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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
TEORIAS DA PERSONALIDADE - PSICOLOGIA
WAGNER THIAGO VIEIRA DOS SANTOS
RESENHA DE ARTIGO: “ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ANATÔMICAS E
PSICODINÂMICAS SOBRE A SEMELHANÇA ENTRE OS SEXOS – A
FEMINILIDADE PRIMÁRIA”
CAMPOS DOS GOYTACAZES
2023
O artigo ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ANATÔMICAS E PSICODINÂMICAS SOBRE
A SEMELHANÇA ENTRE OS SEXOS – A FEMINILIDADE PRIMÁRIA, por Eliane
Souto de Abreu abarca a discussão sobre a fase primitiva e pré-edípica do desenvolvimento
feminino, conforme descrita por Sigmund Freud. O autor descreve essa fase como uma
intensa e apaixonada ligação exclusiva com a mãe, que pode perdurar até os quatro ou cinco
anos de idade, e afirma que algumas mulheres talvez nunca escolham um homem como objeto
genuíno de amor. Freud compara essa fase ao período pré-grego da civilização
minoica-micênica, destacando sua importância e seu caráter distante, como se tivesse sido
apagada pelo tempo devido a uma repressão inexorável.
Essa fase primitiva descrita por Freud despertou meu interesse, e fiquei intrigado ao descobrir
que autores como Robert Stoller expandiram essa ideia para incluir todas as crianças,
independentemente de seu sexo, argumentando que todos nós possuímos uma fase primordial
de feminilidade.
Stoller sustenta que o jogo de identificações da criança com sua mãe e com o outro adulto
disponível é mais importante e complexo do que a escolha do objeto. Essas identificações
formam a base para a miríade de expressões sexuais que observamos na prática clínica de
adultos, levando diversos autores a proporem termos como "sexualidades",
"neo-sexualidades" e "homossexualidades".
Seguindo a linha de Stoller, a identidade de gênero nuclear, ou seja, a sensação de ser
masculino ou feminino, é uma parte do que ele chama de narcisismo primário. Segundo
Stoller, essa identidade é influenciada por fatores que seguem uma ordem cronológica
aproximada, mas com sobreposições.
A designação do sexo ao nascimento, segundo Stoller, desempenha um papel significativo na
construção da identidade de gênero. Desde o momento em que uma criança nasce, alguém
declara seu sexo, e esse evento aparentemente trivial tem efeitos permanentes. Os adultos
vestem a criança de acordo com seu sexo, escolhem o tom de voz ao se dirigirem a ela e
interagem de maneira diferenciada. Estudos sugerem que as meninas recebem mais carinho e
toque do casal parental em comparação aos meninos, e que os pais fazem mais distinções
nessas situações do que as mães (McIntyre & Edwards, 2009). Piera Aulagnier, citada por
Fiorini (2001), argumenta que o próprio reconhecimento do sexo do recém-nascido, com base
exclusivamente na anatomia, pode ser considerado uma violência, embora seja uma violência
necessária e estruturante.
Os fenômenos biopsíquicos descritos por Stoller parecem ser cruciais para a compreensão da
feminilidade primária, pois vão além dos aspectos puramente biológicos e sociais. Todos os
seres humanos vivenciam esses fenômenos, nos quais a criança vive a mãe antes de amá-la,
sendo gerada dentro dela. O feto experimenta um ambiente líquido rico em estímulos
sensoriais, engolindo o líquido amniótico, movimentando-se, brincando com o cordão
umbilical e adotando posições preferenciais. A partir das 16 semanas de gestação, o feto já
possui audição funcional, ouvindo as batidas do coração da mãe, sua respiração e os
movimentos intestinais. Com 22 semanas, ele pode ouvir a voz da mãe e de outras pessoas ao
seu redor, mostrando preferência pela voz materna. Após o nascimento, a criança prefere
vozes femininas e estabelece um diálogo com a mãe no qual as palavras têm valor secundário,
sendo mais relevante a prosódia, acompanhada de expressões faciais e movimentos corporais..
