiro
atraí dinheiro”, talvez seja verdade. Porque quanto mais você ganha, maior é a aposta. Gosto do
jogo do poder, pois com ele posso tudo o que eu quiser.
O impossível não existe para mim. Mas, se algo do tipo vier, eu faço acontecer. E, se ainda
não for o suficiente, então eu compro! Todos querem algo de mim. As que dizem que me amam, na
verdade, amam o que tenho e não o que eu sou. Fui talhado para ser inatingível, cresci assistindo o
que uma mulher interesseira pode fazer com o burro idiota que pensava que tinha achado a boceta
da sua vida.
Meus pais foram casados durante quarenta anos, mas, um dia, ele chegou com a notícia do
divórcio. Segundo ele, tinha encontrado o amor da sua vida, alguém que o compreendia e blá-blá-
blá... Nessa época, eu já comandava as organizações da família e agradeço a Deus por isso. Eu não
tenho dúvidas de que, se ele estive nessa cadeira, colocaria tudo a perder. Depois do divórcio, ele
se aposentou definitivamente e resolveu se mudar para os Hamptons com sua nova mulherzinha.
Todos sabem que a garota transa até com a perna da mesa, se deixar, mas o “amor” não permite que
o imbecil enxergue.
Depois da separação, minha mãe também resolveu “viver”. Mudou-se para Las Vegas e, em
cinco dias, ligou para anunciar seu casamento com um gigolô. Sempre fomos uma família distante,
por isso não sinto falta deles. E, pelo jeito, a recíproca é verdadeira. Hoje, ela mora em Miami
com o seu “personal fodedor”.
Ambos não se preocupam com nada, pois conhecem o meu empenho à frente da
organização, repasso lucros das organizações para ambos, dando-lhes a oportunidade de fazer
qualquer besteira que quiserem. A mim restou olhar a história deles para saber que o amor não
existe. A verdade é o quanto estão dispostos a suportar para ter a vida que desejam e isso tem
nome: amor.
Admito que não sou um santo. Bom, tenho a quem puxar. Minha vida é o sonho de qualquer
cara do mundo, festas, orgias, mulheres de quatro implorando para serem fodidas e brigas. Bem,
pelo menos foi assim até o dia em que fui preso por dirigir bêbado e avançar dois sinais
vermelhos. Meu departamento de relações públicas veio com a ideia esdrúxula de casamento, para
mostrar a minha regeneração a sociedade.
Nesse tempo, eu estava transando com Amber Wilkinson, socialite desocupada, que até hoje
espera o príncipe que casará com ela sem ser por sua fortuna. Unindo o útil ao agradável, a pedi
em casamento. Organizaram uma megafesta para que pudesse desfilar com o diamante monstruoso
em seu dedo. A ideia não era chamar a atenção? Então, fiz meu dever de casa. Só que, depois disso,
a mulher surtou e vieram as cobranças, os choros descontrolados e as crises de ciúmes violentas.
Deus sabe que eu não suportava mais.
Em um de seus ataques descontrolados, saí para evitar fazer besteira. Como Ethan tinha me
convidado para uma de suas festas, não pensei duas vezes e dirigi-me para o local. Na verdade,
não era bem uma festa, estava mais para orgia. Lembro-me de beber muito, mulheres seminuas
dançavam esfregando-se em mim e eu estava na seca por algum tempo. Já que sexo com Amber era
algo raro. Aquela noite, matei minha fome!
Amber apareceu no exato momento em que uma garota me chupava eeu sugava os seios de
outra. Ela tirou as duas de cima de mim pelos cabelos. Se meu pau não corresse o risco de ser
amputado pelos dentes da garota, teria sido hilário. Eu continuei lá, assistindo ao espetáculo da
maluca, como se nada daquilo tivesse a ver comigo. Não me movimentei nem para fechar as calças,
estava sem condições alguma de me manter em pé.
No outro dia, acordei com os gritos estridentes que vinham da sala e a ressaca cobrava seu
preço. Da maneira em que estava, fui ver o que acontecia e mandaria quem quer que fosse para o
inferno. Assim que entrei na sala, os gritos de Amber aumentaram e o inútil do seu pai veio para
cima de mim, me deu um soco no queixo e quebrou sua mão. Pacientemente, virei as costas para
aquele circo e fui para o banheiro tomar banho. Era isso ou quebrar o homem em dez lugares
diferentes. Quando me senti inteiro novamente, voltei para a sala para enfrentar Amber e seus pais.
— Desde o começo, avisei que não toleraria seus ataques de loucura – ela abriu a boca
para falar, mas desistiu assim que viu meu olhar. — O meu problema não é pelo que aconteceu na
casa do Ethan, o problema é vir na minha casa achando que tem direito de encenar esse espetáculo.
Eu não quero uma mulher assim, não quero viver no limite entre a sanidade e a loucura de uma
pessoa.
A mulher se jogou aos meus pés aos prontos.
— Por tudo o que é mais sagrado, Zachary, não me deixe! Eu sei que você tem um jeito
diferente de amar, mas eu o perdoo. Vamos esquecer tudo e...
Tive que rir da parte do “eu te perdoo”. Como um cavalheiro que não sou, levantei-a.
— Perdoar exatamente pelo quê, Amber? Por ter quebrado metade da casa do Ethan? Pelas
inesgotáveis crises de ciúmes? Por atrapalhar reuniões de trabalho? – olho para os seus pais. —
Procurem ajuda profissional para sua filha.
O pai esbravejava enquanto sua filha surtava, e eu queria todo mundo fora da minha casa.
Acenei para King, que fez meu desejo acontecer. Depois disso, se espalhou a fofoca de que eu a
agredi. Amber nunca desmentiu, eu nunca toquei no assunto e a notícia correu mais rápido que o
Papa Léguas. Meu RP – relações públicas – enlouqueceu com o fato de eu não desmentir também.
Sei que sou bonito em meus trinta e nove anos. Tenho um metro e noventa e dois de altura,
um corpo bem trabalhado e músculos firmes. Já fui capa das revistas mais badaladas, também tenho
participação especial nas listas de mais ricos, mais bonitos, mais disputados e mais sexies. Não
sou do tipo que se “acha”, apenas sou realista. Tenho espelho e sei exatamente como sou, sei o
efeito que tenho sobre as mulheres e dentro delas também. E um detalhe muito importante sobre
mim, sou aficionado em desenhos animados.
Outro dia, outro evento e a mesma inquietação. Sentado em mais um evento, ouço Ethan
conversar com o monge Liam Larkin sobre uma provável aquisição hostil que enfrentará. Liam é
tudo o que Ethan e eu não somos, ponderado, tranquilo e respeita muito a memória de sua falecida
esposa. Ele não é de festas e baladas, nunca se meteu em briga, nem se envolveu em escândalos.
Gosto dele, principalmente pela sua discrição, e é um bom parceiro de negócios.
— Nessa edição da Vitrine, eles enviaram a lista de projetos que serão apresentados e
colocaram uma apresentadora gostosa – Ethan fala.
— Sim. Só achei uma aposta arriscada. Esse evento já é conhecido, as apostas são grandes.
Cooper foi corajoso ao colocar essa mulher à frente de algo assim.
— A apresentadora é a Letícia Barros, uma mulata dos sonhos – Ethan e sua loucura. Ele
continua: — A mulher vai te surpreender, Liam.
Reviro meus olhos. Tudo o que envolve mulheres bonitas tem a presença de Ethan
garantida, geralmente dentro delas.
— Não me diga que você já a pegou? – questiono-o. — Eu não quero estar em uma reunião
onde uma maluca está tentando comê-lo ou matá-lo. E mais uma coisa, nada de acompanhantes
vulgares.
Toda vez que me lembro do Bora-Bora até passo mal. Fomos comemorar uma fusão
gigantesca e em uma reunião de última hora, a acompanhante de Ethan entrou e se ofereceu para
todos que estavam ali. Não satisfeita, tentou chupar um senhor japonês de setenta e cinco anos. Foi
um pesadelo.
Rindo, Ethan fala:
— Cara, estou indo ao Brasil, tudo o que preciso tem lá! E não, não peguei a Letícia, não
por falta de vontade, da minha parte pelo menos. Faltou vontade por parte dela. Falei que ela irá
surpreender, porque a conheço. Mantemos contato desde que nos conhecemos e, quando tenho
contratos complicados, é a ela que recorro para finalizá-los.
Tarde da noite, já em casa, localizo o arquivo da Vitrine. Como E. falou, eles enviaram a
lista com os projetos. Em anexo, também há uma breve apresentação da hostess e seu currículo
impressiona. Rapidamente, abro página de pesquisa e digito o nome Letícia Sophie Barros. Não há
muitas imagens dela e, nas poucas que encontrei, não capturaram totalmente seu rosto. O sono que
há dias não vinha, agora bate com força, levando-me para o mundo dos mortos.
CAPÍTULO 03
 
Letícia
Meu apartamento é o meu refúgio. Aqui sinto-me protegida do mundo. É pequeno, com
apenas dois quartos, mas bem aconchegante. Localizado na Barra na Tijuca, à beira mar, em frente
ao paraíso. Ter a oportunidade de tomar café da manhã com essa vista é um privilégio. Nos dias em
que o mundo está pesando nas minhas costas ou quando acho que alguma coisa não tem solução,
olho para o mar e percebo que para Deus não há limites. Olhar o infinito renova minhas forças.
Depois de uma semana exaustiva de organização, sento-me no sofá, ainda de pijama e com
uma caneca de café na mão, olho as pastas que tenho que examinar. Venho adiando esse momento há
dias. Não sei por que, mas pressinto algo. E incomoda-me não saber o que é. Ouço três batidas e
logo Lorena coloca seu rostinho de anjo na porta.
— Bom dia, Lê – é a pessoa mais bem-humorada que conheço.
— Bom dia, Lolo. Que sacolas são essas? – pergunto curiosa.
— Nada demais, apenas umas comidinhas e uns docinhos para nos alegrar nesse final de
semana de trabalho.
Lorena é uma moça linda. Baixinha invocada, cabelo liso, cortado estilo Chanel, pele
branquinha como a neve e grandes olhos castanhos, tornando-a uma verdadeira boneca. Ela é
daquelas pessoas que amam todo mundo, não vê o lado negativo de nada e nem de ninguém, acho
que foi isso que me conquistou. Sem ao menos me conhecer, abriu os braços como se já me
conhecesse a vida inteira.
Desde que cheguei aqui, ela e sua mãe me acolheram como se eu fosse da família. Ela tem a
chave do meu apartamento, a única pessoa a quem confiaria isso. Há pouco tempo, ela terminou um
relacionamento conturbado com um ser idiota. Desde então, ela tem se refugiado no trabalho. A
Vitrine veio em boa hora, segundo ela, que se ofereceu para me ajudar com o evento.
Enquanto ela desempacota nosso arsenal alimentício, abro a primeira pasta que é do
bendito sheik. Entrego a foto a ela e leio as anotações:
— Hassan Mohamed Aziz Bashir. Quarenta e cinco anos, casado, oito esposas, doze filhos
e dez netos. Seu patrimônio está avaliado em vinte e cinco bilhões de dólares. Investe em todos os
ramos que desponta, de hotéis a clubes de futebol. Seus hobbies – olho para Lolo e pergunto: —
Fazer filho? Procurar outra esposa para o harém?
Ela ri e fala mordazmente:
— Realmente o dinheiro é tudo nessa vida! Um homem baixinho, gordo e que usa vestido.
Não deve ser grande coisa na cama.
Reviro os olhos e faço a minha análise:
— Pela austeridade em seu rosto, posso dizer que sorrir não é algo que ele faça. Não deve
ter tempo para os filhos, somente para fazê-los. Número de esposa é status. Ele não negocia com
mulher, acha que fomos feitas somente para dar prazer... e filhos. Isso é algo cultural, mas a
globalização e a independência da mulher moderna não são agradáveis para ele. É do tipo que não
se importa com os riscos, desde que tenha uma boa chance de retorno.
Lolo olha-me de boca aberta.
— O que foi, criatura? – pergunto.
— Você me assusta com essas coisas. Olha uma foto e lê duas linhas sobre a pessoae já a
descreve. Você é estranha, sabe disso, não é?
Dou de ombros e ignoro-a. Esse tipo de análise é fácil para mim. As imagens podem nos
indicar muitas coisas.
— Ter oito esposas não é para qualquer um. Só em um país onde as mulheres não têm voz e
nem vez, para aceitarem ser mais uma na cama daqueles que deveriam as venerar como únicas –
digo sem emoção.
— Verdade. Mas na carência que ando, se um daqueles sheiks bonitinhos aparece por aqui,
eu me jogo no harém sem problema nenhum.
Rindo, jogo uma bola de papel nela. Ela pega a segunda pasta, tira a foto e me dá os outros
papéis. Suspirando, ela fala:
— Italianos, humm. Esses homens foram criados para o pecado. Delícia!
— Menos hormônios, Lolo. Esse italiano é Martino Nicolazzi Rossi. Quarenta anos, uma
esposa e cinco filhos. Seu patrimônio está avaliado em treze bilhões de dólares. Outro que investe
em vários segmentos. Também encontra-se envolvido em escândalos com prostitutas de luxo,
modelos, atrizes... vidinha bem agitada do ragazzo – estendo a mão. — Deixa eu ver a cara do
sujeito.
Lorena tem razão, esses italianos têm um charme especial. Eles podem não ser lindos, mas
esse “jeito italiano” de ser é o suficiente para querer cair em escândalos com eles. Parando com o
devaneio, ouço minha amiga dizer:
— Está babando no italiano, não é? Eu sabia que não iria resistir também.
— Esse será um dos investidores. Com as armas certas, somos capazes de fazê-lo não só
construir um hotel mas também investir em outros empreendimentos. Percebeu como ele é parecido
com aquele jogador italiano, o Buffon? Muito “nham nham”.
Alcanço a terceira pasta e, ao abrir, um calafrio percorre meu corpo. Quando focalizo
aqueles olhos azuis, meu coração falha uma batida. Rapidamente jogo a pasta sobre a mesa e longe
de mim.
— O que houve, Lê? Está pálida. Está sentindo alguma coisa? – ela senta ao meu lado,
abraçando-me. — Que tal voltar para a cama, minha flor?
— Não foi nada, só um mal-estar. Vamos continuar a conhecer os bofes endinheirados? –
falo na tentativa de desviar o assunto.
Alcanço outra pasta e abro com cuidado. Deparo-me com um lindo grego. Entrego a foto
dele a Lolo e leio:
— Grego, quarenta e dois anos, uma esposa e três filhos. Seu patrimônio é de
aproximadamente dezoito bilhões de dólares. Seu ramo de investimentos é a hotelaria. Seu nome é
Sebastian Khristophoros. Erradicado nos Estados Unidos há mais de vinte anos, ele compra hotéis
de médio e grande porte que estão à beira da falência e os transforma em empreendimentos cinco
estrelas. Aqui diz que ele não costuma mudar o nome dos estabelecimentos. Segundo Sebastian,
manter a tradição de cada casa é imprescindível. Interessante – divago.
Olho para Lorena, que está quase tendo um orgasmo com a foto do grego na mão. Ela
balança a foto quase em meu rosto.
— Ele é lindo! E gostoso... e rico... e comível. Ai, ai...
— Negociar com gregos não é fácil, está na mesma linha do sheik – comento.
— Deixa que a Lolinha aqui negocia com o bonitão.
Paramos para almoçar e descansar um pouquinho. A cada pasta aberta, anotações são feitas
e ideias guardadas. Possuir essas pequenas informações é fundamental quando pretendemos
negociar com grandes cacifes. Os detalhes são importantes para esses homens e não deixar que
nenhum passe em branco pode ser o nosso trunfo.
Passamos a pasta de um empresário americano que já tive o desprazer de conhecer. Ethan
Scott, trinta e cinco anos. Um dos solteiros disputadíssimos dos Estados Unidos. Olhos azuis, boca
perfeita, barba por fazer, cabelos curtos e bem cortados. Seu corpo parece ter sido esculpido. É um
verdadeiro atleta e muito arrogante. Seu patrimônio gira em torno de treze bilhões de dólares e seu
principal ramo de investimentos é a construção civil. Tem participação na sociedade de grandes
marcas mundiais e não abre mão de brincar na bolsa, o que já lhe deu perdas de patrimônio e
ganhos incalculáveis.
Segundo Lorena, o cretino será seu futuro marido. No que depender de mim, não mesmo! O
conheci em uma feira na Argentina. Ele é um prostituo descarado que adora um rabo de saia. Não
pode ver uma brasileira que já ataca. Deve ser fetiche ou loucura mesmo. Acha que o mundo gira
em torno do seu umbigo. E tem um senso de humor apuradíssimo, contrastando com o seu ego.
Também estudamos o irlandês Liam Larkin. Trinta e nove anos, viúvo e sem filhos. Seu
patrimônio é de vinte bilhões de dólares. Seu ramo de investimentos é basicamente hotelaria,
turismo e bebidas. Ele tem participação em várias indústrias cervejeiras e em várias bebidas em
todo o mundo. Um ruivo, de olhos verdes e aparentemente doce. Parece ser uma pessoa tolerante,
do tipo que não perde a calma muito fácil, mas aqueles intensos olhos verdes mostram uma
pontinha de tristeza. Tristeza, não... solidão. Lorena também vai casar com ele para trazer mais cor
a sua vida. Deus, como essa garota sonha.
Já era noite quando terminamos de organizar um arquivo sobre o encontro. Estava
guardando a papelada quando Lorena grita:
— MEU DEUS! Esquecemos de um Deus. Zachary Thorton O´Brian, americano, trinta e
nove anos, solteiro e sem filhos. Agora vem a parte importante, o homem tem um olhar de fazer
qualquer mulher ovular e uma boca desenhada para o pecado. Molhei só em pensar nas maravilhas
que essa boca pode fazer.
Cautelosamente peço a ela:
— Passe-me somente a ficha, por favor – assim que eu alcanço, leio o que realmente
importa. — Aqui diz que seu patrimônio é de trinta e um bilhões de dólares. Empreendedor nato,
que triplicou o patrimônio da família em tempo recorde. A holding sob seu comando compra
empresas falidas ou quase e as faz prosperar, vendendo-as pelo dobro do preço atual. Não tem um
segmento prioritário. Aqui estão listadas as empresas e marcas do mundo todo que ele possui
participações. Esse, sem dúvidas, não seguirá com as negociações. Na melhor das hipóteses, ele
ficará só o tempo de terminar a apresentação dos projetos.
— Você já viu a foto dele? O homem é um tesão – ela faz biquinho. — Eu quero um desse,
mãe!
— Um desse, um daquele, um do outro – comento rindo. — Estou cansada, vamos deixar o
resto para outro dia. Que tal um filme?
— Maravilha! Aproveita e faz aquela pipoca com chocolate, Creusa! Ficarei por aqui
admirando meu futuro marido número três, Zachary.
— Doida de pedra.
Assistimos dois filmes e comemos muito, antes de adormecermos. De repente, eu estava
caminhando sozinha em um local escuro, uma espécie de jardim sombrio, trajando um lindo
vestido de festa. Senti alguém me observar e, amedrontada, olhei para os lados, à procura de
algo ou alguém, mas só via escuridão. Senti meus cabelos da nuca arrepiarem e um calafrio
percorreu meu corpo. Olhei para trás e encontrei um par de olhos azul-escuros ou violetas, tão
sombrios quanto o lugar em que estávamos.
Fiquei paralisada, o medo não permitia mexer-me. Uma voz gritava em minha cabeça
para eu correr dali. Eu tinha que me livrar daquele olhar. Eu queria correr, mas aqueles olhos
me hipnotizaram e estavam cada vez mais perto. Foi aí que percebi que não era o medo que me
paralisava, e sim o desejo. Com a aproximação, o ar ficou frio, meu corpo respondeu ao
comando silencioso daquele olhar e se manteve estático. Ele estava cada vez mais perto. Aquela
vozinha em minha cabeça gritava desesperadamente por socorro, mas meu corpo tremia em
excitação. Quando ele chegou a minha frente e tentei focalizar seu rosto, meu corpo foi de
encontro a ele, de encontro a minha morte.
Acordo assustada. A televisão ainda estava ligada e Lorena deitada ao meu lado na cama.
Vou à cozinha para beber água e vejo que está amanhecendo. Respiro fundo para desfazer o nó que
aquele sonho deixou em meu peito. Corajosamente, caminho até a sala e alcanço a bendita pasta.
Sento-me no sofá e abro, pronta para confirmar que eram os mesmos olhos dos meus sonhos. Mas,
para a minha surpresa, não eram. Será que estou ficando louca? Eu tinha certeza que havia visto
aquele olhar na imagem que estava nesta pasta. Não foi a primeira vez que sonhei com ele, sóque,
por um momento, achei que poderia dar um rosto e...
Balanço a cabeça para sair desse torpor. Devo estar trabalhando demais. Volto para o
quarto e visto-me para correr na praia, espairecer desse sonho louco. Durante a corrida, fico
tentando entender a loucura de ontem à noite e a certeza de que os olhos dos sonhos eram os
mesmos que tinha visto na foto. Senti até o mesmo calafrio. É muita loucura para uma pessoa só.
Volto ao meu apartamento e sinto um cheirinho de café. Ah, que delícia! Se eu ficar muito
tempo com areia na pele, brotoejas aparecem e a coceira é terrível. Resistindo ao café, vou direto
ao banheiro para tomar banho. Assim que visto-me, vou para a cozinha e encontro a mãe da Lolo
fazendo tapioca. Abraço-a forte.
— Bom dia, tia. Madrugou?
— Bom dia, Lê. Já são dez horas da manhã, isso não é madrugar. Liguei mais cedo para a
Lorena e ela disse-me que você tinha saído para correr. E, se eu a conheço bem, sei que está com
problemas. Então, vim fazer um mimo para minhas meninas.
— Longe de mim reclamar, tia. Adoro quando você vem aqui. Mas não estou com
problemas, é só cabeça cheia por causa dos projetos mirabolantes do Kevin.
Lolo senta na cadeira em frente a mim.
— Mãe, depois do café, vou mostrar para a senhora seus três futuros genros.
Ri tanto que me engasguei. E assim foi meu domingo, tranquilo, com a família, recarregando
as energias para mais uma semana de batalha.
CAPÍTULO 04
 
Letícia
Vozes exaltadas irrompem pelo andar e levanto-me para saber o que acontece. Caminho até
a sala de reuniões e vejo o cliente exaltado. Kevin e o responsável pela pasta desse cliente tentam
miseravelmente acalmar o homem. Não costumo me meter nos assuntos dos meus colegas de
trabalho, mas a situação estava fora de controle e ninguém fazia nada.
Entro sem pedir licença e todos se calam ao me observar pegar alguns papéis sobre a mesa.
Pude ler o relatório que apontava um caixa dois e uma amante sem noção que tinha acesso à conta
da empresa. Seu capricho em Miami custou uma pequena fortuna. Esse é um dos piores tipos para
lidar, velhos babões amantes de ninfetinhas com a empresa da família beirando a falência.
O contrato não é da minha responsabilidade, só que eu não poderia permitir que aquele
circo continuasse. Pessoas com o rei na barriga acham que podem tratar os outros de qualquer
maneira, mas não podem! Kevin tentou intervir, mas não teve êxito e minha paciência estava por um
fio. O cara conseguiu atrapalhar o serviço de todo mundo.
Ainda olhando os papéis, dirijo-me diretamente ao presidente da minha empresa:
— Qual o problema, Kevin? – eu já sabia, só queria a confirmação, antes de falar o que não
devia.
— O senhor Monteiro está insatisfeito com nosso trabalho. Quer que eu troque o consultor
porque, segundo ele, o Camargo não serve nem para limpar banheiros – Kevin fala, apontando para
o infeliz do cliente.
Fui até o Camargo e perguntei onde o problema estava pegando.
— Ele não mencionou que a secretária também tinha um cartão corporativo de outro banco.
Aliás, conta que não tínhamos conhecimento até então. E, com os boatos de falência, alguns bancos
credores não querem renegociar a dívida da empresa. Só que há uma solução. Na auditoria,
encontramos uma conta robusta para quitar as principais dívidas e tirar a empresa da lama. Mas,
segundo o senhor Monteiro, se usarmos esse recurso, ele não terá como sobreviver.
— Quem é ela? – o “tiozin” pergunta.
Antes que Kevin pudesse responder, falo:
— Sou sua nova consultora.
O homem fica ainda mais vermelho.
— Era só o que me faltava, tirar um velho e colocar uma mulher. Isso é trocar seis por meia
dúzia – bastardo.
Com toda educação que tenho, coloco as folhas sobre a mesa e encaro-o:
— O senhor está à beira da falência e acredita mesmo que pode exigir alguma coisa? Aqui
na Global, senhor Monteiro, o ditado “o cliente sempre tem razão” não funciona! Se nos
contrataram, é porque estão com a corda no pescoço. Se estão com a corda no pescoço, é porque
não tiveram razão! Então, o senhor deve ficar bem tranquilo e nos deixar fazer o que estamos sendo
pagos para fazermos. E, comigo, educação vem no pacote. É bom que lembre-se disso.
Aponto para as linhas no meio de uma página e volto a falar:
— Pelo que vi aqui, sua amante gastou mais do que deveria e o senhor não quer que sua
família saiba desse pequeno detalhe. Eu compreendo que seja difícil contar a eles que estão
ficando pobres por causa da péssima administração do pai. Também acho constrangedor dizer que a
amante tem mais gastos que eles.
— Você não pode falar assim comigo. Quem você pensa que é? – ele questiona irritado.
— Eu sou aquela que vai salvar sua empresa da falência. Agora, responda-me, o senhor
quer sair do buraco, senhor Monteiro? – pergunto com meu tom falsamente doce.
Visivelmente irritado, ele responde:
— Por qual outro motivo ainda estaria aqui?
— Ótimo. Camargo, concordo com você, vamos usar o dinheiro do desvio para quitarmos a
dívida. Também vamos confiscar o cartão dela e encerrar a conta da se...
A “secretanha”, mistura de secretária com piranha, pula de sua cadeira.
— Meu cartão? Por quê?
Com o mesmo tom que usei com o senhor anteriormente, respondo:
— Porque você é secretária, não precisa...
Ela interrompe-me:
— Eu faço compras para o Monteiro, sabia?
Procuro pelas faturas e volto a falar:
— Não sabia que o seu patrão andava com sapatos Louboutin, senhorita – volto a atenção
ao meu colega de trabalho e o instruo: — Camargo, também acho interessante fazer algumas
mudanças no quadro de funcionários, começando pela a secretária. Ela trabalha lá, sabe da
dificuldade que estão passando. Se, ainda assim, gasta mais do que pode, prova que não tem
consideração por quem lhe sustenta. E acredito que ter a amante como funcionária seja
inconveniente e constrangedor.
— Se vocês não se incomodam, pretendo continuar com o consultor – Monteiro senta,
ajeitando sua gravata.
Segurando o riso, pisco para o Kevin, que concorda imediatamente. Então, saímos da sala
conversando.
— Por que você permitiu aquele escândalo? Nossa obrigação é salvar a empresa, e não
sermos condescendentes com eles – questiono-o.
— Lê, você sabe que não gosto de expor nossos clientes. A amante é uma parte privada da
vida dele, não cabe a mim trazer isso à tona. Podemos violar a sua privacidade.
— Aprenda, Kevin, aqui não é como no seu país, onde as crianças de seis anos gritam com
os pais porque violaram sua privacidade. Aqui, o máximo de privacidade que temos é ir ao
banheiro com a porta fechada.
Chegando a minha sala, Lorena avisa-me que alguém me espera.
— Lê, o Ricardo está te esperando para dar uma palavrinha com você.
— Obrigada, Lolo.
— Faço muito gosto na sua relação com o Ricardo. Às vezes, te acho muito solitária,
Letícia. Merece alguém que a faça feliz – Kevin fala com carinho.
— Obrigada, senhor presidente. Mas nós não temos nada.
Despeço-me e entro na sala, encontrando um belo exemplar masculino sentado em uma das
cadeiras em frente a minha mesa, distraído, no celular. Ricardo é diretor do departamento jurídico
da Global. E encantador, com seus olhos castanhos, cabelos curtos e bem penteados para trás.
Sempre elegante em seus ternos sob medida. Nós somos uma espécie de amigos com benefícios.
Saímos de vez em quando para jantar e algo mais.
— Olá! Que bons ventos trazem o galã da empresa até minha sala?
— Vim te ver, bonita – ele fala afetuosamente.
— Cansou da nova secretária? – pergunto, rindo. — As conversas correm por aqui.
— Não sei o que falaram, mas é mentira, eu não...
Abro um sorriso e levanto a mão, cortando seu discurso.
— Meu querido, não se preocupe! Não temos um relacionamento, apenas gostamos da
companhia um do outro. Não há porque você deixar de sair com outras pessoas.
— Você está saindo com outra pessoa, Letícia? – ele pergunta consternado.
— Não... – ele sorri, vitorioso. Mas dou um jeito de seu ego desinflar: — Mas não por sua
causa. Tenho trabalhado demais e saído de menos.
— Vamos sair hoje?
— Claro – passo a impressãode estar empolgada, mais do que realmente estou.
— Eu te busco às oito. Pode ser?
— Perfeito.
Assim que ele sai, Lorena entra com e entrega-me alguns papéis.
— Tenho um encontro hoje à noite, Lê! – ela fala com um sorriso enorme e pulando como
uma menina. — Com o Diego da contabilidade. Estou tão ansiosa, não saio com ninguém desde o
Rogério.
— Hoje à noite promete – levanto e dou um abraço nela. – Já estava na hora, Lolo.
Interessante, o tal do Zachary Thorton não pediu nada extravagante, apenas a suíte
presidencial. Bem, todos a pediram. Para nossa tranquilidade, o hotel se propôs a montar suítes
pomposas para recebê-los. Ainda tento entender o que houve aquele dia que abri a pasta, a foto que
está lá é de um jovem sorridente que não parece ter trinta e nove anos. E, cada vez que penso nisso,
um arrepio corre pelo meu corpo.
Não quero dar o braço a torcer, mas estou ansiosa. Não vejo a hora de ficar frente a frente
com os seis ilustres convidados. Meu único receio é não conseguir alcançar a meta que o Kevin
quer. Pelo menos dois investidores e, desses dois, um tem que investir na restauração de um prédio
tombado pelo patrimônio histórico, que hoje é um hotel ou era.
O dia passou rápido demais para o meu gosto. Assim que saí da minha última reunião, fui
para casa me arrumar para o encontro. Já de banho tomado, vou para o closet escolher uma roupa.
Não sou muito ligada em moda, prefiro algo elegante e confortável. Então, opto por um vestido
frente única floral, scarpin e clucht verde, brincos e pulseira de ouro e o look está pronto. Eu
adorava meus cachos, até descobrir a praticidade dos cabelos lisos, por isso alisei e fiquei ainda
mais apaixonada pelos meus cabelos que vão até o meio das costas.
Já sai com o Ricardo algumas vezes e com outros homens também. Na hora da transa, tenho
que fingir um orgasmo. Não é justo ferir o orgulho do cara só porque me tornei frígida ou quase.
Mas a verdade é que ninguém me desperta, por mais que eu tente. Nem mesmo lembro da última
vez que tive prazer com um homem. Entre abraços e beijos, “mão naquilo e aquilo na mão”, nada
acontece! É como se desligassem o interruptor do desejo. Sozinha, tocando-me, tenho orgasmos, só
que nada se compara a sentir uma pessoa dentro de mim. Já fui em médicos e todos me disseram a
mesma coisa, é psicológico, mas nem os psicólogos conseguiram me ajudar.
Encontro Ricardo à minha espera no hall de entrada do condomínio. Ele me cumprimenta
com dois leves beijos no rosto.
— Boa noite, Lê. Você está linda, como sempre.
— Boa noite, Ricardo. Você também está muito bem.
Ele abre a porta para mim como o verdadeiro cavalheiro que é. No caminho para o
restaurante, tento me concentrar no que o homem fala, mas meus delírios com aqueles olhos azuis,
que só existem nos meus sonhos, têm se intensificado cada vez mais.
— Letícia?
Assusto-me.
— Oi?
— Está distraída, princesa. Algum problema? – seu olhar preocupado faz-me sentir mal.
— Está tudo bem – respondo.
— Estou sabendo que você apresentará a próxima A Vitrine. Se eu a conheço bem, sei que
está se dedicando totalmente a isso.
— Se não for assim, não teremos êxito.
— Quando fui o apresentador, o sheik Baschir estava presente e já adianto, não é fácil.
— Imagino – desconverso. Sou muito fechada para ficar trocando figurinhas sobre
negócios. Parece egoísmo, eu sei. Mas, nesse mundo, você nunca sabe quem está prestes a lhe trair.
O jantar foi muito agradável e, apesar de Ricardo ser uma ótima companhia, meus
pensamentos estavam longe dali. Assim que entramos no carro para irmos embora, ele beija-me e o
clima esquenta. Dessa vez vai... tem que ir.... Um calafrio faz com que eu abra os olhos, vejo que
um par de olhos azuis intensos. Então, um calor desconhecido queima dentro de mim. E eu quero
mais... muito mais! Mas Ricardo quebra o momento quando abre a boca.
— Nossa, princesa! Eu sabia que você estava com saudades de mim.
Todo encanto se perdeu. Abri meus olhos e encontrei os olhos castanhos de Ricardo. Meu
Deus, acho que estou ficando louca.
— Desculpa, eu não sei o que me deu.
— Para sua casa ou para minha? – ele fala confiante.
— Eu para minha e você para sua – digo seriamente.
— Mas achei que iríamos passar a noite juntos. O clima estava esquentando e...
— Não estou me sentindo bem.
Ricardo acena consternado, sabendo que discutir nesse momento é trabalho perdido. No
trajeto, mais uma vez me distraio. O que está acontecendo comigo? De onde esses benditos olhos
saíram e por que não me deixam em paz?
Assim que ele estaciona em frente ao prédio, despedimo-nos e subo correndo para o meu
refúgio. Preciso colocar a cabeça no lugar. Tirando minha roupa em frente ao espelho, a lembrança
dos sonhos que venho tendo com aquele olhar volta com força, fazendo meu corpo acordar mais
uma vez. Como isso é possível? Balanço a cabeça e coloco uma camisola, deito sob as cobertas
ainda impressionada. Nos últimos dias, estou dormindo cada vez mais cedo. Mesmo não querendo
admitir, tenho que reconhecer que o faço porque quero encontrar aquele olhar mais uma vez.
Estou correndo entre árvores, em meio a escuridão da noite. Piso em meu vestido branco
que é longo demais e caio. De repente, um arrepio corre pelo meu corpo. Essa sensação já é uma
velha conhecida, sei quem está por vir. Minha cabeça grita para levantar e correr. Mas meu
corpo continua inerte, à espera daquele que realmente o comanda. É assustador. Sei que ele está
por perto e sei que ele está aqui por mim.
Olho para o meu pé descalço e um pouco machucado, lágrimas brotam dos meus olhos e
as palavras saem da minha boca:
— Eu preciso tanto de você... por favor... – mas por quem eu clamava?
Uma mão toca o meu rosto e seca minhas lágrimas. Sentindo-me confortada, levanto a
cabeça e vejo aqueles olhos que me prendem. Passo a mão por aquele rosto desfocado e
novamente as palavras saem sem permissão:
— Eu preciso de você...
Mãos fortes rasgam meu vestido, deixando meu corpo à mostra. Todo o lugar que estava
no breu é iluminado por uma luz vermelha e a luxúria toma conta do meu corpo. Assalto sua
boca sem piedade e ele, o meu corpo, tomando de mim o que quer. Suas mãos apertam meus seios
e logo a sinto entre minhas pernas, penetrando-me. Sua respiração em meu pescoço e todo
aquele desejo, sobrecarregam-me. Quando estava prestes a ter um orgasmo, toda a cena muda.
A luz que outrora era vermelha, volta a desaparecer, deixando-nos no breu novamente.
Aquele ser me empurra e acabo caindo no chão, com o rosto no pó. Humilhada, machucada e
ainda no chão sem entender, pergunto:
— Por quê? – o sentimento de traição volta mais uma vez para me assombrar.
Abro os olhos e me dou conta de que foi somente um sonho ruim. Caminho até a varanda e
sento-me na espreguiçadeira, contemplando o mar. Isso me acalma. A brisa resfria meu corpo que
estava quente por causa daqueles olhos azuis, novamente. Preciso encontrar um psiquiatra, urgente!
* * *
— Bom dia, minha Deusa de Ébano!
Sorrio com o bom humor de Lorena. Ela entra e senta-se com seu tablet em mãos.
— Essa empolgação toda logo pela manhã significa que a noite rendeu. Como foi seu
encontro, Lolo?
— Foi ó! – abro a boca para felicitá-la, mas ela continua: — Horrível! O tarado não queria
nem mesmo me levar para jantar, queria ir direto ao motel. Mal entrei no carro e a mão boba criou
vida. Teve uma hora que até desconfiei que tinha mais gente dentro daquele carro, era muita mão
para uma pessoa só.
Tentei me segurar o máximo que pude, mas foi impossível não cair na gargalhada.
— Um polvo? – comento.
— O Lula Molusco, do Bob Esponja, não tem tanta habilidade com oito tentáculos como
aquele protótipo de nerd tem com as duas mãos.
Meu riso cessou quando ela perguntou sobre a minha noite. Assim que respondo que foi
agradável, ela se levanta pronta para sair.
— Onde você vai, Lorena? Nem passou meus recados ainda.
— Vou procurar seu ânimo. Você deve ter deixado cair em algum lugar – ela senta-se
novamente. — Como alguém pode falar que um encontro com o deus do sexo é agradável?Agradável é tomar chá com a minha mãe!
— Desde quando o Ricardo é deus do sexo? – pergunto, sorrindo.
— Informações das “peguetes” dele pelos corredores.
Enquanto ela conta onde ouviu esses absurdos, abro as pastas novamente para fazer
anotações.
— Desculpa te interromper, Lolo, mas estas pastas estão todas organizadas como te pedi?
— Isso não é daqui – ela fala enquanto folheia cada uma e retira algo de uma delas.
Não suportando mais a ideia dos benditos olhos me perseguindo, desabafo com a minha
melhor amiga:
– Lolo, acho que estou ficando louca...
— Por que acha isso? – ela deixa seu tablet de lado e concentra-se em mim.
— De uns dias para cá, ando sonhando com um par de olhos azuis.
Levantando as sobrancelhas, ela pergunta, sorrindo:
— E quem é o dono desses olhos poderosos a ponto de fazê-la achar que está louca?
— Não sei...
— Não sabe? – pergunta descrente.
Nego com a cabeça.
— Não. Mas figura em meus sonhos há um longo tempo e quase todos os dias.
— Você deveria estar com o Ricardão, e não sonhando!
— Eu estava beijando o Ricardo quando aqueles malditos olhos me assombraram e...
— O Ricardão não tem olhos azuis, criatura – ela interrompe-me
— Mas eu os vi! E aqueles olhos acenderam uma coisa diferente em mim, até que o Ricardo
falou alguma coisa, quebrando o clima.
— Que estranho, Lê. Não sei como te ajudar nisso. Mas minha mãe tem uma teoria sobre
isso. Ela diz que quando temos esse tipo de sonho é um sinal do destino. Talvez, o dono desses
olhos esteja vindo ao seu encontro.
— De onde vocês tiram essas coisas? – pergunto, arrependida de ter contado.
Ela dá de ombro.
— Não sei. Mas ela costuma acertar. Deixa eu terminar o pensamento dela. A missão de
ambos é encontrar-se e, quando esse encontro acontecer, seu destino será selado. Isso não é
profundo?
Um calafrio sacode meu corpo e falo, me benzendo:
— Credo! Sua mãe tem que parar de falar essas coisas e você tem que parar de repeti-las.
— Já parei!
Impressionada com as palavras da Lorena, tento focar no meu trabalho. Ela repassa os
horários das reuniões do evento e confirma o desembarque dos convidados que estão prestes a
chegar. Passamos o dia verificando o hotel e se todas as exigências dos rigorosos hóspedes foram
cumpridas. Mesmo com a cabeça cheia e um dia brutal de trabalho, a frase da Lolo não para de
rolar pelos meus pensamentos: A missão de ambos é encontrar-se e, quando esse encontro
acontecer, seu destino será selado.
CAPÍTULO 05
 
Zachary
Raramente viajo com uma equipe numerosa; minha assistente pessoal, meu chefe de
segurança e mais dois seguranças são suficientes para mim. Só que para essa viagem optei por
trazer mais dois assistentes, para verificar a viabilidade de investimentos rapidamente. A viagem é
longa e meu tempo é curto. Enquanto estamos trancados todos juntos no meu avião, não há motivos
para não trabalharmos.
— O Rio é uma cidade um pouco violenta, não quero ser surpreendido, King – falo para
Kingston que, além de ser chefe da minha segurança, também é um grande amigo.
Ele era um franco atirador de elite, até o dia que um de seus parceiros foi morto por outro
soldado. O homem estava em uma situação difícil, arrumando brigas por onde passava. Em um dos
meus porres memoráveis, acordei com King deitado ao meu lado na beirada da piscina do Ethan.
Lembro-me que houve uma briga no bar em que estávamos, e ele tomou minhas dores. Somos
inseparáveis desde então.
— Tudo está em ordem, Zach. Enviei dois homens há dois dias para verificarem o local. E
também chequei a ficha de todos que estarão em contato com você durante essa estadia.
Encaro-o.
— Verificou ela também?
— Sim. A senhorita Letícia Sophie Barros tem a ficha limpa e um currículo profissional
invejável. Seus pais morreram quando ela tinha apenas dez anos e sua guarda passou para a sua
avó, que morreu quatro anos depois. Morou com um cara durante três anos. Não chegamos a fundo
sobre os detalhes da separação, mas deve ter algo a ver com o novo trabalho em outro estado – ele
fica em silêncio, encarando-me: — Por que o súbito interesse nessa mulher, Zach?
— Porque, se ela é como E. a descreveu, a trarei para compor minha equipe na Holding.
Outra coisa, investigou a nova esposa do meu pai?
— Sim. Viúva, professora aposentada, dois filhos de dezoito e vinte anos respectivamente.
Eles moram e estudam fora. Ela é idônea, mulher exemplar na sua comunidade, do tipo que não se
interessa pelo seu pai.
Não é que o meu papai achou alguém que valha a pena! Só espero que dure. Esses divórcios
estão levando muito dinheiro para o meu gosto.
— Obrigado, King.
Lennon, um dos meus seguranças, entra e confirma para King que a varredura no hotel foi
feita e nada foi constatado. Está tudo certo para a minha chegada. Segundo meu amigo, ele é mestre
em artes marciais e um excelente motorista de fuga. Não que eu esteja pensando em roubar alguma
coisa. Só que já escapei de duas tentativas de assassinato e quem sabe quando precisaremos fugir
de uma mulher louca?
Minha assistente pessoal, Maggie, que é muito eficiente, aproxima-se com um largo sorriso.
— Qual o motivo desse sorriso bonito, Mag?
Ela balança a cabeça.
— Nada... – ela suspira com olhar sonhador. Deve estar apaixonada.
— Eu quero aquele levantamento da nova fábrica, os relatórios do hotel de Vegas e aqueles
documentos que Philip deveria ter enviado ontem. Caso ele não tenha feito ainda, diga que não
precisa nem fazer e ir direto ao departamento pessoal pegar suas contas – volto minha atenção para
o papel a minha frente. — Mag, fala para o Joe e o Ted virem aqui.
Ela vai até a parte da frente do avião e King volta a falar com Lennon. A minha cabeça está
cobrando seu preço e a falta de sono está prejudicando meu bom senso.
— Quer falar conosco, senhor? – Joe pergunta.
Aceno para eles, que procuram o melhor lugar para sentar.
— Prontos para conhecerem o Brasil? – ambos assentem.
Contratei Joe, porque ele foi o primeiro de sua classe desde o Ensino Médio e em Harvard
se formou com louvor em Economia. Ted, além de ser um excelente com números, é um dos
melhores hackers que já encontrei. Depois que ele cumpriu pena por invadir os computadores da
Casa Branca, eu o contratei. Ajudei-o a terminar sua faculdade e o contratei. Hoje, é um dos meus
braços direitos.
— Eu soube que aquela empresa de telecomunicações vai abrir seu capital. Confirme isso e
especule as ofertas. Caso seja certo, você e Joe tracem uma estratégia para adquirir todas.
— Sim, senhor – Ted responde.
— Senhor O´Brian, acredito que a Blacwater Eletronics será uma negociação hostil. Será
que...
Corto Joe antes que ele profira:
— Que vale a pena? Sim, vale! Eu não me importo. Continue como o planejado.
— Sim, senhor.
Eles levantam e observo voltarem aos seus lugares. Tenho pessoas talentosas da minha
inteira confiança para gerir os departamentos da organização. E eles fazem parte desse grupo. Mas,
como dono, tenho obrigação de saber tudo o que acontece para manter o controle e aniquilar
eventuais obstáculos.
* * *
Assim que desembarcamos, fomos direto para os carros que estavam a nossa espera na
pista. No trajeto para o hotel, pude ter uma noção da beleza da cidade do Rio de Janeiro. Já estive
no Brasil a negócios, mas não tive a oportunidade de conhecer nada da cidade em que estive. Ao
chegarmos ao hotel, vejo Cooper a nossa espera na recepção. Caminho em sua direção, e ele
adianta-se.
— Como vai, Zachary? – estende a mão para cumprimentar-me.
— Estou bem. Você como está? E sua família, como está? – retribuo com um aperto firme.
— Estamos todos bem, obrigado. Espero que seu voo tenha sido agradável.
— Foi excelente. Só quero descansar em uma cama confortável.
Neste instante, a inquietação que venho sentindo ao longo do mês fica ainda mais intensa. É
como se o ar ficasse denso e sinto-me agoniado. O concierge do hotel nos leva em direção aos
elevadores quando avisto uma mulher e não sei por qual motivo meu coração falha uma batida.
Percebo que ela está procurando alguém, tão inquieta quanto eu. Antesdas portas se fecharem, seus
olhos encontram os meus.
Ela é linda...
Preciso saber quem é. Essa gaiola não sobe mais rápido e a inquietação que agora tem um
rosto está me matando. Assim que chegamos ao nosso andar, abordo King antes mesmo de entrar na
suíte. Enquanto falamos, os seguranças fazem uma segunda varredura no local.
— Acabei de ver uma mulher no hall, quero que descubra quem é e em qual quarto está.
Imediatamente!
Ele faz uma careta.
— Sim, senhor. Como ela é?
— Pele negra, cabelos lisos, tive a impressão de que seus olhos são claros. É só o que sei,
descubra.
Ele acena e se vai. Entro na suíte, dou uma olhada ao redor e abro as cortinas que dão para
uma pequena sacada. Respiro fundo e a brisa do mar me acalma. A vista é deslumbrante! Vou para
o banheiro e tomo um banho demorado. Ainda nu, deito para descansar e a imagem daquela mulher
não sai da minha cabeça.
Uma dor no estômago faz-me lembrar que estou há horas sem comer. Levanto e visto uma
roupa fina para encarar o clima tropical. Encontro Lennon e King na sala de estar, discutindo
alguma coisa.
— Estou descendo para comer, vão comigo? – pergunto.
King se adianta.
— Não prefere pedir algo para comer na tranquilidade da suíte, Zach?
— Não.
Saio com as duas paredes em meu encalço. Os homens são grandes. Indo em direção ao
restaurante, vejo Ethan com duas mulheres. A baixinha eu não conheço, mas reconheceria aquela
mulata de longe. Se está com Ethan, só pode ser uma de suas acompanhantes e, por algum motivo,
isso me incomoda.
— King, é ela – aponto.
— Essa é a...
O interrompo antes que ele termine sua fala:
— Esquece! Deixe que eu mesmo descubro quem ela é – aproximo-me do grupo,
colocando-me ao lado dela. Seu perfume envolve-me e minha excitação desperta. — Ethan.
Assim que ela vira-se para mim, seu olhar é de perplexidade e segura o meu, como se
estivéssemos hipnotizados.
— Ei, cara! Não sabia que já estava por aqui. Se soubesse, teria o convidado para jantar
conosco – Ethan fala enquanto continuo preso à imagem dela.
Desvio o olhar e falo com Ethan.
— Sim, já estou em solo brasileiro há algum tempo. Quanto ao seu desejo de me convidar
para o seu jantar – encaro-a. — Você sabe que não misturo negócios com prazer. Apesar de que
suas amiguinhas são lindas – volto minha atenção ao meu amigo e o repreendo: — Quantas vezes
falei para não envolver as acompanhantes em viagens de negócios? Quer tê-las na sua cama, tudo
bem, mas expor assim, pode ser um problema.
Nesse momento, pego-me torcendo para que ela não esteja com E., pois seria
decepcionante. Bem, por outro lado, se ela for acompanhante dele, Ethan poderia dá-la a mim.
— Lê, é impressão minha ou bonitão aí está nos chamando de prostitutas? – olho para a
mulher que está ao lado da morena. Ela é tão linda quanto sua amiga, mas de forma diferente.
Enquanto a morena é uma amazona gostosa, sua amiga é uma boneca.
Sem desviar os olhos dos meus, ela fala sem emoção em sua voz.
— Não foi impressão.
Eu sei exatamente o efeito que tenho sobre as mulheres e em alguns homens, com ela não
seria diferente. Eu sou aquele que toda mulher quer ao seu lado durante o dia e dentro dela durante
a noite. Só que eu não contava com o efeito que ela teria sobre mim. Mas não contava com o efeito
que ela teria sobre mim. Não havia muito espaço entre nós dois, mas dei um jeito de chegar ainda
mais perto. Passo meus dedos pelo seu rosto, admirado com sua pele morena e sedosa. É
impecável! Eu poderia ficar assim com ela a noite toda. Aproximo-me do seu ouvido e falo:
— Se você subir comigo, garota, eu te darei uma noite inesquecível e a recompensarei
muito bem.
Por uma fração de segundos, ela fica tensa, relaxando seu corpo em seguida. Ela vira-se de
frente para mim e passa a mão pela minha camisa. Meu corpo reage ao seu toque e, com um sorriso
deslumbrante, ela fala:
— Seria um prazer cuidar de você, senhor. Mas infelizmente não tenho mais horário. Minha
agenda está cheia. Sabe como é, não é?!
Ethan solta uma gargalhada enquanto eu atribuo todos os xingamentos possíveis a ela em
minha mente. A atrevida despede-se de Ethan e leva sua amiga para longe, segurando-a pelo
cotovelo.
— Está perdendo o jeito, garanhão – ele fala, debochando.
O maître aparece de algum lugar e nos escolta a uma mesa do elegante restaurante.
Sentados, Ethan pede uma bebida para acompanhar-me enquanto eu me alimento.
— Quem é ela? – pergunto.
— Letícia...
— A mulher que apresentará a Vitrine? – eu o corto.
— Yeah! Ela mesmo – servem-nos e se retiram. Ethan continua: — E aquela gracinha
pequenina será minha. Só espero que a Letícia não seja uma empata-foda.
Ela não é acompanhante, mas, com certeza, já passou pela cama dele. Se fosse outra, não
me importaria, mas algo nela faz sentir-me de forma diferente.
— Por que ela seria, sendo que estarão os três juntos?
— Letícia não faz o tipo aventureira – ele responde.
Ainda mais curioso, pergunto com medo da resposta:
— Já saiu com a Letícia?
— Não. A Letícia não se deixou levar pelo meu sex appeal. Mas ela me conhece muito bem
e a Lorena é sua melhor amiga. Duvido que permitirá que sua amiga se deleite comigo.
— Cadê a confiança inabalável de Ethan Scott? – falo, rindo.
Durante todo o jantar, não consegui tirar a mulher da minha cabeça. A cor de seus olhos é
diferente, exótica e extremamente bonita. Enquanto ela estava me encarando, pude perceber o misto
de emoções em seus olhos. E um outro desejo alienígena surge, quero abraçar e protegê-la.
Que porra de pensamento é esse?
Nada de abraçar e proteger. Ela é louca, isso sim! Onde já se viu falar daquela maneira
comigo? Quem ela pensa que é? Eu sou Zachary Thorton O´Brian, se eu quiser tê-la no caralho da
minha cama, eu vou ter! E Letícia Sophie Barros pode se conformar a hora que estiver gozando com
o meu pau enterrado no fundo da sua boceta, que, com certeza, é aper...
Caralho! Solto os talheres com mais força do que deveria e empurro o prato para longe. Ela
conseguiu acabar com meu apetite. Era só o que me faltava! Uma mulher qualquer me desprezar
daquela maneira. Mal sabe ela que posso transformar sua vida em um inferno. Letícia não perde
por esperar.
— Zach? – noto cautela na voz do Ethan.
— Estou indo. Boa noite.
A passos largos, vou para a suíte trocar de roupa. É uma hora perfeita para nadar. Assim
que abro a porta da minha suíte, vejo Maggie com um vestido curtíssimo. Ela tem pernas bonitas,
nunca percebi isso.
— Boa noite, senhor – ela bateu os cílios para mim ou foi impressão minha?
— Boa noite, Mag. Vejo que está indo para um encontro ou algo assim?
— Estava a sua espera, na verdade. Temos que repassar algumas coisas referente ao evento.
— Oookaay...
Realmente fui pego de surpresa com seu tom de voz aveludado. Dou um passo para o lado,
para que Mag possa entrar. Mas acredito que as medidas das portas por aqui são muito menores do
que as do meu país, pois a menina esfregou tudo o que podia do seu corpo ao passar por mim.
A minha suíte é quase um apartamento, composto por uma sala grande com sofás, poltronas,
mesa e um espaço para reuniões. O quarto é ainda maior e o banheiro também. Ela senta-se no sofá
e cruza as pernas, revelando muito mais do que eu gostaria de ver. Exasperado, falo:
— Diga, Mag – ela está agitada. E, se a conheço bem, está com receio de falar: — O que
está acontecendo? Estou começando a ficar preocupado.
Ela se levanta e vem em minha direção com passos determinados. Nesse exato momento,
King entra e faz uma cara de “que porra é essa?” para mim. Olho novamente para Mag, que está
mais pálida do que de costume. Certo, agora tenho certeza que algo está acontecendo com ela.
Pego-a pelo braço e a sento no sofá novamente. Ajoelho-me diante dela e seguro sua mão.
— Você está bem? Precisa de alguma coisa?
Ela abre um sorriso diferente dos seus sorrisos normais e coloca sua mão em cima da
minha, firmando seu toque. Quando ela abre a boca para falar, King antecipa-se:
— Maggie, vá para o seu quarto antes que o resto da sua dignidade escorra pelo ralo.
Estreitoo olhar em direção a ele enquanto ela sai em silêncio. Continuo esperando uma
resposta para sua atitude.
— O quê? – ele pergunta surpreso. — Vai me dizer que não percebeu?
— Percebi que ela não estava bem e você a colocou para fora.
King ri alto. Idiota!
— Você deve estar ficando cego, Zach – ele balança a cabeça e fala: — Ela queria se deitar
com você.
Como é?
— Não. Não. Nãooo! Acho que a mulher até lésbica é.
Ele ri ainda mais alto, deixando-me irritado.
— Cara, já é o segundo fora que você dá essa noite... – seu celular notifica uma mensagem.
Ele lê e um sorriso abre-se em seu rosto. — O ar do Brasil deve ser afrodisíaco. Está deixando as
mulheres loucas, em ponto de ebulição. Assim que você estiver descansando, darei assistência para
algumas delas. Então, não percebeu que a Mag é apaixonada por você?
De onde veio isso?
— Claro que não! E nisso não posso ajudá-la. Porque não me apaixono e porque não
costumo transar com as minhas assistentes, mantenho-as bem longe da minha cama – sorrio. —
Somente com as assistentes dos outros. Vou procurar a piscina para nadar.
— Lá foi minha noite de manutenção. – King coloca o dedo em sua orelha e troca algumas
palavras com os outros. — Vamos, menino-peixe. Vou te acompanhar e nadar também.
King, certamente, é meu melhor amigo, sabe que eu não gosto que fique em meu pé o tempo
todo. Só que a vinda ao Brasil o deixou neurótico. Seu físico pode assustar qualquer um. Ele é mais
alto que eu, um muro negro de dois metros e mais dois de largura. O cara é tão grande que me sinto
pequeno perto dele. Mas tudo o que esse monstro tem de tamanho, seu coração tem de
generosidade. Eu confio minha vida a ele, sem sombra de dúvidas.
 
