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Processos Patológicos Gerais Alterações do Crescimento Celular (Adaptações e Neoplasias) Desenvolvimento do material Daniela de Carvalho Martins 1ª Edição Copyright © 2022, Afya. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Afya. Sumário Alterações do Crescimento Celular (Adaptações e Neoplasias) Para Início de Conversa... ............................................................................... 4 Objetivos .................................................................................................... 4 1. Adaptações Celulares .................................................................................. 5 1.1 Hipertrofia ................................................................................................ 5 1.1.1 Hipertrofia Fisiológica ...................................................................... 6 1.1.2 Hipertrofia Patológica ...................................................................... 7 1.1.3 Consequências .................................................................................... 8 1.2 Hiperplasia ............................................................................................... 8 1.2.1 Hiperplasia Fisiológica .................................................................... 9 1.2.2 Hiperplasia Patológica ..................................................................... 10 1.2.3 Hiperplasia X Neoplasia .................................................................. 10 1.3 Hipotrofia (Atrofia) ................................................................................ 11 1.3.1 Hipotrofia Fisiológica ....................................................................... 11 1.3.2 Hipotrofia Patológica ........................................................................ 12 1.3.3 Consequências .................................................................................... 12 1.4 Hipoplasia ................................................................................................ 13 1.4.1 Hipoplasia Fisiológica ..................................................................... 13 1.4.2 Hipoplasia Patológica ...................................................................... 13 1.5 Metaplasia ................................................................................................ 13 2. Neoplasias ...................................................................................................... 15 2.1 Propriedades das Neoplasias ............................................................ 15 2.1.1 Proliferação Celular Descontrolada ............................................. 15 2.1.2 Autonomia de Crescimento ............................................................ 16 2.1.3 Perda da Diferenciação Celular ..................................................... 16 2.2 Nomenclatura e Classificação das Neoplasias ............................ 16 2.3 Características das Neoplasias Benignas e Malignas .............. 17 2.3.1 Diferenciação e Anaplasia .............................................................. 17 2.3.2 Velocidade ou Taxa de Crescimento ............................................ 18 2.3.3 Invasão Local ....................................................................................... 19 2.3.4 Metástases ............................................................................................ 19 2.3.5 Vias de Disseminação ....................................................................... 20 2.4 Princípios Fundamentais da Carcinogênese ................................ 21 Referências .................................................................................................... 24 Processos Patológicos Gerais 3 Para Início de Conversa... O organismo é alvo constante de inúmeras agressões, que induzem respostas variadas. As células encontram muitos tipos de estímulos estressantes, como resultado das alterações em seus ambientes interno e externo; assim, elas estão sempre ajustando sua estrutura e função em decorrência das demandas de alterações e de estresse extracelular, mantendo sua homeostasia normal. Estímulos fisiológicos excessivos ou estímulos patológicos podem acarretar uma série de adaptações celulares fisiológicas e morfológicas, preservando a viabilidade da célula e modulando a sua função e seu metabolismo, seja aumentando-a ou diminuindo-a, como uma resposta a esses estímulos, pois para sobreviver, a célula precisa ser capaz de se adaptar às condições adversas do ambiente. Desta maneira, nesta unidade de aprendizagem, serão abordadas as principais formas de adaptações utilizadas por tecidos e órgãos, além de vermos a questão das neoplasias. Objetivos ▪ Definir e interpretar as diferentes alterações adaptativas das células e tecidos; ▪ Definir e descrever as neoplasias, estabelecendo as diferenças entre benignas e malignas. Processos Patológicos Gerais 4 1. Adaptações Celulares As células dos tecidos e órgãos podem responder a uma enorme variedade de estímulos ou ações, sejam eles fisiológicos excessivos, ou até mesmo, ações patológicas. Essas respostas podem ocorrer sob a forma de adaptações celulares tanto na fisiologia, quanto pela morfologia, em que um “estado novo”, porém alterado e constante, é atingido. Estas alterações são importantes para a preservação das células e sua viabilidade; para que isso ocorra, há a necessidade de uma modulação na função dessas células, em resposta a tais estímulos. Observe a Figura 1: Célula normal (homeostasia) Morte celular Incapacidade de se adaptar Intensa, progressiva Leve, transitória Lesão irreversível Lesão celular Lesão reversível Necrose Apoptose Adaptação Estresse Estímulos nocivos Figura 1: Respostas celulares a estímulos fisiológicos ou patológicos. Fonte: Adaptado de Kumar et al. (2016). 