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Apostila - História do cristianismo II (1)

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Julho/ 2019
Professor: Dr. Wander de Lara Proença
Coordenadoria de Ensino a Distância: Dr. Marcos Orison Nunes de Almeida 
Projeto Gráfico e Capa: Mauro Rota - Depto. Marcom
Todos os direitos em língua portuguesa reservados por:
Rua: Martinho Lutero, 277 - Gleba Palhano - Londrina - PR
86055-670 Tel.: (43) 3371.0200
3História do cristianismo | FTSA | 
SUMÁRIO
História do cristianismo I
Unidade I - Contexto, temas e personagens da reforma
Introdução...............................................................................................................04
1. Motivos e interpretações da reforma na igreja no século XVI.........................05
2. Quem foi Martinho Lutero...................................................................................17
3. Lugares, estratégias e repercussões do movimento reformador....................24
Unidade II - A reforma protestante e seus movimentos
Introdução...............................................................................................................33
1. Líderes e movimentos de Reforma....................................................................34
2. Grupos e contexto social da Reforma...............................................................42
3. O papel da leitura nos movimentos de reforma................................................50
4. João Calvino e a Reforma em Genebra.............................................................54
5. O legado luterano e a Contra-Reforma Católica................................................57
Unidade III - Expansão dos movimentos de reforma - Parte I
Introdução...............................................................................................................61
1. Moviemntos advindos com a Reforma: Pietistas, Moravianos e Puritanos...61
2. A reforma na Inglaterra e o contexto de surgimento do Metodismo..............68
3. John Wesley e o Metodismo..............................................................................72
4. Protestantismo no E.U.A e (re)avivamentos.....................................................78
Unidade IV - Expansão dos movimentos de reforma - Parte II
Introdução...............................................................................................................88
1. Origens do Pentecostalismo..............................................................................89
2. Primeiros contatos da América Portuguesa com o Protestantismo...............96
3. Signifi cados da Reforma Protestante 500 anos depois..................................103
Para assistir os vídeos, ouvir os podcasts e fazer os exercícios,
acesse o AVA (Ambiente Virtual de Aprendizagem)
Olá, seja bem-vindo(a) ao curso de História do Cristianismo II.
Sobre este aconteciemnto, veremos: Como ocorreu? Quem foram 
seus principais líderes? Que mudanças promoveu? Qual a sua 
repercussão e alcance social, cultural, político? Quais 
denominações protestantes surgiram? Quais países foram 
alcançados? Quais outros movimentos surgiram posteriormente como 
desdobramentos da Reforma?
Ocorrida inicialmente na Europa, expandiu-se logo depois para 
outros continentes, dentre os quais, a América. Protestantes ou 
evangélicos, são terminologias que historicamente passaram a designar 
uma grande parcela de cristãos identificados com estes acontecimentos 
do Mundo Moderno. 
Veremos que esse caminho histórico foi marcado pelo surgimento de 
inúmeros movimentos, denominações e tipologias doutrinárias. Exemplos 
disto são os movimentos avivalistas e reavivalistas dos séculos XVIII e 
XIX, com seu impacto e expansão missionária. Nestes acontecimentos, 
dos séculos XVI e XIX, estão as raízes do que são hoje as diversas 
denominações que confi guram o cenário evangélico-protestante, em 
termos de doutrina e prática. 
Este é, então, um período muito rico da história do cristianismo. E para um 
desenvolvimento mais dinâmico destas aulas, usaremos textos, vídeos e 
documentários.
Para isto, recomendamos que leia atentamente as aulas escritas, os textos 
de apoio, veja os vídeos e interaja com as atividades propostas. 
Evidentemente, muitos outros assuntos ou temas importantes poderiam ser 
aqui abordados, mas as aulas apresentadas no programa de curso foram 
cuidadosamente selecionadas, objetivando proporcionar uma compreensão 
panorâmica deste emblemático e extensivo período histórico.
Iniciemos essa jornada instigante, buscando compreender no passado as 
origens do nosso presente. Bom curso!
Prof. Wander de Lara Proença
4 | História do cristianismo II | FTSA
5História do cristianismo | FTSA | 
UNIDADE I - Contexto, temas e personagens da reforma 
protestante
O movimento de reforma ocorrido na igreja no século XVI representa, 
ao mesmo tempo, o início e o fi m de acontecimentos que marcam a 
história do Cristianismo. Representa o fi m, pela consolidação de anseios 
vivenciados por inúmeros cristãos ao longo do período medieval, que 
vendo a realidade de uma igreja marcada por interesses e disputas de 
poder obscuros ao reino de Deus, e pela prática de doutrinas estranhas às 
Escrituras bíblicas e à tradição apostólica. Representa também o início, 
ou (re)começo, de um novo tempo para a fé cristã, marcado pelo impacto 
da leitura e pregação da Bíblia no vernáculo, pelo surgimento de novos 
valores calcados na ética protestante, com repercussões na cultura, na 
economia e na política.
Nesta primeira unidade de estudos, é quase que natural as atenções 
estarem voltadas para um personagem, Martinho Lutero, por ser um 
representante emblemático destes acontecimentos. Costuma-se dizer 
que “Lutero foi a pessoa certa, no lugar certo, na hora certa”. Pessoa 
certa (por seu preparo intelectual, liderança, paixão pelas Escrituras), no 
lugar certo (porque na região onde se defl agrou a Reforma, a Germânia, 
havia intenso anseio de mudança pelos príncipes que ali governavam, 
por camponeses, e também por estar ali o berço da invenção da 
imprensa), na hora certa (por ser aquele momento da história marcado 
pelo Renascimento, pelo Humanismo, vetores de mudança e gestação 
do Mudo Moderno). Mas veremos que Lutero não está sozinho. Ele 
é continuador de líderes pré-reformadores; está acompanhado de 
estudantes, que o ajudam a escrever as 95 teses; tem o decisivo apoio 
de príncipes; é seguido e auxiliado por outros infl uentes líderes que 
espalharam a mensagem reformista em diferentes lugares.
| História do cristianismo II | FTSA6
1. Motivos e interpretações da Reforma na igreja no século
XVI
1.1. O contexto religioso e teológico
Para introduzir os conteúdos que virão pela frente, ao longo do curso, é 
importante inicialmente perguntar: por que foi necessária uma reforma 
na Igreja no século XVI?
Na disciplina anterior, de História do Cristianismo I, vimos que no período 
“medieval” ou Idade Média (entre os séculos V e XV) desenvolveu-se 
o catolicismo institucionalizado, com acentuada estrutura hierárquica,
sustentada na fi gura papal e no clericalismo de bispos e sacerdotes.
Após a conversão do imperador Constantino, os clérigos passam a ter
remuneração do Estado, constroem-se suntuosos templos, o poder
religioso passa a estar atrelado ao poder político etc. A igreja alia-se
ao Império Romano, contra o qual deixa de exercer função profética de
denúncia e reivindicação - O Estado passa agora a benefi ciá-la. A igreja
desempenha em tal sociedade, a partir de então, um papel semelhante ao
da velha religião estatal, ou seja, concebendo Cristo apenas como um rei
celestial que dá apoio ao imperador cristão que governava em seu nome.
Aprendemos também que nesse mesmo período foi marcante a vivência 
de um cristianismo mais popular, folclórico, profundamente arraigado 
em imaginários religiosos sincréticos, com fortes raízes fi ncadas no 
elemento da magia. Isso porque, especialmente, a partir do século IV 
da era cristã, quando o cristianismo se tornou religião livre e ofi cial do 
Império Romano, desenvolveu-se um intenso e crescente processo de 
aculturação entredoutrinas cristãs e antigas práticas religiosas que 
permeavam o universo de crenças do mundo greco-romano.
Alguns exemplos das doutrinas e práticas surgidas como sincretismo ou 
hibridismo formados naquele período são: Jesus deixa de ser o único 
mediador (também a mãe de Jesus e os apóstolos, especialmente 
7História do cristianismo | FTSA | 
passam a exercer tal função); surge a fi gura papal, como representante 
de Cristo na Terra; a Bíblia passa a ser lida somente em latim e pelos 
clérigos, fi cando, portanto, distante do povo; a justifi cação passa a se dar 
também por obras, daí as penitências, os autofl agelos, as indulgências 
como meios de redimir pecados; a doutrina do purgatório, mediante a 
qual era dada a oportunidade de salvação após a morte àqueles que não 
se preparam devidamente em vida; surgimento da Inquisição, que se 
constituía numa tribunal eclesiástico que dava à igreja o direito de julgar 
e punir àqueles que ousassem questionar as doutrinas canônicas ou a 
verdade que pertencia de forma exclusiva e absoluta à igreja medieval.
No chamado “período áureo” da Idade Média, verifi cam-se vários prejuízos 
à missão da igreja. A preocupação da comunidade cristã ofi cial 
neste contexto voltou-se quase que exclusivamente para a elaboração 
dogmática da teologia, fundamentada em categorias fi losófi cas, sob forte 
infl uência da metafísica. O que mais importava era o Cristo triunfante e 
transcendental, e não o Jesus histórico. Há também nesta época forte 
interesse pela vida monástica, a qual levava os cristãos a fugirem do 
mundo e seus confl itos, com o propósito de se dedicarem à purifi cação e 
contemplação nos desertos.
Também se observou um grande apego à magia. Segundo o sociólogo 
Leonildo Campos (1997), nesse período a assimilação da fé cristã pela 
população rural, mediante a catequese, “formou uma camada de verniz 
sobre uma antiga realidade religiosa” (p.170), desencadeando um intenso 
apego às relíquias como fetiches de proteção, com caráter mágico, 
objetos esses que supostamente teriam sido utilizados pelos apóstolos 
ou outros mártires do cristianismo e que eram então guardados nos lares 
dos devotos com o sentido de proteção contra doenças, contra infortúnios 
do demônio ou como ajuda contra as intempéries que poderiam ameaçar 
as colheitas. O historiador inglês Keith Thomas também afi rma que no 
contexto da Idade Média:
as relíquias sagradas tornaram-se fetiches milagrosos, tidos como dotados 
do poder de curar enfermidades e proteger contra perigos [...] atribuía-se 
igualmente uma efi cácia miraculosa às imagens. A representação de São 
| História do cristianismo II | FTSA8
Cristóvão, que com tanta frequência (sic) ornamentava as paredes das 
igrejas das aldeias inglesas, supostamente concedia um dia de imunidade à 
doença ou à morte a todos os que a fi tassem (p. 36).