CAPÍTULO 6
 
Letícia
Os dias que antecederam o desembarque dos convidados foram agitados. Andava tão
ansiosa que nem mesmo minhas corridas aliviaram o sentimento inquieto. Na empresa, as coisas
estavam mais tranquilas, mesmo assim, ainda foi cansativo. Acompanhei de perto cada detalhe para
esse evento. Desde a arrumação do hotel, em relação as exigências dos convidados, até os
equipamentos que seriam usados. Além de tratar com cada assistente para que seus chefes não
tenham nenhum inconveniente. E Deus! Nada me preparou para o que aconteceu ontem à noite.
O primeiro empresário a desembarcar foi nada mais, nada menos que Ethan Scott. Kevin
convocou-me para um jantar para recepcioná-lo. E, como uma boa anfitriã, fui fazer meu papel.
Lolo, que é meu braço direito, esquerdo e as duas pernas, também foi convocada.
Lorena e eu formamos uma equipe. Sua formação acadêmica permite que ela seja
promovida a executiva, mas, por escolha própria, ela prefere ser minha assistente. Há pastas e
contratos que levam sua assinatura, cabendo a mim fazer somente as negociações. Ela é uma
excelente profissional, não haveria porque limitá-la. Kevin já tentou promovê-la diversas vezes,
vários departamentos a procuraram, mas Lolo rejeitou a cada um. Por sorte, Kevin entende o quanto
somos fortes juntas e permite-nos continuar desse modo. Às vezes, tenho a impressão de que muitos
preferem lidar com ela a lidar comigo.
Já no hotel, esperando alguém da recepção checar a informação que pedi, um arrepio
conhecido percorreu meu corpo. A apreensão tomou conta de mim, pois só senti isso nos meus
sonhos. Com meu coração disparado e meu corpo em alerta, olhei por todo o local, à procura de
algo que justificasse aquele tormento. E, quando virei-me na direção dos elevadores, paralisei. Foi
nesse momento que vi o dono do olhar azul-violeta que me persegue há meses.
Ele existe!
Fiquei ali, estática. Sem conseguir desviar os olhos dele, vi as portas fecharem e nossa
ligação sombria se quebrar. Meus pés, sem ordem nenhuma, começaram a marchar para o elevador
quando Lorena entrou a minha frente, parando-me.
— Letícia!
Assustei-me e olhei para Lorena.
— Lolo, ele existe...
Ela segurou meu braço e seu olhar era preocupado.
— Quem existe, Lê?
Apontei para o elevador.
— O-os olhos azuis... o-o dono dos olhos que te falei. E-ele está aqui no hotel...
Lorena me balançou com força.
— Estão te esperando no restaurante, mulher! E você está pálida, até parece que viu um
fantasma. O senhor Scott, aquele gostoso, não para de perguntar por você.
Fechei os olhos e acenei. Respirei fundo e recuperei a compostura. Fui a trabalho,
distrações não são bem-vindas. Dirigimo-nos até o restaurante, onde Kevin e a esposa, Ethan e um
de seus assistentes, nos aguardavam. Assim que me viram, Ethan levantou-se para me abraçar.
— Letícia! – seu português americanizado é um charme.
— Como está, Ethan? – retribuí o abraço, não tão apertado quanto o dele.
— Melhor agora com você nos meus braços.
Revirei os olhos para sua bobagem e desvencilhei-me do seu abraço pegajoso.
Cumprimentei os outros que estavam à mesa também. Conversamos antes de fazermos nossos
pedidos e não gostei nada dos olhares trocados entre Lorena e Ethan. Lolo tem que ser forte! Ethan
não é o melhor negócio.
O jantar foi agradável, mas lutei muitas vezes para não me levantar dali e sair em busca
daquele homem. Quando Kevin e sua esposa partiram, logo após o jantar, o assistente de Ethan,
Mark, também subiu para descansar. Fomos para um bar que antecede a sala de jantar do
restaurante. Entre conversas animadas, risadas da Lolo e o flerte nada saudável dela com o senhor
“Scott-prostituto”, alguém chama por ele.
Não tive que virar na direção da voz para saber quem era. O calafrio que o antecede em
meus delírios noturnos percorreu meu corpo no segundo em que sua voz grave soou. Eu precisava
vê-lo e constatar se sua existência era verdadeira. Então, virei-me para encontrar as profundezas do
azul-violeta escuro e assustador. Eu os reconheceria em qualquer lugar, até mesmo na intensa
escuridão.
Sua beleza me desarmou completamente. Pela forma com que sua camiseta delineia seu
corpo, pude ver o quão forte ele é e também muito alto. Meu um metro e setenta parecia reduzido a
apenas um. Braços fortes expostos pela manga curta e um belo par de pernas ajustados em uma
calça jeans clara, deu-me noção do tamanho de seu membro. Seu perfume embriagou-me de forma
que eu não sentia nada mais, somente a ele. Totalmente hipnotizada, até que o babaca abriu a boca
par nos chamar de prostitutas. Respondi à altura, com ironia, e arrastei Lorena para fora de lá, em
pânico.
No caminho para a saída do hotel, ela me questionava:
— Letícia de Deus, o que você fez?
Estava tão irritada!
— Era aquilo ou um tapa na cara, Lolo. Vamos para casa, estou cansada e não consigo
pensar direito. Deus do céu! A decepção foi grande. Pensei que, quando nos encontrássemos, seria
algo mágico. Por um momento, acreditei que aqueles olhos azuis seriam minha perdição...
Dou-me conta de que falei meus pensamentos em voz alta quando ela parou abruptamente na
entrada do hotel, ficando de frente para mim.
— Ele é o cara com que você anda sonhando? – seu olhar chocado é como um soco na
barriga.
— Sim... – respondi e seus olhos abriram-se ainda mais.
— Você não sabe quem ele é?
Exausta e desiludida, encerrei o assunto:
— Não sei e não quero saber. E, nesse momento, tenho raiva de quem sabe!
Dois táxis encostaram enquanto eu me despedia da minha amiga. A caminho de casa, meus
pensamentos voaram de volta ao hotel, para recordar daquele homem. A sua beleza é indescritível,
como se a natureza tivesse moldado um ser perfeito com cara de anjo e o corpo de um deus. Senti-
me frustrada por desejar uma noite de luxúria com aquelas mãos pelo meu corpo, explorando... sua
boca me possuindo e tomando para si...
Balanço a cabeça para desanuviar os pensamentos. Tenho que esquecer isso e me focar no
trabalho. Pelos próximos dias, viverei em função da Vitrine até todos partirem de volta para seus
países.
Antes de adormecer, pensei naquele milésimo segundo de toque no meu rosto, foi o
suficiente para me desestabilizar. Tateei meu corpo nu sob as cobertas, imaginando que eram suas
mãos percorrendo meu corpo e não as minhas. Toquei-me desesperadamente, alcançando oorgasmo
em segundos. Então, fechei os olhos na esperança de encontrá-lo mais uma vez em meu sonho.
* * *
Depois de uma péssima noite, levanto-me antes mesmo do meu despertador tocar. Coloco
uma roupa confortável, um tênis e vou correr na praia para gastar minhas energias. Alterno entre
caminhar e correr ao longo da orla. Alongo-me e continuo meus exercícios. Minha finalidade é me
esfriar, entrar no papel de executiva e focar-me no profissionalismo.
Entro no apartamento correndo para o banheiro, para um longo e revigorante banho. Estou
saindo do chuveiro quando ouço meu celular tocar. Caminho até onde ele está e vejo que é Kevin.
— Bom dia, boss! Em que posso ajudá-lo?
— Bom dia, Letícia. A que horas pretende chegar ao hotel? – seu tom de voz preocupa-me.
— Eu tinha combinado de almoçar com a Lorena às quatorze horas. Mas, se precisar que eu
vá, posso chegar em pouco tempo.
— Então venha! – olho para o telefone estranhando seu jeito.
— Estarei aí em uma hora. Até daqui a pouco.
O que aconteceu? Será que foi um imprevisto? Estava tudo conforme o planejado, nada saiu
errado até aqui. Não estou nervosa, estou ansiosa para começar a pescaria. Tenho alguns peixes
grandes no lago hoje. Não há nada mais letal para negociações do que a ansiedade, isso faz com
que a gente ceda antes do necessário e não enxergue as melhores oportunidades. Quando vamos
enfrentar os grandes, como é o meu caso hoje, não podemos mostrar a ansiedade, até porque, em
qualquer sinal de fraqueza, eles me devorarão.
Escolho um tailleur e saia lápis preta, uma camisa rosa e sapatos de saltos altos. A
maquiagem leve dará a descontração do dia, um par de brincos simples, pois estou indo a trabalho,
e não para chamar a atenção. Arrumo meus cabelos em um rabo de cavalo bem apertado. Para estar
à frente das pessoas, apresentando algo, devemos ter em mente que alguns trejeitos são irritantes.
Como arrumar o cabelo a todo instante e puxar a saia curta a todo momento. A chave é a elegância.
E a elegância é a simplicidade da combinação.
No hotel, vou direto ao encontro de Kevin na sala de conferências reservada para a Vitrine.
Muitos seguranças já estão a postos e fazendo seu trabalho. Perfeito! Corro os olhos ao redor e
posso constatar que tudo está indo bem. Dediquei-me totalmente e me preocupei com cada detalhe
desse encontro. Participei da seleção dos seguranças que trabalharão conosco nesses dias. Para
passar confiança, acompanhei a varredura do local com cada chefe de segurança que solicitou a
visita.
— Letícia, você tem que falar com o Kevin. Ele está tão tenso que acho que pirará na
batatinha a qualquer momento. – Lorena vem ao meu encontro, mais agitada do que nunca. — Já
pensei em providenciar camisa de força para o coita...
— Letícia! – Kevin grita do outro lado da sala.
— Boa sorte! – ela fala enquanto caminho em direção ao Kevin.
— Tudo bem? Estamos tendo problemas? – pergunto, pronta para resolver seja o que for.
— Não estamos com problemas. Por isso, estou nervoso. Nada deu errado, não tivemos
imprevistos e isso é um mau sinal.
Oi? Como pode ser um mau sinal quando tudo está dando certo?
Pego-o pelo braço.
— Vamos beber e comer, senhor presidente. O senhor está muito tenso!
— Não estou com fome, Letícia...
Eu o interrompo:
— Nada disso, Kevin! Você almoçará comigo e a Lorena. Temos seus dois assistentes de
olho naquilo e, se algo der errado, eles nos procurarão. Você já deveria ter aprendido que comigo
as coisas são assim, nada passa em branco. Cada detalhe, cada nuance, está conferido.
— Em todas as edições, tivemos problemas ou imprevistos e esse está tudo... – ele arruma
o terno, tentando recuperar sua compostura. — Certo. Vivemos em um momento em que nada é um
mar de rosas, daí, quando algo vai bem, temos a tendência de procurar algo de errado só para
complicá-las. Enquanto vocês se sentam, vou ao banheiro.
Kevin retira-se e fico prestando atenção em Lorena. Hoje, ela está mais distraída do que de
costume.
— Lorena?
— Sim? – ela olha-me arregalada.
Analiso-a de cima a baixo e os olhos brilhantes entregam a boneca. Estreito meus olhos e a
questiono:
— Qual é o nome do boy?
— Não sei do que você está falando, Letícia.
Isso é o que falamos quando queremos ganhar mais tempo para pensar em uma boa
desculpa.
— Nomes, Lorena.
— Promete não ficar brava comigo? – Ela junta as mãos como se fosse rezar e faz aquela
carinha de cachorro perdido. — Por favorzinho?
— Prometo tentar não surtar.
— Ethan!
Eu deveria ter imaginado. Sorrio e aceno. Se eu abrir minha boca, sairá o que não deve. Ela
merece curtir e ter um cara que a faça bem. Mas tinha que ser logo o Ethan prostituto Scott? Neste
momento, Kevin volta à mesa e fazemos nossos pedidos enquanto passa os últimos detalhes para
nós.
— Sábado pela manhã, embarcaremos para Fortaleza. Na segunda-feira, teremos um
almoço com a Presidente em Brasília e, depois, retornaremos ao Rio. Se algum deles se interessar
pelos projetos, terça-feira voltaremos às negociações.
— Só uma coisa, Kevin. Eu não precisarei ir nesse tour, não é? – nem mesmo os olhos
suplicantes de Lorena fariam eu embarcar com eles.
— Não. Assim vocês podem descansar – ele responde.
— Obrigada, senhor Cooper – Lolo agradece, atirando punhais em mim.
O almoço só não foi mais tranquilo porque o Kevin não parava de balançar a perna, isso
estava me irritando. Mas meus pensamentos estavam voltados a Lorena e Ethan, eu me preocupo
com ela e, levando em consideração como ele é, não sei se será uma boa ideia. Deus a proteja de
qualquer mal.
— Antes que eu me esqueça, Letícia. Reservei um quarto para vocês descasarem. Se
quiserem passar a noite durante esses dias, fiquem à vontade.
Por essa eu não esperava.
— Obrigada, Kevin – agradeço com carinho, por se preocupar com o nosso bem-estar.
 
O momento da abertura de A Vitrine estava perto. É algo pequeno, mas se tratando de quem
são os nossos convidados, o peso da responsabilidade aumenta. Arrumo as pastas, confiro os
equipamentos e respiro fundo algumas vezes para manter-me superficialmente tranquila. Olho em
volta e vejo a grandiosidade do que estou prestes a fazer. Esse é um grande passo para o meu
sucesso ou para a minha decadência.
O salão Azul foi uma excelente escolha para esse evento. As mesas e cadeiras formam um
grande “U” em torno do ambiente. As janelas amplas com cortinas impecáveis preenchem todo o
espaço com luz natural, tornando-o perfeito para a apresentação. Todo o lugar foi arrumado para
tornar as horas mais confortáveis. O hotel teve o cuidado de arrumar uma parte com cafés, sucos e
frutas. O acesso à sacada do hotel proporciona aos participantes um espaço para apreciar a
deslumbrante vista da praia.
O primeiro convidado a chegar é o grego Sebastian Khristophoros. Ele é muito mais bonito
pessoalmente do que pela foto. Bem vestido, com calça cinza e camisa branca moldando seu corpo.
Moreno bronzeado com feições fortes, queixo quadrado, boca bem desenhada, olhos castanhos-
esverdeados, cabelos negros e lisos, no ponto certo para ser puxado. Kevin o recebe e, quando ele
volta sua atenção a mim, qualquer pensamento profissional foge. Acho que até babei.
— Seja bem-vindo, senhor Khristophoros.
Os gregos e sua mania de cumprimentar com beijos no rosto. Não acho ruim. Nem um
pouco!
— Obrigado, senhorita?
— Letícia Sophie Barros.
Seu sorriso encantador é lisonjeiro.
— Sophie é o nome da minha segunda filha. Difícil esquecer. – Lorena o acompanha até a
cadeira de sua escolha e o acomoda no primeiro assento.
Logo entra o sheik Hassan Mohamed Aziz Bashir, e ele não é como na foto. Pessoalmente,
ele é mais elegante, até bonito se olhar de perto. Ele aproxima-se com seu nariz empinado e pura
falta de sutileza. Suas vestes são o que me chamam a atenção, o vestido branco, kandurah, traje de
costume em seu país, e, em sua cabeça, o gutra. Seu cumprimento se resume apenas a um aceno de
cabeça e a Lolo também o acompanha até o seu lugar.
O próximo a entrar é o Ethan. Com o seu habitual bom humor, chega dando-me um beijo norosto.
— Boa tarde, senhorita Letícia.
— Boa tarde, senhor Scott. Sinta-se à vontade.
Ele passa seu braço pela cintura da minha amiga, que está com um sorriso enorme, e vão em
direção à cadeira de escolha dele. E Deus a ajude a se conter e não sentar no colo dela na frente
dos outros.
— Boa tarde, signorina.
Volto minha atenção para o dono da voz, o italiano Martino Nicolazzi Rossi. Elegante em
seu terno Armani preto, ele curva-se em deferência a mim. Olhos claros, nariz avantajado, parecido
com um jogador de futebol, o Buffon. Ele é um homem não muito bonito, mas ele compensa com
aquele charme que só os italianos têm.
— Boa tarde, Signori Rossi – enrolo com o meu portunhol italianado. Sou excelente em
inglês e péssima em alguns outros idiomas. — Seja bem-vindo. Lorena o acompanhará até um
assento.
— Gracie, signorina.
Eu reconheceria o irlandês que está a minha frente em qualquer lugar. Ele é um dos homens
mais bonitos que já vi. Porte inglês, olhos verde-claros, cabelos loiros levemente avermelhados e
pele claríssima. Por debaixo daquela camisa branca justa, deve ter um corpo escultural e sua
elegância não passa despercebida. Sem pensar, adianto-me e estendo-lhe a mão.
— Boa tarde, senhor Larkin. Seja bem-vindo a Vitrine!
Elegantemente, ele a toma e a beija.
— É um prazer estar aqui. E, por favor, chame-me de Liam.
Eu aceno em sinal de respeito e faço questão de acompanhá-lo até a terceira cadeira lateral,
à esquerda de quem apresentará. 
— Qualquer coisa que precise, basta chamar a Lorena – aponto para a Lolo. — E ela se
encarregará de obter o que necessitar.
Os assessores e assistentes dos empresários foram tomando seus lugares nos assentos em
volta do grande “U” que os principais convidados formavam.
— Espero que eu também tenha o prazer de ser escoltado pela senhorita Letícia até o meu
assento.
Não pode ser...
 
CAPÍTULO 7
 
Letícia
Ainda estática, sinto o calor tomar conta do meu corpo e a minha pele queimar. Sua voz
reverbera o desejo em mim. Será que agora o bastardo me seguirá para se vingar? Meu Deus! E se
ele for um perseguidor ou um serial killer? Viro-me o mais devagar possível.
— Desculpe-me, senhor, mas essa é uma reunião privada. Somente para convi...
— Senhor Zachary Thorton O´Brian, como está? – Lorena corta a minha frente na tentativa
de corrigir meu deslize. Ela aponta para mim. — Essa é a anfitriã dessa edição, Le...
— Letícia. Eu sei – ele termina a fala dela.
Não! Não! Não! Por favor, Deus. Não faça isso comigo. Muda, chocada, de boca aberta,
pasma, descrente e todos os outros adjetivos cabíveis e possíveis aqui são citados em minha
cabeça, que está girando. Perco-me em sua boca deliciosa, que continua a se movimentar, fazendo
com que eu o deseje ainda mais. Esforço-me para ouvi-lo:
— Então, Letícia, acompanha-me?
Claro que sim! Não! Não quero nada com esse... esse... Urgh!
— Lorena o fará, senhor O´Brian. Com licença.
Viro-me e caminho em direção a minha mesa arrumada. Preparo-me para começar a
apresentação, mesmo sentindo minhas pernas tremerem e borboletas esvoaçarem em minha barriga.
Kevin coloca-se ao meu lado e inicia a reunião.
— Sejam bem-vindos à sexta edição da Vitrine. Fico honrado por terem aceitado nosso
convite para estarem presentes. Espero que os projetos apresentados alcancem o gosto de alguns e,
assim, poderemos concretizar fortes parcerias. Deixo vocês com a competente Letícia Barros, a
anfitriã do evento.
Em meio aos aplausos, tomo meu lugar e começo minha jornada.
— Obrigada, senhor Cooper. Boa tarde a todos. É um prazer tê-los aqui...
— O prazer é todo nosso, signorina – o italiano com um sorriso galante fala.
O infeliz do Zachary Olhos-Azuis sentou-se em frente a mim, em linha reta. Deus, agora sou
eu que preciso da sua proteção. Como posso me concentrar em frente a um loiro, alto, com olhos
azuis intensos e detestavelmente lindo? Seus cabelos, compridos e bem cortados, vão até abaixo
do ombro. A barba por fazer contorna aquela boca que, com toda certeza, foi desenhada para o
pecado. Lábios finos repuxados em um sorriso de canto fazem minha calcinha umedecer.
Ele tira seu terno e a sua assistente pega-o prontamente. Sem tirar seus olhos dos meus, ele
dobra as mangas. Pacientemente, abre mais um botão da camisa e recosta-se na cadeira com aquele
sorriso sarcástico nos lábios.
— Gostou, senhorita Letícia?
Só então dou-me conta de que assisti ao seu showzinho de boca aberta. Balanço a cabeça
para desanuviar e começo meu discurso:
— À frente de vocês há uma pasta para que acompanhem as apresentações. Quaisquer
dúvidas que possam ter, estejam à vontade para perguntar, a qualquer momento.
Olhar diretamente nos olhos das pessoas é um ponto a favor de quem está negociando, isso
mostra força e determinação. Tento olhar para cada um e, como a mulher forte que sou, desvio o
meu olhar de Zachary bravamente. Aquele olhar hipnótico confunde-me. Faço um sinal para ligarem
o retroprojetor.
— Nosso primeiro projeto é uma empresa de software. Dois jovens trabalham duro
desenvolvendo aplicativos que facilitam a comunicação dentro das empresas. Eles adaptam a
funcionalidade de cada unidade e tipo de serviços de acordo com cada empreendimento. Senhores,
seria algo simplório se os smartphones não fossem um dos equipamentos mais vendidos no mundo.
Sua facilidade de transporte... – alcanço o meu celular e o coloco na palma da minha mão. — E o
poder de levar seu mundo na mão. A vantagem? – dou um sorriso de gato cheshire. — As
mensagens e os e-mails chegarão aos seus funcionários, mesmo que eles estejam off-line.
Foram quatro horas seguidas e três projetos transmitidos. Cada detalhe esboçado e
explicado. Perguntas foram feitas e respondidas com sucesso. Discussões de como tornar os
projetos ainda melhores e novas ideias florescendo. Até aqui, tudo foi absolutamente perfeito!
Agora é hora de dar um tempo para respirar e descansar. Pego um copo de suco e vou para a
sacada para ver a praia.
A minha frente, muitas pessoas estavam caminhando pelo calçadão e tantas outras dentro do
mar, banhando-se para espantar o calor. Essa cidade é linda, tanto de dia quanto à noite, e o som do
mar é calmante para os mais tensos. Movimento meu pescoço em círculos para aliviar a tensão em
meus músculos quando ouço alguém:
— Uma massagem pode ser uma boa saída agora.
Olho para ver o irlandês gato escorar-se no parapeito da sacada. É impossível não sorrir
para ele, Liam é diferente, emana paz.
— Não seria nada mal – respondo com simpatia.
— Você foi muito bem, Letícia. Admito ter pensado que o Cooper estava se arriscando
colocando-a em frente a seis homens intimidadores. Mas foi um deleite ver sua imposição perante o
Bashir, respondeu a cada pergunta sem gaguejar. A hora que você falou sobre o aplicativo para
organizar as visitas das esposas, não pude me conter. Ri muito.
Entrego o copo a um dos garçons e peço outro suco.
— Ele se mostrou difícil o tempo inteiro, já estava ficando impossível continuar.
Ele se aproxima e seu braço encosta no meu.
— Você é muito persuasiva, Letícia. A autoridade nata em sua voz e o modo como está
regendo a reunião faz de você perfeita para o posto.
— Obrigada, senhor Larkin.
— Chame-me de Liam – nossos olhos se encontram e gosto do que eles transmitem. — Sem
querer ser inconveniente, gostaria de jantar comigo essa noite, Letícia?
— Não, Larkin. Ela não gostaria! – Zachary entrega-me um copo. — Seu suco, senhorita
Barros – ele volta-se para Liam. — A agenda da nossa executiva prodígio está lotada. Não é
mesmo, Letícia?
Viro metade da bebida para aplacar a sede repentina.
— Minha agenda estava cheia para você, senhor O´Brian. Será um prazer jantar com você,
Liam.
Kevin aparece na sacada e tira-me do sufoco.
— Encerraremos por hoje, Letícia. Amanhã retornaremos a partir das dez da manhã. E mais
uma coisa, parabéns! Você foi magnífica.
Aceno para ele com sincera gratidão.
— Obrigada, senhor Cooper.
Saio para encontrar Lolo e a encontro de conversa com Ethan.
— Você me empresta ela, Ethan? Obrigada– puxo-a dali antes que ele tivesse tempo para
alguma reação.
— Agora que o papo estava ficando quente, Lê! Isso não é justo.
Faço uma careta e ela volta a olhá-lo.
— Foco, Lorena! Preciso de um favor.
— Meus ouvidos são todos seus, Lê... – ela fala com interesse.
— O senhor Larkin me convidou para jantar essa noite. Eu não ia aceitar, mas Zachary
apareceu e acabei aceitando.
— Zachary. Sei... – ela me olha com um sorriso debochado.
— Mui amiga, senhorita Lorena. Poderia correr no meu apartamento e pegar algumas roupas
para mim? Eu deixei um conjunto branco em cima da cama, tenho quase certeza que deixei peças
íntimas que combinem com a roupa no mesmo lugar. O meu nécessaire está no banheiro. Tudo o que
eu preciso para higiene, está dentro. E não esqueça do meu perfume, aquele do vidro rosa em
formato de flor. Ah, traga um pijama, por favor.
— Vou num pé e volto no outro, Lê.
— Obrigada!
Lorena passa por Ethan, que a segura. Ela fala algo e ambos olham-me, sorrindo, e Ethan
faz sinal de positivo. O que aquela garota falou para ele?
* * *
— Nossa mesa está pronta, Letícia – Liam estende seu braço para mim, que aceito com
prazer. — Vamos?
Examino o salão para ver se tudo está em ordem. Quase todos os convidados já se
recolheram aos seus quartos, menos Zachary e Ethan, lógico! Estão confabulando a morte de alguém
em algum canto. Alguns dos assistentes estavam organizando as coisas para a reunião de amanhã e
o lindo irlandês esperando-me para jantar.
Fomos até um dos melhores restaurantes da cidade, que fica no próprio hotel. Nos levaram
até uma mesa de canto, onde poderíamos ter um pouco de privacidade. Liam é um cavalheiro, seu
sorriso aquece meu coração.
— Fico feliz que tenha aceitado meu convite, Letícia. Fiquei encantado com seus olhos. Em
alguns momentos, parece amarelado, como olhos de gato.
— Obrigada. Assim você deixa-me pouco à vontade, Liam. Eu não gosto de misturar
negócios com prazer – já ouvi isso em algum lugar.
— Não pude deixar de perceber que seu inglês é perfeito. E, pelo modo com que fala,
deduzo que já morou nos Estados Unidos – ele segura meu olhar.
— Fiz um curso de relações internacionais durante três meses lá. Os melhores meses da
minha vida! E, desde então, sempre que tenho férias é para lá que vou.
Meu sonho era conhecer Nova York, andar pela Quinta Avenida e trabalhar na Wall Street.
Para mim, Letícia, esse é o ápice que um executivo pode alcançar: Ser bem-sucedido na capital do
mundo.
Há alguns anos, fiz inscrição para um curso de extensão em Harvard, sem pretensão alguma.
Na verdade, na minha pobre concepção, era só pelo prazer de tentar. Por esse motivo, fiquei uma
semana com um sorriso bobo no rosto. Então, em um belo dia, recebi uma carta de uma das
instituições de ensino mais importantes do mundo, informando-me que fui aceita para fazer o curso
de relações internacionais. Eu não tinha palavras naquele momento, só pensei em meus pais e como
eles estariam orgulhosos de mim.
Naquele dia, fui até o Kevin decidida a pedir demissão para fazer o curso. Eu iria para os
Estados Unidos de qualquer maneira. Mas ele surpreendeu-me, não somente me apoiou como exigiu
que eu me hospedasse em seu apartamento. Era um belíssimo apartamento e muito bem localizado.
Lorena embarcou comigo nessa jornada estudantil, aprimoramos nosso inglês, até porque saímos
daqui só sabendo o básico para comer, egg, milk, water, bacon e bread. De fome ninguém
morreria. Bons tempos, bons contatos e ótimos passeios. Jurei a mim mesma que um dia moraria lá
e estou no caminho de adquirir meu primeiro imóvel em Nova York, em frente ao Central Park.
Com a crise, os valores dos imóveis despencaram e Kevin acredita que está na hora de se
desfazer do apartamento. Venho planejando uma oferta há algum tempo e logo a farei. Nesse meio
tempo, também descobri que adoro a bolsa de valores. Aprendi como jogar e não é que deu certo?!
É meu passatempo preferido. Ninguém sabe que tenho um bom dinheiro, nem mesmo a Lolo. Mas
posso me dar o luxo de fazer o que bem entender na vida.
Sou sozinha, não sei se terei a oportunidade de ter filhos. E, quando chegar minha hora de
partir dessa vida, terei a certeza de que aproveitei tudo o que pude. Tudo bem que, se o Kevin me
vender o apartamento, serei pobre novamente. Mas uma pobre em Nova York, meu bem!
O garçom se aproxima e tira-me do devaneio. Fazemos nossos pedidos e ele se retira. De
repente, o clima do ambiente muda. O restaurante fica em silêncio, menos algumas meninas com
suas risadinhas. Alguma coisa faz com que eu olhe para minha esquerda, avistando Zachary muito
próximo de sua assistente. Aliás, até onde pude perceber, é a única mulher entre os quatro homens
em sua delegação.
Olhando-o de longe, viajo pelo seu corpo, analisando o homem. Zachary não é um tipo
comum, os traços delicados de seu rosto contrastam com a força de seu maxilar anguloso. Seu olhar
é intenso e profundo, do tipo que você afoga-se nele. E sua boa... bem... sua boca é... – passo a
língua umedecendo meus lábios que desejam os dele. — Os seus lábios finos o deixam ainda mais
poderoso.
— Pelo jeito, Zach está aproveitando a viagem – Liam fala e eu coro de vergonha por ter
sido pega olhando para quem não deveria.
— O hotel é lindo e a cidade é maravilhosa. Seria um pecado vir ao Rio de Janeiro e não
aproveitar. Não é? – falo com o meu melhor sorriso.
— Vocês se conhecem há quanto tempo? – de onde ele tirou essa pergunta?
Sem jeito, respondo:
— O conheci hoje.
— Interessante. Tive a impressão de que se conheciam há mais tempo.
Aonde o irlandês gostoso quer chegar? Arrumo-me na cadeira e cruzo minhas mãos no colo.
— Todos são cheios de impressões descabidas, Liam. Não permita-se ser levado por elas –
falo em um tom imparcial.
— Talvez – Liam olha além de mim e fala: — Toda mulher sensata sabe que deve ficar
longe de Zachary O´Brian. Ele não se importa de passar por cima de tudo e de todos para
conseguir o que deseja. Ele é um bom colega, mas, no que se refere às mulheres e aos negócios, ele
é implacável. Mas há algo que eu gostaria de saber.
— O quê? – pergunto, inocente.
— Por que ele não tira os olhos de você? – Liam fala, olhando para mim.
— Porque sou a hostess mais sexy que já tiveram ou talvez seja apenas o fato de um
milionário como você jantar com uma pobre mortal como eu – meu coração bate um pouco mais
forte do que o normal. E controlo-me ao máximo para não certificar que Liam esteja falando a
verdade. Liam solta uma risada deliciosa.
— Você é mortal, sim – ele pisca para mim, levando-me a sorrir também.
Paramos em frente aos elevadores após o delicioso jantar. Assim que as portas se abrem,
Lolo sai apressadamente.
— Já ia te procurar, Lê. Suas coisas estão na suíte e aqui está chave –ela dá-me um abraço
e sai. — Desculpa, mas tenho um compromisso.
Não deu tempo nem de agradecê-la. Estranho. Algumas pessoas entraram conosco no
elevador, o que o deixou superlotado. Liam fica ao meu lado, um pouco mais a frente. Mas quem se
colocou atrás de mim ficou além do limite da proximidade. Não precisei olhar para quem era, eu já
sabia, reconheceria esse perfume em qualquer lugar. E os arrepios do meu corpo são atribuídos
somente a ele. Passo a mão pelo pescoço por causa do desconforto. Fecho meus olhos e tento não
respirar.
— Espero que o casal tenha tido um bom jantar.
O tom grave de sua voz reverbera pelo meu corpo, fazendo os cabelos da minha nuca se
arrepiarem.
— Nosso jantar foi excelente, Zach. E, pelo visto, o seu também – Liam responde.
— O meu foi prazeroso, sim, Larkin – o idiota está sorrindo?
O elevador para em meu andar e saio sem dizer uma palavra a ninguém. Assim que as
portas fecham, solto minha respiração, que nem tinha percebido que estava segurando. Corro para a
segurança da suíte e tranco-me. Preciso tomar um banho para relaxar e pensar. Já deitada, peço
para a recepção passar a ligação para o quarto do Liam. Foi deselegante da minha parte fugir
daquela maneira. Ele merecia uma explicação.
— Suíte do senhor, Larkin – um homem atende.— Boa noite. Sou a Letícia Barros e gostaria de saber se o Liam se encontra.
— Boa noite, senhorita Barros. Neste momento, ele está em videoconferência. Gostaria de
deixar recado?
— Só liguei para desejar-lhe boa noite. Obrigada.
Viro-me para o lado e fecho os olhos na intenção de dormir, o que demora a acontecer, e
aquele espetáculo de homem de olhos azuis figura o palco do meu sonho, fazendo-me despertar
ofegante. Eu não sei como isso é possível e não faço a menor ideia do que está acontecendo
comigo. Mas de uma coisa eu tenho absoluta certeza, tenho que me afastar de Zachary Thorton O
´Brian.
 
