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A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)

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A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)
Marcelo Renó Arbex
Descrição
A constituição das políticas públicas, a função e as características dos serviços de saúde mental no Brasil.
Propósito
O tratamento da pessoa com sofrimento psíquico grave, em liberdade e integrada na sociedade, é complexo
e desafiador, pois envolve diversos atores e áreas de atuação que precisam atuar de forma complementar e
seguir os valores antimanicomiais. O conhecimento de todos os desafios envolvidos e das possibilidades
existentes é fundamental para a prática ética e eficiente dos profissionais inseridos no contexto de saúde
mental.
Objetivos
Módulo 1
Reforma psiquiátrica no Brasil
Identificar os principais valores da reforma psiquiátrica no Brasil.
Módulo 2
Fundamentos do acompanhamento do paciente
Aplicar os fundamentos do acompanhamento do paciente em exemplos concretos.
Módulo 3
Funcionamento dos dispositivos da saúde mental
pública
Reconhecer o funcionamento dos diferentes dispositivos da saúde mental pública.
Módulo 4
Serviços residenciais terapêuticos
Avaliar a importância e as peculiaridades dos serviços residenciais terapêuticos.

Introdução
Ao trabalhar com saúde mental pública, você vai se deparar com uma realidade muito diferente da que
possa estar imaginando ou da representada em alguns filmes. Atualmente, o tratamento das pessoas com
transtornos mentais graves é realizado em liberdade.
A partir da década de 1970, houve uma mudança importante no mundo todo em relação ao tratamento de
pessoas com transtorno mental grave. Tendo iniciado na Itália, um movimento, conhecido como psiquiatria
democrática, se expandiu para diversos outros países.
No Brasil, esse movimento se associou à redemocratização do país e ao movimento sanitarista, o que
culminou na criação do Sistema Único de Saúde (SUS). Aliada ao ideal de libertação das pessoas, que até
então ficavam fechadas em manicômios por décadas, essa mobilização ansiava por melhores condições de
trabalho para os profissionais da saúde pública.
1 - Reforma psiquiátrica no Brasil
Ao �nal deste módulo, você será capaz de identi�car os principais valores
da reforma psiquiátrica no Brasil.
Marcos normativos importantes na saúde
mental
Mudanças históricas no tratamento das pessoas com
transtorno mental
A sociedade vai se modificando com a passagem do tempo. Pense na sua vida há dez anos: a cultura e as
tecnologias eram muito diferentes.
Na década passada, todos nós, em vários aspectos, pensávamos de forma muito diferente se compararmos
com a maneira como entendemos as coisas hoje em dia. É só observar os programas de televisão, por
exemplo, ou os filmes nos cinemas.
Nossas concepções também mudam: basta refletir que se nota que a consciência ambiental das pessoas
se desenvolveu bastante nos últimos anos. Também se modificou a forma como nós tratamos os outros
seres humanos.
Exemplo
Antigamente, a aplicação de castigos físicos por pais e educadores era muito comum. Contudo, atualmente,
acreditamos não haver a necessidade desse tipo de disciplina – e até a achamos prejudicial na criação das
crianças e jovens.
Outro exemplo de mudança histórica é o destino das pessoas com grave sofrimento psíquico. Atualmente,
entendemos que alguém que sofre com um transtorno mental está doente, mas não foi sempre assim.
No século XVIII, comportamentos desatinados e estranhos das pessoas chamadas de “loucas” foram
finalmente entendidos como doença mental por uma área do conhecimento conhecida como alienismo.
Posteriormente, essa área se tornou a especialidade médica denominada psiquiatria.
Ilustração de hidroterapia praticada em pacientes alienados. Paris, 1868.
Tratamento moral
Em seu início, a psiquiatria utilizava um “tratamento moral” para tentar resolver as doenças mentais, sendo
ele aplicado com o paciente internado. Esse “tratamento” não utilizava medicamentos ou qualquer forma de
terapia como nós entendemos hoje em dia, e sim castigos e rigidez disciplinar. Acreditava-se que, com isso,
seria possível modificar o comportamento da pessoa com transtorno mental para que ela passasse a agir
de forma “normal” (FOUCAULT, 2012).
Saiba mais
O tratamento moral era realizado em manicômios, os quais, em seguida, seriam chamados de hospitais
psiquiátricos. Essas instituições eram fechadas e estavam afastadas dos grandes centros, pois se entendia
que os doentes mentais não poderiam conviver em sociedade.
Imagine alguém sofrendo com alterações mentais, tendo pensamentos que invadem sua cabeça, uma
convicção em ideias absurdas ou tão desanimada que mal consegue sair da cama ou cuidar de si mesma.
Agora suponha que essa pessoa seja colocada em internação em um quarto de hospital longe da cidade
onde ela vivia e que seu contato com todos fora da instituição seja cortado.
Por fim, pense em um cotidiano totalmente controlado dentro desse hospital. Você acredita que essa
pessoa melhoraria ou pioraria seu transtorno mental? Se respondeu “pioraria”, você acertou.
No entanto, os profissionais que acompanhavam as pessoas internadas nos manicômios acreditavam que
essa piora se devia à doença, e não ao ambiente. Posteriormente, foi dado um nome a essa condição:
institucionalização.
Reforma psiquiátrica
A situação começou a mudar quando alguns profissionais, no século XX, começaram a modificar o
tratamento, enfatizando as atividades em grupo dentro dos hospitais psiquiátricos (BIRMAN; COSTA, 2014).
Isso propiciou aos pacientes mais convivência e autonomia. Ambas foram consideradas terapêuticas e
levaram a uma melhora das condições de saúde mental deles.
Porém, somente na década de 1970, com Franco Basaglia, na Itália, começou o movimento pelo tratamento
em liberdade, fora dos muros dos manicômios. Com sua experiência piloto em um hospital da cidade de
Gorizia, Basaglia (2014) utilizou certos fundamentos em sua reorganização do funcionamento da
instituição. Vejamos os mais importantes:
Com isso, foi criada uma rotina: os pacientes poderiam ficar até mais tarde na cama, alimentar-se quando
quisessem e circular por espaços antes fechados. Isso também levou a uma recusa da hierarquia e da
opressão sofrida por eles lá dentro. Com isso, nascia a psiquiatria democrática.
Atenção
O ponto principal da psiquiatria democrática é o tratamento em liberdade, extramuros, fora do manicômio. A
partir dessa visão, entendeu-se que não adianta tornar o hospital psiquiátrico mais humanizado, mais
Utilização de medicações que permitiam eliminar as contenções físicas.
Reeducação teórica e humana dos pro�ssionais.
Restabelecimento de vínculos com o exterior.
Destruição de barreiras físicas.
Abertura das portas.
confortável ou com tratamentos mais eficazes em seu interior. A segregação não é terapêutica e viola os
direitos humanos da pessoa com transtorno mental.
A reforma psiquiátrica pode ser entendida como o movimento de tornar mais humanizado o tratamento das
pessoas com transtorno mental, reinserindo-as na sociedade e acabando com o tratamento fechado em
manicômios. Desse modo, o tratamento da pessoa com tal transtorno mudou muito desde o surgimento da
especialidade da Medicina que entendia a loucura como uma doença mental.
Dois séculos depois, percebeu-se que o tratamento realizado com isolamento e exclusão em manicômios
era prejudicial. Teve início, com isso, um movimento de reforma psiquiátrica.
O início da reforma psiquiátrica no Brasil
O Brasil, como diversos países do mundo, possui uma história marcada por tratamentos desumanos em
relação ao tratamento das pessoas com transtornos mentais. A longa permanência de internados em
condições insalubres levou a dezenas de milhares de mortos por décadas a fio até que houvesse um levante
contra o que já foi chamado de “holocausto brasileiro”.
Agora vamos entender como o movimento de mudança dessa triste realidade começou no país. O maior
consenso em relação ao marco inicial da reforma psiquiátrica foi o processo de redemocratização do país,
no final da década de1970, que incentivou outros movimentos sociais.
Um fator que é considerado o estopim para a reforma foi a deflagração de uma
greve pelos trabalhadores da saúde mental devido às condições precárias de
trabalho (AMARANTE, 2016).
A pauta inicial de reinvindicações girou em torno da regularização da situação trabalhista, aumento salarial,
redução do número excessivo de consultas por turno de trabalho, críticas à cronificação do manicômio e ao
uso do eletrochoque, por melhores condições de assistência à população e pela humanização dos serviços.
O movimento seguiu por meio da presença em Congressos de Saúde Mental em âmbito nacional e na
incorporação de seus militantes no serviço público (AMARANTE, 2016).
Saiba mais
Chamada de “eletrochoque”, a eletroconvulsoterapia é uma forma de tratamento utilizada até hoje em casos
de depressão ou psicose em pacientes que não melhoram com o uso de medicações e quando isso
representa um risco para eles. No entanto, ela é um tratamento muito criticado por pessoas da luta
antimanicomial, pois, além de extremamente invasivo, causa efeitos colaterais significativos, como perda de
memória recente. A eletroconvulsoterapia foi utilizada durante muito tempo de maneira errada, funcionando
como forma de castigo nos manicômios.
Outro fator importante no contexto em que se situa o surgimento da luta antimanicomial foi a batalha pela
garantia de uma assistência de saúde pública e de qualidade. Denominada reforma sanitária, tal luta levou
ao surgimento do SUS.
Cartão Nacional de Saúde - SUS (Sistema Único de Saúde).
No meio dessas reivindicações por melhores condições de trabalho na saúde mental e da criação de uma
saúde pública para todos, surgia ainda a luta contra todos os tipos de maus-tratos sofridos pelos pacientes
nos manicômios. Ela foi estimulada por denúncias das terríveis condições sofridas por essas pessoas.
Lei nº 10.216 – Lei da Reforma Psiquiátrica
Em 1989, é apresentado o projeto de lei que viria a ser conhecido como a Lei da Reforma Psiquiátrica. Quais
eram os itens mais importantes a serem garantidos por essa lei?
Vamos enumerá-los a seguir:

Diminuir os leitos em hospitais psiquiátricos.

Investir em dispositivos que tratassem fora dos manicômios.

Impedir a internação feita de forma arbitrária.
A lei foi homologada somente no ano de 2001 como Lei nº 10.216/2001 (BRASIL, 2004a). Porém, antes
disso, já havia portarias ministeriais que regulamentavam os serviços, por exemplo, os centros de atenção
psicossocial.
Um dos aspectos mais significativos da Lei nº 10.216 é sua garantia dos direitos da “pessoa portadora de
transtorno mental”. Destacaremos adiante alguns dos direitos mais importantes garantidos por essa lei
federal para as pessoas acometidas de transtorno mental:
Os direitos e a proteção dessas pessoas são assegurados sem qualquer forma
de discriminação.
Direito de ser tratado com humanidade e respeito, e de acordo com suas
necessidades, pelo que o sistema de saúde tenha melhor a oferecer.
Direito de ser tratado visando unicamente ao benefício de sua saúde, tendo
como objetivo alcançar sua melhora por meio da reinserção do paciente na
família, no trabalho e na comunidade.
Direito a esclarecimento médico relacionado a assuntos pertinentes à
internação involuntária.
Percebe-se que a lei busca garantir direitos até então negados às pessoas que sofrem de transtornos
mentais. Também é possível notar uma preocupação com a transparência do atendimento: todo o
tratamento, afinal, tem de ser esclarecido ao paciente.
Atenção
Ao trabalhar com o público que sofre com transtornos mentais, é preciso conhecer os fundamentos do que
se concebe atualmente como o tratamento mais indicado. A ideia na qual se baseia essa lei é a utilização
de locais comunitários e descentralizados de centros de saúde, permitindo, assim, uma maior integração ao
Território.
Território
O termo “território” aqui faz referência à territorialização do SUS. Esse fato permite a organização dos serviços
oferecidos segundo as necessidades do território, pois entende-se que são os serviços de saúde que devem se
adequar às necessidades da população.
Você pode estar pensando agora: essa lei prevê o fim dos hospitais psiquiátricos? A resposta é não. No
entanto, a Portaria GM nº 52, de 2004, prevê a diminuição progressiva dos leitos psiquiátricos.
Direito de ser informado ao máximo em relação à sua doença e a seu
tratamento.
Direito de que seu tratamento se dê por meios minimamente invasivos tanto
em ambiente terapêutico quanto em serviços comunitários.
As pesquisas cientí�cas para �ns diagnósticos ou terapêuticos não poderão
ser realizadas sem o consentimento expresso do paciente ou de seu
representante legal.
Com essa redução, os recursos que mantinham esses leitos seriam redirecionados para os dispositivos de
atenção psicossocial extra-hospitalares, como os centros de atenção psicossocial, os quais, aliás,
estudaremos posteriormente (BRASIL, 2004a).
Dessa forma, a Lei nº 10.216 garante a interrupção da violação de direitos ocasionada pela forma como a
psiquiatria vinha intervindo na vida das pessoas com transtorno mental ao longo de dois séculos. Mais do
que o tratamento em liberdade, ela pretende ratificar, na verdade, a cidadania a todos que possam ser
vítimas do poder médico no âmbito da saúde mental.
A legislação deve servir de base para uma nova forma de se pensar o acompanhamento com o paciente
com transtorno mental.
Portaria nº 148 e o serviço hospitalar de referência para
atenção a pessoas com sofrimento mental
Outra legislação que vale a pena mencionar aqui é a Portaria nº 148, de 2012, que regulamenta os leitos de
internação. Esses leitos são chamados de serviço hospitalar de referência para atenção a pessoas com
sofrimento mental e necessidades decorrentes do uso de crack e outras drogas.
Sua função principal é preservar a vida e garantir a continuidade do cuidado pelos outros serviços da rede
de atenção psicossocial (BRASIL, 2012). Ou seja, esse serviço deverá ser utilizado em casos de risco para o
paciente ou outras pessoas no seu entorno até que a situação seja estabilizada e se torne possível
continuar o acompanhamento pelos outros dispositivos.
Uma diretriz a ser destacada dos serviços hospitalares é a sua integração à RAPS, pois eles precisam
funcionar em articulação e corresponsabilidade com os outros serviços, não operando como uma
instituição separada ou deslocada.
Comentário
Os serviços que compõem a RAPS não são somente os dispositivos específicos de saúde mental, e sim
todos os serviços de saúde que devem acompanhar as pessoas com transtorno mental, como as unidades
básicas de saúde e os hospitais.
É claro que os serviços hospitalares de internação funcionam 24 horas por dia e 7 dias por semana. A
portaria também estabelece que as internações devem ser de curta duração. É importante salientar que
certas demandas clínicas podem exigir um atendimento em unidades hospitalares mais complexas.
Falaremos adiante da internação, recurso que ainda deve ser usado em situações mais graves. Contudo, já
cabe salientar que ele é utilizado de forma muito diferente das internações ocorridas antes da reforma
psiquiátrica. A principal diferença é que, hoje em dia, elas são de curta permanência, enquanto antes se
internava o paciente por anos – e até mesmo por décadas.
Do Holocausto brasileiro às políticas
antimanicomiais
Vamos refletir a seguir sobre a triste história do holocausto brasileiro, o qual, em grande parte, motivou as
transformações alcançadas pelas políticas antimanicomiais e os serviços oferecidos pela RAPS na
atualidade.

Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Existem diferenças marcantes no tratamento das pessoas com transtornos mentais antes e depois da
reforma psiquiátrica. Com a luta antimanicomial, houve uma ruptura com o que se entendia como
tratamento dos pacientes psiquiátricos. Uma mudança principal ocorridaapós essa reforma foi o
surgimento de
Parabéns! A alternativa D está correta.
O que a reforma psiquiátrica trouxe de original foi a ideia de que o paciente pode ser tratado em
liberdade, não segregado em manicômios, ou seja, reinserido na comunidade.
A medicamentos mais eficazes.
B tratamento mais humanizado.
C exames mais avançados para o diagnóstico.
D reinserção social.
E maior comunicação dentro dos hospitais psiquiátricos.
Questão 2
Uma das legislações mais importantes da reforma psiquiátrica no Brasil é a Lei nº 10.216. Ela surgiu
com o intuito de garantir uma mudança na forma com que as pessoas com transtornos mentais vinham
sendo tratadas nos últimos dois séculos. Podemos afirmar que o objetivo dessa legislação é
Parabéns! A alternativa D está correta.
A Lei nº 10.216 trouxe como novidade o tratamento humanizado e a exigência de transparência ao
acompanhar a pessoa com transtorno mental. As internações continuam existindo, mas não devem
mais ser arbitrárias ou prolongadas.
A acabar com os leitos em hospitais psiquiátricos até uma data determinada.
B estipular que as internações devem ser debatidas com o paciente.
C criar residências nas quais os internos dos manicômios pudessem viver após a alta.
D garantir tratamento humanizado ao paciente e informações sobre a sua doença.
E permitir o uso de ferramentas tecnológicas mais avançadas de diagnóstico.