1.1 Hipertrofia A hipertrofia é o aumento do tamanho das células de um órgão e, como consequência, este órgão sofre aumento em seu tamanho também. Desta forma, o órgão hipertrofiado não possui novas células, e sim, células maiores. Porém, tecidos e órgãos que possuem células lábeis ou estáveis (quiescentes), além da hipertrofia, podem, por meio dos mesmos estímulos, sofrer hiperplasia, ou seja, aumento do número de células, assunto que será abordado adiante. Este aumento de tamanho das células não está relacionado à tumefação celular ou degeneração hidrópica, mas, com a síntese e incorporação de mais componentes estruturais intracelulares, em virtude do aumento do metabolismo destas células. Em outras palavras, é o aumento quantitativo dos constituintes e das funções celulares, resultando em aumento volumétrico das células e dos órgãos atingidos. Para que ocorra uma maior síntese desses elementos celulares, e com isso haja a hipertrofia, são necessários alguns fatores: ▪ O fornecimento de oxigênio e de nutrientes deve ser maior para atender às necessidades das células, suprindo o aumento de demanda delas. ▪ As células devem ter suas organelas e sistemas enzimáticos íntegros, pois, células e órgãos lesionados ou degenerados não têm condições de sofrer hipertrofia. Processos Patológicos Gerais 5 ▪ Órgãos, cuja a atividade depende de estimulação nervosa, só têm condições de hipertrofiar se a inervação estiver preservada. A hipertrofia é sempre uma forma de adaptação das células e dos órgãos e tecidos, diante de uma maior exigência de trabalho, ou seja, quando há um aumento da carga de trabalho e gasto de energia, um aumento da demanda funcional ou por estimulação hormonal específica e de fatores de crescimento para as células e órgãos, e consequentemente, aumento do metabolismo, sendo que a hipertrofia pode ser fisiológica ou patológica. 1.1.1Hipertrofia Fisiológica A hipertrofia fisiológica ocorre em certos órgãos e em determinadas fases da vida, como fenômenos programados. Por exemplo: ▪ Útero na gestação: A musculatura lisa do útero, durante a gestação, cresce induzida por estimulação hormonal; ela sofre hipertrofia, mas também ocorre hiperplasia, adaptação que será abordada adiante. A hipertrofia é estimulada por hormônios estrogênicos, por meio de receptores de estrogênio no músculo liso, que permitem interações dos hormônios com o DNA, resultando em maior síntese de proteínas na fibra muscular lisa e em aumento do tamanho destas células, promovendo o aumento de tamanho do órgão. ▪ Glândulas mamárias na gestação: A hipertrofia das mamas durante a gestação ocorre pelo mesmo processo do útero, ou seja, por meio da estimulação hormonal, sendo que, neste caso, promovida pelo estrogênio e pela prolactina; da mesma forma, a hipertrofia é acompanhada de hiperplasia mamária. ▪ Musculatura estriada esquelética: Esta hipertrofia muscular é observada em atletas, em indivíduos que fazem atividade física, como musculação, fisiculturistas, e em indivíduos que trabalham em atividades que exigem grande esforço físico. As fibras musculares esqueléticas aumentam de tamanho por causa do aumento da demanda de trabalho. Figura 2: Estímulos que aumentam a carga de trabalho da musculatura esquelética, com o passar do tempo. promovem a hipertrofia muscular. Fonte: Dreamstime. Processos Patológicos Gerais 6 1.1.2 Hipertrofia Patológica Este tipo de hipertrofia não é programada e surge em consequência de estímulos variados. Hipertrofia do miocárdio (músculo estriado cardíaco): Ocorre em casos de sobrecarga do coração, uma sobrecarga hemodinâmica crônica, ou seja, o coração trabalha “forçado”, com mais força de contração (sístole). Esta sobrecarga cardíaca pode ocorrer em virtude de um aumento da resistência vascular periférica; estenose ou insuficiência das valvas cardíacas; e hipertensão arterial. A câmara cardíaca (parede) correspondente ao transtorno hemodinâmico sofre hipertrofia, pois as fibras musculares produzem mais proteínas, aumentando o número de miofilamentos; logo, há um aumento de força do miocardiócito e maior força e capacidade de trabalho do músculo de um modo geral. Este processo também ocorre com a musculatura esquelética. Hipertrofia ventricular esquerda Coração normal Ventrículo esquerdoVentrículo direito Espessamento do miocárdio no ventrículo esquerdo Figura 3: Hipertrofia do ventrículo esquerdo, em razão de uma sobrecarga de trabalho cardíaco. Fonte: Dreamstime. Musculatura lisa da parede de órgãos ocos: A camada muscular de órgãos ocos, constituída de músculo liso, pode sofrer hipertrofia em casos de obstrução. Por exemplo, a próstata aumentada de tamanho comprime (estenose) a uretra prostática, ocasionando retenção de urina na bexiga, e consequentemente, a camada muscular da parede da bexiga sofre hipertrofia. Processos Patológicos Gerais 7 1.1.3 Consequências Em virtude da hipertrofia aumentar o tamanho ou volume celular, os tecidos e órgãos também aumentam de volume e peso. Como há uma alta de carga de trabalho, ocorre um crescimento do fluxo sanguíneo (hiperemia ativa fisiológica), por conta do aumento do metabolismo. A capacidade de hipertrofia é diferente de acordo com o tipo celular. Para cada célula, existe um limite crítico, em que o estímulo para hipertrofia deixa de provocar uma reação adaptativa e passa a produzir processos regressivos, ou seja, lesão, principalmente em tecidos e órgãos constituídos por células perenes ou permanentes. Se o estímulo for muito persistente ou aumentar além da capacidade adaptativa do organismo, podem ocorrer variadas degenerações ou, até mesmo, levar à morte celular. Por exemplo, na hipertrofia cardíaca decorrente de transtornos hemodinâmicos, deve-se identificar a causa e realizar o tratamento, pois, com o passar do tempo, a hipertrofia cardíaca atinge um limite, em que o aumento da fibra muscular cardíaca deixa de ser capaz de compensar a sobrecarga, ocorrendo a insuficiência cardíaca e arritmias. Nesse estágio, diversas alterações degenerativas ocorrem nas fibras miocárdicas, como lise e perda de elementos contráteis miofibrilares, podendo ocorrer, ainda, a morte do miocardiócito. Em alguns casos, o estímulo, após atingir certa intensidade, promove um aumento de material genético nas células, e com isso, ocorre mitose destas células, ou seja, multiplicação celular. Para que isso ocorra, o tecido ou órgão deve ser constituído por células lábeis ou estáveis (quiescentes); com isso, a hipertrofia pode ser acompanhada de hiperplasia, como no caso do útero e das glândulas mamárias na gestação. A hipertrofia, em outros casos, também pode ser um processo reversível, pois quando cessado o estímulo que a provocou, a célula retorna ao seu aspecto normal. Por exemplo, a musculatura esquelética de indivíduos que param de fazer musculação, com o tempo, reduz a hipertrofia; além disso, após a gestação, o útero retorna ao tamanho original, ou seja, as células hipertrofiadas readquirem o tamanho normal, e aquelas células que surgiram por mitose morrem por apoptose. 