CAPÍTULO 8
 
Zachary
— Você tanto babou que a garota fugiu – falo para Larkin assim que as portas do elevador
fecham.
— Se é nisso que quer acreditar. Eu apostaria que você a assustou – ele fala.
— Duvido muito. Só assusto as mulheres quando tiro a calça, antes disso, sem chance.
Fomos obrigados a rir. Somos infantis, sabemos disso.
— Parece que você está interessado nela. Acertei, Zachary? Se for, ouça meu conselho, não
alimente esperanças quanto a isso. Ela será minha! – Larkin fala, convicto.
Não me contenho e dou risada.
— Ah, Larkin. Essa sua confiança o deixa mais interessante. Mas, se eu a quiser, não há um
homem na face da Terra que me impedirá de tê-la.
Despedimo-nos como os cavalheiros que somos e cada um vai para sua suíte. Corajoso da
parte dele me enfrentar por causa de uma mulher. Quem diria que o casto irlandês se interessaria
por alguém a ponto de entrar em uma disputa? O único problema é que não haverá disputas, eu a
quero e ele não terá a menor chance.
A dor de cabeça que senti essa manhã foi pior do que as dores causadas pelas ressacas após
as festas do Ethan. Entro no quarto e troco de roupa rapidamente. Desço para a piscina com Lennon
no meu encalço. Entro na água e faço minhas voltas até a exaustão. Indo diretamente para o quarto,
tomo um banho e caio na cama, morto para o mundo.
Na madrugada, sinto alguém se esgueirando ao meu lado. A pele macia que envolve-me é de
mulher. Letícia.... Busco-a com prazer. Eu a desejo descontroladamente. Meu corpo desperta com a
possibilidade de saboreá-la por inteiro. Sinto sua boca passear pelo meu pescoço e descer para o
meu peito. Céus! Ela está deixando-me louco. Viro-nos para colocá-la sob mim e encontro o rosto
da minha assistente.
— Maggie?
Saio da cama como se estivesse pegando fogo. Acendo a luz e vejo que ela está nua. Puta
que pariu!
— O que... O que... Caralho, Mag! Eu quase a fodi... – viro o rosto para não vê-la daquela
maneira. — Vista sua roupa. Eu vou esperá-la na sala.
Como durmo só de boxer, pego o roupão e saio. O que essa maluca fez? Merda! Eu quase
transei com a minha assistente achando que era a porra da Letícia, que agora não sai da porra da
minha cabeça. Sirvo-me de uma dose tripla de whisky. Mag sai do quarto e vai em direção à porta.
— Onde pensa que vai? – rosno para ela. — Senta sua bunda agora nesse sofá para
conversarmos – ela senta e continuo: — Enlouqueceu, Maggie? Onde estava a merda da sua cabeça
quando fez isso? Meu Deus! Você é minha assistente, te considero como minha irmã mais nova,
mulher.
Ela balança a cabeça em negativa.
— Não quero ser sua...
— CALA A BOCA! – respiro fundo para controlar a raiva. — Não quero ouvir mais uma
palavra sobre isso. Porque, se continuar a falar, terei que demiti-la e eu não quero isso – ando de
um lado para outro e sirvo-me de mais uma dose. Vou até a janela e contemplo o mar. — Não faça
mais isso. Na próxima vez, não serei complacente. Você, mais do que ninguém, sabe que eu não
costumo ser bom com ninguém, muito menos dou segunda chance para quem quer que seja. Vamos
esquecer que isso aconteceu...
King apareceu do nada, armado.
— Todo mundo parado!
Pronto, o mundo enlouqueceu!
Maggie pula em seu assento, gritando assustada. E eu fico parado, assistindo a cena. Meus
funcionários são surreais. Uma tenta atacar-me sexualmente enquanto durmo e o outro aparece de
cueca, com uma arma em punho. Esfrego a minha testa enquanto Lennon e outros seguranças entram
para o circo.
— Onde estão suas roupas, King? – falo exasperado.
— Ouvi seu grito, Zach. E você está preocupado com a minha roupa?
— Mag entrou em meu quarto sem permissão. Perdi a paciência e acabei falando mais alto
do que deveria.
Rezei para ele entender sem precisar entrar em detalhes. King vira-se para ela.
— Mag, Mag... O que faremos com você?
A garota estava abrindo a boca para discutir, mas estou cansado.
— Estão dispensados, podem voltar para os seus quartos. Só mais uma coisa, de hoje em
diante, batam antes de entrar na porra do meu quarto.
Ouço a porta bater atrás de mim e me acalmo. Abro as portas que dão para a varanda e
sento-me para ouvir o som do mar. Eu deveria fazer isso mais vezes, é tranquilizador. Tenho casas
em quase todas as partes do mundo, mas não tenho uma à beira mar. Comprar uma no Brasil pode
ser um bom negócio. Vou pedir a Joe para ver isso.
Um perfume conhecido volta a minha lembrança. Letícia...
A ideia de senti-la não sai da minha cabeça. Aquele corpo quente sob o meu, suas mãos
macias acariciando-me enquanto suas unhas arranham minhas costas e eu dentro de sua boceta. Seus
gemidos devem soar como música lírica ao pé do ouvido. Letícia... Letícia.... Repito seu nome
várias vezes, como se, em um passe de mágica, ela pudesse materializar-se aqui para o meu deleite.
Há quanto tempo não vejo o nascer do sol? Há muito tempo não faço isso! A melancolia
toma conta e, nesse momento, somente nesse momento, desejo ter alguém aqui para dividir esse
espetáculo da natureza comigo. Raras vezes a solidão visita-me e, quando o faz, aperta sem
compaixão.
Batidas na porta interrompem minha apreciação. Antes mesmo de poder sair de onde estou,
King abre a porta, olha-me com curiosidade e acena, dando espaço para que um funcionário do
hotel passe com um carrinho de café. Levanto-me e vou em busca do meu computador enquanto
preparam meu desjejum. Volto para a sala e sento-me para comer.
Tomando meu café tranquilamente, lendo as notícias, um sentimento inesperado apodera-se
de mim. Enquanto meu computador inicia, a ideia de manter vigilância sobre Letícia parece cada
vez mais... certa? Não sei, será que é o meu instinto de proteção? Da onde isso saiu, não faço ideia,
mas ela ter alguém olhando-a por mim, informando-me cada passo seu, faz-me sentir melhor.
Aliviado, talvez.
Volto minha atenção ao meu amigo.
— Acompanhe-me, King – aponto para a cadeira a minha frente e sorrio ao vê-lo sentar
estreitando seus olhos em minha direção.
— O que se passa, Zachary? – ele pergunta desconfiado.
— Quero que você selecione o melhor segurança que está trabalhando para o Kevin na
Vitrine e o contrate para acompanhar a Letícia de longe. Ele terá que passar relatórios diários para
mim e me informar cada passo dela.
— Cara... não precisa ser muito inteligente para perceber que você e Larkin estão
interessados nela. Só que disputar mulheres nunca foi seu modus operandi. E ele chegou primeiro,
Zach.
Encaro-o e ele continua:
— Você é meu amigo e é meu dever como chefe da sua segurança, alertar que isso é bizarro.
Ter alguém vigiando uma mulher que você nem aos mesmo conhece? É loucura! – ele respira fundo
como se estivesse levando o mundo nas costas. — Isso é só pela disputa?
Olho para o mar.
— Pode ser que seja por uma disputa de ego. Desde que coloquei meus olhos sobre ela, eu
a quis. Ela desperta algo estranho em mim. Seja o que isso for, quero alguém com ela a todo
momento, e informando cada passo dado.
— Tudo bem. Será feito conforme sua vontade, chefe!
Faço uma careta.
— Não gosto quando fala assim, com veneno escorrendo pela palavra chefe. Obrigado,
King – como de costume, batemos nossos antebraços.
Logo, Maggie bate na porta e entra, anunciando que estamos em cima da hora para a reunião
dessa manhã. Termino de me arrumar e desço para juntar-me aos outros e prosseguir com as
apresentações. Encontro Lorena aflita e Kevin ansioso na entrada da sala de conferência que foidestinada ao evento. Estudo a menina que Ethan está tentando conquistar e pergunto:
— Algum problema?
Ela acena com a cabeça.
— Nada de importante, senhor O´Brian. Só estamos ansiosos à espera da Letícia.
Dou-me conta do horário e vejo que a hostess realmente está um pouco atrasada. Mas nada
fora do normal. Será que é somente isso? Não querendo pressioná-la, assinto e vou em direção a
cadeira que ocupei ontem. Cumprimento os outros e tomo meu lugar. Assim que Maggie coloca a
pasta a minha frente, Letícia entra na sala apressadamente, pronta para iniciar os trabalhos:
— Bom dia, senhores. Espero que a noite de vocês tenha sido boa. Tenho...
Antes que ela pudesse prosseguir, Ethan fala:
— Eu tive uma noite maravilhosa – ele se recosta na cadeira e cruza as pernas, olha para a
amiga da Letícia e pisca. Deixando bem claro o motivo de sua divertida noite. — Mas pelo jeito
você não, Letícia.
Ela dá um meio sorriso e continua sua apresentação. Sinto que está tensa ou talvez esteja só
cansada. Ainda assim, a visão da mulher a minha frente é deslumbrante. Meus olhos passeiam pelo
seu corpo elegantemente vestido, fazendo-me desejar rasgar cada peça e fodê-la sobre essa mesa.
Meu pau endurece na expectativa de tê-la sentada em meu colo. Tento concentrar-me.
— Tenho mais dois projetos para apresentar. Peço que as perguntas sejam feitas após a
apresentação de cada projeto.
O primeiro foi apresentado e discutido em duas horas. E pego-me surpreendido pela sua
desenvoltura. Letícia contorna situações conflituosas de uma maneira tranquila, como se tivesse
nascido para comandar um exército de poderosos. E cara, isso me deixou ainda mais duro! Um
importante debate foi feito em torno disso. Com firmeza, a mulher apresentou a ideia que acalmou a
animosidade entre alguns. Ao invés de apenas um deles investir, poderiam fechar uma parceria
satisfatória.
O segundo projeto era ainda melhor. Talvez venha a ser o melhor de A Vitrine. Letícia pede
para o seu assistente exiba as imagens do lugar onde pretende executar o projeto.
— Essa é uma das paisagens mais lindas que já vi e acredito que vocês também... –
concordamos e ela continua: — Esse lugar é no Nordeste brasileiro. Como podem perceber, é
ermo. Nessa região moram apenas cento e poucas pessoas, não mais que isso. Um empresário
espanhol descobriu a localização, comprou parte das terras, tirou licenças para construir um
luxuoso resort. Infelizmente, a crise que assolou parte da zona do Euro o pegou desprevenido. Ele
procurou-me algum tempo atrás pedindo que o auxiliasse nessa negociação. Isso, senhores – ela
aponta para a imagem na tela. — E uma oportunidade única. Nessa parte, pode-se construir um
hotel e nessa parte de trás, pode ser feito um grandioso condomínio de luxo para férias. Um paraíso
com acesso exclusivo para aqueles que estão dispostos a pagar qualquer valor para ter férias
extraordinárias. Uma casa como se fossem a sua, desfrutando de toda tecnologia de ponta
disponível. E o principal, sem fotógrafos, sem mídia, sem nenhum inconveniente que possa
perturbá-los. A mil e quinhentos metros da costa, há um banco de areia, lugar ideal para um bar
exclusivo.
Ela discorre sobre o projeto por mais vinte minutos, apresentando cada detalhe e vantagens
que teríamos. Só que para a execução do projeto, Letícia incluiu algumas exigências como, a
manutenção da escola local e que os restaurantes que servirão o complexo, seja exclusivamente dos
nativos.
— O projeto é magnífico. Mas paraísos como este, temos em várias partes do mundo. Por
que investiríamos nesse? – Sebastian Khristophoros pergunta.
Letícia responde sem titubear.
— Porque o Brasil pode oferecer uma coisa que os outros não, o clima e a baixa
probabilidade de catástrofes naturais.
Ela correu seu olhar por todos os homens desviando de mim. E tomou o nosso silêncio
como desinteresse. Nervosamente, ela organiza seus papéis de cabeça baixa. Letícia não percebeu
que sua resposta nos pegou de surpresa, tenho certeza que nenhum dos outros jamais pensou nisso.
Quando a realização de uma grande oportunidade foi reconhecida por nós, cães farejadores de
dinheiro, discutimos com nossos assistentes financeiros as probabilidades e riscos.
Foi difícil concentrar-me no que ela falava sem imaginar o que aquela boca pode fazer. E
no meio da discussão tive uma ideia que a deixará furiosa. Levanto para esticar-me e aproveito
para falar:
— Eu tenho duas perguntas, senhorita Letícia. A primeira é, se eu embarcar nesse projeto,
que não é pequeno, você será responsável por ele? – antes que ela fale, a paro: — Só mais uma
pergunta. Todos nós teremos uma hora em sua companhia, ou isso é um privilégio de poucos?
Porque Larkin teve duas horas com você no jantar de ontem e Ethan teve mais tempo na noite
anterior.
A cara dela era hilária. Escoro-me na mesa e cruzo os braços. Ela estreita seu olhar em
minha direção, e a linha fina que seus lábios se tornaram, indicam sua irritação. Quando ela fala,
sua voz é suave, mas firme.
— Sobre a primeira pergunta, senhor O´Brian, se caso contratarem a Global para
intermediar suas negociações, pode ser que o senhor Cooper coloque-me frente a isso. Sobre a
segunda pergunta, podemos resolver esse impasse indo almoçar todos juntos ago...
— Não! – o italiano a corta: —Eu não quero dividir meu horário com mais ninguém.
Os outros concordam com ele e fazem algumas observações. Eu não as ouço porque estou
planejando como vou matar Zachary, que está me olhando com deboche. Kevin vem até mim e
começa a falar, mas Zachary toma a frente.
Os homens começam em uma discussão acalorada e Letícia olha para o Cooper pedindo
socorro. O salão virou um circo com todos falando ao mesmo tempo. Vou até o centro da sala e
mando calarem a boca:
— Silêncio! Algum assistente anota isso. Vamos começar pelo almoço de daqui a pouco
com o Rossi. Bashir ficará com o jantar dessa noite. O almoço de amanhã será com o Sebastian e o
jantar comigo.
Exasperada, Letícia tenta dissuadir-nos:
— Vocês embarcarão para o Ceará hoje no final da tarde. Eu não irei. Não está nos planos a
minha ida com vocês nessa viagem.
— E? – Sebastian pergunta.
— Não está nos planos a minha ida com vocês nessa viagem.
— Então refaça seus planos Cooper, porque ela vai! – Martino fala de seu lugar.
Enquanto Letícia planeja meu assassinato encarando-me para deixar-me ciente disso, sorrio
em júbilo. Bashir levanta-se e fala antes de sair:
— Se a menina tocar esse projeto, eu embarco. E se os outros tiverem interesse também, os
convido para demandar sobre essa ideia mais tarde.
Ela ainda está de boca aberta olhando para o Kevin, que está informando o horário da
viagem. Ainda sorrindo, chamo-a:
— Letícia – seu nome é doce em minha boca e o olhar dela é mortal. — Se eu fosse você
doçura, não perdia tempo conversando. Você tem um almoço daqui a pouco e malas para arrumar.
Rindo, saio em companhia de Ethan.
— Ela vai querer sua cabeça.
— Tenho uma coisa melhor para ela – falo ainda sorrindo.
— Ela vai te matar, cara! Por que fez isso?
Olho-o sério.
— Porque eu quero transar com ela. Vamos para o bar beber alguma coisa, só vou dar uma
palavra com o King.
Em alguns passos alcanço meu chefe de segurança e o abordo:
— Conseguiu o que pedi?
— Tudo conforme o combinado. Contratei o melhor e o instruí.
Aceno e vou para o bar do hotel. Ethan está sentado em uma das mesas de canto com a sua
boneca no colo. Logo que ela me vê, fica sem jeito e tenta sair do colo dele que a impede
apertando-a em seus braços.
— Por favor, Ethan, deixe-me ir. Se alguém nos ver assim, posso ser demitida – ela fala
olhando para mim, temerosa.
Beijo sua face em sinal de amizade. Ethan e eu somos amigos há muitos anos, se ele está
assim com ela, nada mais normal que ela seja minha amiga também. E um dia, ela poderá ser útil
para que eu possa chegar à sua amiga.
— Fique em paz, little doll. Ninguém está aqui para atrapalhar.
— Muito bem, senhor O´Brian...
Eu a corrijo:
— Zach, por favor. Chame-me apenas por Zach – dou um empurrão no ombro do meuamigo
e pergunto a ela: — Ethan tem se comportado como um cavalheiro com você? Caso não esteja, é só
me chamar e mando King dar um jeito.
Ele bufa.
— Se o King me der um tapa na cara com aquela mão, apaixono-me e fico sem nenhum
dente na boca – ele acaricia a perna dela. — Estou cuidando muito bem dela, não é baby? Ontem
até passeamos na praia.
Agora é minha vez de ficar com a boca aberta. Observo-o como se tivesse crescido uma
segunda cabeça nele. Quem diria, Ethan Scott, um dos maiores playboys dos Estados Unidos,
passeando na praia.
— Vou procurar a Lê que a essa altura deve estar querendo socar alguém – ela olha para
mim. Acho que eu sou o “alguém”.
— Por falar nisso, little doll, quando chegarmos ao nosso destino, precisamos conversar
sobre ela e seus gostos. Quero surpreendê-la.
Lorena levanta-se e coloca suas mãos na cintura, adotando uma posição de desafio.
— Responda-me, Zach, você não vai se encontrar com ela só para irritá-la, não é? Porque
se for, peço que não o faça. Ela já passou por muitos momentos difíceis na vida, não precisa
adicionar mais feridas.
Coloco a mão sobre o meu coração, parecendo solene.
— Fica tranquila, serei um cavalheiro – quando tiver aquela mulher sob mim, cavalheiro
será a última coisa que serei. Eu não sei que feitiço a Letícia jogou sobre mim, mas cada vez que
estamos no mesmo lugar, posso sentir sua presença e fico faminto por ela.
Lorena assente e sai em busca da sua amiga.
— Acho que estou apaixonado por essa mulher – Ethan desabafa.
— Você já tinha me chocado com o passeio sob a luz do luar, agora estou ficando
preocupado. Acho que o sol desse lugar fritou seu cérebro – zombo.
— Ela é meio doidinha, mas muito carinhosa, me faz rir a todo momento e não pede nada
em troca, apenas prazer.
— Tudo bem. Só lembre-se que, você partirá em breve e ela vai ficar. Então, não faça
promessas levianas para depois deixá-la para trás arrasada.
— Estou pensando em esticar minha estadia e até alugar um imóvel. Por falar em imóvel,
gostei desse último projeto, se alguém mais entrar embarco nessa.
— Estou pensando seriamente em entrar nisso – ainda mais se a adorável hostess tocar o
projeto. A ideia de estender a estadia no Brasil não é uma má ideia. Eu poderia comprar uma casa
aqui e vir de vez em quando para recarregar as baterias. E quem sabe ver ela...
— Zach?
—Sim – respondo para E. que me olhava sério.
— Pelo jeito não ouviu o que falei.
— Estava pensando em ter uma casa aqui no Rio de Janeiro, para descansar. Talvez eu peça
para alguém ver isso.
Dez minutos depois, despedimo-nos e fui em direção aos elevadores. No caminho, passei
pelo restaurante e o segurança estava lá atento. Impulsionado pela curiosidade, fui até a porta olhar
Letícia e o Rossi que estavam conversando amigavelmente. Minha vontade é ir lá e acabar com o
sorriso dele, mas a ideia foi minha e por um momento, arrependo-me dessa babaquice. Minha
cabeça está estourando, preciso descansar um pouco para viajar.
Tiro a roupa e vou para o banho e a água fria alivia a enxaqueca. Enquanto me ensaboo,
Letícia nua surge em meus pensamentos. Fecho os olhos e imagino-me deslizar minhas mãos pelo
seu corpo, amaciando seus seios fartos e sem perda de tempo, toco-me até gozar como um
adolescente. Inferno! Eu preciso experimentá-la, saber qual é o seu gosto, ouvir seus gemidos. Saio
do banheiro direto para a cama e com Letícia em meus pensamentos, adormeço como há muito
tempo não havia feito.
 
CAPÍTULO 9
 
Zachary
Acordo com Mag passando a mão no meu peito e, por algum motivo, estou descoberto, o
que só complica as coisas, pois eu estava nu e de pau duro. Pau que ela provavelmente deve ter
molestado. Sem dizer nenhuma palavra, levanto e vou para o banheiro, antes de abrir a porta do
inferno e jogá-la lá. Quando volto ao quarto após minha higiene e alguma roupa, confronto minha
assistente:
— Por que caralho dos infernos você não bate na porta, Mag? E que porra é essa de me
tocar?
Ela responde como se eu não tivesse acabado de chamar sua atenção. Definitivamente, as
mulheres são loucas!
— Faltam menos de vinte minutos para sairmos do hotel, bati várias vezes, mas você não
atendeu. Fiquei preocupada e entrei.
Não vale a pena discutir
— Já acordei. Você está dispensada.
— Preciso arrumar suas coisas, senhor.
— Enquanto me visto, procure o King e mande-o vir aqui.
As coisas foram tumultuadas, pois acordei atrasado. Os outros também desceram atrasados
e o sheik estava reclamando como uma mulherzinha. Por fim, cada um foi em um carro para o
aeroporto. Procurei Letícia para oferecer-lhe carona, mas não a encontrei. Como de costume, dividi
o carro com Ethan.
— Poderíamos ter falado para o Liam vir conosco, já que os assistentes foram em outro
carro – E. fala.
— Nada de Larkin. Ele está me irritando.
Ethan ri da minha irritação.
— Por que isso? Sempre foram bons amigos.
Não estou a fim de falar que aquele idiota vermelho está tentando levar a mulher que quero
para a cama antes de mim. Só de pensar, meu sangue já ferve.
— Onde está a Lorena? – pergunto.
— Letícia queria ir com os assistentes e a levou junto.
Logo que chegamos ao aeroporto, fomos levados direto à aeronave. Toda a primeira classe
foi reservada para os convidados e o serviço de bordo é excelente. As aeromoças são lindas e,
com certeza, foram escolhidas a dedo para esse voo. Um sorriso se abre no meu rosto quando o
pensamento de que Letícia está incomodada comigo preenche meu pensamento. A assistente de
bordo loira traz-me uma bebida e curva-se de modo que seus seios ficam à mostra para mim. Pisco
em um flerte descarado em agradecimento.
Depois daquele descanso, minha enxaqueca desapareceu, possibilitando trabalhar enquanto
voamos. Quando estava absorto em um relatório, uma das assistentes de Ethan entrega-me uma lista
de imóveis à venda no Rio de Janeiro. Ele realmente está levando isso a sério. Deixo tudo de lado
e levanto-me para ir ao banheiro. Na entrada, um segurança do Ethan barra-me. Era só o que estava
me faltando.
— Algum problema sério deve ter acontecido para o seu chefe interditar todos os banheiros
da primeira classe?
Sem jeito, ele responde:
— Nada grave, senhor. Só não estão disponíveis.
O cara está se superando com essa história de paixão. Tenho certeza que ele está comendo a
Lorena aí dentro. Porra, E.! Encaminho-me para o banheiro da classe executiva e, na saída, esbarro
em Letícia, que corre seus olhos pelo meu corpo. Ela pode não admitir, mas, cada vez que me vê,
algo acontece com ela. É possível perceber, pois sua respiração muda.
— O que houve com o banheiro da realeza? Deixe-me adivinhar, o ego de alguém caiu e
acabou entupindo tudo.
Não me contenho e dou risada.
— Ethan monopolizou tudo por lá.
Ela entra e eu a aguardo encostado na parede. Serei a primeira coisa que verá quando sair.
Assim que sai, ela concentra-se em minha boca, com desejo estampado em seus olhos. Como já
falei, sei o efeito que tenho sobre as mulheres. Passo a língua pelos meus lábios, umedecendo-os, e
lhe dou meu melhor sorriso de predador. Aquele de canto, que promete um inferno de prazer.
Ela está ofegante quando me aproximo. Passo a mão pelos seus cabelos e falo em seu
ouvido:
— Fico feliz que tenha gostado, senhorita Barros.
Letícia olha-me ainda atordoada.
— Gostado do quê? – pergunta confusa.
Ela é linda! Seus olhos são piscinas que nos tragam e sua pele é um convite para o pecado.
Nesse momento, percebo que darei qualquer coisa para tê-la. Viro-me para voltar ao meu assento e,
antes de sair do seu campo de visão, falo por cima do meu ombro:
— Espero que tenha gostado da parte de trás também.
Sento-me novamente e volto a trabalhar. Tento me concentrar, mas a imagem daquele rosto
não sai da minha cabeça. Gostei de saber que ela me acha atraente, isso vai tornar sua ida para
minha cama mais fácil.
Horas depois, desembarcamos em Fortaleza, no estado do Ceará, sob um sol escaldante e
fomos para o hotel. Por todo o caminho, pude ver o quão bela é a cidade. Assim que chegamos ao
nosso destino, pensoseriamente em ir direto ao mar, mas Mag lembra-me que temos algumas coisas
da empresa para resolver. Ted também já está a postos para trabalhar enquanto King se
responsabiliza pelo resto.
Devidamente instalado na suíte, minha equipe e eu nos envolvemos com os assuntos que
temos que resolver com urgência.
— Os balanços da fábrica em Kentucky não estão batendo – entrego os papéis para Joe. —
Descubra onde erraram e diga-lhes que não tolero esse tipo de erro.
— Sim, senhor – ele faz anotações.
— Senhor, quer que eu reserve uma mesa para nós no restaurante ou quer que mande servir
aqui na suíte? – Mag pergunta.
— Nem uma coisa, nem outra. Assim que eu estiver com fome, pedirei qualquer coisa –
gosto de passar um tempo com eles, mas, depois dos últimos acontecimentos, prefiro evitar.
— Sim, senhor.
— Mag, tenho um serviço para você – digo. — Ethan me passou essa relação de imóveis e
quero que você faça uma pesquisa na internet sobre eles. Veja se algum deles já tiveram
acontecimentos que me impeçam de fazer uma oferta.
— Ok! – ela alcança a lista e sai.
Depois de trabalhar exaustivamente, tomo banho para relaxar e coloco uma roupa fresca.
Voltando para sala onde todos continuam a trabalhar, observo King atender seu celular e falar em
um idioma indecifrável. Assim que desliga, olha-me e fala:
— Areia, praia, Larkin.
PORRA, RUIVO DOS INFERNOS!
Onde aquele inútil árabe está? Ela deveria estar almoçando com ele. Saio correndo,
planejando como enterrarei aquele filho da puta na areia e o deixarei lá para secar. Esse irlandês
quer realmente entrar nessa disputa comigo? Então, vamos brincar. Comigo a brincadeira é de
cachorro grande. Não tenho medo de duendes que moram em potes de ouro. Pego o ouro e prendo o
duende no pote.
Olho para todos os lados para ver onde estão, até que Lennon aponta um casal muito
próximo. NÃO! Apresso o passo e, quando me aproximo, percebo que o corpo dela enrijece. Será
que ele falou alguma coisa ofensiva a ela? Se for, amasso o duende agora mesmo. Aproximo-me
mais, a tempo de vê-lo levantar o rosto dela, pronto para dar o bote.
Isso acontecerá quando o inferno congelar!
— Espero não estar atrapalhando – falo com sarcasmo.
Larkin volta-se para mim irritado e ela levanta seus lindos olhos até os meus.
— Não está atrapalhando, senhor O´Brian. Se me derem licença, vou para o meu quarto,
preciso descansar.
E, mais uma vez, ela foge. 
— Satisfeito, Zach? – o idiota pergunta. — Ela está longe de mim o suficiente? Esse
número de mágica, em que você aparece e desaparece onde ela e eu estamos juntos, está ficando
cansativo.
Dou risada.
— Larkin, Larkin... por que não aceita que ela será minha primeiro?
Ele sorri desdenhoso.
— Por muito pouco você não testemunhou um beijo.
— Vai sonhando – viro-me para voltar ao hotel. — Já jantou?
— Ainda não – ele responde.
O que há de mal em chamar um oponente para jantar? Nada.
— Vamos comer – digo cansado.
— Isso não passa de um jogo para você, não é, Zachary? – ele pergunta assim que se junta a
mim.
Encaro-o na intenção de dizer que sim, mas minha língua fica presa não querendo admitir o
que pode ser.
— Talvez. Vamos jantar.
Encontramos Sebastian sentado à mesa.
— Sentem comigo, é ruim comer sozinho. Contem-me, o que estão achando sobre a viagem.
— Melhor impossível – Larkin responde.
— Perseguindo a hostess, só pode estar bom mesmo – falo.
Enquanto jantávamos, Ethan aparece com Martino.
— Estamos indo conhecer uma boate, estão a fim?
— Estou dentro! – Sebastian se manifesta.
— Eu vou, mas só depois de jantar – respondo.
— Eu passo – Larkin responde.
— Deixa de ser velho, Larkin – Ethan o provoca. — Minha equipe já esteve no local e
disse que é seguro.
Dirigimo-nos ao local, que já estava lotado, e a música rolava. Assim que entramos, fomos
escoltados até a ala VIP, bebidas e mulheres já estavam a postos. As garotas eram muito bonitas e
excessivamente prestativas, se falássemos para ficar de joelhos naquele momento, não tenho
dúvidas que o fariam.
Larkin e eu passamos boa parte do tempo olhando o movimento. Martino dançava com duas,
Sebastian estava atracado com uma mulher que mais parecia um homem e Ethan, o responsável que
nos arrastou até aqui, não saia do celular.
— Cadê a boneca? – pergunto.
— Nós brigamos e ela saiu com a Letícia – seu tom de voz é amargo.
— O que houve? – pergunto.
— Eu avisei que ela estava indo para Nova York comigo e a mulher surtou – o cara
enlouqueceu. E seus olhos indicam um grau alto de embriaguez.
— Falando assim, eu também não iria. E., mulheres são seres complicados, do tipo que
você tem que conquistar, e não impor. Por que simplesmente não a convidou para passar as férias
ou visitá-lo sempre que quiser? – aconselho-o.
— Porque a quero comigo todo o tempo.
— Você realmente está gostando dela, não é?
— Estou gostando mais do que deveria – ele passa a mão pelo cabelo. — Eu sei que tudo é
muito rápido, só que eu a quero pra caralho.
Coloco a mão em seu ombro.
— Então, faça ela sentir vontade de estar com você e não imponha suas vontades. Coloque
as dela acima das suas, mesmo que você seja um bastardo egoísta. Agora vamos voltar para o
hotel, eu estou cansado.
No caminho de volta, penso no que Ethan falou. Eu não acho possível gostar tanto de uma
pessoa em tão pouco tempo. Para mim, não é sentimento, é apenas interesse, o que, por sinal, move
o mundo. Mas o fato dela não querer se jogar de cabeça nessa loucura a faz ganhar uns pontos no
meu conceito.
Lembro-me das poucas informações que tenho da Letícia, a morte dos seus pais, o fato de
estar sempre sozinha e, o principal, por que o seu único relacionamento não deu certo. Não
costumo me enganar no julgamento de caráter das pessoas, e os olhos dela são cheios de
sinceridade. O problema é que não confio em ninguém quando se trata de amor e dinheiro.
Ninguém...
* * *
Passei a noite em claro, virando de um lado para outro e com uma dor de cabeça lancinante.
Quando voltar a Nova York, vou ao médico novamente, ele tem que dar um jeito nisso ou receitar
um remédio que não me deixe atordoado quando acordo. Minha suíte está silenciosa, todos devem
estar dormindo ainda. Levanto, visto minha sunga e vou caminhar na praia, dar um mergulho e,
quem sabe, na volta posso cochilar.
No meu caminho para a praia, algumas meninas param-me para fotografar, falando sem
parar, e eu não entendi absolutamente nada! A única coisa que senti foi uma mão boba na minha
bunda. Essa linguagem é universal. Sorrio e continuo meu caminho.
Enquanto ando pela orla, esvazio minha cabeça e bloqueio meus pensamentos. Respiro
fundo, faço alguns exercícios de alongamento e isso faz com que eu me sinta um pouco relaxado. Na
volta, mergulho e dou algumas braçadas mar adentro. As águas são calmas e quentes, a paisagem é
estonteante, e a soma dos fatores tem poder calmante.
Saindo do mar, tenho a sensação de ser observado. Olhando para os lados, encontro a atual
mulher dos meus sonhos me admirando. Letícia está sentada em uma cadeira de praia, com um
biquíni branco moldando os seios, como se fossem mãos. Um movimento atrás dela chama minha
atenção, Ethan pega um rapaz pelo pescoço. Merda! Ele vai matá-lo. Corro e tiro Ethan da garganta
do rapaz antes que aconteça algo pior.
— Por que esse verme estava com as mãos sobre você, Lorena? – E. praticamente cospe o
nome dela.
— Ele estava apenas passando protetor em minhas costas. E você, Ethan? Onde se meteu
sem dar notícias até agora?
Lorena responde aos berros, atraindo a atenção de todos a nossa volta. Pacientemente,
Letícia intervém:
— Jônatas é um cavalheiro, jamais se aproveitaria dela. Lolo, por que você e Ethan não vão
conversar no quarto?
Se fosse a minha mulher, o rapaz, mesmo com indicação luminosa de que não gosta da
mesma fruta que eu, teria o mesmo destino. Solto meu amigo, que leva Lorena pelo braço para
dentro. Letícia dá folga para o rapaz se recuperar do trauma de quase ser morto.
Tenho vontade de rir quando ele despe-me com os olhos e para no meu pau, e a Letícia
falando como se eleestivesse com medo de mim. Tento me controlar ao máximo para não gargalhar.
Será que ela não percebeu o arco-íris nos olhos dele? Enquanto ela o acalma, deito em sua
espreguiçadeira e coloco seus óculos escuros. Assim que o assistente se vai, puxo-a para perto de
mim.
— Divida a cadeira comigo.
Surpreendo-me quando ela sentou ao meu lado sem contrariar ou fugir. E o arrepio em sua
pele quando se recostou em mim não passou despercebido. Aceno para um garçom e peço duas
águas de coco. Ela se acomoda em mim e pergunta:
— O que deu em Ethan? Nunca o vi assim.
— Ciúmes. Se não fosse por isso, ele teria percebido que o menino é gay.
Ela olha-me de boca aberta. Acaricio seu lábio inferior.
— Jônatas não é gay! – ela rebate.
O garçom traz nosso pedido e passo um para ela. Nesse calor, ela precisa se hidratar.
Gostei de tê-la perto, sua pele quente na minha.
— Falta muito tempo para o seu próximo compromisso? – arrependo-me no segundo em que
pergunto.
— Por falar em compromisso, por que você fez isso, senhor O´Brian?
— Chame-me por Zach. Fiz o quê, Letícia?
— Você me ofereceu para os tubarões de bandeja. Foi por vingança?
Essa mulher não sabe o que causa nas pessoas, não é? Endireito-me e tiro os óculos para
ficar olho no olho com ela.
— Não foi por vingança, apenas... – faço uma pausa para escolher as palavras. — Era a
única maneira de fazer você se encontrar comigo sem fugir, para me desculpar pelo nosso primeiro
encontro.
Ficamos encarando-nos por algum tempo. Seus sentimentos e perguntas estão ali, desfilando
naquele olhar. Por um instante, desejei acreditar que existe destino, que existe o amor. Ela pega
seus óculos e levanta-se.
— Preciso ir. Tenho um almoço com Khristophoros. Obrigada pelo coco.
Uma força me atrai a ela, é como se existisse um campo magnético entre nós, onde os
opostos se atraem. Falo em seu ouvido e a beijo sob sua orelha.
— Estou ansioso para te encontrar mais tarde, senhorita Letícia.
Ela se vai sem olhar para trás. Sua saída de banho transparente me propicia a visão do
paraíso, uma cintura fina, quadril largo e uma bunda perfeita. Vou dar mais um mergulho para
esfriar, não é elegante sair por aí de pau duro para todo mundo ver.
Volto para minha suíte, abro a porta e vejo que estão trabalhando. Dispenso-os, dizendo que
quero dormir e entro no banheiro para tomar banho e me masturbar imaginando Letícia tocando-me.
Saio do banheiro e caio na cama em um sono profundo.
 
CAPÍTULO 10
 
Zachary
Desperto momentos depois com Mag sobre mim novamente.
— Que inferno, Mag? – ela se afasta.
— Ligaram da suíte do Sheik Bashir, solicitando sua presença para uma reunião – sua voz é
baixa.
— Que horas são? – pergunto. Ela olha em seu telefone. — São dezenove horas e dez
minutos.
Caralho! Dormi a tarde toda.
— Diga-lhes que não irei porque tenho um compromisso.
Viro-me para o outro lado, mas a mulher não desiste.
— Senhor, eu sei que tem grande interesse no projeto do resort. Não é melhor cancelar seu
compromisso com a senhorita Barros? Ela pode vê-lo em outro momento, já a oportunidade de
negócio pode aparecer uma vez só.
Mag sempre foi uma assistente excepcional, de uns dias para cá tem passado do limite.
Sento-me e a olho.
— Bom. Quem manda?
Ela troca de pé, sinal de incômodo.
— O senhor...
— Já que deixamos isso bem claro, vou fazer a gentileza de repetir. Diga que tenho um
compromisso e não vou encontrá-los – mesmo nervosa, a garota continua parada. — Vou dar-lhe
cinco segundos para virar as costas e sair, senhorita Carlson. Se não o fizer, será demitida
imediatamente.
Agora ela entendeu o recado. Levanto e arrumo-me para sair. Assim que saio do quarto,
encontro toda a corja de investidores ali, sentados em minha sala de estar.
— O que vocês estão fazendo aqui? – falo rispidamente.
— Menino Zachary, achamos melhor vir até você para conversarmos sobre o projeto, que é
algo importante. Se não resolvermos isso hoje, com certeza, outros virão.
Chamo Mag.
— Quero que envie um grande buquê de rosas para a senhorita Letícia, as mais bonitas que
encontrar. Escreverei um cartão para enviar junto – aceno para o velho. — Pode começar, sheik.
Ele aspira no narguilé.
— Tenho certeza que vocês viram o potencial daquele projeto. Quero saber se mais alguém
está interessado em entrar nesse negócio comigo. É um projeto audacioso, construir uma
minicidade e conseguir que ela fique longe do conhecimento das pessoas não é algo simples.
— Eu estou dentro! – Ethan fala. — Poderíamos solicitar uma visita ao local, deve ser por
aqui.
— Boa ideia – Sebastian diz.
Ficamos discutindo por mais de duas horas. Cooper foi chamado para organizar uma
excursão até o local e logo saiu para acertar os detalhes. Segundo ele, não é muito longe daqui,
talvez uns dez ou quinze minutos de helicóptero. Quando sobrevoarmos o local, teremos a real
dimensão da área. Então, poderemos ter noção do que estamos adquirindo e projetar a viabilidade.
Faço uma proposta:
— Poderíamos formar uma companhia e, se esse empreendimento for um sucesso como
prevemos, poderemos abrir mais em outros lugares do mundo. Mantemos Letícia e um de nós como
as cabeças do projeto e outro de nós assina pelo grupo.
Nesse meio tempo, foi servido um jantar enquanto discutíamos os detalhes da nossa futura
organização. Apesar da adrenalina de dar vida a algo novo, o que me fez ansioso foi a expectativa
de estar com a Letícia.
— Sabe alguma coisa dela? – pergunto a King.
— Sim, senhor. Ela saiu com a menina do senhor Scott. Estão em um restaurante no centro
da cidade.
— Acho sensato que o Zachary tome a frente do grupo – o sheik Bashir fala.
Deus! Não quero mais compromisso.
— Fico lisonjeado, mas não quero mais um compromisso desse porte. Eu voto no Larkin.
Ele é arquiteto, poderá liderar e até fazer os projetos.
Ethan se levanta e vai até um dos seus seguranças. Alguma coisa está se passando, sua testa
franzida diz que algo está errado.
— Eu voto no Zach – E. fala. — Porque, de todos nós, sem dúvida nenhuma, ele é o melhor
empreendedor. Estamos falando de uma construção gigantesca e sabemos que pode sair do controle
orçamentário com qualquer deslize.
Todos concordam, mas ninguém perguntou o que acho. Ethan senta ao meu lado, chateado.
— Alguma coisa de errado? – pergunto e ele faz uma careta.
— Não. É só que não encontraram a Lorena no hotel.
— Formaremos o grupo para construção desse empreendimento, tendo como presidente o
Zachary O´Brian, a menina Letícia como diretora geral e o Liam Larkin como responsável pela
execução – Bashir faz um resumo do nosso acerto. — Todos concordam?
Todos concordaram e volto-me para Ethan.
— Ela está com a Letícia, foram jantar em um restaurante no centro da cidade.
— Como sabe disso? – ele questiona.
— Tenho alguém de olho em Letícia.
— Está de olho em quem? – Sebastian se aproxima, atravessando a conversa.
— Letícia – Ethan responde.
— Todos nós estamos de olho na Letícia – Sebastian sorri, e eu não estou gostando do rumo
dessa conversa.
— Se contente com a sua esposa, Sebastian. Letícia é minha! – Larkin aparece.
— Tenho pena dos cavalheiros, a mulher está rendida aos encantos desse italiano.
— Vocês são completamente loucos – Ethan tem uma crise de riso. — Por que não apostam?
Seria hilário ver a disputa.
Eu estava rindo até perceber que todo mundo se calou. Ficamos uns olhando para os outros
por alguns instantes.
— Aposta feita! – Sebastian é o primeiro a falar. — Porque eu terei a mulher na minha
cama em breve.
— Aposto dois milhões de dólares que levarei a menina para cama – sheik se mete.
Larkin se levanta e se serve com whisky.
— Vocês são insanos. Estou fora e não vou permitir que leiloem Letícia – ele diz.
— Eu estou dentro! – pode ser uma boa ideia.
Ethan levanta e se coloca no meio da sala.
— Senhores, vamos organizar. Quem participará? – Sebastian, Martino, o Sheik e eu
levantamos as mãos. — Vamos fazer uma aposta de gente grande.
— Antes de qualquer coisa, peço que todos os funcionários saiam da sala, permanecendo
somente os chefes dasegurança de cada um – Ethan toma a palavra novamente: — Vamos fazer
disso um jogo de cachorro grande. Dos seis que estão aqui, somente quatro participarão
diretamente da disputa. Caberá a cada um o valor de dois milhões e quinhentos mil dólares. Aquele
que a comer primeiro leva os dez milhões.
— Vamos tornar isso mais interessante. Só levará o montante, se o resto de nós assistir o
ato – Sebastian se levanta.
— Fechado! – digo.
Esse tipo de jogo é comum para nós. Nunca disputamos uma mulher, mas já fiz por coisas
banais e tenho certeza que todos que estão aqui já participaram de alguma coisa parecida. Não
somos santos e gostamos de mulheres. A Letícia é o troféu que todos nós queremos levar para
cama.
— Eu quero assistir e mais, para tudo isso dar certo, Larkin tem que participar, senão ele
estragará tudo, contando a ela – Ethan fala.
Olhamos todos na direção de Liam Larkin, que estava escorado na janela, bebendo.
— Eu não vou participar e também não vou permitir...
— Não falei? – Ethan interrompe.
O sheik se aproxima dele.
— Você vai participar por bem ou por mal, irlandês. Caso você dê para trás, serei o
primeiro a contar a ela que essa ideia partiu da sua pessoa.
— O caralho que vai, seu velho doente! Por que está participando, Bashir? Acha que tem
chance contra esses homens? Se enxerga! – Larkin fala furiosamente.
— Posso não ser bonito como você, mas sou rico. Posso dar o que ela quiser em ouro e,
como sabemos, todo mundo tem um preço – o sheik olha para nós. — Em quem a menina acreditará,
em um irlandês que está nitidamente interessado nela ou nos outros cinco empresários e suas
idoneidades? Pensa bem, Larkin. Talvez seja mais sensato participar da brincadeira.
— Quem guardará a quantia? – Martino pergunta.
— Poderíamos abrir uma conta. Ethan ou Liam ficam como responsáveis pela transferência
assim que o jogo for finalizado – eu respondo.
O sheik, ainda desconfiado de Larkin, aponta para ele.
— Larkin fica como responsável pela conta. Mais um motivo para ele ficar de boca
fechada.
— Então, será um milhão de quem assistir e dois milhões de quem participar, de acordo? –
Ethan fala novamente. Todos assentem e ele aponta para os seguranças de cada empresário. —
Vocês são nossas testemunhas. Alguém pode me dizer a hora?
— Meia noite e dez.
— Então, Zachary, Martino, Sebastian e Bashir participarão da disputa e repassarão o valor
de dois milhões de dólares para a conta estipulada. Liam e eu apenas assistiremos e repassaremos
o valor de um milhão de dólares para a mesma conta. O primeiro que levar a Letícia Sophie Barros
para cama e consumar o ato levará o montante de dez milhões de dólares. E os outros cinco
assistirão o ato sendo consumado, confirmando a vitória. Assim que acontecer, Liam Larkin fará a
transferência do valor para o ganhador. Vamos às regras. Senhores, façam uma disputa limpa, nada
de atropelar ou sabotar as ideias do outro. Estão livres para conquistar seu tempo com ela, mas é
terminantemente proibido forçá-la a fazer qualquer coisa que ela não queira. O tempo será
indeterminado, mas, por favor, não estendam nossa angústia. No caso de algum de vocês a
maltratarem física ou emocionalmente, me encarregarei de acertar as contas pessoalmente. Tenham
isso sempre em mente!
Larkin joga seu copo na parede, pegando todo mundo de surpresa.
— Não acredito que estão me obrigando a participar desse negócio sujo! Vocês são um
bando de filhos da puta sem alma. Se aquela mulher descobrir essa imundície, nunca mais olhará na
minha cara ou pior, poderá destruir cada um de nós por vingança.
Sou obrigado a rir do seu jeito de bom moço.
— Calma, Larkin. Quando ela estiver em meus braços, relaxada depois dos orgasmos que
darei a ela, faço questão de fazer propaganda da sua pessoa como bom partido – todos riem, menos
ele.
— Bastardo idiota. Espero você morra!
— Se tudo o que tínhamos que acertar já foi feito, me deem licença que quero descansar –
dispenso-os.
Depois que todos deixam meu apartamento, chamo meus assistentes para uma conferência.
Passo instruções sobre o voo ao local do projeto e tudo o que quero que façam para tornar meu
encontro com a Letícia perfeito. Após dispensá-los, deito-me na rede da sacada para contemplar a
lua em sua majestade. O céu estrelado, a brisa da noite e o som do mar acalmando-me. E, com
Letícia nos meus pensamentos, adormeço.
* * *
Acordei bem-disposto depois de uma noite tranquila. O sol lá em cima, indicando que o dia
será tão pleno quanto ele.
Sento-me na sala para tomar café, faço um lanche leve e King me escolta até o lugar da
decolagem. Todos já estavam em seus assentos. O piloto estava afivelando o cinto da Letícia, muito
próximo a ela. O único assento disponível é ao lado dela e vou de muito bom grado. 
— Bom dia, senhorita Letícia.
— Bom dia, senhor O´Bri... – arqueio a sobrancelha e ela corrige-se. — Bom dia, Zach.
Como foi sua noite?
— Foi boa, mas poderia ter sido melhor – aproximo-me dela. — Foi boa, porque dormi
com você em meus pensamentos. Poderia ter disso melhor se você estivesse lá comigo.
Sinto seu estremecer e seguro sua mão, apertando-a. Os motores são ligados e começamos
nossa viagem de reconhecimento de campo. Depois de algum tempo, ela nos aponta onde começam
as terras que vamos comprar, também aponta outras que devemos negociar para ampliar o resort.
Há uma encosta muito bonita.
O voo durou menos de duas horas e, em todo tempo, sua mão estava na minha. Ficamos
mais interessados depois de vermos o lugar, é simplesmente fantástico! Desembarcamos e fomos
direto ao apartamento do sheik, prontos para acertar os detalhes e contar a ela da formação do
consórcio.
Ansioso para sair daqui de uma vez com ela, inicio a conversa:
— Como todos ficaram interessados no projeto, resolvemos formar um grupo construtor,
encabeçado por mim, que serei responsável por tudo. Larkin será responsável pela execução dos
projetos e você, Letícia, será nossa porta voz e, claro, tão responsável pela execução quanto
qualquer outro – ela balança a cabeça. — Antes que você pense em negar, é bom que saiba que só
faremos se você estiver à frente. Cooper já foi informado e concordou com todos os termos.
— Aceito, com uma condição: que grande parte da mão de obra seja do povo que mora
aqui. Nem que para isso tenhamos que abrir turmas de formação e especialização. Não quero que
simplesmente cheguem lá, tomem conta de tudo e pronto. Temos que trabalhar em unidade. É isso
ou nada feito!
— Não esperaria menos de você, mademoiselle – Larkin a elogia. — Todos estão de
acordo com seus termos.
Interrompo o momento enjoativo:
— Vou mandar o meu jurídico elaborar a documentação e será enviada para que cada um
possa analisar e fazer as alterações desejadas. Bom, acho que por hoje é só.
Conduzo Letícia até a varanda, para termos privacidade.
— Está pronta para passar o resto do dia comigo? – ela olha-me perdida em pensamentos.
Isso não parece bom. — Letícia?
Ela sorri timidamente.
— Desculpe-me. Eu quero passar o dia com você, só não sei se é uma boa ideia.
— Ei. Olhe para mim... – emolduro aquele rosto perfeito com minhas mãos. — Estou
ansioso por esse encontro, garanto a você que é o certo. Confie em mim.
— Eu confio – seu sorriso toca-me em um lugar desconhecido dentro de mim.
Lennon nos conduz até um buggy e leva-nos a um lugar incrível, todo arborizado. Uma tenda
é montada na areia branca e uma mesa bem colocada está a nossa disposição.á Tudo impecável.
— Promete não fugir de mim, baby? Porque eu realmente desejo estar com você – falo
enquanto acaricio seu rosto.
— Eu prometo.
Não resisto e dou um beijo no canto da sua boca. Um pequeno gemido sai de seus lábios e
meu corpo fica insuportavelmente excitado. Se ela soubesse os pensamentos sujos que tenho
conosco, manteria distância de mim.
A tenda é coberta por um tecido leve, esvoaçante, uma mesa enfeitada com flores e com
duas cadeiras ao centro compõem o ambiente. À esquerda colocaram tapetes com almofadas; logo à
frente, um aparador com a refeição. Puxo a cadeira para Letíciae me sento a sua frente, King
aparece, nos servindo com água e vinho branco. Ela abre um lindo sorriso para ele.
— Obrigada, senhor Kingston.
— King, seu criado – faz tempo que não vejo King sorrir, posso ver daqui todos os seus
sessenta dentes. Exagero? Não, nunca vi tantos dentes em uma boca só.
— Ótimo, King. Deixe a garrafa e nos dê licença – antes que esse sorriso desça ao coração
dele, dispenso-o.
—Você tem que ser grosseiro o tempo todo? – ela pergunta e eu dou de ombros.
— Eu nunca vi King sorrir daquela maneira para ninguém. Se eu permitisse, ele puxaria
uma cadeira e eu serviria a mesa – ela ri. E eu continuo: — Queria desculpar-me pelo nosso
primeiro encontro. É que Ethan já nos fez passar por momentos constrangedores com suas
acompanhantes. Mas, em momento algum, quis ofendê-la.
— Já passou, Zach.
— Desculpa-me? – insisto.
— Se é tão importante que eu o desculpe, considere-se perdoado.
Ela olha com admiração King servir-nos e algo aperta em mim.
— Estou impressionada, King. Está muito bonito.
Entre comidas e conversas, descobri que Letícia tem um senso de humor incrível. Contou-
me sobre sua vida, mas deixou de fora o único relacionamento que teve. Falou sobre a sua entrada
na Global, sobre a amizade e gratidão a Lorena e sua mãe, que a acolheram mesmo sem a conhecer.
Fiquei impressionado com sua ascensão profissional e triste por saber que está todo esse tempo
sozinha.
A sobremesa é o ponto alto da refeição, a hora que ela vê o que é, bate palmas e sorri como
uma menina. Eu adoro vê-la assim, sem barreiras, sem mistérios, apenas uma menina que ama doce.
Eu a levo pela mão e a ajudo a sentar-se no ambiente que montaram para o nosso descanso. Pego
um morango recheado com creme de avelã e coberto com chantilly e levo até seus lábios, que
fecham em meus dedos, e um tremor de excitação percorre meu corpo.
Deveria ser pecado comer dessa maneira. Quando uma gota de chocolate cai entre seus
seios, minha língua coça para limpá-la, é difícil controlar, mas como sou um gentleman, a limpo
com um guardanapo.
— Por que você sempre foge de mim, Letícia?
Ela olha para o mar por alguns minutos.
— Parece que o campo gravitacional ao seu redor, absorve-me. E isso é assustador! Não o
conheço, nunca o vi, mas há algo em você que faz parecer que já o conheço há muito tempo. Parece
loucura...
— Olhe para mim, Letícia.
Puxo-a para deitar-se em meu braço. Mal sabe ela que por algum motivo, sinto-me da
mesma maneira. O cenário é perfeito. Deitados em uma praia deserta, onde mini tochas foram
acesas, tornando o ambiente digno de filmes. Minha mão acariciando seu rosto sob aquele céu
estrelado. Tudo parece certo.
Sinto sua respiração acelerada, em seus olhos posso ver que ela está faminta, tanto quanto
eu. Em um impulso, tomo sua boca em um beijo desesperado, e ela responde prontamente. Quanto
mais a beijava, mais queria dela. Por um nano segundo, desejei tudo, seu corpo, seu coração e sua
alma. Mas sou um cara muito racional para esse tipo de sentimentalismo, preferindo seu corpo e
seus desejos. Há muito tempo uma mulher não desperta essa fome em mim.
— Temos um problema, senhor! — Mag...
Eu vou matar a Mag! Caralho, ela é minha assistente, ela sabe que nesses momentos eu não
estou para nada, todos estão proibidos de me atrapalhar. Tem que me ajudar nesse negócio, merda.
Viro, atirando punhais com meu olhar.
— Espero que o motivo que a trouxe aqui seja caso de vida ou morte.
Letícia tenta sair dos meus braços, eu a seguro, mas seu olhar implora e a solto. Ela
levanta-se e vai até a mesa onde há água e serve-se. Volto minha atenção a minha assistente.
— Estou esperando, senhorita Carlson.
Ela está visivelmente nervosa.
— Uma ligação da matriz, houve uma explosão na Script ś Factoring...
Ah, infernos! Levanto-me rápido, pego Letícia pela mão, Mag e King vem no meu encalço e
nos conduzem até o hotel. Assim que chegamos ao hotel, a levo até sua suíte.
— Desculpe-me, anjo. Eu não esperava um problema dessa gravidade. Provavelmente
embarcarei logo para os Estados Unidos, para ver os estragos de perto. Se não nos virmos mais,
saiba que adorei o nosso encontro e tentarei entrar em contato em breve.
— Não se preocupe, Zach. Eu entendo perfeitamente.
Perco-me em seus lábios, tomando-os nos meus. Pressiono-a contra a parede, querendo
sentir cada polegada de seu corpo quente. Alguém limpa a garganta e dou-me conta de que estamos
no corredor. Eu não sabia o que dizer naquele momento, apenas beijei sua testa e fui para a minha
suíte. Por motivos desconhecidos, odiei deixá-la para trás.
Assim que entro em meu quarto, Ted já está com o computador pronto para o meu uso. Faço
uma vídeochamada para a fábrica e Noah Austin, o diretor-chefe, me atende.
— Boa noite, senhor Thorton.
— Noah, seja direto. Alguém se feriu? Qual foi a proporção da explosão? Houve mortos?
A expressão de seu rosto é confusa.
— Acredito que as informações não chegaram corretamente até o senhor. Tivemos problema
com o travamento de uma máquina, que fazia mais barulho do que deveria. Esvaziamos a linha de
produção por segurança, os técnicos já estão resolvendo o problema. Mandei um memorando,
informando a necessidade de chamarmos os técnicos da empresa que a construiu, porque eles
saberão lidar com eventuais problemas ou troca de peças. Então, resolvi ligar para a matriz para
informar o ocorrido e pedir urgência na aprovação do serviço, já que os técnicos são do Tennessee
e levarão certo tempo para chegar aqui.
Respiro fundo para controlar a raiva.
— Alguém se machucou, Noah?
— Não foi para tanto, senhor.
— Já aprovaram a contratação? – a pergunta sai entre os dentes.
— Sim, senhor.
Estou tentando manter meu controle.
— Obrigado, Noah. Tenha uma boa noite.
Todos os meus assistentes estão em pé a minha frente. Dirijo-me primeiro ao Ted.
— Você sabia desse problema na Script´s?
— Sim, senhor. Ligaram-me, informando sobre o ocorrido e queriam falar-lhe, expliquei
que era impossível. Desculpe, senhor Thorton, mas não julguei necessário tirá-lo de seu
compromisso por algo banal. Eu mesmo aprovei a contratação. Como foi na linha de produção
daquele novo medicamento, tomei a liberdade de providenciar o voo, para os técnicos chegarem lá
o mais rápido possível.
Vou até a vidraça e contemplo o mar. O perfume da Letícia ainda está em mim e a lembrança
do calor do seu corpo junto ao meu faz-me querer esquartejar Maggie. Eu poderia estar com ela em
meus braços ou dentro dela. Com esse pensamento, meu corpo acorda e pede por ela. Minha
irritação cresce ao mesmo tempo em que a vontade de vê-la aumenta.
— Vocês podem dar-me licença? Mag e King ficam. Ted?
— Sim, boss!
Pego um papel timbrado que estava sobre a mesa, rabisco qualquer coisa e entrego para ele,
dobrado.
— Quero que envie muitas dúzias das mais belas flores que encontrar para a Letícia.
Coloque esse papel em um envelope e envie junto. Não economize, eu quero tudo perfeito!
— Que flores eu devo comprar?
— Você é um dos melhores hackers que conheço, é impossível que, com todas as suas
habilidades, não consiga comprar flores!
Ele sai, ficando somente King, Mag e eu. Sento-me na poltrona de frente para os dois que
estão em pé.
— Senhorita Carlson, como você tomou conhecimento sobre o que houve na Script ś?
— É... então... Hã... Vi a agitação deles, então achei melhor chamá-lo para resolver
pessoalmente.
Com os anos, King e eu aperfeiçoamos a tática de conversar apenas com olhar. Ficamos ali,
chegando à conclusão que ela fez o que fez para atrapalhar intencionalmente.
— Mag, de uns tempos para cá, você vem dando um fora atrás do outro. Mas a de hoje
ultrapassou todos os limites. Minha confiança em você está abalada, sendo assim, lhe darei a
segunda e última advertência, depois disso será a demissão.
— Mas se...
Levanto minha mão, cortando-a:
— Apenas vá, Mag. Pense no que acabei de falar. Se achar que as coisas estão demais para
você, basta avisar-me e colocarei outra no seu lugar. Eu vou sentir muito por isso, você sempre foi
uma grande aliada, maslembre-se de que ninguém é insubstituível.
— Com licença – ela vira as costas e sai.
King serve uma bebida para nós e senta-se.
— As mulheres apaixonadas são loucas e as rejeitadas são perigosas. As apaixonadas-
rejeitadas são loucas-perigosas.
— Bela teoria – levanto o copo em uma simulação de brinde.
— Mag se encaixa na última. Ela trabalha com você todo o tempo, tem acessos que outras
pessoas não têm. Quando os seus casos de uma noite vão embora, ela fica. Está entendo o quero
dizer?
Tomo um gole da bebida.
— Que eu deveria demiti-la?
— Que deve ter cuidado para não acordar castrado! Elas nos acham no inferno, se
quiserem. Mudando de assunto, gostou dela, não é? – sei que está falando da Letícia. — Só que, se
os outros tomarem conhecimento do que rolou, vão querer sua cabeça.
— Eu a quero para mim.
Ele levanta o copo.
— Parabéns, você a tem!
CAPÍTULO 11
 