Este mesmo autor constata que no mundo medieval havia se desenvolvido 
um “amplo leque de fórmulas para atrair a bênção prática de Deus sobre as 
atividades seculares”, acrescentando:
O ritual básico era o benzimento com sal e água para 
a saúde do corpo e expulsão dos maus espíritos. Mas 
os livros litúrgicos da época também traziam rituais 
para benzer casas, gados, culturas, embarcações, 
ferramentas, armas, cisternas e fornalhas. Havia 
fórmulas para abençoar homens que se preparavam 
para sair em viagem, para travar um duelo, para entrar 
em batalha ou mudar de casa. Havia métodos para 
abençoar os doentes e tratar de animais estéreis, 
para afastar o trovão e trazer a fecundidade ao leito 
matrimonial [...] Fundamentalmente em todo esse 
procedimento era a ideia de exorcismo, o esconjuro 
formal do demônio, expulsando de algum objeto 
material por meio de preces e da invocação do nome 
de Deus. A água benta podia ser utilizada para afastar 
maus espíritos e vapores pestilenciais. Era remédio 
contra a doença e a esterilidade (Thomas, p.38).
Diante desse quadro religioso e teológico, surgiram movimentos 
de reforma dentro da própria igreja medieval — considerados pré-
reformadores — que buscavam mudanças, os quais prepararam o 
caminho para o advento da Reforma Protestante que viria a ocorrer 
no século XVI, buscando retomar o caminho bíblico e apostólico dos 
primeiros séculos.
Assista ao vídeo: História do Cristianismo II – AVA –Aula 1
Acesse o AVA para assis� r o vídeo!
9História do cristianismo | FTSA | 
1.2. Contexto sócio-político
Diante dos aspectos anteriormente apresentados, cabe agora perguntar: 
em que consiste a Reforma Protestante? Ou ainda: quais possíveis 
leituras podemos fazer deste movimento naquele período e contexto?
O advento de uma nova vertente cristã — o protestantismo — por si só 
confi gura o cariz essencialmente religioso da Reforma. No entanto, é 
possível — ou necessário — fazer leituras daqueles acontecimentos 
do século XVI por outros vieses. Um deles, pelo prisma econômico-
social. Nesta perspectiva, a meta primordial daquele movimento teria 
sido a eliminação do controle social exercido pela igreja, originado a 
expectativa de ganhos fi nanceiros: do príncipe, que via a possibilidade 
de tomar para si as terras da igreja; do camponês mais humilde que 
imaginava não mais ter de pagar dízimos (ou impostos) à igreja. Os 
anseios de mudança mobilizaram, assim, estratos sociais descontentes 
com a tarefa de produzir sob o aguilhão de pesada carga tributária que 
sustentava economicamente as instâncias de poder político e poder 
religioso: camponeses espoliados, formadores da base da pirâmide 
social, entenderam ser chegado o tempo de mudanças revolucionárias, 
quando a terra seria partilhada de modo igualitário entre os trabalhadores.
Outro olhar sobre a Reforma, primariamente na Alemanha, poderia 
considerá-la como uma questão de acentuada natureza política: a 
convergência entre a causa religiosa e o nacionalismo dos países 
europeus teria contribuído diretamente para o grande apoio recebido por 
Lutero do povo e da elite alemã. Lida, por um lado, como um instrumento 
utilizado pelos governantes locais para eliminar a infl uência externa sobre 
os seus territórios, a Reforma é entendida, por outro, como um primeiro 
exemplo do nacionalismo alemão. O aumento contínuo da consciência 
da nacionalidade e o fortalecimento da autoridade real já haviam sido 
presenciados no século anterior à Reforma. Decrescia o poder do papa e 
do imperador, enquanto afi rmava-se o poder dos reis. Além de contestado 
pelas outras nacionalidades, na Alemanha o imperador não conseguia 
impor sua autoridade diante da nobreza germânica. O Sacro Império 
| História do cristianismo II | FTSA10
continuava a ter as suas fronteiras ameaçadas pelos islâmicos. A Dieta 
Imperial (Parlamento) refl etia a ascensão do autonomismo nacional e o 
poder dos nobres regionais (Cavalcanti, p.121).
Uma das obras importantes de Lutero foi intitulada À Nobreza Cristã 
da Alemanha, de apelo nitidamente nacionalista. Com isso granjeou a 
simpatia e o apoio de vários dos poderosos príncipes-eleitores, entre os 
quais Frederico, o sábio, que corajosamente o protegia. Não tivesse ele o 
respaldo popular e o apoio de poderosas forças políticas, difi cilmente não 
seria derrotado, à semelhança do que ocorrera com os pré-reformadores, 
como John Huss, um século antes. 
Esse apoio do braço político teria sido, igualmente, decisivo para a 
expansão do protestantismo. Na Noruega, Dinamarca e Suécia, a Igreja 
torna-se protestante por decisão do rei e do parlamento. A Reforma, 
igualmente, concorreu para alterar a ordem política europeia. Os países 
aderiram ao protestantismo e se separaram do Sacro-Império e do papado, 
enfraquecendo-os. Esses países separados afi rmariam o princípio da 
soberania, como estados-nacionais.
Exercício de Fixação
Sobre as interpretações da Reforma podemos dizer que:
a) A análise deve focar exclusivamente na dimensão religiosa, pois, embora
tenha atingido outras dimensões da vida social, a reforma foi estritamente
religiosa.
b) A análise deve levar em consideraçãotanto a dimensão religiosa
quanto as dimensões da vida social, pois a reforma correspondeu a essa
complexidade das realidades humana.
c) A análise deve focar exclusivamente nas dimensões da vida social, pois,
embora ela tenha iniciado como uma discussão de cunho religioso, isso
não passou de pretexto para a independência política das regiões sob o
domínio do Sacro Império.
Acesse o AVA para fazer o exercício!
11História do cristianismo | FTSA | 
1.3. Mudanças impulsionadas pela reforma
O movimento de Reforma se tornaria o marco de profundas mudanças que 
não se restringiram tão somente ao aspecto religioso, mas que promoveram 
transformações de âmbito político, sócio-econômico e cultural. 
João Calvino, outro infl uente líder da Reforma, ao lado de Lutero, foi 
grande responsável pela formação de um novo conceito em relação ao 
trabalho. Durante a Idade Média, o trabalho era visto como sinônimo de 
castigo divino; além do que, a fé cristã projetava a realização de seus 
sonhos e desejos para o paraíso no “além celestial”. Na compreensão 
dos reformadores, o trabalho passou a ser visto como vocação divina, 
que não só dignifi ca o ser humano, como também promove a glória de 
Deus. Este novo conceito inseriu-se perfeitamente no novo modelo de 
sociedade que a modernidade passava a exigir. Daí a Reforma ter obtido 
tanto êxito nos países em que se forjava o moderno modelo econômico, 
intensamente voltado para a produção.
Analisando este importante período da história da igreja, o historiador Éber 
Silveira Lima comenta que a Reforma Protestante, no século XVI, signifi cou 
um retorno da igreja aos princípios que sempre marcaram sua identidade:
W. Walker, historiador protestante, usa a expressão
bíblica “vinho novo em odres velhos”, ao explicar sobre
as razões que motivaram a Reforma do século XVI.
A Igreja Medieval, trazendo no seu bojo as inserções
acumuladas por tantos séculos, se descaracterizara
quase que por completo. Perdera, ademais, a vitalidade
dos primeiros tempos, em termos de fé e prática neo-
testamentárias. O “odre velho”, ou seja, a instituição
eclesiástica envelhecida, carcomida, rançosa, herdara
do Império Romano sua noção de sociedade, desde
o momento em que o Papa passou a ser na prática, o
sucessor dos Césares, na mistura da religião com o
poder civil, que tanto concorrem para o desfi guramento
| História do cristianismo II | FTSA12
da igreja. A Reforma foi, nesse contexto, o resultado de um 
processo histórico, reconhecida por nós a ação de Deus 
com o intuito de renovar os odres para a preservação do 
vinho novo, que é o Evangelho (1988, p. 1).
Neste importante período, ocorre, portanto, uma retomada da temática 
da cruz quando os reformadores objetivam reconduzir a igreja às suas 
origens doutrinárias e, consequentemente, às suas verdadeiras funções 
de ser sal da terra e luz do mundo. A teologia da Reforma salienta a 
cruz por ser esta o lugar único do perdão e da redenção da humanidade, 
possibilitando a esta a condição para promover o reino de Deus. Por isso 
Lutero emitiu a célebre frase: “Crux sola nostra theologia” (somente a 
cruz é a nossa teologia). Lutero, em sua oração pascal, expressa bem a 
singularidade da obra redentora da cruz de Cristo e a capacitação que da 
ressurreição provém àqueles que passam a ser instrumentos de Deus na 
libertação da morte e da estrutura de pecado que ainda existem:
Sendo nosso fi ador, Tu foste entregue à morte, mas eis 
que vives. Tu venceste a morte e aniquilaste aquele que 
tinha o poder da morte, Tu foste feito o primeiro entre 
os que dormem. Porque Tu abriste o reino dos céus 
para todos os que vivem. O verdadeiro cordeiro pascal, 
que foste oferecido por nós, Tu tiraste o pecado do 
mundo e pela ressurreição nos restaurastes inocência 
e vida eterna. Completa, pois, em nós com poder a obra 
da fé, cuida que ressuscitemos contigo em verdadeiro 
arrependimento de nossa morte natural de ofensas 
e pecados. Possamos vencer o mundo e o terror da 
morte e, na Tua vinda para julgar a mundo, aparecer 
contigo em glória semelhantes a Ti e com nossos 
corpos transformados à imagem do Teu próprio corpo 
glorifi cado. (Liturgia Luterana, p.286-287).
É necessário destacar nesta oração de Lutero, a compreensão de que a cruz 
e a ressurreição não consistem em um fim em si mesmo, mas o meio pelo 
13História do cristianismo | FTSA | 
qual o ser humano é restaurado para agir na promoção do reino de Deus. 
Assim, para Lutero, a redenção não pode ser desvinculada da missão.
João Calvino também fundamenta sua elaboração teológica nos temas 
“cruz e ressurreição”, ressaltando a interdependência teológica entre os 
mesmos. Diz ele:
Ainda que na morte de Cristo tenhamos pleno 
cumprimento da salvação, pois por ela somos 
reconciliados com Deus, o juízo divino é satisfeito, a 
maldição suprimida e a pena paga. Sem dúvida não 
se diz que somos regenerados de uma viva esperança 
pela morte, mas pela ressurreição (1988, p. 539).
