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Fundamentação legal do ensino de língua portuguesa como segunda língua para surdos Para iniciarmos esta webaula, é preciso saber que o Decreto nº 5.626/05 determina que é direito do aluno surdo, desde a educação infantil, ter acesso ao ensino da língua portuguesa como segunda língua (PL2), e, para tanto, as instituições federais de ensino devem promover capacitações e/ou pro�ssionais capacitados para exercerem tal função. O reconhecimento da condição dos surdos como aprendizes de PL2 também é previsto na meta 4 do Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pela Lei nº 13.005/2014, na qual se estabelece como estratégia: garantir a oferta de educação bilíngue, em Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS como primeira língua e na modalidade escrita da Língua Portuguesa como segunda língua, aos (às) alunos (as) surdos e com de�ciência auditiva de 0 (zero) a 17 (dezessete) anos, em escolas e classes bilíngues e em escolas inclusivas [...] — (BRASIL, 2014, grifo nosso). “ ”A modalidade escrita da língua portuguesa é visual e, portanto, acessível aos surdos, mas é preciso lembrar que os professores estão habituados a partirem dos conhecimentos do português oral para o ensino da escrita, e isso não será frutífero com os educandos surdos. Por essa razão, o ensino de língua portuguesa como segunda língua signi�ca, basicamente, partir da Libras como primeira língua (L1) para se chegar ao português, ou seja, a Libras substituirá o português oral nas relações que o professor estabelecer entre o discurso verbal e o escrito. A legislação prevê ainda que as instituições de ensino devem “adotar mecanismos de avaliação coerentes com aprendizado de segunda língua, na correção das provas escritas, valorizando o aspecto semântico e reconhecendo a singularidade linguística manifestada no aspecto formal da Língua Portuguesa” (BRASIL, 2005). O decreto ainda menciona que é possível desenvolver outras formas de avaliação para conhecimentos expressos em Libras, desde que registrados em vídeos ou outros meios eletrônicos e tecnológicos. Para que haja um ensino e uma avaliação que considerem os aspectos semânticos de interferência da Libras sobre a escrita da língua portuguesa, bem como as singularidades sintáticas e morfológicas das línguas envolvidas, o professor precisará ter conhecimentos sobre a Libras e a língua portuguesa para desenvolver atividades epilinguísticas e metalinguísticas. Assim, além do curso de Letras com habilitação em Libras/Língua Portuguesa como segunda língua para surdos, o Decreto nº 5.626/05 também determinou que o ensino de PL2 para surdos fosse incluído como disciplina curricular nos cursos de formação de professores para a educação infantil, anos iniciais do ensino fundamental, médio e superior, bem como para as graduações em Letras com habilitação em Língua Portuguesa. Libras – Língua Brasileira de Sinais A língua portuguesa como segunda língua para surdos Você sabia que seu material didático é interativo e multimídia? Isso signi�ca que você pode interagir com o conteúdo de diversas formas, a qualquer hora e lugar. Na versão impressa, porém, alguns conteúdos interativos �cam desabilitados. Por essa razão, �que atento: sempre que possível, opte pela versão digital. Bons estudos! A- A A+ No entanto, soma-se à necessidade de um professor capacitado, também, a exigência de um espaço diferenciado para esse trabalho, a�nal, enquanto o professor trabalha com o ensino de português como primeira língua (baseando-se, sobretudo, nas relações da escrita com a língua oral), será quase impossível que ele consiga, concomitantemente, atender aos alunos surdos (estabelecendo relações entre a língua escrita e a língua de sinais). Em geral, em virtude de situações como essa, é comum que, em classes regulares, com a presença de intérpretes de Libras, opte-se por retirar os alunos surdos da sala regular em dois momentos: 1. Para o ensino de Libras como primeira língua e 2. Para o ensino de língua portuguesa como segunda língua. Para tais atividades, os alunos surdos são acompanhados por professores diferentes daquele da sala regular e sob abordagens de ensino distintas daquelas adotadas com os alunos ouvintes. A escrita de alunos surdos O aprendizado da língua escrita por alunos surdos se difere dos ouvintes, pois é in�uenciado pelos aspectos linguísticos da Libras, o que, segundo Quadros e Schmiedt (2006), está relacionado ao sistema de interlíngua existente nesse contexto, ou seja, níveis de so�sticação apresentados durante a aquisição linguística com características especí�cas do percurso que o sujeito trilha ao partir da primeira para a segunda língua. Segundo as autoras, esse processo também é enfrentado por outros aprendizes de segunda língua ou de língua estrangeira. Fonte: iStock. Quadros e Schmiedt (2006) destacam que a interlíngua não ocorre de forma desorganizada. Há hipóteses e regras que são comuns entre os aprendizes surdos de PL2, que ilustram esse processo de construção de um sistema linguístico que já não é mais a primeira língua do aluno, mas