2 - Fundamentos do acompanhamento do
paciente
Ao �nal deste módulo, você será capaz de aplicar os fundamentos do
acompanhamento do paciente em exemplos concretos.
Projeto terapêutico singular e a atuação
interdisciplinar
Projeto terapêutico singular
Quando acompanhamos uma pessoa que faz tratamento na saúde mental, temos de traçar um plano de
trabalho com ela. Esse planejamento é denominado projeto terapêutico singular (PTS).
Primeiramente, precisamos entender que uma pessoa que sofre com transtornos mentais não precisa
somente de medicamentos ou de psicoterapia. Ela pode ter diversos problemas diferentes na sua vida que
requeiram algum cuidado, como necessidade de renda para sobreviver. Além disso, essa pessoa pode sofrer
de outra doença e não conseguir acessar os serviços especializados para se tratar.
Mas você pode estar pensando: tais problemas precisam ser atendidos apenas
pelo serviço social ou também pelas unidades básicas de saúde e pelas policlínicas
da cidade?
A questão é que, como já vimos, a pessoa com transtorno mental historicamente era uma excluída da
sociedade, sofrendo um enorme preconceito em diferentes ambientes. Vai ser necessário, portanto, todo
um trabalho de inclusão social para mudar esse cenário.
O PTS é um instrumento que busca atender a todas essas demandas do usuário na rede de serviços
públicos. Ele se constitui de uma série de ações que, construída em conjunto com o usuário, tem como
finalidade a melhoria de sua qualidade de vida nas diferentes esferas da vida: física, mental e social.
Atenção
A pessoa que busca e necessita do centro de atenção psicossocial não é vista somente como um paciente,
ficando passivo frente à oferta de cuidados, mas também como um usuário protagonista de sua vida e
cidadão portador de direitos e voz política. Por isso, é importante que o PTS seja elaborado com o usuário
do serviço e busque satisfazer às demandas de todas as esferas que compõem sua vida.
Ações que compõem o PTS
O PTS não deve se concentrar somente na saúde do usuário do serviço, mas também buscar reintegrá-lo na
sociedade e evitar que seus direitos sejam violados.
Mas, afinal, que ações podem compor um PTS? Eis alguns exemplos (BRASIL, 2004b):
Inclusão em atividades no CAPS, como convivência e oficinas (de esporte, de música,
expressiva ou de geração de renda).
Cada PTS será elaborado com um conjunto variado de ações. Todo projeto terapêutico é único, pois cada
caso apresenta suas especificidades, isto é, cada pessoa é singular e precisa ser atendida sem nenhuma
ideia preconcebida.
Atendimento psicoterápico individual ou em grupo.
Realização de visitas domiciliares (VD) para avaliação do entorno e do contexto social no qual
o paciente está inserido.
Atendimento aos familiares do paciente em reuniões de família ou em consultas específicas.
Auxílio para obtenção de benefícios governamentais, como benefício de prestação
continuada, Minha Casa, Minha Vida ou auxílio-doença.
Inserção do usuário em atividades no próprio bairro ou nas proximidades para vinculá-lo à sua
comunidade e ao suporte que ela pode oferecer.
Ações em conjunto com a atenção primária ou a rede de assistência.
Após a elaboração do projeto terapêutico, o que acontece? Devemos acompanhar se as ações propostas
tiveram o efeito esperado. Os resultados são observados em uma avaliação periódica do PTS, com o
objetivo de avaliar se ele é adequado ao paciente e se está sendo eficiente para atender e resolver as
demandas às quais se propôs.
Atuação interdisciplinar
Como já apontamos, a pessoa em tratamento na saúde mental possui diversas necessidades além da
estabilização de seu quadro de transtorno mental. Ela pode estar passando por problemas sociais, como
dificuldades financeiras e de moradia, ou ter problemas motores que prejudicam sua autonomia, por
exemplo.
Por isso, entendemos que o ser humano precisa ser visto como alguém constituído
de diferentes dimensões (biológica, psicológica, social e histórica). Seu tratamento,
assim, tem de levar em conta todas essas esferas.
Para dar conta do ser humano integralmente, o trabalho nos CAPS é realizado por uma equipe
multidisciplinar na qual nenhuma especialidade possui qualquer tipo de protagonismo ou superioridade
hierárquica. Antes da reforma psiquiátrica, salientamos, o poder médico era exercido de forma absoluta.
Ainda temos a tendência de buscar prioritariamente um médico ou um psicólogo quando precisamos cuidar
de um transtorno mental. Porém, como enfatizamos, os problemas das pessoas nos serviços de saúde
mental pertencem a campos muito variados.
Exemplo
Questões sociais, ocupacionais e jurídicas.
Especialidades
É claro que, se uma pessoa tem um problema específico de certa área, ela precisa de um profissional
especializado no assunto. Por isso, não podemos desprezar o conhecimento do especialista.
Mas existem diversas tarefas que todo profissional no CAPS pode fazer, como elaborar um PTS. Já outras
coisas, como receitar uma medicação, somente o médico pode realizar.
Atenção
O campo da saúde mental é muito complexo e plural, demandando um intercâmbio intenso de diversos
saberes para a realização de um trabalho efetivo e de qualidade.
Também temos questões que não podem ser resolvidas somente com a equipe do CAPS, por mais variada
que ela seja. Por vezes, é preciso que o paciente acesse serviços da assistência social ou da Justiça – e
assim por diante.
Por conta disso, o acompanhamento não pode ser feito de forma centralizada no CAPS. Deve haver a
atuação conjunta de toda a rede de serviços de saúde, de assistência social, de educação e de cultura, entre
outros, que possam auxiliar nos cuidados e na reinserção social da pessoa com transtorno mental.
Dessa forma, o atendimento à pessoa com transtorno mental deve ser realizado de forma integral, isto é,
não fragmentada, levando-se em conta que as diversas dimensões da pessoa se influenciam mutuamente e
não podem ser tratadas de forma separada.
Papel da família no acompanhamento
Na época das internações de longa permanência, a pessoa com transtorno mental era retirada da sociedade
e separada de sua família. Atualmente, nosso modelo de tratamento prevê que o acompanhamento em um
CAPS tem de ocorrer em parceria com as famílias (BAGNOLA; SOUZA, 2007).
Mas deve-se ter cuidado ao abordar as famílias dos usuários dos serviços de saúde mental. É preciso evitar
uma vertente que as culpe pelos problemas dos pacientes, assim como não devemos responsabilizá-las por
todo o cuidado com eles.
Muitas vezes, o surgimento e a presença de uma pessoa com transtornomental na família causam uma
reestruturação no funcionamento familiar. O paciente pode requerer maior vigilância ou – sendo até então
alguém produtivo – estar incapacitado para o trabalho. Desse modo, é importante entender como a família
vê esse membro, que sofre com todas as implicações de um transtorno mental, o qual, em muitos casos, é
incapacitante.
Qual é, então, o objetivo do trabalho com os familiares?
Pode-se dizer que ele visa a auxiliar na relação e na gerência do paciente no cotidiano, gerando uma melhor
cooperação, diminuindo os fatores que podem levar a um conflito intrafamiliar e incentivando a participação
de todos no tratamento.
Atenção
É importante destacar que o acompanhamento da pessoa com transtorno mental deve ser feito com a
família, pois entende-se que os familiares podem tanto auxiliar como prejudicar o estado do paciente. O
atendimento técnico a eles pode ter como consequência uma mudança positiva na atitude da família como
um todo em relação ao usuário do serviço.
Ao receber a família de um paciente no serviço, é necessário algum tipo de atividade que a envolva no
tratamento para intermediar suas relações no núcleo familiar ou para obter outro tipo de informação sobre
ele. Ainda é essencial disponibilizar um espaço de escuta para os familiares dentro do serviço para que
também exista um momento para o sofrimento deles, do cuidador e dos envolvidos, destacam Bagnola e
Souza (2007).
Muitas vezes é a família que primeiramente busca o tratamento, pois a pessoa com transtorno mental pode
não ter consciência de seu estado alterado. Com isso, o próprio paciente pode não frequentar o CAPS.
Nesses casos, o trabalho realizado em conjunto com o familiar pode auxiliar ou ser o único vínculo entre a
pessoa com transtorno mental e o serviço de saúde mental.
Agora você pode estar pensando que é muito pesado para um só profissional acompanhar o paciente e toda
sua família. Por conta disso, é recomendado que o acompanhamento dos familiares do usuário seja feito
por um funcionário diferente daquele que acompanha o próprio usuário. Além de dividir a carga do caso, o
vínculo e a confiança podem ser comprometidos quando o acompanhamento é feito a ambos, pontuam
Bagnola e Souza (2007).
Desde o início, temos visto que a ideia mais atual do acompanhamento de pessoas com transtorno mental é
o tratamento feito em liberdade. Isso significa que ele preferencialmente vai estar em casa ao longo desse
processo.
Então, mesmo que seu quadro de transtorno mental fique agudo, ele terá de ser – de modo preferencial,
insistimos – tratado da seguinte forma: o paciente vai ao serviço, mas tem de voltar para sua residência
todos os dias. Com isso, a família precisa ser esclarecida sobre seu papel de apoio e orientada a como
cuidar do paciente, além de ter suas angústias acolhidas e elaboradas em um trabalho profissional eficiente.
Muitas vezes, os transtornos mentais mais graves são crônicos. Isso quer dizer que
não existe cura, mas somente o tratamento. O acompanhamento feito de forma
eficiente permite que esse quadro fique estabilizado.
Porém, no momento que chamamos de “crise”, a situação se desestabiliza. Resultado: pode haver
alterações capazes de representar um risco para a própria pessoa ou para os outros.
Desinstitucionalização
Um dos conceitos que perpassa todo o pensamento da reforma psiquiátrica é o de desinstitucionalização,
que pode ser entendido como “desconstrução” da ideia tradicional de que os transtornos mentais devem ser
tratados somente com a internação nos hospitais psiquiátricos (AMORIM; DIMENSTEIN, 2009, p. 196).
Essa tendência “manicomial” não está presente somente nos hospitais psiquiátricos, mas também em toda
a nossa cultura. É muito comum a tendência de patologizar o diferente, excluir o disforme e segregar o que
vai contra as normas e os valores com os quais estamos acostumados.
Por isso, a luta antimanicomial é muito mais do que simplesmente retirar os internos dos hospitais
psiquiátricos: é necessária uma mudança cultural mais ampla. Uma parte importante da
desinstitucionalização é a consciência de que os transtornos mentais podem não ser curados no mesmo
sentido que as outras doenças.
É por isso que utilizamos o termo “transtorno” no lugar de “doença. Não há uma causa definida para os
transtornos mentais; então, tampouco existe uma medicação ou outra ferramenta que resolva esse
problema de forma definitiva.
Na saúde mental, trabalhamos com o conceito de redução de danos. Trata-se de um termo mais conhecido
no trabalho com as pessoas que sofrem prejuízos com o uso de álcool e de outras drogas.
Ao atender um dependente químico, não se utiliza a abstinência (ou a interrupção do uso de substâncias
psicoativas) como critério de inclusão e continuidade no tratamento, cujo objetivo, em qualquer caso de
transtorno mental, é diminuir os prejuízos que ele causa à vida da pessoa, e não a eliminação completa das
alterações. Como não existe um local que resolva definitivamente o transtorno mental, a pessoa terá de ser
acompanhada dentro do território onde vive e estabelece seus vínculos.
Território
Na saúde mental, trabalhamos com o conceito de redução de danos. Trata-se de um termo mais conhecido no
trabalho com as pessoas que sofrem prejuízos com o uso de álcool e de outras drogas.
Atenção
Um ponto importante do trabalho do território é a construção de uma rede de serviços e de pessoas que
possam dar o suporte às necessidades da pessoa com transtorno mental.
Ao trabalhar em rede, entende-se que não existe um centro ou um elemento de destaque em importância.
Todos as pessoas envolvidas no cuidado são essenciais. Da mesma forma, nenhum serviço é mais
importante que os outros.
Os centros de atenção psicossocial, que vamos conhecer no próximo módulo, podem ser a referência no
atendimento à pessoa com transtorno mental, mas, entre outros, eles dependem de outros serviços de
saúde, das instituições não governamentais (ONGs), da família, dos órgãos da educação e da assistência
social.
A responsabilidade pela reinserção social da pessoa em sofrimento psíquico grave não deve ficar restrita a
certos espaços. Ela precisa ser difundida por toda a cultura, o que permite uma mudança na tendência de
impedir a livre circulação e o acesso a certos espaços por quem sofre com transtornos mentais.
Implicações do conceito de redução de
danos e os centros de atenção psicossocial
Vamos refletir a seguir sobre a ideia de cura no caso dos transtornos mentais, além de explicar o conceito
de redução de danos e a filosofia de atendimentos nos CAPS. Confira!

Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
O projeto terapêutico singular (PTS) deve ser elaborado com o paciente e ser constituído de diversas
atividades, as quais, por sua vez,.
Parabéns! A alternativa C está correta.
O PTS deve ser pensando com o paciente para atender às suas diferentes necessidades – e não só no
campo da saúde. As atividades que compõem o PTS podem ser realizadas nos mais diferentes locais,
sejam eles serviços públicos ou outros espaços da comunidade.
Questão 2
É muito comum que a família chegue ao serviço de saúde mental antes do paciente. Muitas vezes, ela
comparece ao local queixando-se do comportamento dele e demandando alguma solução imediata.
Qual é o papel da equipe no acolhimento desses familiares nesse momento?
A visam estabilizar seu quadro de alteração psíquica.
B devem ser realizadas dentro dos centros de atenção psicossocial.
C tem como objetivo atender às diferentes demandas que ele apresenta.
D buscam cuidar da sua saúde.
E são pensadas pela equipe do CAPS e comunicadas ao paciente.
Parabéns! A alternativa C está correta.
Em um primeiro momento, a queixa da família deve ser acolhida. É preciso esclarecer que o suporte
deles é muito importante para que o acompanhamento tenha mais qualidade.
A Informar que logo será ministrada uma medicação que fará o paciente melhorar essescomportamentos alterados.
B
Colocar essa família em uma atividade para que essas queixas trazidas sejam
resolvidas.
C
Encaminhar os familiares aos serviços da assistência social nos quais suas demandas
serão mais bem atendidas.
D
Escutar o sofrimento dessa família e explicar que o auxílio deles é essencial para o
tratamento ser mais eficiente.
E
Explicar que é preciso atender o paciente antes de tirar qualquer conclusão, pois a visão
deles pode ser tendenciosa.

3 - Funcionamento dos dispositivos da
saúde mental pública
Ao �nal deste módulo, você será capaz de reconhecer o funcionamento
dos diferentes dispositivos da saúde mental pública.
Centro de Atenção Psicossocial (CAPS),
atenção psicossocial e atenção básica
Características dos centros de atenção psicossocial
Como já pontuamos, as pessoas que sofrem com transtornos mentais possuem necessidades de
tratamento que vão além de questões da saúde propriamente dita. Muitas possuem dificuldades de convívio
ou de inserção social.
Por isso, os centros de atenção psicossocial não devem ser apenas dispositivos de saúde. Eles, na verdade,
precisam ser espaços aonde os usuários do serviço também vão para conviver com outros e exercer sua
cidadania.
Para isso, esses serviços devem ser acolhedores e não reprimir a singularidade dos usuário, para que as
pessoas com transtornos mentais possam apresentar supostos comportamentos bizarros e discursos
delirantes sem o medo de sofrer represálias ou preconceitos.
Tipos de CAPS
Os CAPS podem variar em três níveis de acordo com o número de habitantes:
Cidades menores
(entre 15.000 e 70.000 habitantes)
Os CAPS I atendem a toda a demanda de saúde mental desses municípios.
Cidades medianas
(entre 700.000 e 150.000 habitantes)
Atuam os CAPS II, que têm mais dois subtipos: CAPSi (para atendimento infantojuvenil) e
CAPS-ad (para atender a população que sofre com o uso de álcool ou outras drogas).
Cidades grandes
Com mais de 150.000 habitantes
C t CAPS III CAPS d III E di iti d f i 24 h di
A divisão em subtipos de CAPS busca melhorar o atendimento a demandas específicas de cada público,
além de especializar o serviço. Imagine que você consiga uma vaga no serviço público e que sua lotação
seja em um serviço de tratamento para dependentes químicos. Ou pode ser que você vá para um local de
atendimento infantil.
São duas situações bastante diferentes, não é verdade? Dependendo da situação, você vai precisar se
especializar em um assunto ou no outro. Por conta disso, o CAPS infantojuvenil (CAPSi), por exemplo, se
dedica aos casos mais comuns que acometem as pessoas menores de idade, trabalhando mais de perto
com os conselhos tutelares.
Os profissionais que atuam no CAPSi vão precisar conhecer a fundo o Estatuto da Criança e do Adolescente
e as principais psicopatologias da infância. Por outro lado, quem trabalha em um CAPSad tem de conhecer
amplamente o universo da dependência química e das substâncias psicoativas. Todos os serviços da saúde
mental, porém, seguem os fundamentos da reforma psiquiátrica, como vimos na primeira parte de nosso
estudo.
Estrutura física do CAPS
Como deve ser uma estrutura física de um CAPS?
Você pode estar pensando que isso não é tão importante. O CAPS, afinal, pode funcionar em qualquer tipo
de casa – contanto que tenha salas de atendimento, como um consultório.
Contam com os CAPS III e CAPS ad III. Esses dispositivos podem funcionar 24 horas por dia,
ter vagas para acolhimento noturno e atender a todas as faixas etárias.
Porém, conforme já verificamos, o acompanhamento do paciente em um CAPS vai além do cuidado com
sua saúde. A pessoa com transtorno mental tem de ser atendida levando-se em conta todas as esferas de
sua vida. O ser humano, afinal, deve ser visto como um ser biopsicossocial e histórico.
Com isso, o ambiente do CAPS (BRASIL, 2004b) precisa ter:

Espaços de convívio social.

Áreas para atividades dos mais diversos tipos
(chamadas de “o�cinas”).

Refeitório para os pacientes que precisam passar o dia
lá.

Salas para atendimentos e sanitários.
Sobre o CAPS é importante reforçar:
O Centro de atenção psicossocial não deve tornar o paciente dependente do
serviço. As atividades internas precisam resolver as demandas do usuário para que
ele consiga conviver na sociedade de forma mais satisfatória.
Apesar da estrutura abrangente, a equipe não deverá ficar restrita ao CAPS se quiser atender a todas as
demandas do usuário. É preciso, em suma, atuar com toda a RAPS, os serviços de assistência social, a rede
de educação e quaisquer outras instituições que possam auxiliar na melhoria da saúde mental e da
qualidade de vida da pessoa atendida.
Em resumo, cada CAPS varia de acordo com o tamanho da cidade. Nas medianas ou grandes, existe a
subdivisão em três tipos de CAPS (de transtornos mentais de adultos, infantojuvenil e de transtornos
relacionados ao uso de álcool e outras drogas). Cada tipo precisa cuidar de seus pacientes em todas as
dimensões relacionadas à sua existência sem deixar de estimular a autonomia deles.
Atenção psicossocial
Uma pessoa procura um CAPS quando está sofrendo por causa de um transtorno mental próprio ou de
outra pessoa. Esse sofrimento não precisa ser somente da esfera mental: ele também pode ser social ou
um problema físico.
A causa desse sofrimento muitas vezes é consequência da exclusão social que a pessoa com transtorno
mental sofre em nossa sociedade. Mesmo alguém sem esse tipo de transtorno pode ter um sofrimento
psíquico devido a uma situação de preconceito.
A ausência de recursos materiais, o preconceito, os conflitos familiares e a falta de acesso à educação e à
cultura já fazem sofrer uma significativa parcela da população. Todos esses itens deixam mais grave ainda
a situação de quem tem um transtorno mental.
Por isso, a atenção psicossocial deve levar em conta todo o entorno e o contexto no qual o paciente está
inserido. O PTS tem de contemplar todas essas esferas da vida da pessoa em questão. No entanto, isso não
quer dizer que a equipe do CAPS vai resolver os problemas da vida das pessoas por elas.
Atenção
O objetivo do acompanhamento do paciente é estimular a autonomia e o protagonismo do usuário para
evitar ações que estimulem a dependência, a submissão e a incapacidade da pessoa em ser responsável
por si mesma.
Outro ponto que já mencionamos é que o trabalho da atenção psicossocial não deve ficar restrito a espaço
do CAPS. É preciso lutar pelo fim das fronteiras que impedem o livre fluxo das pessoas com transtornos
mentais na sociedade.
Não pode existir um local específico para que as pessoas frequentem. Tampouco deve haver impedimentos
para uma pessoa com transtorno mental visitar certos locais por conta do preconceito, por exemplo. Nosso
trabalho na saúde mental também inclui, portanto, modificar a consciência das pessoas em relação a esse
problema.
Além da clínica
É importante entender que o trabalho clínico muitas vezes pode se assemelhar a um controle social em vez
da busca pela autonomia e independência das pessoas. Afirmar que o outro precisa de ajuda, afinal, pode
configurar uma forma de interferir, aliciar, tutelar, dominar etc.
Por isso, a atenção psicossocial precisa encontrar o delicado equilíbrio entre dar suporte sem retirar a
possibilidade de escolha do sujeito.
É preciso observar atentamente que existe o perigo de tornar o espaço interno dos
CAPS excludente e manicomial.
Isso pode acontecer na oferta de atividades que nada mais são do que meros “passatempos”. Além desse
fato, a tendência em serviços do tipo é a de ser um ambulatório com atividades diversas, embora lhes falte a
produção de cultura e de práticas inovadoras, assim como um trabalho político.
Atenção!
É necessário ir além da produção de saúde ao se acompanhar o paciente na saúde mental. Tendo isso em
vista, a reinserção social e a atividade como cidadão devem ser estimuladas e auxiliadas.
Deve-se abandonar, então, o modelo de consultas individuaise agendadas, dando prioridade a ações e
atividades coletivas no CAPS em que outros atores sociais estejam envolvidos; caso contrário, tal espaço
acaba servindo como excludente. O usuário pode tê-lo como local único de convívio e de entretenimento;
afinal, muitas vezes, mesmo em casa, ele fica segregado de sua família.
Então, ao trabalhar em um CAPS, devemos entender que nosso papel não é torná-lo o único local seguro e
agradável para o paciente, e sim possibilitar sua convivência em um território cada vez mais amplo. Com
isso, o nosso trabalho tem de transpor as paredes do CAPS.
Matriciamento
Imagine que você seja um profissional lotado em um centro de atenção psicossocial. Você precisa
acompanhar dezenas de pacientes em um território amplo da cidade.
Muitos deles não vão ao CAPS e, por isso, demandam visitas domiciliares. Contudo, o carro do serviço é
utilizado para diversas funções ao longo dos dias. Além disso, você possui uma agenda de atividades
dentro do serviço.
A solução para esse tipo de situação é realizar o acompanhamento dos pacientes da saúde mental com a
atenção básica (ou a primária) presente nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). O nome dado a esse
trabalho em conjunto feito pelos CAPS e pelas UBS é matriciamento.
Saiba mais
A atenção em saúde é dividida em três níveis: primário, secundário e terciário. O nível primário, também
denominado atenção básica, é composto pelas UBS nas quais se organiza a estratégia da saúde da família.
A atenção primária realiza o acompanhamento básico de todos os moradores de dada região. Trata-se de
um acompanhamento de saúde descentralizado que visa à prevenção e ao acompanhamento de doenças
muito comuns que precisam ser monitoradas constantemente, como hipertensão e diabetes.
Esse trabalho é realizado pelos agentes comunitários de saúde (ACS), que são profissionais de nível médio.
Na abordagem de pacientes com transtornos mentais, o suporte especializado da saúde mental –
representado pelos profissionais dos CAPS – pode ser necessário.
A equipe de saúde mental dos CAPS, chamada, nesse âmbito, de “equipe
matriciadora”, deve dar apoio matricial à equipe de saúde da família (ESF). A ESF é
constituída pelos ACS, os quais, nesse contexto, são denominados “equipes de
referência”.
O acompanhamento do paciente pelos ACS é imprescindível para levar em conta sua saúde integral e o
acompanhamento mais próximo no próprio território onde ele reside. Os agentes de saúde devem ser
capacitados e instrumentalizados pela equipe de saúde mental para lidar com demandas mais simples e
avaliações iniciais dos pacientes para que haja uma resolução de demanda inicial nos postos de saúde.
A ideia desse acompanhamento conjunto é que se elabore um projeto terapêutico singular com o paciente e
com os agentes comunitários. O acompanhamento dele pode ser feito pela atenção primária: a equipe de
saúde mental pode funcionar somente como uma retaguarda e acompanhar de perto os casos mais graves.
O acompanhamento matricial tem como consequência a mudança na forma de funcionamento e
organização dos serviços de saúde. O matriciamento tem como objetivo evitar uma comunicação “precária
e irregular” feita por intermédio de encaminhamentos sem muita efetividade (CHIAVERINI, 2011). Ao se
trabalhar em conjunto e responsabilizar cada setor com seus papéis específicos, é possível haver uma
atenção à saúde eficiente.
A ideia do matriciamento não é ter um especialista em saúde mental nas unidades básicas de saúde
atendendo ou tomando decisões por conta própria. Pelo contrário: seu papel é dar um suporte especializado
para a equipe encarregada do acompanhamento na atenção básica.
Dessa forma, esse especialista permite:
Um suporte técnico-pedagógico, um vínculo interpessoal e o apoio institucional
no processo de construção coletiva de projetos terapêuticos
(CHIAVERINI, 2011, p. 14 e 15).
Internação
Você sabe que diversos tratamentos de saúde demandam internação hospitalar por alguns dias ou até
semanas. Na saúde mental, isso não é diferente. No entanto, precisamos estar atentos ao fato de que ela
não pode ser prolongada como era na época manicomial.
Por isso, a Lei nº 10.216 define que a internação só será utilizada quando o tratamento extra-hospitalar não
for suficiente para evitar riscos para o próprio paciente ou para terceiros. Então, antes de se indicar uma
internação, deve-se buscar o suporte familiar e comunitário, além de estimular a autonomia do paciente no
próprio tratamento.
Na internação, a assistência integral à pessoa ainda precisa ser garantida, incluindo serviços médicos,
psicológicos e do serviço social, além de outros. Essa preocupação se baseia na tendência anteriormente
em voga, já que antigamente a internação em manicômio privava o paciente de qualquer tipo de assistência,
configurando-se simplesmente como uma reclusão e isolamento da sociedade.
A internação pode ser de três tipos (BRASIL, 2004a):