1.2 Hiperplasia Hiperplasia é uma adaptação que significa o aumento do número de células em um órgão ou tecido, e por consequência, há o aumento de tamanho ou volume do órgão. A hiperplasia é, portanto, decorrente do aumento da taxa de proliferação celular ou mitose, e por esta razão, somente órgãos constituídos por células lábeis ou estáveis (quiescentes) podem sofrer hiperplasia, ou seja, hiperplasia só acontece em órgãos com capacidade replicativa. Órgãos formados por células perenes ou permanentes só sofrem hipertrofia. Processos Patológicos Gerais 8 A hipertrofia e a hiperplasia ocorrem, com frequência, juntas. Apesar de serem processos diferentes, elas podem ser desencadeadas pelo mesmo mecanismo, sendo que a hipertrofia não envolve divisão celular; já a hiperplasia ocorre se a população celular for capaz de sintetizar DNA, permitindo assim, a divisão mitótica. Para haver hiperplasia, são necessárias as mesmas condições ou fatores já descritos para a hipertrofia, como: maior suprimento de sangue e oxigênio suficientes; integridade morfofuncional das células e inervação adequada. Observe a Figura 4: Células normais CombinaçãoHiperplasia Hipertrofia Figura 4: A hipertrofia, quando ocorre em órgãos que possuem células lábeis ou estáveis, é acompanhada da hiperplasia. Fonte: Dreamstime. Tal como ocorre na hipertrofia, a hiperplasia é desencadeada por um agente que estimula a função específica da célula. Neste sentido, a hiperplasia também é uma forma adaptativa das células à uma sobrecarga de trabalho, ou seja, a mesma causa pode desencadear os dois processos e a hiperplasia também pode ser fisiológica ou patológica. Quando cessado o estímulo que causou essas adaptações, o órgão retorna ao seu tamanho normal, ou seja, em órgãos que sofrem hipertrofia e hiperplasia associadas, as células que nasceram durante o processo por mitose morrem por apoptose, a população de células reduz ao nível normal e as células que só aumentaram de tamanho retornam ao tamanho normal. 1.2.1 Hiperplasia Fisiológica A hiperplasia fisiológica é dividida em: Hiperplasia hormonal: Ocorre no útero (proliferação das fibras musculares lisas) e nas glândulas mamárias (proliferação do epitélio glandular) durante a gestação, por estímulo hormonal, como na hipertrofia. Após o parto, algum tempo depois, o útero adquire seu tamanho original, pois os leiomiócitos (fibras musculares lisas), que surgiram por mitose, sofrem apoptose e os leiomiócitos, que somente hipertrofiaram, diminuem de tamanho, voltando ao volume original; logo, o útero retoma suas dimensões originais. Processos Patológicos Gerais 9 Hiperplasia compensatória: Observada no rim após nefrectomia unilateral ou lesões graves no outro rim. Nesse caso, o rim que permaneceno indivíduo sofre hipertrofia e hiperplasia compensatória das suas células, e tem um aumento do seu peso e volume. Outro exemplo é o que ocorre em caso de doação de um lobo hepático; os hepatócitos que permanecem entram em proliferação e, em pouco tempo, a população de hepatócitos normais é restaurada e o órgão retorna ao tamanho original (regeneração hepática). 1.2.2 Hiperplasia Patológica A maioria das formas de hiperplasia patológica é de casos de estimulação hormonal excessiva ou é resultado dos efeitos da desregulação dos fatores de crescimento sobre as células-alvo, ou seja, é uma hiperplasia secundária à hiperestimulação hormonal. Vejamos alguns exemplos: ▪ Produção excessiva de ACTH (hormônio adrenocorticotrófico) pela adenohipófise, ocasionando hiperplasia e hiperfunção da região cortical das glândulas adrenais ou suprarrenais, e como consequência, síndrome de Cushing. ▪ Produção excessiva de TSH (hormônio estimulador da tireoide) pela adenohipófise, causando hiperplasia e hiperfunção das glândulas tireoides, causando, consequentemente, hipertireoidismo. ▪ Excesso de estrógenos no homem pode causar hiperplasia das glândulas mamárias, ou seja, ginecomastia. ▪ Excesso de hormônios androgênicos causam hiperplasia prostática. ▪ Estimulação por fatores de crescimento também está envolvida na hiperplasia, que por sua vez, está associada a certas infecções virais, como o papilomavirus que causa papilomas (verrugas) cutâneos e uma série de lesões na mucosa, composta de massas de epitélio hiperplásico. 1.2.3 Hiperplasia X Neoplasia A capacidade de proliferação das células na hiperplasia tem limites. As células hiperplásicas não se multiplicam indefinidamente e, embora haja a formação de uma população nova de células crescendo no local estimulado, há conservação dos mecanismos de controle da divisão celular. Além disso, a hiperplasia é um processo reversível, no sentido de que se a causa deixar de atuar, a população celular retorna ao nível normal. Na neoplasia, principalmente a maligna ou câncer, a proliferação celular é descontrolada e há autonomia de crescimento, em virtude das alterações genéticas, e é independente da ação de um agente estimulador. Processos Patológicos Gerais 10 Mesmo a hiperplasia sendo diferente da neoplasia maligna, a hiperplasia patológica, por apresentar muita proliferação celular, pode constituir uma porta para o câncer; logo, é considerada potencialmente neoplásica, já que neste tipo de hiperplasia, o risco de surgir uma neoplasia é maior do que em tecidos normais. Isso se dará, caso haja, nas células hiperplásicas, uma transformação neoplásica, ou seja, eventualmente ocorrerá o surgimento de uma proliferação cancerosa. 