Letícia
Sob o chuveiro, aquela sensação de aperto que tive ontem volta com vigor. Foi algo
inexplicável. Lorena e eu saímos para jantarmos fora, nos divertimos muito, mas, em um certo
momento, meu coração acelerou e meu peito apertou. O momento vem vividamente a mim pela
décima vez.
Passo a mão no peito para tentar aliviar o nó dolorido que está se formando. Viro-me
para Lorena e pergunto a hora. Por algum motivo, eu precisava saber.
— É meia noite e dez – sinto como se estivesse sendo golpeada no peito e engasgo
tentando respirar. Preocupada, Lorena acaricia meu braço em conforto. — O que foi, Lê? Sua
mão está gelada.
— Não sei... Só um aperto no peito.
— Pode ser por causa daqueles olhos azuis - ela tenta aliviar minha angústia.
Olho para fora da janela.
— Ou o meu destino sendo selado.
Meu corpo treme, tirando-me do torpor do pressentimento. E sorrio com a lembrança do
meu encontro com Zach há pouco. Deus! Eu voltei confusa. Ele é muito... intenso. Não precisou
muito para ele ter-me grudada em sua boca e isso me assustou muito! Do nada, contei toda a minha
vida para ele, deixando de fora o meu relacionamento desastroso. Tenho vergonha de tudo o que
aconteceu durante meu tempo com o João. Quando Zachary ou Zach se despe da sua arrogância, ele
se torna irresistivelmente sedutor.
A quem quero enganar?
Sua arrogância e prepotência o deixa ainda mais imperioso. Aquele sorriso de canto que só
pertence aos superconfiantes torna-o perigoso, fazendo as mulheres em seu caminho molharem suas
calcinhas. Não seria diferente comigo. Mas seu carinho e delicadeza surpreenderam-me, senti-me
protegida pela primeira vez, desde que vovó faleceu.
— Olha o tamanho desse sorriso – saindo do banho, encontro Lolo sentada na minha cama.
— O homem dos olhos azuis fez você revirar os olhinhos? – reviro os olhos e ela vê pelo espelho.
— Eu sabia! – ela bate a mão na cama. — Senta aqui e conta tudo para a titia, em detalhes.
Coloco minha camisola e deito.
— Foi bom... muito bom.
Olho para o teto e relembro seu beijo, suas mãos pelo meu corpo, aquele olhar intenso,
desnudando minha alma. Naquele momento, eu daria tudo o que ele quisesse, eu me daria de corpo,
alma e coração.
— LETÍCIA SOPHIE BARROS!
— O que foi, garota? – Lolo estava com um pijama do Bob Esponja, me chacoalhando.
— O que aquele homem delicioso fez com você a ponto de tirar o foco da nossa amazona,
guerreira Xena? – jogo um travesseiro nela.
— Boba. Ele foi um gentleman, atencioso e um ótimo ouvinte. Ah, acho que foi o King que
cozinhou, a comida estava uma delícia.
— Aquele negro já é lindo parado, cozinhando deve ser um estrago. Dava facin para ele.
— E Ethan? – pergunto.
— Dou também! Mas não muda de assunto. Conta tudo do Zachary, o tesudo. Ops! O tesouro
– recosto-me na cama.
— Nos levaram a uma parte da praia deserta. Colocaram uma daquelas tendas de tecidos,
parecidas com aquelas de novela. Uma mesa bem arrumada, flores por todos os lados. Conforme o
sol baixava, Lennon ia acendendo mini tochas. A sobremesa foi morango recheado com creme de
avelã, deitado em chantilly – Lorena se joga ao meu lado.
— Aquele homem é destruidor. Além de lindo e arrogante, tem seus momentos românticos –
ela suspira dramaticamente.
— Eu estou com medo, Lolo – ela aperta minha mão.
— Medo do que, Lê?
— De me apaixonar...
Nesse momento, alguém bate à porta e Lorena corre com seu pijama amarelo. Ouço
barulhos, mas nada dela voltar. Vou até a sala e sou recebida por muitas tulipas, gérberas, rosas,
lírios, de todas as cores e tamanhos.
— A senhorita Barros pode assinar? – o entregador pede.
Assino e procuro um cartão no meio de tantas flores, localizando-o no meio das rosas
vermelhas.
Eu daria tudo para tê-la em meus braços nesse momento.
Boa noite, meu anjo.
Z
Eu nunca desejei algo como desejei que Zachary me tomasse naquela praia. Eu não me
importaria se alguém visse ou ouvisse-nos transar. Durante aquele beijo, várias cenas obscenas
passaram pela minha cabeça e, em todas elas, estávamos nus, entrelaçados como se fossemos um
só. A delicadeza de Lorena arrancando o cartão da minha mão, tira-me do devaneio.
— Até eu me apaixonei agora. Menina, o que você fez para o homem lhe mandar Holambra
inteira? Amanhã você o leva para a cama e mostra como a gente agradece aqui no Brasil – ela fala
enquanto balança suas sobrancelhas sugestivamente.
— Boba! Ele só está se desculpando por ontem. Assim que foi informado do problema em
uma de suas empresas, saiu correndo, dizendo que embarcaria o mais rápido possível. Mas duvido
que Ethan já não tenha feito algo muito maior para você.
Ela encosta-se em mim e coloca a cabeça em meu ombro.
— Ele enjoou do brinquedinho e jogou de canto. Não quer mais saber de mim, desde sexta à
noite, mal fala comigo.
— O que houve, boneca Lolo? – passo meu braço pelos ombros dela.
— Depois daquela cena com Jô, Ethan surtou e saiu com a brilhante ideia de me levar
embora com ele para os Estados unidos.
— Isso não é bom? – pergunto.
— Não vou mentir que adoraria embarcar nisso com ele. Mas conheço o cara há apenas
alguns dias e o que eu sei da sua vida é o que todos sabem. Vou para um lugar que mal conheço,
com uma pessoa que acabei de conhecer e... – ela dá de ombros, baixa a cabeça e prende o cabelo.
— E quando ele se cansar de mim, como será, Lê? Mandará arrumar minhas malas e me colocará
em um avião de volta, como se nada tivesse acontecido? E eu? E meu coração? – uma lágrima rola
pelo seu rosto. — O pior de tudo isso é que acho que estou apaixonada por ele.
— Lolo... – ela levanta a mão.
— Deixa eu terminar, Letícia. Conheço a fama do Ethan, eu sei que as mulheres para ele não
passam de objetos e, ainda assim, me arrisquei. No começo, foi uma brincadeira, eu estava
adorando e então, do dia para a noite – ela coloca a mão em cima do coração –me apaixonei. Ele
está distante de mim, não me procura mais. Talvez seja melhor. Assim já vou me acostumando à
dor.
Abraço-a.
— Não mandamos no coração, boneca Lolo. Lembro que minha avó sempre dizia que,
quando é para acontecer, não há tempo ou distância que possa impedir o coração de amar. Eu
não sou um bonitão de olhos claros e charmoso, mas estou aqui para você, sempre. Vem, vamos
para a cama.
Fomos para a minha cama, ela se deitou comigo.
— Lê, antes que eu me esqueça, o Jônatas esteve aqui e passou nossos roteiros.
Embarcaremos amanhã às dez da manhã para Brasília. Você, os convidados e seus seguranças
desembarcarão lá e almoçarão com a Presidente. O resto de nós, continuará o voo até o Rio.
— Não mesmo! Eu continuarei no voo com você. O Kevin se vira com Jônatas – seguro sua
mão. — Você precisa de mim e estarei sempre para você.
— Obrigada, Lê. Eu te amo, maninha – aperto meus braços em torno dela. Lolo fala: — A
Vitrine é importante e vocês têm muitas coisas a discutir. Você será apresentada à Presidente...
— Nada disso tem importância se você está infeliz a ponto de chorar. Vamos direto para o
Rio e preencheremos nossas cabeças, bebendo e organizando tudo para a volta deles. Assunto
encerrado!
— Yes, boss!
Deitamos juntas com o cartão do Zach junto a mim. Meu sono não vem facilmente,talvez
porque ele já tenha poder até nisso. Eu não deveria me empolgar com isso, me apaixonar por ele
seria um erro. Misturar minha vida pessoal com a profissional seria ainda pior. Eu não sei o que
fazer, já que meus pensamentos estão tomados por ele e sua boca.
Estou no meio de um salão de festas com um vestido lindo de gala, azul bebê. Estou tão
feliz, porque é justamente o vestido que queria ter usado na minha festa de debutante que nunca
tive. O salão está repleto de pessoas desconhecidas, mas, do outro lado, com o braço estendido,
está Zachary. Lindo em seu smoking. Eu sabia que ele viria, sabia que era meu príncipe.
Zach me toma em seus braços e dançamos a valsa dos filmes que assistia com a minha
mãe. Ela estaria orgulhosa agora, vendo-me com o meu príncipe, dançando com o amor da
minha vida.
— Você está linda, Letícia.
— Você é o homem dos sonhos de qualquer mulher, Zachary. Estonteante a ponto de
roubar a cena, forte para proteger e generoso para me amar.
Ele se afasta e começa a rir, todos ao redor também estão gargalhando.
— Achou mesmo que eu amaria alguém como você? Garota, você é a minha diversão,
como todas as outras.
No palco onde a banda tocava, as cortinas se abriram e algumas pessoas conhecidas
surgiram, rindo e apontando para mim. Eu queria sair dali correndo, mas para onde? Não vejo
saídas. No meio do desespero, vejo Liam com o rosto contorcido, como se estivesse com dor,
estendendo o braço para mim, chamando-me. Será que devo confiar?
Olho mais uma vez para Zachary, que já está com uma loira em seus braços e ambos
rindo de mim. Em meio às lágrimas, corro até Liam. Alguém grita não e entra a minha frente,
impedindo-me de passar. Vejo que é Ethan e ele apenas ri... Eles riem... Todos riem...
— Letícia, acorda! Por favor, abre os olhos... – Lolo, ela jamais riria de mim. Abro meus
olhos com dificuldade e percebo que estavam molhados, como se tivesse chorado. — Graças a
Deus, você acordou, Lê. Estava chorando e soluçando, gritava não, se remexia muito, repetiu
várias vezes o nome do Zachary.
— Desculpe, Lolo. Acho que foi um pesadelo, só que não consigo me lembrar do que era e
também não me lembro de Zachary estar nele. Enfim, desculpe por te acordar. 
— Quase perdemos a hora. Vamos tomar café antes de arrumarmos as malas?
— Você faz muita questão de ir ao salão principal tomar café? Não poderíamos pedir aqui
enquanto arrumamos as coisas? – antes de eu ter terminado de falar, ela já estava ao telefone,
pedindo nosso café. Agradeço a Deus todos os dias por ter colocado ela e sua mãe em minha vida,
são minha família, meu coração.
Enquanto tomávamos café na varanda da suíte, ouvi Lorena contar sua relação com Ethan e
tudo o que ele fez com ela e para ela. Uma pontinha de inveja apareceu e tratei de esquecer minhas
frustrações para me focar somente nela. Sei o quanto é doloroso o sofrimento do amor. Eu já saí
com alguns homens e amei apenas um, justamente aquele que me roubou uma vida. João não levou
apenas bens, levou parte da minha juventude, minha fé nas pessoas, acabou com meus desejos e
roubou-me o poder de amar. Sofri, chorei, sangrei, mas superei. Os trincados em minha armadura
provam que tive um combate vitorioso. Pelo menos, assim penso eu.
— Havia momentos em que ele me fazia acreditar que queria-me – voltei minha atenção a
ela. — Eu não vou mentir, quando ele atacou o Jô, me senti o máximo! Alguma coisa dentro de mim
dizia que estávamos na mesma página.
Terminamos de arrumar nossas coisas e saí à procura do Kevin, para avisá-lo de que estava
indo diretamente ao Rio. Assim que o faço e estou para entrar no elevador, ouço gritos pelo
corredor. Vou em direção à discussão e vejo Ethan escorado na parede, fazendo gestos com os
braços para dois funcionários do hotel, um homem e uma mulher que tentavam entendê-lo.
Aproximo-me deles.
— Algum problema?
— Estamos tentando ajudá-lo a chegar ao seu quarto, mas não entendemos o que ele fala – 
o funcionário responde. — Tentamos segurá-lo, mas ele se debateu, ficamos preocupados com seu
bem-estar.
— Ethan? – ele levanta seus olhos vidrados, que indicam embriaguez além da conta, e sua
fala arrastada confirma o porre.
— Letíxia, essstão tentando me arrastarr para lonxe dela...
Ele está completamente bêbado e provavelmente falando da Lorena. Olho para os lados e
aceno para as duas pessoas que permaneciam ali, para ajudar-me a levá-lo para sua suíte, que é em
outro andar.
— Ethan, essas pessoas te ajudarão a voltar ao seu quarto. Mas preciso que você colabore
conosco. Ok?
Ele balança a cabeça em negativo.
— Tem o cheiro dela – como uma criança “birrenta”, ele aperta o nariz com dois dedos
para não sentir o cheiro e se aproxima do meu rosto para falar baixinho: — O cheiro dela essstá
porrr todo lado. Aquela dessgraçada...
Ele é muito grande e pesado, não será fácil. Tentamos caminhar com ele escorado mais em
mim do que no outro, ainda assim, quase caímos. Um de seus seguranças aparece, tirando-o
rapidamente dos meus ombros.
— Estávamos todos à procura dele. Ainda estou tentando entender como o senhor Scott saiu
sem que percebêssemos.
— Leve o nosso bebezão para tomar um banho frio. Eu vou providenciar um café forte.
Prepare-o para embarcarmos.
O segurança sorri e acena para mim.
— Obrigado, senhorita.
Volto a minha suíte apressadamente, ligo para a copa e peço para enviarem um café a suíte
de Ethan rapidamente. Procuro a Lorena para contar o último babado, mas não a encontro. Onde
essa criatura se meteu? Alguns minutos depois, ela entra no quarto com os carregadores. Despeço-
me desse paraíso e, olhando para o lugar onde ele me beijou pela primeira vez, guardo a lembrança
dentro do meu coração.
Assim que chegamos ao aeroporto, confiro o embarque de todos, mas fico para trás com os
assistentes. Aproximando-me do portão de embarque, dois policiais barram-me.
— Letícia Sophie Barros?
— Sim, sou eu.
Ele aponta para frente.
— Acompanhe-me, por favor.
Meu coração bate tão forte que, por um momento, cheguei a pensar que veriam por cima da
minha roupa. Suando frio e nervosa, acompanho-os e vou planejando ajoelhar-me e implorar
perdão por tudo o que fiz, mesmo não tendo feito nada. Olho para Lorena desesperada, refletindo
os mesmos sentimentos que os meus, medo! Rezo todas as orações que vovó me ensinou. Peço
proteção a Trindade Divina, mas, como o desespero é grande, apelo para todos os santos.
Quando chegamos à frente de uma porta azul, um dos policias apontou para que eu entrasse
e parou Lorena.
— Somente ela. Caso a senhorita queira esperá-la, pode sentar-se logo à frente da porta,
aqui fora.
A porta é fechada atrás de mim. Antes de alcançar o sofá do outro lado da sala, pulo com o
baque da porta sendo aberta. Viro-me para ver Zachary entrar mais elegante do nunca! Meu alívio é
tão grande que minhas pernas chegam a falhar.
— Graças a Deus é você – falo aliviada.
Em dois passos, Zach alcança-me com seus braços e senta-nos no sofá, comigo em seu colo.
Ele olha-me com atenção, procurando alguma coisa diferente.
— Qual o problema, anjo? Fizeram algum mal a você?
Meu coração aquece com tamanha proteção.
— Não. Só me assustei com a abordagem.
Ele suspira em meu cabelo e beija minha cabeça. Vira-me de frente para ele, deixando-me
escanchada nele. Passa a mão pelo meu rosto, contornando minha boca, desce pelo meu pescoço, e
um arrepio percorre meu corpo. Ele pega um punhado do meu cabelo da nuca e puxa-o com força.
Desliza seu nariz pelo meu pescoço.
— Seu cheiro me enlouquece, Letícia – Zach toma minha boca em um beijo possessivo,
beijando-me até ficarmos sem ar.
Abro os olhos e mergulho naqueles olhos azuis que perseguiam-me em sonhos. A beleza de
Zachary sobrecarrega-me, mas a habilidade de suas mãos, faz com que eu esqueça até quem sou.
— Achei que você tinha partido ontem.
— O problema não era tão sério como pensava-se – Zachary mordisca meu lábio inferior,
fazendo-me gemer. — Debati se deveria ou não buscá-la para dormir comigo. Por fim, as horas
passaram e fui avisado que Ethan estava dandoum show no bar da praia e fui resgatá-lo.
— O encontrei bêbado no hotel há pouco tempo. Ajudei-o a voltar a sua suíte e pedi ao
serviço de quarto um café forte. Ele sempre foi assim, Zach?
— Nunca o vi naquele estado. Acho que sua amiga fodeu a cabeça dele.
De última hora, optei por um vestido curto e tailleur para a viagem de volta. Bendita
escolha! Zachary beija-me e desliza suas mãos pelas minhas coxas nuas, subindo cada vez mais.
Sua língua possuía-me, exigia minha entrega enquanto sua mão deslizava pela minha calcinha já
úmida.
Seu toque desperta o meu corpo e meu desejo renasce, depois de anos adormecido. E eu
quero sentir mais, muito mais. Deixando-me levar pelo momento, rebolo em seu colo, fazendo com
que minha abertura deslize sobre seu pau, separados apenas pelo tecido de sua calça.
— Meu autocontrole está por um fio, anjo. Inferno! Eu a quero tão mau, Letícia.
Zach coloca minha calcinha de lado e seus dedos encontram minha abertura encharcada.
Ambos gememos quando ele penetra-me.
— Assim, anjo. Dança para mim – meu corpo é totalmente controlado por ele. — Sua
boceta é deliciosamente apertada, baby.
Sua mão livre aperta meus mamilos através do tecido fino do meu vestido. Meu orgasmo
aproxima-se e meus gemidos ficam mais altos. Zachary tem-me em suas mãos para satisfazer seus
caprichos. Usando suas mãos e sua boca, ele dá-me o orgasmo mais poderoso que já senti.
Ele fala ao meu ouvido e meu corpo atentamente rebola mais. Estou prestes a gozar quando
alguém bate fortemente na porta. Zach sente a tensão do meu corpo e belisca meu clitóris, levando-
me em uma espiral de prazer. Não satisfeito, ele continua a me masturbar enquanto meu orgasmo se
estende, deixando-me completamente enlouquecida. 
Quando recupero-me das ondas de prazer, Zach beija-me e voltamos a ouvir as batidas na
porta. Eu tive dez segundos para arrumar-me da melhor maneira possível, até Zachary gritar para
entrarem e a porta abrir. Na ânsia de sair de seu colo, desequilibro-me e caio em seu colo.
— Calma, anjo. É só o King.
King abre um largo sorriso para mim.
— É sempre bom vê-la, senhorita Barros.
— Chame-me de Letícia ou Lê, ficarei menos constrangida.
— Só faltam vocês para partirmos – King acena e sai.
Zachary acaricia meu pescoço.
— Quero você ao meu lado no avião, Letícia?
— Não é uma boa ideia – falo.
— Eu darei um jeito de te atacar na próxima parada – ele me dá um sorriso lascivo e um
arrepio percorre meu corpo, fazendo-me estremecer. Balanço a cabeça.
— Não ficarei em Brasília, vou direto ao Rio de Janeiro.
Seu olhar que era desejoso torna-se frio, assustando-me.
— O que tem no Rio de Janeiro que é mais importante que eu? – ele fala com raiva.
Fico sem ação, sem saber o que responder ante a sua reação.
— Zacha...
— Esquece!
Ele tira-me de seu colo, levanta e caminha em direção à porta. Ira irradia de seu corpo,
alcançando quem está por perto. Zachary sai, batendo a porta atrás de si. E eu fico ali, tentando
entender o que aconteceu. Lolo, que me esperava fora da sala, entra com os olhos arregalados.
— O que houve, Lê? O homem entra todo sorrindo e sai todo nervoso. Sexy como o inferno!
– ela faz uma careta e divaga: — Como esses homens conseguem ficar ainda mais bonitos quando
estão bravos? Se eu ficar brava e fizer careta, vão me chamar de Zangado dos sete anões e me
colocarão em algum jardim por aí.
Não me contenho e começo a rir.
— Eu não sei o que aconteceu – dou de ombros. — Apenas falei que não iria para Brasília,
e ele surtou.
Olho para o relógio e puxo Lorena pelos corredores para embarcarmos. Estavam quase
partindo e nos deixando para trás. Sentamos, e Lorena coloca sua cabeça em meu ombro.
— Eu estava tão absorvida em minha história com Ethan que não perguntei o que está
rolando entre você e o gostoso do Zach. Porque, amiga, seus gemidos ecoaram pelo aeroporto
inteiro – empalideço e ela imita: — Oh, Zach... Sim... Por favor... Zachary O´Brian, o deus do sexo!
Destronou o Ricardão.
Coloco as mãos no meu rosto, mortificada. Como olharei para as pessoas?
— Fala para mim que é brincadeira sua, por favor – sussurro para ela.
— Você realmente deu um show, querida. Não sabia que você fazia o tipo “gritona”. Cara,
você é uma sexy hot lady! Definitivamente temos que voltar mais vezes a Fortaleza.
 
CAPÍTULO 12
 
Letícia
O voo foi uma mescla de emoções. Estava confusa com a cena que Zachary protagonizou no
aeroporto. Preocupada com a Lorena que, mesmo tomando um relaxante para dormir, secava suas
lágrimas constantemente. Deus, amar não deveria machucar tanto! Também fiquei com dó da
assistente do Ethan, ela corria desesperada de um lado para o outro, tentando satisfazer os
caprichos do seu chefe. Certa hora, me irritei e fui ter um papo com ele na primeira classe. Ethan
estava deitado e uma máscara de dormir cobria seus olhos. Aproximei e coloquei para cima.
— Bom dia, senhor Scott – fiz questão de falar alto. A ressaca deve estar matando-o e
minha ideia é fazê-lo sofrer.
— Que merda, Letícia! Me deixa em paz – ele falou entre os dentes e puxou sua máscara
para o lugar novamente.
Teimosamente, retiro-a e o questiono:
— Qual é o seu problema, Ethan? Você está matando a Kimy de cansaço, as comissárias de
bordo não te suportam mais e fora esse cheiro horroroso. Entenda que ninguém tem nada a ver com
seus problemas de garoto mimado. Se a sua vida não está da maneira que você quer, arrume-a! Mas
deixe todo mundo fora disso.
No caminho de volta, encontro o olhar gélido de Zachary. Um calafrio percorre meu corpo e
desvio o meu olhar. Volto ao meu assento e alcanço o livro Redenção e Submissão, da escritora
Nana Pauvolih novamente. Ele, sim, vale toda minha atenção. Distraída, não percebo que a Lorena
sai e Liam senta-se.
— Olá – ele dá um beijo em meu rosto.
— Achei que tinha arranjado uma linda cearense e resolvido fixar residência no paraíso –
falo, rindo. Liam é um homem muito bonito e sua risada é contagiante.
— Realmente é um paraíso, e eu ficaria somente se você ficasse comigo – seu olhar é
intenso.
— Assim posso me apaixonar, senhor Larkin – pisco para ele e mudo de assunto. — Veio
até a classe econômica por saudades de mim ou Ethan interditou tudo com seu mau humor?
Ele ri.
— Ontem no bar, entre dez palavras ditas por ele, sete eram ela. Deduzimos que ela era a
sua amiga. Para quem nunca se apaixonou, Letícia, acordar um dia e descobrir que não pode viver
mais sem aquela pessoa pode não ser uma coisa fácil.
Faço uma careta.
— Se tratando de amor, Liam, nunca é fácil. Eu amei e não fui amada.
Ele alcança minha mão.
— Eu amei e fui muito amado. O meu amor era tão grande que, quando minha esposa
faleceu, eu não me sentia só, pois o sentimento me amparou – aperto sua mão em conforto.
— Nunca ouvi ninguém falar assim, ainda mais da perda de um amor. Faz muito tempo que
ela faleceu? – pergunto curiosa.
— Quatro anos – sinto seu corpo tencionar.
— Desculpe minha inconveniência, Liam. Não queria ser invasiva.
— Gosto de conversar com você, Letícia. Você é a única mulher que despertou meu
interesse, depois de anos.
Encaramo-nos.
— Eu também gosto de conversar com você, Liam.
Alguém se aproxima e limpa a garganta. Volto a minha atenção ao visitante e percebo que é
um dos seguranças de Sebastian. Eu acho.
— Senhor Larkin, estão solicitando sua presença na primeira classe.
— Algum problema? – pergunto para o segurança, mas é Liam quem responde.
— Acredito que seja alguma coisa sobre o projeto – ele beija o canto da minha boca. —
Depois nos falamos.
Assim que ele desaparece do meu campo de visão, Lolo reaparece.
— Hum... o irlandês está caidinho de amores pela nossa Letícia. A hora que o Mister
Gostoso souber será um duelo de titãs.
Sim, eu percebi que Zachary e Liam estão em duelo pela minha atenção. E, sinceramente,
não sei o que sinto. Olho pela janela do avião.
— Sou um brinquedo que dois meninos ricos desejam. Nada mais é que um duelo de egos –
Lorena coloca sua cabeça em meu ombro. E eu mudo de assunto: — Está sabendo que o Ethan está
aterrorizandomeio mundo com seu mau humor? Hoje, antes de embarcarmos, encontrei-o bêbado
como um gambá. Zachary e Liam assistiram ao showzinho dele no bar ontem. Ele está mal, Lolo.
Acho que você deveria falar com ele.
Ela balança a cabeça negativamente.
— Nos encontramos no corredor ontem, ele fingiu não ter me visto. Acho que isso já diz
tudo. Só não esperava que ele fosse tão infantil.
O avião fez sua primeira parada e, em menos de uma hora, já estávamos voando novamente.
Eu não vi Zachary ou Liam, só entregaram-me uma caixa de chocolate suíço em nome de Martino.
Dividi com todos que estavam perto de mim, até porque eram muitos bombons. Lorena, com a boca
cheia de chocolate, solta:
— Letícia de Deus, o Kevin falou para você convencê-los a investir em projetos e não a
investir em você!
Momentos depois, acordo com a comissária de bordo chamando por mim e Lorena. Pela
cara da moça, estávamos horríveis, Lorena com seu cabelo arrepiado e eu, com certeza, igual.
Quando desembarcamos, coloquei Lolo em um táxi para sua casa. Quando estamos curtindo a fossa,
é melhor estar em nossa casa e chorar em nossos travesseiros com um afago de mãe. Eu
acompanhei os assistentes e os auxiliei no hotel. Assim que tudo estava em ordem, fui para o meu
apartamento. Estava morrendo de saudades do meu cantinho.
Abri as janelas, as cortinas e sentei na varanda para contemplar o mar, o meu mar. Quer
saber? Vou trocar de roupa e correr à beira mar e foi o que fiz, por duas horas. Alonguei-me,
caminhei, corri, tomei água de coco, respirei esse ar puro e em nenhum momento Zachary saiu dos
meus pensamentos, nem Liam e até o Martino se infiltrou, depois daqueles benditos chocolates.
Perdida em pensamentos, pego-me comparando Liam e Zachary. Eles não têm muita coisa
em comum além da beleza extravagante. Sabe aqueles homens que vimos nos filmes, que parecem
criação digital de tanta perfeição? Liam é o homem perfeito, o genro que toda mãe gostaria de ter.
Martino é o cafajeste sedutor, que toda mulher quer ter na cama. E Zachary é o pecado
personificado que, se eu continuar a me envolver, será minha morte.
Zachary é o tipo de homem que sabe exatamente o que quer e é impiedoso em obtê-lo. Ele
sabe como enredar uma mulher em sua teia, sabe o poder que tem sobre cada fêmea que está ao seu
redor e até mesmo à distância. A sua beleza é devastadora e aquele olhar azul profundo, como a cor
do mar Mediterrâneo, leva qualquer um para suas profundezas.
Gosto de analisar as pessoas, muitas vezes elas são tão previsíveis que posso preceder seus
pensamentos e atos. Ethan, por exemplo, um dos jovens mais ricos do mundo, acha que, sem o seu
dinheiro, o mundo quebraria. Tenho certeza que ele não pediu a Lolo para acompanhá-lo até os
Estados Unidos, ele apenas a avisou que iria com ele. Porque Ethan não costuma pedir, acha que
tudo é dele! Só que não é difícil lidar com esse tipo de ego, saber seu ponto fraco é o caminho para
o sucesso. Mas jamais bata de frente com os homens que se acham o rei do mundo, eles passam por
cima sem piedade.
Posso estar enganada, só que Zachary é pior. Ele não tem pontos fracos e, se os tiver, trata
de fortalecê-los, mesmo que para isso ele precise cortar algo importante da sua vida. Acredito que
ele não tenha ligações fortes, nem mesmo com a família. A docilidade se torna ira em um piscar de
olhos, coisa exclusiva de quem não tem afinidade com o amor. Porque variar do amor ao ódio é
simples, para odiar basta amar. A ira não, ela é um dos piores sentimentos existentes nos seres
humanos, poucos conseguem irar-se, podem odiar e o ódio impede de fazer uma coisa ou outra, a
ira não! Ela faz com que as pessoas destruam outras sem motivo algum, aparentemente.
Quando vi o gelo em seu olhar no aeroporto, se formou um nó no meu peito. Ali tive a
certeza de que eu sou apenas um desafio. Ele não se importa se será bom, o que importa é ganhar
do outro. Eu queria ceder com Liam facilmente como aconteceu com Zachary, mas é impossível.
Tenho que parar com esses delírios. Faço meu alongamento e volto para casa. Depois do
banho, vou direto para cama. Estou cansada fisicamente e mentalmente. Em meio ao melhor sonho
que tive nos últimos tempos, o meu telefone toca justamente quando eu estava bebendo chocolate
direto da fonte que instalaram para mim no escritório.
— Alô...
— Letícia, preciso de você aqui, imediatamente!
Lógico que precisa. Todos precisam da Letícia para resolver algum pepino.
— Primeiro, diga quem é. Depois, tenha a gentileza de dizer o que quer. E tenha o espírito
forte para ouvir minha resposta – falo mau humorada.
— É o Jôna... – a voz fica distante... distante... acho que o telefone ficou mudo... estou
vendo tudo bran... — Letícia! Letícia, por favor! Não acredito que ela cochilou no telefone...
LETÍCIA!
O pior é que cochilei mesmo...
— Pare de gritar, menino! O que posso fazer pela sua pessoa, Jônatas?
— O senhor Scott está dando uma festa na suíte e o hotel está ameaçando a chamar a polícia
– ele fala tão rápido que meu cérebro lento demora a assimilar. — Tenho medo de que saiam todos
algemados daqui, Lê. Não achei o senhor Cooper em lugar nenhum. Ajude-me, por favor!
— Eles já retornaram? – olho ao redor para ver a hora em algum lugar.
— Sim. E estão fora de controle! – Jô fala gritando.
— Estou indo.
Tomo um banho para despertar, coloco uma roupa para aterrorizar as pessoas. Decido por
uma calça de couro preta, justa, uma camisa e uma jaqueta da mesma cor e uma bota de saltos
altíssimos. Estou saindo conforme meu humor, eles terão que me suportar. Ethan está fora de
controle! Sabe Deus o que vou encontrar naquela suíte, deve estar rolando um verdadeiro bacanal
naquele lugar. Meu Deus, e se tiver drogas?
Vou para a garagem quase correndo e um dos seguranças do condomínio me cumprimenta.
Saio dirigindo como uma louca da Nascar pelas avenidas do Rio de Janeiro. Entro no hotel e, no
hall, já dou de cara com o gerente e um grupo de seguranças prontos para invadir o quarto, para
intervir.
— O senhor permite que dois de seus seguranças subam comigo? – peço ao gerente.
— Sim, senhora.
Vou acabar com o bundalelê, mesmo que para isso eu tenha que jogar uma bomba de gás
lacrimogêneo. Logo que as portas do elevador abrem-se tenho ideia do que está acontecendo, pois
o barulho é ensurdecedor. Assim que entro no apartamento presidencial de Ethan, sou recebida com
som alto, conversas e gemidos. Como os seguranças dos convidados me conhecem e provavelmente
acham que fui convidada, permitem que eu circule livremente. Caminhando pelo lugar, tenho a
impressão de estar no portal do inferno: mulheres seminuas, bebidas, uma nuvem espessa de
fumaça, um verdadeiro bordel.
Tento localizar Ethan no meio daquela zona, mas não o vejo em lugar algum. Avisto a
estação de onde aquele som sai e jogo-o no chão, quebrando o aparelho em pedaços. Com isso,
metade das pessoas me dão sua atenção.
— Ah, que pena! A festa acabou, cambada! Retirem-se.
— Que porra está acontecendo? – Ethan surge nu, na sala, gritando. Ele passa o olhar pelo
lugar até me encontrar com as mãos na cintura. — Letícia...
— A própria – aponto para os seguranças do hotel. — Por favor, escoltem todas as moças
para fora. E você, Ethan, coloque uma roupa.
Acredito que todos ficam meio chocados com a minha iniciativa. Eu sou legal, relevo muita
coisa pelos amigos. Mas, quando tenho que ser firme, sai da frente, senão passo por cima! As
mulheres saíram em silêncio, Martino e Sebastian surgem com três meninas que logo partem
também. As interesseiras que rodeavam o sheik acharam que teriam sua proteção. Pobres idiotas!
Eu apenas aponto a direção da porta.
Pedi ao Jônatas para providenciar um café forte para todos em outra suíte e liguei para a
recepção, solicitando limpeza para este lugar. Antes da equipe de limpeza entrar, passo pelos
cômodos para ver o estado em que as coisas tinham ficado. Passando pelo quarto secundário,
deparo-me com uma cena chocante. A assistente ruiva do Ethan está de quatro e Zach a penetra
selvagemente enquanto a segura peloscabelos. Ela geme a cada estocada e pede para fodê-la com
mais força.
Na posição em que se encontra, Zachary exala todo seu poder. Ele é forte e majestoso. Seus
cabelos, soltos do coque samurai, grudam em sua pele e o suor escorre pelos seus músculos
definidos, deixando-os mais evidentes. E seu semblante sério o faz mais perverso.
— Puta que pariu!
Assusto-me com Ethan falando atrás de mim, o que acabou chamando a atenção do casal.
— Vocês poderiam nos dar licença? – a mulher fala irritada. — Estamos um pouco
ocupados aqui.
O olhar de Zachary contêm uma frieza crua que me dá calafrios. Uma dor aguda corta meu
peito, fazendo-me arquejar. Empurro Ethan do meu caminho e saio correndo. Ouço alguém me
chamar, mas ficar aqui é a última coisa que quero. Desço pelas escadas e, não suportando a
pontada em meu peito, sento e choro. A cena repete-se em minha cabeça, fazendo lágrimas
abundantes correrem e soluços me castigarem.
Não percebo quando King senta ao meu lado. Em silêncio, o homem negro de mais de dois
metros, permite-me ver em seus olhos que sua alma e seu coração são tão grandes quanto ele.
Oferece-me um lenço e seu ombro para chorar. E, mesmo sem me conhecer, consola-me. King
mantêm-se ali, em silêncio, até que meu choro cesse e eu possa recuperar um pouco da minha
dignidade.
— E-eu não sei porque estou assim... – falo, ainda deitada em seu ombro. — Não é como se
tivéssemos uma relação. Apenas doeu.
— Há coisas na vida, princesa, que não fazem sentindo e não nos cabe entender – sua voz
grave transmite uma docilidade calmante.
Levanto meu rosto e olho-o falar:
— Conheço Zachary há muitos anos. Ele era o playboy riquinho, metido a valente e de
família poderosa. Eu era o oposto, negro, de família simples e um SEAL dissidente. O imbecil do
Zach e seus amigos se meteram em uma briga em um lugar barra pesada. Tanto eu quanto ele
estávamos bêbados e, ainda assim, o defendi. Só sei que acordamos na beira da piscina do Ethan –
ele sorri com a lembrança. King continua a história: — A partir daquele dia, nos tornamos amigos.
Ele me ajudou dando-me um emprego e a recuperar minha vida. O que eu estou tentando dizer é que
às vezes as pessoas são conforme a vida os moldam. Zachary é uma boa pessoa, só que a sua vida
não foi muito fácil. A vida o ensinou que as pessoas não valem a pena. Mas, um dia, ele descobrirá
que existe aquela pessoa que valerá por toda uma vida.
— Você gosta muito dele, não é? – pergunto.
— Ele é meu irmão! Fez coisas por mim que outro jamais faria – King fala com afeto.
— Ele tem muita sorte em tê-lo por perto, King – dou um beijo em seu rosto e levanto-me.
— Obrigada por ficar comigo. Se um dia precisar de algo, é só chamar-me.
Voltei à suíte para pegar minha bolsa na esperança de não encontrar ninguém. Mas a vida
tem outros planos, Ethan e Zachary estão sentados em meio a bagunça, conversando, já vestidos.
— Desculpem-me, achei que estavam limpando o lugar. Só vim pegar minha bolsa – Ethan
aponta para a minha bolsa que está ao lado de seu amigo.
— Letícia. Quero lhe pedir desculpas por tudo – ele fala arrependido.
— Não há porque se desculpar, senhor Scott – adoto meu tom profissional para que
entendam que quero distância.
Zachary ousa convidar-me para um café, exibindo aquele sorriso arrogante. Nego, mesmo
com a insistência de Ethan em reparar os últimos acontecimentos. Quando estou prestes a ceder os
apelos, ouço um pof pof pof de saltos e a ruiva sai de um dos quartos, terminando de abotoar a
camisa. Olho entre eles e calculo mentalmente quanto tempo se passou e, para minha decepção,
tudo indica que quando eu saí Ethan se juntou à festinha. Bom, estamos falando do rei das orgias de
Nova York.
Puxo minha bolsa com força e ela vem direto ao meu rosto. Despeço-me e saio de lá como
se o lugar estivesse pegando fogo. O que a idiota aqui esperava de um homem como ele? Que se
ajoelhasse e pedisse perdão? Pelo quê? Afinal, eu sou a conquista recente e ela, segundo o outro
assistente, é uma foda corriqueira. Como sou tonta, meu Deus! Realmente acreditei que o homem se
tornaria um santo? Desgraçado!
Distraída, esbarro em uma parede rígida por nome de Sebastian.
— Desculpe-me, eu estava distraída.
Martino aproxima-se, encarando-me.
— O que se passa, Letícia?
Sorrio sem graça, querendo fugir de uma vez.
— Acabar com a festinha de vocês consumiu todas as minhas energias.
O olhar fascinante de Sebastian captura-me. Sua beleza e seu charme grego o torna um
encantador de serpentes.
— Gostaria de tomar café conosco?
Assinto e os acompanho até o salão principal. O café foi prazeroso. Ambos se empenharam
em me fazer rir e foram galantes até demais. Falamos sobre a ideia deles para o projeto do resort,
quais outros projetos investirão e, por um momento, achei que Sebastian estava dando em cima de
mim. Despedi-me e fui para o carro, encontrando Liam no hall, com seus assistentes e seguranças.
— Bom dia, Liam.
Ele alcança minha mão e a beija.
— Bom dia, ma chérie. Como você está?
— Um pouco cansada, mas bem. Estou indo para casa, arrumar-me para a reunião de logo
mais.
Liam surpreende-me ao falar:
— Posso ir com você? Prometo me comportar – seu sorriso, derrete-me. E faz a frustração
dos últimos acontecimentos amenizar. — Assim poderei conhecer um pouco mais a cidade e onde
você habita.
— Será um prazer – Liam é adorável, não há como dizer não. E tê-lo por perto faz-me bem. 
Ele já estava pedindo um carro quando o silenciei. — Se quiser ir comigo, terá que ser no meu
carro e sem seguranças. Não aguento mais ver essas paredes humanas a minha volta, alguns me
assustam. Quando o sheik entra com aqueles caras, tenho a impressão que um deles vai gritar
homem-bomba a qualquer momento.
Liam ria alto quando deixamos o hotel, a caminho do meu apartamento.
* * *
Durante o caminho, Liam me falou que estava encantado com a hospitalidade brasileira.
Que os brasileiros são calorosos e que a alegria do povo é contagiante. Isso porque o irlandês
ainda não viu o nosso carnaval. Já em meu apartamento, a primeira coisa que faço é ligar para o
restaurante e pedir comida para ambos. A reunião não estava longe e eu ainda precisava arrumar-
me. Peço peixe e salada para não fazer feio com o homem. Por mim, tinha enfiado comida
congelada no forno e devorado sozinha. Enquanto esperávamos a entrega, convidei-o para sentar no
sofá da varanda comigo.
— A vista da sua casa é sensacional, Letícia – ele beija minha mão. — Assim como você.
— Entre nós dois, a beleza está em você! – falo, sorrindo. Bonito não o descreve, lindo
ainda seria pouco.
— Gostaria que você olhasse para mim como olha para Zachary – assim que ele solta as
palavras, fico tensa. Volto minha atenção a ele.
— Não olho de maneira alguma para o Zachary. Você está vendo coisa onde não existe,
Liam. E eu não gostaria de estragar esse momento falando dele.
Ele levanta as mãos em rendição.
— Não está mais aqui quem falou. Só preciso saber de algo.
Antes que eu pudesse perguntar o que era, Liam puxa-me e beija-me inesperadamente. O
beijo é tão doce e carinhoso quanto ele, mas não desperta-me.
— Tenho vontade de beijá-la desde a primeira vez que a vi.
Salva pela campainha, levanto-me em um pulo e vou até a porta. Abro na expectativa de
pegar as sacolas, mas dou de cara com as últimas pessoas que eu gostaria de ver no momento.
Ethan e Zachary, com seus respectivos seguranças.
— O que a dupla dinâmica está fazendo aqui? – pergunto em um rosnado.
Ambos olham sobre meu ombro, e Zachary fala com um sorriso debochado:
— Estávamos passando por aqui e resolvemos entrar para ver como você estava, já que se
negou a tomar café conosco – ele coloca-me de lado e entra em minha casa, seguido pelos outros.
Ethan, King e Kaleb beijam-me no rosto e Zachary apenas esfrega-se, fazendo com que meu corpo
acorde. Filho da mãe!
Liam e eles trocam olhares estranhos. Dou de ombros e, assim que fecho a porta, Lorena
entra falando alto, não se dando conta de que não estou só.
— Letícia, Jô me contou da merda que Ethan fez. O que ele... – elapercebe que temos
companhia e olha-os. — Ah, Merlin do Carvalho! O que estão fazendo aqui? – Lolo acena para o
chefe de segurança do Ethan. — Oi, Kaleb.
Nesse momento, a campainha toca e vou atender, orando para que dessa vez seja a comida.
Porque, pelo andar da carruagem, pode ser até o Papai Noel. A quantidade de alimento era
insuficiente para alimentar esse batalhão de músculos. Peguei todo meu estoque de comidas
congeladas e pus-me a prepará-las. 
Zachary veio para minha pequena cozinha com a desculpa de ajudar-me enquanto Ethan
discutia com Liam e olhava de canto para Lolo. Em um momento em que todos estavam distraídos,
Zachary colocou-se atrás de mim, deslizando suas mãos pelas laterais do meu corpo e puxando-me
para si. Em seguida, levou suas mãos sobre as minhas e as prendeu sobre a pia. Meu corpo tremia
em antecipação quando ele mordicou minha orelha e falou em meu ouvido:
— Conversaremos mais tarde, com privacidade.
— N-não... – tento negar-lhe o que já era dele.
— Não estou lhe convidando, Letícia. Estou avisando que mais tarde conversaremos – seu
tom de voz era ameaçador. Antes de soltar-me, ele dá uma leve mordida em meu pescoço,
lambendo a marca logo em seguida. Minhas pernas falham e ele segura-me, chamando a atenção de
todos. — Cuidado, Letícia!
— É só cansaço. Vamos nos servir?
Enquanto todos comiam meus arranjos culinários, Lolo acompanhou-me até o meu quarto.
— Letícia Sophie Barros, por que parte da gangue dos dentes de ouro está aqui?
— Liam se ofereceu para vir comigo. E os outros apareceram minutos antes de você,
surpreendendo-me também.
Sentada na minha cama, Lorena fala tristemente:
— Eu soube do que aconteceu na suíte do Ethan. Seja sincera comigo, ele estava com
alguém?
Só de lembrar-me daqueles fatos, meu estômago embrulha. Não vou mentir para minha
melhor amiga, ainda mais vendo-a assim, magoada.
— Eu não o vi com ninguém, Lorena. Mas tinham muitas mulheres, bebidas; aquilo estava
um verdadeiro caos – faço uma pausa antes de entrar no banheiro para banhar-me. — Eu vi Zachary
transando com a assistente ruiva do Ethan.
Arrumo-me em tempo recorde. Para a reunião de hoje, optei por um tailleur com saia de
cor clara. Prendo meu cabelo em um rabo de cavalo baixo e saio do closet com os sapatos na mão.
Lolo arrumava seu cabelo em frente ao espelho.
— Eu não sei quais são seus sentimentos por ele, mas sei que é algo muito forte.
— Fiquei mal e acabei chorando no ombro do King. Até agora tento entender minha reação.
Não temos nenhum compromisso e nem vínculo. Eu não tinha direito de me sentir traída – Lorena,
entendendo minha angústia, abraça-me forte.
— Você sonhava com ele antes mesmo de conhecê-lo. Isso não é algo comum, Letícia.
Ainda abraçadas, ela dá batidinhas nas minhas costas.
— Pode soltar-me, Lorena. Já estou conformada.
— Tinha até esquecido que estava lhe segurando, Lê. Meus pensamentos estavam naquele
homem, nu, comendo a ruiva. Acho que até gozei! – engasgo-me com suas palavras. Às vezes, tenho
a impressão de que a minha amiga não é normal. — O que, Letícia? Vai dizer que em nenhum
momento você se imaginou no lugar da desbotada? Porque, vamos ser sinceras, a garota mora no
centro das tecnologias estéticas e não arranjou um produto que deixe o cabelo com vida?
Eu não tinha imaginado, só que agora.... Alguém bate à porta, avisando-nos que estamos
atrasados e minha fantasia evapora. Daquele momento até chegarmos ao hotel foi uma loucura.
Liam, Ethan e Zachary insistiam que iriam comigo no carro. Consequentemente, King e Kaleb
tinham que ir com seus chefes, não caberiam todos no carro, porque os caras são uns monstros de
grandes. Por fim, o trio e Lolo foram comigo e o táxi com os seguranças veio logo atrás.
Eu não sei se há algum problema entre Liam e Zachary, mas o clima amistoso passou a ser
tenso. Quando Liam comentou sobre meu apartamento, vi a tempestade nos olhos de Zachary e
tenho quase certeza que foi nesse momento que o tempo na cidade nublou. Quando chego ao hotel,
largo todos para trás e vou para o salão Azul, onde acontecerá a última reunião. Kevin está sentado
em uma das cadeiras, muito pálido.
— Meu Deus, Kevin. Está tudo bem?
— Estou mal. Fiquei no hospital desde que desembarquei, fugi da internação só para essa
reunião.
— Eu sei que a Vitrine é importante para você, mas morto não poderá fazer nada! Deveria
ter ficado no hospital, eu cuido de tudo.
Ele segura minha mão.
— Eu sei e te devo por isso. Fiquei sabendo sobre a festinha do Ethan, obrigado por
resolver.
— Esse é o meu trabalho, senhor Cooper – sorrio. — Fica tranquilo, eu conduzo a
despedida.
Todos começam a entrar e tomar seus assentos. Os empresários, seus assistentes e
seguranças lotam o salão azul. Venho tentando não pensar muito nesse momento, porque agora é o
momento em que eles me dirão se tem interesse em investir ou não.
Olho para Liam e sorrio. Despedir-me dele será doloroso, adorei conhecê-lo. Eu daria tudo
para me apaixonar por ele, tenho certeza que seria muito feliz. Ele é daqueles homens que zelam
pelo seu amor, cuidam, protegem, daria o mundo pela sua companheira. Qualquer mulher no mundo
será feliz ao lado dele. Continuo a olhar para cada um e sinto um prazer enorme em conhecê-los.
Sorrio para o King, desejando vê-lo novamente.
Meus olhos pousam no poderoso homem que faz-me tremer. Ele é perigosamente lindo,
daqueles que destroem o coração de uma mulher sem remorso algum. Ele não joga para perder e
passaria por cima da própria mãe caso precisasse. Zach é o oposto de Liam, jamais colocaria o
bem-estar da mulher acima do seu. Relacionamento sério não combina com ele, seria mais um
casamento por interesses comerciais. O amor de Zachary Thorton O´Brian é ele mesmo! Quem se
envolver com ele, terá que se contentar em ser o último item das suas prioridades.
Desvio o olhar e balanço a cabeça. Eu já tive o desprazer de viver com um protótipo de
Zachary, estive no inferno, comi o pão que o diabo amassou, foi minha quase morte. Agora o
destino traz a minha provável morte, muito irônico! Será fácil esquecê-lo depois que ele partir,
provavelmente nunca mais nos veremos novamente.
Chegou a hora.
— Boa tarde. Senhores, como muitos já têm voos planejados para hoje à noite, serei breve.
Logo que nos reunimos, foi entregue aos vossos assistentes uma pasta que continha alguns
documentos para a boa realização da reunião. Nesse momento, eu preciso que me entreguem o
documento restante da pasta, que é o contrato de investimento, onde deverá constar o nome do
projeto de seu interesse, o valor do investimento e a assinatura do pretenso investidor.
Lorena e Jônatas recebem todas as pastas e entregam-me. Enquanto abro as pastas, deixo a
palavra com Kevin, para fazer suas considerações. Ele faz o seu melhor. Levanta-se em um belo
discurso enquanto surpreendo-me com os resultados. Todos os projetos foram contemplados e mais,
o sheik quer investir pesado na formação de jogadores e colocou isso no papel. Respiro fundo e
agradeço a Deus em silêncio. Agora, tenho que colocar um intermediário competente para ficar
responsável por cada parceria.
— Menina Letícia – o sheik chama-me. — Os demais amigos e eu estivemos conversando
sobre o projeto do resort e chegamos à conclusão de que todos nós vamos participar. Formaremos
um grupo construtor para tornarmos aquele lugar um paraíso de férias. Decidimos que o
responsável pelos projetos e execuções será o Larkin, mas o grupo será presidido pelo Zachary –
eu estava tão emocionada e prestes a comemorar quando ele continuou: — Só que temos uma
condição e essa condição é que você complete essa diretoria junto com os dois. Conversamos com
o Cooper e ele disse que não há pessoa melhor para o completar o nosso quadro.
O sorriso no rosto de Zachary é demoníaco e aquele olhar disse-me como será. Você está
ferrada! Em contrapartida, será um prazer trabalhar com Liam. Volto à realidade e ouço Bashir:
— O escritório do Zachary cuidou de tudo e reuniremo-nos daqui a duas semanas, para
assinarmos nossa parceria, em uma grande festaem Abu Dhabi.
Fico sem palavras diante da grandiosidade do que está para acontecer. Os seis empresários
mais ricos do mundo se uniram para formar uma das maiores organizações construtoras e a
primeira obra será aqui, no Brasil.
— Fico imensamente honrada, sheik Bashir. Mas acredito que o próprio Kevin seja a
pessoa ideal para fazer parte dessa equipe de gigantes.
Zachary levanta-se.
— Não queremos mais ninguém além de você e isso já é assunto resolvido, senhorita
Barros. Você nos passou um valor estimado de quanto queriam pelas terras, achamos o preço
razoável, pode fechar o negócio. Se ele quiser um sinal, entre em contato comigo e providenciarei
imediatamente. Também tenho aqui... – ele abre um mapa e vejo que está demarcado. — Nós
também queremos essa parte aqui. Como eu sei que no Brasil as coisas são um pouco burocráticas
para se saber quem é o proprietário, tomei a liberdade de descobrir. Os donos vivem naquela
região, são nativos e tenho certeza que pedirão um valor baixo. Se não pedirem, convença-os.
Isso é o que irrita-me, eles sempre querem tirar proveito das pessoas.
— Senhor O´Brian, vou pagar a eles o real valor das terras. Nosso país não é mais colônia,
não aceitamos ser explorados. Quando lhes apresentei o projeto, passei-lhes minhas condições e
uma delas é fortalecer aquele povoado, e não destruí-lo. Caso isso não seja do seu agrado, retiro-
me do projeto e...
Martino pede calma.
— Essa mulher foi a escolha mais acertada. Letízia, tenha calma, cara mia. Negocie da
maneira que achar melhor. Temos certeza que você será sensata nisso, não é, Zachary?
— Talvez – o infeliz sorri. Será um martírio trabalhar com esse homem. O sheik volta a
falar:
— Letícia, eu quero que você vá aos Emirados Árabes para conhecer e discutir tudo o que
espero no projeto da minha casa. Assim, a menina tem a oportunidade de conhecer a terra das mil e
uma noites.
— Acho que todos nós queremos que você conheça os nossos costumes para poder passar
para o complexo – Martino fala. — Até porque quero minha vila mais parecida possível com a que
tenho na Itália.
Eles são acostumados a comandar e a mim só cabe executar.
— Já tenho data para cada visita? – pergunto sarcasticamente.
Assim que a assistente de Zachary entrega-me um cronograma, vejo quão irônica a vida é.
Não é que já tinham decidido minha agenda. Ela recita minha rotina pelas próximas semanas:
— Seremos responsáveis por todas as suas viagens, providenciaremos as passagens,
traslados e hotéis. A você cabe apenas comparecer. Sua primeira viagem será para Abu Dhabi e
seu embarque será daqui a doze dias. A próxima visita será em Cala Dogana, residência do senhor
Rossi, na Itália. Depois, encontrará com o senhor Khristophoros em Atenas, na Grécia. E, de lá, irá
para os Estados Unidos, onde você se reunirá com o senhor O´Brian.
Olho para Zachary. Se foi a secretária do Mister Ego que passou o meu roteiro, tenho
certeza que ele se ocupou pessoalmente do itinerário. E isso me irrita de uma maneira muito má.
Inferno! Eu faço meus horários, eu controlo tudo, e não ele.
— A Lorena irá acompanhá-la. Você precisará de uma pessoa de confiança e ninguém
melhor do que sua amiga para lhe auxiliar – Zach fala.
Odeio esse homem! Ele é lindo, mas o odeio! Gostoso, mas o odeio!
— Já que o senhor O´Brian resolveu tudo, acredito que não tenhamos mais nada a acertar.
Ignorei sua presença enquanto pude. Conversei com cada um sobre seus investimentos; no
caso da empresa de software, dois deles investiriam simultaneamente e, por livre e espontânea
pressão, fiquei responsável por intermediar todos. Nesses casos, já tínhamos contratos pré-prontos
e pudemos assinar três. Como sou intermediária, vou repassando os recursos, aos poucos, aos
destinados e enviando relatórios para os investidores.
— Estou ansioso para reencontrá-la, Letícia – Sebastian foi o primeiro a se despedir.
— Não entendi por que vamos nos encontrar na Grécia. Você não mora nos Estados Unidos?
– pergunto, curiosa.
— Você disse que um dos itens de sua lista de desejos era conhecer a Grécia, e eu posso lhe
proporcionar isso, em retribuição a como fomos recebidos em seu país – ele alcança minha mão e a
beija. — Será um enorme prazer, γλυκιά. Meu doce.
Assim que Sebastian se vai, Lorena puxa-me pelo braço até um canto:
— Quer, por favor, desfazer essa cara de desgosto? Olha, Zachary é assustador, mas fiquei
excitada...
Corto-a:
— Oi? Ficou excitada por que exatamente? Por ele ser um arrogante e um puto controlador?
Ou por ele ter me enfiado nisso sem ao menos convidar-me?
— Por tudo! – seus olhos negros brilham. — E se você me contar que, além dele ser
arrogante, também tem pau grande, eu me apaixono. Sabe como é, tenho tendência a me apaixonar
por egomaníacos.
Olho acima dos ombros dela e vejo Ethan bebendo novamente.
— Estou preocupada com Ethan, Lolo. Ele não parou de beber...
Ela levanta a mão, parando-me:
— Quero que o senhor Scott se foda! Que roupa eu tenho que levar para Abu Dhabi? – eu
sei que essa é a forma dela sofrer, fingir que não está nem aí para a situação. Mas também sei que
aquele coração dói ao vê-lo assim. Será que ele está com problemas? Ou se.... Não, não pode ser.
Será? Será que ele se apaixonou por ela?
Entre assinaturas e despedidas, ainda tive que atender os assistentes que tinham algumas
dúvidas a sanar. Assim que despeço-me do sheik e de Martino, vou ao encontro de Liam. De todos,
ele é o único que faço questão de despedir-me em particular. Saímos do salão e vamos para outra
sala, que o gerente gentilmente nos cedeu.
— Foi um prazer te conhecer, Letícia – Liam envolve-me em um abraço afetuoso. —
Mesmo que eu não tivesse fechado nenhum negócio, ainda teria valido a pena, só por te conhecer.
— Digo o mesmo, Liam – olho em seus olhos. — Adorei te conhecer.
Por um momento, achei que havia visto dor em seus olhos e o que falou em seguida deixou-
me ainda mais intrigada:
— A vida nem sempre é justa. E mantenha isso em mente, por mais que as coisas pareçam
ruins, pode não ser o que parece.
— A parte da vida não ser justa é o lema da minha vida.
— Eu te adoro, Letícia. Conte comigo para o que precisar, sempre! – ele beija-me no rosto
e se vai.
Restam no salão, conosco, somente Ethan, Zachary, seus respectivos assistentes e
seguranças. Ethan está entre a sobriedade e a embriaguez, com mau humor e com ideias loucas.
— Letícia, essa é uma lista de imóveis que Zachary e eu queremos comprar aqui no Rio –
isso não foi um pedido, foi uma ordem. E, até onde sei, tenho que responder a Zachary somente
quando for sobre a organização.
— Repassarei a Kimy os nomes de bons corretores.
Ele não muda sua postura e Ethan arrogante é insuportável.
— Não, eu quero que você faça! Ninguém negocia como Letícia Barros.
— Não será possível, Ethan.
— Você é a melhor e eu a quero!
Debruço-me em frente a ele:
— Tudo bem, senhor Scott. Eu intermediarei esse negócio para vocês. Enviarei a Kimy a
análise de cada imóvel e o valor dos meus honorários.
Sem dar chance a ninguém para responder ou puxar assunto, caminho até Kevin e saio à
francesa. Estou cansada, minha cabeça está cheia e ainda tenho que preparar os relatórios para
apresentar em breve. A última coisa que preciso é conversar com Zachary ou desfrutar a arrogância
de Ethan.
 
