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História e Cultura Afro-brasileira e Indígena - completo

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HISTÓRIA E CULTURA 
AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA
Prof. Me. Karla Katherine de Souza Seule
005 Aula 1: O Berço da Humanidade
016 Aula 2: Pré-História Africana
027 Aula 3: A África na Antiguidade
040 Aula 4: Reinos Africanos na Idade Média
050 Aula 5: A África na Modernidade
062 Aula 6: A África na Contemporaneidade
074 Aula 7: Africanos no Brasil – da Escravidão à Abolição
084 Aula 8: Movimento Negro
096 Aula 9: Nossas heranças africanas
109 Aula 10: História da África e Historiografia Africana
121 Aula 11: Os povos indígenas do Brasil 
136 Aula 12: Questão indígena no Brasil Colonial
148 Aula 13: Questão indígena no Império e República
159 Aula 14: Nossas Heranças Indígenas
173 Aula 15: Os Povos Indígenas no Brasil Contemporâneo
182 Aula 16: O Brasil e o Mito da Democracia Racial
002
Introdução
Olá, caro(a) aluno(a), é com imenso prazer que convido você a percorrer-
mos um breve, mas intenso percurso da história de africanos e dos povos 
indígenas e suas formações culturais e sociais, bem como as contribuições 
que tiveram para a nossa formação enquanto povo brasileiro. Ao longo de 
16 aulas, faremos um trajeto pelas temáticas importantes para o nosso 
autoconhecimento enquanto povo que foi constituído com a participação 
ativa e efetiva desses povos. E para compreender esses papéis, é necessário 
conhecer melhor suas histórias e modos de vida e, desse modo, as raízes 
que eles plantaram no germinar e florescer de nossa identidade enquanto 
brasileiros.
Para tanto, começaremos percorrendo rapidamente uma história africana. 
Isso é essencial, pois foi na África que a humanidade deu seus primeiros 
passos no planeta. Assim, será possível ver como, a partir de sua trajetória 
nesse continente, os seres humanos se espalharam para demais espaços 
do globo terrestre. Em seguida, analisaremos ao longo da história como 
sociedades foram formadas por diferentes povos em territórios africanos. 
Desse modo, será possível desmistificar uma ideia – muitas vezes gerada 
por ignorarmos a real situação da vida na África – de que o continente afri-
cano foi uma porção isolada ao longo da Antiguidade até a Era Moderna e 
as Grandes Navegações dos séculos XV e XVI. Vamos, então, conhecer vários 
povos e reinos importantes para uma dinâmica interna e externa à África.
Seguiremos nosso caminho analisando como o tráfico Atlântico de escravos 
modificou a dinâmica e a vida de muitos africanos, e como ela os inseriu 
em nossa formação desde os tempos coloniais, afetando também a sua 
trajetória por aqui durante a escravidão e depois da abolição. Desse modo, 
também será importante analisarmos o papel que o Movimento Negro teve 
por aqui e mundo afora no combate aos efeitos que o racismo sobre as po-
pulações negras afrodescendentes tem deixado, do passado até o presente. 
Mas ainda: observaremos como em meio à resistência aos diversos abu-
sos e autoritarismos a que foram submetidas às populações africanas que 
para cá foram trazidas, ainda assim, elas acabaram por contribuir na nossa 
formação e nos deixou diversas heranças que precisamos reconhecer, pois 
muitas vezes nos passam despercebidas e não lhes damos a devida impor-
tância na constituição de nossa essência enquanto povo.
003
Continuaremos abordando quem foram os indígenas que habitavam o nosso 
território à época da chegada dos portugueses e como eles também possu-
íam e ainda detêm uma diversidade grandiosa de costumes e maneiras de 
se organizarem. Em seguida, observaremos como em meio aos encontros 
com o colonizador português esses diferentes povos foram tratados de for-
ma violenta e homogeneizante. Para tanto, vamos buscar conhecer quais 
políticas foram implantadas em relação a essas populações desde os tempos 
coloniais até a atualidade. Poderemos, assim, conhecer suas formas de vida e 
resistência, bem como as nossas raízes indígenas - que também ignoramos, 
mas que fazem parte de nosso jeitinho brasileiro de ser.
Encerraremos o nosso trajeto abordando como todos esses povos, indígenas 
e africanos, que fizeram parte de nossa história e formação enquanto povo, 
estiveram permeados de situações que muitas vezes os colocaram como 
marginais na sociedade brasileira. Discutiremos, a partir daí, como um mito 
de que no Brasil existiu e existe uma democracia racial, acaba forjando uma 
noção errônea de porque essas populações ainda ocupam papéis desiguais 
na situação socioeconômica do país. 
São discussões necessárias e instigantes, que não se esgotarão de forma 
alguma neste breve caminho que faremos, mas espero que suscitem um 
maior interesse e que, a partir delas, você busque mais informações e co-
nhecimentos a respeito. 
Vamos lá?
004
01
África: o Berço 
da Humanidade
005
Caro(a) aluno(a), convido você a caminhar comigo pela formação do continente
africano e consequentemente do iniciar da história humana. A�nal, a África é o berço
da humanidade, ou seja, onde demos nossos primeiros passos no planeta e
começamos a nossa trajetória enquanto uma das espécies que o integra.
Começaremos o nosso caminho na busca por entender quais os aspectos geográ�cos
gerais desse continente gigantesco que é a África, e ao mesmo tempo diverso, onde a
vida de nossa espécie teve início, para que compreendamos por que o início da
humanidade se deu ali, bem como a partir de então se abriram rumos a novos
percursos e múltiplas situações que, no transcorrer do tempo, sofreram diversos
desdobramentos dentro e fora de África.
Quem é a África?
Pois bem, comecemos o nosso percurso compreendendo as características gerais que
dão forma material a este continente, pois alguns dos “segredos” que buscamos para
desvendar o porquê de a humanidade ter iniciado sua trajetória no planeta ali tem
suas respostas reveladas nas características que o fundamentam.
A África é a porção mais antiga de terra do planeta, cuja formação geológica remonta a
3,6 bilhões e 300 milhões de anos. Sua enorme extensão territorial abarca 30.343.511
km², que equivale a 22% da superfície da Terra, onde encontramos enorme variedade
ambiental. Como pontuou Macedo (2014), a antiguidade desse continente lhe legou
diversas massas rochosas. Essas massas são denominadas cratões e ocupam mais da
metade da superfície do continente africano, e nelas contêm formações minerais
riquíssimas em ouro, diamantes, platina e outros metais raros, além de inúmeras
jazidas de petróleo.
Seu território é dividido em cinco macrorregiões: África do Norte ou Setentrional,
África do Sul ou Meridional, África Ocidental, África Oriental e África Central. Ao longo
da extensão do continente africano, encontramos ambientes diversi�cados.
006
Subdivisões da África para �ns estatísticos usados pela ONU.   África Setentrional
(norte) (físico-geogra�camente, a Península de Sinai, no Egipto, pertence ao Médio
Oriente, região da Ásia).   África Ocidental   África Central   África Oriental   África
Meridional (sul) | Fonte: Disponível aqui
Na África, encontramos regiões de deserto tais como o Saara e áreas de �orestas
tropicais e equatoriais, bem como de savanas. Encontramos ainda rios grandiosos,
como o Nilo, o mais extenso do mundo, com 6.650 quilômetros, entre outros rios
extensos tais como o Níger e o Zambeze.
007
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=546265
Deserto do Saara| Fonte: Disponível aqui
Margem esquerda (ocidental) do rio Nilo, entre Edfu e Com Ombo| Fonte: 
Disponível aqui
008
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=2175927.
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1529650
Parque Nacional de Serengueti, na Tanzânia – região de savana | Fonte:  
Disponível aqui
Desse modo,como Macedo (2014) observa na composição da superfície, a plataforma
do continente africano era diferente das demais existentes no planeta, enquanto a
primeira a se desprender da Pangeia. Logo, teve primeiro as condições para iniciar ali
formas de vida, incluindo a humanidade.
E foi no interior dessa porção continental mais antiga que a vida humana teve início e
tanto se diversi�cou. Sendoassim,convido você a continuar nosso trajeto ao longo do
surgimento do ser humano na África e os desdobramentos dessa história. Vamos lá?!
O surgimento do homem
em África
Para começar esta fase de discussão sobre o início do processo evolutivo da espécie
humana há cerca de 4,5 milhões de anos, devemos compreender que, dadas as
condições de vida na África terem iniciado primeiro, espécies animais ali foram se
desenvolvendo. Entre elas, encontramos os mamíferos.  
009
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=2612602
Dentre os mamíferos, desenvolveram-se os primatas, que dariam origem aos macacos
e hominídeos – esses últimos, os nossos ancestrais:
Os primatas classi�cam-se em prossímios e símios.   O homem
pertence a este segundo grupo, que se caracteriza por um aumento
da estatura, pelo deslocamento das órbitas na face e consequente
melhoria da visão, e pela independência das fossas temporais.
(UNESCO, 2010, p. 448).
São nos fósseis símios dos últimos 30 milhões de anos que os pesquisadores têm se
dirigido pra escrever a história dos hominídeos, ou seja, a história dos primeiros
humanos. Isso porque é nesse ínterim que foram formadas as características que
marcam o gênero Homo:
Locomoção sobre os membros posteriores com as consequentes
transformações dos pés, das pernas, da bacia,   da   orientação   do
 crânio,  das  proporções  da  coluna  vertebral; desenvolvimento da
caixa craniana; redução da face; arredondamento da arcada
dentária; redução dos caninos; curvatura do palato, etc. (UNESCO,
2010, p. 448).
O primeiro hominídeo, o Australopithecus, cujo fóssil mais antigo do qual temos
registro, viveu há cerca de 3 milhões de anos e foi apelidada de “Lucy”, foi localizado
em território que hoje pertence à Etiópia, na região que compõe o chamado Rift Valey
(ou vale do Rift).
