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TEORIA E PRÁTICA EM SOCIOLOGIA CLÁSSICA AULA 04 Prof. Dr. Rafael Pons Reis CONVERSA INICIAL O objetivo do presente texto consiste em apresentar brevemente os conteúdos da quarta vídeo-aula ministrada pela Professora Maria Izabel Machado, da disciplina de Teoria e Prática em Sociologia Clássica. Para tanto, na primeira seção veremos a sociologia de Max Weber, suas principais obras e o objeto de estudo da sociologia compreensiva. Na segunda seção veremos algumas características da tipologia da ação social, que Weber chamou de tipo ideal. Na seção seguinte, apresentaremos alguns importantes conceitos de sua teoria social, tais como poder, dominação e burocracia. E, por fim, na última seção examinaremos alguns dos aspectos centrais de uma das principais da teoria sociológica contemporânea, “A ética protestante e o espírito do capitalismo”. Bons estudos! TEMA 1 – A SOCIOLOGIA COMPREENSIVA DE MAX WEBER Nascido na cidade de Erfurt, na Alemanha, em 1864, Maximilain Karl Emil Weber, mais conhecido por Max Weber, foi um sociólogo, economista, intelectual e jurista, considerado um dos sociológos mais influentes em todo o mundo. Além da sociologia, Weber estudou e pesquisou outras áreas de conhecimento, tais como ciência política, economia, direito, história e religião. Dentre suas obras mais importantes destacamos “A ética protestante e o espírito do capitalismo” (1905), “A ciência como vocação” (1917), e “Economia e Sociedade” (1922). Conforme vimos nas aulas passadas, os pensadores Durkheim e Marx partem da premissa em seus estudos de que é possível compreender a relação entre os homens a partir do exame da sociedade que os obriga. Deste modo, a partir do entendimento sobre como a sociedade se organiza, é possível compreender como as pessoas pensam, o modo como elas agem bem como as regras que seguem. Sendo assim, por meio da análise do todo – a sociedade –, seria possível entender as partes – os indivíduos, a educação, a organização familiar. Em tese, podemos afirmar que é no todo que ambos os pensadores concentraram seus esforços no sentido de tentar descobrir as “leis 3 gerais”, que por sua vez, explicariam o funcionamento da sociedade. É nesse sentido que devemos entender o desenvolvimento do conceito de fato social, por Durkheim, e a ideia da luta de classes, por Marx, segundo a qual seria a responsável pela história dos homens. Neste contexto, Weber faz o caminho inverso, qual seja, em suas análises ele parte do indivíduo para o todo (sociedade). O ponto de início da sociologia de Weber é o conceito de ação social, que, segundo o próprio autor, “(...) é aquela ação orientada pela ação dos outros. Os ‘outros’ podem ser um indivíduo ou uma coletividade. Pode ser desconhecido ou conhecido. Nem toda ação entre os homens é de caráter social. Somente o é quando tem um sentido dirigido pela ou para a ação dos outros. Dessa forma, a simples imitação não poder ser uma ação social, ela somente será social quando houver um sentido, um significado atribuído à conduta” (Weber, 1977, apud Paixão, 2012, p. 119) (grifo nosso). Desse modo, a sociologia de Weber procura entender como o agente dá sentido à sua forma de ação, à sua ação social, que são, por sua vez, racionalmente orientada, dada a importância da racionalidade como um dos elementos da ordem social. É por isso que, segundo Paixão, “(...) o indivivíduo é sempre portador de uma intencionalidade” (2012, p. 115), sendo que estudando o indivíduo e suas intencionalidade, é possível examinar os grupos, os comportamentos e as instituições. Mas, quais são as ações sociais consideradas relevantes para Weber? Para ele, são aquelas em que se verifica uma atribuição de sentido, isto é, quando existe uma relação intelegível entre a conduta do indivíduo e o comportamento dos outros. Neste sentido, a sociologia weberiana tem como objetivo procurar desvendar qual o sentido ou o significado da