CAPÍTULO 13
 
Letícia
Pego a última folha que a impressora acabou de cuspir e a coloco na pasta. Mesmo cansada,
decidi fazer esses relatórios hoje. Alcanço minha caneca de café e bebo, contemplando pôster de
Nova York que tenho em casa, em meu escritório. Se Deus quiser e Ele há de querer, muito em
breve comprarei um imóvel naquela cidade. Absorta em meus sonhos, assusto-me com a
campainha. É tarde da noite, ninguém sobe sem ser anunciado. Estranho. Abro a porta e dou de cara
com Zachary.
— Boa noite, querida. Trouxe o seu jantar.
Inacreditável! Viro-me e entro, deixando a porta aberta.
— Eu não acredito que você controlará até a minha comida, senhor O´Brian? – falo irritada.
— Lorena estava preocupada. Disse que, se a conhece bem,provavelmente você estaria
trabalhando e não teria comido ainda. E, pelo seu mau humor, acredito que ela acertou – sorrindo
de canto, daquele jeito que o diabo gosta, fala:
— Acertou – digo a contragosto. Lorena não me ajuda em nada mesmo!
Ele foi em direção a minha cozinha e colocou as sacolas sobre a pia. Abriu todos os
armários até encontrar os pratos e as taças de vinho, dispondo-as sobre a bancada. Observei a
desenvoltura daquele homem, ocupando todo o espaço da minha pequena cozinha.
— A boneca Lolo buscou no restaurante do hotel. Caso não goste, cobre dela – ele pisca e
meu corpo acorda. — Sente-se, Letícia. Vou lhe servir.
Sentei em uma das banquetas que cercam a bancada.
— Lorena está com Ethan? – Zachary abre a geladeira e tira alguns molhos para salada,
colocando-os em frente a mim. Abre o vinho que trouxe e serve duas taças, estendendo uma para
mim.
— Lorena foi embora não muito tempo depois de você. E Ethan partiu essa noite – a coisa é
mais séria do que pensei.
— Fiquei preocupada com ele, algo muito sério deve estar acontecendo – Zach coloca um
prato de salada a minha frente.
— Ethan está sofrendo de uma grave doença, Letícia.
Um nó forma-se em minha garganta.
— Paixão. Ele está apaixonado por sua amiga Lolo – olho-o feio. Ele não se intimida e
continua: — A paixão, senhorita Letícia, pode ser letal. As pessoas acham que podem fazer as
piores atrocidades do mundo usando o amor como desculpa e serão perdoadas. Esse é um dos
motivos de eu querer distância do tal amor.
Meu coração aperta e meus olhos ardem. Pisco algumas vezes para evitar a angústia e as
lágrimas. Não sei o porquê dessa reação às palavras dele. Ultimamente, coisas sem motivos mexem
comigo.
— O amor é para os fortes, senhor O´Brian. Só se entrega de verdade quem tem coragem de
viver.
Zachary aproxima seu rosto do meu até ficarmos a uma respiração de distância.
— Você é forte ou fraca, Letícia?
O que você quiser que eu seja! Como ainda não enlouqueci, guardo isso para mim. Desvio
meu olhar do seu.
— Não sei.
Quando Zachary não está tentando me ferrar, ele é uma excelente companhia. Apesar de
estar excitada desde o momento em que abri a porta, tivemos uma agradável conversa e eu pude
conhecer mais dele. Fiquei sabendo sobre seu breve noivado que acabou por ciúmes, que seus pais
são divorciados e ambos gostam de viver novos romances. Zach é franco e direto, não se importa
em abrir sua vida para os outros. E isso atrai-me ainda mais.
Sentamos no sofá, confortáveis.
— Sei que a sua vida é corrida, Zachary, mas o que gosta de fazer para se distrair?
— Nadar, jogar golfe, viajar. Coisas simples. E você, menina dos olhos dourados?
— Gosto muito de correr à beira mar, ler também. Agora, quando estou em casa de pernas
para o ar, eu assisto... – paro de falar para não envergonhar-me. Ele tira a minha mão da boca.
— Diga, estou curioso.
— Não é na-nada. É meio constrangedor.
Ele passa a mão pelo meu rosto, deslizando seu polegar pelos meus lábios.
— Nada que saia daqui pode ser constrangedor.
Perco completamente a noção da realidade. Por onde seus dedos passam, brasas acendem
em minha pele, fazendo-me suar. Solto meu segredo sem insistência.
— Desenhos animados. Eu amo desenhos animados. Não só essas novas animações cheias
de efeitos. Gosto mais das antigas – sinto seu corpo tencionar e meu constrangimento eleva-se. —
Eu sei que é infantil, mas é algo que me faz sentir bem. Eu tenho pijamas de vários deles.
— Você é surpreendente – seu olhar intenso prede-me. — E linda.
— Beije-me, Zachary.
Ele emoldura meu rosto entre suas mãos.
— Com prazer.
O beijo é inexplicável. Doce, paciente, como se quisesse transmitir seus sentimentos. Um
misto de sensações passa pelo meu corpo quando seus beijos doces passam a ser carnais. Zach
puxa-me para o seu colo e enlaça-me forte com seus braços. Não contenho meus gemidos quando
seus lábios fazem o caminho do pescoço e voltam para a minha boca. Suas mãos percorrem meu
corpo sobre a roupa, o calor é tão intenso que, mesmo com os tecidos entre nós, suas mãos
queimam.
— Zachary...
— Cada vez que você pronuncia meu nome, a desejo ainda mais, baby.
Quando sua mão toca minha pele sob a camisa que visto, a campainha toca e Zachary
amaldiçoa. — Não responda. Quem quer que seja pode esperar.
A campainha insiste e, desvencilhando-me dele, vou atender. Assim que abro a porta,
encontro King sem jeito. Sinto seu corpo quente logo atrás de mim. E sua proteção comove-me.
— Desculpa incomodar, Letícia – ele beija meu rosto antes de olhar além de mim. —
Temos que ir, senhor.
— Porra, King! Sempre nos piores momentos. Timing de merda esse seu – ele resmunga,
King e eu rimos. — Vou me despedir de Letícia e já desço.
Zachary fecha a porta e pressiona-me contra ela. Seus olhos travam nos meus e sua boca na
minha. Ele levanta minhas pernas e as enrolo na cintura dele. Não há espaços entre nós, e percebo
que o meu corpo foi feito para encaixar no dele. Com muito custo, separo minha boca da sua.
— Não quero te atrasar – mordo seu lábio inferior.
Seu olhar tem um poder sobrenatural sobre mim. Capaz de fazer com que eu submeta-me a
qualquer coisa que ele queira. Posso ver em seus profundos olhos azuis, admiração, desejo e mais
alguma coisa que não identifico cruzam seus olhos. No segundo seguinte, a barreira de gelo está lá
novamente.
— Nos veremos em breve – ele me coloca no chão, abre a porta e, antes de ir, beija-me. —
Sonhe comigo, anjo – desde quando precisa que ele mande sonhar para sonhar com ele? O infeliz
gostoso invadia meus sonhos mesmo antes de conhecê-lo, já me tinha, antes mesmo de eu saber que
ele existia.
Minha noite foi tranquila, dormi como uma pedra. Como de costume, levantei antes do
despertador, coloquei minha roupa e fui correr na praia. Uma corrida rápida, porque estou ansiosa
para chegar no escritório e fazer minha proposta de compra para o Kevin. Deus, pouco nessa vida
te pedi, aceitei as coisas dadas da melhor maneira possível. Só que hoje preciso da sua ajuda,
aquele apartamento é o meu sonho, ajude-me a conquistá-lo, por favor.
Meu dia estava muito cheio e eu precisava da ajuda de Lorena para ver as casas. Mas como
eu iria dizer a ela que um desses imóveis seria para Ethan? Vou até a mesa dela e vejo minha amiga
abatida, com olheiras profundas e muito pálida.
— Lolo, se quiser, pode voltar para a casa – passo meu braço pelo seu ombro. —
Descanse. Eu acho que suas olheiras criaram vida.
Ela sorri timidamente.
— Prefiro ocupar minha cabeça. Logo estarei bem novamente.
Minha vontade é de pegar um avião e quebrar a cara dele. Babaca!
— Eu preciso de um favor, Lolo. Quero que você descubra a imobiliária que esses imóveis
estão cadastrados e agende uma visita ainda essa semana. Vou entregar os relatórios para o Kevin
agora e, se as visitas puderem começar após o almoço de hoje, serei grata.
— Essas casas não fazem seu tipo, Lê.
— Não são para mim. Alguns empresários se interessaram pela cidade. Então, faremos esse
favor a eles.
— Ok.
Se Ethan aparecer a minha frente, juro que castrarei aquele infeliz! Caminho para a sala do
Kevin e encontro Jônatas no meio do caminho.
— Como está seu chefe hoje, Jô?
— De ótimo humor!
O jovem rapaz abre a porta para que eu entre. Kevin realmente parece melhor, está até
corado.
— Bom dia, chefe. Vejo que está bem melhor.
Ele dá a volta na mesa e me cumprimenta com um beijo no rosto, como de costume.
— Estou bem, sim, só não esperava você aqui hoje pela manhã.
— Vim entregar os relatórios. Atrás, coloquei os gráficos e fiz uma tabela para detalhar
todos os dados. Nossa estimativa inicial é de quase cem milhões de dólares em investimentos. Mas,
se o sheik concretizar os planos sobre a instituição em busca e lapidação de talentos desportivos,
nós podemos ultrapassar a casa dos cento e vinte milhões.
— Foi a melhor edição da Vitrine. Fico muito feliz que tenhamos alcançado grandes
investimentos, Letícia. Tenho que te agradecer pelo excelente trabalho que você fez. Para todos os
apresentadores da Vitrine, douum bônus de acordo com o valor das negociações. Esse é o seu.
Ele me alcança um pedaço de papel com muitos zeros escritos.
— Kevin, é muito alto! Dois milhões e meio, é muita coisa.
— Muito merecido. Você trabalhou arduamente para que tudo saísse perfeito. Teve a
delicadeza de entrar na onda de encontros que Zachary te colocou.
É agora ou nunca.
— Kevin, você ainda pensa em vender aquele seu apartamento da Upper East Side?
Ele cruza os braços sobre a mesa.
— Tinha me esquecido. Por que, tem alguém em vista?
— Sim, tenho. O valor continua o mesmo? – ele assente. E eu continuo: — Você tem tempo
para ouvir uma história, senhor Cooper?
Ele sorri e recosta em sua cadeira.
— As suas, sempre!
Levanto-me, vou até a janela e começo minha história.
— O pretenso comprador teve muitas perdas durante sua vida. Mas, a cada perda, um sonho
ia se fortalecendo, o de ser alguém na vida. Seu maior sonho sempre foi estar em Nova York, onde
as coisas acontecem. Ela trabalhou muito, adquiriu algum dinheiro, tendo sempre em mente que um
dia iria adquirir um imóvel na terra de seus sonhos – viro-me para ver sua expressão e fico
surpresa com a emoção em seus olhos. — Ter aquele apartamento é a concretização dos seus
sonhos. Mesmo que depois ela tenha que trabalhar mais uma vida para juntar dinheiro para viver.
Só que a realização de um sonho não tem preço, a satisfação da vitória vale uma vida de perdas.
Ele se levanta e vem até mim.
— Eu conheço essa história. Muitas vezes, quando as coisas estão mal, olho para o pretenso
comprador e vejo o real significado de superação e perseverança. O apartamento é seu, Letícia.
Não contenho as lágrimas. Ninguém imagina o que se passa no meu coração, ninguém faz
ideia do quanto isso é importante para mim. Obrigada, Deus! Obrigada por esse presente!
Ainda emocionada, tento recompor-me para discutir a realidade.
— Só temos que negociar o valor e o pagamento, Kevin. Tenho algumas aplicações...
— Eu já tinha te passado algum valor? – ele pergunta.
— Lembro que você pediu para providenciarem uma avaliação e nos retornaram com o
valor de um milhão e cento e cinquenta mil dólares. Mas a minha proposta é de novecentos e
noventa mil, Kevin. Porque os tramites da transferência de propriedade ficam por conta do
comprador.
— Vendido, senhorita Letícia Sophie Barros! – ele estende a mão para fechar nosso acordo.
— O apartamento é seu por novecentos mil dólares.
— Oh, Deus! – abraço-o. — Você não sabe o que isso significa para mim, Kevin. É a
realização de uma vida.
— Eu sei. Você não é só uma funcionária da Global, Letícia. Você é uma amiga querida que
tive o privilégio de ter ao meu lado. Vou mandar o pessoal do escritório de Nova York dar entrada
na papelada para você assinar quando estiver lá. Você realmente gostou daquele apartamento, não
é?
— Foi amor à primeira vista.
Kevin volta a se sentar e mexe em alguns papéis.
— Não querendo estragar sua felicidade, mas já o fazendo, você viaja daqui a uns dias, tem
que negociar com o espanhol proprietário daquelas terras. O que me faz lembrar outro assunto, o
acordo do grupo que será formado.
— Terei um aumento? – um aumento depois de comprar um imóvel caro é bem-vindo!
Apesar de eu faturar muito bem.
— Não – comemorei cedo demais. — Letícia, você receberá como acionista do grupo, a
Global também receberá até o término da obra.
— Não entendi... – eu sou inteligente, mas minha cabeça deu um branco.
— Você é sócia deles na organização, e não uma funcionária, terá poder de voto e receberá
lucros como todos. Pelo que entendi, todos concordaram que você terá o mesmo percentual de
participação que todos os outros. Vocês repassarão todos os itens do contrato em Abu Dhabi –
estou CHOCADA! O telefone sobre a mesa toca e ele atende: — Sim. Estou passando para ela,
Lorena.
— Oi...
— Lê, as visitas começarão logo após o almoço, como você pediu. Como os imóveis
listados são muito próximos uns dos outros e são da mesma corretora, você poderá ver todos os
imóveis hoje.
— Tudo bem, eu só preciso almoçar antes de ir e você irá comigo.
— Ok – ela fala e desligamos.
— Ethan e Zachary querem comprar casas aqui. Deram-me uma lista de imóveis para visitar
e fazer ofertas. Tenho que levar Lolo porque desconfio que a intenção do Ethan seja essa – explico.
— Boa sorte – ele fala, sorrindo.
Vou em direção à porta e falo antes de ir:
— Você realizou o sonho da minha vida. Serei eternamente grata, senhor Cooper.
Ele balançou a cabeça em negativa.
— Não, nada de senhor Cooper. E, não, não realizei nada, você conquistou o seu sonho. Vá
comemorar, menina. Você merece!
Volto correndo para minha sala e carrego Lolo comigo. Ela coloca a mão na cintura.
— O que você fez, Letícia? De quem é o corpo que teremos que esconder?
— Primeiro, quero saber qual é o seu maior sonho – pergunto a Lorena.
Ela pensa e responde:
— Reformar o apartamento da mamãe e dar a viagem que ela sempre sonhou para Portugal.
E o seu?
— E para você, Lorena? Qual o seu sonho, para você? – insisto.
Ela estreita seus olhos em minha direção e senta-se em uma das cadeiras.
— O que está acontecendo, Letícia?
Balanço a cabeça, sorrindo.
— Prometo que tem propósito. Apenas diga-me, qual é o seu sonho?
— Esse é meu sonho, Lê. Ver minha mãe feliz.
Abaixo-me diante dela:
— Então, considere seu sonho realizado! – ela olha-me sem entender. Alcanço sua mão e
continuo: — Quando cheguei à empresa, conheci uma menina com rostinho de boneca que se
apresentou como minha secretária. Além de linda, ela era engraçada, fazia-me rir todo o tempo. Ela
nunca soube a importância de cada palavra que saia da sua boca. Inesperadamente, ela levou-me
para sua casa e sua mãe acolheu-me como filha. Ambas adotaram-me de coração, amaram-me como
se eu fosse seu sangue e cuidam de mim até hoje – ela seca as lágrimas que caem de seus olhos.
— Espero que você tenha um bom motivo para me fazer chorar.
Sorrio.
— Eu tenho. Lorena, eu sempre tive um sonho, nunca contei a ninguém porque as pessoas
achariam loucura...
— Nossa, Letícia. Segredos para mim? – ela questiona.
— Sabe aquelas coisas que a gente sonha acordada, como um conto de fadas? Coisas
impossíveis que fazem parte do nosso imaginário? Então, meu sonho era um desses. Lembra do
apartamento do Kevin, aquele em que ficamos hospedadas? – ela assente. — Desde o dia que
entramos lá, ele se tornou meu sonho. Venho guardando tudo o que posso para fazer uma oferta.
Ganho bem e tenho aplicações que rendem um bom dinheiro, mas ainda era pouco. Eu contaria com
a boa vontade dele para financiar o restante. Só que, com o bônus da Vitrine, eu pude comprar o
apartamento à vista, Lorena.
Ela coloca as mãos na boca e depois me abraça.
— Parabéns, parabéns, parabéns!
— Só consegui tudo isso porque tenho uma família que me apoia e me ama. Nada faz
sentido se eu não puder compartilhar com vocês duas – ela puxa-me e pulamos juntas. —
Comemoraremos mais tarde. Tenho que ligar para o espanhol e temos que ver os imóveis.
Passei a tarde ocupada, visitando as casas e negociando com o empresário. O espanhol
aumentou o valor na esperança de ganhar mais. Mas, por livre e espontânea pressão, ele baixou. A
ganância pode destruir o homem. De todas a casas que vi até agora, essa, que é a quinta, é a mais
deslumbrante. Perfeita para Zachary. Mesmo não o conhecendo muito bem, posso garantir que ele
vai adorar.
A casa é enorme e, como é construída em uma encosta, totaliza quatro andares. O quarto
principal que fica no terceiro piso tem uma grande varanda em estilo deck, com parapeitos em
vidro e aço, dois banheiros e dois closets. Cada andar possui dois quartos menores que o principal,
mas igualmente lindos. A varanda de todos eles dão uma visão espetacular para a praia de Ipanema
e Arpoador. A sala de jantar tem uma bela varanda com vista para o mar e para o jardim. Há uma
sala de cinema, outra sala ampla com lareira e acesso ao jardim com jacuzzi, sauna e uma área de
lazer ao ar livre com churrasqueira. Todos os andares da casa estão ligados por um elevadorinterno. O último andar é um grande terraço com uma parte em deck, parcialmente coberto, com
uma cozinha e área de jantar extra. À esquerda há uma plataforma que dá acesso à praia privada.
Nenhuma casa de filme ou novela faz jus a essa, é fora de qualquer realidade que eu
poderia ter. Bati fotos para enviar a ele logo à noite, tenho certeza que vai aprovar. Fiz uma oferta
generosa, levando em consideração a crise no mercado imobiliário.
Enquanto ia para a última visita do dia, liguei pela última vez para o Ramón Santiago para
dar a boa notícia de que compraremos seu ex quase futuro empreendimento pelo preço acordado na
minha última ligação, e o muchacho queria negociar até as licenças, vê se pode?
— Ramón, essa é minha proposta final. Se não estiver satisfeito com o valor, desejo-lhe
boa sorte em outra negociação – o cara está com a corda no pescoço e ainda quer tirar tudo o que
pode. Não precisei de mais do que isso para fechar negócio. Faço mais uma anotação para enviar a
Zachary, deixando-o a par de que consegui um preço melhor e para transferir o sinal para o
espanhol.
A última visita era a cinco casas daquela que gostei para Zachary. O lugar é espetacular!
Como estava anoitecendo, as luzes exteriores eram azuis e ligavam uma a uma, nos dando uma
visão esplendorosa do lugar. Ela também foi construída na encosta e tem três andares. Entramos
pelo segundo andar, diretamente na sala de estar com lareira. Nesse andar, há um amplo salão
principal com vários ambientes internos e externos, como: sala de jantar, salão de jogos, um lindo
jardim de inverno e uma suíte maravilhosa.
No andar inferior, vimos uma adega, cozinha com integração para outra sala com home
theater, um escritório enorme todo em vidro e a área da piscina. A área de deck externo tem
lareira e a piscina com cascata é uma obra de arte. No canto onde se vê muitas plantas, entramos
por uma porta de vidro e vimos outra suíte.
Não há palavras para descrever a beleza do andar superior. São três suítes, todas com
varanda. A suíte Master é tão impressionante quanto o tamanho da cama. Uma das paredes é toda
em vidro e se abre para uma varanda privada. Há uma jacuzzi e deck de frente para o mar. O
banheiro é do tamanho do meu apartamento, com uma hidromassagem do tamanho da minha cama.
Olha, eu moraria aqui sem problema nenhum! Todos os cômodos da casa têm uma vista
avassaladora para o mar e para o verde. Encontro Lorena na beira da piscina que está toda
iluminada com luzes de led azuis.
— Algum problema, Lolo? – pergunto.
— É simplesmente lindo, Lê! Olha essa vista. Daqui da piscina, dá para ver o mar. Essa
beleza emociona-me.
Era tudo o que eu precisava para fazer uma oferta. Ethan vai adorar o lugar.
Depois de um longo dia e de um banho revigorante, sento no pequeno escritório do meu
apartamento. Envio um e-mail para um famoso arquiteto, para trabalhar na reforma do apartamento
da tia Aurora. Como não tenho acesso direto a Zachary, envio dois e-mails para sua assistente,
Maggie, que faz o tipo sonsa. E como minha avó dizia: As sonsas são sempre as piores. Tento falar
com Ethan, mas infelizmente não consigo. Seu telefone pessoal está desligado e em sua residência
disseram-me que ele não está. Ligo para sua assistente, Kimy, que atende no terceiro toque.
— Olá, Kimy. É a Letícia Barros. Tudo bem?
— Oi, Letícia. Tudo bem e com você?
— Tudo ótimo! Desculpe incomodá-la a uma hora dessas, tentei ligar para o Ethan só que
ele não atende. E eu precisava passar as informações sobre o imóvel.
— O senhor Scott surtou na viagem de volta, Letícia. Ninguém entendeu o que ele dizia,
somente Kaleb. A única coisa que sei é que ele embarcou e seu destino é desconhecido –
despedimo-nos e desligo, pensativa. Ethan está me deixando cada vez mais preocupada. Algo me
diz que algo grande está vindo por aí.
* * *
Acordo com o som estridente do interfone. Olho para o relógio e vejo que são dez horas.
Ontem, enviei mensagem para Lolo, dizendo que hoje ficarei em casa. Caminho até a cozinha e
atendo:
— Bom dia, dona Letícia. Tem dois gringos aqui querendo falar com a senhora.
— Quais são os nomes deles, Almeida?
— Virgimaria, dona Letícia. Sei perguntar isso, não. Ele só fala Letixia, Letixia.
Rio com a sua narração.
— Aponte para ele e fale name – instruo o porteiro.
Ele pergunta e ouço Ethan responder ao fundo.
— Ele tá dizendo Itan, dona Letícia.
— Traga-o até aqui, Almeida. Eles são meus amigos.
— Sim, senhora.
Corro até o banheiro, faço uma higiene rápida e volto a tempo para atender a porta.
— Ethan... – ele e Kaleb entram e fecho a porta, após agradecer ao porteiro. O homem a
minha frente é um rascunho daquele Ethan que conheço. Olheiras arroxeadas sombreiam seus lindos
olhos, há marcas de expressões e nenhum sorriso à vista. — O que houve, Ethan?
Lágrimas caem de seus olhos. Puxo-o para um abraço e sinto seu corpo tremer. É até pecado
um homem desses chorando.
— Eu preciso dela, Letícia. Eu preciso dela.
— Precisa de Lorena? – pergunto para constatar.
— Sim.
Desvencilho-me dele e viro-me para Kaleb.
— Há quanto tempo ele está assim?
— Desde que a menina rompeu com ele. Desde então, ele bebe demais, não trabalha, não se
alimenta. Acho que não toma banho há dias.
Observo Ethan jogando-se em meu sofá, olhando para o nada. Meu coração aperta com a
visão. Vou até o armário e pego um milagroso remédio que a tia Aurora nos dá quando não estamos
bem. Sabe aqueles comprimidinhos que nos fazem dormir contra a nossa vontade? Esses! Não
demorou muito para os olhos de Ethan começarem a fechar. Pedi a Kaleb para levá-lo para o meu
quarto.
— Kaleb, você fica com o quarto de hóspedes para descansar. Enquanto isso, eu vou
providenciar algo para vocês comerem.
Enquanto caminho para o mercado perto do condomínio, penso em Ethan e em como
assustei-me ao ver seu estado. Meu peito apertou por ver tanta dor em seus olhos. Fico muito feliz
por ele ter vindo atrás dela. Isso mostra o quanto seus sentimentos por ela são fortes. Eu acredito
que o amor seja poderoso e sou a prova de que é devastador quando não somos correspondidos.
Ligo para a tia Aurora e conto toda a história da Lolo e Ethan. Falo para ela que ele está no
Brasil para vê-la. No começo, a tia ficou com receio, afinal ele era o motivo das lágrimas do seu
bebê. Mas, no fim, ela concordou em ajudar-me no reencontro do casal. Também ligo para a Lorena
e marco um jantar em um restaurante chique. Lolo acha estranho, mas concorda numa boa. Como
eles continuam a dormir, repasso meus e-mails. Recebo as mensagens da imobiliária, dizendo que
os proprietários aceitaram a proposta. Encaminho para a assistente do Zachary com os detalhes da
negociação do imóvel e da compra das terras para o resort.
Em meio aos afazeres, perco-me em um delírio onde Zachary bate em minha porta para me
ver, com a mesma intensidade de Ethan. Sou boba mesmo. Não será nessa vida que Zachary
Thorton O´Brian fará isso. Nosso último encontro não sai da minha cabeça. Lembro de cada
sensação que senti com suas mãos percorrendo meu corpo e da sua boca na minha. Eu não sou uma
pessoa muito romântica, mas tenho meus momentos de carência. Sonho com um amor que cuide de
mim, que queira-me somente para si. Sonho com um príncipe encantado, mesmo que ele seja um
sapo.
No final da tarde, Ethan acorda e toma um banho. Revigorado, senta-se no sofá e eu sirvo
um lanche. Aguardo ele se alimentar o suficiente para ter uma conversa.
— Agora vamos conversar, senhor Scott. O que aconteceu com você, Ethan?
— Quando Lorena disse que não iria embora comigo, desesperei-me. Foi quando me dei
conta de que estava apaixonado por ela e tive o motivo perfeito para afastá-la. Bebi feito um louco,
atormentei todo mundo e fui embora. E, desde que fui, quis voltar. Estou há dias sem dormir e
comer. Cada minuto que passa, a dor piora, sinto como se rasgassem meu peito – seu olhar encontra
o meu. —Eu preciso dela, Letícia.
— Fico muito feliz que você tenha voltado por ela. Mas, Ethan, o coração dela não é um
objeto que você pode pegar e soltara todo o momento. Tem certeza de que a quer de verdade? Para
fazê-la feliz de verdade? Ela é minha irmã, Ethan, minha boneca Lolo. Não permitirei que você a
faça sofrer mais do que já fez. E eu não me importarei se tiver que passar por cima de você,
querido.
Ele sorri.
— Você pode não acreditar, Letícia, mas estou completamente apaixonado pela boneca
Lolo.
— Acredito, Ethan. E, por isso, vou te ajudar a encontrá-la hoje. Mas não faça com que eu
me arrependa disso, senhor Scott.
Nesse momento, o celular dele toca e vou para a cozinha.
— Oi. Estou no Rio. Sim. Na casa da Letícia. Sim. Não. Vai tomar no cu, Zach! Tenho
vivido um inferno por causa daquela mulher e preciso da Letícia para encontrá-la. Cara, tranca a
mulher em seu quarto... – por que ele está discutindo com Zachary? Finjo-me de estátua para ouvir
mais um pouquinho. — Como você pode ser tão possessivo com uma pessoa que nem é sua? Vá se
foder, Zach. Vou ficar aqui até ter o que eu quero.
Ethan desliga o telefone e o coloca de lado.
— Tudo bem? – pergunto.
Ele abre um grande sorriso, mostrando-me que o velho Ethan Scott está de volta.
— Você não faz ideia do quanto é divertido atormentar Zach – seu telefone toca novamente
e ele atende: — Isso tudo é saudade do meu pau, cara? Vou passar – Ethan coloca o telefone em
minha mão e caminha em direção ao quarto. — Ligação para você, senhorita Letícia.
— Alô?
Ouço uma voz profunda, uma velha conhecida que arrepia-me.
— Letícia...
Meu coração está acelerado, só por ouvir sua voz.
— O-oi – posso parecer mais patética?
— Como está, menina dos olhos dourados?
— Estou bem. E você?
— Só não estou melhor porque Ethan está aí – ele faz um som de nojo.
Sorrio.
— Ele veio reconquistar seu amor, deixe-o em paz. Foi bom ter ligado, eu precisava falar
com você, mas não tenho seus contatos pessoais – essa voz de adolescente é minha? De onde
saiu?
— Passa-me seu e-mail que, em minutos, respondo com todos esses detalhes. O que quer
falar comigo?
— Sobre os imóveis, e-eu... – limpo a garganta. — Encontrei um especial e fiz uma oferta
que foi aceita. Enviei as fotos e os detalhes da negociação para a Maggie – por um momento, achei
que ele tinha desligado. — Zachary?
— Sim, little girl. Estava desfrutando da sua voz.
Por que ele faz isso? Estou a um passo de pegar o primeiro avião para vê-lo.
— Tenho certeza de que gostará da casa.
— Eu sei que...
Olho para o aparelho que está mudo e vejo que a bateria acabou. NÃÃÃÃOO! Ai Deus, por
quê?
Vou até o quarto e jogo o celular para Ethan, que está confortável em minha cama.
— Você sabia que existe uma coisa chamada carregador?
Ele ri.
— Pelo jeito, a ligação foi cortada.
Bufo.
— Quero te mostrar algo – alcanço meu celular e mostro as fotos que bati da casa que fiz
uma oferta para ele. — Saiba que olhei todas as casas da lista, era um lugar melhor que o outro.
Mas teve uma que foi... diferente. Ethan olha-me com curiosidade. — Quando entrei nessa casa, eu
soube que tinha sido feita para você e minha confirmação veio com essa imagem.
Lorena sorria enquanto as luzes da piscina iam acendendo. Eu estava fazendo uma anotação,
mas a imagem era tão bela, que eu tinha que registrar. Sabia que Ethan iria gostar. Ele pega o
telefone da minha mão e contempla a foto por alguns segundos estendidos.
— Tão perfeita quanto ela. A casa é minha! – não falei?
Conversamos durante um tempo sobre o valor e como toda a negociação aconteceria. Ele
prefere que eu seja sua representante legal para isso, então, já mandei um e-mail para o corretor
fechando o negócio. Arrumamo-nos para ir ao restaurante e Ethan queria alugar um carro com
motorista a todo custo.
— Não mesmo! Eu dirijo. Minha cidade, minhas regras.
Assim que entramos, Lorena percebe quem está atrás de mim e, em questão de segundos, ela
empurra tudo em seu caminho para chegar a Ethan e joga-se em seus braços. Todos no restaurante
aplaudem a cena. É tão lindo! Sentamos à mesa com a intenção de comer, o que demorou uma vida,
já que os dois queriam namorar. Fiz prometerem que só iam se pegar quando estivessem a sós,
porque, pelo andar da carruagem, os coelhos ali iam se pegar em qualquer lugar.
Enquanto eles descansavam essa tarde, tratei de fazer as reservas das suítes e do carro.
Imaginei que o casal iria virar a noite, um nos braços do outro. Voltei para o meu apartamento,
solitário como sempre, pensei em ligar o computador e trabalhar, mas uma tristeza bateu e fui para
cama. É ruim estar sozinha, a solidão às vezes maltrata. Cada dia que passa, sinto-me mais distante
de um amor, apesar de ter uma fagulha aqui dentro. Eu sei que estou a um passo de amar alguém que
não me amará de volta. Amor não faz o estilo de Zachary.
Os dias seguintes foram corridos e muito divertidos. Ethan foi conhecer a mãe da Lorena e,
como sempre, conquistou a mulher de primeira. A imobiliária aceitou que ele entrasse no imóvel
mediante a um caução, até a transferência ser concluída. A casa já era toda mobiliada e já tinha um
quadro de funcionários completo, facilitando a mudança de Ethan. Como ele tem um império para
cuidar, teve que voltar aos Estados Unidos. Prometeram de se encontrarem nos Emirados Árabes,
em quatro dias.
Os quatro dias mais rápidos da história! Corri como uma louca para dar conta de tudo e
ainda arrumar minhas coisas para a viagem. Lorena teve um pequeno imprevisto com seu
passaporte, mas, no fim, tudo deu certo, graças a Deus! O embarque foi tranquilo, só não entendi
por que faríamos uma conexão em Londres, sendo que há voos diretos de São Paulo para Abu
Dhabi. Enfim, a mim cabe apenas desfrutar.
A primeira parte do voo foi tranquila. Ri muito com a Lorena, li um romance que me deixou
literalmente nas nuvens e dormi um pouco. Assim que desembarcamos em Londres, um motorista
estava a nossa espera e, de limusine, fomos até a outra parte do aeroporto, onde um jatinho nos
esperava. O motorista nos disse que pertence ao sheik Bashir e que estava aqui para nos levar a
Abu Dhabi. Não precisamos passar por nenhum tipo de revista ou burocracia. Como é fácil ser
rico!
O jatinho, por dentro, era extravagante demais, dourado demais, cheguei demais, mas era
ouro! Serviram-nos champanhe, caviar e alguns pratos típicos dos Emirados. Enfim, fomos tratadas
como rainhas, só a reação da Lolo não era digna da realeza.
— Eu prefiro espumante, cidra, essas coisas que são docinhas. Esse Dom Perdigão não é
para mim...
— Dom Perignon, Lorena – corrijo-a. A menina tinha bebido um pouquinho demais.
— Pode ser Perdigão, Seara, Sadia, detestei da mesma maneira. Gente, como alguém pode
comer ova de peixe e pagar caro por isso? Prefiro um pirão de caldo de peixe.
— Eis a futura senhora Ethan Scott, chiquérrima, elegante, o orgulho da Glorinha Khalil no
Brasil – falo, rindo.
— Cala a boca, Letícia! Eu nasci para ser rica. Olha para mim, sou a cara da riqueza.
Depois dela colocar todo o caviar que comeu para fora e se embebedar com vinho, cai em
um sono profundo. Enquanto isso, tento trabalhar para ocupar minha cabeça, mas com Zachary a
preenchendo foi impossível! Nenhum homem tem esse efeito sobre mim, nem mesmo o meu ex, que
foi meu primeiro em todos os sentidos.
Será que ele virá para a assinatura do contrato? Eu realmente desejo vê-lo. Fiquei um
pouco decepcionada por ele ter pedido para que eu fosse a representante legal na compra da casa.
Esperava que ele fosse conhecer a casa e quem sabe... ver-me. Mas não Zachary. E não nessa vida.
 