010
O vale do Rift e o Triângulo de Afar (em rosa escuro)| Fonte: Disponível aqui
Essa espécie tem algumas características essenciais que lhe dão a de�nição de nosso
ancestral primordial, pois tem pés e mãos modernas, “cérebro com nítido aumento de
volume, caninos pequenos e face reduzida” (UNESCO, 2010, p. 448). Pesquisas
realizadas no decorrer do século XX, mais precisamente entre os anos de 1930 e 1970,
por grupos franceses e estadunidenses, limitaram a área de distribuição do
Australopithecus às regiões oriental e meridional da África.
011
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=37695246.
Esqueleto e o modelo de restauração de Lucy exibidos no Museu Nacional de Ciência
do Japão | Fonte: Disponível aqui
Reportagem completa: Disponível aqui
Estima-se que Lucy - também chamada "Dinknesh"- tenha vivido há 3,2
milhões de anos. Quando os seus ossos fossilizados foram escavados
em 1974, ela foi aclamada como o mais antigo humano primitivo - ou
hominin - já encontrado. Os cientistas encontraram 40% dos seus ossos,
o que fez deste o esqueleto mais completo de uma antiga espécie
humana encontrada. Lucy pertencia a uma nova espécie que recebeu o
nome cientí�co de "Australopithecus afarensis". Ao estudar Lucy, os
cientistas aprofundaram seus conhecimentos sobre a evolução
humana, por exemplo, em relação à forma como esses hominins se
deslocavam.
012
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=25045173.
https://www.dw.com/pt-002/lucy-o-f%C3%B3ssil-que-reescreveu-a-hist%C3%B3ria-da-humanidade/a-42478592
Homo habilis, o primeiro a usar ferramentas de pedra | Fonte:   Disponível aqui
Há cerca de 3 milhões de anos, a Terra passou por um novo ciclo de aquecimento,
quando ampliaram-se áreas de �orestas, fazendo subir o nível do mar em 30 metros
do atual que reduziram desertos, incluindo na África. Nesse cenário, surgiu o gênero
Homo, por volta de 2,5 milhões de anos atrás. (SOUZA, 2014). As características que
diferem o gênero Homo do Australopithecus são:
Aumento da estatura, melhoria na postura ereta, crescimento do
volume do cérebro, que, a partir da espécie mais antiga, pode atingir
800 cm³, e transformação da dentição com maior desenvolvimento
dos dentes anteriores em relação aos laterais, em consequência da
mudança do regime alimentar, de vegetariano para onívoro.
(UNESCO, 2010, p. 448).
A África então foi o berço do Homo Habilis. Esta espécie de hominídeo dispunha de
habilidades em “manipular artefatos e atuar sobre o meio natural”, como, por
exemplo, “fragmentos de osso ou lascas de pedra para abater outros animais, agindo
como predador, como caçador” (MACEDO, 2012, p. 14).
Esses elementos tornaram a África um espaço de grandes transformações e de�nições
que �zeram parte do processo de formação do ser humano:
013
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=9503636
Homo erectus, o primeiro a usar o fogo | Fonte:  Disponível aqui
Desde o mais remoto ancestral do gênero Homo, toda a aventura
humana se confunde com a África. Apenas ali se pode acompanhar o
processo completo de transformação dos primatas em homens.
(MACEDO, 2012, p. 15).
Além do Homo Habilis, o Homo Erectus – primeiro hominídeo a andar totalmente em
pé – e outras espécies do gênero Homo têm suas origens apontadas no continente
africano:
O aumento da estatura, a maior capacidade craniana, a compleição
mais robusta e o progresso tecnológico na fabricação de ferramentas
com o lascamento bifacial da pedra, conhecida como indústria
acheulense, são característicos dessa etapa evolutiva humana.
(SOUZA, 2014, p. 75).
Essa espécie de hominídeo teve alguns de seus membros ampliando seus territórios
para além da África, chegando ao Oriente Médio, outras partes da Ásia e também à
Europa.
014
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=9503611
E entre 400 mil e 100 mil anos atrás, também foram identi�cados na África os
primeiros exemplares de nossa espécie, o Homo Sapiens:
Acredita-se que os homens modernos tenham evoluído a partir de
grupos de homens arcaicos que permaneceram na África, já saindo
desse continente para ocupar outras terras na forma física atual
(Guégan, Prognolle & Thomas, 2008). Os novos viajantes, agora H.
sapiens, ou homens modernos, re�zeram muitos passos de seus
ancestrais, foram expostos a ambientes semelhantes e desa�aram
diferentes condições de saúde-doença. Dotados de tecnologias mais
so�sticadas, também tiveram maior vantagem na superação
adaptativa dos desa�os colocados diante da colonização do planeta
Terra. (SOUZA, 2014, p. 76).
Fonte: Disponível aqui
Os mais antigos fósseis já encontrados de seres humanos modernos
datam de 130 mil anos e foram localizados na África. E de todas as
espécies, o Homo sapiens sapiens foi a única que se espalhou e
conquistou os cinco continentes do nosso planeta.
Dotados de maiores capacidades adaptativas, o Homo Sapiens, os exemplares de nossa
espécie, conseguiu sobreviver às intempéries climáticas e em diferentes ambientes,
com diferentes características geográ�cas para além do clima, fazendo a continuidade
de seu percurso durar até os dias atuais, dentro e fora de África.
Como podemos ver, a nossa história enquanto ser humano está intimamente ligada à
história do continente africano. A�nal, os nossos antepassados começaram a sua saga
no planeta no interior desse continente e de lá começaram a ocupar outros espaços.
Portanto, esse trajeto que aqui iniciamos é muito intrigante e importante, pois ele nos
capacita a conhecer não apenas a história africana em seu início, mas a história
humana. Desse modo, demonstra como conhecer o desenvolvimento desse
continente é essencial para que compreendamos as raízes de nossa espécie e as
relações que manteve dentro e fora de África.
015
https://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia/pre-historia-2-o-surgimento-do-ser-humano-e-os-periodos-pre-historicos.htm
02
Pré-História Africana
016
Nesse momento, quero abarcar com você esse percurso inicial da história humana,
que comumente denominamos de Pré-História. Essa forma de periodizar a história foi
criada na passagem do século XIX para o XX, quando a ciência histórica tentava �rmar
seu status cientí�co. Desse modo, as fontes para o estudo da ação do homem aolongo do tempo, consideradas �dedignas, eram os documentos escritos, de
preferência o�ciais. Sendo assim, considerava-se que a História só teria início a partir
da invenção da escrita e, desse modo, tudo aquilo que acontecera antes seria
denominado pré-histórico.
Transformações afetaram o desenvolvimento da ciência histórica e os afazeres do
historiador. Novos sujeitos foram sendo incorporados nos estudos históricos,
buscando-se compreender melhor o homem ao longo do tempo. Para tanto, novas
fontes foram necessárias, e o auxílio de outras ciências tais como a arqueologia foram
muito importantes. Foi assim que chegamos ao homem antes da invenção da escrita,
ou seja, do período conhecido como Pré-História.
Destaca-se que, a partir de então, esse período deixou de ser visto com indiferença ou
pouca importância. Pelo contrário, conhecimentos a respeito do homem desde sua
gênese �zeram-se, e ainda fazem signi�cativos para que possamos conhecer as
relações humanas no presente. Como a História não é uma ciência só do passado –
mas que busca a compreensão dessa relação passado/presente –, investigar o modo
de vida do homem na pré-história ganhou fôlego e passou integrar o ofício do
historiador em sua busca por compreender a ação do homem ao longo do tempo
passado e presente.
Sendo assim, o uso de uma divisão tradicional da História (Pré-História, Idade Antiga,
Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea) e do termo “Pré-História”, são
apenas para �ns de localização temporal e não com o �m de desconsiderar a
importância de tal período para o conhecimento da trajetória humana ao longo do
tempo. Feitas essas considerações, é importante observar que essa etapa inicial da
história da humanidade, chamada de Pré-História, é dividida em duas principais fases:
o Paleolítico e o Neolítico.
Tomando então esses referenciais, nos desdobraremos sobre essas duas fases da Pré-
História africana. A�nal, o trajeto humano se iniciou nesse continente, e as
transformações na vida humana nesse espaço ao longo desses períodos
espalhadaram-se para dentro e para fora da África.
017
A África no Paleolítico
Na África, os primeiros grupos humanos foram desenvolvendo formas de sobreviver
por meio de novas tecnologias que eles inventavam. Quando há cerca de 1 milhão de
anos a.C. começaram as ondas migratórias para outros continentes, os primeiros
humanos levaram da África consigo conhecimentos e técnicas. Convido você a veri�car
agora quais adaptações o ser humano desenvolveu em território africano, ao longo do
Paleolítico. Vamos lá?!
O Paleolítico é a primeira fase do que se designou como período da Pré-História.
Também conhecido com Idade da Pedra Lascada, esse período se estendeu até cerca
dos 12 mil anos a.C. (DALAL, 2016). Nesse período, o ser humano vivia como caçador e
coletor, e somente em sua fase �nal é que o homem conseguiu o controle sobre o
fogo.
Em território africano, ao longo do Paleolítico, com o surgimento dos primeiros
hominídeos, no decorrer do paleolítico, diferentes espécies do gênero Homo criaram
habilidades de produzir ferramentas. A começar pelo Homo Habilis:
Os achados de seus ossos foram associados a ferramentas
rudimentares de pedra lascada, como choppers e chopping-tools, e
aos ossos de animais com marcas sugestivas de cortes ou quebras
intencionais, con�rmando um comportamento habilidoso
diferenciado e o uso regular de ferramentas fabricadas. (SOUZA, 2014,
p. 74).
Vivendo há cerca de 2 milhões de anos, seus fósseis não foram encontrados em
nenhum outro local do mundo além da África.
As evidências, segundo Souza (2014), nos fazem supor que os primeiros
representantes do gênero Homo tenham permanecido restritos ao território africano
por mais de 1 milhão de anos. Essa autora observa que sítios arqueológicos, com
artefatos de pedra lascada de tradição olduvaiense (referente ao sítio arqueológico
Garganta de Olduvai, na Tanzânia), nos indicam que indivíduos do gênero Homo
expandiram suas ocupações do interior ao norte da África e da África subsaariana.