Ao falar da cruz propriamente, o reformador de Genebra nos diz que ela 
nos humilha, revela nossa hipocrisia, e nos liberta da confi ança que temos 
em nossas próprias forças. Nela nos tornamos totalmente dependentes 
da graça de Deus. E da ressurreição do crucifi cado provém a esperança 
do triunfo da verdade de Deus para a humanidade e seu futuro (1988, 
p. 539). Nas palavras de Calvino também encontramos a alusão de que 
a ressurreição consiste no poder que preenche o vazio outorgado pela 
cruz: “A cruz de Cristo triunfa de verdade no coração dos fi éis contra o 
Diabo, contra a carne, contra o pecado e contra os ímpios quando voltam 
seus olhos para contemplar o poder de sua ressurreição” (l988, p. 551).
Para Calvino, a ressurreição de Cristo é fator fundamental de nossa 
justifi cação, nossa santifi cação e a nossa própria ressurreição. Ele 
também aponta para a segurança que a ressurreição proporciona aos 
que percorrem o caminho da cruz no seguimento de Cristo:
A nossa santifi cação se deve pelo fato de que, assim 
como Cristo foi morto na cruz, devemos mortifi car 
a nossa carne e andarmos, assim como Cristo, em 
novidade de vida, com uma vida transformada. E é 
também pela ressurreição de Cristo assegurada a 
| História do cristianismo II | FTSA14
nossa própria ressurreição, uma vez que, tendo sido 
Cristo homem também, morreu à semelhança de toda 
a humanidade, mas não fi cou presa a ela, antes Deus 
o ressuscitou, vencendo a morte e destruindo o seu
poder. Sendo assim, uma vez estando ligados a Cristo
pela fé e engajados no seu ministério, é-nos assegurada
a nossa ressurreição. Assim como Deus levantou a
Cristo dentre os mortos, há também de nos levantar
(1988, p. 386-387).
Desse modo, o espírito da Reforma do século XVI identifi ca-se bastante 
com o espírito da missão de Jesus Cristo entre os homens, quando a 
falsa religião e a hipócrita espiritualidade são denunciadas, juntamente 
com os abusos de poder que são feitos em nome de Deus. Este espírito de 
denúncia profética, de inconformismo, e de enfrentamento da realidade 
levado às últimas consequências, caracteriza o caminho da cruz pelo 
qual a Reforma Protestante trilhou, caminho este que produziu vida.
Também, em termos teológicos, houve a redescoberta do sacerdócio 
universal de todos os crentes, cujo princípio é o de que todo cristão, e não 
somente o clérigo, é vocacionado por Deus para exercer dons e ministérios. 
No período medieval, o exercício ministerial fi cou bastante circunscrito 
ao controle da instituição católica, sobrevalorizando-se o clericalismo 
em relação ao laicato (leigos). Afi rma o sociólogo Pierre Bourdieu:
A concentração do capital religioso nunca foi talvez tão 
forte como na Europa Medieval. A igreja, organizada 
segundo uma hierarquia complexa, utiliza uma 
linguagem quase desconhecida do povo e detém o 
monopólio do acesso aos instrumentos do culto, textos 
sagrados e, sobretudo, os sacramentos (1996, p.62)
O fato de a Reforma trazer de volta o sacerdócio universal de todos os 
crentes, isto não significou desprezo à formação teológica e ausência 
15História do cristianismo | FTSA | 
de preparo de novos líderes para o exercício do pastorado e outros 
ministérios. Logo no seu início, o protestantismo também criou suas 
escolas de Teologia, sendo a primeira e mais infl uente, a Academia 
de Genebra, na Suíça, sob liderança de João Calvino, acerca da qual 
trataremos com mais detalhes nos tópicos seguintes.
Saiba mais
Origens do Seminário
A palavra “seminário” tem sua origem no latim seminariu, que signifi ca 
originalmente “viveiro de plantas onde se fazem as sementeiras”. Este 
termo passou a designar instituição de ensino teológico no século 
XVI, mais precisamente entre 1545 e 1563, por ocasião do Concílio 
de Trento, também conhecido como Concílio da Contra-Reforma. 
Adotou-se ali a expressão para designar os cursos de formação 
eclesiástica sob controle da Igreja de Roma. A ideia original era a 
de que, semelhantemente às plantas dos viveiros e herbários, os 
candidatos às funções clericais também fi cassem separados sob 
cuidados especiais e protegidos durante seu processo de formação. 
Especifi camente, naquele momento, deveriam os estudantes fi car 
protegidos das “tentações do mundo” e das infl uências das “ideias 
heréticas” propagadas pelos protestantes (Proença, 2004, p.9)
 Exercício de Aplicação 
Citação 1:
Os melhores pastores não saem dos seminários. Pastor é que 
nem jogador de futebol: eles saem das escolinhas, eles surgem, 
aparecem. Depois só precisam ser lapidados. Com o passar dos 
anos, eles vão fi car muito mais preparados do que jamais fi cariam 
num seminário normal. Os grandes homens de Deus surgiram do 
nada, sem preparação (Eclésia, 2004)
| História do cristianismo II | FTSA16
Citação 2:
Nunca foi tão fácil exercer o ofício de pastor ou pastora no contexto 
brasileiro como o que se observa atualmente. Pessoas com 
pouquíssimo tempo de conversão à fé evangélica, ou ainda sem o 
mínimo preparo teológico ou até mesmo bíblico, se auto-intitulam 
pastores/as, alugam um salão para o início de suas pregações 
e logo passam a ter um grupo de seguidores. Contribui para a 
banalização do ofício pastoral o fato de não existir nenhum órgão 
que possa – com base em critérios que levem em conta o devido 
preparo e formação – emitir uma credencial de reconhecimento e 
legitimidade a quem deseja exercer o ministério pastoral ou então 
fundar uma nova igreja (Proença, 2004, p.33,34)
À luz dos desdobramentos do princípio do sacerdócio universal 
de todos os crentes na Reforma, qual das afi rmações abaixo 
demonstra incompreensão desse princípio?
O sacerdócio universal de todos os crentes torna desnecessária a 
formação teológica para o exercício da atividade pastoral. 
A formação teológica tem um importante papel para o exercício 
ministerial do cristão. 
A falta de preparo teológico e o desconhecimento de recursos de 
interpretação da Bíblia por parte de líderes, podem trazer algum 
risco à vida cristã da comunidade.
Acesse o AVA para fazer o exercício!
17História do cristianismo | FTSA | 
2. Quem foi Martinho Lutero
2.1. Os anos de formação
Lutero nasceu em Eisleben, região germânica, em 10 de novembro de 
1483. Com recursos provenintes do trabalho na mineração, seu pai 
teve condições de lhe dar estudo, aspecto distintivo em um contexto 
de predomínio do analfabetismo. Seu processo educacional pode 
ser dividido em três etapas: alfabetização, bacharelado em Artes e o 
estudo da Teologia. Sua alfabetização teve início aos cinco anos, na 
escola municipal de Mansfi eld. Nesta escola, até 1497, Lutero aprendeu 
noções de latim, música e os princípios da fé cristã: orações, o Credo 
e os Dez Mandamentos. Esta escola mantinha uma metodologia de 
ensino conservadora: memorização pela coerção. Seu contato com uma 
renovação pedagógica se deu quando frequentou a escola de latina de 
Magdurgo, entre 1497 e 1498. Apesar do pouco espaço de tempo, o jovem 
aluno deve ter se impressionado com ensino de infl uência humanista que 
os irmãos da vida comum se empenhavam por introduzir naquele espaço 
educacional. 
Em 1501, em Erfurt, Lutero iniciou sua formação universitária. Para essa 
universidade renomada foi enviado por seu pai com o objetivo de cursar 
a faculdade de Direito. Como pré-requisito, cursou primeiramente a 
Faculdade de Artes. Neste curso dedicou-se às disciplinas de gramática, 
retórica, dialética, geometria, aritmética, música e astronomia, além de 
estudar ética e metafísica. Neste período é que Lutero leu textos da obra 
aristotélica. 
Em 1505 tornou-se mestre, estando apto para ingressar em um dos três 
cursos superiores: Direito, Medicina e Teologia. Seguindo a vontade do 
pai, escolheu a carreira jurídica. Uma situação inusitada, em que teve sua 
vida ameaçada em um tempestade, fê-lo decidir abandonar o Direito e 
buscar a Teologia. Ingressou-se no convento dos agostinianos, tornado-
se monge agostiniano. Lutero, na clausura, autofl agelava-se várias vezes 
ao dia em busca da segurança da salvação. Chegou, certa vez, indo a 
| História do cristianismo II | FTSA18
Roma, subir as escadarias da basílica em penitência, recitando o “Pai-
Nosso” em favor de seu pai, já falecido.
Em 1508 mundou para Wittemberg, onde, em 1509, tornou-se bacharel 
em Bíblia. Como mestre lecionou por um breve período até tornar-se 
doutor em Teologia em 1512.
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2.2. A infl uência do pensamento agostiniano
No período de sua formação teológica, Lutero foi infl uenciado, além 
dos estudos das Escrituras, pelas leituras que fez de Santo Agostinho. 
Embora Agostinho (354-430 d.C.) tenha nascido num lar cristão, foi por 
nove anos maniqueísta, vindo a se converter à fé cristã em 386 d.C., 
sendo batizado em 387 d.C. por Ambrósio, em Milão. Em 391 d.C. foi 
ordenado ao sacerdócio, sendo quatro anos mais tarde consagrado 
bispo coadjutor de Hipona. Em 412 d.C., é que começa a controvérsia que 
dividiu defi nitivamente as opiniões dentro da Igreja, envolvendo Pelágio. 
Pelágio era um monge britânico que apareceu em Roma, por volta do ano 
400 d.C., para refutar as doutrinas de Agostinho. Escreveu um comentário 
sobre as epístolas paulinas em 409 d.C. A sua posição teológica pode 
ser denominada de “monergismo humano”, assim chamado porque para 
ele o poder da vontade humana é decisivo e sufi ciente na experiência 
da salvação. Sua célebre frase expressa claramente essa mentalidade, 
quando ele afi rma “se eu devo, eu posso”. 