CAPÍTULO 14
 
Letícia
Desembarcamos no clima quente e seco de Abu Dhabi. No caminho para o hotel, pude ter
ideia de como é o lugar, a paisagem é um presente divino. Uma alegria imensa invade meu peito,
pois jamais pensei em chegar aqui. Já era final de tarde quando nos aproximamos do hotel
Emirates Palace, fiquei impressionada com a grandiosidade do lugar.
A entrada é ladeada por palmeiras com o majestoso hotel ao fundo, mais iluminado do que
uma cidade inteira.
— É muita luz para minha ressaca – Lorena fala enquanto procura seus óculos escuros na
bolsa.
— Sejam bem-vindasa Abu Dabhi, senhoritas – fomos recepcionadas pelo secretário do
sheik, Hamdan. — É um prazer tê-las em nossa terra, faremos tudo para que vossa estadia seja
confortável.
— Obrigada, Hamdan – eu o cumprimento e Lorena apenas acena e dá um sorriso torto. —
Desculpe-a. Ela não está passando muito bem.
Ele acena em entendimento.
— Quer que eu chame um médico? – Lolo diz que não e Hamdan prossegue: — Os
carregadores levarão suas coisas ao apartamento em que ficarão instaladas. Acompanhem-me, por
favor.
Fomos escoltadas até o apartamento em que nos hospedaremos. Quando Hamdan abre as
portas duplas, fico maravilhada. O apartamento é um apartamento mesmo! Na sala de estar, há dois
sofás marfim com detalhes dourados, uma mesa de centro e as cortinas são um cinza pálido,
deixando todo o lugar delicado. O próximo cômodo é a sala de jantar com uma mesa de mármore
marfim e quatro cadeiras, que mais parecem poltronas de tão fofas que são. O tecido do estofado é
o mesmo dos sofás. Tudo impecável.
Minha suíte é linda! A cama é enorme, sua cabeceira ocupa meia parede toda em detalhes
dourados. Um grande sofá marfim e dourado, uma escrivaninha e uma mesa compõem os móveis do
quarto. O teto é alto, tipo uma abóboda, pintado de cinza pálido com detalhes em marfim e há duas
colunas revestidas de mármore rosado. As cortinas seguem o mesmo padrão dos estofados, dando
delicadeza à ostentosa decoração. Há um closet com sofá e cadeiras.
Ainda no quarto, abre-se uma porta de vidro para a varanda que dá para um dos jardins e ao
fundo pode-se contemplar o golfo, um lindo lugar para se tomar café. O banheiro é digno de um
sheik, a banheira fica de canto, de onde caem águas como uma cascata, tudo em marfim. Estou
maravilhada com a imponência do lugar. A suíte da Lorena é uma cópia da minha. Não tínhamos
percebido que a porta de vidro na sala a interligava com um barzinho com mesa de bilhar. Tudo
com muito requinte e elegância.
— Lê, tem certeza que esse luxo todo é de graça? Estou perguntando porque nada na vida é
de graça. Vai que o sheik nos tranca como escravas até pagarmos?
Cada ideia que essa garota tem.
— Dá um tempo, Lorena – falo, tentando controlar o riso.
— Nossa alternativa é dar um rim. O seu é mais forte, poderemos pedir um bom dinheiro
nele – Lolo fala pensativa.
— Senhoritas, vocês serão assistidas por Zharan – fomos interrompidas por Hamdan, que
estava em companhia de um rapaz em torno de vinte e poucos anos. — Qualquer coisa que queiram,
ele as atenderá. O sheik almoçará com a senhorita Letícia amanhã. Acredito que hoje esteja muito
cansada para enfrentar mais um compromisso. Lembrando-as que amanhã à noite terá uma grande
festa de confraternização para celebrar o contrato. Será no salão principal do hotel. Qualquer
serviço estético que queiram no térreo ou aqui, basta falarem com Zharan e ele providenciará. O
mesmo vale para os trajes que devem ser de gala, caso vocês não tenham um vestido para a noite, o
hotel conta com lojas das principais grifes mundiais.
Após várias tentativas malsucedidas de assimilar tudo o que Hamdan falou, tomo um
relaxante muscular, um belo e delicioso banho e deito. Eu estava tão cansada, com o corpo
fadigado e, para piorar, minha noite foi permeada com imagens de Zachary, não permitindo-me ter o
sono que realmente necessito. Não sei se estou apaixonando-me ou ficando louca... bem, me
apaixonar por ele é loucura. Então, estarei ferrada da mesma maneira.
Ouço um telefone estridente tocar e tateio em busca do objeto, que quebrarei daqui a pouco,
derrubando tudo pelo caminho.
— O que quer? – mau humor me define neste momento.
— Fiquei emocionado com a sua alegria. Eu quero falar com a Lorena.
— A Letícia não está, deixe seu recado após o bip – desligo antes do desconhecido tentar
argumentar. O meu sono é o mais importante nesse momento.
A droga do telefone volta a tocar. Quem quer que seja está disposto a me acordar.
— Letícia, cadê a Lolo?
— Quanta delicadeza. Não se identifica e nem sequer dá bom dia – digo irritada.
— É o Ethan, princesa. E tenho compaixão pelo cara que dorme com você. A senhorita não
é uma pessoa solícita quando acorda. Sabe onde a Lorena está?
— Eu não sei porque estava dormindo – na tentativa de sentar no colchão excessivamente
fofo, atrapalho-me e sinto um corpo ao meu lado. Vasculho entre as cobertas e encontro a Lolo. —
Então, acabei de achar nossa boneca.
— Estou indo encontrar-me com vocês. E providenciei o café para nós e Sebastian, tudo
bem? – Ethan pergunta.
— Sim – respondo.
— Vocês têm cinco minutos para se arrumarem.
Desligo e volto-me para Lorena.
— Seu namorido está subindo e disse que você tem cinco minutos para se arrumar –
chacoalho a menina, que parece estar dormindo novamente.
Lorena tenta se levantar mais rápido do que deveria e acaba se enrolando nas cobertas e
caindo, fazendo minha alegria. Ela corre para sua suíte e viro-me para dormir novamente. Tenho a
impressão de mal ter fechado os olhos quando ouço a campainha insistente. Levanto ainda mais
mal-humorada que antes e vou atender da maneira que estou. Assim que coloco o pé na sala, vejo
Zharan abrir a porta. Ethan e Sebastian entram e param ao olhar para mim.
— Você dorme vestida de Bob Esponja? – Ethan pergunta já rindo.
Mostro a língua e volto para o quarto a fim de ajeitar-me. Eu precisava dormir mais.
Contemplo a cama quente e fofa chamando-me, mas vou direto ao banheiro, escovar os dentes e
pentear os cabelos. Como não pretendo tornar-me uma pessoa apresentável, continuo com o meu
pijama. Se eles estiverem incomodados, a porta da rua é serventia da casa. Volto para a sala e não
encontro ninguém.
— Eles estão aqui – Zharan puxa um cordão trançado ao lado da grande cortina da sala,
abrindo-a para a ampla varanda com piscina e uma linda mesa pronta para o café.
Coloco meus óculos escuros e vou para a varanda vestida de Bob Esponja, como se
estivesse no último grito da moda. Lorena está impecável, como uma princesa ao lado de seu
príncipe. Sebastian se adianta cumprimentando-me com dois beijos no rosto e Ethan me dá um
beijo na testa, com tanto carinho que meu coração se comprimi um pouquinho. Assim que sento,
Zharan serve-me um café muito forte. Há tanta coisa gostosa nessa mesa que nem sei por onde
começar. Sendo assim, experimento um pouquinho de cada.
Permaneço em silêncio durante todo o tempo. O mau humor baixou em mim e, quando estou
assim, não sou uma boa pessoa. Qualquer coisa que saia da minha boca estará encharcada de
sarcasmo. Ouço os planos da Lorena e do Ethan, que vão passear de camelo por Dubai. E, pelo que
percebi, tudo isso me inclui. Eu só concordo e pronto, discutir com gente doida é só para passar
raiva.
— Senhorita Letícia, Hamdan quer falar-lhe – Zharan entrega-me um telefone dourado.
— Oi, Hamdan – simpatia não é o meu forte nesse momento.
— Bom dia, senhorita Barros. Estou ligando para lembrá-la do almoço com o sheik daqui a
meia hora.
Meia hora? Engasgo-me com o que estou comendo e Sebastian gentilmente dá batidinhas em
minhas costas.
— S-sim – respondo, ofegante.
— Alguém irá buscá-la em seu apartamento. Até logo!
— Obrigada – entrego o telefone a Zharan. — O almoço com o sheik é dentro de meia hora
e eu ainda dessa maneira.
— Vai de Bob Esponja. Ele vai adorar – viro-me para repreender Sebastian, mas paro no
momento em que vejo luxúria em seus olhos. — Eu gostei.
— Claro que vai gostar. Quem não gostaria de ter uma mulher dessas em um pequeno
pijama que deixa suas coxas descobertas? – Ethan balança a cabeça e olha para mim. — Há
pessoas que matariam se soubessem que você está a nossa frente com esse pijama.
Todo mundo olha-me. Imagino de quem ele fala, mas não toco no assunto. Levanto-me.
— Nos vemos mais tarde, meninos? – eles assentem. — Vou me arrumar e preciso de você,
Lorena.
— Volta logo, boneca Lolo – Ethan a beija e Lorena acompanha-me até o quarto.
Procuro minhas malas e Lolo vai direto ao closet. Pergunto como minhas coisas foram para
o devido lugar e minha amiga responde que há uma equipe responsávelpelo bem-estar dos
hóspedes nesse apartamento. Foram eles que arrumaram minhas roupas. Vida difícil essa que a
gente tem aqui em Abu Dhabi! Escolho um vestido longo na cor azul e sandália rasteira prata. Uma
leve camada de maquiagem, com muito protetor solar, para disfarçar meu visível cansaço.
— Mermã, tu tá de sacanagi! – assusto-me com o tom de voz agudo da Lorena falando uma
mistura de carioquês com algum outro sotaque que não deu muito certo. — Filha, você está em Abu
Dhabi, podendo se vestir como a Carrie Bradshaw de Sexy in the City e escolhe esse vestidinho
de praia? Minha avó sempre dizia: Podemos sair da breguice, mas a breguice nunca sai da gente!
— Pobreza – a corrijo.
— No seu caso é breguice mesmo! Volte lá e escolha outra roupa!
— Essa palavra, “breguice”, não existe – falo enquanto caminho no closet à procura de
algo.
— Agora passou a existir – Lolo retruca.
Volto para o closet e procuro... procuro... procuro. Por fim, decido por um macacão de seda
estampada em tons de rosa e azul bebê. Gola alta, mas sem mangas. A cintura é bem marcada e a
calça da peça é em estilo palazzo pants, aquelas calças que parecem saias. Uma sandália alta
dourada, para entrar no clima do deserto, e uma bolsa de mão da mesma cor. Prendo meu cabelo em
um alto rabo de cavalo e opto por brincos discretos.
— Agora, sim! Lê... – Lorena olha-me sem jeito. — Preciso ir a esse almoço com você? Sei
que estou aqui a trabalho, mas você até agora não me disse nada.
Vou até ela, passo meu braço pelos seus ombros e vamos caminhando de volta para a
varanda.
— Esse almoço é somente de boas-vindas, eu posso sobreviver sem você. Vá se divertir
com Ethan e namore bastante.
Sebastian aproxima-se de mim e beija meu rosto.
— Seu sorriso é deslumbrante, Letícia. Pode iluminar o mundo. Sinceramente, estou com
inveja de Bashir.
— Obrigada, Sebastian – faço uma mesura com floreios para agradecer-lhe o elogio.
Ethan puxa-me de canto e Kaleb se aproxima, entregando um aparelho celular para Ethan. 
— Letícia, eu quero que leve esse telefone com você.
— Já tenho um, Ethan – respondo.
— Letícia, por favor, não discuta comigo. Você não está no seu país e eu me preocupo com
a sua segurança – seu tom sério deixa-me intrigada. — Na discagem rápida há o meu número e o do
Kaleb. Se acontecer qualquer coisa, ligue para um de nós, entendeu? – encaro-o, esperando
maiores explicações. — Mulher difícil! Sabe aquele sentimento que você tem em proteger a boneca
Lolo? – assinto. — Eu tenho por proteger você.
— Eu não entendi, senhor Scott. Mas se ficará mais tranquilo com isso, assim o farei.
— Obrigado – ele fala, aliviado.
Pouco tempo depois, eu estava sendo escoltada para um dos restaurantes do hotel. Hamdan
recepciona-me na entrada, levando-me ao salão privativo, onde se encontrava o Sheik Bashir e
mais dois homens que, por dedução, devem ser seguranças.
— Menina Letícia – o sheik se levanta e cumprimenta-me com um beijo em minha mão. —
É um prazer recebê-la em meu país. Providenciei para que tudo seja perfeito em sua estadia.
— O prazer é meu, Sheik Bashir – Hamdan puxa a cadeira para mim. — E, até aqui, tudo
está em perfeita ordem. Obrigada pelas acomodações, são magníficas.
— Mulheres como você merecem um mundo de luxo que poucos podem dar. Quais são os
seus desejos para que eu possa realizá-lo, menina Letícia?
Que olhar é esse? Uma mistura de “olhar 43” com o estrabismo daquele cantor sertanejo.
Que história é essa de desejos? Dou o meu melhor sorriso.
— Não se preocupe com os meus desejos, senhor. Zharan foi designado para que eles se
realizem – pisco para ele.
O banquete que colocaram a nossa frente exalava um cheiro incrível. A mesa estava forrada
de pratos típicos, a maioria deles com carne de cordeiro como base. Esses, eu dispensei, mas
houve um em especial que achei muito bom, o shawarma. Um pão sírio recheado com legumes,
molhos e carne grelhada, que me garantiram ser carne bovina.
Durante o almoço não falamos sobre negócios. Mas estou tendo a ligeira impressão de que
ele está dando em cima de mim. Um carrinho de sobremesas aproximou-se e escolhi o umm ali.
Sobremesa parecida com o pudim de pão que, em sua receita, leva nozes, pistaches e amêndoas.
Bashir é um homem austero, seus traços o tornam ainda mais estoico. Seus olhos pretos demonstram
sagacidade e sua boca ligeiramente torta o deixa meio sexy. Ele até pode ficar bonito em algum
momento do dia. Talvez depois de algumas muitas taças de vinho.
Em pouco tempo a ligeira impressão se tornou uma constatação, ele realmente estava dando
em cima de mim. Eu não sei lidar com esse tipo de situação, fico constrangida. Sei que, no fundo,
todos querem sexo e eu não sou a mulher que gosta de apenas sexo, eu quero mais! Fora que o cara
já tem oito esposas. E, Deus, como elas conseguem? No Brasil, um homem mal da conta de uma.
— Espero que tenha apreciado nossa culinária – o sheik alcança minha mão.
— Gostei muito. E fiquei honrada com o convite para almoço, senhor. — Solto-a com
delicadeza.
— A honra é toda minha, menina.
Falamos sobre variados assuntos e fiquei impressionada com a sua visão de negócios. Isso
fez com que ele subisse em meu conceito. Contou-me que é tradição o mais velho ser chefe para o
clã familiar e que ele era o chefe da sua. Todos devem obediência a ele, desde os irmãos que são
mais novos até os primos mais distantes. Outra coisa que me impressionou, Bashir conhece os
filhos e convive com eles em harmonia. Ele sabe exatamente o que cada um de seus filhos e filhas
fazem.
O encanto durou até ele dizer que as mulheres foram feitas para servirem aos seus maridos,
e não para trabalharem fora ou serem independentes. Sendo assim, suas filhas são educadas para
serem excelentes esposas... ou escravas, se os outros tiverem a mesma visão que a minha.
— Está na minha hora – falo já levantando-me. — Obrigada pelo almoço, estava delicioso.
— Está cedo e eu quero mais tempo com você – ele levanta-se e caminha até mim.
— Tenho que rever algum trabalho e não quero atrasar-me para o jantar de logo mais – tento
sair daquela situação nada agradável.
— Tudo bem – ele responde exasperado. — Contento-me em vê-la no jantar.
Despeço-me e vou ao encontro de Zharan, que estava me esperando na entrada do salão
privado e me acompanhou até o apartamento. Não tinha me dado conta de que estava tarde assim.
Lolo já estava me esperando para nos arrumarmos. Então, corri para o banheiro, enchi a banheira e
me afundei.
Os questionamentos começaram assim que relaxei na água quente. Acredito que outras
mulheres ficariam encantadas por ter um príncipe das Arábias interessado por elas. Eu não! A
maneira como o sheik me olhava, o modo com que falava e suas sutis investidas constrangeram-me.
Não é correto misturar negócios com prazer, algo sempre dá errado. Se um deles sentir rancor pelo
fato de eu não querê-los, levará todas as negociações por água a baixo.
— Por onde a sua cabeça está passeando, querida? – Lorena senta à beira da banheira e
passa a mão em meu cabelo. — Será que está no corpo do homem dos olhos azuis? Até eu já me
peguei pensando. Ethan que não me ouça.
— Não. Acho que estou no jet lag ainda – suspiro. — Não sei se foi uma boa ideia ter
vindo para Abu Dhabi. Estou começando a questionar se fazer parte desse projeto também seja uma
boa ideia.
— Por que isso, Lê?
— Não sei... a-acho que é insegurança – não querendo discutir mais o assunto, mudo-o
rapidamente. — Estou gostando de ver esse relacionamento. O senhor Scott está apaixonado pela
boneca Lolo. Fico muito, muito feliz com isso, minha amiga.
— Estou tão feliz, Lê. Agora sai daí e vamos nos arrumar. Ameixas secas não são bonitas –
ela abre um grande sorriso que me contagia.
Sou uma pessoa muito discreta, roupas extravagantes não são para mim. Às vezes, a Lorena
fala que sou invisível, pois sempre opto por roupas claras, tons pastéis, preto ou branco. Para essa
noite em especial, escolhi um vestido tomara que caia longo, todo em renda branca com fundo de
seda rosa, uma faixa marcando a cinturae terminando em um laço. A parte superior é toda bordada
em pedras, tornando-se uma verdadeira obra de arte. O vestido se ajustou tão bem ao meu corpo
que dá a impressão de que foi feito especialmente para mim. Um scarpin rosa bebê completa o
traje.
Como estamos no Oriente e aqui é a terra das extravagâncias, escolhi um par de maxi-
brincos dourados com pedras marrons. E, como os brincos já são exagerados, não há necessidade
de colar. Termino a composição com um anel em cada mão e um bracelete dourado, todo trabalhado
com as mesmas pedras do brinco. Fiz grandes cachos nas pontas dos meus cabelos e os prendi
somente de um lado. Uma maquiagem mais forte do que de costume, marcando e sombreando os
olhos, assim como as mulheres daqui o fazem. E batom nude.
— LETÍCIA! – Lorena grita em desespero e saio correndo em direção ao seu quarto. Chego
lá e vejo a Lorena de roupão, com os dedos, indicador e polegar, grudados no olho que estava
fechado.
— O que houve com seu olho? – me aproximei para ajudar.
— Essa bosta de cílios postiços, grudaram!
— Desde quando você precisa disso, criatura? – pergunto, rindo.
— Desde quando eu não tenho cílios longos, corpo longo, pernas longas, como certas
pessoas – ela olha-me séria e bate o pé. — Pare de rir, preciso de ajuda porque estou muito
atrasada.
Ajudo-a da melhor maneira possível e, assim que ela abre o olho, analisa-me dos pés à
cabeça.
— Nossa! Você está boa, hein, Lê? Até eu te comeria.
Volto a minha suíte para terminar de me arrumar e, de frente para o espelho que ocupa quase
toda a parede do closet, penso em Zachary. Será que ele vem? Estou ansiosa para vê-lo novamente.
Muito, muito ansiosa. Talvez formássemos um belo par nessa festa.
Zharan bate à porta, dizendo que Ethan já está nos esperando. No caminho, passo pela suíte
de Lorena e a arrebato para fora. Ela está linda em seu vestido longo vermelho, estilo tomara que
caia com decote coração. Do centro desse decote, sai uma faixa bordada com pérolas e uma
sandália preta com solado vermelho que, mesmo aparecendo pouco, faz toda diferença. O conjunto
de brincos e pulseira eram de strass. As pedras da tiara que enfeita seus cabelos não parecem
strass, e sim diamantes. Sua maquiagem gótica carregada em preto e o batom vermelho-sangue
contrastam com sua pele branquinha.
— Você está linda, boneca Lolo. Vamos? Ethan já está nos esperando.
Assim que entramos na sala, testemunho os olhos de Ethan brilharem em adoração a Lorena.
Ele a arrebata em seus braços, fazendo-a rir. Dá gosto vê-los juntos. Será que é pecado desejar
alguém que sinta por mim o mesmo que Ethan sente por Lorena?
Ethan oferece um braço a mim e outro a Lorena.
— Kaleb, sou ou não sou um homem de sorte? – Ethan pergunta orgulhoso e nós duas
fazemos pose.
— Muito! – o segurança sorri com afeto.
Descemos ao salão principal onde seria a festa. O lugar é ostentoso e excessivamente
vermelho. A decoração é basicamente vermelha. Finos tecidos, também em tons de vermelho, caem
do teto, entrelaçados com tecidos de outras cores. A mesa, longa e bem-posta, formando um “U” é
ladeada por cadeiras que mais parecem tronos. A louça é de uma delicadeza sem par, em branco
com beiradas douradas, assim como os talheres que provavelmente são de ouro.
— Meu Deus! Estou me sentindo parte da decoração. Se me pendurarem no teto, posso ser
um lustre. Branca desse jeito, ilumino maravilhosamente bem – Lolo brinca e nós rimos.
Uma banda caracterizada toca músicas belíssimas ao fundo. Sinto como se estivesse
entrado em um filme hollywoodiano.
— Ela até pode sentar ao lado do sheik, mas na outra cadeira estará Liam ou eu – volto
minha atenção a Ethan que conversa com Hamdan.
Fomos levados até o centro da mesa onde o sheik nos espera alegrinho demais. Sento ao seu
lado e Ethan fica com o assento ao lado do meu. A visão é privilegiada, posso ver todo o salão, os
convidados e as entradas. 
— Você está maravilhosa, Letícia – o sheik beija minha mão com exagerada cortesia. E isso
incomoda-me. Lorena troca de lugar com Ethan para ficar ao meu lado e segura minha mão em
conforto.
— Você voltou estranha do almoço com o sheik. Agora essa careta e mão gelada. Estou
ficando preocupada – seu olhar de angústia aperta meu peito.
Tento disfarçar com um sorriso.
— Não é nada! Vamos festejar, boneca Lolo.
Como poderia explicar a ela, se nem eu mesma sei o que está acontecendo comigo? Talvez
seja o jeito que o sheik me olha, ou o fato de que Zachary não sai da minha cabeça, ou porque tenho
me sentido cada vez mais solitária. Não sei. E não quero estragar seus momentos com o seu
namorado, não seria justo Lorena se preocupar comigo logo agora que tudo está indo bem para
eles.
Martino e Sebastian vem até mim e cumprimentam-me. Eles são muito queridos. Martino me
faz rir com suas histórias e Sebastian com seus comentários sarcásticos. Alguns minutos depois,
avisto Liam. Não contenho-me e vou ao seu encontro. Ele recebe-me em um abraço de urso.
— Liam! – ele coloca-me no chão e emoldura meu rosto entre suas mãos.
— Como é possível você estar ainda mais linda? – Liam beija-me no rosto. — Como está,
mon petit?
Ele está com barba por fazer e isso o deixou mais apetitoso.
— Estou melhor agora. E você também está impecável nesse smoking – passo as mãos pela
lapela de seu casaco.
— Você deveria me ligar mais vezes, Letícia.
De repente, o lugar torna-se frio e silencioso. Estremeço ao sentir um calafrio e todo meu
corpo arrepia-se. Percebo Liam e as pessoas ao nosso redor olharem para algo além de mim.
Curiosa, viro-me para saber o que se passa e vejo Zachary na entrada principal. Lindo ou
maravilhoso são adjetivos que não fazem jus a sua beleza. Não foi à toa que o lugar parou, ele e sua
acompanhante roubaram o fôlego de todos. 
Pela altura e beleza, posso dizer, sem dúvidas, que a mulher é uma modelo de passarela.
Ela é o oposto de mim. Loira, absurdamente magra, pernas longas e perfeitas, exalando
sensualidade. Meu coração afunda ao perceber que esse é o mundo dele, ela é o tipo de mulher que
ele quer. Meus músculos chiam por causa da tensão em meu corpo. Liam pergunta-me se estou bem,
assinto e volto para o meu lugar à mesa. Porque eu não estava nada bem.
Assim que sento, as luzes apagam, deixando apenas uma fraca iluminação ao centro do
salão. A banda começa a executar uma música típica e uma dançarina coberta por véus entra
movimentando-se conforme a batida da música. À medida que ela percorre o espaço, fracas luzes
amareladas acendem. Eu estou encantada com tudo que se passa a minha frente. O sheik aproxima-
se e fala o significado da dança.
— Diz a lenda, que a origem da Dança dos Sete Véus surgiu no antigo Egito e era executada
pelas sacerdotisas em homenagem à Deusa Ísis, conhecida como a deusa do amor e da magia. A
dança representava um ritual de autoconhecimento. A dançarina envolve-se com sete véus, seguindo
a ordem das cores, vermelho, laranja, verde, azul, lilás e branco. A beleza dessa dança é o mistério
e a graça que a dançarina passa para o público.
E assim foi. Quando a mulher tira o último véu, a batida da música muda. Ela pega um dos
lenços no chão e volta a dançar, só que dessa vez é algo mais sensual, é a Dança do Ventre. É
incrível a maneira como ela envolve todo o lugar com suas expressões faciais e seu olhar marcante.
É divino.
As luzes acendem no final do espetáculo, fazendo-me piscar. Em meio aos aplausos,
encontro o olhar intenso de Zachary em minha direção e, por instantes, fico presa a ele. Então, sua
acompanhante beija seu rosto e Zachary toma sua boca em um beijo apaixonado. Sentindo uma faca
cruzar meu peito, tento puxar algumas respirações curtas para aliviar a dor. O sheik levanta-se e
começa seu discurso:
— Hoje é uma noite de muita alegria para mim e é gratificante ter a família e amigos
dividindo esse momento especial comigo e meus convidados, Martino Rossi, Sebastian
Khristophoros, Liam Larkin, Ethan Scott e Zachary O´Brian, que, além de amigos, agora também
são meus sócios. Essa é uma festa de agradecimento a Alá por medar mais do que mereço e de
boas-vindas à prosperidade. Para encerrar meu discurso, quero agradecer a pessoa responsável
pela formação dessa nova organização - ele vira-se para mim e todos o acompanham, deixando-me
desconfortável. — Essa bela mulher ao meu lado, Letícia, nos proporcionou tal privilégio.
Obrigado, Letícia. Agora vamos comemorar! Música e bebidas para todos!
A alegria que permeia o lugar é contagiante, música, dança, todos rindo e conversando. O
povo árabe sabe como receber seus convidados, a hospitalidade, sem dúvida nenhuma, é sua marca
registrada. A fartura chamou minha atenção, eles não se importam com desperdício. Usufruem a
vida com luxo e ostentação.
Não conseguindo prestar atenção nas conversas por causa da música, o incômodo que os
meus sapatos estavam causando faz com que eu fuja para a varanda. Minha cabeça está em outro
lugar, com outra pessoa que, provavelmente, está com outra pessoa em seus pensamentos. Respiro
fundo algumas vezes para tentar controlar a angústia.
— A vista desse lugar é tão bonita quanto você.
Aquela voz grave faz todo meu corpo vibrar. É como se a voz de Zachary apalpasse minha
pele, a despertando para o pecado. É inexplicável o que acontece em sua presença, meu corpo não
obedece meus comandos, somente aos dele. A imagem da loira que chegou em sua companhia vem
em minha cabeça e caio na real. Mesmo querendo correr e abraçá-lo, mantenho-me parada, olhando
a paisagem.
— A palavra certa para descrever esse lugar é extraordinário – digo sem me dar ao
trabalho de olhá-lo. Meu corpo traidor detecta o calor do seu se aproximando.
— Como está, Letícia? – ele pergunta mais perto do que eu esperava.
— Estou muito bem. E você?
— Com saudades de você.
Solto uma risada sarcástica. Os homens são incríveis mesmo. Idiota!
— Fingirei que acredito.
Zachary puxa-m,e fazendo com que eu vire de frente para ele. Sua expressão não é nada
amigável. Mas o canalha, quanto mais bravo, mais bonito fica.
— Eu não minto – ele rosna.
— Mas também não fala a verdade, senhor O´Brian – tento desvencilhar-me. — Se me der
licença...
Ele me segura ainda mais forte.
— Você não vai a lugar nenhum, Letícia.
— Solte-me, por favor – digo isso da boca para fora. Pois suas mãos em mim lembram-me
do quanto gosto do calor de seu toque.
— Não – ele fala com um sorriso de canto, como se soubesse o que penso.
— Que merda, Zachary! – eu explodo, atraindo a atenção das poucas pessoas a nossa volta.
— Como você quer que eu acredite que sentiu minha falta? Você é um dos homens mais poderosos
do mundo, conseguir um número de telefone não é nada para você. Temos amigos em comum,
negócios em comum e, mesmo assim, nenhum contato. Eu não sou nenhuma idiota.
— Olhe para mim, Letícia – fiz a besteira de olhar e fui imediatamente hipnotizada. — Eu
realmente senti falta de conversar com você.
Por minutos a fio, nenhuma palavra saiu de nossas bocas. Aproximávamos à medida que
respirávamos, até que...
— Zach? O que está acontecendo aqui?
Ainda olhando para mim, Zachary responde, rápido demais para o meu desgosto.
— Nada.
Senti como se tivessem socado meu estômago. Como eu sou idiota, meu Deus! Ela é sua
namorada ou até mesmo noiva, ele não colocaria seu relacionamento a perder por causa de um
flerte com uma funcionária. Recomponho-me da melhor maneira possível, viro-me para ela, fugindo
do aperto da mão dele.
— O senhor O´Brian estava cumprimentando-me pelo projeto que deu início a tudo isso –
estendo minha mão para cumprimentá-la. — Eu sou Letícia Barros, executiva da Building Paradise
Company.
— A Letícia é uma das sócias e diretora da companhia – Zachary corrige-me.
— Valery Fowler – ela sorri, estendo sua mão e aperta a minha. — Fico feliz por ter outra
mulher nessa viagem. Eu estava chateada por ter que ficar com os homens, ouvindo sobre negócios
– Valery abraça-o. — Apesar de que as viagens com Zachary são sempre cheias de promessas.
— Imagino – respondo ironicamente. Eu queria gritar de raiva, xingá-lo, bater naquele rosto
lindo e deixar um daqueles olhos azuis roxo. Sem coragem de fazer qualquer uma dessas coisas,
digo que eles aproveitem a festa.
Saio o mais rápido que posso. Enquanto caminho para o apartamento, envio mensagem para
Ethan e Kaleb.
Estou indo deitar. Avise a Lorena.
Chegando na suíte, tiro o vestido e jogo-o em um canto. Tiro os meus sapatos e os jogo na
parede. Vou ao banheiro e tiro a maquiagem grosseiramente, quase arrancando minha pele no
processo. Deito e cubro minha cabeça para não ouvir nada da festa. Queria ter o poder de tirar
aquele maldito da minha cabeça. Chega de expectativas! Chega de Zachary! Porra!
 
CAPÍTULO 15
 
Letícia
Fiquei trancada em meu quarto o dia inteiro. Graças à Deus, Lorena entendeu que eu não
queria ver ninguém. Eu sei que tinha uma reunião da nova companhia essa manhã, mas enviei
mensagem a Ethan dizendo que não estava passando bem. Quando criei coragem para levantar, já
era noite. Pedi comida a Zharan e fui tomar banho. Quando saí do banheiro, Lorena estava sentada
na minha cama.
— Letícia, eu não sairei daqui até você dizer o que está acontecendo. Ontem você sumiu da
festa e hoje não saiu do quarto, nem foi à reunião. Isso não combina com você.
Sento-me para comer o que Zharan me trouxe.
— Andei incomodada com algumas atitudes do sheik. E ontem, quando vi Zachary com a...
– engulo em seco. — Com a namorada, fiquei mal.
— Eu sabia que você estava gostando dele, só não fazia ideia do quanto.
— Estava apenas atraída por ele, Lorena. Mas, essa noite, tive uma conversa com o meu
coração e decidimos em comum acordo que estamos fechados para balanço – enfio um pedaço de
pão na boca.
— E por que não tentar? Já pensou que ele pode gostar de você também? Lê, você é minha
irmã e me sinto na obrigação de falar. Pare de arranjar motivos para ser solitária! Abra o seu
coração e permita-se amar e ser amada.
Bufo com deboche.
— Amar é tão fácil quanto fazer café. Complicado é ser amada.
— Não é fácil, dói, machuca e tem dias que a gente quer se matar. Mas tudo é compensado
no instante em que vemos o brilho no olhar da pessoa quando estamos juntos. Muitos
relacionamentos não dão certo. Nós duas passamos por isso e demos a volta por cima, continuamos
vivas. Isso prova que amor não mata, ensina a viver.
— Viu a acompanhante dele? – pergunto.
— Vi e, para sua informação, ela não é nada dele. Apenas acompanhante.
— Você não entende, Lorena. Zachary é o tipo de homem que não ama ninguém, a não ser a
si mesmo. Não tem bom coração, se é que tem um. Ele passa por cima de qualquer um para ter o
que quer. Eu sei que ele me quer, mas como será quando ele partir para outra e deixar-me aos
pedaços? – falo com visível desgosto.
— Ele pode ser melhor do que você imagina. Ainda assim, Letícia, há outras pessoas que
podem surpreendê-la.
Mudo de assunto. Chega de falar de pessoas que estão mortas! Porque, para mim, Zachary
Thorton O´Brian morreu!
— Chega de falar de coisas ruins. Cadê o príncipe, boneca Lolo?
— Foi jantar com os meninos. Por falar neles, também estão preocupados com você.
Zachary surtou legal quando o Martino fez um comentário sobre você. Ethan e Liam tiveram que
intervir.
Alguém bate à porta e ouço a voz de Zharan.
— Senhorita Letícia, preciso falar-lhe.
— Entre, Zharan.
— O senhor Sheik Bashir mandou avisar-lhe que amanhã pela manhã vocês sairão em
excursão pelo deserto. Servirei seu café por volta das sete da manhã – ele acena e sai.
— Desde que chegamos, algumas coisas no sheik têm me incomodado, seus olhares, suas
insinuações – comento com a Lolo.
— Normal, você é bonita. Te desejar faz parte do processo. Você sempre se sai bem dessas
situações, não se preocupe – ela boceja. — Estou com sono, vou dormir aqui.
Enquanto ela se ajeita na minha cama, vou ao banheiro escovar os dentes e deito ao seu
lado.
— Lolo.
— Diga, Lê.
— Ele disse que sentiu saudades de mim – minha voz sai em um sussurro.
— Isso é bom, não é? – ela pergunta, sonolenta.
— Se sentiu falta, por que não me procurou?
— Não sei, Lê.Mas vou te dar um conselho de irmã: não fica questionando os porquês da
vida, isso não nos leva a nada. Só saberá o porquê de alguma coisa quando perguntar ou quando se
permitir viver.
Outra noite de sono agitado. Passei mais tempo acordada, pensado, do que dormindo. Por
fim, cheguei a uma conclusão: vou viver! Estou em um lugar lindo, tenho que aproveitar esse
passeio. O resto deixo para quando tiver que me preocupar, até lá, viverei cada dia como se fosse
único.
Tomo um banho revigorante, na tentativa de melhorar minha aparência cansada. Vou para o
closet em silêncio para não acordar Lorena e olho todas as peças de roupa que trouxe, muitas delas
por insistência da dorminhoca ali. Pego uma calça tipo pantalona, estampada com cores vibrantes,
um top de alças na cor branca para usar por baixo da camisa da mesma cor. Um cinto largo
vermelho e uma sandália rasteira também vermelha. Amarro meus cabelos em um rabo de cavalo e
pego um chapéu de abas largas. Coloco o protetor solar na bolsa e vou para sala.
— Bom dia, senhorita Letícia – assusto-me quando ouço Zachary.
— O que você está fazendo no meu apartamento a hora dessas, senhor o´Brian? – vejo King
ao lado e caminho até ele para cumprimentá-lo. Desde o dia em que secou minhas lágrimas, ele
virou meu BFF (Best Friend Forever). Venhamos e convenhamos, para suportar Zachary e ainda
adorá-lo como King o adora, só um santo com um nobre coração. — Bom dia. Como está, príncipe
negro? – beijo seu rosto.
— Estou melhor agora – ele sorri com carinho.
— Então a nossa executiva está boa para abraçar todo mundo e para sair a passeio com o
sheik. Mas para ir a reunião da nova companhia está mal? – Zach vai até a janela e continua a falar:
— Eu esperava mais de você, Letícia.
— Ontem eu realmente não estava bem. Só que hoje acordei disposta, pronta para desfrutar
dos Emirados Árabes e do que ele me proporcionar.
— Falta de profissionalismo da sua parte – ele está empurrando-me para um confronto.
— Caro senhor, até onde sei, não lhe devo satisfações, pois não fui contratada pela
companhia ainda. E, até assinarmos os documentos formalizando a coisa toda, sou livre. Então,
Zachary, dá um tempo! Você não tem outra pessoa para atormentar? Quem sabe a loira oxigenada
que veio com você?
Ele sorri, provocando-me.
— Verdade. Tenho uma linda modelo nua a minha espera na cama. Onde a deixei depois de
uma noite de intensa atividade.
Idiota!
— Vai querer me convencer que, com sua idade, ainda suporta uma noite de intensas
atividades? Faça-me rir – falo com deboche.
— Eu poderia te surpreender.
— Já surpreendeu e não foi nada bom – respondo com desgosto.
A campainha toca e Zharan prontamente atende a porta. Céus! Estou ficando mal-
acostumada com isso. Liam e um de seus seguranças entram, vem em minha direção e beija minha
testa.
— Bom dia, Letícia. Como se sente? – ele olha interrogativamente para Zachary — Bom
dia, Zach. Já de pé?
— Bom dia, Liam – respondo e retribuo seu carinho com um beijo em seu rosto. — Hoje
acordei sentindo-me bem!
— Tão bem que vai se encontrar com Bashir – Zachary fala para Liam, que olha para mim
com cara de poucos amigos.
— Me diz uma coisa, o que vocês vieram fazer aqui a hora dessas? – interrompo, antes que
isso se torne uma guerra de egos. — Desde quando dei liberdade para ambos cobrarem ou não
alguma coisa? Quer saber? Vão se catar!
Pego minhas coisas e saio sem olhar para trás. Ah, faça-me o favor! Primeiro, Ethan
obrigando-me a levar o celular para todos os lados e agora as gracinhas achando que devo alguma
satisfação. Idiotas!
As portas do elevador abrem-se e Hamdan interrompe seu passo assim que me vê.
— Bom dia, senhorita Letícia. Estava indo buscá-la.
— Hamdan eu preciso tomar café. Meu apartamento foi invadido por abutres.
— Abutres? Aqui? – seus olhos saltam, quase caindo de seu rosto.
— Modo de falar, Hamdan. Apenas recebi visitas inesperadas e saí sem comer.
Ele acena em atendimento e leva-me a um dos restaurantes do hotel. Segundos após sentar-
me, uma equipe enche a mesa com um serviço de café completo. Assim que termino meu desjejum,
vamos para a entrada, onde quatro SUV´s nos esperam. Hamdan encaminha-me ao terceiro carro e
abre a porta para encontrar o sheik a minha espera no banco de trás.
— Bom dia, menina Letícia. Preparada para o nosso passeio? – sorrio e aceno.
O carro andou durante alguns minutos e pude vislumbrar parte da cidade com construções
contemporâneas contrastando com a história. Enquanto percorríamos a cidade, o sheik contava-me
o significado de cada coisa, a história de cada lugar, como as coisas funcionavam e as tradições
milenares que ainda são preservadas. Eu conhecia Abu Dhabi pela televisão, onde mostraram que
até as paradas de ônibus são climatizadas e realmente é verdade. É tudo muito bonito!
Os prédios modernos e a civilização foram ficando para trás e eu não tinha a menor ideia de
onde íamos. Mas eu acordei decidida a viver, então só curti o passeio. Em certo momento, tentei
entender o motivo do chilique de Zachary logo cedo. Às vezes, tenho a impressão de que ele me
detesta e, em outros momentos, acho que ele me adora a ponto de querer-me. Envia-me sinais
confusos e eu que sou a louca. A certeza de tudo é: estou muito interessada nele, tanto que desejo
estar no lugar daquela loira. Durante a noite, imaginei como seríamos juntos. Droga, Letícia! Pare
com isso!
Pouco tempo depois, os carros param e o sheik aconselha-me:
— Se hidrate sempre e não esqueça do protetor solar.
Olho ao redor e fico hipnotizada com a beleza do lugar. Estamos no meio do deserto, em um
acampamento estilo beduíno. Várias barracas coloridas interligadas formam um círculo. Passamos
pela única entrada, saindo diretamente no centro do acampamento. Havia várias pessoas em uma
roda de música, homens e mulheres, completamente cobertos ao centro, dançando e cantando.
Aproximamo-nos e o sheik foi recebido com reverência.
Um jovem se levanta e vem até nós. Eles se cumprimentam em árabe, depois se volta para
mim e fala em um inglês quase perfeito:
— Prazer, sou Heidrun, filho mais velho da casa de meu pai Bashir.
— Letícia Barros – curvo-me levemente em sinal de respeito.
Eu fiquei encantada com a festa que acontecia até sentir minha primeira tontura.
Rapidamente providenciaram água e tudo ficou bem. Mais ao canto, havia uma farta mesa,
arrumada com muitas frutas e pães. O sheik me levou até lá para que eu sentasse e logo apareceram
duas mulheres para nos servir.
— Assim que a menina se recuperar, vamos fazer um pequeno passeio pelo deserto. Você
verá a beleza e o poder das nossas terras.
O passeio foi estranho e acabei enjoada sobre o camelo. Voltamos para o acampamento e
insistiram para que eu comesse, sempre com um copo de água ou suco próximo a mim. No meio da
tarde, o sheik levou-me para fazer um tour pelas barracas e fiquei surpresa ao ver as acomodações
de luxo que haviam. Os quartos com lindos tapetes e colchas de peles, adornos em ouro e prata
espalhados por todos os lugares. Impressionante!
Paramos na última tenda, em uma sala espaçosa, onde havia muitos tapetes e grandes
almofadas bordadas pelo chão. Ele me assentou em uma que mais parecia um colchão e eu pude
descansar confortavelmente.
— O que está achando do nosso passeio, menina?
— Estou encantada com tudo e com todos – respondo.
— Você é boa companhia. E seu sorriso faz com que tudo valha a pena – vejo desejo em
seus olhos e um nó forma-se em minha garganta. — Não sou um homem de rodeios, Letícia, então
vou direto ao ponto. Estou interessado em você.
Eu não sei como responder a isso. Ele é um homem de personalidade forte, mas não faz meu
tipo. Aliás, qualquer um que tenha uma esposa não faz meu tipo, imagine oito. Sento-me e pego sua
mão com carinho, rezando para que ele entenda e não atrapalhe os negócios.
— Fico muito lisonjeada, mas infelizmente não é recíproco.
— Eu sei que não sou um homem bonito, mas sou muito rico e quero colocar o mundo aos
seus pés – suas mãos encobrem a minha.
— Não se trata de beleza ou de dinheiro,Bashir. Comigo, as coisas são diferentes. Tenho
princípios e um deles é não me envolver com homens casados.
Ele tenta beijar-me e desvio meu rosto. Afastei-me dele rapidamente porque sabia que
aquilo não daria certo. Estou no meio do deserto, sem comunicação com ninguém, ele poderia me
forçar a fazer qualquer coisa.
— Há alguma chance de mudar de ideia?
— Nenhuma – seu olhar baixo faz-me chegar perto dele novamente. Coloco uma mão em
seu ombro. — Agradeço por tudo que vem me proporcionando, a viagem, os passeios e,
principalmente, o conhecimento. Dessa estadia, pude tirar ideias maravilhosas para o projeto e
para as casas. Mas, Bashir, ter-me na empresa não quer dizer que terão liberdade comigo. Exijo
respeito e o nosso negócio vem em primeiro lugar.
— Fico satisfeito em saber que você está desfrutando do passeio. Que Alá em sua
sabedoria a guie nessa jornada da vida – posso ver a sinceridade estampada em seu rosto e respiro
aliviada.
A viagem de volta foi mais demorada ou eu que estava cansada demais, não sei. O ar seco
teve efeitos colaterais, como espirros, boca e garganta secas e um cansaço tenebroso. Já era noite
quando chegamos ao hotel, Bashir e seus seguranças me acompanharam até o apartamento que foi
designado a mim e a Lorena.
— Antes que eu esqueça, marcamos a assinatura do contrato para às dez da manhã.
Descanse.
Despedimo-nos e entro no apartamento, que está escuro e em silêncio. Vou até o quarto da
Lorena e vejo que está vazio, ela deve estar com Ethan. Vou em direção ao meu quarto, fecho a
porta e acendo a luz. Sento na beirada da cama, tiro os sapatos e minha roupa e vou para o banheiro
tomar uma ducha. Após o banho, deito na cama somente de toalha e caio em um sono profundo.
* * *
— Letícia Sophie Barros, ACORDA! Você está atrasada para a reunião, mulher!
Sonolenta, tento levantar, mas enrolo minhas pernas nas cobertas e caio batendo as costas
na mesinha de cabeceira, machucando-me. Merda! Faço minha higiene em tempo recorde, pego um
uma calça jeans desbotada, uma camisa azul e um tailleur e alcanço o primeiro calçado à
disposição. Não consigo nem erguer os braços direito, dói demais. Lolo está com seu habitual
terninho preto e pronta para o trabalho.
— Pega uma fruta, Lê. Infelizmente não dará tempo de sentar para comer, pois são dez e
cinco. Ethan me mandou mensagem, dizendo que só falta você.
No meio do caminho, percebo que um segurança nos acompanha. Ethan deve ter
providenciado o guarda-costas para Lorena. Eu não faço a menor ideia de onde será a reunião e
nem sei explicar o que anda acontecendo comigo. Sempre fui uma excelente profissional, nunca
deixei nada de lado quando se trata do meu trabalho. Ultimamente, isso tem acontecido.
— Minhas costas estão doendo – reclamo.
— Desculpa, acho que a culpa foi minha. Vou providenciar alguma coisa para você comer,
Lê, e um remédio também.
Avisto uma grande porta com muitos seguranças, acho que a reunião deve ser ali. Assim que
nos aproximamos, um dos armários de terno preto abre a porta para um escritório espaçoso, com
sofás de veludo verde-escuro, uma mesa redonda que acredito que seja de mogno e todos os
homens envolvidos nesse negócio.
— Bom dia, senhores. Desculpe minha demora, caí e acabei me machucando – explico.
— Mas está tudo bem? Precisa de um médico? – Martino aproxima-se e estende seu braço
para me dar apoio até uma confortável poltrona.
— Não, obrigada – respondo. Desde quando sentar se tornou um trabalho difícil?
Maggie e King entram na sala com algumas pastas e as distribuem. Zachary toma a frente e
inicia o discurso:
— Ficamos honrados com a sua presença, princesa Letícia – o infeliz fala com deboche. —
Acredito que todos já tenham conhecimento sobre o contrato, até porque o formulamos juntos,
faltando somente a Letícia tomar partido disso tudo – ele fala diretamente para mim: — Letícia
Barros, quando nos reunimos para discutir as cláusulas desse contrato, nós chegamos à conclusão
de que você era muito importante para ser meramente uma funcionária. Então, de comum acordo,
acertamos que você será uma das acionistas do grupo e os lucros serão divididos por igual entre
nós. Queremos que esteja à frente de todos os trabalhos que a Building Paradise Company venha
executar. Você ocupará o cargo de diretora geral, reportando-se somente a mim, quando for
necessário.
— Muito obrigada! Darei o meu melhor para que se orgulhem de mim e não se arrependam
– agradeço emocionada.
Foram duas horas de conversas, acertos, assinaturas e discussões. Eu não estava mais
suportando a dor.
— Acho que preciso de um médico, não suporto mais a dor – falo para a Lorena.
— Vou pedir para o Luke te acompanhar até a suíte e eu vou procurar médico – ela
responde.
— Quem é Luke? – pergunto.
— O segurança. Agora fica quietinha – Lorena corta-me.
Tentei me levantar, mas a dor não permitiu. Acabei gemendo alto demais, atraindo a atenção
de todos. Perguntam se estou bem, mas eles falam ao mesmo tempo e a dor não me permite pensar.
Lágrimas caem dos meus olhos, tento pará-las, mas falho vergonhosamente. Não demorou muito e
apareceu um médico para me examinar.
— Vocês poderiam dar licença para que eu possa examiná-la? – o médico pede gentilmente.
— Não! – eles respondem em uníssono.
Olho para o médico e vejo pelo seu olhar que ele pensa a mesma coisa que eu, “ninguém
merece”. O doutor toca-me por cima da camisa de tecido fino. — A senhorita pode me contar o que
aconteceu?
— Eu caí...
Começo a falar, mas Zachary interrompe-me:
— Vai ver que o sheik foi ensinar alguma posição do kamasutra e acabou machucando a
pobre princesa – o que eu fiz para ele me odiar tanto?
O médico olha-me com entendimento e isso me leva à borda da ira. Meu Deus! De princesa
passarei a vadia do oriente.
— NÃO! Claro que não. Eu acordei atrasada... – ofego ao tentar esforçar-me. Olho com
nojo para Zachary. — Sozinha. Tentei levantar, mas enrolei-me nas cobertas e caí. Acabei batendo
as costas na mesinha de cabeceira. Na hora doeu tanto que chegou a me faltar ar, mas levantei
mesmo assim. Afinal, estava atrasada.
— Teremos que levá-la para a clínica e fazer algumas radiografias para confirmar a
provável quebra de uma costela.
Mas, gente, como consegui quebrar uma costela? Foi um tombinho de nada. Levaram-me
para o hospital e tiraram algumas radiografias e constataram que somente trincou uma costela.
Deram-me muitos remédios, a ponto de me sedar. Não lembro como voltei para o hotel e nem
quanto tempo dormi.
— Acho que um segurança é pouco, temos que colocar mais dois e ficar mais atentos. Eles
são capazes de se matarem. Viu como Martino foi para cima do sheik? – acordo ao ouvir Liam.
— Preocupo-me mais com a reação do Zachary do que de qualquer outro. Ele é letal e
ninguém o segurará quando quiser destruir algo em seu caminho – reconheço a voz de Ethan. Do
que eles estão falando? Mal assinaram um acordo e já estão se matando? Não faz sentido! Também
não faz sentido trincar uma costela ao tentar sair da cama.
Tento mexer-me, mas a dor não deixa que eu obtenha êxito. Apesar de estar menos intensa,
ainda dói pra caramba! Faço mais um esforço para me levantar, mas só consigo gemer. Logo,
encontro os dois homens sobre mim e reviro os olhos. Para que tudo isso?
— Oi, Lê. Esses lindos cavalheiros a ajudarão a sentar-se para comer – Lorena senta ao
meu lado com uma bandeja.
Liam passa um braço atrás do meu joelho e o outro nas costas. Acabo tocando-o e tendo a
noção de seus fortes músculos. Com isso, percebo que estou enfaixada na altura da costela
machucada. Lorena alcança alguns comprimidos e coloca a bandeja sobre a mesinha de cama. As
cortinas estão abertas e o sol brilha. Estranho. Não deveria ser noite?
— Dormi por quanto tempo? – pergunto.
— Dezesseis horas – Lolo me informa. — Quando voltamos da clínica, você estava grogue.
Dormia e acordava a todo o momento. À noite, sua dor piorou porque você tentou levantar-se,
então o médico esteve aqui e lhe deu outra injeção para a dor. Ele disse que você poderá andar
normalmente, só não poderáfazer muito esforço e nem pegar peso.
Odeio incomodar as pessoas e não me lembro de ter me tornado tão desastrada assim. Vejo
carinho nos olhos de cada um, mesmo assim fico incomodada com o trabalho que estou dando.
Tento comer alguma coisa, mas meu estômago não está legal. Zharan bate e anuncia Sebastian, que
entra com lindas flores amarelas.
— Como está, Letícia? – ele as entrega para mim e beija minha face.
— Obrigada, são lindas. Estou melhor.
Lolo prontamente pega o ramalhete, entregando para Zharan colocar em um vaso. Liam e
Ethan não fazem menção de sair, o que me deixa desconfortável. Devo estar com uma aparência
horrível, cabelos desgrenhados, nem escovei os dentes.
— Vocês poderiam me dar licença? Eu gostaria de me arrumar. Depois encontro-os na sala.
— Acha que consegue andar, Lê? – Lorena pergunta.
— Consigo, sim. Só preciso que me ajude a levantar.
Ethan ajuda-me a ficar em pé antes de sair e vou para o banheiro tomar uma ducha, na
tentativa de ficar mais apresentável. Lavei e sequei meus cabelos, escovei os dentes, desenrolei a
faixa molhada e Lorena ajudou-me a colocar uma bandagem nova, que aliviou minha dor. Meu
corpo está dolorido, mas nada tão intenso que eu não possa suportar. Ela ajudou-me a entrar dentro
de um vestido longo preto de malha e chinelos. Até me sinto gente outra vez.
— Está com uma carinha boa, Letícia. Ficamos preocupados – Lorena fala e posso
constatar alívio em sua voz. Caminhamos para a sala, abraçadas. Bom, meu braço em torno dela.
Sento-me em uma poltrona e Martino ajoelha-se ante mim.
— Como a nossa menina está se sentindo?
— Mimada, dessa maneira, vou ficar mal por muito tempo – falo, sorrindo. — Estou ótima.
E é bom você estar aqui, Martino. Quero saber se está indo direto para Itália.
— Sim, estou. Pretende ir comigo? – seu sorriso espalha-se.
— Sim – respondo. — Tem algum problema para você? Se não for possível, poderemos
embarcar depois.
Seu rosto fica sério.
— Fico mais tranquilo se você vier comigo, assim posso cuidar de você. Partiremos
amanhã à noite.
Conversamos sobre o projeto e deixaram-me a par do que decidiram enquanto eu estava
fora. Em vinte dias, a equipe de topografia já estará no local, fazendo um levantamento mais
detalhado do terreno. Eles falam dessa primeira obra com tanto orgulho que sinto-me contagiada.
Tenho certeza que será um sucesso e fazer parte disso é uma honra!
— Senhores, vamos descer para jantar? A Letícia deve estar cansada e elas têm que
arrumar suas coisas para viajarem amanhã – Ethan sugere.
Depois que eles se foram, Lorena e eu organizamos a minha agenda de trabalho. Desde que
cheguei aqui, só tenho passeado, trabalhar que é bom, nada! Liam apareceu para se despedir,
dizendo que nos encontraríamos na Itália. Ele tem um projeto com Martino e a reunião estava
marcada para daqui a alguns dias.
A campainha toca e Lolo atende. Zachary entra mais lindo do que nunca. Calça jeans justa e
uma camiseta branca tão justa quanto a calça. A visão dele faz-me desejá-lo ainda mais. Como um
radar, meu corpo acorda e clama pelo seu. Seu andar é gracioso, seus movimentos são elegantes e
seu olhar grita PERIGO! Zach toma conta do lugar e senta-se ao meu lado.
— Pelo que vejo, a senhorita está bem – grosso!
— Se veio para tirar conclusões, já tirou. Pode se retirar.
— Lê, estou indo jantar na suíte do Ethan. Qualquer coisa, é só mandar uma mensagem –
imploro com o olhar para Lorena não me deixar com ele. Mas a garota finge-se de cega. —
Zachary, os remédios que ela deve tomar dentro de meia hora estão na mesinha ao lado de sua
cama. Ela não pode se cansar. Se você perceber que ela está fazendo qualquer esforço, leve-a para
cama. Não para comer, Zach, somente para dormir. Entendeu, bonitão? – ela coloca a mão na
cintura. — Gente, eu não me conformo com a beleza desse homem! – sua atenção volta-se para
mim. — Por favor, tenham juízo. Não quebre mais nenhum osso.
Assim que Lorena sai, Zachary alcança minha mão e permanecemos em silêncio por um
bom tempo. Agoniada com a situação, tiro minha mão da dele e falo:
— O que você quer, Zachary?
Ele acaricia meu rosto.
— Quero passar um tempo com você. Saber se está sendo bem cuidada.
Bufo.
— Provavelmente para saber se ainda posso trabalhar. Não se preocupe, estou bem e logo
começo meus afazeres.
Seu rosto endurece, mas há um brilho desconhecido em seu olhar.
— Às vezes é complicado falar com você, Letícia.
— Sim, eu sou a difícil – faço uma careta. — Você não é do tipo que cuida de alguém,
Zachary. Muito menos de mim, até porque você me detesta.
Ele segura meu rosto entre suas mãos e faz com que eu olhe para ele.
— Quem disse que te detesto?
— O modo com que me trata a maior parte do tempo responde a sua pergunta. Geralmente é
estúpido comigo e está sempre gritando ou me questionando.
Suas mãos que estavam em meu rosto passeiam pelo meu pescoço e uma tem destino certo
em minha nuca; a outra, acaricia meus lábios. Zach aproxima e beija meu rosto com tamanha doçura
que choca-me.
— Eu detesto o fato de sempre ter algum homem ao seu redor – ele beija minha testa. — Às
vezes, detesto até mesmo o King, por ter mais contato com você do que eu – ele beija meu queixo.
— Detesto a maneira que você mexe comigo. Mas jamais te detestaria, baby.
Ele toma minha boca em um beijo quente, me arremetendo ao céu para ver o show de
estrelas que se forma quando ele chupa meu lábio inferior. Zachary puxa meu cabelo da nuca para
controlar o ritmo do beijo, fazendo-me gemer. Sua língua procura a minha para uma dança sensual,
explorando, com o seu desejo dominador, a minha paixão submissa a ele. Ele morde meu lábio e
acaricia com a língua, destruindo-me para qualquer outro homem do mundo. Fazendo-me querer
mais.
O momento é interrompido pela campainha. Sem discutir, Zachary abre a porta e King entra
com carrinho de comida.
— O jantar está servido – o meu gigante gentil sorri, fazendo-me esquecer que estava quase
transando com a boca de seu chefe. King beija o topo de minha cabeça e abaixa-se a minha frente.
— Está pronta para outra briga?
Sorrio envergonhada. É vergonhoso uma pessoa contar que trincou a costela tentando sair
da cama.
— Estou quase – respondo.
— O jantar já foi servido e você está dispensado, Kingston – Zachary fala sem cerimônia.
King pisca para mim e se vai.
— Espero que esteja ao seu gosto – Zachary entrega-me um prato com salada, legumes e
peixe. O cheiro está divino.
— Obrigada – a última coisa que eu queria neste momento era jantar. Mesmo assim, tratei
de mastigar e engolir cada coisa servida naquele prato. — Zachary? – ele olha para mim. —
Obrigada por cuidar de mim.
— Não há porque agradecer, eu realmente quero estar aqui com você. E, infelizmente, sou
assim, Letícia. Não faço o tipo gentil como Liam ou engraçado como Ethan, mas prometo tentar ser
mais tranquilo a sua volta. Estou ansioso para ir ao Brasil conhecer minha nova propriedade.
Quero que você fique comigo nos dias em que eu estiver lá.
Enquanto comemos, falamos sobre amenidades e fizemos planos para quando eu estiver nos
Estados Unidos. Conto a ele que comprei um apartamento lá e que foi a realização de um sonho.
Mas não conto detalhes, ele não precisa saber de tudo. Começo a sentir dores e gentilmente ele
pega-me em seus braços e caminha para o quarto, colocando-me na cama.
Zachary deita ao meu lado e vira-se de frente para mim. Enquanto nos encarávamos, pude
memorizar cada traço seu, cada nuance, cada peculiaridade daquele homem misterioso. A cor dos
seus olhos é diferente e nos faz ter a impressão de mergulhar em um mar escuro e revolto. Acaricio
seu rosto e, com o meu polegar, contorno seus lábios.
— Bonito não faz jus a você – digo.
— Nem a você!
Ele tira seu celular do bolso e logo a música Earned it, do The Weeknd, soa pelo quarto.
Seguindo a batida da canção, suas mãos percorrem o meu corpo. Zachary vem para mim lentamente,
como um predador vai para saborear sua presa. Ele tira meu vestido com cuidado, como se eu
fosse de porcelana. Coloca-se sobre mim, sustentando seupeso em seus braços, que estão em cada
lado do meu corpo. Sua boca percorre minha pele quente, começando pela minha orelha, indo para
a minha boca e descendo pelo o meu pescoço.
Chegando aos meus seios, Zachary morde e suga ao redor, sem tocar nos meus mamilos,
fazendo-me gemer de frustração. Seu sorriso perverso diz-me que isso é só o começo de suas
provocações. E céus! Eu estou pronta para cada uma delas. Levanto minhas mãos para tocá-lo e, na
tentativa de puxar sua boca para minha, minha ferida chia e eu não evito uma careta de dor.
— Quietinha, baby. Deixa que eu tomo conta de você.
Ele dá pequenos beijos sobre a faixa que envolve parte do meu abdome e continua a descer,
rodeando meu umbigo com sua língua, deixando-me ainda mais desejosa. Seus dedos acariciam os
contornos da minha calcinha e logo sinto-os alisarem minha abertura sobre o tecido. Estou
dominada pelo desejo e afogada em sensações. Sua boca desce sobre o tecido rendado da pequena
peça, sugando e me tocando com seus dedos até o tecido encharcar. Estou tão molhada que chega a
ser vergonhoso.
Nenhum homem fez sentir-me assim, somente ele...
Zachary sai da cama e leva minha calcinha com ele, então começa um belíssimo show. No
ritmo da música, ele tira cada peça, sem desviar seus olhos dos meus. E, a cada peça fora, um
pedaço de mim morre para qualquer outro homem da face da Terra. Estou completamente e
irrevogavelmente apaixonada por Zachary Thorton O´Brian.
Um preservativo aparece de algum lugar em um passe de mágica e ver um homem, como
aquele, revestindo seu pau deveria ser grotesco. Mas não, não Zachary. Ele vem sobre mim com
cautela.
— Espero esse momento há muito tempo. Fantasiei você nua muitas vezes e nenhuma delas
chegou perto da realidade. Você é linda, talvez a mulher mais linda que já tive sob meu corpo –
seus olhos prendem-me com a sua intensidade. E, com extremo cuidado, levanta minhas pernas ao
redor de seu quadril e seu pau esfrega-se em minha entrada úmida. — Eu preciso sentir o seu sabor
em minha boca, mas preciso estar dentro de você para viver em paz.
E, com essa declaração, Zachary penetra-me, possuindo cada pedaço meu sem delicadeza e
eu amei cada centímetro seu possuindo-me. O ritmo é lento, mas forte. Estou me afundando no mar
de luxúria e na força do seu corpo. Fecho os olhos para não mostrar-lhe meus sentimentos.
— Você é malditamente apertada e não vou durar muito – seus gemidos levam-me a um
frenesi. — Sua boceta é o paraíso. Você é gostosa demais... perfeita demais...
Neste momento, eu sou puramente amor e Zachary é somente prazer. Ele toma um mamilo
em sua boca, fazendo com que eu chame seu nome repetidas vezes, como um mantra. Seu dedo
alcança meu clitóris e, ao seu toque, ele ordena:
— Goza comigo, anjo – e eu obedeço prontamente.
Zachary beija-me com paixão até ficarmos sem ar. Com cuidado, retira-se de mim e deita-se
ao meu lado, acariciando-me. Algum tempo depois, levanto-me com dificuldade e vou ao banheiro
limpar-me. Tiro a faixa em frente ao espelho e vejo minha pele arroxeada. Ele entra e fica atrás de
mim. Encarando-nos pelo espelho, passa a mão pela minha ferida. Zachary abaixou-se e beijou
cada centímetro machucado. Sentou-me na bancada de mármore fria, abriu a torneira de água
quente, pegou uma toalha e limpou-me gentilmente.
Ele enrola uma toalha e a coloca entre minhas costas e o espelho. Eleva uma de minhas
pernas, deixando-a sobre a pia, firmando minha posição. Sem dizer uma palavra e tendo como
fundo a música que repete sem parar – “... Então eu vou cuidar de você. Eu vou cuidar de você,
você, você...” – ele passa sua língua pela minha boceta, fazendo-me estremecer.
— Fodidamente doce – Zachary chupa o meu clitóris e penetra-me com dois dedos. Meus
gemidos são estímulo para ele, que impulsiona cada vez mais sua língua e seus dedos. —
Absolutamente deliciosa – meu segundo orgasmo vem sem demora, fazendo-me arquear as costas e
a dor lancinante acaba com qualquer prazer que eu estava sentindo.
— Puta que pariu! Esqueci os seus remédios – ele liga as torneiras da banheira e volta para
me abraçar. — Vou colocá-la na banheira e pegar os medicamentos para você tomar. Depois,
colocaremos a bandagem novamente e você irá para cama.
— Sim, senhor, senhor! Aaaiii... – dor maldita!
— Não faça esforço, anjo – ele passa seus braços pela minha cintura e beija-me ternamente.
Eu ficaria aqui para sempre.
Zachary fez questão de lavar cada parte do meu corpo. Depois de seca, vestida e medicada,
vamos para sala e ele ajuda-me com a bandagem. Seus olhos encontram os meus, mas o calor foi
substituído por aquela parede de gelo. A marca registrada do velho e arrogante Zachary.
Ele se arrependeu de transar comigo. Também, o que eu esperava? Ele tem uma das
mulheres mais bonitas do mundo esperando por ele. Zachary veio foder a assistente para que ela
fique na sua e trabalhe conforme sua vontade. Como uma mulher pode ser tão idiota? Tudo nesse
homem grita PERIGO. Minha cabeça diz que devo me afastar, mas meu corpo e coração o
obedecem como se pertencessem a ele. Tristeza toma o lugar que estava preenchido com satisfação.
— O que houve, Zachary? Arrependeu-se de transar com a assistente? – cuspo as palavras
com amargura.
— Sim.... Não! Ah, caralho! – ele passa as mãos pelo cabelo, puxando-os. — Arrependo-
me, porque sou um homem de palavra, nunca volto atrás depois de dar minha palavra. Mas não
mudaria nada dessa noite.
Não consigo segurar minha gargalhada de desgosto. Mesmo com dor, levanto e vou para a
janela.
— Eu já imaginava. Veio comer a assistente para que ela se deixasse levar e você pudesse
controlá-la. E agora se deu conta do tamanho da merda que fez e se arrependeu. Acertei, Zachary? –
balanço a cabeça e estalo a língua. — Tsc, tsc, tsc. Eu já deveria saber que para você eu não passo
de diversão.
— Não, Letícia! Não, não, não! – ele xinga. — Não é isso, é só que...
Não é possível segurar as lágrimas. E, nesse momento, não faço nenhuma questão de fazê-
lo. Levanto a mão o cortando.
— Esquece!
Maggie, a assistente do Zachary, entra sem pedir licença e sem ser convidada. Seco minhas
lágrimas para que a infeliz não as enxergue e ache uma fraqueza em mim. Minha suíte parece uma
pensão, todo mundo entra e sai sem permissão, achando que estão em casa.
— Boa noite, senhores – a sonsa fala como se o clima não estivesse estranho. — Letícia, eu
vim confirmar sua partida com o senhor Rossi amanhã à noite.
— O quê? – Zachary rosna como se tivesse levado um tapa na cara. Ele anda de um lado
para o outro sem parar. — Eu não acredito que... Porra! Por que não me disse...
— Está confirmado, Maggie – não permito que ele continue a falar: — Agora vocês dois
podem se retirar do meu apartamento.
Ele balança a cabeça e fala com raiva:
— Eu não vou sair até conversarmos sobre a sua viagem com aquele italiano safado.
— VOCÊ, SUA ASSISTENTE E O DIABO A QUATRO VÃO PARA O QUINTO DOS
INFERNOS! SAIAM DAQUI, AGORA! – grito.
Assim que a porta fechou, fui ao chão com a minha dor, com as minhas lágrimas e com o
resto de esperança indo pelo ralo. Pela segunda vez, a vida mostra-me que não fui feita para ser
amada, somente para amar e ser deixada.
Deus, o problema sou eu? O que você fez de errado quando me criou? Por que não posso
ser amada? Por quê? Por quê? Por que dói tanto?
CAPÍTULO 16
 