Resumindo as palavras de Winnicott "não existe tal coisa como um bebê". A criança não é um
indivíduo separado, mas está fusionada com a mãe e ancorada nela. Esses fenômenos
continuam após o nascimento por um tempo variável, dependendo da autonomia e do desejo
da criança de se distanciar da mãe, bem como das escolhas que a própria mãe e o pai fazem
nessa questão. Portanto, parece que o surgimento do psiquismo ocorre por meio da ligação
com o feminino, por meio de estímulos não mentais, silenciosos e próximos às fontes
pulsionais. Trata-se de um inconsciente não recalcado e, portanto, de difícil, senão impossível,
representação.
Aprofundando-se na ligação intensa com a mãe, essa conexão traz vantagens evolutivas e
contribui para o desenvolvimento de comportamentos sociais e emoções mais refinadas,
especialmente nos mamíferos. Os estudos clássicos de Harlow com filhotes de
macacos-rhesus ilustram essa importância. No entanto, os seres humanos diferem de outras
espécies devido à grande imaturidade do sistema nervoso central após o nascimento,
especialmente o sistema límbico, que está ligado às emoções primordiais. Somente na
presença do outro nos tornamos verdadeiramente nós mesmos.
A abordagem psicodinâmica, com destaque para Sigmund Freud e a psicanálise, oferece uma
perspectiva rica e complexa sobre a feminilidade primária e a formação da identidade de
gênero. As ideias de Freud sobre a fase pré-edípica do desenvolvimento feminino, a ligação
exclusiva com a mãe e a importância dessa fase, comparada à civilização mino-micênica,
fornecem um ponto de partida para a exploração desses temas. Autores como Stoller
expandiram as ideias de Freud, propondo que todas as crianças, independentemente do sexo,
passem por uma fase de feminilidade primordial. Além disso, a análise de Stoller destaca a
importância das identificações da criança com a mãe e com outros adultos, bem como a
complexidade do desenvolvimento intrapsíquico, que resulta em uma variedade de expressões
sexuais na prática clínica de adultos.
Ao revisar essas teorias e explorar outras áreas como medicina e neurociências, podemos
encontrar ancoragens que corroboram aspectos da feminilidade primária. A influência da
biologia, a designação do sexo ao nascimento e os fenômenos biopsíquicos desempenham
papéis significativos na construção da identidade de gênero. Compreender esses elementos
nos ajuda a entender a complexidade do desenvolvimento humano e a importância das
primeiras experiências na formação da identidade. No entanto, é crucial reconhecer que essa
perspectiva não é a única maneira de abordar a feminilidade e a identidade de gênero, e outras
teorias e abordagens também devem ser consideradas para uma compreensão mais
abrangente.
A teoria psicodinâmica fornece insights valiosos para compreendermos a feminilidade
primária e a formação da identidade de gênero. A partir da perspectiva freudiana, a união
primordial com a mãe desempenha um papel crucial na formação do eu, mas essa união nem
sempre é perfeita.
Stoller, ao trabalhar com pacientes transexuais, observou um padrão comum nas histórias
desses indivíduos e suas mães. Ele identificou que mães que nunca haviam experimentado
muita gratificação emocional em suas vidas ficaram encantadas com a gravidez e o filho
transexual. Essas mães construíam uma espécie de cápsula para elas e seus bebês, e o menino
transexual ficava amalgamado à mãe, o que determinava sua identidade nuclear de gênero.
Essa ideia de uma feminilidade natural, sem "trejeitos caricatos", em contraste com alguns
estereótipos associados a homossexuais masculinos, é intrigante.
No caso das meninas, o excesso de amor nessa fase pode dificultar o desenvolvimento de sua
própria personalidade e feminilidade. Em alguns casos, a menina pode até abdicar de sua
feminilidade em favor da mãe, especialmente se o pai é desqualificado pela mãe para ocupar
seu lugar na dinâmica familiar. Por outro lado, mães ambivalentes ou pouco amorosas podem
interditar a expressão saudável da homossexualidade nessa fase.