A controvérsia entre Agostinho e Pelágio se resumia em dois pontos 
teológicos: a liberdade — capacidade — da vontade humana (livre arbítrio); 
e na maneira como Deus opera sua graça. Quanto ao livre arbítrio, a 
discussão era se o ser humano é absolutamente capaz de exercer a sua 
liberdade, ou não. Agostinho ensinava e defendia a doutrina “do pecado 
original”, e os seus inevitáveis efeitos mortais sobre a vida de todos os 
descendentes dos primeiros pais. Pelágio, negava tal contaminação, e 
19História do cristianismo | FTSA | 
afi rmava a inocência da alma, como também a absoluta capacidade de 
escolha tanto moral, quanto espiritual. Como exemplo desta disputa, leia 
o trecho abaixo:
Saiba mais
O querer e o agir dependem também da graça de Deus, conforme 
testemunho de São Paulo
Todo o dogma de Pelágio consta no livro terceiro de sua obra em 
favor do livre arbítrio, transcrito fi elmente com essas palavras. Nele 
são diferenciados os três fatores, um que é o poder, o outro que 
é o querer, o terceiro que é o ser, isto é, a possibilidade, a vontade 
e a ação. Mas lança mão de tanta sutileza nas palavras, que 
procuremos saber o que ele quer dizer, quando lemos ou ouvimos 
que ele reconhece a ajuda da graça divina para nos afastarmos do 
mal e praticarmos o bem, fazendo-a consistir na lei ou na doutrina 
ou em qualquer outra coisa. Não caiamos no erro de entendê-lo de 
modo diferente do que pensa.
Por isso, devemos ter em conta que ele não crê no auxílio divino 
paraa vontade e a ação, mas somente para a possibilidade da 
vontade e da ação. Segundo afi rma, é o único fator, dentre os três, 
que recebemos de Deus, como se não tivesse capacidade o que 
o próprio Deus pôs na natureza. Os outros dois, que são nossos,
no seu dizer, são tão fi rmes, fortes e autossufi cientes, que não
necessitam de auxílio algum. Portanto, Deus não nos ajuda para
o querer nem ajuda para o agir, mas somente auxilia para que
possamos querer e agir.
O Apóstolo, porém, diz o contrário: Operai a vossa salvação com 
temor e tremor. E para fazê-los saber que não tinham capacidade 
não somente para poder agir (pois já o haviam recebido na natureza 
e na doutrina), mas também para o próprio agir, não diz: Deus que 
opera em vós o poder, como se o querer e o agir, os possuíssem por 
si mesmos e não necessitassem de ajuda com relação a esses dois 
fatores, mas diz: Pois é Deus que opera em vós o querer e o agir (et 
| História do cristianismo II | FTSA20
velle et perfícere), ou como se lê em outros códices, principalmente 
gregos: et velle et operari (Fl 2:12-13).
Percebei como o Apóstolo, inspirado pelo Espírito Santo, previu 
muito antes os futuros adversários da graça de Deus. Além disso, 
asseverou que Deus opera em nós os dois, ou seja, o querer e o 
operar, que os pelagianos pretendem que sejam nossos, como se 
não necessitassem da ajuda da graça divina.
AGOSTINHO, A graça de Cristo e o pecado original, Capítulo V.
As ideias de Pelágio foram fortemente refutadas por Agostinho 
numa série de tratados que se tornaram conhecidos como escritos 
antipelagianos. O Pelagianismo foi condenado ofi cialmente pela 
Igreja antiga nos concílios de Cartago (418 d.C.), de Éfeso (431 d.C.) e 
fi nalmente no Concílio de Orange II (529 d.C.). A partir de então a Igreja 
Ocidental tornou-se ofi cialmente agostiniana em seu entendimento da 
doutrina da graça, todavia, essa ofi cialidade estava um tanto que longe 
da realidade dos clérigos e igrejas locais. Entretanto, durante a Idade 
Média o semipelagianismo tornou-se a doutrina ofi cial da Igreja Católica 
Romana, daí a ênfase nas boas obras para fi ns de salvação. Como 
leitor de Agostinho, Lutero se insurgiu contra este sistema teológico do 
catolicismo romano no contexto da Reforma.
Exercício de Fixação
 A respeito da doutrina da graça em Lutero podemos afi rmar que:
Tanto a leitura bíblica quanto a leitura de textos da tradição cristã 
contribuíram para a maturação da refl exão teológica de Lutero que, 
frente ao seu contexto, contextualizou de forma signifi cativa para o 
seu tempo as implicações da doutrina da graça.
Através das leituras de Agostinho Lutero simplesmente reativou 
uma antiga questão nos mesmos moldes que Agostinho a tinha 
travado com Pelágio.
21História do cristianismo | FTSA | 
2.3. Os anos em Wittemberg
Na cidade de Wittemberg, uma recém fundada universidade trazia 
abertura para as novas correntes de pensamento: utilização de uma 
gramática humanista e novas traduções de Aristóteles, além do grego e 
do hebraico. Ali, passaria a dar aulas sob estas perspectivas inovadoras, 
constituindo-se o espaço da sala de aula em um lugar estratégico para a 
elaboração, inclusive, das 95 teses reformistas.
Tornou-se doutor em Teologia, sacerdote, mas a crise insistia em não 
lhe abandonar. Até que, fi nalmente, lendo as Escrituras deparou-se com 
o versículo bíblico de Romanos, "o justo viverá pela fé". Ao tornar-se 
professor na Universidade de Wittenberg, passou a estudar a estudar a 
Bíblia com os seus alunos, discutindo temas teológicos decisivos, como 
por exemplo, o valor das indulgências para o perdão de pecados.
No dia 31 de outubro de 1517, véspera do dia de “todos os santos” no 
calendário católico, o monge agostiniano, afi xou 95 teses na porta da 
igreja de Wittenberg, na Alemanha, apontando desvios teológicos, 
doutrinários e institucionais em que a Igreja Católica romana estava 
incorrendo, fato este que implicaria, posteriormente, na expulsão ou 
excomunhão deste sacerdote pela referida igreja. Não queria deixar a 
igreja, mas sim, reformá-la; porém, foi excomungado. Sendo perseguido, 
refugiou-se em um castelo por quase dez anos; ao ser excomungado 
pelo papa, estava, pois, criado o Protestantismo. 
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| História do cristianismo II | FTSA22
Saiba mais
Debate para o esclarecimento do valor das indulgências 
pelo Dr. Martin Luther, 1517
Por amor à verdade e no empenho de elucidá-la, discutir-se-á o 
seguinte em Wittenberg, sob a presidência do reverendo padre 
Martinho Lutero, mestre de Artes e de Santa Teologia e professor 
catedrático desta última, naquela localidade. Por esta razão, ele 
solicita que os que não puderem estar presentes e debater conosco 
oralmente o façam por escrito, mesmo que ausentes. Em nome do 
nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.
1 - Ao dizer: "Fazei penitência", etc. [Mt 4.17], o nosso Senhor e 
Mestre Jesus Cristo quis que toda a vida dos fi éis fosse penitência.
2 - Esta penitência não pode ser entendida como penitência sacramental 
(isto é, da confi ssão e satisfação celebrada pelo ministério dos 
sacerdotes) [...]
21- Erram, portanto, os pregadores de indulgências que afi rmam
que a pessoa é absolvida de toda pena e salva pelas indulgências
do papa.
22 - Com efeito, ele não dispensa as almas no purgatório de uma única 
pena que, segundo os cânones, elas deveriam ter pago nesta vida.
23 - Se é que se pode dar algum perdão de todas as penas a alguém, 
ele, certamente, só é dado aos mais perfeitos, isto é, pouquíssimos.
24 - Por isso, a maior parte do povo está sendo necessariamente 
ludibriada por essa magnífi ca e indistinta promessa de absolvição 
da pena [...]
27 - Pregam doutrina humana os que dizem que, tão logo tilintar a 
moeda lançada na caixa, a alma sairá voando [do purgatório para o céu].
28 - Certo é que, ao tilintar a moeda na caixa, podem aumentar o 
lucro e a cobiça; a intercessão da Igreja, porém, depende apenas da 
vontade de Deus [...]
23História do cristianismo | FTSA | 
52 - Vã é a confi ança na salvação por meio de cartas de indulgências, 
mesmo que o comissário ou até mesmo o próprio papa desse sua 
alma como garantia pelas mesmas.
53 - São inimigos de Cristo e do papa aqueles que, por causa da 
pregação de indulgências, fazem calar por inteiro a palavra de Deus 
nas demais igrejas.
54 - Ofende-se a palavra de Deus quando, em um mesmo sermão, 
se dedica tanto ou mais tempo às indulgências do que a ela [...]
81 - Essa licenciosa pregação de indulgências faz com que não seja 
fácil, nem para os homens doutos, defender a dignidade do papa 
contra calúnias ou perguntas, sem dúvida argutas, dos leigos [...]
90 - Reprimir esses argumentos muito perspicazes dos leigos somente 
pela força, sem refutá-los apresentando razões, signifi ca expor a Igreja 
e o papa à zombaria dos inimigos e desgraçar os cristãos.
Exercício de Aplicação
Tomando como exemplo a relação entre formação educacional 
e desafi os ministeriais em Martinho Lutero e tentando aplicar à 
nossa realidade, podemos dizer que:
a) O itinerário acadêmico de Lutero mostra como os diversos
conteúdos adquiridos e capacidades desenvolvidas contribuem
para o colocar-se diante dos desafi os que se apresentam ao
serviço cristão.
b) As principais infl uências sobre o pensamento de Lutero vieram
exclusivamente de suas experiências devocionais, mostrando
que as contribuições de um itinerário acadêmico se limitam
apenas às questões secundárias à fé.
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| História do cristianismo II | FTSA24
3. Lugares, estratégias e repercussões do movimento 
reformador
3.1. Renascimento, humanismo e outros aspectos que 
contribuíram para a Reforma
O movimento de Reforma, do século XVI não está circunscrito apenas 
às questões religiosas. Ele é parte de um contexto mais amplo, de 
abrangência política, ecônomica e cultural. Leia o texto a seguir para 
contextualizar estas abrangências:A Reforma também deve ser vista como uma parte da história da cultura. 
Parcialmente ela coincide com o Renascimento, iniciado na Itália já no 
século XIV. O século XVI é também período de humanismo. Grande parcela 
dos reformadores era humanista ou infl uenciada por essa corrente de 
pensamento. Melanchthon, Zwínglio e Calvino foram humanistas. Por 
outro lado, foram também representantes do Renascimento. Muitas 
vezes, é difícil separar humanismo e Renascimento. Aliás, Renascimento 
e humanismo são usados muitas vezes como sinônimo, ainda que 
nos apresentem o mesmo fenômeno sob perspectivas diferentes. 