Voluntária
O paciente aceita a decisão de ser internado ou se encaminha voluntariamente.

Involuntária
O paciente recusa a indicação. Nesse caso, ela deve ser notificada ao Ministério Público em até 72 horas.

Compulsória
O paciente não pode decidir, ela é determinada pela Justiça.
A alta da internação não depende apenas da estabilização do quadro do transtorno mental, pois ela também
tem de ser planejada para que os fatores que possam ter agravado o quadro sejam revertidos. O trabalho de
atenção psicossocial, portanto, não se interrompe com o paciente internado. Na verdade, ele apenas se
intensifica.
Deve haver também uma abordagem com a família do paciente internado para que sejam dadas
“orientações sobre o diagnóstico, o programa de tratamento, a alta hospitalar e a continuidade do
tratamento em outros pontos de atenção da rede de atenção psicossocial” (BRASIL, 2012).
A internação e sua importância no
funcionamento da RAPS
Vamos refletir a seguir sobre os diversos tipos de internação, assim como sua importância tanto para os
usuários dos serviços oferecidos pela RAPS quanto para o funcionamento desses serviços nos CAPS.

Confira!
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Os principais serviços da saúde mental pública são os centros de atenção psicossocial. Esses centros
contam com uma equipe multidisciplinar para o acompanhamento dos usuários do serviço. Os
profissionais que a compõem devem
A
trabalhar com toda a rede de saúde e de assistência conforme as necessidades do
usuário.
B
acompanhar o usuário, centralizando seus atendimentos no serviço para vinculá-lo ao
CAPS.
C
atuar de forma isolada, cada um utilizando as técnicas de sua especialidade
profissional.
D
atender segundo uma agenda de marcações de atendimento, deixando a critério do
paciente o contato com o serviço.
Parabéns! A alternativa A está correta.
O acompanhamento do paciente no CAPS não deve ser feito de forma centralizada ou excludente. O
CAPS é um serviço que opera de portas abertas, sempre acolhendo o paciente e trabalhando com toda
a rede conforme a necessidade do paciente no momento do atendimento.
Questão 2
Conhecido como matriciamento, o acompanhamento de pessoas com transtornos mentais realizado
por agentes comunitários de saúde, com o suporte dado pelas equipes de saúde mental dos CAPS, é
essencial no cuidado desses pacientes, pois:
Parabéns! A alternativa E está correta.
E
acompanhar o paciente quando ele estiver estabilizado, pois o indivíduo em crise deverá
ser atendido nos hospitais.
A permite dividir a responsabilidade pelo paciente.
B
possibilita que o paciente possa ser visto de forma mais frequente.Segunda resposta da
pergunta.
C auxilia a equipe do CAPS a dar conta de todos os pacientes.
D dispensa os profissionais do CAPS de atender aos casos mais urgentes.
E realiza o tratamento de forma mais próxima do local onde o paciente reside.
O tratamento ao paciente com transtorno mental deve ser realizado em território. O matriciamento éa
ferramenta que permite o acompanhamento descentralizado do público que precisa de cuidados da
saúde mental.
4 - Serviços residenciais terapêuticos
Ao �nal deste módulo, você será capaz de avaliar a importância e as
peculiaridades dos serviços residenciais terapêuticos.
Serviço residencial terapêutico (SRT)
Criação dos SRT
Imagine como deve ser difícil mudar hábitos constituídos ao longo de anos ou de décadas. As pessoas que
passaram grande parte de suas vidas enclausuradas dentro de uma instituição adquirem prejuízos devido a