018
A garganta de Olduvai| Fonte: Disponível aqui
019
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=930871
Seixo talhado, de tradição Olduvaiense | Fonte:   Disponível aqui
Fonte: Disponível aqui
Garganta do Olduvai, que dá nome a uma cultura (primeiras formas da
fabricação com pedras), situa-se ao norte da Tanzânia, próxima ao
Parque Nacional do Serengueti, cujas primeiras escavações foram
realizadas nos anos de 1950 pelo casal britânico Louis e Mary Leakey.
Os depósitos mais antigos da garganta de Orduvai possuem pouco mais
de dois milhões de anos e contém indústrias em pedra na Camada I que
recebem o nome de Olduvaiense (ou Modo I). Este tipo de indústrias
surgiu (há 2,6 milhões de anos) junto a outras formas primitivas de um
hominídeo – Paranthropus boisei.
020
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1707288.
http://www.dicyt.com/noticia/cenieh-explora-a-evolucao-de-duas-culturas-do-paleolitico-inferior-em-marrocos
Proto-biface próprio do Olduvaiense evoluído ou acheulense | Fonte: 
Disponível aqui
O Homo Erectus, com maior estatura e força física, foi o responsável por desenvolver
mais tecnologias com a fabricação de ferramentas com o lascamento bifacial da pedra,
classi�cada como indústria ou cultura acheulense (SOUZA, 2014).
Fonte: Disponível aqui
Duas culturas do Paleolítico Inferior assentaram-se na bacia de Ain Beni
Matar, próxima à cidade de Uchda (noroeste de Marrocos, próxima a
Argélia, a 150 quilômetros de Melilla). Nesta localidade, que na chegada
dos hominídeos era composta de uma paisagem de rios mais
caudalosos que os atuais e com maior pluviosidade, desenvolveram-se
as culturas olduvaiense e acheulense, indústrias caracterizadas pelo uso
de cantos talhados e bifaces, respectivamente, e se acredita que uma
sucedeu a outra cronologicamente.
021
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1892118
http://www.dicyt.com/noticia/cenieh-explora-a-evolucao-de-duas-culturas-do-paleolitico-inferior-em-marrocos
Micrólitos do período Mesolítico | Fonte: Disponível aqui
Com o controle do fogo, que além de servir para aquecer e cozer os alimentos abriu
espaço para os primeiros humanos desenvolverem novas tecnologias, tais habilidades
- junto com o desenvolvimento da linguagem - puderam ser transmitidas, levando às
primeiras formas culturais. Esses foram elementos da vida no Paleolítico que
ocorreram no continente africano.
Nesse processo, entre 15 mil e 12 mil anos a.C., mais precisamente no Mesolítico,
tivemos avanços por parte de nossos ancestrais no desenvolvimento de técnicas de
fabricação de artefatos e utensílios de pedra trabalhada, os chamados micrólitos
(MACEDO, 2012). Com lâminas cortantes, esses artefatos eram utilizados por
caçadores nos territórios atuais da Zâmbia, Namíbia e Angola, além do
desenvolvimento do uso do arco e da �echa.
022
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=14893932
Fonte: Disponível aqui
O Período Mesolítico corresponde ao período de transição pré-
histórica entre o Paleolítico (Idade da Pedra Lascada) e o Neolítico
(Idade da Pedra Polida). Essa transição aconteceu de forma lenta e
gradual, sendo o mesolítico o período que abrange essa mudança.
Continuaremos nosso percurso nos voltando para os desdobramentos que a vida
humana na África sofreu no período posterior ao Paleolítico. Vamos lá?!
A África no Neolítico
O Neolítico, que se estende de 12 mil a.C. até cerca de 2.500 a.C., também conhecido
como período da Pedra Polida, é a segunda fase do período pré-histórico. Foi ao longo
dessa fase da história humana que o homem desenvolveu práticas agrícolas e
pastoris, além de com o domínio já adquirido do fogo, ter conseguido aprimorar o
desenvolvimento de ferramentas e utensílios importantes para sua vida.
No Neolítico, mais precisamente com a última Era Glacial, tivemos mudanças
climáticas que �zeram os seres humanos buscarem novos modos de sobrevivência,
que deram início às primeiras práticas agropecuárias; passo essencial para a
transformação dos primeirosgrupos nômades em sedentários, cujo alimento não
precisava mais ser buscado constantemente, o que lhes permitiu �xar morada em
determinados territórios.
Com isso, aldeias e vilas puderam se desenvolver e surgiram, assim, estruturas sociais,
com destaque para determinados grupos tais como os guerreiros e sacerdotes.
Inovações técnicas também marcaram esse período, com o desenvolvimento da
023
https://www.todamateria.com.br/caracteristicas-do-periodo-mesolitico/
Cerâmica egípcia | Fonte: Disponível aqui
cerâmica e da metalurgia.
Tais mudanças, segundo Macedo (2012), não ocorreram em todo o continente
africano. Isso porque em muitas áreas o clima inóspito di�cultava a permanência e o
desenvolvimento de habitações. Contudo, a adaptação também é uma característica
marcante, que fez impulsionar novos inventos por parte dos homens que nesse
continente diverso viveram.
Foi na região do atual Saara até o vale do Níger que comunidades mais antigas se
formaram e ali desenvolveram artefatos de pedra polida, primeiras formas de
pecuária bovina, equina e caprina, além da agricultura do sorgo e uma espécie de
milho, datados de 12 mil e 8 mil a.C. Posteriormente, houve ainda o desenvolvimento
da metalurgia do cobre e mais tarde do ferro:
Evidências materiais nesse sentido foram encontradas em escavações
arqueológicas no ano de 1942 feitas no Planalto de Jos, na atual
República da Nigéria. As cabeças e bustos em terracota revelam estilo
so�sticado e domínio técnico excepcional (MACEDO, 2012, p. 20).
024
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=165753
Terracota retratando cavalo e cavaleiro | Fonte: Disponível aqui
Fundição de cobre em murais funerários egípcios| Fonte: Disponível aqui
A vida humana, portanto, passou por todas essas transformações dentro do espaço
que integra o continente africano para então migrar para outros territórios na Ásia,
Europa, Oceania e América:
025
https://comons.wikimedia.org/w/index.php?curid=3290139
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1365887
A nossa espécie, hoje pandêmica, distingue-se de outras pelo enorme
potencial exploratório e pela capacidade de desenvolver as estratégias
adaptativas que nos permitiram, ao longo de alguns milhares de
anos, nos dispersar, colonizando os ambientes mais diferenciados.
(SOUZA, 2014, p. 69).
Nesse percurso, o ser humano abriu caminho para novos trajetos dentro e fora de
África, construindo comunidades, as primeiras vilas e então cidades, onde outros
meios e técnicas foram realizados para uma melhor organização da vida, como é o
caso da invenção da escrita para �ns de comunicação e sobretudo de marcação e
contabilização do que era realizado e produzido nesses espaços fundados pela
humanidade.
Quanto a sua diversi�cação física, devemos pontuar que:
É provável que a longa permanência nas zonas frias possa ter
contribuído para tornar mais clara a cor da pele, a�nar o nariz e
aumentar a pilosidade e a adiposidade, a �m de que os caçadores e
coletores emigrados da África resistissem aos rigores das baixas
temperaturas do território europeu. Por outro lado, a adaptação ao
sol intenso e ao clima úmido das zonas tropicais e equatoriais
acentuou a pigmentação escura, o alargamento das narinas e a
adaptação das glândulas sudoríparas dos africanos atuais. (MACEDO,
2012, p. 16).
Esses acontecimentos marcaram o trajeto dos nossos antepassados, que iniciaram sua
história na África. Desse modo, eles foram percorrendo e se adaptando aos diferentes
espaços do continente e então migrando para outros territórios do planeta, onde sua
saga traçou a história humana. 
026
03
A África na 
Antiguidade
027
Mapa do Crescente Fértil | Fonte: Disponível aqui
A África, primeiro ambiente habitado pelo ser humano, também foi o berço de grandes
civilizações e reinos que tiveram importância em seu contexto interno e externo.
Seguiremos percurso sobre alguns dos povos que tiveram papel importante na
história africana ao longo do período que convencionalmente caracterizamos como
Idade Antiga. Tomaremos aqui os egípcios e os núbios, mais precisamente
pertencentes ao reino de Kush. Em nosso trajeto, abordaremos as suas organizações
políticas, econômicas e culturais. Vamos lá?
Os Egípcios
Uma das civilizações humanas mais antigas é a egípcia. Ela se estabeleceu na parte
ocidental de uma região denominada “crescente fértil”, pois forma uma meia lua, se
estendendo ao longo do Oriente Médio ao noroeste africano, sendo banhada a leste
pelos rios Tigre e Eufrates e a oeste pelo rio Nilo. Esses rios foram e são importantes
para a manutenção da vida nessa região árida e desértica. A presença dos mesmos
permitiu que núcleos humanos ali se estabelecessem e formassem comunidades. E a
partir dessas comunidades é que nasceram algumas das civilizações mais antigas da
humanidade, como a egípcia.
028
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=26169754
Fonte: Disponível aqui
O termo “Crescente Fértil” foi utilizado pela primeira vez pelo
arqueólogo e historiador estadunidense James Henry Breasted (1865-
1935). Foi citado em sua obra “Antigos Registros do Egito” (em inglês:
“AncientRecordsof Egypt”), publicada em 1906. A ideia do autor era
designar as áreas da Mesopotâmia e do Egito.
As origens populacionais do Egito são um assunto controverso, pois por muito tempo
egiptólogos atribuíram as origens da população egípcia a diferentes origens étnicas,
que variaram de uma linha de defesa que levantava hipótese de origens caucasianas,
ou posteriormente, que tenha sofrido mistura com povos do Oriente Médio. Contudo,
hoje o que sabemos, segundo Dobertein (2010), é que os egípcios não só estavam
localizados em África, mas foi um povo com características étnicas africanas (negros),
embora essas raízes tenham sido por muito tempo relegadas.