É necessário cuidado quando se busca distinguir Renascimento, 
humanismo e Reforma, para não cair no erro tantas vezes feito, quando 
se aponta para a discussão entre Lutero e Erasmo em torno do livre e do 
servo arbítrio. As pessoas que afi rmam que Lutero rompe defi nitivamente 
com o humanismo, em 1525, com seu escrito De servo arbítrio, com o 
qual respondeu ao escrito de Erasmo, de 1524, De libero arbítrio diatribe, 
esquecem que Lutero recorreu em sua tese principal a ninguém mais do 
que humanistas italianos como Lourenço Valla. A teologia apresentada 
por Erasmo não era católica e também não pôde ser aceita por teólogos 
protestantes (Dreher, 1996, p. 11).
Em termos culturais, estava em curso naquele momento, um processo 
chamado Renascimento, que representava mudanças nas artes, na 
ciência, nas formas de se conceber o mundo, ocorrido entre os séculos 
XIV e XVI, marcando a passagem do mundo medieval para o mundo 
25História do cristianismo | FTSA | 
moderno. Teve início na Itália, mas espalhou-se posteriormente para 
outros lugares. A expansão das universidades, em tal período, representou 
um canal de difusão destas ideias renovadoras. 
O nome Renascimento quer expressar que naqueles dias a Antiguidade 
nascia de novo, renascia [...]. Mas o Renascimento não é apenas um 
retorno à Antiguidade, enquanto estudo das línguas e da literatura 
clássica. O Renascimento provocou um novo sentimento de vida. É 
simplista querer afi rmar que o ser medieval tenha estado completamente 
orientado no transcendente, enquanto que o ser humano do Renascimento 
tenha estado orientado no imanente. Certo é, porém, que a pessoa do 
Renascimento tinha uma posição distinta em relação às realidades do 
imanente. Acentuou a individualidade. História e técnica cresceram em 
importância. A sensibilidade para o belo, para o sensual fez parte do 
Renascimento ((Dreher, 1996, pp. 11-12).
Simultaneamente, naquele período e contexto, surgia com evidência o 
Humanismo, enfatizando a centraliade do pensamento no ser humano, 
e não mais no sagrado, representado pela igreja medieval. Como um 
contraponto às ideias da igreja, que confi nava o ser humano ao controle 
dos dogmas e ritos, sem condições de por si decidir, o Humanismo 
revalorizava a liberdade, a racionalidade, a capacidade do ser humano de 
gerir suas próprias ações. 
Sob o ponto de vista religioso, o humanismo é multifacetado. Podemos 
notar isso no lema humanista ad fontes. O lema pode referir-se tanto 
á Antiguidade anterior ao cristianismo quanto à Antiguidade cristã. 
Paulo pode ser tão importante quanto Platão, e um pode ser usado para 
interpretar o outro. O estudo dos Pais da Igreja, a Patrística, estava tão 
presente quanto o estudo de Platão. Quando nos dias da reforma se fala 
da palavra de Deus como norma, a expressão pode signifi car tanto a 
Bíblia quanto o ensinamento dos Pais da Igreja [...] Praticamente todas 
as tendências da Reforma têm traços humanistas [...]. Há, isso sim, 
delimitações frente a determinadas tendências (Dreher, 1996, p. 12).
| História do cristianismo II | FTSA26
Há um contexto político e econômico que favorece o avanço do 
movimento reformista. É bom recordar que a Europa havia saído 
recentemente de um sistema conhecido como Feudalismo, que subsistiu 
até o século XV, no qual se destacaram duas principais características: 
(1) a concentração de pessoas no mudo rural, na condição de servos
nas terras concedidas pela Igreja e governadas por senhores feudais;
(2) organização econômica voltada apenas à subsistência dos feudos,
sustento do clero e da classe senhorial.
Este sistema entrou em crise como resultado de guerras, epidemias e 
fome. Como solução social e econômica foram adotadas três principais 
estratégias: o êxodo rural, investimentos no comércio marítimo e 
organização política concentrada em novos Estados independentes, 
tendo príncipes como governantes, sob a tutela da igreja. Lutero e os 
demais líderes reformadores se valeram deste contexto para fortalecerem 
as ações reformistas. Os príncipes queriam maior autonomia 
administrativa e redução na carga de tributos que eram pagos à igreja 
de Roma, e por isso vários deles apoirarm Lutero na ruptura com Roma; 
camponeses viram inicialmente nas reformas luteranas a oportunidade 
de refazerem a vida no campo, sem a necessidade de aderirem ao êxodo 
rural, por isso muitos se juntaram inicialmente a Lutero, antes ainda de 
serem nominados de anabatistas; mais adiante, a ética protestante, 
que valorizava o trabalho e o lucro como dádivas divinas, não apenas 
impulsionou o comércio ultramarino, como também legitimou “o espírito 
do capitalismo” mercantil nascente nos países que aderiram à Reforma. 
A ética protestante e o espírito do capitalismo ajudaram-se mutualmente 
naquele momento.
3.2. A Reforma e as estratégias educacionais
Outra importante estratégia dos reformadores foi a educação, visando 
alfabetizar e educar o ser humano, no sentido amplo do termo, para a 
transformação do novo mundo que acreditavam estar construindo a 
partir daquele momento. Após um longo período — a Idade Média — 
em que a educação, ou mesmo a alfabetização, foram privilégios de 
27História do cristianismo | FTSA | 
poucos, Martinho Lutero escreveu diversos textos nos quais a temática 
da educação foi abordada, visando popularizar este alcane. Dentre estes 
textos, podem ser citados Aos prefeitos de todas as cidades da Alemanha 
sobre o dever de fundar e manter escolas, publicado em 1524; e Sermão 
sobre o dever de mandar os fi lhos à escola, de 1530. 
O primeiro texto, uma carta aberta, foi enviado aos cidadãos e autoridades 
como um grande apelo ao investimento na educação cristã dos jovens. 
Como não podia contar com o auxílio dos bispos e do papa, restavam 
às autoridades civis o empenho pela educação. Como o movimento 
reformista havia abalado a vida monástica como um “lugar de perfeição”, 
muitos pais estavam preferindo encaminhar os fi lhos para o trabalho 
no comércio nascente ao invés de mandá-los à escola. Como forma de 
persuasão, Lutero argumentava que, sem o auxílio dos meios pedagógicos 
e científi cos, os pais não teriam condições de educar corretamente os 
fi lhos. Discute também que os conselhos municipais, responsáveis pelo 
bem-estar dos cidadãos e da cidade, precisavam dispor de pessoas 
aptas, bem instruídas e sábias para a administração das decisões e 
encaminhamentos sociais. Somente por meio de uma boa e formal 
educação é que estes cidadãos seriam preparados. A carta é concluída 
com uma advertência de que as novas escolas fossem construídas 
com boas bibliotecas, com espaço devido para estudo e leitura, com 
representativas obras que auxiliassem no estudo das Escrituras, das 
línguas e das artes liberais. 
No segundo texto, Lutero defende a importância da educação para o futuro 
da igreja e da sociedade. Por meio da educação e da Escritura, o cristão 
seria capacitado a promover a cidadania e a sociedade mais justa. Motiva 
os pastores a continuarem insistindo na educação dos jovens. Destaca a 
ideia de que os pais que enviarem seus fi lhos à escola estarão colaborando 
como o próprio Deus, pois é Ele quem rege o mundo através destes dois 
poderes, a igreja e a educação. Ressalta também que os estudantes 
pobres não sejam desprezados; incentiva as pessoas a doarem recursos 
fi nanceiros para que todas as crianaças frequentassem à escola.| História do cristianismo II | FTSA28
Na visão reformista de Lutero, sem a leitura, a alfabetização e o 
conhecimento — particularmente das Escrituras bíblicas — o povo 
permaneceria sob o poder de estruturas eclesiais burocráticas. Para 
promover a libertação em seu sentido pleno, era preciso um processo 
educacional abrangente que capacitasse para a leitura e a escrita. Enfatiza 
a necessidade da educação deixar de ser inacessível para a maioria da 
população. Sugere a criação de escolas comunitárias, administradas e 
fi nanciadas pelos cidadãos:
[...] Caros senhores. Anualmente é preciso levantar grandes somas para as 
armas, estradas, pontes, diques e inúmeras outras obras semelhantes para 
que uma cidade possa viver em paz e segurança temporal. Por que não 
levantar igual soma para a pobre juventude necessitada, sustentando um 
ou dois homens competentes como professores? (Lutero, 1995, p.305).
No que se refere à metodologia, Lutero propõe uma escola baseada 
em ideais humanistas, opondo-se aos castigos, insultos e deboches da 
educação antiga. Repreensão e punições não eram maneiras amáveis 
de se educar; as crianças deveriam aprender através do lúdico. Segundo 
Thomas Giles (1987), o reformador sugeriu um método educacional que 
consistia, primordialmente, no estudo das Sagradas Escrituras e, por 
conseguinte, das línguas hebraica e grega. Outras matérias deveriam 
complementar, visando a boa instrução: história, matemática, música 
e canto. Em 1528, Lutero organizou um novo projeto curricular, dividido 
em três níveis: aos iniciantes, aos já instruídos e aos que já tiveram 
êxito. Os iniciantes aprendiam o alfabeto, o Credo e o Pai Nosso. Aos 
já alfabetizados se designava o estudo da gramática latina, poesia de 
Plauto e Terêncio, fábulas de Esopo e textos de Erasmo. O terceiro nível, 
concedido aos melhores alunos, era composto por música, textos de 
Virgílio e Cícero, gramática, dialética, retórica e formação religiosa (Giles, 
1987, p.18-22; 120-121).
Sob tais perspectivas, e benefi ciado pelo advento da imprensa, o povo 
desenvolveu gosto e hábito pela leitura, o que facilitou e popularizou 
os escritos do reformador. Segundo Marc Lienhard (1998, p.49), com o 
29História do cristianismo | FTSA | 
movimento de reformas do século XVI, “pela primeira vez na história se 
operava uma aliança entre o material impresso e um movimento popular”. 
Os números são inaugurais: o Sermão sobre as Indulgências, por exemplo, 
vendeu 250 mil exemplares em quatro anos; o Manifesto à Nobreza 
Alemã vendeu 20 mil exemplares no ano de sua publicação. A tradução 
da Bíblia para o alemão contribuiu para a sistematização desta língua, 
de modo que passaram a existir uma gramática e um léxico. Conforme 
destacado por Alvori Ahlert (1996, p.49), a criação do Catecismo Menor 
contribuiu para a popularização da educação, visto que serviu de livro de 
alfabetização até o fi nal do século XVII.