1.3 Hipotrofia (Atrofia) É a diminuição do tamanho das células por perda de substância celular, ocorrendo redução quantitativa dos constituintes e das funções celulares, com manutenção do número de células, resultando, consequentemente, em redução do volume e do peso dos órgãos e tecidos afetados. O mecanismo básico é a diminuição do anabolismo (síntese) celular, que resulta em menor renovação dos constituintes das células; além disso, há uma redução da síntese de proteínas e uma maior degradação das proteínas celulares. A hipotrofia representa uma redução dos componentes estruturais da célula, ou seja, menor quantidade de organelas, como mitocôndrias, retículo endoplasmático etc., alcançando um novo equilíbrio. Esta redução de organelas ocorre para que a célula e o órgão consigam sobreviver a uma nova situação; logo, há redução no tamanho das células, diminuindo assim, as necessidades metabólicas das células o suficiente para que elas sobrevivam. Quando a causa da hipotrofia é mais prolongada, pode ocorrer a morte de células por apoptose; assim, o número de células do tecido ou do órgão diminui (hipoplasia), portanto, a hipotrofia pode ser acompanhada pela hipoplasia. Assim como a hipertrofia e a hiperplasia, a hipotrofia também pode ser fisiológica ou patológica. 1.3.1 Hipotrofia Fisiológica A hipotrofia fisiológica ocorre por: Senilidade: Ocorre hipotrofia de órgãos em virtude da redução das atividades metabólicas com o envelhecimento, havendo também uma diminuição do ritmo da proliferação celular. Perda de estimulação endócrina: Redução na produção de hormônios leva a hipotrofia de células ou órgãos-alvo, que dependendo da causa, pode ser fisiológica ou patológica. Como ocorre na menopausa, a perda de estimulação estrogênica promove a atrofia fisiológica do útero. Processos Patológicos Gerais 11 1.3.2 Hipotrofia Patológica A hipotrofia patológica ocorre por: Deficiência nutricional: Nutrição inadequada, por qualquer causa, resulta em hipotrofia de órgãos, podendo ser de forma generalizada, sendo mais grave quando ocorre em crianças, pois pode interferir no desenvolvimento. Em casos graves de desnutrição proteico-calórica, pode ocorrer a utilização das proteínas musculares como fonte de energia. Após todo o esgotamento das reservas, inclusive de tecido adiposo, esse consumo muscular é caracterizado como caquexia. Desuso: Redução de carga de trabalho, órgãos ou tecidos sem uso por algum tempo. Como exemplo, podemos citar a musculatura esquelética quando sofre imobilização com aparelhos ortopédicos, em casos de fratura óssea. Como é um processo reversível, após exercícios ou fisioterapia, a musculatura esquelética retorna à sua conformação habitual, com a atividade motora restaurada (Figura 5). Este mesmo processo ocorre em indivíduos que ficam em repouso absoluto no leito. Quando a imobilização é mais prolongada (por muito tempo), pode ocorrer a morte das fibras musculares esqueléticas por apoptose; com isso, há uma redução no número de células, o que caracteriza uma hipoplasia, e em casos mais graves, pode ocorrer até uma osteoporose por desuso, por causa da reabsorção óssea aumentada. Figura 5: Imobilização do membro superior durante um tempo promove a redução da massa muscular em decorrência de uma atrofia por desuso. Fonte: Dreamstime. Compressão por neoplasias, cistos, aneurisma: Principalmente neoplasias. Com o crescimento delas, pode ocorrer a compressão de tecidos adjacentes ou de vasos sanguíneos. Perda de inervação: Perda da estimulação nervosa de músculos, como ocorre na poliomielite, que promove a hipotrofia dos músculos dos membros inferiores. 1.3.3 Consequências Vai depender do local afetado e da intensidade da hipotrofia. A hipotrofia pode progredir até o ponto em que as células são lesionadas e levadas a morte. Se o suprimento de sangue for inadequado até mesmo para manter a vida de células que reduziram de tamanho, podem ocorrer lesão e morte celular. O tecido atrófico pode ser substituído por tecido adiposo, sendo chamado de infiltração adiposa. Processos Patológicos Gerais 12 1.4 Hipoplasia Hipoplasia é a diminuição da população celular ou do número de células em um tecido ou órgão, resultando na diminuição do tamanho e do peso. A hipoplasia comumente está associada à hipotrofia, ou seja, nos órgãos que sofrem hipotrofia, algumas células morrem por apoptose, e com isso, há redução no número de células. Normalmente, a hipoplasia está relacionada com uma redução no ritmo de renovação celular e com uma elevada taxa de destruição e morte das células ou ambos os processos simultaneamente. 1.4.1 Hipoplasia Fisiológica A hipoplasia fisiológica ocorre por: Involução do timo: Ocorre a partir da puberdade e pode ocorrer, simultaneamente, substituição por tecido adiposo. Perda de estimulação hormonal: Útero na menopausa. Senilidade: Como descrito na hipotrofia, diminuição no ritmo da proliferação celular e aumento da apoptose; a hipoplasia acompanha a hipotrofia. 1.4.2 Hipoplasia Patológica A hipoplasia patológica ocorre: Na medula óssea: Desencadeada por agentes tóxicos ou infecciosos, resultando em anemias aplásicas (ou hipoplásicas), podendo ser acompanhadas ou não pela diminuição no número das demaiscélulas sanguíneas. Em órgãos linfoides: Pode ocorrer hipoplasia em decorrência da destruição de linfócitos por corticoides. 1.5 Metaplasia Metaplasia é uma adaptação em que ocorre a mudança de um tipo de tecido adulto, maduro, diferenciado (epitelial ou mesenquimal) em outro tecido da mesma origem embrionária ou linhagem. Em outras palavras, na metaplasia, um tipo de epitélio se transforma em outro tipo epitelial, ou um tecido mesenquimal se transforma em outro mesenquimal. Vale frisar que um epitelial não se transforma em mesenquimal e vice-versa. Em todos os casos, o tecido formado (metaplásico) é mais resistente que o tecido anterior, logo, é mais resistente às agressões. Por conta disso, a metaplasia é uma adaptação à uma agressão, e portanto, ela surge em resposta a vários estímulos agressores. Em outras palavras, é o resultado de irritações persistentes, prolongadas ou crônicas que promovem o aparecimento de um tecido mais resistente. Os tipos mais comuns de metaplasia são: Processos Patológicos Gerais 13 ▪ Transformação do epitélio pavimentoso (escamoso) estratificado não queratinizado em epitélio pavimentoso (escamoso) estratificado queratinizado em cavidade oral ou esôfago por causa de uma irritação persistente. Muitos se referem a esta metaplasia como leucoplasia, pois ela ocorre nas irritações