anos e décadas de uma vida controlada, regulada e vigiada. Isso é chamado de institucionalização. E não
basta tirar as pessoas do aprisionamento dos manicômios para desfazer esses efeitos deletérios.
Um estudo muito profundo sobre as alterações causadas pela internação em hospitais psiquiátricos e
outros locais foi feito por Erving Goffman. Esse sociólogo norte-americano (1996) descreveu as
características e os efeitos da estadia em uma instituição total.
Características das instituições totais
Uma instituição é total quando ela faz com que todas as atividades da vida de alguém sejam realizadas
dentro dela, causando uma ruptura com todos os outros espaços de convívio da sociedade. Normalmente,
nós realizamos atividades em locais diversificados: moramos em um lugar, trabalhamos em outro,
estudamos em um terceiro ambiente – e assim por diante.
Entretanto, algumas situações nos obrigam a ficar fechados em um local. Nesses casos, ele precisa
acumular diversas funções.
Exemplo
Internação para tratamento intensivo de saúde ou prestação de serviço militar. Conventos e prisões também
apresentam características semelhantes.
As instituições totais possuem, entre outras, as seguintes características:
Os horários são rigorosamente estabelecidos.
Viver em um ambiente com essas características leva a uma perda da liberdade que tem consequências
graves. Perde-se a concepção de si mesmo e de suas crenças, o que é denominado por Goffman (1996)
como “mortificação do eu” e “desculturamento”, respectivamente.
Por isso, deve ser feita uma reabilitação psicossocial assistida do paciente hospitalizado por longa data ou
em “situação de grave dependência institucional”. Muitas vezes, essas pessoas já não podiam contar com a
família para recebê-los após a saída dos manicômios; para esses casos, foi necessária a criação de
serviços residenciais terapêuticos, que são moradias mantidas pelo Estado para que elas possam viver
reinseridas na sociedade.
Desde os anos 1990, já existiam algumas iniciativas denominadas “pensões protegidas” ou “lares
abrigados”, uma espécie de protótipo dos serviços residenciais terapêuticos (FURTADO, 2006). Nessa
época, já ficou demonstrada, na prática, a possibilidade da existência de moradias dentro das cidades para
os internados por longa data. Esses pacientes praticamente “moravam” dentro dos manicômios e não
conseguiam ser reinseridos em suas famílias ou não tinham as condições de manter por si só uma
residência.
Legislação
A legislação que criaria oficialmente os serviços residenciais terapêuticos só foi publicada no ano 2000 pela
Portaria GM nº 106. Ela estipula que as residências terapêuticas devem ser casas, preferencialmente
inseridas na comunidade.
Há constantemente vigilância e risco de punição.
O contato é restrito com o mundo externo.
Os internos não possuem informações nem poder sobre as decisões que lhes
afetam.
Essa ação teria como objetivo o acolhimento de:
Egressos de internações psiquiátricas de longa permanência, que não
possuam suporte social e laços familiares.
(BRASIL, 2004a, p. 100)
Essa ruptura com a família podia acontecer porque os hospitais não mantiveram a documentação de seus
pacientes internados há muitos anos e até mesmo décadas, o que tornava impossível esse reencontro. Mas,
mesmo quando eles eram localizados, poderia haver diversas dificuldades para o recebimento desses
internos (FURTADO, 2006, p. 786).
A transferência de pacientes de uma internação em um hospital psiquiátrico para uma vaga em SRT prevê a
redução ou o descredenciamento do leito previamente ocupado. Tal medida pretendia não eliminar a verba
que mantinha os leitos psiquiátricos de longa duração e transferi-lo para o serviço que viria a substituí-lo.
Atenção
A função das residências terapêuticas não é somente a de ser um local para a pessoa residir após a saída
do manicômio. Seu objetivo é a reabilitação psicossocial, graças a uma reintegração social, de “programas
de alfabetização, de reinserção no trabalho, de mobilização de recursos comunitários, de autonomia para as
atividades domésticas e pessoais e de estímulo à formação de associações de usuários, familiares e
voluntários” (BRASIL, 2004a, p. 101).
Os serviços residenciais terapêuticos devem ser de natureza pública, mesmo que eles sejam não
governamentais. Além disso, precisam ter um projeto terapêutico construído tendo em vista os objetivos
acima descritos. Com isso, sua atividade se centraliza nas necessidades de seus usuários (BRASIL, 2004a).
Para ajudar a reabilitação de quem saía das internações longas em manicômios, foi estipulado ainda um
auxílio financeiro. Em 2003, é criada a Lei nº 10.708, que prevê um auxílio reabilitação de caráter
indenizatório para pessoas com transtornos mentais egressos de internações de longa permanência (por
pelo menos dois anos ininterruptos). Esse auxílio é parte integrante de um programa intitulado "De volta
para casa”.
Características e importância dos SRTs
As residências terapêuticas devem se situar fora de hospitais, evitando, assim, a tendência à
manicomialização de pessoas com transtornos mentais. Sua estrutura física precisa ser compatível com o
máximo de 8 usuários, com 3 por dormitório. Ele ainda tem de ser mobiliado como qualquer casa
confortável e contar com a garantia de três refeições diárias.
A legislação não prevê que uma equipe atue nos SRTs. Cada um deve estar referenciado a um serviço de
saúde, que será o responsável por realizar o acompanhamento especializado em saúde mental dos
moradores.
Já a Portaria nº 3.090, de 2011, diferencia os SRTs em tipo I e tipo II (BRASIL, 2011):
Comporta até oito moradores que não possuem outra característica além de pessoas com
transtorno mental em processo de desinstitucionalização.
Tem como público pessoas com “acentuado nível de dependência, especialmente em função do seu
comprometimento físico, que necessitam de cuidados permanentes específicos. Pode comportar
até 10 moradores e conta com uma equipe: 5 cuidadores e um técnico de enfermagem”.
É importante frisar que os SRTs devem funcionar como uma moradia, sendo o tratamento dos moradores
realizados no serviço de saúde mental de referência do local (BRASIL, 2004a). Então, apesar de ter “serviço”
em seu nome, o local precisa possuir características de um lar, “onde se estabelecem vínculos de afeto e
cooperação, compartilham-se vivências prazerosas e dolorosas, enfim, lugar de produção de subjetividade e
de redes de sociabilidade” (ARGILES et al., 2013, p. 2051).
SRT Tipo I 
SRT Tipo II 
A inserção de ex-internos na sociedade, além de cumprir um direito humano violado com sua exclusão em
um manicômio, também serve para descontruir a ideia da loucura como perigosa ou como algo que exige
uma reclusão para evitar danos. Como já pontuamos, o tratamento da pessoa em sofrimento psíquico
extramuros deve ser feito a partir do território e por intermédio de uma rede na qual se entrelaçam serviços,
instituições e pessoas.
Essas relações precisam ser percorridas de forma livre pelos indivíduos. A partir delas, formam-se os
“campos de sociabilidade” que vão estruturar o cotidiano dessas pessoas e construir suas concepções de
mundo (ARGILES et al., 2013, p. 2051).
Isso tudo será construído graças ao trabalho feito pelos SRTs, operando como um elemento essencial no
qual o ex-interno pode vivenciar de forma saudável a socialização da qual ele havia sido segregado. Por
contada convivência com os outros moradores e os acordos que vão se estabelecer entre eles, pode-se
trabalhar questões de sociabilidade necessárias para a reabilitação psicossocial.
Muitos daqueles que amargaram anos e até mesmo décadas de internação em hospitais psiquiátricos
podem sofrer com a desabilidade social, o que requer todo um trabalho para que o convívio social possa ser
satisfatório. Isso nos leva a compreender que resgatar a cidadania dos ex-internos dos manicômios não é
somente “a restituição de seus direitos formais, mas, principalmente, [...] de reconstruir seus direitos ao
afeto, às relações sociais, à moradia digna e à produtividade” (ARGILES et al., 2013, p. 2056).
Interromper a violação de direitos humanos que o encerramento em um hospital psiquiátrico impõe,
portanto, é só o primeiro passo de um longo processo de restituição e reparação aos usuários dos serviços
de saúde mental.
Atenção
As residências terapêuticas representam, além de um local possível de se viver, a possibilidade de alcançar
uma qualidade de vida retirada dessas pessoas por décadas de preconceito, reclusão e exclusão.
Os SRTs, com isso, evitarão que o paciente simplesmente fique dependente de outra instituição (FURTADO,
2006). Ou seja, de nada adiantaria fechar os hospitais psiquiátricos para que, em seguida, os pacientes
ficassem à mercê de outros serviços que não suprem suas necessidades.
A pessoa pode não estar mais isolada em uma instituição total e, mesmo assim, não ficar plenamente
inserida na sociedade. Ela, afinal, só realiza trocas sociais nos serviços públicos de saúde – e não em uma
sociedade mais ampla.
Desa�os enfrentados pelos SRTs
Os serviços públicos no Brasil enfrentam muitos desafios relacionados à manutenção e aos investimentos.
Algumas dificuldades já foram verificadas logo nos primeiros anos de implantação oficial dos SRTs. Vamos
mencionar agora aquelas que dizem respeito à reforma psiquiátrica e à luta antimanicomial de forma mais
ampla.
Muitos proprietários resistem em alugar sua casa para nela se estabelecer um SRT
devido ao preconceito contra as pessoas com transtorno mental (FURTADO, 2006).
É claro que o preconceito sofrido pelas pessoas com transtorno mental é um problema mais generalizado.
De qualquer maneira, o trabalho na saúde mental também deve ter como objetivo uma mudança cultural,
que pode ser produzida por meio de campanhas de conscientização sobre a desinstitucionalização de
pessoas com transtorno mental. Também é preciso desconstruir os mitos associados a quem sofre disso,
como o suposto perigo que ele representa.
Outro desafio enfrentado na implantação dos SRTs é a falta de capacitação dos profissionais que devem
acompanhar de perto os moradores, que são os mais prejudicados pelos anos de internação. Esses
funcionários precisam ser treinados no “novo referencial ético e clínico” da saúde mental (FURTADO, 2006,
p. 792); caso contrário, ocorre uma tendência de excesso de tutela ou de aplicação de disciplina rígida no
trato com esses usuários. Deve-se levar em conta que muitos desses moradores podem estar bastante
comprometidos pela institucionalização, representando, por conta disso, comportamentos muito
divergentes da norma social.
Comentário
Outro problema notado é a dificuldade da gestão de um serviço peculiar como o das residências
terapêuticas. Além de ser visto como um serviço com 24 horas de duração, o que acarreta um maior custo e
uma manutenção mais complexa, ele, ao mesmo tempo, não é um serviço de saúde, já que tem de ser
gerido como uma residência. Resultado: pode ocorrer uma resistência quanto à sua implantação em
algumas localidades, diz Furtado (2006).
Porém, apesar dos desafios, a implantação de um SRT é muito importante, algo que você pôde constatar ao
longo deste texto. Trata-se, em suma, de um serviço que representa ao máximo a desinstitucionalização e a
luta antimanicomial.
Cada residência terapêutica em funcionamento significa menos pacientes enclausurados em hospitais
psiquiátricos, vivenciando um isolamento que não faz sentido.
A vida em liberdade não é somente um tratamento mais eficaz: ela também
representa uma restituição do direito de todo ser humano.
Importância e desa�os do SRT
Acompanhe uma reflexão sobre a importância, as características e os desafios enfrentados com os SRT.
Vamos lá!

Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Os serviços residenciais terapêuticos cumprem um papel fundamental na reforma psiquiátrica e na
desinstitucionalização dos ex-internos dos manicômios. Eles, afinal, permitem que
A
os usuários dos serviços mentais recebam um cuidado especializado, indo além das
atividades presentes nos CAPS.
Parabéns! A alternativa B está correta.
A função da residência terapêutica é servir de moradia para a pessoa com transtorno mental que, no
momento de sua alta, não tenha condições de retornar para sua família ou de morar sozinho.
Questão 2
Existe uma ambiguidade na nomenclatura dos serviços residenciais terapêuticos (SRTs): eles, afinal,
seriam serviços ou residências? Quanto a essa questão, podemos afirmar que o aspecto principal de
um SRT é seu caráter
B
após a saída dos hospitais psiquiátricos, os pacientes com laços familiares rompidos
possam ter um local onde morar.
C
o paciente possa passar um tempo em outra moradia no caso de conflito com a família
com a qual ele reside.
D
os ex-internos possam ter uma convivência agradável entre si, podendo trocar
experiências sobre o processo de saída dos hospitais psiquiátricos
E o Estado faça uma reparação aos ex-internos, investindo em uma moradia de qualidade.
A
de serviço, pois são estruturas mantidas pelos governos municipais que prestam um
serviço à população.
B
terapêutico, porque são espaços de tratamento do transtorno mental apresentado por
seus residentes.
Parabéns! A alternativa C está correta.
Os Surtos devem ser prioritariamente residências, pois representam a moradia das pessoas que
perderam os vínculos com suas famílias e a cultura devido a um tratamento que violava seus direitos
fundamentais. Mesmo sendo serviços mantidos pelo Estado e tendo um caráter terapêutico, eles
representam uma reparação da sociedade a essas pessoas, sendo um lar no qual elas podem viver em
liberdade.
Considerações �nais
A história da reforma psiquiátrica é relativamente recente no Brasil e no mundo. Por isso, ela é um campo de
pesquisa que ainda pode revelar muito; além disso, seu conhecimento gerado é muito instigante. A atuação
profissional nesse campo exige, portanto, um rompimento com o senso comum em relação aos transtornos
mentais.
O trabalho na saúde mental pública precisa ir além dos elementos próprios do campo da saúde. Ele, afinal,
envolve cultura, assistência social e educação, entre outros itens. Com isso em mente, pontuamos que o
tratamento feito em liberdade coloca desafios que vão além do campo da Medicina e da saúde tradicional.
C
de residência, já que servem aos ex-internos dos manicômios como suas moradias e
não podem perder essa especificidade.
D
de serviço, uma vez que contam com uma equipe especializada em saúde mental que
deve realizar o trabalho de ressocialização.
E
terapêutico, pois devem estar voltadas a todo tempo para a ideia de melhorar a saúde
mental de seus moradores.

Vimos que, em toda a RAPS, existem os mais diversos tipos de serviços de saúde: de atenção básica, de
urgência e emergência, hospitais e CAPS, além de outros. O importante é todos eles seguirem os preceitos
da reforma psiquiátrica: atenção humanizada, combate a preconceitos e respeito aos direitos humanos.
Além dos profissionais de saúde, a família também é muito importante no acompanhamento da pessoa
com transtorno mental e deve ser responsabilizada. Na verdade, toda sociedade, frisamos, é responsável
pelo cuidado dessas pessoas, que, por tantos anos, foram excluídas e submetidas a um tratamento
desumano. Apontamos ainda que é papel dos servidorespúblicos da saúde mental levar esse
conhecimento a todos.
Por fim, destacamos que a reparação de todo mal feito ao longo da história manicomial encontra seu ápice
na manutenção pelo Estado de residências para aqueles que não conseguem retornar para suas famílias e
na garantia de uma renda para que eles possam se manter. Só assim podemos tornar a sociedade mais
justa e livre para todos.
Podcast
Para encerrar, vamos refletir sobre os preceitos da reforma psiquiátrica e de sua materialização na rede de
atenção psicossocial no Brasil, assim como sobre os diversos desafios encontrados nos serviços
oferecidos.

Referências
AMARANTE, P. Loucos pela vida. 2. ed. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2016. 
AMORIM, A. K. M. A; DIMENSTEIN, M. Desinstitucionalização em saúde mental e práticas de cuidado no
contexto do serviço residencial terapêutico. Ciência & saúde coletiva. v. 14. n. 1. jan./fev. 2009. p. 195-204. 
ARGILES, C. T. L. et al. Redes de sociabilidade: construções a partir do serviço residencial terapêutico.
Ciência & saúde coletiva. v. 18. n. 7. jul. 2013. p. 2049-2068. 
BAGNOLA, E. P. P.; SOUZA, S. F. M. O sujeito na família. In: AMARAL, H; MERHY, E. E. A reforma psiquiátrica
no cotidiano II. São Paulo: Aderaldo & Rothschild Editores Ltda., 2007. 
BASAGLIA, F. et al. Considerações sobre uma experiência comunitária. In: AMARANTE, P. (Org.). Psiquiatria
social e reforma psiquiátrica.Rio de Janeiro: Fiocruz, 2014. p. 11-40. 
BIRMAN, J.; COSTA, J. F. Organização de instituições para uma psiquiatria comunitária. In: AMARANTE, P.
(Org.). Psiquiatria social e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2014. p. 41-72. 
BRASIL. Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). Ministério da Saúde: Brasília, 2017.
BRASIL. Legislação em saúde mental 1990-2004. 5. ed. ampliada. Ministério da Saúde: Brasília, 2004a. 
BRASIL. Portaria nº 148, de 31 de janeiro de 2012. Definir como normas de funcionamento e habilitação do
serviço hospitalar de referência para atenção às pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com
necessidades de saúde decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas, do componente hospitalar da
rede de atenção psicossocial, e institui incentivos financeiros de investimento e de custeio. Brasília, 2012. 
BRASIL. Portaria nº 3.090, de 23 de dezembro de 2011. Ministério da Saúde: Brasília, 2011. Altera a Portaria
nº 106/GM/MS, de 11 de fevereiro de 2000, e dispõe, no âmbito da Rede de Atenção Psicossocial, sobre o
repasse de recursos de incentivo de custeio e custeio mensal para implantação e/ou implementação e
funcionamento dos serviços residenciais terapêuticos (SRT). Brasília, 2011. 
BRASIL. Saúde mental no SUS: os centros de atençãopsicossocial. Ministério da Saúde: Brasília, 2004b. 
CHIAVERINI, D. H. (Org.). Guia prática de matriciamento em saúde mental. Brasília: Centro de Estudo e
Pesquisa em Saúde Coletiva, 2011. 
FOUCAULT, M. História da loucura na idade clássica. São Paulo: Perspectiva, 2012.
FURTADO, J.P. Avaliação da situação atual dos serviços residenciais terapêuticos no SUS. Ciência & saúde
coletiva. v. 11. n. 3. jul./set., 2006. p. 785-795. 
GOFFMAN, E. Manicômios, prisões e conventos. Ed. São Paulo: Perspectiva, 1996.
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Assista a estes vídeos no YouTube:
a) Documentário Holocausto brasileiro
Baseado no livro de mesmo nome da jornalista Daniela Arbex, este documentário mostra a triste história
dos horrores que aconteceram no Hospital Colônia de Barbacena, por meio de relatos de ex-funcionários,
egressos e outras pessoas. 
ÍCONES NEGROS. Holocausto brasileiro - 2016 - documentário completo. Publicado em: 27 abr. 2018. 
b) Programa da série Profissão repórter
Este programa apresenta a vida de quem sofre transtornos mentais, assim como o drama das famílias e as
pessoas envolvidas. 
PROFISSÃO REPÓRTER. Doenças psiquiátricas (transtornos mentais). Publicado em: 26 nov. 2018. 
c) FilmeBicho de sete cabeças  
Rodrigo Santoro representa um jovem que está internado em um manicômio porque a família não aceita o
comportamento dele e seu uso de drogas. Esta obra retrata como experiências traumáticas nesse contexto. 
FILOSOFIA EM PÍLULAS. Bicho de sete cabeças. Publicado em: 24 nov. 2012. 
d) FilmeDá pra fazer
Este filme italiano conta a história ficcional de uma cooperativa de trabalho na época da reforma
psiquiátrica italiana. 
FÁBIO PAZ. Si può fare. Dá pra fazer - filme completo legendado. Publicado em: 27 mar. 2014.

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