Outro aspecto da infl uência do movimento da Reforma atingiu o culto. 
O uso de imagens como elemento de veneração no culto cristão tem 
origens nos primórdios do cristianismo medieval. A partir da liberdade 
religiosa proporcionada pelo imperador Constantino, e pela ofi cialização 
do cristianismo como religião do Estado, pelo imperador Teodósio, ainda 
no século IV, houve grande afl uência de novos adeptos à fé cristã. Muitos 
destes eram adoradores de deuses pagãos com altares adornados de 
imagens e ícones de devoção. Sem experimentarem uma conversão 
genuína e sem uma doutrinação bíblica devida, parte destes novos 
cristãos optou por conciliar antigos costumes sagrados com o novo 
culto. Desse modo, nos altares de antigos deuses foram gradativa e 
sutilmente sendo introduzidas imagens de líderes cristãos, confi gurando 
um sincretismo entre cristianismo simbolismos pagãos. Muitos destes 
deuses antigos eram protetores das cidades; em seus lugares cristãos 
colocaram imagens de santos protetores, conhecidos até hoje como 
“padroeiros” das cidades.
No período medieval, estes altares, muitos deles domésticos, foram 
adornados com relíquias (objetos sagrados) trazidos da Terra Santa (hoje 
Israel e Palestina). Muitos destes objetos eram venerados pela crença 
em seus poderes miraculosos.
Nem todos os cristãos medievais concordavam com isto. Surgiram, 
inclusive, movimentos iconoclastas. A palavra iconoclastia ou 
| História do cristianismo II | FTSA30
iconoclasmo vem do grego εικών (eikon) que signifi ca ícone, imagem, e 
κλαστειν (klastein), que signifi ca quebrar. Desse modo, etimologicamente 
o termo signifi ca "quebrador de imagem".
Um dos primeiros movimentos iconoclastas veio de fora da igreja: surgiu 
com os mulçumanos no século VII d.C., que orientados pela pregação de 
Maomé, atacavam igrejas cristãs e destruíam as imagens nela existentes
Por infl uência deste contexto, surgiu um forte movimento político-religioso 
iconoclasta na região de governo do Império Bizantino (parte sobrevivente 
do antigo Império Romano, no Oriente). Estes cristãos acreditavam que 
as imagens sacras seriam ídolos e a veneração e o culto de ícones, por 
conseguinte, uma idolatria. Esse movimento ocorreu durante os séculos 
VIII e IX. Em razão disto, as igrejas daquela região, conhecida a partir do 
ano 1054 como Igreja Ortodoxa, retiraram as imagens dos seus templos, 
inserindo em seu lugar apenas pinturas e símbolos.
A pregação da Reforma gerou interpretação pelos ouvintes por vezes 
carregadas de intolerância em relação às ideias ou práticas que se 
apresentavam como “diferentes”. Isto acabou levando a comportamentos 
radicais, inclusive quanto às expressões artísticas e símbolos culturais 
do período. Debates e tensões ocorreram em relação ao biblicismo e às 
manifestações simbólicas.
As ações iconoclastas atingiram não apenas as imagens religiosas, mas 
também a música e a arte. Em razão disto, o culto cristão reformando 
fi cou bastante centralizado na Palavra, como linguagem única, rejeitando 
a comunicação que possa se comunicar por símbolos.
No contexto atual, tem ocorrido com certa frequência comportamentos 
iconoclastas. No vídeo que mostraremos a seguir, há um episódio que 
ganhou notoriedade no contexto brasileiro, envolvendo evangélicos e 
uma imagem de devoção popular. Um acontecimento que foi veiculado 
pela TV em rede nacional, ocasionando grande polêmica, episódio que 
fi cou conhecido como “chute na santa”.
31História do cristianismo | FTSA | 
Assista ao vídeo reportagem do Jornal Nacional: Bispo 
Sergio Von Helde chutando a imagem de N. S. Aparecida.
Acesse o AVA para assistir ao vídeo!
Exercício de Reflexão
Assista o vídeo que fala sobre a destruição de terreiros de culto 
de matriz africana, por evangélicos, e sua reconstrução por outros 
evangélicos (https://www.youtube.com/watch?v=Qco-71blqZ8)
Em seguida, construa um texto de refl exão considerando as 
seguintes questões:
1) Que avaliação é possível fazer sobre o comportamento dos
evangélicos que destruíram o local de culto de matriz africana?
2) Que avaliação é possível fazer sobre o comportamento dos
evangélicos que reconstruíram o local de culto de matriz africana?
3) A Reforma do século XVI traz alguma mensagem de “tolerância”
para as práticas atuais?
Bibliografi a
AHLERT, Alvori. Modernidade. Ijuí: Inijuí, 1996.
BOURDIEU, Pierre. Leitura: uma prática cultural. In: CHARTIER, Roger (org.). 
Práticas da leitura. São Paulo: Estação Liberdade, 1996.
CALVINO, João. Apud WILES, J. P. As institutas da religião cristã – um 
resumo. São Paulo: PES, 1984.
CAVALCANTI, Robson. Cristianismo e política. São Paulo: Nascente, 1985.
| História do cristianismo II | FTSA32
DREHER, Martin. A crise e a renovação da Igreja no período da Reforma. 
Vol 3. São Leopoldo: Sinodal, 1996.
ECLÉSIA. Rio de Janeiro, ano 9, ed. 97, 2004.
LIMA, Eber F. Silveira. Paulo, os pré-reformadores e nós: meditação a 
propósito dos 471 anos da Reforma Protestante. Londrina – PR: NP, 1988.
LITURGIA LUTERANA. Porto Alegre: Casa Publicadora Concórdia, 1987.
PROENÇA,Wander de Lara. Cruz e ressurreição: a identidade de Jesus 
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Carlos; KOHL, Manfred (orgs.). Educação teológica transformadora. 
Londrina: Descoberta, 2004.
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Letras, 1991.
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Leituras complementares:
DREHER, Martin. A crise e a renovação da Igreja no período da Reforma. 
Vol 3. São Leopoldo: Sinodal, 1996, p. 53-57.
33História do cristianismo | FTSA | 
UNIDADE II – A reforma protestante e seus movimentos
Nos próximos tópicos, desta unidade, conheceremos melhor o 
contexto dos acontecimentos reformistas, as estratégias utilizadas, os 
personagens que protagonizaram ações de mudanças, as repercussões 
e reações ao movimento de Reforma, no século XVI. 
Veremos que, não obstante a fi gura de Lutero ser diretamente associada 
àqueles episódios — por sua liderança e ação impactante com a 
publicação das 95 teses, que se constituíram um marco muito simbólico 
das mudanças — evidentemente ele não está sozinho neste processo. Ao 
seu lado, há um número expressivo de outros personagens que ansiavam 
por transformações e foram protagonistas em diferentes lugares, 
usando variadas estratégias para que os objetivos de Reforma fossem 
alcançados. Destacam-se, por exemplo, de Philipp Melanchthon, Ulrico 
Zwínglio, Erasmo de Roterdã, João Calvino, dentre outros.
Todos estes líderes tiveram em comum, e nisto reside o êxito das reformas 
e mudanças, o uso da leitura da Bíblia como regra de fé e prática. O papel 
da leitura foi, portanto, elemento decisivo e determinante.
Conheceremos, também, que os movimentos de Reforma em dados 
momentos assumiram rumos violentos, desencadeando confl itos, 
guerras e até aplicação de penas de morte, ocasionando martírios entre 
cristãos membros de grupos antagônicos, que buscavam mudanças na 
igreja, mas que não souberam lidar com a tolerância ao “outro” que agia 
ou pensava de modo diferente.
Por fi m, também veremos que o catolicismo romano não assistiu 
passivamente ao avanço do protestantismo. Empreendeu reações, 
destacando-se como um marco de seu posicionamento a realização 
do Concílio de Trento, também conhecido como Contra-Reforma, que 
durou cerca de 18 anos. Conheceremos as principais resoluções que ali 
foram aprovadas e que marcariam a identidade católica pelos séculos 
subsequentes.
| História do cristianismo II | FTSA34
1. Líderes e movimentos de Reforma 
Nos movimentos de reforma do século XVI se destacaram outros 
personagens, além de Martinho Lutero. Felipe Melanchthon, por exemplo, 
era um humanista, considerado “Professor da Alemanha”, por ter sido 
importante pedagogo que contribuiu diretamente para a valorização da 
educação como um braço da Reforma Protestante; é autor de livros e 
textos, além de ser um dos redatores da confi ssão de fé luterana, conhecida 
como “Confi ssão de Augsburgo”, elaborada em 1530. Outro personagem 
é Erasmo de Roterdã, escritor holandês e teólogo agostiniano, que se 
tornou importante propagador das ideias humanistas. Tinha um grande 
respeito pessoal por Lutero e uma simpatia pelos pontos principais da 
crítica luterana à Igreja. Lutero sempre se referia a Erasmo com respeito 
pelo seu conhecimento teológico e esperava dele obter cooperação 
no trabalho reformista. Na troca de correspondência inicial, Lutero 
expressou admiração por tudo o que Erasmo tinha feito pela causa de um 
cristianismo saudável e razoável, encorajando-o a se unir ao movimento. 
Entretanto, Erasmo não via a saída ou ruptura com a Igreja romana 
como o caminho ideal; queria nela permanecer para modifi cá-la. Quis 
evitar alguma hostilidade em relação à organização institucional, ainda 
que buscasse meios de aplicar seus conhecimentos na purifi cação da 
doutrina católica.
A seguir, veremos com mais detalhes um outro importante líder daqueles 
acontecimentos.
1.1. Ulrico Zwínglio
Ulrico Zwínglio é quem inicialmente estabeleceu a Reforma na Suíça de 
língua alemã. Por causa de algumas divergências teológicas com Lutero, 
as igrejas sob sua liderança e pastoreio, que diziam ser suas fi lhas 
espirituais, passaram a se chamar “reformadas”, para se diferenciar das 
que eram “luteranas”. 
35História do cristianismo | FTSA | 
Leia, como introdução, e a título de curiosidade, o texto no box a seguir:
Saiba mais
A Faculdade Teológica Sul Americana fi ca na esquina das ruas 
Martinho Lutero e Ulrico Zwínglio, na Gleba Palhano, em Londrina. 