Entre as características étnicas de sua população, a língua falada na região, de acordo
com Cardoso (1995), pertencia à família hamito-semítica, que seria de origem afro-
asiática. Esses dados vinculam a procedência desse idioma tanto a línguas africanas
(berbere e tchadiano) quanto a línguas semíticas do Oriente Médio. Eles reforçam,
portanto, os apontamentos que defendem a composição populacional egípcia na
Antiguidade, enquanto sendo proveniente de populações do Saara, ou seja, africanas,
mescladas a populações sírio-palestinas, vindas da Ásia.
A permanência dessas populações em torno dos vales banhados pelo rio Nilo
tornaram possível o desenvolvimento de práticas agrícolas e a sua permanência em
seu derredor. Desse modo, as pessoas foram organizando ali uma vida sedentária, ou
seja, �xando moradia por meio da prática da agricultura e da pecuária, que ali era
possibilitada por meio da presença desse grandioso rio.
029
https://www.todamateria.com.br/crescente-fertil
Pesquisas atuais têm demonstrado essa forte ligação entre a agricultura no vale do
Nilo e a formação do Egito antigo. Elas apontam que, após a deserti�cação da região
onde conhecemos como deserto do Saara, muitas populações migraram para o vale
do Nilo. Nesse território, essas pessoas desenvolveram práticas agrícolas que
funcionavam da seguinte forma: a cada ciclo de tempo, a partir de meados de julho até
setembro, uma enchente acontecia e tudo �cava inundado, mas os nutrientes
orgânicos que vinham junto com as águas eram �xados no solo; depois, quando o rio
voltava ao seu leito normal, grãos eram semeados na terra úmida, na beira de
pequenas poças que se formavam. (DOBERSTEIN, 2010).
A princípio, o trabalho era realizado de modo coletivo, sem “che�as”. Mas foi entre os
anos de 3300 e 3000 a.C. que as práticas agrícolas começaram a mudar.  Essas práticas
coletivas deram lugar a uma organização das forças produtivas para melhor proveito
das mesmas. Segundo Cardoso (1995), a população crescia, e com ela mais
necessidades de alimentos, por isso começaram a desenvolver as primeiras formas de
irrigação arti�cial na região, para que as águas do Nilo fossem levadas mais longe e,
assim, as lavouras fossem estendidas.
De acordo com Doberstein (2010),foi dessa necessidade de se aumentar o esforço de
trabalho e a produção de alimentos que entre os egípcios apareceram as primeiras
che�as dirigentes. Os povos que formariam o Egito antigo, portanto, para uma melhor
organização e sobrevivência em meio à região desértica, onde dependiam das cheias
do Nilo e, ao mesmo tempo, tinham que controlar suas cheias, tiveram que se unir e
demandar che�as que liderassem de forma e�ciente a distribuição dos recursos
disponíveis.
O desenvolvimento das inovações tecnológicas ocorreu em três fases principais:
Durante o IV milênio a.C. e no início do milênio seguinte (até
aproximadamente 2700 a.C.), �xaram-se algumas das técnicas
básicas da civilização egípcia: diversas técnicas agrícolas e da
pecuária; metalurgia do cobre, persistindo porém o predomínio de
uma tecnologia da pedra e da madeira nos instrumentos da produção
agrícola; um torno lento para a produção da cerâmica; o tear
horizontal; técnicas de construção em tijolo e, no �nal do período, em
pedra; de navegação a remo e a vela; de escrita e aritmética etc. 2. O
Reino Médio (2040-1640 a.C.) viu uma relativa difusão do uso do
bronze, mas foi o Segundo Período Intermediário (1640-1550 a.C.) que
se apresentou como novo na inovação e aperfeiçoamento tecnológico,
com a introdução, pelos asiáticos hicsos, de métodos melhores de
030
metalurgia do bronze, de um torno rápido para fabricar cerâmica, do
tear vertical mais e�ciente, do gado zebu e do cavalo, de novas frutas
e legumes, além de técnicas militares (arco composto, carro), sem as
quais as conquistas do Reino Novo na Ásia seriam impossíveis. 3. Por
�m, a ocupação assíria difundiu, no século VII a.C., o uso do ferro,
popularizando �nalmente no Egito os instrumentos metálicos, antes
raros e caros. (CARDOSO, 1995, p. 61-62).
E, apesar de a evolução tecnológica ter sido lenta, isso foi compensado pela
quantidade de mão de obra disponível, o que levou a grandes desenvolvimentos em
um ambiente a princípio inóspito.
Foi nesse ínterim que populações em torno do vale do Nilo foram se organizando em
um aparelho estatal, com uma hierarquia de che�as para diferentes categorias
socioeconômicas, que acabaram por organizar o Estado egípcio; primeiro Estado
uni�cado de que se tem registro na história humana.
O Egito antigo, segundo Cardoso (1995), não foi somente o primeiro Estado uni�cado
da história. O autor explica que esta organização política foi a primeira experiência
mais longa nesse sentido da qual temos registro, e observa que tudo isso permitiu
uma longa experiência cultural em sua abrangência.
A uni�cação egípcia ocorreu por volta de 3 mil a.C. As primeiras dinastias de faraós
existiram entre os anos de 2920 e 2575 a.C. (DOBERSTEIN, 2010). Mas isso fez parte de
um processo longo no qual, conforme pontuou Cardoso (1986), tudo indica que houve
o fortalecimento de um chefe tribal no sul que conseguiu reunir sob o seu poder
territórios no sul e no norte. Este se tornou o “rei das duas terras” e, sob tal título,
tornou-se o primeiro faraó. O faraó era uma autoridade civil, jurídica e divina, pois
governava em nome de algum deus do panteão religioso do seu povo.
Com a expansão dos domínios egípcios, o poder faraônico começou a ser
compartilhado com uma elite de sacerdotes e militares. Tais cargos eram dispostos em
uma hierarquia que começava no tjati, espécie de primeiro ministro, seguindo os
escribas e chefes de nomos (províncias). E embora o poder central do faraó e sua
burocracia estatal tenham sofrido revezes ao longo do tempo, tais ameaças não
tiveram sucesso diante da sua necessidade da manutenção e mobilização de recursos,
trabalho e produção que se estendiam das lavouras que forneciam alimento à
população a atividades como as construções de obras públicas (construção de canais
de irrigação, diques e outras construções). Essa organização levava ao
desenvolvimento da vida e prosperidade no Egito antigo.
031
Fonte: Disponível aqui
A economia nesse reino se voltava à agricultura e pecuária. Os produtos agrícolas mais
produzidos eram “trigo-duro (emmer) para o pão, cevada para a cerveja e linho para o
vestuário” (CARDOSO, 1995, p. 65). Na pecuária, o gado bovino era seguido pela
criação de asnos, ovelhas, cabras, suínos e aves diversas.
Os hicsos invadiram o Egito por volta do século XVIII a. C., e com eles trouxeram
cavalos que passaram a fazer parte dos animais de criação dos egípcios. Quanto ao
gado bovino, eram poderosos aliados nas atividades de arar a terra e movimentar
moendas, além de fornecer leite como alimento, já que a sua carne era um luxo que
raramente chegava à mesa dos mais pobres (CARDOSO, 1995).
De acordo com Cardoso (1995), entre as práticas produtivas de destaque, também 
encontramos a pesca, praticada no Nilo ou em canais que dele partiam. Para tal, os 
egípcios utilizavam desde anzóis a redes, a nassa (um tipo de gaiola) e o arpão. O 
consumo de peixe, principalmente já seco, era grande. A caça também era praticada, 
considerada um esporte que servia para abastecer a mesa e a coleção de aves da elite 
egípcia.
Outras manufaturas eram realizadas pelos habitantes do reino egípcio, como a 
extração do barro das margens do Nilo para fabricação de cerâmica, tijolos, bem como 
do papiro, que servia para escrita, além de juncos e caniços para a confecção de cestos
e móveis, e da madeira de sicômoros, palmeiras e acácias (mais populares na região).
(CARDOSO, 1995).
032
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=3884634
Enquanto isso, o comércio corriqueiro era praticado por meio do escambo. Os egípcios 
trocavam produtos têxteis, vinhos e derivados bovinos da região do delta do Nilo, por 
produtos de outras regiões. A distribuição desses produtos era muito realizada por 
transporte �uvial, que era controlado pelo Estado. Já as grandes transações 
econômicas, geralmente eram realizadas por meio da troca de pesos de metais como 
cobre e prata. O comércio exterior era realizado: ao norte, via Mediterrâneo, com 
cretenses, com o Chipre, com a Fenícia e a costa da região da atual Somália; no leste, 
via Mar Vermelho, eram importados artigos de luxo, principalmente para produção de 
objetos de cunho religioso, cujo pagamento era feito com ouro da Arábia e da Núbia. 
Sendo que este comércio era também de controle estatal. (CARDOSO, 1995).
Vemos, portanto, que o Egito foi um Estado centralizado, com governantes que 
controlavam todas as suas esferas econômicas, por meio dos tributos e produtos, 
além da prestação de serviços. Baseado em um “peso ideológico” que dispunha sua 
monarquia enquanto “divina” (CARDOSO, 1995, p. 70), os egípcios se organizaram em 
um sistema fechado de regras e disciplina que norteava as relações humanas do reino.
Essas condições bases da cultura egípcia deram a ela seus aspectos mais marcantes. 
Dentre elas, segundo Santos (2003), encontramos religiosidade, com seus ritos e 
práticas que norteavam as características fundamentais dessa cultura:
Tudo no Egito era orientado por ela: o mundo poderia - na visão desse
povo - ser destruído não fossem as preces e os ritos religiosos, a
felicidade nessa vida e a sobrevivência depois da morte eram
asseguradas pelas práticas rituais, e até mesmo "o ritmo das
enchentes, a fertilidade do solo e a própria disposição racional dos
canais de irrigação dependiam diretamente da ação divina do faraó"
(SANTOS, 2003, p. 17).