por calor prolongado, por causa de alimentos muito quentes ou nos lábios de usuários de cachimbo. ▪ Agressões mecânicas repetitivas como próteses dentárias mal ajustadas no epitélio da gengiva ou bochecha. ▪ Transformação do epitélio pseudoestratificado cilíndrico ciliado em epitélio pavimentoso (escamoso) estratificado na traqueia e brônquios de indivíduos fumantes (tabagismo), pois ocorre uma irritação química prolongada, persistente e crônica (Figura 6). Membrana basal Metaplasia escamosa A B Epitélio colunar normal Figura 6: A: Esquematização de uma metaplasia de um epitélio cilíndrico para um epitélio pavimentoso ou escamoso. B: Corte histológico da referida metaplasia. Fonte: Adaptado de Kumar et al. (2016). Processos Patológicos Gerais 14 ▪ Refluxo gastroesofágico por agressão contínua do suco gástrico – que é ácido – à mucosa do esôfago. Neste caso, o epitélio pavimentoso (escamoso) do esôfago é substituído por um epitélio cilíndrico intestinal. ▪ Transformação de tecido conjuntivo em tecido cartilaginoso, ósseo ou adiposo, pois são todos de origem mesenquimal. Os estímulos que induzem a metaplasia podem também induzir uma transformação neoplásica no tecido metaplásico, principalmente, se o agente agressor indutor for um agente oncogênico ou carcinogênico, originando então, uma neoplasia, que geralmente é maligna. 2. Neoplasias As neoplasias são alterações do crescimento e da diferenciação celulares. O termo “neoplasia” significa crescimento novo, e na prática, a neoplasia também é chamada de “tumor”, sendo que os termos “neoplasia” e “tumor” devem sempre vir acompanhados dos termos “benigno” ou “maligno”, ou seja, neoplasia ou tumor benigno e neoplasia ou tumor maligno. A palavra “câncer” é um termo comum utilizado para se referir a todos os tumores ou neoplasias malignas; logo, o termo “câncer benigno” não é correto. Por definição, neoplasia é uma massa anormal de células ou tecido, cujo crescimento excede e não está coordenado com o crescimento dos tecidos normais, persistindo mesmo quando cessada a causa que a provocou. A área da saúde que estuda as neoplasias é a oncologia e os estímulos ou agentes causadores de neoplasias, principalmente o câncer, são denominados agentes cancerígenos ou oncogênicos ou carcinogênicos. As células da neoplasia são anormais, pois sofrem mutação no DNA, por conta desses agentes. 2.1 Propriedades das Neoplasias As neoplasias possuem três importantes propriedades. Vamos conhecê- las a seguir. 2.1.1 Proliferação Celular Descontrolada A taxa de proliferação de cada tipo celular é controlada, com precisão, por um sistema integrado, que permite a replicação apenas dentro dos limites, que mantém a população normal em níveis homeostáticos. Já a célula neoplásica sofre alteração intrínseca nos seus mecanismos regulatórios da multiplicação celular; logo, a proliferação celular é descontrolada e esta característica é mais visível na neoplasia maligna. Processos Patológicos Gerais 15 2.1.2 Autonomia de Crescimento Como a proliferação celular é descontrolada, as células neoplásicas adquirem autonomia de crescimento, principalmente em neoplasias malignas, pois se tornam independentes dos controles ou estímulos internos ou externos, ou seja, sua capacidade de replicação é ilimitada, e por conta disso, estas células são, muitas vezes, consideradas “imortais”. 2.1.3 Perda da Diferenciação Celular O termo “diferenciação” é sinônimo de especialização, e quanto mais avançado ou complexo é o estado de diferenciação celular, menor é a taxa de proliferação celular, ou seja, o estado de diferenciação celular é inversamente proporcional à taxa de mitose. Desta forma, entende- se que nas neoplasias, em geral, ocorre paralelamente ao aumento do crescimento, uma perda de diferenciação celular, característica bastante observada nas neoplasias malignas. Consequentemente, em virtude disso, as células neoplásicas perdem progressivamente as características de diferenciação e se tornam atípicas, indiferenciadas ou anaplásicas. 2.2 Nomenclatura e Classificação das Neoplasias As neoplasias podem ser classificadas de acordo com vários critérios. São eles: ▪ Por meio do comportamento clínico; ▪ Pelo aspecto microscópico ou critério histomorfológico, principalmente por meio da coleta de material para biópsia (histopatologia); ▪ Por meio da origem da neoplasia, critério histogenético. O critério mais utilizado para se nomear uma neoplasia é o histomorfológico, em que a neoplasia é identificada pelo tecido ou célula que está se proliferando. Neste sentido, algumas regras de nomenclatura são importantes, como: O sufixo OMA é empregado na nomenclatura de qualquer neoplasia benigna ou maligna; A palavra CARCINOMA indica neoplasia maligna de origem epitelial, como os epitélios de revestimento, havendo a necessidade de se especificar o órgão de origem (Quadro 1); Neoplasia Benigna Neoplasia Maligna Glândula Mamária Adenoma mamário Adenocarcinoma mamário Glândula Tireoide Adenoma de tireoide Adenocarcinoma de tireoide Pâncreas Adenoma pancreático Carcinoma pancreático Fígado (hepatócitos) Adenoma hepático Carcinoma hepático ou hepatocelular Rins (epitélio renal) Adenoma renal Carcinoma renal Melanócitos Nevo Melanoma maligno Quadro 1: Exemplos de nomenclatura de neoplasias de tecidos de origem epitelial. Fonte: Do autor. Processos Patológicos Gerais 16 A palavra SARCOMA indica neoplasia maligna de origem mesenquimal (Quadro 2); Neoplasia Benigna Neoplasia Maligna Tecido adiposo Lipoma Lipossarcoma Tecido fibroso Fibroma Fibrossarcoma Tecido cartilaginoso Condroma Condrossarcoma Tecido ósseo Osteoma Osteossarcoma ou sarcoma osteogênico Músculo liso Leiomioma Leiomiossarcoma Músculo estriado Rabdomioma Rabdomiossarcoma Vaso sanguíneo Hemangioma Angiossarcoma ou hemangiossarcoma Células hematopoiéticas - Leucemias Tecido linfoide - Linfomas Quadro 2: Exemplos de nomenclatura de neoplasias de tecidos de origem mesenquimal. Fonte: Do autor. A palavra BLASTOMA, quando empregada como sufixo, indica que a neoplasia reproduz estruturas com características embrionárias. Por exemplo: neuroblastoma; nefroblastoma; hepatoblastoma. Existem ainda outras formas de nomenclaturas, como os TERATOMAS, que são tumores que podem ser benignos ou malignos de células originárias de várias camadas germinativas (células toti ou pluri ou multipotentes), ou seja, endoderma, ectoderma e mesoderma, encontrados, principalmente, nas gônadas masculina (testículos) e feminina (ovários). Logo, nos teratomas, podem ser encontrados pele, gordura, dente, pelos etc. Os TUMORES MISTOScontêm células de uma única camada germinativa e apresentam tanto componentes epiteliais, quanto mesenquimais, como tecido cartilaginoso e ósseo. Normalmente, os componentes epiteliais são observados em meio a um estroma mixoide, podendo conter ilhas de cartilagem ou osso, sendo comuns em glândulas salivares em humanos e nas glândulas mamárias em animais, principalmente em cadelas. 