O texto também aborda o desenvolvimento do ego e a importância do conhecimento e
reconhecimento do corpo. O ego corporal, especialmente na infância, está ancorado no corpo
físicoe no conhecimento das sensações e limites corporais. Aqui, Stoller destaca as sensações
genitais, levantando a discussão sobre o conhecimento precoce da vagina pela menina. É
interessante notar que a representação anatômica do clitóris foi historicamente escassa,
enquanto o conhecimento sobre sua complexidade avançou apenas recentemente. Portanto, é
vazio associar a maturidade psicossexual feminina exclusivamente ao deslocamento do prazer
do clitóris para a vagina.
A neurociência também entra em cena, fornecendo dados sobre a representação cerebral dos
genitais femininos e masculinos. Esses estudos indicam diferenças entre as sexualidades
masculina e feminina, com a sexualidade masculina mais centrada no pênis e a feminina mais
difusa e imprecisa em relação às zonas erógenas.
A leitura do texto leva a refletir sobre a importância das teorias psicodinâmicas, em especial a
psicanálise freudiana, na compreensão da feminilidade primária e da formação da identidade
de gênero. Essas abordagens oferecem uma visão complexa e multifacetada, considerando
fatores biopsicossociais e o papel das primeiras experiências na vida de uma pessoa.
Ao ler o texto sobre a abordagem psicodinâmica de Sigmund Freud e a psicanálise, fiquei
impressionado com a profundidade e relevância dessas teorias para compreender o
desenvolvimento intrapsíquico e a formação da identidade de gênero.
O conceito de complexo de Édipo apresentado no texto ressalta a importância dos objetos
concretos na interação da criança pequena com o mundo. É interessante observar como a
visualização dos genitais do irmão ou dos seios da mãe pode despertar desejos e imaginações
na criança, como a crença de que também crescerá um pênis ou de que seus seios serão
grandes. Esses desejos não necessariamente levam à dúvida em relação ao próprio gênero ou à
vontade de abdicar dele. Acredito que meninas e mulheres não sintam a necessidade de provar
sua feminilidade, ao contrário dos meninos e homens, que frequentemente buscam reafirmar
sua masculinidade e posse do pênis.
Destaca-se que desde o nascimento, as meninas têm um contato mais íntimo e prolongado
com a mãe, o que reforça sua identificação inicial com o feminino. Essa ligação simbiótica
com a mãe e a vivência da feminilidade ocorrem mesmo antes da fase edípica. A autora
também menciona as diferenças observadas entre meninas e meninos em termos de
preferências e comportamentos, como a tendência das meninas de olhar mais para faces e
mostrar maior reação de medo ao novo, enquanto os meninos demonstram maior atividade
motora e afastamento da mãe. Essas observações ressaltam a influência das primeiras
experiências na formação da identidade de gênero.
A discussão sobre a função estruturante do pênis na psique também me chamou a atenção. A
ideia de que o pênis do pai pode ser internalizado e desempenhar funções internas é intrigante.
Essa internalização permitiria o desenvolvimento do espaço psíquico necessário para o
pensamento, possibilitando tanto a separação quanto a ligação. Compreendo que a separação
da criança em relação à mãe seja um processo necessário, para evitar a fusão psíquica e o
risco de engolfamento. O texto também destaca a importância da sexualidade na criação desse
espaço interno e na aceitação da diferença.
Uma das reflexões mais interessantes apresentadas no texto é a questão do repúdio ao
feminino. Contrariando Freud, os autores da feminilidade primária afirmam que o superego
feminino é mais severo do que o masculino, devido à relação primordial com a mãe e ao
medo constante da perda do amor materno. Essa perspectiva ressalta a complexidade da
construção da feminilidade e como cada mulher a desenvolve de maneira singular, levando
em consideração sua própria história e as culpas femininas mais profundas e arcaicas.
No entanto, é importante reconhecer que a abordagem psicodinâmica de Freud tem sido
objeto de críticas e questionamentos ao longo dos anos. É necessário considerar outras teorias
e abordagens contemporâneas para obter uma compreensão mais completa e inclusiva desse
complexo processo.
REFERÊNCIA
Feijo, L. P., Strassburger, B. C., de Barcellos, E. D., & Serralta, F. B. (2023). Processo da aliança
terapêutica em um caso bem-sucedido de psicoterapia psicodinâmica on-line para ansiedade. CES
Psicología, 16(1), 111-131.

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