Os egípcios acreditavam na existência de uma “ordem necessária, legítima e desejável 
no mundo e na sociedade” (CARDOSO, 1986, p. 31). Essa ordem fundamentada na 
religiosidade nortearia ainda a preparação para uma “vida após a morte”, que eles 
achavam ainda mais importante do que a vida terrena.
Alguns aspectos que formavam a sociedade egípcia sofreram modi�cações ao longo 
do tempo. Contudo, essas não foram o su�ciente para acabar com as características 
mais marcantes desse Estado centralizado que se manteve por tanto tempo. Daí a sua
importância e o nosso prolongamento sobre suas características.
033
Fonte: Disponível aqui
A Núbia e os kushitasAgora, prosseguiremos o nosso caminho analisando outro reino importante da 
Antiguidade africana, Kush, localizado na Núbia. Conhecida como “terra do ouro”, a 
Núbia �ca localizada entre o sul do Egito e o norte do atual Sudão. Desde tempos 
remotos, esse território foi importante fornecedor de peles de animais, temperos, 
pedras e minerais precisos. Começou a ser habitada por meio da concentração de 
agrupamentos humanos a partir do Nilo, que garantia a sobrevivência em meio à 
deserti�cação do Saara.
As primeiras populações que se reuniram na Núbia formaram aldeias organizadas por
meio da domesticação de numerosas espécies vegetais, “numa escala tão grande, que
se pode dizer ter sido ali a agricultura reinventada” (SILVA, 2011). Mas por meio apenas
da existência do rio Nilo não era possível sobreviver. Para tanto, foi preciso controlar
034
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=2133014
suas cheias, por meio de diques e sistemas de irrigação, que permitissem práticas
agrícolas anuais, o que tornou imprescindível que essas comunidades núbias se
organizassem politicamente (BRISSAUD, 1978).
As fontes decifradas sobre a Núbia são mais escassas que as egípcias, contudo, as
estudadas até o momento, sugerem que desde sempre essa região foi um ponto de
encontro que reuniu povos do interior africano até o Mediterrâneo. E dentre os reinos
que se formaram nessa região, temos destaque na Antiguidade para Kush.
As fontes sugerem que esse reino nasceu por volta do século IX a.C. e teve seu �m no
século IV d.C. (SILVA, 2012). Ele teria surgido da instabilidade egípcia, frente a invasões
dos asiáticos hicsos, que abriria a possibilidade para estabelecer um reino
independente do mesmo na Núbia; reino este que �cara conhecido como reino dos
faraós negros.
Sua primeira capital foi Napata, entre os séculos IX e V a.C. Devido a suas riquezas e
rivalidade com os egípcios, muitas forti�cações foram construídas nas fronteiras entre
os dois reinos, o que não impedia que realizassem comércio entre si, já que este era
bené�co para ambos os reinos. Esse comércio manteve a Núbia como centro de
circulação de pessoas pela África, que além das trocas econômicas proporcionou
muitas trocas culturais na região.
Um exemplo dessas trocas foi encontrado em 1918, em escavações que revelaram
túmulos de uma série de príncipes kushitas, cujas estruturas de alvenaria eram do tipo
mastaba, ou piramidal.
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Pirâmide Piânkhy de El-Korrou | Fonte: Disponível aqui
Extensão do Reino de Kush entre os séculos VII e I a. C. | Fonte: Disponível aqui
A partir do século VI a. C., a capital do reino foi transferida para Méroe, mais ao sul. A
partir de então, apesar da escassez de fontes, o que se sabe é que esse reino
sobreviveu com formas e características cada vez mais africanas.
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https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=5594365
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=37478935
Necrópole de Nuri | Fonte: Disponível aqui
A cidade de Méroe era um centro caravaneiro e produtor de ferro, além de estar em
uma região mais propícia para práticas agrícolas. Essa cidade �ca na margem direita
do Nilo e nela restam imponentes ruínas do reino da qual era sede (SILVA, 2012).
Contudo, Napata não foi esquecida e permaneceu um centro religioso e tendo até o
século IV a.C., na necrópole de Nuri, o lugar da “morada eterna” dos reis kushitas.
Esse poderoso reino antigo foi governado por um matriarcado entre os anos de 170 e
160. Entre as “rainhas mães” da Núbia, duas tiveram destaque: Amanirenas e
Amanishaketo. O período em que governaram foi também de grande prosperidade no
Reino de Kush. As construções, as joias e os próprios sepulcros do período atestam
essas informações. (MEC, 2010).
037
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=5593590
Bracelete de Amanishaketo, encontrado em sua pirâmide, na Núbia | Fonte: 
Disponível aqui
Fonte: Disponível aqui
Shanakdakhete foi a rainha Negra Africana de Kush quando o reino
eracentrado em Meroé. Ela é a primeira rainha governante conhecido
de Núbia e reinou de cerca de 177-155 a. C.
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https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=3768519
https://www.geledes.org.br/grandes-reis-e-rainhas-da-africa/
Shanakdakhete| Fonte: Disponível aqui
Kush entrou em decadência por volta do século II da era atual. Posteriormente, por
volta dos anos 300 d.C., e ao que tudo indica, um outro reino mais ao sul, conhecido
como Axum, ajudaria a acabar com sua soberania. Contudo, sua importância, bem
como do seu vizinho ao norte, o Egito, se faz presente na história. E com a ajuda da
expansão de pesquisas que decifrem as fontes disponíveis, tem sido cada vez mais
con�rmada a importância desse reino no contexto de relações do interior africano
com demais partes da África, do Oriente Médio asiático e Mediterrâneo.
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https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=10518985
04
Reinos Africanos 
na Idade Média
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De uma maneira geral, quando estudamos sobre os africanos e a História com a
participação de povos africanos, é comum que falemos a respeito sob um ponto de
vista que tenha como pano de fundo a escravidão. Ou seja, partimos para uma análise
da história africana e de seus povos somente quando tem início o comércio Atlântico
de escravos, como se antes ou, além disso, não houvesse mais sobre o que contar ou
estudar a respeito da História da África.
Mas, se veri�carmos, não é bem assim. A África é não só o continente mais antigo do
planeta como onde o ser humano iniciou a sua trajetória na Terra. Esse continente
possui povos que se diversi�caram e construíram inúmeras histórias antes e depois do
período que teve início o comércio Atlântico de escravos (séculos XVI e XIX).
Convido você então a debruçar sobre alguns povos africanos em especial, dado nosso
limite de tempo e espaço, que se organizaram em reinos ao longo do período que
convencionamos chamar de Idade Média. Nosso trajeto se fará em torno de dois
reinos em especí�co, o de Axum e o do Mali.
Esperamos com isso, observar e conhecer mais a respeito da história e cultura de tais
reinos, bem como as suas in�uências sobre as relações intra e extra África. A�nal,
alguns desses reinos são formados por populações que para cá foram trazidas no
período da colonização do Brasil e, portanto, fazem parte de nossas heranças
históricas e culturais. Vamos lá?
As migrações e a formação
dos reinos africanos
Para Pereira (2014), é enganosa a ideia de que a África esteve isolada de grandes
�uxos migratórios internacionais, a�nal, as regiões norte e leste mantiveram contatos
frequentes com a Europa e a Ásia, bem como houve inúmeras migrações de leste para
oeste e também sentido sul.
Populações se locomoveram movidas pela deserti�cação lenta e gradual do Saara. No
norte, esbarraram com os berberes e se miscigenaram. Outras desceram mais ao sul
dos rios Níger e Senegal, multiplicando grupos agrícolas. Desse modo,
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Norte africano | Fonte: Disponível aqui
Pouco a pouco, os homens que viviam nas savanas ao sul do Saara foram
acrescentando a bagagem trazida das culturas aquática e pastoril. Aperfeiçoaram o
cultivo da terra e domesticaram novos vegetais. Melhoraram os utensílios de trabalho.
Tornaram mais sólidas as casas. A cerâmica evoluiu e se enriqueceu até chegar à
escultura em barro cozido. E, uns cinco ou seis séculos antes de nossa era, o ferro
começou a incorporar-se aos materiais com que lidavam. (SILVA, 2011, p. 166).
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https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=4438190
Rio Níger | Fonte: Disponível aqui
A di�culdade para atravessar do Sahel ao Mediterrâneo a cavalo fez do uso do camelo,
nos primeiros séculos de nossa era, uma prática de habitantes do deserto,
principalmente dos garamantes.
Outras inovações foram importantes, nesse contexto, como o uso do ferro que
alterou substancialmente as vidas dos que passaram a conhecê-lo.
Tornou-se mais fácil, com machados de ferro, derrubar as matas; com
enxadas de ferro, revolver o solo; com a foice de ferro, ceifar o sorgo.
Os instrumentos de caça e pesca �zeram-semelhores. Esfolavam-se
com maior facilidade os animais. Abriam-se nos troncos das árvores
as grandes canoas. E, com as armas de ferro, aumentaram o poder de
destruição dos guerreiros e o poder de centralização de seus chefes.
(SILVA, 2011, p. 177).
Portanto, a África nunca foi um continente estático, muito pelo contrário. E foram
esses processos migratórios que deram início a reinos e civilizações. Prosseguiremos,
então, observando cada um dos reinos que selecionamos.
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https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1624028
Fonte: Disponível aqui
Axum
O reino Axum foi formado na região da atual Etiópia a partir de uma cidade
homônima, em torno do século V a. C., por populações de pastores e agricultores cujos
indícios é de que praticavam a fundição do cobre e do bronze, manufaturavam couro,
tecido e produtos de madeira, além de manter importantes relações com povos da
outra margem do Mar Vermelho, em especial, os iemenitas.
Nesse contato com o Iêmen, que possuía centros comerciais de especiarias, Axum
recebeu, de acordo com Silva (2011), o desenvolvimento de:
casas de pedra, o uso da escrita, as técnicas do represamento de
águas, da irrigação arti�cial e da disposição das lavouras em terraços
com socalcos na encosta das montanhas, outras práticas agrícolas e
novos vegetais, como, talvez, o trigo e a cevada. (SIVA, 2011, p. 183)
A fundição do ferro foi provavelmente uma herança meroíta. Também o uso da mula
como animal de carga e de arado, o que permitiu ampliar áreas cultiváveis em solos
vulcânicos dos planaltos. (SILVA, 2011).