2.3 Características das Neoplasias Benignas e Malignas As neoplasias benignas e malignas se distinguem por meio de uma série de características. Vamos conhecê-las a seguir. 2.3.1 Diferenciação e Anaplasia Estas características são aplicadas às células parenquimatosas das neoplasias. A diferenciação (especialização) se refere ao grau de semelhança entre as células neoplásicas e as células do tecido ou órgão normais, quando comparadas a nível morfológico e também funcional. Processos Patológicos Gerais 17 Normalmente, as neoplasias benignas são bem diferenciadas, compostas por células que se assemelham às células normais maduras do tecido de origem da neoplasia, apresentando células neoplásicas semelhantes entre si, num mesmo tumor, e um aspecto monótono, com raras figuras mitóticas. Em relação às neoplasias malignas, estas podem apresentar uma variação com relação ao grau de diferenciação, desde células moderadamente diferenciadas, pouco diferenciadas a células indiferenciadas. Estas últimas são também denominadas anaplásicas, ou seja, as neoplasias malignas possuem células não especializadas, de aspecto primitivo, ou seja, com atipias acentuadas e perda completa das características morfológicas. A falta de diferenciação ou anaplasia é considerada uma característica básica da transformação maligna ou malignidade e se caracteriza por diversas alterações morfológicas e funcionais, ou seja, normalmente está associada a outras alterações morfológicas. Tanto as células, quanto os núcleos apresentam pleomorfismo, isto é, uma variação no tamanho e na forma. Com este pleomorfismo celular e nuclear, as células cancerígenas de uma mesma neoplasia não são uniformes. Os núcleos das células cancerígenas contêm uma quantidade abundante de cromatina, que é irregular e mais compacta, deixando os núcleos com tonalidade extremamente escura e hipercromáticos (hipercromasia nuclear), podendo apresentar mais de um nucléolo, além de células bi ou multinucleadas. Muitas vezes, são núcleos desproporcionalmente grandes para a célula; portanto, a relação núcleo/citoplasma é aumentada, podendo se aproximar de 1:1, ao invés do valor normal de 1:4 ou 1:6. Além das anormalidades celulares e nucleares, a organização e orientação das células da neoplasia maligna encontram-se bastante alteradas, pois elas perdem sua polaridade normal, formando camadas ou grandes massas de células (hipercelularidade) com crescimento anárquico e desorganizado. 2.3.2 Velocidade ou Taxa de Crescimento A velocidade de crescimento das neoplasias é inversamente proporcional ao seu grau de diferenciação, logo, as neoplasias malignas crescem mais rápido que as neoplasias benignas. A neoplasia benigna possui um índice mitótico baixo e taxa de divisão celular pequena; com isso, seu crescimento é lento e por expansão, o que permite um desenvolvimento adequado de vasos sanguíneos, fornecendo uma boa nutrição e oxigenação das células neoplásicas. Processos Patológicos Gerais 18 Áreas com degenerações, necrose e ulceração são raras, atribuindo à neoplasia benigna um aspecto homogêneo. Como o crescimento é por expansão, a neoplasia benigna não se infiltra e nem destrói os tecidos vizinhos ou adjacentes. Apesar de as neoplasias benignas crescerem devagar, elas têm importância, pois podem causar vários transtornos para os indivíduos, como obstrução e compressão, além de produzirem substâncias em maior quantidade, levando, inclusive, o indivíduo a óbito. Como possuem perda da diferenciação, as neoplasias malignas apresentam alto índice mitótico, alta taxa de proliferação celular, e consequentemente, crescem rapidamente e por infiltração. Com isso, essas células mostram um crescimento inadequado dos vasos sanguíneos e o estroma vascular se torna escasso, ou seja, o estroma e os vasos sanguíneos se desenvolvem mais lentamente. Com frequência, é observada a presença de áreas com degenerações, necrose – normalmente isquêmica –, em áreas centrais e ulceração, deixando esta neoplasia com um aspecto heterogêneo. 2.3.3 Invasão Local Como mostram um crescimento lento, as neoplasias benignas apresentam massas coesas em expansão, permanecendo no seu local de origem; logo, não são observadas infiltração, invasão de tecidos adjacentes, e nem promovem metástases para locais distantes. De acordo com este tipo de desenvolvimento, as células da neoplasia benigna crescem unidas entre si e formam massas esféricas ou ovaladas, bem delimitadas e regulares, pois podem comprimir estruturas adjacentes, principalmente tecido conjuntivo fibroso, causando hipotrofia ou atrofia. Por conta disso, a neoplasia benigna é considerada encapsulada (pseudocápsula), facilmente palpável e móvel, com seus limites precisos e de remoção cirúrgica sem maiores complicações e com margens cirúrgicas satisfatórias. No caso das neoplasias malignas, o crescimento rápido é acompanhado de infiltração progressiva, invasão e destruição de tecidos adjacentes circundantes. O formato desta neoplasia é irregular, seus limites são imprecisos, de difícil palpação e ela não apresenta pseudocápsula; logo, dependendo do tamanho do tumor, sua remoção cirúrgica é extremamente dificultada, podendo não ter condições de ser realizada. Após o desenvolvimento de metástase, a capacidade de invasão constitui a característica mais confiável entre as diferenças entre neoplasias malignas e benignas. 