Zachary
Que caralho aconteceu naquele quarto? Estou tentando entender como uma deliciosa transa
virou um inferno. Martino não perde por esperar. Aquele italiano filho da puta tirando a Letícia
daqui antes de terminar o prazo do sheik é jogo sujo.
— Aquela mulher é grosseira. Não sei como vocês a aturam. Alguns dos homens babam por
ela. Credo! – Mag faz cara de nojo. E isso irrita o inferno em mim.
— A Letícia está passando por dias difíceis. E um conselho, Maggie, não volte a falar
assim dela. Eu odiaria ter que chutar sua bunda para a rua. Entendeu? Educação cabe em todo lugar.
— Sim, senhor.
— Cadê o King e o outro segurança? Eles não deveriam estar guardando o apartamento
dela?
— Não sei. Quandocheguei, a porta estava livre.
Vou matar o King! Onde inferno ele se meteu? Vou para o meu apartamento com uma
enxaqueca dos diabos. Entro e encontro Valery fazendo ioga no meio da sala. Tinha até esquecido
da existência dessa mulher esticada em alguma posição estranha. Passo direto e vou para o quarto,
pensar. Toda essa viagem foi um desastre... não! Desde que conheci Letícia, o desastre está a um
passo de mim. O que era certo passou a ser incerto. O que estava no lugar, não está mais. E eu não
sei o que fazer nesse caso, porque nunca passei por isso antes.
Desde que saí do Brasil, minha vida está esse caos. Venho dia após dia tentando tirar a
desgraça daquela mulher dos meus pensamentos. E o pior é que nem tinha experimentado sua doce
boceta ainda e tornei-me um louco do caralho. Agora que tenho conhecimento do seu gosto, não sei
se poderei manter-me longe dela. Acreditei que estando a mais de seis mil milhas de distância as
coisas esfriariam e ela se tornaria uma mera lembrança. Não foi o que aconteceu!
O dia em que Ethan surtou e sumiu fui o primeiro a localizá-lo no apartamento da Letícia.
Aquele dia falei com ela por alguns minutos e bastou para querer embarcar de volta ao Brasil
também. Inferno! Essa coisa está indo longe demais. Eu sei o que me espera no final da linha:
Letícia com os bolsos cheios de dinheiro e meu coração quebrado, enganado pelo meu próprio
tesão. Repito constantemente que é somente sexo, nada mais. Assim que eu conseguir isso,
satisfazer-me e tirá-la do meu sistema, será bye bye, baby girl!
Os dias que Ethan ficou no Brasil foram um calvário para mim. Não fazia ideia do porquê
ele enviava-me fotos dela e também não faço a menor ideia do porquê tenho cada uma delas
guardada em meu telefone. Não satisfeito, Ethan enviava-me conversas entre eles, principalmente
aquelas em que ela ria. E, com o passar dos dias, percebi que o som da sua risada fazia-me dormir
profundamente. De lá para cá, não tenho tomado qualquer medicamento para dormir ou para a
enxaqueca. O seu riso alivia qualquer pressão ou desconforto que eu esteja sentindo. Não sei qual a
ligação, mas é assim que funciona, Letícia é o meu remédio.
Isso incomoda o inferno em mim. Nunca permiti que mulher nenhuma estivesse tão perto de
mim. Mas, mesmo de longe, Letícia conseguia estar perto demais e isso não está certo! Eu tinha que
fazer alguma coisa. Então, comecei a sair com todas as mulheres que chegavam até mim. No
começo, foi bom, mas, com o passar dos dias, perdeu a graça e voltei à estaca Letícia.
Por diversas vezes, eu pensei em ligar, mas desisti de todas elas. A partir do momento em
que eu procurá-la, estarei abrindo uma porta que não se fechará facilmente. Sou um homem realista
e coerente, conheço limites, apesar de não respeitá-los, e manter essa porta fechada é o certo a se
fazer. Dois dias antes de embarcar para Abu Dhabi, King chamou minha atenção.
— Está difícil de te suportar, cara. Um de seus assistentes está chorando há dez minutos.
O que está acontecendo? Nos últimos dias, você está mais nervoso do que de costume – eu não
tinha percebido que meu estresse tinha sido tão perturbador.
— Não sei o que está acontecendo comigo. Deve ser o cansaço – falo exasperado.
— Então, tira férias, porque ninguém mais quer ficar a sua volta.
Eu sabia o que me incomodava, só não queria admitir. Eu já vi essa novela com outras
pessoas e, em nenhuma das vezes, deu certo. Os caras encontram a foda da sua vida e viram uns
tapados, incapazes de ver a realidade a um palmo de seus narizes. As mulheres, por sua vez,
enrolam os “paus nervosos” em volta dos seus dedos e os fazem de palhaços. No meu caso, não é
amor, é uma competição para ver quem a leva para a cama primeiro. Estou obcecado com a ideia
de ganhar, só isso. Sou um jogador nato, desafios me revigoram.
Fui a um coquetel e Valery estava lá. Já saímos algumas vezes e, se eu não estou enganado,
já viajou uma ou duas vezes em minha companhia. Acreditei ser uma brilhante ideia de trazê-la
para o Oriente. Era a companhia perfeita. Uma linda modelo de lingeries, loira, que não faz muito
meu tipo, só que manda muito bem na cama. E, o principal, é completamente o oposto de Letícia.
Quando eu a convidei, tinha tudo planejado. Ela não sairia do meu lado por nada e,
enquanto estivéssemos no quarto, eu não sairia de dentro dela. Com isso, a Letícia se manteria
longe. O que eu não contava era que eu não conseguiria manter distância dela. E tem mais a porra
da aposta. Ainda não me decidi se estou arrependido ou não.
Entrei nessa putaria porque tinha certeza que iria ganhar. O único rival a minha altura é
Larkin. Ele é o único que pode tirá-la de mim. Todos sabem que, a partir do momento que ela deitar
na cama de alguém, estou fora! Se for Larkin, pior ainda, porque ele a quer para casar, está
apaixonado. Eu falei para ele: case-se com ela após a minha noite com ela. Só que o cara é
teimoso e está disposto a acabar com a festa de todo mundo. Mas ele está tão enrolado nisso quanto
nós. É tarde demais para voltar atrás e fazer papel de bom moço. Ela jamais o perdoaria.
Eu soube que sentia saudades no momento em que coloquei meus olhos nela. Letícia estava
linda com aquele vestido branco que tinha sido costurado já no corpo, de tão perfeito que era o seu
ajuste. Seus olhos se destacaram com a maquiagem, fazendo-a ainda mais impressionante. Naquela
noite, decidi que me afastaria dela, Letícia pode ser minha ruína. Meu telefone toca, tirando-me do
devaneio. Olho o visor e vejo que é Ethan.
— Fala, E...
— E., o caralho! Que porra você fez com a Letícia, seu filho da puta? – ele estava gritando
ao telefone, mas tenciono ao ouvir o nome dela.
— Do que você está falando? – pergunto com cuidado.
— Quando voltamos ao apartamento, a Letícia estava no chão, chorando, Zachary. Ela não
tinha forças nem para levantar-se. E a menina só se acalmou depois de dois calmantes. Caralho!
— Estou indo vê-la – falo já me levantando.
— Nem fodendo! A segurança tem ordens expressas para ninguém passar, principalmente
você. Então, traga esse traseiro arrogante até o meu apartamento, agora. Ou eu mesmo irei quebrar
sua cara aí na sua suíte.
Ele desliga e eu fico olhando o telefone na mão. Eu deveria ter mais cuidado, ela não estava
em condições para discussões. Deus, ela é preciosa demais para ser ferida. Saio do quarto e
encontro King sentado no sofá.
— Onde você estava, Kingston?
— Estou aqui – ele responde como se a minha pergunta fosse tola.
— Enquanto eu estava na suíte da Letícia, você estava aonde, idiota?
— Um dos assistentes me chamou, dizendo que estava com problemas. Dei instruções para
o Luke se manter ali e fui ver o que era – King olha-me ir até a porta. — Está pensando em ir a
algum lugar?
— Estou indo à suíte do Ethan. Diga ao Lennon para ir até o apartamento da Letícia e
conseguir informações sobre o estado dela. E, para sua informação, Luke não estava lá quando saí.
Ele acena e já está com seu telefone a mão. Enquanto King falava com Lennon, íamos em
direção ao apartamento de Ethan. Assim que batemos na porta, meu amigo a abriu com um copo de
whisky na mão.
— O que caralho você fez com ela, Zach? – ele aponta para Kaleb. — Ele viu o estado que
a encontramos. Conte para esse babaca, Kal.
Kaleb encara-me.
— A senhorita Letícia estava chorando, encolhida no chão. Corta o coração só de
relembrar. Ver uma mulher tão forte naquele estado é triste.
King, Kaleb e Ethan olham-me, esperando que eu fale alguma coisa. Vejo que não tenho
saída e conto o que aconteceu.
— Eu transei com a Letícia – os três chiam. — Aconteceu! Não tinha como controlar e acho
que eu nem queria. Enquanto eu estava com ela, esqueci de todo o resto. Quando lembrei da aposta,
o meu humor mudou e ela achou que eu tinha me arrependido de transar com ela. Na verdade, ela
acha que a detesto e me expulsou aos gritos de lá – eles balançam a cabeça em desaprovação. —
Se eu soubesse que ela ficaria mal, não teria saído de lá.
Ethan se joga em um dos sofás.
— Você é um bastardo filho da puta – E.passa a mão pelo seu cabelo, exasperado. — Pelo
que a Lorena me contou, a Letícia é encantada por você. Sonhava com os seus olhos mesmo sem
nunca ter te visto. Eu não sei se é destino ou não, mas ele já tratou de fodê-la quando te jogou no
caminho dela. Mas você tinha que piorar a situação.
Ele vai até o barzinho, enche dois copos, entrega um a mim e volta ao seu discurso.
— Os outros não podem nem sonhar que você já a fodeu. A ideia de cada um ter o seu
tempo para conquistá-la sem correr o risco do outro interromper a jogada foi sua, animal! Eu só
não abrirei o bico para os outros porque eu sabia que você ganharia essa porra de aposta.
— Eu não quero machucar a Letícia e não me arrependi de tê-la. Não sei de onde aquela
mulher tirou essa ideia absurda. Não há como explicar isso a ela, Ethan. E mais, tem a merda da
aposta e eu não sou homem de voltar atrás com minha palavra.
— Seja como for, amanhã ela embarca com o Rossi para a Itália. Ele alugou uma casa em...
sei lá onde. Só sei que é uma das ilhas mais bonitas de lá – Ethan termina sua bebida. — Rossi é a
menor das minhas preocupações agora.
— Ela não ficará com o Rossi, assim como não ficou com o Bashir, ambos são casados e
isso a impede de ir adiante – falo resignado.
— Eu acho que você não se deu conta das coisas, mas farei o favor de esclarecer. A Letícia
não é tão frágil assim e mulher, quando quer se vingar, meu amigo, o capeta é nada perto delas.
Então, ela pensa que o cara dos seus sonhos a usou. No consenso geral das mulheres, ela não tem
nada a perder e Rossi é um puta de um encantador de calcinhas. Então, de agora em diante, tudo
pode acontecer. Até mesmo Bashir voltou a ter chances.
Isso me fez beber todo o conteúdo do copo em um só gole. Eu não suporto a imagem de
outro homem a tocando, possuindo-a, como eu fiz. Dessa vez, sou eu quem vai até o bar encher o
copo. King olha-me com reprovação, ele também é protetor com ela. Isso é uma das coisas que me
incomoda, ela desperta esse carinho nas pessoas. Minha experiência diz que pessoas assim sempre
têm segundas intenções, elas não conquistam ninguém à toa.
Kaleb abre a porta e Lennon entra:
— Ela está bem, senhor – ele acena e sai.
— Um segurança para ela é pouco. Vocês devem aumentar o contingente antes do mundo
tomar conhecimento da nova companhia. A partir daí, ela será alvo fácil – King fala.
— Enquanto ela estiver com um de nós, estará sempre protegida e Luke estará com ela.
Depois, King já terá mais dois seguranças contratados para protegê-la – falo.
Conversamos sobre como proceder com a logística da vida da Letícia. Tenho certeza de que
ela não achará necessário ter seguranças e morar em um lugar mais seguro. King e Kaleb serão
responsáveis pela segurança dela, assim ficarei mais tranquilo. Enquanto todos falam, perco-me em
meus pensamentos. O fato de tê-la machucado me incomoda, eu não deveria me sentir assim, já
passei por situações piores e nenhuma delas me afetou como agora.
Eu queria matar Bashir quando a vi pálida de dor na reunião. Até Letícia esclarecer que
caiu tentando sair da cama, deu trabalho para controlar a vontade de bater naquele bastardo. Todos
nós estávamos nitidamente preocupados, mas me contive. Ethan me ligava de hora em hora para
dizer como ela estava. Sei que o médico foi chamado às pressas e aplicou-lhe remédio por causa
da dor. Ela passou o dia dormindo e a cada minuto que passava, mais ansioso ficava para vê-la.
Até ele ligar-me:
— Como ela está?
— Está bem, sentada na sala, conversando conosco – Ethan responde.
Ouço vozes e risadas ao fundo, como se estivessem em uma festa.
— Quem está aí? – pergunto curioso.
— Sebastian e Rossi babando sobre dela.
— Ethan, eu preciso que você tire-os daí. Quero passar um tempo com ela. E levarei seu
jantar.
— Ok – ele responde.
Em seguida, liguei para Mag e mandei providenciar um jantar para duas pessoas na
suíte da Letícia. Instruí King:
— Você vai ficar guardando aquela porta para que ninguém entre. Quero meu tempo
sozinho com ela, King.
— Certo.
Vou para minha suíte, tomar banho e trocar de roupa. No caminho, encontro Valery
brava, no sofá.
— Zachary, onde você estava? Estou te esperando para jantar.
— Pode ir jantar, eu já tenho compromisso – falo já saindo. Não dou tempo para
questionamentos. Arrumo-me rapidamente e atendo ao telefone que toca sem parar.
— Zachary, falando.
— O senhor Larkin está na suíte da Letícia. Peço comida para três? – Maggie avisa.
— Não. Avise-me quando ele for embora – Larkin está me saindo melhor do que a
encomenda. Ele realmente está apaixonado por ela. D
Enquanto aquele duende está com a Letícia, ligo o meu computador para ler meus e-
mails. Quinze minutos se passam e nada da Mag ligar. Larkin não vai sair de perto dela tão
cedo. Vou à procura de King e o encontro no barzinho do apartamento.
— King, liga para o Luke e mande-o ver o que está acontecendo no apartamento da
Letícia.
Prontamente, ele liga para Luke, franze a testa e desliga o telefone:
— Ele disse que está tudo bem. Depois que o Ethan saiu com os outros, Larkin esteve com
ela, mas saiu poucos minutos depois. Desde então, ela está só com a Lorena e está bem.
Mag está a cada dia mais relapsa, tenho que ter outra conversa séria com essa garota.
Peço para o King providenciar o jantar na suíte da Letícia dez minutos depois. Quando chego ao
apartamento em que Letícia está hospedada, sou recebido por Lorena e realmente nenhum sinal
de Larkin. Essa coisa da Mag esquecer das minhas ordens, está estranho.
Voltando para o hoje, as imagens de Letícia nua, seus gemidos, o modo com que seu corpo
se contorcia e sua doce boceta fazem meu pau endurecer e ter vontade de voltar lá e tomá-la
novamente. Seus olhos eram tão claros, que dava para ver sua alma, eu lia cada sentimento que se
passava neles e gostei de cada um. Em outros tempos, com outras mulheres, me incomodaria com
tais coisas, mas não com Letícia. Nada nela me incomoda. Ainda posso sentir seu gosto em minha
boca. É possível uma mulher ser doce daquela maneira? O cheiro da sua excitação deixou-me como
um animal faminto. É impossível ter uma mulher daquelas e não querer mais.
Um sorriso espalha-se pelo meu rosto ao lembrar-me do preservativo rasgado. A foda foi
tão intensa que o preservativo não aguentou. Eu deveria entrar em pânico, mas há dois meses, no
meu check-up de rotina, o médico reafirmou o que vem acontecendo há algum tempo, minha
contagem de esperma está baixa. Seria difícil engravidar uma mulher na primeira tentativa e eu
teria que fazer um tratamento para ter filhos. Também não tenho doença alguma e tenho absoluta
certeza que a Letícia também não. Não haveria porque contar a ela e estragar o momento, porque,
com toda a certeza, ela surtaria.
A hora que ela se levantou para ir ao banheiro, desfilando nua, eu já estava pronto para
mais uma rodada. Fui atrás dela e a peguei, tirando a faixa do seu corpo. Impulsivamente, me
abaixei e beijei as marcas. Um corpo tão bonito não deveria ter ferida. A Letícia é magra, cintura
fina, mas seus quadris são mais largos que o padrão, suas pernas são mais grossas e seus seios são
fartos. Não é um corpo proporcional e nem dentro de padrões estéticos que estamos acostumados a
ver. Só que eu não mudaria nada nela, ela é simplesmente perfeita e gostosa para caralho!
— Zach... – olho na direção de Ethan.
— O quê?
— Aposto toda minha fortuna que você estava pensando na transa com a Letícia – ele fala,
sorrindo.
— Você pode perder, imbecil – seu sorriso fica maior.
— Ninguém se perde em pensamentos depois de uma cagada e sorri dessa maneira.
Mostro o dedo do meio para ele.
— Aposta isso, imbecil – falo e mostro o dedo do meio a Ethan-babaca-Scott.
* * *
Eu não fui maduro o suficiente para ver Letícia partir com Rossi para a Itália. Eu tinha que
sair de Abu Dhabi antes deles. Depois da conversa com Ethan, milhões de imagens povoaram
minha cabeça e em nenhuma delas eu estava. Um filme em que Sebastian a fodia e em outras cenas
era Martino que o fazia. Mas as que mexeram comigo, foramas de Larkin de braços dados com ela.
Odiei cada uma, odiei Letícia por estar em todas, odiei por não estar em nenhuma e odiei estar
agindo como um obsessivo.
Durante o voo de volta para casa, tive que ouvir a playlist horrível da Valery enquanto eu
tentava trabalhar. Não conseguia concentrar-me em nada e culpava a música por isso, mas sei que o
real motivo era outro. Em um certo momento, apenas me perdi olhando para a tela a minha frente e
prestei atenção na letra da música que estava tocando.
....Lembra daquelas paredes que construí? Bem, elas estão desmoronando. Elas nem
tentaram ficar em pé, nem fizeram um som e eu achei um jeito de deixá-lo entrar. Mas eu nunca
tive dúvida, sob a luz de sua auréola, eu tenho meu anjo agora. É como se eu estivesse
despertando, todas as regras que eu tinha, você está quebrando. É o risco que eu estou
correndo... – reconheço a intérprete, Beyoncé, mas não sei o nome da música.
— Que música é essa, Valery?
— Halo da Beyoncé. Gostou? – ela desfila até mim e senta-se em meu colo. — Que tal
irmos para o quarto no fundo do avião para discutirmos melhor sobre as suas paredes – ela
aproxima-se do meu ouvido. — Que tal a gente derrubar essa parede de roupas e foder até
desmaiar? Você está me devendo, Zach. Nessa viagem, você está distante.
Em outro tempo, ela não teria terminado a frase e já estaria nua no meio do meu avião
enquanto eu a foderia em frente a todos. Em outros tempos... quando Letícia ainda não existia.
Enquanto ela não fodia minha cabeça. Tiro Valery do meu colo e volto ao trabalho em meu
computador. A viagem é longa, estou revoltado comigo mesmo por não conseguir tirar aquela
mulher da minha cabeça. E como se não faltasse mais nada, até as músicas da Beyoncé estão
mexendo comigo. Deve estar nascendo uma vagina em mim.
* * *
Desde que pousamos, não saio de casa. Mais especificamente do escritório de casa. Tudo o
que tenho que fazer é feito por aqui. Não tenho dormido porque, cada vez que fecho os olhos, o
olhar dourado daquela mulher aparece. Apaguei todas as imagens e áudios dela em meu celular.
Preciso de distância. Não serei dominado por um sentimento ilusório medíocre. Pois tudo o que se
trata de coração é ilusão. Preciso de uma mulher, urgente! Uma não... duas. Talvez Ethan esteja
organizando uma festinha.
Alcanço o telefone e ligo:
— Então, o senhor O´Brian resolveu aparecer. Ninguém tem notícias suas há quase dez dias,
cara – E. fala antes mesmo de cumprimentar-me.
— Estou trabalhando em casa, palhaço. Preciso ir a uma daquelas suas festas – falo.
— A coisa é séria. Primeiro, não faço mais esse tipo de festa. Estou com a Lorena e não
quero que nada dê errado. Segundo, você nunca esteve desesperado assim a ponto de me ligar. O
que está acontecendo? – seu tom de voz é sério.
— Preciso me divertir. Tenho trabalhado demais – ele fica em silêncio, esperando que eu
dê mais explicações. O que caralho eu deveria falar? Fodi a Letícia agora a quero como um
sedento quer água no deserto? — Esquece! Deixa que eu mesmo arrumo as garotas.
Desligo o telefone antes que ele possa dizer algo que leve meus planos a perder. Repasso
todos os nomes dos meus contatos e acho as meninas perfeitas. Duas morenas de origem latina,
cabelos cumpridos, com bocas que fazem um estrago. Ligo para ambas e envio um carro para
buscá-las. Enquanto isso, tomo meu whisky, sentado na varanda do meu apartamento em Manhattan,
onde posso ver parte da cidade iluminada.
Quando as garotas chegaram, eu já estava alto. As levei para o quarto de hóspedes, porque
o meu é sagrado. Não há motivos para levar fodas esporádicas para depois me cobrarem
casamento. Liguei o som e deitei. Logo, ambas nuas, tomam em suas bocas a parte do meu corpo
que lhes convinham. E em meio a loucura da transa, eu não sei que porra aconteceu. A música do
The Weeknd começou a tocar e não vi mais nada a não ser Letícia, linda como sempre, ao som da
mesma canção que tocava quando a possuí tempos atrás.
— Letícia... Letícia... Letícia... – não sei quantas vezes transei com ela, mas tive tudo o que
queria. E adormeci quando a exaustão me alcançou ao nascer do sol, trazendo brilho para a vida
que, provavelmente, já não me pertencia mais.
Acordo com cabelos em meu rosto que não eram meus. Apalpo e sinto um corpo em cada
lado. Que merda eu fiz? Abro os olhos e vejo as duas mulheres dormindo tranquilamente. Bastou
abrir os olhos para a minha enxaqueca ou ressaca atravessar, mal conseguia manter os olhos
abertos. Saí da cama e fui para o banheiro tomar banho e, depois de vestir-me, fui caçar um
remédio ou uma faca, o que achasse primeiro. Encontro Mag em minha sala de estar, com o rosto
vermelho de raiva, enquanto King fala ao telefone, concentrado.
— Mas está tudo bem com ela? Já está na Grécia então... Ok. Até – eu sei que falava da
porra da mulher que está acabando com a minha vida. E eu sinto-me imediatamente protetor em
relação a ela.
— Ela está bem? – sento-me no sofá à espera do café e do remédio que a Ruth logo trás.
King encarou Mag até ela se retirar.
— A Letícia teve uma discussão séria com o Rossi. Luke falou-me que, quando chegou ao
lugar de onde vinham as conversas, ela já tinha esbofeteado o cretino. E embarcou para a Grécia
ontem.
— Aquele bastardo merece uma surra – falo entre os dentes. Ruth serve-me e King espera
ela sair para falar:
— Zach, não precisa ser um gênio para saber o que se passa com você. Só não entendo por
que você está sabotando a si próprio. A Letícia pode ser a sua chance de ser feliz, cara. Mulheres
como ela, foram criadas para que caras como nós tenhamos uma chance de redenção. Aquela
menina é um anjo que caiu na sua vida, não seja um bastardo egoísta e bote tudo a perder. Porque a
vida vai lhe cobrar caro por machucar um anjo como aquele.
— Não sei do que você está falando – desconverso.
— Sabe, você sabe muito bem. Ela foi feita para você, qualquer um enxerga isso. Mas, se
você preferir continuar vazio assim, deixe-a ir. Ela não merece um cretino como você.
Ouço vozes alteradas vindo do quarto de hóspedes e saimos em disparada para ver o que
acontece. As mulheres colocam suas roupas enquanto Mag esbraveja. Deus! A mulher está
completamente descontrolada. King retira as moças e as envia para casa. Eu levo Mag para o
escritório. Hoje é dia de uma conversa definitiva, mesmo com uma ressaca dos infernos. Recosto-
me em minha cadeira.
— Seu descontrole está passando de todos os limites. Que show foi aquele?
Ela retira seus óculos e seca as lágrimas. Ah, merda! Eu não sei lidar com isso.
— Elas me insultaram quando pedi para se vestirem e avisei que o motorista as esperava
em frente ao Solarium – lágrimas abundantes correm por seu rosto. — Eu trabalho para você por
tanto tempo, Zach, não mereço ser tratada assim pelas suas vadias.
Isso mexe comigo. Não é bom que a minha vida interfira de modo negativo na vida de meus
colaboradores. Dou a volta na mesa e pego sua mão:
— Eu sei, Mag. Peço desculpas pelo que aconteceu. Você não tem que lidar com as minhas
merdas o tempo todo.
— Obrigada – seus sentimentos passam por seus olhos e desvio de qualquer coisa que
venha me chutar na bunda depois. Não quero saber que ela sente por mim mais do eu deveria sentir.
Levanto-me e volto para a minha cadeira.
— Localize Ted e mande-o vir agora.
— Sim, senhor – Mag sai, fechando a porta atrás de si.
Meu escritório foi projetado entre os dois apartamentos da cobertura. A parede que fica
atrás de mim é toda em vidro escuro, daqui posso ver parte da cidade. As palavras de King
mexeram com alguma coisa em mim que eu nem sabia que existia. É inegável que estou obcecado
por Letícia e a coisa piorou depois de ter sentido seu gosto, de memorizar cada pedaço do seu
corpo.
— Queria falar comigo, senhor? – Ted aparece na porta.
— Fecha a porta e sente-se. Ted, é possível recuperar arquivos excluídos de um celular?
— Na maioria das vezes é. Posso ver o aparelho? – entrego meu aparelho para ele que
mexe... mexe... mexe demais. — É possível, sim. Alguma coisa específica, senhor?
— Não.Apenas recupere tudo e entregue-me o mais rápido possível.
— Posso ficar trabalhando aqui? Em pouco tempo já conseguirei entregar-lhe os arquivos –
ele fala, já abrindo seu laptop.
— Logo jantaremos – levanto-me e aponto a minha cadeira para que ele trabalhe
confortavelmente. — Então, corra!
Ando em direção à sala e ouço uma conversa estranha entre King e Mag:
— Não diga uma palavra sobre isso a ele, Mag.
— Ele tem que saber. Afinal, King, ele é quem paga todo mundo para repassar as
informações – ela responde.
— Mulher, você não sabe o que está falando...
Interrompo, pegando-os desprevenidos.
— Não dizer nada a quem?
Mag sorri e canta como um pássaro enquanto King faz careta de desaprovação.
— Luke passa um relatório para o King todo final de tarde. Estava dizendo a ele que é
nosso dever o deixar informado. Já que é o senhor quem nos paga.
— Podemos conversar em particular, Zach? – King fala a contragosto.
— Vamos para o meu quarto – lá é o único lugar que acredito que não tenha como ninguém
nos ouvir. Assim que fecho a porta, volto-me para o chefe da minha segurança. — O que você tem
para me contar, King?
— Antes de qualquer coisa, eu não acho certo a Mag dormir aqui sempre que quiser. Não
concordo que ela tenha livre acesso a todos os cômodos da cobertura, incluindo o meu quarto e
meu escritório.
— De uns tempos para cá, você tem ficado incomodado com ela. Por quê? O que ela te fez?
– pergunto curioso.
— Mag tem estado estranha, Zach – King hesita e eu sinalizo com um aceno de cabeça para
ele continuar: — Luke envia-me um relatório no final de cada dia que contém as informações do
que a Letícia fez, quem teve acesso a ela, essas coisas. Nós que somos chefes de segurança
gostamos de ter esses pequenos detalhes cobertos. Porque, se houver algum problema, as respostas
podem estar nesses detalhes – ele entrega-me um papel. — A Letícia ficou mais tempo do que o
esperado na Itália.
Isso me faz pensar que Martino teve êxito em alguma coisa.
— É o que parece – falo, olhando o papel. Ele balança seu dedo indicador.
— Negativo! Não é o que está pensando. Ela precisou ir para Roma para fazer um
tratamento para amenizar a dor na costela. A Letícia não podia ter viajado naquele dia, a queda era
recente. Depois, o Rossi a levou para a sua casa na Sicília, onde ela pôde descansar por uns dias.
O Larkin esteve dois dias com ela sem a presença do anfitrião. O que gerou a ira do italiano, que
foi tirar satisfações com a Letícia e acabou nocauteado por ela – King sorri com orgulho dela. Ele
limpa a garganta e volta a falar: — Agora ela está com a costela e a mão enfaixada. O soco que a
menina deu no italiano fez estrago em ambos.
Ando pelo quarto e acabo em frente à vidraça. Larkin está trabalhando arduamente para
atrapalhar tudo. Isso não dará certo! King continua o relatório. — Não aconteceu nada entre ela e o
Larkin.
— Como você sabe?
Ele se coloca ao meu lado.
— Todos os chefes de segurança estão com receio de que passem seus patrões para trás
nessa maldita aposta. Então, de comum acordo, passamos relatórios uns para os outros. Zach, eu sei
que você acha que ela é como as outras, só que não é. Ela não quer o empresário, ela quer você,
com suas grosserias, com seus erros. A Letícia não cederá aos outros porque está apaixonada por
você.
— Chega, King! Você está velho demais para bancar o cupido e me conhece muito bem para
saber que não acredito em amor. Então, esqueça esse assunto – falo irritado.
— Eu vou parar por aqui, só que vou te dar um aviso, deixe-a ir. Seja homem e saia dessa
aposta. Você já experimentou para saber o gosto, agora a deixe viver a vida dela longe de você.
King sai batendo a porta e solto a respiração que nem tinha percebido que estava
segurando. Eu deveria ser homem o suficiente para deixá-la ir, mas não sou! Se ela realmente
estiver sendo sincera e se apaixonado por mim, só tenho que lastimar por seu coração. Eu não sou
homem de paixões. Letícia deveria ter se apaixonado por Larkin, que é um bom homem, gentil e
educado, quase um santo. Desde que sua esposa faleceu, nunca foi visto com outras mulheres. Faz o
papel do bom moço solitário, o sonho de consumo de qualquer mulher da face da Terra. É o homem
ideal para Letícia, ele poderia dar amor, casamento, filhos e tudo o que ela deseja.
Mas, infelizmente, as variáveis não estão do lado dele e há dois problemas que aquele
duende tem que aceitar. Um, ele não sou eu. Dois, ela não é dele. Sou egoísta, sim! Não a deixarei
ir e vou tê-la novamente quantas vezes forem necessárias para satisfazer meus desejos.
Mais tarde no jantar, Ted entrega-me um cartão de memória com os arquivos recuperados.
Já deitado em minha cama, procuro o áudio com a risada dela. Não me contenho e sorrio diante
daquele som que, de alguma maneira, conforta-me. Faz-me sentir... em casa.
 