ação social. Dito de outra forma, a ação social consiste em um sentido subjetivamente visado pelo ator, bem como a expectativa em relação a ação de outros atores. TEMA 2 – A TIPOLOGIA DA AÇÃO SOCIAL No sentido de tentar entender as ações que tenham um sentido subjetivamente visado e que tem como referência a ação de outros indivíduos, Weber elaborou uma tipologia da ação social, caracterizada de quatro tipos, que Weber chamou de tipo ideal. Segundo Paixão, “O tipo ideal é uma 4 construção teórica elaborada pelo pesquisador com base em vários aspectos históricos. É utilizado como instrumento de pesquisa, possibilitando verificar se a realidade a ser estudada se aproxima ou se distancia do tipo ideal construído. O tipo ideal nunca será encontrado tal e qual na realidade, sendo apenas uma construção teórica. É um recurso metodológico” (Sell, 2002; Johnson, 1997, apud Paixão, 2012, p. 121). Os quatro tipos de ação são os seguintes: i-) racional com a relação a fins; ii-) racional com relação a valores; iii-) afetiva; iv-) tradicional. Na primeira ação social, o ator calculará como agir com base a partir do objetivo a ser atingido. No segundo tipo de ação social, o agente procurará realizar a finalidade desejada tomando como base a escolha racional de acordo com um dado valor, podendo ser este, moral, estético ou religioso. No terceiro tipo, o agente conduz suas ações com base nos afetos como: amor, ira, vingança, ódio. E, por fim, o último tipo de ação social, são as ações orientadas com base em valores obtidas pelas tradições, pelos costumes, herdadas ao longo do tempo. O quadro 1 abaixo apresenta uma breve descrição dos quatro tipos de ações sociais weberianas. Quadro 1. Tipologia das ações sociais Fonte: Paixão (2012, p. 122) 5 Importante mencionarmos que, para Weber, os indivíduos são racionais e, por isso, suas ações são dotadas de intencionalidade. Isso não significa dizer que o autor quer estudar apenas o indivíduo, deixando de lado importantes instituições como a família, a Igreja e o Estado. Em sua análise acerca do comportamento do indivíduo, ele leva em consideração não apenas o comportamento dos outros, mas, sobretudo, as normas e regras institucionalizadas na sociedade. Em tese, podemos afirmar que os comportamentos dos agentes são influenciados e constrangidos pelas normas estabelecidas, sejam elas, as leis escritas, os costumes e as convenções (Sell, 2002). A tipologia da ação social de Weber consiste em um modelo teórico de análise, portanto, ela não pode ser encontrada de forma pura em nosso cotidiano, em nossa vida diária. Em síntese, não é um fenômeno natural em que possa ser observado em toda a sua extensão no dia a dia social. Assim, para Weber, em um fenômeno social podemos encontrar dois ou mais tipos de ação social, necessitando, para tanto, isolar o tipo de ação social que mais predomina de forma a conseguir dar a essa ação um tratamento sociológico a partir de uma perspectiva científica. TEMA 3 – BUROCRACIA E DOMINAÇÃO EM MAX WEBER Um dos elementos amplamente abordados nas obras de Weber é sobre a racionalidade dos indivíduos e o respeito as regras, em específico, sobre a ação social racional, o comportamento dos atores segundo as regras, e os regulamentos sociais vigentes. Não é à toa que, segundo o autor, a racionalidade é um dos principais elementos da ordem social. O crescente processo de racionalização, em grande medida, por conta do desenvolvimento das ciências, da urbanização e o progresso do conhecimento técnico, permitiu fazer com que elementos racionais passassem a guiar e organizar a vida dos indivíduos em sociedade. O resultado prático disso fez com que a tradição e as explicações mágicas e religiosas perdessem espaço para o saber científico, momento em que a sociedade estaria passando, segundo Weber, por umprocesso chamado de racionalização. 