2.3.4 Metástases Metástase é a formação de uma nova massa tumoral a partir da primeira, mas sem continuidade entre elas, ou seja, é a propagação de uma nova lesão neoplásica para áreas distantes da neoplasia primária. Processos Patológicos Gerais 19 Para que isso ocorra, as células cancerígenas se desprendem da neoplasia primária, rompendo a membrana basal. Havendo o descolamento das células tumorais uma das outras, elas migram pelo tecido intersticial ou matriz extracelular (MEC), se fixando a componentes da matriz. Desta forma, conseguindo fazer sua migração até atingirem uma via de disseminação, como a circulação, por meio da membrana basal vascular, essas células são levadas para um local distante, onde irão formar uma nova massa ou colônia neoplásica. Em geral, as metástases se apresentam macroscopicamente na forma de múltiplos nódulos (Figura 7). Figura 7: Metástase hepática originada por um adenocarcinoma pancreático. Observe a presença de múltiplos nódulos, de vários tamanhos e de coloração brancacenta pelo parênquima hepático. Fonte: Wikimedia. As metástases definem uma neoplasia como maligna, pois as neoplasias benignas não realizam metástases. A invasão dos cânceres permite a sua penetração nos vasos sanguíneos, linfáticos e em cavidades corporais, proporcionando, desta forma, a disseminação. É importante frisar a compreensão de que nem toda neoplasia maligna faz metástase, pois nem todas as células que se desprendem do tumor primário e atingem a circulação sanguínea ou linfática conseguem sobreviver. Geralmente, quanto mais agressiva, de crescimento mais rápido e maior a neoplasia maligna primária, maior a probabilidade de sofrer metástase ou de já apresentar metástase; a disseminação metastática reduz acentuadamente a possibilidade de cura e o prognóstico é desfavorável. Infelizmente, em muitos indivíduos, a primeira manifestação clínica de um câncer está relacionada com suas metástases, logo, é de extrema importância a conscientização da população sobre a realização periódica de exames (checkup). 2.3.5 Vias de Disseminação As células da neoplasia maligna apresentam alterações importantes na membrana plasmática, que astornam menos aderentes entre si e facilitam seu deslocamento da massa neoplásica. Processos Patológicos Gerais 20 As metástases das neoplasias malignas para outro locais ocorrem, basicamente, por meio de três vias de disseminação. São elas: Implantação direta em cavidades ou superfícies corporais: Esta via também é conhecida como via transcelômica. A cavidade peritoneal é a mais frequentemente afetada por este tipo de disseminação, mas esta situação pode ocorrer em qualquer outra cavidade, como a pleural, pericárdica e os espaços articulares. Via linfática: Esta via ocorre por meio dos vasos linfáticos. É o transporte de células neoplásicas (êmbolos neoplásicos) pelos vasos linfáticos e é a via mais comum de disseminação dos carcinomas, apesar de que os sarcomas também podem utilizar esta via. O padrão de comprometimento dos linfonodos segue as vias naturais de drenagem. Por exemplo: os adenocarcinomas mamários se disseminam primeiro para os linfonodos axilares e torácicos. O primeiro linfonodo na via de drenagem linfática da neoplasia é denominado linfonodo sentinela, que pode ser identificado por meio de marcações com corantes ou contrastes, e removido para realização de biópsia. O aumento dos linfonodos pode ser causado por disseminação e crescimento das células cancerosas e por hiperplasia reativa (linfoadenopatia reativa). Por isso o aumento de volume dos linfonodos nas proximidades de um câncer não indica, necessariamente, a disseminação da lesão primária. Via hematogênica: Esta via de disseminação ocorre por meio dos vasos sanguíneos; é a via mais comum de disseminação dos sarcomas, podendo ser utilizada também pelos carcinomas. As artérias são menos facilmente penetradas ou invadidas do que as veias, pois as artérias possuem a parede mais espessa que as veias. Entretanto, pode ocorrer disseminação arterial quando as células tumorais atravessam os leitos capilares pulmonares ou derivações arteriovenosas pulmonares, ou ainda, quando as próprias metástases pulmonares dão origem a êmbolos tumorais adicionais. Com a invasão venosa, as células transportadas pelo sangue seguem o fluxo venoso, drenando o local da neoplasia. O fígado e os pulmões são mais frequentemente afetados de forma secundária neste tipo de disseminação hematogênica. De acordo com as vias de disseminação, existem aqueles órgãos em que a probabilidade de se encontrar metástases é grande; são os chamados órgãos sítios de metástases, e entre eles, podemos citar, principalmente, os linfonodos regionais, fígado, pulmões, sistema nervoso central e ossos. 2.4 Princípios Fundamentais da Carcinogênese As células neoplásicas têm origem em células normais que sofreram alterações em seu DNA (mutação), os chamados fatores genéticos. Essas células são consideradas alterações genéticas não letais, ou se originam de mecanismos que controlam a expressão gênica, os chamados Processos Patológicos Gerais 21 fenômenos epigenéticos – expressão de genes envolvidos no controle do ciclo celular e da diferenciação das células. O surgimento de neoplasias em tecidos com células permanentes está relacionado com alterações em células-tronco. As neoplasias são clonais, ou seja, uma única célula que sofreu lesão genética (mutação no DNA) dá origem a um clone de células alteradas, que ultrapassam o controle da proliferação celular. A partir deste clone, há proliferação destas células alteradas, fenômeno conhecido como expansão clonal, surgindo novos clones de células alteradas, por acúmulo de mutações, o que implica na formação da massa tumoral. A carcinogênese é um processo bastante complexo, multifásico e dependente tanto de fatores genéticos, quanto epigenéticos, culminando com o aparecimento de clones de células “imortalizadas”, que adquirem a capacidade de se proliferar de forma autônoma. Em outras palavras, elas têm a capacidade replicativa ilimitada de promover invasão a tecidos adjacentes e de gerar metástases. A alteração genética não letal, que ocorre nas células, constitui a cerne da carcinogênese. Essa mutação no DNA pode ser adquirida pela ação de agentes ou componentes ambientais, como substâncias químicas (tabagismo, consumo abusivo de