CAPÍTULO 17
 
Zachary
Minha manhã foi excelente como há muito não era. Levantei disposto depois de tanto tempo
dormindo precariamente e acordando com enxaqueca intensa. Estou de bom humor e nada pode
tirar-me isso hoje. Quando abri os olhos, resolvi dar uma chance a essa coisa com a Letícia, seja lá
o que for. Céus! Só de pensar nela, sorrio como um bobo.
Fechado em meu escritório na cobertura, trabalhando ou tentando trabalhar, ouço Mag bater
à porta e entrar com pastas em seus braços.
— Bom dia, Mag – seu rosto fechado chama minha atenção. — Sente-se e conte-me o que
está lhe deixando com essa carinha séria.
— Eu não sei se devo contar, senhor.
Querendo ou não, ela me contará.
— Diga-me o que é, Maggie – não foi uma pergunta e sim uma ordem.
— É sobre a senhorita Letícia.
Dou a volta em minha mesa e sento-me rosto a rosto com a minha assistente.
— Conta de uma vez! – minha paciência já estava por um fio.
— Eu sei que King contou o que tinha naqueles relatórios, mas não posso omitir alguns
detalhes que ele deixou de fora, como a visita do senhor Liam Larkin. Fiquei curiosa com os
relatórios e, quando li que o senhor Larkin esteve na Itália, pedi a um amigo detetive para
investigar o ex-marido dela. Quando recebi o dossiê, fiquei estarrecida com o conteúdo. Os
depoimentos de vizinhos e familiares dele, contando o que ela tinha feito para causar a separação.
Algo dizia-me que isso não seria bom.
— E onde estão esses documentos, Mag? – a tensão é evidente em minha voz.
Ela me entrega uma pasta.
— O profissionalismo dela é incontestável, mas a Letícia não é o anjo que aparenta ser. Eu
sabia que aquela doçura toda não poderia ser real, mas achava que era cautela da minha parte.
Hoje, tive a certeza de que ela não é uma boa pessoa, é falsa e dissimulada – Mag coloca sua mão
sobre a minha. — Eu me preocupo com você, Zach.
— Obrigado, Mag. Agora vamos trabalhar.
Volto ao meu quarto e tranco a pasta no cofre. Decido trabalhar na empresa e visto um terno.
Durante todo o trajeto, analiso a situação. Se a Letícia é mau caráter como Mag insinuou, King
deve-me explicações sobre seu protecionismo sobre essa mulher. Alguma coisa não se encaixa
nisso. Eu vi sinceridade nos olhos da Letícia. Será que ela era tão boa atriz assim, a ponto de me
enganar?
Passei o dia no escritório, debruçado sobre a documentação da obra da Paradise. A todo o
momento, a pasta que está trancafiada em meu cofre volta para atormentar-me. E o que Mag havia
me contado faz piruetas em neon em meus pensamentos, dando-me certeza de que a Letícia é igual a
todas as outras mulheres. Ela quer o que posso proporcionar a ela, ou melhor, o que meu dinheiro
pode proporcionar-lhe.
Quando volto para casa, dou ordens para ninguém incomodar-me e fecho-me no quarto com
uma garrafa de whisky. Pego a pasta e sento na poltrona, girando para ficar de frente para a sacada.
Seja o que tiver aqui dentro, sei que ela pagará muito caro por posar de boa moça para mim.
Primeiro, olho o selo de autenticação, como todo bom escritório de investigação deve ter. Depois,
abro a pasta e, na primeira página, tem uma foto de alguém que deduzo ser o ex coitado.
Nome: Paulo Azevedo
Idade: 33 anos
Estado Civil:Casado
Cônjuge: Camila Souza Azevedo
Filhos: Paulo Eduardo Azevedo
 Melissa Souza Azevedo
Profissão: Advogado
Emprego Atual: Desempregado
 
Precisei encher outro copo para continuar a ler as próximas páginas, que contavam sobre o
relacionamento deles. Segundo diz aqui, Letícia sempre foi uma mulher empenhada no trabalho,
mas levava uma vida de luxo. Seu marido trabalhava somente para arcar com seu estilo de vida e
caprichos. Ela ganhou um carro de aniversário e, dias depois, o vendeu sem avisar o homem.
O pobre coitado foi enrolado direitinho pela cadela. Ele a pegou com um amante na própria
cama e ainda a perdoou. Idiota! Quem no mundo vê sua parceira transando com outro e ainda
perdoa? Ela não se conformou e continuou sua vida devassa paralelamente, até o dia em que ele se
cansou e saiu de casa sem dar satisfações, deixando tudo para trás. Dias depois, a mãe dele
apareceu para ver como ela estava e viu a casa arruinada. Letícia destruiu cada pedaço do lugar,
não deixando nada inteiro para contar a história.
Depois disso, ninguém mais soube dela. Lógico que não! A Letícia tinha que achar outro
infeliz para fazer de otário e arrancar seu dinheiro. Terminei de examinar a papelada depois de uma
hora e meia, esvaziei a garrafa para conseguir chegar ao final dessa história imunda. Mau caráter
não a descreve, ela é um demônio que, por onde passa, traz a ruína.
Para aquela puta dos infernos, a Vitrine não passou de um meio de chegar até os idiotas
ricos. Segurou a máscara de boa moça para conseguir agarrar um babaca rico e tomar posse da sua
grana. Desgraçada! Eu deveria ter confiado mais em meus instintos. Mas Letícia não perde por
esperar! Vou conquistá-la, ganhar a porra da aposta, expô-la para aqueles tarados e desmascará-la
na frente de todos. Não a quero na companhia, não a quero perto de mim e perto de nada do que é
meu.
Levanto da poltrona, tonto com tanta informação ou bebida, jogo meu copo na parede, de
ódio por aquela mulher. Como eu pude ser tão idiota? Agora tenho que acertar contas com King.
Saio pelo apartamento à caça daquele imbecil e o encontro em seu escritório. Sento-me na cadeira
de frente a ele.
— Vamos conversar, Kingston – pronuncio seu nome com desgosto e ele percebe.
King cruza os braços e encara-me:
— Sobre o quê?
— Sobre isso – jogo a pasta em sua direção e ele a abre olhando algumas folhas.
— Isso aqui não é verdade.
— Será mesmo? Eu só quero saber por que você a defende tanto, Kingston? Você mal a
conhece. Diga-me, ela está saindo com você também? Será que ela tem prometido dar uma parte do
dinheiro que conseguir levar do trouxa que cair em seu conto de boa moça?
King soca a mesa.
— Se há uma coisa que eu conheço na vida são pessoas. Se eu não tivesse bom
discernimento, com certeza não estaria aqui ouvindo isso de você, filho da puta do caralho! Eu não
tenho dúvidas quanto a índole da Letícia, mas duvido da de quem fez esse dossiê. Que, por sinal,
nem profissional é. Outra coisa, eu não vou permitir que você fale assim dela...
Rio da sua inocência em relação a uma boceta fingida.
— Você é mais ingênuo do que eu pensei. Não vê que ela não passa de uma boa atriz?
Cadela, golpista, interesseira. A Letícia não passa de uma vagabunda como todas as outras.
King dá a volta em sua mesa e levanta-me pela minha camisa.
— Seu bastardo de merda! Lava a porra da sua boca para falar dela, entendeu? – ele solta-
me e caio de mal jeito na cadeira. King respira e volta para o seu lugar, tão surpreso quanto eu pela
sua reação. — Eu sempre serei leal a você, Zachary. Independentemente de qualquer coisa ou
situação, eu sempre estarei ao seu lado. Vou continuar meu trabalho como seu chefe de segurança,
mas a partir de hoje Lennon e Mike serão seus guardas costas permanentes. Eu estarei trancado
aqui todo o tempo, coordenando tudo.
— King...
Ele joga a pasta sobre mim e vira-se para o seu computador.
— O dia em que você confiar em mim ou na minha equipe, de verdade, nós podemos
conversar novamente. Até lá, serei somente seu funcionário. E não esqueça de ligar para essa firma
de investigação e pedir reembolso. O serviço foi muito mal feito. Se me der licença, tenho que
verificar alguns documentos.
Não era essa a reação que eu queria. King é o meu melhor amigo, eu confio minha vida a
ele. Não é certo que essa mulherzinha abra esse abismo entre nós. Inferno! Saio de seu escritório
depois de perceber que ele realmente irá me ignorar. Passando pela sala, Ruth pergunta se jantarei,
mas a dispenso. Faço meu caminho até o barzinho e pego uma garrafa de vodca. Volto para o meu
quarto para me divertir com a minha amiga vodca, até ela dar-me doces sonhos com lindas
mulheres.
* * *
Os dias que seguiram, mantiveram-me informado sobre a rotina da Letícia e sobre cada
pessoa que se aproximou dela. Soube que ela ficou oito dias na Grécia, mas teve que voltar ao
Brasil por alguns dias. Parece que a mulher tem se mantido ocupada com um tal de Ricardo. Pelo
relatório, ela está fazendo doce para o bastardo. Talvez ele não seja rico o bastante para ela.
Também soube que ela chegou a Manhattan há dois dias. Ela e Lorena estão hospedadas no
apartamento do Kevin, três andares abaixo do meu.
Aí chegamos a outro ponto duvidável, ninguém emprestaria um imóvel desse calibre para
usufruto de um funcionário. A não ser que esse funcionário lhe dê algo mais que boa produtividade.
Talvez um lugar onde possa guardar sua doce amante longe da esposa? Ou um agrado, já que ela o
tem agradado de quatro? Talvez...
Ethan virá buscá-las para jantarem em um restaurante badalado da cidade e me convidou.
Está na hora de colocar meu plano “Bye Bye Letícia” em ação. Sei que ela gosta do meu corpo,
então escolho uma calça jeans escura e uma camisa bem ajustada ao corpo, permitindo ver os
contornos do meu corpo, na cor lilás. Olho-me no espelho e passo as mãos pelo meu cabelo. Não
sou do tipo que passa horas tentando domar fios, eu os deixo livres.
Dirijo até o lugar combinado e, assim que chego, sou escoltado até a mesa onde eles estão
sentados. Ela sorri quando me vê, mas logo seu sorriso desaparece e percebo seu corpo tremer. A
lembrança do episódio no Orienteainda é difícil para ela. Eu sei que a Letícia pode ler meu olhar e
a sua reação diz que o meu recado está dado. A boneca Lolo também não está muito feliz em me
ver, mesmo assim vou até ela e a beijo na testa.
— Como vai, boneca Lolo?
— Estou bem. E você? – Lorena responde friamente.
— Vou ficar melhor se a sua amiga cumprimentar-me – sento-me ao lado de Letícia e falo
em seu ouvido: — Como está, Letícia?
Sinto sua pele arrepiar e a respiração mudar. Ela responde em um sussurro:
— Estou bem – ela olha para todos os lugares, menos para mim, o que me faz sorrir. Seu
desconforto alimenta-me.
— Vamos pedir de uma vez. Estou faminto – digo enquanto aceno para um atendente. —
Como está sua costela? Eu soube que também machucou a mão.
Fazemos nossos pedidos e atendente retira-se. Letícia mostra a mão com unhas impecáveis
pintadas de vermelho.
— Tanto minha costela quanto minha mão estão ótimas. Obrigada pela preocupação, senhor
O´Brian – seu tom de voz é frio.
— Zachary ou Zach... – corrijo-a, mas ela corta-me. Meu pau faz festa.
— Prefiro senhor O´Brian – ela é uma boa atriz, mas eu também sei ser um bom ator.
— Eu queria conversar com você sobre o que aconteceu em Abu Dhabi. Eu não consigo
parar de pensar no que aconteceu – baixo meu tom de voz. — Não consigo esquecer o seu sabor.
Por favor, dê-me a oportunidade de explicar.
Ela observa-me.
— Tudo bem. Só marcar o dia.
— As obras começam segunda-feira. Estão ansiosos como eu? – Ethan interrompe nossa
conversa.
— Não! – Letícia e eu respondemos juntos.
— Não? – Ethan faz uma careta e volta-se para a Lorena, que está sorrindo. — Viu esses
dois? Não estão empolgados. Fodam-se!
— Eu não estarei presente – Letícia fala. — Estou em outro projeto e esse merece minha
total atenção nessa etapa. Mas a Lorena e o Kevin estarão lá.
— Perfeito! – Ethan diz e beija sua boneca. — Nãoque você não seja importante, Letícia.
Mas ela é a mulher da minha vida.
As duas ficam claramente emocionadas... não! A Lorena fica emocionada, aqueles olhos
brilhantes da Letícia são para o dinheiro do Ethan que ela alcançará através da amiga inocente
dela.
— Teremos um casamento em breve – falo com sarcasmo.
— Sim. Algum problema? – Ethan e eu nos encaramos, ele deixa claro que não gostou do
que falei. As coisas ficam um pouco tensas na mesa e levanto as mãos em sinal de rendição.
— Nenhum problema. Fico muito feliz pelos dois.
— Ainda não se acostumou ao sarcasmo do senhor O´Brian, Ethan? – Letícia fala.
— Isso me machucou, princesa – falo, colocando as mãos sobre o peito.
— Menos, bem menos. Ninguém te machuca, Mister Ego.
Durante todo o jantar não tirei os meus olhos de Letícia, a filha da puta estava linda. Uma
saia rodada curtinha, branca, uma blusa de renda verde-clara e saltos pretos. Imaginei todas as
posições que a colocaria, tiraria toda a sua roupa e a deixaria somente com os sapatos. Ela olha-me
com seu olhar dourado e falsa ingenuidade. Não suporto tamanho cinismo e desvio meu olhar do
dela. Há uma parte de mim, bem lá no fundo, que nega-se a acreditar que ela seja a mulher que
estava descrita naqueles papéis. Meu corpo não se controla em sua presença e minha cabeça viaja
nas imagens daquela noite em que a tomei. Porra!
Ao final do jantar, já na porta do restaurante, faço um convite:
— Estamos indo para o mesmo lugar, posso te dar uma carona, Letícia? – Ethan deixou
escapar que a Letícia dormiria sozinha no apartamento do Cooper, pois Lorena irá ficar com ele.
— Ótimo! – Lorena abraça e beija sua amiga no rosto. — Até amanhã, crianças. Juízo – ela
coloca as mãos na cintura. — E você, senhor O´Brian, cuide-se! Não esqueci o que aconteceu nas
Arábias.
Lennon encosta o carro e Mike abre a porta para nós. Ela olha entre mim e o novo
segurança.
— Cadê o King?
— King agora fica só no QG. E cadê os seus seguranças? – olho ao redor à procura de
quem a guarda.
— É só o Luke e hoje é sua noite de folga.
Engulo minha irritação para não foder com o plano. Já basta meu pau jogar contra mim, não
preciso de mais erros. Entramos e puxo o cinto de segurança para atá-la.
— Nossa princesa tem tendência a se machucar. Vamos protegê-la. Conte-me seus planos
para os próximos dias.
Ela está tensa, preciso que relaxe.
— Tenho que assinar alguns papéis da transferência do imóvel que comprei, amanhã pela
manhã. E, depois de amanhã, na sexta-feira, irei à Thorton Holding Internacional.
— Fazer o que na Holding? – como eu não sabia disso?
— Tenho que assinar alguns papéis referentes à Paradise. Não sabe o que acontece nas suas
empresas, senhor O´Brian?
— Parece que não – foi minha vez de olhar para fora, desconfortável por saber que tenho
sido negligente. Por que a Mag não me falou nada? A partir de amanhã, as coisas mudarão. Nunca
fui relapso com meus negócios, sempre estive à frente de tudo e não pretendo mudar. — E depois?
— Depois pegarei uma carona com Ethan para o Rio, mas ficarei em São Paulo, cuidando
de um projeto.
Boa oportunidade para ir ao Brasil e dar mais um passo do meu plano. O carro estaciona
em frente ao meu prédio. Mike abre a porta para mim e eu estendo a mão para ajudar Letícia a sair.
— Também embarco no sábado à noite para o Rio de Janeiro, para instalar-me em minha
nova casa. Depois vou ao Ceará para o início das obras. Por falar em casa nova, poderia me ajudar
a contratar empregados? Ninguém melhor que...
Assim que entramos no elevador, seus olhos dourados encontram os meus e algo dentro de
mim agita-se.
— A casa já conta com um quadro de funcionários que entrou nas negociações. Sua casa
está pronta para recebê-lo, senhor O´Brian.
— Verifiquei todas as minhas planilhas dos imóveis e não constava pagamentos a um novo
quadro de funcionários, somente a segunda e última parcela da compra da casa.
O elevador para no andar em que ela está hospedada e seguro a porta. Letícia sai do
elevador e vira-se com um sorriso de compaixão. Minha ira irradia pelos poros no mesmo nível
que minha excitação.
— Você tem que ver isso com a sua assistente, já que a designou para lidar comigo. Envio
e-mails e relatórios para a Maggie, inclusive dizendo que abri mão da minha comissão. Como não
houve resposta por parte de vocês, paguei a empresa que administra os funcionários da casa – devo
ter mostrado que estava perdido com todas essas informações, quando ela volta a falar comigo, sua
voz é suave. — Eu tenho toda a documentação em casa, Zachary. Assim que estiver no Brasil,
ligue-me e os levarei para que você confira.
— Obrigado. Podemos conversar amanhã? Quem sabe comemorar sua casa nova? – aperto
o botão para segurar o elevador nesse andar e caminho até ela, alcanço suas mãos e as beijo em
real agradecimento.
— Podemos sim. Boa noite, senhor O´Brian – entro no elevador e vou até a cobertura.
Assim que saio do elevador, a porta do meu apartamento abre-se e King surge com seu
rosto retorcido de desaprovação.
— Eu o vi com a Letícia. Você não falou nenhuma merda para ela, falou? Juro por tudo o
que é mais sagrado que te...
Levanto a mão e o corto. Estou atordoado demais para discutir.
— Não, King. A Letícia está salva, pelo menos por hora. Sabe se Mag está aqui?
— Não sei – seu rosto, que teve um momento de alívio, volta a fazer uma careta. — Boa
noite.
Desde aquela conversa, eu não tenho mais meu amigo. Até nisso aquela infeliz se meteu.
Vou para o meu quarto colocar meus pensamentos em perspectiva, porque, definitivamente, há
alguma coisa errada. Horas depois, ainda sem sono, volto para o escritório e repasso algumas
planilhas e realmente não há nada. Como eu não percebi antes?
* * *
Não preguei os olhos essa noite, estou cansado e meu humor voltou a ficar nível zero.
Dispenso o café da manhã e vou direto ao escritório do King. Abro a porta e o encontro de frente
para as telas. Assim que percebe minha presença, ele se levanta.
— Bom dia, chefe.
— Bom dia. Podemos conversar? – preciso de você, cara! Meus olhos dizem isso. —
Como amigos? – King assente e eu continuo a falar. — Ontem eu soube que a Letícia tem um
horário na Holding amanhã, para assinar alguma coisa. Mais tarde, eu soube que ela vem cobrindo
os salários dos funcionários da casa do Rio. King, eu trabalho dia e noite, conheço cada detalhe
das minhas empresas, sei até a fração de variação por dia de cada ação, por que eu não sabia
dessas coisas?
Ele não toma café pela manhã, somente leite. É engraçado ver um grandalhão desse com
uma caneca do Batman, tomando leite.
— Quem cuida desses assuntos para você? – sei que é uma pergunta retórica, então
mantenho-me em silêncio. Até onde eu sei, a Letícia ficou responsável pela casa do Rio e é Mag
quem lida diretamente com ela. Quando cheguei na casa para fazer as entrevistas dos novos
seguranças, nenhum funcionário tinha conhecimento da minha chegada. Tive que ligar para a
Letícia, que estava na Itália, para resolver isso e eu entrar na casa.
— Será que a Mag está tendo problemas e não quer nos contar nada? – pergunto, perdido
em pensamentos.
— Maggie trabalha para você há mais ou menos seis anos, não é? Não tem notado nada de
diferente em seu comportamento?
— Não notei nada. Ela é uma excelente assistente, sempre foi muito competente e é leal a
mim. Isso é o que importa – quando se é poderoso, como eu sou, é difícil encontrar bons
funcionários que não queiram tirar proveito da nossa intimidade. Mag nunca errou comigo e, para
mim, isso basta. — Ela está com problemas.
King desata a rir.
— Como pode ser tão cego? Mag é negligente quando se trata somente da Letícia. Não é
problema, é ciúme! Não é de hoje que falo que aquela mulher anda estranha. Chame o Ted e mande
abrir a caixa de e-mail dela, para ver se ela teve conhecimento ou não sobre as informações que a
Letícia lhe passou. Apesar de acreditar que você já tenha sua resposta.
Sim, mas ainda não quero admitir.
— Eu farei isso agora. Obrigado por me ouvir – estendo minha mão para ele e King a
aperta.— Sempre ao seu dispor, chefe.
Sigo para o escritório e passo instruções ao Ted e Joe, quero tudo pronto quando chegar lá.
Do caminho, ligo para Ruth e peço para preparar um lanche da tarde especial para duas pessoas.
Ligo e peço ao King que não permita ninguém em casa depois do almoço e para enviar à Letícia um
convite para encontrar-se comigo na cobertura, às dezesseis horas. Hoje tenho que dar mais um
passo no meu plano em relação a ela.
Quando chego a minha sala, Ted já está a postos e Mag reclamando. Por que as mulheres
reclamam tanto?
— Mag, o que diabos você já está reclamando a uma hora dessas? – coloco minha pasta
sobre a mesa.
— Ele não pode entrar aqui e ficar, sem permissão – sua voz estridente faz minha dor de
cabeça ficar pior.
— Foram ordens minhas, Mag. Agora nos dê licença. Assim que Joe chegar, mande-o
entrar. Não quero ser interrompido em hipótese alguma. Entendeu?
— Sim, senhor – ela arruma seus óculos e se retira.
— Agora você, garoto dos computadores, conseguiu o que pedi?
— Isso é como tirar doce de um bebê. Então, todos os e-mails enviados do Brasil foram
lidos, todos, sem exceção – Ted entrega-me alguns papéis. — São as cópias dos e-mails. Entrei na
conta da senhorita Barros e identifiquei que ela transferiu para a Holding sessenta e cinco por
cento do valor que a Holding repassou a ela. O que restou ela transferiu para uma empresa de
serviços.
Joe entra, trazendo-me os papéis que a Letícia assinará amanhã. Tudo está a cargo da Mag.
Por que a garota está fazendo isso? Não pode ser ciúmes, ela nunca correu risco de ser substituída.
Repasso alguns documentos com Joe e Ted, revisando números até sentir-me no controle
novamente. Assim que eles saem, ordeno que Maggie venha a minha sala.
— Mag, você sabe que é importante para minha equipe, não sabe?
— Sim, senhor – ela responde, sorrindo. — Faço o meu melhor para satisfazê-lo.
— Então, por que não tomei conhecimento sobre os detalhes da negociação da propriedade
no Brasil?
Ela olha-me apreensiva.
— Repassei a você os documentos e, assim que os assinou, foram reenviados à Letícia.
— Você sabia que a casa já tinha um quadro de funcionários contratado? – pergunto
enquanto analiso-a.
— Sim, sabia. Mas tomei a liberdade de investigar a empresa e cada um dos funcionários.
Não vou repassar um dólar para a Letícia sem saber quem está lá – ela tem um ponto. Levanto,
alcanço o meu terno e vou em direção à porta.
— Mais uma coisa, por que eu não soube que ela viria à empresa assinar documentos da
Paradise?
— Quando chegamos de Abu Dhabi, o senhor pediu que não o incomodasse com assuntos
pequenos. São documentos de rotina, todos os sócios devem assinar.
Não sei por que duvidei da Mag, ela é muito competente e leal.
— Obrigado.
Lennon é minha sombra agora, mas admito que está difícil acostumar-me. Mike me aguarda
em frente à empresa com a porta aberta. Entro e logo estamos em meio ao louco trânsito da cidade.
Estou ansioso para encontrar a Letícia, quero saber as histórias mirabolantes que ela irá me contar.
Repasso meu plano para desmascará-la e percebo que há uma falha. Eu não resisto àquela mulher, é
como se ela tivesse poder sobre o meu pau.
O trânsito estava um caos, demoramos mais do que de costume e acabei atrasando-me para
o encontro. Entro na cobertura e pergunto a Ruth se está tudo em ordem.
— King recebeu sua visita e a levou para o jardim de inverno enquanto o senhor não
chegava. O lanche será servido assim que o senhor mandar.
— Obrigado, Ruth. Já sirva o lanche, por favor – com King distraindo-a, posso correr para
tomar um banho e tirar essas roupas pesadas. Faço tudo em tempo recorde e vou ao encontro da
princesa. Esbarro em King, que está saindo do jardim. — Há mais alguém em casa, além de você e
Ruth? – pergunto.
— Há seguranças no hall de entrada, devidamente instruídos para que ninguém passe –
aceno e dou um passo quando ele para-me com sua grande mão. Sim, suas mãos são grandes pra
cacete! E diz: — Pensa bem no que você está fazendo e lembre-se, você é meu chefe, mas isso não
significa que não farei a você o mesmo que você fizer a ela.
King arruma seu terno e se vai. Quando decidi unir os dois apartamentos que compõem a
cobertura, fui contra a ideia do arquiteto em fazer esse jardim de inverno que fica do lado oposto
ao escritório. Para que caralho eu queria um jardim de inverno? Hoje, vendo Letícia sentada no
banco, não tive dúvidas de que tê-lo feito foi uma excelente decisão.
— Desculpe-me. O trânsito estava parado e acabei me atrasando – falo enquanto aproximo-
me e a beijo no rosto.
— King me fez companhia. E ficar aqui, nesse jardim, é um presente – sento-me ao seu lado
e ela afasta-se. Como não a quero longe, passo meu braço por trás de seus ombros, segurando-a no
lugar.
— Então, podemos comemorar a casa nova?
— Sim – essa resposta monossilábica diz que ela não está à vontade comigo e eu preciso
que ela fique. Assim, tensa, será difícil tê-la novamente sobre a minha cama.
Viro-nos para ficarmos de frente um para o outro.
— Quero te pedir desculpas pelo que aconteceu em Abu Dhabi, Letícia – ela desvia seu
olhar, baixando o rosto, e eu levanto com um dedo sob seu queixo. — Olhe para mim, anj... Letícia.
Eu fiquei atordoado com o que você me falou e acabei expressando-me de maneira errônea. Não
me arrependi de ter transa... feito amor com você em nenhum momento sequer. Eu a desejava como
um louco. Mas, depois, dei-me conta de que estava machucada e senti-me um bastardo por obrigá-
la a esforçar-se. Esse foi o motivo do meu mal humor, esse foi meu único arrependimento.
— Desculpe-me pela minha reação, eu também passei dos limites – encarando-a assim, de
perto, minha vontade é beijá-la, rasgar peça por peça de sua roupa, jogar na minha cama e fodê-la
em cinquenta posições diferentes.
Ruth entra e serve a mesa discretamente. Ela é uma senhora de quarenta e sete anos e
trabalha comigo há mais de dez. Ruth e King são meus pilares.
— Oi, Ruth – Letícia levanta sem equilíbrio e eu a seguro. Quando recupera-se,
cumprimenta minha governanta, que vem até ela.
— Você não tem comido direito, Lê. Tem que se cuidar, querida – isso deixa-me
desconfiado. Como elas se conhecem?
— De onde se conhecem? – pergunto, olhando entre as duas. — Você está doente, Letícia?
— Eu tive uma intoxicação alimentar alguns dias atrás, desde então, meu estômago não
aceita muita coisa. No dia em que cheguei ao condomínio, a Ruth teve o desprazer de ficar trancada
comigo no elevador. Depois, ela ajudou-me com as bagagens, pois eu estava muito fraca e ela teve
compaixão.
— Então, você sabia que eu morava aqui? – pergunto cada vez mais intrigado.
— Soube que você morava aqui no dia seguinte, quando a Ruth mandou King levar uma
canja para mim – essa mulher é muito ardilosa. Ela abraça Ruth e a minha governanta sorri com
verdadeiro afeto. — Mais uma vez, obrigada, Ruth.
— Quer que eu chame um médico? Você está pálida – ninguém no mundo pode simular um
mal-estar dessa maneira. Eu acredito que ela não está bem de verdade. Talvez, esteja começando a
pagar pelos seus pecados. A mesa está farta, tem tudo o que eu gosto. Minha barriga ronca. —
Estou faminto. Passei o dia apenas com café e água.
Escolto Letícia até a mesa para comermos. Durante a refeição, falamos sobre o início das
obras, a casa do Rio e outras amenidades. Não deixei de tocá-la em momento nenhum. No começo,
ela até se incomodou, mas depois acabou acostumando. Eu havia esquecido como é divertido
conversar com ela, mulheres com bom humor são excelentes companhias. Quando a noite caiu,
fomos para a sala, ela estava com ar de cansaço e a sua fragilidade era evidente.
— Eu ainda sinto seu gosto em minha boca – Letícia encara-me enquanto passa a língua
umedecendo seus lábios, fazendo-me desejar o mesmo. Ela deita sua cabeça no encosto do sofá e
eu, em um impulso, acaricio seu rosto. Passo meu nariz por seu pescoço, seu perfume é suave, mas
não menos marcante. — Estar dentro de você foi a melhor sensação que já tive na vida.
Tomo sua boca sem pedir permissão.Meu autocontrole vai pelo ralo quando estou com ela.
Sua pele, seu cheiro, seu gosto, tudo o que é referente ao seu corpo me deixa louco! Ela geme em
minha boca, o que atiça-me ainda mais. Letícia se afasta, levantando-se rápido demais, acaba se
desequilibrado, devido a um novo ataque de tontura, e apresso-me para segurá-la.
— Sente-se aqui, anjo.
Ela insiste em ficar de pé e sai do meu abraço.
— N-não! Obrigada. É melhor eu ir para casa – Letícia sai apressada, indo para o lado
errado.
Alcanço-a e a escolto até a porta. Aciono o elevador.
— Desculpe-me pelo beijo. Não...
Letícia corta-me:
— Não fala nada, por favor – as portas do elevador se abrem e ela parte.
Caminho para dentro da cobertura e encontro King a minha espera, de braços cruzados.
— Algum problema, King?
— Só estou tentando entender por que você está fazendo isso. Para você, ela não passa de
uma safada interesseira. Então, por que está a cercando, Zach?
Aproximo-me dele e o encaro.
— Eu é que não entendo o porquê dessa superproteção em relação a ela. Por que, King?
Diga-me, está apaixonado por ela? Letícia o seduziu?
Ele ri.
— Cada dia que passa, Zachary, você consegue ficar mais imbecil. Você tem seus pais
vivos, não sabe o que é perder ninguém próximo. Nasceu tendo tudo, dinheiro, amor e família. Ela
perdeu todos muito cedo, a vida dela foi complicada. Não precisa estar apaixonado para querer
proteger os amigos, você sabe disso. Mesmo sendo um bastardo filho da puta, você é o meu melhor
amigo, Zach e eu o protegeria com a minha vida. Eu vi aquela menina chorar e nada vai tirar essa
imagem da minha cabeça, ela parecia uma menininha perdida – ele balança a cabeça. — Falar esse
tipo de coisa para você é perda de tempo. Você nasceu com um Napoleão na barriga, nunca
entenderá.
— Ela pode não ser quem você pensa – digo.
— Ela é exatamente o que eu penso. Uma pobre infeliz que teve o desgosto de cruzar o seu
caminho. Só isso, já é punição o suficiente para qualquer alma.
— O jantar está servido – Ruth anuncia. E a conheço o suficiente para saber que a marca de
expressão em sua testa mostra seu descontentamento com alguma coisa.
— Boa noite, Zach – Mag entra sem ser anunciada. Ela não olha para King e nem para Ruth,
que também a ignoram. — Estou cansada de esperar. Os seguranças não permitiram a minha entrada
até segunda ordem. O que estava acontecendo aqui?
— Nada da sua conta – falo sem paciência e ela sorri como se não tivesse mais ninguém na
sala.
— Pelo cheiro, o jantar está servido. Estou morrendo de fome! – Ruth revira os olhos para
a expressão exagerada da minha assistente, e King sai da sala. O mundo resolveu enlouquecer? Eu
não vou ficar no meio disso.
— Ruth, sirva meu jantar no quarto – peço.
Dormi pensando naquele beijo. O que farei para o cheiro de Letícia dissipar-se do meu
nariz? Ela não sai da minha cabeça, atormentando-me a todo momento. Seja o que aquela mulher
fez, ela me tem. E guardar esse segredo não é fácil. Estar perto de alguém que você daria a vida e
disfarçar com indiferença está ficando insuportável. Tenho necessidade de Letícia.
Tarde da noite, sinto puxarem minha coberta e um corpo macio encosta-se ao meu. Mãos
delicadas passeiam pelo meu corpo e pés quentes alisam minhas pernas. Letícia....
Sonolento, viro-me e puxo aquele corpo para mais perto do meu, abraçando-o forte para
não escapar. Suas mãos voltam a tatear meu corpo até encontrar meu pau, que já está duro. Pensar
em Letícia o deixa assim. As mãos macias acariciam meu membro, fazendo-me gemer. Ela encosta
sua boca no meu peito e desce trilhando seu caminho com a língua. Meus gemidos ficam cada vez
mais altos. Antes que ela me tome em sua boca, quero beijá-la, fazê-la minha. Puxo-a para cima até
sentir sua respiração.
— Cada dia que passa, te desejo mais, Letícia – beijo-a com... espera! Empurro o corpo
estranho para o lado, porque não é Letícia. Acendo a luz do abajur e vejo Mag, nua. Merda! Merda!
Merda!
— Mag! Mag! Mag! Cubra-se, pelo amor de Deus – digo, já saindo da cama.
— Zach, eu sei que você me deseja – ela fala mais alto do que deveria. Meu Deus, a mulher
é louca.
— De onde você tirou isso? – pergunto.
Ela deixa o lençol cair e seus pequenos seios ficam à mostra.
— Eu sinto seu desejo – vou ao banheiro, enrolo-me em uma toalha e pego o roupão. Volto
para o quarto e o jogo para ela.
— Cubra-se e saia da minha cama.
Ela faz o que eu mando.
— Você me quer, Zach. Eu senti seu pau duro. Você me deseja! – ela grita. Até que ponto
uma mulher pode ir?
— Eu te chamei pelo nome de outra. Qualquer mulher no mundo teria surtado com isso.
— Zach...
— Cala a boca, Mag!
Alguém bate à porta e abro-a para quem quer que fosse entrar.
— Está tudo bem, Zach? – King pergunta.
— Não, não está bem. Mag vem invadindo meu quarto há algum tempo, mas hoje ela passou
de qualquer limite.
Ela surta de vez.
— Você está tão cego por aquela puta que não consegue enxergar que eu sou perfeita para
ficar ao seu lado. Eu sou apaixonada por você desde sempre!
— Eu avisei. Estranha – King debocha.
Tenho que tomar alguma providência para Maggie entender que ela é apenas minha
assistente.
— A partir de hoje, você está proibida de passar a noite na cobertura, Mag. Também a
proíbo da livre circulação, aqui é minha casa, minhas regras e eu ainda mando nessa porra! Só virá
aqui quando eu solicitar, caso contrário, será expulsa e demitida. Ainda a quero como minha
assistente, mas, de agora em diante, haverá limites. Esquece esse sentimento que acha que sente por
mim e eu vou tratar de esquecer o que houve aqui. King vai providenciar sua ida para casa. Até
amanhã, senhorita Carlson.
Antes de sair, King olha-me e ri.
— Eu avisei – mostro o dedo do meio e ele sai rindo ainda mais alto.
CAPÍTULO 18
 
Zachary
— Podemos conversar, Zach? – Ruth aproxima-se enquanto tomo meu café da manhã.
— Sempre! – aponto a cadeira para ela. Ruth é importante para mim e em alguns momentos
difíceis, foi ela quem segurou minha mão.
— Eu trabalho com você há algum tempo e lhe tenho como um filho. Sempre que precisou e
mesmo quando achava que não precisava, estive perto de você. Eu te amo como se tivesse saído de
mim.
— Eu sei e sou eternamente grato por isso. Por mim, você já teria se aposentado e ido
morar na casa que te dei em Long Island. Mas você é teimosa – falo enquanto alcanço sua mão.
— Ontem eu ouvi sua conversa com o King sobre a Letícia e fiquei muito chateada em saber
que você tem uma péssima ideia da pessoa que ela é – solto a sua mão.
— Ruth...
— Não, Zach. Deixe-me falar, serei rápida – eu assinto e ela continua: — Aquela menina
não é o que você acredita. Ela pode ser um pouco intransigente às vezes, eu conheço mulher de
negócios a distância. Mas não é por mal, foi assim que a vida a ensinou a ser. Você disse para o
grandão que talvez ela não seja quem ele pensa e repito a mesma coisa a você, ela não é quem você
pensa. Você é um homem poderoso, pode fazer o que quiser, por que você mesmo não tira a vida
dela a limpo? – Ruth levanta. — Era só o que eu tinha para lhe dizer. Com licença e tenha um bom
dia.
Alguma coisa impulsiona-me a descer e bater na porta do apartamento dela. É cedo,
provavelmente Letícia está dormindo. Estou prestes a virar as costas quando Lorena abre a porta de
pijama.
— Bom dia, senhor empata-sono.
Sorrio e lhe dou um beijo na testa.
— Bom dia, boneca Lolo. A Letícia está acordada?
— Graças a Deus, não – ela fala enquanto boceja.
— Algum problema? – pergunto com real preocupação.
— Ela passou a noite vomitando e está muito fraca. Dormiu faz pouco tempo.
— Chamaram um médico? – tiro o celular do bolso para ligar, se for necessário.
— Consultamos um médico antes de embarcarmos para cá. Ele disse que era uma
intoxicação alimentar e ela teria alguns dias ruins. O problema é que esses dias estão demorando a
passar.
— Ontem ela teve tonturas. É normal? – questiono.
Ela escora-se na porta.
— Deve ser por causa da fraqueza. Mas ela já está melhor, Zach. Consegue comer uma
refeição inteira antes de colocarpara fora.
Tiro um cartão com meus contatos e entrego a ela.
— Se precisar de alguma coisa, a qualquer momento, chame-me. Enviarei a documentação
que ela deve assinar, para que não precise sair de casa.
— Serei grata – Lorena fala.
Vou para empresa enfrentar o dia que está por vir. Tomei todas as providências necessárias
para que as obras iniciem na segunda-feira sem imprevistos e isso tomou quase todo o meu dia.
Mandei Joe levar a documentação para que Letícia assinasse em casa. E, quando estava prestes a ir
embora, Ethan é anunciado e peço que ele entre. Ele está com cara de cansado, barba por fazer e
sua roupa amassada, dando a impressão de que não arruma-se há muito tempo.
— Bom dia, E. Por que você está assim? – pergunto.
— Passei a noite bebendo no escritório – ele responde e sua inquietação preocupa-me.
— Por que, E? Qual é o problema?
— Vou pedir Lorena em casamento – ele tira do bolso uma pequena caixa de veludo azul de
uma famosa grife de joias.
— Não acha cedo demais? – questiono.
— Eu sou um homem de trinta e poucos anos que nunca encontrou quem o fizesse se sentir
em casa cada vez que sorri. Eu comecei a acreditar em felizes para sempre desde o primeiro beijo
na Lorena.
— Acho loucura, cara. Mas se isso é o que você quer, vá em frente.
— Só tem um problema – Ethan está nervoso.
— Qual?
— Eu preciso sair da aposta. Não! Melhor. Eu preciso que essa aposta seja desfeita.
Recosto-me na cadeira.
— Nem pensar, E.!
— A Lorena e a Letícia nunca me perdoarão se souberem que participei disso. Eu vou pedir
a Lolo em casamento quando estivermos no Brasil e não quero ser mais atormentado por essa porra
de aposta.
— Lorena nunca saberá. Ninguém nunca saberá – vou até o barzinho do escritório e encho
dois copos com whisky, entregando um a ele.
— Eu vou saber. Como você consegue olhar para a Letícia e não sentir remorso? Ela não é
qualquer uma, Zach.
— A Letícia não é o anjo que todos imaginam. Ela é como qualquer outra mulher, vadia e
interesseira.
Mal tenho tempo de processar o que vem a seguir, quando Ethan joga seu copo no chão e
soca-me no rosto.
— Nunca mais fale assim dela, seu bastardo! Você, acima de todos, deveria protegê-la da
merda que está por vir e não desrespeitá-la dessa maneira.
— Você é outro iludido, Ethan – Lennon e Kaleb entram em minha sala e colocam-se entre
nós dois. Sinto algo escorrer do canto da minha boca, passo a mão e vejo que é sangue. — Você
não sabe o que eu sei, não sabe nada da vida dela. Eu não vou desfazer nada! Essa aposta vai até o
final e acabou. Você mesmo, idiota, amarrou de uma forma para que ninguém possa fazer nada.
— Se a Lorena souber disso, eu te matarei.
Ele vira as costas e sai do meu escritório. Mag entra correndo com gelo. Depois de passar
instruções a alguns funcionários, entrego a bolsa de gelo para Mag e vou para casa. Tenho que
pensar rapidamente, Ethan pode colocar tudo a perder. Inferno! Isso é hora para ter crise de
consciência? Tenho que apressar meu plano, se quiser desmascará-la em frente a todos. Não
acreditam em mim, então verão com os próprios olhos.
Tarde da noite, desço para nadar na esperança de que a exaustão possa desligar-me do
mundo. Não sei quanto tempo fiquei dando voltas naquela piscina, mas, infelizmente, nada
aconteceu. Depois de uma ducha quente, visto uma roupa leve e vou para o escritório. Pensei
seriamente no que Ethan falou, seria um desastre se a Lorena tomasse conhecimento da aposta e o
cara é o meu melhor amigo, além de Kingston. Minha cabeça não para de dar voltas com isso.
Chamo King para falarmos sobre a viagem ao Brasil.
— Embarcaremos no final da tarde e desembarcaremos no Ceará nove horas depois. Assim,
teremos tempo para descansar em um hotel na capital.
— Não. Quero ir ao Rio de Janeiro primeiro.
— Claro que ele vai complicar – King fala exasperado. — O dia em que Zachary Thorton O
´Brian facilitar a vida de alguém será o Armagedon – rio do seu comentário. Ele tira o celular do
bolso e liga para meu piloto. Conversam durante um tempo e volta a falar comigo. — Bob disse
que o voo entre o Rio e o Ceará é de mais ou menos duas horas. Assim que ele retornar a ligação,
faço o planejamento. Tenho que falar com a Letícia sobre o helicóptero que sairá da capital para o
resort – ele levanta-se e, antes de sair, o chamo:
— King?
— Sim.
— Você viajará comigo? – sei que pareço carente, mas ele é a porra do meu amigo!
— Não vou deixar você ir ao Brasil sozinho. Por mais que eu deseje lhe matar ultimamente,
não posso permitir que outra pessoa faça isso por mim e tenho muitas contas a pagar, o que garante
sua vida intacta por mais alguns anos – ele acena e se retira.
Sei que ele não está ao meu lado, acredita que a Letícia seja um anjo e acha que eu posso
destruí-la. O que ele não sabe é que esse demônio de mulher pode destruir-me e eu tenho que lutar
contra isso. Decido ligar para os outros apostadores para saber em que pé andam as coisas com
eles. Preciso certificar-me de que Ethan não chegue até eles e os convença a desistir. Disco
primeiro para o Sebastian.
— Sebastian falando – típico grego.
— É o Zachary, Sebastian. Como estão as coisas por aí?
— Tudo indo. Estou me sentindo privilegiado por receber uma ligação de tal personalidade
– ele fala, rindo. — Em que posso ajudá-lo?
— Direto ao ponto. Quero conversar sobre a aposta – falo.
— Vamos fazer o seguinte, vou chamar os outros dois e conversaremos em conferência – em
menos de cinco minutos estávamos todos rindo em uma única ligação. Volto a focar no motivo que
me fez ligar:
— Ethan vai se casar e teme que a menina descubra a aposta. Acredito que ele procurará
cada um de vocês para desfazer a aposta.
— Sinceramente, depois que passei uns dias com ela, pensei seriamente em sair dessa
aposta. A Letícia ajudou-me com a minha esposa, ela salvou o meu casamento. Mas, quando recebi
o dossiê, voltei atrás. Quero mais é que ela se foda! – será que é o mesmo que chegou a mim? Se
for, não estou sozinho nessa.
— Bashir e Sebastian, qual é o veredicto de vocês?
— Também não gostei do que li. Se ela realmente é uma golpista, por que não ficou com um
de nós? – Bashir questiona.
— Não está claro? – Martino começa. — Entre nós quatro está um dos três homens mais
ricos do mundo. Por que ela ficaria conosco, sendo que pode conquistar a cama do cara mais rico?
Ela quer Zachary, se não fosse por isso, ela teria cedido a qualquer um de nós antes ou até mesmo
ao Larkin.
— Tudo continua como está. Mulheres como ela não são dignas de compaixão – Sebastian
declara.
— Respondam-me uma coisa, todos vocês receberam um dossiê sobre ela? – a coisa do
dossiê desperta minha curiosidade.
— Sim! – respondem em uníssono. Conversamos por mais alguns minutos e desligo o
telefone convencido de que não estou sozinho. Por mais que eu não queira admitir, estou
decepcionado comigo mesmo. Deixei-me envolver demais por alguém que não vale a pena. No
fundo, eu queria que eles me convencessem a fazer o que Ethan quer, porque acreditam que ela seja
o anjo que King acha que ela é.
Chega de ficar aqui me lastimando. Levanto da cadeira para ir ao apartamento em que as
meninas estão hospedadas. Isso lembra-me que tenho que mandar investigar onde é o imóvel que a
Letícia adquiriu e quem é o pobre imbecil que financiou tal luxo. Entro no elevador e desço até seu
andar. Assim que toco a campainha, Letícia abre a porta vestida com pijama dos Minions. A blusa
justa retrata seus fartos seios e o short curto deixa as pernas grossas à mostra, o que faz a minha
imaginação viajar.
— Você atende a porta vestida dessa maneira? – minha pergunta sai como repreensão.
— Eu sabia que era você e meu pijama não é escandaloso. Já vi coisas piores andando
pelas ruas de Nova York – Letícia leva sua mão até o inchaço no canto da minha boca. — Quem
teve coragem de estragar essa obra de arte que é o seu rosto? Entre.
— Alguém que está surtando. Está sozinha? – Deus, faça com que ela esteja sozinha.
— Sim, estou – ela a minha frente e sua bunda a um palmo de distância me faz gemer.Ela
vira-se para encarar-me. — Algum problema, Zach?
— Cadê a Lorena? – ignoro sua pergunta. Não seria elegante dizer que estou de pau duro.
Sentamos no sofá, que é bem confortável, enquanto passa a Liga da Justiça na televisão. Um dos
meus desenhos favoritos, por sinal. Ela senta no canto mais distante do sofá e coloca as pernas
embaixo de si.
— Ethan não está muito bem e ela foi cuidar dele.
Assistimos alguns desenhos e descobrimos que somos ótimos críticos de animação. A fome
bate e solicito a Ruth que nos traga sopa e suco de limão, a pedido de Letícia que não está muito
legal do estômago. Voltamos a assistir, mas, dessa vez, a trouxe para perto de mim. Enlacei-a e a
coloquei em meu colo. Foi a pior besteira que fiz. O seu cheiro embriaga-me de tal maneira que
perco o controle. Não resisto e a deito enquanto a beijo. Fico entre as suas pernas, baixo sua blusa
e seus fartos seios pulam para fora, fazendo minha felicidade. Os massageio com vigor e a beijo
sem parar. Seus gemidos deixam-me louco e bloqueiam qualquer pensamento coerente que eu
poderia ter.
— Zachary, por favor – ela empurra-me e sai correndo com a mão na boca – vou atrás dela
e a encontro prostrada no banheiro, vomitando, pálida e suando frio. Umedeço a toalha que está em
meu alcance e coloco em sua testa. Não sei se resolve, mas vi em alguns filmes e lá dava certo.
Sem graça, Letícia escova os dentes e voltamos para a sala.
— Letícia, isso não é normal para uma intoxicação alimentar – questiono.
— O médico falou que eu ficaria mal por mais uns dias. Olha, desculpe-me pela cena. Você
não precisava ver aquilo.
— Estou feliz por estar aqui e te ajudar – encaro-a na tentativa de descobrir qual é o seu
jogo. Ela seria tão boa atriz a ponto de demonstrar sentimentos que não existem em seu olhar? —
Ontem você não falou que me perdoava pelo que aconteceu em Abu Dhabi e, mesmo assim, hoje,
estou com você em meu colo. Achei que nunca mais olharia em minha cara. Diga-me, Letícia, foi
fácil me perdoar?
— Eu não tenho que perdoá-lo, Zachary. Você foi sincero e isso me basta. Na hora, fiquei
mais irada com a entrada surpresa da sua assistente do que com a discussão. Por dias, fiquei
magoada, admito. Mas tive tempo para amadurecer e cheguei à conclusão de que, de agora em
diante, só viverei o momento, o resto deixarei para depois – não sei o que está acontecendo
comigo, mas eu quero acreditar. Daria minha vida para que essa mulher maravilhosa que está a
minha frente existisse. Verdadeira, sem máscaras, sem interesses. Encosto minha testa na sua e
fecho os olhos.
— Eu trocaria toda minha fortuna pela verdade que fantasio, Letícia.
— Não entendi, Zachary – sua voz é melódica como uma delicada canção.
— Não é nada. Só estou cansado – falo.
O sofá era grande e cabíamos deitados. Letícia ficou no canto e, abraçados, pegamos no
sono enquanto assistíamos a um filme. Fazia tempo que eu não tinha um sono tranquilo, sem acordar
várias vezes durante a noite. Não tenho dúvidas de que é por causa da Letícia, ela me faz sentir
como Ethan se sente em relação a Lorena. Tê-la em meus braços faz-me sentir em casa. A diferença
entre nós dois é que a mulher por quem sinto isso não é um anjo como a dele.
— Desgraçado filho da puta! – intensifico meu aperto ao redor de Letícia para protegê-la.
Abro os olhos e vejo Lorena olhando-nos com um pequeno sorriso no rosto. Ao contrário
de seu namorado, que está atirando punhais em minha direção. Ethan sai xingando.
— Desculpa, Zachary. Não queríamos acordar vocês. Ethan está estressado e acabou
falando alto demais.
Letícia abre os olhos, encontrando os meus e, naquele momento, eu soube que estava mais
fodido do que antes.
— Bom dia, menina dos olhos dourados. Como se sente? – Letícia tem o poder de tirar o
melhor e o pior de mim. Na maioria das vezes, é o melhor.
— Estou bem. Obrigada por cuidar de mim.
Lorena, ainda nos olhando com aquele sorriso de boneca, comenta:
— Vocês são tão lindos juntos! Parecem aqueles casais de revistas.
— Menos, Lolo. Bem menos – Letícia corta sua amiga.
Levanto para ajudá-la a sair do sofá e ela vai para o banheiro. Viro-me para a Lolo.
— Esse negócio da Letícia é sério. Tem certeza que foi somente uma intoxicação?
— Eu fui ao médico com ela e esse foi o diagnóstico. Só que eu acho que ela pegou uma
virose que acabou por piorar a situação. De qualquer maneira, a Letícia está medicada – ela faz
uma pausa antes de continuar: — Zachary? – lágrimas enchem os olhos de Lorena. — Você é o
melhor amigo do meu namorado, então, diga-me, o que está acontecendo com o Ethan. Essa noite
ele só dormiu porque dei um dos remédios da Letícia, e todos a sua volta estão estranhando seu
comportamento autodestrutivo – ela balança a cabeça. — Eu não sei o que fazer.
Faço-a sentar no sofá e abaixo-me à frente dela.
— Ethan está apaixonado por você e isso é assustador, o deixa inseguro, nervoso,
estressado. Você o ama, boneca Lolo?
— Mais do que tudo – essa menina é uma graça.
— Então, somente ame-o! Isso será o suficiente – isso realmente saiu da minha boca? Desde
quando tornei-me conselheiro de casais?
Ela me abraça.
— Obrigada, Zach. E obrigada por cuidar da Lê para mim.
Passos atrás de mim fazem-me soltar Lorena e virar. Ethan, com cara de poucos amigos,
fala:
— Bom dia, Zachary. Não queria te acordar, mas nosso voo parte daqui a duas horas e elas
irão comigo – a entonação forte em “elas irão comigo” não passa despercebida.
— Bom dia, E. Sem problema – aponto em direção ao quarto. — Só vou despedir-me de
Letícia.
Ethan entra na minha frente.
— Eu não acho que seja necessário.
— E eu não acho que seja da sua conta – respondo. Dou um passo em sua direção e o
encaro.
— Qual é o problema de vocês? Tenho que colocá-los no cantinho da disciplina? – Lorena
interfere, chamando nossa atenção. Ela aponta para mim. — Você! Vá falar com ela – agora ela
aponta para Ethan. — E você, mocinho, venha comigo.
Vou olhando de porta em porta para encontrar Letícia e a encontro no último quarto,
fechando uma mala.
— Oi. Te deixei sozinho na sala, que grosseria a minha. Mas vamos viajar daqui a pouco e
não queria me atrasar ainda mais.
Aproximo-me, emolduro seu rosto entre minhas mãos e a beijo de leve.
— Embarco para o Brasil essa noite. E gostaria muito que você ficasse comigo.
Ela sorri lindamente.
— Sim. Telefone-me assim que chegar.
Abraço Letícia com toda minha força e a beijo como se dependesse disso para viver. Eu a
quero tanto que chega a doer! Mas a vida não é justa. Foi a primeira lição que recebi do meu pai:
Aprenda enquanto eu estiver vivo, meu filho, a vida não é e nunca será justa. Conforme-se, Zachary.
Volto para a cobertura pelo elevador de serviço e, assim que entro pela porta da cozinha,
ouço gritos vindos da sala. Vou andando devagar para saber que caralho está acontecendo em minha
casa. Nos últimos dias, as pessoas estão enlouquecidas, começando pelos meus funcionários. Um
fica contra mim por causa de uma mulher e a outra invade a minha cama, nua. Reconheço a voz da
Mag:
— Claro que vou! Sou a assistente pessoal dele, minha obrigação é acompanhá-lo em todos
os lugares.
— Sua obrigação é manter a agenda dele organizada e não sair por aí agindo como a esposa
traída. Não há necessidade de você ir nessa viagem – King fala.
Ela ri.
— Está brincando, não é? Há coisas daquele projeto que só eu sei.
— Como as coisas da Letícia, que você vem negligenciando por despeito? – com a menção
do nome de Letícia, Mag surta.
— Pare de pensar com a cabeça do seu pau, cretino! Deixe aquela vadia fora disso. A vida
não gira em torno dela. Sou mais indispensável que você. Aliás, os últimos dias tem sido o céu com
a sua ausência. Agora saia da minha frente, eu vou acordá-lo.
— Não vai! – King a interrompe. — Ele deixou bem claro que você não tem mais livre
acesso a esse apartamento.
Entro na sala e vejo King barrando a passagem para as escadas que dá acesso ao segundo
andar, onde fica meu quarto. E Mag, parada na frente dele, pronta para passar por cima.
— Saia da minha frente,

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