6 Segundo o autor, o processo de racionalização consiste “(...) no abandono das concepções mágicas e tradicionais como formas de explicação e orientação da vida social, em favor de formas cada vez mais precisas, organizadas e burocratizadas. É uma adaptação cada vez maior entre meios racionais para se conseguirem os fins desejados” (Weber, 1994, apud Paixão, 2012, p. 127). Neste momento devemos questionar sobre, afinal, quais são os motivos que levam as pessoas a obedecer às leis e às normas criadas pela própria racionalização da sociedade? Segundo Weber, a resposta encontra-se alicerçada por conta da legitimidade, isto é, as pessoas obedecem às regras e normas não apenas porque temem a punição, mas sim porque estão convencidas de que elas são verdadeiras, no sentido de que há um consenso em torno da necessidade de respeitar e obedecer, mesmo que não se obedeça. É neste contexto que Paixão afirma que “(...) aceitar uma lei ou regra como legítima é, então, acatá-la como verdadeira” (2012, p 128). Precisamos responder outra indagação: como e por quem são feitas as regras? Em resumo, elas são feitas por indivíduos que conseguem impor a sua vontade sobre os demais. A fim de entender melhor essa questão, Weber desenvolveu a tipologia da dominação. Segundo ele, quando indivíduos conseguem impor sua vontade, eles exercem dominação, entendida “(...) como a probabilidade de contar com a obediência daqueles que teoricamente devem obedecer” (Paixão, 2012, p. 128). Devemos distinguir poder e dominação: enquanto o primeiro consiste na capacidade de impor à vontade, a dominação, por sua vez, refere-se à probabilidade de encontrar obediência. Quadro 2 – Tipologia da dominação Fonte: Paixão (2012, p.130) 7 O quadro 2 acima apresenta um breve resumo acerca dos três tipos básicos de dominação: i-) a dominação carismática; ii-) a dominação tradicional; e iii-) a dominação racional-legal. Gostaríamos de chamar a atenção para a dominação racional-legal, momento em que o exercício da autoridade precisa dispor de uma estrutura composta por um quadro administrativo de funcionários e profissionais treinados que conheçam as normas e regras para “operarem” os meios que lhes permitam exercer o seu poder. É precisamente neste momento que surge a burocracia, veementemente destacada na sociologia de Weber, como a forma moderna de extrair a obediência das pessoas. No que diz respeito as faces da burocracia, se por um lado ela poderia oportunizar tratamento equitativo a todos, uma vez que não estaria sujeita aos favores pessoais (personalismo), de outro lado, a burocracia despersonaliza as esferas da vida minando, com isso, a criatividade, a inventividade e as forças transformadoras do homem. TEMA 4 – “A ÉTICA PROTESTANTE E O ESPÍRITO DO CAPITALISMO”, DE MAX WEBER Dentre as obras mais conhecidas de Weber, “A ética protestante e o espírito do capitalismo”, publicada em 1905, o autor analisa a relação existente entre aspectos da religião protestante com o comportamento humano, procurando, com isso, compreender as particularidades do capitalismo do Ocidente. Weber é brilhante ao estabelecer uma relação entre uma ética, uma conduta dada pela religião, e uma conduta econômica dos indivíduos dada pelo sistema capitalista. Conforme defende Paixão, Weber “(...) demonstra que existe uma ‘afinidade eletiva’ entre a ética protestante e a atividade capitalista moderna, ou o que chama de espírito do capitalismo” (2012, p. 133). Por “espírito do capitalismo”, Weber designa a conduta dos protestantes em não considerar o lucro um pecado e, para tanto, a partir de um cálculo racional e planejado entre meios e fins, o trabalho é entendido como resultado e expressão de uma virtude (Aron, 2003). O trabalho reveste-se de grande 8 importância no contexto da ética puritana, no sentido de que a vocação do trabalhador protestante implica necessariamente determinada conduta profissional que se identifica com a conduta econômica do capitalismo. A famosa filósofa brasileira, Marilena Chaui, captou muito essa passagem ao