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https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=50756360
Igreja em Axum | Fonte:   Disponível aqui
A partir do século III a. C., a cultura do norte da Etiópia vai se afastando da iemenita e
se aproximando do Egito ptolomaico e de Kush, seja por meio da língua, da escrita ou
das técnicas de produção de cerâmica, com seus vasos “de argila negra ou rubra, com
superfícies vidradas e incisões ornamentais preenchidas com uma pasta branca ou,
em alguns casos, vermelha” (SILVA, 2011, p. 185).
Foi então que dentre as cidades da região que eram centro do comércio e do
artesanato, Axum teve destaque. Localizada no planalto do Tigre, em uma área de
solos bem regados e de fácil acesso ao mar Vermelho e ao Nilo, Axum “tornou-se um
importante empório do mar�m e de outros artigos africanos” e passou a dominar os
vales dos rios Mareb e Tacazé, garantindo o controle sobre o trá�co do interior
africano para o Mar Vermelho e que intermediava os rios Nilo e Adúlis (SILVA, 2011,
187).
Essa região foi visitada por sírios, persas e também judeus, o que rendeu o mito da
união de Salomão e da Rainha de Sabá, cujo resultado seria o rei Menelique I. Essa
história serviu posteriormente para manter a monarquia etíope até o século XIV.
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https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=319092
Obelisco do Rei Ezanas em Axum | Fonte: Disponível aqui
vários lugares, o que permitiu grandes trocas culturais, como a conversão ao
Cristianismo, a começar pelo rei Ezana, em meados do século IV, estendendo-se a sua
população entre os séculos V e VI por interferência de missionários sírios, o que legou
a esse reino o que Costa e Silva (2011, p. 198) denominou de “um sincretismo de
crenças pagãs com um monoteísmo inde�nido”.
Esse reino de comércio pleno, que ligava produtos do interior africano até a Índia, 
sofreu sua decadência a partir do século VII, envolvido em con�itos entre bizantinos e 
persas, além do avanço árabe muçulmano em sua região. Contudo, a cidade de Axum 
até hoje tem importância religiosa e cultural.
Em sua grandiosidade, esse reino se envolveu em con�itos regionais e até mesmo
globais, como o as disputas entre romanos e persas. Porém, seu foco principal sempre
esteve em controlar os portos do Mar Vermelho e manter a ligação do Oriente com o
Mediterrâneo. Essa área foi, portanto, percorrida por inúmeras pessoas, vindas de
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https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=429145
ouro, pimenta-malagueta, âmbar, alúmen, sal, cobre, tâmaras, tecidos e artefatos de
couro”. Além disso, cavalos eram frequentemente trocados por escravos (SILVA, 2011,
p. 310).
Uma região, portanto, muito disputada, teve sua população islamizada por volta do
século XI, o que segundo os Griotz, fez com que muitos estados se formassem para
escapar da expansão árabe:
Grupos de vilarejos achegados passaram a se vincular no que hoje se
chama kafu e a reconhecer a autoridade religiosa e política de um
chefe, o mansa, senhor da terra e da chuva, liame entre sua gente e o
divino. A cada che�a corresponde, na tradição, um clã nobre dos
mandingas, como o Traoré, o Câmara, o Conate, o Queita. (SILVA,
2011, p. 316).
Fonte: Disponível aqui
Contadores de histórias, mensageiros o�ciais, guardiões de tradições
milenares: todos esses termos caracterizam o papel dos Griots que, na
África Antiga, eram responsáveis por �rmar transações comerciais entre
os impérios e as comunidades e passar ensinamentos culturais aos
jovens, sendo hoje em dia a prova viva da força da tradição oral entre os
povos africanos.
Mali
Nos atuais territórios da República do Mali até as regiões dos atuais Senegal e Guiné, 
existiu um importante reino africano entre os séculos XIII e XVI, formado em meio a 
antigas rotas subsaarianas que desembocavam no “cotovelo” do rio Níger, onde desde 
muito tempo negros e berberes começaram a “transportar para mercados distantes
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https://www.geledes.org.br/griots-os-contadores-de-historias-da-africa-antiga/
Griot moderno, Di�a, Níger, tocando um Ngoni ou Xalam | Fonte: Disponível aqui
De acordo com a tradição mantida pelos Griotz, Mali, enquanto reino, surgiu por meio
da �gura de um membro do clã Queita, chamado Sundiata que, fugindo a princípio do
irmão mais velho por disputas de sucessão do controle de suas posses, acabou por
escapar de um massacre da família em meio a guerras com o povo sosso. Em seguida,
Sundiata teria derrotado esse povo que destruiu sua estirpe e começou a reunir sob
seu comando vários clãs malinquês. Ao longo dessas guerras, cada líder de clã se
tornou um chefe local e Sundiata Queita recebeu o título de Mansa, um rei, que pela
primeira vez dominava “os mananciais do ouro, os portos caravaneiros do Sael e os
caminhos que levam de uns aos outros” (SILVA, 2011, p. 318).
Nesse reino, o comércio sustentava a corte, enquanto a população vivia do trabalho no
campo:
Não era um estado unitário nem homogêneo. Compreendia as mais
diversas formas políticas, desde reinos e cidades-estado a aldeias que
obedeciam a conselhos de anciães. A extensão e a diversidade dos
territórios que lhe pagavam tributo e lhe forneciam tropas, exigiam do
rei dos reis uma ampla tolerância para com as peculiaridades de
cada parcela do império e vetavam, por isso mesmo, uma política de
forçada islamização.” (SILVA, 2011, p. 328).
048
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=2599915
No século XV, as guerras internas enfraqueceram o Mali junto com investidas externas
e interferência de outros povos como os portugueses, em busca de suas riquezas e
mão de obra escrava.
Contudo, é possível perceber a importância de reinos como este, que ao longo de
séculos integraram o comércio de diferentes partes da África para relações para além
desse continente, bem como para o desenvolvimento de tecnologias e culturas que
partiram ou se aperfeiçoaram em solo africano.
049
05
A África na 
Modernidade
050
A África é um continente grandioso e com uma imensa variedade de povos, mas nem
sempre essas informações são de conhecimento geral, principalmente entre aqueles
que desconhecem sua formação e história. Esse desconhecimento em muitos casos se
deve a uma formação que nos fez abordar estudos sobre a história e sociedades
africanas, apenas como parte de uma história eurocêntrica, sem que verdadeiramente
se conhecesse as relações entre as populações africanas dentro e fora desse
continente, mas somente, pelo papel que povos de origem africana foram submetidos
no início da Era Moderna pormeio do trá�co Atlântico de escravos.
É importante percorrer essa fase da história africana para compreender quais relações
eram mantidas para além da prática extensiva que o comércio Atlântico de escravos
empreendeu, bem como para veri�car quais consequências esse mercado impôs ao
continente africano e seus povos. Convido você a debruçar sobre essa fase da história
do continente africano tomando como ponto de partida as con�gurações internas da
África nesse contexto e as relações internacionais que dele partiram.
Um imaginário sobre a
África
Muito do desconhecimento a respeito da África e seus habitantes é fruto do contexto
de relações que foram implantadas em seu território, sobretudo no contato com
europeus, a partir do início da Era Moderna. Neste processo, o racionalismo teve um
importante papel, enquanto uma teoria que pressupôs um olhar ocidental sobre o
universo, já que em um contexto de expansão europeia por meio das Grandes
Navegações entre os séculos XV e XVII, quem dominava – os europeus – era quem
detinha o saber sobre os lugares e as populações dominadas. 
051
Fonte: Disponível aqui
O Racionalismo é uma corrente �losó�ca que atribui particular
con�ança à razão humana, ao passo que acredita que é dela que se
obtêm os conhecimentos.
Nesse ínterim, viajantes, estudiosos e missionários dos séculos XV, XVI, XVII e XVIII que
saíram da Europa em direção à África tiveram papel fundamental ao descrever o
continente africano e gerar um imaginário sobre ele, pois o contato que eles
mantinham eram pontuais, com localizações restritas aonde os europeus conseguiram
chegar à África. Um exemplo é o famoso mapa do holandês Guilherme Blaeu, datado
de 1644.
052
https://www.todamateria.com.br/racionalismo/
Fonte: Waldman, 2014.
Filho de negociante, Guilherme Blaeu (1571-1638) cresceu em ambiente
cercado de relatos sobre países longínquos. Estudou matemática e foi
aluno do famoso astrônomo Tycho Brahe. Em 1633 tornou-se
cartógrafo da Companhia das Índias Ocidentais, cargo de in�uente
status social. Sua perícia na cartogra�a não era menor do que seu
pendor artístico, revelado em mapas �namente trabalhados.
No mapa de Blaeu, temos um “conjunto de dados imaginários e reais generalizados
presentes na mesma obra” (CHARLES; SÁ, 2011, p. 3). A começar, a Europa direcionada
ao Norte, na face superior da imagem, denota o olhar eurocêntrico que o mapa
expressa. Embora os contornos do continente tenham bastante perfeição, fruto de
anos de navegações ao seu redor, quando paramos para analisar mais a fundo as
imagens que estão em seu interior e arredores, começamos a observar alguns pontos
importantes.
A começar, os únicos centros urbanos retratados no mapa, são de Tanger, Ceuta,
Alger, Tunis, Alexandria, Alcacer, Canárias, Moçambique e o Forte de el Mina. Ou seja,
apenas na costa e mais ao norte da África, locais onde o conhecimento europeu se
restringia. Tais localizações são apenas as cidades que drenavam as riquezas do
interior para o exterior do continente africano.
Em seu redor, o mapa apresenta �guras de criaturas exóticas no entorno da África.