álcool); agentes físicos; radiação ultravioleta; radiação ionizante; vírus (alguns tipos de HPV; vírus Epstein-Barr); bactérias (Helicobacter pylori); alguns hábitos alimentares (dieta rica em gordura), podendo ser herdada também na linhagem germinativa, ou seja, de maneira hereditária. A massa tumoral é formada por vários clones e subclones de células, que adquirem capacidades variadas de sobrevivência, como fazer invasão e metástase. Os fatores genéticos e os componentes ambientais possuem grande importância no surgimento de inúmeros tumores, tanto em humanos, quanto em animais; logo, as neoplasias são entendidas como o resultado de agressões ambientais em indivíduos geneticamente suscetíveis, pois as influências ambientais parecem ser os fatores de risco dominantes para a maioria dos tipos de câncer. Existem quatro classes de genes reguladores normais, que tendem a manter as células normais dentro dos limites fisiológicos de crescimento e diferenciação; logo, estas classes de genes constituem os principais alvos da lesão genética, ou seja, das mutações causadoras do câncer. São eles: Processos Patológicos Gerais 22 Os proto-oncogenes promotores do crescimento: Os proto-oncogenes, como os genes da família RAS, gene BRAF, gene MYC, ERBB1 (EGFR) e ERBB2 (HER-2), que são da família do receptor EGF, são essenciais para a grande parte dos processos biológicos vitais, como o crescimento e diferenciação celulares. Em seu estado natural, esses genes comandam a divisão celular de forma ordenada e fisiológica e são responsáveis pelo controle normal do ciclo celular. Quando um proto-oncogene sofre mutação, ele passa a ser um oncogene, e consequentemente, o controle do ciclo celular ou da replicação é perdido, pois os oncogenes promovem o crescimento celular autônomo nas células cancerígenas. Esta alteração genética resulta na síntese de um produto gênico anormal (oncoproteína), tendo uma função aberrante, como a proliferação excessiva descontrolada. Os genes supressores de tumor que inibem o crescimento do câncer: Podemos citar como exemplos o gene RB, o gene TP53, que codifica a proteína p53 (conhecida como a guardiã do genoma), BRCA-1 e BRCA-2 etc. Os produtos destes genes atuam como “freios” contra a proliferação celular, podendo levar células à apoptose. A função fisiológica desses genes consiste em regular o crescimento da célula e impedir a formação de neoplasias, pois eles estão envolvidos no controle de pontos estratégicos “checkpoints”, controlando o crescimento e diferenciação celulares, e evitando a proliferação celular desordenada. Logo, alterações nestes genes promovem uma insuficiência da inibição do crescimento. Os genes que regulam a apoptose: Esses genes – por exemplo, a família BCL-2 – podem sofrer alterações e, por consequência, inibir ou diminuir a morte por apoptose, permitindo, desta forma, uma maior sobrevida das células cancerígenas, como a superexpressão da proteína BCL-2, que inibe a apoptose. A via intrínseca da apoptose ou via mitocondrial é a mais frequentemente desativada no câncer, enquanto a via extrínseca é alterada com menos frequência. Os genes relacionados ao reparo do DNA: Como exemplo, podemos citar o gene TP53. Reparo do DNA danificado, estes genes afetam a proliferação ou sobrevida das células, indiretamente, ao influenciarem a capacidade do organismo de proceder ao reparo das lesões não letais em outros genes. Em outras palavras, estes genes permitem que células normais procedam ao reparo do DNA danificado, impedindo, assim, a ocorrência de mutações em genes que regulam o crescimento e a apoptose celulares. Durante o processo normal de duplicação do DNA, falhas na replicação podem ocorrer. Quando esta falha é reparada, a célula permanece com seu genótipoe fenótipo normais, porém, se ocorrer uma falha no reparo do DNA, a mutação ocorrida se propaga nas gerações seguintes, podendo ser capaz de induzir transformação neoplásica. Nesta unidade de aprendizagem, vimos que a progressão tumoral está relacionada ao surgimento sequencial de subpopulações ou subclones de Processos Patológicos Gerais 23 células, que se diferem em relação aos fenótipos, com caráter invasivo, velocidade de crescimento, capacidade metastática, responsividade hormonal e susceptibilidade a agentes antineoplásicos. Aprendemos, também, que, quando o câncer se torna clinicamente evidente, suas células são extremamente heterogêneas e ao nível molecular. Por fim, vimos que a progressão do tumor e a heterogeneidade associada resultam de múltiplas mutações, que se acumulam independentemente em diferentes células, gerando, dessa forma, os clones com características diferentes. Referências ANATPAT. Carcinoma epidermoide corneificado de pele grossa. Disponível em: http://anatpat.unicamp.br/lampele10a.html. Acesso em: 16 nov. 2018. BRASILEIRO FILHO, Geraldo. Bogliolo: Patologia geral. 5 ed. Rio de Janeiro: Gen/Guanabara Koogan, 2013. ______. Bogliolo: Patologia geral. 6 ed. Rio de Janeiro: Gen/ Guanabara Koogan, 2018. KUMAR, Vinay et al. Robbins e Cotran, patologia: bases patológicas das doenças. 9 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. Processos Patológicos Gerais 24 http://anatpat.unicamp.br/lampele10a.html Alterações do Crescimento Celular (Adaptações e Neoplasias) Para Início de Conversa... Objetivos 1. Adaptações Celulares 1.1 Hipertrofia 1.1.1 Hipertrofia Fisiológica 1.1.2 Hipertrofia Patológica 1.1.3 Consequências 1.2 Hiperplasia 1.2.1 Hiperplasia Fisiológica 1.2.2 Hiperplasia Patológica 1.2.3 Hiperplasia X Neoplasia 1.3 Hipotrofia (Atrofia) 1.3.1 Hipotrofia Fisiológica 1.3.2 Hipotrofia Patológica 1.3.3 Consequências 1.4 Hipoplasia 1.4.1 Hipoplasia Fisiológica 1.4.2 Hipoplasia Patológica 1.5 Metaplasia 2. Neoplasias 2.1 Propriedades das Neoplasias 2.1.1 Proliferação Celular Descontrolada 2.1.2 Autonomia de Crescimento 2.1.3 Perda da Diferenciação Celular 2.2 Nomenclatura e Classificação das Neoplasias 2.3 Características das Neoplasias Benignas e Malignas 2.3.1 Diferenciação e Anaplasia 2.3.2 Velocidade ou Taxa de Crescimento 2.3.3 Invasão Local 2.3.4 Metástases 2.3.5 Vias de Disseminação 2.4 Princípios Fundamentais da Carcinogênese Referências
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