afirmar que “(...) essa vocação se expressa no trabalho, que não é mais um castigo de Deus lançado sobre a humanidade ao expulsar Adão e Eva do paraíso, mas que se torna uma virtude e um chamamento divino” (1999, p. 7). Em linhas gerais, Weber sinaliza a ênfase dada de uma ética e uma conduta do homem puritano dedicada à riqueza e à obtenção desta no dia a dia do homem religioso. Num primeiro momento, o princípio da ética puritana traz aversão à riqueza associada às consequências que ela pode trazer, tais como a preguiça, a luxúria, ao ócio, à vida desregrada. No entanto, uma vez respeitada os princípios e valores cristãos – a ética protestante – o lucro e a usura seriam considerados a expressão de uma virtude, razão pela qual Weber demonstra uma pregação quase apaixonada pelo trabalho. Conforme defende Paixão: “o ato de trabalhar constitui um estado de graça do homem na terra, a maneira de glorificar a Deus. E deixar de glorificar a Deus – ou seja, não trabalhar – para se dedicar a outras atividades é fugir de sua vocação religiosa” (2012, p. 134). Importante mencionarmos que a ética protestante não consiste apenas e tão somente na obtenção do lucro, mas sim na adequação entre meios e fins na aquisição dele. Igualmente importante é a separação entre a casa e o local de trabalho (que denota o surgimento da fábrica e da indústria), que, por sua vez, permite a racionalização e o disciplinamento do trabalho, favorecendo a consolidação do capitalismo. SÍNTESE O conjunto da obra de Max Weber nos permite entender que o autor não estava preocupado em encontrar “leis gerais” para explicar a sociedade, tal como propunham Durkheim e Marx, mas sim no indivíduo, uma vez que é a partir deste que se dá a análise da ordem social e das instituições. A sociologia weberiana é chamada de sociologia compreensiva por pretender compreender a ação social em seu curso e seus efeitos. O conceito de ação social é 9 elemento fundamental em sua teoria social, pois é por meio dela que o autor desenvolve suas tipologias, como a da ação social e a da dominação. Em análise à sociedade moderna, Weber evidencia o crescente processo de racionalização e burocratização da vida, momento em que as concepções religiosas, mágicas e tradicionais gradativamente vão sendo substituídas pela crença no saber científico e no progresso da ciência. O autor apresenta dois aspectos sobre o processo de racionalização da vida em sociedade, se por um lado torna o mundo mais desenvolvido e organizado, por outro, a racionalização da vida em sociedade acaba ocasionando a perda de sentido e a perda da liberdade, uma vez que transforma o homem em um mero “cumpridor de regras” (Paixão, 2012). FINALIZANDO Ao longo do texto vimos os marcos fundamentais da sociologia compreensiva de Max Weber, um dos sociólogos mais importantes em todo o mundo. Na primeira seção vimos o conceito de ação social, cujo cerne da sociologia weberiana consiste em procurar desvendar o sentido e o significado da ação social. Na seção seguinte vimos a tipologia da ação social, caracterizada em quatro tipos, que chamou de tipo ideal. Na terceira seção foram apresentados os conceitos de burocracia, poder e a tipologia da dominação. E, por fim, na última seção verificamos os argumentos centrais da obra “A ética protestante e o espírito do capitalismo”, dando destaque para a conduta dos protestantes a partir de um cálculo racional e planejado entre meios e fins, e para o trabalho, entendido como resultado e expressão de virtude cristã. 10 REFERÊNCIAS ARON, R. As etapas do pensamento sociológico. São Paulo: Martins Fonttes, 2003. (Coleção Tópicos)CHAUI, M. Introdução. In: LAFARGUE, P. O direito à preguiça. São Paulo: Hucitec; Ed. Da Unesp, 1999. PAIXÃO, Alessandro E. Sociologia Geral. Curitiba: Editora Intersaberes, 2012. SELL, C. E. Sociologia clássica: Durkheim, Marx e Weber. 3. Ed. Itajaí: Ed. Univali, 2002.
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