Enquanto isso, voltando para dentro do continente, encontramos uma “megafauna” e
animais tropicais, não exatamente em seu habitat. Os navios que dominam os mares
são europeus, e o desconhecimento do centro-sul africano é demonstrado na
selvageria com que essas partes do continente são representadas.
053
Reino do Congo | Fonte: Disponível aqui
Dinâmica interna do
continente
Migrações internas e externas foram importantes para a formação de reinos africanos
na África e também para suas dinâmicas locais e globais. A África não foi um
continente isolado do �nal da Antiguidade até o início da Modernidade, fazendo parte
de processos migratórios que levaram a formação de reinos e aos contatos entre
diferentes grupos étnicos que se estabeleceram ao longo do tempo no interior desse
continente. Além disso, o comércio foi um fator importante, que levou à intensi�cação
desses contatos e a uma dinâmica que ia para além do território africano.
No contexto da era moderna, tivemos entre os povos de língua banta, localizados no
centro sul africano, o desenvolvimento de reinos como o Congo, que a partir do século
XIV tornaram-se de grande importância. 
Tal reino era rico, com uma economia abrangendo da produção de ferro, sal e cobre a
produtos artesanais e a um comércio que ele “comandava ao longo do rio e entre o
litoral, a �oresta e a savana” (SILVA, 2011, p. 519). Sustentava-se por meio do
recebimento de tributos cobrados pelos chefes das aldeias, dos quais retiravam uma
054
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=4816371
Rotas transaarianas | Fonte: Disponível aqui
parte e o restante repassavam ao chefe de distrito, que da mesma forma repassava
outra parte ao governador, até que chegassem as mãos do rei. E tais contribuições
exigiam em troca a proteção, bem como se organizavam meios de comércio e permuta
de bens e serviços.
Ao mesmo tempo, a expansão islâmica se fazia há muito sobre a África, dominando
territórios que se estendiam do Egito ao Marrocos. Por meio dessa expansão, não só a
cultura islâmica era disseminada, mas o comércio que ligava regiões asiáticas ao
interior africano, e a partir daí, produtos levados até o sul da Europa, criando redes
comerciais:
A religião muçulmana também se estendeu para o Oriente, chegando
até a Índia e às fronteiras da China. O pertencimento ao Islã
fortaleceu esse comércio e inseriu Gana, assim como outros reinos da
África Ocidental, em uma dimensão transcontinental. Além disso, uniu
os mercados da África Ocidental às cidades italianas – sobretudo
Gênova e Veneza – ao Oriente Médio, à Europa Oriental, chegando até
a Índia, a China e o Japão. (PEREIRA, 2014, p. 23).
Esse comércio era favorecido pela segurança que a irmandade entre �éis muçulmanos
detinha, levando à formação de rotas muito cobiçadas.
055
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=3415866
Reino Songai | Fonte:   Disponível aqui
Reinos como o Songai, na região do Sahel, foram importantes nesse período. Com seu
soberano convertido ao Islã, teve seu comércio integrado a essa rede acima citada. Na
mesma região, cidades hauçás importantes se integravam a um comércio
transaariano. Tombuctu, uma das cidades mais importantes da região, além de centro
comercial, tornou-se um importante centro de estudos.
056
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=36813579
Universidade de Sancoré em Tumbuctu, datada do século X | Fonte: 
Disponível aqui
Desse modo, os reinos do Sudão Ocidental, além de integrarem importantes rotas
comerciais,
englobavam, em suas fronteiras, povos de agricultores e mineradores
– os trabalhadores que criavam as grandes riquezas controladas por
reis e nobres. Essas pessoas – homens e mulheres – criaram
instrumentos, tecnologias e sistemas de trabalho que contribuíram
para o desenvolvimento da mineração e da produção agrícola, não
apenas em suas regiões (PEREIRA, 2014, p. 25).
Essas conexões foram importantes para trocas não apenas de produtos, mas para o
�orescimento de práticas culturais. Também foi por meio desses contatos que muitos
viajantes do mundo islâmico escreveram alguns dos primeiros relatos exteriores a
respeito de populações africanas. Nesse contexto, a interferência europeia começou a
se fazer por meio do trá�co Atlântico de escravos, do qual falaremos mais a respeito
adiante.
057
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=3406814
O Tráfico Atlântico de
Escravos e suas
Consequências
A escravidão é uma prática antiga, presente não só no continente africano, mas em
todos os demais espaços continentais do planeta. Contudo, foi por meio do trá�co
Atlântico de escravos retirados da África para servir de mão de obra principalmente
nas Américas, com início na Era Moderna, que essa prática tomou proporções nunca
antes vistas.
A escravidão na África, a princípio, se fez como modo de aumentar o número de mão
de obra para o trabalho na terra. Mas nesse contexto, a escravidão não era uma
instituiçãoessencial, já que a base da formação social sobre a qual era realizada não
sofria alterações.
Aos poucos, de região para região, houve variantes. Com a expansão do Islã sobre
territórios africanos, de acordo com Pacheco (2008), o contato muçulmano com
Estados escravistas como o Bizantino e o Persa, tornou essa prática naturalizada,
sobretudo porque nos textos sagrados do Corão ela não é defendida nem condenada.
A escravidão praticada pelos árabes na África cresceu, na medida em que a expansão
do Islã se fez:
desenvolveram um intenso trá�co alimentado por rotas dispersas ao
longo da costa da África negra e de localidades próximas a elas.
Facilitando o escoamento da “mercadoria” escravo por meio do
oceano Índico, do mar Vermelho, pelo deserto do Saara e, mais tarde
do oceano Atlântico. Províncias foram criadas para melhor
atendimento ao trá�co, destacando a do Egito - capital al-Fustat
(próximo de Cairo), de Magrebe – capital Fez, e a de Ifriqiya (Tunísia) –
capital Kairuan. (PACHECO, 2008, p. 20).
Nesse contexto, a escravidão era entendida como parte de uma Jihad, em que os
in�éis eram escravizados e podiam ser vendidos. Sendo que nas sociedades
islamizadas da África, tais escravos eram empregados em inúmeras atividades que
variavam de serviços domésticos a atividades administrativas e em serviços militares.
058
Fonte: Disponível aqui
Contudo, mesmo sendo uma prática importante, não era algo essencial, mas
contribuiu para que reinos submetidos à expansão árabe se tornassem fornecedores
de escravos.
Essa prática concomitante, iniciada pelos árabes, levou a uma associação entre as
populações negras com o ser escravo, o que impôs a esses povos uma condição de
inferioridade.
Com a abertura de rotas de comércio de escravos na costa Atlântica da África,
realizada a partir do século XVI com europeus que estavam em busca de força de
trabalho para suas colônias na América, a expansão do trá�co negreiro aumentou
vertiginosamente e acabou por representar um comércio sistemático de pessoas
escravizadas, causando profundas consequências nas regiões em que este era
realizado.
O abastecimento de escravos via Atlântico era realizado principalmente nas:
área de Angola e do Congo (até quase o �nal do século XIX); Costa dos
Escravos (Golfo de Benin, do �nal do século XVII até Século XIX); Costa
do Ouro (do início do século XVIII até o seu �nal); baía de Biafra
(centralizado no delta do Níger e do rio Cross). Outras regiões tiveram
menor participação em épocas diversas como: do rio Bandana; costa
059
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=17827742
Principais zonas de abastecimento de escravos para o comércio Atlântico | Fonte: 
Disponível aqui
perto do planalto de Futa Jalom; portos próximos onde agora �cam
Morávia e Freetown; e a região da Senegâmbia com conexão com o
interior muçulmano. (PACHECO, 2008, p. 27).
O principal alvo era a população masculina jovem. Além disso, o trá�co aumentou a
busca por escravizar pessoas e também a violência necessária para viabilizar isso.
060
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=14652878
Inspeção e venda de um escravo africano | Fonte: Disponível aqui
As consequências foram mais de trezentos anos de um trá�co intenso de pessoas
escravizadas, retiradas de suas terras e famílias e submetidas a terríveis condições do
transporte à vida nas colônias europeias, para onde serviam como força de trabalho.
Isso imprimiu aos seus territórios de origem em África, di�culdades de
desenvolvimento, dadas a con�itos constantes, que eram alimentados por essa busca
por escravizar mais a falta de mão de obra, sobretudo masculino. E, para aqueles que
sofriam esse triste destino �cou um legado sobre povos de cor negra que integravam,
de uma ideia de pertencimento a uma população inferior entre as demais civilizações
humanas, já que estariam servindo “senhores” brancos por meio de trabalhos
subalternos.
Essas situações nos ajudam a compreender por que o racismo contra os povos
afrodescendentes ganhou forças com a prática da escravidão e como noções
equivocadas sobre esses povos e o continente africano foram surgindo e sendo
disseminadas ao longo da história humana. Daí a importância de conhece mais essa
história para, desse modo, contribuir para combater preconceitos e ideias indevidas.
061
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=16082204
06
A África na 
Contemporaneidade
062
A história mais recente do continente africano, assim como em períodos mais
remotos, nunca foi pouco estática. Na era contemporânea, que convenientemente foi
classi�cada como o período que segue a passagem para o século XIX, até os dias
atuais, o continente africano foi alvo de inúmeras transformações sociopolíticas e
culturais que, transformaram suas fronteiras internas e as relações entre os povos que
o povoam.
Convido você a percorrermos sobre esse trajeto na história desse continente e assim,
buscarmos conhecer um pouco mais sobre as relações internas que o permeiam,
assim como este passou a manter em uma escala global. Vamos lá?
A ação imperialista em
África
Não podemos falar em África contemporânea sem que toquemos no assunto
imperialismo. Pois, essa que foi uma política neocolonialista por parte de potências
econômicas europeias, atingiu em cheio o continente africano que, teve o interior do
seu território disputado e partilhado por esses países estrangeiros, o que afetou a vida
da maioria dos inúmeros povos que compõem seu espaço.