Apesar de nunca se debater intencionalmente a intersecção 
teológica de Lutero e Zwínglio, neste ano em que se celebra os 
500 anos da Reforma, não deixa de ser sugestivo e pertinente 
relembrar que na história da Reforma, de fato, houve um, e único, 
encontro entre Lutero e Zwínglio na tentativa de aproximar 
dois importantes e independentes movimentos reformadores, 
e indagar sobre o sentido desse encontro e o que isso pode 
representar para a continuação do debate teológico em torno 
da presença de Cristo no sacramento, na igreja e na sociedade 
(Lane, 2014, p.60)
Há autores que estabelecem uma principal diferença entre Lutero e 
Zwínglio: enquanto para Lutero a motivação para Reforma foi muito 
mais religiosa, para Zwínglio teria sido muito mais intelectual. O escritor 
Thomas Lindsay, por exemplo, afi rma que 
Até em idade bem avançada a questão da piedade 
pessoal [de Zwínglio] não parecia perturbá-lo, e ele 
nunca foi como Lutero e Calvino, o tipo de homens que 
são líderes de um avivamento religioso. Ele se tornou 
reformador porque era um humanista, que gostava da 
teologia de Agostinho (apud Lane, 2014, p. 61).
Saiba mais sobre quem foi Zwínglio e seu posicionamento teológico nas 
palavras de Justo Gonzales:
Zwínglio, por outro lado, tinha sido ordenado padre em 
1506 e por vários anos pastoreou a paróquia de Glaurus 
até ser transferido para Zurique em 1519. Zwínglio 
era um estudioso e provavelmente o mais humanista 
| História do cristianismo II | FTSA36
dos reformadores. Foi através de seus estudos que 
passou questionar práticas da igreja. Em 1516, quando 
Erasmo de Roterdã publicou o Novo Testamento 
Grego, Zwínglio teve um encontro com ele e leu todo 
o NT em grego. Como cura (clérigo, pároco) da cidade 
de Zurique, na Suíça, iniciou uma série de leituras e 
pregações sobre o evangelho de Mateus e passou a 
criticar o jejum, a abstinência, o celibato, a doutrina do 
purgatório e outros aspectos doutrinários (Klein, 2014, 
p. 64). Diferentemente de Lutero, que defendia que as 
práticas e tradições da igreja que não contradissessem 
as Escrituras podiam ser mantidas, Zwínglio defendeu 
uma Reforma eclesiástica baseada no princípio de 
que tudo o que não fosse explicitamente expresso nas 
Escrituras tinha de ser abolido (1983, p. 93). 
A história registra que, não obstante as particularidades do contexto 
político e religioso da Alemanha e da Suíça, onde viviam Lutero e 
Zwínglio, das características próprias de cada um e da independência 
dos movimentos reformadores, houve uma tentativa de aproximação dos 
movimentos liderados por estes dois reformadores.
O encontro dos dois se deu por meio de um debate que 
foi conhecido por Colóquio de Marburgo. O encontro 
foi convocado por Filipe I para tratar das diferenças 
entre Lutero e Zwínglio sobre a presença de Cristo na 
Ceia ou Eucaristia e outras questões. No entanto, essa 
tentativa de aproximação de Wittenberg e Zurique não 
resultou numa síntese e unidade dos dois importantes 
movimentos reformadores da época. Pelo contrário, 
apesar de concordarem com 14 dos 15 artigos sobre 
a fé cristã, não chegaram a um consenso sobre a 
presença de Cristo na Ceia. Isso foi o sufi ciente para 
mantê-los à parte (Lane, 2014, p.61).
37História do cristianismo | FTSA | 
A diferença básica entre os dois posicionamentos, 
em relaçãoà Ceia eucarística, pode ser resumida nos 
seguintes termos: para Lutero, havia uma presença 
espiritual de Cristo nos elementos do pão e do vinho, 
posição esta que é denominada de consubstanciação; 
para Zwínglio, o pão e o vinho na celebração eucarística 
eram apenas um memorial da morte e paixão de Cristo 
(“fazei isto em memória de mim”), ou seja, ele não se 
fazia presente por meio dos elementos.
Glossário
Transubstanciação eucarística: concepção do catolicismo, segundo 
a qual, o pão e o vinho se transformam em corpo e sangue de Cristo 
na cerimônia da Ceia (um novo sacrifício se repete).
Consubstanciação eucarística: concepção luterana, segundo a qual, 
há apenas uma presença espiritual de Cristo por meio dos elementos 
do pão e vinho (a presença espiritual está consubstanciada aos 
elementos materiais)
Memorial eucarístico: concepção zwingliana e calvinista, segundo 
a qual, o pão e o vinho são apenas lembranças ou memória de 
Cristo em sua morte salvífi ca (os elementos apenas representam a 
presença de Cristo)
1.2. Thomas Müntzer e os anabatistas
O anabatismo foi um movimento liderado pelo teólogo e também 
camponês, Thomas Müntzer, no contexto da Reforma do século XVI. Foi 
característica enfática deste movimento a leitura e interpretação literal 
de textos bíblicos. Esse movimento assumiu perspectivas de maior 
radicalidade em relação aos perfi s de mudanças propostos por outros 
líderes daquele período, como Lutero, Zwínglio e Calvino. Müntzer e seus 
| História do cristianismo II | FTSA38
seguidores, que eram camponeses, buscavam rupturas mais contundentes, 
como por exemplo, a distribuição comunitária da terra, sem que ninguém 
fosse dela proprietário. Fundamentaram tal perspectiva na leitura bíblica: 
nos textos referentes ao período dos juízes, em que a terra de Canaã foi 
distribuída entre as tribos; também no texto de Atos 2:44,45 que afi rma: 
“Todos os que creram estavam juntos e tinham tudo em comum. Vendiam 
as suas propriedades e bens [...]”. Pregavam uma grande renovação que 
culminaria com intervenção divina para o estabelecimento de um reino 
milenarista, a ser instaurado em favor dos eleitos. 
Podemos dizer, grosso modo, que os anabatistas foram “fi lhos bastardos 
da reforma”, não para reforçar o teor pejorativo dessa declaração, mas 
para destacar o lado crítico e periférico de sua relação com os demais 
movimentos reformadores. Enquanto “fi lhos da reforma”, os anabatistas 
endossaram alguns dos preceitos nela estabelecidos, como o do apreço 
pela autoridade das Escrituras. Segundo Earle Cairns (1995, p. 248), “a 
insistência de Zwínglio na Bíblia como fundamento da ação dos pregadores 
encorajou a formação de conceitos anabatistas baseados na Bíblia”. 
Cedo, porém, eles fi caram conhecidos mais por suas discordâncias do 
que por pontos de concordância com a Reforma. O princípio de sola 
Scriptura não era mais sufi ciente, especialmente quando, na prática, 
não havia sido capaz de confrontar certas estruturas temporais. Um 
aporte mais radical começou a ser desejado por alguns espíritos menos 
conformados. Conforme o olhar de Bard Thompson, eles começaram a 
suspeitar da idéia de um corpus Christianum em torno do qual toda a 
sociedade, inclusive os “mornos na fé”, seria reunida. Também passaram 
a duvidar da integridade da “Reforma Magisterial” (mais focada no 
ensino), qual seja, a de Lutero, Zwínglio, Calvino ou da Igreja da Inglaterra, 
no qual o papel dos ministros não muito se diferenciava do papel do 
padre na Igreja Católica (centralizador), e em que a autoridade secular 
(Estado) seria uma expressão da divina providência sobre a criação. 
O primeiro foco de aparecimento desse descontentamento se deu na 
Suíça, talvez em função da, até então, ligeira liberdade civil e religiosa 
39História do cristianismo | FTSA | 
que se encontrava no país. No início, associaram-se a Zwínglio por sua 
ênfase na autoridade das Escrituras e pela reforma social mais ampla por 
ele proposta. Depois entenderam que seu endosso ao ensino primitivo 
do batismo infantil, bem como sua prudência, patriotismo e “atraso” (do 
ponto de vista dos descontentes) em relação a mudanças mais radicais 
eram um impedimento sério para o avanço da reforma em outras frentes, 
como a abolição da missa, o uso de imagens e o papel das autoridades em 
questões religiosas. Assim, por volta de 1523, concluíram que a liderança 
de Zwínglio era um tanto quanto “conservadora”, resolvendo dele se afastar, 
não somente nas idéias, como na prática (Walker, 1981, p. 40). 
Começaram se reunindo em pequenas convenções para estudo da 
Palavra, ou nas casas onde se tinha maior liberdade para a pregação 
e um discipulado pessoal. Assim, no outono de 1524, Grebel e seus 
correligionários passaram a rejeitar a coleta dos dízimos, que eram 
recolhidos pelo Estado para suporte dos ministros e outras questões, 
e, principalmente, aboliram o batismo infantil de seu meio. Para os 
anabatistas, o batismo era o distintivo do discipulado e compromisso 
cristão. E como somente um adulto seria capaz de se comprometer 
de tal maneira, então somente o batismo adulto poderia ser legítimo. 
(Menezes, 2014, p.33-34)
O movimento Anabatista envolveu questões não apenas religiosas, 
em relação à Igreja Romana e mesmo quanto à Igreja que nascia com 
a Reforma; a pregação deles tinha também implicações sociais: eram 
camponeses que desejavam o direito de viverem integrados à terra 
onde trabalhavam, alegando que o mundo criado pertence a Deus, não 
devendo portanto ser propriedade de senhores ou príncipes, os quais, 
em razão disto, também não poderiam cobrar tributos pelo que na 
terra era produzido; a pregação anabatista tinha implicações políticas: 
questionavam o poder de reis e príncipes, pois o governo a ser instaurado 
em breve na Terra, de acordo com suas interpretações escatológicas, 
seria de natureza Teocrática (um governo de Deus). Com este cenário 
confl ituoso, “não tardaria para que se iniciasse uma verdadeira ‘caça às 
bruxas’ em relação aos anabatistas” (Menezes, 2014, p. 34). 
| História do cristianismo II | FTSA40
Saiba mais
Perseguição e martírio
Em 7 março de 1526, o conselho municipal de Zurique publicou um 
edito no qual se previa a prisão e morte daqueles que praticassem os 
atos de rebatismo. Em 19 de novembro do mesmo ano, o conselho 
aprovou uma nova lei, que não somente condenava à morte os 
praticantes do rebatismo, como estendeu tal pena aos que pregassem 
ou simplesmente atendessem às pregações anabatistas. 