também ainda não é a segunda língua. Baseado nos estudos de Brochado (2003 apud QUADROS; SCHMIEDT, 2006), as autoras destacam três estágios de interlíngua identi�cados em crianças surdas. Primeiro estágio: é marcado, por exemplo, por frases bastante sintéticas e a sintaxe ainda é majoritariamente organizada na estrutura da Libras (tópico comentário e não sujeito verbo objeto). Há ausência ou inadequação do uso de preposições, artigos, conjunção (elementos ausentes na Libras) e predominância de verbos no in�nitivo com pouca ocorrência ou uso inadequado de verbos de ligação, como, por exemplo, ser e estar (verbos dispensados em enunciados da Libras). Assim, além de erros ortográ�cos, as frases são curtas com inadequações na �exão de verbos e no uso de preposições, artigos e conjunções, como pode ser visto neste exemplo: Exemplo do primeiro estágio Segundo estágio: conforme as autoras, está relacionado a um híbrido entre a primeira e a segunda língua, ora com maior in�uência de uma ora da outra. Nessa fase, o aluno já é capaz de fazer algumas �exões verbais e nominais, aplicando melhor os artigos aos seus contextos, mas ainda apresenta di�culdade com as conjunções e preposições. Os textos começam a ser mais bem elaborados, pois, apesar de o aluno ainda demonstrar di�culdades no uso de determinados elementos da língua portuguesa (ausentes na Libras), ele reconhece sua existência e se preocupa com seu uso, conforme o exemplo a seguir: Exemplo do segundo estágio Terceiro estágio: predomina a estrutura gramatical do português, e o sujeito elabora estruturas mais complexas com emprego mais acertado dos artigos, preposições, conjunções, �exões verbais e verbos de ligação. Exemplo do terceiro estágio Alguns equívocos são comuns aos ouvintes, como as trocas fonêmicas entre “s” e “z”, não são desa�os para os surdos, pois eles não se guiam pela oralidade na escrita. A omissão de letras que aparece em alguns erros ortográ�cos é de ordem visual, uma vez que eles precisam memorizar as palavras. Estratégias didáticas de ensino de língua portuguesa como segunda língua para surdos As di�culdades enfrentadas pelos alunos surdos, in�uenciadas pela Libras como primeira língua, são diferentes dos ouvintes e por essa razão demandam, além de professores capacitados para atendê-los, estratégias e materiais didáticos também diferenciados. Uma estratégia que tem sido indicada por vários autores no trabalho de língua portuguesa com alunos surdos embasa-se na contação de histórias, pois, em concordância com Quadros e Schmiedt (2006), a leitura precede a escrita. Logo, para o aprimoramento da escrita de alunos surdos, é preciso expô-los a um grande volume de leituras que sejam interessantes e signi�cativas. Para isso, é preciso considerar o conhecimento prévio que esse aluno possui na língua e que permitirá a ele compreender o que está sendo contado,pois o ato da leitura não é uma simples decodi�cação das palavras. Fonte: Shutterstock. Os surdos, por serem privados da língua portuguesa oral, não participam de todas as trocas interlocutivas que uma criança ouvinte é exposta, não acessam os meios de comunicação (rádio e televisão) com a mesma facilidade e, por isso, não dominam conceitos básicos que circulam na sociedade ouvinte. Para as autoras, a literatura deve ser explorada primeiramente em língua de sinais, despertando o interesse e explorando o enredo, a organização e funcionamento do gênero textual etc. Silva, Kumada e Nogueira (2012) propõem que, após a leitura de um texto, haja uma reescrita coletiva, tendo o professor como escriba e os alunos como autores do reconto. O texto pode ser impresso e solicitado aos alunos que o leiam circulando palavras conhecidas em azul e desconhecidas (ou que haja dúvida) em amarelo. Os autores também sugerem como estratégias o uso de placas com palavras que possam ser manipuladas e organizadas pelos alunos para formar frases e/ou enunciados. Tais placas podem ser coloridas, buscando explorar o gênero de alguns substantivos. Além da literatura e do gênero textual narrativo, outros textos autênticos podem ser explorados no ensino de PL2, tais como lista de compras, livros de receitas, cartões festivos (para amigos, de dia das mães etc.), convites (para uma festa de aniversário) etc. O que não é recomendado é o trabalho com textos empobrecidos para surdos, criados unicamente para o ensino de determinadas características da escrita. Por �m, importa destacar que todas as informações e preocupações com o ensino da PL2 devem estar claras no projeto político pedagógico (PPP) da escola, pois o compromisso com uma educação bilíngue para surdos deve ser dos professores e também dos gestores. Fonte: Shutterstock. Nesta webaula, o nosso objetivo foi entender os efeitos do ensino e aprendizagem da língua portuguesa como segunda língua para surdos. Estudamos a fundamentação legal do ensino de língua portuguesa como segunda língua para surdos, a escrita de alunos surdos, e, as estratégias didáticas de ensino de língua portuguesa como segunda língua para surdos.
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