063
Fonte: Disponível aqui
O termo “Imperialismo” sugere, obviamente, uma “Era de Impérios”; em
grande parte trata-se disso mesmo. Mas, conceitualmente falando, o
Imperialismo do século XIX consistiu num tipo de política expansionista
das principais nações europeias, que tinha por objetivo a busca de
mercado consumidor, de mão de obra barata e de matérias-primas
para o desenvolvimento das indústrias.
Esse fenômeno de expansão dos países europeus teve início a partir do
momento em que, após as Revoluções Burguesas dos séculos XVII e
XVIII e da formação das nações modernas na Europa (como Alemanha,
Itália e França), houve um intenso processo de industrialização desses
países. A industrialização gerou, por conseguinte, uma forte
concorrência entre as nações, que passaram a disputar territórios e
estabelecer as suas fronteiras com exércitos modernizados e uma
so�sticada diplomacia.
O transcorrer do século XIX foi marcado por uma intensi�cação da industrialização de
alguns países europeus, que buscavam fontes de matérias-primas e a ampliação dos
seus mercados consumidores. Para tanto, o seu foco de ação, que em muitos casos
anteriormente estava voltado para o Novo Mundo – a América – deslocou-se para o
continente africano. Nesse contexto, é que entre os anos de 1880 e 1935 a África
sofrerá os intensos efeitos da expansão imperialista:
Na verdade, as mudanças mais importantes, mais espetaculares – e
também mais trágicas –, ocorreram num lapso de tempo bem mais
curto, de 1880 a 1910, marcado pela conquista e ocupação de quase
todo o continente africano pelas potências imperialistas e, depois,
pela instauração do sistema colonial. A fase posterior a 1910
064
https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/imperialismo.htm
O Congresso de Berlim em gravura da época | Fonte: Disponível aqui
caracterizou-se essencialmente pela consolidação e exploração do
sistema. (UNESCO, 2010, p. 1).
Se na Era moderna – entre os séculos XV e XVIII – os contatos e uma presença europeia
se faziam em alguns pontos, sobretudo, nas margens litorâneas do continente, em
entrepostos comerciais e sem um conhecimento mais profundo de seu interior, isso
mudou drasticamente ao longo do século XIX. A busca por produtos africanos levou a
uma roedura do continente e abriu as portas para o desejo de conquista. E, conforme
o trá�co Atlântico de escravos diminuía, ao mesmo tempo era aumentado o processo
de expansão europeia no continente.
Com o �m de ordenar e evitar con�itos entre as potências que disputavam territórios
na África, uma reunião foi organizadaentre os seus representantes. Essa coferência,
ou Congresso de Berlim, realizado em 1878, terminou por dar os limites das
ocupações por parte dos europeus já iniciadas na África.
065
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=185665
Comparação da divisão política da África nos anos de 1880 e 1913 | Fonte:
Disponível aqui
Fonte: Disponível aqui
Os países que participaram no Congresso de Berlim foram Áustria, Grã-
Bretanha, França, Alemanha, Itália, Rússia e Turquia.
O Congresso de Berlim, sem obviamente levar em conta as situações internas e os
povos que integravam o continente africano, deu cabo de uma partilha da África. Essa
partilha que vinha sendo conduzida e então �nalizada, entre os anos de 1880 e 1930,
como mencionamos acima.
066
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=37125742
https://www.wdl.org/pt/item/11911/
A partir de então, as diferentes potências europeias que haviam empreendido
conquistas territoriais ou estavam conquistando territórios na África passaram a
implementar suas políticas coloniais no continente africano.
Políticas coloniais
Se até 1880 cerca de 80% do território africano era governado por “seus próprios reis,
rainhas, chefes de clãs e de linhagens, em impérios, reinos, comunidades e unidades
políticas de porte e natureza variados” (UNESCO, 2010, p. 3), essa situação mudou
radicalmente. Com exceção da Etiópia e da Libéria, a África estava quase
completamente submetida à dominação de potências europeias que a dividiam em
colônias sem, na maioria dos casos, relação com as divisões políticas pré-existentes.
Desse modo, entre os anos de 1880 e 1935 a África esteve submetida a um
colonialismo. Sem dúvidas houve resistência:
na sua esmagadora maioria, autoridades e dirigentes africanos foram
profundamente hostis a essa mudança e declararam -se decididos a
manter o status quo e, sobretudo, a assegurar sua soberania e
independência, pelas quais praticamente nenhum deles estava
disposto a transigir, por menos que fosse. (UNESCO, 2010, p. 3-4).
Uma resistência armada e religiosa foi organizada, apesar de algumas elites locais se
�arem na crença de que conseguiriam barrar as intenções expansionistas europeias,
como vinham fazendo havia séculos, enquanto mantinham relações comerciais com a
Europa. Contudo, o contexto era outro:
Em 1880, graças ao desenvolvimento da revolução industrial na
Europa e ao progresso tecnológico que ela acarretara – invenção do
navio a vapor, das estradas de ferro, do telégrafo e sobretudo da
primeira metralhadora, a Maxim –, os europeus que eles iam
enfrentar tinham novas ambições políticas, novas necessidades
econômicas e tecnologia relativamente avançada. Por outras
palavras, os africanos não sabiam que o tempo do livre-cambismo e
do controle político ocioso ̀ cedera lugar, conforme diz Basil
067
Davidson, à “era do novo imperialismo e dos monopólios capitalistas
rivais”. (UNESCO, 2010, p. 7).
Foi aí que a metralhadora venceu as antigas espingardas e boa parte dos soberanos
africanos foi destronada pelas potências europeias - mas não sem confrontos, pois
muitos soberanos africanos preferiram lutar até o �m em campos de batalha para
defenderem sua soberania.
Outros procuraram recorrer à diplomacia e alguns ainda a alianças políticas. Em
alguns casos, as diferenças e hostilidades locais eram utilizadas a favor dos interesses
entre ambas as partes. O que queremos dizer com isso? Na África, muitos povos
estavam submetidos a autoridades políticas que não eram as suas, ou seja, povos que
disputavam territórios e poder entre si, cujo soberano de algum deles que conseguiu
se autoa�rmar governava todos os demais. Com isso, esses povos viam na aliança com
os invasores, a possibilidade de combater inimigos em comum. Nesse ínterim, o uso
da política “dividir para dominar” era realizada por europeus, ou em buscar acordos
que mantivessem os interesses das elites locais.
E nesse processo de dominação e colonização, embora em muitos lugares fossem
implementadas obras de infraestrutura rodoviária e ferroviária para o transporte das
mercadorias, bem como a abertura de escolas primárias e secundárias, para o ensino
e uma assimilação das populações locais a uma cultura europeia, os interesses das
potências colonizadoras continuava sendo o de explorar os recursos africanos “fossem
animais, vegetais ou minerais, em benefício exclusivo das potências metropolitanas,
principalmente de suas empresas comerciais, mineiras e �nanceiras” (UNESCO, 2010,
p. 15). E isso levava a um ressentimento anticolonial compartilhado por diferentes
grupos sociais em meio aos povos africanos.
068
Veja matéria completa: Disponível aqui
Com a ocupação da África durante o século XIX, inúmeros movimentos
de resistência ao neocolonialismo europeu surgiram em diferentes
partes desse continente.
Tais práticas não ocorreram em meio a uma passividade entre os africanos. Pelo
contrário: foram múltiplas as formas de resistência mesmo no auge do colonialismo
europeu em África. Inclusive, a essa resistência se deveu o cerne dos movimentos por
independência que vieram a ter êxito no decorrer do século XX e trouxeram novos
rumos à vida das populações que hoje formam o continente africano.
Independências na África
e consequências do
imperialismo
Vamos analisar como os movimentos de resistência ganharam força e levaram à
independência de antigas colônias na África para então observar as consequências de
todo esse transcorrer de acontecimentos para os países que se formaram e
constituem o continente na atualidade.
Inúmeras iniciativas foram organizadas:
069
https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiageral/movimentos-resistencia-ao-neocolonialismo-na-africa.htm
As associações e agrupamentos formados pela articulação das
aspirações nacionalistas foram efetivamente numerosos, e bastante
variadas as estratégias e táticas elaboradas no decurso do período
para concretizá -las. [...]
[...] clubes de jovens, associações étnicas, sociedades de antigos
alunos, partidos políticos, movimentos políticos abrangendo um ou
vários territórios com atividades tanto internas (UNESCO, 2010, p. 16).
São exemplos de como grupos socioculturais variados buscavam se articular em torno
do objetivo de vencer o colonialismo europeu em África.
Sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, esses movimentos de resistência africana
ganharam força e levaram a um processo de independência que na segunda metade
do século XX levou a formação de inúmeros países:
Dos anos 50 até o m ̀ da “presença europeia” no continente africano,
a luta independentista foi intensa, com o surgimento de vários
movimentos, conitos ̀ e lutas armadas, contra a exploração e invasão
que ocorriam há tempos em África, e que sempre encontrou a
resistência pelo caminho. (MATOS, 2019, p. 77).
O �nal da Segunda Guerra foi importante por que:
Os africanos que participaram da guerra esperaram que as
“promessas” de transformações mais signicativas ̀ nos seus países,
como uma autonomia maior sobre as decisões políticas e econômicas,
fossem cumpridas. Como isso não ocorreu, acabaram por insuar ̀ as
populações, que mesmo com concretização da presença forçada
europeia, não estavam inertes e realizavam uma grande linha de
resistência nas suas regiões, fazendo emergir desse contexto o
discurso mais duro, que reivindicava autonomia, independência e
união africana contra os europeus. (MATOS, 2019, p. 79).
A�nal, não fazia sentido ter lutado contra dominadores nazifascistas se seus territórios
na África estavam sob o domínio dos aliados para os quais lutaram nesta guerra.
070
Fonte: Disponível aqui
Ao �m da Segunda Guerra, a África vivenciou um período de crises
famélicas e os soldados retornados não obtiveram reconhecimento de
suas lutas. É nesse período que o movimento do nacionalismo africano
retorna em cada território com características diferentes.
Além disso, com o �ndar da guerra, as antigas potências imperialistas estagnaram, o
que tornava mais difícil conter con�itos. E nesse contexto, um con�ito de nível global
teve importância

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