Conrado Grebel, que fora um dos primeiros líderes do movimento, 
faleceu na prisão no verão de 1526, vítima da peste. Experimentou 
o princípio da perseguição e capturas, mas não do martírio
(assassinato). Já Félix Manz não teve a mesma “sorte”. Como
primeiro mártir do movimento anabatismo, morreu afogado no
rio Limmat em 5 de janeiro de 1527. Alguns pesquisadores viram
nesse tipo de morte, que se seguiu em muitos outros casos
de martírio anabatista, um tipo satírico, como se os algozes
dissessem: “Gosta de água? Então, toma!”.
Conforme se intensifi cava a perseguição, a tendência de alguns 
grupos anabatistas foi a de se exilar em outras regiões que, ao 
menos de início, se mostravam mais tolerantes. Blaurock, por 
exemplo, por não ser cidadão de Zurique, foi condenado ao exílio 
perpétuo, após ter sido açoitado pelas ruas da cidade. 
Caso similar foi o de Baltasar Hubmaier, sacerdote de um povoado 
austríaco chamado Waldschut, que, depois de ter (re)batizado sua 
paróquia quase inteira, teve de se exilar “voluntariamente” na região 
da Moravia, mais precisamente em Nicolsburgo. Após vivenciar 
problemas, como a controvérsia local entre os anabatistas não 
violentos e outros, sob a liderança de Hans Hut, que apregoava a 
não obediência à violência e o pegar em espadas se preciso fosse, 
Hubmaier foi capturado, conduzido a Viena e, depois de sessões de 
tortura e interrogatório, foi condenado por heresia e sedição e queimado 
vivo em praça pública. Sua esposa foi afogada poucosdias depois (cf. 
Byler, 2000, p. 05; Driver, 2000, p. 08) (Menezes, 2014, pp. 36-37).
41História do cristianismo | FTSA | 
Perseguido, o movimento se expandiu e na cidade de Zwickau se juntou 
a um outro ramo anabatista, acentuadamente carismático e totalmente 
leigo. Seus membros, com interpretações bíblicas bem peculiares, 
diziam ter experiências diretas com o Espírito Santo e pretendiam erigir 
o reino de Deus eliminando todos os não-crentes. Sob tal infl uência, 
Müntzer se sentiu chamado a fundar a Nova Igreja Apostólica. Guiado 
por interpretações de profecias do livro de Daniel, Müntzer entendeu, no 
ano 1525, que a hora do novo reino era chegada. Passou a convocar o 
povo para a “luta do Senhor”, para a guerra santa. Mobilizou inúmeros 
camponeses que não se furtaram a pegar em armas (espadas) com 
intuito de apressar o grande advento mediante a “batalha do Armagedom”, 
o que culminou em violenta guerra religiosa. Müntzer ordenou, na partida 
para a batalha, que levassem uma grande bandeira branca, na qual 
estava desenhado o arco-íris, sinal da aliança de Deus com os eleitos. 
Enquanto proferia sua última pregação, apareceu no céu o arco-íris. Era 
o sinal que faltava da bênção divina para aquela hora fi nal. Na batalha 
morreram milhares de camponeses. Müntzer foi aprisionado, torturado 
e decapitado em 27 de maio de 1525. Suas últimas palavras foram de 
apelo à leitura bíblica: “leiam o livro dos Reis”.
Sufocado, por um tempo, entre 1533-1535 o movimento ressurgiu em 
outras regiões da Alemanha, ocasionando, inclusive, a tomada de uma 
cidade e a implantação do que seria um novo reinado davídico na Terra. O 
novo líder era Melchior Hoffman, refugiou-se em Estrasburgo se dizendo o 
novo Elias. Anunciava o fi m do mundo para 1533, dizendo que Estrasburgo 
seria a Nova Jerusalém. Foi perseguido, fugiu, mas no ano marcado voltou 
para ver o fi m do mundo. Foi então preso, onde permaneceu até morrer 
em 1543. Houve um sucessor, Jan de Leyden, alfaiate. Com o auxílio de 
anabatistas tomou a cidade de Munster, em 1534. Proclamou-se rei da 
Nova Sião. Dizia-se o terceiro Davi. Implantou três práticas: a comunhão 
de bens; ritos do Antigo Testamento; poligamia. Depois de uma revolta 
católica, a cidade foi invadida e os líderes anabatistas mortos.
| História do cristianismo II | FTSA42
Na Holanda, ramifi cações anabatistas ressurgiram sob a liderança de 
Menno Simons (1496-1561), dando origem ao movimento Menonita, ou 
dos “Irmãos Menonitas”, progenitores da futura igreja Batista que surgiria 
na Inglaterra, no século XVII. 
Diante de tantas perseguições e ameaça de extinção, o grupo dos 
anabatistas fi cou mais uma vez disperso pelas muitas regiões por onde 
havia se espalhado. Um dos grupos que conseguiu sobreviver foi o 
dos Menonitas. Esse nome foi derivado de seu líder e responsável pela 
“renascença do Anabatismo”, o holandês Menno Simons (1496-1561). 
Menno serviu como sacerdote católico em sua terra natal, Friesland 
ocidental, até que se convenceu de que essa Igreja, Lutero, Zwínglio e 
Calvino estavam errados, especialmente no consenso quanto ao batismo 
infantil, e que apenas o batismo adulto tinha base nas Escrituras. Foi 
então batizado (renunciando sua matriz católica) e passou a atuar como 
ministro anabatista. Segundo Thompson (1996), Menno foi o maior 
teólogo da tradição anabatista, defendendo um anabatismo biblicamente 
fundamentado, e tendo publicado em 1540 sua obra “Fundação da Doutrina 
Cristã”, que serviu como meio de estabelecimento de sua autoridade 
perante os anabatistas no norte da Europa. Devido à perseguição e 
ameaça de morte, viveu na clandestinidade por muito tempo, tendo de se 
mudar várias vezes, embora tivesse esposa e fi lhos; passou por Bélgica, 
Dinamarca e Polônia, ajudando a organizar comunidades ali. E, de acordo 
com Byler (2000, p. 07), apesar dos 100 fl oríns (moeda holandesa na 
época) oferecidos em ouro por sua cabeça, “Menno foi um dos únicos 
anabatistas de sua geração que morreu em sua própria cama, já idoso. 
Sua mulher e seus três fi lhos não puderam sobreviver à dureza da vida de 
pródigos”. (Menezes, 2014, pp. 38-39)
2. Grupos e contexto social da Reforma
Neste tópico, destacaremos dois grupos sociais que marcaram o contexto 
da Reforma no século XVI: os judeus e as mulheres.
43História do cristianismo | FTSA | 
2.1. Os judeus
Os judeus eram alvo de hostilidade no mundo medieval cristão. O 
antijudaísmo, que se estendeu até o período da Reforma, atingira proporções 
amplas naquela sociedade. Segundo o historiador Jean Delumeau 
(1989, p.279), eram acusados de “Usurários ferozes, sanguessugas dos 
pobres, envenenadores das águas bebidas pelos cristãos”. Vistos como 
pessoas rejeitadas por Deus por negar Jesus e crucifi cá-los; acusados de 
deicidas (os que “mataram Deus”); denunciados pelo assassinato ritual 
de jovens cristãos em rituais, inclusive crianças, também de profanação 
da hóstia eucarística —vilipendiavam a hóstia no intuito de derramarem 
novamente o sangue de cristo, matando-o novamente —; suspeitos de 
envenenarem poços de água. O IV Concílio de Latrão, realizado em 1215, 
exigiu, por exemplo, que os judeus usassem distintivos amarelos para 
serem facilmente identifi cados; tiveram que concentrar sua habitação 
em burgos (regiões separadas ou segregadas). Eram discriminados e 
foram expulsos de vários países.
No período da Idade Média Tardia e início da Moderna fl oresciam vários 
temores e várias acusações contra os judeus, que em dados momentos 
foram colocados à margem da sociedade. Essas acusações fi zeram 
com que medidas anti-judaicas tomassem moldes mais violentos, o 
que gerou a morte ou expulsão dos pertencentes a este grupo social de 
vários territórios. [...] No fi m da Idade Média e início da Idade Moderna 
aumentaram as acusações contra os judeus e o medo que se tinha 
deles esteve mais presente em âmbito religioso, uma vez que foi muito 
alimentado pela Igreja; esta desempenhou grande esforço em provar 
sua forte dominação frente ao judaísmo, por isso houve tentativas de 
destruir todas as bases de religião judaica, assim como todos os seus 
praticantes, feitas através de expulsões, mortes e todas as maneiras de 
segregação (Silva, 2014, p. 36,39).
 O pesquisador Carter Lindberg afi rma que “Inicialmente Lutero se afastou 
do legado antijudaico da Idade Média. Em seu panfl eto Que Jesus Cristo 
foi um judeu nato, de 1523, ele enfatizou que Deus honrou os judeus 
| História do cristianismo II | FTSA44
acima de todos os povos e que por isso, os cristãos deveriam tratar os 
judeus de modo fraterno” (2001, p.435).
Em seus primeiros escritos, Lutero defendeu os judeus, considerando-os 
como parte de um projeto divino, enxergando uma possibilidade de convertê-
los à fé cristã, devendo por isso serem levados amorosamente a Cristo.
O primeiro escrito analisado é também o primeiro que foi redigido por Lutero: 
Que Jesus Cristo foi um judeu nato, de 1523. Nesse texto ele está escrevendo 
em prol dos judeus e usa de vários argumentos para defendê-los. Foi escrito 
com a fi nalidade de apresentar uma defesa frente a alguns rumores que 
haviam sido levantados sobre ele. Isto é o que ele começa dizendo no texto, 
e também diz que aproveitará desse texto para escrever algo de útil:
Uma vez que para o bem dos outros, no entanto, sou obrigado a responder 
a essas mentiras, eu pensei que eu iria também escrever algo de útil, 
além disso, para que eu não vá roubar o tempo do leitor com tal negócio 
sujo (Lutero, [S.l.: s.n., 15--]).
Em seguida ele dá início aos vários de seus argumentos em defesa 
dos judeus. Primeiramente, ele demonstra a esperança de converter 
alguns deles e tece uma crítica ao papado, chegando a afi rmar que: 
“Se eu tivesse sido um judeu e tivesse vistos esses imbecis e idiotas 
governarem e ensinar a fé cristã, eu preferiria ter me tornado um porco 
do que um judeu” (Ibid.). No fi nal ele oferece conselhos de como lidar 
com os judeus, sempre de forma positiva, e afi rma que os

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